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Pesquisa sobre o ensino de performance em instrumento musical
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTUTO DE ARTES – IARTE
CURSO DE MÚSICA
Herbert Rodrigues Mendonça
Paula Roberta Batista Fernandes
Expertise na performance musical
Trabalho apresentado à disciplina
Psicologia do desenvolvimento
musical.
UBERLÂNDIA – MG 2015
Expertise na performance musical
A música é a arte de organização e combinação dos sons ao longo de um
contínuo temporal. E a experiência musical envolve, entre outras, a atividade de
performance.
Composição e improvisação é ato de criar e desenvolver ideias e motivos
musicais. Beineke (2008 pág. 19) pensa a composição de forma ampla abrangendo
inclusive a improvisação, diz que elas são “ideias organizadas espontaneamente com a
intenção de articular e comunicar seus pensamentos musicais.”
Execução ou performance é o ato de realização da música, o momento em que
ela é sonoramente apresentada. Um
modo de caracterizar a performance instrumental é como um
tipo de atividade de resolução de problemas que envolvem
dimensões tais como objetivos, conteúdo, meios de
aprendizagem, alocação de tempo, planejamento e avaliação de
resultados. (GALVÃO, 2006, pág. 170).
Na performance musical da música erudita, o intérprete realiza a execução da
música baseando-se no estilo, período, compositor, indicações de partitura e caráter da
peça. Para Galvão (2006), “tocar um instrumento musical é uma das mais complexas
atividades humanas pelo tipo de demanda que faz ao sistema de conhecimento como um
todo” (GALVÃO, 2006, p. 169). Ele afirma ainda que o tocar
envolve uma interdependência de aspectos cognitivos,
Kinaestheticos e emocionais realizados por meio de uma
coordenação entre os sistemas auditivos, visuais, que se
articulam com o controle motor fino (GALVÃO & KEMP,
1999; PEDERIVA 2005 apud GALVÃO 2006 pág. 169).
Muitas vezes o músico intérprete necessita de um senso crítico que limite quais
características interpretativas são boas ou não a execução do estilo musical que ele
desempenha. O que é determinado por fatores culturais e sociais imerso em seu
ambiente musical.
Vimos então que o estilo musical e o fator cultural/social ditam as características
elencáveis da boa execução musical. Sendo assim, há intérpretes que possuem boa e má
execução, segundo os padrões aceitos e esperados, na díade estilo musical e fator
cultural/social.
Os intérpretes que executam e demonstram facilidade e familiaridade com os
padrões e objetivos do estilo musical que ele cultiva podem ser denominados experts.
Galvão (2001 pág. 225) designa expertise como a capacidade adquirida através da
prática ou estudo individual deliberado (decisão do próprio músico em estudar), de
desempenhar particularmente bem uma tarefa específica de um domínio. A expertise na
performance musical pode ser facilmente encaixada na ideia de Galvão (2011) em que
ela pode ser entendida como a capacidade adquirida pela prática desempenhada
qualitativamente bem.
Por vezes o rendimento na performance não se torna satisfatório para o
intérprete, que acaba sentindo-se frustrado. França & Swanwick (2002) dizem que
frequentemente os alunos são obrigados a enfrentar seguidos desafios técnicos, sem
oportunidade para utilizarem tais recursos com expressividade e sentido musical
tornando a performance mecânica, comprometendo o desenvolvimento cognitivo
musical destes alunos.
No desempenho performático, o intérprete não é um simples instrumento de
execução musical, antes de tudo ele é um ser humano dotado de sensações, emoções e
vontades.
A performance musical pode ser entendida como o
desempenho do musicista, sua forma de interpretar uma obra
musical e criar a sua forma de execução e comunicação
musical. Porém, para que esse processo ocorra com sucesso, é
necessário que o performer esteja motivado. (GRINGS
&HENTSCHKE 2013)
E como ser humano, o intérprete pode ser suscetível a erros, lapsos de memória,
e não obstante é claro à ansiedade. A experiência de ansiedade na performance musical
pode ser uma defesa contra a experiência ou re-experiência de enfrentar uma futura
ameaça, isto é, medo da vergonha ou da humilhação de uma apresentação malsucedida
(KENNY, 2011, pág.23 apud SINICO; WINTER 2013)
Pesquisas mostram que vários fatores influenciam o processo
motivacional e podem marcar o indivíduo com julgamentos e
avaliações errôneas ou predeterminadas. A ansiedade é um
desses fatores que podem influenciar a motivação. Uma
pesquisa realizada com instrumentistas mostrou que a
ansiedade na performance pode provocar um impacto negativo
na qualidade da execução. (PAPAGEORGI; HALLAM;
WELCH, 2007 apud GRINGS &HENTSCHKE2013)
Em decorrência de todos esses fatores, em um contexto de ensino, como
propiciar o desenvolvimento da expertise na performance musical?
Sabemos que existe uma variada gama de fatores que influenciam na qualidade
performática do aluno. Dentre os meios externos que influem a execução, podemos
citar:A expectativa de pais e professores em relação ao progresso do aluno, o medo de
errar e não corresponder as exigências do meio.
No meio interno, podemos destacar ansiedade: O estado de ansiedade é uma
característica em que o indivíduo está em determinado momento. E o traço de
ansiedade que é uma disposição geral para ser ansioso (GALVÃO 2006). O medo de
palco, a insegurança, e a falta de confiança na memória.
Antes de tratarmos sobre os aspectos importantes para o desenvolvimento
cognitivo da expertise musical, vale ressaltar que a literatura em português que trata
especificamente deste tema é muito escassa. Porém, Galvão, um pesquisador brasileiro,
desenvolve muitos trabalhos na área, trazendo exemplos e estudos de pesquisadores de
outros países, sobretudo norte-americanos.
É possível inferir que os trabalhos discutam aspectos cognitivos-emocionais.
Entretanto, Galvão (2006), em seu texto, explora quatro dimensões cognitivas
relacionadas à atividade musical. São elas: o Estudo deliberado, Auto-regulação,
Memória e Ansiedade.
Estudo deliberado
O estudo deliberado,
é o termo utilizado para definir a atividade em que o aprendiz
não apenas controla, mas também toma a iniciativa do seu
próprio processo de estudo com vistas a aprimorar o seu
desempenho (ERICSSON et al. 1993 apud GALVÃO 2007)
Em alguns casos o estudo musical começa muito cedo, o que está em
conformidade com vários estudos (Ilari 2003; 2006) que defendem que “a infância é um
período propício para o desenvolvimento do cérebro da criança”. Nessa idade o estudo
sistemático da criança ocorre por influência dos pais e professores. Já na adolescência
ou vida adulta, a exigência da escola ou ensino superior de música, desencadeia um
estudo independente responsável pela programação de seu estudo individual (GALVÃO
2006 pág. 170). O estudo deliberado precisa levar em conta pontos como cansaço físico,
mental, e tempo de concentração, pois há limites físicos e psíquicos para a quantidade
de prática (Ibidem, p. 171).
Apesar disso, Galvão (2006 pág. 170) diz que “existem evidências consistentes
para a ideia de que a expertise musical é alcançada somente depois de muitos anos de
intenso estudo individual deliberado”. Nesse sentido, tornar-se um expert exige o
envolvimento do sujeito em atividades praticadas regularmente de modo deliberado
qualitativa e quantitativamente eficiente, por longo prazo (GALVÃO 2011).
Auto-regulação
Entendida como processo de autocontrole e regulação de suas ações, enquanto
intérpretes musicais.
Mecanismos usados pelas pessoas para controlar o seu próprio
processo de aprendizagem. Implica estabelecer um objetivo ou
norma de estudo além de controlar o próprio progresso
utilizando estratégias tais como monitoração, elaboração e
gerenciamento de esforço. (CORNO 1989 apud GALVÃO
2006, pág. 171).
É a auto-regulação que permite a reflexão dos hábitos e ações do estudo, além de
avaliar estratégias e maneiras de aprender.
Primeiramente, expertise e inteligência são definidas a partir de
diferenças individuais, uma vez que o que diferencia experts de
aprendizes é a capacidade superior de resolução de problemas
dos primeiros (GALVÃO 2011, pág. 1018).
Portanto, para aquisição da expertise na performance musical, a auto-regulação é o
grande senso que denota o que está ou não está em conformidade.
A qualidade da performance envolve também um referencial
social coletivamente construído. Isso significa que o produto da
performance expertvai ter seu reconhecimento condicionado a
relevância e lugar deste produto dentro de uma dada cultura.
(GALVÃO 2001, pág. 226)
Além disso, esta habilidade não é de usufruto somente de experts, segundo estudos
(GALVÃO 2000, apud GALVÃO 2006 pág. 171) ela pode ser aprendida.
Memória
“Aquisição, formação, conservação e evocação de informações” (IZQUIERDO,
2002 apud HIGUCHI 2005, pág. 112). Na literatura científica, descobriu-se que existe
mais de um tipo de memória, e os estudos demonstraram que elas eram de ordem
consciente e inconsciente.
A memória consciente está relacionada a ativação da atenção no decorrer do
processo de retenção de informações (HIGUCHI, 2005, pág. 113) para que mais tarde
esses dados possam ser evocados no momento da execução musical, pois o mesmo foi
memorizado de maneira ativa, e não automatizada e mecânica.
Há duas subdivisões de memória consciente ligadas a duração: a memória
operacional e a memória de longa duração.
A memória operacional é uma memória de curta duração que permite a
estocagem e a manipulação temporária de informações (BADDELEY 2000 apud
HIGUCHI 2005, pág. 113). A memória de longa duração é o armazenamento de dados
e fatos conscientemente acessíveis (IZQUIERDO 2002 apud HIGUCHI 2005, pág.
113).
Uma maneira eficiente de desenvolver a memória consciente aliada a
performance expert é o uso da memória analítica que consiste em analisar a música por
partes.
A memória inconsciente é em geral adquirida de maneira automática, sem que o
sujeito perceba de forma clara que aprende (IZQUIERDO 2002 apud HIGUCHI, pág.
116). Contudo nem sempre essa memória é ruim pois no momento da performance o
intérprete utiliza das várias memórias. Inclusive das memórias dos sentidos, auditiva,
visual e kinaesthetica.
Ansiedade
Ansiedade é um fator emocional que pode interferir na realização de tarefas
cognitivas. Segundo Galvão (2006, pág. 171), a ansiedade pode ou não ajudar na
performance, isto depende de uma combinação de fatores.
Segundo pesquisas, a ansiedade pode tornar-se facilitadora se o performer tiver
um bom nível de proficiência na área de sua competência, agora se sua proficiência for
baixa, sua performance pode ser debilitadora (GALVÃO 2006, pág. 172).
Lehrer (1987) apud (GALVÃO 2006, pág. 172), considera ser
possível transformar a ansiedade de debilitadora em
facilitadora, mas para que isso ocorra é necessário o
engajamento constante em atividade de prática de performance.
Vimos acima, que Galvão pontuou quatro dimensões cognitivas relacionadas ao
desenvolvimento da expertise na performance musical.
No contexto de ensino-aprendizagem de um instrumento musical, o professor
pode orientar o aluno quanto a importância destas quatros dimensões como fatores
desenvolvimentista da expertise na performance musical. Deixando claro que
Ao contrário do que se pensa, o músico não se torna expert por
instinto ou natureza, mas desenvolvendo habilidade e
conhecimento dentro das técnicas, história e padrões que
sustentam seu domínio musical (ELLIOTT 1989 apud
GRASSI; DOS ANJOS 2010, pág. 72).
Lembrando que expertise na performance musical é a capacidade adquirida pela
prática desempenhada qualitativamente bem.
O expert é caracterizado pela extrema habilidade que apresenta
no desempenho de tarefas dentro do seu domínioe têm uma
grande capacidade para organizar e utilizar conhecimentos para
resolução de problemas (STERNBERG 2000 apud GRASSI;
DOS ANJOS 2010, pág. 72).
O estudo deliberado é um dos fatores mais importantes para esse
desenvolvimento a longo prazo. Pois segundo estudos, a expertise não é uma
característica de indivíduos que possuem habilidades inatas, e sim de indivíduos que
possuem motivação e disciplina de se dedicarem diariamente ao estudo do instrumento,
além de manterem essa rotina de estudo por longos anos.
De nada adianta horas a fio de estudo, se ele não é acompanhado de um filtro
crítico que o leve a pensar sobre como ele desenvolve a sua performance, como controla
seu processo de aprendizagem e suas etapas. A auto-regulação está ligada ao
reconhecimento de estruturas, controle e planejamento das ações performáticas. O que
já entra na análise, influindo não obstante, na memória analítica.
Na performance, como resultado do estudo, a retenção e posteriormente a
utilização do dados retidos são de extrema importância. Nesse aspecto, a memória,
assim como o estudo deliberado e auto regulação, precisa ser desenvolvida. Enquanto
professores, devemos propiciar que os alunos saibam da importância do processo da
memorização e dos tipos de memória que podem ser usadas em benefício da execução
performática, além do estabelecimento de estratégias de memorização mais eficientes.
O professor deve trabalhar ainda o fator ansiedade, pois esse pode desencadear
processos de lapsos de memória, mau desempenho na execução musical.
O traço de ansiedade aparece como uma característica
particularmente forte da personalidade de músicos que
interagem com aspectos tais como instabilidade emocional,
tensão, suspeição, baixa autoestima e apreensão (KEMP 1997
apud GALVÃO 2006 pág. 171).
Porém, a ansiedade não é de toda ruim, como afirma Galvão (2006), a ansiedade
pode ser benéfica quando o performer está preparado, e maléfica quando ele não está.
Relação com a Idea de estresse positivo.
De um todo, a expertise na performance musical pode ser alcançada através da
dedicação, autocrítica, estudo consciente e controle emocional. O ideal para as aulas de
instrumento musical seria muito além de leitura, questões técnicas e apresentações de
informações desnecessárias e sem importância para o aluno. E sim a abordagem de
questões cognitivas, expressivas, e interpretativas que venham a fazer parte da vida do
estudante.
Referências:
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