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Efeito da Velocidade e Composição do Oxidante nas
Emissões de CO de uma Fornalha Laboratorial
Operando em Regime de Combustão Oxy-fuel
Miguel Alexandre de Oliveira Alves
Dissertação para obtenção do grau de Mestre em
Engenharia Mecânica
Júri
Presidente: Professor Doutor João Rogério Caldas Pinto
Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa
Vogal: Professor Doutor Edgar Caetano Fernandes
Outubro de 2011
ii
Resumo
A presente dissertação centra-se na avaliação experimental do efeito da velocidade de
injeção e composição do oxidante nas emissões de CO de uma fornalha laboratorial, operando
em regime de combustão oxy-fuel. O estudo efetuado compreendeu ensaios em que se variou
o diâmetro de injeção do oxidante e sua composição, nomeadamente as quantidades relativas
de O2, CO2 e H2O. Os resultados obtidos incluem medidas de composição dos gases de
exaustão e revelam que existe uma velocidade de injeção do oxidante ótima, correspondendo
esta a um tempo de residência adequado para a minimização das emissões de CO para todas
as composições de oxidante utilizadas. O oxidante composto por 35% de oxigénio e 65% de
dióxido de carbono apresenta as menores emissões de CO, entre os oxidantes compostos
somente por O2 e CO2, apresentando emissões semelhantes às obtidas quando o oxidante é
ar. No entanto, se se tiver em conta a energia necessária para obter um oxidante composto por
35% de O2, a partir de ar atmosférico, o oxidante composto por 30% O2 e 70% CO2 torna-se a
melhor opção. Finalmente, a presença de vapor de água no oxidante não causa alterações
significativas nas emissões de CO, independentemente da composição do oxidante.
Palavras-chave: Experimental, combustão oxy-fuel, composição do oxidante,
emissões de CO
iii
Abstract
This study evaluates the effect of the injection velocity and composition of the oxidizer in
the CO emissions in a laboratory furnace operating under oxy-fuel conditions. The dada
reported includes flue-gas composition as a function of the oxidizer velocity and composition.
The results suggest that there is an optimal oxidizer injection velocity that corresponds to a
residence time more suitable for the minimization of the CO emissions for all oxidizer
compositions. The oxidizer composed of 35% of oxygen and 65% of carbon dioxide yields the
lowest CO emission, among all the oxidizers composed only of O2 and CO2, being the
emissions comparable to those obtained when the oxidizer is air. However, if the energy
required to obtain an oxidizer composed of 35% O2 from air is taken into account, the oxidizer
with 30% O2 and 70% CO2 becomes the best option. Finally, the presence of water vapor in the
oxidizer does not cause significant changes in the CO emissions, regardless of the oxidizer
composition.
Key-words: Experimental, oxy-fuel combustion, oxidizer composition, CO emissions
iv
Agradecimentos
Ao Professor Mário Costa, agradeço toda a disponibilidade, apoio e orientação
prestados durante a realização deste trabalho.
Agradeço ao colega Anton Verissímo pela ajuda indispensável prestada na parte
prática deste trabalho e pela sua disponibilidade para ajudar em diversas situações.
Agradeço ainda aos meus colegas de laboratório que, de alguma forma, contribuíram
para a realização deste estudo, criando um bom ambiente de trabalho, nomeadamente a Tiago
Pinto, Pedro Queirós, Catarina Rosa, José Pedro Madeira, Maria Luís Castela, António
Domingues, Miriam Rabaçal, Maura Rocha, Miguel Graça e Gongliang Wang.
Agradeço a Manuel Pratas por todo o apoio técnico prestado durante a montagem
experimental e a realização dos ensaios.
Um agradecimento também ao Sr. Norberto e restantes funcionários das oficinas das
Áreas Científicas de Energia e Termofluidos e Ambiente e Energia do Departamento de
Engenharia Mecânica, pela construção de parte do equipamento utilizado nos ensaios.
A todos os meus amigos e colegas de faculdade, por todo o apoio dado ao longo
destes últimos cinco anos na minha vida académica, pois sem eles tudo teria sido muito mais
difícil.
Aos meus pais e irmã, um agradecimento muito particular pela compreensão, apoio,
disponibilidade e incentivo que sempre demonstraram.
v
Índice
1 Introdução .................................................................................................................. 1
1.1 Enquadramento e objetivos ............................................................................... 1
1.2 Caraterísticas e consequências da formação de CO ........................................ 9
1.2.1 Efeitos na saúde e fontes de CO ................................................................. 9
1.2.2 Mecanismos de formação de CO ............................................................... 10
1.3 Estado da arte ................................................................................................. 14
1.3.1 Caraterísticas da combustão oxy-fuel ........................................................ 14
1.3.2 Estudos recentes ........................................................................................ 20
1.3.2.1 Reatores tubulares ............................................................................... 20
1.3.2.2 Fornalhas laboratoriais ......................................................................... 22
1.3.2.3 Outros estudos relevantes .................................................................... 24
1.3.3 Aplicações .................................................................................................. 25
1.4 Presente contribuição ...................................................................................... 28
2 Fornalha Laboratorial e Técnicas de Medida .......................................................... 29
2.1 Câmara de combustão e queimador ............................................................... 31
2.2 Sistema de alimentação do combustível ......................................................... 33
2.3 Sistema de alimentação do oxidante .............................................................. 33
2.4 Sistema de exaustão ....................................................................................... 35
2.5 Técnicas de medida e incertezas experimentais ............................................ 35
2.6 Procedimento experimental ............................................................................. 37
3 Apresentação e discussão de resultados................................................................ 41
3.1 Condições experimentais ................................................................................ 41
3.2 Emissões de CO .............................................................................................. 44
3.2.1 Influência da velocidade do oxidante ......................................................... 44
3.2.2 Influência da concentração de CO2 no oxidante ........................................ 50
3.2.3 Influência da concentração de vapor de água no oxidante ........................ 51
4 Fecho ....................................................................................................................... 54
4.1 Conclusões ...................................................................................................... 54
4.2 Recomendações para trabalhos futuros ......................................................... 54
5 Referências ............................................................................................................. 56
vi
Anexo A ...................................................................................................................... 59
vii
Lista de Figuras
Figura 1. Contribuição das diferentes fontes de energia primária para o consumo energético a
nível mundial desde 1850 (WEC & IIASA, 1998). ......................................................................... 1
Figura 2. Consumo de energia a nível mundial por região (x 1018
J) (EIA, 2010). ....................... 2
Figura 3. Consumo mundial de energia primária por combustível e cenário (IEA, 2011). ........... 3
Figura 4. Concentração de CO2 na atmosfera ao longo dos anos (Solomon et al., 2007). .......... 4
Figura 5. Emissões de CO2 com origem na produção energética (x 109 ton) (EIA, 2010). .......... 5
Figura 6. Emissões mundiais de CO2 por combustível (x 109 ton) (EIA, 2010). ........................... 5
Figura 7. (a) Captura com pré-combustão; (b) Captura com pós-combustão; (c) Combustãooxy-
fuel com recirculação dos produtos de combustão. ...................................................................... 8
Figura 8. Efeito do CO sobre a saúde humana. ............................................................................ 9
Figura 9. Diagrama simplificado do processo de combustão em regime oxy-fuel com captura de
CO2. ............................................................................................................................................. 15
Figura 10. Efeito do consumo de combustível nas emissões de CO2 em centrais termoelétricas
(IPCC, 2005). ............................................................................................................................... 18
Figura 11. Eficiência térmica de centrais termoelétricas com e sem captura de CO2 (IPCC,
2005). .......................................................................................................................................... 19
Figura 12. Fornalha de testes com regime de combustão oxy-fuel (Sturgeon et al., 2009). ...... 26
Figura 13. Progressão histórica dos testes efetuados em oxy-fuel em unidades piloto e
unidades de demonstração (Wall et al., 2009). ........................................................................... 27
Figura 14. Princípio de funcionamento do ciclo combinado de uma turbina a gás em regime
oxy-fuel (IPCC, 2005). ................................................................................................................. 27
Figura 15. Representação esquemática da câmara de combustão ........................................... 29
Figura 16. Representação esquemática dos sistemas de alimentação de combustível e
oxidante ....................................................................................................................................... 30
Figura 17. (a) Dispositivo utilizado para saturar a corrente de CO2 com vapor de água; (b)
Panela de pressão utilizada para produzir vapor de água. ......................................................... 30
Figura 18. Vistas da câmara de combustão. ............................................................................... 31
Figura 19. Vista interior do topo da câmara de combustão. (1) Exaustão; (2) entrada do
oxidante; (3) entrada de combustível; (4) vidro de quartzo; (5) queimador. ............................... 32
Figura 20. Tubos centrais do queimador utilizados. ................................................................... 32
Figura 21. Caudalímetro utilizado para CH4 e O2. ...................................................................... 33
Figura 22. Rotâmetros de ar (esquerda) e CO2 (direita) utilizados. ............................................ 34
Figura 23. Representação esquemática da sonda para recolha de amostras de gases............ 35
Figura 24. Ignição através de arco elétrico ................................................................................. 39
Figura 25. Visualização do tipo de chama para cada atmosfera testada. (a) Ar; (b) 35% O2/65%
CO2; (c) 30% O2/70% CO2; (d) 25% O2/75% CO2; (e) 20,9% O2/79,1% CO2. ............................ 40
viii
Figura 26. Variação da temperatura adiabática de chama para diferentes composições de
oxidante. ...................................................................................................................................... 41
Figura 27. Variação da percentagem de vapor de água no oxidante consoante a relação
O2/CO2 e dispositivos usados (recipiente de acrílico ou panela de pressão). ............................ 44
Figura 28. Efeito da velocidade de injeção do oxidante e da sua composição nas emissões de
CO em ppm. ................................................................................................................................ 46
Figura 29. Escoamento no interior da câmara de combustão, tal como previsto por Graça
(2011). ......................................................................................................................................... 47
Figura 30. Efeito da velocidade de injeção do oxidante e da sua composição nas emissões de
CO em ng/J. ................................................................................................................................ 49
Figura 31. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO
(Composição do oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 35%/65%. ........ 51
Figura 32. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO
(Composição do oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 30%/70%. ........ 52
Figura 33. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO
(Composição do oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 25%/75%. ........ 52
Figura 34. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO
(Composição do oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 20,9%/79,1%... 53
ix
Lista de Tabelas
Tabela 1. Variação do calor específico (cp) com a temperatura das diferentes espécies
químicas constituintes do oxidante. ............................................................................................ 16
Tabela 2. Propriedades das espécies químicas constituintes do oxidante (T = 1396 K; p = 1
atm). ............................................................................................................................................ 16
Tabela 3. Percentagem volúmica seca de CO2 nos produtos de combustão para os dois
regimes de combustão. ............................................................................................................... 17
Tabela 4. Analisadores usados no presente trabalho. ................................................................ 36
Tabela 5. Misturas padrão utilizadas na calibração dos analisadores........................................ 36
Tabela 6. Erros associados à leitura dos gases utilizados. ........................................................ 37
Tabela 7. Condições experimentais* .......................................................................................... 43
xi
Nomenclatura
Carateres romanos
Calor específico a pressão constante [kJ/kg K]
Diâmetro exterior do queimador [mm]
Caudal mássico da espécie química i [kg/s]
Potência térmica [kW]
Fluxo de calor convectivo [kW/m2].
Fluxo de calor radiativo [kW/m2].
Temperatura adiabática de chama [K]
Velocidade de injeção do oxidante [m/s]
Fração molar da espécie i [%]
Carateres gregos
Coeficiente de excesso de ar/oxigénio
Viscosidade dinâmica [kg/(m s)]
Viscosidade cinemática [m2/s]
Massa volúmica [kg/m3]
Abreviaturas
Carbon Capture and Storage
Energy Information Administration
International Energy Agency
International Institute for Applied Systems Analysis
Intergovernmental Panel on Climate Change
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
Poder calorífico inferior
Partes por milhão
Recirculação dos produtos de combustão
União Europeia
World Energy Council
1
1 Introdução
1.1 Enquadramento e objetivos
De acordo com Liñán e Williams (1993), a combustão é a ciência das reações químicas
exotérmicas em escoamentos com transmissão de calor e massa. Este fenómeno é o principal
processo de produção de energia primária no mundo, trave mestra da sociedade tecnológica
contemporânea.
A Figura 1 mostra que, atualmente, 90% da energia utilizada no mundo resulta da
queima de combustíveis sólidos, líquidos e gasosos, sendo passível de retirar a conclusão que
a combustão de combustíveis fósseis é a maior fonte de energia na sociedade. Embora a
tendência aponte no sentido de uma diminuição desta percentagem, prevê-se que a combustão
continue a dominar largamente o setor de produção de energia nas próximas décadas. Apesar
de o seu uso ser um bem necessário para a nossa sociedade funcionar, tem havido um
aumento de consciencialização dos malefícios das emissões de dióxido de carbono (CO2)
resultantes de atividades antropogénicas. Estas emissões são consideradas como a principal
causa do aquecimento global e mudanças de clima que se têm feito sentir nos últimos anos.
Figura 1. Contribuição das diferentes fontes de energia primária para o consumo energético a nível
mundial desde 1850 (WEC & IIASA, 1998).
2
O consumo de energia a nível mundial aumentou de forma dramática durante o século
XX, prevendo-se que esta tendência se traduza num aumento de cerca de 49% entre 2007 e
2035, de acordo com a EIA (2010), como mostra a Figura 2. Nos países não pertencentes à
OCDE prevê-se que o consumo em 2035 seja mais de 84% superior ao atual, enquanto nos
países da OCDE o crescimento não será tão acentuado. A maior parte destas necessidades
energéticas têm sido, e continuarão a ser, supridas através de processos de combustão.
A tendência de evolução prevista pela IEA para o consumo de energia até 2035, que é
semelhante à da EIA, mostra um aumento no consumo dos principais combustíveis fósseis –
carvão, petróleo e gás natural (Figura 3), como já referido anteriormente. É importante
mencionar que o petróleo continuará a ser o principal combustível neste horizonte temporal,
mas o gás natural registará a maior taxa de crescimento, tornando-se o segundo combustível
mais consumido em detrimento do carvão, de acordo com o último cenário (IEA, 2011). A
diminuição da contribuição relativa do carvão e do petróleo no consumo energético mundial
deve-se, por um lado, à consciencialização de que as reservas destes combustíveis são
limitadas e, por outro lado, ao facto de serem os combustíveis fósseis os principais
responsáveis pela emissão de poluentes, resultantes da combustão.
De facto, o impacto ambiental é indissociável da combustão. A queima de combustíveis
fósseis provoca inevitavelmente a formação de CO2. Até há relativamente poucos anos, estas
emissões eram consideradas inócuas e não causavam qualquer preocupação, nem na
comunidade científica nem na população em geral, apesar de já nos primórdios do século XIX,
Joseph Fourier ter descrito o efeito de estufa e reconhecido o consequente aumento da
temperatura da atmosfera, afirmando que se nesta não houvesse CO2, a temperatura média da
atmosfera terrestre seria 30 ºC inferior.
Figura 2. Consumo de energia a nível mundial por região (x 1018
J) (EIA, 2010).
3
A Figura 4 mostra a evolução da concentração de CO2 na atmosfera ao longo dos
anos. Antes da revolução industrial, a concentração de CO2 na atmosfera era cerca de 280
ppm, mas no início do século XXI, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou para 300
ppm. Atualmente é de 370 ppm, acréscimo esse que se pensa ser fundamentalmente devido à
queima de combustíveis fósseis.
Na realidade, cerca de 75% das emissões de CO2 resultantes da atividade humana são
atribuídas à queima de combustíveis fósseis, sendo as restantes emissões devidas a
alterações provocadas na superfície terrestre, em particular à agricultura e desflorestação.
Estima-se que, se não forem tomadas medidas preventivas eficazes, o aumento de CO2 na
atmosfera continue (Figura 4), atingindo uma concentração de cerca de 560 ppm no fim do
presente século. Apesar de o CO2 ser absorvido pelas plantas no processo de fotossíntese, tal
não é suficiente para manter constante a concentração de CO2 na atmosfera, ao ritmo atual de
emissões.
O facto de o aumento da concentração de CO2 e de outros gases com efeito de estufa
na atmosfera conduzir, na ausência de outros fatores, ao aquecimento global é incontestável.
Porém, não é consensual que o aumento da concentração de CO2 e de outros gases com
efeito de estufa na atmosfera, em resultado da atividade do homem, seja a causa do aumento
da temperatura média na atmosfera que se tem observado desde há algumas décadas,
embora seja essa a opinião maioritária na comunidade científica.
Entre as hipóteses alternativas que têm sido propostas para explicar o aquecimento
global, refira-se a evolução natural do clima, dado que ao longo do tempo a temperatura média
na superfície terrestre sofre flutuações, e variações na radiação solar.
Figura 3. Consumo mundial de energia primária por combustível e cenário (IEA, 2011).
4
De modo a evitar o aumento da concentração de gases com efeito de estufa na
atmosfera é essencial um novo paradigma energético, que aposte numa maior utilização de
energias renováveis, e na investigação em novas tecnologias de energia (pilhas de
combustível, biocombustíveis e, a longo prazo, fusão nuclear) em detrimento da queima de
combustíveis fósseis. Como nas décadas mais próximas, a queima de combustíveis fósseis vai
continuar a ser dominante na satisfação da procura energética mundial, o novo conceito de
desenvolvimento sustentável1 fez emergir um novo paradigma à escala global.
O Protocolo de Quioto é um primeiro passo nesse sentido. Este Protocolo é um acordo
assinado e ratificado no final do século XX pela grande maioria dos países, mas onde não se
incluem os Estados Unidos da América, e no âmbito do qual foi assumido um compromisso
para a redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2012, especificamente 5% em
relação aos níveis de 1990.
Mais recentemente, foi reconhecido que o CO2, tradicionalmente considerado como
não poluente, tem também efeitos nefastos, na medida em que provoca o efeito de estufa que
se presume poder conduzir a um aquecimento global da atmosfera. A Figura 5 apresenta as
emissões de CO2 mundiais e por região com origem na produção energética. Observa-se que
estas emissões irão aumentar e prevê-se que essa tendência se mantenha até 2035. Devido
ao forte crescimento económico e à grande dependência de combustíveis fósseis esperada
para muitas das economias não pertencentes à OCDE, a maior parte do aumento das
emissões de CO2 projetadas ocorrem nessas nações (Figura 5). Em 2007, as emissões de
países não pertencentes à OCED excediam apenas os da OCED em 17%; em 2035 prevê-se
que estas emissões sejam o dobro das emissões da OCDE.
1 Garantir que as necessidades do presente são cumpridas sem comprometer a capacidade das gerações
futuras satisfazerem as suas necessidades
Figura 4. Concentração de CO2 na atmosfera ao longo dos anos (Solomon et al., 2007).
5
Assim, as emissões dos poluentes gerados em processos de combustão têm diminuído
nos últimos anos em muitos países industrializados, devido à introdução de medidas de
controlo da poluição, quer a nível de modificações durante o processo de combustão, quer
após a combustão.
A Figura 6 mostra as contribuições relativas de diferentes combustíveis fósseis para as
emissões de CO2, verificando-se que ocorreram trocas de relevância nas emissões ao longo
dos anos. Os combustíveis líquidos dominavam as emissões na década de 90, tendência que
se inverteu, sendo atualmente e nas próximas décadas as emissões provenientes da queima
de carvão a principal fonte de CO2.
Figura 5. Emissões de CO2 com origem na produção energética (x 109 ton) (EIA, 2010).
Figura 6. Emissões mundiais de CO2 por combustível (x 109 ton) (EIA, 2010).
6
Tendo em consideração as projeções apresentadas sobre o inevitável aumento das
emissões de CO2 derivadas do uso de combustíveis fósseis, foram aprovadas em março de
2007, pela União Europeia (UE) determinadas medidas que visam combater estas alterações
climáticas causadas pelo uso excessivo destes combustíveis e aumentar a segurança
energética da UE, reforçando simultaneamente a sua competitividade. Os Chefes de Estado e
de Governo definiram uma série de exigências climáticas e de energia a serem cumpridas até
2020, nomeadamente:
Redução das emissões de gases com efeito de estufa na UE, no mínimo 20% abaixo
dos níveis de 1990.
Contributo de 20% de fontes de energia renováveis no consumo de energia primária
total da UE.
Redução de 20% no consumo de energia primária em comparação com os níveis
previstos, a ser alcançado através da melhoria da eficiência energética.
Coletivamente, estas imposições são conhecidas como os objetivos "20-20-20".
A conjugação dos dados, apresentados ao longo deste capítulo, mostra que apesar do
papel progressivamente mais importante desempenhado pelas energias renováveis na
satisfação das necessidades energéticas globais, a combustão é, e continuará a ser nas
próximas décadas, o principal processo de produção de energia para consumo. Por
conseguinte, é importante compreender os fenómenos físicos envolvidos em processos de
combustão. De modo a combater os principais problemas intrínsecos à combustão, os
cientistas e engenheiros terão que, entre outros aspetos:
Projetar, operar e controlar os equipamentos de combustão, de modo a atingir uma
elevada eficiência energética.
Atuar, durante ou após o processo de combustão, de modo a reduzir as emissões de
poluentes.
Procurar e avaliar as consequências do uso de combustíveis alternativos.
Reduzir os custos de fabrico e operação por unidade de energia produzida.
O trabalho desenvolvido nesta dissertação incide particularmente na redução das
emissões de gases com efeito de estufa, nomeadamente o CO2, o que corresponde à primeira
imposição dos objetivos “20-20-20” e ao objetivo do definido pelo Protocolo de Quioto. Devido a
estas condições, estão a ser desenvolvidas tecnologias alternativas à queima convencional de
combustíveis fósseis. Para obter uma redução significativa das emissões de CO2, este gás,
emitido em processos de combustão, tem que ser capturado e armazenado.
7
Atualmente, encontram-se em estudo várias tecnologias que permitem a captura e
armazenamento de CO2 (CCS – Carbon Capture and Storage). Para se proceder à CSS, três
tipos de tecnologias encontram-se em estudo:
Captura de CO2 com pré-combustão: esta tecnologia processa o combustível primário
num reator com vapor e ar ou oxigénio para produzir uma mistura, consistindo
principalmente em CO e H2 (gás sintético). H2 adicional é produzido junto com CO2
através da reação do CO com vapor de água num segundo reator. A mistura resultante
de H2 e CO2 pode ser separada numa corrente de CO2 e numa corrente de vapor de
água. O CO2 é armazenado e o H2 pode ser queimado para produzir energia.
Captura de CO2 com pós-combustão: esta tecnologia separa o CO2 dos produtos de
combustão através da combustão do combustível primário em ar. Estes sistemas
utilizam normalmente um solvente líquido para capturarem a pequena fração de CO2
(tipicamente 3-15% em volume) presente nos produtos de combustão, na qual o
principal constituinte é o N2 proveniente do ar.
Combustão oxy-fuel com recirculação dos produtos de combustão (queima de
combustível com oxigénio, em vez de ar, de modo a evitar N2 nos produtos de
combustão, conseguindo-se assim produtos de combustão ricos em CO2 prontos a
serem capturados e armazenados)
Na Figura 7 podem ser observados esquemas, com os equipamentos respetivos,
destas tecnologias que permitem a captura de CO2. Destas tecnologias, a mais próxima de
aplicação comercial é a combustão oxy-fuel. A tecnologia oxy-fuel enquadra-se perfeitamente
no objetivo de diminuir as emissões de gases com efeito de estufa, produzindo com elevada
eficiência produtos de combustão ricos em CO2, facilitando a sua captura e posterior
armazenamento.
Muitos dos estudos de avaliação tecno-económicos iniciais sugerem que a combustão
oxy-fuel deverá ser a tecnologia de captura de carbono mais eficiente e mais económica.
(Toftegaard et al., 2010).
O regime de combustão com tecnologia oxy-fuel será o alvo de estudo desta
dissertação. Para que esta tecnologia se torne comercial é ainda necessário estudar vários
aspetos e parâmetros e analisar os seus prós e contras. Os principais poluentes resultantes da
combustão são o monóxido de carbono (CO), os hidrocarbonetos não queimados, os óxidos de
azoto (NOx), o dióxido de enxofre (SO2), e as partículas sólidas. Estes poluentes podem causar
problemas na saúde, “smog”, chuvas ácidas, a destruição da camada de ozono e o efeito de
estufa.
8
Assim, no âmbito desta dissertação, as emissões de monóxido de carbono (CO) serão
estudadas e analisadas com o intuito de ajudar a otimizar esta nova tecnologia em
desenvolvimento. No subcapítulo seguinte são apresentadas informações que permitirão
compreender melhor os fenómenos ligados a este poluente, nomeadamente os seus
mecanismos de formação e oxidação.
(a)
(b)
(c)
Figura 7. (a) Captura com pré-combustão; (b) Captura com pós-combustão; (c) Combustão
oxy-fuel com recirculação dos produtos de combustão.
9
1.2 Caraterísticas e consequências da formação de CO
1.2.1 Efeitos na saúde e fontes de CO
O CO é um poluente primário, ou seja, é emitido diretamente da fonte sendo que, no
caso em estudo, a sua principal fonte é a combustão incompleta de combustíveis fósseis. A
perigosidade do CO deriva da sua grande capacidade de reação com a hemoglobina do
sangue, transformando-a em carboxihemoglobina que não se combina com o oxigénio.
Portanto, ao ocorrer uma intoxicação por CO, a transformação de uma parte dos glóbulos
vermelhos do sangue reduz a sua capacidade de transporte de oxigénio, com efeitos
observáveis na Figura 8, entre os quais a morte.
Como será descrito no capítulo 2 em maior detalhe, a instalação considerada no
presente estudo opera com uma chama de difusão. Deste modo, será dada grande atenção
aos mecanismos de formação de CO em chamas de difusão. Nos sistemas de combustão que
utilizam chamas de difusão existem duas fontes de monóxido de carbono intrinsecamente
ligadas à natureza das próprias chamas. Uma destas fontes está relacionada com o
estabelecimento na câmara de combustão de regiões onde a mistura é muito pobre. Nestas
circunstâncias, o processo de combustão é muito lento, e, assim, a oxidação do combustível é
somente parcial, originando produtos tais como aldeídos e CO, entre outros.
As caraterísticas da injeção do combustível e processo de mistura
oxidante/combustível são parâmetros determinantes neste mecanismo de formação de CO.
Este mecanismo é particularmente importante em equipamentos operando a cargas reduzidas
Figura 8. Efeito do CO sobre a saúde humana.
10
onde o excesso de ar/oxigénio é elevado. Assim, a presença de O2 na zona de reação é
fundamental para o início do mecanismo de oxidação do CO. Para além da parte química
envolvida, é necessário que o grau de mistura entre os reagentes seja intenso para que todo o
CO formado seja convertido em CO2, principalmente nas situações em que o excesso de
oxidante é moderado. Este fenómeno pode ser ilustrado pela combustão em motores Diesel,
onde a capacidade de mistura dos reagentes é limitada e as emissões de CO elevadas.
A outra fonte de CO associada à natureza das chamas de difusão está relacionada
com a criação de regiões onde a mistura é muito rica. Nestas condições, os fragmentos de
combustível que deixam essas regiões não se misturam com oxidante adicional suficiente ou,
se isso acontecer, os seus tempos de residência na câmara de combustão são insuficientes
para que a sua combustão seja completa. Este mecanismo é particularmente importante em
equipamentos operando a carga máxima, onde o excesso de ar/oxigénio é relativamente baixo.
Entre os outros mecanismos que podem originar CO, destacam-se os seguintes:
Fenómenos de “quenching” na parede das câmaras de combustão (por exemplo,
em motores Diesel);
Fenómenos de “quenching” induzidos por jatos de ar de diluição ou ar secundário
(por exemplo, em turbinas a gás);
Atomização deficiente no caso de combustíveis líquidos (por exemplo, caldeiras).
Fica claro que, no processo de oxidação do CO, o tempo de residência dos gases
dentro da câmara de combustão necessita de ser suficiente para compensar os "atrasos"
químicos e físicos envolvidos. O projeto de queimadores também deve criar condições que
proporcionem uma mistura intensa dos reagentes, e, no caso de combustão de combustíveis
líquidos, os atomizadores devem ser capazes de promover um spray fino, facilitando a
atomização do combustível e a penetração do oxidante no seu interior.
No caso de combustíveis gasosos, o aumento da taxa de mistura entre os reagentes
pode ser conseguido através de uma pré-mistura de parte do ar de combustão com o
combustível ainda no queimador. Apesar de reduzir substancialmente a emissão de CO, e
diminuir a fuligem, a pré-mistura do oxidante com o combustível requer uma atenção especial
no projeto do queimador, pois se a velocidade de chama for maior que a do escoamento e a
razão de pré-mistura estiver dentro do limite de inflamabilidade, a chama pode deslocar-se
para o interior do queimador e causar uma explosão.
1.2.2 Mecanismos de formação de CO
Os mecanismos de formação de CO em combustão de hidrocarbonetos não podem ser
isolados da cinética que envolve os hidrocarbonetos. Os radicais formados a partir do
11
combustível são atacados pelo oxigénio para formar aldeídos, que, por sua vez, formam outros
radicais que se convertem em CO por decomposição térmica. Muito embora a oxidação de CO
tenha importância por si, o processo é extremamente importante para a oxidação de
hidrocarbonetos.
De uma maneira simplista, a combustão de hidrocarbonetos pode ser caraterizada
como um processo com dois passos: o primeiro envolve a quebra do combustível para formar
CO, e o segundo, a oxidação final do CO para CO2. É conhecido que o CO se oxida
lentamente, excepto se estiverem presentes compostos que contenham hidrogénio. Pequenas
quantidades de H2O ou H2 podem ter um forte efeito na taxa de oxidação do CO. Isto ocorre
porque a reação de oxidação do CO que envolve o radical OH é muito mais rápida do que a
reação que envolve o O2:
⁄ (R1)
A presença de CO2 no oxidante tem um efeito inibidor na oxidação do combustível, em
resultado da competição entre CO2 e O2 por átomos de hidrogénio (H) como mostram as
equações:
(R2)
(R3)
À medida que a importância da reação (R2) aumenta na presença de grandes
quantidades de CO2, o consumo de radicais H aumenta igualmente. A menor disponibilidade de
hidrogénio atómico diminui a formação de radicais de propagação de cadeia, OH, através da
reação (R3) reduzindo assim a taxa de consumo de CO pela reação inversa (R2). A reação
(R3) é a principal reação de ramificação de cadeia nos processos de combustão.
A oxidação de CO tem lugar essencialmente através da reação (-R2) e, deste modo, é
governada pelo rácio O/OH. De acordo com previsões computacionais, em condições pobres, a
grande disponibilidade de átomos de oxigénio favorece a reação:
(R4)
Também em misturas pobres, a concentração relativamente alta de O2 causa o
aumento das reações de oxidação e atua como fonte de radicais. Uma nova sequência
competitiva torna-se ativa que inclui o consumo do radical H através da interação com O2 e um
terceiro corpo, com o CO2 a servir como uma parede de colisão muito eficiente da reação:
(R5)
12
Em condições estequiométricas, a presença de O é mais limitada e é o radical H, em
vez do O, que primeiramente reage com HO2:
(R6)
Uma maior quantidade de radicais OH, formados através da reação (R6), é capaz de
consumir CO através de (-R2), conduzindo a uma oxidação de CO mais rápida perto de
condições estequiométricas. Ao descrever o mecanismo de reação de CO foi dado um
destaque especial às reações que convertem CO2 em CO, que assim ativam quimicamente a
inerte molécula de CO2. Como as ligações duplas carbono-oxigénio são muito fortes, é
necessário elevadas temperaturas e/ou a presença de radicais muito reativos para quebrá-las.
A dissociação térmica do CO2 (R7) é fortemente endotérmica e ocorre apenas a elevadas
temperaturas.
( ) ( ) (R7)
As reações do CO2 com radicais livres podem ocorrer a temperaturas mais baixas. A
mais importante é a reação com hidrogénio atómico (R2) que é comparativamente rápida
mesmo a temperaturas moderadas. Outras espécies do conjunto de radicais O/H que reagem
com o CO2 são demasiado lentas para terem significado quando comparadas com a reação
(R2), tais como:
(R8)
(R9)
Era expetável que as reações inversas de (R8) e (R9) tivessem elevada importância na
oxidação de CO em condições onde a concentração do radical OH é baixa, mas trabalhos
recentes (You et al., 2007) revelaram que estas reações são muito mais lentas do que
inicialmente estimado. Ainda há que ter em conta as reações do CO2 com radicais de
hidrocarbonetos, que podem ser possivelmente ativas na decomposição do CO2. Os radicais
de hidrocarbonetos podem ser muito reativos. Como regra, a reatividade destes radicais
aumenta com o número de electrões desemparelhados, tornando assim o metino (CH) mais
reativo que o metileno (CH2), que é mais reativo que o metilo (CH3).
No entanto, os radicais mais reativos estão tipicamente presentes em pequenas
concentrações, não recebendo muita atenção. Apesar do radical CH3 ser o mais abundante na
combustão de CH4, a sua reação com CO2 é muito lenta e com pouca importância para o
presente trabalho. O radical metileno tem dois estados energeticamente acessíveis durante o
13
processo de combustão. Comparado com o estado triplo (3CH2), o metileno simples (
1CH2) é
menos reativo com radicais, mas reage mais rapidamente com moléculas estáveis. Ambos os
estados reagem com CO2 da mesma forma:
(R10)
(R11)
Segundo Glarborg e Bentzen (2008), estas reações podem ter um papel muito
importante no consumo de CO2 e consequente aumento de CO. Como já referido, na presença
de grandes quantidades de CO2, a reação (-R2) é limitada (quer por razões de equilíbrio, quer
pela diminuição da concentração de radicais OH), quando comparada com uma atmosfera de
N2, devido à menor extensão da reação (R3). A reação (R3) é seguida da reação seguinte, que
devido ao decréscimo de radicais O causado por (-R3), provoca uma diminuição maior da
concentração de OH, inibindo a oxidação do CO:
(R12)
Efeito do vapor de água
Na ausência de CO2, a presença de elevadas quantidades de vapor de água modifica
substancialmente a composição do conjunto de radicais disponível, estando diretamente
implicado no destino dos radicais H, através de:
(R13)
Na presença de CO2, os radicais H que reagiram com o vapor de água na reação
anterior, vão reagir preferencialmente com CO2 através da reação (R2), diminuindo a
relevância da reação (R13).
O vapor de água participa maioritariamente em duas reações: (a) diretamente, na
interação com radicais O e H, através das reações (R12) e (R13), e (b), atuando como uma
parede de colisão muito eficaz na reação (R5). A reação (R5) compete com (R3) por radicais H,
competição que determina, em grande parte, o regime de oxidação do CO.
Outros mecanismos
Quando o H2 está presente em quantidade significativa, as reações seguintes devem
também ser tidas em consideração:
14
(R14)
(R15)
Além das reações (R14) e (R15), uma terceira reação de oxidação pode ocorrer
quando o radical HO2 está presente:
(R16)
No entanto, tal reação só apresenta algum significado em relação à reação (R2) em
situações de pressão elevada.
1.3 Estado da arte
1.3.1 Caraterísticas da combustão oxy-fuel
Como já foi referido, o interesse na tecnologia oxy-fuel é a sua facilidade em produzir
produtos de combustão ricos em CO2, de modo a facilitar a sua captura. As fornalhas
convencionais utilizam ar como oxidante, sendo este composto por 79% (em volume) de N2.
Este dilui a concentração de CO2 nos produtos de combustão, dificultando a sua captura.
No regime de combustão oxy-fuel, o combustível é queimado com O2 mais CO2,
obtendo-se deste modo produtos de combustão ricos em CO2 contendo ainda vapor de água.
O CO2 usado no oxidante é proveniente da recirculação dos produtos de combustão (RPC). A
RPC consiste em reenviar parte dos produtos de combustão, provenientes da câmara de
combustão de um sistema de queima, para a zona de chama, geralmente através do
queimador, no qual são introduzidos juntamente com o oxidante e/ou combustível.
Como mostra a Figura 9, o O2 é separado do N2 (através de uma unidade de
separação de ar) e injetado na câmara de combustão, juntamente com a RPC. Nesta figura é
possível observar que a RPC é composta por CO2 e vapor de água. Contudo, o vapor de água
pode não ser recirculado, se os produtos de combustão recirculados passarem por um
condensador. Neste caso, a RPC será apenas constituída por CO2.
Como será descrito no subcapítulo 1.3.2.1., não existe consenso entre os
investigadores sobre o efeito da concentração de vapor de água na combustão em regime oxy-
fuel. Daí a razão deste ter sido alvo de estudo nesta dissertação. Ainda na Figura 9, é de notar
que, antes de se proceder à CSS, os produtos de combustão ricos em CO2 têm que ser
tratados, atravessando um precipitador para eliminar poeiras, arrefecidos e secos.
15
Seguidamente, são removidas as espécies químicas como inertes e gases ácidos. Somente
após estas operações será possível proceder à captura do CO2.
A RPC é indispensável para a combustão oxy-fuel, pois é utilizada para reduzir a
temperatura de chama e perfazer o volume em falta de N2, de modo a assegurar que há gás
suficiente para conduzir o calor através da câmara de combustão. Esta recirculação aumenta a
capacidade térmica dos gases queimados para uma dada quantidade de energia libertada na
combustão, o que permite baixar a temperatura de combustão.
A Tabela 1 apresenta a variação do calor específico (cp) das diferentes espécies
constituintes do oxidante utilizado neste trabalho. Verifica-se que substituir N2 por CO2 (mais
vapor de água) no oxidante origina um oxidante com maior calor específico quando comparado
com o ar. Este aumento tem como consequência a diminuição da temperatura adiabática de
chama (Tad).
Assim, processos de combustão com o mesmo rácio entre oxigénio e inertes (CO2 e
N2), apresentam temperaturas no interior da câmara de combustão menores devido à
diminuição da Tad. Para além do calor específico e Tad, outras diferenças nas propriedades das
Figura 9. Diagrama simplificado do processo de combustão em regime oxy-fuel com
captura de CO2.
16
espécies químicas constituintes do oxidante podem ter relevância na mudança do regime de
combustão em ar para regime de combustão oxy-fuel.
Tabela 1. Variação do calor específico (cp) com a temperatura das diferentes espécies químicas
constituintes do oxidante.
Temperatura (K) Calor específico, cp (kJ/kgK)
N2 CO2 H2O(v)
275 1.039 0.819 1.859
300 1.040 0.846 1.864
500 1.056 1.014 1.954
1000 1.167 1.234 2.288
1500 1.244 1.326 2.609
2000 1.284 1.371 2.836
2500 1.307 1.397 2.987
A Tabela 2 apresenta um conjunto de propriedades com o objetivo de melhor
compreender os efeitos observados na transição de regime de combustão. A massa volúmica
dos gases recirculados é maior devido à massa molecular do CO2 ser maior (44) quando
comparada com N2 (28).
Assim, para se obter um fluxo de calor radiativo na combustão oxy-fuel semelhante ao
da combustão em ar é necessário que a proporção de O2 no oxidante seja inferior a 30%. O
volume dos gases que atravessam a fornalha é ligeiramente reduzido, e o volume dos produtos
de combustão (após recirculação) é reduzido em cerca de 80%. Tipicamente, ao queimar
carvão com ar, 20% de excesso de ar é utilizado. A tecnologia oxy-fuel necessita apenas de
1% de excesso de O2 nos reagentes para se obter uma fração de O2 nos produtos de
combustão idêntica à combustão em ar, que é cerca de 3-5%.
Tabela 2. Propriedades das espécies químicas constituintes do oxidante (T = 1396 K; p = 1 atm).
H2O O2 N2 CO2 Razão CO2/N2
Massa volúmica (ρ) [kg/m3] 0,157 0,278 0,244 0,383 1,6
Condutividade térmica (k) [W/m K] 0,136 0,087 0,082 0,097 1,2
Calor específico (cp) [kJ/kg K] 2,53 1,00 1,22 1,31 1,1
Viscosidade dinâmica (µ) [kg/m s] 5,02e-05 5,81e-05 4,88e-05 5,02e-05 1,0
Viscosidade cinética (ν) [m2/s] 3,20e-04 2,09e-04 2,00e-04 1,31e.04 0,7
17
Outra forma de compreender as diferenças entre os dois regimes de combustão é
analisar as reações químicas envolvidas em ambos os casos. Através da reação típica de um
hidrocarboneto, com um determinado excesso de ar/oxigénio, λ, pode-se observar o aumento
de CO2 nos produtos de combustão ao substituir o CO2 por N2 no oxidante. As reações
químicas seguintes representam a combustão em ar e em regime oxy-fuel, respetivamente:
(
) ( )
(
) (
) ( )
(R17)
(
) ( ) ( (
))
(
) ( )
(R18)
Assumindo que o hidrocarboneto em causa é metano, visto ser o combustível usado no
trabalho experimental, a Tabela 3 mostra a diferença na percentagem de CO2 nos produtos de
combustão para os dois regimes.
Tabela 3. Percentagem volúmica seca de CO2 nos produtos de combustão para os dois regimes de
combustão.
Regime de
combustão
%CO2 nos produtos de combustão
λ = 1 λ = 1,05 λ = 1,1
Ar-fuel 11,7 11,1 10,5
Oxy-fuel 100 98,9 97,9
A Tabela 3 mostra o impacto que a combustão em regime oxy-fuel tem na obtenção de
produtos de combustão ricos em CO2, o que torna esta tecnologia muito conveniente, no que
se refere à captura e armazenamento do CO2.
Ao produzir produtos de combustão tão ricos em CO2, a sua captura é muito facilitada,
pois as unidades de captura de CO2 gastam menos energia a separar este gás dos que não
são capturados nos produtos de combustão. Na combustão em ar, a grande quantidade de N2
presente nos produtos de combustão, torna a captura de CO2 mais dispendiosa. Tal deve-se às
maiores necessidades energéticas requeridas para separar concentrações relativamente
pequenas de CO2 dos outros gases presentes nos produtos de combustão para posterior
armazenamento.
Custo da captura de CO2
O custo capital de uma central termoelétrica com captura de CO2 será muito mais
elevado que o de uma central convencional, sendo ainda necessário o uso de mais energia
durante a operação. A Figura 10 mostra claramente os ganhos e as perdas em construir
18
centrais termoelétricas com captura de CO2, sendo estas reduzidas significativamente à custa
do aumento do consumo de combustível.
A Figura 11 apresenta a comparação da potência gerada entre diferentes tipos de
centrais termoelétricas com e sem captura de CO2. A figura é do IPCC (2005) e é baseada em
estudos de dimensionamento e projeto, sendo as eficiências calculadas com base no poder
calorífico inferior (PCI) do combustível usado. Em todas as centrais, cerca de 80-90% de CO2 é
capturado, constituindo as exceções as centrais a funcionar com regime de combustão oxy-
fuel, que apresentam percentagens superiores a 97%. A energia necessária para comprimir o
CO2 para 110 MPa encontra-se incluída nos estudos efetuados.
Para além destas considerações, é necessário ter em conta o custo de transporte e
armazenamento do CO2. É óbvio que a captura de CO2 é uma tecnologia cara. Por essa razão,
e para torná-la comercialmente atrativa, é importante ou aumentar os custos associados às
emissões de CO2, ou melhorar a tecnologia de captura de CO2.
Assim, uma contrapartida para a captura de CO2 será o seu custo, sendo atualmente
ainda uma tecnologia bastante cara, tanto em custo de capital como em equipamento
adequado. Este fator é de extrema relevância, sendo, por isso, necessário maximizar a
eficiência nas centrais termoelétricas. No entanto, não é possível maximizar a eficiência
energética indefinidamente. De facto, ao aumentar a percentagem de O2 no oxidante até este
ser composto totalmente por O2, as temperaturas de chama tornar-se-ão demasiado elevadas,
o que impõe um limite à percentagem de O2 no oxidante devido à resistência dos materiais.
Outro ponto muito importante é que a tecnologia oxy-fuel combinada com captura de
CO2 deve fornecer energia a unidades de operação adicionais, tais como a compressão dos
produtos de combustão, não necessárias em centrais convencionais sem captura. A tecnologia
oxy-fuel com captura de CO2 é, portanto, menos eficiente por unidade de energia produzida.
Figura 10. Efeito do consumo de combustível nas emissões de CO2 em centrais
termoelétricas (IPCC, 2005).
20
1.3.2 Estudos recentes
Neste subcapítulo são apresentados estudos científicos recentes que, dentro do âmbito
desta dissertação, apresentam resultados de relevância para a tecnologia em estudo, sendo
alguns deles passiveis de comparação com o trabalho desenvolvido. Esses estudos foram
selecionados de modo a perceber as implicações e problemas que têm maior influência nos
parâmetros de funcionamento e nas caraterísticas do oxidante no desempenho energético e
ambiental de reatores tubulares e fornalhas laboratoriais.
Tais estudos têm-se realizado essencialmente em dois tipos de instalações: reatores
tubulares (Giménez-López et al., 2010; Giménez-López et al., 2011a; Giménez-López et al.,
2011b; Abián et al., 2011; Riaza et al., 2011; Amato et al., 2011; Mendiara e Glarborg, 2009;
Glarborg e Bentzen, 2008) e fornalhas laboratoriais (Costa et al., 1997; Bohn et al., 2011;
Smart et al., 2010; Ditaranto e Oppelt, 2011; Liu et al., 2005; Heil et al., 2011). Outros estudos
relevantes para a combustão oxy-fuel em geral também serão apresentados.
1.3.2.1 Reatores tubulares
Emissões de poluentes
Giménez-López et al. (2010) estudaram a oxidação de cianeto de hidrogénio (HCN)
numa atmosfera O2/CO2. Ao fazer variar a temperatura do reator e estequiometria, notaram
que, como já referido, a competição do CO2 e O2 por hidrogénio atómico, resulta na diminuição
de radicais de propagação de cadeia, o que inibe a oxidação do HCN. Também constataram
que as menores conversões de HCN observadas numa atmosfera de CO2, quando comparada
com combustão em ar, resulta numa maior formação de CO, mas menores concentrações de
NO. Este efeito foi observado para todas as estequiometrias estudadas.
Giménez-López et al. (2011a) estudaram, igualmente, os efeitos do SO2 na oxidação
de CO numa atmosfera de CO2, caraterística de condições oxy-fuel. Concluíram que para uma
determinada estequiometria e temperatura, a conversão de CO em CO2 é sempre maior numa
atmosfera rica em N2 quando comparada com uma atmosfera rica em CO2. Este facto deve-se
à competição do CO2 (R2) e O2 (R3) por radicais H, o que reduz a formação de radicais OH
pela reação (-R2), inibindo a conversão de CO numa atmosfera de CO2. Foi observado que a
presença de SO2 inibe a oxidação de CO, tanto em atmosferas de CO2 como de N2, para todas
as estequiometrias estudadas, afetando significativamente a taxa de oxidação de CO, sendo o
efeito mais pronunciado em atmosferas de N2.
21
Efeitos químicos da combustão em O2/CO2
Glarborg e Bentzen (2008) estudaram os efeitos químicos de elevadas concentrações
de CO2 no regime de combustão oxy-fuel de metano (CH4). Verificaram que neste regime de
combustão pode ser esperada a formação de CO em concentrações elevadas na zona próxima
do queimador. Estas elevadas concentrações localizadas de CO podem ter implicações na
corrosão e formação de slagging nas zonas próximas do queimador, não sendo previsível o
aumento de problemas relacionados com as emissões de CO no regime de combustão oxy-
fuel.
Por seu lado, Amato et al. (2011) analisaram as emissões de CO e O2 em chamas de
metano a operar em regime de combustão oxy-fuel para diferentes estequiometrias, pressão,
concentração de CO2 e tempo de residência. Concluíram que as emissões de CO são mais
elevadas na combustão com CO2 do que na combustão em ar. Para um dado tempo de
residência, as emissões de CO são mais elevadas por causa da oxidação mais lenta do CO
intermédio formado na chama. Também constataram que estas emissões aumentam
exponencialmente com a temperatura de chama, sendo previsível que um aumento de pressão
baixe as emissões.
Efeito da adição de vapor de água
Abián et al. (2011) estudaram o efeito de diferentes concentrações de CO2 e H2O na
oxidação de CO para diferentes temperaturas. Observaram que, em geral, o efeito da adição
de CO2 inibe a oxidação de CO, notando ainda que esta supressão é mais pronunciada para
misturas ricas e para baixas concentrações de CO2. Em contraste, verificaram que a adição de
vapor de água causava o aumento da conversão de CO em CO2.
Por seu turno, Riaza et al. (2011) analisaram o efeito da adição de vapor de água na
temperatura de ignição da combustão de carvão, em regime oxy-fuel, para diferentes relações
O2/CO2/H2O(v). Os resultados mostraram que a temperatura de ignição, ao substituir o N2 do ar
por CO2, é maior no último caso. No entanto, o aumento da concentração de O2 na relação
O2/CO2 para valores superiores a 21% inverte a tendência, observando-se agora uma menor
temperatura de ignição quando comparada com a combustão em ar. Por último, constatou-se,
ainda, que a adição de vapor de água provoca um aumento na temperatura de ignição, não se
notando diferenças relevantes para diferentes concentrações de vapor de água.
Reburning na combustão oxy-fuel
Mendiara e Glarborg (2009) estudaram a química do reburning na combustão oxy-fuel
de metano. Notaram que a combustão em ambiente O2/CO2 impõe um aumento significativo
das concentrações de CO, quando comparado com uma atmosfera O2/N2.
22
Para misturas estequiométricas e pobres, a eficiência de redução de NO do processo
de reburning é igual em CO2 e N2, mas para misturas ricas verificaram uma redução de NO
maior em CO2. Observaram, ainda, que a temperatura à qual o CO exibe a máxima
concentração coincide com um decréscimo brusco na concentração do NO. Esta temperatura
foi maior nas experiências com CO2, comparando com as obtidas em N2.
Por sua vez, Giménez-López et al. (2011b) analisaram o reburning de combustíveis
gasosos em condições de interesse para a combustão em regime oxy-fuel. Constataram que a
oxidação dos combustíveis utilizados no reburning é inibida em ambiente oxy-fuel comparando
com a combustão em ar. Esta inibição é acompanhada por uma formação muito elevada de
CO. A eficiência da redução de NO do processo de reburning depende das condições de
operação, sendo as maiores eficiências observadas para misturas ricas, concentrações do
combustível de reburning elevadas e baixas concentrações de H2O.
Combustão com outros tipos de combustíveis
Arias et al. (2008) verificaram o efeito na ignição de misturas de biomassa e carvão em
regime de combustão oxy-fuel. A temperatura de ignição para uma mistura O2/CO2 (substituído
o N2 na mesma percentagem) é superior. Contudo, ao aumentar a concentração de O2 na
mistura, esta situação inverte-se, sendo a temperatura de ignição menor. Observaram também
que para a combustão em ar, misturar biomassa com carvão melhora a temperatura de ignição.
Tal não se verifica, todavia, para o regime de combustão oxy-fuel.
1.3.2.2 Fornalhas laboratoriais
Transferência de calor por radiação e por convecção
Outros estudos nesta tecnologia de combustão têm recaído sobre a transferência de
calor na forma de radiação e convecção. Smart et al. (2010) avaliaram a transferência de calor
na forma de radiação e convecção em regime de combustão oxy-fuel com carvão. Os
resultados mostram que os valores máximos do fluxo de calor radiativo (qrad) relacionam-se
inversamente com a taxa de recirculação (RPC). O contrário acontece para os valores do fluxo
de calor convectivo (qconv), que são máximos para taxas de RPC elevadas. À medida que a
RPC aumenta, o valor máximo do qrad desloca-se axialmente no sentido contrário ao do
queimador.
Ditaranto e Oppelt (2011) analisaram as caraterísticas radiativas do fluxo de calor de
chamas de metano em atmosferas oxy-fuel. Observaram que à medida que a concentração de
O2 aumenta, a distribuição do fluxo de calor radiativo ao longo do reator e o comprimento de
chama decrescem. Foram encontrados valores das distribuições de fluxo de calor e frações
radiantes semelhantes para combustão em ar e em ambiente oxy-fuel para uma mistura de
35%O2 em CO2.
23
O valor máximo de qrad diminui à medida que se aumenta a concentração de CO2 no
oxidante, deslocando-se o máximo no sentido contrário à base da chama. No regime laminar, o
máximo de qrad aumenta com o número de Reynolds, ao contrário do que acontece em regimes
turbulentos totalmente desenvolvidos.
Efeitos químicos da combustão em O2/CO2
Ding e Du (1995) analisaram os benefícios energéticos e ambientais do regime de
combustão oxy-fuel. Estudaram várias concentrações de O2 no oxidante e observaram a
redução de emissões de gases com efeitos nocivos, nomeadamente CO, NOx e partículas. Por
sua vez, Heil et al. (2011) investigaram os efeitos do O2 e CO2 nas taxas de combustão de
metano durante o regime de combustão oxy-fuel. Todos constataram que a concentração de O2
numa atmosfera O2/N2 não apresenta influência na formação de CO, enquanto numa atmosfera
composta por O2/CO2, um aumento da concentração de O2 causa uma diminuição acentuada
na concentração de CO medida na zona de reação. Foi ainda observado que na zona de
recirculação o aumento da concentração de O2, aumenta a taxa de oxidação de CO.
Por seu lado, Liu et al. (2005) compararam a combustão de carvão pulverizado em ar e
em misturas de O2/CO2. Concluíram que substituindo o N2 por CO2 origina uma diminuição na
temperatura dos gases. De modo a manter um perfil de temperatura semelhante à combustão
de carvão em ar é necessário que na combustão de carvão numa mistura O2/CO2, a
concentração de O2 seja 30% ou superior. Observaram, ainda, que as emissões de CO estão
relacionadas com os perfis de temperatura dos gases, sendo obtidos os menores valores perto
da exaustão.
Recirculação de produtos de combustão
Costa et al. (1997) analisaram o efeito da RPC na combustão em ar de chamas de
propano. Observaram que a RPC tem um efeito positivo na diminuição das emissões de NOx,
não apresentando efeitos significativos nas emissões de CO e na eficiência da combustão em
geral. Verificaram que uma taxa de recirculação de cerca de 32% produz uma combustão
estável independentemente do valor de λ. A transição de cor da chama entre amarelo e azul
tende a ocorrer para maiores taxas de recirculação à medida que o excesso de ar aumenta.
Temperatura de chama
Bohn et al. (2011) analisaram a temperatura de chama e concentrações das espécies
em chamas resultantes da combustão oxy-fuel de carvão. Analisaram, igualmente, a viabilidade
de controlar a temperatura de chama em processos oxy-fuel, não só com a RPC, mas também
variando a estequiometria da mistura à entrada na câmara de combustão. A dependência da
temperatura da estequiometria é idêntica à da Tad, com valores máximos obtidos para
24
combustão próxima da estequiometria. Assim, um aumento ou diminuição do valor de λ,
conduz a uma redução da temperatura de chama. Verificaram que a temperatura máxima
obtida ocorreu para a combustão em O2/CO2 com 30% de O2 e λ = 1,15, sendo que os testes
com 40% de O2 e λ = 0,55 e 2,15 apresentaram temperaturas menores. Também observaram
que a combustão com misturas ricas resulta em elevadas concentrações de CO e baixas
concentrações de NOx, constatando o contrário para misturas pobres.
Combustão sem chama visível
Krishnamurthy et al. (2009) analisaram um queimador de baixa intensidade em regime
de combustão oxy-fuel, onde compararam a combustão sem chama visível com combustão
convencional. Constataram que o regime de combustão oxy-fuel sem chama visível pode ser
obtido através da injeção axissimétrica de O2 a alta velocidade. A aparência visual da chama é
distinta nos dois casos: no modo sem chama visível, a chama apresenta um azul transparente
dificilmente visível, enquanto no modo normal, a chama apresenta uma cor branca. A
recirculação interna de produtos de combustão resulta numa distribuição de temperatura mais
uniforme na câmara de combustão, juntamente com menores máximos de temperatura quando
comparada com a combustão oxy-fuel convencional. Os perfis de qrad são idênticos em ambos
os casos; no entanto, a distribuição do fluxo de calor total é mais uniforme no regime de
combustão oxy-fuel sem chama visível.
1.3.2.3 Outros estudos relevantes
Normann et al. (2009) analisaram o controlo de emissões de óxidos de azoto (NOx) em
regime de combustão oxy-fuel. Observaram que esta tecnologia proporciona uma redução de
cerca de 65% nas emissões de NOx comparando com a combustão em ar. Concluíram, ainda,
que a redução de NOx a alta temperatura é um exemplo de como se pode reduzir mais estas
emissões, se se continuar a melhorar e investir nesta tecnologia de combustão.
No que toca à captura de CO2 após a combustão oxy-fuel com carvão, Yan et al.
(2011) estudaram processos de optimização e limpeza dos produtos de combustão. Não foram
encontrados problemas técnicos na remoção de SOx com as tecnologias disponíveis para a
limpeza de produtos de combustão. A limpeza de NOx dos produtos de combustão necessita de
mais estudos e posterior desenvolvimento das técnicas disponíveis para a sua remoção.
Outros desenvolvimentos devem focar a optimização tecno-económica dos sistemas de
limpeza dos produtos de combustão, reduzindo o consumo energético e respetivos custos,
validando, assim, a performance desejada em sistemas de grande escala.
Os dados da Figura 3, apresentada anteriormente, mostram uma elevada taxa de
crescimento da utilização de gás natural num futuro próximo. Contudo, a maior parte dos
estudos sobre o regime de combustão oxy-fuel lidam com combustíveis sólidos,
25
nomeadamente carvão (Liu et al., 2005; Smart et al., 2010; Bohn et al., 2011; Riaza et al.,
2011, entre outros).
Convém referir que, mesmo para combustíveis sólidos, grande parte da conversão do
combustível no processo de combustão ocorre na fase gasosa. Os materiais voláteis
transportam tipicamente 50% da energia do combustível, e, em adição à libertação de calor, a
oxidação dos voláteis é também importante na ignição, definição da estequiometria local e
emissão de poluentes. Os estudos disponíveis sobre a combustão oxy-fuel de combustíveis
gasosos são, porém relativamente escassos (Amato et al., 2011; Heil et al., 2011; Ditaranto e
Oppelt, 2011).
1.3.3 Aplicações
Apesar de a combustão oxy-fuel e da combustão enriquecida com oxigénio já serem
aplicadas há várias décadas em indústrias (como é o caso do vidro, do cimento e do aço), o
conceito da combustão oxy-fuel (no sentido de providenciar produtos de combustão ricos em
CO2 para captura e armazenamento) é relativamente recente, tendo ganho maior atenção nos
anos 90.
Todavia, este regime de combustão oxy-fuel é apenas ideal para se proceder à captura
de CO2, em instalações que trabalhem com grandes potências. Por exemplo, para capturar o
CO2 proveniente do motor de um veículo automóvel seria demasiado caro, tornando-se
também um problema juntar todo o CO2 e transportá-lo para armazenamento. A tecnologia oxy-
fuel tem interesse, particularmente em duas aplicações no mundo da produção de energia,
nomeadamente, a alteração e a atualização de centrais termoelétricas e em ciclos combinados
com turbinas a gás.
A Figura 12 mostra uma central térmica de 40 MW t, na qual Sturgeon et al. (2009)
conduziram testes sobre o regime de combustão oxy-fuel. Vários testes, em instalações de
grande dimensão, estão a avaliar os efeitos desta tecnologia na alteração das centrais
termoelétricas, de modo a tornar possível a comercialização desta tecnologia. Wall et al. (2009)
fizeram uma revisão sobre o estado da arte da combustão oxy-fuel com carvão, relatando o
estado recente de diversos testes.
A Figura 13 mostra a evolução dos testes efetuados, bem como as demonstrações
realizadas. Nas décadas de 80 e 90 iniciaram-se os testes em unidades piloto, e, de seguida,
começaram os testes à escala industrial sem CCS (10 MWe). Atualmente estão a decorrer e a
ser planeadas demonstrações da tecnologia oxy-fuel com CCS em centrais termoelétricas (10-
250 MWe). Outra aplicação desta tecnologia são as turbinas a gás. A Figura 14 mostra o
princípio de funcionamento do ciclo combinado de uma turbina a gás a operar em regime oxy-
fuel. Embora o processo de separação do oxigénio do ar seja uma tecnologia disponível, a
maior parte da tecnologia necessária para construir uma central termoelétrica a operar em
regime oxy-fuel não se encontra comercialmente disponível.
27
Para uma turbina a gás, a troca do fluido de trabalho de ar para um gás rico em CO2
resulta em várias alterações nas propriedades que são importantes para o projeto do
compressor, câmara de combustão e a ligação dos gases quentes que inclui a turbina. Estas
alterações têm um impacto muito significativo nos componentes da turbina a gás, sendo
necessário um projeto completamente novo dos compressores, câmara de combustão e do
percurso dos gases quentes. Liu et al. (2011) analisaram várias caraterísticas do regime de
combustão oxy-fuel em turbinas a gás.
Figura 14. Princípio de funcionamento do ciclo combinado de uma turbina a gás em regime
oxy-fuel (IPCC, 2005).
Figura 13. Progressão histórica dos testes efetuados em oxy-fuel em unidades piloto e unidades de demonstração (Wall et al., 2009).
28
1.4 Presente contribuição
O objetivo da presente dissertação é avaliar experimentalmente o efeito da velocidade
e composição do oxidante nas emissões de CO de uma fornalha laboratorial operando em
regime de combustão oxy-fuel.
Como referido anteriormente, na comunidade científica não há consenso sobre os
efeitos destes parâmetros. Assim, para analisar aprofundadamente estes efeitos foram
medidas as emissões de CO numa fornalha laboratorial para várias condições de
funcionamento, incluindo várias composições do oxidante. Especificamente, a presente
dissertação inclui:
Emissões de CO em função da velocidade de injeção do oxidante na câmara de
combustão.
Emissões de CO em função da composição do oxidante, composto por O2, CO2 e
H2O.
Os presentes resultados contribuem para uma melhor compreensão da combustão oxy-
-fuel, em particular no que diz respeito ao seu impacto nas emissões de CO.
29
2 Fornalha Laboratorial e Técnicas de Medida
O presente estudo foi realizado no Laboratório de Combustão do Departamento de
Engenharia Mecânica, no Instituto Superior Técnico, em Lisboa.
As Figura 15 e 16 mostram esquematicamente a câmara de combustão, com as
respetivas dimensões, e os sistemas de alimentação de combustível e oxidante. A Figura 17
mostra os dispositivos utilizados para a injeção de vapor de água.
Figura 15. Representação esquemática da câmara de combustão
30
a) b)
Figura 17. (a) Dispositivo utilizado para saturar a corrente de CO2 com vapor de água; (b) Panela de
pressão utilizada para produzir vapor de água.
Figura 16. Representação esquemática dos sistemas de alimentação de combustível e oxidante
31
2.1 Câmara de combustão e queimador
A câmara de combustão e o queimador utilizado no presente trabalho foram
desenvolvidos por Castela (2010). A câmara de combustão é constituída por um tubo de
quartzo cilíndrico com um diâmetro de 100 mm e um comprimento de 320 mm.
Como pode ser observado na Figura 18, a câmara de combustão está disposta na
vertical, estando a admissão de oxidante e combustível, bem como a exaustão dos produtos de
combustão, localizadas no topo da câmara de combustão. A base da câmara de combustão é
fechada, contendo apenas uma calha com um furo de 11 mm de diâmetro para possibilitar a
entrada, quer das sondas quer do mecanismo de ignição. Durante os ensaios, a câmara de
combustão era isolada (ao longo do seu comprimento) com 30 mm de espessura de lã de vidro
para minimizar as trocas de calor com a envolvente.
A Figura 18 mostra o interior do topo da câmara de combustão. O queimador tem um
orifício central com 4 mm de diâmetro por onde é injetado o combustível. Concêntricos a este
existem dois anéis com espessura de 2 e 7,5 mm, respetivamente. O anel intermédio destina-
se à injeção do oxidante, enquanto a exaustão dos gases de combustão é feita através do anel
exterior.
Figura 18. Vistas da câmara de combustão.
32
Neste trabalho foram utilizados quatro queimadores, diferindo apenas no diâmetro
exterior (dext) do tubo central, e que estão representados na Figura 19. A variação de dext tem
apenas influência na velocidade de injeção do oxidante. Deste modo, à medida que dext
aumenta, a área de passagem do oxidante diminui, o que para o mesmo caudal, implica um
incremento da velocidade de injeção.
Figura 19. Vista interior do topo da câmara de combustão. (1) Exaustão; (2) entrada
do oxidante; (3) entrada de combustível; (4) vidro de quartzo; (5) queimador.
Figura 20. Tubos centrais do queimador utilizados.
33
2.2 Sistema de alimentação do combustível
O combustível utilizado neste trabalho foi metano (CH4), proveniente de garrafas. Por
questões de segurança, ao sair da garrafa, o metano passa por uma válvula de fecho rápido
que permite cortar imediatamente o caudal, em caso de extinção da chama ou de alguma
irregularidade detetada durante os ensaios. Após esta válvula de fecho rápido, o caudal é
controlado através de uma válvula, sendo possível visualizar o valor do caudal respetivo no
caudalímetro colocado imediatamente a seguir a esta válvula, ilustrado na Figura 21, seguindo
o caudal de combustível para o queimador. As caraterísticas do caudalímetro utilizado para
este fim encontram-se apresentadas na Tabela 6.
2.3 Sistema de alimentação do oxidante
O sistema de alimentação do oxidante é mais complexo que o do combustível, visto ser
necessário conjugar quatro espécies químicas constituintes do oxidante: oxigénio, dióxido de
carbono, ar e vapor de água.
Começando pelo sistema de alimentação do oxigénio é possível constatar, observando
a Figura 16, que este não difere muito do utilizado para o metano. O oxigénio também é
fornecido à instalação através de garrafas, sendo a única diferença a realçar a ausência de
uma válvula de fecho rápido, visto que a do metano é suficiente, extinguindo a chama
imediatamente após ser acionada. O caudalímetro usado é idêntico ao do metano (Figura 21) e
as suas caraterísticas são apresentadas na Tabela 6.
Figura 21. Caudalímetro utilizado para CH4 e O2.
34
Para que fosse possível trabalhar em condições de excesso de O2 constantes, foi
escolhido um λO2 = 1,1 para todos os ensaios. No subcapítulo 3.2 serão explicados os motivos
da escolha deste excesso de O2 e a razão de o manter constante.
Quanto ao sistema de alimentação do ar, este é fornecido à instalação através do
compressor que comprime o ar até 10 bar. O ar comprimido segue do compressor para um
redutor de pressão que anula as oscilações de pressão introduzidas pelo funcionamento
daquele, reduzindo assim a pressão para 2 bar. O caudal é controlado com o rotâmetro
apresentado na Figura 22.
O sistema de alimentação de dióxido de carbono/vapor de água é o mais complexo de
todos. O caudal de CO2, proveniente de garrafa, passa por dois redutores de pressão até
chegar ao rotâmetro (Figura 22). Após o rotâmetro, o CO2 segue para um dispositivo (Figura
17b), onde, consoante as aberturas das válvulas, é enviado diretamente para a câmara ou é
forçado a passar num recipiente com água. Neste caso, a câmara de combustão é alimentada
com uma corrente de CO2 contendo uma dada quantidade de humidade. É importante referir
que a injeção de CO2 através de garrafa tem o intuito de simular a RPC, que, devido a
limitações da instalação experimental usada, não foi possível realizar. As caraterísticas dos
rotâmetros referidos podem ser observadas na Tabela 6.
A instalação possui outro sistema de alimentação de vapor de água para além do
referido anteriormente. Este sistema é constituído essencialmente por uma panela de pressão
e placa de aquecimento que proporciona um débito de vapor de água constante (previamente
medido) para a corrente do oxidante.
Figura 22. Rotâmetros de ar (esquerda) e CO2 (direita) utilizados.
35
A montante da câmara de combustão está montado um pré-aquecedor com uma
potência de 27 kW. O oxidante antes de entrar na câmara de combustão passa por este pré-
aquecedor, podendo ser pré-aquecido até temperaturas de cerca de 700 ºC.
2.4 Sistema de exaustão
O sistema de exaustão é constituído por um tubo de aço inoxidável que está conectado
a um sistema de lavagem e arrefecimento de gases. Este sistema força os produtos de
combustão a atravessarem um jato de água, capturando as partículas com maiores dimensões,
impedindo que estas atinjam a atmosfera, após serem evacuadas pelo sistema de exaustão do
laboratório.
2.5 Técnicas de medida e incertezas experimentais
A medição das concentrações das espécies químicas gasosas implica a recolha de
uma amostra de gases do local em estudo, o seu transporte e a sua análise. Neste trabalho
experimental, a recolha da amostra foi feita com o auxílio de uma sonda com arrefecimento
convectivo indirecto a água, como esquematizado na Figura 23. O tubo central recolhe a
amostra, arrefecendo-a ao longo do seu comprimento com o auxílio da água que circula nos
tubos concêntricos. A sonda usada assegura o arrefecimento da amostra imediatamente após
a sua entrada na sonda. A diminuição da temperatura garante o congelamento das reações
químicas, conservando-se assim a composição química do local de onde a amostra foi retirada.
Figura 23. Representação esquemática da sonda para recolha de amostras de gases.
36
A Figura 23 mostra esquematicamente a sonda usada para a obtenção das amostras
de gases. Uma vez recolhida a amostra, esta é transportada até aos analisadores. No percurso
da amostra até aos analisadores, as temperaturas atingem valores inferiores a 100 ºC, pelo
que existe condensação da água dos produtos de combustão ao longo da linha. O sistema de
amostragem é constituído por um condensador de serpentina e um reservatório com sílica, de
modo a condensar toda a água presente na amostra. A amostra é ainda limpa ao passar por
filtros de algodão, chegando aos analisadores seca e livre de impurezas.
A Tabela 4 lista os analisadores utilizados para a medição da concentração das
espécies gasosas, assim como o método de análise. Os analisadores eram calibrados com
misturas padrão antes e após cada sessão de medidas. Inicialmente, os valores da
concentração de O2, CO, CO2 e HC são ajustados a zero, fazendo passar azoto puro através
dos analisadores. Em seguida, a concentração de O2 é ajustada de acordo com a respetiva
percentagem no ar atmosférico (20,9% em volume), enquanto para as restantes espécies
químicas se faz passar, através dos analisadores, misturas padrão de CO, CO2 e HC. A Tabela
5 apresenta as misturas padrão utilizadas no presente estudo.
Como o objetivo deste trabalho foi o estudo das emissões de CO, apenas se procedeu
à recolha de valores de CO, CO2 e O2. Refira-se que as concentrações de HC medidas foram
nulas para todas as condições testadas.
Tabela 4. Analisadores usados no presente trabalho.
Espécie química Analisador Método de análise Gama de medida
O2 Horiba,
Modelo CMA-311 A Paramagnetismo 0-25%
CO2 Horiba,
Modelo CMA-311 A
Não-dispersivo
infravermelhos 0-50%
CO Horiba,
Modelo CMA-311 A
Não-dispersivo
infravermelhos 0-1000 ppm
HC Anluk
Modelo FID E 2020 Ionização de chama 0-1000 ppm
Tabela 5. Misturas padrão utilizadas na calibração dos analisadores.
Espécie química Concentração
O2 0; 20.9%
CO2 0; 8%
CO 0; 100 ppm
HC 0; 80 ppm (C3H8)
37
Relativamente às incertezas experimentais associadas à medição de concentração das
espécies químicas usando sondas arrefecidas, estas prendem-se com: (1) a eficiência do
arrefecimento da amostra imediatamente a jusante da entrada da sonda; (2) a possível
dissolução de algumas espécies químicas na água condensada ao longo da linha de transporte
e (3) aerodinâmica e trocas de calor entre a sonda e a envolvente. No presente trabalho, dado
que as medidas foram realizadas somente na exaustão da câmara de combustão, as
incertezas resultaram essencialmente da eficiência do congelamento das reações químicas.
Verificou-se que o congelamento das reações químicas foi adequado, sendo a repetibilidade
dos resultados, que é um bom indicador da sua qualidade, cerca de ± 8%.
Neste trabalho foi utilizado um termopar situado na parte superior da câmara de
combustão, em contacto com a parede do quartzo, com o objetivo de controlar melhor as
alterações de potência térmica da instalação experimental, sendo definidos alguns valores que
correspondiam às alterações de caudal de metano. Outro objetivo deste termopar foi assegurar
que o escoamento se encontrava em regime estacionário. O termopar utilizado era do tipo R.
Refira-se, ainda, que no caso da medição do caudal de vapor de água recorreu-se a
uma balança para obter a variação de peso desta e, consequentemente, calcular a taxa de
evaporação da água. A balança utilizada tinha uma precisão de ± 0,1 g, com um valor máximo
de 6200 g.
Finalmente, para a medição dos caudais de CH4, O2, CO2 e ar foram utilizados
rotâmetros e caudalímetros, apresentados nas Figura 21 e Figura 22. A Tabela 6 apresenta as
incertezas de leitura destes dispositivos.
Tabela 6. Erros associados à leitura dos gases utilizados.
Espécie química Gama Erro associado
CH4 0-50 l/min ± 1,5%
O2
Ar 0-500 l/min ± 2,5%
CO2 0-100% ≤ 0,25%
2.6 Procedimento experimental
O primeiro passo era pré-aquecer a câmara de combustão. A primeira fase do pré-
aquecimento consistia em ligar o pré-aquecedor, com ar, atingindo-se assim cerca de 600 ºC a
montante da câmara de combustão. Esta subida até 600 ºC era feita gradualmente para evitar
grandes variações de temperatura no equipamento.
38
O caudal de ar utilizado no pré-aquecimento, não sendo relevante nesta fase, era cerca
de 300 – 400 l/min. Para medir a subida de temperatura foi usado um termopar, colocado em
contacto com a parede exterior do quartzo na parte superior da câmara de combustão. O
objetivo deste termopar era apenas de indicar a temperatura na parede para se controlar mais
eficientemente o processo de pré-aquecimento.
Após cerca de vinte minutos, a temperatura na parede estabilizava em torno de 320 ºC,
sendo necessário iniciar a alimentação com metano para continuar o processo de pré-
aquecimento da câmara de combustão. Assim, começava-se com uma potência térmica de
aproximadamente 3 kW. A ignição era efetuada através do fecho de um circuito elétrico e
consequente arco elétrico criado entre o elétrodo e a parte superior da câmara, como mostrado
na Figura 24. Mantinha-se esta potência enquanto ainda se observava um aumento de
temperatura. Este aumento cessava em torno de 650 ºC, sendo que, nesta altura aumentava-
se a potência térmica gradualmente até 6 kW. Quando a temperatura atingia 850 ºC, o pré-
aquecedor era colocado em 500 ºC, deixando a temperatura estabilizar entre 890 – 900 ºC.
Ao chegar a esta fase, o elétrodo era retirado do interior da câmara de combustão e a
parte inferior desta fechada, eliminando-se assim a possível entrada de ar por esta parte. O
tempo total despendido no pré-aquecimento era cerca de uma hora. De seguida, procedia-se à
colocação da sonda de medição de gases, descrita anteriormente, na exaustão, podendo-se
iniciar a recolha de dados para o regime de combustão metano/ar.
O passo seguinte era a mudança para combustão em regime oxy-fuel. Esta fase
iniciava-se com a abertura das garrafas de O2 de CO2, seguida do aumento gradual dos
caudais de O2 de CO2, enquanto, em simultâneo, se diminuía o caudal de ar até zero. Era
necessário prestar particular atenção à chama para melhor controlar esta mudança no
oxidante. Após a mudança estar concluída, era necessário esperar mais cerca de quinze
minutos para que a temperatura estabilizasse novamente, visto que a maior percentagem de
O2 em relação ao ar provocava novo aumento de temperatura, atingindo-se novo regime
permanente perto de 930 ºC.
Durante os ensaios houve necessidade de recorrer à abertura da exaustão,
controlando aquela. Esta ação tinha como objetivo obter o valor teórico da percentagem de O2
à saída, calculado previamente. Deste modo, a abertura da exaustão provocava uma
diminuição no O2 à saída. Tal acontecia porque o tempo de residência dos produtos de
combustão aumentava, o que conduzia a uma maior taxa de oxidação do combustível e,
consequentemente, a uma diminuição da percentagem de O2 disponível.
O caso contrário, fecho da exaustão, tinha como efeito o aumento desta percentagem, ficando
este a dever-se à maior sucção dos gases de combustão que diminuía o tempo de residência
dos gases de combustão.
Apesar de, teoricamente, o tipo de chama presente na câmara de combustão ser uma
chama de difusão, devido aos reagentes se encontrarem separados antes de entrarem na
câmara de combustão, o regime de combustão que melhor define a chama presente neste
trabalho é o regime de combustão sem chama visível, tal como discutido por Castela (2010).
39
Este regime é caraterizado pela ausência de uma zona de combustão localizada, isto é,
pela ausência de uma frente de chama. Em contraste com as chamas convencionais, a chama
distribuída não se consegue visualizar, devido à ausência de luminosidade, encontrando-se
distribuída pela câmara de combustão, fenómeno que ocorre neste trabalho. Ao passar para
combustão oxy-fuel, com elevadas percentagens de O2 (35%) é observável uma luminosidade
azul caraterística da elevada percentagem de O2. Essa tonalidade desaparece à medida que se
aumenta a concentração de CO2, aumento que também provoca a diminuição da intensidade
sonora da chama.
A Figura 25 ilustra os tipos de chama estabelecidos para todas as atmosferas testadas,
permitindo assim visualizar os fenómenos anteriormente referidos.
Figura 24. Ignição através de arco elétrico
40
Figura 25. Visualização do tipo de chama para cada atmosfera testada. (a) Ar; (b) 35%
O2/65% CO2; (c) 30% O2/70% CO2; (d) 25% O2/75% CO2; (e) 20,9% O2/79,1% CO2.
41
3 Apresentação e discussão de resultados
3.1 Condições experimentais
A Figura 26 mostra a variação da Tad em função da percentagem de O2 na relação
O2/x, em que x corresponde a N2 ou CO2, para diferentes tipos de oxidante. Nas curvas azul e
vermelha, a percentagem de oxidante em falta é O2 e CO2, respetivamente. Na curva verde, a
relação O2/CO2 corresponde a 90% do oxidante, sendo o restante vapor de água.
A Figura 26 revela que a substituição de N2 por CO2 causa uma diminuição em Tad na
ordem de 500 K. Este valor é muito significativo dado que permite contrariar as elevadas
temperaturas originadas pela combustão de O2, revelando um grande impacto na diminuição
da carga térmica a que a câmara de combustão está sujeita. Ao adicionar vapor de água,
verifica-se um novo decréscimo em Tad (cerca de 100 K), o que era previsível, tendo em conta
a Tabela 1.
As duas linhas verticais representadas mostram os casos limite das condições
experimentais. A linha situada à esquerda significa que para valores inferiores a 15% de O2 a
chama extingue-se, devido à grande concentração de CO2, que simula uma RPC muito
elevada, enquanto a linha situada à direita implica que para valores acima de 40% de O2 a
carga térmica é muito elevada para a presente fornalha laboratorial operar em segurança
(limite físico dos materiais), por esta ser constituída por um tubo de quartzo com temperatura
de fusão de 2100 K. A partir destes dados limitaram-se os valores das condições experimentais
para o intervalo de %O2 [20,9; 35].
Figura 26. Variação da temperatura adiabática de chama para diferentes composições de oxidante.
42
Apesar de para 35% de O2 a Tad ser superior à temperatura de fusão do quartzo, a
temperatura na parede nunca atinge tal valor, visto os gradientes de temperatura serem muito
elevados. Para obter Tad semelhantes, a proporção de O2 dos gases a atravessar uma câmara
de combustão em regime de combustão oxy-fuel tem de ser mais elevada, tipicamente 30%, de
que o valor de 21% de O2 no ar.
A Tabela 7 apresenta as condições experimentais utilizadas nos testes laboratoriais.
Nesta tabela é possível observar, os diferentes diâmetros exteiores do queimador utilizados,
assim como as diferentes composições do oxidante, representadas pelas frações volúmicas e
caudais mássicos das espécies químicas que o compõem (O2, CO2, H2O). Também se
encontra representada a variação da temperatura adiabática de chama para as diferentes
combinações do oxidante. Refira-se, ainda, que o presente trabalho foi efetuado para uma
potência térmica (P) de 6 kW que, de acordo com o poder calorífico inferior do CH4 (50419
kJ/kg), implica um caudal mássico de 1,19E-04 kg/s, sendo o caudal de O2 correspondente
5,22E-04 kg/s.
Para se obter uma percentagem de vapor de água constante no oxidante para as
diferentes relações O2/CO2, seria necessário fornecer vapor de água à instalação a uma taxa
variável. No entanto, tal objetivo não foi possível de concretizar devido a limitações inerentes
ao equipamento disponível. No presente trabalho, recorreu-se a dois geradores de vapor
diferentes: recipiente de acrílico (Figura 17a) e panela de pressão (Figura 17b). Com o
recipiente de acrílico foi possível obter uma composição de oxidante, constituído por 1,5% de
vapor de água. De modo a compreender melhor as variações da percentagem de vapor de
água que constituem o oxidante (Tabela 7), é necessário observar a Figura 27. Esta mostra
várias curvas que representam a taxa de evaporação da água em função da percentagem de
CO2 presente na relação O2/CO2. Como se pode constatar, para se obter uma percentagem de
vapor de água no oxidante, constante para diferentes relações O2/CO2, é necessário que a taxa
de evaporação aumente gradualmente.
Para os testes realizados com o recipiente de acrílico apenas é possível obter uma
condição: 1,5% de vapor de água no oxidante, o que acontece porque a corrente de CO2,
utilizada para evaporar a água, fica saturada em todas as condições estudadas. O aumento
visível na figura é consequência do aumento do caudal de CO2, implicando que a corrente
sature com maiores quantidades de vapor de água. No caso da panela de pressão, a taxa de
evaporação (8,8 g/min) é sempre constante, assim como a velocidade de injeção, o que causa
uma variação da percentagem de vapor de água no oxidante para diferentes relações O2/CO2,
como ilustra a Figura 27. No início dos ensaios laboratoriais foi necessário definir os
parâmetros a variar, bem como aqueles a manter constantes. Duas hipóteses foram, então,
consideradas: (1) variar o valor de λ, fixando a percentagem de O2 nos produtos de combustão;
(2) fixar o valor de λ obtendo diferentes percentagens de O2 nos produtos de combustão.
Optou-se pela segunda hipótese devido à sua fácil implementação e possibilidade de
comparação com estudos recentes (Heil et al., 2011).
43
Tabela 7. Condições experimentais*
Teste (mm) (kg/s)
Oxidante (K)
(kg/s)
(% vol.) (kg/s)
(% vol.) (kg/s)
(% vol.) (kg/s) (% vol.) (m/s)
1
d1: 14 1,19E-04 5,22E-04
20,9 - - 1,73E-03 79,1 - - 16,62 2182
2 35,0 – 29,3 1,33E-03 65,0 – 54,4 - - 0,00 – 1,64E-04 0,0 – 16,3 9,93 2426 – 2188
3 30,0 – 25,6 1,68E-03 70,0 – 59,9 - - 0,00 – 1,65E-04 0,0 – 14,4 11,58 2174 – 1990
4 25,0 – 21,8 2,15E-03 75,0 – 65,6 - - 0,00 – 1,68E-04 0,0 – 12,5 13,90 1912 – 1775
5 20,9 – 18,6 2,72E-03 79,1 – 70,4 - - 0,00 – 1,90E-04 0,0 – 11,9 16,62 1688 – 1576
6
d2: 14,5 1,19E-04 5,22E-04
20,9 - - 1,73E-03 79,1 - - 18,42 2182
7 35,0 – 29,3 1,33E-03 65,0 – 54,4 - - 0,00 – 1,64E-04 0,0 – 16,3 11,00 2426 – 2188
8 30,0 – 25,6 1,68E-03 70,0 – 59,9 - - 0,00 – 1,65E-04 0,0 – 14,4 12,83 2174 – 1990
9 25,0 – 21,8 2,15E-03 75,0 – 65,6 - - 0,00 – 1,68E-04 0,0 – 12,5 15,40 1912 – 1775
10 20,9 – 18,6 2,72E-03 79,1 – 70,4 - - 0,00 – 1,90E-04 0,0 – 11,9 18,42 1688 – 1576
11
d3: 15 1,19E-04 5,22E-04
20,9 - - 1,73E-03 79,1 - - 20,74 2182
12 35,0 – 29,3 1,33E-03 65,0 – 54,4 - - 0,00 – 1,64E-04 0,0 – 16,3 12,38 2426 – 2188
13 30,0 – 25,6 1,68E-03 70,0 – 59,9 - - 0,00 – 1,65E-04 0,0 – 14,4 14,45 2174 – 1990
14 25,0 – 21,8 2,15E-03 75,0 – 65,6 - - 0,00 – 1,68E-04 0,0 – 12,5 17,33 1912 – 1775
15 20,9 – 18,6 2,72E-03 79,1 – 70,4 - - 0,00 – 1,90E-04 0,0 – 11,9 20,74 1688 – 1576
16
d4: 15,5 1,19E-04 5,22E-04
20,9 - - 1,73E-03 79,1 - - 23,84 2182
17 35,0 – 29,3 1,33E-03 65,0 – 54,4 - - 0,00 – 1,64E-04 0,0 – 16,3 14,23 2426 – 2188
18 30,0 – 25,6 1,68E-03 70,0 – 59,9 - - 0,00 – 1,65E-04 0,0 – 14,4 16,61 2174 – 1990
19 25,0 – 21,8 2,15E-03 75,0 – 65,6 - - 0,00 – 1,68E-04 0,0 – 12,5 19,93 1912 – 1775
20 20,9 – 18,6 2,72E-03 79,1 – 70,4 - - 0,00 – 1,90E-04 0,0 – 11,9 23,84 1688 – 1576
*Para todas as condições: potência térmica = 6 kW; = 14,4 m/s; = 500 ºC; = 1,1
44
0
2
4
6
8
10
12
14
63 65 67 69 71 73 75 77 79 81
Taxa
de
eva
po
raçã
o (
g/m
in)
%CO2 no oxidante
1% 2% 4%
6% 8% 10%
13% Testes - Panela de pressão Testes - Recipiente acrílico
Deste modo, foi definido como valor para o excesso de ar/oxigénio, λ = 1,1. Isto implica
que o caudal de O2 é igual em todas as condições testadas, obtendo-se diferentes relações
O2/CO2 apenas com a variação do caudal de CO2.
3.2 Emissões de CO
3.2.1 Influência da velocidade do oxidante
Neste trabalho, a velocidade do oxidante foi variada de duas formas distintas: (1) para
um dado caudal (constante) de oxidante, alterou-se a geometria do queimador, nomeadamente
a área de passagem do oxidante, e, por conseguinte, a velocidade do oxidante variou, e (2)
para uma dada geometria do queimador, aumentou-se o caudal de CO2 e, por consequência, a
velocidade do oxidante.
A Figura 28 mostra a variação das emissões de CO em função da velocidade de
injeção do oxidante, vox, para 0% de vapor de água no oxidante. Nesta figura é também
possível comparar todos os oxidantes estudados (ar e diferentes relações O2/CO2). Outra
informação passível de ser visualizada na Figura 28 são as barras de erro representadas para
cada ponto. Os pontos representados dizem respeito à média de todos os valores medidos
Figura 27. Variação da percentagem de vapor de água no oxidante consoante a relação
O2/CO2 e dispositivos usados (recipiente de acrílico ou panela de pressão).
45
para cada condição testada, e as barras de erro mostram os desvios padrão respetivos. Estes
desvios foram calculados através da seguinte expressão:
√∑ ( )
(3)
onde representa os resultados obtidos para cada diâmetro, a média dos valores obtidos
para cada diâmetro e n corresponde ao número de ensaios realizados para cada diâmetro.
Esta representação revela a repetibilidade dos ensaios efetuados, a qual no caso presente foi
muito razoável.
A Figura 28 apresenta os dois casos do efeito da velocidade acima referidos, em que
cada curva representa uma composição distinta de oxidante. A curva localizada mais à
esquerda é caraterizada pela maior concentração de oxigénio, 35% em volume, que diminui à
medida que se avança para a direita, apresentando a última curva, 20,9% em volume de
oxigénio. A condição situada na parte inferior do gráfico representa o oxidante constituído por
ar.
O primeiro caso do efeito da velocidade pode ser observado em cada curva. Mantendo
a composição do oxidante constante, os quatros pontos de cada curva representam os quatro
diâmetros utilizados, e é facilmente percetível, neste caso, o aumento de velocidade. Este
aumento provoca, em todas as condições em que o oxidante é composto por uma mistura de
O2/CO2, um decréscimo nas emissões de CO relativamente acentuado quando se passa do
queimador d1 para d2, descritos na Tabela 7. A variação deste decréscimo é maior com o
oxidante constituído pela maior percentagem de O2, sendo cada vez menor à medida que esta
percentagem diminui. Após este decréscimo, as emissões de CO estabilizam, não tendo o
aumento de velocidade do oxidante qualquer efeito. Quando o oxidante é ar, a variação da sua
velocidade aparenta não ter qualquer influência nas emissões de CO.
De modo a explicar os resultados observados, é necessário compreender a
aerodinâmica do presente escoamento. A Figura 29 mostra o escoamento no interior da
câmara de combustão, tal como previsto por Graça (2011). Do lado esquerdo desta figura
podem-se observar as linhas de corrente do escoamento, e, do lado direito, os vetores de
velocidade. Um aumento de velocidade de injeção do oxidante causa uma variação da
intensidade de turbulência, podendo esta variação ser explicada pela aerodinâmica do
escoamento interior da câmara de combustão. A velocidade de injecção é a principal causa do
aparecimento da zona de recirculação, pois a depressão criada por aquela em torno do eixo
axial, provoca novamente, o arrasto de uma parte dos produtos de combustão para a zona de
reação. Assim, o incremento da vox, provoca um aumento da intensidade da zona de
recirculação. Como a exaustão se localiza junto ao queimador, na sua periferia (Figura 29) o
escoamento inverte de sentido, o que por um lado ajuda no aumento da turbulência do
escoamento, e, por outro lado, na estabilização chama.
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0
10
20
30
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9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[p
pm
]
Velocidade do Oxidante (m/s)
35/65 30/70 25/75 20.9/79.1 Ar
Figura 28. Efeito da velocidade de injeção do oxidante e da sua composição nas emissões de CO em ppm.
48
Esta recirculação provoca o aumento de inertes (N2 no caso do ar; CO2 em oxy-fuel),
dando assim origem a uma região de grande mistura, contribuindo deste modo, quer para a
diminuição de temperatura adiabática de chama na zona de reação, quer para a diminuição da
concentração local de oxigénio. Esta zona de grande mistura é ilustrada na Figura 29 através
da maior densidade das linhas de corrente.
A diminuição da temperatura adiabática de chama na zona de reação, inibe a formação
de radicais OH, o que implica a redução da oxidação de CO através de (-R2) aliada à maior
concentração de CO2 disponível. Outro fator importante é a menor concentração local de O2 na
zona de reação, o que faz diminuir a taxa de oxidação de CO através de (R1). O conjunto das
reações (-R2) e (R1) aliadas à concentração de CO2 disponibilizada pelo oxidante, e a possível
dissociação do CO2 (R7) indicam que o contrário do observado na Figura 28 deveria acontecer.
Contudo, é necessário ter em conta as consequências do efeito da elevada taxa de
recirculação: (1) aumento do tempo de residência (tres) das espécies químicas na câmara de
combustão; (2) aumento da intensidade da turbulência no interior da mesma, potenciando o
aumento de espécies químicas na zona de reação, nomeadamente, os radicais OH. O aumento
da concentração destes radicais é devido à reação (R3) ganhar na competição por radicais H
em relação à reação (R2). Ao fazer o balanço de todos os efeitos envolvidos, as consequências
da elevada taxa de recirculação (1) e (2) aliadas ao aumento do tres, conduzem à oxidação do
CO em CO2 através de (-R2), apresentando vantagem sobre os outros efeitos que contribuem
para a redução desta taxa de oxidação. Esta descrição está de acordo com o método de
destruição de CO descrito no subcapítulo 1.2.1.
Esta explicação apenas se aplica à evolução de d1 para d2, pois nas transições
seguintes não foram observadas variações nas emissões de CO, ou seja, para a gama de
velocidades apresentadas, as emissões de CO não se alteram. Este fenómeno pode ser
explicado pela taxa de oxidação do CO através da reação (-R2) se tornar independente da
velocidade de injeção do oxidante. Os resultados obtidos indicam que na gama de velocidades
de injeção de oxidante estudadas, o queimador com diâmetro exterior 14,5 mm (d2) apresenta
o melhor desempenho com menores emissões de CO. O posterior aumento de velocidade de
injeção do oxidante (d3 e d4) não apresenta quaisquer vantagens na diminuição de emissões
de CO.
No caso do ar, verifica-se que as emissões de CO são constantes, não apresentando a
variação da vox qualquer influência. Aparentemente existe um tres óptimo, resultante da vox, para
o qual as emissões de CO deixam de variar com esta. Deste modo, é possível afirmar que a
gama de vox utilizadas causam este tres ótimo, apenas podendo as emissões de CO apresentar
variações para vox menores.
No entanto, para que seja possível uma comparação fiável das diferentes curvas de
oxidante, torna-se necessário corrigir as emissões de CO para uma base em que se possa
anular o efeito da diluição causada pelo aumento de CO2 no oxidante. A Figura 30 mostra as
emissões de CO corrigidas para a base ng/J para as mesmas condições da Figura 28.
49
0
10
20
30
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[n
g/J]
Velocidade do oxidante (m/s)
35/65 30/70 25/75 20.9/79.1 Ar
Figura 30. Efeito da velocidade de injeção do oxidante e da sua composição nas emissões de CO em ng/J.
50
As expressões utilizadas para corrigir as emissões de CO são apresentadas em anexo.
Observa-se que as emissões de CO provenientes de oxidantes O2/CO2 com maior
percentagem de O2 estão agora ao nível das emissões quando o oxidante é ar.
É de notar que a relação entre oxidantes compostos por O2/CO2 não se alterou, após
terem sido corrigidas as emissões de CO. Ao comparar as atmosferas de ar e O2/CO2 com a
mesma percentagem de O2, 20,9% na sua composição, verifica-se que as emissões de CO na
atmosfera oxy-fuel são superiores. Este resultado é consequência da reação (R2), pois a maior
concentração de CO2 na atmosfera faz deslocar esta reação no sentido direto. Os presentes
resultados estão de acordo com os disponíveis na literatura, ver, por exemplo, Ding e Du
(1995), Giménez et al. (2011a) e Amato et al. (2011). No que toca aos diferentes oxidantes de
O2/CO2 estudados, aquele composto por 35% O2 e 65% CO2 é o que apresenta menores
emissões de CO, estando agora ao nível das emissões quando o oxidante é ar. Isto é devido
essencialmente à sua menor concentração de CO2 quando comparada com a dos outros
oxidantes estudados. Apesar de este oxidante apresentar menores emissões de CO, ao ter em
conta os aspectos económicos e eficiência energética relacionados com a implementação
desta tecnologia, a composição do 35%/65% já não é tão favorável, pois a maior percentagem
de O2 requer elevados custos de operação derivados da utilização de unidades de separação
de ar para a obtenção de oxigénio puro em grandes quantidades. Estas unidades consomem
energia proveniente da instalação, o que no geral faz diminuir a eficiência energética do
processo de combustão em regime oxy-fuel.
O segundo caso passível de análise, na Figura 30, corresponde ao aumento do caudal
de CO2, mantendo a geometria do queimador inalterada. Esta situação, que requer a
comparação de pontos de curvas diferentes que tenham o mesmo diâmetro, é analisada no
subcapítulo seguinte.
3.2.2 Influência da concentração de CO2 no oxidante
Ao observar a Figura 30, e fixando, por exemplo, o primeiro ponto de cada curva, o que
corresponde a condições sempre com o mesmo diâmetro (d1), verifica-se que à medida que a
concentração de CO2 no oxidante aumenta, a vox aumenta, assim como as emissões de CO. O
aumento da velocidade é facilmente explicável, pois é consequência do incremento do caudal
de CO2 para a mesma área de passagem do oxidante no queimador. O aumento de CO
verificado é apenas consequência do aumento de CO2 no oxidante através da reação (R2),
dado que as elevadas percentagens de CO2 ganham na competição de radicais H ao O2 (R3),
impedindo assim a oxidação do CO. Este resultado é consistente com as conclusões obtidas
em outros estudos, nomeadamente, Giménez et al. (2010) e Giménez et al. (2011a).
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0
20
40
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80
100
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[p
pm
]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 14,8% 16,3%
3.2.3 Influência da concentração de vapor de água no oxidante
As Figura 31 aFigura 34 mostram o efeito da concentração de vapor de água no
oxidante nas emissões de CO. Cada uma destas figuras é relativa a um oxidante O2/CO2,
apresentando a primeira destas figuras (Figura 31) a maior percentagem de O2 (35%), e a
última (Figura 34) a menor percentagem de O2 (20,9%). Como descrito no subcapítulo 1.2.1, o
vapor de água participa maioritariamente em três reações (R5), (R12) e (R13). A reação (R13)
apenas tem importância na ausência de CO2, não apresentando relevância nesta análise.
Assim, o vapor de água participa apenas em duas reações, diretamente na reação
(R12), e como parede de colisão na reação (R5). Segundo Abián et al. (2011), o vapor de água
apresenta uma elevada eficiência como terceiro corpo em (R5), no entanto ainda existe muita
incerteza sobre esta reação. Deste modo será considerada apenas a influência da reação
(R12) na análise do efeito de vapor de água na oxidação de CO.
Como se pode observar nas Figuras 31 a 34, a adição de vapor de água não aparenta
ter impacto na taxa de oxidação de CO em nenhum dos oxidantes estudados. A introdução de
vapor de água no oxidante faz obviamente deslocar a (R12) no sentido direto, favorecendo a
formação de radicais OH, o que supostamente deveria conduzir a um aumento da taxa de
oxidação de CO através da reação inversa de (R2). No entanto, tal não acontece. O aumento
da concentração de radicais OH pode fazer deslocar a reação (R3) no sentido inverso,
aumentando por sua vez a concentração de átomos de hidrogénio. Este incremento de radicais
H vai reagir com CO2 (R2), anulando deste modo a reação inversa (-R2) que estava a ocorrer
devido à elevada concentração de radicais OH, atingindo assim o equilíbrio. Deste modo, a
concentração de CO é passível de não ser sensível à introdução de vapor de água no oxidante
para as percentagens de vapor de água testadas.
Figura 31. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (Composição do
oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 35%/65%.
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0
20
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60
80
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9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[p
pm
]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 12,9% 14,4%
0
20
40
60
80
100
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[p
pm
]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 11,0% 12,5%
Figura 32. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (Composição do
oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 30%/70%.
Figura 33. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (Composição do
oxidante: O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 25%/75%.
53
0
20
40
60
80
100
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[p
pm
]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 9,4% 11,9% Ar
Em anexo apresentam-se os gráficos das emissões corrigidas de CO para os efeitos da
concentração de vapor de água no oxidante, visto estes após a correcção da emissões
manterem as mesmas relações.
Figura 34. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (Composição do oxidante:
O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 20,9%/79,1%.
54
4 Fecho
4.1 Conclusões
O presente estudo incidiu na avaliação experimental do efeito da velocidade e
composição do oxidante nas emissões de CO de uma fornalha laboratorial, operando em
regime de combustão oxy-fuel. Especificamente, a presente dissertação incluiu a análise das
emissões de CO em função da velocidade de injeção do oxidante na câmara de combustão, e
em função da composição do oxidante, composto por O2, CO2 e H2O.
As principais conclusões deste trabalho são as seguintes:
Os resultados revelam que existe uma velocidade de injeção do oxidante ótima,
correspondendo esta a um tempo de residência adequado para a minimização das
emissões de CO para todas as composições de oxidante utilizadas.
O oxidante composto por 35% de oxigénio e 65% de dióxido de carbono apresenta
as menores emissões de CO, entre os oxidantes compostos somente por O2 e CO2,
apresentando emissões semelhantes às obtidas quando o oxidante é ar. No
entanto, se se tiver em conta a energia necessária para obter um oxidante
composto por 35% de O2, a partir de ar atmosférico, o oxidante composto por 30%
O2 e 70% CO2 torna-se a melhor opção.
Sobre o efeito da adição de vapor de água ao oxidante, nenhumas ou poucas
alterações nas emissões de CO foram detetadas. Para todas as combinações de
O2/CO2 testadas, a presença de vapor de água no oxidante não traz vantagens ou
desvantagens no aumento da taxa de oxidação do CO. No entanto, a injeção de
vapor de água na câmara de combustão necessita de ser analisada mais
aprofundadamente de modo a melhor compreender os seus efeitos neste regime de
combustão, pois ainda existem muitas incertezas sobre os seus efeitos.
4.2 Recomendações para trabalhos futuros
Como trabalhos futuros, sugere-se que, para as mesmas condições, se analise o efeito
da variação do coeficiente de excesso de ar/oxigénio, numa gama suficientemente ampla de
modo a estudar os limites de inflamabilidade no regime de combustão oxy-fuel.
Para uma melhor compreensão dos processos físicos e químicos associados a este
regime de combustão, é necessário proceder-se à medida da concentração de espécies
químicas e temperaturas no interior da câmara de combustão, de modo a traçar perfis e obter
mais resultados que reforcem e melhorem as explicações dadas neste trabalho.
55
No entanto, este passo implicará a alteração da câmara de combustão utilizada neste
estudo ou o dimensionamento de uma nova câmara, visto que o único local possível de se
colocar uma sonda ou termopar para realizar as medições referidas, pode implicar a entrada de
ar para o interior da câmara de combustão, o que num estudo do regime de combustão oxy-
fuel nunca pode acontecer, pois anularia o objetivo base do trabalho.
No que respeita ao sistema de alimentação de vapor de água utilizado neste estudo,
alguns melhoramentos em relação ao equipamento podem ser efetuados, como, por exemplo,
variar o caudal de água evaporado.
Finalmente, seria interessante alargar o presente estudo a combustíveis sólidos,
incluindo diferentes tipos de carvão e biomassa.
56
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Physical Chemistry A, Vol. 111, pp. 4031-4042 (2007).
59
Anexo A
As emissões de CO foram corrigidas de acordo com a expressão apresentada em
Croiset et al. (2001). Assim, a taxa de emissão de CO pode ser calculada através da seguinte
equação:
(A1)
onde:
(A2)
( )
( )
[
( )
] ( ) (A3)
( ) ( )
( )
(A4)
Nas equações (A1) a (A4) o significado dos simbolos é o seguinte:
Taxa de emissão do poluente [ng/J]
Concentração do poluente [ng/m3]
Fator F seco baseado no oxigénio [m3/J]
Fator de correção da diluição do oxigénio nos produtos de combustão
Massa molar da espécie i [kg/kmol]
Constante dos gases perfeitos [kJ/kmol.K]
Temperatura do combustível [K]
Pressão [Pa]
Poder calorífico superior [kJ/kg]
( ) Fração de oxigénio no oxidante
( ) Fração de oxigénio nos produtos de combustão
( ) Percentagem mássica da espécie j no combustível
O fator Fd (equação A3) pode ser deduzido da seguinte forma. A queima de uma mole de
carbono numa atmosfera oxy-fuel origina n moles de CO2:
( ( )
( )
) → ( ( )
( )
) (A5)
60
Por sua vez, a queima de uma mole de hidrogénio (H2) forma n moles de CO2:
( ( )
( )
) → ( ( )
( )
) (A6)
Assim, obtêm-se os seguintes volumes molares:
( )
(A7)
(
( )
) (A8)
onde
( ) ( ) (A9)
Entrando agora com as fracções mássicas de carbono e hidrogénio presentes no combustível e
com o seu poder calorífico superior obtém-se a seguinte expressão:
( )
( )
[
( )
]( )
( )
( )
[
( )
] ( )
(A10)
As figuras A1 a A4 mostram os gráficos com as emissões de CO corrigidas para várias
condições de operação da fornalha.
61
0
10
20
30
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[n
g/J]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 14,8% 16,3%
0
10
20
30
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[n
g/J]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 12,9% 14,4%
Figura A1. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (composição do oxidante:
O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 35%/65%.
Figura A2. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (composição do oxidante:
O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 30%/70%.
62
0
10
20
30
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[n
g/J]
Velocidade do oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 11,0% 12,5%
0
10
20
30
9 11 13 15 17 19 21 23 25
CO
[n
g/J]
Velocidade do Oxidante (m/s)
0,0% 1,5% 9,4% 11,9% Ar
Figura A3. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (composição do oxidante:
O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 25%/75%.
Figura A4. Efeito da concentração de vapor de água no oxidante nas emissões de CO (composição do oxidante:
O2 + CO2 = 100% - %H2O). Relação %O2/%CO2 = 20,9%/79,1%.