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ESTUDO DE IMPLEMENTAÇÃO DA
ACREDITAÇÃO JCI: O CASO DE UM
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO PÚBLICO
FEDERAL
Germano Mendes Rosa (IFMG )
Jose Carlos de Toledo (UFSCar )
Tradicionalmente, a acreditação JCI é vista como a mais completa e
eficiente metodologia em nível internacional. Assim, este artigo, que
constitui parte de uma pesquisa de doutoramento, retratou, por meio
de estudo de caso único, o processoo de implementação do programa
de acreditação JCI em um hospital universitário de propriedade
pública federal. Apesar do hospital ainda não ter alcançado o status de
acreditado, o mesmo já cumpre 80% dos requisitos necessários,
apresentando uma maturidade gerencial notável. Este trabalho se faz
importante para expor a motivação, o processo, os benefícios e as
barreiras relacionadas à implementação da acreditação JCI no
contexto hospitalar público, acrescido de um momento de transição de
gestão (administração EBSERH) e substituição de grande parte da
força de trabalho.
Palavras-chave: Acreditação, JCI, hospital.
XXXVI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil
João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016.
XXXVI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil
João_Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016. .
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1. Introdução
Historicamente a gestão da qualidade e, portanto, o desempenho das organizações da área da
saúde são sensivelmente inferiores se comparados aos dos demais setores industriais
(INSTITUTE OF MEDICINE, 2012), embora haja um esforço mundial pela melhoria
contínua da qualidade no setor hospitalar, direcionado por adesão à modelos de gestão da
qualidade (SGQ) (certificações e acreditações), através de projetos de colaboração (melhoria
colaborativa da qualidade) e/ou por meio da adoção de modelos de excelência de gestão
(MEG) (prêmios da qualidade).
Com relação à adoção de modelos de sistemas de gestão, destacam-se o modelo de SGQ,
segundo a ISO 9001, e os programas de acreditação nacional (Organização Nacional de
Acreditação, ONA) e internacionais (Joint Commission International, JCI; Accreditation
Canada International, ACI; e National Integrated Accreditation for Healthcare Organizations,
NIAHO).
Tradicionalmente, a acreditação JCI tende a ser vista como a mais completa e eficiente
metodologia em nível internacional (LIEBHABER; DRAPER; COHEN, 2009; TABRIZI;
GHARIBI; WILSON, 2011). Assim, este artigo, que constitui parte de uma pesquisa de
doutoramento, retratou, por meio de estudo de caso único, o processo de implementação do
programa de acreditação JCI em um hospital universitário de propriedade pública federal.
Apesar do hospital ainda não ter alcançado o status de acreditado, o mesmo já cumpre 80%
dos requisitos necessários, apresentando uma maturidade gerencial notável. Este trabalho se
faz importante para expor a motivação, o processo, os benefícios e as barreiras relacionadas à
implementação da acreditação JCI no contexto hospitalar público acrescido de um momento
de transição de gestão (administração EBSERH).
O artigo se divide em cinco seções, incluindo essa, que apresentou o trabalho; na seção
seguinte apresenta-se o referencial teórico enfatizando brevemente o programa de acreditação
JCI; na seção três esclarecem-se os procedimentos metodológicos; na seção quatro descreve-
se o estudo de caso; e, na seção cinco, são dadas as considerações finais. Deseja-se proveitosa
leitura!
2. Fundamentação teórica
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A Joint Commission International (JCI) foi fundada pela Joint Commission on Accreditation
of Healthcare Organizations (JCAHO) em 1994, com a missão de primar pela melhoria
contínua da segurança e qualidade do fornecimento de serviços de saúde na comunidade
internacional, através da capacitação de profissionais, consultoria, auditorias e acreditação e já
chegou a mais de 90 países inclusive ao Brasil (JCI, 2015).
De acordo com Tabrizi, Gharibi e Wilson (2011), a JCAHO lidera o foco em qualidade e
segurança, integração da gestão, comunicação e estabelecimento de confiança com o público
e muitas outras questões, apresentando significativo interesse nos direitos do paciente e no
estabelecimento de um ambiente ético, tendo como principais premissas a comunicação e
gestão da informação. Contudo, segundo os mesmos autores, é esperado que seu programa de
acreditação seja um dos mais dispendiosos em razão da frequência das auditorias, qualificação
e treinamento requerido dos funcionários e nível dos padrões requisitados para a acreditação.
A JCI utiliza-se do Manual Internacional de Padrões de Acreditação como referência no
processo de acreditação, organizado em 500 padrões de avaliação, agrupados em 11 seções
distribuídas entre a assistência prestada aos usuários e a gestão dos processos hospitalares
(PRICE, 2009 apud ALÁSTICO, 2014), como mostra o Quadro 1.
Quadro 1 - Padrões do Manual Internacional de Padrões de Acreditação da JCI organizados segundo suas
seções
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Fonte: Baseado em Alástico (2014)
No processo de acreditação, o programa de acreditação JCI pode classificar o hospital
auditado segundo três categorias (ALÁSTICO, 2014), conforme o Quadro 2.
Quadro 2 - Classificação de acreditação pela JCI e ações a serem tomadas
Fonte: Baseado em Alástico (2014, p. 43)
No Brasil, o órgão responsável pela acreditação do modelo JCI é o Consórcio Brasileiro de
Acreditação – CBA (JCI, 2015), que já acreditou 28 hospitais. A Tabela 1 mostra a
distribuições dos hospitais acreditados JCI por estado.
Tabela 1 - Distribuição dos hospitais acreditados JCI por estado
Fonte: Elaboração própria com dados consultados em CBA (2016)
3. Procedimentos metodológicos
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A abordagem empregada na pesquisa foi qualitativa, tendo sido adotado como método o
estudo de caso único e, como instrumento de coleta de dados, um questionário
semiestruturado. A pesquisa se processou por meio de entrevista com o gestor responsável
pelo sistema de gestão hospitalar e análise de documentos internos. A unidade de análise foi
escolhida por conveniência (hospital público acreditado ou em processo de acreditação JCI no
Estado de Minas Gerais).
4. Estudo de caso
A unidade de análise representa um Hospital Universitário Federal que, segundo Datasus
(2016), possui 504 leitos 100% dedicados ao SUS e que está caminhando rumo a acreditação
JCI, apresentando-se em conformidade com 80% dos requisitos exigidos pela norma. O
hospital, como a maior parte dos Hospitais Universitários Federais, está passando por um
processo de reestruturação de sua gestão sob direção da Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares (EBSERH). Os Quadros 3 e 4 apresentam a descrição da unidade de análise e os
dados do entrevistado e da entrevista, respectivamente.
Quadro 3 – Descrição da unidade de análise
Fonte: Elaboração própria com base na entrevista
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Quadro 4 – Dados do entrevistado e da entrevista
Fonte: Elaboração própria
4.1. Histórico da busca pela acreditação JCI
A história da busca pela acreditação iniciou-se em 2001 com ideia voltada à acreditação
ONA, tendo sido feito todo um trabalho, especialmente na parte de processos (estruturação de
processos, cadeia cliente-fornecedor etc.).
Em 2009 o hospital foi convidado a participar de um processo de seleção do Programa de
Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS) no qual
foi escolhido. O projeto foi realização de alguns hospitais filantrópicos, tais como o Hospital
Alemão Oswaldo Cruz, o Hospital Sírio-Libanês, o Hospital Albert Einstein, entre outros, em
parceria com o Ministério da Saúde para reestruturação dos hospitais públicos.
Assim, o hospital foi contemplado no ano de 2010 com o projeto do Hospital Alemão
Oswaldo Cruz que utilizada a metodologia de acreditação da JCI, portanto, a definição da
metodologia JCI se deu em função disso.
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Finalizado ao final de 2014, o projeto durou cinco anos. Contudo, há expectativa de que a
EBSERH dê continuidade ao processo de acreditação pelo programa JCI, pois ao contrário de
outros hospitais participantes do PROADIS-SUS, o hospital conseguiu continuar até o
presente e há consenso de se continuar de uma forma ou de outra, pois esse objetivo está
institucionalmente entranhado, estando explícito no plano diretor se tornar um hospital de
excelência até 2018. A Figura 1 expõe a linha histórica da busca pela acreditação JCI e a
projeção para 2018.
Figura 1 – Linha histórica da busca pela acreditação JCI
Fonte: Elaboração própria com base na entrevista e documentos consultados
4.2. Estrutura organizacional do hospital
De acordo com o organograma atual, a estrutura organizacional é colegiada, ou seja,
predominantemente horizontal. Contudo, a EBSERH tem uma proposta de organograma
diferente, mais verticalizado. Foi feita uma contraproposta para que houvesse ao menos um
meio termo, pois enxerga-se que ao longo dos anos houve sucesso significativo com a atual
organograma, no qual existe um colegiado gestor que quinzenalmente se reúne com todas as
chefias dos serviços, a alta administração e a assessoria para discutir temas estratégicos da
instituição. Inclusive o plano diretor é construído conjuntamente com a comunidade, sendo
feita uma validação com o grupo de chefias e depois é aberto à comunidade na forma de um
grande seminário, no qual as pessoas participam significativamente. É realizado também um
exercício de caráter mais restrito com as chefias e, na sequência, cada chefia de serviço se
reúne com seu respectivo colegiado interno, no qual participam a chefia, o coordenador
administrativo, o coordenador médico e outras funções importantes para aquela estrutura para
discutir questões relevantes da unidade.
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Juntamente com a transição da gestão, grande parte da força de trabalho do hospital está
sendo substituída, já tendo atingido a marca de 1.700 profissionais e isso tem seu impacto. Por
outro lado, a entrevistada credita benefícios proporcionados pelo processo de acreditação
nessa fase de mudança:
“É fortalecida a necessidade de organização da instituição para que aqueles que estão
entrando encontrem uma estrutura organizada. Esse foi um fator muito positivo, inclusive do
ponto de vista da acreditação, uma vez que um de seus princípios é a melhoria dos processos.
Ter toda a documentação em dia, todos os processos mapeados, todas as atividades críticas
identificadas, isso tudo facilita o momento da transição. O ano de 2015 foi crucial, pois todas
as forças se voltaram para o processo de transição, para que transcorresse da forma mais
tranquila possível. Eu creio que estamos indo bem, tem dado certo, mesmo porque a
instituição se organiza muito bem para isso. ”
A Figura 2 mostra os pontos de apoio e de impacto no processo de transição da gestão.
Figura 2 – Pontos de apoio e de impacto na transição de gestão
Fonte: Elaboração própria com base na entrevista
4.3. Fatores críticos de sucesso para a acreditação JCI
Para a entrevistada, não há dúvida de que o principal fator de sucesso para a acreditação é o
envolvimento da alta direção. Em suas palavras:
“Isso é muito visível, o comprometimento dessas pessoas, da superintendente, da gerente e
também das chefias é essencial. Esse é um trunfo que faz com que não deixemos a “peteca
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cair”, é um motivo para que a gente se mantenha firme. Nada acontece de cima para baixo,
há discussão em uma estrutura horizontal.”
Outro fator de relevância mencionado foi a capacitação das gerências. Nas palavras da
entrevistada:
“A gestão é uma dimensão muito importante para o enfermeiro, porque ele gerencia uma
equipe muito grande em algo muito complexo. Não é possível o enfermeiro se manter apenas
com conhecimento técnico em nível de procedimentos.”
Um marco se deu em 2010, quando foi oferecida uma especialização em gestão hospitalar e
qualidade para as chefias, em parceria com a Escola de Saúde Pública. Tal iniciativa gerou
diversos ganhos, inclusive vários trabalhos de conclusão se trataram de intervenções com base
nos requisitos do programa JCI. Foram realizados 60 trabalhos para atender a esses requisitos.
4.4. Consultoria
O Hospital Alemão Oswaldo Cruz comprometeu-se a apoiar o desenvolvimento do projeto no
hospital, inclusive financeiramente, cujos custos não foram baixos. Contratou-se o CBA,
incluindo as consultorias mensais de educadores e avaliadores, mais as visitas anuais de
cunhos educativo e avaliativo. Além disso, foi fornecida toda a parte de educação,
capacitação, realização de cursos, participação em fóruns e em congressos relacionados a
tópicos da qualidade e segurança e visitas de benchmarking às instituições que trabalhavam
com a mesma metodologia, um processo considerado bastante rico.
4.5. Status da acreditação
Para a concessão da acreditação exige-se 95% de conformidade com os requisitos do manual
da JCI, sendo que para alguns padrões não se admite nenhum parcial conforme como, por
exemplo, as metas internacionais de segurança do paciente. Segundo a entrevistada, não é um
processo simples, são muitos padrões, constituindo mais de 1200 requisitos divididos em
questões com foco na gestão, na assistência, no ensino e na pesquisa.
A parte de assistência e segurança do paciente avalia-se o acesso do paciente à instituição, a
sua avaliação primária, o planejamento do seu cuidado, sua alta e encaminhamento; a parte de
direitos do paciente, concentra-se principalmente nos termos de consentimento que têm que
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ser muito bem esclarecidos; a parte de educação do paciente, necessita-se de uma linguagem
apropriada de acordo com a situação; a parte de gerenciamento de medicamentos envolve a
aquisição até a administração; a parte de anestesia e cirurgia cobre os procedimentos, a
segurança, a adequação da avaliação pré-anestésica etc.
A entrevistada afirma que, no momento, a instituição atende a 80% dos requisitos exigidos
para a acreditação e cada vez fica mais difícil avançar.
4.6. Sistema de auditoria
Auditoria externa
O processo de auditoria externa é realizado anualmente por auditores capacitados que em
cinco dias de avaliação acessam inúmeros processos. A equipe de avaliadores é formada por
seis profissionais: dois administradores, dois médicos e dois enfermeiros. A avaliação segue
uma agenda e os auditores se dividem para cumpri-la. A instituição também se prepara para a
auditoria, uma vez que os avaliadores são sempre acompanhados por funcionários do hospital,
chamados de facilitadores. Os facilitadores são funcionários que conhecem a instituição como
um todo e que têm afinidade com o processo de acreditação.
Ao que tange as instalações, são realizadas principalmente visitas prediais, se concentrando na
segurança. O restante é na parte assistencial a que se chama de “rastreadores” de pacientes, de
sistema, de qualidade e de segurança. Nesse processo os auditores, em posse de uma lista de
pacientes internados no dia e pacientes que irão realizar cirurgia, escolhem um caso e seguem
toda a rota do paciente escolhido e verificam se o mesmo recebeu transfusão e, em caso
positivo, vão até a agência transfusional para saber a hora que foi feita a transfusão, como foi
liberado o sangue, quanto tempo foi gasto para o mesmo chegar na unidade, ou seja,
relaciona-se e confere-se toda a linha de cuidado daquele paciente e, por meio do rastreador,
abordam-se todos os requisitos.
Apesar da complexidade da avaliação, os funcionários se sentem motivados com a auditoria
externa. Segundo a entrevistada:
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“Enfim, é uma semana muito rica que traz um aprendizado significativo e a instituição vê
isso com bons olhos, todos ficam ansiosos para a chegada da próxima visita e se mobilizam.”
A sistemática de auditoria externa é esquematizada na Figura 3.
Figura 3 – Fluxograma da sistemática de auditoria JCI
Fonte: Elaboração própria
Auditoria interna
O hospital mantém uma equipe de auditores internos não vinculada ao setor da qualidade,
apesar de compartilharem o mesmo espaço físico. A equipe é independente, inclusive tem o
poder de auditar o setor da qualidade. Isso porque enxerga-se a auditoria como uma das
principais estratégias de melhoria da qualidade.
A auditoria interna foi criada em 2011, quando se formou um expressivo número de
profissionais (mais de 170) com base nos requisitos da JCI.
Desde 2014 o processo de auditoria interna foi modificado para ganho de eficiência, evitando
redundâncias e retrabalho. A entrada da auditoria interna é o relatório da auditoria externa
sobre o qual realiza-se uma análise profunda, levando em considerando não somente as não
conformidades, mas também as conformidades. Segundo a entrevista isso se justifica porque
normalmente não se tem um falso não conforme, mas pode-se ter um falso conforme por uma
razão muito simples, o auditor não consegue verificar mais de 1200 requisitos, assim, aquilo
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que não foi visto é dado como conforme. Portanto, avalia-se tudo e, com base no relatório,
estrutura-se uma lista de verificação para condução da auditoria interna.
As auditorias internas são quadrimestrais, perfazendo três ciclos por ano, proporcionando
condições de se comparar a evolução de cada área sobre os requisitos selecionados. As não
conformidades identificadas são inseridas em um sistema de gestão e planejamento
estratégico próprio, através do qual são disparados e-mails para os gerentes responsáveis e
para os funcionários indicados para acompanhamento.
Por meio do sistema, o escritório da qualidade realiza o monitoramento de todos os
acontecimentos e, caso a área não tome as medidas necessárias dentro do prazo estipulado, o
gerente é convidado a apresentar seu planejamento para a direção numa reunião do comitê da
qualidade. A sistemática de auditoria interna pode ser vista por meio da Figura 4.
Figura 4 – Fluxograma da auditoria interna
Fonte: Elaboração própria com base na entrevista
Para todas as áreas existe um indicador que é o percentual de não conformidades resolvidas,
bem como uma meta a ser cumprida. Portanto, os dados de auditoria e esse monitoramento
impactam no indicador de cada área, o que, na opinião da entrevistada, estimula a melhoria
contínua sustentada.
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4.7. Benefícios da acreditação
A entrevistada afirmou que a acreditação vai muito além do selo de acreditação. Em suas
palavras:
“ Para nós o selo é meramente uma consequência de um bom trabalho. Sentimo-nos
honrados de sermos um hospital público de altíssima complexidade, com inúmeras
dificuldades como as de qualquer outro e, mesmo assim, prestar uma assistência de
qualidade e segura para nossos pacientes. Isso é um orgulho institucional porque nós
decidimos dar continuidade ao processo de acreditação, porque acreditamos que esse é o
melhor caminho para nossa instituição.”
Para a entrevistada os benefícios da busca pela acreditação são inúmeros, citando:
Melhoria no clima organizacional;
Padronização dos processos;
Diminuição dos eventos adversos;
Conscientização dos profissionais;
Melhoria dos resultados em função do uso de indicadores;
Maturidade organizacional.
4.8. Envolvimento dos funcionários
De acordo com a entrevistada, em sua experiência nunca houve problemas com o
envolvimento do corpo clínico, mas já houve com a enfermagem. Mas a mesma afirma que
tudo gira em torno da estratégia de abordagem da instituição para qualquer área, seja
administrativa ou assistencial. Em suas palavras:
“Aqui é um hospital-escola e, portanto, temos os residentes que ficam por um período e
rodam. Temos também os alunos e isso implica numa dinâmica muito intensa. Mas nunca
tivemos problemas de abordagem. Na verdade, a forma de abordar o profissional médico é
diferente. Não se deve pedir que observem o capítulo X do manual que trata da avaliação do
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paciente. Isso não funciona. É necessário comunicar diretamente o que ele deve fazer e o
porquê. Nós apregoamos não o processo de acreditação, mas o processo da melhoria dos
processos, deixando claro que o que foi colocado não tem que ser feito 30 dias antes da
auditoria, mas rotineiramente.”
4.9. Barreiras à acreditação
Como barreira à acreditação, além da magnitude dos investimentos, a entrevista relembrou
que no início do processo houve consultoria de um administrador. Apesar de todo consultor
do CBA ser preparado para atuar tanto na parte administrativa quanto na parte assistencial, o
hospital já tinha evoluído muito na parte documental e sentiu-se a necessidade de alguém com
conhecimentos na área da saúde para falar com um auditório repleto de médicos e enfermeiros
sobre procedimentos específicos. Essa dificuldade foi superada com a troca do consultor por
outro da área da saúde e isso causou uma guinada, na qual as equipes de enfermagem, que não
se envolviam muito no início, passaram a se envolver sensivelmente.
Outro desafio importante é fazer com que as pessoas pensem em nível de processo. Nas
palavras da entrevistada:
“Por exemplo, se uma auditoria aponta uma não conformidade “falta de sabonete no
dispensador”, parece algo simples, mas é muito sério. Isso significa que as pessoas não estão
higienizando as mãos e isso implicará no aumento da taxa de infecção hospitalar. Já
aconteceu caso em que o responsável enviou e-mail pedindo para encerrar a não
conformidade pelo fato do sabonete ter sido reposto. Mas qual ação foi tomada para garantir
que o sabonete não venha a faltar? Esse é um desafio, mas são desafios bons, porque quando
a pessoa compreende o sentido da melhoria é fantástico.”
4.10. Treinamento
A entrevistada explanou que o treinamento dos funcionários é um grande desafio, pois
circulam diariamente no complexo cerca de 20 mil pessoas, sendo mais de cinco mil
profissionais para o atendimento e não se consegue colocar os funcionários dentro da sala de
aula nem sequer por duas horas. Um médico não se dispõe a realizar um curso de um dia que
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não tenha relação direta com sua área de atuação, e a situação é igual para qualquer outro
funcionário da assistência.
Por outro lado, tem-se atualmente um programa institucional de capacitação do setor de
desenvolvimento que pensa a capacitação de forma institucional. Usualmente tem-se uma
matriz de capacitação que o setor de desenvolvimento usa para discutir com todos os setores
as capacitações essenciais de cada um. Obviamente que existem requisitos do ponto de vista
da qualidade e da segurança, além de outros, que são exigências tanto da JCI quanto da
vigilância sanitária e que, portanto, obrigatoriamente já estão inseridos na matriz.
Além disso, existe a prática de ir à linha de frente do atendimento e conversar de cinco a dez
minutos sobre temas essenciais numa passagem de plantão, como, por exemplo, a respeito das
metas internacionais de segurança do paciente, algo que não pode ser ignorado nunca.
De forma estratégica o hospital começou a trabalhar com Educação à Distância (EaD), em
função da dificuldade de colocar os funcionários dentro de sala. Segundo a entrevistada,
atualmente as aulas da EaD estão disponíveis principalmente para a residência médica e a
multiprofissional, mas serão expandidas para toda a instituição.
As aulas se compõem de treinamentos e capacitações essenciais, durando cerca de 15 minutos
cada, contendo pré-teste, teste e toda a estrutura necessária. Essa estratégia tem permitido que
os funcionários consigam participar, atendendo a todos os perfis. A Figura 5 apresenta a
esquematicamente a estrutura de treinamento.
Figura 5 – Esquema da estrutura de treinamento interna
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Fonte: Elaboração própria com base na entrevista
4.11. Impressão sobre a metodologia JCI
Segundo a entrevistada, a metodologia JCI tem sido significativamente positiva ao longo dos
últimos anos em todos os sentidos e, diferentemente da metodologia da ONA, permite
permear o todo, possuindo ainda foco expressivo na segurança do paciente. Nas palavras da
entrevistada:
“Eu considero a metodologia JCI muito completa, ela não nos limita. Consegue-se trabalhar
a segurança do paciente, a segurança institucional, todos os fatores... A metodologia JCI nos
atende perfeitamente, ela se encaixa nas nossas necessidades.”
4.12. Perspectivas para o sistema de gestão do hospital
De acordo com a entrevistada, as perspectivas para o sistema de gestão do hospital são as
melhores, sendo importante primeiramente aproveitar da melhor forma o atual momento de
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transição, no qual estão sendo inseridos novos profissionais conjuntamente com melhorias de
processo.
Outra perspectiva é investir em EaD, principalmente na parte de gerenciamento de riscos e da
segurança do paciente. Para o ano de 2016 os grandes focos são: gerenciamento de riscos e
segurança do paciente, envolvimento dos novos profissionais, qualificação dos documentos
institucionais e facilitação do acesso às documentações nas áreas.
Pretende-se continuar com a metodologia do programa JCI e espera-se que a EBSERH
viabilize a continuidade para que o plano de alcançar a excelência possa se tornar realidade
até 2018.
5. Considerações finais
O estudo de caso realizado revelou detalhes importantes do processo de implementação do
programa de acreditação JCI em um hospital público de grande porte. Apesar de não ter
completado o ciclo de acreditação, o hospital goza das vantagens proporcionadas pelo
programa, inclusive para manter-se estável durante período de transição de direção
(administração EBSERH) simultaneamente à substituição de grande parte da força de
trabalho.
A maturidade da gestão fica evidente na visão de processos alcançada e, principalmente, pelo
refinamento das soluções, mostradas tanto em relação à auditoria interna, que passou por
adaptações para melhor desempenho, quanto pela sistematização de uma estrutura de
treinamento flexível (utilização da EaD).
Conclui-se que o programa de acreditação JCI, apesar de complexo, está garantindo bons
resultados ao hospital estudado. Assim, estima-se que ao alcançar o cumprimento da maioria
dos requisitos o hospital potencialmente terá desempenho de excelência.
Os autores vislumbram a importância de ter pesquisado a implementação de um programa de
acreditação internacional em um hospital público ao mesmo tempo que enxergam que a
principal limitação decorre da unicidade da amostra e seu caráter apenas qualitativo. Lembra-
se, no entanto, que ainda não há hospital certificado JCI no Estado de Minas Gerais.
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REFERÊNCIAS
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do Estado de São Paulo. 2013. 207 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) – Departamento de
Engenharia de Produção, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2014.
DATASUS. Departamento de Informática do SUS. Cadastro nacional de estabelecimentos de saúde. 2016.
Disponível em: <http://cnes2.datasus.gov.br/Lista_Es_Nome.asp?VTipo=0>. Acesso em: 20 fev. 2016.
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SMITH, M. et al. (Ed.). Washington DC: Nacional Academy Press, 2012.
JCI, Joint Commission International. Sobre a JCI. 2015. Disponível em: <
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LIEBHABER; A.; DRAPER, D.A.; COHEN, G.R. Hospital strategies to engage physicians in quality
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RATCLIFFE, R.L. Re-engineering hospital accreditation. Clinical Governance: An International Journal, v.
14, n. 4, p. 315-335, 2009.
TABRIZI, J.S.; GHARIBI, F.; WILSON, A.J. Advantages and disadvantages of health care accreditation
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AGRADECIMENTO
Ao Instituto Federal de Minas Gerais pela licença capacitação do primeiro autor e
potencialmente à FAPEMIG pelo auxílio à divulgação desse artigo.