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ARTIGOS ORIGINAIS 1 A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônica Gustavo J. Volpe, Henrique T. Moreira, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônica Salvador Rassi 13 Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateter Daniel J. Blackman, Smriti Saraf, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateter Auristela Isabel de Oliveira Ramos 23 Sobrevida de longo prazo após revascularização multiarterial em pacientes com diabetes: Estudo de seguimento FREEDOM Michael E. Farkouh, Michael Domanski, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Resultados de longo prazo do estudo FREEDOM: a evidência definitiva em favor da cirurgia de revascularização miocárdica? Humberto Graner Moreira EDIÇÃO EM PORTUGUÊS / PORTUGUESE EDITION O PRESENTE E O FUTURO 36 Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidez Dan G. Halpern, Catherine R. Weinberg, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidez Cláudia Maria Vilas Freire 58 Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetes Kelly McHugh, Adam D. DeVore, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetes Evandro Tinoco Mesquita, Letícia Mara dos Santos Barbetta 70 ECMO venoarterial para adultos Maya Guglin, Mark J. Zucker, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL ECMO venoarterial para adultos Silvia Moreira Ayub-Ferreira MAIO 2019 NÚMERO 6

EDIÇÃO EM PORTUGUÊS / PORTUGUESE EDITION · 2019-05-20 · A tradução dos artigos para o português brasileiro foi realizada pela Scientific Linguagem, sob sua exclusiva responsabilidade

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ARTIGOS ORIGINAIS

1 A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônicaGustavo J. Volpe, Henrique T. Moreira, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônicaSalvador Rassi

13 Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateterDaniel J. Blackman, Smriti Saraf, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateterAuristela Isabel de Oliveira Ramos

23 Sobrevida de longo prazo após revascularização multiarterial em pacientes com diabetes: Estudo de seguimento FREEDOMMichael E. Farkouh, Michael Domanski, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Resultados de longo prazo do estudo FREEDOM: a evidência definitiva em favor da cirurgia de revascularização miocárdica?Humberto Graner Moreira

EDIÇÃO EM PORTUGUÊS / PORTUGUESE EDITION

O PRESENTE E O FUTURO

36 Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidezDan G. Halpern, Catherine R. Weinberg, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidezCláudia Maria Vilas Freire

58 Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetesKelly McHugh, Adam D. DeVore, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetesEvandro Tinoco Mesquita, Letícia Mara dos Santos Barbetta

70 ECMO venoarterial para adultosMaya Guglin, Mark J. Zucker, et al. COMENTÁRIO EDITORIAL ECMO venoarterial para adultosSilvia Moreira Ayub-Ferreira

MAIO 2019

NÚMERO 6

A tradução dos artigos para o português brasileiro foi realizada pela Scientific Linguagem, sob sua exclusiva responsabilidade. A Elsevier e a American College of Cardiology Foundation não assumem qualquer responsabilidade quanto à tradução. Embora a tradução tenha sido feita com todo o cuidado necessário, o leitor deve sempre se basear em sua própria experiência e seu conhecimento ao avaliar e utilizar quaisquer informações contidas nesta publicação, e deve sempre verificá-las em fontes originais. A empresa responsável pela tradução não assume nenhuma responsabilidade pelo uso de quaisquer informações desta publicação e/ou quaisquer erros, omissões ou imprecisões, resultantes de negligência ou qualquer outro motivo, ou por quaisquer consequências que resultarem deles.

Os profissionais e os pesquisadores devem sempre se basear em sua própria experiência e em seu conhecimento ao avaliar e utilizar quaisquer informações, métodos, compostos ou experimentos descritos aqui. Devido aos rápidos avanços observados, em especial, nas ciências médicas, deve-se realizar uma verificação independente dos diagnósticos e das posologias dos medicamentos. Dentro do limite máximo permitido pela lei, a Elsevier, a American College of Cardiology Foundation e a empresa de tradução não assumem qualquer responsabilidade por quaisquer lesões e/ou danos a pessoas ou propriedades como consequência de responsabilidade de produtos, negligência ou qualquer outro motivo, nem por qualquer uso ou operação de quaisquer métodos, produtos, instruções ou ideias contidos neste material. Embora se espere que todos os materiais publicitários estejam em conformidade com os padrões éticos (médicos), a inclusão nesta publicação não constitui garantia ou endosso da qualidade ou do valor de tal produto ou das afirmações feitas pelo fabricante.

The translation into Brazilian Portuguese has been undertaken by Scientific Linguagem at their sole responsibility. No responsibility is assumed by Elsevier or the American College of Cardiology Foundation in relation to the translation. Although much care has been taken in performing the translation, readers must always rely on their own experience and knowledge in evaluating and using any information in this publication, and must always check it with original sources. No responsibility is assumed by the translation company in relation to the use of any information in this publication and/or any error, omission, or inaccuracies, whether arising from negligence or otherwise, or for any consequences arising thereafter.

Practitioners and researchers must always rely on their own experience and knowledge in evaluating and using any information, methods, compounds or experiments described herein. Because of rapid advances in the medical sciences, in particular, independent verification of diagnoses and drug dosages should be made. To the fullest extent of the law, no responsibility is assumed by Elsevier, the American College of Cardiology Foundation, or the translation company for any injury and/or damage to persons or property as a matter of products liability, negligence or otherwise, or from any use or operation of any methods, products, instructions, or ideas contained in the material herein. Although all advertising material is expected to conform to ethical (medical) standards, inclusion in this publication does not constitute a guarantee or endorsement of the quality or value of such product or of the claims made of it by its manufacturer.

EDITOR-CHEFE

Valentin Fuster, MD, PhD, New York, NY

EDITOR EXECUTIVO

Jagat Narula, MD, PhD, New York, NY

EDITOR ADJUNTO

Jonathan L. Halperin, MD, New York, NY

DIRETORES CONVIDADOS

Deepak L. Bhatt, MD, MPH, Boston, MA

P.K. Shah, MD, Los Angeles, CA

VICE-PRESIDENTE, EDITORIAL

Kimberly Murphy, Washington, DC

DIRETORA EDITORIAL

Justine Varieur Turco, Washington, DC

CONSELHEIROS INTERNACIONAIS

Jane Armitage, FRCP, Oxford, United Kingdom

Edimar A. Bocchi, MD, São Paulo, Brazil

Antonio Colombo, MD, Milan, Italy

Gerd Heusch, MD, PhD, Essen, Germany

Chang-Sheng Ma, MD, Beijing, China

Gilles Montalescot, MD, PhD, Paris, France

José C. Nicolau, MD, PhD, São Paulo, Brazil

Han Ya-Ling, MD, PhD, Shenyang, China

EDIÇÃO EM PORTUGUÊS / PORTUGUESE EDITION

EDITOR-CHEFE

Edimar A. Bocchi, MDProf. Associado da Faculdade de Medicina da Universidadede São Paulo, São Paulo, Brasil

CONSELHO EDITORIAL DA EDIÇÃO EM PORTUGUÊS

José Silva-CardosoAssociate Professor of Cardiology, Porto Medical School

Andrei Carvalho SpositoProfessor in Cardiology, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Francisco Saraiva Professor in Cardiology, Universidade Católica de São Paulo (PUC)

Whady HuebHeart Institute, São Paulo University Medical School

Maria da Consolação Vieira MoreiraFederal University of Minais Gerais State, Medicine School

EDITORA DE MÍDIAS SOCIAIS

Monica Samuel Avila

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 8 P O R A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

P U B L I C A D O P O R E L S E V I E R

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Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster.

A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônicaGustavo J. Volpe, MD, PHD,a Henrique T. Moreira, MD, PHD,a Henrique S. Trad, MD,a Katherine C. Wu, MD,b Maria Fernanda Braggion-Santos, MD,a Marcel K. Santos, MD, PHD,a Benedito C. Maciel, MD, PHD,a

Antonio Pazin-Filho, MD, PHD,a José Antonio Marin-Neto, MD, PHD,a João A.C. Lima, MD,b André Schmidt, MD, PHDa

Resumo

Contexto Pacientes com cardiomiopatia chagásica crônica (CCC) têm fibrose miocárdica pronunciada, o que pode causar predisposição para morte súbita cardíaca, mesmo havendo função sistólica do ventrículo esquerdo (VE) bem preservada. A ressonância magnética cardíaca pode avaliar fibrose miocárdica através de sequências de realce tardio por gadolínio (RTG).

objetivos Este estudo prospectivo avaliou se a presença de fibrose via RTG foi preditora de desfechos adversos graves em um grupo de pacientes com CCC.

Métodos Um grupo prospectivo de 140 pacientes com CCC [52,1% mulheres; idade mediana de 57 anos (intervalo interquartil: 45 a 67 anos)] foi incluído. Foram realizadas cine-ressonância magnética cardíaca e técnica de RTG no momento da inclusão com um aparelho de 1,5 T. O desfecho primário foi a combinação de morte cardiovascular e taquicardia ventricular sustentada. O desfecho secundário foi a combinação de morte cardiovascular, taquicardia ventricular sustentada ou hospitalização cardiovascular durante o seguimento.

Resultados Depois de uma mediana de 34 meses (intervalo interquartil: 24 a 49 meses) de seguimento, foram registradas 11 mortes cardiovasculares, 3 episódios de taquicardia ventricular sustentada e 20 hospitalizações cardiovasculares. A fibrose de RTG estava presente em 71,4% dos pacientes, com as paredes lateral, inferolateral e inferior sendo mais comumente afetadas. Pacientes com RTG positivo tiveram menor fração de ejeção de VE e maiores volume diastólico final de VE e massa de VE do que os pacientes sem RTG. Não foi observada qualquer diferença em outros fatores de risco cardiovascular. Pacientes com fibrose tiveram maiores taxas de eventos se comparados com aqueles sem fibrose nos desfechos primário (p = 0,043) e secundário (p = 0,016). Na análise multivariada, idade e área de RTG estavam relacionadas ao desfecho primário; idade e menor fração de ejeção do VE estavam relacionadas ao desfecho secundário. O padrão de fibrose miocárdica assinalada por RTG consistia em fibrose difusa, focal ou transmural em aproximadamente um terço dos pacientes com RTG positivo, e nenhum padrão especificamente relacionado a desfechos.

ConClusões Em pacientes com CCC, a presença de fibrose por RTG é comum e está fortemente associada a desfechos adversos maiores. (J Am Coll Cardiol 2018;72:2567–76) © 2018 pela American College of Cardiology Foundation.

aDepartamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, Brasil; e bDivisão de Cardiologia, Johns Hopkins University, Baltimore, Maryland, EUA. Todos os autores informaram não ter relações relevantes para os conteúdos deste artigo a serem declaradas.

Manuscrito recebido em 12 de março de 2018; manuscrito revisado recebido em 12 de setembro de 2018, aceito em 18 de setembro de 2018.

Apesar do sucesso de iniciativas multinacionais para o controle de vetor e a triagem em bancos de sangue, a doença de Chagas, também conhecida

como tripanossomíase americana, continua sendo um importante problema de saúde pública, com um impacto econômico significativo nos países da América Latina nos quais a doença é endêmica (1-3). A doença de Chagas também está se tornando um problema mundial como resultado da emigração, com países não endêmicos rela-

tando um número crescente de indivíduos cronicamente infectados pelo Trypanosoma cruzi (3). Por exemplo, estima-se que 300.000 indivíduos infectados residam nos Estados Unidos, enquanto a Europa tem uma esti-mativa de 68.000 a 122.000 indivíduos infectados.

A cardiomiopatia chagásica crônica (CCC) é a mani-festação mais clinicamente relevante da doença, tanto por conta da severidade de sua morbidade quanto por conta de sua alta mortalidade inerente. A CCC ocorre em

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~30% dos indivíduos infectados e tipicamente causa anormalidades do sistema condutor, bradiarritmias, taquiarritmias, distúrbios microvasculares coronarianos, aneurismas ventriculares, insuficiência cardíaca, complica-ções tromboembólicas e morte súbita cardíaca (4, 5). Miocardite, necrose e fibrose reativa e reparativa são características distintas de CCC, e estudos histológicos da doença de Chagas, tanto experimentais quanto em seres humanos, mostram um padrão difuso de fibras espessas de colágeno circundando feixes de músculos com um aumento menos pronunciado na ma-triz de colágeno endomisial (6, 7). Uma forte

correlação entre a progressão da fibrose e a dilatação ventricular e a disfunção sistólica também foi relatada (8). A ocorrência de arritmias ventriculares foi descrita em associação com a presença de fibrose do tecido miocárdico, e ambas as características de CCC podem afetar indivíduos infectados que não tenham sintomas ou sinais de insuficiência cardíaca. De fato, pequenas quantidades de fibrose focal podem estar presentes mesmo em indivíduos com a forma indeterminada da doença de Chagas (9-11).

A ressonância magnética cardíaca (RMC) com uso da técnica de realce tardio por gadolínio (RTG) mudou a forma pela qual avaliamos a fibrose miocárdica de forma não invasiva nas últimas 2 décadas (12). Com boa qualidade de imagem, a RMC permite uma delimitação precisa das áreas de fibrose no miocárdio e mostrou uma forte correlação com achados histológicos (13). Diversos estudos clínicos relataram a eficácia do RTG para identificar fibrose miocárdica em uma variedade de contextos clínicos, tais como doença isquêmica, ami-loidose e doença da valva aórtica (14-16). Além disso, o tamanho, a localização e a quantidade de fibrose, tanto nas cardiomiopatias isquêmicas quanto nas não isquê-micas, estão relacionados à remodelação adversa do ventrículo esquerdo (VE) e a piores desfechos clínicos (17, 18). Embora poucos estudos tenham avaliado fi-broses por meio da técnica de RTG na doença de Chagas (19-21), nenhum deles, até onde sabemos, investigou as implicações clínicas de longo prazo da presença de fibrose por RTG nesta forma de cardiomiopatia.

O presente estudo avaliou de forma prospectiva a associação temporal entre a presença e a quantidade de fibrose no VE e os desfechos clínicos em pacientes com CCC.

Métodos

De outubro de 2009 a dezembro de 2013, cadastramos de forma prospectiva os pacientes do Ambulatório da Divisão de Cardiologia, dedicado ao tratamento de pa-

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

CCC = cardiomiopatia chagásica crônica

FEVE = fração de ejeção do ventrículo esquerdo

NYHA = New York Heart Association

RMC = ressonância magnética cardíaca

RTG = realce tardio por gadolínio

TVNS = taquicardia ventricular não sustentada

VD = ventrículo direito

VE = ventrículo esquerdo

cientes com CCC no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, Brasil. Os critérios de inclusão foram: participantes de ambos os sexos entre 18 a 75 anos de idade, com 2 resultados positivos em testes serológicos (ensaio de imunoadsorção enzimática, hemaglutinação ou teste de imunofluorescência) para T. cruzi e ≤ 1 marcador de envolvimento cardíaco por CCC, incluindo:• Eletrocardiografia: bloqueio atrioventricular de pri-

meiro grau (intervalo PR > 0,2 s) ou maior, bloqueio do ramo esquerdo do feixe de His, bloqueio do ramo direito do feixe de His, bloqueio fascicular anterior esquerdo, batimentos do complexo ventricular pre-maturo ou ondas Q anormais;

• Radiografia torácica: cardiomegalia, definida de acordo com um índice cardiotorácico > 0,5;

• Ecocardiografia: função sistólica do VE deprimida, definida como fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) < 50%, ou qualquer anormalidade no movi-mento da parede;

• Taquicardia ventricular sustentada ou não susten-tada no monitoramento Holter de 24 h.Os critérios de exclusão foram: evidências de qual-

quer outro tipo de cardiomiopatia, doença arterial coronariana, cardiomiopatia associada a doença valvar cardíaca, claustrofobia ou implantes metálicos, tais como marca-passo, cardioversor desfibrilador implan-tável, clipe cerebral ou próteses valvares metálicas.

Todos os pacientes sob tratamento ambulatorial de CCC que preencheram os critérios foram convidados a fazer parte do estudo. Todos os pacientes concordaram em participar. Após a inclusão, todos os pacientes passaram por um exame de RMC para os propósitos do estudo. Todas as informações clínicas e os resultados de exames subsequentes foram obtidos a partir dos registros clínicos para aqueles que eram regularmente acompanhados no hospital. O escore de Rassi foi cal-culado para todos os participantes no início do estudo (22). Eventos clínicos foram obtidos de anotações mé-dicas ou atestados de óbito oficiais. Não houve registro de tratamentos antiparasitários recentes em nenhum dos pacientes ou durante o seguimento.

O estudo foi conduzido de acordo com os preceitos da Declaração de Helsinki e foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa de nossa instituição (CAAE-0154.0.004.000-10). Todos os pacientes cederam con-sentimento informado por escrito.

exaMe de RMC. Todos os exames foram realizados em um único aparelho 1,5 T (Achieva, Philips Medical Systems, Best, Países Baixos) com bobina SENSE de 5 elementos (Philips Medical Systems) para exames car-diológicos. O protocolo incluiu cines com precessão livre

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em estado estacionário nos planos de 2 e 4 câmaras, com uma pilha de 9 a 12 cortes cobrindo ambos os ventrí-culos no eixo curto com os seguintes parâmetros: tempo de repetição, 3,8 ms; tempo de eco, 1,6 ms; ângulo de virada, 45º; matriz, 256 x 160; campo de visão, 360 a 400 mm; espessura do corte, 8 mm (lacuna, 2 mm); e aquisição em 30 fases. Posteriormente, os pacientes re-ceberam 0,2 mmol/kg de gadodiamida por via intrave-nosa (Omniscan, GE Healthcare, Chicago, Illinois, EUA). Após 10 min, uma sequência de eco de gradiente rápido destinada à recuperação de inversão foi adquirida para a detecção de RTG nas mesmas posições dos cines (eixo curto, planos de 2 e 4 câmaras). Os parâmetros foram os seguintes: tempo de repetição, 5,4 ms; tempo de eco, 1,3 ms; ângulo de virada, 20°; matriz, 256 x 192; campo de visão, 360 a 400 mm; e espessura do corte, 10 mm (sem lacunas). O tempo ideal de inversão variou de 150 a 280 ms e foi escolhido com base em uma sequência com múltiplos tempos de inversão (TI scout) realizada um pouco antes da aquisição de RTG.

análise dos dados. Volume diastólico final dos ven-trículos esquerdo (VE) e direito (VD), volume sistólico final e fração de ejeção foram avaliados em imagens de precessão livre em estado estacionário em eixo curto aplicando o método de Simpson. Os músculos papilares foram considerados parte da cavidade ventricular, e a gordura epicárdica foi excluída. A área de superfície corporal foi calculada com a fórmula de DuBois e DuBois (23). Para a análise de RTG, o leitor identificou primeiramente a presença ou ausência de fibrose ba-seado na avaliação visual. Os padrões de distribuição da fibrose foram então classificados da seguinte forma: 1) transmural, se houvesse qualquer área de fibrose que ocupasse > 50% da espessura da parede, mas em não > 8 segmentos; 2) focal, se a área da fibrose não fosse transmural e identificada em não > 8 segmentos; e 3) difusa, se as áreas de fibrose estivessem presentes em > 8 segmentos, independentemente de terem áreas transmurais ou não. Para os casos com fibrose, o leitor desenhou manualmente os contornos endocárdicos e epicárdicos, e áreas de fibrose foram definidas como aquelas com sinal acima de um limiar determinado pela largura máxima na metade do método máximo. O software calculava então, de modo automático, os limiares para a fibrose baseado na técnica descrita por Schmidt et al. (24), com áreas de fibrose definidas como aquelas com ≤ 50% da intensidade de sinal mais elevada para cada corte. A correção manual foi aplicada para artefatos e efeitos de volume parcial caso fosse ne-cessário. Todas as imagens foram analisadas por meio do software MASS, versão para pesquisa (Universidade de Leiden, Leiden, Países Baixos). Todas as análises por imagem foram realizadas por um único leitor cegado

para os desfechos clínicos. Os profissionais envolvidos no seguimento não foram cegados para resultados de RMC.

seguiMento e eventos. O momento de inclusão inicial foi definido como a data do exame de RMC. Todos os participantes com CCC estiveram, posteriormente, sob acompanhamento clínico regular com consultas agendadas no ambulatório por ≤ 18 meses. Assim que o último paciente incluído completou o tempo mínimo de seguimento, a última consulta clínica para todos os pacientes foi definida como o último dia de seguimento, e se esta consulta ocorreu > 2 meses antes, contatamos o participante por telefone para obter detalhes referentes

tabela 1 Características clínicas, demográficas e eletrocardiográficas basais de pacientes com CCC com e sem fibrose

Total (n = 140)

Sem fibrose (n = 40)

Fibrose (n = 100)

Valor de p

Idade, anos 57,0 (45-67) 54,5 (45,5-65,5) 57,5 (44-67) 0,939

Feminino 73 (52,1) 24 (60,0) 49 (49,0) 0,239

ASC, m2 1,70 ± 0,02 1,72 ± 0,03 1,62 ± 0,04 0,001

Classe funcional da NYHA

I 105 (75,0) 31 (77,5) 74 (74,0) 0,068

II 24 (17,1) 9 (22,5) 15 (15,0)

III 11 (7,9) -- 11 (11,0)

Escore de Rassi para risco de morte em CCC

Baixo 53 (37,5) 31 (78,3) 25 (25,0) < 0,001

Intermediário 61 (43,7) 7 (17,4) 52 (52,0)

Elevado 26 (18,7) 2 (4,3) 23 (23,0)

Hipertensão 58 (41,4) 16 (40,0) 42 (42,0) 0,852

Diabetes melito 10 (7,1) 2 (5,0) 8 (8,0) 0,724

Dislipidemia 39 (27,8) 10 (26,0) 32 (32,0) 0,185

Fibrilação atrial crônica 11 (7,9) 2 (5,0) 9 (9,0) 0,729

Tabagismo

Anterior 33 (23,8) 8 (20,5) 25 (25,0) 0,630

Atual 11 (7,5) 2 (5,1) 8 (8,0)

Medicamentos

Furosemida 39 (27,9) 4 (10,0) 35 (35,0) 0,003

Inibidores de ECA 24 (46,4) 11 (27,5) 54 (54,0) 0,005

BRA 24 (17,1) 7 (17,5) 17 (17,0) 0,943

Betabloqueadores 63 (45,0) 11 (27,5) 52 (52,0) 0,008

Espironolactona 20 (14,3) 2 (5,0) 18 (18,0) 0,047

Amiodarona 28 (20,0) 2 (5,0) 26 (26,0) 0,005

Varfarina 16 (11,4) 1 (2,5) 15 (15,0) 0,036

Dados eletrocardiográficos

BRDFH isolado 28 (20,0) 11 (27,5) 17 (17,0) 0,023

BFAE isolado 9 (6,4) 2 (5,0) 7 (7,0)

BRDFH mais BFAE 44 (31,4) 6 (15,0) 38 (38,0)

BREFH 13 (9,3) 2 (5,0) 11 (11,0)

Bloqueio AV de primeiro ou segundo grau 37 (26,4) 6 (15,0) 31 (31,0) 0,052

Baixa voltagem de QRS 16 (11,4) 4 (10,0) 12 (12,0) 0,737

CVPs 25 (17,9) 2 (5,0) 23 (23,0) 0,012

Os valores são expressos por mediana (intervalo interquartil), n (%) ou média ± DP. Todos os valores de p se referem à comparação entre os grupos com ou sem fibrose.ASC = área de superfície corporal; AV = atrioventricular; BFAE = bloqueio fascicular anterior esquerdo; BRA = bloqueador de receptor de angiotensina II; BRDFH = bloqueio do ramo direito do feixe de His; BREFH = bloqueio do ramo esquerdo do feixe de His; CCC = cardiomiopatia chagásica crônica; CVPs = complexos ventriculares prematuros; ECA = enzima conversora de angiotensina; NYHA = New York Heart Association.

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à sua condição atual. Sempre que um paciente faltasse a uma consulta agendada, o protocolo institucional exigia que um funcionário administrativo o contatasse por telefone. Se o paciente falecesse ou fosse hospitalizado fora do nosso hospital, esses registros eram revisados para os desfechos primários e secundários. Não houve perda de seguimento na coorte.

O desfecho primário pré-definido consistiu em uma combinação de morte cardiovascular e taquicardia ventricular sustentada. O desfecho secundário incluía morte, taquicardia ventricular sustentada e hospita-lização por motivos cardiovasculares, definidos como insuficiência cardíaca, evento cardioembólico ou arritmia. Cardioversores desfibriladores implantáveis foram censurados no momento do implante. Quando 2 eventos ocorriam no mesmo participante, o primeiro era registrado como um desfecho.

analise estatístiCa. As variáveis contínuas são apresentadas como média ± DP, se paramétricas, e como mediana [intervalo interquartil (IIQ)], se não paramé-tricas, e os dados categóricos estão resumidos como frequências e porcentagens. Diferenças nas caracterís-ticas basais entre pacientes que apresentavam fibrose e aqueles que não apresentavam foram analisadas por meio do teste t de Student para amostras independentes, teste de Mann-Whitney ou teste exato de Fisher, de acordo com a situação.

Modelos de regressão de riscos proporcionais de Cox, com análise univariada e multivariada, foram constru-ídos para estudar o valor preditivo da área de fibrose do

VE para os desfechos primários e secundários. Razões de riscos ajustadas foram obtidas após ajuste para poten-ciais fatores de confusão: idade, sexo, classe funcional da New York Heart Association (NYHA), hipertensão, diabetes melito, dislipidemia, condição de tabagismo, cardiomegalia em radiografia do tórax, taquicardia ventricular não sustentada (TVNS) em monitoramento de Holter, FEVE e baixa voltagem de QRS.

Apenas as variáveis associadas ao desfecho primário em um nível de p < 0,07 na análise univariada foram incluídas no modelo multivariado. Não foi possível incluir o volume diastólico do VE e a massa do VE no mesmo modelo devido à colinearidade (correlação de Pearson, r2 = 0,76; p < 0,001). As curvas de sobrevida foram analisadas com o método de Kaplan-Meier, e dife-renças na taxa de eventos ao longo do tempo, de acordo com a presença ou ausência de fibrose, foram avaliadas usando o teste de log rank.

Todos os testes foram bilaterais, e valores de p < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos. O software utilizado em todas as análises foi o Stata, versão 12.1 (StataCorp, College Station, Texas, EUA).

Resultados

No total, 140 pacientes foram incluídos no estudo; 73 (52,1%) eram mulheres, com uma idade mediana de 57 anos (IIQ: 45 a 67 anos). Cem participantes (71,4%) ti-veram RTG positivo compatível com fibrose miocárdica. Dentre esses participantes, a massa de fibrose média era de 10,4 g (IIQ: 6,4 a 16,6 g), a qual era equivalente a uma mediana de 9,2% (IIQ: 5,4% a 17,2%) da massa do VE. As características basais são descritas em detalhes na Tabela 1. Em resumo, quando pacientes com e sem fibrose foram comparados, não houve diferenças esta-tisticamente significativas em termos de idade, sexo e fatores de risco para doença cardiovascular isquêmica entre os grupos. No grupo completo de pacientes, a classe funcional da NYHA apresentou resultados gerais positivos, com 75% dos participantes na classe funcional da NYHA I. Contudo, 11 participantes apresentaram classe funcional da NYHA III, todos eles com fibrose. Era mais frequente que pacientes com fibrose recebessem prescrições de furosemida, inibidores de enzima de conversão de angiotensina, betabloqueadores, espi-ronolactona, varfarina e amiodarona. Anormalidades eletrocardiográficas também foram mais frequentes entre aqueles com fibrose.

Comparados a pacientes sem fibrose detectável, os pacientes com fibrose tinham volumes finais diastólicos e sistólicos de VE e massa de VE aumentados, além de menor FEVE (58,2 ± 14,8% vs. 45,5 ± 14,2%; p < 0,001). O volume final sistólico do VD era menor naqueles sem fibrose no VE (43 mL [IIQ: 33 a 55 mL]) se comparados

tabela 2 Características funcionais e de RTG na ressonância magnética cardíaca de pacientes com CCC com e sem fibrose de VE

Total (n = 140)

Sem fibrose de VE (n = 40)

Com fibrose de VE (n = 100) Valor de p

Ventrículo esquerdo

VDF, mL/m2 160 (127-226) 131 (102-152) 193 (142-240) < 0,001

VSF, mL/m2 76 (52-136) 49 (35-63) 102 (63-149) < 0,001

MVE, g 115 (92-147) 93 (78-108) 125 (101-155) < 0,001

Fração de ejeção, % 48,4 ± 15,5 58,7 ± 14,0 44,2 ± 14,1 < 0,001

Ventrículo direito

VDF, mL/m2 117 (94-134) 110 (83-129) 120 (96-143) 0,103

VSF, mL/m2 48 (34-65) 43 (33-55) 49 (36-75) 0,046

Fração de ejeção, % 58 (50-65) 59 (53-68) 58 (49-65) 0,196

RTG

Massa de RTG, g -- -- 10,4 (6,4-16,6)

Massa de RTG, % -- -- 9,2 (5,4-17,2)

Padrões, %

Transmural -- -- 30 (30)

Focal -- -- 38 (38)

Difusa -- -- 32 (32)

Os valores são expressos em mediana (intervalo interquartil), média ± DP ou n (%). Todos os valores de p se referem à comparação entre os grupos com ou sem fibrose. Todos os volumes são indexados de acordo com a ASC.CCC = cardiomiopatia chagásica crônica; MVE = massa ventricular esquerda; RTG = realce tardio por gadolínio; VDF = volume diastólico final; VE = ventrículo esquerdo; VSF = volume sistólico final.

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com aqueles com fibrose no VE (49 mL [IIQ: 36 a 75 mL]; p = 0,046), enquanto não houve diferença no volume final diastólico do VD ou na fração de ejeção do VD entre aqueles com fibrose no VE e aqueles sem fibrose no VE (Tabela 2). É importante notar que, entre os pacientes

sem fibrose, havia 10 indivíduos com FEVE entre 35% e 55% e 3 com FEVE < 35%.

Aneurismas apicais estavam presentes em 19,7% dos pacientes, mas apenas naqueles com fibrose. Os segmentos mais comumente afetados foram aqueles

FiguRa 1 Proporção de segmentos com fibrose de acordo com o modelo de 17 segmentos da American Heart Association, em uma análise por segmento dos casos de RTG positivo

Para cada segmento, a proporção de casos positivos foi apresentada no gráfico à esquerda (cinza, basal; laranja, meio da cavidade; azul, ápice). Os segmentos 4, 5, 10, 11 e 15 foram os locais mais comuns de realce tardio por gadolínio (RTG).

FiguRa 2 Exemplos dos 3 diferentes padrões de RTG em CCC no eixo curto

Padrões (A) transmural; (B) focal; e (C) difuso. O miocárdio normal está em preto, e as áreas positivas estão em branco. Setas laranjas indicam as áreas de fibrose. Os percentuais no canto inferior esquerdo refletem a quantidade de participantes com aquele padrão entre os casos positivos de realce tardio por gadolínio (RTG). CCC = cardiomiopatia chagásica crônica.

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A presença de fibrose foi significativamente relacio-nada a uma maior probabilidade de eventos, conforme visto nas curvas de Kaplan-Meier na Figura 3 para o desfecho primário (teste de log rank, p = 0,043) e na Figura 4 para o desfecho secundário (teste de log rank, p = 0,016). Contudo, não houve relação significativa entre o padrão da fibrose e os desfechos primário (teste de log rank, p = 0,523) ou secundário (teste de log rank, p = 0,092). A presença de aneurismas apicais também não foi relacionada aos desfechos primário (teste de log rank, p = 0,189) e secundário (teste de log rank, p = 0,268).

Para o desfecho primário (Tabela 4), a análise univa-riada identificou que idade avançada, classe funcional da NYHA III, TVNS em monitoramento de Holter, menor FEVE e maior quantidade de fibrose estavam relacio-nadas a uma maior probabilidade de eventos. A análise multivariada mostrou que idade avançada (p = 0,030) e massa de fibrose miocárdica (p = 0,045) estavam inde-pendentemente relacionadas ao desfecho primário.

Para o desfecho secundário, idade avançada, classe funcional da NYHA III, TVNS, menor FEVE, maior quantidade de fibrose e fração de ejeção do VD estavam associadas a um maior risco de eventos na análise univa-riada. No modelo multivariado, apenas idade avançada (p = 0,025) e menor FEVE (p = 0,015) mostraram-se preditores independentes (Tabela 5).

disCussão

Este estudo prospectivo mostra a associação entre fibrose miocárdica, conforme detectado pela presença de RTG, e eventos clínicos em CCC. A presença de qualquer fibrose estava relacionada tanto ao desfecho primário quanto ao secundário (Ilustração Central). Na análise multivariada, o tecido fibroso foi um preditor independente do desfecho composto de morte cardio-vascular e de taquicardia ventricular sustentada. Esse achado mostra que a fibrose miocárdica é uma lesão fundamental em CCC e provavelmente estabelece um caminho de reentrada responsável, em grande parte, por morte súbita cardíaca e por arritmias ventriculares sustentadas.

Entretanto, para o desfecho combinado de morte cardiovascular, taquicardia ventricular sustentada e hospitalização cardiovascular (um evento que, na maior parte das vezes, está relacionado à insuficiência cardíaca), apenas idade e FEVE, mas não a presença de fibrose miocárdica, apresentaram um valor preditivo in-dependente em nossa amostra. Esses resultados diferem daqueles relatados por Masci et al. (25), que descobriu que, em outras cardiomiopatias dilatadas, a presença de fibrose adiciona valor incremental à idade e à FEVE para a ocorrência de uma nova insuficiência cardíaca. A

tabela 3 Eventos clínicos registrados para pacientes com CCC com e sem fibrose no VE durante o seguimento

Total (n = 140)

Sem fibrose de VE (n = 40)

Com fibrose de VE (n = 100)

Morte cardiovascular 11 (7,8) 1 (2,5) 10 (10,0)

Taquicardia ventricular sustentada 3 (2,1) 0 (0,0) 3 (3,0)

Hospitalização por razão cardiovascular 20 (14,2) 2 (5,0) 18 (18,0)

Insuficiência cardíaca * 18 (12,8) 2 (5,0) 16 (16,0)

Fibrilação atrial de alta frequência 2 (1,4) 0 (0,0) 2 (2,0)

Os valores são descritos por n (%). *Insuficiência cardíaca descompensada aguda ou crônica.Abreviaturas conforme as Tabelas 1 e 2.

FiguRa 3 Fibrose miocárdica por RTG relacionada a morte cardiovascular ou taquicardia ventricular sustentada

Curvas de Kaplan-Meier para taxas de eventos em pacientes com CCC com (linha tracejada laranja) e sem (linha sólida azul) fibrose identificada por RTG para o desfecho primário (morte e taquicardia ventricular sustentada). Pacientes com RTG positivo tiveram maiores taxas de eventos do que os pacientes com RTG negativo (teste de log rank, p = 0,043). Abreviaturas conforme a Figura 2.

relacionados à parede inferolateral (Figura 1). Houve uma distribuição equilibrada nos 3 padrões de fibrose (Figura 2), com fibrose difusa, focal e trans-mural em 32 (32%), 38 (38%) e 30 (30%) pacientes, respectivamente.

Na análise de sobrevida, durante um seguimento mediano de 34 meses (IIQ: 24 a 49 meses), ocorreu um total de 11 mortes cardiovasculares, 3 episódios de taquicardia ventricular sustentada e 20 hospita-lizações cardiovasculares. Houve 18 hospitalizações cardiovasculares por insuficiência cardíaca e 2 devido a fibrilação atrial de alta frequência (Tabela 3). Não houve ocorrência de evento embólico. Portanto, levando em consideração o critério de primeiro evento a ocorrer, 14 participantes satisfizeram o desfecho primário e 31, o desfecho secundário.

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diferença pode se dever à maior proporção de pacientes com fibrose em nosso estudo do que no estudo de Masci (71,4% vs. 27%), o qual poderia ter destacado outros fatores importantes responsáveis pelo desenvolvimento de insuficiência cardíaca e consequentes hospitalizações em CCC. De fato, a extensão e a prevalência de fibrose em pacientes com CCC têm sido descritas como uma lesão muito mais proeminente do que em outras cardiomiopa-tias dilatadas. Esse achado pode também constituir um fator relevante para um pior prognóstico de longo prazo associado a CCC (26, 27).

PResença de FibRose e desFeChos CaRdio-

vasCulaRes. Estudos anteriores têm relatado a associação da presença e da quantidade de fibrose, avaliada por RMC, com desfechos cardiovasculares em outras entidades, tais como pacientes com diabetes e suspeita de doença arterial coronariana, sarcoidose e cardiomiopatia dilatada não isquêmica (18, 28-31). O presente estudo em pacientes com CCC revelou o forte valor preditivo da fibrose para desfechos clínicos graves, incluindo morte, durante o período de seguimento, em uma amostra considerável de pacientes: apenas 1 morte cardiovascular foi registrada entre os pacientes sem fibrose, enquanto 10 mortes foram registradas entre aqueles com fibrose miocárdica de qualquer tamanho ou distribuição.

Estudos anteriores avaliaram a associação entre a presença de fibrose do VE e alterações cardíacas mais severas na doença de Chagas, mas nenhum deles relatou acompanhamento clínico. No estudo de Rochitte et al. (19), a fibrose estava presente em 84,6% dos pacientes com CCC e em 100% dos pacientes com CCC e taqui-cardia ventricular (p < 0,001). Além disso, a extensão da fibrose miocárdica aumentou progressivamente em subgrupos com diferentes níveis de gravidade da doença e classes funcionais da NYHA, e sua extensão foi correlacionada negativamente com FEVE (r = -0,78; p < 0,001). Um artigo recente também relatou a correlação entre a quantidade de fibrose e um escore de risco validado para morte em pacientes com CCC, o escore de risco de Rassi (22, 32).

Nesta coorte de pacientes, a presença de fibrose de RTG foi associada ao volume aumentado de VE, embora não preenchesse os critérios para dilatação e baixa FEVE. É importante ressaltar que foi notada dilatação de cavidade no lado do VD. O fato de termos avaliado apenas a fibrose de RTG do miocárdio do VE pode explicar essa discrepância. A presença de fibrose no VE e sua relação com o volume dilatado do VD é, pos-sivelmente, uma consequência da alteração miocárdica difusa em CCC, confirmando descobertas anteriores de Moreira et al. (33) de que a fibrose em uma câmara pode afetar a outra. Além disso, Tassi et al. (34) descreveram

FiguRa 4 Fibrose miocárdica por RTG relacionada a morte cardiovascular, taquicardia ventricular sustentada ou hospitalização por razões cardiovasculares

Curvas de Kaplan-Meier para taxas de eventos em pacientes com CCC com (linha tracejada laranja) e sem (linha sólida azul) fibrose identificada por RTG para o desfecho secundário (morte, taquicardia ventricular ou hospitalização cardiovascular). Pacientes com RTG positivo tiveram maiores taxas de eventos do que os pacientes com RTG negativo (teste de log rank, p = 0,016). Abreviaturas conforme a Figura 2.

tabela 4 Avaliação dos parâmetros clínicos e dos resultados de ressonância magnética cardíaca em relação ao desfecho primário (morte e taquicardia ventricular sustentada) em pacientes com CCC de acordo com o modelo de regressão de Cox (n = 140)

Univariado Multivariado

Razão de risco (IC 95%) Valor de p

Razão de risco (IC 95%) Valor de p

RTG* 1,06 (1,02-1,11) 0,006 1,06 (1,01-1,12) 0,045

Idade† 1,07 (1,02-1,13) 0,007 1,06 (1,01-1,13) 0,030

Classe funcional da NYHA

II 1,99 (0,51-7,00) 0,318 1,36 (0,26-7,06) 0,717

III 5,61 (1,64-19,10) 0,006 1,93 (0,47-7,90) 0,356

TVNS 3,09 (1,08-8,81) 0,034 1,13 (0,31-4,12) 0,843

FEVE‡ 0,95 (0,92-0,98) 0,004 0,98 (0,94-1,02) 0,370

*Razão de risco por 1% de alteração em área de RTG positivo sobre MVE.†Razão IC de risco por 1 ano.‡Razão de risco por 1% de alteração da fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE).TVNS = taquicardia ventricular não sustentada avaliada por monitoramento de Holter; outras abreviaturas conforme as Tabelas 1 e 2.

uma relação entre o grau de fibrose e a ocorrência de arritmias ventriculares.

Não encontramos um padrão predominante ou preditivo de fibrose no presente estudo. Houve uma proporção comparável dos 3 padrões de distribuição de fibrose entre os pacientes avaliados. Esse achado reflete a mesma heterogeneidade individual notável da distribuição de fibrose descrita em estudos histológicos de pacientes com CCC. Apesar de todos os participantes terem CCC clinicamente estabelecida como um critério de inclusão no protocolo do estudo, a mesma variação

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tabela 5 Avaliação dos parâmetros clínicos e dos resultados de ressonância magnética cardíaca em relação ao desfecho secundário (óbito, taquicardia ventricular sustentada ou hospitalização cardiovascular) em pacientes com CCC de acordo com o modelo de regressão de Cox (n = 140)

Univariado Multivariado

Razão de risco (IC 95%) Valor de p

Razão de risco (IC 95%) Valor de p

RTG* 1,05 (1,01-1,08) 0,008 1,03 (0,98-1,07) 0,233

Idade† 1,05 (1,02-1,08) 0,003 1,05 (1,01-1,09) 0,025

Classe funcional da NYHA

II 2,22 (0,95-5,20) 0,065 1,42 (0,51-3,95) 0,502

III 3,63 (1,32-9,98) 0,012 1,99 (0,61-6,48) 0,251

TVNS 2,39 (1,13-5,07) 0,022 1,13 (0,44-2,89) 0,799

FEVE‡ 0,94 (0,92-0,97) < 0,001 0,96 (0,92-0,99) 0,015

FEVD‡ 0,96 (0,94-0,99) 0,005 0,99 (0,95-1,03) 0,691

*Razão de risco por 1% de alteração em área de RTG positivo sobre MVE. †Razão de risco por 1 ano. ‡ Razão de risco por 1% de alteração da FEVE e da fração de ejeção do ventrículo direito (FEVD).Abreviaturas conforme as Tabelas 1, 2 e 4.

ilustRação CentRal Fibrose miocárdica avaliada por RM com realce tardio por gadolínio como preditora de eventos na doença de Chagas

Volpe, G.J. et al. J Am Coll Cardiol. 2018;72(21):2567-76.

A infecção crônica por Trypanosoma cruzi leva ao dano miocárdico habitualmente relacionado à fibrose pronunciada, a qual é característica da doença de Chagas. Essa lesão miocárdica pode ser identificada e quantificada por meio da técnica de realce tardio por gadolínio (RTG) em RM. Pacientes com a doença de Chagas apresentam uma vasta amplitude de padrões de quantidade e distribuição de fibrose. A presença desse achado está relacionada a uma maior taxa da combinação de eventos de morte cardiovascular e de taquicardia ventricular sustentada.

ampla nos padrões de fibrose foi detectada, variando de indivíduos com pequenas fibroses focais a outros com áreas um tanto difusas e intensamente fibróticas. De fato, em alguns casos, os padrões transmurais poderiam ser facilmente confundidos com aqueles normalmente vistos em pacientes com doença arterial coronariana. Os 2 estudos anteriores principais realizados com uso de RMC relataram alterações semelhantes, bem como a mesma preocupação diagnóstica no que se refere a casos transmurais (19, 20). Não foi observada qualquer correlação entre padrão de fibrose e eventos clínicos. Da mesma forma, Mello et al. (35) observaram uma as-sociação entre a quantidade de fibrose por RTG e o risco de taquicardia ventricular, mas não com distribuição de fibrose. Esse cenário também é semelhante àqueles descritos para cardiomiopatias dilatadas, nos quais

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não se encontrou uma relação clara entre o padrão de fibrose e a ocorrência de eventos (17).

liMitações do estudo. Não houve análise de fibrose difusa em T1, mas essa técnica não se encontrava dispo-nível na época em que os exames foram realizados. As in-formações de seguimento foram baseadas na revisão dos prontuários dos pacientes. Contudo, como nosso hospital tem um sistema de arquivos médicos de alta qualidade e um protocolo de seguimento rigoroso para pacientes que faltem às suas consultas, acreditamos que perdas nas informações de desfechos sejam mínimas ou mesmo inexistentes. Além disso, a presença de alguns pacientes com fibrose semelhante à de isquemia gera preocupa-ções sobre possíveis associações com doença arterial coronariana. Para minimizar esse problema, alguns de nossos participantes foram submetidos a angiografia coronariana caso tivessem ≥ 2 fatores de risco para doença arterial coronariana, e todos estavam livres de doença arterial coronariana epicárdica significativa. Por fim, nossa amostra de pacientes incluiu uma proporção elevada daqueles com escores de Rassi dentro das faixas intermediária e elevada em termos de risco de morte. Portanto, a amostra pode não refletir de forma integral a totalidade da população de pacientes com CCC.

ConClusões

A presença de fibrose em pacientes com CCC é um forte preditor de uma combinação de morte e taqui-

cardia ventricular sustentada. A fibrose de RTG é vista mais frequentemente na parede inferolateral do VE, mas nenhum padrão específico de distribuição de fibrose aparentou ser mais especificamente correlacionado à patogênese da doença ou à ocorrência de desfechos clínicos.

CoRResPondÊnCia. Dr. André Schmidt, Divisão de Cardiologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil, CEP 14048-900. E-mail: [email protected]. Twitter: @usponline.

PeRsPectivas

CoMPetÊnCia eM ConheCiMento MédiCo. Em pacientes com CCC, a fibrose miocárdica iden-tificada por meio de RTG em RMC foi associada a taquicardia ventricular sustentada e morte cardiovascular, mas esses eventos eram indepen-dentes da extensão e da distribuição da fibrose.

PanoRaMa tRanslaCional. Uma vez que exames de diagnóstico por imagem de RMC podem estar indisponíveis em áreas do mundo onde a doença de Chagas é predominante, mais pesquisas se fazem necessárias para avaliar o valor prog-nóstico de marcadores substitutivos de fibrose, tais como o escore de Selvester para achados eletrocardiográficos.

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PALAVRAS-CHAVE Chagas, doença de Chagas, eventos clínicos, realce tardio por gadolínio, RM, fibrose

RassiComentário Editorial

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CoMentáRio editoRial

A fibrose do ventrículo esquerdo e prognóstico na cardiomiopatia chagásica crônicaSalvador Rassi, MD, PhD*

*Professor Titular de Cardiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás.

A doença de Chagas permanece um problema para o sistema de saúde pública nos países da América Latina, onde estima-se que 18 milhões de pessoas

estejam infectadas pelo Trypanossoma cruzi. Considera-se que entre 10 e 40% desta população terá manifesta-ções clínicas da doença; portanto, supõe-se que cerca de 4,8 a 5,4 milhões de pessoas apresentam alterações atribuíveis à doença de Chagas, tais como anormalidades eletrocardiográficas e disfunção ventricular, conforme relatório da Organização Mundial de Saúde(1).

A morte súbita cardíaca frequentemente se associa a insuficiência cardíaca (IC), mas pode ocorrer mesmo em pacientes assintomáticos(2). Entretanto, esta infor-mação vem de um período anterior a introdução de medicamentos que mudaram a história do tratamento da IC, como os betabloqueadores, inibidores da enzima conversora da angiotensina, bloqueadores de receptores da angiotensina e antagonistas mineralocorticoides(3). Vários fatores de risco têm sido associados com o prog-nostico desfavorável na doença de Chagas. Rassi et al.(4) desenvolveu um escore de risco que incluiu sintomas de IC, cardiomegalia, disfunção sistólica ventricular, taquicardia ventricular não sustentada, baixa voltagem QRS e sexo feminino. Este escore mostrou predizer a morte por todas as causas na cardiopatia chagásica (CC). A fibrose miocárdica (FM) tem sido identificada em estudos patológicos na CC e pode ser detectada usando-se a ressonância magnética cardíaca (RMC). Es-tudos prévios associaram a RMC, em pacientes com CC, com a disfunção ventricular, IC, severidade da doença, taquicardia ventricular e com o escore de Rassi(4).

Dois artigos concomitantes, publicados nesta edição, avaliaram a importância da fibrose no ventrículo esquerdo com o prognóstico da CC. Em ambos estudos

a fibrose miocárdica foi avaliada pelo realce tardio do gadolínio (RTG) demonstrado pela RMC usando scaner 1.5-T. Utilizaram dados dos pacientes com CC que foram submetidos a RMC previamente e seguidos em suas instituições.

Volpe et al.(6) usou como desfecho final uma combi-nação de morte cardiovascular (CV) e taquicardia ven-tricular sustentada (TVS), enquanto Senra et al.(7) usou uma combinação que incluída mortalidade por todas as causas, transplante cardíaco, atuação do CDI e morte súbita abortada. Definidos como desfechos secundários foram a soma de morte cardiovascular, TVS e hospitali-zação CV no estudo de Volpe e mortalidade por todas as causas no estudo de Senra.

No estudo de Volpe et al., 100 (71,4%) dos 140 pacientes com CC mostraram RTG com uma média de massa de fibrose de 10.4g, representando 9,2% do miocárdio total. Esta alta prevalência de RTG foi observada apesar da maioria dos pacientes estarem em classe funcional I (75%) da NYHA. O período médio de seguimento foi de 2,75 anos, durante o qual penas 14 (10%) e 31 (22%) atingiram o desfecho primário e secundário, respectivamente. A presença do RTG foi significativamente associada com o evento primário e secundário. Entretanto, em uma análise multivariada, o RTG foi preditor independente de mortalidade e TVS, mas não da combinação de morte, TVS e hospitalização. Para hospitalização, a idade e fração de ejeção do VE (FEVE) foram os únicos preditores independentes. Isto foi interpretado, pelos autores, como se o RTG estaria mais relacionado a mecanismos de reentrada, que faci-litam o surgimento de TVS e morte súbita, enquanto a FEVE seria mais relacionada ao desenvolvimento de IC, o que é verdadeiro. Notavelmente, apenas uma morte

RassiComentário Editorial

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cardiovascular foi observada entre os pacientes sem RTG, apesar da FE reduzida, realçando o alto poder do valor preditivo negativo do RTG.

Senra et al. avaliaram 130 pacientes com CC seme-lhantes, apesar da maioria dos pacientes pertencer a classe funcional I da NYHA, o RTG foi detectado e 76,1% da população, com uma massa média de 15,2g, o que cor-responde a 5,5% do miocárdio. O seguimento médio foi de 5,4 anos, quase o dobro reportado no estudo de Volpe e col. Como consequência houve uma maior mortalidade, n=45 (34,6%) ou atingiram o desfecho primário, n=58 (44,6%). Também, ao contrário de Volpe et al., uma por-centagem significativa de pacientes teve CDI implantado durante o seguimento. RTG foi significativamente mais prevalente e extenso no grupo de pacientes que atingiu o desfecho primário. Novamente, neste estudo, pacientes sem RTG não tiveram eventos durante o seguimento. Na análise multivariada o RTG emergiu como um preditor independente dos desfechos combinados tanto como uma variável contínua ou categórica. Entretanto, neste caso, a FEVE pela RMC não foi incluída como uma covariável, porque de acordo com os autores havia uma colinearidade entre RTG e FEVE. Quando os modelos foram construídos incluindo tanto RTG e FEVE, não havia diferença no

desempenho, o que evidencia a alta concordância entre FEVE e RTG para o prognóstico global.

Os resultados de ambos os estudos são relevantes e em concordância com estudos prévios que avaliaram a importância do RTG no prognóstico de outras cardio-miopatias. O RTG se comporta como um claro marcador de mal prognostico em pacientes com CC. Parece haver associação entre RTG e FEVE, entretanto, grandes es-tudos com seguimento longo são necessários para con-firmar o valor prognóstico incremental do RTG sobre a FEVE, para predizer TVS e morte súbita na CC.

Algumas limitações destes estudos devem ser consi-deradas antes de se incorporar como rotina a avaliação do RTG na CC. Primeiro, ambos os estudos excluíram pacientes com marcapasso e desfibriladores, que re-presentam os mais graves. Segundo, ambos os estudos são retrospectivos, baseados na análise de prontuários de suas instituições, não havendo um seguimento com datas preestabelecidas.

Finalmente, uma melhora na estratificação de risco na CC é útil no processo de decisão do implante de CDI, entretanto, custos adicionais com a realização da RMC tem óbvias limitações financeiras na maioria dos países donde a doença é endêmica.

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ReFeRÊnCias

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 9 P O R A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

P U B L I C A D O P O R E L S E V I E R

V o l . 7 3 , N o . 5 , 2 0 1 9

I S S N 0 7 3 5 - 1 0 9 7

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Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster, em JACC.org

aRtigo oRiginal

Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateterDaniel J. Blackman, MD,a Smriti Saraf, MD,a Philip A. MacCarthy, PHD,b Aung Myat, MD,c Simon G. Anderson, PHD,d Chris-topher J. Malkin, MD,a Michael S. Cunnington, MD,a Kathryn Somers, BSC,a Paul Brennan, MD,e Ganesh Manoharan, MD,e Jessica Parker, BSC,c Omar Aldalati, MD,b Stephen J. Brecker, MD,f Cameron Dowling, MBBS,f Stephen P. Hoole, MD,g Stephen Dorman, MD,h Michael Mullen, MD,i Simon Kennon, MD,I Melanie Jerrum, BSC,i Pavan Chandrala, BSC,i David H. Roberts, MD,j Justin Tay, MD,j Sagar N. Doshi, MD,k Peter F. Ludman, MD,k Timothy A. Fairbairn, MD,l Joanne Crowe, BSC,l Richard D. Levy, MD,d Adrian P. Banning, MD,m Neil Ruparelia, MD,m Mark S. Spence, MD,e David Hildick-Smith, MDc

Resumo

Contexto Muito pouco se conhece sobre a durabilidade de longo prazo da valva após a substituição da valva aórtica transcateter (TAVR).

objetivos Este estudo buscou avaliar a incidência de degeneração estrutural da valva (DEV) de 5 a 10 anos pós-procedimento.

Métodos Os dados demográficos, processuais e de desfecho intra-hospitalar sobre pacientes submetidos a TAVR de 2007 a 2011 foram obtidos do registro U.K. TAVI (implante da valva aórtica transcateter do Reino Unido). Os pacientes para os quais dados ecocardiográficos estavam disponíveis tanto na linha de base quanto ≥5 anos pós-TAVR foram incluídos. A DEV hemodinâmica foi determinada de acordo com as orientações do comitê europeu.

Resultados Um total de 241 pacientes (79,3 ± 7,5 anos de idade; 46% do sexo feminino) com seguimento pós-procedimento e seguimento ecocardiográfico tardio (mediana de 5,8 anos, intervalo de 5 a 10 anos) foi incluído. Um total de 149 pacientes (64%) foi tratado com uma valva autoexpansível e 80 (34,7%), com uma valva expansível por balão. O gradiente de pico da valva aórtica no seguimento foi mais baixo do que pós-procedimento (17,1 x 19,1 mmHg; p = 0,002). Mais pacientes não apresentaram regurgitação aórtica (RA) ou apresentaram RA trivial (47,5% x 33%), e poucos apresentaram RA leve (42,5% x 57%) no seguimento (p = 0,02). Houve 1 caso (0,4%) de DEV grave 5,3 anos após o implante (nova RA grave). Houve 21 casos (8,7%) de DEV moderada (média de 6,1 anos pós-implante; intervalo de 4,9 a 8,6 anos). Doze deles (57%) devido a nova RA e 9 (43%), à re-estenose.

ConClusões O funcionamento da valva aórtica transcateter de longo prazo é excelente. No estudo dos autores, 91% dos pacientes permaneceram livres de DEV entre 5 e 10 anos pós-implante. A incidência de DEV grave foi de <1%. Ocorreu DEV moderada em 1 de 12 pacientes. (J Am Coll Cardiol 2019;73:537–45) ©2019 pela American College of Cardiology Foundation.

aDepartment of Cardiology, Leeds Teaching Hospitals NHS Trust, Leeds, Reino Unido; bDepartment of Cardiology, King’s College Hospital, London, Reino Unido; cDepartment of Cardiology, Royal Sussex County Hospital, Brighton, Reino Unido; dDepartment of Cardiology, Manchester University NHS Foundation Trust, Manchester, Reino Unido; eDepartment of Cardiology, Royal Victoria Hospital, Belfast, Reino Unido; fDepartment of Cardiology, St. George’s Hospital, London, Reino Unido; gDepartment of Cardiology, Papworth Hospital NHS Foundation Trust, Cambridge, Reino Unido; hDepartment of Cardiology, Bristol Heart Institute, Bristol, Reino Unido; iDepartment of Cardiology, Barts Health NHS Trust, London, Reino Unido; jDepartment of Cardiology, Lancashire Cardiac Centre, Blackpool, Reino Unido; kDepartment of Cardiology, Queen Elizabeth University Hospital, Birmingham, Reino Unido; lDepartment of Cardiology, Liverpool Heart and Chest Hospital, Liverpool, Reino Unido; e mDepartment of Cardiology, John Radcliffe Hospital, Oxford, Reino Unido. Esta pesquisa foi apoiada pela infraestrutura do National Institute for Health Research (NIHR) em Leeds, Reino Unido. Prof. Banning é parcialmente financiado pelo NHS NIHR Biomedical Research Center, Oxford, Reino Unido. Dr. Blackman foi consultor e fiscal da Medtronic e Boston Scientific. Dr. MacCarthy foi fiscal da Edwards Lifesciences; recebeu apoio da Boston Scientific; e recebeu honorários de consultoria/palestra da Abbott Vascular e Edwards Lifesciences. Dr. Malkin foi fiscal da Medtronic e da Boston Scientific. Dr. Cunnington recebeu honorários de consultoria da Boston Scientific; e patrocínio para participação em encontros educacionais da Medtronic e da Boston Scientific. Dr. Manoharan é fiscal da Medtronic e da Abbott. Dr. Brecker foi consultor e recebeu subsídios da Medtronic e da Boston Scientific. Dr. Dowling recebeu subsídios e honorários de palestras da Medtronic. Dr. Hoole recebeu subsídios de pesquisa da Abbott Vascular; e foi fiscal, palestrante e/ou fez parte do conselho da Abbott Vascular e da Boston Scientific. Dr. Dorman recebeu patrocínio para participar de encontros educacionais da Medtronic. Dr. Mullen é consultor e recebeu subsídios de pesquisa da Edwards Lifesciences. Dr. Kennon recebeu subsídios e honorários da Edwards Lifesciences, Medtronic e Boston Scientific. Dr. Doshi foi fiscal e consultor da Edwards Lifesciences. Dr. Fairbairn foi palestrante da HeartFlow. Dr. Levy foi fiscal da Medtronic. Prof. Banning recebeu subsídio institucional da Boston Scientific para financiamento de uma bolsa; e recebeu honorários de palestras

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A substituição da valva aórtica trans-cateter (TAVR) emergiu como uma alternativa à substituição cirúrgica da

valva aórtica (SAVR) para o tratamento de estenose aórtica grave. No entanto, há muito poucos dados sobre a durabilidade de longo prazo da valva. Avaliações do funcionamento da valva nas primeiras coortes randomizadas e registros têm demonstrado consistentemente funcionamento preservado da valva até 5 anos após a TAVR (1-5). No entanto, reconhece-se bem que a degeneração estrutural da valva (DEV) com bioprótese cirúrgica da valva aór-tica não é geralmente observada até 5 a 10 anos

pós-procedimento, e os dados de tempo após a TAVR são muito escassos. Há uma necessidade premente de uma maior compreensão sobre a durabilidade de longo prazo das valvas TAVR, especialmente como a TAVR se move para coortes de baixo risco. O objetivo deste estudo foi avaliar o funcionamento da valva de longo prazo e determinar a incidência de DEV hemodinâmica entre 5 e 10 anos após TAVR, utilizando dados do registro do U.K. TAVI (o implante da valva aórtica transcateter) (6).

Métodos

PoPulação do estudo. O registro U.K. TAVI é um banco de dados prospectivo obrigatório que inclui todos os pacientes submetidos a TAVR no Reino Unido. Os dados são geridos pelo National Institute for Cardiovascular Ou-tcomes Research (NICOR, Instituto Nacional de Pesquisa de Desfechos Cardiovasculares). Informações detalhadas sobre a natureza do banco de dados foram publicadas an-teriormente (6). Para efeitos do presente estudo, os dados demográficos, processuais e de desfecho intra-hospitalar anônimos de todos os pacientes que foram submetidos a TAVR no Reino Unido de 2007 a 2011 foram obtidos do banco de dados do registro U.K. TAVI. Solicitou-se aos centros para fazer referência cruzada de seus pacientes com o conjunto de dados anônimos do NICOR, utilizando parâmetros como data do procedimento, idade, sexo e nível sérico de creatinina, a fim de permitir o acesso aos dados de desfecho clínico e seguimento ecocardiográfico não incluídos no registro U.K. TAVI.

Coleta de dados. Os dados demográficos, proces-suais e de desfecho intra-hospitalar foram gerados a partir do banco de dados do registro do U.K. TAVI. O

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

DEV = degeneração estrutural da valva

ETT = ecocardiograma transtorácico

IC = intervalo de confiança

RA = regurgitação aórtica

SAVR = substituição cirúrgica da valva aórtica (surgical aortic valve replacement)

TAVR = substituição da valva aórtica transcateter (transcatheter aortic valve replacement)

estado vital foi determinado com um banco de dados de mortalidade do NHS. Os dados ecocardiográficos iniciais foram obtidos a partir do primeiro ecocardiograma transtorácico realizado após o procedimento de TAVR, não mais do que 6 meses após o implante da valva. Os dados de seguimento ecocardiográfico foram obtidos pelo ecocardiograma transtorácico mais recente, não inferior a 4 anos e 6 meses pós-TAVR.

deFinições. A definição de DEV hemodinâmica foi adaptada das orientações do comitê europeu (7) para incluir velocidade de pico para definir DEV, em que o gradiente médio não foi registrado, refletindo uma prá-tica comum no Reino Unido. As definições foram feitas da seguinte forma: DEV grave: 1) gradiente médio ≥40 mmHg e/ou aumento ≥20 mmHg do valor basal; E/OU 2) ≥velocidade de pico ≥4 m/s e/ou aumento ≥2 m/s do valor basal; E/OU 3) nova regurgitação aórtica (RA) in-traprostética grave ou pior. DEV Moderada: 1) gradiente médio ≥20 e aumento <40 mmHg e/ou ≥10 e <20 mmHg do valor basal; E/OU 2) velocidade de pico ≥3 e <4 m/s e/ou aumento ≥1,5 e <2 m/s do valor basal; E/OU 3) nova RA intraprostética moderada ou pior.

análises estatístiCas. Os dados foram analisados com o pacote estatístico Intercooled Stata versão 14.2 (StataCorp, College Station, Texas, EUA). Os dados foram expressos em média (intervalo de confiança [IC] de 95%), média ± DP, mediana (intervalo interquartil) ou percentual, quando relevante. Foi utilizado o teste de soma de postos de Wilcoxon e o teste de McNemar para comparar variáveis ordinais, e testes t de Student pareados para comparar as variáveis contínuas.

étiCa. Os dados foram coletados como parte de uma auditoria cardíaca nacional e obrigatória do Reino Unido, e todos os campos de identificação do paciente foram removidos antes da análise. A aprovação ética para o estudo foi obtida da autoridade de pesquisa em saúde competente do Reino Unido.

Resultados

PoPulação do estudo. Dos 22 centros que reali-zaram procedimentos de TAVR entre 2007 e 2011, 15 centros concordaram em participar do estudo. Os dados ecocardiográficos pareados tanto iniciais quanto ≥4,5 anos pós-TAVR estavam disponíveis para 241 pacientes —esses pacientes formaram a população de estudo.

da Medtronic, Boston Scientific, Phillips e Abbott. Dr. Spence recebeu subsídios de pesquisa da Edwards Lifesciences, Boston Scientific e Medtronic; foi consultor da Abbott, Boston Scientific e Edwards Lifesciences; foi fiscal da Medtronic, Edwards Lifesciences e Boston Scientific. Dr. Hildick-Smith foi fiscal e fez parte de conselhos da Boston Scientific, Edwards Lifesciences e Medtronic. Todos os demais autores informaram não ter relações relevantes para os conteúdos deste artigo a serem declaradas.

Manuscrito recebido em 26 de agosto de 2018; manuscrito revisado recebido em 13 de outubro de 2018, aceito em 29 de outubro de 2018.

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Cento e trinta (53,6%) eram do sexo masculino; a idade média foi de 79,3 ± 7,5 anos. A média do EuroSCORE logístico foi de 19,7% (IC de 95%: 18,4% a 21,6%). As características basais estão resumidas na Tabela 1.

CaRaCteRístiCas PRoCessuais e Resultados. Características processuais e desfechos intra-hospi-talares são apresentados nas Tabelas 2 e 3, respecti-vamente. A TAVR foi realizada para o tratamento de estenose aórtica pura em 91,4% dos pacientes, e para degeneração de uma valva cirúrgica em 6,8%. Um total de 149 pacientes (64%) foram tratados com o sistema autoexpansível CoreValve (Medtronic, Dublin, Irlanda), 80 (34,3%) com uma valva por balão expansível [Sapien/Sapien XT (Edwards Lifesciences, Irvine, Cali-fórnia, EUA)], 4 (1,7%) com o Portico (Abbott Vascular, Minneapolis, Minnesota, EUA) e, em 8 pacientes, o tipo de valva não foi registrado. A via de acesso foi a trans-femoral na maioria (80,3%); os restantes 19,7% foram através da via subclávia, transaórtica ou transapical. Um total de 73,5% dos procedimentos foram realizados sob anestesia geral (Tabela 2). A implantação da valva foi bem-sucedida em 97,4% dos casos.

dados eCoCaRdiogRáFiCos. A mediana do segui-mento ecocardiográfico foi de 5,8 anos (intervalo inter-quartil: 5,3 a 7,7 anos). Seguimento prolongado para 6 anos (n = 168; 69%), 7 anos (n = 68; 28%), 8 anos (n = 30; 12%), 9 anos (n = 9; 4%) e 10 anos (n = 2; 1%). Dados ecocardiográficos na linha de base e no seguimento de longo prazo são apresentados na Tabela 4. Todos os 241 pacientes apresentaram estudos iniciais <6 meses

pós-TAVR e no seguimento de pelo menos 4,5 anos pós-TAVR. O gradiente de pico foi menor no seguimento em comparação com a linha de base (17,1 x 19,1 mmHg; p = 0,002). Mais pacientes não apresentaram RA ou apre-sentaram RA trivial no seguimento (47,8% x 32,9%; p = 0,055), e poucos apresentaram RA leve (42,5% x 57,0%; p = 0,02), em comparação com a linha de base. Não houve alteração na incidência de RA moderada. Um paciente (0,4%) desenvolveu novo RA grave no seguimento.

dados eCoCaRdiogRáFiCos de aCoRdo CoM

o tiPo de valva. Dados de seguimento e de valor basal de acordo com o tipo de valva são apresentados na Tabela 5 e Figuras 1 e 2. Entre os pacientes tratados com prótese autoexpansível, o gradiente de pico no se-guimento foi significativamente menor do que no valor basal (15,5 x 19,0 mmHg; p < 0,0001), considerando que não houve diferença para a valva expansível por balão (19,4 x 20,4 mmHg; p = 0,45).

Os pacientes com valva autoexpansível também apresentaram uma redução significativa na frequência de RA leve no seguimento (44,8% x 66,9%; p = 0,001) e um aumento correspondente em nenhuma RA/RA trivial (46,2% x 23,4%; p = 0,02). Para a valva expansível por balão, não houve mudança na proporção de pacientes com RA leve ao longo do tempo (35,4% x 34%; p = 0,98). A frequência de RA moderada foi a mesma da linha de base ao seguimento com ambos os tipos de valvas.

degeneRação estRutuRal da valva. As caracte-rísticas de valor de base e processuais dos 22 pacientes com DEV são apresentadas na Tabela 6. Não houve dife-rença significativa entre os pacientes com e sem DEV.

dev gRave. Nenhum paciente foi submetido a rein-tervenção para DEV. Uma paciente que foi tratada com uma valva autoexpansível de 26 mm desenvolveu DEV grave com RA grave da valva em 5 anos e 4 meses pós-implante. Seu ecocardiograma basal apresentava RA

tabela 1 Características basais da população do estudo

Masculino 126/235 (54,0)

Idade, anos 79,3 ± 7,47

EuroSCORE logístico 19,7 ± 12,3

Cirurgia cardíaca prévia 92/223 (41,3)

Doença pulmonar 60/223 (26,9)

AVC/AIT prévios 43/223 (19,3)

Doença vascular periférica 60/234 (26,0)

Creatinina >200 μmol/L 10/223 (4,5)

Fibrilação atrial 54/219 (25,0)

IM prévio 60/234 (25,6)

Diabetes melito 52/223 (23,3)

Gradiente de pico 80,6 ± 26,2

Área da valva aórtica 0,67 ± 0,3

Funcionamento do ventrículo esquerdo

Normal, FEVE ≥50% 163/235 (69,7)

Moderadamente debilitada, 30%–49% 51/235 (22,8)

Gravemente debilitada, <30% 20/235 (8,5)

Pressão da AP >60 mmHg 39/227 (17,2)

Diâmetro do anel, mm 22,7 ± 2,3

Os valores são n/N (%) ou média ± DP. Os denominadores variam devido à falta de alguns dados.FEVE = fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IM = infarto do miocárdio; AP = artéria pulmonar; AIT = ataque isquêmico transitório.

tabela 2 Dados processuais

Anestesia geral 172/234 (73,5)

Acesso

Transfemoral 179/223 (80,3)

Transapical 31/223 (13,9)

Subclávia 8/223 (3,6)

Transaórtica 5/223 (2,2)

Tipo de valvas

Sapien 45/233 (19,3)

Sapien XT 35/233 (15,0)

CoreValve 149/233 (64,0)

Portico 4/233 (1,7)

Pré-dilatação (BAV) 214/234 (91,5)

Os valores são expressos como n/N (%). Os denominadores variam devido à falta de alguns dados.BAV = valvoplastia aórtica por cateter-balão

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paravalvar leve apenas. Não havia recursos para sugerir endocardite aórtica, e ela não era considerado apta para outra intervenção.

dev ModeRada. Houve 21 casos (8,7%) de DEV mo-derada. Doze deles foram devido a novo RA moderada, e 9 foram devido a um aumento do gradiente transvalvar. A degeneração da valva foi observada em uma duração mediana de 6 anos e 1 mês (intervalo de 4 anos e 11 meses a 8 anos e 7 meses); 13 (62%) desses pacientes foram tratados com a valva autoexpansível, e 8 (38%) com uma valva expansível por balão.

seM dev. Na grande maioria dos pacientes (n = 220; 90,9%), não houve DEV. As curvas de Kaplan-Meier para a sobrevida livre de DEV grave e moderada são apresen-tadas na Ilustração Central.

tavR da valva eM valva. Não houve casos de DEV moderada ou grave entre os 15 pacientes que foram sub-metidos a TAVR para degeneração de uma bioprótese cirúrgica prévia da valva aórtica.

disCussão

Os principais achados do presente estudo são os se-guintes: 1) Em geral, em longo prazo, o funcionamento das valvas cardíacas aórticas transcateter foi excelente, sem aumento no gradiente de pico médio, e uma redução da RA em longo prazo; 2) a DEV foi muito rara, com apenas 1 caso de DEV hemodinâmica grave (0,4%), e 21 casos de DEV moderada (8,7%); e 3) a prótese autoex-pansível foi associada a uma diminuição no gradiente de pico da linha de base ao seguimento, e uma mudança no grau de RA de leve a nenhum/trivial.

os dados existentes sobRe a duRabilidade

da valva de tavR. durabilidade de médio prazo

(≤5 anos). Agora existe um corpo significativo de dados randomizados e de registro indicando bom funciona-mento global de valvas aórticas transcateter até os 5 anos de idade, com uma incidência muito baixa de DEV. O ensaio clínico PARTNER (substituição de valvas aórticas

transcateter) 1 randomizou 699 pacientes com estenose aórtica grave para TAVR com valva expansível por balão ou SAVR. Nenhum dos pacientes em qualquer ramo apresentou qualquer evidência de DEV em 5 anos de seguimento (2). Em uma análise combinada de 3 ensaios europeus: REVIVE (avaliação multicêntrica randomizada da eficácia da levosimendana intravenosa) II, TRAVERCE (ensaio para implante de valva aórtica transapical), e PARTNER EU (ensaio de colocação de valvas aórticas transcateter da Europa), 410 pacientes foram tratados com o valva expansível por balão, e nenhum caso de DEV foi identificado (5). No estudo ADVANCE CoreValve (estudo avançado internacional de pós-mercado do Co-reValve), 996 pacientes apresentaram TAVR utilizando a prótese autoexpansível. Dados ecocardiográficos estavam disponíveis em 860 pacientes com seguimento médio de 36,0 ± 21,1 meses, com 267 pacientes com seguimento por 5 anos. A DEV foi observada em 0,2% dos pacientes em 1 ano, e 0,9% dos pacientes em 5 anos (8). Uma revisão recente de quase 14 mil casos, usando vários tipos de valvas demonstraram que a sobrevida em 5 anos é de 48% e em 7 anos, de 28% (9), e outra revisão de 8.914 pacientes, com seguimento mediano entre 1,6 e 5 anos, relataram uma incidência de DEV pós-TAVR até 1.34/100 pacientes-anos. A incidência combinada de DEV em ambos os estudos foi 28.08/10.000 pacientes-anos (IC de 95%: 2,46 73,4/100 para pacientes-anos), e 12% desses pacientes foram submetidos a reintervenção da valva (10). No ensaio NOTION (intervenção nórdica na valva aórtica), que comparou TAVR x SAVR em 280 pacientes de baixo risco (escore STS <4%) com estenose aórtica grave, a incidência de DEV em 5 anos nos pacientes tratados com TAVR foi significativamente menor do que nos pacientes tratados cirurgicamente (3,9% x 26,1%; p < 0,0001) (11).durabilidade de longo prazo (>5 anos). Dados de biopróteses cirúrgica têm demonstrado consisten-temente que a DEV é rara nos primeiros 5 anos após

tabela 3 Resultados intra-hospitalares

Implantação bem-sucedida da valva 228/234 (97,4)

Grau de RA (eco ou fluoroscopia)

Nenhum/leve 193/213 (90,6)

Moderado 20/213 (9,4)

Grave 0/213 (0,0)

Principais complicações vasculares 4/233 (1,7)

AVC 5/233 (2,1)

Novo marca-passo definitivo 39/221 (17,6)

Os valores são expressos como n/N (%). Os denominadores variam devido à falta de alguns dados.RA = regurgitação aórtica.

tabela 4 Dados ecocardiográficos de valor basal versus de seguimento para todas as valvas

Basal Seguimento Valor de p

Gradiente de pico* 19,1 (18,0–20,2) 17,1 (15,9-18,4) 0,002

Regurgitação aórtica† <0,01

Nenhum/trivial 73/221 (33,0) 105/221 (47,5)

Leve 126/221 (57,0) 94/221 (42,5)

Moderado 22/221 (10,0) 21/221 (9,5)

Grave 0/221 (0,0) 1/221 (0,5)

Funcionamento do VE‡ 0,62

Normal 181/217 (83,4) 184/217 (84,8)

Moderadamente debilitada 23/217 (7,6) 21/217 (19,7)

Gravemente debilitada 13/217 (6,0) 12/217 (5,5)

Os valores são expressos como média (intervalo de confiança de 95%) ou n/N (%). *Valores de p são de testes t de Student pareados para variáveis contínuas. †Teste de soma de postos de Wilcoxon. ‡Teste de qui-quadrado de McNemar para variáveis nominais.VE = ventrículo esquerdo.

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cirurgia, mas que a falha ocorre cada vez mais depois disso. Atualmente, há poucos dados que descrevem o funcionamento da valva de TAVR para além de 5 anos. Para nosso conhecimento, descrevemos a maior coorte de pacientes com avaliação ecocardiográfica do funcionamento entre 5 e 10 anos, com dados de 241 pacientes aos 5 anos, 168 aos 6 anos, 68 aos 7 anos e 30 aos 8 anos. Encontramos uma incidência de DEV grave de <0,5%, em um seguimento mediano de 5,8 anos, com DEV moderada em 8,7%.

Webb et al. (12) relataram dados de 236 pacientes que foram submetidos a TAVR entre 5 e 10 anos previa-

mente, e demonstraram DEV grave, classificada como estenose grave, regurgitação ou reintervenção para DEV, em apenas 5 pacientes (1,9%). No entanto, apenas 68 pacientes estavam vivos aos 4 anos, 41 aos 6 anos e de 8 a 8 anos pós-TAVR. Eltchaninoff (13) descreveu os achados em 242 pacientes tratados por >5 anos e até 14 anos, previamente. Um paciente necessitou reintervenção para DEV grave, e 4 no total apresentaram DEV moderada ou grave. Mais uma vez, números em risco para além de 5 anos foram baixos – apenas 17 aos 6 anos e de 1 aos 8 anos. Testa et al. (14) apresentaram dados sobre 2.343 pacientes que foram submetidos a TAVR em 13 centros

tabela 5 Dados ecocardiográficos iniciais versus de seguimento de acordo com o tipo de valva

Sapien/XT inicial Sapien/XT de seguimento Valor de p CoreValve inicial CoreValve de seguimento Valor de p

Gradiente de pico* 19,4 (17,4-21,4) 20,4 (17,8-23,0) 0,45 19,0 (17,6-20,4) 15,5 (14,1-16,8) <0,0001

RA† 0,88 0,0005

Nenhum/trivial 35/65 (54,0) 34/65 (52,3) 34/145 (23,4) 67/145 (46,2)

Leve 22/65 (34,0) 23/65 (35,4) 97/145 (66,9) 65/145 (44,8)

Moderado 8/65 (12,0) 8/65 (12,3) 14/145 (9,7) 12/145 (8,3)

Grave 0/65 (0,0) 0/65 (0,0) 1/145 (0,7)

Os valores são expressos como média (intervalo de confiança de 95%) ou n/N (%). *Os valores de p são de testes t de Student pareados para variáveis contínuas. †Teste de postos com sinais de Wilcoxon para variáveis ordinais.RA = regurgitação aórtica.

FiguRa 1 Gravidade da RA na linha de base e no seguimento de acordo com o tipo de valva

Demonstra a gravidade da regurgitação aórtica (RA) na linha de base e no último seguimento (5 a 10 anos pós-procedimento), tanto para a valva expansível por balão (barras laranja) e a valva autoexpansível (barras azuis). No grupo da valva autoexpansível, mais pacientes apresentaram RA leve na linha de base, e poucos apresentaram RA trivial ou não apresentaram RA, em comparação à valva expansível por balão. No entanto, a proporção de pacientes com RA leve caiu, e a proporção com RA trivial/sem RA aumentou ao longo do tempo com a valva autoexpansível. Em contrapartida, não houve mudança na gravidade da RA entre linha de base e seguimento tardio com a valva expansível por balão.

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com seguimento de 9 anos. O número total de casos de DEV grave foi extremamente baixo, visto em apenas 3 pacientes aos 26, 72 e 89 meses, respectivamente.

duRabilidade da valva CiRúRgiCa. Compreensão da durabilidade da valva cirúrgica tem sido dificultada pela ausência de padronização das definições de DEV. A maioria dos estudos relatou DEV em termos da necessi-dade de reoperação. Puri et al. (15) relataram que a DEV em biopróteses cirúrgicas tende a ser observada em torno de 8 anos de pós-operatório, e rapidamente aumenta em frequência após os 10 anos. Os dados atuais sugerem uma incidência de DEV (definida como óbito, reoperação ou reinvestigação clínica devido a suspeita de DEV) de <1% antes dos 5 anos, aumentando para 10% aos 10 anos para pacientes >65 anos de idade (16). No entanto, a incidência e o momento da DEV é altamente dependente do tipo de prótese utilizada, com tempo para DEV sendo relatado logo aos 3,8 ± 1,4 anos para a prótese Sorin Mitroflow (Sorin Group, Arvada, Colorado, EUA) (17) e mais tarde aos 19 anos para a valva Carpentier-Edwards Perimount (Edwards Lifesciences) (18). A liberdade da DEV foi re-latada como 95% para a valva Trifecta (St. Jude Medical, Saint Paul, Minnesota, EUA) (19) aos 6 anos, e 95% para a valva Hancock II (Medtronic) aos 10 anos (20). Pibarot et al. (21) relataram uma ampla liberdade de reinter-venção ou morte em valvas cirúrgicas de 95% aos 5 anos, 70% a 90% aos 10 anos e 50% a 80% aos 15 anos.

Vários fatores podem influenciar a relativa a dura-bilidade de valvas cirúrgicas e transcateter. Os danos ao tecido da valva durante a carga, a falta de rotina de tratamento de anticalcificação nos dispositivos de primeira geração e expansão incompleta e excêntrica da estrutura, podem todos potencialmente levar a pior du-rabilidade de longo prazo para valvas transcateter (22). Por outro lado, o aumento da área do orifício efetivo da valva TAVR, especialmente com próteses supra-anular, e a redução da incidência de incompatibilidade de prótese no paciente podem conferir uma vantagem significativa no que diz respeito à durabilidade (23). Os dados atuais sugerem que a durabilidade da valva transcateter é comparável à durabilidade da valva cirúrgica em curto e médio prazo, mas faltam dados de longo prazo.

CoMPaRação das PRóteses. Encontramos uma durabilidade geral excelente de longo prazo tanto com as próteses autoexpansíveis como as expansíveis por balão, com apenas 1 caso de DEV grave com uma valva autoex-pansível, nenhuma com a valva expansível por balão e nenhuma diferença na incidência de DEV moderada. No entanto, o dispositivo autoexpansível foi associado a uma redução do gradiente de pico ao longo do tempo. Além disso, parecia haver uma melhoria na RA paravalvar com a valva autoexpansível, com um aumento significativo no número de pacientes com nenhum vazamento ou

tabela 6 Características basais dos pacientes com e sem DEV

DEV (n = 22) Sem DEV (n = 219) Valor de p

Masculino 13/22 (59,1) 113/213 (53,1) 0,59

Idade, anos 77,3 ± 6,6 79,5 ± 7,3 0,21

EuroSCORE logístico 20,7 ± 13,4 19,6 ± 12,2 0,69

Creatinina >200 μmol/L 1/21 (4,8) 9/202 (4,7) 0,95

Diabetes melito 6/21 (28,6) 46/202 (22,8) 0,55

Gradiente da VA 76,6 ± 22,3 81,3 ± 26,5 0,44

Área da valva aórtica 0,67 ± 0,24 0,67 ± 0,24 0,97

Diâmetro do anel, mm 23,4 ± 2,46 22,7 ± 2,27 0,19

Funcionamento do ventrículo esquerdo* 0,24

Normal, FEVE ≥50% 13/22 (59,1) 150/213 (70,8)

Moderadamente debilitada, 30%–49% 6/22 (27,3) 45/213 (21,2)

Gravemente debilitada, <30% 3/22 (13,6) 17/213 (8,0)

Acesso, %* 0,96

Transfemoral 17/21 (80,9) 162/202 (80,2)

Subclávia 0/21 (0,0) 8/202 (4,0)

Transapical 4/21 (19,0) 27/202 (13,4)

Transaórtica 0/21 (0,0) 5/202 (2,0)

Tipo de valvas, %* 0,45

Sapien 4/21 (19,0) 41/212 (19,3)

Sapien XT 5/21 (23,8) 30/212 (14,2)

CoreValve 12/21 (57,1) 137/212 (64,6)

Portico 0 (0,0) 4/212 (1,9)

Os valores são expressos como n/N (%) ou média ± DP. Os denominadores variam devido à falta de alguns dados. *Pares combinados do teste de postos com sinais de Wilcoxon para variáveis ordinais.DEV = degeneracao estrutural da valva; FEVE = fracao de ejecao do ventriculo esquerdo.

FiguRa 2 Diagrama em caixa do gradiente de pico na linha de base e no seguimento por tipo de valva

Gráfico de caixa estreita ilustrando o gradiente de pico na linha de base e no seguimento tardio (5 a 10 anos pós-procedimento), divididos de acordo com o tipo de valva. O gráfico mostra a mediana do gradiente de pico com intervalo interquartil, e caixas estilo Tukey, que se estendem a um máximo de 1,5× do intervalo interquartil para além da caixa. Os pontos além das caixas representam os pontos fora da curva. Não houve diferença no gradiente de pico (mmHg) no grupo Sapien ao longo do tempo (19,4 x 20,4 mmHg; p = 0,45). Houve uma redução significativa no gradiente de pico nos pacientes CoreValve da linha de base ao seguimento (19,0 x 15,5 mmHg; p < 0,0001).

italianos entre junho de 2007 e dezembro de 2016. Todos os pacientes receberam o sistema CoreValve ou Evolut R (Medtronic). Tempo médio de seguimento foi de 22 meses, com um número muito pequeno de pacientes

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vazamento trivial. Esses achados podem ser explicados por expansão contínua de longo prazo da estrutura autoexpansível de nitinol da valva autoexpansível. No entanto, esses dados não são randomizados, envolvem um número relativamente pequeno de pacientes e devem ser considerados apenas para a geração de hipóteses.

liMitações do estudo. Os dados de seguimento ecocardiográfico estavam disponíveis somente naqueles pacientes que ainda estavam vivos e/ou para os quais dados do seguimento ecocardiográfico tardio estavam disponíveis antes da morte, e este foi de apenas 15,8% de todos os pacientes submetidos a TAVR nos centros que contribuíram entre 2007 e 2011. Uma proporção signifi-cativa daqueles pacientes sem dados ecocardiográficos de longo prazo haviam falecido, com a causa da morte sendo incerta na maioria dos pacientes. Não podemos excluir a morte devido à DEV em alguns desses pacientes.

Os dados de seguimento ecocardiográficos foram ob-tidos a partir de análises de seguimento clínico padrão, em vez de estudos de pesquisa dedicada e, como conse-quência, dados completos não estavam disponíveis em

todos os casos. Assim, algumas análises podem ter sido afetados por variáveis faltantes. Além disso, a ausência de um laboratório principal pode comprometer a pre-cisão dos dados ecocardiográficos. O conjunto de dados do U.K. TAVI é igualmente afetado por dados faltantes em um pequeno número de pacientes (por exemplo, o tipo de valva), o que pode afetar os nossos achados.

A mediana de seguimento foi de apenas 5,8 anos, com menos de 15% tendo seguimento para além de 8 anos. Dados de mais longo prazo são necessários para uma análise mais robusta; pretendemos continuar o segui-mento deste estudo de coorte e de um relatório anual sobre a durabilidade da valva.

Este estudo concentrou-se na DEV hemodinâmica. Não temos dados sobre outras causas de falha estrutural da valva, como trombose ou endocardite.

Os achados deste estudo não podem ser extrapo-lados para pacientes mais jovens, em quem a TAVR pode ser considerada em preferência a SAVR no futuro, e na qual a durabilidade da valva será a consideração fundamental.

ilustRação CentRal Liberdade da deterioração estrutural da valva ao longo do tempo: Curva de Kaplan-Meier

Blackman, D.J. et al. J Am Coll Cardiol. 2019;73(5):537–45.

A análise de Kaplan-Meier de liberdade da degeneração estrutural da valva (DEV) ao longo do tempo, ≤8 anos após substituição da valva aórtica transcateter (TAVR), com liberdade de DEV grave em azul, e de DEV moderada em laranja. O número de pacientes em risco em diferentes momentos é apresentado no eixo x. O gráfico ilustra a infrequência de DEV entre 5 e 10 anos pós-procedimento nesta coorte de pacientes do registro do U.K. TAVI. DEV grave foi observado em apenas 1 paciente, 5,5 anos após TAVR. DEV moderada foi observada em 21 casos, representando cerca de 1 em 12 (8,7%), e ocorreu entre 5 anos e 8,5 anos pós-TAVR.

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Por último, apenas a primeira geração de valvas TAVR foram utilizadas durante o período de estudo, e a experiência do operador era limitada.

ConClusões

O funcionamento da valva de TAVR de longo prazo foi excelente, sem aumento no gradiente ou regurgitação em um seguimento médio de 5,8 anos, até um máximo de 10 anos, e DEV grave ocorreu em <0,5% dos pacientes.

CoRResPondÊnCia. Dr. Daniel J. Blackman, Depart-ment of Cardiology, Leeds General Infirmary, Great Ge-orge Street, Leeds LS1 3EX, Reino Unido. E-mail: [email protected]. Twitter: @ryvetsprog.

PeRsPectivas

CoMPetÊnCia na assistÊnCia ao PaCiente

e habilidades de PRoCediMento. O fun-cionamento da valva bioprotética é geralmente preservado de 5 a 10 anos após substituição da valva aórtica transcateter, com pouca degeneração estrutural e nenhuma mudança no gradiente da pressão sistólica ou na regurgitação aórtica.

PanoRaMa tRanslaCional. Estudos futuros precisam comparar a durabilidade dos diversos tipos de próteses disponíveis e identificar fatores específicas do paciente que favorecem a seleção de um tipo em vez de outro.

ReFeRÊnCias

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PALAVRAS-CHAVE degeneração estrutural da valva, substituição da valva aórtica transcateter, durabilidade da valva

RamosComentário Editorial

21

Estenose Aórtica (EAo) é a valvopatia mais comum em pacientes com idade avançada. A expectativa de vida vem aumentando ao redor do mundo e,

consequentemente, a prevalência da EAo também. O único tratamento eficaz para pacientes sintomáticos com EAo grave é a troca valvar, cirúrgica ou implante da prótese transcateter (TAVR). A partir de 2002, vários estudos multicêntricos, randomizados, demonstraram que a TAVR é superior ao tratamento clínico em pa-cientes inoperáveis e é uma alternativa ao tratamento cirúrgico em pacientes idosos, independente do risco cirúrgico. Entretanto a incorporação desta nova tecnologia é muito variável entre os países de língua portuguesa e mesmo entre regiões de um mesmo país. A seleção adequada dos pacientes, necessidade de um centro especializado, investimento em treinamento de especialistas, além do alto custo do procedimento, constituem uma grande barreira para o emprego desta nova tecnologia nos países em desenvolvimento. TAVR tem sido progressivamente utilizada em pacientes de baixo risco, menos idosos (média de idade no estudo PARTNER 3 e no EVOLUT LOW RISK em torno do 73-74 anos). Apesar da tecnologia e design diferentes, os folhetos das próteses cirúrgicas e das TAVRs são de tecido biológico, logo, são vulneráveis à disfunção tipo estenose e ou insuficiência.

Blackman et al. analisaram o seguimento clínico e ecocardiográfico pós-TAVR de pacientes incluídos em um Registro da Inglaterra, no período de 2007 a 2011. A média das idades foi 79,3 ± 7,5 anos e o EuroScore médio foi 19,7%. Foram analisados 241 pacientes com seguimento pós-TAVR de 6 a 10 anos. A prótese balão-expansiva foi implantada na maioria dos pacientes (64%) e o acesso transfemoral foi realizado em 80,3%. O seguimento clínico e ecocardiográfico médio foi de 5,8 anos (variando de 5,3 a 7,7 anos).

CoMentáRio editoRial

Durabilidade de longo prazo de próteses de valva aórtica transcateterAuristela Isabel de Oliveira Ramos, MD*

Segundo a definição da European Task Force Committee, degeneração estrutural não aconteceu na maioria dos pacientes 90,9%. Degeneração grave foi diagnosticada em um paciente (0,4%) e moderada em 21 (8,7%). A curva de Kaplan-Meier (ilustração central do artigo) demonstra que a deterioração se inicia a partir do quinto ano pós-TAVR. Vale ressaltar que o seguimento além de 8 anos foi possível somente em 15% dos pacientes. Entre os 15 pacientes que se submeteram a valve-in-valve, não foi observado disfunção da TAVR.

A durabilidade das biopróteses cirúrgicas tem sido um desafio ao longo da história dos substitutos valvares. A calcificação resulta de múltiplos fatores, relacionados à prótese (tipo de material biológico, esterilização, fi-xação, armazenamento) e ao paciente, sendo a idade no momento do implante, um dos fatores mais relevantes. Gabela et al. demonstraram que o risco de reoperação em 10 anos de seguimento em pacientes, com bioprótese cirúrgica, abaixo de 60 anos foi significativamente maior do que nos pacientes acima de 60 anos (5,6% versus 1,5%).

A real incidência da degeneração das biopróteses cirúrgicas não é muito bem conhecida, em razão da falta de padronização nas publicações sobre o que se considera disfunção de prótese, variando desde elevação do gradiente transprotético em um paciente assintomático, até indicação de reoperação. Por esta razão, é fundamental que sejam feitas referências sobre deterioração estrutural e disfunção, tanto nas próteses cirúrgicas como nas transcateter, como publicado em 2017 por Capodanno et al.

Os autores do estudo em discussão deram uma importante contribuição sobre a durabilidade da TAVR, em um intervalo de tempo um pouco maior do que os publicados anteriormente. Barbanti et al., PARTNER- 5 anos, CoreValve Pivotal trial, France-2 Registry, também

*Chefe da Seção Médica de Valvopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia.

RamosComentário Editorial

22

demonstraram baixo risco de disfunção grave em um seguimento que variou de 3 a seis anos.

Nesta nova etapa do conhecimento sobre TAVR, indicada em pacientes menos idosos, mais hígidos e com maior expectativa de vida, será possível acompanhar os pacientes por um tempo mais longo e apreciar qual será

a velocidade da deterioração e da disfunção da prótese transcateter. A indicação de TAVR ainda não pode ser ampliada para pacientes mais jovens, especialmente nos países em desenvolvimento, onde o custo é um fator im-portante e a maioria dos pacientes que precisam de troca valvar cirúrgica ainda enfrentam longas filas de espera.

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2. Mack MJ, Leon MB, Thourani VH, Makkar R, Kodali SK, Russo M, Kapadia SR et al. Transcatheter Aortic-Valve Replacement with a Balloon-Expandable Valve in Low-Risk Patients. NEJM 2019, Mar 17.

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ReFeRÊnCias

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 9 P U B L I C A D O P O R E L S E V I E R E M N O M E D O

A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

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Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster, em JACC.org

aRtigo oRiginal

Sobrevida de longo prazo após revascularização multiarterial em pacientes com diabetes

Estudo de Seguimento FREEDOM

Michael E. Farkouh, MD, MSC,a Michael Domanski, MD,b George D. Dangas, MD, PHD,c Lucas C. Godoy, MD,a,d Michael J. Mack, MD,e Flora S. Siami, MPH,f Taye H. Hamza, PHD,f Binita Shah, MD, MS,g Giulio G. Stefanini, MD,h Mandeep S. Sidhu, MD,i Jean-François Tanguay, MD,j Krishnan Ramanathan, MBCHB,k Samin K. Sharma, MD,c John French, MBCHB, PHD,l Whady Hueb, MD, PHD,d David J. Cohen, MD, MSC,m Valentin Fuster, MD, PHD,c,n para os Investigadores do Estudo de Seguimento FREEDOM

Resumo

Contexto O ensaio clínico FREEDOM (Avaliação futura de revascularização em pacientes com diabetes melito: manejo ideal da doença multiarterial) demonstrou que em pacientes com diabetes melito (DM) e doença coronariana multiarterial (DCM), a revascularização miocárdica com enxerto (RME) é superior à intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos (ICP-SF) para reduzir a taxa dos principais eventos cerebrovasculares e cardiovasculares adversos após um seguimento mediano de 3,8 anos. Não se sabe, contudo, se a RME confere uma vantagem de sobrevida após um longo período de seguimento.

objetivos O objetivo do presente estudo foi avaliar a sobrevida de longo prazo de pacientes com DM e DCM submetidos à revascularização coronariana no ensaio clínico FREEDOM.

Métodos O ensaio clínico FREEDOM randomizou 1.900 pacientes com DM e DCM para serem submetidos a ICP com stents farmacológicos com sirolimus ou paclitaxel ou, então, RME em um contexto de terapia médica ideal. Após a conclusão do ensaio clínico, os centros e os pacientes registrados foram convidados a participar do estudo de seguimento FREEDOM. A sobrevida foi avaliada pela análise de Kaplan-Meier, e os modelos de risco proporcional de Cox foram usados para as análises multivariadas e de subgrupo.

Resultados Um total de 25 centros (de 140 centros originais) concordou em participar do estudo de seguimento FREEDOM e contribuiu com um total de 943 pacientes (49,6% da coorte original) com um seguimento mediano de 7,5 anos (intervalo de 0 a 13,2 anos). Dos 1.900 pacientes, houve 314 mortes durante todo o período de seguimento (204 mortes no ensaio clínico original, e 110 mortes no seguimento FREEDOM). A taxa de mortalidade por todas as causas foi significativamente maior no grupo ICP-SF em comparação ao grupo RME (24,3% [159 mortes] vs. 18,3% [112 mortes]; razão de risco: 1,36; intervalo de confiança de 95%: 1,02 a 1,74; p = 0,01). Dos 943 pacientes com seguimento prolongado, a taxa de mortalidade por todas as causas foi de 23,7% (99 mortes) no grupo ICP-SF e 18,7% (72 mortes) no grupo RME (razão de risco: 1,32; intervalo de confiança de 95%: 0,97 a 1,78; p = 0,076).

ConClusões Em pacientes com DM e DCM, a RME leva a menor mortalidade por todas as causas em comparação à ICP-SF em seguimento de longo prazo. (Comparison of Two Treatments for Multivessel Coronary Artery Disease in Individuals With Diabetes [FREEDOM]; NCT00086450) (J Am Coll Cardiol 2019;73:629–38) © 2019 Publicado por Elsevier em nome da American College of Cardiology Foundation.

aPeter Munk Cardiac Centre and the Heart and Stroke Richard Lewar Centre, University of Toronto, Toronto, Ontario, Canadá; bUniversity of Maryland School of Medicine, Baltimore, Maryland, EUA; cZena and Michael Wiener Cardiovascular Institute, Icahn School of Medicine at Mount Sinai, New York, New York, EUA; dInstituto do Coração (InCor), Hospital das Clínicas HCFMUSP, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil; eBaylor Scott & White Health, Dallas, Texas, EUA; fNew England Research Institutes,Watertown, Massachusetts, EUA; gVA New York Harbor Healthcare System, New York University School of Medicine, New York, New York, EUA; hHumanitas Research Hospital, Milan, Itália; iAlbany Medical Center, Albany, New York, EUA; jDivision of Medicine, Montreal Heart Institute, Université de Montréal, Montréal, Quebec, Canadá; kUniversity of British Columbia, Vancouver, British Columbia, Canadá; lCardiology Department, Liverpool Hospital, Sydney, New South Wales, Austrália; mSaint-Luke’s Mid America Heart Institute, University of Missouri-Kansas City, Kansas City, Missouri, EUA; e nCentro Nacional de Investigaciones Cardiovasculares

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O ensaio clínico FREEDOM (avaliação fu-tura de revascularização em pacientes com diabetes melito: gestão ideal da

doença multiarterial) (1) demonstrou que, em pacientes com diabetes melito (DM) e doença coronariana multiarterial (DCM), a revas-cularização miocárdica com enxerto (RME) está associada a uma redução nos principais eventos cerebrovasculares e cardiovascu-lares adversos em um seguimento mediano de 3,8 anos, quando comparado à intervenção

coronária percutânea (ICP) com stents farmacológicos (SF). Evidências anteriores dos ensaios clínicos BARI (Bypass Angioplasty Revascularization Investigation — Investigação sobre revascularização, angioplastia e derivação) e BARI 2D (Bypass Angioplasty Revascula-rization Investigation 2 Diabetes – Investigação sobre revascularização, angioplastia, derivação 2 diabetes) (2, 3) primeiro destacaram os benefícios da RME nessa população. No BARI, a RME foi relacionada a menor mortalidade em pacientes diabéticos, quando com-parados com o ICP sem implante de stent, e, no BARI 2D, as taxas dos principais eventos cardiovasculares foram menores no grupo RME, quando comparadas à terapia médica.

O seguimento para além de 5 anos após ensaios clí-nicos sobre revascularização coronariana é incomum, devido à falta de fundos e obstáculos logísticos. Embora os pesquisadores nos ensaios clínicos BARI (4) e COU-RAGE (Clinical Outcomes Utilizing Revascularization and Aggressive Drug Evaluation — Desfechos clínicos utilizando revascularização e avaliação medicamentosa agressiva) (5) tenham relatado resultados de longo prazo, os ensaios BARI precederam o uso de SF na prática clínica, e o COURAGE incluiu pacientes sem DM e não comparou os desfechos da ICP com aqueles da RME. Não se sabe se a RME resulta em melhor sobrevida de longo prazo em comparação ao padrão ICP-SF na po-pulação diabética. O objetivo do estudo de seguimento FREEDOM foi examinar em longo prazo a mortalidade por todas as causas em pacientes com DM e DCM regis-trados no ensaio clínico FREEDOM.

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

DM = diabetes melito

DCM = doença coronariana multiarterial

ICP = intervenção coronária percutânea

IDT = intenção de tratar

RME = revascularização miocárdica com enxerto

SF = stent farmacológico

Métodos

PaCientes. O desenho e os resultados principais do ensaio clínico FREEDOM foram relatados anteriormente (1, 6). Entre abril de 2005 e abril de 2010, o FREEDOM registrou 1.900 pacientes com DM e DCM confirmada angiograficamente, definido como um diâmetro de estenose superior a 70% em 2 ou mais vasos epicár-dicos grandes, envolvendo, pelo menos, 2 territórios separados de artéria coronária e sem doença arterial coronariana com acometimento do tronco da artéria coronária esquerda. Os pacientes foram considerados aptos para ICP-SF e RME, com base no julgamento da equipe de cardiologia local.

No FREEDOM, a maioria dos pacientes (83%) apre-sentou doença triarterial, e destes, a maioria incluía envolvimento da artéria coronária descendente anterior esquerda (99%), com média de escore SYNTAX de 26,2 ± 8,6. No total, 140 centros em todo o mundo participaram do ensaio clínico FREEDOM (7).

tRataMento e seguiMento do ensaio ClíniCo

FReedoM oRiginal. Depois de fornecer o consen-timento informado por escrito, os participantes do ensaio clínico FREEDOM foram randomizados para serem submetidos a ICP-SF ou RME. A randomização foi realizada em uma proporção 1:1 com o uso de blocos de permutação com balanceamento dinâmico dentro de cada centro de estudo. No braço da ICP-SF, os stents far-macológicos com sirolimus e com paclitaxel foram uti-lizados em 51% e 43%, respectivamente, dos pacientes que foram submetidos a ICP, sendo que apenas uma mi-noria dos pacientes receberam SF de segunda geração. Terapia antiplaquetária dupla foi recomendada por pelo menos 1 ano após ICP-SF, que foi realizada em 78,1% dos pacientes. No grupo RME, 94,4% dos pacientes tiveram a colocação de um enxerto de artéria torácica interna.

Pacientes de ambos os grupos de intervenção foram solicitados a receber terapia médica ideal com base em diretrizes, com uma meta de colesterol de lipoproteína de baixa densidade inferior a 70 mg/dL, pressão arterial inferior a 130/80 mmHg e hemoglobina glicada inferior a 7% (8).

Carlos III, Madrid, Espanha. O ensaio clínico original FREEDOM foi patrocinado pelo National Heart, Lung, and Blood Institute (NHLBI), com subsídios da Cordis Corporation, uma empresa Johnson & Johnson naquele momento, da Boston Scientific (fornecendo os stents), da Eli Lilly (fornecendo abciximab e subsídio irrestrito de pesquisa), da Sanofi e da Bristol-Myers Squibb (clopidogrel). O estudo de seguimento FREEDOM foi patrocinado pela Joseph and Vicky Safra Foundation. Nenhuma empresa ou agência forneceu subsídios adicionais para o seguimento prolongado, e nenhuma participou da revisão, análise e decisão de submeter o manuscrito para publicação. Dr. Farkouh recebeu subsídios de pesquisa da Amgen e Novo Nordisk. O cônjuge do Dr. Dangas atuou no conselho consultivo da Boston Scientific e da Abbott Vascular; e prestou consultoria para a Abbott Vascular. Dr. Shah atuou no conselho consultivo da Philips Volcano; e atuou como consultora para a Terumo. Dr. Stefanini recebeu subsídio de pesquisa (para sua instituição) da Boston Scientific; e recebeu honorários de palestra/consultoria de B.Braun, Biossensores e da Boston Scientific. Dr. Sharma atuou como palestrante da Abbott Vascular, Boston Scientific, Cardiovascular Systems, Inc. e TriReme. Dr. Cohen recebeu subsídio de pesquisa para sua instituição e pagamento de consultoria (modesto) da Medtronic; subsídio de pesquisa da Abbott Vascular; e subsídio de pesquisa para sua instituição da Boston Scientific. Todos os demais autores informaram não ter relações relevantes para os conteúdos deste artigo a serem declaradas. Deepak L. Bhatt, MD, MPH, atuou como editor convidado neste artigo.

Manuscrito recebido em 13 de outubro de 2018; manuscrito revisado recebido em 1º de novembro de 2018, aceito em 1º de novembro de 2018.

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seguiMento de longo PRazo. Após a conclusão do ensaio clínico FREEDOM original em março de 2012, os pacientes e os centros foram convidados a participar do estudo de seguimento FREEDOM. Um total de 25 centros concordou em participar do estudo de segui-mento (Tabela On-line 1), e os pacientes desses centros consentiram em ser contatados anualmente por telefone ou e-mail e/ou para determinar seu estado vital, pela re-visão do prontuário ou registros de morte nacional, com base no nome completo, data de nascimento, número de prontuário e número do seguro social. Quando a data da morte do paciente não estava disponível, os pacientes foram censurados na data do último contato. Desfechos clínicos foram julgados até o fim do seguimento original por um comitê de eventos independente e cego. No estudo de seguimento FREEDOM, nenhum julgamento

de morte foi realizado. O convite inicial para participar no estudo de seguimento FREEDOM foi estendido a todos os centros do ensaio clínico FREEDOM original. Os centros de maior volume concordaram em participar e contratar o centro coordenador.

suPeRvisão do estudo. O estudo de seguimento FREEDOM foi desenvolvido pelos membros do comitê executivo do ensaio clínico FREEDOM, que também foram responsáveis pela condução, análise e decisão de enviar o artigo para publicação. A coleta de dados para este estudo de seguimento prolongado foi reali-zada pelos pesquisadores e coordenadores do estudo em cada centro participante, e a análise dos dados foi realizada pelo estatístico do estudo (T.H.). O protocolo do FREEDOM original e do seguimento FREEDOM foi

FiguRa 1 Fluxo de pacientes no ensaio clínico FREEDOM original e no estudo de seguimento FREEDOM

Após a conclusão do FREEDOM (avaliação futura de revascularização em pacientes com diabetes melito: manejo ideal da doença multiarterial) inicial, centros e pacientes foram convidados a participar do estudo de seguimento FREEDOM. Um total de 25 centros aceitou participar, resultando em uma população de 943 pacientes. Excluindo os pacientes que faleceram (n = 104), retiraram o consentimento ou foram perdidos para o seguimento (n = 66) durante o seguimento do FREEDOM original, 773 pacientes estavam disponíveis para serem seguidos. No fim, a informação de seguimento foi obtida de 766 pacientes (99% dos pacientes no seguimento FREEDOM). A expressão “encerramento precoce” nas caixas inferiores refere-se a indivíduos que foram perdidos para o seguimento ou retiraram consentimento antes do início do estudo de seguimento FREEDOM. Como observado na figura, houve diferenças numéricas nos números de encerramento precoce e status de morte faltantes entre os 2 grupos de tratamento. ICP = intervenção coronária percutânea; RME = revascularização miocárdica com enxerto.

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aprovado pelo comitê de ética em pesquisa institucional local em cada centro participante.

análises estatístiCas. O desfecho primário do estudo de seguimento FREEDOM foi inicialmente pla-nejado para ser o mesmo o do ensaio clínico FREEDOM, ou seja, um composto de mortalidade por todas as causas, infarto do miocárdio não fatal e AVC não fatal. Muitos centros só foram capazes de coletar dados sobre mortalidade (estado vital), o que levou a uma mudança no desfecho primário do presente relatório para morta-lidade por todas as causas apenas. Essa análise primária de mortalidade por todas as causas foi realizada de acordo com a intenção de tratar (IDT), incluindo todos

os indivíduos registrados no ensaio clínico FREEDOM (coorte completa). A análise foi repetida no subconjunto dos sujeitos do FREEDOM que estavam registrados nos centros participantes do seguimento (coorte de seguimento). Uma análise secundária sem IDT também foi realizada, na qual os pacientes foram classificados de acordo com o procedimento de revascularização inicial efetivamente recebido. Ela foi utilizada como uma análise de sensibilidade para nossos resultados, permitindo a avaliação da robustez dos resultados do estudo de seguimento.

As características basais são resumidas como média ± DP para variáveis contínuas e proporções para as vari-

tabela 1 Características basais dos pacientes de acordo com o tratamento randomizado e coorte de seguimento

Seguimento prolongado Nenhum seguimento prolongado

Valor de pICP (n = 478) RME (n = 465) ICP (n = 475) RME (n = 482)

Idade na randomização, anos 63,4 ± 8,4 63,0 ± 9,1 62,9 ± 9,3 63,1 ± 9,4 0,52

Masculino 337 (70,5) 314 (67,5) 361 (76,0) 344 (71,4) 0,03

Hemoglobina glicada, % 7,9 ± 1,9 7,8 ± 1,7 7,6 ± 1,6 7,6 ± 1,6 0,03

Tabagismo corrente 61 (12,8) 75 (16,1) 80 (16,8) 82 (17,0) 0,13

Hipertensão 395 (82,6) 399 (85,8) 411 (86,5) 407 (84,4) 0,44

AVC prévio 10 (2,1) 7 (1,5) 27 (5,7) 21 (4,4) <0,001

Infarto do miocárdio prévio 141 (29,5) 141 (30,3) 109 (22,9) 96 (19,9) <0,001

Síndrome coronariana aguda recente 143 (29,9) 127 (27,3) 161 (33,9) 152 (31,5) 0,05

Colesterol total, mg/dL 166,4 ± 72,1 166,6 ± 45,8 171,7 ± 109,6 166,8 ± 44,7 0,75

Colesterol LDL, mg/dL 91,4 ± 32,7 93,4 ± 37,6 93,4 ± 37,9 92,9 ± 36,8 0,98

Colesterol HDL, mg/dL 38,5 ± 10,9 38,9 ± 10,8 39,5 ± 10,9 40,0 ± 12,0 0,03

Mediana de triglicerídeos, mg/dL 184,4 ± 307,8 177,2 ± 136,7 203,3 ± 496,6 178,5 ± 127,4 0,95

IMC, kg/m2 29,5 ± 5,5 29,7 ± 5,2 29,7 ± 5,2 29,9 ± 5,4 0,31

Depuração de creatinina, mL/min 89,0 ± 50,0 86,5 ± 34,1 90,9 ± 37,8 90,2 ± 45,4 0,10

Microalbuminúria, mg/dL 94,6 ± 227,4 117,0 ± 295,7 89,1 ± 364,6 76,3 ± 188,1 0,27

Fração de ejeção do ventrículo esquerdo

Porcentagem do PIB 65,8 ± 12,2 66,2 ± 10,4 65,6 ± 12,0 67,1 ± 10,6 0,52

<40% 11/335 (3,3) 4/322 (1,2) 10/306 (3,3) 7/328 (2,1) 0,65

EuroSCORE 0,17

Média 2,5 ± 2,0 2,7 ± 2,2 2,8 ± 2,7 2,8 ± 2,8

Mediana (intervalo interquartil) 1,8 (1,2-3,0) 1,9 (1,2-3,2) 2,0 (1,3-3,2) 2,1 (1,3-3,3)

Escore SYNTAX 0,04

Média 25,5 ± 8,5 26,2 ± 9,4 26,9 ± 8,2 26,1 ± 8,1

Mediana (intervalo interquartil) 25,0 (20,0-31,0) 25,5 (19,0-32,0) 27,0 (21,0-31,5) 26,0 (20,0-31,0)

Categoria 0,08

Baixa 180/474 (38,0) 173/459 (37,7) 149/475 (31,4) 167/479 (34,9)

Intermediária 210/474 (44,3) 186/459 (40,5) 228/475 (48,0) 220/479 (45,9)

Alta 84/474 (17,7) 100/459 (21,8) 98/475 (20,6) 92/479 (19,2)

Doença triarterial 386/474 (81,4) 379/459 (82,6) 394/474 (83,1) 414/480 (86,3) 0,12

Oclusão total crônica 147/2.729 (5,4) 162/2.759 (5,9) 176/2.835 (6,2) 167/2.903 (5,8) 0,35

Uso de insulina 150/477 (31,4) 141/465 (30,3) 172/475 (36,2) 152/482 (31,5) 0,17

Uso de medicamentos orais redutores de glicose 386/477 (80,9) 382/465 (82,2) 350/475 (73,7) 347/482 (72,0) <0,001

Nº total de lesões por stent em todas as fases 3,4 ± 1,3 — 3,7 ± 1,5 — 0,01

Cirurgia sem circulação extracorpórea — 82/440 (18,6) — 83/453 (18,3) 0,87

Nº de artérias com enxerto — 2,9 ± 0,8 — 2,9 ± 0,8 0,74

Enxerto de artéria torácica interna esquerda — 415/440 (94,3) — 428/453 (94,5) >0,99

Enxerto de artéria torácica interna-bilateral — 54/440 (12,3) — 56/453 (12,4) >0,99

Enxerto de artéria torácica interna esquerda e radial — 28/440 (6,4) — 56/453 (12,4) 0,003

Valores são média ± DP, n (%) ou n/N (%), salvo indicação em contrário. Os valores de p para comparações entre pacientes com e sem seguimento prolongado. Não houve diferenças significativas entre os braços de tratamento (RME vs. ICP) dentro de cada coorte de seguimento.HDL = lipoproteína de alta densidade; ICP = intervenção coronária percutânea; IMC = índice de massa corporal; LDL = lipoproteína de baixa densidade; RME = revascularização miocárdica com enxerto.

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áveis categóricas, por grupo de tratamento no grupo de seguimento prolongado e não prolongado. As variáveis contínuas foram comparadas por meio do teste t de Student ou do teste rank sum de Wilcoxon para variáveis contínuas e o teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher para variáveis categóricas. A mortalidade por todas as causas foi descrita utilizando as estimativas de Kaplan-Meier e comparadas pelo teste log-rank. Análises do tipo multivariada temporal para mortalidade por todas as causas ajustada para covariáveis, de subgrupo e de interação foram realizadas utilizando regressão de riscos proporcionais de Cox. A não proporcionalidade foi testada com a interação do tratamento e o tempo de so-brevida, e explorada com curvas log(−log[sobrevida]) (9). Um modelo de perigo não proporcional, permitindo um efeito diferente de tratamento antes e após os primeiros 2 anos de seguimento também foi aplicado e comparado ao modelo com um efeito de tratamento constante. Variá-veis basais significativas entre comparação de coorte de seguimento prolongado ou não prolongado, ou no teste de interação, foram incluídas na análise multivariada. Um nível alfa bilateral <0,05 foi considerado para indicar significância para a temporalidade das análises de mortalidade por todas as causas e testes de interação de subgrupo, e um valor de p <0,01 foi considerado estatisti-camente significante para as comparações de coortes de seguimento prolongado ou não prolongado. SAS versão 9.4 (SAS Institute, Cary, North Carolina, EUA) e R versão 3.5.1 (R Foundation, Viena, Áustria, EUA) foram utilizados para realizar as análises estatísticas.

Resultados

CaRaCteRístiCas basais. Um total de 25 centros concordou em participar do estudo de seguimento FREEDOM, resultando no seguimento de longo prazo de 943 pacientes (49,6% da coorte original completa dos 1.900 pacientes do ensaio clínico FREEDOM). O fluxo detalhado de pacientes do ensaio original e do estudo de seguimento é apresentado na Figura 1.

As características basais estão resumidas na Tabela 1, de acordo com o grupo de tratamento randomizado nas dentro das coortes de seguimento prolongado ou não prolongado. Quando comparados com pacientes sem seguimento prolongado, aqueles com seguimento prolongado foram menos propensos a ter um histórico de AVC (p < 0,001) e a receber um enxerto radial (p = 0,003) e tinham maior probabilidade de ter um infarto do miocárdio prévio (p < 0,001) e de estarem recebendo medicamentos orais de redução de glicose no momento da randomização (p < 0,001). No entanto, nenhuma das características basais foi diferente estatisticamente de maneira significativa entre ICP-SF e RME nas coortes com seguimento prolongado ou não prolongado.

seguiMento da CooRte PRolongada. A duração mediana de seguimento para a coorte com-pleta de todos os pacientes durante o ensaio clínico FREEDOM original foi de 3,8 anos (intervalo de 0,0 a 6,9 anos; intervalo interquartil: 2,5 a 4,9 anos (média 3,6 ± 1,6 anos). A duração mediana de seguimento no ensaio clínico FREEDOM original para sujeitos que

FiguRa 2 Estimativas de Kaplan-Meier da sobrevida nos 2 grupos de tratamento

(A) As curvas de sobrevida para toda a coorte com todos os pacientes registrados no ensaio clínico FREEDOM, de acordo com o grupo de tratamento (n = 1.900). (B) As curvas de sobrevida para pacientes da coorte de seguimento prolongado, de acordo com o grupo de tratamento (n = 943). IC = intervalo de confiança; RR = razão de risco; outras abreviaturas conforme a Figura 1.

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FiguRa 3 Análise de subgrupo de mortalidade por todas as causas para a coorte completa

O efeito do tratamento comparou ICP com stents farmacológicos vs. RME, ambos com terapia médica ideal. RR para FEVE <40%: 2,70 (IC 95%: 0,58 a 12,50); ausência de envolvimento DAE 1,88 (IC 95%: 0,78 a 4,49); e histórico positivo de AVC: 1,83 (IC 95%: 0,57 a 5,86). DAE = artéria descendente anterior esquerda; FEVE = fração de ejeção do ventrículo esquerdo; outras abreviaturas conforme as Figuras 1 e 2.

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foram mais tarde incluídos na coorte de seguimento prolongado foi de 3,6 anos (intervalo de 0,0 a 6,9 anos; intervalo interquartil: 2,5 a 5,0 anos (média 3,6 ± 1,6 anos). Somando-se o período de seguimento durante o ensaio clínico FREEDOM original e o seguimento du-rante o estudo de seguimento FREEDOM, os pacientes da coorte de seguimento foram seguidos por 7,5 anos (variação de 0,0 a 13,2 anos; intervalo interquartil: 5,0 a 9,0 anos (média de 6,7 ± 3,1 anos). Este é um aumento de 3,9 anos no seguimento mediano ou um aumento de 3,1 ± 2,3 anos no seguimento em média.

análise de sobRevida. Coorte completa. Um total de 314 pacientes foi a óbito durante o período de segui-mento: 204 mortes ocorreram durante o ensaio clínico FREEDOM original, e 110 no estudo de seguimento FREEDOM. A Figura 2A mostra as curvas de sobrevida para até 8 anos do seguimento para a coorte completa de todos os pacientes registrados no ensaio clínico FREEDOM. A taxa de evento de seguimento aos 8 anos foi de 24,3% (159 mortes) no grupo ICP-SF, em oposição a 18,3% (112 mortes) do grupo RME não ajustado (razão de risco não ajustada [RR]: 1,36; intervalo de confiança de 95% (IC): 1,02 a 1,74; p = 0,01). A interação em tempo de tratamento não foi estatisticamente significativa (p = 0,27). A curva log(−log[função de sobrevida]) apresenta a sobreposição das curvas nos primeiros 2 anos, e elas tornam-se, então, paralelas (Figuras On-line 1A a 1C). Considerando que uma RR de um tratamento não constante na morte por todas as causas sugeriu um atraso no efeito do tratamento, não houve diferença de tratamento durante os primeiros 2 anos (RR: 1,04; IC 95%: 0,73 a 1,50; p = 0,82), mas a ICP tinha um maior risco de morte após o segundo ano (RR: 1,69; IC 95%: 1,22 a 2,36; p = 0,002). A comparação entre o modelo colocado com e sem uma RR constante resultou em um valor de p de 0,051. Os resultados das análises não IDT foram semelhantes.Coorte de seguimento prolongado. Com a conside-ração de apenas pacientes de centros que participaram no estudo de seguimento FREEDOM (943 pacientes), houve 99 mortes (23,7% de taxa de eventos) no grupo ICP-SF e 72 mortes (18,7% de taxa de eventos) no grupo RME (RR não ajustada: 1,32; IC 95%: 0,97 a 1,78; p = 0,076) mais de 8 anos de seguimento (Figura 2B). Os re-sultados das análises não IDT foram semelhantes. Cabe notar que 17 centros (representando 415 pacientes) também registraram dados sobre infarto do miocárdio (proporção de eventos: 4,7% no grupo ICP [10 eventos] vs. 4,0% [8 eventos] no grupo RME) e AVC (proporção de eventos: 2,3% no grupo ICP [5 eventos] vs. 1,5% [3 eventos] no grupo RME) durante o período de segui-mento prolongado.

CooRte de seguiMento PRolongado vs. não

PRolongado no ensaio ClíniCo oRiginal.

Para descobrir se o seguimento de 5 anos durante o ensaio clínico FREEDOM original foi diferente entre os pacientes que foram incluídos posteriormente na coorte de seguimento prolongado vs. pacientes sem seguimento prolongado, as curvas de sobrevida para estas 2 coortes são apresentadas nas Figuras On-line 2A e 2B. Os efeitos do tratamento comparando ICP-SF vs. RME foram com-paráveis entre os 2 grupos.

análises MultivaRiáveis e de subgRuPos. Coorte completa. Após controlar as principais ca-racterísticas basais, a análise de regressão de Cox da coorte completa de todos os paciente do ensaio clínico FREEDOM demonstrou que a RR para morte por qual-quer causa durante todo o período de seguimento da pós-revascularização no grupo ICP-SF vs. grupo RME foi de 1,38 (IC de 95%: 1,08 a 1,76; p = 0,01). A Figura 3 apresenta o efeito do tratamento nos diferentes subgrupos de interesse em toda a coorte de todos os pacientes do ensaio clínico FREEDOM. O aumento da sobrevida da RME vs. ICP-SF foi consistente na maioria dos subgrupos. Pacientes mais jovens do que a idade mediana no início do estudo (63,3 anos) tendeu a de-rivar aumento preferencial a partir da RME, bem como aqueles com histórico de tabagismo e pacientes de cen-tros na América do Norte (valores de p para a interação, respectivamente: 0,001, 0,01 e 0,02).

CooRte de seguiMento PRolongado. Tendências semelhantes foram observadas ao realizar análises multivariadas (RR: 1,32; IC 95%: 0,97 a 1,79; p = 0,076), e durante a realização de análises de subgrupos apenas com pacientes de centros com seguimento on-line (Figura 3).

disCussão

Neste estudo de seguimento de longo prazo com-parando revascularização coronariana com ICP-SF ou RME em pacientes com DM e DCM registrados no ensaio clínico FREEDOM, a RME foi associada a uma redução significativa na mortalidade por todas as causas em 8 anos (Ilustração Central). Esses resultados são consistentes com os desfechos de 10 anos do subgrupo de DM do ensaio clínico BARI (2, 4), mesmo depois de considerar os avanços na técnica de ICP (os pacientes do BARI foram submetidos à angioplastia apenas sem colocação de stent) e melhorias na terapia médica. É fundamental que uma melhor terapia médica orientada por diretrizes seja adotada como o pilar no manejo de pacientes com DM e DCM (8).

O FREEDOM foi o primeiro ensaio clínico randomi-zado de poder adequado a comparar ICP-SF com RME

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em pacientes com DM e DCM. Desde a publicação do ensaio clínico FREEDOM original em 2012, diretrizes de prática clínica das principais sociedades internacionais cardiovasculares têm recomendado RME mais do que ICP como o método de escolha de revascularização em pacientes com DM e DCM (10-13). Outros ensaios clínicos de pacientes com DM tiveram um seguimento menor, mas também relataram resultados superiores da RME quando comparado a ICP com stents de metal sem revestimento (14, 15), SF de primeira geração (16-19) e com SF de segunda geração (20). Uma análise combi-nada (21) dos 5.034 pacientes com DM randomizados nos ensaios clínicos FREEDOM, BARI-2D e COURAGE também relatou menor mortalidade associada à revas-cularização miocárdica em comparação com a ICP (RR: 0,76; IC 95%: 0,60 a 0,96; p = 0,024) após uma mediana de 4,5 anos de seguimento. Além disso, Head et al. (22) recentemente publicaram uma análise dos pacientes de 11 ensaios clínicos, comparando a RME e a ICP, em que 34,2% dos procedimentos de ICP foram realizados com SF da geração mais recente. No subgrupo de pacientes com DM e DCM (n = 3.266), a ICP foi associada a um risco

maior de mortalidade por todas as causas em 5 anos (RR: 1,48; IC 95%: 1,19 a 1,84; p = 0,0004).

Apesar de haver novos avanços na ICP desde o ensaio clínico FREEDOM, dados dos últimos 5 anos continuam a sustentar a RME em comparação à ICP em pacientes com DAC estável e DM. Uma análise baseada em registro de todos os procedimentos de revascularização realizados em pacientes com DM e DCM na província de British Columbia, Canadá, relatou que a RME foi associada a uma menor taxa de mortalidade em comparação à ICP (7,8% vs. 12,2%; p < 0,01) após um seguimento mediano de 3,3 anos (23). Além disso, o ensaio clínico BEST randomizou 880 pacientes com DCM (aproximadamente 40% com DM) e demonstrou uma taxa significativamente maior do prin-cipal desfecho composto de morte, infarto do miocárdio, revascularização do vaso-alvo após ICP com SF com evero-limus quando comparada à RME (20). Além disso, as taxas de infarto do miocárdio espontâneo e revascularização devido a novas lesões foram significativamente maiores na ICP vs. braços de RME – sugere-se que a proteção de ambas possa ser o mecanismo de aumento com RME em pacientes com aterosclerose difusa como DM (24).

ilustRação CentRal Curvas de sobrevida de acordo com a estratégia de revascularização no estudo de seguimento FREEDOM

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Estimativas de Kaplan-Meier e curvas de sobrevida, incluindo todos os pacientes registrados no ensaio clínico FREEDOM (avaliação futura de revascularização em pacientes com diabetes melito: manejo ideal da doença multiarterial) (coorte completa dos pacientes). A revascularização miocárdica resulta em um aumento da sobrevida em longo prazo em pacientes com diabetes e doença coronariana multiarterial, quando comparada à revascularização com intervenção coronária percutânea e stents farmacológicos.

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No ensaio clínico FREEDOM original, as curvas de mortalidade para ICP-SF vs. RME começaram a se separar durante o segundo ano de seguimento. Com seguimento de longo prazo, as curvas continuaram a se separar, tornando essa diferença mais pronunciada. Cabe notar que a mesma tendência de mortalidade foi observada nas curvas de sobrevida compostas por pacientes apenas com seguimento prolongado, e a falta de significância estatística nesta coorte pode ser devida à falta de poder. O seguimento FREEDOM apresentou tendências importantes de maior benefício da RME em pacientes que eram mais jovens, tinham uma histórico de tabagismo e que foram registrados em centros norte-americanos; todas merecem uma avaliação mais aprofundada. Na metanálise realizada por Head et al. (22), não foi encontrada interação entre idade e método de revascularização após 5 anos de seguimento. Para pacientes mais jovens, o maior benefício da RME no seguimento FREEDOM sustenta a hipótese de que o número de anos de vida adquirido somente pode ser avaliado pelo seguimento prolongado para além de 5 anos, e introduz a idade como um potencial deter-minante principal no processo de tomada de decisão quanto ao modo ideal de revascularização em pacientes com DM e DCM. O histórico de tabagismo foi avaliado na coorte com DM no ensaio clínico BARI e, após 7 anos de seguimento, ao contrário dos nossos achados, não houve aumento diferencial da sobrevida em fumantes vs. não fumantes, de acordo com o modo de revascularização (25). Por último, o estudo de seguimento FREEDOM corrobora a tendência observada no ensaio clínico FREEDOM original de que diferenças regionais também podem ser um determinante de desfechos clínicos após revascularização coronariana.

liMitações do estudo. Primeiro, a coorte de pacientes com seguimento prolongado incluiu apenas metade (49,6%) da população do ensaio clínico FRE-EDOM original. No entanto, é importante considerar que a randomização do ensaio clínico FREEDOM foi estratificada por centro, e uma bastante elevada de seguimento global (99%) foi obtida em centros par-ticipantes do estudo de seguimento FREEDOM. Além disso, havia apenas poucas diferenças basais entre as coortes com e sem seguimento prolongado, o que não parece ter uma grande inf luência na sobrevida de longo prazo, embora confundidores teoricamente não medidos também possam intervir nos resultados. Em segundo lugar, embora esforços tenham sido feitos para entrar em contato com todos os pacientes nos centros participantes, por telefone ou por e-mail, houve uma pequena proporção de pacientes que foi perdida no seguimento ou retirou o consentimento antes e durante o estudo de seguimento FREEDOM,

e este foi numericamente maior no grupo RME, como ilustrado na Figura 1. Além disso, para uma minoria de pacientes de ambos os grupos de tratamento, o estado vital foi obtido por meio de registros administrativos locais. No entanto, ele é composto por apenas uma pequena porcentagem da população (<10%) e, mesmo considerando que essas fontes de dados possam ser menos robustas, é improvável que altere os resultados do estudo global. Em terceiro lugar, na última década, as plataformas de stent continuaram a evoluir à me-dida que a geração mais nova de stents foi adotada na prática. Esses novos stents estavam, em grande parte, indisponíveis durante o período de registro do ensaio clínico FREEDOM. Os resultados do FREEDOM devem ser interpretados com base na totalidade das evidên-cias que demonstram que mudanças nas plataformas de ICP não alteraram significativamente o tamanho do efeito da vantagem de sobrevida de longo prazo da RME sobre a ICP (22). As opções de tratamento médico para DM também evoluíram na última década, pois novos hipoglicemiantes também estão associados a reduções nas principais taxas de eventos adversos cardiovas-culares e cerebrovasculares (26, 27). A combinação desses novos medicamentos para reduzir a glicose com uma estratégia de revascularização contemporânea ainda tem de ser estudada. Por fim, dados relativos à terapia médica concomitante, procedimentos de revas-cularização adicional ou outros desfechos clinicamente relevantes, como infarto do miocárdio e AVC, estavam disponíveis apenas em centros selecionados durante o período de seguimento e, portanto, não foram inclu-ídos na presente análise. Nós não conseguimos avaliar a contribuição da revascularização incompleta para sobrevida no FREEDOM, pois ela não foi avaliada no momento da avaliação angiográfica principal no labo-ratório. No entanto, este estudo fornece maior dados de seguimento sobre mortalidade por todas as causas após a randomização dos pacientes com DM e DCM, sem doença com acometimento do tronco da artéria coronária esquerda, para ICP-SF ou RME.

ConClusões

No presente estudo de seguimento FREEDOM, rea-lizamos uma análise de sobrevida de longo prazo dos pacientes registrados no ensaio clínico FREEDOM. Em pacientes com DM e DCM e sem doença com acometi-mento do tronco da artéria coronária esquerda, a RME continua a ser superior à ICP-SF na redução da mortali-dade por todas as causas em um seguimento de 8 anos. Esses dados sustentam as recomendações atuais de que a RME seja considerada a estratégia de preferência para revascularização nesses pacientes.

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CoRResPondÊnCia. Dr. Michael E. Farkouh, Peter Munk Cardiac Centre, 585 University Avenue–4N474, Toronto, Ontario M5G 2N2, Canadá. E-mail: [email protected]. Twitter: @drmikefarkouh. OU Dr. Valentin Fuster, Mount Sinai School of Medicine, Cardio-vascular Institute, One Gustave Levy Place, Box 1030, New York, New York, EUA 10029-6500. E-mail: [email protected]. OU Centro Nacional de Investi-gaciones Cardiovasculares Carlos III, Madrid, Espanha. E-mail: [email protected].

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PALAVRAS-CHAVE doença arterial coronariana, revascularização coroniana, diabetes

APÊNDICE Para acesso a uma tabela e figuras suplementares, consulte a versão on-line deste artigo.

PeRsPectivas

CoMPetÊnCia eM ConheCiMento MédiCo. A revascularização cirúrgica de pacientes com dia-betes e DCM está associada a menor mortalidade em relação à ICP.

PanoRaMa tRanslaCional. Avanços na te-rapia médica, na tecnologia da ICP e nas técnicas de RME na década desde que se iniciou o ensaio clínico FREEDOM devem ser levados em conta ao considerar a revascularização de pacientes com diabetes e doença arterial coronariana.

MoreiraComentário Editorial

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CoMentáRio editoRial

Resultados de longo prazo do estudo FREEDOM: a evidência definitiva em favor da cirurgia de revascularização miocárdica?Humberto Graner Moreira, MD*

*Universidade Federal de Goiás – UFG, Goiânia, GO, Brasil.

A prevalência de diabetes mellitus tem aumentado progressivamente nas populações de países de-senvolvidos e em desenvolvimento, e é uma das

principais preocupações de políticas de saúde pública pela elevada morbidade e mortalidade1. Juntos, os países de língua portuguesa possuem mais de 14,5 milhões de diabéticos1. A principal causa de mortalidade nesses pacientes são as doenças cardiovasculares, incluindo a doença arterial coronária (DAC). Esta é complicação frequente e muitas vezes mais complexa do que na-queles não-diabéticos. Variados graus de inflamação e disfunção endotelial induzidos pelos estados hipergli-cêmicos faz com que esses pacientes se apresentem com uma carga aterosclerótica maior e mais difusa. Por isso, muitos irão apresentar DAC multiarterial, e a revascula-rização miocárdica será sempre considerada como uma possibilidade terapêutica.

A jornada na busca de uma evidência definitiva sobre a melhor estratégia, se intervenção coronária percutânea (ICP) ou cirurgia de revascularização miocárdica (CRM), tem sido longa. Muitos dos ensaios clínicos desenhados para fornecer essas respostas utilizaram técnicas e critérios de inclusão diferentes, dificultando a comparação entre os mesmos. Ainda na era pré-stent, o estudo BARI (Bypass Angioplasty and Revascularization Investigation) randomizou 1.829 pacientes com DAC envolvendo duas ou mais artérias coronárias para serem tratados por CRM ou ICP com balão. Num pequeno subgrupo de 343 pacientes com diabetes, aqueles submetidos à cirurgia apresentaram melhor sobrevida aos 5 e 10 anos quando comparados àqueles submetidos à angioplastia (80,6% vs. 65,5 %, p=0,003 aos 5 anos; 57,8% vs. 45,5%, p=0,025 aos

10 anos)2. Pouco tempo depois, o BARI-2D (Bypass Angioplasty Revascularization Investigation 2 Diabetes) comparou estratégia inicial de revascularização com CRM ou ICP (com stents convencionais ou farmacoló-gicos de primeira geração) versus tratamento clínico em 2.368 diabéticos com DAC. O objetivo principal não era a comparação específica entre os métodos de revascularização, mas, embora o resultado global do estudo tenha sido neutro, uma menor incidência do desfecho composto de morte, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral (AVC) foi observada nos pacientes submetidos à CRM em comparação com tra-tamento medicamentoso isolado3. Já o estudo CARDia (Coronary Artery Revascularization in Diabetes) avaliou 510 pacientes com diabetes e DAC multiarterial ou lesão complexa de vaso único, e não mostrou diferença no desfecho composto (morte, infarto do miocárdio e AVC) entre os grupos submetidos à CRM e à ICP (10,5% vs. 13,5%, p=0,39)4. Por outro lado, um subgrupo do es-tudo SYNTAX (Synergy between Percutaneous Coronary Intervention with Taxus and Cardiac Surgery) de 452 pacientes diabéticos com DAC multiarterial, ou com lesão de tronco, apontou maior incidência de eventos cardiovasculares adversos naqueles que realizaram angioplastia com stent farmacológico de primeira geração (46,5%) em comparação àqueles submetidos à CRM (29,0%, P <0,001)5.

Mas foi o estudo FREEDOM (Future Revasculariza-tion Evaluation in Patient with Diabetes Mellitus: Op-timal Management of Multivessel Disease) que se propôs a dar uma resposta aparentemente definitiva sobre o assunto ao randomizar 1.900 pacientes com diabetes e DAC multiarterial para revascularização cirúrgica ou

MoreiraComentário Editorial

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percutânea. A idade média foi 63 anos, com predomínio do sexo masculino (71%), na maioria portadores de DAC estável (79%) e função ventricular normal (2,5% com FEVE <40%). Após uma mediana de seguimento de 3,8 anos, a incidência do desfecho primário de morte, infarto do miocárdio e AVC no grupo submetido a CRM foi significativamente menor do que no grupo submetido a ICP com stents farmacológicos (18,7% vs. 26,6%, respectivamente, p=0,005)6. O benefício em termos de redução de morte (10,9% vs. 16,3%, respec-tivamente, p=0,049) e infarto do miocárdio (6,0% vs. 13,9%, respectivamente, p<0,001) a favor da cirurgia parecia contrabalancear o maior risco de AVC nesses pacientes (5,2% vs. 2,4%, respetivamente, p=0,034). Apesar das limitações desse estudo, ele foi o principal balizador das atuais diretrizes que apontam a CRM como sendo preferível à ICP em pacientes com diabetes e DAC multiarterial, caso o pacientes seja elegível para ambos, independente do escore SYNTAX7,8.

Mas, como é sempre possível conhecer um pouco mais sobre a evolução de determinado grupo de pacientes ao longo do tempo, os investigadores prin-cipais do estudo FREEDOM propuseram seguir aqueles pacientes por um tempo ainda maior. O objetivo era a mortalidade a longo prazo relacionada à estratégia de revascularização originalmente alocada. Para o FRE-EDOM Follow-On, cujos resultados estão publicados nesse jornal, foram seguidos 943 pacientes (49,6% da amostra inicial) de apenas 25 centros, dos 140 origi-nalmente participantes9. As características basais foram similares àqueles não incluídos. A mediana de acompanhamento foi de 7,5 anos, e o desfecho primário foi a mortalidade por todas as causas, já que muitos centros não conseguiram outros dados para além do status vital dos pacientes. Quando foram analisados todos os 1.900 pacientes originalmente incluídos no FREEDOM, a mortalidade foi significativamente menor em pacientes submetidos a CRM em comparação à ICP (18,3% vs. 24,3%, respectivamente, P=0,01). Quando a análise se restringiu apenas aos 943 pacientes do estudo estendido, a diferença na mortalidade, embora presente, não foi significativa (18,7% vs. 23,7%, respectivamente, P=0,076). Análises de subgrupos sugerem ainda que pacientes mais jovens (≤63,3 anos) se beneficiaram ainda mais da CRM, com mortalidade de 9,4% em 8 anos de seguimento, quando comparados àqueles mais velhos (Pinteração<0,001). Os autores con-cluem que os pacientes com diabetes e DAC multivas-cular, a revascularização miocárdica por CRM reduziu a mortalidade por todas as causas a longo prazo, em comparação com a ICP com stents farmacológicos.

Seria este o fim da jornada, a conclusão definitiva sobre a melhor estratégia de revascularização em diabéticos com DAC multiarterial? Certamente, não.

O mesmo longo tempo que premia com informações singulares de seguimentos duradouros, também castiga com relação à obsolescência de tecnologias e métodos terapêuticos. Afinal, muitos dados do estudo FREEDOM Follow On caducaram. A população ori-ginal foi recrutada entre 2005 e 2010 e, desde então, diversos avanços tecnológicos e farmacológicos foram incorporados e tem impactado no prognóstico desses pacientes. Os stents revestidos com sirolimus ou pacli-taxel (mais de 90% das angioplastias no FREEDOM) já não são mais utilizados na prática clínica, e stents far-macológicos de nova geração, mais seguros e eficazes, são amplamente disponíveis. A própria decisão para a intervenção percutânea é mais criteriosa e assertiva, com base em medidas de FFR (reserva de f luxo fracio-nada) e iFR (razão de onda livre instantânea). Também assistimos ao desenvolvimento de novas classes de hipoglicemiantes, como os agonistas do receptor GLP-1 e os inibidores da SGLT-2, que tem demonstrado redução consistente de eventos cardiovasculares em diabéticos10. Como a combinação destes avanços resul-tariam em desfechos diferentes para esses pacientes são novos caminhos a percorrer.

Mais do que um ensaio clínico randomizado de longa duração, os resultados desta coorte do estudo original devem ser interpretados como insights sobre a melhor estratégia de revascularização miocárdica nesses pacientes. Afinal, perde-se poder estatístico quando se considera que menos da metade dos pacientes foram seguidos. Além disso, do desfecho primário original composto morte por todas as causas, infarto do mio-cárdio e AVC, apenas o primeiro foi possível ser aferido a longo prazo. E quanto às maiores taxas de infarto do miocárdio nos pacientes submetidos à ICP no estudo FREEDOM original? Ou o excesso AVC no grupo subme-tido à CRM? Essas são algumas das informações que continuaram sem resposta no longo prazo.

Como os dados desse seguimento estendido do FRE-EDOM pode ajudar na prática clínica nos países de língua portuguesa? Para além das limitações acima citadas, há que se considerar ainda dois aspectos. Primeiro, repor-tada ainda na publicação original, a mortalidade após 30 dias da CRM foi 1,7%, um índice notável e muito abaixo da média observada em diferentes países. Logo, a supe-rioridade da cirurgia sobre a intervenção percutânea pode ficar comprometida, caso esta seja realizada em instituições com mortalidade cirúrgica mais elevadas. Segundo, a taxa de morte de morte entre os pacientes submetidos à CRM em 8 anos foi significativamente mais baixa na América do Norte do que em outros pa-íses (13,8% vs. 21,5%, respectivamente, Pinteração=0,02). Mesmo sendo uma análise de subgrupos, este dado restringe a aplicabilidade universal dos achados desse estudo e deve ser levada em consideração.

MoreiraComentário Editorial

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Por fim, estes resultados não contradizem os achados originais do estudo FREEDOM, e ainda apontam na mesma direção das recomendações internacionais de que diabéticos do tipo 2 com doença coronariana com-plexa e fração de ejeção preservada tem maior benefício com a revascularização por CRM em relação à ICP. E a despeito das fragilidades metodológicas, estas reforçam

a importância de uma abordagem multidisciplinar que leve em consideração todas as variáveis envolvidas, em uma discussão aberta entre o Heart Team, o paciente e sua família. Além disso, mais do que definir qual estratégia de revascularização escolher, é necessário o controle agressivo do diabetes e dos fatores de risco cardiovasculares associados. A jornada continua.

1. International Diabetes Federation. IDF Diabetes Atlas, 8th edn. Brussels, Belgium: International Diabetes Federation, 2017.

2. BARI Investigators. The final 10-year follow-up results from the BARI randomized trial. J Am Coll Cardiol 2007;49:1600-6.

3. Group BDS, Frye RL, August P, et al. A randomized trial of therapies for type 2 diabetes and coronary artery disease. N Engl J Med. 2009;360:2503–15.

4. Kapur A, Hall RJ, Malik IS, et al. Randomized comparison of percutaneous coronary intervention with coronary artery bypass grafting in diabetic patients. 1-year results of the CARDia (Coronary Artery Revascularization in Diabetes) trial. J Am Coll Cardiol 2010;55:432-40.

5. Kappetein AP, Head SJ, Morice MC, et al. Treatment of complex coronary artery disease in patients with diabetes: 5-year results comparing outcomes of bypass surgery and percutaneous

coronary intervention in the SYNTAX trial. Eur J Cardiothorac Surg 2013;43:1006-13.

6. Farkouh ME, Domanski M, Sleeper LA, et al. Strategies for multivessel revascularization in patients with diabetes. N Engl J Med 2012;367:2375–2384.

7. Patel MR, Calhoon JH, Dehmer GJ, Grantham JA, Maddox TM, Maron DJ, Smith PK. ACC/AATS/AHA/ASE/ASNC/SCAI/SCCT/STS 2017 appropriate use criteria for coronary revascularization in patients with stable ischemic heart disease: a report of the American College of Cardiology Appropriate Use Criteria Task Force, American Association for Thoracic Surgery, American Heart Association, American Society of Echocardiography, American Society of Nuclear Cardiology, Society for Cardiovascular Angiography and Interventions, Society of Cardiovascular Computed Tomography, and Society of Thoracic Surgeons. J Am Coll Cardiol 2017;69:2212–41.

8. Neumann FJ, Sousa-Uva M, Ahlsson A, Alfonso F, Banning AP, Benedetto U, Byrne RA, Collet JP, Falk V, Head SJ, Jüni P, Kastrati A, Koller A, Kristensen SD, Niebauer J, Richter DJ, Seferovic PM, Sibbing D, Stefanini GG, Windecker S, Yadav R, Zembala MO; ESC Scientific Document Group. 2018 ESC/EACTS Guidelines on myocardial revascularization. Eur Heart J. 2019 Jan 7;40(2):87-165

9. Farkouh ME, Domanski M, Dangas G, et al. Long-term survival following multivessel revascularization in patients with diabetes: the FREEDOM Follow-On study. J Am Coll Cardiol 2019;73:629-38.

10. Zelniker TA, Wiviott SD, Raz I, et al. SGLT2 inhibitors for primary and secondary prevention of cardiovascular and renal outcomes in type 2 diabetes: a systematic review and meta‐analysis of cardiovascular outcome trials. Lancet. 2018;393(10166):31–39.

ReFeRÊnCias

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 9 P O R A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

P U B L I C A D O P O R E L S E V I E R

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I S S N 0 7 3 5 - 1 0 9 7

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Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster, em JACC.org

o PResente e o FutuRo

REVISÃO DO ESTADO DA ARTE DO JACC

Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidez

Revisão do Estado da Arte do JACC

Dan G. Halpern, MD,a Catherine R. Weinberg, MD,a Rebecca Pinnelas, MD,a Shilpi Mehta-Lee, MD,b Katherine E. Economy, MD,c Anne Marie Valente, MDd

Resumo

A quantidade de doenças cardiovasculares que trazem complicações à gravidez está aumentando a prevalência secundária à idade materna avançada, aos fatores de riscos cardiovasculares e ao tratamento bem-sucedido das condições de doença cardíaca congênita. As alterações fisiológicas da gravidez podem alterar as propriedades do medicamento, afetando a mãe e o feto. A familiaridade com os atributos fisiológicos e farmacológicos é fundamental para o manejo com sucesso de gestantes com doença cardíaca. Esta revisão resume os dados publicados, as diretrizes disponíveis e as recomendações do uso de medicamentos cardiovasculares durante a gravidez. O atendimento a gestantes com doença cardiovascular requer uma abordagem de equipe multidisciplinar com membros da cardiologia, medicina fetal materna, anestesia e enfermagem. (J Am Coll Cardiol 2019;73;457-76) © 2019 pela American College of Cardiology Foundation.

aAdult Congenital Heart Disease Program, Cardiology Division, NYU Langone Health, New York, New York, EUA; bDivision of Maternal Fetal Medicine, Department of Obstetrics & Gynecology, New York University Langone Health, New York, New York, EUA; cPregnancy and Cardiovascular Disease Program, Department of Obstetrics and Gynecology, Division of Maternal Fetal Medicine, Brigham and Women’s Hospital, Harvard Medical School, Boston, Massachusetts, EUA; e dBoston Adult Congenital Heart Disease Program, Boston Children’s Hospital and Brigham and Women’s Hospital, Harvard Medical School, Boston, Massachusetts, EUA. Os autores informaram não ter relações relevantes para os conteúdos deste artigo a serem declaradas.

Manuscrito recebido em 15 de abril de 2018; manuscrito revisado recebido em 19 de outubro de 2018, aceito em 23 de outubro de 2018.

A doença cardiovascular (DCV) é a causa mais comum de mortalidade materna indireta durante a gravidez, afetando de 1% a 2% das gestações e

representando 15,5% das mortes maternas nos Estados Unidos (1, 2). O aumento na idade da primeira gravidez, o aumento do número de mulheres com fatores de risco cardiovasculares, como obesidade, hipertensão e dia-betes, além de uma população crescente de mulheres em idade reprodutiva com cardiopatias congênitas, levaram a um aumento da DCV na gravidez (3, 4). De acordo com o registro ROPAC (Registro de gravidez e doença cardíaca), até um terço das mulheres com DCV usam medicamentos cardíacos durante a gravidez, uso esse que foi associado

ao aumento do risco fetal, como a restrição do crescimento fetal intrauterino (RCIU) (5). Os betabloqueadores foram os medicamentos mais utilizados para DCV, seguidos dos antiagregantes plaquetários e diuréticos (5). A terapia farmacológica para DCV durante a gravidez é um desafio devido ao fato de a farmacocinética de um medicamento poder mudar durante a gestação. A maioria dos dados sobre a segurança do uso de medicamentos durante a gravidez depende de estudos observacionais e da opinião de especialistas. O objetivo desta revisão do estado da arte é fornecer uma atualização sobre as evidências atuais e recomendações para o uso de medicamentos na gravidez em mulheres com DCV.

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alteRações heModinâMiCas da

gRavidez

Durante a gestação, ocorrem alterações fisiológicas complexas e dinâmicas (Figura 1). Essas adaptações continuam conforme o feto cresce e se desenvolve, atingindo o pico no momento do trabalho de parto e no parto em si, continuando durante o período pós-parto. Mulheres saudáveis podem se adaptar sem ter consequ-ências significativas; já em relação a mulheres com con-dições cardíacas subjacentes, essas alterações podem revelar uma condição previamente desconhecida ou exacerbar a hemodinâmica anormal existente. No início da gravidez, há um aumento na massa de eritrócitos. O estrogênio ativa os sistemas renina-angiotensina-aldosterona, aumentando o volume plasmático (até 40% do valor pré-gestacional) e promovendo a retenção de sódio e água 6, 7. O aumento desproporcional de volume leva à hemodiluição e resulta na anemia fisiológica da gravidez. Para acomodar o aumento de volume, ocorre a vasodilatação e o remodelamento vascular com uma redução da resistência vascular sistêmica e pulmonar. No segundo trimestre, a resistência vascular sistêmica cai de 30% a 50% dos valores pré-gestacionais, seguida de um ligeiro aumento no final do terceiro trimestre. A relaxina, a prostaciclina e, possivelmente, o óxido nítrico também contribuem para uma queda na pressão arterial, começando em 6 a 8 semanas. Inicialmente, o débito cardíaco aumenta como resultado de um aumento no volume de bombeamento. Em um momento posterior na gestação, a frequência cardíaca aumenta de 10 a 20 batimentos/min, atingindo um máximo no terceiro trimestre. O efeito líquido dessas alterações fisiológicas é o aumento do débito cardíaco de 30% a 50% acima do nível pré-gestacional em uma gestação única e de até ∼15% a mais para gestações de gêmeos (8).

No momento do trabalho de parto e no parto em si, a frequência cardíaca e as catecolaminas circulantes aumentam, e há de 300 a 500 mL de sangue liberado na circulação com cada contração uterina. Imediatamente após o parto, a autotransfusão com a circulação ute-roplacentária e o aumento do retorno venoso devido à descompressão da veia cava inferior elevam ainda mais a pressão venosa central. O débito cardíaco aumenta em até 50% a 80% após o parto em comparação aos valores pré-trabalho de parto (8). Essas mudanças começam a ser solucionadas dentro das primeiras 48 horas. A maioria das alterações é solucionada dentro das pri-meiras 2 semanas; porém, pode levar até 6 meses para se obter um retorno completo à linha de base (9). Du-rante o trabalho de parto e no período inicial pós-parto, as pacientes estão mais vulneráveis a complicações cardiovasculares devido a essas profundas alterações hemodinâmicas.

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

ACOG = American Congress of Obstetricians and Gynecologists

AMD = alfa-metildopa

ARNi = inibidor do receptor de angiotensina-neprisilina

AVK = antagonista da vitamina K

BCC = bloqueador de canal de cálcio

BRA = bloqueador dos receptores de angiotensina

CF = classe funcional

CPPM = cardiomiopatia periparto

DCV = doença cardiovascular

ECA = enzima conversora da angiotensina

ESC = European Society of Cardiology

FA = fibrilação atrial

FDA = Food and Drug Administration

HBPM = heparina de baixo peso molecular

HCTZ = hidroclorotiazida

HP = hipertensão pulmonar

MAA = medicamento antiarrítmico

QTc = intervalo QT corrigido para frequência cardíaca

RCIU = restrição do crescimento fetal intrauterino

RRGL = Regra de Rotulagem da Gravidez e Lactação

SMF = síndrome de Marfan

TE = taxa de extração

TSV = taquicardia supraventricular

TV = taquicardia ventricular

VAB = valva aórtica bicúspide

VD = ventricular direito

Vd = volume de distribuição

WPW = Wolff-Parkinson-White

FaRMaCoCinétiCa duRante a

gRavidez

A farmacocinética na gravidez é alterada devido a alterações fisiológicas que ocorrem durante toda a gestação e no período pós-parto. Todos os fatos a seguir podem afetar a distribuição e depuração do medicamento: esvaziamento gástrico e motilidade tardios, aumento do volume plasmático e acúmulo de gordura, aumento do volume de distribuição (Vd), diminuição de albumina e de proteínas de ligação ao plasma, aumento da ventilação por minuto e aumento da depuração hepática e renal (10) (Figura 1). A soma dessas alterações geralmente resulta em um efeito farmacoló-gico reduzido do medicamento; no entanto, existem exceções. Poucos estudos abordaram diretamente as propriedades de medicamentos cardiovasculares na gravidez em comparação ao estado não gestacional.

absoRção. Durante a gravidez, os aumentos de progesterona retardam a motilidade no in-testino delgado, além disso, náuseas e vômitos podem inibir a absorção de medicamentos (11, 12). O uso de antiácidos e suplementos de ferro pode diminuir ainda mais a biodisponibilidade de um medicamento devido à quelação no cenário de aumento do pH gástrico (13). Entre-tanto, essas alterações são principalmente teó-ricas, pois vários estudos sobre medicamentos cardíacos, incluindo sotalol e propranolol, não mostraram diferença na biodisponibilidade em comparação ao estado não gestacional (14-16).

voluMe de distRibuição. O aumento de 50% no volume plasmático e na água corporal total aumenta o Vd de substâncias hidrofílicas e lipofílicas (17). Conforme o Vd aumenta durante a gravidez, as concentrações inicial e máxima de um medicamento podem diminuir, exigindo um aumento na dosagem. A meia-vida dos medicamentos é variável, dependendo do Vd e da depuração pelos diferentes sistemas de órgãos (ou seja, pulmões, rins e fígado) (16) O Vd também é afetado pela quantidade de medi-camento ligada às proteínas plasmáticas (por exemplo, albumina). Portanto, a exposição líquida de um medica-mento durante a gravidez depende da interação entre o Vd, o grau de ligação às proteínas séricas, a taxa de extração e a depuração.

dePuRação hePátiCa e MetabolisMo. A taxa de extração (TE) hepática se refere à fração de medi-camento removida da circulação pelo fígado. Medica-

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mentos com alta TE, como propranolol, verapamil e nitroglicerina, são rapidamente absorvidos pelos he-patócitos, sendo que sua depuração depende da taxa de fluxo sanguíneo ao fígado. Na gravidez, a perfusão para o fígado se mantém estável ou aumenta, fazendo com que os medicamentos de alta TE sejam metabolizados mais rapidamente, o que, por sua vez, pode exigir um aumento na dosagem do medicamento (18). A depuração de medicamentos de baixa TE, como a varfarina, não depende do fluxo sanguíneo hepático, mas da atividade hepática intrínseca, assim como da fração não ligada do medicamento no plasma.

No fígado, as enzimas envolvidas no metabolismo de fase I (oxidação, redução, hidrólise) e fase II (conjugação) são alteradas durante a gravidez (18, 19). As razões para alterações na eliminação hepática estão intimamente relacionadas à atividade do estrogênio e da progeste-rona. A progesterona estimula a atividade da enzima microssomal hepática, enquanto os efeitos colestáticos do estrógeno podem interferir na depuração do medi-camento, sendo que ambos inibem competitivamente a oxidase microssomal (12).

As enzimas do citocromo P450 envolvidas no meta-bolismo de fase I são, na maioria das vezes, reguladas ascendentemente durante a gravidez, mas podem ter

efeitos variáveis. Os polimorfismos genéticos podem afetar o metabolismo além do efeito aumentado gerado pela gravidez. A nifedipina e o metoprolol são cata-lisados pelo CYP3A (20) e pelo CYP2D6 (21) respecti-vamente. Ambas as enzimas são induzidas na gravidez e, portanto, os níveis de medicamento são reduzidos em comparação ao estado não gestacional. O CYP2C9, juntamente com os níveis de atividade da vitamina K epóxido-redutase, afetam a dose de varfarina necessária durante a gravidez. O labetalol é um exemplo de um medicamento que, devido à conjugação glicuronídica com regulação ascendente de fase II, tem uma meia-vida mais curta durante a gravidez (22).

dePuRação Renal. O fluxo plasmático renal efetivo aumenta em até 50% a 85% na gravidez (23). A taxa de filtração glomerular aumenta em 45% a 50% até o final do primeiro trimestre (24) e continua a aumentar a termo com uma possível tendência de queda nas últimas semanas. A função tubular é variável com diminuição da absorção de ácido úrico e glicose e aumento na excreção de proteína urinária e pequenas quantidades de albumina (25). Embora seja possível que as funções tubulares aumentem para corresponder ao fluxo san-guíneo renal, esse ajuste pode não ser adequado em um cenário de hipertensão e pré-eclâmpsia (26, 27). Em um

FiguRa 1 Alterações hemodinâmicas e farmacológicas durante a gravidez

As alterações farmacocinéticas e hemodinâmicas durante a gravidez. (A) Alterações farmacocinéticas baseadas no sistema ao longo da gravidez. (B) diagrama de alterações hemodinâmicas durante a gestação. DC = débito cardíaco; FC = frequência cardíaca; FvW = fator Von Willebrand; PAM = pressão arterial média; RVS = resistência vascular sistêmica; TFG = taxa de filtração glomerular; VB = volume de bombeamento; Vd = volume de distribuição. Imagem em B adaptada de Fuster V, Harrington RA, Narula J, Eapen ZJ (editores). Hurst’s the Heart. 14ª edição. Nova York, NY: Monte McGraw, 2017.

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grupo de gestantes tratadas para hipertensão com o uso de atenolol, a depuração aumentou 38% no segundo trimestre e 36% no terceiro trimestre, com um aumento na depuração da creatinina (28). Uma limitação do es-tudo foi o predomínio de mulheres obesas, nas quais se espera maior depuração de creatinina (29).

ClassiFiCação de MediCaMentos na

gRavidez

Na década de 1960, o efeito teratogênico da talidomida na gravidez resultou em maior preocupação do público com o uso de medicamentos na gravidez (30-32). Em 1966, a Food and Drug Administration (FDA), agência que controla alimentos e medicamentos nos EUA, publicou uma exi-gência a estudos com animais e, em 1979, eles introduziram um conjunto de cinco categorias de alfabéticas (ABCDX) destinadas a designar a segurança de um medicamento para uso durante a gravidez (33). Esse sistema foi adotado rapidamente e foi usado para orientar médicos e pacientes quanto à segurança de medicamento durante a gravidez por mais de 35 anos, até que o FDA substituísse essas categorias por um sistema de rotulagem narrativa em 2015 (Tabela 1). Os medicamentos da categoria A eram seguros de usar em geral, e a categoria X era contraindicada, ou seja, eram cate-gorias facilmente interpretáveis na medicina clínica. No en-tanto, os dados ambíguos de segurança e as interpretações errôneas quanto às categorias B, C e D fizeram com que elas não tivessem utilidade clínica (34). Em 2015, a FDA adotou a Regra de Rotulagem da Gravidez e Lactação (RRGL) para todas as novas aplicações de medicamentos e produtos biológicos após 30 de junho de 2015, quando determinaram que as categorias ABCDX eram confusas e não informavam com precisão ou consistência as diferenças graduais do risco fetal. A regra está sendo gradualmente introduzida em todos os medicamentos sob prescrição aprovados entre junho de 2001 e junho de 2015. Os novos resumos de risco da RRGL devem ser escritos no contexto dos dados epidemiológicos disponíveis que sugerem que defeitos congênitos graves ocorrem em 2% a 4% da população geral e que o aborto ocorre em 10% das gestações clinicamente reconhecidas (35, 36). Uma das mudanças no formato RRGL é incluir a gravidez, o trabalho de parto e o parto em si na mesma rotulagem, fornecendo categorias separadas para lactação e reprodução masculina e feminina. De acordo com as novas diretrizes da European Society of Cardiology (ESC), o ABCDX não é mais recomendado para a tomada de decisão (1).

teRatogeniCidade Fetal

O uso de medicamentos durante a gravidez requer uma abordagem cuidadosa, fazendo um equilíbrio entre o risco fetal e materno. Os dados referentes à

teratogenicidade dos medicamentos se baseiam, prin-cipalmente, em modelos animais, análises retrospec-tivas, conselhos consultivos ou relatos de casos, sendo, em geral, limitados e insuficientes. Apenas uma mi-noria de medicamentos já foi associada a malformação ou morte fetal significativas, porém, as implicações médico-legais são tão grandes que os fabricantes não se comprometerão prontamente com a segurança de seus medicamentos durante a gravidez (37). O período de administração do medicamento também é crítico para o desenvolvimento da teratogenicidade e, como a organogênese ocorre durante o primeiro trimestre, esse é o período mais vulnerável. No entanto, alguns medicamentos exercem efeitos sobre o feito em um momento mais tarde da gravidez, como os inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA). Medica-mentos com potencial teratogênico conhecido, como captopril ou bosentana, devem ser evitados, sendo substituídos por alternativas mais seguras, mas o uso de outros medicamentos durante a gravidez pode ser mais f lexível.

aboRdageM geRal de MediCaMentos

CaRdiovasCulaRes na gRavidez e

aleitaMento MateRno

Os princípios básicos do uso de medicamentos na gravidez e lactação são determinar os seguintes pontos sobre o medicamento: necessidade, urgência, período durante a gestação e efeito adverso sobre o feto. Como a maioria dos medicamentos é transferida para o

tabela 1 Potenciais de gravidez, aleitamento e reprodutivo atuais da FDA: Rotulagem de medicamentos humanos sob prescrição e produtos biológicos

Gravidez Esta subseção contém informações sobre gravidez, incluindo trabalho de parto e o parto em si.

Os resumos narrativos dos riscos de um medicamento durante a gravidez e as discussões dos dados que corroboram esses resumos são necessários na rotulagem para fornecer informações mais significativas para os médicos, nas seguintes sub-rubricas:

• Registro de exposição da gravidez: informar os profissionais de saúde sobre a disponibilidade de um registro de exposição da gravidez para um produto com informações de contato (por exemplo, um número de telefone gratuito, site 178) necessário para se inscrever ou obter informações sobre o registro.

• Resumo de risco: caso haja informações disponíveis sobre defeitos congênitos e aborto espontâneo para a população de pacientes para quem o medicamento é rotulado, elas devem ser incluídas. Quando o uso de um medicamento é contraindicado durante a gravidez, essa informação deve ser a primeira a ser indicada.• “Anormalidades estruturais” descreve dismorfologia, o que inclui malformações, variações,

deformações e rupturas.• “Mortalidade embriofetal e/ou infantil” descreve a mortalidade por desenvolvimento, o que inclui

aborto espontâneo, morte fetal e morte infantil (incluindo morte neonatal).• “Comprometimento funcional” descreve a toxicidade funcional, que inclui desfechos como surdez,

endocrinopatia, efeitos no desenvolvimento neurológico e comprometimento da reprodução.• “Alterações de crescimento” descreve desfechos como restrição de crescimento, crescimento excessivo

e maturações atrasadas e antecipadas.• Considerações clínicas

• Risco materno e/ou embrionário/fetal associado à doença;• Ajustes de dose durante a gravidez e no período pós-parto;• Reações maternas adversas;• Reações fetais/neonatais adversas;• Trabalho de parto ou parto em si

• Dados• Dados humanos• Dados de animais

FDA = Food and Drug Administration dos EUA.

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ilustRação CentRal Medicamentos cardiovasculares na gravidez

Halpern, D.G. et al. J Am Coll Cardiol. 2019;73(4):457–76.

Antigas categorias ABCDX da Food and Drug Administration: A) nenhum risco ao feto demonstrado com base em estudos humanos bem controlados; B) nenhum risco ao feto demonstrado com base em estudos em animais; C) estudos em animais demonstraram efeitos fetais adversos; nenhum estudo em humanos; benefícios potenciais podem justificar o uso do medicamento; D) risco fetal humano demonstrado; benefícios potenciais podem justificar o uso do medicamento; e X) alto risco de anormalidades fetais humanas demonstrado, superando o benefício potencial; N) não classificado. ACODs = anticoagulantes orais diretos; ARE = antagonistas dos receptores da endotelina; BRA = bloqueador do receptor de angiotensina; ECA = enzima conversora de angiotensina; INA = inalado; IV = intravenosa; VO = por via oral.

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leite, também é preciso analisar os efeitos nos recém-nascidos. Deve ser usada a menor dose efetiva. A mulher deve ser aconselhada sobre os riscos e benefícios do me-dicamento, além de receber dados atualizados, reconhe-cendo as limitações do medicamento. Bancos de dados e instruções dos fabricantes presentes na Internet e que contêm informações sobre prescrições são úteis para obter as informações mais atualizadas. Especialistas em medicina fetal materna devem ser consultados para auxiliar no manejo do medicamento durante a gravidez, além de um pediatra após o parto e durante a lactação. No caso de uma parada cardiorrespiratória, devem ser seguidos os protocolos padrão do suporte vital cardíaco avançado (SVCA), incluindo o uso de medicamentos e desfibrilação (38).

MediCaMentos esPeCíFiCos

A Ilustração Central e a Tabela 2 resumem alguns dos medicamentos para DCV mais comuns usados durante a gravidez, possíveis eventos adversos, a antiga categoria da FDA e a compatibilidade do medicamento com a amamentação.

MediCaMentos antiaRRítMiCos

As arritmias cardíacas maternas podem aumentar durante a gravidez, seja por de novo ou devido a alte-rações fisiológicas da gravidez. O aumento da dilatação das câmaras cardíacas e os efeitos da progesterona são considerados os mecanismos primários que promovem a arritmia (39). As arritmias mais comuns são contra-ções atriais e ventriculares prematuras e taquicardia supraventricular (TSV), enquanto a fibrilação atrial (FA) está aumentando em prevalência à idade e em pacientes com cardiopatia congênita. As arritmias ven-triculares são muito mais raras (40). O aparecimento novo de arritmias em uma gestante com um coração estruturalmente normal deve levar à investigação de condições subjacentes, como doença da tireoide ou embolia pulmonar. As bradiarritmias são raras e podem estar relacionadas à compressão uterina, aumento do tônus vagal ou doença cardíaca estrutural, necessitando raramente de estimulação (41). Como os medicamentos antiarrítmicos (MAAs) são usados na gravidez para as condições materna e fetal, seus mecanismos e perfis de efeitos adversos devem ser toleráveis tanto para a mãe quanto para o feto. Os MAAs devem ser evitados, se possível, durante o primeiro trimestre, e o início de uso do medicamento deve ser tentado na dose mais baixa, com o envolvimento de um eletrofisiologista especializado no controle de arritmias na gravidez. Assim como ocorre com as pacientes não gestantes, a arritmia instável hemodinamicamente deve ser tratada

com cardioversão elétrica ou desfibrilação, que são ge-ralmente seguras para o feto. O uso de desfibriladores cardioversores implantáveis não está associado a um aumento significativo nos desfechos fetais adversos ou complicações maternas (42).

aRRitMias atRiais. Raramente as contrações pre-maturas atriais e ventriculares sintomáticas requerem tratamento, embora betabloqueadores possam ser utilizados. A TSV é a arritmia sustentada mais comum na gestação, com a taquicardia de reentrada no nó atrioventricular sendo o mecanismo mais comum em um coração estruturalmente normal (43). O tratamento da TSV inclui manobras vagais, seguidas por adenosina, betabloqueadores (preferencialmente um bloqueador seletivo beta 1, como metoprolol) e verapamil como terapia de terceira linha. A terapia supressiva para TSV na ausência de pré-excitação pode incluir betablo-queadores isolados ou em combinação com digoxina ou verapamil oral. Sotalol ou flecainida podem ser cogitados em mulheres sem anomalias cardíacas estru-turais. Flecainida ou propafenona são recomendadas para a prevenção de TSV em pacientes com síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW) (1). A amiodarona quase nunca é usada devido ao alto risco de complicações na tireoide e no desenvolvimento neurológico do feto (ver posteriormente no texto). A ablação por cateter com radiação de baixa dose é um raro último recurso do paciente significativamente sintomático.

FA ou flutter atrial é observado em mulheres com doença cardíaca estrutural (por exemplo, congênita, valvar, cardiomiopatia) com altas recorrências durante a gravidez. Para o controle da frequência, os betabloque-adores, o verapamil e a digoxina são terapias de primeira linha; e, para o controle do ritmo, podem ser cogitados o sotalol, a flecainida ou a propafenona. A FA no cenário de pré-excitação se manifesta como uma taquicardia de complexo amplo e é tratada com procainamida por via endovenosa. O verapamil e a digoxina podem promover a condução por vias acessórias e devem ser evitados em mulheres com pré-excitação. A anticoagulação deve ser cogitada em gestantes com FA/flutter atrial, especial-mente com anomalias estruturais (por exemplo, estenose da valva mitral reumática); no entanto, a estratificação de risco durante a gravidez é controversa, e algumas fontes recomendam usar a mesma estratificação de risco que pacientes não gestantes (1).

A adenosina é um nucleosídeo com uma meia-vida de segundos que tem sido usada com segurança no trata-mento da TSV materna, taquicardia atrial e taquicardia reentrante atrioventricular ortodrômica na WPW. Ela tem sido usada raramente para diferenciar entre TSV e TV. A adenosina geralmente é considerada segura na gravidez, embora tenha sido descrita bradicardia fetal

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tabela 2 Medicamentos usados na gravidez para DCV

Nome do medicamento

Antiga categoria da

FDA* Efeitos adversos e outros comentáriosTransferência

placentária Transferência para leite materno

Adenosina C Dispneia, bradicardia. Substância endógena com meia-vida curta; pode exigir doses maiores na gravidez.

Não. Desconhecida, endógeno ao leite materno.

Amiodarona D Bócio congênito, distúrbios da tireoide (hipotireoidismo), prolongamento do QT, anomalias do desenvolvimento neurológico e nascimento prematuro. Use somente após outros antiarrítmicos terem falhado, meia-vida prolongada, efeitos sobre o feto não relacionados à duração do uso ou da dose.

Sim. Sim. Devido à meia-vida prolongada, o fabricante recomenda a interrupção da amamentação caso o uso de medicamentos seja necessário.

Inibidores da enzima conversora da angiotensina, bloqueadores dos receptores da angiotensina, inibidores do receptor da angiotensina-neprisilina, inibidores diretos da renina

X Oligoidrâmnios, RCIU, diminuição da função renal fetal, hipoplasia pulmonar e malformações do esqueleto. Contraindicado na gravidez.

Sim. Sim. Captopril, benazepril e enalapril podem ser cogitados no período pós-parto com um seguimento rigoroso do peso da criança no início. Os fabricantes não recomendam o uso de outros agentes durante a lactação.

BetabloqueadoresLabetalol Atenolol Metoprolol Carvedilol

C (atenolol D)

Bradicardia, hipoglicemia, redução do peso ao nascer. Labetalol usado para HT (primeira linha), requer mudanças de dose com IG e peso magro. Atenolol associado a RCIU significativo.

Sim. Sim. Labetalol – seguro (relato de bradicardia assintomática e fenômeno de Raynaud). Metoprolol – aceitável, sem efeitos adversos relatados em um pequeno estudo. Carvedilol – desconhecido.

Bloqueadores dos canais de cálcioNifedipina Verapamil Diltiazem Amlodipina

C Pré-maturidade, RCIU, bradicardia fetal em alguns BCC, suspeita de convulsões neonatais se usado no terceiro trimestre. Nifedipina usada como HT (primeira linha) e tocólise (pode gerar hipotensão materna e hipoxemia fetal quando usada com magnésio). O verapamil, juntamente com os betabloqueadores, é o preferido para a TSV paroxística em comparação ao diltiazem. O diltiazem está associado a efeitos fetais adversos em estudos com animais. A amlodipina é provavelmente segura para a hipertensão.

Sim (não para diltiazem).

Sim. Exposição mínima. A nifedipina é considerada segura, mas há poucos dados sobre verapamil e diltiazem.

Resina de colestiramina/colestipol C Pode reduzir as vitaminas lipossolúveis. Desconhecida. Não. Pode ser usado durante a lactação, mas pode interferir nos níveis de vitamina materna.

Clonidina C Pode exigir o encurtamento dos intervalos de dosagem; pode ser usado em uma preparação transdérmica para pacientes sem tolerância a medicamentos orais.

Sim. Sim.

Digoxina C Baixo peso ao nascer. Usada como primeira linha para TSV sintomática com a menor dose efetiva; os níveis séricos não são confiáveis durante a gravidez. Usada como MAA fetal.

Sim. Sim. Exposição mínima.

Disopiramida C Contração uterina, descolamento prematuro da placenta, QT prolongado.

Sim. Sim.

Agentes diuréticos Agentes diuréticos de alça (por exemplo, furosemida) Tiazidas (por exemplo, HCTZ, metolazona) Espironolactona/eplerenona

C (eplerenona B)

Oligodramnia, anomalias eletrolíticas fetais. A furosemida, comumente usada para edema e IC, pode estar associada ao aumento de peso ao nascer. Dados limitados sobre a torsemida e a bumetanida. HCTZ usada para hipertensão se usada antes da gravidez, não recomendada para propósitos diuréticos de rotina. Pode estar associada a icterícia fetal/neonatal, trombocitopenia e diátese e hiponatremia hemorrágica materna. A espironolactona tem efeito antiandrogênico (feminização) durante o primeiro trimestre. A eplerenona teve efeitos adversos em estudos de reprodução animal.

Sim. Sim. Diuréticos podem suprimir a lactação. Tanto a furosemida como a HCTZ são aceitáveis, mas requerem seguimento do lactente. Dados limitados sobre outros diuréticos. A espironolactona e a eplerenona não são recomendadas para a lactação.

Dopamina C Os medicamentos de reanimação cardíaca são usados de modo semelhante ao estado não gestacional. Pode ter efeito vasoativo sobre o feto, estudos de reprodução animal mostraram efeitos adversos.

Desconhecida. Desconhecida.

Dobutamina B Os medicamentos de reanimação cardíaca são usados de modo semelhante ao estado não gestacional. Não deve ser usada em testes de estresse durante a gravidez.

Desconhecida. Desconhecida.

Antagonistas dos receptores da endotelina (bosentana, ambrisentana, macitentana)

X Associados a defeitos congênitos, incluindo malformações mandibulares e cardiopatias.

Desconhecida. Dados limitados.

Epinefrina C Os medicamentos de reanimação cardíaca são usados de modo semelhante ao estado não gestacional. Pode causar vasoconstrição uterina e hipóxia fetal. Também usada para anafilaxia e asma grave.

Sim. Desconhecida.

Ezetimiba Associada a efeito fetal adverso em estudos com animais. Não recomendado.

Desconhecida. Desconhecida.

Fenofibrato C Dados limitados. Não recomendado. Sim. Desconhecida.

Flecainida C Distúrbios visuais maternos, nefrite intersticial aguda, colestase obstétrica, bradicardia fetal. Usado para AAD materna e fetal.

Sim. Sim.

Fondaparinux B Usado em alergias à heparina e trombocitopenia induzida por heparina.

Sim. Desconhecida.

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tabela 2 Continua

Nome do medicamento

Antiga categoria da

FDA* Efeitos adversos e outros comentáriosTransferência

placentária Transferência para leite materno

Genfibrozila C Associada a efeito fetal adverso em estudos com animais. Não recomendado.

Sim. Desconhecida.

Heparinas HNF HBPM—enoxaparina

C—HNF B—enoxaparina

Monitoramento meticuloso necessário à anticoagulação em mulheres com válvulas mecânicas. Trombocitopenia induzida por heparina (heparina > HBPM), osteoporose.

Não. Desconhecida.

Hidralazina C Síndrome semelhante ao lúpus, taquicardia reflexa, trombocitopenia fetal. Usado para HT e IC.

Sim. Sim.

Ibutilida — Dados limitados. Desconhecida. Desconhecida.

Iloprosta C Dados limitados. Desconhecida. Desconhecida.

Dinitrato de isossorbida B Estudos de reprodução animal apresentaram efeitos adversos. Desconhecida. Desconhecida.

Ivabradina — Estudos de reprodução animal apresentaram efeitos adversos. Sim (em ratos). Desconhecida.

Levosimendana — Vasodilatador para o manejo da IC (especialmente no contexto da CPPM), não disponível nos Estados Unidos.

Desconhecida. Desconhecida.

Lídocaína B Depressão do SNC, efeitos do tônus cardíaco e vascular. Dados limitados ao uso em arritmias ventriculares, mas podem ser levados em consideração.

Sim. Sim.

Metildopa B/C (injetável)

Usado para HT (primeira linha). 1% de toxicidade hepática. Sim. Sim.

Mexiletina C Usada para arritmia ventricular. Dados limitados, mas provavelmente seguros.

Sim. Sim.

Milrinona C Os medicamentos de reanimação cardíaca são usados de modo semelhante ao estado não gestacional. Reabsorção aumentada durante a gravidez relatada.

Desconhecida. Desconhecida.

Nitroglicerina C Usada para IC, HT e relaxamento uterino. Desconhecida. Desconhecida.

Nitroprussiato C Toxicidade do cianeto e do tiocianato no feto. Sim. Sim (metabólitos).

Noradrenalina C Os medicamentos de reanimação cardíaca são usados de modo semelhante ao estado não gestacional.

Sim. Desconhecida.

PDE-5i (sildenafil, tadalafila) B Dados limitados. Desconhecida. Sim.

Inibidores da agregação plaquetáriaAspirina Clopidogrel Prasugrel Ticagrelor

N – aspirina B – clopidogrel C – ticagrelor – prasugrel

A aspirina está associada à RCIU, ao sangramento fetal e à acidose neonatal. A alta dose de aspirina está associada ao fechamento prematuro da PCA. Outros antiplaquetários não foram bem estudados.

Sim (aspirina). Desconhecido –

clopidogrel, ticagrelor, prasugrel.

Aspirina: transfere, mas pode ser segura em doses baixas (o fabricante não recomenda o uso). Clopidogrel: desconhecido. Prasugrel e ticagrelor: transferidos em estudos com ratos.

Procainamida C Síndrome semelhante ao lúpus, QT prolongado. Sim. Sim.

Propafenona C Dados limitados. Provavelmente seguro Sim. Sim.

Quinidina C Trombocitopenia fetal, QT prolongado. Sim. Sim.

Sotalol B Maior risco para TdP (QT prolongado), bradicardia fetal, hipoglicemia, redução de peso ao nascer. Cada vez mais usado para flutter atrial fetal.

Sim. Sim.

Estatinas X Dados limitados, anomalias congênitas. Sim. Desconhecida.

TrombolíticosAlteplase Estreptoquinase

C Contraindicação relativa na gravidez e no periparto. Não deve ser suspenso em um evento com risco à vida. Efeitos adversos em estudos em animais com alteplase. Aumento do risco de hemorragia (principalmente genital), perda fetal (6%), parto prematuro (6%).

Mínimo. Desconhecida.

Treprostinil B Dados limitados, efeitos adversos demonstrados em estudos com animais.

Desconhecida. Desconhecida.

Varfarina X Cruza a placenta; risco de embriopatia no primeiro trimestre (hipoplasia nasal e de membros, epífises pontilhadas); anomalias do SNC; e hemorragia durante a gravidez. O risco de embriopatia diminui com dose diária ≤ 5 mg. A indicação principal são as válvulas mecânicas.

Sim. Transferência mínima, se houver. Monitor de contusões do lactente.

*Categorias: A) nenhum risco ao feto demonstrado com base em estudos humanos bem controlados; B) nenhum risco ao feto demonstrado com base em estudos em animais; C) estudos em animais demonstraram efeitos fetais adversos; nenhum estudo em humanos; benefícios potenciais podem justificar o uso do medicamento; D) risco fetal humano demonstrado; benefícios potenciais podem justificar o uso do medicamento; e X) alto risco de anormalidades fetais humanas demonstrado, superando o benefício potencial; N) não classificado.CMH = cardiomiopatia hipertrófica; FDA = Food and Drug Administration; HBPM = heparina de baixo peso molecular; HCTZ = hidroclorotiazida; HNF = heparina não fracionada; HT = hipertensão; IC = insuficiência cardíaca; IG = idade gestacional; MAA = medicamento antiarrítmico; PCA = persistência do canal arterial; PDE-5i = inibidor da fosfodiesterase 5; RCIU = restrição de crescimento intrauterino; SNC = sistema nervoso central; SVCA = suporte avançado de vida cardíaca; TdP = torsades de pointes; TSV = taquicardia supraventricular.

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(44, 45). Os efeitos adversos incluem bradiarritmia, dispneia, dor torácica e rubor.

Os betabloqueadores são os medicamentos mais usados na gravidez e têm sido estudados de maneira mais extensa que outros MAAs devido ao seu papel no tratamento da hipertensão, doença valvar, insuficiência

cardíaca, arritmias atriais e ventriculares e síndrome do QT longo (1, 39). Vários estudos retrospectivos extensos abordaram a questão dos eventos e anomalias fetais adversos resultantes da exposição a betablo-queadores. Em um estudo retrospectivo com 379.238 gestações em que 1,3% dos pacientes foram expostos

FiguRa 2 Anticoagulação de pacientes grávidas com válvulas mecânicas

ASP = aspirina; HBPM = heparina de baixo peso molecular; HNF = heparina não fracionada; QD = uma vez por dia; RNI = razão normalizada internacional; TTPA = tempo de tromboplastina parcial ativada. Adaptado de Nishimura et al. (143).

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a betabloqueadores, não houve aumento significativo de anomalias cardíacas congênitas após o ajuste para fatores maternos (46). Um registro europeu de anomalias congênitas descobriu que havia um risco aumentado de displasia renal multicêntrica neonatal com betabloqueadores em comparação a controles, mas eles não encontraram aumento de hipospádia, defeitos do tubo neural, cardiopatias ou fissuras orais (47), que tinham sido identificados em estudos anteriores (48, 49). Em comparação aos controles, neonatos expostos a betabloqueadores apresentaram significativamente mais bradicardia (razão de chance: 1,29; IC95%: 1,07 a 1,55) e hipoglicemia (razão de chance: 1,68; IC95%: 1,50-1,89), mesmo após ajuste multivariado em um banco de dados Medicaid com 2.292.116 gestações. Foi o labetalol, e não o metoprolol ou o atenolol, o mais associado a esses efeitos (50). Há também estudos mostrando que os lactentes eram pequenos para a idade gestacional se expostos a betabloqueadores (51, 52). Além disso, observou-se um aumento do risco de parto prematuro, com resultados semelhantes em todos os betabloqueadores estudados (51).

O atenolol é um medicamento hidrofílico com elimi-nação renal e é classificado com a categoria D da FDA. As diretrizes da ESC não recomendam seu uso para arritmia na gravidez (1) devido ao risco de restrição do crescimento fetal (53, 54). Há também um relato de caso vinculando a exposição ao atenolol no pré-natal à fibromatose retroperitoneal em um lactente (55).

Geralmente, o propranolol é considerado seguro na gravidez, no entanto, em um pequeno estudo de 12 gestações, metade dos neonatos apresentou retardo no crescimento intrauterino. Também houve casos isolados de hipoglicemia, policitemia e hiperbilirrubinemia (56).

O metoprolol é bem tolerado e usado para TSV ma-terna e arritmias ventriculares. A depuração durante a gestação média e tardia é maior (57); no entanto, em um estudo com oito mulheres no terceiro trimestre, os autores descobriram que houve quatro vezes o efeito da frequência cardíaca e duas vezes o efeito da pressão arterial sistólica para uma determinada concentração plasmática durante a gravidez quando comparada ao pós-parto, sugerindo aumento da sensibilidade ao me-toprolol durante a gravidez (58). O labetalol é discutido posteriormente neste texto.

bloqueadoRes dos Canais de CálCio. Em 2011, um estudo de Davis et al. (59) encontrou um risco aumentado de convulsões neonatais em lactentes expostos a bloqueadores dos canais de cálcio (BCC) em comparação a lactentes não expostos, principalmente no terceiro trimestre, com suspeita de relação à hipo-calcemia. No entanto, estudos posteriores em larga escala não reproduziram esse achado (60, 61).

O verapamil pode ser usado para tratamento de curto e longo prazo da TSV materna e da TV fascicular (1, 62). O verapamil não foi associado a efeitos fetais adversos, mas tem sido associado à hipotensão materna (63, 64). O verapamil é submetido a um extenso metabolismo de primeira passagem, com apenas 22% dele atingindo a cir-culação inalterada em indivíduos normais (65, 66). Existe um único relato de caso de cardiomiopatia hipertrófica congênita ocorrendo com a exposição ao verapamil, a qual também foi demonstrada em ratos (67).

O diltiazem é usado tanto para arritmias maternas como para promover a tocólise no trabalho de parto de prematuros (68), podendo diminuir a proteinúria (69). Em estudos com animais, o diltiazem pode resultar em diminuição do peso fetal e anomalias no esqueleto (70). Os níveis de diltiazem no leite materno seguem de perto a concentração sérica materna e podem atingir aproxi-madamente o mesmo nível máximo do soro (65, 71). A nifedipina é discutida posteriormente neste texto.

A digoxina tem um longo histórico de uso bem to-lerado para TSV materna e fetal. A farmacocinética é complexa, com a fisiologia da gravidez resultando em alterações na biodisponibilidade e depuração normais (72). Em um estudo com 10 gestantes que receberam metildigoxina, houve um aumento significativo na depuração de medicamentos em gestantes em compa-ração a não gestantes (183 mL/min vs. 140 mL/min; p < 0,001) (73). Em um grupo no qual a digoxina foi usada como substrato modelo para estudar a atividade de transporte da glicoproteína-P, 14 participantes grá-vidas com aproximadamente 30 semanas foram usadas como seus próprios controles no período pós-parto. Os autores descobriram que as mulheres no terceiro trimestre apresentavam aumento na fração não ligada de digoxina e aumento da depuração renal (61%) da digoxina em comparação ao período pós-parto (74). O efeito líquido comum desses dois processos opostos é o efeito de medicamento reduzido da digoxina durante a gravidez.

O ensaio para medir a digoxina pode ser compro-metido em gestantes, as quais apresentam fragmentos circulantes semelhantes à digoxina que podem elevar os níveis falsamente (75). Níveis mais altos de digoxina em gestantes não devem, no entanto, excluir a toxici-dade quando o nível estiver normal. Os médicos devem procurar sinais clínicos de toxicidade por digoxina em qualquer nível, como arritmia (76) e vômitos. Embora exista um relato de toxicidade por digoxina intrauterina após overdose materna, na verdade, o recém-nascido tolera bem doses mais altas de digoxina quando sua dose de exposição é ajustada para a área de superfície corporal (77).

A f lecainida é usada principalmente na gravidez para TVS materna e fetal, TV sustentada idiopática

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materna e manejo de TVS em longo prazo (1). A f le-cainida também tem sido usada em cardiomiopatia ventricular direita (VD) arritmogênica grave e em casos de TV polimórfica sustentada, ambos com bons desfechos neonatais (78, 79). A f lecainida está sendo cada vez mais reconhecida como uma opção eficaz para o tratamento da TSV fetal (80, 81). A f lecainida para TSV fetal foi descrita pela primeira vez em 1988 por Wren et al. (82), quando um feto hidrópico foi convertido com f lecainida endovenosa após a digoxina ter falhado. Os casos iniciais subsequentes usaram f le-cainida oral após a falha da digoxina ou como terapia inicial (83). Vários estudos mostram desfechos fetais melhores com f lecainida em comparação à digoxina ou em terapia combinada com digoxina para TSV fetal, especialmente em hidropsia com 3 dias como o tempo mediano para o ritmo sinusal normal e uma tendência à redução da mortalidade (84, 85). Os eventos adversos observados nos ensaios e relatos sobre f lecainida incluem perturbação visual materna, prolongamento do intervalo QT materno corrigido para frequência cardíaca (QTc), intervalos QT neonatais prolongados e insuficiência cardíaca em níveis tóxicos, colestase da gravidez e diminuição da variabilidade da frequência cardíaca fetal.

Pouco se sabe sobre a segurança da propafenona em gestantes, além de isso não ter sido estudado durante a organogênese (86). A propafenona foi usada sem efeitos prejudiciais ao feto em casos de displasia arritmogênica do VD (87), WPW (88) e contrações ventriculares pre-maturas relacionadas à estrutura (89).

Arritmias ventriculares na gravidez. A TV ou a fibri-lação que surge durante a gravidez sugere anomalias estruturais cardíacas subjacentes. O desenvolvimento de novas TV em um coração normal no final da gestação deve levar a uma investigação de cardiomiopatia peri-parto (CPPM). Pacientes instáveis devem ser submetidos a cardioversão elétrica. Mulheres hemodinamicamente estáveis podem ser tratadas com cardioversão elétrica ou com lidocaína ou betabloqueadores. As diretrizes da ESC também recomendam o uso de procainamida, flecainida e sotalol (1). A amiodarona deve ser usada caso todas as outras medidas falhem. Os betabloqueadores são o principal tratamento para a terapia supressiva de TV.

A lidocaína tem sido mais estudada como anestésico do que como agente antiarrítmico, e os dados farmaco-cinéticos disponíveis que são provenientes de estudos sobre seu uso como anestésico sugerem que o agente é seguro. De 60% a 70% da lidocaína são ligadas às pro-teínas, entrando rapidamente na circulação materna e atravessando a placenta mesmo após a administração epidural (65). Existem dois casos publicados de lido-caína sendo usados para arritmia ventricular durante o trabalho de parto e o parto em si, mesmo através do

cateter epidural (90, 91). A depressão do SNC pode ser um efeito adverso em doses elevadas.

A mexiletina é um oral lipossolúvel e tem dados limitados na gravidez, mas parece segura (92).

A quinidina, usada historicamente para o tratamento da malária, tem sido usada para tratar taquiarritmias atriais e ventriculares maternas desde o início do século XX. Ela também tem sido usada com o isoproterenol para tratar uma gestante com síndrome de Brugada e TV re-corrente (93). Os efeitos adversos incluem o aumento do possível dano ao nervo craniano VIII do feto, contrações uterinas, trombocitopenia neonatal e prolongamento do intervalo QT (1).

A procainamida é mais comumente usada na era moderna do que a quinidina para o manejo em longo prazo da TSV ou para a conversão em curto prazo de TV monomórfica hemodinamicamente estável e ocasional-mente para TSV fetal (94). Está associada à síndrome materna semelhante ao lúpus e ao prolongamento do intervalo QT.

A amiodarona deve ser usada apenas para TVS ma-terna como agente de última linha se outros agentes fa-lharem (1). A amiodarona é um medicamento altamente lipofílico que se acumula no músculo liso esquelético e no tecido adiposo (95). Sua meia-vida dura de semanas a meses. Amiodarona, seu metabólito desetilamiodarona e iodo são todos capazes de transferência transplacen-tária. Deve haver grande cautela no uso da amiodarona, cujos efeitos adversos sobre o feto parecem não estar relacionados à duração ou à dose total do tratamento (96). Os efeitos colaterais mais preocupantes são a disfunção tireoidiana, especialmente o hipotireoidismo neonatal e as anomalias do neurodesenvolvimento. Não se sabe se os efeitos tóxicos vêm diretamente do medi-camento em si ou da indução de disfunção tireoidiana. O tecido tireoidiano neonatal pode não ser capaz escapar do efeito Wolff-Chaikoff (em que o aumento de iodo suprime a produção do hormônio tireoidiano) tal qual o tecido adulto consegue, portanto, os fetos podem ser mais suscetíveis aos efeitos adversos da carga de iodo da amiodarona (97). Geralmente, o hipotireoidismo neonatal é transitório, com incidência relatada em 17% a 25% nas mães que receberam amiodarona (96, 97, 98, 99). O hipertireoidismo é menos comum, mas também é registrado no feto, e a tireotoxicose pode aparecer mais em países com deficiência de iodo (97).

Embora o hipotireoidismo neonatal seja frequente-mente transitório e, geralmente, não resulte em bócio, ainda pode haver efeitos adversos duradouros no neurodesenvolvimento. Há casos com hipotireoidismo fetal, mas desfechos normais de neurodesenvolvimento (99, 100), tireoide normal com neurodesenvolvimento anormal (97, 101), além de casos com ocorrência de ambos (96). Os efeitos não estão ligados ao trimestre

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quando administrados, e há vários casos de desfechos neonatais normais, mesmo quando a amiodarona foi iniciada antes da gravidez (102, 103). Outros efeitos adversos a serem observados incluem bradicardia e prolongamento do intervalo QT em lactentes.

O sotalol é um MAA com um dos maiores riscos de torsades de pointes devido ao prolongamento do inter-valo QT. Seu uso na gravidez ocorre principalmente no manejo de arritmias fetais, recomendado principal-mente para flutter atrial e TV (104). O QTc materno deve ser monitorado de perto quando o sotalol for usado.

MediCaMentos usados PaRa

tRataMento de hiPeRtensão e

insuFiCiÊnCia CaRdíaCa

hiPeRtensão. A hipertensão traz complicações a 5% a 10% das gestações e está associada a complicações obstétricas e fetais, bem como ao aumento do risco futuro de doença cardiovascular (1, 105). Os princi-pais distúrbios hipertensivos da gravidez incluem hipertensão pré-existente ou crônica (hipertensão diagnosticada antes de 20 semanas de gestação), hipertensão gestacional (diagnosticada após 20 semanas de gestação), hipertensão pré-existente com hipertensão gestacional sobreposta com proteinúria e pré-eclâmpsia. A hipertensão durante a gravidez é definida como pressão arterial ≥ 140/90 mmHg em duas leituras separadas; a hipertensão grave é defi-nida como ≥ 160/110. As diretrizes variam em relação às metas de pressão arterial-alvo de cada grupo de tratamento. A ESC recomenda o tratamento medica-mentoso em todas as gestantes com valores acima de 150/90 mmHg, além de ≥ 140/90 nas mulheres com hipertensão gestacional, hipertensão pré-existente com hipertensão gestacional sobreposta ou hiper-tensão com dano ou sintomas do órgão subclínico. O American Congress of Obstetricians and Gynecolo-gists (ACOG) recomenda a terapia para hipertensão gestacional e pré-eclâmpsia sem danos ao órgão-alvo para valores superiores a 160/105 mmHg. Para ges-tantes com hipertensão crônica em terapia, o ACOG recomenda um intervalo de meta de 120 a 160 mmHg para sistólica e 80 a 105 mmHg para diastólica com controle mais rigoroso em um cenário com dano ao órgão-alvo (106, 107). Infelizmente, o uso de agentes anti-hipertensivos na gravidez não demonstrou reduzir o risco de pré-eclâmpsia (108), nem um con-trole mais rigoroso (pressão diastólica < 85 mmHg) demonstrou reduzir complicações obstétricas ou fetais (109, 110). Importa ressaltar que a placenta não autorregula o f luxo sanguíneo e, portanto, a hipotensão materna aguda secundária ao tratamento anti-hipertensivo pode causar sofrimento fetal que

se manifesta inicialmente com desacelerações da frequência cardíaca fetal (111).

Os agentes anti-hipertensivos de primeira linha para hipertensão crônica e gestacional incluem labetalol, nifedipina e metildopa orais (1). A segunda linha pode incluir outros betabloqueadores (excluindo atenolol) e outros BCC (112). As terapias podem precisar de uma redução na dose no segundo trimestre devido a uma diminuição fisiológica de 5 a 10 mmHg nos valores médios da pressão arterial. Os inibidores da ECA, os bloqueadores dos receptores da angiotensina (BRA), os inibidores diretos da renina, o inibidor do receptor de angiotensina-neprisilina (ARNi), a espironolactona e a eplerenona são contraindicados na gravidez e são discutidos posteriormente neste texto. Mulheres com hipertensão crônica podem manter o uso de seus medicamentos antes da gravidez, a menos que sejam contraindicados. É preciso ter precaução com o uso em longo prazo de agentes diuréticos na gravidez devido a preocupações com a diminuição da perfusão placen-tária, especialmente no contexto de pré-eclâmpsia.

A terapia para emergências hipertensivas (> 160 a 180/110 mmHg) inclui terapias endovenosas, como labetolol ou hidralazina e nifedipina orais ou alfame-tildopa (AMD) (1, 110). Nas diretrizes atualizadas da ESC, a hidralazina não é mais o medicamento de escolha devido ao seu perfil de efeitos adversos (ver posterior-mente no texto). A nitroglicerina é recomendada para hipertensão com congestão pulmonar e pré-eclâmpsia. O nitroprussiato de sódio só deve ser usado em casos refratários de hipertensão devido ao potencial de toxi-cidade por cianeto.

O labetalol é um bloqueador não seletivo dos re-ceptores beta-1 e beta-2 usado como primeira linha para a hipertensão aguda e crônica na gravidez. Pode ser necessário o ajuste da dose ao longo da gravidez devido ao aumento da depuração, levando a uma meia-vida mais curta (110). Em um estudo com 57 gestantes que receberam labetalol por via oral para hipertensão, aquelas na semana 12 tiveram 1,4 vezes a depuração de indivíduos em pós-parto e, na semana 40, tiveram 1,6 vezes a depuração de indivíduos em pós-parto (113). Os efeitos fetais documentados incluem hipoglicemia, bradicardia, hipotensão e de-pressão respiratória, bem como RCIU. No entanto, o labetalol é considerado seguro, sem perfil de malfor-mações fetais, e tem dados de desfechos semelhantes aos da nifedipina e da AMD (106).

A nifedipina é outro medicamento seguro de primeira linha usado tanto para o controle da pressão arterial quanto para a tocólise (114). Podem ser necessários intervalos de dosagem mais curtos ou doses mais ele-vadas devido ao metabolismo hepático acelerado du-rante a gravidez por meio da CYP3A4. Não foi observado

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nenhum aumento na teratogenicidade com a nifedipina. No entanto, no ensaio clínico APOSTEL III (Avaliação do resultado perinatal após tocólise específica no início do trabalho de parto), que comparou a nifedipina à atosibana — um inibidor da ocitocina usado para tocó-lise —, ambos os agentes exibiram eventos perinatais semelhantes como desfecho primário, mas a nifedipina apresentou um aumento não significativo na mortali-dade neonatal (5% vs. 2%) (115). A hipotensão pode ser desenvolvida com o uso concomitante de magnésio. As preocupações com convulsões neonatais ou hemorragia pós-parto foram descartadas por grandes estudos de coorte (59, 60, 116).

A alfametildopa (AMD) é um agonista do receptor adrenérgico alfa-2 e que diminui a atividade simpática do cérebro. Ela é considerada um agente de primeira linha para a hipertensão na gravidez, embora raramente seja usada hoje em dia e, provavelmente, seja menos eficaz em comparação a betabloqueadores ou BCC. A AMD não requer nenhum ajuste de dose durante a gra-videz. Nenhum efeito teratogênico óbvio foi observado em estudos com animais; no entanto, em um estudo que seguiu 92 pacientes por 7,5 anos após o parto, a cir-cunferência da cabeça em crianças do sexo masculino foi menor (117). A hepatotoxicidade é um importante efeito adverso observado em 1% das pacientes grávidas administrando AMD. Ela está relacionada à dose e pode progredir para hepatite fulminante (118).

A hidralazina, um vasodilatador arterial, é usada para o tratamento de hipertensão de início agudo e grave, bem como insuficiência cardíaca durante a gravidez, e pode ser usada por via oral ou endovenosa (119). A hi-dralazina oral em pacientes com pré-eclâmpsia mostrou não ter efeito sobre a perfusão placentária (120). A hi-dralazina está associada a taquicardia reflexa, sintomas semelhantes aos do lúpus materno e trombocitopenia fetal. Comparada com o labetalol e a nifedipina, pode haver um aumento de complicações maternas e fetais, não sendo mais considerada uma terapia de primeira linha (1, 121).

A clonidina é um agonista alfa-2 que tem efeitos hipotensores semelhantes à AMD na gravidez (122). A farmacocinética mostra maior depuração não renal durante a gestação, o que pode exigir intervalos menores de dosagem (123). A interrupção abrupta do medicamento pode resultar em hipertensão rebote. A clonidina atravessa a placenta, e estudos em animais apresentaram efeitos adversos. Sua formulação como um adesivo transdérmico pode ser vantajosa para pa-cientes sem tolerância a medicamentos orais.

agentes diuRétiCos. As indicações para terapia diurética durante a gravidez incluem manejo da hiper-tensão, da hipervolemia ou da insuficiência cardíaca. As

principais preocupações quanto aos agentes diuréticos estão relacionadas à redução do volume plasmático, débito cardíaco e diminuição da perfusão útero-fetal.

A furosemida, o agente diurético mais usado na gravidez, tem sido associada a icterícia neonatal, trombocitopenia, pancreatite materna e hiponatremia. Porém, em uma grande metanálise, não houve diferença significativa nos efeitos adversos em comparação a pa-cientes grávidas que não usam diuréticos. A furosemida também estava associada a bebês com maior peso ao nascer (aumento médio de 104,7 g em comparação ao grupo não diurético), embora os autores tenham argu-mentado que a descoberta pode estar relacionada ao viés de referência e não ao efeito diabetogênico causado pelo medicamento (124).

A hidroclorotiazida (HCTZ) é, principalmente, conti-nuada durante a gravidez em vez iniciada nela. Ela tem sido associada a menor peso ao nascer (125), icterícia neonatal, trombocitopenia e diátese hemorrágica. Não foi relatado nenhum efeito teratogênico (106).

inibidoRes da eCa, bRa, inibidoRes diRetos da

Renina, aRni e antagonistas da aldosteRona. Os inibidores da ECA, os BRAs, os inibidores diretos da renina estão na categoria X, são contraindicados na gravidez e devem ser suspensos no período de pré-concepção. Foi demonstrado que esses medicamentos causam disgenesia renal, oligoidrâmnio como resultado de oligúria fetal, hipoplasia pulmonar e calvariana, RCIU e insuficiência renal anúrica neonatal, resultando em morte fetal, especialmente se usada no segundo e terceiro trimestres (126). Contudo, durante a lactação, o benazepril, o captopril e o enalapril podem ser cogi-tados com segurança. Não há dados sobre BRA e ARNi durante a lactação, portanto, eles não devem ser usados. Antagonistas da aldosterona, espironolactona e eplere-nona, são contraindicados na gravidez devido aos seus efeitos antiandrogênicos no feto masculino no primeiro trimestre e devido a evidência de teratogênese em um modelo com ratos. Eles também são contraindicados durante a lactação.

CaRdioMioPatias e insuFiCiÊnCia CaRdíaCa. As cardiomiopatias durante a gravidez podem ser herdadas (por exemplo, dilatações) ou adquiridas (por exemplo, CPPM, virais, induzidas por estresse ou tóxicas). A gra-videz prediz um alto índice de complicações maternas e fetais e é contraindicada em mulheres com disfunção sistólica além do nível leve (fração de ejeção ventricular esquerda < 40%). Os inibidores da ECA, BRA, inibidores diretos da renina, antagonistas da aldosterona e ivabra-dina são contraindicados e devem ser suspensos antes da gravidez ou quando se descobre que a mulher esteja grávida (1, 127). Os bloqueadores beta-1 seletivos, como o succinato de metoprolol, são preferidos para evitar

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a interferência no relaxamento uterino mediado por beta-2 e vasodilatação periférica. Não foi demonstrada a associação do carvedilol, um bloqueador alfa/beta-adrenérgico, à restrição de crescimento (128). Antes da gravidez, é aconselhável tentar um período experi-mental de vários meses sem os agentes contraindicados, observando atentamente os sintomas e com exames de imagem da função sistólica, para garantir que não haja deterioração clínica.

O manejo da insuficiência cardíaca aguda e do choque cardiogênico na gravidez se baseia nas diretrizes atuais para insuficiência cardíaca (1). O parto urgente é recomendado em casos graves e em choque cardiogê-nico. Diuréticos como a furosemida, a bumetanida e a HCTZ são usados para o edema pulmonar sintomático e, conforme mencionado anteriormente, mantêm o risco de diminuir a perfusão placentária e causar um desequilíbrio eletrolítico no feto. Para a redução da pós-carga, a hidralazina e os nitratos são usados no lugar dos inibidores da ECA e BRA. Após a estabilização inicial, os betabloqueadores devem ser iniciados, e a digoxina pode ser cogitada. O bloqueio neuro-hormonal pós-parto pode ser reiniciado (1).

Há escassez de dados e falta de diretrizes em relação ao uso de inotrópicos e vasopressores para pacientes grávidas críticas. A dopamina e a dobutamina têm sido usadas com segurança na gravidez para o suporte inotrópico (119). A levosimendana, um sensibilizador de cálcio, é recomendada no contexto da CPPM, uma vez que a dobutamina pode estar associada à progressão da insuficiência cardíaca nesses pacientes (129). Os vasopressores apresentam o risco de reduzir o fluxo sanguíneo uterino, embora não tenha sido demonstrado que a noradrenalina, comumente usada como agente vasoativo de primeira linha, tenha afetado o feto (130).

A bromocriptina aumenta a clivagem da prolactina em uma isoforma do subfragmento de prolactina de 16 kDa, promovendo a apoptose e a inflamação enquanto suprime a angiogese. Foram demonstrados desfechos positivos com melhora da função ventricular em mu-lheres com CPPM; no entanto, são necessários ensaios clínicos randomizados controlados mais amplos para a validação (131). A anticoagulação deve ser administrada em pacientes com CPPM recebendo bromocriptina (1).

As receptoras de transplante cardíaco podem ser sub-metidas à gestação após um abrangente aconselhamento pré-gestacional e a estratificação do risco de rejeição, infecção, falência do enxerto e teratogenicidade da te-rapia imunossupressora. As complicações mais comuns encontradas durante a gravidez são hipertensão, doença tromboembólica e hiperemese. As alterações hemo-dinâmicas e volumétricas durante a gravidez também afetam os níveis dos medicamentos imunossupressores e exigem monitoramento próximo. Os corticosteroides

e inibidores de calcineurina (por exemplo, ciclosporina, tacrolimo) e azatioprina podem ser mantidos durante a gravidez, enquanto o micofenolato mofetil deve ser interrompido (132). A amamentação é contraindicada.

doença valvaR CaRdíaCa

O manejo específico da doença valvar durante a gravidez vai além do escopo deste artigo. As lesões estenóticas, como estenose mitral ou aórtica, são muito menos toleradas durante a gravidez quando comparadas a lesões regurgitantes. Deve ser dada atenção especial aos efeitos hemodinâmicos das lesões estenóticas no período inicial do pós-parto. A terapia médica consiste, principalmente, em terapia diurética para estados congestivos e, caso haja estenose mitral, o betabloqueio para permitir mais enchimento ventricular e anticoa-gulação no contexto de FA, trombo atrial esquerdo ou embolia prévia (1). Intervenções ou cirurgias baseadas em cateteres são necessárias na descompensação he-modinâmica grave. Válvulas protéticas mecânicas são discutidas posteriormente neste texto.

doença CaRdíaCa isquÊMiCa

A dissecção da artéria coronária é a causa mais comum de doença cardíaca isquêmica na gravidez (133). Outros mecanismos de isquemia incluem: espasmo, doença de Kawasaki prévia, doença aterosclerótica com aumento da idade materna e fatores de risco para DCV, além de toxinas como a cocaína. A ocorrência é mais comum no terceiro trimestre ou no pós-parto, e a maioria dos casos é de dissecção coronária, trombo ou evento embólico (134, 135). O tratamento inicial do infarto agudo do miocárdio na gestação é idêntico ao do estado não gestacional. A intervenção coronária percutânea é preferível à fibrinólise. A terapia de angina instável inclui terapias antiplaquetárias (ver posterior-mente neste texto), betabloqueadores ou BCC, heparina ou heparina de baixo peso molecular (HBPM) e nitratos. Bivalirudina e inibidores IIb/IIIa da glicoproteína não são recomendados devido à falta de dados (1).

estatinas e outRas teRaPias

hiPoliPeMiantes duRante a gRavidez

Os dados sobre o uso de estatinas e inibidores da hidroximetilglutaril coenzima A redutase estão misturados. Embora, anteriormente, relatos de casos e revisões retrospectivas tenham sugerido um link para efeitos teratogênicos, não foi apresentado aumento sig-nificativo na taxa de defeitos congênitos graves em um estudo multicêntrico, observacional e prospectivo com gestantes expostas a estatinas no primeiro trimestre.

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No entanto, o nascimento prematuro foi mais frequente (136). Em uma revisão sistemática mais recente, não houve relação clara entre o uso de estatina na gravidez e anomalias congênitas. Os autores concluíram que, provavelmente, as estatinas não são teratogênicas; no entanto, devido à limitação de dados e à qualidade das informações, as estatinas devem ser evitadas durante a gravidez (137). O uso de estatinas permanece con-traindicado na gravidez e ele deve ser suspenso antes da concepção (138, 139).

Os sequestrantes de ácidos biliares (isto é, colesti-ramina e colestipol) inibem a absorção de lipídios no nível intestinal e são considerados mais seguros do que outros agentes hipolipemiantes, além de serem o tratamento de escolha para a hiperlipidemia. Contudo, eles também diminuem a absorção de vitaminas lipos-solúveis, o que pode afetar o feto (140). Outros agentes hipolipemiantes com efeitos teratogênicos potenciais incluem gemfibrozil, fenofibrato e ezetimiba.

teRaPia antiPlaquetáRia e

antiCoagulante

A gravidez está associada a um estado de hipercoa-gulabilidade devido ao aumento da produção de certos fatores de coagulação, à diminuição da atividade da proteína S e à inibição da fibrinólise (141). As complica-ções trombóticas são uma das principais causas de mor-bimortalidade materna (142). O risco de complicações tromboembólicas aumenta ao longo da gravidez, atinge o pico na primeira semana pós-parto e permanece elevado nas primeiras 6 semanas pós-parto. A terapia de anticoagulação durante a gravidez é indicada para a prevenção ou o tratamento de tromboembolismo venoso, trombofilia hereditária, síndrome do anticorpo antifosfolípide, RCIU e válvulas cardíacas mecânicas.

antiCoagulantes. A varfarina é um antagonista da vitamina K (AVK) que atravessa a placenta. As recomendações das diretrizes da American Heart Association/American College of Cardiology para o uso de AVKs durante a gravidez foram revisadas em 2014, em reconhecimento à relação dose-dependente com o aumento dos desfechos adversos (143). As taxas de embriopatia, aborto espontâneo e natimortalidade ocorrem com maior frequência com doses diárias > 5 mg (144). Durante a gestação, mulheres com válvulas cardíacas mecânicas apresentam risco de complicações de trombose valvar e hemorrágicas, sendo que a anti-coagulação deve ser meticulosamente monitorada. As diretrizes recomendam que as mulheres administrando > 5 mg de AVKs durante o primeiro trimestre devem ser transferidas para HBPM ou heparina não fracionada até o final da sexta semana de gestação para diminuir

o risco de embriopatia. As diretrizes da American Heart Association/American College of Cardiology contam com um algoritmo de gerenciamento anticoagulação de mulheres com válvulas cardíacas mecânicas durante a gravidez (Figura 2) (143). A síndrome da varfarina fetal ou “síndrome de Di Sala” afeta principalmente o feto no primeiro trimestre, uma vez que a varfarina atravessa a placenta. Ela está associada a dismorfismos faciais, como hipoplasia nasal, anomalias do esqueleto (hipoplasia de membros e epífises pontilhadas), anormalidades do SNC (displasia da linha média ventral e dorsal) e cardiopatias (145-147). Os efeitos do segundo e terceiro trimestres incluem uma incidência de aproximadamente ∼1% de anomalias do SNC e ocular, bem como hemorragia intra-craniana (1). As mulheres administrando AVK durante a gestação devem trocar para HBPM ou heparina não fracionada na 36ª semana de gestação para reduzir o risco de hemorragia fetal no momento do parto vaginal e sangramento materno associado ao parto (148). As mulheres administrando HBPM não são candidatas à anestesia local dentro de 24 horas de sua última dose, portanto, um parto programado pode evitar complica-ções de sangramento de anticoagulantes injetáveis de ação prolongada. A reversão da AVK na mãe não garante a reversão do feto, de modo que, se uma paciente se apresentar em trabalho de parto enquanto estiver ad-ministrando um AVK, deve ser realizada uma cesariana para evitar a hemorragia intraventricular fetal durante a passagem pelo canal do parto.

A HBPM não atravessa a placenta, e os níveis máximos e mínimos de anti-Xa devem ser analisados meticulosa-mente durante a gravidez. Frequentemente, há maior risco de complicações mecânicas da válvula cardíaca em mulheres durante o período de transição do AVK para a heparina (149). A trombose valvular mecânica foi relatada em 4,7% das gestantes com válvulas mecâ-nicas (149). Em uma recente metanálise com desfechos maternos e fetais de mais de 800 mulheres com válvulas cardíacas mecânicas em diferentes estratégias anticoa-gulantes, Steinberg et al. (150) confirmaram que o AVK estava associado ao menor risco de desfechos maternos adversos, enquanto o uso de HBPM estava associado ao menor risco de desfechos fetais adversos.

Estratégias anticoagulantes alternativas podem ser utilizadas em determinados casos. O fondaparinux é um inibidor indireto do fator Xa, com uso recomendado pelo ACOG no contexto de trombocitopenia induzida por he-parina ou de alergia à heparina (151). No momento, não há dados suficientes para recomendar a bivalirudina ou os anticoagulantes orais diretos para gestantes.

agentes antiPlaquetáRios. É comum o uso de aspirina em baixas doses (75 a 100 mg) na prevenção da pré-eclâmpsia. Seu uso também é recomendado no se-

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gundo e terceiro trimestres para mulheres com próteses valvares mecânicas ou bioprotéticas (143). No entanto, dado o aumento do risco de sangramento quando usada em combinação com outros anticoagulantes, as novas diretrizes da ESC não recomendam o uso de aspirina em baixas doses para válvulas mecânicas, contrariando as diretrizes da AHA/ACC (1, 143). Não há evidências de que baixas doses de aspirina aumentem os riscos de sangramento materno ou fetal, o risco de descolamento prematuro da placenta, as anomalias congênitas ou as complicações no momento da anestesia neuroaxial durante o parto (152, 153). O uso de altas doses de aspirina deve ser evitado em gestantes devido ao risco de fechamento prematuro do canal arterial.

O clopidogrel inibe a agregação e ativação plaque-tária, impedindo a ligação do fibrinogênio ao receptor de difosfato de adenosina. Estudos em animais não demonstram efeitos adversos na gravidez com dados humanos limitados (154). Seu uso na gravidez deve ter o menor período possível (1). Antes da anestesia neuroa-xial, ele deve ser interrompido por 7 dias para diminuir o risco de hematoma epidural (155). Existem poucos dados em relação ao prasugrel, ticagrelor, abciximab ou eptifibatide, com o uso dessas substâncias não sendo recomendado (156).

teRaPias avançadas PaRa hiPeRtensão

PulMonaR

As grandes alterações hemodinâmicas da gravidez podem exacerbar a insuficiência cardíaca direita, au-mentar o desvio da direita para a esquerda em pacientes cianóticas, além de ter consequências fatais para mulheres com hipertensão pulmonar (HP). Diversas diretrizes e documentos de consenso recomendam que mulheres com HP, em especial a hipertensão arterial pulmonar do tipo 1, sejam aconselhadas a não engra-vidarem (1, 157). Relatos de históricos de gestantes com HP indicam sobrevida muito ruim, com taxas de letalidade que frequentemente excedem 50% em pequenas séries de casos (158). No entanto, conforme as terapias médicas para HP foram se desenvolvendo, houve certo progresso no manejo de mulheres com HP durante a gravidez, resultando em melhores desfechos, ainda que cautelosos. Uma publicação recente do re-gistro ROPAC relatou melhores desfechos em um grupo de 151 mulheres com HP: nenhuma morte ocorreu durante a gravidez, 3,3% das mulheres morreram na primeira semana pós-parto e 2,6% morreram em até 6 meses após o parto (159). Contudo, esse registro inclui mulheres diagnosticadas com formas leves de HP e > 50% das mulheres incluídas foram baseadas apenas em dados ecocardiográficos. Na verdade, três das sete mulheres (43%) com HP idiopática morreram. Apenas

nove mulheres desse registro estavam administrando medicamentos avançados para HP, enfatizando que esses dados do registro podem ser relativos a mulheres com formas menos avançadas de HP.

Em 2015, o Pulmonary Vascular Research Institute publicou uma declaração sobre gravidez e HP com re-comendações de manejo baseadas em consenso (160). Essas recomendações incluem o uso de prostaglandinas parenterais (epoprostenol endovenoso, treprostinil) em mulheres de classe funcional (CF) IV da Organização Mundial de Saúde (OMS) ou disfunção significativa do VD. O epoprostenol (161) tem sido o mais extensi-vamente estudado. Os medicamentos podem afetar a agregação plaquetária e levar a sangramento.

Prostaglandinas inaladas, como o iloprost (162, 163), podem ser cogitadas em determinadas mulheres com função RV mais preservada e que estão na CF III da OMS. Em mulheres com função normal do VD que estão na CF I ou II, podem ser cogitados os inibidores da fosfodiesterase 5 (sildenafil ou tadalafila) (164). Além disso, há relatos de gravidez bem-sucedida usando uma terapia combinada de epoprostenol e sildenafil (165).

Para mulheres com hipertensão arterial pulmonar responsiva a vasodilatadores e com função preservada do VD, pode ser razoável manter a terapia com BCC durante a gravidez. As pacientes com anticoagulação também podem manter a terapia durante a gravidez. Por fim, os bloqueadores dos receptores da endotelina (por exemplo, bosentana, ambrisentana, macitentana) não devem ser usados na gravidez devido ao potencial teratogênico (por exemplo, malformação mandibular, cardiopatias).

doenças do teCido Conjuntivo

Algumas mulheres com síndrome de Marfan (SMF) apre-sentam maior dilatação da raiz da aorta, com maior risco de dissecção durante a gravidez (166). Outras síndromes aórticas de alto risco incluem Loeys-Dietz, Ehlers-Danlos tipo IV (tipo vascular) e síndrome de osteoaneurisma. Mulheres com síndrome de Turner, que geralmente apre-sentam válvulas aórticas bicúspides (VAB), coarctação da aorta, hipertensão e outros fatores de risco cardiovascular, agora podem engravidar por meio da reprodução assistida, o que as deixa em risco maior de eventos aórticos (167). A VAB não sindrômica é um fator de risco para dissecção durante a gravidez, mas supostamente menor que a SMF (168). Pacientes com SMF ou de alto risco devem passar por investigação pré-concepcional abrangente; e mulheres que estejam administrando betabloqueadores para a pre-venção da dilatação da raiz da aorta são aconselhadas a manter o tratamento durante a gravidez, particularmente no terceiro trimestre e no período periparto. O controle rigoroso da pressão arterial é obrigatório em todas as aortopatias durante a gravidez. Mulheres com SMF com

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raiz aórtica dilatada de 4,0 a 4,5 cm, VAB acima de 5,0 cm e síndrome de Turner com aorta indexada > 25 mm/m2 devem receber aconselhamentos cuidadosos de profis-sionais de cardiologia, cirurgia cardíaca e medicina fetal materna, além de cogitar fortemente a substituição da raiz antes da gravidez (1).

MediCaMentos de ReaniMação duRante

a gRavidez

Os medicamentos maternos para salvar vidas não devem ser suspensos durante situações de emergência, como choque cardiogênico ou parada cardiorrespira-tória. As considerações pós-parada são semelhantes às de pacientes não gestantes. Os betabloqueadores são usados como primeira linha para a supressão da arritmia e síndrome de QT longo (38).

ConClusões

A DCV é a principal causa de morte materna não obstétrica na gravidez. O uso de medicamentos contra

DCV durante a gravidez requer o conhecimento das alterações fisiológicas da gravidez, o que pode alterar as propriedades do medicamento, bem como seus efeitos sobre o feto. Uma equipe multidisciplinar deve fornecer aconselhamento cuidadoso e completo para a gestante com DCV relacionada aos riscos e benefícios do uso de medicamentos. Conforme nossa compreensão da fisiologia da gravidez, da farmacologia e das interações fetais e placentárias evoluam, teremos uma melhor capacidade de tratar as condições de DCV materna durante a gravidez.

agRadeCiMentos. Os autores agradecem ao Dr. Frank Cecchin por sua contribuição valiosa e a Abigail Moses por sua assistência na criação da Ilustração Central.

CoRResPondÊnCia. Dr. Dan G. Halpern, Programa de Cardiopatias Congênitas Adultas, New York University School of Medicine, The Leon H. Charney Division of Cardiology, NYU Langone Health, 530 First Avenue, HCC building 7H, New York, New York 10016, EUA. E-mail: [email protected]. Twitter: @nyulangone.

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PALAVRAS-CHAVE farmacocinética, gestação, gravidez, medicamentos cardiovasculares

FreireComentário Editorial

56

A doença cardiovascular na idade procriativa não é muito frequente, calcula-se que de 1 a 3% das mulheres em idade procriativa têm cardiopatia.

Apesar dessa prevalência relativamente baixa, as complicações cardiovasculares são a principal causa de mortalidade materna indireta, isto é, causa não obsté-trica, em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Já as doenças hipertensivas são responsáveis por uma proporção elevada das causas de mortalidade materna direta no Brasil e em países em desenvolvimento. De acordo com a ONU, a mortalidade materna caiu cerca de 44% no período de 1990-2015. Dos nove países que conseguiram alcançar a meta de redução em pelo menos 75% desse índice, dois são países de língua portuguesa: Timor Leste e Cabo Verde. Os demais países em desen-volvimento tiveram progressos, mas não alcançaram essa meta. A mortalidade materna sempre foi consi-derada um dos melhores indicadores de saúde de uma população e, por isso, a grande importância de ações que promovem a melhora desse marcador (1-3).

Não levando em consideração a hipertensão arterial, as valvulopatias de etiologia reumática ainda são as cardiopatias mais presentes nas séries brasileiras e em países como Moçambique. Entretanto, dados popu-lacionais ainda são escassos em populações de línguas portuguesas, com publicações isoladas ou citações em relatórios de saúde pública dos oito países de língua portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste). Além das cardiopatias adquiridas, a melhora dos tratamentos das cardiopatias congênitas, especialmente o cirúrgico, vem propiciando o aumento do número de mulheres com cardiopatias congênitas em idade procriativa. Esse cenário aumenta o desafio do cuidado com essas pacientes durante a gravidez e lactação. A

evidência científica rigorosa, usual para aprovação de tratamentos fora da gestação, isto é, demonstrada por ensaios clínicos usando grupos controle, randomizados e duplo cegos são praticamente inexistentes para esse grupo de pacientes. Assim, a evidência de efetividade e segurança do uso de medicações no período gravídico e de lactação habitualmente são avaliadas ex post facto, isto é, um número de crianças após serem identificadas com um defeito congênito não usual, vai ser relacionada ao uso da droga durante a gestação. A investigação sobre teratogenicidade é sempre retrospectiva, pois está sujeita a muitos fatores de confusão, como a infecção intrauterina ou doenças maternas. Apesar de todas as exposições, apenas 2 a 3% de todas as anomalias congê-nitas estão relacionadas à exposição a drogas (1,4,5).

Em fevereiro deste ano a publicação de Halpern et al. no JACC (6) apresentou de forma didática e orga-nizada, dados atualizados sobre o uso de drogas nas várias formas de cardiopatias que podem necessitar tratamento no período da gravidez e amamentação. Apesar de todas as dificuldades que este tema envolve, os autores reuniram 168 referências atualizadas. O artigo é de grande relevância para todos os profissio-nais envolvidos na atenção a essas pacientes, isto é, cardiologistas, obstetras, neonatologistas e médicos de cuidados primários.

Após o desastre da talidomida, o FDA categorizou as medicações quanto ao risco de teratogenicidade em classes ABCDX e, por cerca de mais 30 anos essa classi-ficação foi utilizada na escolha de medicações cardio-vasculares na gestação e sujeita a muitas interpretações errôneas. Em 2015, essa classificação foi substituída por uma nova regra: Pregnancy and Lactation Labeling Rule (PLLR) (4,7,8) onde textos completos das informações sobre uso das medicações, não só na gestação como

*Mestre e Doutora em Clínica Médica pela UFMG; Coordenadora do Ambulatório de Cardiopatia e Gravidez do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da UFMG; Cardiologista e Ecocardiografista titulada pela Sociedade Brasileira de Cardiologia; Ecografista Vascular titulada pelo Colégio Brasileiro de Radiologia. E-mail: [email protected]

CoMentáRio editoRial

Uso de medicamentos para doenças cardiovasculares durante a gravidezCláudia Maria Vilas Freire*

FreireComentário Editorial

57

também na lactação, tornaram as informações mais claras e, consequentemente, menos confusas. Os autores relatam inicialmente as alterações cardiovasculares e far-macocinéticas durante a gravidez e lactação e informam as bases atualizadas e mais consistentes sobre o uso das medicações cardiovasculares. Em seguida, abordam o tratamento da maioria das cardiopatias e síndromes clí-nicas cardiovasculares que necessitam do uso de drogas nesse período de forma sumária, mas bem abrangente. O artigo menciona também cardiopatias atuais como aquelas mulheres que engravidam após transplante car-díaco e o uso de medicações que mudaram a mortalidade das grávidas portadoras de hipertensão pulmonar.

A clareza da ilustração presente no artigo, que de maneira singela, conseguiu reunir as melhores infor-

mações sobre a segurança de drogas cardiovasculares na gravidez, lactação e no tratamento de cardiopatias fetais. A ilustração é de grande utilidade a todos os pro-fissionais da área de atuação, na escolha de substâncias mais seguras (6,8).

A maioria dos países de língua portuguesa se encontra dentro do conceito de países em desenvolvimento ou recentemente industrializados. Essa publicação sobre um tema diretamente relacionado a saúde materna e da criança é de grande relevância para nossos países que ainda lutam para melhoria dos índices de desenvolvi-mento social. Sabidamente cerca de 32% das cardiopatas que engravidam usam medicações durante a gestação, por isso são bem-vindas as publicações de qualidade que ajudem no cuidado das gestantes cardiopatas (9).

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ReFeRÊnCias

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 9 P U B L I C A D O P E L A E L S E V I E R E M N O M E D A

A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

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Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster, em JACC.org

o PResente e o FutuRo

REVISÃO DO ESTADO DA ARTE DO JACC

Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetes

Revisão do Estado da Arte do JACC

Kelly McHugh, BA,a Adam D. DeVore, MD, MHS,a,b Jingjing Wu, MS,b Roland A. Matsouaka, PHD,b Gregg C. Fonarow, MD,c Paul A. Heidenreich, MD,d,e Clyde W. Yancy, MD, MSC,f Jennifer B. Green, MD,g,h Natasha Altman, MD,i Adrian F. Hernandez, MD, MHSa,b

Resumo

A insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP) é a forma mais comum de IC, acometendo mais de três milhões de adultos somente nos Estados Unidos. A ICFEP é uma síndrome com vários fenótipos, sendo um deles possivelmente relacionado a comorbidades, incluindo o diabetes melito (DM). O DM possui, aproximadamente, 45% de prevalência na ICFEP, mas as características e os desfechos dessa população são pouco compreendidos. Nesta revisão de literatura, são apresentados dados resumidos de diversos ensaios clínicos envolvendo o tratamento da ICFEP e dados inéditos de uma grande coorte utilizando o registro Get With The Guidelines-HF. Em conjunto, sugerem que há maior morbidade e mortalidade a longo prazo quando o DM é associado à ICFEP. A seguir, são discutidos diversos mecanismos patológicos comuns da ICFEP e do DM, incluindo retenção de sódio, transtornos metabólicos, função musculoesquelética comprometida e potenciais alvos terapêuticos. À medida que o entendimento sobre a coexistência da ICFEP e do DM cresce, espera-se que os médicos estejam melhor equipados para oferecer tratamentos efetivos centrados no paciente. (J Am Coll Cardiol 2019;73:602–11) © 2019 Publicado pela Elsevier em nome da American College of Cardiology Foundation.

aDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, Duke University School of Medicine, Durham, North Carolina, EUA; bDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, Duke Clinical Research Institute, Durham, North Carolina, EUA; cDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, Ahmanson–UCLA Cardiomyopathy Center, Ronald Reagan–UCLA Medical Center, Los Angeles, California, EUA; dVeterans Affairs Palo Alto Health Care System, Palo Alto, California, EUA; eDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, Stanford University, Stanford, California, EUA; fDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, Northwestern Feinberg School of Medicine, Chicago, Illinois, EUA; gDepartamento de Medicina, Setor de Endocrinologia, Duke University School of Medicine, Durham, North Carolina, EUA; hDepartamento de Medicina, Setor de Endocrinologia, Duke Clinical Research Institute, Durham, North Carolina, EUA; e iDepartamento de Medicina, Setor de Cardiologia, University of Colorado-Denver, Aurora, Colorado, EUA. Esta pesquisa foi financiada para Dr. Hernandez pela American Heart Association. O programa Get With The Guidelines-Heart Failure (GWTF-HF) é disponibilizado pela American Heart Association. Ele é parcialmente patrocinado pela Amgen Cardiovascular e já foi financiado pela Medtronic, GlaxoSmithKline, Ortho-McNeil e American Heart Association Pharmaceutical Roundtable. Dr. DeVore foi financiado pela Akros Medical, American Heart Association, Amgen, Bayer, Intra-Cellular Therapies, Luitpold Pharmaceuticals, National Heart, Lung, and Blood Institute, Novartis e Patient-Centered Outcomes Research Institute; também atuou como consultor para a Novartis. Dra. Wu é funcionária da Cytel. Dr. Fonarow foi financiado pelo National Institutes of Health; e atuou como consultor para a Amgen, Abbott, Janssen, Medtronic, Novartis e St. Jude Medical. Dr. Yancy é presidente do subcomitê do GWTG-Heart Failure da American Heart Association. Dra. Green foi financiada pela AstraZeneca/Bristol-Myers Squibb, Boehringer Ingelheim, GlaxoSmithKline, Sanofi e Intarcia Therapeutics; também atuou como consultora para AstraZeneca, Merck Sharp & Dohme, Daiichi-Sankyo Company, Boehringer Ingelheim Pharmaceuticals, Sanofi/Regeneron e Novo Nordisk. Dra. Altman foi financiada pela American Heart Association. Dr. Hernandez foi financiado pela AstraZeneca, GlaxoSmithKline, Luitpold, Merck e Novartis; também atuou como consultor para a Bayer, Boston Scientific, Merck e Novartis. Todos os demais autores informaram não ter conflitos relevantes aos conteúdos deste artigo para declarar.

Manuscrito recebido em 22 de outubro de 2018; manuscrito revisado recebido em 9 de novembro de 2018, aceito em 13 de novembro de 2018.

A insuficiência cardíaca (IC) atinge aproximada-mente 6,5 milhões de pessoas apenas nos Estados Unidos, sendo esperado um aumento de 46% na

prevalência até 2030 (1). Atualmente, a insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP) é a forma mais comum de IC, caracterizada pela síndrome

de IC e uma fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) normal ou praticamente normal. Cresce, ao mesmo tempo, o reconhecimento de que a ICFEP talvez não seja uma doença isolada. Na verdade, é mais provável que seja uma síndrome de variação fenotípica discreta (2-4), sendo possível que um fenótipo específico esteja

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McHugh et al.Revisão de literatura sobre ICFEP e DM

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relacionado a condições subjacentes. Compreender e visar os processos patológicos que contribuem para esses fenótipos pode ser mais benéfico que focar apenas na disfunção cardíaca decorrente.

É comum a coexistência do diabetes melito (DM) e da IC, influenciando o prognóstico de forma negativa e significante. Aproximadamente 30,3 milhões de ameri-canos são diabéticos, 84,1 milhões são pré-diabéticos e é esperado um aumento da prevalência em 54% até 2030 (5, 6). É importante ressaltar que cerca de 45% dos pacientes com ICFEP possuem DM e a prevalência da comorbidade está aumentando de maneira expres-siva entre aqueles no início da ICFEP (7). O DM tem recebido crescente atenção entre a comunidade da IC devido tanto ao impacto negativo do DM no prognóstico de IC com fração de ejeção reduzida (ICFER) quanto aos resultados de ensaios clínicos demonstrando os efeitos benéficos e prejudiciais de anti-hiperglicêmicos nos desfechos da IC. No entanto, dados reunidos a partir da prática clínica, que abrangem as características e a evo-lução dos pacientes com ICFEP e DM, são limitados. Há uma necessidade de compreensão das características clínicas e dos desfechos dos pacientes com ICFEP e DM para nortear a tomada de decisão terapêutica, destacar potenciais alvos fenotípicos e auxiliar no desenvol-vimento de ferramentas de estratificação de risco. Nesta revisão de literatura, expomos um quadro geral do presente paradigma da ICFEP. Apresentamos dados resumidos de diversos ensaios clínicos que examinam o efeito do DM na ICFEP e dados inéditos de uma grande coorte com pacientes acometidos pela ICFEP, diabéticos e não diabéticos, no registro Get With The Guidelines (GWTG)-HF. Por fim, discutimos vários mecanismos fisiopatológicos de potencial importância em pacientes com ICFEP e DM (Ilustração Central) e possíveis alvos terapêuticos.

insuFiCiÊnCia CaRdíaCa CoM FRação de

ejeção Reduzida

Dados obtidos de registros e estudos com base na comunidade demonstram que pacientes com ICFEP são com frequência mais velhos, do sexo feminino e propensos a ter múltiplas comorbidades, incluindo hipertensão, diabetes, doença pulmonar, doença renal crônica e obesidade (8, 9). Os desfechos da ICFEP são infelizmente desfavoráveis e semelhantes aos da ICFER, com 10% a 30% de mortalidade em 1 ano (10). O estudo de Cheng et al. (9), utilizando dados do registro GWTG-HF, não encontrou diferença na mortalidade em 1 ano entre a ICFER e a ICFEP. Enquanto pacientes com ICFER tiveram taxas mais altas de reinternação por IC, pacientes com ICFEP apresentaram taxas mais altas de reinternação por causas diversas. A mortalidade por

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

BNP = peptídeo natriurético tipo B

DM = diabetes melito

FEVE = fração de ejeção do ventrículo esquerdo

GWTG = Get With The Guidelines

IC = insuficiência cardíaca

ICFEP = insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada

ICFER = insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida

IC de 95% = intervalo de confiança de 95%

IMC = índice de massa corporal

NT-proBNP = N-terminal do peptídeo natriurético tipo B

OR = razão de chances (odds ratio)

causas não cardiovasculares é mais alta na ICFEP em relação à ICFER, provavelmente pela maior carga de comorbidade (9). As mortes sú-bitas correspondem a cerca de 20% do total de mortes de acordo com os últimos estudos sobre a ICFEP e os mais propensos são do sexo mas-culino e diabéticos tratados com insulina (11). Além disso, ainda que a taxa de mortalidade da ICFER tenha diminuído nos últimos 15 anos, a da ICFEP permaneceu a mesma, provavelmente devido à escassez de tratamentos baseados em evidências para a ICFEP em comparação com a ICFER (1).

Ao longo das duas últimas décadas, houve avanços significativos em relação ao trata-mento da ICFER, principalmente ao ter como alvo a ativação neuro-humoral. Embora inibi-dores da enzima de conversão da angiotensina, bloqueadores dos receptores de angiotensina, betablo-queadores e antagonistas da aldosterona tenham redu-zido a mortalidade por ICFER, o mesmo não pode ser dito da ICFEP, e nenhum estudo até hoje atingiu os desfechos de morbidade/mortalidade (4). Há uma necessidade urgente de desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas para pacientes com ICFEP. É importante ressaltar que o estudo PARAGON-HF (Prospective Com-parison of Angiotensin Receptor Neprilysin Inhibitor With Angiotensin Receptor Blocker Global Outcomes in Heart Failure and Preserved Left Ventricular Ejection Fraction – Comparação Prospectiva Entre Desfechos Globais da Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Ventricular Esquerda Preservada Com Inibidores Da Neprilisina e Receptores da Angiotensina Com Bloquea-dores de Receptores da Angiotensina) já encerrou o seu recrutamento. Considerando as características basais do estudo PARAGON-HF, observa-se que embora os participantes tenham idades e distribuição entre sexos semelhantes aos de estudos anteriores da ICFEP, eles possuem maior prevalência de comorbidades, incluindo DM e doença renal crônica (12).

Antes considerada uma doença primordialmente de disfunção diastólica, hoje aceita-se que existem diversos transtornos na ICFEP, incluindo, entre outros, prejuízos no fluxo de reserva coronariana, na função atrial, no tônus autonômico e em mecanismos periféricos, como função endotelial e musculoesquelética (4, 13). Os perfis dos biomarcadores da ICFEP também corroboram um fenótipo pró-inflamatório, em oposição a marcadores de estiramento cardíaco que predominam na ICFER (14). No entanto, dada a multiplicidade de prejuízos es-truturais e funcionais na ICFEP, uma variedade de vias mecanicistas com efeitos diversos possivelmente con-tribui para a fisiopatologia no geral. A heterogeneidade fenotípica da ICFEP é cada vez mais reconhecida, e tem

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sido proposto um paradigma em que a ICFEP colabora para a inflamação causada por comorbidades, levando a disfunções sistêmicas e cardíacas microvasculares (3, 14, 15). Assim, há um crescente interesse em relação à necessidade de tratamentos específicos aos fenótipos. Devido à alta prevalência de DM em ICFEP e seu efeito em múltiplos órgãos, as características e os desfechos dos pacientes com coexistência de ICFEP e DM merecem avaliação mais aprofundada.

iCFeP CoM dM ConCoMitante

O DM é associado a um maior risco de morbimortali-dade em pacientes com ICFER crônica. Embora dados de ensaios clínicos sugiram que a associação prognóstica negativa com o DM pode ser maior na ICFEP que na ICFER, dados da prática clínica a respeito da ICFEP e do DM são limitados (16, 17).

dados de ensaios ClíniCos

Os dados de quatro grandes ensaios clínicos com pacientes acometidos pela ICFEP foram usados para avaliar o impacto prognóstico do DM. Foram priorizados estudos com critérios definitivos da FEVE, assim como aqueles que descreveram aspectos e desfechos clínicos dos pacientes com ICFEP e DM. Os principais achados estão resumidos na Tabela 1. Em conjunto, esses dados sugerem que o DM é associado a maior morbimortali-dade em ICFEP.

O estudo CHARM (Candesartan in Heart failure: Assessment of Reduction in Mortality and Morbidity – Candesartana na Insuficiência Cardíaca: Avaliação da Redução da Mortalidade e Morbidade) acompanhou 3.023 pacientes com FEVE >40% por um período de seguimento médio de 37,7 meses. Os pacientes com DM apresentaram mais sinais e sintomas de sobrecarga vo-

ilustRação CentRal Carga da ICFEP com diabetes melito concomitante nos Estados Unidos

McHugh, K. et al. J Am Coll Cardiol. 2019;73(5):602-11.

A prevalência da ICFEP e do DM estão ilustradas com seus fatores de risco associados. As características e os processos patológicos comuns às duas doenças são retratados na parte central da figura, incluindo sobrecarga volêmica devido a natriurese e ativação neuro-humoral prejudicadas, multimorbidade, inflamação e transtornos periféricos, como função musculoesquelética comprometida. Esses processos contribuem para a maior morbimortalidade de pacientes com ICFEP diabéticos em relação aos não diabéticos. DM = diabetes melito; ICFEP = insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada.

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lêmica, pior estado funcional, índice de massa corporal (IMC) mais alto, maiores taxas de hipertensão e cardio-patia isquêmica e pior função renal quando comparados àqueles sem DM. O DM foi associado a um número de mortes cardiovasculares ou hospitalização por IC duas vezes maior, assim como maior mortalidade por todas as causas. O estudo também examinou os efeitos do DM em pacientes com baixa FEVE (<40%) e encontrou uma associação do DM com mortalidade cardiovascular e reinternações por IC mais forte na ICFEP do que naqueles com baixa FEVE (17). É importante notar que, quando o estudo foi realizado, pacientes com FEVE entre 40% e 49% eram incluídos no grupo da ICFEP. Entretando, IC com FEVE de 40% a 49% é reconhecida atualmente como IC com fração de ejeção na faixa média, e estudos recentes mostram que esses quadros se assemelham mais à ICFER que à ICFEP (18).

O estudo DIG (Digitalis Investigation Group – Grupo de Investigação de Digitálicos) acompanhou 987 pa-cientes com FEVE >45% por 37 meses. Os pacientes com DM tinham IMC mais alto, maiores taxas de congestão e edema periférico, e maior probabilidade de serem mais jovens, do sexo feminino e com um histórico de hiper-tensão e cardiopatia isquêmica. O DM foi associado a um risco 68% maior de hospitalização ou morte por IC, assim como a um maior risco de mortalidade total (19).

O estudo I-PRESERVE (Irbesartan in Heart Failure with Preserved Ejection Fraction – Irbesartana na In-suficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Preservada) abrangeu 4.128 pacientes com FEVE ≥45% durante 4,1 anos. Os pacientes com DM eram mais jovens, tinham IMC mais alto, mais sinais de sobrecarga volêmica, pior qualidade de vida e níveis mais elevados de N-terminal do peptídeo natriurético tipo B (NT-proBNP). Dados ecocardiográficos detalhados foram obtidos de 745

pacientes. Embora os dados estivessem incompletos, os pacientes com DM apresentaram maiores dimensões sistólicas e diastólicas finais, massa ventricular es-querda e área do átrio esquerdo. Não foram observadas diferenças significativas na função sistólica ventricular esquerda, mas a relação E/e′ era mais elevada em pa-cientes com DM. O DM foi associado a um maior risco de desfecho composto por morte cardiovascular ou reinternação por IC, assim como mortalidade por todas as causas (20).

O estudo RELAX (Phosphodiesterase-5 Inhibition to Improve Clinical Status and Exercise Capacity in Heart Failure With Preserved Ejection Fraction – Inibidores da Fosfodiesterase 5 Para Melhora do Estado Clínico e Aptidão Física na Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Preservada) acompanhou 216 pacientes com FEVE ≥50% por 6 meses. Os pacientes com DM eram mais jovens e obesos, do sexo masculino e tinham maiores taxas de hipertensão, doença vascular, cardiopatia isquê-mica, doença pulmonar obstrutiva e doença renal. Uma análise de biomarcadores revelou que pacientes com DM tinham níveis similares de NT-proBNT se comparados aos não diabéticos, mas tinham níveis mais elevados de vasoconstritor, endotelina-1, marcadores inflamatórios, proteína C-reativa e ácido úrico, marcadores profibró-ticos, galectina-3 e telopeptídeo carboxiterminal do colágeno tipo I. Os dados ecocardiográficos mostraram que pacientes com DM apresentavam relação E/e′ mais elevada, mas não houve diferenças em outras medidas de função sistólica e diastólica. Os pacientes com DM apre-sentavam massa ventricular esquerda aumentada, mas nenhuma diferença no volume ou na espessura da parede ventricular esquerda. Nos testes físicos, pacientes com DM apresentaram Vo2 pico mais baixo, menores distân-cias na caminhada de seis minutos e taxas mais elevadas

Tabela 1. Características e desfechos de pacientes com ICFEP diabéticos e não diabéticos obtidos a partir de ensaios clínicos

Estudo (ano)* Características da coorte Características de pacientes com ICFEP diabéticos e não diabéticos Desfechos†

CHARM (2008) FEVE>40% N = 3.023

Maiores sinais/sintomas de sobrecarga volêmica, IMC mais alto, pior classe funcional da NYHA, hipertensão, cardiopatia isquêmica, acidente vascular cerebral, insuficiência renal

Morte CV ou hospitalização por IC RR: 2,0 (1,70–2,36); p < 0,0001 Mortalidade por todas as causas: RR: 1,84 (1,51-2,26) p <0,0001

DIG (2010) FEVE>45% N = 987

Mais jovens, do sexo feminino, IMC mais alto, hipertensão, IC por isquemia, mais sinais de edema periférico e congestão

Mortalidade ou hospitalização por IC: RR: 1,68 (IC de 95%: 1,26 a 2,25); p < 0,001 Mortalidade por todas as causas: RR: 1,48 (IC de 95%: 1,11-1,99); p = 0,009

RELAX (2014) FEVE>50% N = 216

Mais jovens, obesos, do sexo masculino, hipertensão, doença pulmonar, doença vascular, disfunção renal NT-proBNP similar, ácido úrico, PCR, CTX, endotelina-1 e galectina-3 mais altos Relação E/e′ e massa VE maiores, função sistólica similar Vo2 pico e teste de caminhada de 6 minutos mais baixos

Hospitalização por causas cardíacas ou renais em 6 meses: RR: 4,08 (IC de 95%: 1,60-10,36); p = 0,003

I-PRESERVE (2017) FEVE>50% N = 4.128

Mais jovens, IMC mais alto, mais sinais de sobrecarga volêmica, IC por isquemia, pior qualidade de vida, nível de NT-proBNP mais alto Medidas sistólicas e diastólicas finais aumentadas, massa VE, área atrial e relação E/e′ aumentadas, sem diferença na função sistólica

Morte CV ou hospitalização por IC: RR: 1,75 (IC de 95%: 1,49–2,05) Mortalidade por todas as causas: RR: 1,59 (IC de 95%: 1,33-1,91)

*Os estudos estão ordenados por ano de publicação. †Razões de risco (RRs) são listadas com intervalos de confiança de 95% e valores de p quando disponíveis. CHARM = Candesartan in Heart failure: Assessment of Mortality and Morbidity; CTX = telopeptídeo carboxiterminal do colágeno tipo I; CV = cardiovascular; DIG = Digitalis Investigation Group; DM = diabetes melito; FEVE = fração de ejeção ventricular esquerda; IC = insuficiência cardíaca; ICFEP = insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada; IMC = índice de massa corporal; I-PRESERVE: Irbesartan in Heart Failure with Preserved Ejection Fraction; NT-proBNT = N-terminal do peptídeo natriurético tipo B; NYHA = New York Heart Association; PCR = proteína C-reativa; RELAX = Phosphodiesterase-5 Inhibition to Improve Clinical Status and Exercise Capacity in Heart Failure with Preserved Ejection Fraction; RR = razão de risco; VE = ventrículo esquerdo.

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de incompetência cronotrópica. Os pacientes com DM tinham maior probabilidade de serem hospitalizados em 6 meses por causas cardíacas ou renais (21).

Dados de ensaios clínicos sugerem que o DM na ICFEP é associado a multimorbidade, estado funcional e aptidão física comprometidos, maior quantidade de marcadores de inflamação, fibrose e disfunção endote-lial, pior congestão, pressão de enchimento ventricular esquerdo mais alta e maior mortalidade e internações por IC. Embora esses dados sejam úteis, os estudos incluem uma população muito específica, e a capaci-dade para recrutamento é relativamente pequena se comparada a dos estudos retrospectivos. Por isso, os autores conduziram uma análise retrospectiva de uma grande coorte de pacientes com ICFEP diabéticos e não diabéticos utilizando o registro GWTG-HF para melhor caracterizar essa população.

iCFeP CoM e seM dM: aChados do

RegistRo gWtg-hF

O registro GWTG-HF, criado pela American Heart Association em 2005, é uma iniciativa nacional de dados hospitalares que busca a melhoria da qualidade, conforme previamente descrito (22, 23). Com mais de uma década de dados obtidos de internações por IC, o GWTG-HF é o maior registro contemporâneo de pacientes com IC e tem contribuído para melhorias no manejo da IC nos Estados Unidos, sendo uma robusta fonte de dados para nossa análise. Conduzimos um estudo de coorte retrospectivo de 232.656 pacientes com ICFEP (ejeção de fração >50%) hospitalizados pelo surgimento ou piora da IC no registro GWTG-HF entre 2006 e 2017, incluindo 62.402 pacientes ligados a solicitações de reembolso ao Medicare, para análise dos desfechos pós-alta (Figura On-line 1). Comparamos as características basais, os desfechos hospitalares e os desfechos pós-alta em 30 dias de diabéticos e não diabéticos. Os desfechos de curto prazo relevantes incluíram mortalidade hospitalar, tempo de internação (<4 ou ≥4 dias) e destino pós-alta (casa ou unidade de cuidados paliativos, clínicas de repouso, etc.). Desfechos pós-alta incluíram mortalidade, reinternações por todas as causas e reinternações por IC em 30 dias (confira a metodologia completa no Apêndice On-line).

Os pacientes com ICFEP e DM eram propensos a serem mais jovens, do sexo masculino e não cauca-sianos, e a apresentarem maiores taxas das seguintes comorbidades: hipertensão, hiperlipidemia, doença pulmonar obstrutiva crônica/asma, acidente vascular cerebral/ataque isquêmico transitório, doença vascular periférica, histórico de isquemia, insuficiência cardíaca prévia, insuficiência renal, anemia e depressão. Os pacientes diabéticos tinham pressão arterial sistólica,

índice de massa corporal e peso maiores no momento da internação e da alta, mas níveis de peptídeos natriu-réticos do tipo B (BNP) mais baixos se comparados aos dos não diabéticos (Tabela On-line 1).

Embora pacientes diabéticos apresentassem taxa de mortalidade hospitalar mais baixa que a de pacientes não diabéticos (2,1% vs. 2,8%), o DM, em uma análise ajustada, não foi associado de forma independente à mortalidade hospitalar [odds ratio (OR): 1,05; intervalo de confiança de 95%: 0,99 a 1,11] (Tabela 2). O DM foi associado a uma internação significativamente mais longa (OR: 1,27; IC de 95%: 1,23 a 1,31) e probabilidade significativamente menor de alta para casa (OR: 0,83; IC de 95%: 0,81 a 0,86). Pacientes com DM tiveram uma taxa de mortalidade em 30 dias mais baixa que a de não diabéticos (4,8% vs. 6,2%; p < 0,0001); porém, em uma análise ajustada, o DM não foi associado de forma independente à mortalidade

tabela 2 Desfechos hospitalares em pacientes com ICFEP diabéticos e não diabéticos no Registro GWTG-HF

Taxa de desfecho, %

OR ajustada IC de 95% Valor

de p

Mortalidade hospitalar

Total 2,47 0,1301

Diabéticos 2,09 1,05 0,99-1,11

Não diabéticos 2,79

Tempo de internação ≥4 dias

Total 47,58 <0,0001

Diabéticos 50,01 1,27 1,23-1,31

Não diabéticos 45,50

Alta hospitalar

Total 70,55 <0,0001

Diabéticos 72,83 0,83 0,81-0,86

Não diabéticos 68,61

IC de 95% = intervalo de confiança de 95%; GWTG = Get With The Guidelines; OR = odds ratio; outras abreviaturas conforme a Tabela 1.

tabela 3 Desfechos pós-alta em pacientes com ICFEP diabéticos e não diabéticos no Registro GWTG-HF

Taxa de eventos cumulativos, %

OR ajustada IC de 95% Valor de

p *

Mortalidade em 30 dias

Total 5,64

Diabéticos 4,75 1,027 0,948-1,111 0,5165

Não diabéticos 6,22

Reinternação em 30 dias por todas as causas

Total 14,67

Diabéticos 16,03 1,099 1,052-1,149 <0,0001

Não diabéticos 13,77

Reinternação em 30 dias por IC

Total 4,64

Diabéticos 5,29 1,208 1,117-1,307 <0,0001

Não diabéticos 4,21

*Valores de p refletem a relevância das razões de risco; valores de p para testes de log rank e testes de Gray para incidência cumulativa não são exibidos.Abreviaturas conforme as Tabelas 1 e 2.

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em 30 dias (RR: 1,03; IC de 95%: 0,95 a 1,11) (Tabela 3). O DM foi associado a uma probabilidade significativamente maior de readmissão em 30 dias por todas as causas (RR: 1,10; IC de 95%: 1,05 a 1,15) e readmissão por IC (RR: 1,21; IC de 95%: 1,12 a 1,31).

Também examinamos a associação de níveis de BNP e desfechos hospitalares em diabéticos e não diabéticos. Na análise ajustada, quartis mais altos de BNP foram associados a maior risco de mortalidade hospitalar, internações mais longas e menor probabilidade de alta. No entanto, foi observada interação significativa entre o BNP e o DM, tanto que o efeito do BNP elevado era menor na mortalidade hospitalar e no tempo de internação em pacientes diabéticos (Figura On-line 2).

Neste grande estudo retrospectivo, observamos um aumento significativo de morbidade hospitalar e pós-alta associada ao DM em pacientes com ICFEP. Esses achados destacam a necessidade crítica de estratégias de tratamento e manejo para ICFEP e DM a fim de melhorar a qualidade de vida e reduzir a utilização de recursos. Apesar de ensaios clínicos revelarem maior mortalidade associada ao DM, tanto a mortalidade hospitalar quanto a de 30 dias não foram afetadas de maneira significativa pelo DM. As associações diferenciais do DM com a mor-talidade e morbidade de curto prazo podem refletir dois mecanismos distintos associados ao DM na ICFEP. Os me-canismos hemodinâmicos com ação mais rápida podem contribuir para a sobrecarga volêmica e se manifestar na internação e logo após a alta. Os mecanismos de remode-lamento com ação mais lenta podem levar a uma maior mortalidade, mas sem evidência em 30 dias. No texto a seguir, discutimos esses e outros mecanismos fisiopato-lógicos possíveis na ICFEP com DM concomitante.

MeCanisMos Possíveis e alvos

teRaPÊutiCos

Embora os mecanismos fisiopatológicos definitivos do DM na ICFEP ainda precisem ser elucidados, com

base em dados coletados de ensaios clínicos e da coorte GWTG-HF, propomos diversos mecanismos possíveis e formas de visar esses processos a fim de melhorar os desfechos.

Retenção de sódio e sobReCaRga

volÊMiCa

A sobrecarga volêmica e a congestão ainda são causas comuns de hospitalizações por IC. Os pacientes diabéticos têm ativação neuro-humoral elevada e alterações no manejo do sódio, que podem predispor a congestão, síndrome cardiorrenal e menor responsi-vidade diurética. A hiperglicemia no quadro diabético causa suprarregulação de cotransportador de sódio e glicose 2, levando a maior absorção de sódio no túbulo proximal, expansão volêmica e menor responsividade diurética (24). Evidências também reforçam uma corre-lação positiva entre a síndrome metabólica e a ativação excessiva do sistema renina-angiotensina e do sistema simpático (25).

Nos estudos CHARM, DIG e I-PRESERVE, os pacientes diabéticos apresentaram mais sinais de congestão. Em-bora o estado volêmico não tenha sido analisado direta-mente no estudo GWTG-HF, pacientes com ICFEP e DM mostraram maiores frequências de ventilação mecânica e diálise/ultrafiltração e pior função renal, o que pode sugerir sobrecarga volêmica. Um volume aumentado no momento da hospitalização e uma pior resposta diuré-tica podem contribuir para uma internação mais longa de pacientes diabéticos, enquanto uma diurese alterada na alta pode explicar o aumento de reinternações por IC em 30 dias. Apesar da propensão à maior sobrecarga volêmica em diabéticos, a associação entre o BNP e o NT-proBNP, marcadores de sobrecarga volêmica, e o DM em pacientes com ICFEP mostra-se inconsistente nos estudos. Os diferentes critérios de inclusão da FEVE podem explicar a heterogeneidade dos resultados, pois verifica-se que peptídeos natriuréticos se elevam

tabela 4 Estudos em andamento sobre inibidores de SGLT-2 em pacientes com ICFEP e DM

Estudo Terapia População Desfecho primário Recrutamento esperado

EMPEROR-PRESERVED (NCT03057951) Empagliflozina FE >40%, ± DM tipo 2, NT-proBNP elevado Tempo até morte CV ou hospitalização por IC em 38 meses 4.126

EMBRACE-HF (NCT03030222) EmpagliflozinaFE >40% ou <40% DM tipo 2 Pressão AP diastólica ≥12 mmHg

Variação na pressão AP diastólica da linha de base até 8 a 12 semanas 60

ERADICATE-HF (NCT03416270) Ertugliflozina FE >20% (ICFEP e ICFER) e DM BNP elevado

Reabsorção de sódio pelo túbulo proximal em 1 e 12 semanas 36

PRESERVED-HF (NCT03030235) DapagliflozinaFE ≥45% DM tipo 2 BNP elevado

Variação no NT-proBNP da linha de base até 6 e 12 semanas 320

AP = arterial pulmonar; BNP = peptideo natriurético cerebral; EMBRACE-HF = Empagliflozin Impact on Hemodynamics in Patients With Heart Failure; EMPEROR-PRESERVED = Empagliflozin Outcome Trial in Patients With Chronic Heart Failure with Preserved Ejection Fraction; ERADICATE-HF = Ertugliflozin in Diabetes With Preserved or Reduced Ejection Fraction Mechanistic Evaluation in Heart Failure; IC = insuficiência cardíaca; PRESERVED-HF = Dapagliflozin in PRESERVED Ejection Fraction Heart Failure; SGLT-2 = cotransportador de sódio e glicose 2; outras abreviaturas conforme a Tabela 1.

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menos na ICFEP do que na ICFER (15). A atenuação da associação entre o BNP e piores desfechos hospitalares no estudo GWTG-HF pode ser explicada pelo fato de comorbidades ou outros fatores clínicos em pacientes diabéticos afetarem o tempo de internação em maior grau que o BNP.

As terapias que têm como alvo a ativação do sistema renina-angiotensina e do sistema simpático não mostraram baixa da mortalidade na ICFEP. No entanto, esses tratamentos podem ter benefícios específicos no DM, e estudos nessa subpopulação de pacientes diabéticos com ICFEP merecem maior consideração. Em contrapartida, recentes estudos de desfechos com inibidores do cotransportador de sódio e glicose 2 tiveram resultados promissores em relação aos desfechos de IC em pacientes diabéticos. No estudo EMPA-REG OUTCOME [BI 10773 (Empagli-f lozin) Cardiovascular Outcome Event Trial in Type 2 Diabetes Mellitus Patients – Ensaio sobre Eventos e Desfechos Cardiovasculares com Empaglif lozina em Pacientes com Diabetes Melito Tipo 2] , a empaglif lo-zina foi associada não só a uma redução de desfechos cardiovasculares adversos graves, mas também a uma redução significativa das hospitalizações por IC (26). Ao restaurar o transporte de sódio ao túbulo distal, inibidores do cotransportador de sódio e glicose 2 pro-movem diurese e natriurese, sem ativação simpática (27). A obtenção da natriurese e o alívio da sobrecarga volêmica podem reduzir a morbidade em pacientes com ICFEP e DM. Estudos sobre os efeitos dos inibidores do cotransportador de sódio e glicose 2 na população com ICFEP estão em andamento (Tabela 4) (4).

tRanstoRnos MetabóliCos e

inFlaMação sistÊMiCa

Apesar da natureza pró-inflamatória da ICFEP, terapias que têm como alvo a inf lamação e a disfunção endotelial subsequente, tais como estatinas, inibidores do sistema renina-angiotensina e da fosfodiesterase-5, não demonstraram benefício de longo prazo na ICFEP (4). Uma abordagem única para tratar todos os casos de inf lamação não parece ser adequada. É possível que os processos patológicos causando inf lamação e remodelamento no DM precisem ser lidados de uma forma mais específica. A resistência à insulina no DM leva a uma maior utilização de ácidos graxos livres por cardiomiócitos, o que pode, por sua vez, causar disfunção mitocondrial, produção de intermediários de lipídios tóxicos e aumento de espécies reativas de oxigênio (28). Uma maior adiposidade no epicárdio e na periferia, vista com mais frequência na população diabética, resulta também na liberação de citocinas pró-inflamatórias. Os produtos finais da glicação avan-

çada derivados da hiperglicemia prejudicam a função microvascular e diminuem a disponibilidade de óxido nítrico (28). Todos esses processos podem contribuir para mudanças estruturais dos cardiomiócitos, dis-função endotelial e danos a múltiplos órgãos. Os dados ecocardiográficos dos estudos RELAX e I-PRESERVE sugerem que o DM está associado à disfunção diastó-lica grave e à hipertrofia ventricular esquerda, sendo prováveis responsáveis por esse fenótipo as alterações metabólicas e inf lamatórias subjacentes.

Uma estratégia para lidar com esses transtornos pode ser a diminuição da adiposidade através de res-trição calórica. Isso provavelmente teria efeitos bené-ficos para risco de isquemia, pressão arterial, aptidão física, responsividade à insulina e inf lamação em geral. Além disso, vários novos agentes anti-hiperglicêmicos podem ter efeitos anti-inf lamatório, antirremode-lamento e redutor da glicose, com possibilidade de melhorar a função vascular e retardar o dano a órgãos em pacientes com ICFEP diabéticos. Os agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon 1 são uma classe de agentes anti-hiperglicêmicos que de-monstraram em estudos in vivo e em humanos reduzir a carga da aterosclerose, a inf lamação e a disfunção endotelial (29, 30). Embora os ensaios clínicos sobre os agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glu-cagon 1 não mostrarem melhora nos desfechos da IC, esses agentes ainda precisam ser estudados de forma específica na população com ICFEP. Os inibidores de cotransportador de sódio e glicose 2 também demons-traram diminuição de marcadores de inf lamação, e foi levantada a hipótese de que eles alteram o meta-bolismo cardíaco em prol das citocinas, o que reduziria o consumo de oxigênio e a produção de radicais livres (27). Por fim, a inibição de neprilisina, uma enzima que quebra peptídeos natriuréticos, pode restaurar os níveis de GMPc (monofosfato cíclico de guanosina), le-vando a uma maior ativação de proteína quinase G, com efeitos posteriores de melhora na função endotelial e na ridigez cardiomiócita (2). O uso de sacubitril/valsartan, um inibidor da neprilisina e angiotensina, na ICFEP será testado no estudo PARAGON-HF (Efficacy and Safety of LCZ696 Compared to Valsartan, on Morbidity and Mortality in Heart Failure Patients With Preserved Ejection Fraction - Comparação da Eficácia e Segurança entre LCZ696 e Valsartana na Morbidade e Mortalidade de Pacientes com Insuficiência Cardíaca Com Fração de Ejeção Preservada), sendo seus resultados ansio-samente esperados (2). É provável que os processos pró-inflamatórios operem em um menor espaço de tempo em pacientes com ICFEP e DM se comparados a mecanismos hemodinâmicos, e estudos com seguimento de longo prazo serão necessários para avaliar a melhora da mortalidade com essas intervenções.

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CoMPRoMetiMento PeRiFéRiCo

Os comprometimentos periféricos, como baixa função musculoesquelética, fornecimento periférico de oxigênio prejudicado e incompetência cronotrópica, provavelmente contribuem para menor capacidade de realizar exercícios e estado funcional prejudicado no DM e na ICFEP. Foram observados piores resultados de Vo2 pico e testes de caminhada de seis minutos entre os pacientes diabéticos no estudo RELAX. Embora uma baixa tolerância a exercícios possa estar relacionada a um aumento da pressão de enchimento ventricular esquerdo, estudos mostram que pacientes com ICFEP apresentam alterações no músculo esquelético e re-dução da diferença arteriovenosa de oxigênio, sendo o último em virtude do menor fornecimento ou captação de oxigênio pelo músculo esquelético. Menor reserva vasodilatadora, disfunção endotelial e anemia podem contribuir para a diminuição do fornecimento de oxigênio (21). Uma maior infiltração de tecido adiposo no músculo esquelético, resultando em menor densi-dade capilar e Vo2 pico, também pode contribuir para fraqueza muscular e baixa tolerância a exercícios. Os pacientes com ICFEP exibem menos fibras musculares oxidativas do tipo I e mais fibras musculares glicolí-ticas do tipo II, ocasionando menor uso de oxigênio (2). Esses mecanismos são possivelmente exacerbados em pacientes diabéticos, devido à maior adiposidade. A in-competência cronotrópica também compromete o dé-bito cardíaco durante os exercícios, e a provável causa é a neuropatia autonômica, uma complicação comum do DM. Embora a neuropatia possa ser irreversível, o músculo esquelético pode ser regenerado e reparado através de um programa de exercícios progressivo, au-mentando a aptidão física e a qualidade de vida (2). De fato, observou-se o aumento do Vo2 pico em pacientes com ICFEP após a realização de um programa de trei-namento. Essa opção de tratamento não invasiva pode ter benefícios para a população diabética.

MultiMoRbidade

Sabe-se que pacientes com ICFEP apresentam múl-tiplas comorbidades. Os dados do registro GWTG-HF e de outros estudos mostram claramente a maior carga de comorbidades na população com ICFEP diabética. Isso não é surpreendente, pois o DM é conhecido pelo maior risco de isquemia, doença vascular, acidente vascular cerebral, disfunção renal, etc. A maior carga de comorbidades pode explicar as internações mais longas devido à complexidade do tratamento, assim como a menor probabilidade de alta para casa e o grande número de readmissões observadas na população com ICFEP. Esses dados subestimam a

necessidade de cuidado multidisciplinar e holístico em pacientes com ICFEP e DM. A coordenação entre profissionais de serviços ambulatoriais, como cardio-logistas, endocrinologistas, nefrologistas e médicos da atenção primária à saúde, é necessária. O seguimento imediato deve ser planejado no momento da alta para prevenir reinternações nessa população de alto risco. As clínicas multidisciplinares, onde os pacientes podem consultar vários médicos em uma única visita, talvez possam melhorar a coordenação do cuidado e diminuir a carga de múltiplas consultas médicas para o paciente. O nosso entendimento sobre as áreas da saúde mais carentes de atenção crescerá com futuros estudos que categorizem os motivos precisos das reinternações e da mortalidade não cardiovascular de pacientes com ICFEP e DM.

PeRsPeCtivas globais

A IC é uma pandemia global. Ainda que o registro GWTG-HF e os estudos citados sejam restritos a pacientes americanos, existem vários registros de pa-cientes com IC hospitalizados fora dos Estados Unidos, inclusive na Europa Ocidental, Japão e outros países em desenvolvimento da Ásia e da Europa Oriental (31). As variações de comorbidades e de padrões de vida em cada região, assim como de nutrição, prática de exercí-cios e predisposição genética, podem levar a diferenças nas características e nos desfechos de pacientes com ICFEP e DM ao redor do mundo. A Ásia é o epicentro da epidemia de DM, por exemplo, e os asiáticos desenvolvem a doença mais jovens e com menor IMC em relação à população ocidental (32). Os diferentes fenótipos metabólicos podem ocasionar interações distintas entre a ICFEP e o DM. Além disso, embora a isquemia seja a etiologia mais comum da IC no geral, a hipertensão, as anomalias valvulares e a cardiopatia congênita podem ser as etiologias mais comuns nos países em desenvolvimento, possivelmente reduzindo o papel do DM na patogênese da ICFEP (31). Futuras pesquisas utilizando registros globais de IC são neces-sárias para identificar essas potenciais diferenças.

ConClusões

A ICFEP não é mais considerada uma doença única de disfunção diastólica, sendo redefinida como um grupo heterogêneo de fenótipos com alterações em diversos órgãos causadas por comorbidades. Conside-rando que a carga do DM e da ICFEP está crescendo, essa população precisa de terapias específicas. Os dados de ensaios clínicos mostram que pacientes diabéticos com ICFEP apresentam maior morbidade e mortalidade a longo prazo que os não diabéticos. Os

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achados recentes do registro GWTG-HF demonstram que, na ICFEP, o DM está ligado a maior morbidade hospitalar e pós-alta, internações mais longas, menor probabilidade de alta e mais reinternações em 30 dias por IC e por todas as causas. A morbidade a curto prazo associada ao DM pode ser mediada pela retenção de sódio, ativação neuro-humoral e sobrecarga volêmica, e os inibidores do cotransportador de sódio e glicose 2 podem aliviar a sobrecarga volêmica e reduzir reinter-nações de pacientes com ICFEP e DM. O DM é um fator da inf lamação sistêmica na ICFEP por diversas vias, incluindo a oxidação de ácidos graxos, a menor dispo-nibilidade de óxido nítrico e os produtos da glicação avançada. Utilizar novos agentes anti-hiperglicêmicos pode retardar o remodelamento a longo prazo e diminuir a mortalidade. Um programa de exercícios

progressivo pode melhorar os transtornos periféricos pela utilização de oxigênio pelo músculo esquelético e melhorar a tolerância aos exercícios e a qualidade de vida. Por fim, é necessário um esforço conjunto entre uma equipe multidisciplinar de profissionais da saúde para tratar as múltiplas comorbidades em pacientes diabéticos com ICFEP a fim de diminuir a mortalidade e prevenir a reinternação. Precisa-se de mais estudos para avaliar desfechos de longo prazo e efeitos de novas terapias em pacientes com ICFEP e DM.

CoRResPondÊnCia. Dr. Adrian F. Hernandez, 200 Trent Drive, Davison Building, Suite 120, P.O. Box 17969, Duke University School of Medicine, Durham, North Carolina 27710. E-mail: [email protected]. Twitter: @texhern.

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ReFeRÊnCias

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KEY WORDS ensaios clínicos, comorbidade, insuficiência cardíaca, registros

APÊNDICE Para acesso a uma seção de Métodos expandida, figuras suplementares e uma tabela, confira a versão on-line deste artigo.

MesquitaComentário Editorial

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CoMentáRio editoRial

Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e diabetesEvandro Tinoco Mesquita, MD, PhD;1 Letícia Mara dos Santos Barbetta, MD2

1Doutor em Cardiologia pela Universidade de São Paulo, Diretor Científico do Departamento de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Brasileira de Cardiologia (DEIC-SBC); Diretor Clínico do Hospital Pró-cardíaco. 2Aluna de MD-PhD em Ciências Cardiovasculares da Universidade Federal Fluminense (UFF).

A insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP) vem mostrando uma alte-ração em seu padrão etiofisiopatológico, prin-

cipalmente pelos efeitos das diferentes comorbidades. Previamente, a ICFEP era comumente associada a disfunção diastólica como alteração básica. Entretanto, cada vez mais a ICFEP tem se demonstrado resultado de múltiplas alterações metabólicas acometendo o sistema cardiovascular e musculoesquelético [1].

O diabetes mellitus (DM) é uma condição de alta prevalência em todo o mundo [2]. A DM é conhecida por promover aumento de marcadores pró-inflamatórios, originando alterações em diversos sistemas como: vascular, renal, cardiovascular, cerebrovascular e al-terações microcirculatórias. Além disso, pacientes com DM frequentemente são acometidos por outros fatores de risco cardiovasculares como hipertensão arterial, obesidade, doença pulmonar obstrutiva crônica e se-dentarismo [2].

Na presente revisão [1], os autores têm como obje-tivo sumarizar as principais evidências dos ensaios clínicos que investigaram o efeito da DM na ICFEP, além de fornecerem dados não publicados do registro norte-americano Get With the Guidelines - HF (GWTG-HF) [3,4]. No artigo [1] os autores também discutem os possíveis mecanismos fisiopatológicos em pacientes com ICFEP e DM e potenciais alvos terapêuticos.

Na análise dos ensaios clínicos em conjunto com os dados do GWTG-HF, foi observado que a DM está associada à maior morbidade e mortalidade a longo prazo na ICFEP [1]. No registro GWTG-HF, pacientes com ICFEP e DM apresentaram uma carga elevada de comorbidades. Além disso, a DM foi associada à maior duração da internação hospitalar, à uma probabilidade significativamente menor de receberem alta para casa,

aumento da probabilidade de reinternação por todas as causas em 30 dias e de reinternação por IC [1].

Um aspecto fisiopatológico abordado pelos autores foi que a DM na ICFEP apresenta um conjunto de ma-nifestações sistêmicas capaz de promover sobrecarga de volume pelo aumento da reabsorção de sódio e água, devido à uma desregulação do cotransportador sódio-glicose 2. Dessa forma, tal desregulação provocaria uma diminuição da responsividade aos diuréticos, levando a maior taxa de reinternação e aumento do tempo de internação [1].

Conforme abordado na revisão [1], existem quatro im-portantes ensaios clínicos em andamento que analisam o efeito dos inibidores do cotransportador sódio-glicose 2 (inibidores de SGLT2) como a empaglifozina, ertuglifo-zina e dapaglifozina em pacientes com ICFEP e DM, que poderão determinar o papel dos inibidores de SGLT2 nesses pacientes. Além disso, devido a característica inflamatória da ICFEP, a inibição da neprilisina configura uma nova possibilidade de tratamento ao almejar uma melhora da função endotelial e diminuição da rigidez dos cardiomiócitos, por meio da restauração dos níveis de GMPc e aumento ativação da proteína G quinase [1].

A ICFEP e a DM são patologias de elevada prevalência à nível global. De acordo com o International Diabetes Federation, em 2017, cerca de 12,5 milhões (8,7%) de brasileiros tinham o diagnóstico de DM, sendo estimado para 2035 um aumento para 20.9 milhões de indivíduos, enquanto atualmente em Portugal estima-se que a prevalência da DM seja de 13.9% [2]. No Brasil, o estudo Digitalis [5] encontrou que 59% dos pacientes com insuficiência cardíaca (IC) eram do fenótipo ICFEP e 29% desses pacientes tinham DM. Em Portugal o estudo EPICA [6] encontrou uma prevalência de 40% de ICFEP e 11% de DM em pacientes com IC.

MesquitaComentário Editorial

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O presente artigo enfatiza a importância fisiopato-lógica da DM na ICFEP para o almejo de possíveis alvos terapêuticos. Novos medicamentos como os inibidores de SGLT2 tem mostrado resultados promissores em pacientes com IC [7], como evidenciado pela empaglifo-zina no estudo EMPA-REG [8]. Dessa forma, espera-se que tais fármacos apresentem resultados positivos no contexto da DM e ICFEP. Além disso, em 2019 o estudo PARAGON-HF [9] apresentará resultados do uso do sacubitril/valsartana na morbidade e mortalidade de pacientes com ICFEP, que poderá se tornar o primeiro fármaco capaz de reduzir a morbidade e mortalidade nesse fenótipo de IC.

A ICFEP tem se tornado o principal fenótipo de IC em todo mundo, sendo um grande desafio no cenário clínico-epidemiológico pela falta de terapias efetivas que diminuam a mortalidade e hospitalização. A DM é uma comorbidade de elevada prevalência, interferindo diretamente nas características, potenciais alvos tera-pêuticos e prognóstico da ICFEP [1].

Dessa forma, novos registros que avaliem o impacto da DM na ICFEP são fundamentais para caracterizar esse novo fenótipo, principalmente no Brasil onde esses dados ainda não são completamente explorados. Além disso, novas drogas, como os inibidores do SGLT2 e os agonistas do receptor GLP-1 podem se tornar um novo recurso no tratamento da DM na ICFEP.

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ReFeRÊnCias

J O U R N A L O F T H E A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y

© 2 0 1 9 P O R A M E R I C A N C O L L E G E O F C A R D I O L O G Y F O U N D A T I O N

P U B L I C A D O P O R E L S E V I E R

V o l . 7 3 , N o . 6 , 2 0 1 9

I S S N 0 7 3 5 - 1 0 9 7

h t t p s : / / d o i . o r g / 1 0 . 1 0 1 6 / j . j a c c . 2 0 1 8 . 1 1 . 0 3 8

Ouça o áudio com o resumo deste artigo, apresentado pelo editor-chefe do JACC, Dr. Valentin Fuster, em JACC.org

o PResente e o FutuRo

PAINEL CIENTÍFICO DE ESPECIALISTAS DO JACC

ECMO venoarterial para adultos

Painel Científico de Especialistas do JACC

Maya Guglin, MD, PHD,a Mark J. Zucker, MD,b Vanessa M. Bazan, BBA, BS,c Biykem Bozkurt, MD, PHD,d Aly El Banayosy, MD,e Jerry D. Estep, MD,f John Gurley, MD,a Karl Nelson, MBA, RN,e Rajasekhar Malyala, MD,g Gurusher S. Panjrath, MD,h Joseph B. Zwischenberger, MD,g Sean P. Pinney, MDi

Resumo

A oxigenação extracorpórea por membrana (ECMO) venoarterial é uma terapia de resgate que pode estabilizar pacientes com comprometimento hemodinâmico, com ou sem insuficiência respiratória, por dias ou semanas. Em cardiologia, entre as principais indicações para ECMO, estão: parada cardiorrespiratória, choque cardiogênico, choque pós-cardiotomia, taquicardia ventricular refratária e manejo agudo de complicações de procedimentos invasivos. A premissa fundamental subjacente à ECMO é que se trata de uma ponte: para a recuperação, para uma ponte mais duradoura, para o tratamento definitivo ou para a tomada de decisão. Por ser uma intervenção bastante intensiva em recursos e esforços, a ECMO não deve ser usada em pacientes que não podem se recuperar. Como o uso dessa tecnologia continua evoluindo rapidamente, é importante entender: suas indicações e contraindicações; a logística de iniciação, manejo e desmame da ECMO; a infraestrutura geral do programa (incluindo os desafios associados à transferência de pacientes com assistência de ECMO); além de considerações éticas, áreas de incerteza e direções futuras. (J Am Coll Cardiol 2019;73;698-716) © 2019 pela American College of Cardiology Foundation.

aGill Heart Institute, University of Kentucky, Lexington, Kentucky, EUA; bCardiothoracic Transplantation Programs, Newark Beth Israel Medical Center, Rutgers University-New Jersey Medical School, Newark, New Jersey, EUA; cUniversity of Kentucky, Lexington, Kentucky, EUA; dMichael E. DeBakey VA Medical Center and Section of Cardiology, Department of Medicine, Baylor College of Medicine, Houston, Texas, EUA; eAcute Circulatory Support and Advanced Critical Care, INTEGRIS Baptist Medical Center, Oklahoma City, Oklahoma, EUA; fSection of Heart Failure & Transplantation, Cleveland Clinic Foundation, Cleveland, Ohio, EUA; gDepartment of Surgery, University of Kentucky, Lexington, Kentucky, EUA; hDivision of Cardiology, Department of Medicine, George Washington University, Washington, DC, EUA; and the iDivision of Cardiology, Icahn School of Medicine at Mount Sinai, New York, New York, EUA.

Dr. Zucker informou que atuou no conselho científico e recebeu honorários da Alnylam e da Pfizer. Dra. Bozkurt atuou como consultora para a Lantheus e a Bayer. Dr. Estep atuou como consultor para a Abbott; e como consultor médico para a Medtronic. Dr. Zwischenberger recebeu royalties de patentes licenciadas pela cânula de duplo lúmen Avalon Elite (Maquet); recebeu um subsídio corporativo da Xenios Austria GmBH; atuou como parceiro da WZ Biotech; atuou como consultor da CytoSorb; atuou como presidente do Conselho Consultivo Cardiológico Cytosorb; e recebeu financiamento do National Institutes of Health. Todos os demais autores informaram não ter relações relevantes para os conteúdos deste artigo a serem declaradas.

Manuscrito recebido em 15 de julho de 2018; manuscrito revisado recebido em 3 de outubro de 2018 e aceito em 14 de novembro de 2018.

É crescente o uso da oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) na doença cardiovascular. Após o marco CESAR (suporte ventilatório con-

vencional versus oxigenação por membrana extracor-pórea para insuficiência respiratória grave em adultos), no qual a ECMO pareceu ser superior ao ventilador na população adulta (1), essa modalidade tem se tornado cada vez mais popular.

De acordo com a Extracorporeal Life Support Orga-nization (ELSO), um registro voluntário internacional, a quantidade de execuções cardíacas de ECMO em adultos aumentou 1.180% na última década, de < 200 entre 1997 e

2007 para mais de 2.000 até o momento (Figura 1) (2). De modo semelhante, a quantidade de centros de ECMO, que aumentou 15% (de 115 para 131) de 1996 a 2006, subiu impressionantes 133% (de 131 para 305) de 2006 a 2016.

As indicações de ECMO venoarterial (VA) continuam evoluindo. Na última década, a principal indicação deixou de ser o choque pós-cardiotomia (tratado por cirurgiões) e passou a ser o choque cardiogênico mul-tifatorial e/ou a parada cardiorrespiratória (tratada no cenário de equipes multidisciplinares, incluindo car-diologistas ou primariamente por cardiologistas) (Ilus-tração Central). A proporção de pacientes com choque

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pós-cardiotomia com assistência de ECMO-VA diminuiu de 56,9%, em 2002, para 37,9%, em 2012. Durante esse mesmo período, a quantidade de pacientes adultos com insuficiência cardiopulmonar com assistência de ECMO-VA aumentou consideravelmente (3).

Existem várias razões por trás do grande au-mento no uso de ECMO em cardiologia, incluindo:

• Disponibilidade de membranas duráveis e cir-cuitos portáteis

• Capacidade da ECMO-VA de oferecer suporte ventricular esquerdo, direito e biventricular

• Facilidade de implantação no laboratório de cateterização ou à beira do leito

• Maior familiaridade de cardiologistas e cirurgiões com a tecnologia

• A necessidade de uma ponte de curto prazo para transplante ou suporte mecânico

• Progresso em dispositivos mecânicos e duráveis de suporte circulatório, os quais permitem o uso de ECMO como ponte para um dispositivo auxiliar ventricular esquerdo (DAVE)

• Incentivos financeirosA implementação do novo sistema de alocação de doa-

dores da Rede Unida para Compartilhamento de Órgãos no outono de 2018 pode resultar em um aumento ainda

ABREVIATURAS

E ACRÔNIMOS

BIA = balão intra-aórtico

DAVE = dispositivo de assistência ventricular esquerda

ECMO = oxigenação por membrana extracorpórea (extracorporeal membrane oxygenation)

ECPR = reanimação cardiopulmonar extracorpórea (extracorporeal cardiopulmonary resuscitation)

ELSO = Extracorporeal Life Support Organization

HR = razão de risco (hazard ratio)

IC = intervalo de confiança

PDFVE = pressão diastólica final ventricular esquerda

PV = pressão-volume

RCE = retorno da circulação espontânea

RCP = reanimação cardiopulmonar

VA = venoarterial

VD = ventricular direito

VE = ventrículo/ventricular esquerdo

VV = venovenoso

maior no uso de ECMO nos Estados Unidos. No sistema atual, a prioridade era determinada primeiramente pelo estado hemodinâmico, sendo necessário o uso de um cateter de Swan-Ganz para a confirmação. O novo esquema prioriza a alocação com base principalmente no tipo de dispositivo de suporte mecânico no local, com prioridade para os pacientes com assistência de ECMO.

A ECMO se tornou o dispositivo preferido para suporte hemodinâmico de curto prazo em pacientes com choque cardiogênico. A Tabela 1 compara a ECMO a outros dispositivos de curto prazo. A maioria dos cardiologistas atuantes não foi treinada em ECMO, o que levou a essa revisão abrangente.

visão geRal da eCMo

A ECMO é uma modificação portátil da circu-lação extracorpórea capaz de assistir pacientes críticos com insuficiência cardiopulmonar refratária por dias ou semanas (4). Embora disponível há mais de 40 anos, inicialmente, a ECMO foi usada principalmente na neonato-logia. A ECMO, predominantemente venovenosa

ilustRação CentRal ECMO-VA é uma ponte

Guglin, M. et al. J Am Coll Cardiol. 2019;73(6):698-716.

A premissa fundamental subjacente à oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) é que se trata de uma ponte: para a recuperação, para uma ponte mais duradoura, para o tratamento definitivo ou para a tomada de decisão. Esta figura mostra indicações para ECMO e os desfechos potenciais. VA = venoarterial; VD = ventricular direito.

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(VV), foi usada pela primeira vez em adultos com doença pulmonar grave, mas potencialmente reversível, como pneumonia por influenza e síndrome do desconforto respiratório em adultos. Ao longo da última década, a tecnologia ganhou força na cardiologia adulta.

As evidências favorecendo a ECMO-VA em adultos surgiram em estudos observacionais prospectivos de propensão pareada da reanimação cardiopulmonar extracorpórea (ECPR), demonstrando um benefício de sobrevida neurologicamente intacto em relação à reani-mação cardiopulmonar convencional (RCP) (5, 6).

O circuito fechado de ECMO retira o sangue desoxi-genado do sistema venoso por meio de uma ou múltiplas cânulas de drenagem, bombeia o sangue usando um oxi-genador, no qual ocorre a troca gasosa, e retorna o sangue para a circulação venosa (VV) ou arterial (VA) por meio de uma cânula de reinfusão (Figura 2) (7). Enquanto a ECMO-VV substitui os pulmões em falha, a ECMO-VA fornece as-sistência respiratória e hemodinâmica (ou seja, substitui o coração e o pulmão). Este artigo foca a ECMO-VA.

O circuito usa uma bomba centrífuga como a Centrimag (Thoratec, Pleasanton, Califórnia, EUA), a Rotaflow (Ma-quet, Rastatt, Alemanha) ou a TandemHeart (TandemLife, Pittsburgh, Pensilvânia, EUA) e uma unidade de troca de sangue que inclui um trocador de calor e um oxigenador de membrana. Conforme o sangue passa pelo oxigenador de membrana, a hemoglobina fica totalmente saturada com oxigênio, e o dióxido de carbono (CO2) é removido. O grau de oxigenação é determinado pela taxa de fluxo e pela fração do oxigênio inspirado. O oxigenador de mem-brana pode fornecer saturação de oxigênio total. Mesmo

em estado de edema pulmonar ou embolia pulmonar massiva, a saturação de oxigênio é normal.

A remoção de CO2 é controlada principalmente pelo ajuste da taxa de fluxo de gás contracorrente por meio do oxigenador, também conhecido como velocidade de var-redura (8). A ECMO é extremamente eficaz na remoção de CO2. O CO2 é removido por difusão. Geralmente, o gás de varredura é composto 100% por oxigênio, com a cor-reção da acidose respiratória podendo ser rapidamente alcançada com o aumento da velocidade de varredura.

Os dois tipos de ECMO – VV e VA – podem ser usados para tratar a insuficiência respiratória aguda refratária. A ECMO-VA (em contraste à ECMO-VV) pode fornecer suporte circulatório completo. Em comparação a outros dispositivos mecânicos temporários de assistência circulatória usados para assistir pacientes com choque cardiogênico refratário, a ECMO-VA aborda a disfunção ventricular direita (VD) e esquerda (VE), a oxigenação sis-têmica (pO2) e o equilíbrio ácido-base por meio da modu-lação da pressão parcial de CO2. A configuração do circuito (Figura 2) permite a retirada e o bombeamento de sangue dessaturado do átrio direito ou de uma veia central, com a saída de bomba não pulsátil direcionada ao oxigenador de membrana e guiada por uma cânula de saída a uma artéria sistêmica (por exemplo, artéria femoral ou subclávia).

heModinâMiCa CoM Choque

CaRdiogÊniCo e eCMo-va

A condição hemodinâmica do VE em todos os tipos de choque cardiogênico é mais bem ilustrada pelo ciclo

FiguRa 1 Crescimento de eventos de oxigenação por membrana extracorpórea cardíaca em adultos

Gráfico mostrando o aumento da quantidade de eventos de oxigenação extracorpórea cardíaca em adultos. Houve um aumento de 1.180% na última década. Houve < 200 execuções/ano entre 1997 e 2007, aumentando para > 2.000 execuções/ano em 2014 a 2016. Os dados são da Extracorporeal Life Support Organization (2).

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de pressão-volume (PV). Esse ciclo representa as quatro fases de um único ciclo cardíaco, além de fornecer informações sobre propriedades contráteis e de rela-xamento, trabalho cardíaco e consumo de oxigênio no miocárdio (9-11). Geralmente, no choque cardiogênico, independentemente da etiologia subjacente, a contra-tilidade do VE, que é refletida pelo Emáx e definida como a inclinação máxima no ponto PV sistólico final, é reduzida; além disso, a pressão diastólica final do VE (PDFVE) é aumentada. Embora haja diferenças na magnitude do efeito no volume sistólico e no trabalho de acidente vascular cerebral (AVC) do VE com os dife-rentes tipos e severidades do choque cardiogênico, esses índices também são geralmente reduzidos (Figura 3) (10). Foram relatados diferentes efeitos cardíacos com o uso de ciclos de PV com diferentes dispositivos de assistência mecânica (11).

Especificamente, com a ECMO-VA, a pós-carga do VE aumenta, conforme refletido pelo aumento na elastância arterial efetiva, um componente conhecido da pós-carga do VE, conforme mostrado na Figura 4 (12). Isso contribui para um aumento da PDFVE. Em pacientes com fração de ejeção significativamente reduzida na linha de base, a ECMO-VA pode causar um aumento no estresse da parede e na demanda de oxigênio, o que impede a recuperação miocárdica e pode precipitar o edema pulmonar progressivo e a lesão pulmonar aguda e piorar os desfechos (13). Essa complicação geralmente é referida como distensão do VE ou pulmão com ECMO.

Os aumentos dependentes da ECMO-VA sob as pres-sões diastólica final do VE, do átrio esquerdo e capilar pulmonar ser atenuados pela diminuição da resistência vascular sistêmica ou pela melhora da contratilidade ventricular (12). No entanto, aumentos sutis no vo-

lume diastólico final do VE podem estar associados a aumentos substanciais na PDFVE devido à relação não linear da PV diastólica final (Figura 4) (12).

O monitoramento para o aumento da PDFVE pode incluir exames físicos seriados, raio x do tronco ou monitoramento de cateter de Swan-Ganz. O tratamento dos aumentos previstos ou observados na pressão sistólica e diastólica final do VE inclui a ventilação ou a descompressão do VE.

Foram utilizadas várias estratégias para reduzir a congestão pulmonar durante a assistência da ECMO-VA (11, 14-16).

tabela 1 Comparação entre dispositivos comercialmente disponíveis para assistência circulatória mecânica de curto prazo

Dispositivo ECMO-VA BIA Coração em tandem Impella (2,5; CP; 5; RP)

Fluxo, l/min 4-6 0,5-1 4-6 2,5-5

Duração da assistência, aprovada pela FDA

6 h (limitada pela durabilidade do oxigenador)

9 dias 21 dias 4 dias (2,5, CP), 6 dias (5) 14 dias (RP)

Ventrículos com assistência VE e VD VE VE ou VD VE ou VD

Tamanho da cânula, F Entrada 18–21 Saída 15–22

7-9 Entrada 21 Saída 15–17

12-21

Requisitos adicionais Potencial necessidade de ventilação de VE, possível corte

Punção transeptal Corte cirúrgico para Impella 5

Vantagens O mais alto débito cardíaco Assistência cardiopulmonar completa (incluindo oxigenação e remoção de CO2)

Fácil colocação Bom perfil de segurança Menos efeitos colaterais, especialmente vasculares

O mais alto débito cardíaco, comparável à ECMO-VA e sem distensão do VE

Vários dispositivos para escolha

Desvantagens Requer mais recursos e equipe de assistência do que outros dispositivos Fluxo sanguíneo retrógrado com agravamento da pós-carga (distensão do VE) Complicações vasculares Trombocitopenia

Assistência hemodinâmica limitada Contraindicado em regurgitação aórtica grave

Necessidade de centro de atendimento especializado terciário ou quaternário Necessidade de punção transeptal atrial com suas potenciais complicações Complicações vasculares Fluxo sanguíneo retrógrado

Implante mais invasivo e complexo em relação ao BIA Hemólise frequente Complicações vasculares

BIA = balão intra-aórtico; CO2 = dióxido de carbono; ECMO-VA = oxigenação por membrana extracorpórea venoarterial; FDA = Food and Drug Administration; VD = ventrículo direito; VE = ventrículo/ventricular esquerdo.

FiguRa 2 Circuito de oxigenação por membrana extracorpórea venoarterial

Uma bomba centrífuga retira o sangue dessaturado do átrio direito com o fluxo de saída não pulsátil direcionado para o oxigenador de membrana e guiado por uma cânula de saída para uma artéria sistêmica. Reimpresso com permissão de Kapur e Zisa (7). AE = átrio esquerdo; AD = átrio direito; Ao = aorta; VD = ventrículo direito; VE = ventrículo esquerdo.

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FiguRa 4 Efeitos hemodinâmicos do VE da ECMO venoarterial

O impacto negativo da oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) venoarterial no ciclo de PV faz uma curva com um aumento dependente do fluxo em PDFVE (asteriscos) e o aumento associado na Ea efetiva, conforme definido na Figura 2. Uma diminuição dependente de fluxo associada no SB do VE é mostrada nos ciclos de PV e é representada pela largura do ciclo de PV como a diferença de volume entre os volumes sistólico final e diastólico final. Modificado e adaptado com permissão de Burkhoff et al. (12). CC = choque cardiogênico; outras abreviaturas conforme a Figura 3.

FiguRa 3 Ciclos de PV na condição normal, com infarto do miocárdio, e em insuficiência cardíaca crônica agudizada complicada pelo choque cardiogênico

(A) Ciclo de pressão-volume (PV) em condição normal. O Ponto 1 observa o final do relaxamento isovolumétrico. A Fase 1 a 2 define a diástole. O Ponto 2 (diástole final) representa o volume máximo do ventrículo esquerdo (VE) e o início do relaxamento isovolumétrico. O Ponto 3 define o pico de contração isovolumétrica, em que a pressão do VE excede a pressão aórtica e marca o início da ejeção sanguínea na aorta. A Fase 3 a 4 define a fase de ejeção sistólica, além de ilustrar a diminuição do volume do VE. O Ponto 4 define o ponto de PV sistólica final em que a pressão aórtica excede a pressão do VE e marca o fechamento da válvula aórtica. A largura do ciclo de PV representa o volume de bombeamento (VB), definido como a diferença entre os volumes diastólico final e sistólico final. A área sombreada dentro do ciclo representa o trabalho de bombeamento. Emáx representa a contratilidade do VE independente de carga definida como a inclinação máxima do ponto de PV sistólica final sob várias condições de carga. A elastância arterial efetiva (Ea) é um componente da pós-carga do VE e é definida como a razão entre a pressão sistólica final e o VB. (B) Ciclo de PV em infarto do miocárdio (ciclo azul). A contratilidade do VE (Emáx2), a pressão sistólica do VE (PSVE), o VB e o trabalho de bombeamento são levemente reduzidos. A pressão diastólica final do VE (PDFVE) é aumentada. (C) Ciclo de PV em choque cardiogênico em insuficiência cardíaca crônica agudizada (ciclo cinza escuro). A contratilidade do VE (Emáx2) é bastante reduzida, o volume médio da PDFVE e o volume diastólico final do VE são aumentados significativamente e a VS é significativamente reduzida. Adaptado com permissão de Rihal et al. (10).

1. Aumento do fluxo direto pela introdução de inotró-picos ou dispositivos como o Impella (Abiomed, Dan-vers, Massachusetts, EUA) ou o balão intra-aórtico (BIA).

2. Diminuição da pós-carga do VE pela colocação de um BIA.

3. Descompressão mecânica do VE desviando o sangue para o lado direito por meio de atriosseptostomia ou remoção do volume do VE por meio da colocação do Impella, de canulação transeptal do VE ou do átrio esquerdo (AE) ou da drenagem apical cirúrgica direta do VE.

4. Remoção de líquido do espaço intravascular usando agentes diuréticos, ultrafiltração ou hemodiálise.

5. Redução da velocidade da ECMO e, consequentemente, fluxo de ECMO (que pode não ser bem tolerado).O uso de contrapulsação de BIA na ECMO-VA é

debatido em relatórios publicados, e se acredita que traga melhorias à descarga sistólica e à relação oferta/demanda de oxigênio do miocárdico (17). Dois estudos apresentaram menores dimensões de VE e menor pressão arterial pulmonar com ECMO-VA mais a assis-tência ativa de BIA (11, 15). Em um estudo de coorte retrospectivo com 1.650 pacientes adultos apresen-tando choque cardiogênico da base de dados nacional de pacientes internados do Japão, a mortalidade em 28 dias e intra-hospitalar foi significativamente menor com ECMO-VA mais BIA (48,4% vs. 58,2%; p = 0,001) do que somente com ECMO-VA (55,9% vs. 64,5%; p = 0,004)

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(18). No entanto, uma metanálise observacional de 16 estudos mostrou uma falta de benefício de sobrevida da ECMO-VA com BIA concomitante (19). Até o momento, nenhum ensaio clínico randomizado foi realizado para esclarecer o papel da ventilação e qual é a melhor estra-tégia (BIA vs. dispositivos alternativos) para atenuar o aumento dependente do fluxo da VA-ECMO em PDFVE.

A ECMO fornece fluxo sanguíneo contínuo. Qualquer pulsatilidade, se presente, é criada pela função residual do VE. Em casos graves de choque cardiogênico ou na presença de tamponamento cardíaco, os sons de Koro-tkoff podem estar ausentes e apenas a pressão arterial média pode ser medida, sendo necessário o uso de uma linha arterial. À medida que a função cardíaca melhora, a pulsatilidade no traçado arterial fica cada vez mais pronunciada e pode ser um sinal de recuperação.

indiCações e ContRaindiCações

indiCações. O segredo para o sucesso da ECMO é seu princípio como uma ponte para a recuperação ou para o tratamento definitivo. A ECMO não cura a condição subjacente; ela dá tempo para a cura do paciente ou para a equipe de profissionais encontrar uma solução de longo prazo, como um dispositivo para assistência ventricular durável ou um transplante de coração (Ilustração Cen-tral). A inserção da ECMO-VA é geralmente feita para: 1) fornecer assistência circulatória enquanto o coração se recupera espontaneamente ou com tratamento (ponte para a recuperação/desmame); 2) determinar a reversibi-lidade do dano ao órgão-alvo comumente observado após um evento catastrófico ou grave do miocárdio (ponte para a decisão); e 3) atingir um período de estabilidade temporária até que seja implantada uma assistência mais definitiva ao bombeamento (assistência circulatória me-cânica durável) ou uma terapia de substituição cardíaca (transplante de coração ou coração totalmente artificial) (ponte para a ponte) (Tabela 2).

A falta de uma solução (listada anteriormente) ou um potencial de recuperação devem desencorajar a ini-ciação da ECMO. A equipe da ECMO deve levar em consi-deração os objetivos (Tabela 2) e as indicações (Tabela 3) para a ECMO-VA antes da canulação do paciente: 1) parada cardiorrespiratória; 2) choque cardiogênico; 3) taquicardia ventricular refratária; 4) insuficiência do VD durante o auxílio do DAVE; e 5) falha de desmame do bypass cardiopulmonar.

ContRaindiCações. Entre as contraindicações para ECMO-VA, há (20):Absoluta• Insuficiência de órgão não cardíaco grave e irre-

versível que limita a sobrevida (por exemplo, lesão cerebral anóxica grave ou câncer metastático)

• Insuficiência cardíaca irreversível caso o transplante ou o DAV de longo prazo não sejam cogitados

• Dissecção aórticaRelativa• Coagulopatia grave ou contraindicação à anticoagu-

lação, incluindo doença hepática avançada• Acesso vascular limitado (doença arterial periférica

grave, obesidade extrema, membros amputados, entre outros)Entre os preditores de mortalidade em ECMO-VA,

temos: idade, sexo feminino, tempo de assistência maior, diminuição da função cardíaca na linha de base (21), alta concentração de lactato, doença vascular peri-férica, doença pulmonar obstrutiva crônica, disfunção renal (22, 23), AVC, infecção, hipoglicemia, alcalose (24), inserção de dispositivo durante RCP e diminuição de débito urinário (25).

PaRada CaRdioRResPiRatóRia

A ECMO-VA está sendo cada vez mais usada durante a ressuscitação inicial da parada cardiorrespiratória. ECPR – o acrônimo pelo qual essa modalidade é conhe-cida – é a aplicação da ECMO de rápida implantação para fornecer assistência circulatória em pacientes

tabela 2 Objetivos comuns para inserção da oxigenação por membrana extracorpórea venoarterial

Cenário Explicação

Ponte para a recuperaçãoUsar a assistência circulatória enquanto estratégias de tratamento definitivo e de assistência são implantadas para restaurar a recuperação miocárdica e obter sucesso no desmame

Ponte para a decisãoPara determinar a reversibilidade do dano ao órgão-alvo comumente observado após um evento catastrófico ou grave do miocárdio ou para decidir o próximo nível de ação

Ponte para a ponte

Para obter uma breve estabilidade à perfusão de órgãos-alvo até que seja implantada uma assistência mais definitiva ao bombeamento (assistência circulatória mecânica durável) ou uma terapia de substituição cardíaca (transplante cardíaco ou coração totalmente artificial)

Ponte para o transplante Para obter uma breve estabilidade à perfusão de órgãos-alvo até que o transplante cardíaco seja realizado

tabela 3 Indicações para oxigenação por membrana extracorpórea venoarterial

1. Parada cardiorrespiratória (RCP extracorpórea)

Choque cardiogênico devido a2. Infarto do miocárdio3. Miocardite aguda4. Progressão de cardiomiopatia isquêmica ou não isquêmica5. Insuficiência aguda do VD devido a embolia pulmonar6. Progressão da insuficiência do VD devido a doença pulmonar7. Progressão da cardiopatia congênita8. Insuficiência primária de enxerto e rejeição aguda de aloenxerto após

transplante cardíaco9. Overdose de medicamentos cardiotóxicos10. Cardiomiopatia séptica

11. Taquicardia ventricular refratária

12. Insuficiência do VD durante a assistência do DAVE

13. Falha ao desmamar o bypass cardiopulmonar*

*Indicação cirúrgica além do escopo desta revisão. DAVE = dispositivo de assistência ventricular esquerda; RCP = reanimação cardiopulmonar; VD = ventrículo direito.

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que não conseguem obter um retorno da circulação espontânea (RCE) sustentado (definido como 20 mi-nutos consecutivos sem a necessidade de compressões torácicas por RCP convencional) (26). O uso da ECMO iniciada devido a baixo débito cardíaco após RCE sus-tentado não é considerado ECPR (27). Essa importante distinção é frequentemente negligenciada nos relató-rios publicados, dificultando a análise dos desfechos. Um estudo recente de coorte prospectivo de ECPRs intra- e extra-hospitalar em pacientes selecionados apresentou 54% de sobrevida para alta com função neurológica completa (6).

O determinante mais importante do desfecho é o tempo para o suporte básico de vida. As compressões torácicas precoces influenciam todas as intervenções subsequentes. A RCP imediata da pessoa presente ou um tempo sem fluxo < 5 min são pré-requisitos para a ECPR (4). O intervalo entre a parada e o início da RCP deve ser considerado um período sem fluxo, enquanto o tempo de RCP é um período de baixo fluxo (28) com circulação subideal. A probabilidade de sobrevida com um bom desfecho neurológico diminui rapidamente a cada minuto de RCP convencional. Quando a ECPR é atrasada até a parada cardiorrespiratória refratária, definida como sem resposta aos esforços de reanimação após 30 min de RCP convencional, a sobrevida é extre-mamente ruim (29).

A ECPR deve ser tentada logo após a parada cardíaca, e não após a falha completa das medidas tradicionais (30). Estudos sugerem 21 min de RCP convencional antes do início do suporte extracorpóreo à vida (ECMO-VA), com a preparação da ECPR nos primeiros 10 min de RCP e canulação dentro de 20 min de colapso (Figura 5) (31).

Embora o limite superior de idade para ECPR varie conforme o centro, alguns estudos excluem pacientes > 70 a 75 anos de idade (32, 33). Os critérios de inclusão ou exclusão comumente usados para ECPR são:Critérios de inclusão• Idade < 70 anos• Ritmo inicial de fibrilação ventricular ou taquicardia

ventricular• Parada presenciada• RCP por pessoa presente dentro de 5 min• Falha em obter RCE dentro de 15 minutos do início da

RCP (20)Critérios de exclusão• Assistolia como um ritmo inicial• Parada não presenciada• Tempo total de parada cardiorrespiratória > 60 min• Doença neurológica ou sistêmica grave preexistente

(incluindo AVC, demência grave, malignidade avan-çada, distrofia neuromuscular crônica, condições psiquiátricas, lesão cerebral anóxica)

FiguRa 5 Tempo de ECPR para a seleção de paciente

O intervalo entre a parada e o início da reanimação cardiopulmonar (RCP) deve ser considerado um período sem fluxo (extrema esquerda), enquanto o tempo durante a RCP é um período de baixo fluxo com circulação subideal. A probabilidade de sobrevida com bom resultado neurológico diminui rapidamente a cada minuto de RCP convencional. Quando a RCP extracorpórea (ECPR) é adiada até a parada cardiorrespiratória refratária, RCP, a sobrevida é extremamente ruim (extrema direita). ECLS = suporte extracorpóreo à vida; PCREH = parada cardiorrespiratória extra-hospitalar; SBV = suporte básico de vida.

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• Contraindicações para anticoagulação• Dissecção aguda da aorta• Suspeita de choque devido a hemorragia ou outra

causa não cardiovascular• Status conhecido de “não reanimar” (NR)

Um algoritmo de tomada de decisão para iniciar a ECPR é apresentado na Figura 6. A parada cardior-respiratória intra-hospitalar pode ser um cenário particularmente favorável para a ECPR. Em coortes não correspondentes, a ECPR resultou em uma taxa de sobrevida mais alta para o recebimento de alta (log-rank p < 0,0001) e uma melhor taxa de sobrevida em 1 ano (log-rank p = 0,007). Entre os grupos de escore de propensão pareada, ainda houve uma diferença sig-nificativa na sobrevida até a alta [razão de risco (HR): 0,51; intervalo de confiança de 95% (IC): 0,35 a 0,74; p < 0,0001], sobrevida em 30 dias (HR: 0,47: IC95%: 0,28 a 0,77; p = 0,003) e sobrevida de 1 ano (HR: 0,53; IC95%: 0,33 a 0,83; p = 0,006) favorecendo a ECPR em detrimento à RCP convencional (6).

Uma metanálise recente de estudos de ECPR mostrou que ela estava associada a um aumento absoluto na so-brevida em 30 dias de 13% (IC95%: 6% a 20%; p < 0,001; quantidade necessária para tratamento: 7,7) e uma taxa maior de desfecho neurológico favorável aos 30 dias (diferença de risco absoluta 14%; IC95%: 7% a 20%;

p < 0,0001; quantidade necessária para tratamento: 7,1) comparada com a RCP convencional (34).

Choque CaRdiogÊniCo

O choque cardiogênico é uma condição crítica de instabilidade hemodinâmica com comprometimento da perfusão tissular e do órgão-alvo. Entre os parâmetros hemodinâmicos comumente aceitos que definem o choque cardiogênico, estão o índice cardíaco < 2,0 l/min/m2 com pressão arterial sistólica < 90 mmHg, pressão capilar pulmonar ≥ 24 mmHg e dependência a pelo menos dois inotrópicos ou vasopressores, com ou sem BIA (35). Com tratamento somente farmacológico, a recuperação é rara. Se a causa do choque for reversível, o paciente deve ser cogitado para ECMO-VA.

O choque cardiogênico pode ser originado por di-versas condições, incluindo insuficiência do VE, VD ou biventricular. As causas típicas de choque cardiogênico estão listadas na Tabela 3, e uma revisão detalhada de estudos publicados sobre cada etiologia pode ser encontrada em nosso trabalho publicado anteriormente (36). A sobrevida para alta em choque cardiogênico por infarto do miocárdio varia de 19,2% (37) a 87,5% (38). Os desfechos de sobrevida variam de 47% (22) a 83,3% (39, 40) para miocardite e 57% (41) a 100% (42) para

FiguRa 6 Algoritmo para tomada de decisão sobre o início da ECPR

Possíveis desfechos após o início da RCP dentro de 5 min (extrema esquerda), levando a desfechos favoráveis ou desfavoráveis com base nas decisões da linha de tempo para iniciar o retorno da circulação espontânea (REC) ou ECLS. Abreviaturas conforme a Figura 5.

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embolia pulmonar. A ECMO-VA para rejeição aguda de aloenxerto cardíaco pode ser usada como uma medida preventiva, com uma taxa de sobrevida de 79% até a alta, ou como uma estratégia de resgate com taxa de sobrevivência de 14% (43). Existem relatos de uso bem-sucedido de ECMO em overdose de medicamentos ou intoxicação por medicamentos, mas estão associados à depressão grave da função cardíaca (33).

Dois grupos de pacientes, aqueles com miocardite fulminante (Tabela 4) e aqueles com embolia pulmonar com falência aguda do VD (Tabela 5), atraem especial interesse devido à excelente sobrevida relatada, e a ECMO-VA deve ser considerada nos primeiros sinais de instabilidade hemodinâmica. A revisão dos dados da ELSO sobre miocardite aguda identificou 147 pacientes com 61% de sobrevida até a alta hospitalar (44). Além disso, a ECMO está se tornando uma ferramenta universal de resgate para um comprometimento hemodinâmico agudo resultante de diversos procedimentos invasivos, como a substituição valvular aórtica transcateter(45).

taquiCaRdia ventRiCulaR ReFRatáRia

A ECMO-VA é usada com sucesso para estabilizar hemodinamicamente pacientes com taquicardia ou fibrilação ventricular refratária, independentemente da etiologia. Ao criar um fluxo sanguíneo contínuo, a ECMO mantém a hemodinâmica adequada no cenário de taquicardia ventricular, fibrilação ventricular ou tempestade elétrica enquanto terapias antiarrítmicas são administradas ou a ablação por radiofrequência é realizada (46), ajudando os pacientes a sobreviverem, seja devido a estabilidade, a transplante cardíaco ou a implantação de um DAVE (47-52).

logístiCa da eCMo-va: ativação,

Canulação, geRenCiaMento, desMaMe

A logística de colocar um paciente em ECMO pode ser dividida em várias etapas, com cada uma exigindo um conjunto específico de competências. Geralmente, os padrões de práticas históricas determinarão qual com-binação de especialistas estará envolvida no cuidado do paciente com ECMO. Quase invariavelmente, porém, a equipe inclui cardiologistas intervencionistas e clínicos, especialistas em cuidados intensivos, perfusionistas, cirurgiões vasculares ou cardiotorácicos, enfermeiros intensivistas especialmente treinados e, às vezes, médicos de emergência e especialistas em cuidados paliativos. Existem pelo menos 5 etapas: 1) ativação; 2) canulação; 3) gerenciamento contínuo; 4) desmame; e 5) decanulação.

ativação. A ativação da equipe de ECMO requer (ex-ceto em circunstâncias de emergência) uma discussão interativa a priori entre os membros da equipe para fazer uma avaliação inicial com relação à probabilidade de sucesso com base no cenário clínico, nas capacidades institucionais e nas estimativas de sobrevida. Depois que a maioria dos membros da equipe concorde em pros-seguir, o médico que faz a inserção precisa coordenar o processo com os perfusionistas ou com enfermeiros do laboratório de cateterização, além de providenciar uma maca de cuidados críticos e uma unidade de transporte paramédica avançada, quando indicado.

Canulação. A canulação é extremamente importante. Geralmente o acesso é realizado por via percutânea no laboratório de cateterismo ou à beira do leito, conforme seja necessário durante a ECPR. Em situações menos urgentes, deve ser cogitado o corte cirúrgico na sala de cirurgia. A inserção de uma cânula de grande calibre na artéria de um paciente que será sistemicamente anticoagulado deve ser feita meticulosamente para evitar hematomas, sangramentos e comprometimento vascular. Para a inserção percutânea, essa etapa é

tabela 4 Sobrevida com a ECMO em miocardite fulminante

Primeiro autor, ano (Ref. #) n Sobrevida em ECMO (%)

Sobrevida para alta (%) Dias em ECMO

Asaumi, 2005 (84) 14 71 71 5,4*

Pages, 2009 (40) 6 83 83 13 ± 4

Kawahito, 1998 (39) 6 83 83 8,3 ± 2,1

Kato, 1999 (85) 9 100 78 6,4 ± 2,2

Carroll, 2015 (22) 13 80 70 —

Hsu, 2011 (86) 75 — 64 7,1 ± 5,0

Mirabel, 2011 (87) 35 — 69 —

Gariboldi, 2010 (88) 10 — 70 12,0*

Ishida, 2013 (89) 20 — 60 —

Wu, 2012 (90) 16 — 88 —

Montero, 2018 (91) 11 72 72 —

Liao, 2017 (92) 33 — 79 3,0 ± 1,9

Lorusso, 2016 (93) 57 — 71,9 9,9 ± 19

Nakamura, 2015 (94) 22 — 59 7,5 ± 1,1

Aso, 2016 (95) 122 — 45 —

Os valores são média ± DP, a menos que indicado de outra forma. *Valor mediano.ECMO = oxigenação por membrana extracorpórea.

tabela 5 Sobrevida com ECMO em embolia pulmonar com insuficiência aguda do VD

Primeiro autor, ano (Ref. #) n Sobrevida em ECMO (%)

Sobrevida para alta (%) Dias em ECMO

Kawahito, 2000 (41) 7 57 57 2,8 ± 2,8

Maggio, 2007 (96) 21 — 62 4,7 ± 4,1

Munakata, 2012 (97) 10 — 70 2 ± 1,9

Akkanti, 2015 (42) 4 100 100 —

Aso, 2016 (95) 353 57,2 34 —

Dolmatova, 2017 (98) 5 60 60 10,4 ± 4,4

Corsi, 2017 (99) 17 59 47 4,0*

George, 2017 (100) 32 65,6 53,1 —

Pasrija, 2018 (101) 20 95 95 5,1*

Os valores são média ± DP, a menos que indicado de outra forma. *Valor mediano.ECMO = oxigenação por membrana extracorpórea; VD = ventrículo direito.

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frequentemente realizada usando a orientação por ultrassom e agulhas de micropunções. Na medida do possível, a canulação deve ser realizada por pessoas experientes, como cardiologistas intervencionistas ou cirurgiões cardiotorácicos ou vasculares.

O tamanho das cânulas necessárias para canulação arterial e venosa para assistência à ECMO-VA não é definido de modo claro pelos dados publicados atual-mente. É prática comum selecionar cânulas que darão assistência completa a um determinado paciente, isto é, atingir um índice de 2,2 l/min/m2.

Investigadores da Universidade de Michigan afirmam que uma queda de pressão no circuito não deve exceder 100 mmHg na cânula venosa e 300 mmHg no lado arte-rial. O fluxo necessário para uma assistência total em um adulto é de cerca de 60 cm3/kg/min. O comprimento e o diâmetro da cânula são importantes, e há caracterís-ticas especiais de fluxo para cada cânula que podem ser descritas por uma curva de fluxo de pressão. Um número único, chamado de número UM (fluxo obtido com uma queda de pressão de 100 mmHg em uma cânula) pode ser usado para descrever a cânula e suas características de fluxo (53).

A canulação pode ser realizada perifericamente ou centralmente. A inserção periférica pode ser mais rápida, mas ela é conhecida por estar associada ao com-prometimento vascular da extremidade inferior, devido ao grande tamanho da cânula, particularmente em mulheres pequenas ou em um estado de alta resistência vascular sistêmica (“clamped down”). Geralmente, a menos que o vaso seja pelo menos 1 a 2 mm maior que a cânula, existe o risco de isquemia do membro. Esse problema pode ser resolvido com a colocação de uma pequena bainha anterógrada ou um introdutor de 6-F a 8-F na artéria femoral superficial no momento da inserção da cânula, desviando uma pequena porção do fluxo de retorno arterial membro abaixo (cateter de reperfusão).

A abordagem mais comum é da veia femoral para a artéria femoral. Pacientes não emergentes com ECMO-VA podem ser cogitados para canulação da veia jugular interna para a artéria subclávia, denominada “modelo esportivo” (54, 55). Esse desenvolvimento na técnica mudou os locais de canulação não emergentes de ECMO-VA dos vasos da virilha (femoral) para o corpo superior (subclávia), facilitando a deambulação (56, 57). A ECMO ambulatorial é bastante importante em pacientes aguardando transplante para reduzir o risco de descon-dicionamento do paciente durante essa espera (58).

As necessidades únicas do paciente podem ser satisfeitas pela adição de uma segunda cânula venosa [incluindo cânulas de duplo lúmen, como a Avalon Elite (Getinge, Gotemburgo, Suécia) ou OriGen (OriGen Bio-medical, Inc., Austin, Texas, EUA)] para conversão entre

a VV e a configuração híbrida venoarterial-venosa. A canulação venoarterial-venosa raramente é usada como uma estratégia inicial, mas pode ser usada para oxigenação adicional. Uma série de casos de Biscotti et al. (58) apresentou 21 pacientes reanimados usando a ECMO híbrida com uma taxa de sobrevida de 43%.

Manejo. Fluxo da eCMo. Geralmente, um fluxo da ECMO de 50 a 70 ml/kg/min (∼4 a 6 l / min) é suficiente para a redução acentuada completa, e a aorta é preen-chida pelo fluxo retrógrado da cânula da ECMO arterial. Assim, a pós-carga enfrentada pelo VE é aumentada. Isso pode resultar na elevação da PDFVE e da pressão capilar pulmonar, levando à congestão pulmonar. Nessa situação, pode ser cogitado o uso de inotrópicos ou, em circunstâncias não usuais, uma septostomia por balão interatrial pode ser realizada para desviar o sangue do AE para o átrio direito, reduzindo as pressões elevadas do lado esquerdo. Há várias abordagens para descarga ou “ventilação” do VE revisadas na seção Fisiopatologia. Outra desvantagem do bypass VA é que quaisquer partí-culas, bolhas ou êmbolos que possam ter sido infundidos no circuito arterial ou venoso podem levar a um evento cerebral adverso. Por fim, é possível que diminuição do fluxo através dos pulmões permita o desenvolvimento de tromboses microvasculares intrapulmonares, o que pode agravar ainda mais a patologia pulmonar.Monitoramento. Um paciente com ECMO deve, invaria-velmente, ter uma linha arterial, podendo ter um cateter de artéria pulmonar. O cateter de artéria pulmonar normalmente é usado para monitorar a saturação ve-nosa mista, embora algumas das bombas mais recentes (Maquet CardioHelp) monitorem continuamente a saturação venosa mista, podendo evitar a necessidade do cateter de artéria pulmonar. O uso do débito cardíaco de termodiluição é enganoso porque a uma quantidade desconhecida de bolus frio é atraída pelo circuito da ECMO, invalidando o cálculo. Um cateter de Swan-Ganz deve ser equipado e usado como uma ferramenta para monitorar a pressão arterial pulmonar como um subs-tituto da distensão do VE. A medição intermitente de lactato pode ser útil.anticoagulação. A terapia anticoagulação sistêmica minimiza a interação de produtos sanguíneos com a superfície do circuito da ECMO. O fibrinogénio e a albumina se adsorvem aos componentes do biopolí-mero do circuito, resultando na agregação, ativação e consumo de plaquetas em 1 hora da iniciação da ECMO (59). O sistema de coagulação ativado pode resultar em trombocitopenia, a qual pode ser profunda, exigindo transfusões de plaquetas algumas vezes.

Tanto a escolha do agente usado para a anticoagulação quanto o monitoramento do nível de anticoagulação va-riam de local para local. A heparina é o anticoagulante

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mais comum, usado de acordo com um protocolo padrão baseado em peso e monitorado pelo tempo de trombo-plastina ativada, com meta de 50 a 75 s (linha de base 1,5× a 2,5×) ou antifator Xa, com meta de 0,3 a 0,7 UI/ml. Alguns centros preferem seguir o tempo de coagulação ativado devido à sua disponibilidade à beira do leito e ao rápido tempo de retorno, com meta de 180 a 220 s.

Os inibidores diretos da trombina, como a bivaliru-dina e a argatrobana parenteral, representam alterna-tivas à heparina em indivíduos com trombocitopenia induzida por heparina. Os pacientes anticoagulados fazendo uso desses inibidores diretos da trombina têm seu tempo de tromboplastina parcial ativada entre 50 e 60 segundos monitorado (60).

Manejo do ResPiRadoR. Pacientes em ECMO podem ou não necessitar de assistência de um respirador. Como a ECMO proporciona uma troca gasosa completa, o paciente consciente em choque cardiogênico pode respirar espontaneamente enquanto estiver em ECMO, independentemente da função respiratória. No entanto, a assistência de um respirador pode ser necessária para a proteção das vias aéreas em pacientes que necessitam de sedação, como pacientes com parada cardiorres-piratória. A maioria dos centros usa a ventilação com volume corrente baixo (3 a 5 ml/kg) para reduzir o risco de lesão pulmonar. As configurações da ventilação mecânica protetora incluem uma taxa < 8/min, pressão positiva expiratória final de 10 a 15 Torr, fração inspi-rada de oxigênio < 0,40 e volume corrente baixo (61).hemodiálise em eCMo. A hemodiálise VV contínua pode ser feita por meio do circuito de ECMO ou por meio do acesso vascular separado. A hemodiálise conven-cional também é uma opção.temperatura. Um trocador de calor integral é incluído com o oxigenador de membrana. Dessa forma, um paciente pode ser aquecido ou resfriado conforme o ne-cessário. Isso pode ocultar a presença de uma “febre” e dificultar o reconhecimento de uma infecção. Se a ECMO for usada em um paciente após um insulto anóxico, a manutenção de uma temperatura não superior a 36 °F por até 24 horas pode ser valiosa (62).

desMaMe. Se um paciente apresenta melhoria durante a ECMO, o desmame é o próximo passo. O fluxo da ECMO é diminuído em aproximadamente 1 l/h em um período de 3 a 4 h, embora também tenham sido relatadas taxas mais baixas de desmame de 0,5 l a cada 6 a 24 h (57). O paciente deve ser capaz de manter uma saturação venosa mista > 65% e uma saturação arterial > 90% com um fluxo de ECMO < 1,5 l/min. Também é possível usar uma ponte entre as cânulas arterial e venosa para separar comple-tamente a circulação do paciente do circuito de ECMO sem decanulação. Caso haja sinais de descompensação, a ponte é fixada e o paciente volta para a assistência total

(63). A decanulação geralmente ocorre no laboratório de cateterismo ou na sala de cirurgia.

CoMPliCações

isqueMia de MeMbRo. Historicamente, a isquemia de membro ocorreu em 16,9% dos pacientes em assis-tência de ECMO-VA periférica. A fasciotomia devido a síndrome compartimental foi necessária em 10,3% dos pacientes, sendo que 4,7% precisaram sofrer ampu-tação (54). Atualmente, o uso de cateteres de perfusão anterógrada profilática (como descrito anteriormente) provavelmente reduz a incidência dessa complicação. Conforme Lamb et al. (64), nenhum dos 55 pacientes com um cateter de perfusão distal apresentou isquemia de membro desenvolvida profilaticamente, em oposição a 12 de 36 pacientes sem esse cateter. Uma metanálise de Juo et al. (65) relatou uma relação de risco relativo de 0,41 com um cateter de perfusão distal, por isso ele é altamente recomendável.

Entre os sintomas típicos da isquemia de membro, estão: palidez, perda de pulsos e gangrena. A síndrome compartimental raramente é vista em membros pro-fundamente isquêmicos antes da reperfusão, com um cateter de perfusão distal. Após a reperfusão, porém, o membro pode ficar inchado e a pele tensionada. Caso a medição das pressões do compartimento revelem um valor acima de 20 mmHg, geralmente uma fasciotomia é necessária. É preciso haver um alto índice de suspeita, assim como verificações frequentes do Doppler e um monitoramento por hora. A presença de níveis elevados de creatinina fosfoquinase ou lactato (embora não consistentemente observados) geralmente é uma des-coberta tardia e muito preocupante.

aCidente vasCulaR CeRebRal. AVCs isquêmicos e hemorrágicos ocorrem em aproximadamente 4% dos pacientes com ECMO VA (66). A taxa de AVCs varia de acordo com a indicação e a técnica de canulação. O AVC isquêmico é mais comum em pacientes com ECPR, diag-nosticado em 7% das ressuscitações bem-sucedidas (66). A canulação via artéria carótida triplica o risco de AVC isquêmico em comparação com a canulação da artéria femoral (67). Um em cada 4 pacientes com isquemia cerebral em ECMO-VA sobrevive, enquanto apenas 1 em cada 10 pacientes com hemorragia cerebral sobrevive (68), geralmente com déficit neurológico. A função cognitiva deve ser monitorada continuamente em pacientes com ECMO.

A causa do AVC é multifatorial, acreditando-se que eventos tromboembólicos, a anticoagulação sistêmica e a instabilidade hemodinâmica contribuam para a ocor-rência. A presença do circuito gera risco secundário de partículas, bolhas ou êmbolos, que podem ser infun-

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didos inadvertidamente no circuito arterial. Devido ao estado de baixo fluxo, os trombos podem se formar espontaneamente no AE e no VE.

sangRaMento. Pacientes em ECMO-VA são tipica-mente anticoagulados e propensos a sangramento. Para otimizar a saturação de oxigênio no sangue, a hemoglo-bina deve ser mantida entre 8 e 10 mg/dl. Transfusões podem ser necessárias, mas elas podem deixar sensível um potencial candidato a transplante e causar lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão.

O sangramento é tratado por meio da redução da dosagem de heparina (ou inibidor direto da trombina) ou da interrupção da anticoagulação. Vários relatos sugerem que é seguro suspender a anticoagulação por até 3 dias em circunstâncias de intolerância à anticoa-gulação (69). Quando a modificação da anticoagulação é inadequada, são necessárias a protamina e, mais comu-mente, produtos contendo fatores; além disso, deve ser cogitada a possibilidade de trombocitopenia induzida pela heparina.

inFeCção. As complicações infecciosas mais prová-veis da ECMO-VA são a bacteremia e a sepse, sendo os ciclos mais longos de ECMO associados a taxas mais altas de infecção. Mais de 53% dos adultos adquirem uma infecção dentro de 14 dias após o início da ECMO. A mortalidade em pacientes com complicações infecciosas atinge 60%. A técnica estéril durante a canulação é de suma importância, especialmente devido à natureza urgente ou emergente do procedimento.

síndRoMe de aRlequiM. À medida que o VE se recupera, ele começa a ejetar o sangue que recebe da circulação pulmonar. O fluxo direto do sangue desoxi-genado proveniente de pulmões nativos com falha se mistura imprevisivelmente com o fluxo retrógrado do oxigenador, o que pode resultar no suprimento inade-quado de sangue oxigenado no arco aórtico, resultando em hipoxia no tronco e no cérebro. Esse fenômeno, conhecido como síndrome de arlequim, pode resultar em cianose das extremidades superiores, enquanto as extremidades inferiores aparecem em rosa. O mo-nitoramento da saturação da síndrome de arlequim é realizado na mão direita, na testa, no nariz ou na orelha direita, e a gasometria arterial deve ser obtida a partir de uma linha arterial do braço direito.

PRogRaMa de eCMo

A ECMO é uma terapia complexa e de alto risco que deve ser administrada em centros experientes, além de pessoal adequado e recursos suficientes para garantir que ela seja usada de modo eficaz (70, 71). Os novos programas da ECMO devem se associar a programas

maiores e mais experientes para, não apenas aprender com seu pessoal, mas obter planos de atendimento da amostra, protocolos de enfermagem e políticas. Os programas avançados de atendimento da insuficiência cardíaca que oferecem diversas formas de assistência circulatória mecânica, transplante de coração e pulmão e terapia médica avançada em centros de atendimento terciário de alto volume devem atuar como centros hub de ECMO. Todos os centros participantes desse sistema hub and spoke devem seguir estritamente os protocolos padronizados escritos que detalham os critérios para o início do suporte de ECMO, contraindicações, atendi-mento de seguimento e estratégias de saída.

estRutuRa da equiPe de eCMo

Os pacientes que necessitam da assistência de ECMO precisam do mais alto nível de terapia intensiva de uma equipe multidisciplinar. Por o início da terapia com ECMO ser sensível ao tempo, várias intervenções ocorrem simultaneamente ou em rápida sucessão até que a condição do paciente esteja estabilizada. É preciso que especialistas em ECMO façam uma triagem para confirmar os candidatos adequados, evitando uma aplicação fútil da terapia. As equipes principais de ECMO geralmente são compostas por médicos treinados e dedicados, um coordenador de ECMO, enfermeiros, técnicos em enfermagem, perfusionistas e terapeutas respiratórios (72). As diretrizes da ELSO recomendam que os diretores do programa sejam especialistas em cuidados intensivos certificados pelo conselho; especialistas cardiovasculares; cirurgiões torácicos, vasculares ou de traumas; anestesistas de cuidados car-díacos e críticos; ou outro especialista certificado pelo conselho, com treinamento e experiência em terapia com ECMO (70, 73, 74). Os especialistas em ECMO devem estar disponíveis em tempo integral para dar suporte à equipe e completar o gerenciamento diário do paciente. Em alguns hospitais, os médicos do setor de emergência se tornam parte integrante do programa, plenamente capazes de iniciar a ECMO (75).

Após a seleção apropriada do paciente e a notificação da equipe, um médico da ECMO orienta a equipe, realiza a canulação e conduz o gerenciamento multidisciplinar do paciente. Os enfermeiros intensivistas gerenciam as linhas intravenosas, administram os medicamentos, monitoram os dados de pressão e de eletrocardiograma, solicitam exames laboratoriais e documentam o atendi-mento. De modo específico, uma enfermeira aplica os eletrodos de desfibrilação no peito, assegura o acesso intravenoso adequado, prepara a heparina e os tipos e as referências cruzadas de glóbulos vermelhos, plasma fresco congelado e plaquetas. O perfusionista fornece cânulas, prepara e configura o circuito ECMO e inicia

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a assistência após a conclusão do circuito. Depois que a assistência é iniciada, os locais da cânula são fixados com bandas, um curativo estéril é colocado e as radio-grafias são realizadas para verificar quais são os locais apropriados para a cânula. A assistência contínua à ECMO requer cuidados na proporção de 1:1 ou 1:2, e os médicos da ECMO devem estar nas imediações e devem fornecer gerenciamento médico contínuo.

O pessoal da equipe de ECMO varia consideravel-mente entre as instituições, com volume de casos e ou-tras responsabilidades sendo o principal determinante. A disponibilidade do médico 24 horas por dia para fazer a canulação e gerir os casos atuais requer um mínimo de três médicos, mas esse número depende muito de suas responsabilidades totais durante o serviço. Se o médico também for responsável por outros pacientes críticos ou casos pós-DAVE ou pós-transplante, a acuidade aumenta consideravelmente.

Quando as instituições iniciarem um novo programa de ECMO, deve ser conduzida uma análise completa do volume do paciente potencial, da capacidade da unidade de terapia intensiva e da equipe para assegurar que uma quantidade apropriada de apoio financeiro, recursos humanos e espaços esteja disponível. A administração do hospital deve estar comprometida com os custos iniciais do programa, mas também deve estar ciente de que, se o volume de casos superar a estimativa, serão necessários mais equipamentos e recursos humanos.

PRogRaMa de tRansPoRte da eCMo

A ELSO fornece diretrizes detalhadas para o transporte de pacientes assistidos pela ECMO (2). O estabelecimento de sistemas avançados de atendimento cardíaco que são projetados com hospitais hub de alto volume integrados a sistemas médicos de emergência e centros spoke comunitários podem afetar os resultados de pacientes com insuficiência cardíaca ou pulmonar profunda (71). Uma rede regional hub and spoke é composta por três níveis de atendimento. Os centros de Nível 1 fornecem todos os aspectos de atendimento, incluindo transplantes, DAVs duráveis e suporte circu-latório de curto prazo, incluindo a ECMO. Os centros de Nível 2 fornecem cateterismo e cirurgia cardíaca, com a capacidade para assistência mecânica de curto prazo. Os centros de Nível 3 fornecem ressuscitação, com te-rapia médica para estabilização (Figura 7) (76). Reunir esses centros de diferentes níveis para oferecer a assis-tência de ECMO requer compromisso e comunicação de diversos profissionais de saúde. Os protocolos que de-finem comunicações, a triagem e a seleção de pacientes, o manejo de pacientes e o processo de transporte devem estar em vigor e devem ser estritamente seguidos por todos os centros participantes para que o debate seja

minimizado durante o processo de triagem. A coorde-nação geral do sistema de ECMO é de responsabilidade do hospital hub de Nível 1.

A equipe móvel de ECMO deve estar disponível 24 horas por dia e ter uma equipe experiente e treinada em canulação e transporte de pacientes, iniciação do suporte de ECMO e manejo do paciente. Um especialista em ECMO no centro hub Nível 1 precisa estar disponível 24 horas por dia para consultar os centros de Nível 2 e Nível 3 com relação à escolha de cuidados para os pacientes nos centros spoke. Quando a ECMO é o trata-mento escolhido, a implementação rápida da terapia é essencial (77). Pacientes em choque cardiogênico grave ou insuficiência pulmonar que se apresentem nos cen-tros de Nível 3, devem ser prontamente transportados para o centro hub, se sua condição for suficientemente estável. Para casos instáveis, uma equipe de transporte de ECMO é enviada para iniciar a terapia no local.

Dependendo da distância e do tamanho da área me-tropolitana, podem ser usadas ambulâncias terrestres, helicópteros ou aeronaves de asa fixa. Idealmente, o hospital hub tem serviços de helicóptero prontamente disponíveis e pode fornecer o transporte oportuno. Para o transporte de um paciente estável para o hospital hub, uma ambulância terrestre pode ser a melhor opção se a distância não for excessiva (78). No programa regional em Oklahoma, 250 pacientes de quatro estados diferentes foram transportados por vários modos de transporte.

áReas de desenvolviMento e diReções

FutuRas

Há muitos tópicos em torno do uso da ECMO-VA em cardiologia bastante debatidos. Nós discutimos vários de grande importância.

étiCa

Assim como com todos os pacientes críticos com grandes chances de ter um desfecho ruim, as consi-derações éticas desempenham um papel importante no manuseio da ECMO. As considerações éticas dizem respeito a três pilares: 1) pacientes e suas famílias; 2) a equipe de assistência à saúde; e 3) sociedade em geral.

PaCiente e FaMília. A ECMO é frequentemente realizada sem tempo adequado para uma discussão detalhada entre a equipe de assistência à saúde e os pacientes e suas famílias. Isso pode resultar em percep-ções pouco claras das metas, em compreensões ruins das limitações e casos de futilidade e situações que obrigam a retirada. Um formulário de consentimento específico à ECMO deve ser cogitado pelas instituições.

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Em situações em que há discordância, pode ser benéfico o envolvimento precoce da equipe de ética, da equipe de cuidados paliativos e da liderança hospitalar (79).

equiPe de assistÊnCia à saúde. O atendimento da ECMO pode resultar em um ônus significativo para a equipe de assistência à saúde. Não é incomum observar divergências entre os profissionais sobre metas de atendimento, duração do apoio e retirada significativa (80). Uma consulta ética deve ser considerada logo após o início da assistência de ECMO. Além disso, o encami-nhamento automático à ética pode reduzir o fardo e a sensação de discordância entre os membros da equipe de assistência à saúde. As instituições que estabele-cerem equipes de ECMO podem cogitar ter diretrizes de políticas para estabelecer uma estrutura para casos de discórdia entre as várias partes interessadas envol-vidas. O significado do status de NR em pacientes em assistência de ECMO pode precisar de maior definição e pode variar de acordo com cada cenário. A NR entre os pacientes com ECMO-VA pode assumir as formas de não escalonamento, incluindo o uso de vasopressores ou nenhuma substituição de componentes com falha do circuito de ECMO, se necessário.

soCiedade. Na ausência de resultados definitivos sobre a utilidade e a relação entre custo e benefício da ECMO, torna-se um desafio aceitar seu uso disseminado, o que pode sobrecarregar recursos limitados em certas comunidades. É possível que leis locais e estaduais pre-cisem ser abordadas para permitir a rescisão e a reti-rada de pacientes da assistência conforme decisão dos médicos em caso de futilidade comprovada, cenário de ponte para lugar algum ou lesão irreversível com desa-cordo entre paciente e paciente substituto e as equipes clínicas. Por fim, algumas questões sensíveis precisam ser abordadas, como se hospitais sem capacidade para ECMO devem ser obrigados a transferir pacientes para centros de ECMO.

neCessidade de alteRaR a

ClassiFiCação

A classificação das indicações para ECMO-VA é um legado do passado pediátrico, com forte ênfase na cardiopatia congênita, que representa apenas uma fração das canulações da ECMO-VA. A ELSO divide os eventos cardíacos conforme as seguintes indicações:

FiguRa 7 Proposta de organização regional do programa/transporte da ECMO: um modelo hub and spoke

Um sistema organizado deve consistir em três níveis de atendimento. Os centros de Nível 1 (o hub) fornecem todos os aspectos do cuidado, incluindo oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO), dispositivos de assistência ventricular duradoura a longo prazo (DAVs), assistência ventricular direita (VD) e transplante cardíaco. Os centros de Nível 2 fornecem atendimento de curto prazo. Os cirurgiões estão disponíveis, mas não necessariamente no local. Os centros de Nível 2 devem hospedar um laboratório de cateterização e capacidade de iniciação ou canulação da ECMO. Os centros de Nível 3 podem fornecer diagnóstico, reanimação, monitoramento hemodinâmico e estabilização com vasopressores e inotrópicos. VE = ventricular esquerdo.

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parada cardiorrespiratória, choque cardiogênico, mio-cardite aguda, cardiomiopatia congênita e miscelânea. De 1990 a 2016, de acordo com o relatório de 2017 do ELSO, 4% dos eventos cardíacos foram realizados para cardiopatia congênita, 5% para parada cardiorrespira-tória, 2,2% para miocardite, 6,7% para cardiomiopatia, 24,4% para choque cardiogênico e 58% para outras indicações (2).

A miocardite aguda e a cardiomiopatia requerem ECMO somente se levarem a choque cardiogênico. Além disso, a categoria “outros” é maior do que todas as outras juntas, mostrando que o sistema de classificação não serve ao seu propósito. Para aumentar a confusão, um “evento cardíaco” não é igual à ECMO-VA, pois há alguns ECMO-VV nesta categoria. Assim, estamos propondo mudar a classificação para essa que usamos neste artigo.

PadRões de tReinaMento PaRa

MeMbRos da equiPe de eCMo

O nível inicial de qualificação e avanço ou da manu-tenção da qualificação deve ser padronizado devido às altas demandas e habilidades específicas exigidas.

eCMo-va PaRa Choque séPtiCo. A sepse tem sido historicamente considerada uma contraindicação à ECMO. A explicação padrão é que a sepse está associada à falência múltipla de órgãos e sobrevida ruim, indepen-dentemente do suporte extracorpóreo à vida. No en-tanto, a falta de diferença na sobrevida entre os grupos sépticos e não sépticos indicou que a infecção não afeta adversamente os desfechos da ECMO (10). A ECMO pode ser benéfica para os pacientes sépticos selecionados com disfunção do VE relacionada à sepse.

uso da eCMo-va PaRa uMa PReseRvação Me-

lhoR de óRgãos doados PaRa tRansPlante. Os órgãos de transplante recuperados pela ECMO-VA apresentam uma promessa excepcional. Centros únicos demonstraram que os órgãos (rim, fígado) perfundidos pela ECMO-VA após a morte cardíaca apresentam os mesmos desfechos de transplantes de órgãos adqui-ridos após a morte encefálica, o atual padrão-ouro da coleta de doador póstumo (81). A ECMO mantém um órgão à temperatura corporal e oferece perfusato a um “pulmão em uma caixa” ventilado mecanicamente ou a um “coração em uma caixa” com batimento para permitir o aprimoramento e avaliação de órgãos antes do transplante com resultados promissores (82, 83).

ConClusões

A ECMO-VA é uma ferramenta poderosa que precisa ser usada de maneira criteriosa. À medida que ficamos proficientes, diversos desafios são criados pela falta de estudos prospectivos randomizados ou de um sistema de classificação útil, além da existência de áreas de incer-teza. A infraestrutura adequada, o conjunto de compe-tências adequadas dos membros da equipe e a avaliação completa de cada candidato à ECMO, com uma avaliação de indicações e contraindicações à assistência da ECMO, são etapas fundamentais para garantir desfechos ideais.

CoRResPondÊnCia. Dr. Maya E. Guglin, Diretor Médico do Programa de Assistência Circulatória Mecâ-nica da Divisão de Medicina Cardiovascular, Gill Heart & Vascular Institute, University of Kentucky Albert B. Chandler Hospital, First Floor, Suite G100, 800 Rose Street, Lexington, Kentucky, EUA 40536. E-mail: [email protected]. Twitter: @MGuglin.

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Guglin et al. ECMO venoarterial para adultos em cardiologia

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PALAVRAS-CHAVE choque cardiogênico, ECLS, parada cardiorrespiratória

Ayub-FerreiraComentário Editorial

88

CoMentáRio editoRial

ECMO venoarterial para adultosSilvia Moreira Ayub-Ferreira, MD, PhD*

*Assistente da Unidade de Insuficiência Cardíaca do InCor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

O choque cardiogênico é a expressão da falência circulatória e tem entre as principais causas o infarto agudo do miocárdio (IAM). Mesmo com a

revascularização precoce e o uso de balão intra-aórtico (BIA), o prognóstico desses pacientes é reservado, podendo chegar a 50% de mortalidade intra-hospitalar (1). Além do IAM, o choque cardiogênico pode ser de-corrente de cardiopatias crônicas, miocardite aguda, rejeição de enxerto cardíaco, pós-cardiotomia, entre outras. Nestes casos onde a terapia farmacológica e, eventualmente, a associação do BIA, se mostram ineficazes em restaurar a perfusão orgânica adequada, necessitamos lançar mão do uso de dispositivos de assistência circulatória mecânica. Nessas situações de urgência, onde o prognóstico e a definição da terapia a longo prazo não estão desenhados, os dispositivos mais adequados são temporários e de instalação percutânea, como a ECMO (“extracorporeal membrane oxigenation”) veno-arterial, Impella© ou o Tandem Heart©.

Num cenário de escassez de recursos, como a realidade brasileira, a ECMO talvez seja o dispositivo temporário preferencial, pela sua pluralidade de op-ções: suporte uni ou biventricular, suporte ventilatório associado, implante percutâneo a beira-leito, utilização na parada cardíaca.

No artigo de Guglin et al. (2), os autores fazem uma revisão minuciosa sobre a utilização da ECMO veno-ar-terial. Alguns dados merecem destaque. A ECMO é uma modificação portátil de um circuito extra-corpórea e, só recentemente, tem ganho espaço na terapia do choque cardiogênico em adultos. Conforme dados da ELSO (“Ex-tracorporeal Life Support Organization”), o número de ECMO cardíaco em adultos passou de <200 no período 1997-2007 para mais de 1.000 implantes/ano de 2007 até os dias atuais (3).

A ECMO fornece um fluxo entre 4-6 litros por minuto, podendo dar suporte biventricular por algumas semanas. Talvez a maior desvantagem da ECMO veno-arterial pe-

riférica, em relação aos outros suportes paracorpóreos seja o aumento da pós-carga que exerce no ventrículo esquerdo, já que o fluxo de sangue oxigenado na Aorta é retrógrado para o coração. Isto gera aumento do estresse de parede e da demanda por oxigênio, podendo dificultar a recuperação cardíaca nos casos potenciais. Além disso, o aumento de sobrecarca sobre o ventrículo esquerdo provoca progressiva congestão pumonar. Para aliviar esta congestão podemos lançar mão de algumas estratégias associadas como BIA ou Impella©, e em casos extremos a necessidade de migrar para outro dispositivo.

A ECMO, como citado nesta revisão, não é uma terapia para cura. Na verdade, ele fornece um suporte para ma-nutenção da perfusão adequada e viabilidade orgânica enquanto agurdamos uma recuperação cardíaca (p.e., IAM ou miocardite aguda) ou enquanto decidimos qual a melhor terapia de longo prazo a ser adotada (p.e., numa miocardiopatia dilatada refratária). Desta maneira, a ECMO deve ser indicada quando temos expectativa de potencial salvamento do paciente e quando não existam patologias associadas com baixa expectativa de vida.

Diante da complexidade da instalação do circuito de ECMO, das incertezas quanto a adequada indicação e da necessidade de se programar passos futuros (trans-plante cardíaco, assistência circulatória mecânica de longa duração, recuperação ou cessação de esforços), a decisão deve ser tomada por um time de especialistas que deve englobar cirurgião cardíaco, cardiologista especializado em insuficiência cardíaca, intensivista, perfusionista, enfermagem especializada e cuidados paliativos.

No nosso meio a ELSO tem se organizado e vem cres-cendo nos últimos anos. Em 2012 foi criado o capítulo latino-americano da ELSO. Desde então, os resultados têm melhorado, chegando a taxas de 45% de alta hospi-talar após uso da ECMO (4).

Em resumo, a ECMO é um dispositivo de grande utilidade para atendimento de pacientes em choque car-

Ayub-FerreiraComentário Editorial

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diogênico refratário, de relativa facilidade de instalação à beira-leito, permitindo manutenção do paciente por períodos curtos de tempo (semanas). Mas para que essa terapia possa ser vitoriosa é necessário um time de espe-

cialistas treinados para seu manuseio e sempre antecipar os próximos passos do tratamento do paciente, levando em conta a estratégia futura (transplante cardíaco, im-plante de ACM longa duração, recuperação ou paliação).

1. Mandawat A, Rao SV. Percutaneous Mechanical Circulatory Support Devices in Cardiogenic Shock. Circ Cardiovasc Interv. 2017;10(5).

2. Guglin M, Zucker MJ, Bazan VM, Bozkurt B, El Banayosy A, Estep JD, et al. Venoarterial ECMO for Adults: JACC Scientific Expert Panel. J Am Coll Cardiol. 2019;73(6):698-716.

3. [Available from: http://www.elso.org .

4. Canêo LF, Neirotti RA. ECMO: Improving our Results by Chasing the Rabbits. Braz J Cardiovasc Surg. 2015;30(6):657-9.

ReFeRÊnCias