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INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
GABRIELA ESTE PIRES DA ROSA
DIAGNÓSTICO DAS JUSTIFICATIVAS EMPRESARIAIS E GERAÇÃO DE VALOR
ECONÔMICO DAS INICIATIVAS DE SUSTENTABILIDADE CORPORATIVA NO
SETOR SUPERMERCADISTA, CONSIDERANDO O ENGAJAMENTO DOS
PRODUTORES DE ALIMENTOS
Rio de Janeiro
2011
Gabriela Este Pires da Rosa
DIAGNÓSTICO DAS JUSTIFICATIVAS EMPRESARIAIS E GERAÇÃO DE VALOR
ECONÔMICO DAS INICIATIVAS DE SUSTENTABILIDADE CORPORATIVA NO
SETOR SUPERMERCADISTA, CONSIDERANDO O ENGAJAMENTO DOS
PRODUTORES DE ALIMENTOS
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Administração,
Instituto COPPEAD de Administração,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Administração.
Orientador: Prof. Celso Funcia Lemme, D.Sc.
Rio de Janeiro
2011
E79 Este, Gabriela.
Diagnóstico das justificativas empresariais e geração de valor
econômico das iniciativas de sustentabilidade corporativa no setor
supermercadista, considerando o engajamento dos produtores de
alimentos / Gabriela Este Pires da Rosa. -- 2011.
66 f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração, 2011.
Orientador: Celso Funcia Lemme
1. Sustentabilidade. 2. Desempenho financeiro. 3. Administração – Tese.
I. Lemme, Celso Funcia (Orient.) II. Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Instituto COPPEAD de Administração. III. Título.
CDD: 333.7
Gabriela Este Pires da Rosa
DIAGNÓSTICO DAS JUSTIFICATIVAS EMPRESARIAIS E GERAÇÃO DE VALOR
ECONÔMICO DAS INICIATIVAS DE SUSTENTABILIDADE CORPORATIVA NO
SETOR SUPERMERCADISTA, CONSIDERANDO O ENGAJAMENTO DOS
PRODUTORES DE ALIMENTOS
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Administração,
Instituto COPPEAD de Administração,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Administração.
Aprovada em
Celso Funcia Lemme, D.Sc.
Valéria Gonçalves da Vinha, D.Sc.
Carlos Eduardo Brandão, D.Sc.
Rio de Janeiro
2011
AGRADECIMENTOS
Ao professor e orientador Celso Funcia Lemme, não só pelo apoio e pelos
ensinamentos dados durante a dissertação, mas também por seu empenho em
quebrar paradigmas e mostrar caminhos para o desenvolvimento sustentável. Por
acreditar que podemos fazer diferente e, principalmente, por nos fazer acreditar que
podemos fazer diferente.
A Clarissa Lins e Israel Klabin pela oportunidade de trabalhar e desenvolver minha
dissertação na Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável.
A Fabiana Moreno, Iaci Lomonaco e Luis Saporta por terem dividido suas
experiências em sustentabilidade corporativa e me ensinado quase tudo que sei
sobre o tema. E também por terem me acolhido de forma tão carinhosa, enchendo
de alegria os dias de trabalho e estudo.
Aos amigos trazidos pela COPPEAD pelo esforço em me transformar em uma
pessoa mais leve e por tornar esses anos de estudo muito mais divertidos do que eu
poderia imaginar.
A todos os meus irmãos e amigos por estarem sempre ao meu lado: na alegria ou
na tristeza, na fartura ou na pobreza.
A minha avó e minhas tias pela admiração, carinho e cuidado incansáveis; por terem
sido a minha família durante esses dois anos de Mestrado.
À minha mãe, Graça, por ter dedicado os últimos vinte e nove anos a mim. Por
sempre ter medo do que pode acontecer e me fazer pensar, por apoiar minhas
decisões de todas as formas que estiver a seu alcance, mesmo que pareçam
totalmente descabidas a seus olhos, e por toda a ajuda para que eu concluísse o
Mestrado – financeira, emocional e operacional. E, principalmente, por acreditar em
mim.
RESUMO
ESTE, Gabriela. Diagnóstico das justificativas empresariais e geração de valor econômico das iniciativas de sustentabilidade corporativa no setor
supermercadista, considerando o engajamento dos produtores de alimentos. Orientador: Celso Funcia Lemme. Rio de Janeiro. COPPEAD/UFRJ; 2011.
Dissertação (Mestrado em Administração).
O presente estudo teve por objetivo avaliar a construção de justificativas de negócio
de sustentabilidade no setor de supermercados, considerando a etapa de produção
de frutas, legumes, verduras e carnes, escolhida por representar a maior parte dos
fornecedores da cadeia de valor. Para tal, foram selecionados os oito maiores
supermercados do mundo em critério de faturamento que divulgam relatório de
sustentabilidade. À lista, foi adicionado o maior brasileiro, totalizando nove empresas
para análise, entre americanas, francesas, inglesas, alemãs, japonesas e brasileiras.
Inicialmente, as práticas socioambientais dos supermercados voltadas para a etapa
de produção de frutas, legumes, verduras e carnes da cadeia de valor foram
identificadas. Foram, então, elaborados três rankings para classificação dos
supermercados: o primeiro considerando a quantidade de iniciativas, o segundo
considerando a proximidade da informação divulgada à construção de justificativa de
negócio, e o terceiro considerando os dois critérios anteriores. O resultado do
trabalho mostra que, por mais que os supermercados tenham iniciativas
significativas que envolvam os produtores de alimentos, ainda estão distantes de
justificar financeiramente sua implementação. Algumas informações divulgadas já
estão quantificadas, mas ainda não monetizadas. Isso mostra que ainda existe
distância significativa entre desempenho socioambiental e financeiro nessas
empresas. Dessa forma, foram propostas métricas e indicadores para auxiliar os
supermercados a justificar financeiramente suas iniciativas socioambientais,
inserindo a sustentabilidade nos seus modelos de negócio e aprimorando seu
sistema de informações gerenciais.
Palavras-chave: sustentabilidade corporativa, desempenho financeiro, justificativas
de negócios, supermercado.
ABSTRACT
ESTE, Gabriela. Diagnóstico das justificativas empresariais e geração de valor econômico das iniciativas de sustentabilidade corporativa no setor
supermercadista, considerando o engajamento dos produtores de alimentos. Orientador: Celso Funcia Lemme. Rio de Janeiro. COPPEAD/UFRJ; 2011.
Dissertação (Mestrado em Administração).
This work aimed to evaluate sustainability business cases in the supermarket sector,
considering value chain phase of production of fruits, vegetables, greenery and meat,
chosen because it represents the most of supermarket suppliers. In that sense, the
biggest eight supermarkets (using revenue as a parameter) that publish sustainability
report of the world were selected. To this list, the biggest Brazilian one was added,
generating a sample of nine companies, among American, French, English, German,
Japanese and Brazilian ones. At first, supermarkets` socio-environmental initiatives
directed to the value chain phase of production of fruits, vegetables, greenery and
meat were identified. Then, three rankings were created: the first, considering the
amount of initiatives, the second, considering the proximity of disclosed information
from the creation of business case, and the third, considering previous both. The
result shows that, even if the supermarkets have significant initiatives that implicate
food producers, they are still far from justifying financially their implementation. Some
of the information disclosed is already quantified, but still not monetized. This means
that there is a significant distance between socio-environmental and financial
performance in these companies. Thus, metrics and indicators were proposed in
order to help the supermarkets to justify financially their socio-environmental
initiatives, inserting sustainability and their business models and improving their
managerial information system.
Key-words: corporate sustainability, financial performance, business cases,
supermarkets.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Cadeia de valor do setor varejista (UNEP, 2008) ...................................................29
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Quinze maiores supermercados do mundo e o maior brasileiro, por critério
de faturamento ................................................................................................... 21
Tabela 2 - Oportunidades socioambientais para o setor varejista ............................ 23
Tabela 3 - Processo de escolha dos supermercados a serem estudados................ 26
Tabela 4 - Adaptação da cadeia de valor da UNEP (2008) ...................................... 29
Tabela 5 - Etapas da cadeia de valor vs. principais questões socioambientais do
setor supermercadista........................................................................................ 30
Tabela 6 - Método para avaliação dos supermercados, considerando qualidade da
informação divulgada ......................................................................................... 32
Tabela 7 - Método para avaliação dos supermercados, considerando número de
práticas e qualidade da informação divulgada ................................................... 32
Tabela 8 - Etapas da cadeia de valor vs. principais questões socioambientais do
setor supermercadista e interseções onde existem práticas de sustentabilidade
corporativa.......................................................................................................... 35
Tabela 9 - Práticas socioambientais dos supermercados pesquisados referentes à
etapa de produção ............................................................................................. 36
Tabela 10 - Práticas socioambientais dos supermercados e número de informações
divulgadas, classificadas quanto aos níveis de Epstein e Roy (2003)............... 37
Tabela 11 - Classificação das informações, alocando as práticas de acordo com a
questão material ................................................................................................. 40
Tabela 12 - Ranqueamento dos supermercados, considerando a quantidade de
práticas socioambientais .................................................................................... 41
Tabela 13 - Ranqueamento referente à associação com o desempenho financeiro
das informações das práticas socioambientais.................................................. 42
Tabela 14 - Ranqueamento combinando a quantidade de práticas socioambientais
dos supermercados com o grau de associação ao desempenho financeiro
corporativo.......................................................................................................... 43
Tabela 15 - Consolidação das pontuações segundo a questão material abordada.. 44
Tabela 16 - Consolidação das práticas socioambientais dos supermercados em
práticas genéricas .............................................................................................. 46
Tabela 17 - Informações presentes nas práticas genéricas...................................... 47
Tabela 18 - Descrição das práticas genéricas, com os respectivos benefícios
esperados para o produtor e varejista, a transformação dos benefícios para o
varejista em métricas financeiras e o investimento requerido para sua
implementação ................................................................................................... 50
Tabela 19 - Tradução das métricas de avaliação financeira em indicadores de gestão
........................................................................................................................... 52
ÍNDICE
1. Introdução ......................................................................................................... 13
1.1. Motivação .................................................................................................... 13
1.2. Problema...................................................................................................... 13
1.3. Relevância ................................................................................................... 15
1.4. Delimitação.................................................................................................. 15
1.5. Objetivos e perguntas da pesquisa .......................................................... 16
2. Revisão bibliográfica........................................................................................ 17
2.1. Relação entre desempenho socioambiental e financeiro....................... 17
2.2. Desafios de sustentabilidade corporativa no setor supermercadista... 20
3. Metodologia....................................................................................................... 25
3.1. Universo e amostra..................................................................................... 25
3.2. Fonte de dados ........................................................................................... 27
3.3. Tratamento de dados.................................................................................. 28
3.4. Limitação do método.................................................................................. 34
4. Resultados......................................................................................................... 35
4.1. Levantamento e alocação das práticas socioambientais do setor........ 35
4.2. Diagnóstico dos business cases de sustentabilidade............................ 37
4.3. Ranqueamento dos supermercados......................................................... 40
4.4. Elaboração de métricas financeiras para a construção de business cases de sustentabilidade .................................................................................. 45
5. Conclusão.......................................................................................................... 54
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................... 58
APÊNDICES.............................................................................................................. 61
13
1. Introdução
1.1. Motivação
Este trabalho foi inspirado em parceria entre a Fundação Brasileira para o
Desenvolvimento Sustentável (FBDS) e o Instituto Coppead de Administração da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPEAD/UFRJ), que resultou em um
projeto de consultoria em sustentabilidade corporativa para o maior supermercado
brasileiro. A partir de tal projeto, foi percebido que existem poucas análises
financeiras no setor associadas à implementação de iniciativas socioambientais.
1.2. Problema
Muito se tem falado sobre sustentabilidade corporativa e as grandes
corporações tendem a inserir o tema em suas estratégias, motivadas, entre outros
fatores, por pressão da sociedade civil. Alguns eventos recentes, como A Farra do
Boi na Amazônia (Greenpeace, 2009), relatório que acusa o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de financiar pecuaristas inseridos
em áreas desmatadas ilegalmente da Amazônia e que culminou com boicote desses
produtores pelos três maiores varejistas brasileiros, mostram o poder que uma
sociedade mais consciente e com maior acesso à informação tem sobre as
empresas. O lançamento nos Estados Unidos do GoodGuide (www.goodguide.com)
para o celular, aplicativo no qual o consumidor obtém diversas informações sobre o
impacto que mais de sessenta mil produtos disponíveis em supermercados
americanos têm sobre saúde, ambiente e sociedade, através de uma leitura do
código de barras por aparelho de telefone celular, é uma forte evidência de que as
corporações que não se moverem na direção do desenvolvimento sustentável
podem ter sua existência ameaçada.
Possíveis mudanças no ambiente regulatório também motivam as
organizações a entrar nessa agenda. O uso de sacolas plásticas, por exemplo, já foi
proibido por completo na África do Sul, Taiwan e Bangladesh e está em fase de
permuta por sacolas reutilizáveis no estado do Rio de Janeiro. Diversas campanhas
14
pelo mundo sugerem que o mesmo acontecerá em outros países, forçando as
empresas, principalmente os varejistas, a antecipar-se à mudança.
Por fim, comprovações científicas sobre o impacto que as mudanças
climáticas e escassez de recursos podem ter sobre a sociedade e,
consequentemente, sobre as operações empresariais, também vêm exercendo seu
papel como motivador. Publicações, como The Economics of Climate Change: The
Stern Review (STERN, 2006), que mostra, entre outros, os efeitos sobre culturas
agrícolas de regiões inteiras caso o aquecimento global chegue a cinco graus
Celsius – até um terço da África pode ficar sem produção alimentar – ou como Plan
B 3.0 (BROWN, 2008), no qual o autor propõe que, se a China continuar a crescer
8% ao ano, em 2031 serão necessários, aproximadamente, três planetas Terra para
suprir somente a necessidade de grãos, papel e petróleo desse país, deixam claro
que é necessária uma mudança não só no atual padrão de consumo, mas também
nos padrões de produção.
Como proposto no Plano B 4.0, a “bolha alimentar” não tardará a estourar
(BROWN, 2009). O setor varejista, ou, mais especificamente, o setor
supermercadista, se vê no centro dessa questão. Participante de uma cadeia de
valor extensa e detentor de poder de influência sobre fornecedores e consumidores
finais, é um ator importante nesse cenário de mudança.
Mesmo com as evidências sobre falta de sustentabilidade do atual estilo de
vida de grande parte da sociedade a longo prazo, não se sabe exatamente qual o
valor econômico da mudança e qual o seu retorno financeiro. Apesar de os autores
supracitados terem proposto um business case (justificativa de negócio) para a
sociedade, mostrando que a mudança é menos custosa que o dispêndio com a
manutenção dos atuais padrões, as empresas ainda têm dificuldade em encontrar os
seus business cases de sustentabilidade. Muitas organizações deparam-se com
dilemas dessa ordem, pois enxergam a necessidade de moverem-se em tal direção
para se manterem competitivas, mas não conseguem provar aos acionistas o valor
econômico a ser gerado por tal movimento.
15
1.3. Relevância
Os estudos – acadêmicos ou não – sobre sustentabilidade corporativa e
geração de valor econômico, ou seja, que relacionem desempenho socioambiental e
desempenho financeiro, são pouco conclusivos. Isso é prejudicial para as empresas
que, não sabendo justificar a implementação de iniciativas socioambientais, muitas
vezes se vêem pressionadas por acionistas e por seu próprio corpo interno a reduzir
esses investimentos. A elaboração de business cases não só valida o dispêndio
requerido, como melhora o sistema de informações gerenciais das empresas, ou
seja, atinge dois principais públicos: o executivo que visa a melhorar a gestão e o
investidor que deseja otimizar a alocação de recursos.
O setor de supermercados foi escolhido para esta pesquisa por duas
principais razões: 1) é integrante de uma cadeia de valor extensa, diversificada e
pulverizada; 2) detém forte poder de influência tanto sobre fornecedores, quanto
sobre consumidores. Como o setor apresenta crescimento real no Brasil, o estudo
mostra-se relevante para a construção de um desenvolvimento sustentável no País.
1.4. Delimitação
A delimitação temporal deste trabalho dependeu do lançamento dos relatórios
anuais e/ou de sustentabilidade dos supermercados. Como quando do início de sua
elaboração, em março de 2010, as empresas ainda não haviam publicado seus
relatórios referentes ao ano de 2009, todos os relatórios utilizados referem-se ao ano
de 2008 ou ao ano fiscal 2008/2009.
Como as redes escolhidas vendem uma imensa variedade de produtos, muito
diferentes desde a forma de fabricação até a comercialização, o trabalho contemplou
somente alimentos pertencentes às categorias FLV (frutas, legumes e verduras) e
carnes. Os primeiros foram escolhidos por representarem a maior parte dos
fornecedores da cadeia. Já a carne foi escolhida por ser uma questão relevante no
Brasil devido ao desmatamento para práticas de pecuária e ao impacto relevante na
emissão de gases de efeito-estufa, associados às mudanças climáticas.
16
Devido à sua extensão e complexidade, o estudo não abordou toda a cadeia
de valor do setor e considerou apenas a etapa de produção de alimentos, escolhida
por ser aquela em que a rastreabilidade dos produtos deve ser iniciada.
1.5. Objetivos e perguntas da pesquisa
O movimento das corporações em direção à sustentabilidade parece ser
crescente, especialmente entre aquelas do setor supermercadista, que detêm poder
de influência sobre a cadeia de valor. Porém, é difícil engajar parceiros, visto que os
benefícios desse movimento ainda são incertos.
Este trabalho visou a preencher parte dessa lacuna. Em primeiro lugar, seu
objetivo foi diagnosticar a construção de business cases das iniciativas
socioambientais relativas à etapa de produção da cadeia de valor do setor de
supermercados. Em segundo lugar, teve como objetivo ranquear as empresas
selecionadas para composição da amostra de acordo com sua proximidade de
construção de business cases de sustentabilidade. Por fim, mirou a proposição de
métricas para futuros cálculos de business cases.
Nesse sentido, o estudo propõe três questões:
• O nível de informação sobre iniciativas socioambientais existente é suficiente
para a construção de business cases de sustentabilidade no setor
supermercadista?
• Que supermercados estão mais próximos da construção de business cases
de sustentabilidade?
• Quais as métricas necessárias para a construção de business cases de
práticas socioambientais que envolvem os fornecedores de alimentos?
O restante deste trabalho está organizado da seguinte forma: o item 2 traz
uma revisão da literatura sobre relação entre desempenho socioambiental e
financeiro e sustentabilidade corporativa no setor supermercadista; o item 3 explica
a metodologia utilizada; o item 4 mostra os resultados da pesquisa; e, por fim, o item
5 apresenta a conclusão do trabalho.
17
2. Revisão bibliográfica
A revisão da literatura está dividida em dois assuntos: relação entre
desempenho socioambiental e financeiro e desafios de sustentabilidade corporativa
no setor supermercadista.
2.1. Relação entre desempenho socioambiental e financeiro
Há aproximadamente 20 anos surgiu a noção de que um desempenho
ambiental satisfatório pode ser uma fonte potencial de vantagem competitiva porque
leva a processos mais eficientes, melhoria da produtividade, menores custos de
adequeção e novas oportunidades de mercado (PORTER, 1991). Esse conceito
evoluiu quando John Elkington lançou a idéia de Tripple Bottom Line, integrando as
dimensões ambiental, social e econômica ao dizer que “Triple Bottom Line é a
expansão do modelo de negócios tradicional que só considerava fatores econômicos
na avaliação de uma empresa, para um novo modelo que passa a considerar o
desempenho ambiental e social da companhia, além do financeiro” (ELKINGTON,
1998).
Sabe-se, então, que a sustentabilidade corporativa se manifesta através de
iniciativas corporativas sociais e ambientais que visam a explorar oportunidades e
mitigar riscos financeiros. Dessa forma, a definição engloba responsabilidade
econômica, ou seja, saúde financeira de longo prazo (Salzmann et. al., 2005).
O termo business case for sustainability vem sendo usado por todo o tipo de
organização para justificar estratégias de sustentabilidade, mas ainda existe
compreensão insuficiente sobre o tema entre os gerentes devido, principalmente, à
falta de estudos na área (SALZMANN, IONESCU-SOMERS e STEGER, 2005) – ou
a resultados contraditórios ou inconclusivos (BRITO, 2005; MAROM, 2006). Brito
(2005), após realizar uma compilação de estudos que buscavam compreender a
associação entre desempenho ambiental e financeiro, observou que os resultados
não eram conclusivos, encontrando-se correlações positivas, neutras e negativas,
dependendo do contexto, amostra e metodologia de cada estudo. Da mesma forma,
Marom (2006) afirma que o estudo do relacionamento entre responsabilidade social
corporativa e desempenho financeiro corporativo há algumas décadas vem gerando
resultados empíricos variados e contraditórios.
18
Baseados na Teoria dos Stakeholders1, alguns estudos concordam que deve
haver outras preocupações além da econômica, mas ainda não conseguem calcular
seu retorno financeiro (SALZMANN, IONESCU-SOMERS e STEGER, 2005). Nesse
sentido, muitas empresas vêm agindo de forma social e ambientalmente
responsável sem estarem baseadas em um business case; agem de tal forma
somente porque acreditam que essa é a forma correta de operação de um negócio.
Ações desse tipo, porém, são vulneráveis, pois estão sujeitas a mudanças de
prioridade do público e da gerência e a ciclos financeiros (EPSTEIN e ROY, 2003).
Mas o que é um business case de sustentabilidade? Ele é o mesmo para
todas as empresas e setores? De acordo com Salzmann, Ionescu-somers e Steger
(2005), o business case não é um argumento único para a sustentabilidade em
todas as empresas; depende de cada uma, do cenário e da indústria em que cada
uma está inserida.
Para um business case claro, os gerentes precisam identificar os objetivos do
desempenho social e os consequentes impactos na lucratividade corporativa a longo
prazo. Mas a identificação e mensuração de estratégias ambientais e sociais não
são simples: como estão ligadas ao longo prazo, existe alto nível de incertezas e
impactos difíceis de serem quantificados (EPSTEIN e ROY, 2003). Salzmann,
Ionescu-somers e Steger (2005) propõem uma abordagem para elaboração de um
business case para a sustentabilidade cujos principais motivadores são: 1) redução
de custo devido à melhoria do desempenho ambiental e de saúde e segurança; 2)
aumento de receitas através de ganho de participação de mercado devido aos novos
produtos ambientalmente amigáveis; e 3) efeitos positivos sobre os intangíveis (valor
da marca, reputação, retenção de talentos, acesso ao capital e gerenciamento de
risco).
Diversos autores propuseram diferentes metodologias para calcular o retorno
envolvido em práticas de sustentabilidade. Yachnin & Associates (2006) propuseram
o sdEffect, iniciativa para integrar considerações de desenvolvimento sustentável em
tomadas de decisão sobre investimentos, focando o isolamento dos efeitos de
1ATeoriadosStakeholdersprocuradescreverquemsãoosstakeholdersdaempresaepropormétodosparaaconsideraçãodo interessede todososenvolvidosna tomadadedecisão.Deacordocoma teoriaeconômicaclássica,o(s)proprietário(s)ouosacionistassãoosúnicosstakeholders.
19
práticas de sustentabilidade corporativa no desempenho da empresa e expressando
tais efeitos em linguagem financeira. Basicamente os autores atribuíram diferentes
medidas financeiras a algumas práticas de sustentabilidade de algumas empresas,
chegando bem próximos de um business case de sustentabilidade.
Outros autores, como Arx e Ziegler (2008), Jacobs, Singhal e Subramanian
(2010) e Cavalcante, Bruni e Costa (2009) usaram o desempenho das ações de
empresas para associar seus desempenhos socioambiental e financeiro. Porém,
esses autores fizeram associações considerando o mesmo período temporal entre
tais desempenhos e é esperado que o retorno financeiro de iniciativas
socioambientais seja de longo prazo. Moore (2001) analisou supermercados do
Reino Unido e encontrou relação negativa entre desempenho socioambiental e
financeiro, também considerando o mesmo período temporal em sua análise.
Encontrou, porém, associação positiva quando analisou o desempenho financeiro
em momento posterior à implementação de iniciativas socioambientais.
Além disso, de acordo com McWilliams e Siegel (2000), um modelo de
avaliação de desempenho de sustentabilidade que não controla investimentos em
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) gera resultados enviesados sobre o
desempenho corporativo. De acordo com os autores, empresas que buscam
desenvolvimento sustentável buscam também uma estratégia de diferenciação, o
que envolve investimentos complementares em P&D.
Além da incerteza na associação entre desempenho socioambiental e
desempenho financeiro, há também incertezas quanto à relação de causalidade
entre eles: sustentabilidade corporativa motiva melhores resultados financeiros ou
melhores resultados financeiros permitem a adoção de práticas de sustentabilidade
corporativa? De acordo com Cavalcante, Bruni e Costa (2009), empresas em
dificuldade geralmente ocupam-se de questões mais imediatas – como geração de
caixa – e não com ações cujo resultado é obtido no longo prazo. Scholtens (2008)
encontrou resultados semelhantes: normalmente o desempenho financeiro precede
o social. No entanto, o autor diz que nem todas as questões ligadas à
sustentabilidade corporativa (envolvimento da comunidade, relacionamento com
colaboradores, diversidade, ambiente e produto) têm a mesma interação com
desempenho financeiro.
20
Por fim, existe a dúvida se a inserção e manutenção da sustentabilidade
corporativa na estratégia das empresas dependem de um cenário econômico
favorável. Alguns estudos foram realizados após a crise econômica de 2008,
sugerindo que as empresas que mantiveram a sustentabilidade na sua estratégia
corporativa tiveram desempenho financeiro melhor que aquelas que não fazem parte
dessa agenda.
Em estudo realizado pela Deloitte Touche Tohmatsu Limited (2009), foi
percebido que 69% das empresas – de um total de 115 analisadas – informaram que
o cenário econômico desfavorável não impactou – ou chegou até a impactar
positivamente – seus investimentos relacionados à sustentabilidade. Mahler, Barker
et. al. (2009) verificaram, a partir da análise do Dow Jones Sustainability Index e do
Goldman Sachs SUSTAIN focuslist, que empresas compromissadas com práticas de
sustentabilidade corporativa tiveram desempenho acima da média no mercado
financeiro durante a crise. Existe, ainda, um sentimento geral de que fatores como
transparência e prestação de contas – princípios básicos da Governança
Corporativa – geram valor econômico nesse cenário e reforçam os laços com as
diversas partes interessadas (LINS, MORENO e LOMONACO, 2009).
2.2. Desafios de sustentabilidade corporativa no setor supermercadista
A empresa Deloitte Touche Tohmatsu Limited, em parceria com a revista
Stores, publicou em 2009 o relatório Global Powers of Retailing, listando os
duzentos e cinquenta maiores varejistas do mundo em 2008, seguindo um critério de
faturamento. A Tabela 1 mostra os quinze maiores que possuem operação de
supermercado, seguidos do brasileiro com o mesmo tipo de operação que aparece
na lista, com seus respectivos faturamentos e taxas de crescimento anuais
compostas (CAGR), considerando o período entre os anos de 2003 e 2008,
inclusive.(BRITO, 2005)(CAVALCANTE, BRUNI e COSTA, 2009)
21
Tabela 1 - Quinze maiores supermercados do mundo e o maior brasileiro, por critério de faturamento2
Fonte: Top 250 Global Retailers 2008, revista Stores (www.stores.org)
De acordo com pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados
(ABRAS, 2010), o setor supermercadista vem crescendo no Brasil. Em relação a
2007, todos os indicadores básicos e absolutos, como faturamento, número de
check-outs3, área de vendas, quantidade de estabelecimentos e número de
funcionários cresceram em 2008, significando o melhor desempenho dos últimos
treze anos. Nesse período, o número de lojas teve incremento de 1,5% em relação
ao ano anterior, o que representa 1.123 novas lojas em valor absoluto (de 74.602
lojas em 2007 para 75.725 em 2008).
Conforme outra pesquisa da mesma instituição (ABRAS, 2010), o número de
check-outs aumentou 2,7% no período, indo de 180.926 em 2007 para 185.889 em
2008. A área de vendas, no entanto, ficou praticamente estagnada (crescimento de 2CAGR=CompoundAnnualGrowthRate,ouÍndicedeCrescimentoAnualComposto3Checkoutéomomentoemqueoclienteencerrasuascompras,pagando‐asnocaixa.
22
0,03%), o que representa preocupação do setor com a prestação de serviço. Tal
disparidade pode ser explicada pela crescente demanda dos consumidores por lojas
compactadas e com bom nível de serviço. Além dos modelos como Zapt Coop e
Extra Fácil, das redes Coop (Cooperativa de Consumo) e Grupo Pão de Açúcar,
respectivamente, têm-se visto muitos casos de lojas que reduzem sua área de
vendas para aproveitá-las melhor, sem fazer o mesmo proporcionalmente com os
check-outs. Há casos, ainda, em que o supermercadista aluga parte de sua área
para outro modelo de comércio complementar ao seu, como loja de construção ou
eletrônicos.
Esse crescimento real do setor no Brasil faz com que ele seja de grande
influência na cultura de gestão brasileira, explicitando, portanto, a importância da
participação dos varejistas em uma agenda de políticas socioambientais (ALIGLERI,
2008).
De acordo com outra pesquisa da mesma Associação (ABRAS, 2009) os
perecíveis (frios, açougue, peixaria e hortifrúti), que vinham ganhando espaço nas
vendas, perderam participação em 2008. O mais provável é que os consumidores
desses produtos estejam migrando para o varejo especializado – como quitandas,
padarias e açougues –, que é um forte concorrente para os supermercados. A
demanda crescente dos consumidores por lojas compactadas e com bom nível de
serviço descrita anteriormente, de modo a oferecer-lhes comodidade, praticidade e
agilidade, também pode explicar essa migração.
As empresas que atuam no varejo talvez sejam as mais próximas dos
consumidores, por serem o elo da cadeia de valor onde termina a produção e o
consumo é iniciado. Por essa razão, estão mais expostas à avaliação dos clientes e
aquelas que apresentarem preocupações socioambientais poderão ser vistas como
comprometidos com a sociedade. Alguns estudos brasileiros indicam essa
tendência, mostrando a evolução da percepção do consumidor em relação ao papel
das empresas (INSTITUTO AKATU, 2006; INSTITUTO ETHOS, 2005)
Por estarem tão próximos dos seus clientes finais, os varejistas têm um
grande poder de influência no dia-a-dia da comunidade onde estão inseridos. Dessa
forma, o varejo deve estar sempre buscando diferenciais para ser reconhecido como
gerador não só de ações corporativas, mas também sociais (LEVY e WEITZ, 2000)
23
(MACEDO, 2005). Além disso, essas empresas podem mudar estruturas sociais,
agindo sobre as duas pontas da cadeia (MACEDO, 2005). Segundo Belman e
Parente (2007), os varejistas têm condições de serem articuladores de iniciativas
comunitárias, portando-se como instrumentos de mobilização social, por
conhecerem bem e estarem inseridos na realidade local.
Oportunidades socioambientais foram identificadas na literatura abordando
diversos aspectos que impactam e beneficiam um grande número de stakeholders,
como mostrado na Tabela 2.
Tabela 2 - Oportunidades socioambientais para o setor varejista
As lojas podem ser vistas como centros de disseminação de valores para a
comunidade, educando o consumidor para o consumo consciente de modo a
melhorar sua qualidade de vida (MACEDO, 2005). Sua operação pode, ainda, ceder
espaço para pequenos produtores locais, estimulando o desenvolvimento da
comunidade, além de disseminar práticas responsáveis pela cadeia de valor através
de parcerias com fornecedores (BELMAN e PARENTE, 2007).
Os colaboradores também podem ser beneficiados por iniciativas
socioambientais. Levy e Weitz (2000) destacam a importância do gerenciamento da
24
diversidade como um fator estratégico, já que as bases étnicas dos clientes do
varejo são cada vez mais diversas. Portanto, para competir no mercado, os
varejistas precisam gerenciar equipes que correspondam à diversidade de seus
mercados-alvo.
Além disso, quanto mais próximo o consumidor está do funcionário, mais
exposto está o varejista para avaliação (PARENTE, 2004). Nesse sentido, é
fundamental que gestores preocupem-se boas condições de trabalho, como
questões ligadas a clima organizacional , segurança no trabalho, igualdade de
oportunidades, política salarial e incentivos (BELMAN e PARENTE, 2007).
Também podem ser encontradas oportunidades na dimensão ambiental.
Belman e Parente (2007) ressaltam a importância do comprometimento dessas
empresas com utilização de embalagens recicláveis, incentivo à prática de coleta
seletiva de lixo, utilização de fontes renováveis de energia e prevenção de
desperdício de recursos naturais.
25
3. Metodologia
3.1. Universo e amostra
Com base na Teoria dos Recursos Excedentes4, foi adotada a premissa de
que os supermercados de grande porte estão mais avançados na inserção da
sustentabilidade em suas estratégias corporativas que os de menor tamanho. Com
isso, era esperado que eles detivessem as melhores práticas do setor em
sustentabilidade corporativa. Partindo dessas premissas, os maiores supermercados
do mundo foram levantados a partir de estudo realizado pela empresa Deloitte em
parceria com a revista Stores (DELOITTE TOUCHE TOHMATSU LIMITED;
STORES, 2009), que levantou os duzentos e cinquenta maiores varejistas do mundo
em 2008 de acordo com seu faturamento.
Para seleção da amostra, o primeiro filtro aplicado foi relacionado a
faturamento: como a dispersão entre o faturamento anual dos varejistas
pertencentes à lista é muito grande (de pouco mais de US$3 bilhões a pouco mais
de US$ 400 bilhões), foram escolhidas as empresas com faturamento maior que
US$50 bilhões anuais, correspondendo aos quatorze primeiros colocados. O
segundo filtro buscou excluir os varejistas que não tinham operação de
supermercado, uma vez que este trabalho tem foco no setor supermercadista. O
terceiro filtro aplicado excluiu as empresas que não divulgavam relatórios de
sustentabilidade, já que as práticas socioambientais deveriam ser buscadas em tal
relatório. A aplicação desses filtros resultou em uma amostra de seis
supermercados.
Por fim, foram incluídos mais três supermercados à lista: Sainsbury, Marks
and Spencer e Grupo Pão de Açúcar. Os dois primeiros (29a e 51a maiores,
respectivamente) foram incluídos por serem os dois supermercados mais bem
avaliados pelo Green to the Core? (ALLDER e YATES, 2009), relatório que avalia os
4Umasdas explicaçõespara aTeoriadosRecursosExcedentes consiste emdizerque empresasque seenvolvememiniciativasdesustentabilidadecorporativaouemoutrosaspectosavançadosdegestãosãoaquelas cujo desempenho financeiro gera um volume de recursos além dos necessários para suprir asnecessidades de curto prazo, possibilitando o comprometimento dos recursos emprojetos ou negóciosnãotradicionaisouusuais.
26
supermercados britânicos – tidos como referência em desenvolvimento sustentável –
de acordo com critérios de sustentabilidade corporativa. O Grupo Pão de Açúcar foi
incluído por ser o primeiro supermercado brasileiro a aparecer na lista, na 92a
posição; por este ser um estudo brasileiro, foi considerada relevante a abordagem
de práticas brasileiras.
Assim, a lista final a ser estudada foi composta de nove supermercados: Wal-
Mart, Carrefour, Tesco, Rewe-Zentral, Auchan, Seven&i, Sainsbury, Marks and
Spencer e Grupo Pão de Açúcar. O processo de escolha dos supermercados está
descrito na Tabela 3.
Tabela 3 - Processo de escolha dos supermercados a serem estudados
* Posição das empresas no ranking Top 250 Global Retailers 2008
27
3.2. Fonte de dados
Os dados usados neste trabalho foram provenientes apenas de fontes
públicas e secundárias.
Como já mencionado, os supermercados foram escolhidos a partir do relatório
Global Powers of Retailing (DELOITTE TOUCHE TOHMATSU LIMITED; STORES,
2009).
Para mapeamento das práticas do setor e sua consequente mensuração, foi
necessário o delineamento das principais questões materiais socioambientais do
setor. O relatório Green to the core? (ALLDER e YATES, 2009) propõe algumas
dessas questões, que foram adaptadas para uso neste trabalho.
A partir das principais questões materiais, foi necessário entender quais as
práticas existentes na fase da cadeia de valor a ser estudada – produção. Para isso,
foi usada a cadeia de valor definida na apresentação Greening Supply Chain in
Retail Sector, feita pelo United Nations Environmental Program (UNEP, 2008).
As práticas em sustentabilidade foram levantadas a partir do relatório de
sustentabilidade publicado por cada varejista em seus websites referentes ao ano de
2008 ou ao ano fiscal 2008/2009:
• Wal-Mart: Wal-Mart 2009 Global Sustainability Report,
• Carrefour: 2008 Sustainability Report,
• Tesco: Corporate Sustainability Report 2009,
• Rewe: Sustainability Report 2008,
• Auchan: Auchan Entreprise Responsable 2008/2009,
• Seven&i: CSR Report,
• Sainsbury: Corporate Responsibility Report 2009,
• Marks & Spencer: How We Do Business Report 2009,
• Grupo Pão de Açúcar: Relatório de Sustentabilidade 2008.
Informações complementares foram obtidas nos websites dos
supermercados, consultados no mês de junho de 2010.
Para diagnosticar os business cases existentes e ranquear as empresas foi
usado o método de Epstein e Roy (2003), enquanto a definição de métricas para a
28
construção de business cases foi inspirado no sdEffect (YACHNIN & ASSOCIATES,
2006), modelo de avaliação financeira de práticas socioambientais, como será visto
no item 3.3.
3.3. Tratamento de dados
3.3.1. Levantamento das práticas socioambientais do setor
Para levantamento das práticas socioambientais, foi necessário alocar as
práticas do setor nas questões materiais.
Como mencionado anteriormente, algumas questões materiais do setor
supermercadista foram adaptadas do relatório Green to the core? (ALLDER e
YATES, 2009). Tal relatório propõe três questões: “Pesca, plantio e pecuária
sustentáveis”, “Mudanças climáticas” e “Gestão de resíduos”. Como as categorias de
alimentos estudadas foram frutas, legumes, verdura e carnes, a questão “Pesca,
plantio e pecuária sustentáveis” foi transformada em “Plantio e pecuária
sustentáveis”.
Na ausência de estudos acadêmicos que propusessem outras questões,
estas foram propostas com base em trabalho de consultoria da Fundação Brasileira
para o Desenvolvimento Sustentável desenvolvido em 2009 e 2010 para um grande
varejista brasileiro. De acordo com esse trabalho, além das questões citadas no
parágrafo anterior, existem algumas que envolvem relacionamento com seres
humanos, ou seja, colaboradores de todas as etapas da cadeia, clientes e
comunidade impactada e outras relacionados à geração de valor econômico para as
empresas, como desenvolvimento de negócios indiretos nas comunidades em torno
da operação, envolvimento das partes interessadas e transparência e prestação de
contas.
Dessa forma, foram consideradas as seguintes questões materiais para o
setor:
• Plantio e pecuária sustentáveis: considera a sustentabilidade das técnicas de
produção e cuidados com os animais;
29
• Mudanças climáticas: considera a redução das emissões de gases de efeito
estufa;
• Gestão de resíduos: considera ações para reduzir, reusar e reciclar;
• Relacionamento com colaboradores: considera políticas trabalhistas e de
relacionamento;
• Comunidade em torno do negócio: considera ações em prol da sociedade;
• Engajamento dos stakeholders: considera programas de educação para a
sustentabilidade.
• Transparência e prestação de contas: considera a divulgação de resultados e
prestação de contas para com todos os stakeholders.
A cadeia de valor do setor varejista (UNEP, 2008), mostrada na Figura 1, foi
adaptada para a construção de uma matriz “etapas da cadeia de valor vs. principais
questões socioambientais do setor”.
Figura 1 - Cadeia de valor do setor varejista (UNEP, 2008)
Nessa adaptação, as etapas da cadeia foram renomeadas, como descrito na
Tabela 4. A matriz gerada está ilustrada na Tabela 5 e foi usada mais adiante no
trabalho para a alocação das iniciativas socioambientais encontradas.
Tabela 4 - Adaptação da cadeia de valor da UNEP (2008)
30
Tabela 5 - Etapas da cadeia de valor vs. principais questões socioambientais do setor supermercadista
3.3.2. Diagnóstico dos business cases de sustentabilidade
O primeiro resultado deste trabalho foi gerado a partir de uma análise inicial
dos supermercados, visando à verificação da quantidade e diversidade de práticas
socioambientais que abordassem as questões materiais do setor.
O segundo resultado foi um diagnóstico das práticas de sustentabilidade,
realizado com auxílio do modelo desenvolvido por Epstein e Roy (2003). Nesse
modelo, os autores buscam verificar como as práticas socioambientais são
relatadas, considerando seu relacionamento com o desempenho financeiro da
empresa. Para isso, classificam cada uma delas em quatro níveis:
• Nível 1: As informações divulgadas são de caráter descritivo, não associadas
ao desempenho financeiro, como, por exemplo, a descrição de um programa
de engajamento de stakeholders;
31
• Nível 2: As informações divulgadas são quantificadas, porém não associadas
ao desempenho financeiro, como, por exemplo, o número de stakeholders
atendidos durante a iniciativa de engajamento e o número de propostas feitas
por eles e aceitas pela empresa;
• Nível 3: As informações divulgadas são monetizadas e referentes a
investimentos e outras despesas; portanto, parcialmente associadas ao
desempenho financeiro, como, por exemplo, a divulgação do investimento
realizado para execução das propostas feitas pelos stakeholders durante a
iniciativa de engajamento;
• Nível 4: As informações são monetizadas e referentes a benefícios dos
investimentos, ou seja, diretamente associadas ao desempenho financeiro,
como, por exemplo, a divulgação do retorno financeiro conseguido pela
empresa a partir dos investimentos realizados para execução das propostas
feitas pelos stakeholders durante a iniciativa de engajamento.
Dessa forma, as informações sobre as práticas socioambientais levantadas
foram classificadas em Nível 1, 2, 3 e 4, conforme as informações disponíveis no
relatórios de sustentabilidade dos supermercados detentores de cada uma.
Assim, foi possível determinar o quão próximo cada supermercado
considerado no estudo está da construção de business cases, passo importante
para a proposição de métricas para a construção de business cases de
sustentabilidade no setor.
3.3.3. Ranqueamento dos supermercados
Foram usados três rankings para avaliar os supermercados de acordo com
suas iniciativas socioambientais relacionadas à etapa de produção da cadeia de
valor: o primeiro considerando a quantidade e diversidade de tais práticas
socioambientais, o segundo considerando a proximidade da prática com o
desempenho financeiro da empresa, e o terceiro considerando tanto quantidade e
diversidade de práticas, quanto associação com o desempenho financeiro.
Como o primeiro dos rankings classifica as empresas somente de acordo com
a quantidade de práticas socioambientais existentes, o levantamento das práticas
32
feito anteriormente foi suficiente para sua construção. Já para o ranking que
considera a associação das práticas com o desempenho financeiro, foi usado o
modelo de Epstein e Roy (2003). Após a alocação de cada informação nos níveis
propostos pelos autores, foi usado um sistema de pesos de 1 a 4 , onde para cada
informação considerada como Nível 1 foi alocado peso 1, para cada informação
considerada como Nível 2 foi alocado peso 2, e assim sucessivamente. A soma da
quantidade de informações encontradas nos relatórios divulgados pelas empresas,
multiplicadas pelo peso alocado a cada uma delas, gerou um resultado para cada
prática que, somados, geraram um resultado para a empresa. Como esse resultado
favorece as empresas com maior número de práticas e, nesse momento, o objetivo
foi analisar somente a qualidade das informações, o resultado de cada empresa foi
dividido pelo seu número de práticas. Esse cálculo está exposto na Tabela 6.
Tabela 6 - Método para avaliação dos supermercados, considerando qualidade da informação divulgada
Para composição do último ranking, que visa à análise de ambas as questões
anteriores, foi usado o mesmo cálculo do ranking anterior, mas sem dividir o
resultado da empresa pelo número de práticas, como mostrado na Tabela 7. Dessa
forma, os supermercados foram avaliados considerando não só o número de
iniciativas socioambientais que detêm, mas também quanto ao nível de informação
divulgada e a proximidade de cada uma de um business case.
Tabela 7 - Método para avaliação dos supermercados, considerando número de práticas e qualidade da informação divulgada
33
3.3.4. Elaboração de métricas financeiras para a construção de business cases de sustentabilidade
Conforme as práticas socioambientais foram levantadas, percebeu-se que
muitas delas são muito semelhantes. Para facilitar a elaboração e a aplicação das
métricas para construção de business cases de sustentabilidade, as práticas
selecionadas foram consolidadas em nove “práticas genéricas”, usando critérios de
semelhança, tais como objetivo final e descrição fornecida nos relatórios de
sustentabilidade. As informações disponíveis em cada prática foram, então,
alocadas nas práticas genéricas.
Para determinação das métricas necessárias à construção de business cases
para cada prática genérica, foi usado como base o modelo sdEffect (YACHNIN &
ASSOCIATES, 2006). Os autores do método defendem que para identificar a
influência de práticas socioambientais no desempenho financeiro, seus efeitos
precisam ser isolados de outras variáveis do negócio e expressados em termos
quantitativos e financeiros. Para realizar tal medição no setor canadense de
mineração, seguiram os seguintes passos:
• Identificar métricas predispostas a serem traduzidas para avaliação
financeira;
• Traduzir tais métricas em avaliação financeira, empregando cinco técnicas
usuais de avaliação: análise de índice financeiro, fluxo de caixa descontado,
“regra de bolso”, método do valor adicionado e precificação de opções;
• Isolar o valor financeiro que a medida socioambiental adicionou ao valor total
da empresa.
Na adaptação do método acima, os dois primeiros passos propostos pelos
autores foram explorados em profundidade, enquanto o último passo foi usado para
uma proposição preliminar de construção de business case de sustentabilidade.
Além disso, somente a técnica de avaliação financeira de fluxo de caixa descontado
foi utilizada, por ser o mais usado e consagrado modelo existente para avaliação
financeira.
34
3.4. Limitação do método
O principal limitador da pesquisa foi o uso de informações públicas, sem que
fosse verificado se as empresas realmente praticam o que divulgam.
Além disso, a classificação das informações levantadas nos níveis propostos
pelo modelo de Epstein e Roy (2003) foi realizada a partir de julgamento da
pesquisadora. O mesmo aconteceu durante a seleção dos principais fatores que
compõem as métricas necessárias para construção de business cases.
35
4. Resultados
4.1. Levantamento e alocação das práticas socioambientais do setor
As práticas de sustentabilidade corporativa foram localizadas e alocadas nos
quadrantes da matriz “etapas da cadeia de valor vs. principais questões
socioambientais do setor”. As interseções marcadas da Tabela 8 ilustram a
existência de tais práticas, listadas na Tabela 9. A descrição completa das práticas
encontra-se nos Apêndices 1 a 9 deste trabalho.
Tabela 8 - Etapas da cadeia de valor vs. principais questões socioambientais do setor supermercadista e interseções onde existem práticas de sustentabilidade corporativa
36
Tabela 9 - Práticas socioambientais dos supermercados pesquisados referentes à etapa de produção5
Somente foram encontradas práticas que abordassem as questões de plantio
e pecuária sustentáveis e comunidade em torno do negócio. É importante ressaltar
que somente foram analisadas práticas referentes à etapa de produção da cadeia de
valor e não é possível afirmar que não existem práticas relacionadas a outras etapas
da cadeia que abordem outras questões.
Não foram encontradas práticas que abordassem questões de
relacionamento com colaboradores e clientes. Isso parece fazer sentido, dado que
5Adescriçãocompletadaspráticasencontram‐senosApêndices1a9.
37
colaboradores são atores da etapa de comercialização e clientes das etapas de
comercialização e pós consumo.
4.2. Diagnóstico dos business cases de sustentabilidade
As informações disponíveis nos relatórios de sustentabilidade referentes às
práticas socioambientais dos supermercados estudados foram levantadas e
alocadas nos níveis propostos por Epstein e Roy (2003). Os Apêndices 1 a 9
mostram a descrição detalhada de cada informação divulgada, bem como sua
classificação quanto aos níveis. A Tabela 10 expõe a consolidação da classificação
quanto aos níveis, indicando o número de informações disponíveis de cada prática
referente a cada nível.
Tabela 10 - Práticas socioambientais dos supermercados e número de informações divulgadas, classificadas quanto aos níveis de Epstein e Roy (2003)
38
39
A partir dessa primeira análise, pode ser verificado o quão distante os
supermercados estão da construção de business cases de sustentabilidade, já que
nenhum deles possui práticas com Nível 4 de informação divulgada. Além disso,
ainda existem muitas práticas que só divulgam informação de Nível 1 (quatorze, das
trinta e sete práticas selecionadas, ou 38%), ou seja, apenas informações
descritivas.
Apesar de existir um movimento em direção à quantificação dos resultados
(vinte e duas práticas divulgam informação de Nível 2, ou 59% do total de práticas),
existe pouco movimento em direção à sua monetização, já que apenas 19% (ou sete
práticas) divulgam informações de Nível 3 – nível em que alguma monetização
referente a investimentos e/ou retornos já é realizada. Isso pode significar que:
• a área socioambiental dessas empresas está distante de sua área financeira,
e/ou
• o público-alvo do relatório divulgado não contempla o mercado financeiro,
e/ou entidades interessadas no desempenho financeiro das empresas, e/ou
• o redator-chefe do relatório não é alguém que entende a integração entre as
áreas da empresa.
A Tabela 11 mostra que existe alguma divergência entre o nível de
informação das práticas quando alocadas de acordo com as questões materiais que
abordam. Três das quinze práticas que abordam a questão “comunidade em torno
do negócio” (20%) só divulgam informação de Nível 1, enquanto dez das vinte e
duas práticas que abordam a questão “plantio e pecuária sustentáveis” (45%) só
divulgam informação desse mesmo Nível. Assim, em relação à proximidade de
construção de business cases, parece que as práticas que abordam a questão
material “plantio e pecuária sustentáveis” estão mais distantes de ter seu valor
financeiro mensurado que as práticas que abordam a questão “comunidade em
torno do negócio”.
40
Tabela 11 - Classificação das informações, alocando as práticas de acordo com a questão material
Quando se trata de quantificação de resultados, também existe alguma
divergência quando as práticas são alocadas por questão: 67% das práticas
relacionadas à questão “comunidade em torno do negócio” e 54% das práticas
relacionadas à questão “plantio e pecuária sustentáveis” divulgam informação de
Nível 2. O mesmo acontece quando se trata da monetização de resultados: 27% das
práticas relacionadas à questão “comunidade em torno do negócio” e 14% das
práticas relacionadas à questão “plantio e pecuária sustentáveis” divulgam
informação de Nível 3.
De forma geral, apesar de existirem mais práticas que abordem a questão
“plantio e pecuária sustentáveis” (vinte e duas) que as que abordam a questão
“comunidade em torno do negócio” (quinze), foi possível observar que as práticas
que abordam esta última questão estão mais próximas de tornarem-se business
cases de sustentabilidade que aquelas que abordam a primeira, já que possuem
mais informação de Níveis 2 e 3. Além disso, existem menos práticas que abordam
a questão “comunidade em torno do negócio” que só divulgam informação de Nível
1.
4.3. Ranqueamento dos supermercados
4.3.1. Ranqueamento por quantidade de práticas socioambientais
A partir do levantamento das práticas socioambientais dos supermercados
analisados foi possível construir o primeiro ranking entre eles, baseado na
quantidade de práticas de cada um, como mostrado na Tabela 12.
41
Tabela 12 - Ranqueamento dos supermercados, considerando a quantidade de práticas socioambientais
Esse ranking mostra o Marks and Spencer, o 51o maior varejista do mundo,
na primeira posição e o Groupe Auchan, o 13o maior do mundo, na última posição.
Além disso, alguns dos maiores varejistas do mundo ocupam as primeiras posições
do ranking, como Wal-Mart e Rewe, enquanto outros menores ocupam as últimas
posições, como Grupo Pão de Açúcar. Parece, portanto, que não é possível inferir
relação entre o tamanho do supermercado – quando usado critério de faturamento –
e a quantidade de iniciativas socioambientais praticadas. É possível, porém, dizer
que os primeiros colocados podem ser consultados em caso de necessidade de se
verificar o que é feito no setor atualmente quando se trata de iniciativas
socioambientais que envolvem a etapa de produção.
4.3.2. Ranqueamento por associação com o desempenho financeiro das informações divulgadas referentes às iniciativas socioambientais
Para verificar a qualidade das informações referentes às práticas
socioambientais dos supermercados divulgadas nos relatórios de sustentabilidade,
considerando critério de proximidade de mensuração do valor econômico gerado por
elas, foi utilizada uma ponderação para os Níveis de Epstein e Roy (2003). Como já
mencionado, o resultado da ponderação de cada supermercado foi dividido pelo
número de iniciativas que praticam para evitar o beneficiamento daqueles com maior
número de práticas.
42
O cálculo detalhado dos resultados desta etapa encontram-se no Apêndice 10
e o ranqueamento na Tabela 13.
Tabela 13 - Ranqueamento referente à associação com o desempenho financeiro das informações das práticas socioambientais
Verifica-se que o supermercado que melhor divulga informações associadas
ao desempenho financeiro é o Wal-Mart, o 2o lugar em número de práticas. O
Carrefour, Seven&i e Grupo Pão de Açúcar, que dividiam a 6a posição no ranking
anterior, praticamente dividem a 3a posição neste ranking, diferença considerável, já
que os rankings são compostos de apenas nove posições. O Marks and Spencer,
que ocupava a 1a posição, ocupa agora a 6a e o Rewe, que ocupava a 3a, ocupa
agora a 8a. O Groupe Auchan foi o único supermercado a manter-se na mesma
posição, a última.
Dessa forma, não foi possível observar relação entre o número de iniciativas
socioambientais praticadas pelos supermercados e a qualidade de informações
divulgadas associadas a tais práticas. Foi possível, ainda, concluir que os relatórios
de sustentabilidade de Wal-Mart e Carrefour devem ser consultados em caso de
necessidade de verificação das práticas referentes à etapa de produção mais bem
associadas ao desempenho financeiro corporativo.
43
4.3.3. Ranqueamento por quantidade de práticas e qualidades das informações associadas
Sabendo quais os supermercados que mais possuem práticas
socioambientais e quais melhores divulgam as informações referentes a elas, foi
elaborado um terceiro ranking, visando à avaliação das empresas considerando os
dois critérios anteriores: quantidade e qualidade. Para isso, foi utilizado o cálculo do
ranking anterior, exceto a última etapa do cálculo: a divisão da pontuação pelo
número de práticas. Esse cálculo está disposto na Apêndice 11 e o ranqueamento
na Tabela 14.
Tabela 14 - Ranqueamento combinando a quantidade de práticas socioambientais dos supermercados com o grau de associação ao desempenho financeiro corporativo
Nesse ranqueamento, o Wal-Mart volta a aparecer em 1o lugar, consolidando-
se como o detentor do maior número de práticas e das mais bem divulgadas no
setor atualmente. Da mesma forma, o Groupe Auchan volta a vigorar na última
posição, sendo considerado o pior dos supermercados analisados em relação a
práticas de sustentabilidade relacionadas à etapa de produção do setor e sua
divulgação.
Todos os outros supermercados tiveram suas posições dos rankings
anteriores alteradas, o que era esperado, dado que os dois critérios – distintos entre
si – foram usados para a composição desse ranking.
44
Foi possível concluir que Wal-Mart, seguido de Marks and Spencer e
Carrefour podem ser considerados como referências quando da necessidade de
avaliação das práticas socioambientais – considerando quantidade de iniciativas e
associação com o desempenho financeiro corporativo.
4.3.4. Consolidação dos rankings por questão material abordada
As pontuações calculadas para composição dos três rankings anteriores
foram separadas seguindo a questão material que abordam, como mostrado na
Tabela 15.
Tabela 15 - Consolidação das pontuações segundo a questão material abordada
Foi possível perceber que existem mais práticas que abordam a questão
“plantio e pecuária sustentáveis” que práticas que abordam a questão “comunidade
em torno do negócio”. Porém, ao analisar a associação das práticas com o
desempenho financeiro corporativo, percebeu-se que as práticas que abordam essa
última questão trazem informação de maior proximidade com desempenho
financeiro que as práticas que abordam a primeira. Esse resultado é coerente com o
diagnóstico realizado, em que foi concluído que as práticas relacionadas à questão
“comunidade em torno do negócio” estão mais próximas de um business case que
aquelas relacionadas à questão “plantio e pecuária sustentáveis”.
Apesar de estarem menos próximas da mensuração do valor econômico
gerado por sua implementação, as práticas relacionadas à questão “plantio e
pecuária sustentáveis” ficaram mais bem colocadas quando considerados tanto
critérios de quantidade de práticas, quanto de associação com desempenho
financeiro corporativo.
45
4.4. Elaboração de métricas financeiras para a construção de business
cases de sustentabilidade
4.4.1. Consolidação das práticas socioambientais existentes em práticas genéricas e determinação das métricas existentes
As práticas específicas foram consolidadas em nove práticas genéricas
considerando a semelhança entre elas, sendo seis relacionadas à questão material
“plantio e pecuária sustentáveis” e três relacionadas à questão “comunidade em
torno do negócio”, como mostrado na Tabela 16.
46
Tabela 16 - Consolidação das práticas socioambientais dos supermercados em práticas genéricas
47
As informações disponíveis nas práticas socioambientais levantadas foram,
então, alocadas nas práticas genéricas, como mostrado na Tabela 17. A descrição
dos programas não foi incluída na tabela como informação disponível, já que todas
as práticas analisadas trazem esse tipo de informação de Nível 1.
Tabela 17 - Informações presentes nas práticas genéricas
48
49
* Práticas pertencentes à questão Plantio e pecuária sustentáveis
** Práticas pertencentes à questão Comunidade em torno do negócio
Quando as informações foram separadas segundo os níveis e alocadas nas
prática genéricas a que correspondem, foi percebido que estão relativamente bem
distribuídas pelas práticas, ou seja, não existe concentração de informações de um
certo nível em alguma prática.
4.4.2. Definição das métricas necessárias à construção de business case
A partir da descrição das práticas socioambientais, foram definidos os
benefícios esperados com sua implementação para os produtores, tais como:
aumento de produtividade, aumento de lucratividade, aumento do volume de
vendas, aumento do preço de venda, diferenciação no mercado e entrada no
mercado. Esses benefícios geram consequências positivas para os varejistas, como:
melhoria de imagem, diminuição do preço de compra, aumento do volume de
vendas, diferenciação no mercado e diminuição do custo de transporte6. Os
benefícios para ambas as partes estão ilustrados na Tabela 18.
6 Outro potencial benefício para o produtor e para o varejista seria a diminuição do risco que, porexemplo, poderia gerar a redução do custo de capital (WACC). O tratamento desse tópico exigiria umaextensãodaabordagemconceitualdapesquisa,comoaprofundamentoemumcampoespecíficodateoriafinanceira.
50
Tabela 18 - Descrição das práticas genéricas, com os respectivos benefícios esperados para o produtor e varejista, a transformação dos benefícios para o varejista em métricas financeiras e o
investimento requerido para sua implementação
* Práticas pertencentes à questão Plantio e pecuária sustentáveis
** Práticas pertencentes à questão Comunidade em torno do negócio
Os benefícios esperados para o varejista foram, então, transformados em
métricas de avaliação financeira, que dizem respeito a aumento da margem e/ou a
aumento da receita de vendas, como mostrado na Tabela 18. As iniciativas que
implicam em redução de custo para o varejista poderiam ser transformadas em
aumento de margem ou em redução do preço de venda e consequente aumento do
51
volume de vendas. Em função da diversidade de produtos e fornecedores, foi
assumido que os ganhos em negociação com fornecedores não seriam repassados
a clientes, fazendo com que somente a métrica relacionada ao aumento da margem
tenha sido considerada.
Além dos benefícios que geram, as práticas demandam algum investimento
por parte do produtor e/ou por parte do varejista. Como este trabalho tem foco na
geração de valor econômico para o varejista e os investimentos das duas partes
envolvidas são independentes, foi considerado somente o investimento requerido
para o varejista, como mostrado na Tabela 18, que pode ser voltado para pesquisa e
desenvolvimento ou para melhoria do processo de produção. Investimentos no
processo de produção são, em regra, dispêndios de responsabilidade do produtor,
exceto na prática relacionada à rastreabilidade dos produtos. Nessa prática, já que
não é esperado nenhum benefício direto para o fornecedor, não é esperado que ele
tenha despesas com a implementação.
É esperado que todas as práticas estudadas gerem benefícios aos varejistas,
apesar de nem todas gerarem benefícios aos produtores.
4.4.3. Proposição de modelo para a construção de business case
Tendo definidos os retornos esperados e os investimentos requeridos, foi
preciso determinar os indicadores de gestão necessários para sua mensuração, ou
seja, para a construção do business case, como mostrado na Tabela 19. Os
indicadores relacionados a retorno foram construídos de forma a permitir
comparação temporal, ou seja, o benefício será a diferença entre o momento
posterior à implementação da prática e o momento anterior a ela.
52
Tabela 19 - Tradução das métricas de avaliação financeira em indicadores de gestão
Não foram considerados indicadores referentes a marcas próprias, uma vez
que os supermercados foram estudados como varejistas, não como produtores.
Para aplicação do método de fluxo de caixa descontado, será necessário
determinar o horizonte de tempo dos projetos e dos investimentos requeridos, além
do tempo necessário para que o projeto comece a dar retorno financeiro, que irão
variar em cada prática e em cada empresa. Por fim, o custo médio ponderado de
capital, que também deverá ser estimado para o setor, não foi calculado neste
estudo, já que foram tratadas empresas sob riscos e legislações diferentes (de
diferentes nacionalidades e com operação em diferentes países).
Sabendo as variáveis que constroem o modelo, o método do fluxo de caixa
descontado poderá ser aplicado nos supermercados que esperam criar business
cases para as práticas socioambientais relacionadas à etapa de produção do setor.
53
O valor presente líquido do projeto (VPL) é o valor adicionado à empresa a partir da
implementação das práticas em questão.
54
5. Conclusão
Este estudo analisou as práticas socioambientais de produção de grandes
supermercados a partir de relatórios de sustentabilidade divulgados. Teve como
objetivo responder a três perguntas.
A primeira delas visava a saber se o nível de informação sobre iniciativas
socioambientais existente é suficiente para a construção de business cases de
sustentabilidade no setor. Como visto, a resposta para essa pergunta é não.
Existem, sim, elementos para a sua construção. Foram encontradas muitas
informações operacionais que não são, porém, trabalhadas até o nível estratégico-
financeiro. Isso mostra que, no setor de supermercados, ainda é necessário maior
aproximação entre as gestões financeira e socioambiental. A falta de aproximação
entre essas duas áreas demonstra um sistema de informações gerenciais deficiente,
com bastante espaço para melhoria.
Durante a análise das informações também foi percebido que as empresas
analisadas valorizam a divulgação dos benefícios gerados não só para elas, quanto
também para o fornecedores. Esse é um ponto positivo dos relatórios de
sustentabilidade, já que as iniciativas visam a um “ganha-ganha” entre fornecedores
e varejistas. O negócio sustentável, contudo, não é justificado para nenhuma das
partes, o que é fundamental para a disseminação da sustentabilidade corporativa no
setor.
Nesse sentido, o engajamento dos produtores é etapa fundamental no
processo de transformação da operação dos supermercados em negócio
sustentável. Por esse motivo, é recomendado que os supermercados iniciem a
melhoria de sua gestão para a sustentabilidade por meio de iniciativas de promoção
de práticas sustentáveis, trabalhando em conjunto com fornecedores para a
disseminação de tais práticas. Diversas iniciativas geram aumento de produtividade
e, consequentemente, aumento de lucratividade dos fornecedores, mas as voltadas
à promoção de práticas sustentáveis, além do benefício mencionado, geram
mudanças na estratégia central dos produtores, inserindo a sustentabilidade na
tomada de decisão e abrindo caminho para a implementação das demais práticas.
55
A segunda pergunta deste trabalho visava a responder qual o supermercado
que detém o maior número de práticas socioambientais, qual melhor divulga as
informações relacionadas às práticas e qual tem a melhor combinação de
quantidade de práticas e qualidade de informações associadas. Foram elaborados
três rankings: o primeiro em relação à quantidade de práticas de cada um, o
segundo em relação à qualidade das informações divulgadas e sua proximidade
com a construção de business cases, e o terceiro como uma consolidação dos dois
primeiros, ou seja, considerando quantidade de práticas e qualidade de informações.
O Wal-Mart foi o maior destaque dos rankings, aparecendo em segundo lugar
no primeiro e em primeiro lugar no segundo e no terceiro ranking. Esse
supermercado é, portanto, recomendado como benchmark para os que desejem
melhorar sua gestão para a sustentabilidade, assim como aqueles que queiram
melhorar a qualidade das informações divulgadas. É importante ressaltar, no
entanto, que, mesmo o Wal-Mart, ainda não divulga business cases de
sustentabilidade. O Marks and Spencer alcançou a primeira posição no ranking
referente à quantidade de práticas, sendo, por isso, recomendado como benchmark
de melhores práticas do setor. É importante ressaltar que este trabalho se limitou a
avaliar a qualidade da informação divulgada pela empresa, não sua operação.
A última pergunta deste estudo visava à proposição de métricas para
construção de business cases de sustentabilidade no setor, considerando as
práticas que envolvem os fornecedores de alimentos.
Ao analisar as práticas para diagnosticar o momento em que os
supermercados se encontram em relação à sustentabilidade corporativa e para
elaboração dos rankings supracitados, foram percebidos alguns value drivers.
Alguns indicadores de gestão foram encontrados – informações de Nível 2, segundo
o modelo de Epstein e Roy (2003) –, porém não suficientes para a elaboração de
business cases, mesmo que combinados.
A proposição de tais métricas surgiu, então, a partir da percepção dos
benefícios esperados para o produtor, que inicia o ciclo virtuoso de geração e
preservação de valor econômico. Tais benefícios, geram outros para o varejista, que
foram transformados em métricas financeiras e que, por sua vez, foram
transformadas em indicadores de gestão.
56
Os indicadores propostos, no entanto, ainda são de nível gerencial. Novos
estudos seriam necessários para seu desmembramento em indicadores
operacionais. Já é possível, porém, a partir do modelo proposto, ter um ensaio
preliminar de avaliação financeira das práticas socioambientais e, com isso, de
incremento do valor da empresa a partir da inserção de tais práticas. Isso pode ser
encarado como fonte de aperfeiçoamento do sistema de informações gerenciais das
empresas, que é a base de geração de valor corporativo.
Além de responder às perguntas propostas, ao perceber que a maioria das
informações divulgadas pelos supermercados em seus relatórios de sustentabilidade
não são suficientes para a construção de business cases, este trabalho pode
também verificar que esses relatórios apresentam deficiências quanto à sua
materialidade.
As informações de Nível 1 e 2 representam a grande maioria das divulgadas.
Informações de Nível 1, como visto anteriormente, não trazem quantificação alguma
de resultado. Mesmo que informações de Nível 2 já signifiquem alguma
quantificação de resultados, ou seja, podem servir como base para a construção de
justificativas de negócio, não são suficientes para tal, dado que tal quantificação não
está associada ao desempenho financeiro da prática. Além disso, foi constatado que
grande parte diz respeito ao benefício gerado para o produtor e não para o varejista.
Quanto às informações de Nível 3 (monetizadas) divulgadas, a maioria trata
somente de receita com a venda dos produtos envolvidos na prática em questão e
apenas uma traz o investimento requerido. Essas duas informações, porém, mesmo
que combinadas, não são suficientes para a construção de business cases.
Os relatórios de sustentabilidade não parecem ter como público-alvo a
comunidade financeira, ou seja, investidores e analistas, já que não têm como
intenção mostrar o valor econômico gerado para as empresas a partir da inserção
das práticas socioambientais, o que pode justificar a deficiência em sua
materialidade. Uma mudança no conceito de que esses relatórios são escritos
somente para comunidades envolvidas no negócio, clientes e terceiro setor é de
fundamental importância para que o mercado financeiro comece a enxergar valor
nas empresas que visam ao desenvolvimento sustentável e estão focadas no tripé
da sustentabilidade.
57
Para que isso comece a ocorrer, é preciso que a equipe de redação não
esteja presa à área funcional de sustentabilidade da empresa e nem direcionada a
apenas responder perguntas propostas por algumas diretrizes de elaboração de
relatórios. A submissão do relatório à revisão por diferentes áreas de negócio e até
pela Diretoria Executiva e Pelo Conselho de Administração pode ser o gatilho para
geração de debates e uma consequente melhoria nas informações divulgadas.
58
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61
APÊNDICES
Apêndice 1 – Práticas do Wal-Mart, informações divulgadas e classificação das informações
62
Apêndice 2 – Práticas do Carrefour, informações divulgadas e classificação das informações
Apêndice 3 – Práticas do Tesco, informações divulgadas e classificação das informações
63
Apêndice 4 – Práticas do Rewe, informações divulgadas e classificação das informações
Apêndice 5 – Práticas do Auchan, informações divulgadas e classificação das informações
Apêndice 6 – Práticas do Seven&i, informações divulgadas e classificação das informações
64
Apêndice 7 – Práticas do Sainsbury, informações divulgadas e classificação das informações
Apêndice 8 – Práticas do Marks and Spencer, informações divulgadas e classificação das
informações
65
Apêndice 9 – Práticas do Grupo Pão de Açúcar, informações divulgadas e classificação das
informações
66
Apêndice 10 – Cálculos para a composição do ranking referente à proximidade das informações das
práticas socioambientais de um business case
67
Apêndice 11 – Cálculos para a composição do ranking que considera quantidade de práticas e
qualidade das informações a elas associadas