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MANIFESTAÇÕES DE RURALIDADES EM PEQUENOS MUNICÍPIOS: UMA ABORDAGEM A EVENTOS JUNINOS E SERTANEJOS NO MUNICÍPIO DE DIVISA NOVA – MG MANIFESTATIONS OF RURALITIES IN SMALL TOWNS: AN APPROACH TO JUNINO AND SERTANEJO EVENTS AT DIVISA NOVA TOWN. Flávia Vieira Lourenço [email protected] Universidade Federal de Alfenas-MG Glaucione Raimundo [email protected] Universidade Federal de Alfenas-MG RESUMO As festas juninas e rodeios são manifestações culturais importantes no meio rural e refletem a ruralidade no espaço urbana, sobretudo nas pequenas cidades, como Divisa Nova – MG, sobre o qual pretende- se analisar permanências e mudanças dessas festividades, ao longo do tempo. Para tanto, foram utilizados referenciais teóricos que abordam as ruralidades manifestas em pequenos municípios, coleta de dados junto à Prefeitura Municipal e Secretaria da Cultura de Divisa Nova- MG, entrevistas com moradores, professores, diretores de escolas públicas e estudantes e o pároco local. Símbolos festivos tanto em eventos juninos, quanto eventos de festas de peões vem se perdendo, cedendo assim, novos espaços a novas ruralidades, por adaptações de novos costumes sociais. Órgãos de poder público e educativo desempenham importante papel de resgate e preservação a esses eventos culturais, pois remete a identidade histórica cultural de Divisa Nova-MG. Palavras Chaves: Ruralidade; pequenos municípios; festas. ABSTRACT Feast of Saint John and rodeos are important cultural events in rural areas and reflects the rurality in the urban space, especially in small towns such as Divisa Nova - MG, on which we intend to analyze continuities and changes of these festivities over time.

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MANIFESTAÇÕES DE RURALIDADES EM PEQUENOS MUNICÍPIOS: UMA ABORDAGEM A EVENTOS JUNINOS E SERTANEJOS NO MUNICÍPIO DE DIVISA

NOVA – MG

MANIFESTATIONS OF RURALITIES IN SMALL TOWNS: AN APPROACH TO JUNINO AND SERTANEJO EVENTS AT DIVISA NOVA TOWN.

Flávia Vieira Lourenç[email protected]

Universidade Federal de Alfenas-MGGlaucione Raimundo

[email protected] Federal de Alfenas-MG

RESUMO

As festas juninas e rodeios são manifestações culturais importantes no meio rural e refletem a ruralidade no espaço urbana, sobretudo nas pequenas cidades, como Divisa Nova – MG, sobre o qual pretende-se analisar permanências e mudanças dessas festividades, ao longo do tempo. Para tanto, foram utilizados referenciais teóricos que abordam as ruralidades manifestas em pequenos municípios, coleta de dados junto à Prefeitura Municipal e Secretaria da Cultura de Divisa Nova- MG, entrevistas com moradores, professores, diretores de escolas públicas e estudantes e o pároco local. Símbolos festivos tanto em eventos juninos, quanto eventos de festas de peões vem se perdendo, cedendo assim, novos espaços a novas ruralidades, por adaptações de novos costumes sociais. Órgãos de poder público e educativo desempenham importante papel de resgate e preservação a esses eventos culturais, pois remete a identidade histórica cultural de Divisa Nova-MG. Palavras Chaves: Ruralidade; pequenos municípios; festas.

ABSTRACT

Feast of Saint John and rodeos are important cultural events in rural areas and reflects the rurality in the urban space, especially in small towns such as Divisa Nova - MG, on which we intend to analyze continuities and changes of these festivities over time. Therefore, were used theoretical frameworks that address ruralities manifested in small towns, gathered data at the Prefeitura Municipal e Secretaria da Cultura de Divisa Nova- MG, interviews with dwellers, teachers, public school principals and students and the local priest. Festive symbols both junino events and rodeo parties events has been lost, giving thus new places to new ruralities, by adaptations of new social customs. Public and educational authorities plays an important role in rescue and preserve these cultural events, since it refers to cultural and historical identity of Divisa Nova – MG.Keys-Word: Rurality; small towns; parties.

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INTRODUÇÃO

As festas juninas e rodeios são manifestações culturais importantes no meio rural e

refletem a ruralidade presente naquele meio e naquelas tradições, trazendo à tona elementos

que compõem aquela cultura, evidenciando agricultura e pecuária. A intenção de ambas as

festas é homenagear os atores e personagens principais dessas comemorações: os peões

ligados ao trabalho com o gado e os santos padroeiros ligados ao sucesso das colheitas.

Particularidades de um rural também podem ser percebidas em pequenas cidades e

vilarejos. Nesses locais é bastante evidente a predominância de grande bagagem cultural,

representadas por religiosidades, tradições, festividades e relações socioculturais.

Ao longo dos anos, com a modernização e a vinda de novas tecnologias para a

agropecuária, muitos elementos da cultura caipira estão deixando de fazer parte dessas

importantes manifestações culturais. As fogueiras, músicas caipiras, rodeios e festas em frente

às igrejas já não são tão presentes atualmente e sobre estas questões buscaremos refletir e

esboçar alguns apontamentos acerca da permanência desses elementos nas manifestações

culturais do município de Divisa Nova – MG. Pertencente a microrregião de Alfenas, o

município possui população total de 6.011 habitantes, segundo o Censo Demográfico (IBGE,

2014. (figura 1).

Figura 1: Localização do município de Divisa Nova na Microrregião de Alfenas - MGFonte: IBGE – Base cartográfica digital. Elaborado por André Luís Bellini (2016).

De clima temperado e relevo levemente acidentado, o município possui características

socioeconômicas que se voltam para a agricultura, sobretudo para a produção do café, que

influencia grandemente sua economia, embora também produza outras culturas como milho,

feijão e arroz e pecuária leiteira e de corte (PREFEITURA MUNICIPAL DE DIVISA

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NOVA, 2016). Sem contar que a cana-de-açúcar vem expandindo sua área de produção no

município.

Esse trabalho pretende analisar as manifestações das ruralidades a partir de eventos

ligados a festivais sertanejos e festas juninas no município de Divisa Nova/MG, a fim de

evidenciar as transformações que ocorreram ao longo das gerações envolvidas, para abordar

que mudou e o que ainda permanece nessas manifestações atrativas do município.

Para compreensões e interpretações dessas novas ruralidades que se manifestam em

espaços com vínculos rurais, utilizamos como metodologia revisão bibliográfica, a partir de referenciais teóricos que abordam as ruralidades manifestas em pequenos municípios, coleta de dados

junto à Prefeitura Municipal e Secretaria da Cultura de Divisa Nova- MG e entrevistas com

moradores, professores, diretores de escolas públicas e estudantes e o pároco local.

Este trabalho se reveste de relevância na medida em que ainda são pouco conhecidas e

relatadas as conexões da ruralidade e a perda de alguns costumes em festas juninas e rodeio,

eventos que evidenciam rotinas e organizações sociais, a economia local e os principais atores

econômicos, como o agricultor e o peão. Além disso, esse estudo proporciona compreensão

de novas ruralidades criadas em ruralidades que já existem, trazendo novos hábitos e

evidenciando um novo rural, tornando possível a visualização do que permanece, do que

mudou e se estas práticas estão desaparecendo.

A que se destacar trata-se de um trabalho que se desenvolveu a partir de referenciais

teóricos sobre a temática, discutidos durante as aulas da disciplina “Mundo rural e novas

territorialidades”, ofertada pelo curso de Geografia da UNIFAL-MG, no primeiro semestre de

2016.

MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NA RURALIDADE MANIFESTADA NAS

FESTIVIDADES

Não há uma definição exata do que seria rural e urbano. São conceitos continuamente

resignificados conforme suas funções e relações. Autores do século XX consideravam o rural

como um espaço isolado do meio urbano, sem muitos recursos, “atrasado” e sem estrutura

nenhuma. Era criado como um lugar sempre distante do meio urbano, o que não é verdade.

Eram negligenciados os aspectos econômicos e consideravam que a economia rural e urbana

não se relacionava.

Segundo Wanderley (2003), rural é um modo de vida, por meio do qual os indivíduos

enxergam a si mesmos e o mundo a sua volta. Sendo assim, é importante ressaltar que é um

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erro colocar campo e rural como sendo a mesma coisa. O mesmo se aplica a urbano e cidade.

Há também quem discorde. Para alguns autores como Carneiro (2003) a cultura pode ser uma

abordagem para o “rural”, mas não há como definir uma cultura rural. Para eles, as

características do rural são múltiplas e se torna impossível especificá-las e reduzi-las a

generalizações.

Todavia, a inserção no mercado de consumo tem construído hábitos comuns. A

possibilidade de adquirir determinados produtos e serviços aproxima realidades que outrora

eram bem contrastantes. Mercadorias são adquiridas por moradores do campo e da cidade,

seja para suprir necessidades, divertir ou simplesmente enfeitar. [...] BAGLI, (2006, p. 94)

Biazzo (2007) destaca que pela perspectiva de alguns autores, a ideia de localidade

não leva o rural ou o urbano a serem encarados como tipos de espaço. Eles são qualidades das

relações sociais e, por isso, trata-se de rural e urbano no local e, não um local como rural ou

urbano.

Há também o dilema da separação homem-natureza, em que os habitantes da cidade

resgatam a visão do modo de vida “alternativo”, buscando uma vida sustentável e área de

segunda residência no campo.

O que pode também mostrar a diferença de rural e urbano é o tempo. Para Bagli

(2006) o tempo e a forma como os tempos são apropriados pelas pessoas que vivem nos

espaços mostram como as transformações desses espaços acontecem mais rápido ou

lentamente e como são percebidas pelos habitantes. No rural o tempo seria mais lento e as

transformações aconteceriam mais lentamente pelo maior contato com a natureza. No urbano

o tempo seria mais rápido devido os constantes processos de transformações, construções,

demolições, fluxo de pessoas, mercadorias, automóveis e outras coisas. Enquanto no urbano o

tempo é movimento e o que constrói hábitos e costumes, no rural o tempo é mais ligado ao

território, com base na relação com a natureza.

As relações cotidianas no rural e urbano são construídas basicamente na

funcionalidade da terra, cidades edificadas e terra que produz alimentos. Lembrando que a

distinção não forma dois polos, mas se complementa. Essa complementaridade, segundo

Whitacker (2005), se materializa nas trocas simbólicas e nas trocas econômicas, que implicam

em fluxos de informação e de mercadorias do campo que se torna dinheiro.

A organização de espacialidades, remetem-se aos modos de vida manifestos em

lugares de vivência. O espaço geográfico se desenvolve a partir de anseios, necessidades e

vontades demandadas em determinados grupos sociais. Dessa forma, o espaço e suas

diferentes espacialidades, somente poderão ser compreendidas e interpretadas, a partir da

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atuação de seus habitantes, atreladas em seus modos de vida e históricos culturais. Lindner e

Wandscheer (2010).

Em seus estudos, Lindner (2011, p.1), evidencia que “os espaços na geografia

abordam as mais variadas temáticas, envolvendo uma gama muito grande de estudos e

reflexões de pesquisadores de diversas áreas da ciência geográfica. Ao longo da história do

pensamento geográfico, diversas foram suas representações”. Todavia, o espaço é evidenciado

sob análises multifacetadas, ora por aspectos ligados a natureza, visto como cenário de

desenvolvimento e ações humanas, ora visto como ambiente estável, como absoluto e fixo.

Os espaços vistos sobre contextos atrelados a ruralidades demonstram aspectos

materiais e imateriais em espaços rurais, relacionados a sua configuração, firmadas na

simplicidade, tranquilidade e intrínseca relação para com a natureza. Biazzo (2008) evidencia

que o espaço rural é esclarecido por muitos estudiosos como um ambiente já defasado,

inexistente ou caminhando para a inexistência.

Tais afirmativas se fundamentam ao fato da modernização do campo, de um rural não

apenas voltados para atividades agrícolas, mas em para atividades firmadas em

multifuncionalidades e pluriativas, transformados por vestígios julgados urbanísticos por

muitos estudiosos da área. Desta forma, o rural é visto como sinônimo de atraso,

predominantemente agrícola, com êxodo rural evidente. Disseminações a respeito de tais

fábulas equivocadas necessitam serem evidenciadas, por serem mitos já vencidos,

demonstrado por Graziano da Silva (2001) sob uma ótica de análise ao Projeto Rurbano, que

visa abordar categorias que enfatizem a presença de um novo rural nos campos brasileiros.

Assim, apesar das grandes influências tecnológicas e de informações, o campo ainda

demonstra estar a carregar de forma clara vestígios espaciais de ruralidades tradicionais

herdadas por vivências culturais ao longo da história.

RUA (2005, p.47) estimula a compreensão de um espaço rural pleno de possibilidades,

com desenvolvimento de experiências inovadoras a partir de multifuncionalidades. A

modernização do rural não promoveu o seu desaparecimento, nem o transformou em urbano.

“Rural e urbano fundem-se sem se tornarem a mesma coisa, já que preservam suas

especificidades”. (RUA, 2006, p.86)

No caso do município de Divisa Nova, objeto dessa pesquisa a questão a ruralidade

manifesta-se de diversas maneiras, sendo as festividades rurais, apenas uma delas.

O município surgiu a partir de influências rurais e religiosas, pela venda de 40

alqueires de uma fazenda pertencente a Manoel Joaquim de Figueiredo a vizinhos de suas

terras. Os alqueires vendidos se localizam em uma área denominada “Divisa” da fazenda

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Santo Antônio Pinhal, em 13 de julho de 1859. Os compradores dessas terras doaram parte

dela para a construção da Capela Nossa Senhora da Conceição em homenagem a fé e devoção

pela santa padroeira do local, como também para a formação do povoado. O vilarejo, a partir

de mandatos e leis provinciais e estaduais, foram elevados a categorias como distritos

pertencentes a Alfenas e depois a Cabo Verde. Em 7 setembro de 1923, a partir do decreto

Decreto-Lei 148, o distrito foi elevado à categoria de município, com nomeação de Divisa

Nova (PREFEITURA MUNICIPAL DE DIVISA NOVA, 2016)

As propriedades rurais de agricultores familiares são caracterizadas como pequenas

unidades produtivas, em desenvolvimento de práticas agrícolas que se voltam para o

autoconsumo e pequena comercialização.

A densidade populacional de uma cidade, bem como como suas práticas firmadas em

aspectos agrícolas não são os únicos determinantes de identificação de ruralidades, os hábitos

dos moradores, bem como relações diretas e pessoais destas comunidades, tanto em práticas

ligadas as culinárias e festividades também evidenciam um mundo rural a partir de

eventualidades que envolve pessoas moradoras do município bem como vizinhos próximos a

ele.

Em Divisa Nova, são muito comuns festas juninas comemoradas em junho e julho e

festas sertanejas, que envolvem cavalgadas e atrações de shows sertanejos, no mês de agosto

no município.

As festas juninas no município ocorrem, em sua maioria, em instituições educativas e

grupos da terceira idade entre os meses de junho e julho (figuras 2, 3, 4 e 5). Devido à

existência de alunos de outras denominações religiosas, que não a católica, que não

comemoram essas festividades, a festa é realizada em julho, na última semana do semestre,

sem nenhuma prevenção religiosa. Na semana festiva as escolas são decoradas com

bandeirinhas, balões e painéis com cenários típicos Comidas típicas como pipoca, bolo de

fubá, bolo de milho, canjicada e arroz doce são oferecidas aos alunos como forma de almoço

ou sobremesa. A atração mais esperada é a dança da quadrilha, assim como a disputa do pau

de sebo e pela teatral do casamento caipira feita por alunos.

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Figura 2 e 3: Decoração juninas da Escola Municipal Professor José Silvestre Bastos – Divisa Nova – MG.Fonte: Glaucione Raimundo - Trabalho de campo (junho/2016).

Figura 4 e 5: Carro de boi decorado para a festa junina da terceira idade e dança junina da terceira idadeFonte: Secretaria da Cultura de Divisa Nova/2015.

No passado, as festas ocorriam em frente à igreja católica, nos dias de comemorações

religiosas ligadas aos sabota e datas do mês de junho. Havia bingos, sorteios de premiações,

comidas típicas, músicas de raiz ou voltadas para o forró, gravadas ou cantadas ao vivo. A

festa era sempre desenvolvida para a arrecadação de fundos para a manutenção da igreja.

A comemoração servia de pretexto para socializações e encontros com amigos,

envolvendo pessoas moradoras do município e pertencentes a bairros rurais, envolvendo

assim, toda a comunidade e instituições educativas. A partir de uma ordem vigente da diocese

de Guaxupé - MG, a festividade junina foi restrita de uso de bebidas alcoólicas e foi

restringida a comemorações em um pequeno salão pertencente a igreja.

Atualmente, comemorações juninas com enfoque religioso são organizadas por grupos

jovens pertencentes à igreja, não envolvendo mais as escolas e demais instituições educativas.

Essas comemorações são sempre realizadas após a missa, com ofertas de dança junina, “a

quadrilha” e de comidas típicas da festa (canjicada, arroz doce, pipoca, bolo de fubá e de

milho e chás de hortelã e alfavaca) a fim de recolher fundos para a igreja. Assim como as

festas juninas, rodeios de porte médio costumavam ocorrer em áreas pertencentes ao

município.

As atrações diversificavam-se entre shows ao vivo e declamações de versos sertanejos,

desfiles de cavalos nas arenas de rodeio e montarias de bois (figuras 6 e 7). Pela falta de um

espaço físico para o prosseguimento das festividades, bem como pelas restrições pelas

fiscalizações do corpo de bombeiros, o evento recebeu ordens de suspensão. Para suprir a

falta desse evento comemorativo, a prefeitura vem desenvolvendo o evento Divisaneja,

ofertado no início do mês de agosto com a presença três noites de shows noturnos e um dia de

desfiles de cavaleiros, exposições de bois, carros de bois e charretes. A festa é receptiva,

recebendo visitações de municípios vizinhos a Divisa Nova.

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Figura 6 e 7: Desfile de cavaleiros e amazonas e show sertanejo evento Divisaneja, em 2015.Fonte: Prefeitura Municipal de Divisa Nova

É notória a transformação de ruralidades manifestas no campo e em pequenos

municípios ao longo dos anos, quer sejam por vigentes restrições legislativas e religiosas, quer

sejam pela adição de novas práticas de ruralidades em relação a ações e intervenções sociais

para com o seu meio de vivência.

As mudanças no modelo produtivo e organizacional no campo compõem transformações mais amplas na sociedade brasileira (por sua vez integradas a alterações sentidas em escala global) que marcam as últimas duas décadas. Define-se uma lógica capitalista em que novas representações do espaço emergem e vão ser difundidas como um "novo rural" [...] (RUA,2005, p.48)

Segundo o prefeito, as festas juninas e os rodeios tem o objetivo de recreação, com

cunho religioso e apresentam os elementos da região. O rodeio diminuiu devido à falta de um

espaço físico adequado e dentro das normas de segurança, mas para não ficar sem evento foi

criada a Divisaneja, que fica como algo a parte dos rodeios, que pode voltar após o término

das obras do espaço físico. Há shows sertanejos e caipiras custeados somente pela prefeitura,

já que o comércio local é pequeno. Terminadas as obras, serão cobradas entradas no novo

espaço onde acontecerão estes eventos. A divulgação é feita no site da prefeitura e nas redes

sociais e tem havido uma boa repercussão, inclusive nos municípios vizinhos.

Sobre um viés religioso, foi-nos evidenciado pelo padre responsável da igreja matriz

do município, o sentimento de grandes mudanças em relação as comemorações juninas em

Divisa Nova. Segundo o sacristão, em um tempo não muito remoto, comunidades rurais se

reuniam a noite para levantarem as bandeiras comemorativas aos santos louvados em eventos

juninos.

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As bandeiras, os cânticos e os terços são considerados como símbolos sagrados da

festividade. Nos respectivos dias, ao entorno da fogueira, eram servidos chás e bolos

acompanhados de cânticos religiosos e não religiosos, bem como os terços. Nos dias de hoje,

a prática enfatizada é bem rara. Atualmente as comunidades rurais possuem receio de sair de

casa à noite e deixarem seus bens sem vigilância pelos grandes históricos de roubos que vem

ocorrendo no município.

As festas juninas em frente à igreja católica foram cortadas, a partir de uma orientação

da diocese em não relacionar eventos festivos sagrados com bebidas alcóolicas. “Festas

juninas na porta da igreja com bebidas alcóolicas era um contratestemunho”, alega o padre.

Nos dias de hoje, as festas juninas costumam ocorrer em um salão pertencente a igreja. O

bingo foi mantido nas comemorações, pelo o fato de não ser encarado como jogatina, mas sim

um divertimento histórico cultural do local. Dessa forma, o sacerdote afirma a existência de

festas juninas no município, defendendo que a comemoração em enfoque, e necessita ser mais

impulsionada, pela sua grande riqueza cultural. Para ele, os públicos mais interessados em

eventos juninos são sempre as pessoas da terceira idade.

Os jovens pertencentes as igrejas atualmente veem se organizando a partir de convites

e comunicações em redes sociais para promoção de eventos entre eles. O padre afirma o

enfraquecimento comemorativo religioso, mas não acredita em seu fim, pois ainda há pessoas

que valorizam a prática pela fé.

Pôde ser percebido que o público presente nas festas juninas nas escolas são maioria

crianças e adolescentes, além dos pais e responsáveis. A parte religiosa é deixada de lado,

visto que a escola deve ser laica. Sendo assim, a escola cumpre o papel na manutenção dessa

cultura, não de modo tradicional e nas datas tradicionais, mas preservando as danças, a

decoração e alguns símbolos. São servidas comidas típicas como beijo quente (amendoim

com açúcar), broa de fubá, bolo, canjicada e pau a pique. Existe a dança da quadrilha e de

outras músicas country. Não há música ao vivo, geralmente são todas gravadas e também são

tocadas músicas de diversos estilos a gosto dos alunos. Os principais objetivos das

comemorações juninas nas escolas são a interação e o divertimento.

Das crianças entrevistadas (entre 10 – 12 anos), festas juninas são mais presentes em

sua vida do que festas sertanejas. Festas sertanejas, são pouco frequentadas por elas. Para

eles, as festas juninas são divertidas, a decoração combina com as cores das roupas. “Festas

juninas representam a vida das pessoas de antigamente” afirmou E, N. de 11 anos.

Os jovens entrevistados aparentaram ter maior interesse para com atrações

sertanejas do que festas juninas encarando principalmente os shows como ambientes de

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socializações para com os grupos de amigos. “Eu chamo os amigos e dá para socializar nos

shows” (A.L.S.R, 17 anos). A secretária da cultura de Divisa Nova nos afirmou em

entrevista que práticas juninas se renderam ao modismo. Em tempos passados, segundo a

secretária, festas juninas ocorriam em comemoração à colheitas e depois acabou tendo cunho

religioso. Atualmente o público alvo são os idosos e as crianças da educação infantil, que

geralmente contratam um sanfoneiro, com presença de ritmos ligados ao forró, e além de

práticas na área “urbana”, as comemorações ocorrem ainda em dois bairros rurais

pertencentes ao município.

A secretária acredita que, práticas juninas deixarão de existir se não forem

impulsionadas nas escolas, pois os jovens não se interessam de fato para com a festividade.

Foi-nos informado ainda que os rodeios começaram com os círculos de tourada nas décadas

de 70 e 80 no município, promovendo o surgimento de rodeios com diversas atrações de

shows, declamações de versos e montaria em cavalos e bois.

Os rodeios foram suspensos pela falta de um espaço físico seguro para a sua

organização. Para suprir a falta do rodeio, a prefeitura criou o evento Divisaneja,

comemoração sertaneja que já teve 3 ° edições. A secretária afirmou sentir um grande

enfraquecimento no evento, principalmente na presença de símbolos rurais, como touros,

carros de boi e charretes nos últimos anos. Ela acredita que a diminuição desses símbolos é

mediante as longas distâncias entre as cidades, dificultadas pelo constante tráfego das

rodovias.

CONCLUSÕES

Apesar da grande presença da ruralidade no município, os eventos mesclam-se

bastante com a modernização, perdendo parcelas de identidades passadas para dar lugar a

outras. Símbolos festivos tanto em eventos juninos, quanto eventos de festas de peões vem se

perdendo, cedendo assim, novos espaços a novas ruralidades, a novas adaptações em

costumes sociais, como a inserção de novas músicas em eventos juninos e a perca de símbolos

rurais em eventos sertanejos, como a não mais presença de carros de bois e charretes.

Crianças e idosos demonstram maior interesse a eventos festivos juninos do que jovens.

Eventos de peões possuem públicos diferenciados ao longo de seus períodos.

Os eventos juninos de cunho religioso ocorrem em sua grande maioria para

arrecadação de fundos para a igreja. As crianças entrevistadas alegaram maior presença na

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cavalgada do que em shows noturnos com a família, diferentemente dos jovens entrevistados

que valorizam os shows para socializações com amigos.

Órgãos de poder público e educativo desempenham um importante papel de resgatar e

preservar essa cultura, que mesmo tendo passado por mudanças necessita ser resgatada e

impulsionada pois remete a identidade histórica cultural de Divisa Nova-MG.

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