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Estudos de Numária Portuguesa A viciação do Escudo de 1935 Celso Mascarenhas Estudos de Numária Portuguesa, nº 4, versão: 1 – Abril de 2017

Estudos de Numária Portuguesa - alvesnas.synology.mealvesnas.synology.me/estudos/ENP_4_Escudo_1935_v1.pdf · O custo de fabrico também foi módico e favorável ao Estado - Escudo:

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Estudos de Numária Portuguesa

A viciação do Escudo de 1935

Celso Mascarenhas

Estudos de Numária Portuguesa, nº 4, versão: 1 – Abril de 2017

Índice

Prefácio 1

Introdução 2

A largura do bordo 5

A diferença nos castelos 7

O cabelo da dama junto ao listel 8

Conclusão 9

Ficha técnica 10

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Prefácio

O Escudo de 1935 é seguramente uma das moedas mais frequentemente viciadas. O

colecionador mais experiente conhece os detalhes que permitem identificar algumas

das viciações, mas o mercado continua inundado de espécimes viciados que

facilmente enganam o colecionador mais incauto.

Pela sua simplicidade, este trabalho tornou-se uma referência obrigatória para quem

quer aprender a identificar as viciações do Escudo de 1935. A objetividade do estudo

não deixa espaço para grandes discussões e quem anda nos vários fóruns de

numismática já se habituou a vê-lo referenciado sempre que surge um novo tópico

sobre a autenticidade de um espécime.

Para mim, este trabalho sublinha uma máxima que penso que deve estar presente no

espírito de todos os colecionadores: antes de comprar uma moeda, é preciso estudá-

la. Sem estudo e sem conhecimento, a Numismática resume-se a uma mera opção de

investimento e o colecionador assume um risco muito maior ao poder comprar gato

por lebre.

O Museu da Moeda e, mais especificamente esta série de Estudos de Numária

Portuguesa, tem por objetivo a partilha do conhecimento numismático. Acreditamos

que podemos potenciar a divulgação e o conhecimento deste trabalho de excelência,

tornando-o mais acessível e permitindo que exista autonomamente.

Neste primeiro prefácio, não posso deixar de convidar todos a partilhar o

conhecimento, pois só assim podemos dinamizar e dignificar a Numismática

Portuguesa. O Museu da Moeda tem a porta aberta para todos os que quiserem

partilhar os seus estudos.

Abril de 2017

Paulo Alves

- 2 -

Introdução

As moedas de Escudo e 50 centavos em alpaca surgiram pela necessidade de

substituir as de bronze-alumínio que se verificou não serviam para a circulação, pois

escureciam ficando rapidamente com um aspecto escuro desagradável. Ficou

conhecido pelo Escudo “escuro”. Estas novas moedas vieram substituir também as

notas de 500 e 1000 réis e 50 centavos e de Escudo, emitidas pelo Banco de Portugal

(BdP), que foram retiradas de circulação em 1929 e 1930.

Mantiveram os pesos e diâmetros, os 50 centavos com 4g e 22,8mm de diâmetro e o

Escudo com 8g e 26,8mm.

O anverso é da autoria de Simões de Almeida Sobrinho e o reverso de Alves Rego,

cujos nomes figuram no anverso, junto ao rebordo inferior, “Simões”, em relevo, e

“Rego G.”, incuso.

O custo de fabrico também foi módico e favorável ao Estado - Escudo: $18, 18% do

facial; e 50 centavos: $10, 20% do facial.

Este tipo de moedas foi um sucesso, com enorme adesão popular, graças ao tipo de

liga metálica - resistente e a lembrar a prata - e ao valor numismático e artístico das

gravuras, tendo sido retiradas apenas em 1 de Janeiro de 1982, pelo que circularam

durante cerca de 55 anos.

A baixa taxa de recolha terá ficado a dever-se ao facto de a alpaca ter sido utilizada

em grande escala, na década de 1970, para fins industriais, no fabrico de faqueiros.

Com efeito, industriais espanhóis e portugueses pagaram a peso entre 20 a 25% acima

do facial.

Uma história que por vezes se conta sobre a “raridade” do Escudo de 1935 refere que

as moedas iam para os Açores e o navio que as transportava se afundou. Ora, não

existem provas, nem sequer indícios, de que tenha ocorrido. Um acontecimento desta

importância, a ocorrer, teria certamente registos na Imprensa Nacional Casa da

Moeda e no BdP, e até na imprensa da época, o que nunca se encontrou. Talvez a

circunstância de se ter estabelecido nos Açores o mesmo regime monetário do

Continente e da Madeira, em 1932, tenha contribuído para fabricar esta história da

Numária Portuguesa.

Na realidade, a moeda de Escudo de 1935 é a menos vista porque a sua amoedação

foi muito menor do que qualquer das outras datas. Em 1938, o Ministério das

- 3 -

Finanças ordena que se conclua a amoedação dos 50 centavos e se arredonde a conta

da cunhagem do escudo para 15 mil contos, ou seja 54300 exemplares. Os cunhos de

1935 já existentes foram suficientes para cunhar este número de exemplares e a

cunhagem ocorreu em 1939. A tabela seguinte apresenta as emissões das moedas de

alpaca.

1927 1.917.000 1927 3.330.000

1928 7.462.355 1928 6.823.140

1929 1.616.645 1929 9.778.860

1930 1.911.000 1930 1.116.000

1931 2.038.700 1931 7.127.200

1935 54.300 1935 902.100

1939 250.000 1938 922.700

1940 1.259.359 1940 2.000.001

1944 220.000 1944 2.973.864

1945 773.000 1945 3.699.940

1946 2.507.141 1946 4.334.107

1951 2.500.000 1947 6.998.268

1952 2.500.000 1951 5.209.516

1957 1.656.400 1952 2.421.480

1958 1.435.300 1953 2.369.004

1959 1.910.775 1955 3.056.700

1961 2.505.000 1956 3.003.000

1962 2.757.000 1957 3.940.300

1964 1.611.000 1958 2.386.000

1965 1.683.000 1959 5.029.000

1966 2.607.000 1960 2.599.119

1968 4.099.000 1961 3.324.000

TOTAL 45.273.975 1962 6.678.136

1963 2.346.000

1964 7.654.000

1965 3.366.000

1966 5.085.000

1967 10.301.079

1968 11.247.921

TOTAL 130.022.435

Escudo 50 Centavos

Taxa de recolha (1982)

4,69%

Taxa de recolha (1982)

3,70%

- 4 -

A diferença entre os cunhos das moedas produzidas até 1946, inclusive, e os que

iniciaram a cunhagem em 1951 pode permitir garantir a identificação das moedas

viciadas cuja moeda base foi cunhada após 1946.

Se a moeda base tiver sido cunhada antes de 1951 não será possível tirar conclusões

por este método.

Estou convencido que a esmagadora maioria das moedas viciadas tiveram por base

uma moeda cunhada pós 1946 e em especial a data de 1965.

Existem três diferenças importantes entre os cunhos utilizados nas moedas datadas

até 1946 e os cunhos utilizados na cunhagem das moedas datadas de 1951 e anos

seguintes, a saber:

1) A largura do bordo;

2) A diferença nos castelos;

3) O cabelo da dama junto ao listel.

Trataremos cada um destes assuntos separadamente.

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A largura do bordo

As duas tipologias de cunho variam em vários aspetos, nas primeiras datas (até 1946)

o bordo é mais fino.

É notório que na moeda de 1929 (à esquerda) as legendas estão mais distantes do

listel e na de 1951 se aproximam mais. As diferenças na largura do bordo são visíveis

quer no anverso, quer no reverso.

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Na terceira imagem, com idêntica ampliação, são mais visíveis as diferenças nos

bordos e na distância das folhas ao listel.

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A diferença nos castelos

A segunda diferença entre as duas tipologias de cunhos ocorre ao nível dos castelos

no reverso. São mais estreitos em cima nas primeiras datas e maiores em 1951 e anos

seguintes.

Na imagem anterior e na seguinte, estas diferenças são bem notórias. A imagem da

esquerda corresponde à moeda de 1929, a do centro é de uma moeda de 1935 com

forte desgaste e a da direita é datada de 1951.

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O cabelo da dama junto ao listel

Finalmente, para além da distância ao listel (maior nas primeiras datas), e nessa

mesma zona, há diferença no cabelo por baixo da “voluta” (arco feito pelo cabelo),

em que nas moedas mais antigas (1927 a 1946) podem ver-se três níveis de

representação do cabelo. A seta assinala a zona em causa.

As moedas das datas mais recentes (1951 e posteriores) apresentam apenas dois

níveis de representação do cabelo (imagem da direita).

Esta diferença é visível nas moedas datadas de 1935, mesmo que tenham um forte

desgaste (imagem do centro).

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Conclusão

O Escudo de 1935 é uma moeda muito procurada pelos colecionadores, o que a torna

especialmente apetecível para a viciação e falsificação. O presente estudo demonstra

de uma forma clara e objetiva os detalhes a ter em atenção na deteção de viciações,

que acredito ser a mais comum forma de ludibriar o colecionador menos atento.

É mais seguro e simples observar cuidadosamente estes detalhes do que procurar a

viciação no algarismo 3, da data, que pode induzir em erro se estiver bem executada.

Saber identificar as viciações e falsificações em tempo oportuno é uma prioridade nos

tempos que correm.

Nota:

Os dados necessários para a elaboração deste estudo foram retirados do livro “A Grande

História do Escudo Português” de António Miguel Trigueiros (2003).

- 10 -

Ficha técnica

Os textos submetidos são revistos por duas pessoas, em regime de anonimato do

revisor, sendo a responsabilidade do texto final do autor.

Este trabalho é realizado no âmbito do Museu da Moeda e é gratuito, podendo ser

partilhado. Pedimos apenas que o trabalho e dedicação dos autores sejam

respeitados e devidamente reconhecidos.

A utilização deste trabalho para fins que não sejam estritamente pessoais carece de

autorização prévia do autor.

Para mais informações consulte www.museumoeda.com.

Coordenação

Iúri Fernandes

Leandro Machado

Paulo Alves