Festa de Santa Bárbara - cadernoIPAC5

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    Festa de Santa BrbaraCADERNOS DO IPAC, 5

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    Festa de Santa Brbara

    Salvador Bahia2010

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    GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA

    Jaques Wagner

    SECRETARIA DE CULTURA

    Mrcio Meirelles

    DIRETORIA GERAL DO INSTITUTO DO PATRIMNIO ARTSTICOE CULTURAL DA BAHIA IPAC

    Frederico A.R.C. Mendona

    PRESIDNCIA DA FUNDAO PEDRO CALMON FPC

    Ubiratan Castro de Arajo

    DIRETORIA DE PRESERVAO ARTSTICO E CULTURAL DO IPAC

    Paulo Canuto

    GERNCIA DE P ESQUISA, LEGISLAO PATRIMONIAL E PATRIMNIO

    INTANGVEL DO IPAC

    Mateus Torres

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    FOTOGRAFIASElias Mascarenhas

    PROJETO GRFICOPaulo Veiga

    ILUSTRAOMargarete Abud

    EDITORAOMaria Luzia Lago Brando

    PESQUISACarla Bahia

    Jussara Rocha NascimentoMilena TavaresNvea Alves dos SantosSnia Ivo

    CONSULTORIA E EDIO DE TEXTOCarla Bahia

    REVISO DE TEXTOFundao Pedro Calmon

    IMPRESSO E ACABAMENTO

    Grfica QualiCopy

    Sumrio

    9. APRESENTAO

    Ubiratan Castro Arajo

    11.O STIO

    Milena Tavares

    21. A BRBARA DA ANTIGUIDADE

    Jussara Rocha Nascimento

    31. IANS: ME NOVE VEZES

    Carla Bahia

    41. ICONOGRAFIA

    Snia Ivo

    45.O CULTO A SANTA BRBARA NA BAHIA

    Nvea Alves dos Santos

    53. A FESTA DE SANTA BRBARA NO PELOURINHO

    Carla BahiaB135s Bahia. Governo do Estado. Secretaria de Cultura. IPAC.

    Festa de Santa Brbara. / Governo do Estado, Secretariade Cultura, IPAC. - Salvador: Fundao Pedro Calmon , 2010.

    76p. : il. (Caderno s do IPAC, 5)

    ISBN:

    1. Brbara, Santa Festa Religiosa 2. Bahia - Histria 3.

    Bahia Festa Popular 4. Brbara, Santa Histria I. Ttulo

    CDD 394.265CDU 394.26

    Elaborada pela Gerncia Tcnica - GETEC

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    Apresentao* Ubiratan Castro Arajo

    As festividades de 04 de dezembro, dia de celebrao de Santa Brbara, fo-ram registradas como patrimnio imaterial da Bahia no livro das celebra-es, pelo Instituto do Patrimnio Artstico e Cultural da Bahia.

    Trata-se de um dia de festa no Centro da Cidade do Salvador, desde 1641, quan-do foi institudo o Morgado de Santa Brbara, composto de propriedades e ca-pela ao p da ladeira da Montanha. Aquele foi o primeiro Mercado de Santa Br-bara. Desde o final do sculo XIX os comerciantes, que faziam as celebraes,foram transferidos para o novo Mercado de Santa Brbara na atual Baixa dosSapateiros. Na dcada de 80 do sculo XX, as celebraes e a prpria imagemda Santa passaram a sediar-se na Igreja de Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos,no Pelourinho. Esta indiscutivelmente a grande celebrao religiosa popular doCentro Histrico de Salvador.

    A cada 04 de dezembro, o Centro de Salvador se veste de vermelho, cor usadapelos devotos da Santa Brbara. Gente de toda a cidade, de todas as classes so-ciais, de todas as cores (principalmente a negra), e de todos os sexos (principal-mente as mulheres) rene-se para missa, procisso, samba e caruru. Duasfigurasmsticas de mulher associam-se no vermelho da festa: a Santa Brbara, mrtircrist da antiguidade, e a laba Ians, orix dos Iorub. Ambas representam o ar-qutipo unificado de mulher guerreira, que conquistou a sua liberdade ainda queno martrio, e que levantou a cabea em rebelio contra o poder masculino.

    Na cultura afro-brasileira, no dia 04 de dezembro o povo da Bahia celebra o ru-bro sangue que ferve nas veias das belas mulheres rebeldes libertadas, senhoras

    de suas prprias cabeas. Salve Santa Brbara da sia Menor. Eparri Ians da

    frica Ocidental. Salve a Mulher da Bahia!

    * Presidente da Fundao Pedro Calmon

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    O STIO* Milena Tavares

    Evoluo Urbana de Salvador

    Oestabelecimento da cidade do Salvador ocorreu atravs de Regimento deD. Joo II, Rei de Portugal, datado de 17 de dezembro de 1548. Nestapoca, o regime de donatrios no Brasil foi substitudo por um Governo Geral

    e, a partir de ento, a Cidade do Salvador foi instituda como sede. Logo aps,

    tomou posse o Primeiro Governador Geral do Brasil, Tom de Souza, com

    mandato iniciado em 07 de janeiro de 1549.

    O Regimento de 1548 buscou orientar o processo de povoamento do Brasil,

    discriminando em detalhes todas as regras que deveriam nortear o proces-

    so de construo da cidade do Salvador. Essas normas foram estruturadas

    de forma que a cidade estivesse preparada para atender aos interesses de

    Portugal. Entre os aspectos que foram considerados para a implantao do

    ncleo primitivo, destaca-se:

    - Escolha do stio para implantao:

    - Lugar sadio, de bons ares e com abastana de gua.

    - Atender ao funcionamento de um porto.

    - Fortaleza e povoao grande e forte:

    - Construir uma fortaleza, de tamanho e feio acordes com o lugar de

    sua localizao, obedecendo as traas e mostras entregues, em Lisboa, a

    Tom de Souza.

    * Arquiteta

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    - Recursos humanos:

    - Acompanharo Tom de Souza para edificao da cidade: oficiais, pe-

    dreiros, carpinteiros e outros, inclusive alguns especializados no fabrico de

    tijolos, telhas e cal.

    - Recursos materiais utilizados:

    - Numera-se a preferncia pelos seguintes materiais: pedra aparelhada, pe-

    dra e cal, pedra e barro, ou taipais, e madeira.

    - Deveriam ser resistentes, fortes e que permitissem estabilidade e segurana.

    A escolha do stio

    Aps o desembarque, Tom de Souza ordenou que fosse descoberta a terra bem

    sua frente e deter minou que o melhor lugar para edificar a cidade seria aquele

    defronte ao local em que havia ancorado. Em frente ao espao que virara anco-

    radouro havia uma grande fonte que serviria para atender s necessidades dos

    navios e naus da cidade que ali seria construda.

    O lugar escolhido para assentamento da cidade estava no promontrio compre-

    endido entre as gargantas de onde hoje conhecemos como Barroquinha, ao sul,

    e Taboo, ao norte, pois apresentava caractersticas favorveis: era situado no

    cimo de uma escarpa, sendo considerado de fcil defesa em caso de ameaa de

    invaso, pela altura de 60 metros sobre o mar. Esse espao selecionado tinha a

    oeste um paredo natural, com altura considervel, enquanto a este, um vale na-

    tural, hoje denominado como Rua Dr. Jos Joaquim Seabra (J. J. Seabra ou Baixa

    dos Sapateiros), fortalecia o aspecto da fortaleza da cidade.

    As obras de construo daquela urbe foram aceleradas e, no primeiro semes-tre de 1549, a Governadoria Geral j estava instalada e em funcionamento. Na

    mancha matriz da cidade foram edificadas quatro portas, cercadas por baluartes

    improvisados, que merecem ser citadas: a Porta Norte, no incio da atual Rua da

    Misericrdia, onde antes havia uma depresso natural do terreno servindo de

    fosso, correspondendo hoje Rua 28 de Setembro; Porta Sul, correspondente s

    imediaes da Praa Castro Alves, denominada, em principio, de Porta de Santa

    Luzia e, posteriormente, de Porta de So Bento; a porta do lado de terra,

    acessvel da baixada fronteira por meio de uma ladeira em degraus, chamada

    pelos antigos de Beco da gua de Gasto; e a ltima, que dava acesso ao porto

    e galgava a encosta do monte, atravs de terreno ngreme, prxima atual Rua

    do Pau da Bandeira.

    No interior desta nova fortificao surgiu o primeiro povoamento da cidade alta,

    composta por quatro ruas longitudinais, trs transversais e duas praas. A rua prin-

    cipal e mais extensa era a Rua Direita do Palcio ou dos Mercadores (atual Rua

    Chile), responsvel pela comunicao da porta norte at a porta sul. As demais

    ruas longitudinais, chamadas, na poca, pelo nome de Ajuda, Po de L e dos

    Capites, eram todas retilneas e tinham como limite os muros da cidade. J as ruas

    transversais tinham a denominao de Assemblia, das Vassouras e do Berqu.

    Na praa principal, localizada na banda sul, havia um pelourinho e algumas casastrreas, onde residia o Governador, alm da modesta Igr eja de Nossa Senhora

    da Ajuda. Na direo Este foi implantada a Casa de Cmara e Cadeia e outras

    casas de moradores. Na face norte ficavam as casas de repartio da alfndega e

    armazns. J no oeste ficavam algumas peas de artilharia.

    As primeiras edificaes da cidade foram a ermida consagrada a Nossa Senhora

    da Conceio, prxima praia; baluartes e cercas dos arruamentos. Foi ainda

    providenciada a locao da primeira praa, que fora Centro Administrativo do

    Brasil at 1763, na atual Praa Municipal; alm de uma cerca de pau-a-pique para

    proteo dos trabalhadores e soldados.

    O burgo fortificado na cidade alta se prolongava tambm em direo cidade

    baixa, prxima ao mar, confinado a uma estreita faixa de terra prxima mon-

    tanha. Esta regio reunia o porto, a alfndega, armazns e casas, erigidos no

    entorno da Igreja de Nossa Senhora da Conceio. As povoaes beira da praia

    comearam nas ribeiras do Gis e dos Pescadores. A primeira ribeira estendia-seno trecho limitado em seu comprimento pela atual Praa Cairu e a Fonte das Pe-

    dreiras, alargando-se, linear e posteriormente, presente Praa Conde dos Arcos

    (parte baixa da Ladeira do Taboo).

    Salvador, ento, foi implantada primitivamente entre duas regies, que se con-

    vencionou chamar de Cidade Alta e Cidade Baixa. A ligao entre elas se dava

    atravs de duas ladeiras: da Conceio e da Preguia. Existiam, ainda, caminhos

    terrestres, precrios, que permitiam o acesso ao local que ficou conhecido como

    gua de Meninos e, a partir da, ao Monte Serrat e Ribeira, mais afastados

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    Nessa poca, a Colina da S j se encontrava inteiramente urbanizada; So Ben-

    to e o Carmo haviam progredido visivelmente, indo do que se conhece como

    Santo Antnio Alm do Carmo at o Forte de So Pedro. No decorrer do sculo

    XVIII, a economia baiana foi favorecida pela prosperidade da cultura da cana-

    de-acar e da explorao do ouro, influenciando beneficamente na fisionomia

    da cidade, embelezada pela construo de ricos sobrados e igrejas.

    A cidade do Salvador no sculo XIX

    A abertura dos portos (1808) promoveu grande

    desenvolvimento nas cidades brasileiras, promo-

    vendo emancipao poltica e transformaessociais, na medida em que novos produtos no

    mercado modificaram o gosto e a exigncia da

    populao local. A cidade inicia grandes trans-

    formaes, no intuito de romper com a paisa-

    gem colonial. Esse impulso foi contido pela ex-

    tino do comrcio de escravos, a abolio e a

    proclamao da independncia do Brasil, alm

    do fortalecimento da economia cafeeira no sul

    do pas.

    Em 1800, a cidade do Salvador se apresentava,

    basicamente, da seguinte forma:

    - Bairro da Praia: a Cidade Baixa se estendeu da

    Preguia at a Jequitaia, com predominncia decomerciantes na rea, mas contando tambm

    com templos, fortalezas, alm dos edifcios co-

    merciais. Nessa mesma regio, mas fora da rea

    urbana, havia trs caminhos que viriam, poste-

    riormente, a se agregar cidade de Salvador: um

    pela praia, chamado de Jequitaia, at a porta de

    Monte Serrat, outro para o Bonfim, ou Itapagipe

    de Baixo, e o terceiro para Itapagipe de Cima at

    a Porta do Papagaio.

    - Cidade Alta: no trecho da mancha matriz, as ruas e praas permaneciam sem

    alteraes de monta. O que ocorreu no espao de 80 anos foi a construo de

    edifcios pblicos notveis e o agenciamento da segunda praa da cidade, o Ter-

    reiro de Jesus, construdo no sculo XVI.

    - Fora das Portas: na direo sul, prosseguia o eixo bsico pela atual Ladeira de

    So Bento, com o seu adensamento e abertura de novas ruas. Na direo norte,

    ultrapassando as portas do Carmo, estava o Bairro de Santo Antnio, que se

    prolongava, j estabilizado, do ponto de vista urbano.

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    1818 1919

    - Cidade Alta: se estendia desde o Forte de So Pedro at o Convento da Soleda-

    de, na sua maior largura, procurando a direo do nascente, apresentando gran-

    des edifcios, templos e casas nobres. Nessa poca j havia trs praas: a nova da

    Piedade e as j existentes, do Palcio e do Terreiro de Jesus.

    - Bairros Circunvizinhos: So Bento, o maior e mais aprazvel, no norte da cida-

    de, o Santo Antnio Alm do Carmo, com edifcios de menor qualidade e quan-

    tidade, alm de os bairros da Palma, Desterro e Sade, na parte nascente.

    A cidade do Salvador a partir do sculo XIX

    A partir dessa poca, o trecho urbano da Cidade Baixa se consolidou at o Mon-te Serrat e Bonfim, interligando-os aos ncleos anteriormente existentes. Foram

    tambm construdos novos cais sobre aterro, para melhoria do porto. Enquanto

    isso, na Cidade Alta, a expanso se dava no sentido da conquista de novas cume-

    adas na direo sul, o que ocasionou o surgimento dos bairros da Vitria e da

    Graa. As cumeadas existentes adensaram-se.

    Na direo norte, a cidade antiga se ampliou no sentido da Estrada das Boia-

    das. A leste, deu-se a consolidao dos bairros da Sade, Desterro, Palma e a

    formao de novos bairros, iniciando por Nazar. O progresso urbano trouxe

    a iluminao a gs carbnico, em 1872, e, no fim do sculo, a introduo dos

    primeiros bondes a trao animal, permitindo uma nova extenso do permetro

    construdo, favorecendo o surgimento de mais bairros.

    Nofinal do sculo XIX, o ncleo primitivo sofreu esvaziamento pela populao abas-

    tada. Isso se deu pelo crescimento da cidade para as bandas do sul, no Bairro da

    Vitria. A partir da, os casares coloniais da rea do centro histrico foram sendo

    ocupados por pequenos comerciantes at sua decadncia, quando se iniciou a ativida-

    de marginal no local, favorecendo o seu abandono e a degradao dos imveis.

    A cidade no sculo XX

    A modernizao dos transportes, que se iniciou com a introduo dos primeiros bon-

    des a trao animal, favoreceu a expanso urbana, incentivando o surgimento de no-

    vos bairros. Na Cidade Baixa, a ocupao do territrio se estendeu at a Pennsula de

    Itapagipe, chegando a Monte Serrat e ao Bonfim. O porto sofreu diversos servios de

    melhoramento urbano, ampliando a rea do Comrcio, a partir de sucessivos aterros.

    Na Cidade Alta, conforme j citado, deu-se a conquista de novas cumeadas na direo

    sul, consolidando-se os bairros do Campo Grande, Vitria e Graa.

    Na direo norte, a cidade se estendeu no sentido da Estrada das Boiadas, onde

    j havia residncias, a exemplo do Solar Bandeira, que at hoje se mantm na

    Soledade como monumento digno de nota, bem como a Igreja e o Convento de

    Nossa Senhora das Mercs, ambos entre um perfil de sobrados de feio tradi-

    cional. Na direo Leste, deu-se a consolidao dos bairros da Sade, do Dester-

    ro e da Palma, alm da formao de novos bairros, iniciando por Nazar.

    O governo de Jos Joaquim Seabra traou planos significativos para mudar a pai-

    sagem colonial, modernizando-a. Para tanto, empreendeu grandes obras, seguindo

    o modelo adotado por Pereira Passos, no Rio de Janeiro, que se pautou na reforma

    de Paris (Frana). O perodo mais emblemtico ocorreu na gesto entre os anos de

    1912 e 1916, com a abertura e construo da Avenida Sete de Setembro.

    J na dcada de 40, Salvador passou por um processo de planejamento de sua es-

    truturao viria, sob a coordenao de Mrio Leal Ferreira, no Escritrio do Pla-

    nejamento Urbanstico da Cidade do Salvador (Epucs). O plano, iniciado somente

    em 1959, a partir de transformaes polticas e do reaquecimento da economia,

    permitiu o aproveitamento de vales para a abertura de amplas avenidas, favorecen-

    do a interligao entre o centro, os novos bairros e a orla da cidade.

    Nos anos 50 e 60, a implantao de plos industriais impulsionou a economia e

    tambm o crescimento populacional. Isso aumentou a demanda por reas resi-denciais, que at ento se concentravam no centro da cidade, desencadeando um

    processo de urbanizao acelerada.

    Na dcada de 70, o funcionamento das primeiras fbricas do Complexo Pe-

    troqumico de Camaari, na Regio Metropolitana de Salvador, bem como a

    construo da Avenida Luis Vianna Filho (Paralela), via expressa com 14 km

    de extenso, e a instalao do Centro Administrativo da Bahia e do Shopping

    Iguatemi so questes que abriram espao para o surgimento de novo vetor de

    desenvolvimento, que vem crescendo intensamente desde ento.

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    A BRBARA DA ANTIGUIDADE* Jussara Rocha Nascimento

    Um padre ingls, Alban Butler (1711-1773), dedicou 30 anos de sua vida

    escrevendo um livro que se tornou grande referncia para os catlicos:A Vida dos Santos.1 No seu relato sobre a vida de Santa Brbara explica, ao final,

    que assim que vem narrada, na verso de [William] Caxton [c 1422-1491] a

    Legenda urea de uma das mais populares santas da Idade Mdia. Segundo Bu-

    tler no se faz meno dela nos martirolgios antigos, sua lenda no anterior

    ao sculo VII e seu culto s se difundiu durante o sculo IX. Esclarece, ainda,

    que h diversas verses da lenda sobre esta santa, as quais diferem entre si

    tanto em relao poca como ao local do seu martrio.

    A histria narrada por Butler, resumidamente, assim aparece:

    No tempo em que Maximiano reinava, havia um homem rico, um pago

    cujo nome era Discoro. Este Discoro t inha uma jovem filha, cujo nome

    era Brbara, para a qual mandou construir uma torre elevada e forte, onde

    colocou e fechou esta sua filha Brbara, para que nenhum homem a visse

    por causa de sua grande formosura. Ento, vieram muitos prncipes ter

    com este mesmo Discoro para com ele tratar a respeito do casamento

    com sua filha, e ele foi ter com a filha e disse: Minha filha, alguns prncipes

    vieram at mim e me pediram que lhes fosse dada em casamento e, por

    isso, dize-me qual o teu plano e o que tencionas fazer. Ento, Brbara

    ficou bastante irritada e assim falou ao pai: Meu pai, rogo-vos que no me

    * Bacharel em Cincias Sociais, Mestre em Arte, Doutora em Letras, UFBA

    1 Originalmente publicado em 1756-59, s foi reeditado em 1926-38, uma verso em portugus aparecedatada de 1993.

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    forceis a contrair matrimnio, pois para isso no tenho disposio nem

    inteno. Depois disso, ele partiu e foi para um pas distante e l perma-

    neceu durante muito tempo.

    Ento, Brbara desceu da torre a fim de inspecionar uma casa de ba-

    nho que o pai estava construindo para ela e logo percebeu que nela s

    havia duas janelas, uma que dava para o sul e a outra para o norte. Por

    essa razo, ficou muito desconcertada e muito admirada e perguntou

    aos operrios porque no haviam feito mais janelas, e eles responde-

    ram que o pai dela assim dispusera e ordenara que fizessem, Brbara,

    ento, lhes disse: Abri aqui para mim mais uma janela! Quando, mais

    tarde, o pai lhe perguntou por que que trs janelas iluminam mais

    que duas, Brbara respondeu: Estas trs janelas representam clara-

    mente o Pai, o Filho e o Esprito Santo.

    Ao ouvir tal explicao, Discoro encheu-se de ira e prendeu Brbara num

    crcere. Levada, depois, a um juiz, acabou sendo condenada morte a gol-

    pe de espada. O pai, enfurecido, a tirou das mos do juiz e a transportou

    at o alto da montanha . Aps uma prece, ela se dirigiu a ele e recebeu ofim

    de seu martrio. Quando Discoro desceu da montanha, porm, desceu

    sobre ele um fogo do cu, que o consumiu de tal modo que s restaram as

    cinzas do seu corpo (1993, pp.52-4).

    As publicaes de Caxton e Butler deram forma escrita a uma histria que j

    tinha longa vida por meio da oralidade, com verses que enfatizam detalhes

    variados e curiosos, adaptados a diferentes contextos culturais. Existe, contudo,

    uma pergunta que encontra resposta nos seus devotos: Santa Brbara existiu?Independente do fato, ela vive na religiosidade popular.

    Em 1969, sob a alegao de sua autenticidade ser discutvel, Santa Brbara

    foi retirada do calendrio litrgico da Igreja Catlica Apostlica Romana. Mas

    a devoo a ela permaneceu viva, atravessando longos perodos histricos e em

    reas geogrficas de grande extenso.

    O culto a Brbara tocou coraes de pessoas oriundas de contextos culturais

    distintos, como aqueles que seriam, segundo as histrias, seus conterrneos da

    antiga Nicomdia, regio, hoje, localizada na Turquia. Tambm vemos povos

    no latinos, em diferentes regies do mundo, devotos de Brbara, bem como o

    rei de Castela e Leo, Afonso X (1221 1280), conquistador do reino muluma-

    no de Mrcia, na futura Espanha, que deu o nome de Santa Brbara a seu castelo

    em Alicante.

    Brbara e as configuraes histricas

    O mundo europeu deste perodo de 600 e, claro, anterior a ele , como sabi-

    do, comporta povos e divises administrativas e culturais bastante diversas das

    que viro a se configurar aps a formao dos estados-nao que hoje compre-

    endem os pases da Europa.

    Por volta dos anos 300, o principal centro cultural europeu localizava-se na

    Irlanda, onde os monges que se diziam continuadores da tradio monstica

    egpcia preservavam a tcnica da escrita, tendo criado, por exemplo, as letras

    minsculas.

    No continente, propriamente, o que ocorria na Pennsula Ibrica de particular

    interesse ao estudo da devoo de Santa Brbara, j que por intermdio de

    espanhis e portugueses que essa santa vai chegar s Amricas, quase mil anos

    mais tarde, a partir do sculo XVI.

    A Pennsula Ibrica, at o sculo VII, j havia sido palco de civilizaes

    diversas e, nessa poca, vai, aos poucos, sendo ocupada por rabes mu-

    ulmanos. Inicialmente com os califas Omadas (661-750), depois com os

    Abssidas, que acabam por ocupar toda a extenso da Pennsula Ibrica,onde permanecero por mais 500 anos. Esses grupos foram os introduto-

    res de inmeras tcnicas, produtos agrcolas e informaes cientficas que

    eram, at ento, desconhecidas no restante da Europa: fabricao de papel

    e produtos txteis, a arte de trabalhar o vidro, iluminao pblica em algu-

    mas cidades, com lmpadas de petrleo ou azeite, bibliotecas, a bssola (j

    conhecida na China), entre outras coisas.

    Parte considervel do acervo de conhecimento desses rabes ser traduzido

    em Toledo, sendo Afonso X, conhecido como o Sbio, monarca que man-

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    tinha eruditos e msicos rabes em seu palcio, o primeiro a ter acesso s

    famosas tbuas com registros astronmicos e de cartografia martima, que

    manda traduzir do rabe.

    O mundo catlico, por sua vez, durante o sculo VII, tem como centro de

    poder, no Roma, mas a cidade de Bizncio (Constantinopla, hoje Istambul,

    Turquia), de tradio grega, localizada na entrada do Mar Negro, nas imedia-

    es da regio onde Brbara teria nascido. Em meados do sculo anterior,

    em 553, Constantinopla fora sede de um conclio ecumnico convocado pelo

    Imperador Justiniano (527-565).

    Esse conclio, por sinal, teve como uma de suas principais decises o ba-nimento da obra do telogo alexandrino Orgenes (185-253), que dirigiu

    a Didascalion a famosa Escola Teolgica de Alexandria. Orgenes uma

    das figuras histricas associadas a Brbara j que, segundo uma das lendas,

    a santa teria sido batizada por um discpulo de Orgenes ou, segundo outra

    histria, ela teria recebido a visita de Orgenes enquanto se encontrava ca-

    tiva de seu pai, na torre.

    Apesar de se acreditar que Brbara era nativa da sia Menor, a relao

    de seu nome ao de Orgenes acaba associando-a cidade onde Orgenes

    nasceu, Alexandria, a metrpole mais importante no mundo conhecido de

    ento. Era localizada no norte da frica, no delta do Rio Nilo, e onde ficou

    concentrado todo o acervo de conhecimento coletado nos antigos templos

    africanos; tanto os de carter religioso como os conhecimentos relativos s

    tecnologias desenvolvidas ao longo de trs milnios da antiga civilizao ni-

    ltica, em especial o registro das informaes que se referiam ao sofisticadocalendrio ali construdo.

    interessante observar que passa pela lenda de Santa Brbara a referncia a

    um tipo de conhecimento que se obtinha por intermdio de livros. Em uma

    das verses sobre sua vida, aponta-se o fato de que ela teria entrado em con-

    tato com idias crists ao receber, certo dia, junto com o alimento e a roupa

    lavada que lhe enviavam, na torre, um livro colocado por um estranho, que

    queria faz-la conhecer os ensinamentos cristos.

    A associao de Brbara com o nome de Orgenes reveste-se, assim, de um tipo de

    significado especial, uma vez que no parece ser uma simples coincidncia o fato de

    Orgenes se sobressair por uma atividade literria envolvendo milhares de obras.

    Os indcios de que livros faziam parte da vida de Brbara tem pontos de con-

    tato com o de outras mulheres da antiguidade que eram estudiosas e detinham

    conhecimentos englobando vrias reas do saber, como Hipcia de Alexandria

    (370-451), nascida cerca de cem anos depois da morte de Brbara. Matemtica

    e astrnoma, Hipcia recebeu carta do bispo Sinsio (n. 370) pedindo-lhe ins-

    trues para a confeco de instrumentos de observao de estrelas, a fim de

    melhor equacionar um calendrio.

    Outro ponto que apresenta Brbara ligada aos estudos pode ser indicado pelo

    fato de que ela residia em uma torre. A construo cnica, tpica das torres,

    com aberturas cuidadosamente orientadas para observao do cu, foi usada em

    diferentes regies do mundo antigo, inclusive por monges irlandeses, at a Idade

    Mdia, para registro da passagem dos dias, meses e anos por meio da sombra

    do sol nas paredes e no cho. A descrio de Brbara enclausurada numa torre

    remete, claro, priso determinada por seu pai, mas pode sugerir, ainda que

    remotamente, algum treinado para um tipo de observao valiosa, na poca,

    para confeco de calendrios.

    O momento histrico em que Brbara ter ia vivido, entre os anos de 236 e

    260 do calendrio cristo, faz parte de uma situao em que textos escritos e

    registros de tcnicas antigas estavam sendo violentamente destrudos. A Bi-

    blioteca e o Museu de Alexandria, por exemplo, sofreram um dos inmeros

    golpes que os atingiu por volta do ano de 270, quando o imperador Aure-liano destruiu a maior parte do distrito de Alexandria, onde se localizavam

    os famosos edifcios.

    Cerca de 20 anos antes daquele que teria sido o ano nascimento de Brbara,

    o imperador Caracala (211-217), sucessor de Augusto, ridicularizado em

    Alexandria. Como vingana, manda reunir os jovens a pretext o de incorpo-

    r-los ao exrcito e ordena que sejam massacrados. Eram momentos de mu-

    danas dramticas que incluam desapropriaes, destruies e massacres

    sistemticos. O Imprio Romano afirmava sua fora de conquista e mrtires

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    eram imolados. Brbara faria parte de uma juventude, assim como suas ami-

    gas M nica e Juliana, que estava sob a mira de determinaes violentas.

    Na sia Menor, por sua vez, a antiga Jnia grega, em que a cidade de Mileto

    representou um importante papel no fortalecimento da civilizao da Grcia,

    romanos e nativos se enfrentavam em desequilbrio. As maiores cidades da sia

    Menor, Nicomdia e Peruza, ficaram submetidas ao romano Maximinus Daia, a

    quem tambm coube o Egito e a Sria.

    Contudo, a presena dos romanos na regio jamais foi pacfica, principalmente

    porque lutavam entre si pelo domnio do espao. bem possvel que o rico Di-

    scoro, pai de Brbara, tenha tido certa vantagem nessas disputas, conseguindotirar proveito da relao com os romanos.

    De qualquer forma, a aproximao de Brbara com os cristos, nesse perodo

    em que o cristianismo ia de encontro a interesses dos romanos, definitivamente,

    no do agrado do pai. Sendo ele, pois, um homem rico e poderoso poca,

    teria desejado, por exemplo, o casamento de sua filha com um romano invasor?

    Considerando todo esse contexto, ser que Brbara teria, por ordem do pai, de

    unir-se a um conterrneo no-cristo?

    Brbara criou suas prprias relaes e, de alguma forma, decidiu se colocar con-

    tra uma situao poltica que agredia os nativos da Bitnia. Explicou a Discoro,

    inclusive, que no aceitavam ela e outros devotados ao cristianismo um im-

    prio dinamizado pela violncia e pela injustia.

    Longe da torre na qual esteve por anos, Brbara aproveitava para visitar do-entes, comunidades crists nos montes e ajudar filhos de escravos. Em de-

    terminado momento, foi denunciada aos romanos como crist, talvez pelo

    prprio pai. Foi, ento, caada e teria sido encontrada pelo centurio Aleixo

    e seus soldados numa gruta. Sua me, Imria, apela ao marido em favor

    da filha, mas Discoro no recua e ele mesmo quem desfere a espada no

    pescoo de Brbara.

    A histria de Brbara poderia ter findado a. Mas esse conto tem um diferencial:

    logo aps a degola da moa, o cu se fechou em nuvens e um raio atingiu Di-

    scoro, matando-o tambm. Esta uma das verses da vida da santa, que ficou

    conhecida como a mrtir morta pelo prprio pai.

    Brbara entre outras deusas

    Santa Brbara traz uma histria de mulher decidida, ilustrada, por exemplo, com

    a opo de no compactuar com uma ordem poltica baseada na violncia. Era

    uma entre tantas virgens santificadas a quem muitos recorriam e ainda recor-

    rem pela representao de fora, em momento de dificuldade. Este, inclusive,

    um fato que aproxima o contedo simblico associado a Brbara a uma outra

    representao de longa data, enraizada no imaginrio popular de ento, em espe-

    cial na frica da antiga civilizao niltica, sob o nome escrito como HT NT.A grafia egpcia no registrava vogais, podendo a pronncia deste nome ter sido

    Neith, Nit, Net, Neit, na frica, enquanto, em grego, seria Ateneit, que veio a

    dar em Aten.

    Essa personagem mtica j existia desde os tempos pr-dinsticos, por volta do

    fim do 4 milnio antes de Cristo. Neith uma figura feminina evocada e descri-

    ta como a mulher capaz de exercer a pacincia, seja tecendo, seja cuidando dos

    necessitados, at mesmo, pode-se supor, trabalhando numa torre com alguns

    pontos estratgicos de abertura que poderiam servir para observaes e estudos

    de estrelas ou de feixes de luz do sol.

    Neith poderia ser tambm a mulher caadora e destemida, disposta luta e presen-

    te nas guerras, tratando dos feridos com seus saberes sobre as ervas curativas. Era

    descrita, ainda, como quem ajudava os que estavam morrendo, na sua despedida

    da vida. Ela seria a que abre caminhos, segundo os antigos textos egpcios. Eraguia no mundo dos mortos. Respeitada por sua sabedoria, tinha o poder de conce-

    ber os deuses, sendo, por essa razo, tambm conhecida como Grande Me.

    Seu nome aparece num monumento funerrio comoMerit Neith. O nomeMeri

    significando a amada, em egpcio antigo. Sempre acompanhada de suas irms

    Nephtys, Isis e Selkis, era considerada protetora de guerreiros e caadores. Era

    relacionada s mulheres destemidas e de gnio irrequieto e altivo, aparentemente

    to diferentes da pacfica mrtir Brbara, que se entregou morte em defesa

    da f. Mas, o raio que atingiu Discoro talvez sua espada sangrenta tendo

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    servido de condutor da eletricidade de nuvens de chuva que vai permitir o

    reconhecimento, na mrtir, da representao de uma divindade como a egpcia

    Neith, por exemplo.

    Se essa representao de Neith existente entre os antigos africanos chega ao vale

    do Nilo medida que diversos povos africanos vo a se agregando, ao longo do

    tempo, ou se a partir dessa regio que a idia de uma divindade tecel e guerreira,

    sbia e protetora dos mortos vai mobilizando sentimentos e devoo em diferentes

    regies, tanto para o norte, atravessando o Mediterrneo, como para o sul, subindo

    o Nilo, chegando ao centro da frica, na bacia do Congo, a partir da em direo

    ao Atlntico, entrando no imaginrio de povos de lngua banto ou aproximando-se

    das civilizaes construdas ao longo do rio Nger ou do rio Benue, difcil afir-mar. Essa relao, entretanto, uma possibilidade, j que as divindades Ians, Oi,

    Bamburucema ou Matamba so representadas com atributos bastante familiares

    aos de Neith. Presentes no Brasil, trazidas pelos africanos traficados durante o

    contexto colonial, continuam a comover pessoas que, at hoje, em pleno sculo 21,

    se colocam como seus devotos em busca de proteo e fora.

    Esse contexto, no qual a mrtir catlica apresenta caractersticas da antiga Neith,

    que tambm pode ser associada a outras figuras mticas, conhecidas no Brasil

    como afro-descendentes, nos traz a sugesto de sincretismo. O prprio cristia-

    nismo apropriado pelos imperadores romanos, Constantino (reinado de 324 a

    337), que se converte, e Teodsio (reinado de 378 a 398), que emite um decreto

    obrigando a todos os submetidos ao Imprio Romano a serem cristos, utiliza-se

    de procedimentos de sincretismo, entendido como uma estratgia de adapta-

    o em que um corpo de antigos textos, rituais e procedimentos ligados esfera

    do sagrado so aproveitados na nova hierarquia religiosa que se estabelece.

    Nos ltimos 200 anos, inclusive, depois de ter sido decifrada a antiga escrita

    da civilizao niltica, pode-se reconhecer, por exemplo, em preces africanas,

    datadas do 2 milnio a.C., valores de solidariedade e compaixo para com

    o prximo que tambm aparecem no Novo Testamento, como no trecho de

    O Livro Egpcio dos Mortos, de Bugde:

    Fiz com que o deus ficasse em paz [comigo fazendo-lhe] vontade. Te-

    nho dado po ao homem faminto, gua ao homem sedento, roupas ao

    homem nu e um barco ao marujo [que naufragou]. (...) Sou limpo de boca

    e limpo de mos, seja-me dito, portanto, pelos que me virem: vem em paz,

    vem em paz (1993, p. 329).

    Brbara nasceu, segundo relatos, cerca de cem anos antes de a I greja Romana se

    organizar em moldes estabelecidos a partir de decretos imperiais. A histria de

    sua vida foi registrada por escrito por volta do sculo X, quando Simeon Meta-

    frastes encarrega-se de editar um Feitos dos Mrtires, incluindo o nome dela.

    Tanto Metafrastes quanto Mombrito, que deixaram livros sobre santos, colocam

    o local de martrio de Brbara em Helipolis, no norte da frica. Outros relatos

    citam a Toscana, na pennsula itlica, o que sugere que a lenda latina de Santa

    Brbara inclui um vasto territrio geogrfico.

    A prpria Helipolis, conhecida como a cidade do sol, pode ter sido associada

    ao nascimento da mrtir porque o astro, no antigo Egito, recebia a denominao

    de Reou Ra, slaba contida no nome da santa. Alm disso, o som ba que, tam-

    bm entre egpcios, tinha o significado de alma, sugere o nome Brbara.

    O conjunto de dados histricos referentes a Santa Brbara que, no Brasil e na

    Cidade de Salvador, sobretudo, lembrada associada a Ians, sugere que, des-

    de quando da morte da mrtir, sua representao j inclua uma significativa

    aproximao com uma divindade africana. Se, hoje, algumas autoridades, tan-

    to catlicas quanto de culto afro, fazem esforo para combater o sincretismo,

    escandalizando-se ou rejeitando uma dupla pertena, tal no parece ter sido

    uma preocupao para os antigos habitantes da sia Menor, para quem Brbara

    foi imediatamente enquadrada num prottipo j conhecido de divindade no mo-

    mento em que o raio entra na sua histria de vida.

    possvel admitir, portanto, que a Brbara turca e a Ians nag no seriam

    divindades to distantes assim uma da outra para as pessoas que ajudaram a criar

    e manter viva sua devoo no sculo III. Neith, inclusive, pode ter sido a repre-

    sentao mais antiga que teria moldado ambas, a santa e o orix.

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    IANS: ME NOVE VEZES* Carla Bahia

    Amitologia africana envolta em mistrios e simbologias, como tantas

    outras. Por isso, contar a histria de um orix talvez no seja tarefa dasmais simples. Aqui no Brasil, o candombl, enquanto religio que os cultua,

    tem vises mltiplas o que no quer dizer que sejam divergentes sobre um

    mesmo assunto. Mas isso faz parte, sobretudo, do processo histrico iniciado

    em meados do sculo XVI, quando muitas pessoas foram trazidas do continente

    africano na condio de escravo.

    No livro Candombls da Bahia, Edison Carneiro registrou:

    O trfico trouxe escravos de regies diferentes da Guin Portuguesa

    (Costa da Malagueta), do Golfo da Guin (a Costa da Mina, outrora di-

    vidida em Costa do Marfim, Costa do Ouro e Costa dos Escravos) e de

    Angola, dando a volta ao Continente para alcanar a Contra-Costa (Mo-

    ambique). Os pesquisadores brasileiros: seguindo o lead de Nina Rodri-

    gues, dividem os africanos chegados ao Brasil em dois grandes grupos

    lingsticos: sudaneses (os da Guin e da Costa da Mina) e bantos (Ang ola

    e Moambique) (1954, p. 43).

    Esses povos de diversas regies chegaram com seus cultos fundamentados nas

    realidades de origem de cada um. Alguns tinham formao religiosa com base no

    respeito e adorao a divindades, provveis antepassados: o orix, aqui tambm

    chamado de encantado.

    * Jornalista

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    Em Ians: rainha dos ventos e das tempestades, Helena Theodoro diz que:

    Muitas foram as etnias que se mesclaram nas Amricas e cujos mem-

    bros foram genericamente denominados de negros. Esses negros

    preservaram suas tradies culturais, que tomaram variadas formas,

    como o candombl, no Brasil, a santera, em Cuba, e os voduns, no

    Haiti (2010, p. 23).

    E esse candombl que traz vrias verses para as lendas de um mesmo orix.

    Esta palavra, inclusive, a mais utilizada aqui para identificar figuras mticas (ou

    deuses) de matriz africana. Ligeiramente classificando: de nao Queto (ou

    Nag), na lngua Iorub, enquanto as similares vodum e inquice so, respectiva-mente, de naes Jeje e Angola (ou Congo-Angola).

    De uma maneira geral, a mitologia afro-brasileira busca apresentar um perfil

    mais ou menos parecido ao se falar de um deus do fogo, o outro do mato ou

    uma deusa da gua, por exemplo. Contudo, no se pode pensar em uma catego-

    rizao exata de um orix, de um vodum e de um inquice da mesma maneira que

    se faz com um ou outro santo presente na devoo catlica do Vaticano (que re-

    gistra datas de nascimento e de morte e personifica os trabalhos ou benfeitorias

    de cada um), porque so construes culturais diferentes.

    Ratificando que os cultos de matriz africana renem influncias de muitas regi-

    es do continente, Pierre Verger, no livro Orixs. Deuses Iorubs na frica e no

    Novo Mundo, escreveu:

    O termo rs nos parecera outrora relativamente simples, da ma-neira como era definido nas obras de alguns a utores que se copiaram

    uns aos outros sem grande discernimento, na segunda metade do scu-

    lo passado [XIX] e nas primeiras dcadas deste [XX]. Porm, estudan-

    do o assunto com mais profundidade, constatamos que sua natureza

    mais complexa. Lo Frobenius o primeiro a declarar, em 1910, que

    a religio dos iorubs tal como se apresenta atualmente s gradativa-

    mente tornou-se homognea. Sua uniformidade o resultado de adap-

    taes e amlgamas progressivos de crenas vindas de vrias direes.

    Atualmente, setenta anos depois, ainda no h, em todos os pontos do

    territrio chamado Iorub, um panteo dos orixs bem hierarquizado,

    nico, idntico (2002, p. 17).

    Os orixs, ainda em vida sobre a terra, seriam pessoas que se destacavam em suas

    atividades, muitas vezes. Tinham um conhecimento alm das coisas cotidianas e

    sabiam lidar com certas foras da natureza, com o poder de plantas e poderiam,

    ainda, ter o controle sobre o fogo ou o vento, por exemplo. Aps a passagem en-

    tre os homens, esses espritos com poderes divinos continuavam seus trabalhos

    de cura e proteo, algumas vezes atravs de um mecanismo em que se apos-

    savam momentaneamente do corpo de um de seus filhos, em um fenmeno

    medinico conhecido popularmente no Brasil como incorporao.

    O orix uma fora pura, se [ax] imaterial que s se torna perceptvel

    aos seres humanos incorporando-se em um deles. Esse ser escolhido

    pelo orix, um de seus descendentes, chamado seu elgn, aquele que

    tem o privilgio de ser montado, gn, por ele. Torna-se o veculo que

    permite ao orix voltar terra para saudar e receber as provas de respeito

    de seus descendentes que o evocaram (VERGER, 2002, p. 19).

    Esse intercmbio entre dois mundos, feito atravs de muitos rituais e cheio

    de simbologias, no qual o elgnpassou a se chamar cavalo (pois montado)

    ou filho-de-santo (pela relao familiar), ainda ganhou, no Brasil, alm das trs

    divises em nao (e suas subdivises), a variao de culto a ndios. Essa terceira

    linha religiosa, no Brasil, quando acrescida do catolicismo e da filosofia do es-

    piritismo, recebeu, h pouco mais de cem anos, tambm, o nome de Umbanda.

    Em Candombls da Bahia, Edison Carneiro fala dessas relaes quando j esta-

    belecidas aqui:

    O candombl incorpora, funde e resume as vrias religies no negro

    africano e sobrevivncias religiosas dos indgenas brasileiros, com mui-

    ta coisa do catolicismo popular e do espiritismo. [...] Os deuses e os

    mortos se misturam com os vivos, ouvem as suas queixas, aconselham,

    concedem graas, resolvem as suas desavenas e do remdio para suas

    dores e consolo para os seus infortnios. O mundo celeste no est

    distante, nem superior, e o crente pode conversar diretamente com os

    deuses e aproveitar da sua beneficncia (1954, p.31).

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    O Brasil herdou tambm outro tipo de culto afro, alm do de orixs, inquices e

    voduns: o Bab-Egum.

    As comunidades-terreiros de candombl cultuam os orixs associados

    s foras da natureza. J as comunidades-terreiros de culto de Egun-

    gun reverenciam os ancestrais, chefes de cls ou lderes que se destaca-

    ram por atos excepcionais durante suas vidas, havendo uma separao

    rigorosa desses cultos, j que cada um tem doutrina e liturgia prprias.

    Egungun ou Bab simboliza conceitos morais e representa o mist-

    rio da transformao de um ser-deste-mundo (vivo) e um ser-do-alm

    (morto) (THEODORO, 2010, p.96-97).

    Assim, Ians, tambm chamada de Oi, que, segundo a mitologia, me dos eguns,

    tem suas lendas contadas a partir de todas essas influncias. Matamba e Bamburuce-

    ma, por exemplo, so nomes freqentemente associados ao dela, contudo, no so,

    originalmente, orixs, mas, inquices. Todas quatro esto representadas, alm de outras

    caractersticas, em umafigura feminina, divindade dos ventos, materna e guerreira.

    As lendas

    Uma das histrias diz que Oi era uma mulher-bfalo. O capito Ogum,

    enquanto caava, ia matar o animal que, misteriosamente, virou uma linda

    e encantadora mulher, por quem ele se apaixonou e com quem se casou.

    Outra verso para essa mesma lenda diz que Ians, j esposa de Ogum, teria

    feito uma fantasia de bfalo para fugir s escondidas, de vez em quando, e

    se encontrar com Xang, por quem era apaixonada.

    Ogum era o ferreiro da Cidade de Oi, que tinha Xang como rei. Certa vez,

    passando prximo ao capito, Xang pediu para que Oi fosse sua, mas Ogum

    no aceitou. Ela, que tambm tinha se apaixonado pelo rei, foi embora, mesmo

    sem que seu marido concordasse, para virar a terceira mulher de Xang. Ogum,

    revoltado, trocou golpes de espada com a guerreira, que ficou dividida em nove

    pedaos, mesma quantidade de filhos que teria tido com o fer reiro.

    Em outro enredo, o rei Xang era casado, primeiramente, com Ob e, depois,

    com Oxum, a rainha do feitio. Ob, intrigada com Xang, que aceitou Oxum

    como esposa, foi perguntar senhora das guas o que ela fez para conquistar o

    rei. E Oxum, para desviar Ob do seu caminho e ser a nica rainha ao lado de

    Xang, disse que havia feito uma poro com uma das orelhas e dado para o

    marido tomar. Como Oxum andava com um toro ou com os cabelos enrolados

    cabea, presos, no mostrou, assim, o lado ferido pela ausncia de um dos r-

    gos. Ob, crente que Oxum tinha feito a tal poro, seguiu a mesma histria, fez

    um ch e serviu ao marido, que, vendo-a sem uma orelha, no gostou. Foi ento

    que Ob percebeu que tinha cado numa armadilha de Oxum.

    Quando Oi chegou ao reino junto com Xang, Oxum percebeu que, apesar de

    ter afastado Ob do marido, sofria ameaa com a chegada da nova esposa, uma

    mulher sensual, forte, alegre e desprendida. Oxum, mesmo muito bela tambm,brigou com Oi para afast-la do rei, antes que ele a tornasse a mulher mais im-

    portante do Reino de Oi.

    A nova esposa, ento, fugiu para a floresta e foi viver com o caador Oxssi,

    abandonando o segundo marido. A fria de Xang foi to grande que as trs

    esposas foram transformadas em rios que levaram seus nomes: Ob, Oy e

    Osum. Todos nigerianos.

    Associada com a gua e a chuva, considerada a filha de Oxum. Est

    ligada floresta, aos animais, aos espritos que a povoam, evocando

    a idia de perigo mortal para o caador. Segundo os mitos, Oi assu-

    me a forma de um bfalo africano que vive em charcos lamacentos.

    (THEODORO, 2010, p. 104).

    Podemos ver, ainda, uma lenda que diz que Ians teria fugido de casa de-pois que sua me, enciumada, a renegou pela beleza e sensualidade que a

    moa estava ganhando. Oi, ento, foi se esconder em uma gr uta no meio

    do mato.

    Em um momento de fraqueza, aps um perodo difcil em seu reino, Xan-

    g tinha ficado algum tempo escondido, tambm, numa gruta. Aps a fase

    triste, ele retornou ao reino. Quando contou a Ogum como fora o tempo

    em que passou escondido e onde esteve, Ogum pediu que fossem ao local

    para ele conhecer.

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    Quando chegaram l, encontraram uma mulher deslumbrante, com olhar forte e

    desafiador, pela qual os dois ficaram interessados. Era Oi, que contou como foi

    parar naquela gruta, a mesma que o rei Xang havia usado no recolhimento.

    Depois de conhecer um pouco da vida daquela mulher, Xang, sensibilizado,

    ofereceu-se como pai e deu oportunidade a Ians de lutar contra os inimigos

    ao lado dele e do irmo, Ogum. Ela era mesmo uma mulher forte e guerreira e

    Ogum no escondeu o entusiasmo de ter conhecido uma beldade como aquela,

    a quem pediu em casamento. Oi respondeu que, depois de ter sido adotada

    pelo rei Xang, era ele quem decidiria com quem ela deveria casar. Se fosse do

    consentimento do novo pai, ela seria esposa de Ogum.

    Os significados em Ians

    So realmente muitas verses em torno de um nico mito, mas comum, ainda,

    que se escute, alm dessas histrias, a de que ela era a nica mulher em quem

    Xang confiava. Oi teria ficado at o momento de passagem do rei para o

    mundo encantado (virado orix), ao lado dele, batalhando pelo crescimento

    do marido e pela proteo do povo do qual ele era rei.

    Certa vez, Xang pediu que Oi fosse buscar, junto com If, deus da adi-

    vinhao, um saco com os segredos de como desencadear os relmpagos e

    troves. Muito curiosa, independente e sem querer que o poder fosse todo

    para Xang, roubou para si o domnio dos relmpagos, enquanto o rei ficou

    com a magia dos troves.

    Uma variao dessa histria diz que Ians, primeira mulher de Xang (no a ter-

    ceira, como j foi dito), era a nica por quem ele tinha se apaixonado e a quem

    ele confiou uma misso. Pediu que Oi fosse buscar, sem que ningum soubesse,

    uma poo mgica que ele tinha encomendado. O rei no disse para que serviria

    a mistura, mas a esposa se preparou para provar do segredo. Quando, ento,

    Ians abriu o recipiente, encontrou bolinhas de algodo embebidas em azeite dedend. Sem pestanejar, engoliu uma e se tornou a senhora que conhecia o segre-

    do do acar, o bolo de fogo, representao do poder sobre os raios e troves.

    Enquanto isso, o marido ficara, somente, com o poder do prprio fogo, que,

    para ser alimentado, precisaria dos ventos de Ians.

    Gisle Cossard, no livro Aw: o mistrio dos orixs, descreve a fora da aiab

    (orix feminino):

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    Tambm conhecida como Ians, Oy se manifesta no vento, nas

    tempestades e nos tornados: ativa o fogo, acende o relmpago, des-

    tri casas e arranca as rvores, arrasando tudo com sua passagem

    (2006, p. 54).

    Por isso, quando as trovoadas e os raios anunciam chuva, diz-se Que os bons

    ventos soprem, mas na lngua de Oi: Eparrei! Essa saudao grafada de v-

    rias formas: Eparrei, Eparr, Epa Hey. A expresso bem parecida com

    o som que os filhos-de-santo, quando incorporados por Ians, emanam na

    hora que os atabaques das cerimnias religiosas sadam a entidade: rei, com

    nfase nos fonemas da letra re da letra e.

    A designao Oi tambm tem sua justificativa:

    Oi o nome usado na Nigria para Ians, a deusa a quem dedi-

    cado o Rio Nger, que conhecido como Odo Oi, o rio de Oi. O-ya

    significa ela rasgou em iorub, que nos d uma idia de vento desas-

    troso em sua passagem (THEODORO, 2010, p. 103).

    J o nome Ians associado ao nmero nove. Por isso, inclusive, um dos enre-

    dos de sua lenda conta que, na briga com Ogum, ele a dividiu em nove pedaos,

    mesma quantidade de filhos que teria tido com o fer reiro.

    Oycomanda os Eguns, o povo do alm, mantendo-os fora do mundo

    para que no venham perturbar os humanos. Ela os obriga a ficar nas

    nove partes do cu que lhes so reservadas, os nove oruns, da o segundo

    nome de Oy: Oy mesan orum, Oy dos nove cus, que se tornou Ians

    (COSSARD, 2006, p. 54-55).

    Verger (2002) apresenta mais um enredo para a verso do nome Ians, fazendo

    conexo entre a indumentria utilizada nos rituais de Bab-Egun:

    Oi Lamentava-se de no ter filhos. Esta triste situao era conseqncia

    da ignorncia a respeito das proibies alimentares. Embora a carne da

    cabra lhe fosse recomendada, ela comida a de carneiro. Oi consultou um

    babala, que lhe revelou o seu erro, aconselhando-a a fazer oferendas,

    entre as quais deveria haver um tecido vermelho. Este pano, mais tar-

    de, haveria de servir para confeccionar as vestimentas de Egngn. Tendo

    cumprido essa obrigao, Oi tornou-se me de nove crianas, o que se

    exprime em iorub pela frase: y Omo msn, origem no do nome Ian-

    s (2002, p. 168-169).

    Cossard (2006) apresenta sete variaes tambm chamadas de qualidades

    para a deusa Ians: Ic Oy(carrega a morte), Oy Onir(ligada a Oxum),Jegb

    (a mais velha),Jimud(ligada a Oxal), Car( o fogo), Pad(d luz aos eguns) e

    Bal(que comanda os eguns).

    Ainda na poca em que se fazia necessrio cultuar os santos catlicos na inten-

    o dos deuses africanos, Santa Brbara (trazida ao Brasil pelos colonizadoresportugueses) era associada tanto a Oi, quanto a Xang. Dizia-se que os devotos

    nags de Brbara, quando eram homens, cultuavam, na verdade, o Rei de Oi,

    enquanto as mulheres seriam filhas de Ians.

    Com o tempo, Xang deixou de ser associado santa, primeiramente porque

    Brbara de gnero feminino, depois porque a mrtir catlica, que teria sido

    degolada pelo pai e ele, por sua vez, morrido, logo aps, com descargas de raios,

    traz uma lenda com caractersticas mais ligadas aiab Ians.

    nesse contexto histrico e mtico que Oi vivida na Bahia. Pelas figuras de

    fora e com poderes sobre os raios, Ians e Santa Brbara so comparadas, as-

    sociadas e suas histrias foram sofrendo releituras ao longo dos tempos, a partir

    das lendas que envolvem as duas. Essa relao, inclusive, deu vez a ditados

    populares contidos no processo de bifurcao religiosa entre os cultos de matriz

    africana e o catolicismo: No que Ians seja Santa Brbara, que Santa Br-

    bara de Ians.

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    ICONOGRAFIA* Snia Ivo

    Santa Brbara

    Figura catlica conhecida como mrtir que tem poder sobre os raios, SantaBrbara, nas representaes iconogrficas, usa tnica e manto. Sua imagemtraz cabelos longos caindo em mechas onduladas, enquanto sua cabea desco-

    berta cingida por uma coroa de flores, que utilizada para sinalizar a virginda-

    de, ou por um diadema, remetendo s coroas de princesas medievais.

    Entre os atributos que identificam Santa Brbara est um clice com uma hs-

    tia, fazendo referncia ao sangue e ao corpo de Jesus Cristo, por quem ela foi

    martirizada. H, ainda, a representao da torre onde, segundo sua lenda, ela foi

    aprisionada e na qual teria aberto uma terceira janela, em honra da Santssima

    Trindade: Pai, Filho e Esprito Santo.

    Em uma das mos da santa, encontramos uma folha de palma, smbolo do mar-

    trio, enquanto em outra, a espada, aludindo decapitao que sofreu depois da

    briga com o pai. Algumas vezes, a imagem est ao lado de um canho, por ser

    padroeira dos artilheiros.

    A cor vermelha marcada nas vestimentas da santa lembrando o sangue que foi derra-

    mado na sua morte. O branco, tambm presente, refere-se pureza, sua virgindade.

    Ians

    Com a influncia das produes de imagens dos santos catlicos em madeira ou

    gesso, passou-se a confeccionar, tambm, iconografias dos orixs. Ians repre-

    * Museloga

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    sentada por uma mulher negra, de roupas rosa, vermelha, branca e vermelha ou

    somente branca, assim como o so as indumentrias dasfilhas-de-santo na hora

    dos rituais sagrados.

    Numa das mos, Oi leva uma espada, simbolizando suas lutas, na outra, um eruexin,

    formado por uma crina de cavalo presa a um cabo de metal, utilizado para espantar

    egungns. Ians traz na cabea uma coroa real, chamada ad, com umfil, um tipo de

    cortina cobrindo o rosto, como todas as deusas africanas aqui cultuadas.

    Nos rituais dos terreiros, as filhas de Oi utilizam no pescoo uma corrente de

    ib, feita normalmente de cobre, de onde pendem miniaturas de atributos das

    aiabs. Usam, tambm, um dilogum(ou edilogum), que so colares feitos com

    12, 14 ou 16 fios-de-contas (ou pernas), ordenados em conjuntos simbli-

    cos, arrematados por uma firma (uma conta maior, ovalada ou cilndrica).

    No peito, trazem um oj, uma tira de tecido fazendo um enorme lao no

    busto.

    Vemos, ainda na iconografia de Ians, um abeb, semelhante a um leque fixo em

    um cabo, abano geralmente em cobre, com desenhos incisos fazendo aluso a

    Santa Brbara, como clice, alfanje, raio. Complementando a indumentria, as

    filhas-de-santo utilizam braceletes compridos, em forma de copo, alm de cor-

    rentes e chifres de boi encastoados em cobre.

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    O CULTO A SANTA BRBARANA BAHIA

    * Nvea Alves dos Santos

    Ociclo de festas populares em Salvador se inicia no dia 04 de dezembrocom as homenagens a Santa Brbara. Nesta data, a cidade se veste de ver-melho e branco para homenage-la. Durante todo o dia, essas cores se misturam,

    dando mais vida aos espaos do Centro Histrico de Salvador e do Bairro da

    Liberdade, locais onde so realizadas manifestaes em louvor santa.

    O culto a Santa Brbara, aqui, data a partir do sculo XVII, quando o casal Fran-

    cisco Pereira do Lago e Andressa de Arajo fundou, na regio do comrcio da

    primeira capital do Brasil, um morgado com capela para sua santa de devoo,

    Brbara. Eram denominados de morgados os acmulos de bens, como pro-

    priedades e jias, que garantiriam certo conforto material, sobretudo, ao filho

    primognito de quem os institua. O de Santa Brbara, formado em 1641, tinha

    a finalidade, portanto, de assegurar bens terrenos e garantias econmicas aos

    descendentes do casal Pereira do Lago.

    Francisco e Andressa tiveram apenas duas filhas: Madalena e Francisca Pereira

    do Lago, em favor de quem foi reunido o patrimnio, composto de prdios e

    capela. Dois anos antes de institudo o Morgado de Santa Brbara, em 1639,

    Francisco havia sido nomeado, pelo ento governador Conde da Torre, capito

    de infantaria e, em 1649, assumiu o posto de general. A primeira referncia a

    Francisco Pereira do Lago de 1624, quando lutou como capito contra a inva-so dos holandeses na Cidade de Salvador.

    Com o tempo, o morgado foi sendo destitudo e transformado em mercado,

    situado ao p da Ladeira da Montanha, onde atualmente est o prdio da Rede

    Ferroviria Federal, na Praa da Inglaterra. Segundo a historiadora Hildegardes

    Vianna, no Calendrio de Festas Populares da Cidade do Salvador(1983), todos os

    anos, no mercado que integrava o Morgado de Brbara, bem como no Mercado

    * Antroploga

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    de So Joo, que lhe ficava fronteirio, os encarregados dos festejos se movimen-

    tavam para uma cotizao geral. Os negociantes do comrcio da Cidade Baixa

    de Salvador davam contribuies, sem exceo. O nicho era reformado e se fazia

    uma rigorosa limpeza no Mercado de Santa Brbara, onde cordes de bandeiri-

    nhas coloridas, palmas de coqueiro e folhas de pitanga ornamentavam o espao.

    Toda essa arrumao era para a festa de 04 de dezembro.

    Quando o grande dia chegava, havia missa na Igreja do Corpo Santo ou na

    Matriz da Conceio da Praia, ambas na Cidade Baixa. Pierre Verger, no livro

    Bahia 1850, que aponta as celebraes a Santa Brbara como as que inau-

    guravam o ciclo de festas populares na Bahia, registra, ainda, o perfil do festejo,

    desde aquela poca:

    A festa de Santa Brbara que cai no meio da novena de Nossa Senho-

    ra da Conceio celebrada, sobretudo, pelos africanos e pelas pessoas

    que trabalham no mercado de Santa Brbara na cidade baixa [...] a festa

    catlica consiste em uma missa e uma procisso em torno do mercado

    dos Arcos de Santa Brbara. Os devotos dessa santa organizam regozijos

    no interior do mercado, onde sambam e bebem cachaa em abundncia

    (1999, p.73).

    Aps um incndio que destruiu o que restava do morgado, a imagem de Santa

    Brbara, que ficava em uma capelinha prpria, foi transferida para a Igreja do

    Corpo Santo, onde a devoo continuou sendo mantida pelos negociantes de

    toda a rea. Brbara havia ganhado fiis, sobretudo entre os populares.

    Por motivo de degradao e vrios incndios, o centro comercial que recebia onome da santa foi desativado do primeiro local e transferido para outro, j na

    parte alta da cidade. No livro Bahia Pr Comeo de Conversa(1982), Ansio Felix

    indica que isso deva ter ocorrido por volta de 1889.

    De acordo com comerciantes do atual Mercado de Santa Brbara, locali-

    zado na Avenida J. J. Seabra (Baixa dos Sapateiros), uma imagem foi tra-

    zida de Portugal diretamente para os barraqueiros do antigo morgado, h

    pouco mais de 130 anos. Seria, portanto, a mesma abrigada na igrejinha

    do Corpo Santo.

    A imagem, que em princpio esteve na Igreja do Corpo Santo, foi, ainda, para

    a Igreja do Pao, na regio do Carmo, e, finalmente, para o antigo mercado da

    Rua da Vala. Esse ltimo, alis, inaugurado em 28 de fevereiro de 1874, o que

    foi batizado com o mesmo nome do antigo que ficava no morgado, Mercado de

    Santa Brbara.

    Segundo Waldir Freitas Oliveira, em Santos e Festas de Santos na Bahia

    (2005), no h certeza, ainda, sobre a data em que transferiram a santa para

    o mercado na Baixa dos Sapateiros e h indcios que a imagem tenha per-

    manecido durante certo tempo no Pao. Nesse perodo, inclusive, a festa foi

    mantida e a santa, em procisso, levada ao mercado, no dia 04 de dezembro,

    aps a missa.

    O novo mercado da Baixa dos Sapateiros, arrendado pela famlia Pompi-

    lho, tinha como padroeira Nossa Senhora da Guia, mas deu lugar a Santa

    Brbara. Em 1946, a mrtir catlica recebeu um altar especial dentro da-

    quele estabelecimento. Porm, devido precariedade das instalaes e

    necessidade de reformas no centro comercial, que estava interrompendo

    suas atividades, a imagem foi transferida, em 1987, para a Capela de Nossa

    Senhora do Rosrio dos Pretos, localizada na rua frente, no Largo do

    Pelourinho. O mercado re abriu em dezembro 1997, mas a antiga santa con-

    tinuou abrigada na igreja.

    Em depoimento no livro Orixs, santos e festas: encontros e desencontros do sincretismo

    afro-catlico na cidade de Salvador, de Vilson Caetano de Souza Junior, o senhor

    Albrico Paiva (j falecido), que era Mestre de Novios da Irmandade de Nossa

    Senhora do Rosrio dos Pretos, afi

    rma:

    Duas africanas vendedoras de fato na gamela, mandavam todos os anos

    celebrar missa na Igreja de Nossa Senhora do Rosrio para a Santa no dia

    dedicado a ela pelo calendrio catlico. A santa era trazida do mercado,

    ouvia dizer a missa e voltava em procisso. Esta seria a origem da festa.

    Isso tornou-se uma tradio! Com o passar do tempo, devido ao estado

    que se encontrava o mercado na dcada de 80, a Santa foi trazida para a

    Igreja do Rosrio e a partir da a procisso sai daqui at os dias de hoje

    (2003, p.128).

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    A festa no sculo XX: procisso e caruru

    Desde o perodo ao qual o senhor Albrico se refere, a Igreja do Rosrio dos Pretos

    abre suas portas para a celebrao a Santa Brbara com missa solene. Como de cos-

    tume, logo depois, a procisso percorria o Centro Histrico de Salvador. At incio

    da dcada de 1970, a procisso originava-se no mercado, depois da missa, que ali

    tambm j foi realizada, e os fiis seguiam percorrendo a Baixa dos Sapateiros, fazen-

    do parada no 1 Batalho do Corpo de Bombeiros e aps, subindo a Ladeira da Pra-

    a, passando pela Rua da Misericrdia, Praa da S, pelo Terreiro de Jesus, descendo,

    ento, para a Praa Jos de Alencar, mais conhecida como Largo do Pelourinho.

    Em meados dessa mesma dcada, o trajeto fazia o caminho em sentido contr-

    rio, partindo do Largo do Pelourinho, subindo pela Rua Alfredo de Brito, pas-

    sando pelo Terreiro de Jesus, Praa da S e Rua da Misericrdia, descendo, ento,

    a Ladeira da Praa, fazendo a parada no Corpo de Bombeiros e seguindo depois

    pela Baixa dos Sapateiros at chegar ao Mercado de Santa Brbara. Nos anos de

    1990, durante a execuo do Programa de Recuperao do Centro Histrico de

    Salvador, em vez de cruzar a Rua Alfredo de Brito at o Terreiro, o trajeto seguia

    por uma rua vizinha, Joo de Deus. A partir dos primeiros anos do sculo XXI,

    a procisso, que continua partindo do Largo do Pelourinho, sobe pela mesma

    Rua Joo de Deus ou pela Rua Gregrio de Mattos.

    Essa procisso seguida pelos andores com imagens de Nosso Senhor do Bon-

    fim, Nossa Senhora da Guia, So Lzaro, So Benedito, Santo Antnio de Ca-

    teger, So Miguel, So Jorge, So Sebastio, So Jernimo e os santos Cosme

    e Damio. Logo aps o recolhimento da imagem, o caruru servido e a festa

    tomada pelo que se chama de a parte profana.

    O autor Geraldo da Costa Leal, no livro Salvador dos Contos, Cantos e Encantos,

    retrata a folia nos anos passados:

    Salvo no Mercado de Santa Brbara, em que a festa era no seu inte-

    rior, sistematicamente, aquelas eram realizadas ao ar livre, nas chama-

    das festas de largo e qualquer pessoa podia participar. Formada a roda,

    era ouvido o som de um cavaquinho, estrepitoso bater de palmas no

    ritmo da msica, acompanhado de um pequeno atabaque, colocado

    embaixo do brao de algum participante, batido com as duas mos,

    um chocalho, um pandeiro e muitas vezes os instrumentos paravam

    para se ouvir uma faca ser arranhada na borda de um pano de cozi-

    nha, completando a sonoridade inusitada e distinta. As palmas no

    paravam, e no contorno da roda uma crioula ou mulata sambava rodo-

    piando. Nem todos os componentes das rodas eram jovens, havia at

    velhos e senhores participantes com grande habilidade danante, que

    passavam a outro componente o direito de se apresentar no centro da

    roda. Com uma umbigada, transferiam a outro bailarino a responsabi-

    lidade de uma grande exibio de movimentos dos ps, o molejo das

    cadeiras, dos ombros e dos braos, enfim, todo o corpo em requebros,

    recebendo caricias das prprias mos que ficavam inquietamente er-

    ticas. Acompanhados de passos curtos ou longos, de ps descalos ou

    com sandlias, aqueles miudinhos ps quase juntos, chamados corta

    jaca, alternados com os largos, num baile de fazer inveja a mais erudita

    danarina (2000, p.95).

    Os comerciantes do Mercado de Santa Brbara conservam a tradio de ser-

    vir o caruru em um banquete para, aproximadamente, 12 mil pessoas. Con-

    tudo, os organizadores da festa no Mercado encontram dificuldades para a

    manuteno do costume, devido falta de recursos. Ainda assim, durante o

    dia da festa, o Mercado muito movimentado, tanto por fiis que vo visitar

    o altar para fazer pedidos e agradecer, como pelos j freqentadores que

    vo em busca da diverso.

    Os louvores mrtir catlica s comearam na Baixa dos Sapateiros com esse

    formato que conhecemos hoje no sculo seguinte s transferncias dos merca-dores para o local. Em 1912, por iniciativa de trs mulheres que comercializavam

    ali, Bibiana, Luzia e Pinda, todas devotas de Brbara, uma festa para marcar a

    passagem do 04 de dezembro foi organizada, independente da Igreja. Pinda, no

    primeiro ano dessas homenagens, cedeu uma parte do seu aougue para que ali

    fosse colocada a imagem.

    Cinco anos antes, ratificando a convergncia religiosa caracterstica desse festejo,

    uma filha-de-santo se destacou, como aponta Joclio Teles dos Santos no semi-

    nrio Eparrei, Brbara: f e festas de largo do So Salvador.

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    O dia quatro de dezembro de 1907 foi uma referncia para a secular festa

    de Santa Brbara. Uma negra chamada Balbina, fateira muito conhecida na

    cidade do Salvador,filha de Ians, convidou pais e mes-de-santo afamados

    para reverenciar a santa e a orix no mercado de Santa Brbara. Este ano foi

    considerado o ponto alto da festa de Santa Brbara. Alm de prestigiadas

    lideranas afro-religiosas, estavam presentes reconhecidos mestres de capo-

    eira como Pedro Porreta e Boclor, e algumasfiguras bastante populares do

    cotidiano baiano, como Maria Comprida (2005, p.33).

    Alis, a festa reunia mesmo figuras marcantes entre os populares da poca.

    Alm de Pedro Porreta e Boclor, outros capoeiristas lendrios, como Pe-

    dro Piroca e Chico Trs Pedaos. Juntos, jogavam capoeira num espetculo parte. Conta-se que nem mesmo a presena policial os intimidava, nesse

    tempo em que capoeira no era vista como esporte nem mesmo expresso

    cultural, como hoje.

    Outra que por muitos anos se destacou nos festejos populares na Bahia, prin-

    cipalmente na Festa de Santa Brbara, foi Maria Comprida, qual Joclio Teles

    se referiu; mulher do povo, conhecida por beber cachaa. Onde havia arruaa,

    ela estava presente. Carlos Torres, no livro Vultos, Fatos e Coisas da Bahia, igual-

    mente a menciona:

    Maria Compridinha parda, bastante alta e magra, morava na Rua de

    Baixo (hoje Carlos Gomes), muito conhecida dos rapazes afidalgados da

    poca, tocava regularmente piano. Diziam caluniosamente, ter sido pre-

    ferida de importante autoridade da poca. Havia sido proprietria, pos-

    suindo boas jias e dinheiro. Quando saa era somente a carro. Morreu naindigncia (1950, p. 131).

    Ainda assim, com o marcante comparecimento dessas figuras, a presena do

    povo-de-santo e de populares de uma maneira geral ficava parte, algumas ve-

    zes. Jornais locais da poca registravam a passagem do 04 de dezembro, mas

    somente na igreja Catlica:

    Notas Eclesisticas Em louvor da Gloriosa Santa Brbara celebra-se hoje na Igreja do

    Corpo Santo, missa festiva. (Dirio da Bahia, 04 de dezembro de 1904, p. 01)

    Notas Eclesisticas Na Egreja do Corpo Santo, ser celebrada, domingo prximo,

    s 7 horas da manh, missa festiva em louvor Santa Brbara. Este acto mandado

    realizar pela devoo de Santa Brbara, no bairro commercial. (Dirio da Bahia, 03

    de dezembro de 1910, p. 02)

    Santa Brbara A Egreja Catholica dedica o dia de hoje Gloriosa Santa Brbara.

    Na Egreja do Corpo Santo, houve missa s 8 horas da manhan, em louvor quela

    Santa. (Dirio de Notcia, 04 de dezembro de 1912, p.02)

    Algumas dcadas depois, os festejos a Brbara j eram apontados pela imprensa

    considerando a adorao em carter popular:

    Dia de Santa Brbara.

    O dia de hoje, marca a folhinha, consagrado Santa Brbara, cuja devoo, entre ns,

    reponta desde os tempos da colonizao. De acrdo com a tradio, fruto da influncia

    da religio catlica de seitas afro-brasileira, Santa Brbara foi identificada como Ians-

    san, a deusa da trovoada, que comanda as foras dos elementos, faz chover e protege os

    seus devotos. [...] Alm dos festejos tpicos em vrios postos da cidade, a festa religiosa

    propriamente dita se verifica no Mercado da Baixa dos Sapateiros, que tem o seu nome

    e onde a sua imagem venerada. Esta manh houve missa festiva e durante todo dia

    se realizaro naquele lugar, festividades de carter popular. (Jornal A Tarde, 04 de

    dezembro de 1950, p.02)

    J nos anos 2000, o retrato da festa na imprensa pode ser visto assim:

    Vermelho e Branco nas ruas.

    Entre as festas populares de Salvador, a de Santa Brbara uma das poucas de carterquase estritamente religioso. Ontem foi dia de reverncia santa e osfiis lotaram o

    largo do Pelourinho para a missa campal vestidos de vermelho e branco. A Igreja de

    Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos, que guarda a imagem de santa Brbara, no

    comportaria a multido. (...) Quando o padre deu a bno no final da missa, comea-

    ram as saudaes a Santa Brbara e a orix Ians, com aplausos e queima de fogos.

    (Jornal A Tarde, 05 de dezembro de 2006, p. 07).

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    Brbara, Ians e o processoreligioso na histria

    Desde o perodo colonial, vrias organizaes

    religiosas foram criadas pelos gestores das clas-

    ses dominantes da sociedade. Instituram con-

    frarias, irmandades e ordens terceiras que, ape-

    sar de no terem essa finalidade, com o tempo,

    fortaleceram a vida em comunidade dos afri-

    canos no Brasil, especificamente na Bahia. Ti-

    nham o objetivo de congregar indivduos em

    torno de uma devoo a um santo, a manuten-o do culto e a realizao de suas festas, alm

    de, posteriormente, comprar alforrias e auxiliar

    os desvalidos.

    Dentro dessas organizaes, foram absorvidos

    pelos povos oriundos da frica que, at ento,

    no eram catlicos, alguns elementos simbli-

    cos da religio crist. A partir de relaes como

    essa, criaram-se dilogos religiosos caracteriza-

    dos, fundamentalmente, pela intermistura de

    elementos culturais, abrangendo processos de

    interao com o objetivo de prevenir, reduzir

    ou anular conflitos. Essa relao foi batizada de

    sincretismo religioso e apontada como ca-

    racterstica dos festejos populares na Bahia.

    Para as religies de matriz africana, esse sincre-

    tismo foi a forma de relacionar seus deuses aos

    santos, que, de certa forma, os africanos eram

    obrigados a cultuar por imposio da Igreja Ca-

    tlica. Isso, porm no significava uma fuso.

    Tratava-se de uma estratgia de transculturao

    sabiamente utilizada para a preservao e ma-

    nuteno da religiosidade africana.

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    Em O Liberato: o seu mundo e os outros, Maria Ins Cortes Oliveira escreveu:

    [...] assimilao do catolicismo pelos libertos teria operado da mesma

    forma que na religio popular geral, isto , alm da aceitao dos traos

    externos do culto, a doutrina teria sido criada a partir daqueles elementos

    que falavam mais perto s necessidades da comunidade liberta, em geral

    a africana. Da mesma forma, o sincretismo operando convenincias en-

    tre religies africanas e o catolicismo po pular, levando-nos a considerar a

    importncia da resistncia entre religies afro-brasileiras e o catolicismo

    (1998, p.79)

    Diante desse processo histrico, Raul Lody, no livro O Povo do Santo, ressalta arelao entre Ians e Santa Brbara:

    Santa Brbara Ians, unidas pela nica leitura, tambm se apresentam

    como verdadeiras heronas das lendas dos orixs, arqutipos da valentia

    projetada em todas as situaes em que a cultura popular localiza com

    especialidade o ritual dos terreiros (1995, p. 86-87).

    nesse contexto que acontecem as comemoraes a Santa Brbara, deixando a

    esttica da festa dinmica. Existe todo um ritual envolvendo elementos catlicos

    e da religiosidade afro-brasileira. O modo de vestir, de rezar, de cantar, de sau-

    dar. Segundo o etnlogo Waldeloir Rego, em artigo publicado no jornal Tribuna

    da Bahia (02 de dezembro de 1971), nas homenagens a Santa Brbara havia um

    clima mstico de uma etnia africana. Era realizado um grande candombl no

    mercado pelo pai-de-santo na nao Angola chamado Rafael Boca Torta, en-

    quanto havia missa na Igreja do Rosrio dos Pretos realizada por um ofi

    ciantee assistente negros. Por isso, quando a procisso entrava no mercado, era Santa

    Brbara quem estava no andor, mas I ans no ritual afro-brasileiro.

    Raul Lody, no catlogo da exposio Eparrei, Brbara: f e festas de largo do So

    Salvador(2005), considerou:

    Dona do mercado, do tabuleiro, do oficio da baiana de acara-

    j Ians. O mercado um lugar da histria da mulher africana a afrodes-

    cendente, em especial da mulher nag/iorub. Est no mercado a sntese

    da sociedade e de tudo que a natureza e a cultura podem oferecer de pro-

    dutos, de objetos artesanais, comidas, folhas e principalmente encontros,

    pois o espao de estab elecer contatos, de viver as trocas, de reencontros,

    de organizar e marcar diferentes papis socias, um lugar, portanto, de ex-

    perimentar tradies, de comunicar, de socializar, de aproximar a pessoa

    de sua histria, de apontar e manter identidades. Seguindo esses princpios,

    o mercado de Santa Brbara na Baixa dos Sapateiros, Salvador, traz essas

    memrias remotas africanas e atualiza outras, que fazem sua dinmica e

    seu prprio ser social e econmico. H no Mercado de Santa Brbara forte

    devoo religiosa a sua padroeira, que merece culto dirio, aberto a mani-

    festaes, pedidos de agradecimentos santa, que no imaginrio popular

    tambm orix.

    Nesse perfil, em que cultos a santo catlico e a orix dialogam, que outras refern-

    cias tambm ganham fora. Santa Brbara padroeira do Corpo de Bombeiros e,

    por isso, reverenciada na sua passagem pelo quartel ao som de buzinas, saudaes e

    onde oferecido caruru aos que ali se encontram para homenagear a guerreira. Esse

    caruru feito por integrantes da corporao e devotos de Brbara ou mesmo por

    filhos de Ians, atravs de parcerias, tambm, com comerciantes locais, que fazem

    doaes. Uma missa realizada pelo capelo militar e aberta comunidade.

    Mas nem sempre foi assim. Alm de alguns membros da Igreja Catlica afirma-

    rem a distncia entre as figuras guerreiras, enquanto muitos faziam referncia

    s duas, outros agiam para evitar essa manifestao de duplo devotamento. Em

    1975, o Jornal Tribuna da Bahia publicou:

    Bombeiros impedem Ians de ser carregada pelo povoSanta Brbara sim, o povo no com essa determinao o comandante do Corpo de

    Bombeiros, proibiu a entrada tradicional dos devotos de Santa Brbara (Ians, rainha

    dos raios) nas dependncias do quartel do Corpo de Bombeiros. Cerca de duas mil

    pessoas se aglomeraram frente ao quartel. Houve empurres, palmas, muita confuso,

    choros, manifestaes, mas ningum entrou (04 de dezembro, p. 09).

    Ainda outro fato marcante tangendo o Corpo de Bombeiros no dia de Santa

    Brbara havia sido registrado pelo mesmo veculo, a Tribuna da Bahia, quatro

    anos antes, em 1971. O que tinha virado costume foi interrompido:

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    Quebrando uma tradio de cerca de 20 anos a Banda do Corpo de Bombeiros no

    acompanhou hoje a Procisso de Santa Brbara, sendo substituda pela Banda da Polcia

    Militar. Segundo o Comandante Evaristo Leal, do Corpo de Bombeiros, a Banda foi

    requisitada pelo prefeito Clriston Andrade para ir tocar em Cruz das Almas(04 de

    dezembro, p.05).

    Esses fatos no diminuram o brilhantismo da festa. A cada ano, aqueles que

    participam das homenagens a Santa Brbara trazem para o palco das ruas do

    Centro Histrico a f, a alegria e o orgulho manifestado no choro, no sorriso,

    nos cnticos, nos agradecimentos pelas graas alcanadas. Os fiis carregam o

    andor do santo de devoo em busca de conforto, sem esquecer de saudar a

    mrtir catlica e uma das divindades mais populares do culto afro-brasileiro,dizendo: Viva Santa Brbara e Eparrei, Ians.

    Dia quatro na Liberdade

    As homenagens santa se estendem para alm do Centro Histrico de Salvador.

    no Bairro da Liberdade, local onde se concentra um significativo nmero de

    afro-descendentes em Salvador, que Santa Brbara tambm homenageada. L

    est situada a Parquia de Santa Brbara, fundada em 08 de dezembro de 1973.

    Monsenhor Waldir Guimares do Esprito Santo a instalou ali com o objetivo de

    criar um movimento religioso de razes na devoo popular. Ento, foi escolhida

    Santa Brbara como padroeira. Cerca de 40 anos antes, em 1930, durante o Con-

    gresso Catlico Livre, em So Paulo, motivado pela opo da Ordem de Santo

    Andr em se emancipar, foi criada uma vertente do catolicismo: Igreja Catlica

    Apostlica Independente, batizada de Igreja Brasileira.

    Esse movimento da Independente considera os santos da chamada Igreja Primi-

    tiva at o terceiro ou quarto sculo, poca em que no existia canonizao como

    a Igreja Catlica faz hoje. Os santos eram apontados pelo povo. Ento, Brbara,

    de quem se conhece a histria como algum que viveu no sculo III, era bastante

    popular por aqui e, por isso, a parquia em sua devoo.

    Monsenhor Waldir realizou, pela primeira vez, no ano de 1974, a festa para Santa

    Brbara na Parquia da Liberdade. Os festejos comeam, at hoje, com o trduo pre-

    paratrio a partir de 1 de dezembro. J no dia 04, h missa pela manh, seguida de

    uma procisso que percorre as ruas do Bairro da Liberdade, indo at o Bairro Gua-

    rani, retornando para a celebrao de uma missa campal na Praa Nelson Mandela.

    Dom Roberto Garrido Padim, bispo da Igreja C. A. Independente, em en-

    trevista para pesquisa sobre as celebraes a Santa Brbara, ressaltou a forte

    presena das duas religies nos festejos: a de matriz africana e o catolicismo.

    Ele conta que durante uma missa campal percebeu, entre os devotos, um ba-

    balorix, vestido tradicionalmente que, em alguns momentos, retirava o gorro

    da cabea, jogava para cima e gritava Eparrei. Ao final da missa, o bispo fez

    uma referncia a este fato dizendo: Tem gente que vem aqui e a gente sabe,

    por causa de Santa Brbara. Ento, para aqueles que vem por causa de Santa

    Brbara: Viva Santa Brbara. Mas, queles que vem por causa de Ians, porque no dizer: Eparrei, Oi?!

    O dilogo religioso ou sincretismo, como mais conhecido, que envolve os fes-

    tejos populares em Salvador, representa elemento essencial para todas as formas

    de relao que tangem devoo popular, suas maneiras de reverenciar os san-

    tos catlicos e, tambm, os orixs, inquices e voduns. Assim, percebemos que

    a religiosidade afro-baiana resultou na capacidade de relacionar e diferenciar os

    elementos simblicos atribudos s suas divindades. Isso , tambm, o resistir,

    manifestar a sua f sem se desvencilhar das suas matrizes religiosas.

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    A FESTA DE SANTA BRBARANO PELOURINHO

    * Carla Bahia

    No desanime, moo. Hoje dia de Ians, mulher de Xang, orix dos

    raios e tempestades. Mais logo, nos terreiros, ela est descendo no corpo

    dos seus cavalos.

    Dias Gomes em O Pagador de Promessas

    s vsperas do dia 04 de dezembro, quando se comemora a Festa de SantaBrbara, so feitas muitas oferendas a Oi, deusa iorubana dos ventos edas tempestades, com canes, comidas e flores, mas so os exus os primeiros a

    celebrar. Apresentados como Pomba-Gira, Tiriri, entre outros, eles so os

    orixs, segundo a mitologia, que oportunizam as coisas acontecerem.

    Sempre que se comea um trabalho nos cultos afro-brasileiros, so para os exus

    as primeiras oferendas, para que dem espao ao povo-de-santo continuar os ri-tuais sagrados. Nos terreiros de candombl, nas cerimnias religiosas, so canta-

    das, geralmente, trs msicas dedicadas a cada santo iorubano. Mas Exu quem

    sempre recebe as primeiras homenagens.

    No mercado de Santa Brbara, na Avenida J. J. Seabra, mais conhecida como

    Baixa dos Sapateiros, no Centro Histrico de Salvador, entre os dias 1 e 03 de

    dezembro, uma cerimnia discreta para purificao do espao feita por um

    * Jornalista

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    sacerdote de religio afro-brasileira, um babalorix (ou pai-de-santo, como

    popularmente chamado). Ningum de fora nem, s vezes, alguns de l

    sabem quando isso acontece exatamente. uma limpeza feita, em geral, de

    madrugada, quando o comrcio est fechado. E, nesse momento, o povo-

    de-santo conta com a presena dos exus. Diz-se que eles seriam os traba-

    lhadores dos orixs.

    O antroplogo francs Pierre Verger explica, em Orixs Deuses Iorubs na fri-

    ca e no Novo Mundo:

    Exu que supervisiona as atividades do mercado do rei de cada cidade: o de

    Oy chamado de s Akesan. Como orix, diz-se que ele veio ao mundo com

    um porrete, chamado o og, que teria a propriedade de transport-lo, em algumas

    horas, a centenas de quilmetros e de atrair, por um poder magntico, objetos si-

    tuados a distncias igualmente grandes. o guardio dos templos, das casas, das

    cidades, das pessoas. ele tambm que serve de intermedirio entre os homens e

    os deuses. Por essa razo que nada se faz sem ele e sem que oferendas lhe sejam

    feitas, antes de qualquer outro orix, para neutralizar suas tendncias a provocar

    mal-entendidos entre os seres humanos e em suas relaes com os deuses e, at

    mesmo, dos deuses entre si (2002, p. 76).

    Em muitas encruzilhadas, sobretudo de madrugada, so colocados presen-

    tes para os exus. Cachaa, fumo, flores, farofa de dend e o que mais for

    necessrio, de acordo com o pedido ou com a crena de cada um. Depois

    de trabalhos como esses, comeam as comemoraes a Ians ou, ainda, para

    Santa Brbara que, para alguns, representam a mesma divindade. Assim,

    apesar de o festejo ser realizado de acordo com o calendrio litrgico doVaticano, na data tida como da morte da santa, Oi tambm senhora do

    dia 04 de dezembro, junto com Brbara.

    O trduo de Brbara

    Na Capela do Rosrio dos Pretos, na Praa Jos de Alencar (mais conhecida

    como Largo do Pelourinho), os festejos a Santa Brbara comeam j no primeiro

    dia dezembro, com o incio de um trduo mrtir catlica. Ao cair da tarde, aos

    poucos, a nave da igreja comea a receber gente para a missa das 18 horas.

    Durante os dias primeiro e trs, toda noite, uma cerimnia realizada em louvor,

    alm de Brbara, a outros santos abrigados ali. nesse perodo, tambm, que as

    devoes a Santo Antnio de Categer, Santa Brbara e So Benedito, acolhidas

    na igreja, comemoram a entrada de novos membros.

    Esse templo, alis, um importante patrimnio da cultura negra no Brasil, cons-

    trudo pelos bantos de Angola e do Congo, sob autorizao do arcebispo D.

    Sebastio Monteiro da Vide. A Capela da Venervel Ordem Terceira do Rosrio

    de Nossa Senhora s Portas do Carmo foi o primeiro espao catlico destinado

    especialmente ao povo africano. Abriga, desde aquela poca, a Irmandade dos

    Homens Pretos e foi dedicada devoo de Nossa Senhora do Rosrio, ainda

    festejada ali todo ms de outubro.

    A instituio dessa igreja marcou um novo momento para aquele povo, pois

    foi nessa mesma regio que um pelourinho era erguido, at o incio do s-

    culo XVIII. Alm disso, no sculo anterior, holandeses, quando na invaso

    que fizeram s ter ras brasileiras, castigaram mais de 50 escravos, sob alega-

    o de espionagem em favor dos espanhis, como vemos no livreto Pequeno

    Guia das Igrejas da Bahia, de Maria Jos Rabello de Freitas. Nele tambm

    est registrado:

    Nesse local de to penosas recordaes para os negros escravos da Bahia,

    foi, por eles, erguida, ainda no sculo XVII, pequena ermida sob a invo-

    cao de Nossa Senhora do Rosrio que, reconstruda, ainda se mantm

    aberta ao culto, embora afogada pelas construes residenciais que no

    puderam quebrar a magnitude da edificao (1966, p. 06).

    Pois, nesse mesmo espao, conhecido hoje como Pelourinho, marcado

    pela superao, que se festeja Brbara, a mrtir catlica. As devoes da

    Igreja do Rosrio dos Pretos, os comerciantes do Centro Histrico de Sal-

    vador, devotos da santa ou mesmo os filhos de Ians se organizam para ar-

    rumar a igreja, conseguir flores para ornamentao e dinheiro para preparar

    a festa ao gosto do povo. Na entrada da capela, inclusive, pode-se ver, s

    vsperas do dia 04 de dezembro, um varal que ser ve de vitrine para venda

    de camisetas brancas e vermelhas estampadas com imagem de Brbara.

    Os lucros so revertidos para a festa.

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