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1 “A arte de ensinar Economia de uma maneira simples, sem mistérios”. De Maria Eulália, uma ex-aluna. AULA 1: INTRODUÇÃO ÀS TEORIAS DA INFLAÇÃO Um observação importante: Este Curso online de Economia II é praticamente uma continuação de nosso curso online anterior de Economia I. Seu conteúdo se constituirá de tópicos de Macroeconomia não abordados naquele curso e que constam do Edital do concurso da AFRF. Por isso, para um melhor aproveitamento, é importante que o aluno inscrito neste curso tenha feito o Curso online de Economia I. Esta nossa Aula n° 1 versará sobre inflação, suas causas e modelos explicativos do processo inflacionário. Para um melhor entendimento deste tópico, principalmente quando estivermos tratando dos modelos analíticos da inflação, é importante que você dê uma revisada na Aula 10 de nosso curso online de Economia I – sobre A Oferta e a Demanda Agregadas, ok? Então, vamos lá, já que o tempo de vocês é curto, aliás curtíssimo! 1 . Introdução: o conceito de inflação Ocorre inflação quando um aumento continuado, permanente, do nível geral de preços - o que, em conseqüência, provoca uma perda do poder aquisitivo da moeda. Pela definição acima, vê-se que inflação é um processo de aumento contínuo dos preços ao longo de um certo período. Tecnicamente, se houver um aumento súbito do nível de preços, – que tenha sido provocado, por exemplo, por uma medida governamental que objetivasse a correção de alguns preços “que estavam atrasados” – mas que não tenha continuidade no tempo,

Economia – introdução às teorias da inflação

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“A arte de ensinar Economia de uma maneira simples,

sem mistérios”. De Maria Eulália, uma ex-aluna.

AULA 1: INTRODUÇÃO ÀS TEORIAS DA

INFLAÇÃO Um observação importante: Este Curso online de

Economia II é praticamente uma continuação de nosso curso online anterior de Economia I. Seu conteúdo se constituirá de tópicos de Macroeconomia não abordados naquele curso e que constam do Edital do concurso da AFRF. Por isso, para um melhor aproveitamento, é importante que o aluno inscrito neste curso tenha feito o Curso online de Economia I.

Esta nossa Aula n° 1 versará sobre inflação, suas causas e modelos explicativos do processo inflacionário. Para um melhor entendimento deste tópico, principalmente quando estivermos tratando dos modelos analíticos da inflação, é importante que você dê uma revisada na Aula 10 de nosso curso online de Economia I – sobre A Oferta e a Demanda Agregadas, ok?

Então, vamos lá, já que o tempo de vocês é curto, aliás curtíssimo!

1 . Introdução: o conceito de inflação

Ocorre inflação quando há um aumento continuado,

permanente, do nível geral de preços - o que, em conseqüência, provoca uma perda do poder aquisitivo da moeda.

Pela definição acima, vê-se que inflação é um processo de aumento contínuo dos preços ao longo de um certo período. Tecnicamente, se houver um aumento súbito do nível de preços, – que tenha sido provocado, por exemplo, por uma medida governamental que objetivasse a correção de alguns preços “que estavam atrasados” – mas que não tenha continuidade no tempo,

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tal fenômeno não seria considerado inflação e, sim, um fenômeno isolado e temporário que se esgota em si mesmo.

Da mesma forma, há que se distinguir num processo inflacionário os aumentos de preços por efeito de, digamos, quebras de safras ou de aumento exagerado da demanda, de aumentos de preços de um determinado produto, frutos de melhoria tecnológica ou de qualidade do produto. É claro que, um novo modelo de automóvel, com novas tecnologias (vidro elétrico, ar condicionado, etc.) deve ter seu preço elevado em relação a um modelo anterior, porém mais simples. Este aumento de preço “por melhoria tecnológica ou por melhor qualidade” não pode ser considerado inflação.

2 Principais Distorções Provocadas pela Inflação Muito embora a inflação, em qualquer grau e circunstância, seja

vista, nos países mais desenvolvidos, como um mal a ser evitado por todos os meios, muitos economistas são de opinião que, nas economias em desenvolvimento, uma inflação moderada, suave, digamos de 10% ao ano, pode até ser benéfica à atividade econômica na medida em que pode servir de estímulo a aumentos da produção e do emprego.

No entanto, é ponto pacífico que um processo inflacionário agudo e crônico provoca distorções e desarranjos de toda ordem no sistema econômico, podendo ser citados os seguintes principais efeitos perversos:

i) Efeitos sobre a distribuição de renda

Este talvez seja a pior distorção provocada por um processo

inflacionário acelerado ao reduzir drasticamente o poder aquisitivo de todos os indivíduos que vivem de rendas fixas – como ‚ é o caso dos assalariados, pensionistas, aposentados, ou daqueles que vivem de aluguéis. O mesmo não se pode dizer daqueles que têm renda variável, com possibilidades de reajustes periódicos (preços) ou de aplicação financeira com proteção contra a corrosão inflacionária.

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ii) Efeitos sobre pagamentos de débitos e de impostos

Ganham com a inflação todos aqueles que têm dívida de longo

prazo, mesmo que haja previsão de correção monetária – o que dificulta o fornecimento de crédito para investimentos, crédito este geralmente de longo prazo. A concessão de empréstimos, limitada ao curto prazo, impossibilita os investimentos produtivos que, por natureza, são de longo prazo. Da mesma forma, com a inflação perde o governo na arrecadação de impostos – dada a defasagem temporal entre o momento do fato gerador do imposto e seu recolhimento aos cofres do governo.

iii) Efeitos sobre o mercado financeiro e de capitais

A inflação provoca um desestímulo à aplicação de recursos no

mercado primário de ações, dada a perda acentuada do valor da moeda. Também desestimula a poupança, estimulando, isto sim, a aplicação em imóveis, fazendas, lotes, etc., de natureza não-produtiva.

O instituto da correção monetária, ao mesmo tempo em que procurou reduzir estes efeitos desestimulantes sobre a poupança, acabou por criar outros problemas, como a chamada “inércia inflacionária”, transferindo para hoje a inflação de ontem. Este foi um mecanismo utilizado pelo Brasil desde a segunda metade dos anos 60 até meados da década passada, mas que, agora, com o Plano Real, parece felizmente ter se tornado coisa do passado.

iv) Efeitos sobre o balanço de pagamentos

O aumento continuado dos preços domésticos acaba por

desestimular as exportações do País – pois compensa mais ao exportador vender seus produtos internamente do que no exterior. Da mesma forma, o aumento dos preços internos termina por estimular um aumento das importações.

A solução, no caso, é uma correção permanente da taxa de câmbio, com desvalorização da moeda doméstica. Tal como no caso da correção monetária, a desvalorização cambial, se resolve o

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problema do balanço de pagamentos, acarreta mais inflação na medida em que todos os produtos importados (equipamentos, petróleo, produtos farmacêuticos, etc.) se tornam mais caros.

v) Efeitos sobre as expectativas e incertezas

Um processo inflacionário crônico e agudo, como o caso

brasileiro dos anos 80 e início dos anos 90, acaba por gerar expectativas pessimistas dos empresários quanto ao futuro da economia e quanto a eventuais medidas drásticas que o governo pode vir a adotar.

O aumento do grau de incertezas daí decorrente passa a desestimular os investimentos produtivos e a economia entra num processo de stagflação – ou seja, estagnação com inflação.

3 Tipos ou Causas Clássicas de Inflação Um processo inflacionário pode ter diversas origens ou causas.

Costuma-se classificar os diversos tipos de inflação de acordo com suas causas principais. Assim, temos:

3.1 Inflação de demanda Diz-se que a inflação é de demanda quando a demanda

agregada excede a oferta agregada de bens e serviços. Normalmente, a inflação de demanda é interpretada como sendo o resultado de “dinheiro demais em circulação à procura de bens e serviços de menos!”

Tecnicamente, a probabilidade de surgimento de inflação de demanda ocorre quando a economia estiver no ou próxima do pleno emprego. Isto porque, caso haja desemprego em larga escala, a demanda tende a ser relativamente pequena. Se, por um motivo qualquer, houver um incremento ou excesso de demanda agregada, e estando a economia com capacidade ociosa no setor produtivo, o efeito inicial será estimular um aumento da produção, sem que os preços se alterem. Caso esteja a economia próxima do pleno emprego, e havendo um aumento da demanda agregada,

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não há como aumentar a oferta de bens para satisfazer esta demanda extra. Aí, então, o ajuste ou equilíbrio se dará através de aumentos nos preços, caracterizando um típico caso de “inflação de demanda”.

As principais causas de inflação de demanda são: i) gastos do governo em excesso à suas receitas tributárias,

gerando os conhecidos déficits fiscais, tal como ocorreu sistematicamente três últimas décadas e que desaguou na atual absurdamente elevada dívida interna pública e que tanta dor de cabeça têm causado às autoridades econômicas;

ii) emissões monetárias acima da taxa de crescimento do produto interno – um fenômeno em grande parte associado aos déficits governamentais; e,

iii) vendas a crédito – que aumentam o consumo presente, relativamente à renda dos indivíduos.

3.2 Os choques de oferta e a inflação de custos

Quando se fala de inflação de custos, está-se falando de inflação cuja causa principal se origina do lado da oferta. Neste caso, o nível de demanda agregada permanece praticamente o mesmo, enquanto os custos de produção dos bens e serviços se elevam e são repassados aos preços.

Estes aumentos de custos, extemporâneos e abruptos, decorrem dos chamados choques de oferta e estão geralmente associados ao poder de mercado de grupos de empresas, ou de sindicatos trabalhistas, de fornecedores de matérias-primas, ou não raras vezes estão associados a algum aumento dos impostos sobre as firmas. Como se vê, trata-se, na maioria dos casos, de distorções de mercado, a chamada “concorrência imperfeita”.

Os choques de oferta surgem das seguintes situações:

i) Se as empresas, atuando num mercado monopolista ou oligopolista, julgam baixas suas margens de lucro (mark-up), elas serão capazes de aumentá-las através de uma elevação dos preços dos bens e serviços que produzem – o que termina por extrapolar para todos os setores econômicos.

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ii) Da mesma forma, se os sindicatos trabalhistas mais organizados e com maior poder de barganha são capazes de forçar um aumento dos salários acima do aumento da produtividade, haverá um aumento dos custos de produção – o que, fatalmente, será repassado aos preços dos produtos, gerando inflação.

iii) A partir da observação anterior, surge uma questão que está sempre sendo objeto de discussão: Afinal de contas, os reajustes de salários são ou não causa de inflação? A resposta a esta questão é bastante simples: tecnicamente, os reajustes de salários só serão causa de mais inflação se eles se situarem acima da taxa de aumento da produtividade mais a taxa de inflação corrente. Em outras palavras, se o aumento da produtividade foi de 4% e a taxa de inflação corrente foi de 10%, os salários deverão ser aumentados em, no máximo 14% (numa conta aritmética!). Se o reajuste superar esta taxa, então, pode-se dizer que os salários estão causando um aumento da inflação pelo lado dos custos.

iv) Uma outra fonte de inflação de custos pode ser a chamada “inflação importada” – um aumento de preços de origem externa e que acaba por se transmitir a toda a economia – tal como ocorreu com o aumento dos preços do petróleo em 1973/74 e em 1979/80, que elevou não só os preços dos derivados deste produto, mas, também, das matérias-primas e insumos básicos em geral.

v) Também ocorre inflação de custo quando há uma quebra de safra agrícola. Isto porque, dado um custo do plantio, à medida que a produção esperada se reduz (devido a geadas, secas ou pragas), o custo unitário de produção aumenta – o que faz elevar o preço do produto no mercado.

Estas são, em síntese, as principais fontes ou causas de surgimento de inflação do lado dos custos, conhecidos na literatura econômica como choques de oferta.

3.3 Inflação estrutural

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Apenas para registro histórico, uma explicação ou justificação para o surgimento do processo inflacionário crônico por que passou a maioria dos países da América Latina nos anos 60/70 do século passado, foi a chamada inflação estrutural.

A verdade é que muitos dos países desta região experimentaram, naquelas duas décadas, um processo de rápido crescimento econômico, associado relativamente a altas taxas de inflação no período. Daí, surgiram inúmeras explicações para o fenômeno, que veio a ser denominado de “escola estruturalista” a qual raciocinava do seguinte modo:

– A inflação é uma característica típica dos países que experimentam um rápido processo de crescimento econômico porque:

– Primeiro, os países subdesenvolvidos apresentam uma estrutura setorial produtiva desbalanceada ou desequilibrada, coexistindo, lado a lado, setores bastante dinâmicos e modernos (o setor urbano e a indústria, por exemplo) com setores ortodoxos, atrasados (como a agricultura, a indústria têxtil, etc.). Neste contexto, ao se iniciar um processo de rápido crescimento econômico, os setores modernos e dinâmicos da economia tendem a pressionar os demais setores, com um acentuado aumento de suas demandas por mais matérias-primas, mais alimentos, etc. Estes últimos setores, no entanto, não têm capacidade de pronta resposta, isto é, de satisfazer prontamente este aumento da demanda por seus produtos e, em conseqüência, sua resposta é via aumento de preços.

– Outra explicação residia no papel de liderança desempenhado pelo Estado neste processo de crescimento econômico. Na maioria dos casos, o governo se tornou a verdadeira locomotiva da economia, puxando atrás de si o processo de crescimento econômico, seja através de grandes projetos de eletrificação, de telefonia, de siderurgia, de abertura de estradas, portos e hidroelétricas; seja através de concessão de subsídios ao setor privado. Ocorre, no entanto, que, sendo o país pobre, a arrecadação de impostos era baixa, e a única forma de o governo financiar seus elevados gastos era através de emissão maciça de moeda e/ou através de endividamento – o que só fez gerar inflação.

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– Uma outra explicação do fenômeno residia na necessidade de o país importar matérias-primas e equipamentos para atender ao desenvolvimento econômico. Isto exigiu endividamento externo e/ou desvalorizações cambiais que estimulassem as exportações cujas receitas se destinam ao pagamento das importações. Tais desvalorizações só fizeram gerar inflação interna.

3.4 Estagflação

Trata-se de um estado da economia em que se tem recessão econômica concomitantemente com inflação.

O fenômeno se deve ao fato de que, com a recessão econômica e conseqüente redução da demanda, as empresas com poder de mercado (caso típico dos oligopólios) aumentam seus preços para compensar as quedas nas vendas, mantendo com isso suas margens de lucro sobre seus custos.

Em síntese, na estagflação os preços sobem enquanto a produção e o emprego estão caindo ou, pelo menos, não estão crescendo.

4. A função oferta agregada e a determinação dos preços

Conforme foi visto e analisado na nossa Aula 10, do Curso online de Economia I, a função oferta agregada indica quais as quantidades ofertadas de produto pelo conjunto das empresas do país para cada nível de preços.

Embora intuitivamente pareça que a curva de oferta agregada deva ser positivamente inclinada – ou seja, quando os preços sobem, a oferta agregada também se eleva e vice-versa, na realidade ela pode também ser vertical – isto é, não se altera com o aumento dos preços – e pode até mesmo ser horizontal. Neste último caso, se, por qualquer motivo, houver um aumento da demanda agregada, o produto ofertado se expande sem que os preços se elevem.

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A bem da verdade, o formato da curva de oferta agregada é um dos temas mais controversos entre os macroeconomistas. Dependendo deste formato, os efeitos da política econômica sobre os preços e o produto de equilíbrio podem ser os mais diferentes possíveis. Vejamos isso com um pouco mais de detalhe:

Já foi visto na nossa Aula 10 do curso online de Economia I que a hipótese de uma curva de oferta vertical está diretamente associada com a Escola Clássica. Os economistas desta Escola argumentam que tanto a oferta como a demanda por mão-de-obra é função do salário real. Assim, dado um salário nominal e um nível de preço vigentes num certo momento – que determinam o nível do salário real – encontra-se o nível de emprego da economia e, daí, o nível de produto agregado de equilíbrio.

Neste contexto, qualquer tentativa do governo para aumentar o nível de emprego e daí o nível do produto – via aumentos na demanda agregada - terá como única conseqüência um aumento dos preços. Este aumento dos preços provocaria, em princípio, um aumento no emprego, mas como a mão-de-obra percebe a perda real de sua renda, exigirá aumentos nominais de salário proporcionais à taxa de inflação, retornando, assim, o salário real ao seu nível anterior. Com isso, o emprego não cresce e, em conseqüência, o produto ofertado também não cresce.

A Figura 1 ilustra este raciocínio, mostrando a curva de oferta agregada (OA) na posição vertical e a curva de demanda agregada inicial (DA1). Como sabemos, a curva de demanda agregada é determinada no mercado de produtos e no mercado monetário (Curva IS-LM). Observe que o cruzamento da DA1 com a curva de oferta agregada determina simultaneamente o nível do produto de equilíbrio (Y) e nível de preços vigente na economia (P1).

Supondo que o governo resolva, por exemplo, aumentar seus gastos na tentativa de criar mais empregos na economia, a curva de demanda agregada se desloca para cima – para DA2. Como a curva de oferta agregada é vertical (isto é, totalmente inelástica a preço) o produto de equilíbrio não se altera, mas os preços se elevam para P1.

Ou seja, no caso da oferta vertical (dos clássicos) o efeito da política fiscal expansionista do governo foi somente sobre o nível de preços.

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P OA P P DA0 DA1 OA DA0 DA1

P1 P1

P0 P0 P0 OA DA1

DA0

Y Y Y0 Y1 Y Y0 Y1 Y

Figura 1 Figura 2 Figura 3

Já na hipótese de uma curva de oferta positivamente inclinada – esta associada com a escola keynesiana – onde se supõe que os trabalhadores sofrem um pouco de ilusão monetária, exigindo aumentos nominais de salário quando há aumento de demanda por trabalho, porém sem associá-los com a taxa corrente de inflação – uma política fiscal expansionista , ao aumentar a demanda agregada, provoca um aumento do nível de preços corrente. Este aumento no nível de preços não é repassado inteiramente aos salários, gerando daí um aumento do emprego e, por conseqüência, o produto de equilíbrio cresce de Y0 para Y1, conforme ilustrado na Figura 2, assim como os preços que passam de P1 para P2.

Além dessas duas versões sobre a curva de oferta agregada, existe uma terceira versão que argumenta que, em épocas de crise econômica com muito desemprego, a curva de oferta agregada é horizontal até próximo do pleno emprego. Esta versão é conhecida como keynesiano extremo. De acordo com esta “escola”, em época de desemprego desenfreado na economia – tal como ocorreu na grande depressão de 1929/33, - havendo um aumento na demanda agregada por bens e serviços, os empresários têm condições de aumentar o emprego sem necessidade de conceder aumentos salariais, elevando, assim, o produto ofertado sem que haja pressão sobre os preços, tal como ilustrado na Figura 3. Feitas estas considerações, vamos analisar, agora, a questão da inflação X desemprego.

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5. Um modelo simples de inflação de demanda

Os modelos de inflação de demanda atribuem a elevação de

preços a um excesso de demanda no mercado de produtos. Os preços se elevam porque a demanda agregada de consumo privado, de investimentos e de gastos governamentais excedem a oferta agregada potencial da economia, definido essa ao nível do pleno emprego.

Tomando-se por hipótese um modelo simples tipicamente keynesiano – onde os salários e preços são rígidos no sentido descendente e a oferta de mão-de-obra é função do salário nominal vigente no mercado – a curva do produto ofertado agregado é perfeitamente elástica ao nível de preços vigentes (P0) até próximo ao nível de pleno emprego (Yf), quando se torna perfeitamente inelástica às variações nos preços, como mostra a Figura 4, onde OA representa a curva de oferta agregada e DA representa a curva de demanda agregada.

P OA

P2 P1 DA3 P0 DA2 DA1 DA0 Y0 Yf Y Figura 4 Sob essa hipótese, e supondo que a economia encontre-se

numa situação de desemprego, ao nível de Y0, um aumento da demanda agregada de DA0 até DA1– seja por elevação dos gastos do governo, seja por um aumento autônomo dos investimentos – não deverá provocar uma elevação do nível de preços. Quando, no

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entanto, a economia atingir o nível de pleno emprego (Yf), qualquer aumento da demanda agregada, de forma a deslocar a curva DA para DA2, DA3, etc., provocará aumentos no nível de preços para P2, P3, etc.

Em termos dinâmicos, a proposição é de que a taxa de inflação (dP/P) é uma função do excesso de demanda sobre a oferta agregada, tratando-se de uma função descontínua, não se verificando qualquer mudança no nível de preços até que o pleno emprego seja alcançado.

Ocorre que, na prática, é difícil se medir com exatidão o excesso (percentual) de demanda agregada sobre a oferta agregada. O procedimento comum, nesse caso, é tomar-se o mercado de trabalho como “proxy” do grau de excesso de demanda, verificando-se particularmente a taxa de desemprego existente naquele momento.

Assim, um nível baixo de desemprego indicaria um nível alto de demanda, e vice-versa. No entanto, a verdade é que não existe uma simetria precisa entre o “estado” da demanda agregada por bens e serviços e o nível de desemprego na economia. Essa questão se torna mais problemática ainda quando se tenta aplicar esse critério a uma economia em desenvolvimento, como a brasileira, com elevado desemprego “estrutural” 1 que, de forma alguma, é devido a uma deficiente ou fraca demanda agregada. Nesses países, muito do desemprego aberto, observado nas áreas urbanas, é explicado claramente pelos desequilíbrios estruturais dessas economias.

De toda forma, o teste clássico para se verificar a existência de excesso de demanda agregada seria dado pela Teoria Quantitativa da Moeda – que mostra o elo de ligação entre variações na quantidade de moeda existente num dado momento na economia e o nível de preços. Se, ao nível de renda de pleno emprego, os preços variam proporcionalmente às variações na quantidade de moeda, obtém-se um razoável indicador da presença de inflação de demanda2.

1 Tecnicamente, desemprego estrutural ocorre quando as pessoas desempregadas não dispõem da qualificação necessária para ocupar as vagas oferecidas (há, por exemplo, vagas de professor universitário, mas o desempregado é pedreiro ou enfermeiro). Nos países em desenvolvimento, o desemprego estrutural também surge do simples fato de que a economia é incapaz de absorver toda a mão-de-obra existente. 2 Veja no anexo a esta Aula 1 uma versão detalhada da Teoria Quantitativa da Moeda.

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Antes, porém, de passarmos adiante, vale a pena observar o seguinte: até aqui, consideramos um modelo simples keynesiano em que a função oferta agregada da economia se apresentava em forma de L invertido, com uma porção horizontal até atingir o pleno emprego. Sob tal hipótese, qualquer aumento da demanda agregada causaria um aumento no produto real (pelo deslocamento da curva de demanda agregada ao longo da porção horizontal da curva de oferta agregada), sem afetar o nível de preços. Os preços só começariam a subir a partir do nível de pleno emprego.

Essa função foi derivada da chamada versão keynesiana extrema que argumenta que, em época de grave crise econômica, com amplo desemprego, os trabalhadores estão preocupados com seus salários nominais e resistem firmemente a qualquer redução desses salários (um posição, diga-se, totalmente contrária à opinião dos clássicos até então predominante). Desse modo, uma redução na demanda por trabalho não deve resultar numa queda dos salários nominais dada a sua inflexibilidade no sentido descendente. Havendo desemprego em larga escala e sendo a oferta de trabalho horizontal ao nível do salário nominal vigente, mais e mais trabalhadores poderão ser contratados sem que aquele salário se altere.

Essa interpretação, no entanto, foi posteriormente retificada, levando a uma versão um pouco mais complexa da função oferta agregada keynesiana3. Isso ocorreu por uma razão bastante simples: dizer-se que a taxa salarial será constante (até o pleno emprego), em face de variações na demanda por trabalho, não implica necessariamente que o nível geral de preços será estável diante de variações na demanda agregada.

Em outras palavras, é preciso deixar claro que o fato de a curva de oferta de trabalho apresentar uma seção horizontal não significa que a função oferta agregada da economia também apresentará esta porção horizontal. Isso se explica pelo simples fato de que, quanto mais se empregar mão-de-obra, menor é o produto marginal de trabalho – o que, associado a um salário nominal constante, W, exigirá um aumento dos preços para que a receita marginal (=PxPMgL) se iguale ao custo marginal (W). Em

3 Confira: Wonnacott, P., Macroeconomics, R.D. Irwin Inc., Illinois, 1988, cap. 13.

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conseqüência, a curva de oferta agregada mostrará, no gráfico Y-P, uma inclinação positiva antes de se atingir o pleno emprego.

Feitas essas considerações, vejamos, agora, um modelo de inflação de demanda mais completo e analítico utilizando o instrumental desenvolvido na Aula 10 de nosso curso online de Economia I, relativo à derivação das curvas de oferta e de demanda agregadas.

6. Inflação de demanda: um modelo mais analítico

Para desenvolver um modelo de inflação de demanda de forma mais exaustiva, vamos recuperar as equações do sistema IS-LM, isto é, que definem o equilíbrio no mercado de produtos e no mercado monetário, conforme visto na Aula 10 do curso de Economia I, ou seja:

i) Mercado de produtos (Curva IS): Y = C + I + ir + G (1)

ii) Mercado monetário (Curva LM): Ms/P = kY + hr (2)

Como já foi visto, a combinação desses dois mercados determina os valores de equilíbrio do nível de produto demandado (Y) e da taxa de juros (r), a um dado nível de preços. Se fizermos variar os preços, obtemos a curva de demanda agregada (DA) da economia, no gráfico Y-P.

De outra parte, vimos também que a oferta agregada da economia, no curto prazo, era função do nível de emprego da mão-de-obra, tendo, para tanto, derivado uma função de produção da forma:

Y = f(K, L) (3)

onde, K = estoque de capital, considerado constante; e,

L = quantidade de mão-de-obra (variável).

O nível de emprego era determinado no mercado de trabalho, através da interação da oferta de trabalho (SL) e da demanda por trabalho. Na ocasião, ficou claro que a demanda por

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trabalho, da parte das firmas, era sempre função do salário real (w = W/P), enquanto a oferta de mão-de-obra podia ser função ou do salário real (hipótese dos clássicos) ou do salário nominal (W) – que é a hipótese associada à escola keynesiana.

Para desenvolver nosso modelo de inflação de demanda, vamos adotar a hipótese keynesiana4, ou seja, a quantidade de trabalho que os trabalhadores estão dispostos a oferecer é função do nível do salário nominal (W). Em outras palavras, caso haja um aumento na demanda por trabalho, os trabalhadores só oferecerão mais horas de trabalho caso o salário nominal (W) aumente.

A diferença entre esta hipótese e a dos clássicos está em que, na hipótese clássica, variações de preços provocam, num gráfico de salário nominal, deslocamentos da curva de oferta de trabalho para a esquerda em idêntica proporção. Ou seja, havendo uma elevação de preços, exige-se uma idêntica elevação do salário nominal para que a quantidade ofertada de trabalho permaneça no mesmo nível anterior. Com essa correção salarial, o salário real retorna ao seu valor original e, com isso, não se altera a quantidade de trabalho demandado pelas firmas.

Já na hipótese que adotamos, os trabalhadores têm uma certa ilusão monetária, não exigindo, a curto prazo, aumentos de salários devido a aumentos de preços. Dessa forma, pode-se definir a função oferta agregada de trabalho como:

SL = f(W) (4)

Enquanto a função demanda agregada de trabalho é expressa por:

DL = f (W/P) (5)

Pela forma como aparecem, as equações (4) e (5) dizem coisas bem diferentes. A equação (4) quer significar que P não influi na oferta de trabalho, enquanto na equação (5) a influência de P sobre a demanda por trabalho é tão importante quanto o nível do salário nominal.

4 Para os nossos propósitos aqui, é indiferente adotarmos a hipótese clássica ou keynesiana.

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A visualização gráfica dessas duas funções exige uma certa “concessão” do estudioso. A rigor, tecnicamente, seria difícil justificar a inclusão dessas duas funções num gráfico de duas variáveis, de vez que elas estão medindo coisas diferentes. Mas, para fins de análise, a verificação do efeito combinado de uma alteração no nível de preços sobre a curva de demanda e de oferta de trabalho torna-se mais evidente quando colocadas as duas funções num mesmo gráfico.

A Figura 5 retrata as duas funções, de demanda e de oferta de mão-de-obra, de acordo com as hipóteses descritas acima, estando o mercado de trabalho em equilíbrio ao nível do salário nominal W0, havendo L0 homens empregados. Se, por qualquer razão, houver um aumento de preços para P1, as firmas verão suas receitas aumentarem e aumentarão sua demanda por mão-de-obra para qualquer nível de salário nominal – o que implica um deslocamento da curva de demanda para a direita.

W

SL W2 W1 W0 DL(P2) DL(P1)

DL(P0)

L0 L1 L2 L

Figura 5

Para atender a este aumento na demanda por trabalho, os trabalhadores, conforme nossa hipótese, exigirão um aumento de salário de W0 para W1 e o emprego cresce para L1. Note-se que, se os trabalhadores não exigissem aumentos de seus salários nominais o novo nível de emprego, ao nível do salário W0, chegaria a L2.

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Caso o nível de preços se eleve a P2, o mesmo processo se repete, e o salário nominal sobe para W2, e o nível de emprego aumenta até L2.

Observe-se que embora tenha havido um aumento do salário nominal em W1 e W2, estes dois salários representam um salário real menor que o inicial, já que houve um aumento no nível de emprego. Esse aumento do nível de emprego provocará um aumento no nível do produto ofertado da economia.

Temos, agora, todo o instrumental à mão necessário para analisarmos o processo inflacionário com origem do lado da demanda. Assim, vamos considerar que a economia se encontra em equilíbrio – no sentido de que a oferta agregada é igual à demanda agregada – aos níveis de P0, W0, L0, r0, Y0, conforme aparece na Figura 6.

Suponha, agora, que o produto corrente de equilíbrio (Y0) situa-se abaixo do nível do produto de pleno emprego e que o governo decida adotar uma política fiscal expansionista – aumentando seus gastos, digamos, em ∆G – no intuito de reduzir a taxa de desemprego da economia. Como resultado, a curva IS se desloca para a direita até, digamos, IS1. Conseqüentemente, a curva de demanda agregada se desloca para DA1 e, agora, ao nível de P0, há um excesso de demanda agregada sobre o produto ofertado igual a Y1 – Y0 – o que faz com que os preços comecem a subir. Já vimos, na Aula 10 do curso online de Economia I, os desdobramentos desse processo: o aumento de preços reduz a oferta real de moeda, deslocando a curva LM para LM1, elevando a taxa de juros e daí reduzindo o nível dos investimentos e, conseqüentemente, o novo nível da demanda agregada até Y2 (Figura 6a). No mercado de trabalho, o aumento dos preços reduz o salário real, provocando um aumento da demanda por trabalho (deslocamento da DL para a direita). Esse deslocamento da curva DL provoca uma aumento do salário nominal, e o emprego aumenta até L1 a um salário nominal (mas não o real) mais alto Figura 6b). Esse aumento do emprego elevará, por sua vez, o nível do produto ofertado, implicando um deslocamento ao longo da curva de oferta agregada, OA, no gráfico Y-P, conforme se pode ver na Figura 6c. r IS1 LM1

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IS0 LM0 r2 r1 r0

(a) Y0 Y1 Y2 Y W SL

W2 W0 DL2 (P2)

DL1 (P0) (b) L0 L2 L P OA P2 P0 DA1 DA0

(c) Y0 Y2 Y1 Y

Figura 6

Vale observar que o nível de preços continua se elevando enquanto houver excesso de demanda, ou seja, até que os preços

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atinjam P1. Ao final desse processo de ajustamento, o aumento exógeno inicial da demanda agregada terá provocado um aumento no nível de preços, o nível de emprego se elevou (como queria o governo, aliás), o salário nominal (mas não o real) estará mais alto, a taxa de juros estará, também, mais alta e o produto de equilíbrio ter-se-á elevado para Y2.

Esses, em síntese, os efeitos de um processo inflacionário originário do lado da demanda agregada. Vejamos, agora, uma inflação originária do lado da oferta, também, chamada inflação de custos.

7. Inflação de custos

Diz-se que uma economia enfrenta uma inflação de custos quando os preços se elevam independentemente de pressões da demanda por bens e serviços. Esse fenômeno decorre, geralmente, como já foi visto, dos chamados choques de oferta, traduzidos na “inflação importada”, ou em quebras de safras agrícolas, sendo também um fenômeno bastante comum numa economia onde existem grupos monopolísticos ou oligopolísticos com razoável poder barganha, como é o caso da indústria automobilística, do cimento, etc e de sindicatos trabalhistas fortemente organizados.

Nessas situações, a inflação é debitada às atividades desses grupos que são capazes de obter, conforme o caso, aumentos de salários ou de lucros, sem que se verifiquem pressões de demanda no mercado de trabalho e no mercado de produtos. No caso dos salários, os aumentos obtidos são transmitidos aos preços através de um mark-up de preços sobre os custos salariais por unidade de produto; no caso dos lucros, a inflação é provocada pelo aumento do próprio valor do mark-up5.

A hipótese mais simples do mark-up pode ser algebricamente definida por:

5 Mark-up corresponde, na prática, a um percentual de lucros calculado sobre os custos diretos de produção (basicamente mão-de-obra e matérias-primas).

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P = W/m (1 + π) (6)

onde, P é o preço por unidade de produto W é o nível do salário m é a produtividade média do trabalho (= Q/L) w é o custo salarial por unidade de produto (= W/m) π é o percentual de mark-up sobre os custos salariais.

Da equação acima, tem-se que6:

dP/P = dW/W – dm/m + dπ/1+ π) (7)

A expressão (7) diz simplesmente que a taxa de variação dos preços é igual à taxa de variação dos salários menos a taxa de variação da produtividade do trabalho mais a taxa de variação de (1 + π). Se o percentual do mark-up é fixo, então a taxa de inflação será simplesmente a diferença entre a taxa de variação salarial e a taxa de crescimento da produtividade do trabalho.

Para se descrever o processo de uma inflação de custos, imagine-se que os trabalhadores, por uma razão qualquer, exijam um reajuste salarial – o que se traduz num deslocamento da curva de oferta de trabalho para a esquerda, até, digamos, SL1 (Figura 7b). Ao nível de preços P0, o nível de emprego ser reduz de L0 para L1 – provocando, em conseqüência, uma queda no produto ofertado para Y1, traduzido no deslocamento da curva de oferta agregada para SL1, conforme ilustrado na Figura 7c.

Agora, ao nível de preços P0, verifica-se um excesso de demanda agregada sobre o produto ofertado igual a Y0 – Y1, o que causa uma elevação dos preços. Esse aumento dos preços, por sua vez, reduz a oferta real de moeda (Ms/P), deslocando a curva LM para LM1 e elevando a taxa de juros para r1 (Figura 7a). Daí, a demanda por investimento se reduz, diminuindo a demanda agregada ao longo da curva D0 (Figura 7c).

r LM1 6 Sabendo que a maioria de nossos alunos não têm boa formação matemática, temos evitado ao máximo o uso de cálculos em nossas Aulas. Mas, vez por outra, isso se torna inevitável...

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LM0 ro r2 r1 IS

(a) Y1 Y0 Y W SL1 SL0

W1

W0 DL1

DL(P0)

(b) L1 L2 L0 L P OA1 OA0 P1 P0

DA0 (c) Y1 Y2 Y0 Y

Figura 7

Do lado da oferta, a elevação dos preços provoca um aumento na demanda das firmas por mão-de-obra, deslocando a curva DL para a direita. Haverá, assim, um acréscimo no nível de

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emprego, de L1 para L2, implicando um aumento na oferta agregada de bens e serviços de Y1 para Y2.

Desse modo, a elevação de preços reduz o excesso de demanda ao longo da curva DA, ao mesmo tempo em que aumenta a oferta agregada ao longo da curva OA1. Ao nível de preços P1, o excesso de demanda foi eliminado, os produtos ofertado e demandado estão novamente em equilíbrio ao nível Y2, enquanto o nível de emprego situa-se, agora, em L2.

8. Algumas observações finais

Este aumento de preços provocado por um deslocamento para a esquerda da curva de oferta agregada da economia é comumente associado à inflação de custos. Como se pode verificar, ao contrário da inflação de demanda, a inflação de custos reduz o nível de emprego e o nível de produto de equilíbrio.

Um ponto importante a observar é que, tanto do lado da demanda como do lado dos custos, a inflação possui uma natureza auto-eliminadora, se deixada por conta das forças de mercado. Em ambos os processos, a elevação de preços ocorreu, a rigor, devido ao excesso de demanda sobre a oferta. Ora, a análise aqui descrita mostrou que a própria elevação de preços desencadeia uma série de mudanças nas variáveis que afetam tanto os componentes da demanda agregada (r, Ms/P), como a oferta agregada (W, P, etc.) de tal modo que um novo equilíbrio é alcançado com a eliminação do excesso de demanda.

Se isso é fato, resta a pergunta: por que, em geral, uma vez desencadeado o processo inflacionário, a inflação tende a se perpetuar, às vezes até se agravando?

A resposta residiria no que se tem denominado política de validação, adotada quase sempre pelos governos. Essa política se materializa em adoção pelo governo de políticas fiscal e monetária expansionista, na tentativa de elevar o nível de emprego da economia. Tais políticas, como já sabemos, deslocam as curvas IS e LM para a direita, provocando aumentos contínuos dos preços. Esses aumentos de preços deslocam a curva de oferta de trabalho para a esquerda, causando desemprego, o que exigirá novas

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medidas fiscais e monetárias expansionistas por parte do governo, entrando-se no círculo vicioso de preços e salários em permanente elevação.

Ao adotar tal política, o governo estará sancionando a elevação dos preços e criando obstáculos cada vez maiores ao controle da inflação.

* * * Com essas considerações, encerramos esta nossa Aula 1, sobre inflação. Os pontos mais importantes analisados aqui foram: as principais causas de inflação de demanda, os choques de oferta e a inflação de custos, um modelo simples de inflação de demanda e dois modelos mais analíticos de inflação de demanda e de custos.

Na próxima Aula, a de n° 2, o tema será, de certa forma, uma continuação deste, quando abordaremos o tópico “Inflação e desemprego: a Curva de Phillips” – que mostra um modelo de inflação híbrida que incorpora elementos causais tanto do lado da demanda como do lado dos custos.

A seguir, no Anexo 1, e como complemento, apresentamos uma abordagem da inflação de demanda vista analisada através da Teoria Quantitativa da Moeda. _________________________

A N E X O 1:

A Teoria Quantitativa da Moeda e a Inflação de Demanda O teste clássico para se verificar a existência de excesso de demanda agregada seria

dado pela Teoria Quantitativa da Moeda – que mostra o elo de ligação entre variações na quantidade de moeda existente num dado momento na economia e o nível de preços. Se, ao nível de renda de pleno emprego, os preços variam proporcionalmente às variações na quantidade de moeda, obtém-se um razoável indicador da presença de inflação de demanda.

Essa relação entre quantidade de moeda ou de meios de pagamento e o nível de preços é derivada da conhecida “equação das trocas” clássica, que pode ser assim expressa:

MV = PY (1) onde, M = quantidade de moeda ou de meios de pagamento existente na economia; V = velocidade-renda de circulação da moeda; P = nível médio dos preços; e Y = renda real ou produto físico.

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Como está expressa, a equação (1) nos diz meramente que o valor das compras é igual ao valor das vendas. Nesses termos, dir-se-ia que a equação das trocas é uma tautologia, isto é, está afirmando o óbvio. Para transformar essa equação numa teoria de determinação dos preços em geral, os clássicos foram adiante e supuseram que V e Y são constantes no curto prazo, sob o argumento de que a velocidade da moeda reflete os hábitos de compra da população e a tecnologia de compensação bancária – fatores estes que não não mudam no curto prazo, digamos, em seis meses – enquanto Y reflete a capacidade instalada da economia – o que também não muda no curto prazo – estando a economia, na suposição, no pleno emprego.

Assim, com essas duas restrições a respeito dos valores de V e de Y, a teoria quantitativa clássica torna-se a melhor representação de um modelo puro de inflação de demanda, predizendo que o nível de preços subirá proporcionalmente a um aumento da oferta monetária. A expansão monetária torna-se, então, o fator causal do processo inflacionário.

Observe-se que a hipótese de V constante implica supor que a demanda por moeda é uma função constante ou pelo menos estável do nível de renda, isto é,

Md = kPY (2)

onde,

k = 1/V

No entanto, uma corrente de economistas, geralmente associados à teoria keynesiana, costuma fazer restrições à essa associação direta entre expansão monetária e aumentos automáticos dos preços, argumentando que a hipótese de uma demanda por moeda estável tinha uma certa lógica numa época em que a única função da moeda era a de servir como meio de pagamento. No entanto, com o desenvolvimento do mercado de títulos e o posterior reconhecimento de que parte da demanda por moeda é explicada por motivos especulativos (à feição keynesiana), dificilmente se poderia sustentar a tese de uma função demanda por moeda estável e conseqüentemente de V estável. Isso porque, sendo a demanda por moeda para especulação uma função da taxa de juros, a demanda agregada por moeda oscilaria toda vez que a taxa de juros se alterasse. Assim, para se manter a igualdade expressa na equação (1), a velocidade , V, da moeda teria que se alterar.

Esse ponto pode ser facilmente verificando que o equilíbrio do setor monetário ocorre quando

Ms = Md = M (3)

onde,

Ms é a oferta monetária e, Md é a demanda total por moeda.

Substituindo Md (dado pela equação (3)) na equação (1), temos:

MdV = PY

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ou,

V =PY/Md (4)

Assim, sendo Md variável em função das alterações na taxa de juros, V torna-se altamente adaptável. Nesse sentido, concluem aqueles críticos, a relação direta entre aumentos na oferta monetária e conseqüentes aumentos no nível geral de preços deixa de ser tão automática como previsto pela teoria clássica.

De toda forma, essa é apenas uma questão preliminar neste modelo introdutório de inflação de demanda. Na realidade, um processo inflacionário, seja qual for sua origem, exige um tratamento mais abrangente e mais analítico, enfocando não só suas causas mas, também, seus principais efeitos nos vários setores da economia. Os modelos analíticos de inflação de demanda e de custos apresentados anteriormente mostraram justamente isso.

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