Upload
joseserra
View
405
Download
5
Embed Size (px)
Citation preview
1
FUNDAMENTOS DA FÍSICA MODERNA E CONTEMPORÂNEA
Unidade IV – TEORIA ATÔMICA DA MATÉRIA
A ESTRUTURA ATÔMICA DA MATÉRIA
O Modelo Atômico de Dalton
Em 1808 o físico e químico escocês John Dalton (1766-1844, vide figura 1)
retomou a idéia dos gregos antigos acerca do conceito de átomo e formulou
seu próprio modelo atômico em um trabalho intitulado “A New System of
Chemical Philosophy” que foi apresentado em Manchester e publicado em
Londres pela Dawson. Em suas palavras, disse: “Há três distinções nos tipos
de corpos, ou três estados, os quais têm especificamente chamado mais a
atenção dos químicos, a saber, aqueles que são marcados pelos termos fluidos
elásticos, líquidos, e sólidos. Um exemplo mais famoso nos é exibido pela
água, de um corpo que, em certas circunstâncias, é capaz de assumir todos os
três estados. No vapor, nós reconhecemos um fluido perfeitamente elástico, na
água um líquido perfeito, e em gelo um sólido completo. Essas observações
têm tacitamente levado à conclusão que parece universalmente adotada, que
todos os corpos de magnitudes razoáveis, sejam líquidos ou sólidos, são
constituídos de um vasto número de partículas extremamente pequenas, ou
átomos de matéria ligados por uma força de atração, que é mais ou menos
poderosa de acordo com as circunstâncias, e que como ela se esforça para
evitar sua separação, é apropriadamente chamada nessa visão, atração de
coesão; mas quando ela as coleta a partir de um estado disperso (como a partir
do vapor para formar água) ela é chamada atração de agregação, ou
simplesmente afinidade. Quaisquer que sejam os nomes que possam ter, elas
significam ainda uma e a mesma capacidade. Não é meu plano chamar a
questão essa conclusão, que me parece completamente satisfatória; mas
mostrar que, todavia não fizemos uso dela, e que a conseqüência de desprezá-
la tem sido a visão muito obscura da atuação dos químicos, que está
2
crescendo diariamente mais em proporção às novas luzes que estão tentando
ser lançadas sobre ela.”
Figura 1: Quadro a óleo de John Dalton. reich-chemistry.wikispaces.com
Outra passagem do trabalho de Dalton diz: “Quando um corpo qualquer existe
no estado elástico, suas partículas básicas são separadas uma das outras por
distâncias muito maiores do que em qualquer outro estado; cada partícula
ocupa o centro de uma esfera comparativamente grande, e suporta a si mesma
ao suportar todo o resto em decorrência da gravidade, que do contrário
tenderia a avançar sobre ela a uma distância considerável. Quando tentamos
conceber o número de partículas em uma atmosfera, isto é de alguma forma
igual a tentar conceber o número de estrelas no universo; nós ficamos
confusos com o próprio pensamento. Mas se limitarmos o objeto tomando-se
um dado volume de qualquer gás, somos persuadidos a pensar que se
fizermos divisões tão ínfimas desse volume, o número de partículas deve ser
finito, justamente como em um dado espaço do universo o número de estrelas
e planetas não pode ser infinito.”
Assim, percebe-se que no modelo atômico de Dalton, cada átomo de um
elemento químico é uma esfera maciça que interage de alguma forma com
outros átomos, mas que em qualquer porção de matéria os átomos são
encontrados em número enorme, mas finito, e mantidos a certa distância entre
si. Esse modelo ficou conhecido como “modelo de Dalton das bolas de bilhar”,
3
já que os átomos seriam esferas maciças e duras, semelhantes a bolas de
bilhar, mas de tamanhos diferentes e massas diferentes. Dalton também fez
uma interessante explanação acerca de como os átomos estão ligados nos
compostos químicos e deu uma classificação desses compostos quantos ao
número de átomos presentes. Perceba como ele começou a abordar o assunto
nesta próxima passagem: “Em todas as investigações químicas tem-se
justamente considerado o importante objetivo de apurar os pesos relativos dos
simples que constituem um composto. Mas infelizmente a investigação
terminou aqui, embora a partir dos pesos relativos em massa, os pesos
relativos das partículas fundamentais ou átomos dos corpos poderiam ter sido
inferidos por intermédio de seu número e peso em vários outros compostos em
que aparecem, de maneira a auxiliar e guiar futuras investigações e corrigir
seus resultados. Agora, é o maior objetivo deste trabalho apresentar a
importância e a vantagem de investigar os pesos relativos das partículas
fundamentais de ambos os corpos simples e compostos, o número de
partículas elementares simples que constitui uma partícula composta e o
número de partículas menos compostas que entra na formação de uma
partícula mais composta”. A classificação foi dada nesta próxima passagem:
“Se dois corpos, A e B, que estão dispostos a se combinar, o que se segue é a
ordem em as combinações podem ocorrer, começando com o mais simples, a
saber,
1 átomo de A + 1 átomo de B = 1 átomo de C, binário.
1 átomo de A + 2 átomos de B = 1 átomo de D, ternário.
2 átomos de A + 1 átomo de B = 1 átomo de E, ternário.
1 átomo de A + 3 átomos de B = 1 átomo de F, quaternário.
3 átomos de A + 1 átomo de B = 1 átomo de G, quaternário.
&c. &c.
As seguintes regras gerais podem ser adotadas como guias em todas as
nossas investigações respeitando a síntese química:
1ª – Quando apenas uma combinação de dois corpos pode ser obtida,
deve-se presumir que ela deva ser binária a menos que alguma outra
causa apareça em contrário;
4
2ª – Quando duas combinações são observadas, deve-se presumir que
elas sejam uma binária e outra ternária;
3ª – Quando três combinações são observadas, deve-se presumir que
elas sejam uma binária e outras duas ternárias;
4ª – Quando quatro combinações são observadas, devemos esperar
uma binária, duas ternárias e uma quaternária, &c;
5ª – Um composto binário deve sempre ser especificamente mais
pesado (N.T.: ter densidade maior) que uma mera mistura de seus dois
ingredientes;
6ª – Um composto ternário deve ser especificamente mais pesado (N.T.:
idem) que a mistura de um binário e um simples, os quais se
combinados irão constituí-lo, &c;
7ª – As regras e observações aplicam-se igualmente a corpos tais como
os corpos C e D, D e E, &c. são combinados”.
A partir da aplicação dessas regras, Dalton investigou alguns fatos químicos e
tirou as seguintes conclusões:
1) A água é um composto binário de hidrogênio e oxigênio e os pesos
relativos dos dois átomos elementares são de 1:7 aproximadamente
(hoje se sabe que são de 1:16). Dalton errou ao pensar que a fórmula da
água seria simplesmente HO e não 𝐻2𝑂, mas a correta relação entre as
massas atômicas é de 2: 16 = 1: 8;
2) A amônia é um composto binário de hidrogênio e azoto (nitrogênio) e os
pesos relativos dos dois átomos são de 1:5 aproximadamente (hoje se
sabe que são de 1:14). Outro erro de Dalton ocorreu ao pensar que a
fórmula da amônia seria NH e não 𝑁𝐻3. Mas como a relação é 3H para
1N, 3: 14 ≈ 1: 5, a relação é aproximadamente correta;
3) O gás nitroso (óxido nitroso) é um composto binário de azoto (nitrogênio)
e oxigênio, os átomos dos quais pesam 5 e 7, respectivamente. O ácido
nítrico é um composto binário ou ternário de acordo como ele é derivado
e consiste de um átomo de azoto (nitrogênio) e dois de oxigênio, juntos
pesando 19; o óxido nitroso é um composto similar ao ácido nítrico e
consiste de um átomo de oxigênio e dois de azoto (nitrogênio), pesando
5
17; o ácido nitroso é um composto binário de ácido nítrico e gás nitroso,
pesando 31; o ácido oxinítrico é um composto binário de ácido nítrico
com oxigênio, pesando 26;
4) O óxido carbônico (gás carbônico) é um composto binário consistindo de
um átomo de carvão (carbono) e um de oxigênio, pesando
aproximadamente 12; o ácido carbônico é um composto ternário (mas
algumas vezes binário) consistindo de um átomo de carvão (carbono) e
dois de oxigênio, pesando 19.
É importante frisar que Dalton foi o primeiro a utilizar o peso atômico em
unidades de átomos de hidrogênio, tomando-os como valores unitários,
padronizando assim essa técnica. Percebe-se que Dalton cometeu vários
erros, principalmente em relação à fórmula molecular dos compostos, apesar
de estar sempre parcialmente correto e próximo da verdade. Avogadro
introduziu o conceito de molécula, cunhando este termo, e formulou uma
hipótese em 1811 conhecida como hipótese de Avogadro que afirma que em
volumes iguais de gases de substâncias diferentes nas mesmas condições de
temperatura e pressão há o mesmo número de moléculas.
Outro avanço dado por Dalton foi uma tentativa de sistematização dos átomos
na forma de uma tabela de pesos atômicos construída por ele. A tabela original
aparece em cópia na figura 2.
É importante notar que dentro das escassas possibilidades técnicas da época,
Dalton foi brilhante ao dar início ao processo de sistematização e organização
da estrutura atômica. Outros cientistas, tais como Gay-Lussac, Avogadro,
Proust, Berthollet, Prout, Meyer e Mendeleiev deram contribuições valiosas
para o avanço da teoria atômica da matéria.
O Átomo de Hidrogênio e seu Espectro
No início do séc. XIX, Joseph Fraunhofer, um físico que trabalhava em uma
grande vidraria e fábrica de instrumentos científicos de Munique, ao procurar
6
melhorar as lentes de instrumentos astronômicos, dedicou-se ao estudo da
refração da luz e dos prismas. Ele decompôs a luz nas várias cores do
espectro e colocou uma pequena luneta para observar melhor o espectro.
Assim, ele descobriu em 1814 que o espectro solar possui inúmeras linhas
escuras, hoje conhecidas como linhas de Fraunhofer . Não se tratava de uma
imperfeição do aparelho, mas sim uma característica da luz solar. Ele mapeou
a posição relativa das linhas e as marcou com letras que são utilizadas ainda
na atualidade. Ao observar a luz de Vênus, constatou que era idêntica ao
espectro da luz solar, algo que já era esperado (trata-se da luz solar refletida).
No entanto, ao analisar a luz da estrela Sirius
e seu espectro e de outras estrelas também,
ele percebeu que eram diferentes do
espectro solar. Estava inaugurado assim o
caminho para a espectroscopia estelar, base
da Astrofísica.
Trabalhando juntos, Kirchhoff e Bunsen, dois
cientistas alemães, começaram seus estudos
espectrais pela linha escura D de Fraunhofer.
Ambos estabeleceram que a cada elemento
químico sempre corresponde um espectro
bem determinado, que não depende da
natureza do composto do qual o elemento faz
parte. O espectro equivale a uma “impressão
digital” de cada uma das partes que
compõem uma substância, servindo para
identificá-la. Observaram também que os
espectros emitidos por sólidos ou gases densos incandescentes são contínuos,
em que as cores vão do vermelho ao violeta sem interrupções perceptíveis. Por
outro lado, como os espectros emitidos por pelos gases rarefeitos são linhas,
as cores e o número dessas linhas servem para caracterizar cada elemento. A
Figura 2: Tabela de elementos e compostos construída por Dalton.
7
partir dessas observações, conclui-se que, para determinar os componentes de
uma substância sólida, basta vaporizá-la antes numa chama.
Nº Elemento Peso Relativo Nº Elemento (fórmula) Peso Relativo
1 Hidrogênio 1 21 Água (HO) 8
2 Azoto (nitrogênio) 5 22 Amônia (NH) 6
3 Carbono ou carvão 5 23 Gás nitroso (NO) 12
4 Oxigênio 7 24 Etileno (CH) 6
5 Fósforo 9 25 Óxido Carbônico (CO) 12
6 Enxofre 13 26 Óxido Nitroso (𝑁2𝑂) 17
7 Magnésio 20 27 Ácido Nítrico (𝑁2𝑂) 19
8 Cal (óxido de
cálcio) 23
28 Ácido Carbônico (𝐶𝑂2) 19
9 Barrilha
(carbonato de
sódio)
28
29 Hidrogênio
Carburetado (𝐶𝐻2) 7
10 Potássio 42 30 Ácido Oxinítrico (𝑁𝑂3) 26
11 Água de Estronita
(monóxido de
estrôncio)
46
31 Ácido Sulfúrico (𝑆𝑜3) 34
12 Água de Barita
(monóxido de
bário)
68
32 Hidrogênio Sulfuretado
(𝑆𝐻3) 16
13 Ferro 38 33 Álcool (𝐶3𝐻) 16
14 Zinco 56
34 Ácido Nitroso (1 ácido nítrico + 1 gás nitroso)
31
15 Cobre 56
35 Ácido Acético (2C+ 2 água)
26
16
Chumbo 95
36 Nitrato de Amônia (1
ácido nítrico + 1 amônia
+ 1 água) 33
17 Prata 100
37 Açúcar (1 álcool + 1 ácido carbônico)
35
18 Platina 100 38
19 Ouro 140 39
20 Mercúrio 167 40
Figura 3: Tabela dos pesos atômicos de substâncias simples e compostas com as fórmulas dadas (erroneamente) por Dalton.
8
A figura 4 mostra um espectro típico com as linhas claras e as linhas escuras.
Figura 4: Vários espectros discretos e abaixo se encontra o espectro contínuo.
http://web.stteresa.edu.hk/~kfyuen/s6spectrum2.jpg
No caso do espectro do átomo de hidrogênio, as linhas espectrais foram
obtidas fenomenologicamente (isto é, inferindo fórmulas que se ajustam aos
resultados experimentais), conhecidas atualmente pelo nome de seus
descobridores. Assim, há a série de Lyman, de Balmer, de Paschen e outras,
cada série produzindo um conjunto de linhas espectrais para o átomo de
hidrogênio. É importante frisar que os espectros discretos de linhas claras são
os espectros de emissão que ocorrem em gases rarefeitos; os mesmos
espectros em linhas escuras são espectros de absorção que ocorrem em
rarefeitos após um espectro contínuo passar por gases rarefeitos; finalmente, o
espectro contínuo é formado em sólidos e gases densos. As séries de Lyman,
de Balmer, de Paschen e outras são apresentadas na tabela 1.
O Modelo do “Pudim de Ameixas” de J.J. Thomson
Esse modelo foi favoravelmente bem recebido por seus contemporâneos por
estar de acordo com a teoria eletromagnética do elétron de Maxwell e Lorentz.
O propósito principal no desenvolvimento desse modelo era explicar o
espalhamento de partículas carregadas eletricamente ao passar através de
uma fina lâmina de matéria. Nesse modelo supunha-se que o átomo seria
9
composto de N corpúsculos negativamente carregados acompanhados por
uma quantidade de eletricidade positiva uniformemente distribuída por uma
esfera, parecendo um pudim de ameixas. Confira a figura 5.
Tabela 1: Tabelas das séries espectrais para o átomo de hidrogênio.
Lyman UV 1
𝜆= 𝑅[𝑒𝑉]
1
12−
1
𝑛2
𝑛 = 2,3,4,…
Balmer Próximo ao UV e
visível
1
𝜆= 𝑅[𝑒𝑉]
1
22−
1
𝑛2
𝑛 = 3,4,5,…
Paschen IV 1
𝜆= 𝑅[𝑒𝑉]
1
32−
1
𝑛2
𝑛 = 4,5,6,…
Brackett IV 1
𝜆= 𝑅[𝑒𝑉]
1
42−
1
𝑛2
𝑛 = 5,6,7,…
Pfund IV 1
𝜆= 𝑅[𝑒𝑉]
1
52−
1
𝑛2
𝑛 = 6,7,8,…
Em experiências de espalhamento, o critério crucial para a boa aceitação de
um modelo atômico é o ângulo que uma partícula carregada é defletida a partir
de sua direção original de movimento quando ela passa através de uma folha
de metal usada como centro espalhador. Thomson assumiu que o ângulo de
Figura 5: Modelo de "pudim de ameixas" de J.J. Thomson.
http://en.wikipedia.org/wiki/File:Plum_pudding_atom.svg
desvio sofrido por uma partícula carregada era sempre causado por um grande
número de colisões com muitos átomos. Qualquer colisão única executava
apenas um papel mínimo no desvio total, o qual era decorrência de um efeito
cumulativo. Pode-se mostrar que, com base no modelo de Thomson o desvio
10
total não é o desvio médio produzido em uma simples colisão multiplicado pelo
número de colisões; ao invés, a multiplicação é por uma raiz quadrada da soma
das colisões, 𝑚𝜃, em que θ é o ângulo de deflexão e m é o número de
colisões considerado grande. Assim, se cada colisão resultava da média em
um desvio de 1°, apenas 0.100 colisões dariam surgimento a um desvio total
de apenas 10°.
A principal falha nas previsões dadas pelo modelo de Thomson é que o modelo
não previa grandes ângulos de espalhamento já que os elétrons blindariam a
nuvem positiva esférica e não haveria carga efetiva positiva alta o suficiente
para causar uma grande deflexão. O valor máximo previsto seria de 10−4
radianos.
Espalhamento de Rutherford
Ao final do séc. XIX as partículas α e β foram descobertas por Becquerel a
partir de elementos radioativos. Descobriu-se que as partículas α são
carregadas positivamente e que as partículas β possuem carga elétrica
negativa. Sabia-se que ambas sofriam deflexões de suas trajetórias retilíneas
em colisões com átomos, porém as partículas α faziam colisões bem mais
violentas do que as partículas β, transferindo mais energia e mais momento
para o alvo. A hipótese principal para essas deflexões era que as partículas α e
β, sendo partículas carregadas, encontrariam um campo elétrico muito forte
para interagir com elas e assim poder defleti-las. Seguindo o modelo atômico
de Dalton, qualquer folha metálica conteria um número de camadas de átomos
que seria suficiente para causar múltiplos espalhamentos em um feixe de
partículas α ou β, tal como o observado na figura 6.
Ernst Rutherford sugeriu a dois discípulos que fizessem uma experiência de
espalhamento para tentar sondar uma possível estrutura atômica. Os seus
nomes eram Geiger e Marsden. Eles fizeram espalhamentos de partículas α
em uma folha de ouro de 0.00004 cm de espessura, o equivalente a frenagem
de partículas α em 1.6 mm de ar. Um dos resultados confirmou a previsão de
11
que apenas uma pequena fração das partículas incidentes seria espalhada em
um ângulo médio de 90°: apenas uma em 20 000.
Figura 6: Esquema mostrando o espalhamento de partículas alfa em uma folha metálica.
http://www.sdsc.edu/us/visservices/projects/discovery/images/nucwall.jpg
Geiger mostrou mais tarde que o ângulo mais provável de deflexão era de
aproximadamente 0.87°. Um cálculo simples, segundo Rutherford, mostra que
a chance de uma partícula α ser defletida de um ângulo de 90° é quase zero,
mas não nula. Desta forma, Rutherford chegou às seguintes conclusões (por
meio de cálculos teóricos):
1. A distribuição de partículas α para ângulos grandes de deflexão não
segue a lei de probabilidade que se esperaria se tais deflexões são
constituídas de um grande número de pequenos desvios. Parece
razoável supor que a deflexão de um ângulo grande é causada por uma
única violenta colisão com um átomo;
2. A chance de ocorrer uma segunda colisão com deflexão grande é
excessivamente pequena;
3. O átomo deve possuir um campo elétrico excessivamente forte para
produzir deflexões dessa envergadura.
12
O trabalho de Rutherford impõe sua teoria do espalhamento de partículas α por
átomos compostos de um pequeno núcleo centralmente localizado e carregado
positivamente envolto por uma esfera de carga igual a do núcleo, mas negativa
e uniformemente distribuída, cujo efeito sobre as partículas espalhadas é
desprezível. As ordens de magnitude tratadas no trabalho de Rutherford foram
de 10−14 𝑚 para o raio nuclear e de 10−10 𝑚 para o átomo inteiro. Imaginando-
se que elétrons com cargas negativas discretas estavam presentes ao invés de
uma distribuição contínua de cargas negativas, então o átomo nuclear deveria
ser constituído principalmente de espaço vazio. A fórmula de espalhamento de
Rutherford previu que a fração das partículas α espalhadas por uma folha fina
metálica deveria ser proporcional:
1. Ao inverso de 𝑠𝑒𝑛4 𝜙
2 , em que ϕ é o ângulo que a partícula α é defletida
ao colidir com um átomo da folha metálica;
2. À espessura da folha de ouro, que deve ser pequena para que isto
ocorra;
3. Ao quadrado da carga nuclear Ne;
4. Ao inverso da quarta potência da velocidade v de bombardeamento das
partículas α.
As experiências de Geiger e de Marsden foram propostas e interpretadas por
Rutherford e resultaram no que é freqüentemente conhecido como “modelo
atômico de Rutherford”.
O Modelo Atômico de Bohr
O modelo de Bohr foi apresentado em 1913 como um trabalho de fundamental
importância para a compreensão da estrutura da matéria e mais um trabalho a
corroborar o trabalho seminal de Max Planck sobre o espectro de radiação do
corpo negro em que ele apresentou o quantum elementar de energia em
termos de uma constante hoje conhecida como constante de Planck, h. Na
época, o problema que ele se propôs a resolver era o da falta de estabilidade
do modelo atômico de Rutherford, em que os elétrons estariam movendo-se
em torno do núcleo atômico em órbitas fechadas circulares de forma muito
semelhante ao sistema solar. No entanto, em tais órbitas os elétrons teriam
13
uma aceleração centrípeta que os fariam curvar suas órbitas, mas a
Eletrodinâmica Clássica de Maxwell afirma que toda carga elétrica acelerada
emite radiação, perdendo energia em conseqüência e, no caso do movimento
em torno do núcleo, caindo em movimento espiralado para uma colisão de
encontro ao núcleo. Esta situação é conhecida atualmente como colapso
atômico. A direta contradição que havia entre o modelo atômico de Rutherford
e a Eletrodinâmica Clássica gerava um sentimento geral em relação à
inadequação da Eletrodinâmica Clássica aos sistemas de dimensão atômica.
Mas é inegável o sucesso do modelo de Bohr na descrição do espectro do
átomo de hidrogênio, uma prova de que a Física Clássica estaria encontrando
os seus limites de aplicabilidade e uma nova teoria estaria surgindo.
Figura 7: Niels Bohr em foto tirada na época da apresentação do modelo atômico que leva seu nome.
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Niels_Bohr.jpg
Bohr construiu sua teoria fundamentando-se sobre três postulados que foram
introduzidos a fim de manter a estabilidade atômica, a saber:
1) O elétron está em uma órbita estacionária estável em que não irradia,
orbitando com velocidade v muito menor do que a velocidade da luz e
com massa m desprezível comparada à massa do núcleo;
2) O equilíbrio dinâmico dos sistemas nos estados estacionários pode ser
discutido com a ajuda da mecânica ordinária, enquanto a passagem dos
sistemas entre estados estacionários diferentes não podem ser tratados nesta
base;
14
3) Este último processo é seguido pela emissão de uma radiação homogênea
para a qual a relação entre a freqüência e a quantidade de energia emitida é
dada pela teoria de Planck, isto é,
|𝐸𝑗 − 𝐸𝑖| = ℎ𝜈.
No modelo de Rutherford, assumiu-se que os elétrons moviam-se em órbitas
circulares de raio r e velocidade v em torno do núcleo, tais como os planetas se
movem em torno do Sol no sistema solar. Neste caso, pode-se igualar a força
de atração coulombiana com a força centrípeta para o átomo de hidrogênio,
𝑚𝑣2
𝑟:
𝑒2
4𝜋𝜖0𝑟2=
𝑚𝑣2
𝑟= 𝑚𝑟𝜔2.
A energia total deve ser a soma da energia cinética com a energia potencial,
sendo que esta última é negativa, uma vez que o átomo de hidrogênio forma
um estado ligado e todo estado ligado possui energia potencial negativa.
Assim, pode-se escrever
𝐸 =1
2𝑚𝑟2𝜔2 −
𝑒2
4𝜋𝜖0𝑟
Da igualdade entre as forças centrípeta e elétrica, tem-se que
𝑒2
4𝜋𝜖0𝑟= 𝑚𝑟2𝜔2,
de forma que a energia pode ser escrita como
𝐸 = −1
2·
𝑒2
4𝜋𝜖0𝑟
que é a energia total de ligação do elétron com o núcleo. Percebe-se que para
𝑟 → ∞ a energia 𝐸 → 0, ou seja, a uma distância grande o suficiente o elétron
desliga-se do núcleo. Nessa situação Bohr assumiu que o elétron teria
velocidade praticamente nula em relação ao núcleo. Percebe-se que Bohr nada
diz acerca do comportamento do elétron durante o momento em que ele salta
de um nível de energia para outro a não ser mais um princípio: "...devemos
renunciar a todas as tentativas de visualizar ou de explicar classicamente o
comportamento do elétron ativo durante uma transição do átomo a partir de um
estado estacionário para outro".
15
Pode-se resolver a freqüência angular em função da energia, chegando-se à
seguinte expressão
Bohr assumiu que o momento angular é quantizado
Como
𝑒2
4𝜋𝜖0𝑟2=
𝑚𝑣2
𝑟
então,
Substituindo na fórmula da quantização do momento angular, tem-se
Pode-se calcular o raio para a órbita mais baixa, n=1, utilizando os seguintes
valores
16
resultando em
Este é conhecido atualmente por raio de Bohr do átomo de hidrogênio.
A energia o n-ésimo nível é dada por
A unidade de energia atômica típica não é o joule, mas o elétron-volt (eV), que
é a energia que um elétron ganha ao ser acelerado com a diferença de
potencial de 1V. Há a seguinte relação de conversão de joule para elétron-volt:
A massa do elétron pode ser dada em elétron-volt (unidade de energia) desde
que seja dividida pela velocidade da luz ao quadrado pela fórmula de Einstein
𝐸 = 𝑚𝑐2. Assim, pode-se escrever
Outra constante que pode ser escrita em termos de elétron-volt é a constante
de Planck dividida por 2𝜋, a constante ћ. Seu valor é
17
Assim, a energia do nível n do átomo de hidrogênio é dada por
Com ela é possível calcular, por exemplo, qual será a freqüência da luz emitida
pelo átomo quando um elétron salta do nível 3 para o nível 2, bastando fazer
𝐸3 − 𝐸2 = ℎ𝜈. Veja a figura.
Figura 8: Modelo de Bohr representando esquematicamente a emissão de um quantum de luz após transição de níveis eletrônicos de energia.
https://reich-chemistry.wikispaces.com/file/view/Bohr_atom_model_English.svg.png
A combinação de constantes que aparece na fórmula da energia do n-ésimo
nível é conhecida atualmente como constante de Rydberg, é denotada por 𝑅[𝑒𝑉]
e possui unidades de energia [eV]:
18
A energia do fóton que é emitido ao passar de um nível inicial mais alto do que
o final, 𝛥𝐸, é dada por fórmula de Rydberg
A generalização para um átomo de número atômico Z (carga nuclear +Ze e
carga eletrônica –Ze) é
É interessante notar que a constante de Rydberg em unidade de energia pode
ser trabalhada matematicamente para assumir uma forma mais interessante.
Para isto, basta multiplicá-la e dividi-la pela velocidade da luz ao quadrado:
em que α é conhecida como constante de estrutura fina, 𝑚𝑐2 é a massa do
elétron expressa em eV, e α pode ser calculada a partir de constantes
conhecidas:
de maneira que
O valor pequeno de α permite fazer m procedimento conhecido como teoria da
perturbação, que é um procedimento sistemático para acrescentar correções
às soluções de problemas que foram resolvidos de maneira aproximada,
refinando assim essas soluções.
A energia do fóton emitido é dada por
19
em que agora é possível obter com a teoria do átomo de Bohr a fórmula de
Rydberg, que era originalmente uma fórmula empírica, isto é, obtida por
intermédio de dados experimentais. Assim, basta escrever
com a constante de Rydberg escrita em unidades naturais em que
e impõem-se que
A constante de Rydberg nesse sistema natural de unidades é dada
conseqüentemente por
A fórmula de Rydberg era conhecida desde o séc. XIX dos espectroscopistas,
mas a constante de Rydberg só pode ser determinada depois do trabalho de
Bohr. Com isso, ele obteve as séries de linhas espectrais de Lyman, Balmer e
Paschen, além de outras que não haviam sido observadas que após a previsão
o foram. Após isso, seu modelo ganhou notoriedade e teve grande sucesso,
apesar de ficar a dever na resolução de outros problemas.
A Produção de Raios X
Quando elétrons em altíssimas velocidades são lançados sobre um objeto
metálico são produzidos raios X. A energia cinética dos elétrons é convertida
em radiação eletromagnética devido à grande desaceleração sofrida e a função
de um aparelho de raios X é justamente controlar a intensidade de radiação e
para isto deve-se controlar o fluxo de elétrons do catodo (emissor negativo)
para o anodo (coletor positivo). O aparelho produtor de raios X é composto
basicamente de um tubo de alta tensão (ou alta voltagem, entre 30 e 150 kV),
20
de um painel de controle de corrente alternada e de uma fonte de alta tensão.
A idéia é fornecer um feixe concentrado de elétrons que serão acelerados
antes da colisão com uma pequena parte metálica. A energia cinética será em
parte transformada em fótons na forma de raios X.
Considerando apenas um elétron, sua energia cinética é dada por
𝐾 =1
2𝑚𝑣2
em que v é a velocidade do elétron. No sistema internacional de unidades, a
energia cinética é dada em joules.
Em um tubo de raios X, aumentando-se a tensão aceleradora (a alta voltagem)
aumenta-se a energia cinética dos elétrons e conseqüentemente a energia dos
raios X (raios X mais duros), e aumentando-se a corrente elétrica do feixe
(densidade do feixe), aumenta-se a intensidade dos raios X. Sendo assim, a
máquina converte para o alvo uma quantidade enorme de energia cinética
advinda de um número enorme de elétrons de forma precisamente controlada.
Exemplificando: para uma corrente de 100 mA um número de 6 × 1017 elétrons
passam do catodo para o anodo por segundo.A distância entre o filamento e o
alvo é de cerca de 1 a 3 cm e neste curto percurso os elétrons tem de ser
acelerados até velocidades de 50% da velocidade da luz desde o repouso.
Os elétrons viajando do catodo para o anodo em tubo em que foi feito vácuo
formam uma corrente produtora de raios X que algumas vezes são chamados
de projéteis. Quando os projéteis colidem com os átomos metálicos do alvo,
eles interagem com estes átomos e transferem energia para o alvo. Essas
interações ocorrem em uma pequena profundidade de penetração do alvo.
Quando ocorrem as interações os elétrons sofrem uma grande desaceleração
e finalmente ficam muito próximos do repouso para finalmente entrarem de
volta ao circuito eletrônico.
Os elétrons interagem ou com os elétrons orbitais ou com os núcleos dos
átomos do alvo. Forma-se então energia térmica e energia eletromagnética na
forma de raios X. A maior parte da energia cinética é convertida em calor. Os
21
projéteis interagem com os elétrons das camadas mais externas dos átomos do
alvo, mas não transferem energia suficiente para estes elétrons se ionizarem.
Ao invés, os elétrons das camadas mais externas são excitados para níveis
mais elevados. Os elétrons das camadas mais externas imediatamente voltam
para seu estado normal descarregando o excesso de energia na forma de
radiação infravermelha. Esse processo é o responsável pelo aquecimento do
anodo em tubos de raios X. Em geral, 99% da energia cinética é convertida em
energia térmica, ficando menos de 1% para a produção efetiva de raios X.
Assim, apesar de sofisticado, um aparelho de raios X é extremamente
ineficiente. A produção de calor no anodo aumenta diretamente com o aumento
da corrente no tubo. A eficiência da produção de raios X é independente da
corrente do tubo e é constante em relação a ela. Ela só aumenta com o
aumento da frenagem dos elétrons projéteis. Em 60 kVp (kilovoltagem de pico
ou a tensão máxima aplicada em um tubo de raios X), apenas 0.5% da energia
cinética é convertida, mas em 120 MeV, sobe para 70%.
Se o projétil interage com um elétron interno do átomo do alvo ao invés do
externo, uma radiação característica pode ser produzida. Esta radiação resulta
quando a interação é suficiente violenta para ionizar o átomo pela remoção
total de um elétron da camada mais interna. A mera excitação desse elétron
não produz radiação característica. Quando há a remoção de um elétron da
camada K (n=1), um buraco temporário na camada eletrônica é produzido. Este
é um estado altamente instável de forma que um elétron da camada mais
externa desce para a camada K para preencher a lacuna que ficou nessa
camada. A transição de um elétron na camada mais externa para a camada
mais interna é acompanhada, segundo o modelo de Bohr, pela emissão de um
fóton na freqüência de raios X. Por exemplo, um elétron da camada K é
removido de um átomo de tungstênio e é substituído por um elétron da camada
L. A energia característica é calculada primeiramente colocando K (n=1) e L
(n=2). Usando a expressão:
22
Os valores medidos são na realidade 69.525 keV na camada K e 12.1 keV para
elétrons na camada L, resultando em uma diferença de 57.4 keV.
Em suma, os raios X característicos são produzidos por transições de elétrons
orbitais das camadas mais externas para as mais internas. Uma vez que a
energia de ligação de cada elemento é diferente, os raios X característicos
produzidos nos vários elementos químicos são diferentes também. Este tipo de
radiação X é chamado de radiação característica porque é característica do
elemento químico que constitui o alvo. A energia efetiva dos raios X
característicos aumenta com o aumento do número atômico do elemento do
alvo. O tungstênio possui 15 níveis de energia apenas. Quando é possível
contar os níveis de energia diz-se que os níveis de energia são discretos; do
contrário, diz-se que a energia é emitida de forma contínua.
Quando o elétron perde sua energia cinética em interação com o núcleo
atômico, a energia cinética é convertida em energia eletromagnética e, neste
caso, dá-se o nome de bremsstrahlung ou frenagem de radiação. Os projéteis
que evitam completamente os elétrons orbitais ao passar por um átomo do alvo
podem passar suficientemente próximos ao núcleo do átomo para se submeter
a sua influência. Uma vez que o elétron é negativamente carregado e o núcleo
é positivamente carregado, sua frenagem é muito mais forte, ele é desviado do
seu curso e após a passagem, ele sai com uma energia cinética menor. A
diferença na energia cinética aparece na forma de um fóton de raios X de
bremsstrahlung. Diferente dos raios X característicos que são discretos, a
radiação de bremsstahlung é contínua, podendo assumir qualquer valor que
seja menor ou igual à energia cinética dos elétrons projetados.