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7/21/2019 Friedman, Milton Metodologia Da Economia Positiva Friedman
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EDJ(;OES MUL11PUC
Vol. 1,N! 3, Fevereiro,1981
John Neville Keynes, em seu adminivel The Scope and Method of Political
Economy, distingue "uma ciencia positiva ... ( , ) corpo sistematizado de conheci-
mentos relatlvos ao que e, de uma ciencia normativa, ou reguladora, ... ( , ) corpo
sistematizado de conhecimentos em que se analisam criterios acerca do que devia
ser e de uma arte ... ( , ) sistema de regras para a consecuyll'o de urn determinado
objetivo"; observa que "a confusll'o entre elas e comum e tern sido a fonte de nume-
rosos erros serios" e lembra a importancia de "reconhecer uma ciencia positiva au-
tonoma da economia politic a" . ( 1 )
o presente artigo volta-se principalmente para certos problemas de caratermetodol6gico, manifestos quando se constr6i a "cic~nciapositiva autonoma" recla-
mada por Keynes, e focaliza, em particular, a questll'o de como proceder a fim de
decidir se uma hip6tese ou uma teoria deve ser aceita, ainda que provisoriamente,
como parte do "corpo sistematizado de conhecimentos relativos ao que e". Toda-
via, a confusll'o deplorada por Keynes ainda se manifesta com frequencia e impede
notar que a econornia pode ser - e em parte I S - uma ciencia positiva, de modo que
Acrescentei, no presente artigo, sem alusoes espec{ficas, a maior parte de meu breve "Co-
mentario", que apareceu em Survey of Contemporary Economics, Vol. II (B.F. Haley, organi-
zador) (Chicago, Richard D. Irwin, Inc., 1952), pp. 455-57 .
. Agrade~o, pois muito me ajudaram, os comentarlos e cr{ticas feitos por Dorothy S.
Brady, Arthur F. Burns e George J.Stigler.
(1)
(tondles, Macmillan &Co., 1891), pp. 34-35 e 46.
Original: "The Methodology of Positive Economics"
Reprinted from Essays in Positive Economics by Milton Friedman by permission of
The University of Chicago Press. Copyright 1953by the University of Chicago.Tradu~o: Leonidas Hegenberg.
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parece oportuno prefaciar 0 artigo, juntando-lhe algumas observa~{'les a prop6sito
da rela~ao que vige entre econornia positiva e econornia normativa.
I - A RELA
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pode vir a ser uma ciencia "objetiva", exatamente como qualquer das ciencias fisi-
cas. 0 fato de a economia considerat interrela~aes entre seres human os e de 0pes-
quisador ser ele mesmo (de modo muito mais claro do que acontece nas ciencias fl
sicas), parte do assunto investigado, geram, como e obvio, dificuldades especiais,
quando se cogita de alcan~ar objetividade; entretanto, esses fatos tamMm dll'o, aos
cientistas sociais, certas classes de dados que nll'o estll'o ao dispor dos estudiosos
que se voltam para as ciencias fisicas. Nem urn nertl outro desses dois itens, porem,
permite, no meu entender, que se fa~a uma distin~ao basica entre os dois grupos de
ciencias. ( 1 )
A economia normativa e a arte da economia, por sua vez, nlio podem ser in-
dependentes da economia positiva. Qualquer concluslio rela'tiva a diretrizes apoia-se,
obrigatoriamente, em uma previslio em tomo das conseqiiencias de proceder-se deuma forma e nlio de outra, previslio essa que precisa assentar-se - explicita ou im-
plicitamente - na economia positiva. Nao existe, e claro, uma rela~ao um-a-um
entre as conclusaes relativas a diretriJ:es a seguir e as conclusaes da economia positi-
va; se uma tal rela~lio biunivoca existisse,nlio have ria lugar para uma ciencia norma-
tiva autonoma. Duas pessoas podem concordar a respeito das conseqiiencias de uma
legisla~ll'o especifica qualquer. Contudo, uma dessas pessoas pode achar que tais
conseqiiencias slio desejaveis, inclinando-se, pois, a aceitar a lei, ao passo que a ou-
tra,julgando inaceitaveis aquelas conseqiiencias, pode deliberar opor-se a ela.
Atrevo,me a dizer, entretanto, que, presentemente, no mundo ocidentale, demodo especifico, nos Estados Unidos da America, as divergencias, entre cidadll'os
imparciais, sobre as diretrizes economicas, derivam muito mais das diferen~as nas
previsoes relativas as consequencias economicas de uma a~lio - diferen~as que serll'o
eliminadas pelo processo da economia positiva - do que de uma fundamental diver-
sific~ao dos valores. basicos - diversifica~ao em tomo da qual os homens, em Ulti-
ma analise, so podem lutar. Exemplo claro e nao destituido de importancia eo da
legisla~ll'o a pro,posito dos sallirios rninimos. Sob a ampla quantidade de argumentos
em favor e contra essa legisla~ao esta a ideia geral de flxar urn "salario vital" para
todos - segundo a terminologia ambigua que freqiientemente se usa ao discutir a
questll'o. As diversas opiniaes assentam-se largamente em uma diferen~a, explicita
(1)
A intera~ao entre 0observador e 0processo observado, que e tao marcante caracter{stica dasciencias sociais, possui, a par de urn paralelo obvio, nas ciencias fisicas, uma contraparte mais
sutil no principio da indetermina~ao, que resulta da intera~ao entre 0processo de mensura~o e
o fenomeno que se procura medir. Esses dois elementos possuem, ainda, uma contraparte na
16gica, a saber, 0teorema de Codel, segundo 0quale impossivel construir uma logica abrangen-te e auto""luficiente. Esta em aberto a questao de saber se todos os tIes elementos podem ser
vistos como formula~es diversas de urn principio de generalidade ainda maior.
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ou impli~ita, no que conceme a s previsGes. relativas a eficacia desse particular modode alcan~ar 0 objetivo desejado. Quem apoia a lei acredita (preve) que os sahirios
minimos legais diminuem a pobreza pois elevam os vencimentos de pessoas que re-
cebem menos do que 0sahirio minima, assim como os vencimentos de algumas pes-
soas que recebem mais do que esse minimo, sem provocar aumento do mlmero de
pessoas desempr~gadas ou com empregos piores do que os empregos que teriam sem
a lei. Quem se op~e a lei acredita (Preve) que os salarios minimos legais aumentam a
pobreza pois elevam 0mlmero de pessoas desempregadas ou com empregos piores e
isso contrabalan~a, e muito, qualquer efeito favoravel que a lei poderia ter sobre os
sahirios de pessoas que viessem a manter seus empregos. Acordo quanta as conse-
qiiencias economicas de uma lei nao precisa, obrigatoriamente, corresponder a
completo acordo a respeito da sua desejabilidade, pois
e perfeitamente possivel
haver diferen~as remanescentes no que conceme as suas conseqiiencias politicas ou
sociais. Todavia, existindo acordo em tomo dos objetivos, ter-se-a dado urn largo
passo em dire~ao ao consenso.
Diferen~as intimamente associadas, na analise positiva, esta'o nos alicerces de
concep~~es divergentes a proposito do papel e da posi~ao dos sindicatos e a prop6-
sito da desejabilidade dos con troles qiretos de pre~os e sallirios e das tarifas. Dife-
rentes previsoes acerca da importancia das assim chamadas "economias de escala"
explicam, amplamente, as concep~oes divergentes a respeito da desejabilidade ou da
necessidade de haver pormenorizada regulamenta~ao govemamental da industria ede haver preferencia pelo socialismo em vez da a~l[o das empresas privadas. Essa
lista poderia ser indefinidamente prolongada. ( 1 ) Meu juizo de que as principais
diferen~as em tomo de praticas economicas, no mundo ocidental, SaDdesse genero,
e , naturalmente, ele mesmo, urn enunciado "positivo", a ser aceito O U rejeitado combase na evidencia empirica.
( 1)
Exemplo de maior complexidade e 0das diretrizes de estabiliza\(ao. A urn primeiro olhar, con-cep~oes divergentes a respeito desse problema parecem refletir diferen~as nos objetivos colima-
dos. Acredito, porem, que essa prirneira impressao e desnorteadora e que, fundamentalmente, as
concep~oes divergentes refletem, principalmente, jUlzos diversificados a propOsito da fonte de
flutua~oes, na atividade economica, e do efeito de uma a~o alternativa, contraciclica. Para
examinar uma importante considera~o que explica boa parte da controversia, ver "The Effects
of a Full-Employment Policy on Economic Stabilitiy. A Formal Analysis", infra, pp. 117 -32.
Urn summo da atual posi~o das concep~oes dos profissionais que examinam 0assunto se en-
contra em "The Problem of Economic Instability", relatorio de subcomissao do "Committee on
Public Issues':, da American Economic Association, American Economic Review, XI (setembro
de 1950),501-38.
N.T.: nesta e em outras notas, quando 0Autor diz infra, refere-se a trechos que figuram nas
demais partes (II, III e IV) de seu livro ESSAYS IN POSITIVE ECONOMICS (Chicago Press,1953,edi~ao Phoenix, de 1966),cuja parte I, Introdu~ao, pp. 3-43, esta aqui traduzida.
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Se meu juizo e valida, isso quer dizer que urn consenso acerca de diretrizes
"corretas", no campo Economico, depende muito menos do progresso da Econornia
normativa, propriamente dita, do que do progresso de uma Economia positiva capaz
de conduzir a conclusoes que sao e merecem ser amplamente acolhidas. Quer dizer,tambem, que uma razao pondenivel para distinguir riitidamente a Econornia positiva
da normativa e, justamente, a contribui~ao que por essa via se podera dar ao acordo
sobrediretrizes.
o objetivo ultimo de uma ciencia positiva e 0desenvolvimento de uma "tea-ria" ou de uma "hip6tese" capaz de produzir previs6es vatidas e significativas (ou
seja, nao banais) acerca de fenomenos ainda nao observados. Vma tal teoria e, via de
regra, uma complexa mistura de dois elementos. Em parte, e uma "linguagem", des-
tinada a fomentar "metodos sistematicos e organizados de raciocinio". ( 1 ) Em
parte, e urn corpo de hip6teses substantivas, elaboradas com 0objetivo de collier,
por abstra~ao, aspectos essenciais da realidade complexa.
Vista como linguagem, a teoria naQ"possui conteudo substantivo; e urn con-
junto de tautologias. Sua fun~ao e a de servir como sistema de arquivamento para
organizar material empirico e simplificar a compreensao desse material; os criterios
pelos quais sera julgada sao os que se mostram adequados para avaliar urn sistema de
arquivamento. Estao as categorias definidas de modo claro e preciso? Sao elas
exaustivas? Sabemos onde colocar cada qual dos itens individuais ou M certa ambi-
guidade? Esta 0 sistema de Htulos e subtitulos projetado de tal maneira que se
toma facil encontrar urn desejado item ou e preciso "ca~a-lo", correndo de urn lado
para outro? Os itens que desejariamos considerar conjuntamente acham-se arquiva-
dos uns ao lado dos outros? 0 sistema de armazenamento contoma as elaboradas
referencias cruzadas?
As respostas dadas a tais perguntas dependem, em parte, de considera~eses 16-
gicas; e, em parte, de considera~oes factuais. Somente os canones da 16gica formalpodem revelar se uma linguagem especifica e completa e coercnte,ou seja, se as
proposi~eses da linguagem sao "certas" ou "erradas". Somente a evidencia factual,
por seu tumo, pode revelar se as categorias do "sistema analitico de arquivamento"
possuem urna contraparte emp~rica significativa, ou seja, se elas sao uteis para a
(l)
A frase f"mal e do artigo "The Present Position of Economics" (1885), de Alfred Marshall, queaparece no livro organizado por A.C. Pigou, MEMORIALS OF ALFRED MARSHALL (Lon-
dres: Macmillan Co, 1925), p. 164. Ver, ainda, "The Marshallian Demand Curve", infra, pp.
56-57,90-91.
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tese e rejeitada quando suas previsoes sao contraditadas ("com freqiiencia" ou mais
assiduamente do que as previsoes oriundas de hip6tese altemativa). E aceita quandosuas previsoes nao sao contraditadas e tanto maior confian~a desperta quanta maior
o numero de oportunidades em que poderia ter-se visto contraditada. A evidencia
factual jamais "prova" uma hip6tese; pode, apenas, deixar de refutli-Ia e e isso,jus-
tamente, 0que se entende ao dizer, de maneira urn tanto inexata, que uma hip6tese
foi "confirmada" pela experiencia.
A fim de evitar confusoes, cabe notar, explicitamente, que as "previsoes"
pelas quais se submete a teste a validade de uma hip6tese nao precisam dizer respei-
to a fen6menos que ainda nao ocorreram, ou seja, nao precisam ser vaticinios a
proposito de eventos futuros. Podem dizer respeito a fen6menos ja ocorridos, mas
sem que observa~oes ace rea deles tivessem sido registradas, ou a fen6menos desco-
nhecidos para a pessoa que faz as previsoes. Exemplificando,.uma hip6tese podeimplicar que tal ou qual evento - face a certas outras circunstancias - deve ter
ocorrido em 1906. Se uma pesquisa de registros hist6ricos revel a que 0even to ocor-
reu, de fato, a previsao esta confirmada; se revela, ao contrario, que 0 evento nao
ocorreu, a previsao esta contraditada.
A validade de uma hipotese, no sentido agora elucidado, n[o e, por si mesma,
urn criterio suficiente para a escolha de uma dentre varias hip6teses viaveis. 0nu-
mero de fatos observados e invariavelmente finito, ao passo que 0numero de hip6-
teses po!>siveis e infmito. Se ha uma hip6tese compativel com a evidencia disponi-
vel, entao havera sempre urn numero infinito de hip6teses igualmente compativeis
com essa evidencia. ( 1 ) Imagine-se, para exemplificar, que urn imposto de consu-
mo de urn artigo acarrete aumento de pre~o desse mesmo artigo - e que 0aumento
seja igual ao imposto. Isso e compativel com as condi~oes competitivas, uma curva
estavel de demanda e uma curva estavel e horizontal de oferta. Mas tambem e com-
pativel com as condi~oes competitivas e uma curva de oferta de declividade positiva
ou negativa, com 0exigi do deslocamento de compensa~ao efetuado seja na curva de
demanda, seja na curva de oferta. Tambem e compativel com as condi~oes monopo-
listicas, os custos marginais constantes e uma curva estavel de demanda, com a con-
figura~[o especifica requerida para produzir esse resultado. E assim por diante,
indefinidamente. Novas evidencias, com as quais a hip6tese devera mostrar-se com-
pativel, poderao, e certo, eliminar algumas das possibilidades; mas nao poderao
elimina-Ias todas e delimitar uma unica possibilidade, capaz de revelar-se compati-
( 1)
A restri"ao e necessaria porque a "evidencia" pode mostrar-se internamente contradit6ria, de
modo a inexistir hip6tese compativel com ela. Vcr, ainda, "Lange on Price Flexibility andEmployment", infra, pp. 282-83.
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vel com a evidencia finita. A escolha de uma das hip6teses possiveis - todas
igualmente compativeis com a evidencia disponivel - M de ~r, ate certo
ponto, arbitrana, embora se reconhe~a, em geral, que entre as considera~ijes
relevantes a ter em conta estejam os crit6rios de "simplicidade"( e de "fe-cundidade" - n~ijes que, todavia, desafiam caracteriz~lI'o completanlente obje-
tiva. Diz-se que uma teoria e .tanto mais "simples" quanto menor 0 numero de
conhecimentos iniciais que requer para pennitir previs~es, num dado campo de
fenomenos; diz-se que e mais "fecunda" se as previs~s resultantes slI'omais pre-
cisas, se a area em que a teoria permite as previsijese mais ampla e se 0numero de
linhas de investiga~lfo sugeridas e maior.)A completude 16gica e a .coerencia
16gica slfo relevantes, mas desempenham papel subsidiano, assegurando que a
hip6tese afirma 0
que se pretende seja por ela afirmado e 0
afirme de maneiraanaIoga para todos os seus usuarios. Completude e coerencia atuam, aqui, exata-
mente como atuam, nas computa~ijes estatisticas, as verifiC~ijes de acuidade
aritmetica.
Infelizmente, porem, e raro podermos submeter a teste as previ~s particula-
res, nas ciencias sociais, valendo-nos de experimentos especificamente prOjetados
com 0 fito de eliminar as influencias pertubadoras consideradas de maior importan-
cia. Em geral, precisamos confiar na evidencia recolhida em "experimentos" que,
simplesmente, ocorrem. A dificuldade de realizar os chamados "experimentos con-
trolados" nao corresponde, no meu entender, a uma distin~ao que se deva estabele-cer entre ciencias sociais e ciencias fisicas; com efeito, nao so a dificuldade e co-
mum as duas areas (cogite-se da Astronomia, por exemplo) como, a par disso, urna
presurnivel diferen~a entre experimentos controladOs e experiencias nlfo-controla-
dase , quando muito, uma diferen~a de grau. Nenhurn experimento pode ser com-pletamente controlado e qualquer experienciae parcialmente controlada - no sen-tido de que algumas influencias pertubadoras se mantem relativamente constantes
na experiencia.
A evidencia oferecida pela experiencia e abundante e, muitas vezes, tlio con-
cludente como 0 seria a evidencia recolhida por meio de experimentos planejados.
Segue-seque a impossibilidade de realizar experimentos nao e obstaculo fundamen-
tal para submeter a teste uma hipotese, empregando, para isso, 0exito de suas pre-
visoes. Todavia, essa evidencia fornecida pela experiencia e bem mais dificil de in-
terpretar do que a recolhida em experimentos, porque sempre se mostra indireta e
incompleta e, em geral, se revela complexa. A coleta dessa evidencia e, via de regra,
muito ardua e sua interpret~ao exige anaIises sutis e cadeias de complicados racio-
cinios, que poucas vezes sao efetivamente convincentes.A Econornia se nega a evi-
dencia dramatica e direta do experimento "crucial", 0que gera entraves para 0adequado teste de hipoteses; isso, porem, e menos importante do que 0obstaculo ,.
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posto a tentativa de alcan~ar nipido e amplo consenso a respeito das conc1us~es jus-tificadas pela evidencia acessivel. Assim, torna-se lento e difici1 0processo de elimi-
n~ll'o de hipoteses malogradas, que raramente desaparecem e sempre voltam a sercontempladas.
Ha, e certo, muita varia~ll'o no que concerne a esses temas. Qcasionalmente, a
experiencia nos fomece evidencias tll'o diretas, dramaticas e convincentes quanto as
que nos poderiam ser apresentadas pelos experimentos controlados. 0 exemplo
mais obviamente importante seria, talvez, 0 da evidencia que a infl~ll'o nos da a
respeito da hipotese de que urn apreciavel aumento da quantidade de moeda, em'
urn periodo relativamente breve, corresponde a urn substancial aumento dos pre~os
dos generos. Aevidencia, nesse cas~ e dramatica e a cadeia de raciocinio exigida
para interpreta-la e relativamente breve. Sem embargo, apesar dos numerosos casosde aumento substancial dos pre~os, de sua correspondencia urn-a~urn com 0
aurnento das quantias de moeda e da ampla varia~ll'o de outras circunstancias que
possam parecer relevantes, cada nova experiencia da infla~ao levanta controversias
calorosas (nll'o apenas junto aos leigos, cumpre frisar), afirmando-se ou que 0au-
mento da quantidade de moeda e efeito acidental de uma eleva~ll'o de pre~os, decor-
rente de outros fatores, ou que esse aurnento do estoque de moeda nll'o passa de
fortUito e desnecessano fenomeno, concomitante ao do aumento de pre~os.
Uma conseqiiencia da dificuldade que cerca 0teste de hipoteses economic as
substantivas tern sido a fuga para 0 terreno das analises puramente formais e tauto-
logicas. ( 1 ) Como ja foi obseIVado, as tautologias ocupam urn importante lugar na .
Economia e em outras ciencias, pois sll'Qparte de uma linguagem especializada,ou
seja, constituem urn "sistema analitico de armazenamento". A par disso, a logica e a
matematica, tambem tautologicas, sao recursos essenciais para a verifica~ll'o da cor-
re~ll'o dos raciocinios, para a descoberta das implica~oes das hipoteses e para a anali-
se de hipoteses supostamente diferentes - com 0fito de saber se,afmal, nll'o passam
de hipoteses equivalentes ou se sll'o realmente diversas, com a correspondente de-
termina~ll'o das diferen~as.
Mas a teoria economica deve ser mais do que uma estrutura de tautologias -
se pretende predizer as conseqiiencias de nossas a~oes, sem limitar-se a descrever tais
conseqiiencias, ou seja, se pretende ser mais do que matematica disfar~ada. ( 2 ) A
utilidade das tautologias depende, em Ultima instancia, como ja se ressaltou acima,
(1)
Ver0mesmo artigo, nota anterior, passim.
(2 )
Ver, tambem, Milton Friedman e L. J. Savage, "The Expected Utility Hypothesis and the
Measurability of Utility", Journal of Political Economy, LX (Dezembro, 1952),463-94, esp.pp.565-67.
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da aceitabilidade de hip6teses substantivas, capazes de sugerir as particulares catego-
rias em que se distribuem os refratarios fenomenos empiricos.
Efeito mais serio, provocado pela dificuldade de submeter a teste as hip6teses
economicas atraves de suas previsoes, e 0 deela facilitar 0 surgimento de mal:-enten-
didos acerca do papel da evidencia empirica no trabalho te6rico. A evidencia empi-
rica e vital em duas fases diversas, embora intimamente associadas: na fase de elabo-
ra~ao das hip6teses e na do teste de sua validade. Ampla e abrilhgente evidencia
acerca dos fenomenos de uma hip6tese tratara de generalizar e "explicar", alem de
possuir um a importancia 6bvia, como veicu10 para form ul~li'o de novaship6teses, e
indispensavel para assegurar que a hip6tese explica 0 que pretende expIicar - OU
seja, para garantir que suas implica~ijes, no que conceme aiais fenomenos, nfo este-
jam de antemao contraditadas pela experiencia anterior. ( 1) Supondo que a hip6-
(1)
Nos Ultimos anos, alguns economistas, partic~ente os do grupo lig~do a "Cowles Commi-
ssion for Research in Economics", da Universidade de Chicago; enfatizaram a divisiO desse
passo (de sele~ao de hip6tese compatlvel com a evidencia conhecida) em duas fases: em primei-
ro lugar, a sele~o de um conjunto de hip6teses admisslveis, retiradas da classe de todas as hip6-
teses posslveis (0 que corresponde a escolha de urn "modelo", de acordo coma terminologia
adotada); e, em segundo lugar, a escolha de UJila hip6tese, dentre as admisSlveis (a escolha de
urna "estrutura"). Essa reparti~o pode ser heuristicamente valiosa em alguns tipos de trabalho,
especialmente quando se trata de aperfei~ar 0uso sistematico de teorias e de evidencias esta-
tisticas ja existentes. De urn 3ngulo metodol6gico, porem, temos urna divisiio inteiramente arbi-
trana do processo de sel~o de uma especlfica hip6tese, divisi'o que esta em pe de igualdade
com Wrlas outras divis5es igualmente convenientes para este ou aquele prop6sito ou que satis-
fazem certas necessidades psicol6gicas dos investigadores.
Uma conse~iienci8 dessa particular divisiio foi a de que deu origem ao chamado problema "da
identifica~o". Como se observou acima, se uma hip6tese e compativel com a evidencia existen-
te, M um nlimero inimito de hip6teses que tambem se mostrariio compattveis com a mesma
evidencia. Embora, contudo, isso valha para a classe de hip6teses, como um todo, pode nao
valer para a subclasse obtida pela primeira das duas fases acima descritas - a da escolha do
"modelo". : e posslvel que a evidencia a empregar com 0fito de selecionar a hip6tese f'mal (par-
Undo da subclasse) seja compatlvel com umad;1s hip6teses (da subclasse), caso em que 0mode-10 esta "identificado"i de outra forma, diz-se que omodelo "nao foiidentificado". Depreende-
-se dessa maneira de descrever 0 conceito de "identifica!llio" que estamos diante de urn caso
especial do problema geral de escolha de hip6teses igualmente compattveis com a evidencia -
urn problema que sera resolvido por meio de a1gum principio arbitrano como, digamos, 0da
navalha de Ocam. A consider~ao de duas lases, na sele~o de urna hip6tese, faz com que esse
problema geral se manifeste duplamente, em cada qual dessasfases, dando-lhe uma conf'JgUIll~o
especial. Embora a classe de todas as hip6teses permane~, invariavelmente, nao identificada, a
subclasse do "modelo" talvez possa ser identificada, de modo que se apresenta a questao de
conhecei as condi~es a que 0"modelo" deve satisfazer para ver-se identificado. Conql1anto a
considera~o das duas fases seja muito litil, em alguns contextos; ela gera0
perigo de haver doiscriterios diferentes, inadvertidamente empregados para realizar 0 mesmo tipo de e:scolha de
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tese e compativel com a evidencia existente, os testes ulteriores dessa hip6tese en-
volver[o deduzir, tomandoa como premissa, fatos novos, passiveis de observ~li'o,
mas n[o previamente conhecidos, e comparar tais fatos deduzidos com evidenciaempirica 'adicional. Para que urn tal teste se mostre relevante, os fatos deduzidos
devem dizer respeito a classe de fenomenos que a hip6tese procura explanar; a par
disso, eles devem estar suficientemente hem defmidos de modo a possibilitar que.a
observa~[opossa revelar-lhesa falsidade.
As duas fases (de elabora~ao de hip6teses e de teste de sua validade) relacio-
namse por duas vias diversas. Em primeiro lugar, os fatos particulares considerados
em cada fase, s[o, em parte, urna acidental consequencia da maneira de coligir
dados e dos conhecimentos de l:ada investigador. Os fatos que servir[g para subme-
ter a teste a hip6tese, por meio de suas implic~l>es, poderiam, perfeitamente, situar-se no material bruto empregado para formular a hip6tese - e reciprocamente.
Em segundo lugar, 0processo jamais tern inicio na estaca zero; a chamada "fase
inicial" envolve'~sempre, compar~ao da observa~ao com as implica~l>esde urn
previo conjunto de hipoteses. Contradi~l>esque ai se apresentam sli'ourn estimulo
para a elabora~ao de novas hip6teses ou para a revisao das mais antigas. Segue-se
que as duas fases, metodologicamente distintas, andam, em verdade, lado a lado.
Mal-entendidos a prop6sito desse processo aparentemente simples devem-sea
frase "classe de fenomenos que a hip6tese pretende explicar". A dificuldade, nas
ciencias sociais, de obter evidencia novapara essa classe de fenonenos e de avaliar
sua adequ~ao (com respeito as implica~()esda hip6tese) toma tentadora a ideia de
que outra evidencia, de acesso mais direto,se mostre igualmente relevante para a
validade da hip6tese. Toma, em outras palavras, tentadora a ideia de que as hip6te-
ses admitem nli'o apenas "implica~t'5es",mas, ainda, "pressupostos" e de que a
adequa~li'odestes a "realidade" e urn teste de validade da hip6tese, que difere do
teste pelas impIica~()esou a ele se adiciona. Essa conce~ao, amplamente advogada,
e fundamentalmente erronea e causa de nurnerosos danos. Longe de fomecer meio
mais flicitpara joeirar as hip6teses, separando as vaIidas das nli'o-vaIidas,a conce~aoapenas obscurece a questli'o,provoca 0surgimento de mal-entendidos em tome do
significado da evidencia empirica para a teoria economica, desvia boa parte do
hip6teses, cada qual deles utilizado numa das fases em que se desdobra 0passo generico de
sele~o.
A respeito desse enfoque metodo16gico geral, discutido na presente nota, ver Tryvge Haavelmo,
"The Probability Approach in Econometrics", Econometrica, Vol. XII (1944), Suplemento;
Jacob Marschak, "Economic Structure, Path, Policy, and Predication", American Economic
Review, XXXVII (Maio, 1947), 81-84;e "Statistic8l1nference in Economics: An Introduc-
tion", em T.C. Koopmans (organizador), STATISTICAL INFERENCE IN DYNAMIC ECO-
NOMIC MODELS.
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esfor~o intelectual dos que desejam 0desenvolvimento de uma Economia positiva e
bloqueia urn consenso quanta as hipoteses preliminares que devam figurar nessa
disciplina.
Na medida em que se possa dizer existirem "pressupostos" de uma teoria e na
medida em que seu "realismo" seja passivel de julgamento, independentemente da
validade de previsoos,a rela~aoentre a importincia de urna teoria e 0"realismo" de
seus "pressupostos"e praticamente 0oposto do que sugere a conce~lo sob critica.Hip6teses verdadeiramente importantes tern "pressupostos" que nlo passam de
extravagantes e nlo-acuradas represent~oos descritivas da realidade. Via de regra,
quanta mais significativauma teoria, tanto mais nao-realistas (neste sentido) os seus
pressupostos. ( 1 ) A razaoe simples.Vma hipotesee importante quando "explica"
muito com base em pouco, ou seja, quando esta em condi~6es de delimitar, porabs~lo, partindo da massa de circunstancias complexas e pormenorizadas que
cercam 0fenomeno a explicar, uma classe de elementos comuns e fundamentais,
formulando previS6esvli.lidascujo alicercee , just~ente, apenas essa classe de elementos cruciais. Consequentemente, para que seja importante, uma hip6tese deve
ser descritivamente falsa em seus pressupostos. Ignora e deixa de explanar vlirias
circunstancias presentes, cuja irrelevancia para 0fenomenoem tela decorre do
pr6prio exito da teoria.
A ~un de apresentar esse ponto de maneira menos paradoxal, notese que a
pergunta relevante a fazer, ao cogitar dos "pressupostos" de uma teoria, nlo dizrespeito ao seu "realismo" descritivo fja que os pressupostos jamais sao descritiva
mente "realistas"), mas ao fato de se mostrarem ou nlo aproxima~6es suficiente
mente boas, tendo em conta os objetivos colimados. E essa pergunta sOpoderli.ser
respondida verificando se a teoria "funciona", ou seja, se conduz a previs6eSbastan
te acuradas. Os dois testes, supostamente independentes, reduzemse, portanto, a
urn teste unico.
A teoria da competi~ilo monopolista e imperfeitae urn exemplo do descaso
com que 880 tratadas essas proposi~oos, na teoria economica. 0 desenvolvimentodesse tipo de anlilise foi explicitamente estimulado - e a aceita~ao e a aprova~ao
que recebeu tambem 880 amplamente explicadas - pelo fato de acreditarse que os
pressupostos da "concorrencia perfeita" ou do "monop6lio perfeito", subjacentes,
segundo se diz, a teoria economica neoclli.ssica,nos oferecern uma falsa imagem da
realidade. Essa cren~a assentavase, por sua vez, quase inteiramente, na inocuidade
descritiva dos pressupostos, diretamente percebida, em vez de assentar-se em
(1)
Nao vale, e claro, a reciproca dessa proposi~o: pressupostos nao-realistas (neste sentido) naogarantem que a teoria seja significativa.
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qualquer reconhecida contradi~'o em previs~s deduzidas da teoria econoIDlca
neocllissica. Exemplo ainda mais claro do ponto em tela, embora muito menos
importante, 6 fomecido pela prolixa discuss'oem tomo da anaIisemarginal, publi-
cada, ha alguns anos, na American Economic Review. Os artigos, de defensores oude oponentes, olvidam 0que me parece a clara quest'oprincipal - a concordancia
das implica~~s da analise marginal com a experiencia - e debatem pontos irrele-
vantes, procurando saber se os homens de neg6cios chegama s suas decis~s consul-
tando programas, ou cuevasou fun~~s multivariadas que exibam custo marginal e
receita marginal. ( 1) Espero que esses dois exemplos (e outros que eles prontamen-
te sugerem) se prestem para justificar a id6ia de fazer-se, aqui, uma discuss'oampla
dos principios metodol6gicos pertinentes - uma discuss'oque, de outra forma,
poderia parecer descabida.
(1)
Ver R. A. Lester, "Shortcomings of Marginal Analysis for Wage Employment Problems",
American Economic Review, XXXVI (Mar~o, 1946),62-82; Fritz Machlup, "Marginal Analysis
and Empirical Research", American Economic Review, XXXVI (Setembro, 1946), 519-54;R. A. Lester, "Marginalism, Minimum Wages, and Labor Markets", American Economic Review,
XXXVII (Mar~o, 1947), 135-48; Fritz Machlup, "Rejoider to an Antimarginalist", American
Economic Review, XXXVII (Mar~o, 1947), 148-54; G. J. Stigler, "Professor Lester and the
Marginalist", American Economic Review, XXXVII (Mar~o, 1947), 154-57; H. M. Oliver, Jr.,
"Marginal Theory and Business Behavior", American Economic Review, XXXVII (Junho,
1947), 375-83; R. A. Gordon, "Short-Period Price Determination in Theory and Practice",
American Economic Review, XXXVIII (Junho, 1948), 265-88.
Cabe notar que Lester, alem de referir-5e a MOS assuntos que se relacionam a validade dos
"pressupostos", na teoria marginal, tambem se,refere ievidencia que diz respeito a conformi-
dade da experiencia com as implica~es da teoria. Cita, alias, como exemplos em qqe lalta essa
conformidade, 0modo pelo qual 0emprego reagiu, na Alemanha, ao plano Papen e, nos Esta-
dos Unidos da America, as altera~es havidas na legisla~ao a respeito dos saIarios m{nimos.
Contudo, 0bteve comentarlo de Stigler eo unico, dentre os demais artigos, em que hli alusao a
tal evidencia. Cumpre notar, ainda, que nao deve ser ignorada a completa e cuidadosa exposi~o
de Machlup, relativa a estrutura 16gica e ao significado da teoria marginal, porque 0artigo de
Lester, ao debater 0 tema, estli sensivelmente prejudicado por v3ri.osmal-entendidos que quase
chegam a ocultar a evidencia ali apresentada, relevante para 0assunto examinado. Entretanto,
Machlup, enfatizando a estrutura 16gica, chega perigosamente perto do ponto de apresentar a
teoria como se fosse mera tautologia ...;.embora esteja claro, em MOS pontos, que ele tern COilS-
ciencia do perigo e estli ansioso por evitli-Io. Os artigos de Oliver e de Gordon sao extremados,
concentrando-5e exclusivamente na questao da conformidade do comportamento de homens deneg6cios com os "pressupostos" da teoria.
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III - PODE UMA HIPOTESE SUBMETER-SE A
TESTE PEW REALISMO DE SEUS PRESSUPOSTOS?
Principiemos com urn exemplo fisico simples, 0da lei da queda dos corpos.
Aceita-se a hipotes de acordo com a qual a acelera~ao g, de urn corpo que cai no
vacuo, e constante, na Terra, com valor aproximado de trinta e dois pes por segun-
do (ou seja, 9,8 metros po~ segundo), e independe da forma do corpo, da maneira
pela qual tomba,. etc. Isso acarreta cf\le a distancia percorrida por urn corpo, em
queda livre, em qualquer intervalo especificado de tempo, sera dada pela formula
s= ( 1/2 ) gt2, on de sea distancia percorrida (em pes ou em metros) e te 0tempo (em segundos). Aplicar a formula ao caso de uma esfera compacta, deixada
cair do telhado de urn edificio, equivale a dizer que a esfera se comporta como seestivesse caindo no vacuo. Submeter a teste a hipotese por meio de pressupostos
significaria, presumivelmente, medir a pressao real do ar para decidir se seu valor
esta ou nfo pr6ximo de zero. Ao nivel do mar, a pressao do ar e de aproximada-
mente 15 libras por centimetro quadrado (ou seja, de 6,75 kgf por cm2). Estaria
esse numero suficientemente proximo de zero para que a diferen~a fosse julgada
destituida de importancia? Aparentemente sim, pois 0tempo real que a esfera s6li-
da leva para atingir 0 solo esta bem proximo do tempo indicado pel a formula. Ima-
gine-se, porem, que em vez da esfera compacta se lance, do alto do edificio, uma
pena. A f6rmula conduz, entao, a resultados exageradamente inacurados. Assim,
aquele numero (15, no caso de libras, ou 6,75, no caso dos kgf) e significativamente
diferente de zero para apena, mas nao para a esfera compacta. Suponha-se que a
formula se veja aplicada a uma esfera deixada cair de urn aviao, a trinta mil pes (ou
seja, a quase dez mil metros) de altitude. A pressao do ar, nessa altura, e decidida-
mente menor do que 6,75 kgf por centimetro quadrado. Sem embargo, 0 tempo
real de queda, de dez para sete mil metros de altitude (quando a pressao do ar ainda
e muito menor do que a pressao ao nivel do mar), difere consideravelmente do
tempo dado pela f6rmula - muito mais apreciavelmente do que 0
tempo gasto pelaesfera em sua queda do alto do edificio para 0 solo. De acordo com a f6rmula, a
velocidade da esfera deveria ser gt e deveria, pois, crescer continuadamente. Na
verdade, porem, uma esfera deixada caii de dez mil metros de altura atinge a sua
velocidade maxima bem antes de chegar ao solo. 0 mesmo acontece com respeito a
outras conseqtiencias da formula.
A questao inicial - a de saber se quinze esta ou nao suficientemente pr6ximo
de zero para que a diferen~a possa ver-se desprezada - e, portanto, uma questao
meio tola. Quinze libras por centimetro quadrado equiparam-se a 2.160 libras por
pe quadrado ou a 0.0075 toneladas por polegada quadrada. Nao dispomos de meiosque autorizem considerar tais numeros "pequenos" ou "grandes", se nos falta urn
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padnlo exterior de comparayao. E 0unico padrao relevante de comparayao e a pres-
sac do ar, relativamente a qual a f6rmula "funciona" ou nao, em urn dado conjunto
de circunstancias. Isso, porem, levanta a mesma questao, em urn segundo nivel. Que
significaria "funciona ou nao"? Ainda que pudessemos eliminar os erros de mensu-rayao, 0 tempo de queda, efetivamente medido, dificilmente (ou nunca) se igualaria
ao tempo fornecido pel a f6rmula. Quao grande deveria ser a diferenya entre esses
dois valores para ver-se justificada a afir~ao de que "a teoria nao funciona"? Para
responder a esta pergunta ha dois importantes padroes exteriores de comparayao.
Urn deles seria a acuidade passivel de ser alcanyada por uma teoria altemativa,
igualmente aceitavel, com a qual a teoria em pauta fosse confrontada. 0 outro
padrao manifesta-se quando existe uma teoria que sabidamente conduz a previsoes
mais satisfatorias, mas com maior custo. Os ganhos decorrentes da maior acuidade
(e que dependem dos objetivos perseguidos) precisam, nesse caso, ver-se compara-dos com os mais elevados custos de sua obtenyao.
o exemplo ilustra, a urn tempo, a impossibilidade de submeter a teste umateoria pel os seus pressupostos e a ambiguidade do conceito de "pressupostos de
uma teoria". A formula s = (1/2) 9t2 vale para corpos que caem no vacuo e se
deriva da analise do comportamento de corpos que caem no vacuo. Cabe dizer,
entao, que, em variada gama de circunstancias, os corpos que tombam na atmosfera
real se comportam como se estivessem caindo no vacuo. Em linguagem muito usada
na Economia, isso traduzir-se-ia, de imediato em: a formula pressupoe 0vacuo. Mas
e claro que assim nao acontece. 0 que ela verdadeiramente assevera e isto: emmuitos casos, a existencia da pressao atmosferica, a forma do corpo, 0nome da
pessoa que 0 deixa cair, 0tipo de mecanismo pelo qual se provoca a sua queda e
variadas outras circunstancias presentes deixam de ter efeito apreciavel sobre a
distancia que 0corpo, em sua queda, percorre durante urn especificado intervalo de
tempo. A hip6tese pode ser facilmente refraseada, de maneira a omitir qualquer
alusao ao vacuo: em ampla gama de condiyoes, a distancia percorrida por urn corpo,
em queda livre, num especificado intervalo de tempo, e dado pel a f6rmula
s = (1/2) 9t2. Deixando de lade a historia dessa formula e a teoria fisica a qual seacha associada, tern sentido afirmar que ela pressupoe 0vacuo? Ate onde mee dadosaber, ha varios outros conjuntos de circunstancias que poderiam conduzir a mesma
f6rmula. Ela e acolhida porque funciona e nao porque vivamos em urn vacuo apro-ximado - seja qual for0significado disso.
o problema importante, em conexao com a hip6tese, e 0de especificar ascircunstiincias em que a f6rmula funciona; mais precisamente, e 0 de indicar amagnitude geral dos erros que se apresentam em suas previsoes, sob variadas condi-
yoes. Em verdade - como esta implicito no refraseamento da hip6tese, linhas acima
- nao se tern essa indicay30 da magnitude dos erros, de urn lado, e a propria hipo-
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tese, de outro lado, como coisas diversas. A indica9ao e parte essencial da hip6tese,
uma parte que tendeni a sofrer revisoes e a ampliar-se, na medida em que a expe-
riencia vier a acumular-se.
No caso especifico da queda dos corpos, ha uma teoria mais geral, emboraainda incompleta, esb09ada em fun9ao de tentativas de explicar os erros da teoria
simples. Essa teoria geral permite avaliar a influencia de alguns fatores de pertuba-
9ao e dela se deduz, como caso particular, a teoria simplificada. Entretanto, nao
convem usar sempre a teoria generalizada, pois a acuidade adicional que permite
nao justifica, via de regra, 0 custo adicional de seu emprego. Permanece, pois, como
questao importante, a de saber em que condi90es a teoria simples funciona "sufi-
cientemente bem". A pressao do ar e uma - e somente uma - das variaveis que
definem tais condi90es; ao lado de outras, sao, tambem, relevantes a forma do
corpo e a velocidade atingida. Vma das maneiras de interpretar essas variaveis -diversas da pressao do ar - consiste em encara-Ias como fatores que determinam se
e significativo ou nao urn particular afastamento com_respeito ao "pressuposto" do
vacuo. Exemplificando, pode-se dizer que a diferen9a de formas dos corpos torn a as
quinze libras por polegada quadrada significativamente distantes de zero, no caso da
pena, mas nao significativamente distantes de zero, no caso da esfera compacta,
deixada cair de moderada altura. Esse enunciado, porem, deve ser nitidamente dis-
tinguido de outro, muito diverso, segundo 0 qual a teoria nao vige, no caso da pena,
porque seus pressupostos sao falsos. A rela9ao relevante e exatamente a oposta: os
pressupostos sao falsos, no caso da pena, porque a teoria nao funciona. Este ponto
deve ser enfatizado pois os "pressupostos" sao usados, de maneira perfeitamente
correta, a fim de especificar as circunstancias em que a teoria nao vige, mas nao,
como erroneamente se admite, com freqiiencia, a fim de determinar aquelas cir-
cunstancias - 0 que tern sido, importante fonte de cren9a em que uma teoria possa
ver-se submetida a testes pelos seus pressupostos.
Consideremos, agora, outro exemplo, concebido com 0 fito de apresentar-se
como ancilogo de muitas hip6teses que surgem em ciencias sociais. Cogitemos da
densidade das folhas em uma arvore. Sugiro, como hip6tese, que as folhas se posi-cionam como se cada qual delas procurasse, deliberadamente, maximizar a quanti-
dade de luz solar que recebe, tendo em conta 0 posicionamento de folhas vizinhas;
como se cada qual delas conhecesse as leis fisicas responsaveis pela quantidade de
luz incidente em varios pontos e pudesse mover-se rapida ou instantaneamente de
urn ponto dado para qualquer outro ponto nao ocupado. ( 1 ) Ora, algumas das
(1)
Embora esteexemplo tenha origem independente, e similar a urn exemplo usado por Armen A.Alchian, em "Uncertainty, Evolution, and Economic Theory", Journal of Political Economy,
LVIII ( Junho, 1950), pp. 211-21. Boa poro da discussao subsequente, embora tambemtenha origem independente, acompanha as linhas da discussao de Alchian.
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mais 6bvias implicayoos dessa hip6tese mostram-se perfeitamente compativeis
com a experiencia. Exemplificativamente (considerando, e claro, 0 que ocorre
nos Estados Unidos da America), a densidade das folhas e maior no lado suI
do que no lado norte das arvores, embora isso nlio ocorra ou ocorra de
modo menos patente, como a hip6tese implica, em en costas de m~mtes,
voltadas para 0 norte, ou quando 0 lado suI das arvores, por alguma razlio,
esteja na sombra. Deve a hip6tese tornar-se inaceitavel porque, ate onde
sabemos, as folhas nlio "deliberam" nem exibem comportamento consciente,
nlio freqiientaram escolas para aprender as relevantes leis cientificas ou as tecnicas
matematicas necessarias para a determinaylio de posiyoes "6timas" e n[o s[o
capazes de mover-se de urn ponto para outro? Nenhuma dessas form as de contra-
ditar a hip6tese e vitalmente relevante; os fen6menos envolvidos n[o se acham na
"classe de fen6menos que a hip6tese pretende explanar". A hipotese n[o afirma que
as folhas fayam tudo aquilo que foi men cion ado acima; limita-se a asseverar que a
densidade se apresenta como se as folhas fizessem 0que foi dito. Em que pese a
aparente falsidade dos seus "pressupostos", a hipotese e muito plausivel, dado 0
acordo entre suas implica~oes e 0 observado. Tendemos a "explicar" a sua validade
com base em que a luz solar contribui para 0 desenvolvimento das folhas e que, por
conseguinte, elas se acumulam ou se mantem, em maior numero, nos locais em que
ha mais sol. Assim, 0 resultado decorrente de adaptay[o puramente passiva as
circunstiincias exteriores coincide com 0 resultado que decorreria de acomoday[odeliberada a tais circunstiincias. A hip6tese altemativa e mais atraente do que aconcebida, mas n[o porque seus "pressupostos" seja:t;l "realistas" e sim porque ela e
parte de uma teoria de maior generalidade, aplicavel a uma variedade maior de
fen6menos, de que 0posicionamento de folhas, numa arvore, e apenas urn caso
particular, teoria que admite maior numero de implicayoes passiveis de se verem
refutadas e que n[o foi contraditada, em ampla gama de condi~oes. A
evidencia direta para 0 crescimento das folhas esta, pois, refor~ada pela
evidencia indireta que deflui de outros fen6menos a que essa teoria geral se
aplica.
A hipotese concebida so e presumivelmente valida (ou seja: conduz aprevisoes "suficientemente" acuradas, relativas a densidade das folhas) para
uma classe restrita de circunstiincias. Niio sei quais seriam estas circunstiincias
e nem como defini-Ias. Parece 6bvio, entretanto, que os "pressupostos" da
teoria, neste exemplo, nlio tern qualquer papel na sua determinay[o. 0 tipo
da arvore, as caracteristicas do solo, etc., sao as variaveis que, provavelmente,
definirlio 0 iimbito de validade da teoria - validade que nao dependera da
capacidade matematica das folhas, nem da possibilidade de elas se moverem de urnpara outro ponto.
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Savage e eu discutimos, em outro local, (1 ) urn exemplo similar, porem rela-
tivo ao comportamento humano. Consideremos 0problema de determinar (prever)
os pontos feitos por urn eximio jogador de bilhar. Nlio parece descabido supor. que
excelentes previsOes seriam obtidas a partir da hipotese de que 0jogador executa astacadas como se conhecesse as complicadas formulas matematicas pelas quais fica-
riam fixadas as trajetorias otimas, fosse capaz, de relance, de fazer estimativas acu-
radas sobre os angulos e demais elementos que descrevem as posi~lles relativas das
bolas, estivesse apto, usando as formulas, a realizar caIculos em fra~lles de segundos;e como se pudesse fazer com que as bolas se movessem ao longo das trajetorias indi-
cadas pelas formulas: A confian~a que depositamos em tal hipotese nao provem da
cren~a em que jogadores de bilhar, ainda que eximios, possam atravessar ou atraves-
sem, de fato, as fases do processo descrito; provem, ao contrario, da cren~a em que
as pessoas, se nao atingissem, de alguma forma, os mesmos resultados praticos,deixariam de ser eximios jogadores de bilhar.
Urn pequeno passo nos leva do afirmado nos exemplos ao que se afirma na
hipotese da Economia segundo a qual, em ampla gama de circunstancias, as firmas
(individualmente consideradas), atuam como se estivessem tratando, racionalmente,
de maximizar seus esperados rendimentos (ou "lucros", segundo a terminologia
usual, urn tanto desnorteadora) ( 2 ) e tivessem cabal conhecimento dos dados
(1)
Milton Friedman e L. J. Savage, "The Utility Analysis of Choices Involving Risk", Journal of
Political Economy, LVI (Agosto, 1948), p. 298. Reimpresso no livro READINGS IN PRICE
THEORY, organizado pela American Economic Association (Chicago, Richard D. Irwin, Inc.,
1952),pp.57-96.
(2 )
Parece apropriado 0usa do termo "lucros" para aludir Ii diferenlia entre resultados reOOse "es-perados", entre recebimentos ex post e ex ante. Como sublinha Alehian (op. cit., p. 212),
acompanhando Tintner, os "lucros" sao frutos de incerteza e nao podem, portanto, ver-se, de
modo deliberado, antecipadamente maximizados. Face Ii incerteza, os indivlduos e as frrmasescolhem uma dentre varias antecipadas distribuiliOes de probabilidade, relativas aos recebimen-
tos ou rendas. 0 conteudo especifico de uma teoria da escolha de uma de tais distribuil(c5esdepende de criterios que permitam hierarquiza-las. Uma hip6tese e a de que devam ser hierar-
quizadas segundo a expectativa matematica da utilidade que a elas se associa (cf. Friedman e
Savage, "The Expected-Utility Hypothesis and the Measurability of Utility",\op. cit.). Caso
especial dessa hip6tese, ou alternativa para ela, hierarquiza as distribuil(c5es de probabilidades
segundo a expectativa matematica das rendas em dinheiro associadas a elas. Esta ultima alterna-
tiva e , possivelmente, mais facil de apliCar (e moosfreqiientemente aplicada) ao caso de f'rrmasdo que ao caso de indivlduos. 0 termo "rendas esperadas" sera entendido de modo suficiente-
mente amplo para poder abranger qualquer dessas opl(c5es.
Os temas a que se faz referencia na presente nota nilo silo fundamentOOs, cogitando-se das ques-
toes metodologicas em tela, de modo que se vem contornados, em geral, nas discussOes subs-
seqiientes.
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indispensaveis para aIcanyar hito nessa empreitada; como se - dito de outro
modo - conhecessem as relevantes funyoes de demanda e de custo, calculassem
custos marginais e rendimentos marginais associados a todas as opyoes possiveis,relativas as ayoes a tomar, e considerassem cada qual dessas linhas de ac;ao, prolon-
gando-as ate fazer com que os custos marginais se identificassem aos rendimentos
marginais. Ora, e claro que os homens de negocios nao resolvem, na realidade, Iite-
ralmente falando 0 sistema de equayoes em que 0 economista-matematico conden-
sa aquela hipotese - exatamente como as folhas e os jogadores de bilhar tamoom
nao executam complicados caIculos matematicos, ou os corpos em queda nao deci-
dem criar 0 vacuo. Se perguntarrnos ao jogador de bilhar como escolhe 0ponto da
bola em que da a tacada, ele podera responder que "simplesmente da uma calcula
da", embora nao deixe de apertar um pe de coelho, para ter sorte. 0 homem de
negocios podera dizer, por sua vez, que fixa preyos em termos de custos medios,
permitindo, e claro, alguns desvios, quando 0 mercado 0exige. A resposta do joga-
dor e tao "esclarecedora" quanta a do homem de negocios e nenhuma das afirrnayoes se constitui em teste relevante para a hipotese correlata.
A confianya que possamos ter na hipotese da maximizayao dos rendimentos
justificase por evidencia de genero bem diverso. Essa evidencia e , pelo menos, emparte, semelhante i t que se utiliza para apoiar a hipotese do jogador de bilhar: se 0
comportamento dos homens de negocios nao se assemelhasse, de algum modo, a urn
comportamento compativel com a maximizayao dos rendimentos, parece improva-
vel que esses homens viessem a ficar por tempo longo no ramo dos negocios. Supo-
nhamos haver um determinante imediato aparente para 0comportamento negocia-
dor - 0habito, 0 acaso ou qualquer outro fator. Sempre que esse determinante
conduz a um comportamento compativel com a maximizayao bem informada e
racional dos rendimentos, os negocios prosperam e propiciam recursos para haver
expansao; caso contrario, os negocios tendem a produzir perda 'de recursos e so
poderao manter-se com auxilio de reservas provenientes de fora. 0 processo de
"selec;ao natural" ajuda-nos, pois, a validar a hipotese; em outras palavras, admitidaa seleyao natural, a aceitayao da hipotese pode assentar-se, largamente, na ideia de
que ela sumaria, apropriadamente, as condiyoes de sobrevivencia.
Evidencia de maior importancia, em favor da hipotese da maximizayao dos
rendimentos, provem da experiencia colhida em numerosas aplicayoes da hipotese a
problemas especificos - e a reiterada verificayao de que suas implicay5es deixaram
de se ver contraditadas. Dificlmente se documentara uma tal evidencia, que se acha
espalhada em numerosos memorandos, artigos e monografias cuja preocupayao
principal nao era a de submeter aquela hipotese a teste mas a de resolver especfficos
problemas concretos. Ainda assim, a hipotese tern, a sustenta-Ia, um testemunhoindireto e muito forte: 0 seu continuado emprego e a constante acolhida que mere-
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ceu, por muitos anos - a que se associa a inexistencia de qualquer teoria rival cae-
rente, nao auto-contraditoria, capaz de ver-se desenvolvida e tambem amplamente
aceita. A evidencia em favor de uma hipotese resulta, sempre, de falhas nas tentati-
vas feitas no sentido de contradita-Ia; essa evidencia acumula-se enquanto a hipotese
e utilizada e, por sua propria natureza, nao pode ser facilmente documentada de
maneira abrangente. rende, pois, a tornar-se parte da tradiyao e do fold ore de ilma
ciencia, revelada atraves da tenacidade com que as hipoteses sao defendidas e nao
atraves de listas explicitas de casos em que deixaram de ver-se contraditadas.
Ate aqui, nossas condusoes relativas ao significado dos "pressupostos" 'deuma teoria foram quase todos negativos: vimos que uma teoria n[o pode ser subme-
tida a teste pelo "realismo" de seus "pressupostos" e que 0proprio conceito de
"pressuposto" de uma teoria esta cercado de ambigiiidades. Se isso resurnisse tudo,
seria dificil explicar 0 amplo uso desse conceito e a tendencia que todos temos de
falar dos pressupostos de uma teoria, e de compara-Ios com os pressupostos de
teorias alternativas. Ha muita fumaya presente para que inexista 0fogo.
Na metodologia, tal como na ciencia positiva, os enunciados negativos s[o
formulados, em geral, com maior confianya do que os enunciados afirmativos. Ex-
plica-se, pois, porque tenho menos confianya em minhas proximas observayoes,
relativas ao significado e ao papel dos "pressupostos", do que nas observayoes pre-
cedentes. Ate on de me e dado ver, os "pressupostos de uma teoria" desempenham
tres papeis positivos diversos, embora relacionados: a) sao, freqiientemente, modo
economico de descrever ou de apresentar uma teoria; b) facilitam, algumas vezes, 0
teste indireto da hipotese e de suas impliayoes; e c) slfo, algumas vezes, como se
notou acima, urn meio conveniente de especificar as condiyoes sob as quais se espe-
ra seja valida a teoria. Os dois primeiros itens requerem discuss[o mais pormeno-
rizada.
o exemplo das folhas ilustra 0primeiro papel dos pressupostos. Em vez dedizer que as folhas tendem a maximizar a luz solar recebida, poderiamos formular
uma hipotese equivalente, destituida de pressupostos aparentes, sob a forma de lima
lista de regras que perrnitissem predizer a densidade das folhas: se uma arvore esta
em urn plano, sem que outras arvores ou outros objetos impeyam a chegada dos
raios solares, entao a densidade das folhas tendera a ter tais e quais peculiaridades;se uma arvore se acha na encosta de urn morro, cercada por diversas outras arvores
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similares, entao ... ; e assim por diante. Esta e, claramente, uma forma bem menos
econ6mica de apresentayao da hipotese do que 0enunciado simples segundo 0qual
as folhas tendem a maximizar os raios solares que cad a qual delas recebe. Este Ulti-
mo enunciado e, na verdade, simples sumario das regras que comp
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momenta de aplic~[o das regras. Cada ocorrencia tern tray os tipicos proprios, n[o
abrangidos pelas regras explicitadas. A capacidade de 60pesar esses tra~os para saber
se devem ser desprezados aU n[o e saber se afetam ou n[o a forma de associarfenomenos obsemiveis a certas entidades do modelo, e algo que nao se ensina -
algo que so se aprende pela experiencia e mediante contato com a "correta" atmos-
fera cientifica, mas nunca adotando procedimentos rotineiros. Neste ponto e que 0
"amador" se separa do "profissional", em qualquer ciencia; e por ele passa a linha
divis6ria, muito fina, que separa 0 "vigarista'" do cientista.
Urn exemplo simples servini, talvez, para esclarecer a quest[o. A Geometria
Euclidiana e urn modelo abstrato, logicamente compl~to e coerente. Suas entidades
s[o definidas de maneira precisa: uma reta nao e uma figura cujo comprimento e
"muito" maior do que a largura ou aespessura; e uma figura geometrica de exten-s[o zero e largura zero. Uma figura que tambem e, obviamente, "n[o-realista". Nao
ha, na "realidade", coisas como os pontos, as retas ou as superficies de Euclides.
Apliquemos esse modelo abstrato a Urn sinal deixado, no quadro negro, pelo giz.0
sinal identifica-se a uma curva euclidiana, a uma superficie euclidiana ou a urn soli-
do euclidiano? Sera apropriadamente equiparado a uma'linha ~ 0 empregamos para
representar, digamos, uma curva de demanda. Mas podera ser assim entendido se 0
empregarmos para colorir urn mapa, ao delimitar paises, porque jamais chegariamos
a cobrir de cores as regioes se 0 sinal fosse visto como curva. Para esse fim, e preciso
equiparar 0 sinal a uma superficie. Essa maneira de encara-Io, todavia, esta afastada
das cogitayoes do fabricante de giz; de fato, isso acarretaria que 0 giz n[o chegaria a
ser usado porque, para esse novo fim, 0 sinal deve ser identificado a urn volume.
Neste exemplo simples, os juizos emitidos despertam acordo generalizado. Entre-
tanto, e claro que tais juizos - em que pese a viavel formulaya'o de considerayoes
amplas que os norteiam - nunca chegam IIatingir cabal abrangencia para dar conta
de cada caso possivel. Esta-lhes vedado 0 carater de coerencia e autosuficiencia que
e tipico da Geometria Euclidiana.
Discorrendo a respeito dos "pressupostos cruciais" de uma teoria, procura-mbS, segundo penso, enunciar os elementos-chaves do modelo abstrato. Ha, via de
regra, muitos modos diversos de descrever completamente 0 modelo - varios con-
juntos de "postulados" que tanto implicam quanta s[o implicados pelo modelo,
contemplado como urn todo. Os modos s[o logicamente equivalentes: elementos
que vemos como axiomas ou postulados de urn modelo, em uma perspectiva,
podem surgir como teoremas, em outra perspectiva - e reciprocamente. Os especi-
ficos "pressupostos" chamados "cruciais" s[o selecionados com base em convenien-
cias, tendo em conta questoes como a da simplicidade ou da economia, na descriy[o
do modelo, da plausibilidade intuitiva e da capacida'de de sugerir mesmo que t[o--somente por implicayao) algumas considerayoes que se mostrem relevantes para
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Quando se formula uma hipotese, parece obvia, em geral, a tare fa de separar,
nessa formulayao, os enunciados que correspondem aos pressupostos dos enuncia-
dos que aludem as implicayoes. Entretanto, nao e facil distinguir, de modo rigoroso,
esses dais tipos de enunciados, pais a distinyao, segundo penso, nao e urn trayo da
hipotese, como tal, mas da maneira de emprega-Ia. Se assim acontece, a facilidade
de classificayao dos enunciados deve refletir ausencia de ambigtiidade no alvo que a
hipotese deve atingir. A possibilidade de haver troca de axiomas por tearemas - e
vice-versa - num modelo abstrato, acarreta a possibilidade de troca de "pressupos-
tos" por "implicayoes" - e vice-versa - em hipoteses substantivas associadas ao
modelo. Nao significa isso que qualquer implicaylto possa ver-se intercambiada com
qualquer pressuposto; significa, apenas, que pode haver mais de urn conjunto de
enunciados de que os demais decorram.
Exemplificando, considere-se uma proposiyao particular, na teoria do com-
portamento oligopolista. Se admitirmos que ( a) os empresarios procuram maximi-
zar seus rendimentos por quaisquer vias, inclusive par meio de aquisiyao ou de am-
pliayao do poder monopolista, isso acarretara que ( b ) as empresarios, quando ademanda por urn "produto" e geograficamente instavel, os custos de transporte sao
apreciaveis, os acordos quanta a prey as slto ilegais e 0 numero de produtores do
referido artigo e relativamente pequeno, tenderlto a fixar sistemas de prey os de
ponto-de-referencia. ( 1 ) A afirmaylto ( a ) e vista como pressuposto e ( b ) como
implicayao, pois, aceitamos que a analise tern par objetivo a previsao do comporta-
menta do mercado. 0 pressuposto sera considerado aceitavel se concluirmos que as
condiyoes especificadas em ( b ) se associam, em geral, ao apreyamento de ponto-de-
-referencia e reciprocamente. Alteremos 0 objetivo; ele e 0de identificar aqueles
casos em que vale a pena instaurar urn processo judicial assentado na lei anti-truste,de Sherman, pela qual se prOlbe "ajuste fraudulento para atentado ao livre comer-
cio". Se admitirmos, entlto, que ( c ) 0apreyamento de ponto-de-referencia e artifi-cio deliberado, com 0 proposito de facilitar a coluslto, nas condiytks indicadas
em ( b ), isso acarretara que ( d ) os empresarios que participam de uma tatica de
apreyamento de ponto-de-referencia estarao ligados a urn "ajuste fraudulento para
aten-tado ao livre comercio". 0 que era urn pressuposto, na verslto anterior, passa a
(1)
Ver George J. Stigler, "A Theory of Delivered Price Systems", American Economic Review,
XXXIX (Dezembro, 1949), 1143-57.
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ser uma implica9li'0, nesta segunda versli'o - e reciprocamente. 0pressuposto ( c )
sera dado como valido se concluirmos que, tendo os empresarios adotado urn siste-
ma de apre9amento do ponto-de-referencia, existe, comumente, evidencia adicional- sob a forma de cartas, memorandos, ou coisa anaIoga - de que estamos diante do
que as cortes de justi9a encarariam como "ajuste fraudulento para atentado ao livre
comercio"
Imaginemos que a hip6tese funciona, tendo em vista 0primeiro objetivo, ou
seja,o da previsao do comportamento do mercado. Nao deflui dai, claramente, que
ela funciona quando se tern em vista 0 segundo objetivo, ou seja, 0 de prever se
existe ou deixa de existir evidencia da presen9a de urn "ajuste fraudulento para
atentado ao livre comercio" a justificar uma a9ao judicial. Reciprocamente, se a
hip6tese funciona com respeito ao segundo objetivo, nao deflui, dai que ha defuncionar com respeito ao primeiro. T6davia, faltandoevidencia adicional, 0exito
da hip6tese em urn caso - explicando uma classe de fen6menos - toma maior a
confian9a que nela depositamos ao cogitar de outro caso - explicando outra classe
de fen6menos. E dificil, todavia, dosar esse au~ento de confian9a, pois ele dependede qUaD intimamente julguemos estarem relacionadas as duas classes de fen6menos
o que, por sua vez, depende, em intricada maneira, de tipos anaIogos de evidencia
indireta - ou seja, de experiencia que possamos ter, em outras areas, de como uma
dada teoria esta em condi90es de explicar fen6menos que, em certo sentido, se
mostram "similarmente diversos".
Apresentando 0mesmo ponto em"perspectiva mais geral, 0que denominamos
pressupostos de uma hip6tese presta-se para dar-nos alguma evidencia indireta rela-
tiva a aceitabilidade da hip6tese, na medida em que os pressupostos possam ver-se,eles mesmos, considerados como implica9t'5es da hip6tese (de modo que seu acordo
com a fealidade seja uma forma de nao contraditar algumas implica90es) ou na
medida em que os pressupostos lembrem outras implica9t'5es da mesma hipotese,
susceptiveis de observa9ao causal empirica. ( 1 ) A razao que toma indireta essa
evidencia e a seguinte: os pressupostos ou as implica9t'5es correspondentes referem--se, via de regra, a uma classe de fen6menos que difere da classe que a hipotese pre-
tende explanar; em verdade, como se deixou indicado acima, ai esta 0principal
criterio de que lan9amos mao ao decidir quais os enunciados que consideraremos
"pressupostos" e quais os que consideraremos "implica90es". 0peso associado a
essa evidencia indireta depende de qUaD irltimamente julguemos estarem relaciona-
das as duas classes de fenomenos.
(1)
Ver Friedman e Savage, "The Expected-Utility Hypothesis and the Measurability of Utility",op. cit., pp. 466-67, em que se acha outro exemplo especial desse tipo de teste.
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Outro modo pelo qual os "pressupostos" facilitam 0 teste indireto de uma
dada hip6tese resuIta do fato deles trazerem a ton a a similaridade que ela possa
manter com outras hip6teses, tornando, assim, relevante para a validade da hip6tese
em tela a evidencia que corrobora as demais. Exemplicativamente, suponhamos ter
uma hip6tese relativa a uma particular classe de comportamentos. Ela pode ser
formulada, como de habito, sem fazer alusoes a "pressupostos". Imaginemos poder
mostrar que ela, a par disso, equivale a urn conjunto de outros pressupostos, no qual
se inclua a ideia de que os homens agem em defesa de seus pr6prios interesses. A
hip6tese ganha, assim, plausibilidade indireta, em virtude do exito (em outras clas-
ses de fenomenos) de novas hip6teses em que aquela ideia esteja presente. Na pior
das situayoes, 0 procedimento aqui adotado n[o e totalmente destituido de prece-
dentes ou destituido de exito, relativamente a todas as demais formas de uso daship6teses. Com efeito, enunciar os pressupostos de modo a explicar uma relayao
entre hip6teses superficialmente diversas e dar urn passo no sentido da formulayao
de hip6teses de maior generalidade.
Esse genero de evidencia indireta, relativa a hip6teses correlatas, explica, em
boa medida, os variados graus de confianya que pessoas de formayDes diferentes
associ am a uma particular hipotese. Consideremos, por exemplo, a hip6tese de que
a amplitude de discriminayao racial ou religiosa, na oferta de empregos, numa espe-
cifica area ou numa especifica industria, associa-se intimamente ao grau de mono-
p6lio, na area ou na industria em pauta; de que, sendo a industria competitiva, a
discriminayao somente sera significativa se a raya ou a religiao dos empregados
afetar a disposiyao de outros empregadores (dispostos a aceitar esses empregados)
ou a aceitabilidade do produto fjunto a consumidores), mostrando-se, porem,
nao-correlacionada aos preconceitos dos pr6prios empregadores. ( 1 ) Essa hip6tese
tende a ser muito mais aceitavel para os economistas do que para os soci6logos.
Cabe dizer que ela "presume", entre empregadores, nas industrias competitivas, 0
simples desejo dos beneffcios pecunhlrios; esse "pressuposto" atua de maneira
adequada em uma ampla gama de hip6teses economicas que dizem respeito a vanosfenomenos de massa de que trata a Economia. Ha de parecer razoavel, aos econo-
mistas, que tamoom aqui 0pressuposto poSsa atuar adequadamente. De outro lado,
as hip6teses a que 0 soci610go se habituou possuem urn tipo muito diferente de
modelo, ou de mundo-ideal, em que 0 simples desejQ de beneficios pecuniarios
desempenha papel bem menos importante. A evidencia indireta acessivel ao
(1)
Tratamento rigoroso dessa hip6tese precisaria, e claro, especificar como entender "amplitude da
discriminal;iio racial ou religiosa" e "grau de monopcSlio". Para os presentes objetivos, porem, esuficiente a forrnulal;iio mais ou menos vaga, encontrada no texto.
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soci6logo, no que concerne a essa hip6tese, e muito menos favoravel para ela do quea evidencia indireta acessivel ao economista. 0soci610go, por conseguinte, con tem-
pIa a hip6tese com maior suspei~iIo.E certo que a evidencia do economista e a do soci61ogo niIo se mostram con-
cludentes. 0teste decisivo e 0da atua~lro da hip6tese junto aos fenomenos que ela
pretende explanar. E possivel, entretanto, que, antes da realiza~iIo de qualquer teste
satisfat6rio desse genero (uma realiza~lro que talvez nlro possa ocorrer em futuro
proximo), ~guma avalia~iIo da hipotese venha a tornar-se indispensavel. Em tal
caso, a avalia~[o tera de assentar-se na evidencia inadequada ja recolhida. A par
disso, mesmo quando aquele teste pode ser realizado, 0 "brackground" dos cientis-
tas nlro e irrelevante para as conclusOes que eles obtem. Em ciencia nunca existe
certeza e 0peso da evidencia, pro ou contra uma hipotese, jamais se avalia de ma-
neira totalmente "objetiva". 0economista sera mais tolerante do que 0 soci610go,
ao julgar 0acordo das implica~~es da hip6tese com a experiencia, e tendera, pois, a
acolher a hipotese, ainda que provisoriamente, com base em menor numero de casos
de "conformidade".
v - ALGUMAS IMPLICA(:OES DE INTERESSEPARA AS QUESTOES ECONOMIC AS
As questeses metodologicas abstratas que discutem tern reflexos diretos sobre
a perene critica dirigida cpntra a teoria economica "ortodoxa", tida como "niIo-rea-
lista" e sobre as tentativas de reformul~iIo dessa teoria, feitas com 0 objetivo de
contornar aquela critica. A Edonomia e uma ciencia "desoladora" porque admite
ser 0homem egoista e avido por dinheiro, urn "inflamado calculador de prazeres e
de dores que flutua, como se fOra homogeneo globulo desejoso de felicidade, sob 0
impulso de estimulos que 0empurram de urn lado para outro mas 0 deixam in-
tacto". ( 1 ) A Economia assenta-se em Psicologia ultrapassada e precisa ver-se re-
construida, pondo-se em consonancia com as novas descobertas psicol6gicas. Admi-te que 0 homem ou, pelo menos, 0homem de neg6cios, esta "em constante estado
de 'alerta', preparado para alterar pre~os ou regras de pre~o sempre que sua intui-
~iIo... identifica varia~iIo das condi~~s de oferta e de procura"; ( 2 ) admite que os
mercados s[o perfeitos, a competi~iIo e pura e as mercadorias, 0trabalho e 0 capitals[o homogeneos.
(1)
Thorstein Veblen,. "Why Is Economics Not an Evolutionary Science?" (1898), reimpresso em
THE PLACE OF SCIENCE IN MODERN CIVILIZA nON (New York, 1919), p. 73.
(2 )
Oliver, op. cit., p. 381.
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Como ja vnnos, as criticas desse tipo sli'o mais ou menos inocuas, exceto
quando se vejam suplementadas por evidencia de que outra hipotese, diferente da
teoria criticada em pelo menos urn desses aspectos, conduz a previsoes melhores, em
urn ambito n[o menor de fenomenos. Tais suplementarroes, porem, nli'o aparecemnas criticas - que se assentam, quase inteiramente, em discrepancias supostamente
percebidas de modo direto, entre os "pressupostos" e 0"mundo real". Exemplo
claro e dado pelas-recentes critic as dirigidas contra a hipotese da maximizarrli'o dos
rendimentos, assentada no fato de que os homens de negocios n[o agem e nem
podem agir como a teoria "presume" que 0farram. A evidencia aduzida em apoio
desta afirmarr[o e , de habito, colhida nas respostas oferecidas pelos homens denegocios, quando lhes sli'o feitas perguntas acerca dos fatares que afetam as suas
decisoes (urn procedimento de teste das teorias economic as perfeitamente compara-
vel ao teste das teorias sobre longevidade que se resumisse em indagar, aos octoge-
nanos, de que modo explicariam as suas vidas longas), ou colhida em estudos descri-
tivos referentes as atividades decisorias de firmas individuais. ( 1 )Pouca ou nenhu-
ma evidencia se fomece, relativa a conformidade do comportamento real dos ho-
mens de negocios, no mercado (0 que fazem, em vez do que dizem fazer), com as
implicarroes da hipotese criticada, de urn lado, e com as implicarroes de uma hipote-
se alternativa, de outro lado.
Uma teoria ou os seus "pressupostos" n[o podem ser cabalmente "realistas",
no sentido descritivo imediato, que tli'o freqiientemente se atribui ao termo. Umateoria completamente "realist a" do mercado do trigo teria de incluir nao apenas as
condirroes diretamente subjacentes a oferta e a demanda de trigo, como, ainda,
(1)
Ver H. D. Henderson, "The Significance of the Rate of Interest", Oxford Economic Papers,
n? 1 (Outubro, 1938), 'pp. 1-13; J. E. M{:ade e P. W. S. Andrews, "Summary of Replies to
Questions on Effects of Interest Rates", mesmo local, pp. 14-31; R. F. Harrod, "Price and
Cost in Entrepe~urs' Policy", mesmo periodico, n?2 (Maio, 1939), pp. 1-11; e R. 1. Hall e
C. J. Hitch, "Price Theory and Business Behavior", mesmo local, pp 12-45. Ver, ainda, Lester,
"Shortcomings of Marginal Analysis for Wage-Employment Problems", op. cit.; Gordon, op. cit.Ever, eniun, Fritz Machlup, "Marginal Analysis and Empirical Research", op. ciC, particular-
mente Sec.II,onde se encontrarn cr{ticas pormenorizadas ao metodo dos questiomirios.
Nao pretendo insinuar que sejam imiteis, para todos os objetivos da Economia, os estudos, com
base em questionarios, das motiva\;oes ou das cren\;as a respeito de for\;as que afetam 0compor-
tarnento de homens de negocios ou de outras pessoas. Tais estudos podem ser extremamente
valiosos, sugerindo linhas de pesquisa para a analise das divergencias entre resultados esperados e
observados, ou seja, para a e1abora\;ao de novas hipoteses ou a revisao de hipoteses antigas.
Entretanto, seja qual for 0interesse de que se revistam, nesse prisma, os citados estudos me
Jfarecem completarnente imiteis como forma de submeter a teste a validade de hipoteses eco-
nomicas. Ver, a prop6sito, meu comentario em torno do artig'o de Albert G. Hart, "Liquidityand Uncertainty", American Economic Review, XXXIX (Maio, 1949), 198-99.
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indica
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as discrepiincias entre comportamento previsto e comportamento real. Ate os mais
exagerados advogados dos pressupostos realistas saD obrigados, necessariamente, a
rejeitar seus pr6prios criterios e a aceitar 0
teste de predi
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nada mais faz do que negar 0 estagio preliminar de conhecimento, 0unico em con-
di~oes de dar sentido a atividade cientifica. Vma tal declara~[o se assemelha ao
enunciado, muito justificadamente ridicularizado por John Stuart Mill, segundo 0
qual "afortunadamente, nada mais existe, nas leis relativas ao valor, que os atuais
(l848) e futuros pensadores devam esclarecer; a teoria esta completa." ( 1 )
A confus[o entre acuidade descritiva e relevancia analftica n[o conduziu
apenas as criticas mal fundamentadas, dirigidas contra as teorias econornicas; tam-
bem levou a mal-entendidos em tomo de tais teorias e a uma orienta~[o erronea dos
esfor~os feitos no senti do de escoima-Ias de presumidos defeitos. Os "tipos ideais",
no modelo abstrato desenvolvido por teorizadores, na Econornia, tern sido vistos,
estritamente, como categorias descritivas que se tenciona estejam em corresponden-
cia direta e cabal com entidades do mundo real, independentemente do objetivoque leva ao uso do modelo. As discrepancias 6bvias conduziram a tentativas neces-
sariamente mal sucedidas de elaborar teorias com base em categorias que pretendem
ser completamente descritivas.
Essa tendencia tern sua mais clara ilustra~[o, possivelmente, na interpreta~!'o
dada aos conceitos de "concorrencia perfeita" e de "monop6lio" e no desenvolvi-
mento da teoria da concorrencia "monopolista", ou "imperfeita". Marshall, segun-
do se afirma, adrnitiu a "concorrencia perfeita"; e possivel que tal coisa tenha exis-tido algum dia. Mas ja nlio existe, de modo quee preciso abandonar as suas teorias.
o leitor procurara longa e arduamente - e, segundo minhas previ~s: sem exito -se quiser achar, nos escritos de Marshall, qualquer pressuposto explicito acerca da
concorrencia perfeita ou qualquer afirma~lio em que se registre ser 0mundo, em
sentido descritivo, composto por firmas isoladas envolvidas em uma concorrencia
perfeita. Ao contrario, 0que se encontra nos escritos de Marshall e isto: "Em umaextremidade estlio os mercados mundiais, em que a concorrencia atua diretamente,
vinda de todas as partes do globo; em outra est[o os mercados insulados, para os
quais a concorrencia vinda de longe esta fora de cogita~oes, embora a concorrencia
indireta e transmitida possa fazer-se sentida mesmo ai; de permeio, entre as duas
extremidades, estao quase todos os mercados que os econornistas e os homens de
neg6cios tern de estudar." ( 2 I Marshall encarou 0 mundo como elee ; pensou emconstruir urn "mecanismo" para analisa-Io, mas n[o em uma reprodu~[o fotografica
do mundo.
Analisando 0mundo como elee , Marshall formulou a hip6tese de que, para a(1)
PRINCIPLES OF POLITICAL ECONOMY (Ashley, organizador; Longmans, Green & Co.,
1929), p. 346.
( 2 )PRINCIPLES, p. 329; ver, tambem, pp. 35, 100,.341,347,375 e 546.
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resoluy1i'ode numerosos problemas, as firmas podiani ser agrupadas em "indus trias" ,
de tal modo que as similaridades das firmas de urn mesmo grupo superassem, em
importancia, as diferenyas que entre etas pudessem existir. Os problemas em tela s1i'o
aqueles em que 0 elemento notorio a considerar e 0de as firmas de urn grupo se
verem analogamente afetadas por urn dado estimulo; ha, digamos, uma alteray1i'o
comum na demanda pelos artigos que as firmas produzem ou no fornecimento
desses artigos. Todavia, a tatica n1i'o se'aplica a todos os problemas, ja que, em
muitos casos, 0 eleme1\lto importante a considerar e, justamente, 0dos efeitos dife-
renciadores que demanda e oferta pod em ter sobre firmas particulares.
o modelo abstrato associado a essa hipotese de Marshall con tern dois tipos"ideais" de firmas: firmas competitivas atomizadas, agrupadas em industrias, e
firmas monopolistas. Vma firma se diz competitiva quando a curva de demanda
concernente a sua produy1i'o e infinitamente elastica, relativamente ao seu propriopreyo, para algum preyo e toda a produy1i'o, tendo em conta os pre.yos cobrados por
todas as demais firmas; a firma pertence a uma "industria" definida como urn grupo
de firmas que fabricam urn unico "produto". Urn "produto" e defmido como cole-
y1i'ode unidades que, aos olhos do consumidor, n1i'ose distinguem umas das outras,
de modo que a elasticidade da demanda, no que concerne a produyao de uma firma,com respeito ao preyo de outra firma da mesma industria, se toma infinita, para
algum preyo e certas produyoes. Vma firma se diz monopolista quando a curva de
demanda, concernente a sua produyao, n1i'oe infinitamente elastica, para urn dadopreyo, relativamente a todas as produyoes. ( 1 ) Se a firma e monopolista, elapropria e uma industria. ( 2 )
Como sempre, a hipotese, no seu todo, consiste n1i'o apenas desse modelo
abstrato e de seus tipos ideias, mas tambem de urn conjunto de regras, quase sempre
implicitas, sugeridas por exemplificay[o, que permita identificar firmas reais a urn
ou outro de tais tipos ideais e permita classificar as firmas, para situa-Ias em indus-
trias. Os tipos ideais n1i'otern a pretensao de ser descritivos; s[o concebidos a fim de
isolar os' trayos que se nrostrem relevantes para a resoluyao de urn particular pro-
blema. Ainda que pudessemos fazer estimativas diretas e acuradas da curva de de-
marida para urn produto da firma, n[o nos seria permitido dizer, de imediato, que
(1)
Esse tipo ideal pode ser dividido em dois: a firma oligopolista, se a curva de demanda para 0
produto e infmitamente elastica, a urn dado pre~, para alguns, mas mlo todos os produtos; e afirma propriamente monopolista, se a curva de demanda mlo e infinitamente elastica em qual-
quer de seus pontos, exceto, possivelmente, no ponto que corresponda a uma produ~ao nula.
(2 )
Para 0 adepto do oligopolismo caracterizado na precedente nota, uma industria sera definida
como grupo de f"rrmasque produzem urn mesmo produto.
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ela e perfeitamente competitiva ou monopolista, segundo a finitude ou nao-finitude
da elasticidade daquela curva. Nenhuma curva de demanda, efetivamente observada,
e perfeitamente horizontal, de modo que a elasticidade estimada sempre sera finita.
A questao relevante, invariavelmente, e a de saber se a elastieidade toma valores"suficientemente" grandes a ponto de poder ser vista como infinita. Essa questao,
entretanto, nao adrnite resposta definitiva com base, apenas, no valor numerico da
propria elasticidade - exatamente como nao podemos dizer, de uma vez por todas,
que a pressao atmosferica de quinze libras por polegada quadrada esta "suficiente-
mente" proxima de zero a ponto de permitir 0 usa da formula s= (1/2) 9t2.Analogamente, nao nos e dado calcular as elasticidades-cruzadas da demanda para,
em seguida, classificar as firmas, distribuindo-as em industrias, segundo a existencia
de "substancial hiato nas elasticidades-cruzadas da demanda". Como diz Marshall,
"Saber onde tra
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exemplo. ( 1 )
De outro fado, a hip6tese de que as fabric as de cigarros agiriam como se
fossem perfeitamente concorrentes teria sido urn falso guia para 0
estudo de suasreac;i5esao controle de prec;os, durante a Segunda Guerra Mundial - 0que se reco-
nheceria are mesmo antes do evento. as custos das fabricas de cigarros devem ter
subido no periodo da guerra. Em tais condic;oes, competidores perfeitos teriam
reduzido a quantidade oferecida para venda a prec;os antigos. Todavia, cabe presu-
mir que, mantidos os prec;os antigos, 0aumento da renda dos consumidores, na
epoca do conflito, aumentaria a demanda. Em condic;oes de concorrencia perfeita, a
estrita adesao ao prec;o legal acarretaria nao apenas "escassez", (no sentido de que a
quantidade solicitada superaria a quantidade oferecida), como, ainda, urn declinio
absoluto do numero de cigarros produzidos. as fatos contraditam essa particularconsequencia: houve, na verdade, ades[o razoavelmente boa aos prec;os maximos
dos cigarros e, no en tanto, as quantidades produzidas aumentaram substancialmen-
te. A fOflra comum dos custos aumentados agiu, presumivelmente, com menos in-
tensidade do que a fore;:a de ruptura, representada pelo desejo, em cada firma, de
conservar sua porC;ao do mercado e de manter 0valor e 0prestigio do nome de seu
produto - especialmente quando os impostos sobre excesso de lucros desviou, para
o govemo, uma grande parte dos gastos com a propaganda. No que conceme a este
problema especifico, as firmas fabricantes de cigarros n[o poaem ser tratadas como
se fossem concorrentes perfeitos.
a cultivo de trigo e lembrado, frequentemente, para ilustrar a concorrencia
perfeita. Entretanto, assim como e_legitimo, para alguns problemas, cogitar dos
produtores de cigarros como se formassem uma industria perfeitarnente competiti-
va, nlfo e legitimo, para outros problemas, cogitar dos produtores de trigo nesses
termos. Exemplificlltivamente, n[o e conveniente tratar os produtores de trigo
como se constituissem uma industria perfeitamente competitiva se a quest[o em
foco e ados prec;os diferenciados que os operadores de maquinas da regi[o pagarn
pelo trigo.As ideias de Marshall mostraram-se muito uteis para a analise de problemas
em que urn grupo de firmas e afetado por urn estimulo comum e em que as firmas
podem ser tratadas como se fossem concorrentes perfeitos. Ai esta a fonte do
mal-entendido que levou a admitir haver Marshall "presumido" a concorrencia per-
feita, em algum sentido descritivo. Seria altarnente conveniente dispor de uma
teoria roais geral do que a p,roposta por Marshall, uma teoria que englobasse, ao
mesmo tempo, os casos em que tern e os casos em que n[o tern importancia essen-
( 1)as trechos citados saodos PRINCIPLES.
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cial a diferencia9ao de produtos ou a red