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Galactosemia e FrutosemiaDiagnóstico e Tratamento
Sabrina Bortolin Nery
Especializanda de 2º Ano
Disciplina de Gastroenterologia
Departamento de Pediatria
Escola Paulista de Medicina
Universidade Federal de São Paulo
Galactosemia
Galactosemia
Definição
Trata-se de um erro inato do metabolismo pertencente ao grupo 2 da Classificação de Saudubray & Charpentier (1995) – Defeito no metabolismo intermediário, que utiliza o fenótipo clínico das doenças e as dividem em três grandes grupos.
http://www.unifesp.br/centros/creim
Classificação clínica das doenças hereditárias
http://www.unifesp.br/centros/creim
Galactosemia
A galactosemia clássica, galactosemia por deficiência de GALT ou galactosemia tipo I, é uma doença autossômica recessiva do metabolismo da galactose causada pela deficiência da galactose-1-fosfato uridil-transferase (GALT), enzima responsável pela conversão de galactose-1-fosfato em galactose-1-fosfato uridil-transferase, na via de Leloir no metabolismo humano.
Annet M. Bosch e col. Pediatrics 2004.
Galactosemia
Outras duas deficiências enzimáticas na via de Leloir causam galactosemia, ambas com padrão autossômico recessivo. São elas a deficiência de galactoquinase (GALK), e a deficiência de uridinl-difosfato galactose-4-epimerase (GALE).
Convencionou-se, portanto, nomear a galactosemia de acordo com sua etiologia: galactosemia por deficiência de GALT, galactosemia por deficiência de GALK e galactosemia por deficiência de GALE, sendo a primeira a forma mais comum.
Annet M. Bosch e col. Pediatrics 2004.
Thoden, J. B. et al. J. Biol. Chem. 2005.
Via de Leilor
Galactosemia Tipo I - GALT
A incidência da galactosemia clássica na Holanda é de 1:33000, com cerca de 6 casos novos por ano.
Na população caucasiana a incidência é de 1:40000 – 60000, e na população japonesa é de 1:1000000.
Nos EUA a incidência varia de 1:30000 a 1:60000 nascido vivos .
O gene responsável pela codificação da enzima galactose-1-fosfato uridil-transferase (GALT) encontra-se no cromossomo 9 p 13, e já foram mapeados mais de 200 mutações no gene em questão.
Kimberly K. Openo e col. Am J Hum Genet 2006.
Mohamed Jama e col. J Mol Diagn. 2007.
Annet M. Bosch e col. Pediatrics 2004.
Hidetetsu Hirokawa1 e col. Eur J Hum Genet 1999.
Representação da GALT proveniente da E. coli
Hazel M. Holden e col. J. Biol. Chem. 2003.
As seis mutações mais comuns responsáveis por 80% dos casos de galactosemia clássica são:
p.Q188R (c.563 A>G) p.S135L (c.404 C>T) p.K285N (c.855 G>T) p.L195P (c.584 T>C) p.T138M (c.413 C>T) p.Y209C (c.626 A>G)
A sétima mutação, IVS2-2 A>G (c.253-2 A>G), foi encontrada na população hispânica.
Galactosemia Tipo I - GALT
Mohamed Jama e col, J Mol Diagn. 2007.
Galactosemia Tipo I - GALT
Sinais e sintomas mais freqüentes aparecem no período neonatal: Baixo ganho pondero-estatural Dificuldades alimentares Vômitos e diarréia Icterícia – hiperbilirrubinemia conjugada prolongada Catarata Letargia e hipotonia Hepatomegalia e esplenomegalia Encefalopatia Fontanela ampla Sangramento ou hematomas Melhora clínica à administração de fluidos intravenosos
J H Walter e col, Arch Dis Child 1999.Howard Henderson, BMC Pediatr. 2002.
Galactosemia Tipo I - GALT
Alteração hepática Hiperbilirrubinemia direta, alteração dos testes de função hepática, coagulopatia, aumento dos aminoácidos plasmáticos (fenilalanina, tirosina e metionina)
Alteração tubular renal
Acidose metabólica, galactosúria e glicosúria (após uso de alimentos contendo lactose ou galactose), albuminúria, aminoacidúria
Alteração do metabolismo dos carboidratos
Aumento da galactose plasmática, aumento do galactitol sérico e urinário, aumento da galactose-1-fosfato nas células vermelhas
Anemia hemolítica
Septicemia Escherichia coli
J H Walter e col, Arch Dis Child 1999.
Galactosemia Tipo I - GALT
Seqüelas neurológicas:
Edema cerebral difuso Fontanela anterior ampla Alterações cognitivas Alteração na fala Ataxia e tremores Crise convulsiva
Ridel KR e col. Pediatr Neurol 2005.
Galactosemia Tipo II - GALK
A enzima galactoquinase (GALK), cuja deficiência é responsável pela expressão da galactosemia tipo II, é codificada pelo cromossomo 17q24.
Existem cerca de 20 mutações conhecidas que levam ao aparecimento da galactosemia tipo II, incluindo substituição de bases, deleção de bases e grandes deleções.
O quadro clínico é menos agressivo quando comparado aos tipos I e III, sendo que catarata bilateral precoce é a principal manifestação clínica, surgindo antes da quarta semana de vida.
Thoden, J. B. et al. J. Biol. Chem.2005. Celia I e col. Pediatrics 2006.
Representação da GALK proveniente da E. coli
Hazel M. Holden e col. J. Biol. Chem. 2003.
Galactosemia Tipo III - GALE
A deficiência de uridil-difosfato galactose-4-epimerase (GALE), responsável pelo aparecimento da galactosemia tipo III ou por deficiência de GALE, é uma doença autossômica recessiva localizada no gene 1p36.
Inicialmente foi descrita por Gitzelmann como uma doença benigna cujo prejuízo era restrito à circulação das células vermelhas e brancas do sangue, chamada de forma periférica.
Kimberly K. Openo e col. Am J Hum Genet 2006.
Celia I e col. Pediatrics 2006.
Em 1981, Holton e cols. aventaram a hipótese de que a galactosemia por deficiência de GALE era uma condição binária que apresentava-se com uma forma periférica, cuja incidência variava de 1:6700 a 1:60000, e uma forma generalizada grave, extremamente rara, apresentando-se com ADNPM, hipotonia, baixo ganho pondero estatural e perda auditiva neurosensorial.
Essa teoria binária manteve-se até a década de 90, quando grupos da Europa e dos EUA relataram pacientes que apresentavam alterações nas células sanguíneas associadas a catarata e deficiência cognitiva.
Galactosemia Tipo III - GALE
Kimberly K. Openo e col. Am J Hum Genet 2006.
Celia I e col. Pediatrics 2006.
Representação da GALE proveniente da E. coli
Hazel M. Holden e col. J. Biol. Chem. 2003.
Diagnóstico
Sinais e sintomas sugestivos de galactosemia são: dificuldades alimentares, icterícia (hiperbilirrubinemia conjugada prolongada), hepatomegalia, esplenomegalia, baixo ganho pondero-estatural, vômitos e diarréia, letargia e hipotonia, catarata, sepse (principalmente por Escherichia coli) e melhora clínica com a administração de fluídos intravenosos (pausa alimentar).
Howard Henderson, BMC Pediatr. 2002.
J H Walter e col, Arch Dis Child 1999.
Diagnóstico
Exames laboratoriais inespecíficos para triagem de Erros Inatos do Metabolismo:
Hemograma Transaminases séricas Coagulograma Proteínas totais e frações Uréia e creatinina Sódio, potássio e cloro Gasometria venosa Glicemia Colesterol total e frações Triglicérides Ácido úrico Lactato, piruvato e amônia Urina I
J H Walter e col, Arch Dis Child 1999.
http://www.unifesp.br/centros/creim
Diagnóstico
Triagem urinária para Erros Inatos do Metabolismo através da cromatografia urinária de aminoácidos ou açúcares – Reação de Benedict (galactosúria).
Cromatografia plasmática qualitativa de aminoácidos e dosagem de ácidos orgânicos.
Teste genético – identificação das mutações mais comuns como a Q188R e a S135L na galactosemia clássica.
http://www.unifesp.br/centros/creim
Howard Henderson e col. BMC Pediatr 2002.
Diagnóstico
Teste de Rastreamento em recém nascidos:
É baseado na análise quantitativa estimada de galactose, galactose 1 fosfato e deficiência da enzima GALT.
O Recém Nascido deve estar em uso de aleitamento materno ou fórmula que contenha galactose.
Detecta apenas a galactose tipo I. O teste é realizado através da análise de eritrócitos do sangue e pode
apresentar resultado falso negativo se a criança recebeu transfusão sanguínea nos últimos 3 meses.
Se negativo, deve ser completado com as análises quantitativas das enzimas GALK e GALE.
Celia I e col. Pediatrics 2006.
Tratamento
Crianças com suspeita de galactosemia devem ser alimentadas com dieta isenta de galactose até a confirmação diagnóstica.
Exclusão de leite e derivados da dieta deve ser definitiva, pois sua ingestão pode levar á intoxicação aguda.
Deve-se realizar suplementação de cálcio. Controle da densidade mineral óssea por DMO após os 6 anos de idade. Monitorização do desenvolvimento puberal especialmente nas meninas –
hipogonadismo hipergonadotrófico – falha ovariana primária acarreta menopausa precoce.
Dosagem de galactose 1-fosfato nos eritrócitos é o método mais comum para avaliar a transgressão da dieta.
Celia I e col. Pediatrics 2006.
Ridel KR e col. Pediatr Neurol 2005.
M Rubio-Gozalbo e col. Arch Dis Child. 2002
Tratamento
Medidas terapêuticas durante a crise de intoxicação aguda ou de descompensação metabólica:
Fototerapia para a hiperbilirrubinemia nos Recém Nascidos. Aplicação de Vitamina K se ocorrer coagulopatia. Introdução de antibioticoterapia de amplo espectro na sepse. Hidratação intra-venosa. Plasma fresco congelado caso seja necessário.
Celia I e col. Pediatrics 2006.
Ridel KR e col. Pediatr Neurol 2005.
Tratamento
Fórmula infantil à base da proteína da soja:
Alternativa relativamente segura como fonte única de alimentação em lactentes que necessitam de dietas de exclusão do leite materno e de fórmulas à base de proteína do leite de vaca, aceita pelo FDA.
Indicada como alternativa nutricional em lactentes com galactosemia pela Sociedade Americana de Pediatria.
Atualmente não existem evidências conclusivas a respeito de efeitos nocivos do uso da isoflavona a longo prazo.
Russell J. Merritt e col. J. Nutr. 2004.
Frutosemia
Frutosemia
Trata-se de erro inato do metabolismo pertencente ao grupo 2 da Classificação de Saudubray & Charpentier (1995) – Defeito no metabolismo intermediário.
As anormalidades no metabolismo da frutose foram inicialmente descritas em um paciente diabético, em 1876, por Czapek e Zimmer.
Desde então, 6 condições são consideradas como causadoras de deficiência no metabolismo da frutose, a sasber: deficiência de frutoquinase, deficiência de aldolase A e B, deficiência de frutose 1,6 difosfatase, deficiência de gliceratoquinase, e má absorção de frutose.
http://www.unifesp.br/centros/creim
Frits A Hommes Am J Clin Nutr 1993.
Frutosemia
A intolerância hereditária à frutose é uma doença metabólica autossômica recessiva causada pela deficiência da frutose difosfato aldolase ou aldolase B.
A isoforma B da enzima aldolase é essencial para o metabolismo da frutose no fígado, rins e intestino.
A incidência da intolerância hereditária à frutose é de 1:20000 nascido vivos.
J C Sánchez-Gutiérrez. J Med Genet 2002.
Frutosemia
Desde que o gene responsável pela codificação da enzima aldolase B (ALDOB) foi identificado em diferentes alelos, ao menos 22 mutações foram descritas até o presente momento.
A três mutações mais comuns, responsáveis por 80% dos casos de intolerância hereditária à frutose são A149P, A174D e N334K, sendo que a primeira é responsável por 50% dos casos.
J C Sánchez-Gutiérrez. J Med Genet 2002.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
Metabolismo da frutose
O metabolismo da frutose em indivíduos normais:
A enzima aldolase B catalisa a clivagem reversível da frutose-1-fosfato na enzima frutose-1,6-difosfato que atua diretamente na via glicogênica – gliconeogênica.
A seta pontilhada indica 3 pontos de interrupção no metabolismo da frutose encontrados na deficiência da aldolase B.
Manir Ali e col, J Med Genet 1998.
Frutosemia
Manifestações clínicas precoces:
Irritabilidade Letargia Recusa alimentar Vômitos Após ingestão de frutose, Dor abdominal sorbitol ou sucrose Hipoglicemia Convulsão Coma
J C Sánchez-Gutiérrez. J Med Genet 2002.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
R Santamaria e col. Eur J Hum Genet 1999.
Frits A HommesAm J Clin Nutr 1993.
Frutosemia
Manifestações clínicas da síndrome da toxicidade crônica:
Falha no crescimento Hipoglicemia sintomática – tremores e crises convulsivas Icterícia Coagulopatia Doença hepática progressiva - cirrose Acidose metabólica Tubulopatia renal proximal Insuficiência renal crônica
J C Sánchez-Gutiérrez. J Med Genet 2002.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
R Santamaria e col. Eur J Hum Genet 1999.
Frits A HommesAm J Clin Nutr 1993.
Frutosemia
Após a descompensação causada pela ingestão da frutose, em geral, as crianças desenvolvem um padrão de comportamento protetor chamado Pavlov.
Acentuada aversão permanente a alimentos responsáveis pelos sintomas abdominais: doces, frutas e alguns legumes.
Ingestão persistente da frutose pode levar à síndrome da toxicidade crônica.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
Manir Ali e col. J Med Genet 1998.
Diagnóstico
História clínica, sinais e sintomas que favorecem a suspeita diagnóstica:
Ausência de sintomas durante o aleitamento materno exclusivo Início dos sintomas com a introdução da alimentação complementar em
especial frutas e doces Aversão alimentar a frutas, doces e legumes Hipoglicemia sintomática, acidose metabólica e icterícia recorrentes Déficit de crescimento associado a alteração hepática e renal História familiar
J C Sánchez-Gutiérrez. J Med Genet 2002.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
R Santamaria e col. Eur J Hum Genet 1999.
Frits A Hommes Am J Clin Nutr 1993.
G Hillebrand e col. Arch Dis Child 2000.
Diagnóstico
Exames laboratoriais inespecíficos para triagem de Erros Inatos do Metabolismo: Hemograma Transaminases séricas Coagulograma Proteínas totais e frações Uréia e creatinina Sódio, potássio, fósforo, magnésio e cloro Gasometria venosa Glicemia Colesterol total e frações Triglicérides Ácido úrico Lactato, piruvato e amônia séricos Urina I
J H Walter e col, Arch Dis Child 1999.
Diagnóstico
Triagem urinária para Erros Inatos do Metabolismo através da cromatografia urinária de aminoácidos ou açúcares – Reação de Benedict (frutosúria e hiperaminoacidúria).
Teste sanguíneo de tolerância à frutose (200 mg / Kg) – Pode resultar em hipoglicemia grave !!!
Teste de frutose no ar expirado.
Frits A Hommes Am J Clin Nutr 1993.
G Hillebrand e col. Arch Dis Child 2000.
C L James e col. J Med Genet 1996.
Diagnóstico
Biópsia hepática ou intestinal: análise quantitativa da atividade da frutose – 1 – fosfato aldolase e da frutose – 1,6 – bifosfato aldolase:
A histologia hepática apresenta-se com fibrose periportal e alteração intralobular com perda dos hepatócitos até sinais de cirrose hepática.
Teste genético: reconhecimento das principais mutações genéticas responsáveis pela frutosemia (A149P, A174D e N334K). Frits A Hommes Am J Clin Nutr 1993.
G Hillebrand e col. Arch Dis Child 2000.
C L James e col. J Med Genet 1996.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
Tratamento
Se identificada e tratada precocemente, antes que ocorra dano permanente, a frutosemia é compatível com qualidade e expectativa de vida normais.
Durante a descompensação aguda:
garantir suporte respiratório e cardiovascular corrigir a hipoglicemia com a administração de galactose corrigir os distúrbios hidroeletrolíticos em especial a
hipofosfatemia.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
Manir Ali e col. J Med Genet 1998.
Tratamento
Retirada de todas as fontes de frutose da dieta com acompanhamento nutricional especializado:
Nozes, legumes, frutas e mel (frutose). Açúcar proveniente da cana-de-açúcar e da beterraba (sacarose). Dietas para diabéticos contendo sorbitol e poliol (convertidos em frutose
pela sorbitol desidrogenase na mucosa intestinal).
A sacarose e o sorbitol são amplamente utilizados como excipientes de diversos medicamentos com o intuito de tornar o gosto dos mesmos mais palatáveis.
Timothy Cox. The FASEB Journal 1994.
Manir Ali e col. J Med Genet 1998.
Tratamento
Atualmente o transplante hepático é considerado uma opção terapêutica nas doenças metabólicas que evoluem ou não com cirrose hepática.
A sobrevida em 5 anos das crianças transplantadas varia de 73 a 87 %, e, as transplantadas em conseqüência de doenças metabólicas apresentam valores ainda maiores.
Em algumas doenças metabólicas, como a frutosemia, onde ocorre perda progressiva da função hepática e, eventualmente, cirrose e insuficiência hepática, o transplante pode se tornar a única terapia capaz de mudar o prognóstico da doença.
Yuk K. Sze e col. Transplantation 2009.