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Dissertação de Mestrado
INFORMÁTICA E EDUCAÇÃO INCLUSIVA:
DISCUTINDO LIMITES E POSSIBILIDADES
Eliana da Costa Pereira
PPGE
Santa Maria, RS, Brasil
2005
ii
INFORMÁTICA E EDUCAÇÃO INCLUSIVA:
DISCUTINDO LIMITES E POSSIBILIDADES
por
Eliana da Costa Pereira
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Educação.
PPGE
Santa Maria, RS, Brasil
2005
iii
Universidade Federal de Santa Maria Centro de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação
A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação de Mestrado
INFORMÁTICA E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DISCUTINDO LIMITES E POSSIBILIDADES
elaborada por
Eliana da Costa Pereira
como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação
COMISSÃO EXAMINADORA:
_______________________________ Soraia Napoleão Freitas (Presidente/Orientador)
_______________________________ Maria Alcione Munhóz
_______________________________ Elisa Tomoe Moriya Schlünzen
Santa Maria, 30 de março de 2005.
iv
“Como indivíduos e como cidadãos, temos perfeito direito a ver tudo na cor característica da maior parte das formigas e de grande número de telefones antigos, ou seja, muito preto.
Enquanto educadores, porém, não nos resta outro remédio senão ser otimistas, infelizmente. Educar é crer na
perfectibilidade humana, na capacidade inata de aprender e no desejo de saber que há coisas (símbolos, técnicas,
valores, memórias, fatos...) que podem ser sabidas e que merecem sê-lo – e que nós, homens, podemos melhorar uns
aos outros por meio do conhecimento. De todas essas crenças otimistas podemos muito bem descrer privadamente,
mas se queremos educar ou entender em que consiste a educação não há outro remédio senão aceitá-las. Com
verdadeiro pessimismo pode-se escrever contra a educação, mas o otimismo é imprescindível para estudá-la... e para
exercê-la. Os pessimistas podem ser bons domadores, mas não bons professores.” 1
(Fernando Savater)
1 SAVATER, F. O Valor de Educar. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 2ª ed.
v
AGRADECIMENTOS
Inúmeras são as pessoas que me impulsionaram em direção a
essa caminhada, fazendo-me acreditar que essa conquista era possível.
À vocês, muito obrigada!
Ao meu marido, à minha família, às minhas amigas e à
minha orientadora um agradecimento especial. Para vocês eu
dedico esse trabalho, desejando que compartilhem comigo mais essa
alegria!
Obrigada...
pelos incentivos e sacrifícios inúmeros,
pelo carinho e pela eterna paciência.
Obrigada...
por me acompanharem durante estes anos,
compreendendo minhas angústias e inseguranças,
e me ensinando a ser uma pessoa melhor.
Obrigada...
pela amizade que conquistamos e que permite que mesmo de longe
torçamos juntas pelos nossos sonhos,
Saudades!
vi
Obrigada...
pela oportunidade e pela confiança depositada em mim,
que permitiram que vocês compartilhassem comigo seus
conhecimentos, e alegrassem-se com as vitórias que juntas
conquistamos.
Obrigada...
por me orientarem nas decisões mais difíceis,
proporcionando-me dessa forma um crescimento pessoal e
profissional que levarei comigo para sempre.
Obrigada...
pelos elogios, pelas críticas, pelos incentivos,
que me encorajaram a seguir em frente.
Obrigada...
pelos exemplos,
pela experiência,
pelos ensinamentos.
Obrigada...
por acreditarem em mim e me fazerem crer nas minhas
potencialidades.
vii
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS ...................................................................... v
LISTA DE ANEXOS ....................................................................... ix
LISTA DE ABREVIATURAS ......................................................... x
RESUMO ......................................................................................... xii
ABSTRACT .................................................................................... xiii
Capítulo I
DIGITANDO AS PRIMEIRAS PALAVRAS
1.1 Considerações Iniciais .............................................................. 02
Justificativa, Problematização e Objetivos
Capítulo II NAVEGANDO SOBRE O CAMPO DO SABER
2.1 Informática e Educação Inclusiva .......................................... 16
Sobre o que estamos falando?
2.1.1 Educação Inclusiva: uma trajetória em busca de respeito e oportunidades no exercício da cidadania .......................... 17
viii
2.1.2 Informática Educativa: na era da informação o computador “invade” a escola .............................................. 40
Capítulo III
FORMATANDO O PERCURSO METODOLÓGICO
3.1 Construindo conhecimento em Ciências Sociais ................... 76
Identificando a Pesquisa
3.1.1 Sujeitos envolvidos na Investigação .......................... 83 3.1.2 Instrumentos de Coleta de Dados .............................. 85 3.1.3 Plano de Análise dos Dados ....................................... 89
Capítulo IV
ANALISANDO OS DADOS COLETADOS ................................ 91
Capítulo V
DISCUTINDO LIMITES E POSSIBILIDADES
5.1 Considerações Finais ........................................................ 126
REFERÊNCIAS ............................................................................ 134
ANEXOS ........................................................................................ 140
ix
LISTA DE ANEXOS Anexo 1 ........................................................................................... 141
Carta de apresentação do projeto para a 8ª Coordenadoria de Educação solicitando autorização para o desenvolvimento da pesquisa nas escolas Anexo 2 ........................................................................................... 143
Carta da 8ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação) encaminhada às escolas autorizando a realização da pesquisa Anexo 3 ........................................................................................... 144
Carta de apresentação às Escolas onde a pesquisa foi realizada Anexo 4 ........................................................................................... 146
Carta de apresentação da pesquisa aos professores pedindo a colaboração para a realização das entrevistas Anexo 5 ........................................................................................... 147
Roteiro da entrevista aplicada ao professor do Núcleo de Tecnologia Educacional de Santa Maria – RS Anexo 6 ........................................................................................... 149
Roteiro da entrevista aplicada aos professores da rede regular de ensino de Santa Maria/RS
x
LISTA DE ABREVIATURAS
CAIE/SEPS – Comitê Assessor de Inf. para Ed. de 1º e 2º Graus
CE/IE – Comissão Especial de Informática na Educação
CENIFOR – Centro de Informática Educativa
CIED – Centro de Informática e Educação
CNPq – Conselho Nac. de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CONSED – Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação
DCM – Diretoria de Comunicações da Marinha
FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
NEEs – Necessidades Educacionais Especiais
NEs – Necessidades Especiais
NIED – Núcleo de Informática Aplicada à Educação
NIEE – Núcleo de Informática na Educação Especial
NTE – Núcleo de Tecnologia Educacional
NTE – RC – Núcleo de Tecnologia Educacional da Região Central
PNE – Plano Nacional de Educação
PROCERGS – Cia. de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul
PROINFO – Programa Nacional de Informática na Educação
PRONINFE – Programa Nacional de Informática Educativa
xi
PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
SCT – Secretaria de Cultura e trabalho
SE – Secretaria de Educação
SEED – Secretaria de educação à Distância
SEESP – Secretaria de Educação Especial
SEI – Secretaria Especial de Informática
TIC – Tecnologias de Informação e Comunicação
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
UFPe – Universidade Federal de Pernambuco
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFSM – Universidade Federal de Santa Maria
UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
xii
RESUMO Dissertação de Mestrado
Programa de Pós-graduação em Educação Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brasil
INFORMÁTICA E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DISCUTINDO LIMITES E POSSIBILIDADES
AUTORA: ELIANA DA COSTA PEREIRA ORIENTADORA: SORAIA NAPOLEÃO FREITAS
Data e Local da Defesa: Santa Maria, 30 de março de 2005.
Dentre os temas presentes nas discussões mundiais sobre educação, atualmente, encontramos a questão da utilização da Informática na educação e o processo de inclusão de alunos com Necessidades Educacionais Especiais (NEEs) na rede regular de ensino. Fala-se constantemente na necessidade de articulação entre Educação e Informática para o desenvolvimento de uma efetiva prática pedagógica, “conectada” com os interesses da maioria dos alunos e capaz de possibilitar a superação de limites pelos alunos com NEEs. Diante dessa realidade, realizamos a presente pesquisa, tendo como objetivos identificar como a tecnologia computacional tem sido utilizada pelos professores de alunos com NEEs incluídos na rede regular de ensino do município de Santa Maria/RS, com intuito de compreender sob que enfoque o computador pode e está sendo utilizado no processo de inclusão desses alunos, procurando analisar quais metodologias e concepções educacionais embasam a atuação dos professores frente à referida tecnologia. Para a coleta dos dados, utilizamos entrevistas semi-estruturadas com cinco professores de quatro escolas da rede regular de ensino público de Santa Maria, além de uma professora multiplicadora do Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) do referido município. Na busca de coerência durante o percurso investigativo, mas, principalmente, por estarmos caminhando em uma área em que os aspectos subjetivos são determinantes, a análise dos dados coletados foi feita sob a abordagem qualitativa. Constatamos com este estudo que apesar dos obstáculos existentes e que precisam ser superados em médio prazo, a forma como a Informática Educativa está sendo concebida e utilizada pelos professores com os alunos que possuem NEEs favorece o processo de inclusão desses alunos. Ainda que apresente significativas limitações, a prática pedagógica dos professores entrevistados está possibilitando que todos os seus alunos, tenham eles ou não NEEs, vivenciem atividades frente ao computador. Nesse sentido, mesmo que a aprendizagem de conteúdos não seja diretamente favorecida, acreditamos que o uso do computador de forma democrática, igualitária e não excludente proporciona aos alunos com NEEs em processo de inclusão o desenvolvimento da autonomia, da auto-estima, de aspectos sociais e cognitivos do desenvolvimento, que por sua vez possibilitam que esses alunos sintam-se parte integrante dessa turma, rompendo com processos de isolamento e permitindo que eles possam interagir com seus colegas.
xiii
ABSTRACT Master's Degree Dissertation
Programa de Pós-graduação em Educação Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brazil
COMPUTER AND INCLUSIVE EDUCATION: DISCUSSING LIMITS AND FEASIBILITY
AUTHOR: ELIANA DA COSTA PEREIRA MENTOR: SORAIA NAPOLEÃO FREITAS
Date and place of defense: Santa Maria, March 30, 2005.
Within the themes present in worldwide discussions on education, we can currently go over the matter of the use of computer in education and the process of inclusion of students with Special Educational Needs (SENs) in regular teaching. There is constant discussion about the articulation between education and computer education for the development of an effective pedagogical practice, linked to the interests of most students and able to make feasible the overcoming of limits by the students with special educational needs Facing this reality, the following research was made, aimed at identifying how computer technology has been used by SENs' teachers in the regular teaching in Santa Maria/RS. Trying to comprehend what focus the computer can and has been used in the process of inclusion of such students, analyzing what methodologies and educational conceptions give support to the performance of the teachers before the aforementioned technology. For the data collection, there were semi-structured interviews with five teachers of four schools of regular public teaching in Santa Maria, besides a trainer teacher of the Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) of the city. Searching for coherence during the investigative period, but, mainly for going over an area in which the subjective aspects are purposeful, the collected data analyses were made by the quantitative approach. We conclude that despite the existing hindrances and the necessity of overcoming them in mid-term, the way in which the educational computer use is being conceived and used by teachers who have students with SENs enables the inclusion of such students. Even presenting significant limitations, the interviewed teachers' pedagogical practices are enabling all the students, with or without SENs, activities using the computer. In this way, even if the subject learning is not being directly improved, we believe that the use of computers in a democratic, equal and non-excluding way gives the students with SENs the development of autonomy, self-esteem, and social and cognitive aspects of development, which enable these students to feel part of the group, ameliorating their isolation and allowing them to interact with their classmates.
2
11..11
Considerações Iniciais
... nada pode ser intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeiro lugar, um problema da
vida prática...
M. C. S. Minayo (2001) 2
Acredito que por algum motivo inconsciente optei pela
Educação Especial, sem nem mesmo supor que encontraria nela a
realização profissional tão sonhada por tantos e alcançada por tão
poucos.
Como optei por essa profissão, busquei desde os semestres
iniciais da graduação participar de atividades extracurriculares que me
possibilitassem articular os conhecimentos teóricos construídos
durante as aulas, com atividades práticas, através da resolução de
problemas reais que cotidianamente se efetivam no fazer pedagógico.
Ressalto que tais vivências desempenharam um papel indispensável
em minha formação e exercem, ainda hoje, enorme influência em
minha vida profissional e pessoal.
Dessa forma, ainda como graduanda em Educação Especial
pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM/RS, passei a
2 MINAYO, M.C.S (Org). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. 19ª ed.
3
desenvolver projetos de pesquisa e a realizar estágios em instituições
que trabalhavam com pessoas que apresentavam NEEs3. E foi
exatamente em uma dessas vivências que as inquietações iniciais
acerca do tema que hoje pesquiso, começaram a se fazer presentes em
minha vida.
Refiro-me ao meu estágio curricular como Educadora
Especial, iniciado no ano de 2000 em uma Instituição de Ensino
Especializado, sob orientação da Profª Drª Maria Alcione Munhoz, no
qual eu atuava como regente de uma turma composta por quinze
alunos que possuíam NEEs. Nessa Instituição, deparei-me, de repente,
com o desafio de desenvolver atividades frente ao computador com
meus alunos. Como não possuía na época subsídios teóricos
suficientes para valer-me de tal tecnologia, relacionando-a com os
objetivos que desejava alcançar, e tampouco a compreendia como um
recurso para o desenvolvimento de habilidades e o favorecimento da
aprendizagem dos alunos, acabava utilizando o computador de forma
mecânica e limitada e, por isso, realizava atividades que visavam à
repetição e memorização de conteúdos, e não à construção de
conhecimentos.
Mesmo sem saber como explorar todo o seu potencial, tentava
alternar atividades não informatizadas e que usavam o computador, 3 Ao utilizarmos essa expressão estaremos fundamentando-nos em Duk apud Carvalho (2004) que concebe as necessidades educacionais especiais como individuais e que não podem ser atendidas através dos meios e dos recursos metodológicos usados habitualmente pelo professor para responder às diferenças individuais de seus alunos e que requerem ajustes, recursos ou medidas pedagógicas especiais ou de caráter extraordinário, distintas das requeridas pela maioria dos estudantes. Dizem respeito àqueles alunos que apresentam maiores dificuldades que os demais estudantes para apreender as aprendizagens que lhes correspondem por idade, ou a alunos que apresentam defasagem em relação ao currículo por diversas causas e que podem requerer, para progredir em sua aprendizagem de meios de acesso ao currículo: adaptações curriculares; adequações no contexto educativo e/ou na organização da sala de aula; serviços de apoio especial.
4
porém percebia que a motivação e o desejo dos alunos aumentavam
significativamente quando utilizávamos o computador e por isso
sentia-me desafiada a compreender como poderia direcionar tal
interesse para minhas aulas. Queria entender a relação aluno-
computador, a sua magia, o seu encanto, o seu fascínio e, enquanto
educadora especial, poder ressignificar essa vivência.
Sentia, nesse momento, um misto de impotência e desafio
frente à utilização da Informática na Educação e acredito que foram
esses sentimentos que me impulsionaram em direção a uma
caminhada de reflexões e questionamentos iniciados durante a
graduação e que se intensificaram no início de minha experiência
profissional, culminando no presente estudo.
Instigada por esses sentimentos, busquei, juntamente com duas
colegas de curso e sob a orientação da professora Vera Lúcia
Marostega, elaborar um projeto de pesquisa, visando compreender a
relevância da Informática no processo de formação do professor.
Como necessitávamos delimitar mais o objeto de estudo, e
considerando o vasto conhecimento que a professora orientadora do
projeto possuía, optamos por estudar o Ambiente LOGO4 e suas
influências na formação do Educador Especial e no processo de
aprendizagem de alunos com NEEs. Neste projeto, as principais
atividades desenvolvidas foram a formação teórico-prática das
acadêmicas, abordando conteúdos referentes à Informática e à
4 Linguagem de programação desenvolvida por Seymour Papert no Massachusetts Institute of Tecnology (MIT), Boston-EUA. Apresenta características especialmente elaboradas para implementar uma metodologia de ensino baseada no computador e para explorar aspectos do processo de aprendizagem.
5
Educação; pesquisa e análise de tópicos educacionais que constituem
o Logo e que influenciam no processo de aprendizagem da pessoa
com NEEs e a utilização do recurso computacional como instrumento
facilitador desse processo. Tais vivências possibilitaram-me uma
compreensão maior e mais fundamentada sobre o valor da utilização
dos recursos tecnológicos, mais especificamente computacionais, na
Educação.
Com a conclusão do curso de Educação Especial no ano de
2001, iniciei minha prática profissional em escolas da rede regular de
ensino público e privado. Lembro-me que nessa época a maioria dos
laboratórios de Informática das escolas públicas já estavam em
processo de implantação, e que as escolas particulares, com seus
“ricos” laboratórios anunciavam as “aulas de Informática” como mais
um dos benefícios oferecidos em troca das altas mensalidades.
Diante de tais fatos, chamava-me a atenção a forma como essa
tecnologia estava sendo utilizada dentro do ambiente escolar. Visto
sob um olhar informativo, o computador servia apenas para o repasse
de informações e arquivamento de dados. Em relação ao trabalho com
os alunos, constatei a inexistência de preocupação com a formação
dos professores para o uso do computador como uma ferramenta
pedagógica, uma vez que existia um profissional contratado
exclusivamente para a função de instrutor de Informática. Destaca-se
aqui que esse profissional que possuía apenas uma formação técnica e,
por isso, desenvolvia um trabalho completamente desvinculado da
proposta pedagógicada escola, desconsiderando, no desenvolvimento
das atividades, os objetivos e os conteúdos pedagógicos.
6
Tal realidade reportou-me ao meu estágio e aos
questionamentos resultantes daquela época, fazendo-me perceber que
as minhas limitações frente ao uso da Informática na Educação
estavam também presentes no sistema educacional.
Nesse momento já compreendia a importância de concebermos
a Informática Educativa sob um enfoque inovador, em que o
computador servirá como uma ferramenta potencializadora de
mudanças profundas, levando a escola a debater, discutir, refletir
sobre suas concepções de Educação, de aluno e de aprendizagem.
Aliando tal conhecimento às preocupações que me
acompanhavam desde o término de minha graduação como educadora
especial e
- ciente de que o computador não deve ser usado para instruir,
mas sim para promover a construção de conhecimentos;
- convicta de que a utilização da Informática na Educação
exerce um grande fascínio sobre os alunos, fazendo-os sentirem-se
motivados a aprender;
- conhecendo os benefícios que o computador pode
proporcionar aos alunos com NEEs para a superação de dificuldades,
e favorecimento da aprendizagem, sendo por isso um importante
aliado no processo de inclusão educacional deles;
- acreditando que o professor nesse cenário tem um papel
indispensável, precisando reavaliar sua prática para ser capaz de
compreender a sua função nesse processo – a função de mediador na
construção do conhecimento pelo aluno com o auxílio do computador,
7
ingressei no curso de Mestrado em Educação da Universidade
Federal de Santa Maria com o intuito de investigar de uma maneira
mais aprofundada aspectos envolvendo a relação Informática X
Educação Inclusiva, para compreender como os professores estavam
se apropriando dessa tecnologia no desenvolvimento de suas práticas
pedagógicas.
Atualmente, vivemos em uma época em que nos deparamos a
todo momento com invenções tecnológicas que determinam o modo
como nós, seres humanos, organizamos nossas vidas. Diante dessa
sociedade em constante e rápida transformação, percebe-se que a
influência exercida pelos recursos da Ciência e da Informática no
comportamento dos indivíduos faz com que sejam necessárias
mudanças efetivas nas práticas educacionais atuais.
Assim, quando percebemos a abrangência do enfoque dado à
Educação, que ao longo dos anos vem deixando de primar pela
preparação de técnicos, passando a se preocupar com a formação de
alunos com valores, criatividade, autonomia, mais “humanos” e
menos “máquinas”, torna-se notório que os avanços tecnológicos e
suas influências no desenvolvimento da humanidade afetam o modo
de ensinar e de aprender no mundo. Como Paulo Freire (1996) já
defendia, a Educação não é mais uma mera instrumentalização para o
mercado de trabalho, mas sim para as questões do sentido da própria
condição de sermos humanos, nas quais encontramos espaços para
novas discussões e possibilidades e, em que se situam os discursos
8
pró-inclusão de alunos com NEEs nas salas de aula do sistema regular
de ensino.
Percorrendo diferentes períodos históricos e sendo decorrente
de lutas pelos direitos humanos, pode-se afirmar, de forma sucinta,
que as práticas educacionais desenvolvidas para as pessoas com
NEEs, na maioria dos países, evoluíram da inexistência, período
caracterizado pela segregação e exclusão, passando pela integração e
chegando à inclusão nos dias atuais.
Há algumas décadas, discute-se em busca de uma proposta de
Educação que contemple os alunos com NEEs, e que lhes garanta
igualdade de oportunidades de acesso e permanência nos sistemas de
ensino. No Brasil, de acordo com a evolução histórica, econômica,
social de nosso país e na busca da primazia pelo alcance de uma
Educação de qualidade para todos os alunos, os debates e reflexões
acerca do processo de inclusão dos alunos com NEEs no sistema
regular de ensino passaram a ser enfatizados e mais fortemente
discutidos principalmente após a elaboração da Constituição Federal
de 1988, da Declaração de Salamanca (1994), da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação n° 9.394 (1996) e das Diretrizes Nacionais para a
Educação Especial na Educação Básica (2001), dentre outros
documentos.
Embora a fase assistencialista e caritativa ainda não tenha sido
completamente superada, observamos o crescimento e o
fortalecimento dos ideais de inclusão das pessoas com NEEs em nossa
sociedade. Ressalto, porém, que tais ideais também têm sido motivo
de preocupação por parte das pessoas envolvidas com a Educação no
9
país. De acordo com minha experiência prática como profissional da
área da Educação Especial, passei a acreditar que um dos principais
obstáculos para a efetivação de práticas inclusivistas seja a falta de
conhecimento e a desinformação da sociedade como um todo em
relação às potencialidades das pessoas que possuem NEEs, o que
ocasiona uma fixação apenas nas suas limitações, dificuldades e
deficiências.
Por isso, ainda hoje, quando os alunos com NEEs ingressam
no sistema regular de ensino, vivenciam freqüentemente uma
descrença em suas potencialidades por parte dos professores e
profissionais do ambiente escolar, resultando em restritas interações
com o meio no qual estão inseridos. Na maioria das vezes, eles são
submetidos a uma Educação que, ao contrário de trabalhar para a
conquista de sua independência, autonomia e a liberdade em seus atos,
reforça comportamentos de dependência e passividade diante da
realidade que os cerca.
Sob esse aspecto, ressalto a importância da Informática no
trabalho com alunos que apresentam dificuldades e limitações
específicas no ato de aprender. Com o auxílio do computador eles
poderão descobrir que seu mundo está cheio de possibilidades, através
da busca de superação de suas dificuldades e limitações, do aumento
da auto-estima e da crença em suas capacidades, além do
desenvolvimento de inúmeras habilidades que favorecerão seu
processo de aprendizagem.
10
(...) torna-se incontestável o potencial das tecnologias (...) enquanto ferramentas para o desenvolvimento de aspectos cognitivos e sociais do aluno com necessidades educacionais especiais (...) no sentido de romper com o isolamento do indivíduo com deficiências, permitindo que ele possa interagir e comunicar-se com o outro, sejam quais forem suas limitações.5 (ProInesp, MEC/SEESP, 2004)
Nessa perspectiva, faz-se mister compreender como a
Informática Educativa vem sendo concebida6 e utilizada pelos
professores com os alunos que possuem NEEs, pois a forma como eles
utilizam essa tecnologia, que não se caracteriza simplesmente como
mero produto para um consumo imediato, mas, ao contrário, traz
consigo novos rumos para aqueles que a utilizam, é determinante nos
resultados alcançados.
No Brasil a utilização da Informática na Educação é resultado
de um processo que já dura aproximadamente 30 anos. Atualmente tal
processo está embasado em legislações e políticas federais que
delimitam e delegam ações aos estados. Dessa forma, hoje um número
significativo de escolas no país possui laboratórios de Informática,
implantados por programas governamentais, dentre os quais destaca-
se o Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo). Criado
por uma iniciativa do Governo Federal no ano de 1997, através do
Ministério de Educação/Secretaria de Educação à Distância
(MEC/SEED), busca introduzir as Tecnologias de Informação e
5 Disponível em www.mec.gov.br/seesp/informática.shtm. Acessado em 22 de março de 2004. 6 Neste estudo a palavra concepção está sendo utilizada com o sentido de compreensão, percepção.
11
Comunicação (TIC) nas escolas públicas como ferramenta de apoio no
processo de aprendizagem dos alunos.
Assim, através do ProInfo viabilizou-se a utilização da
Informática no ensino público, pois esse programa, além de implantar
laboratórios, previu também a formação e atualização dos professores,
bem como assessoria pedagógica, acompanhamento e avaliação da
instauração de tal processo. A execução de tais objetivos passa pela
criação dos Núcleos de Tecnologia Educacional (NTEs) que estão
estrategicamente distribuídos em todo o país e através dos quais os
cursos de formação continuada de professores se tornaram possíveis.
A partir então de sua criação, esses núcleos passaram a formar os
professores da rede pública de ensino para que desenvolvam, em suas
práticas, atividades frente ao computador com seus alunos.
Desde as primeiras incursões práticas da Informática
Educativa no Brasil, vêm-se desenvolvendo em núcleos de estudos,
concentrados principalmente nas Universidades Públicas, pesquisas
sobre as possibilidades de utilização do computador para a superação
de limites pelos alunos com NEEs. Dentre esses núcleos, ressalta-se o
trabalho desenvolvido no Núcleo de Informática Aplicada à Educação
(NIED)7 e no Núcleo de Informática na Educação Especial (NIEE)8.
Em decorrência disso, atualmente, podemos encontrar um número
significativo de pesquisas desenvolvidas nas diferentes regiões do
país, publicadas ou não, que trazem dados quantitativos e qualitativos
sobre as vantagens que a utilização do computador pode apresentar à
Educação especial. Na sua quase totalidade, tais pesquisas são
7 Fundado em 1983 na Unicamp 8 Fundado em 1984 na UFRGS
12
desenvolvidas tendo como sujeitos os alunos com NEEs, e como
locais de investigação, escolas especiais, classes especiais nas escolas
do ensino regular ou outros ambientes onde os alunos com NEEs se
encontram separados dos demais alunos.
É inegável a relevância da produção originada por esses
estudos, os quais geraram benefícios inquestionáveis para a
concretização das práticas atuais desenvolvidas na Educação Especial
com o auxílio do computador. No entanto, é preciso admitir que, de
acordo com o atual contexto da Educação Inclusiva, existe uma lacuna
que precisa ser preenchida na produção científica acerca do tema em
questão, fato que corrobora para a originalidade desta pesquisa.
Como já explicitado anteriormente, há alguns anos discute-se e
luta-se em nossa sociedade por uma Educação Inclusiva, processo
através do qual deve ser oferecida a todos uma Educação de
qualidade. Assim, por acreditar nessa filosofia e, principalmente, por
conceber a utilização da Informática na Educação como uma
possibilidade para a equiparação de oportunidades para todos os
alunos dentro do ambiente escolar, justifico a relevância social,
científica e educacional da presente pesquisa, propondo, então, o
desafio de investigar aspectos ainda pouco discutidos na área.
Com o passar do tempo, através de estudos, leituras,
discussões, vivências e trocas, tornei-me capaz de entender a magia, o
encanto e o fascínio que constituem a relação aluno-computador.
Alicerçada nesses conhecimentos, passei a acreditar, que quando
falamos em processo de aprendizagem de alunos com NEEs
estabelecendo uma relação com a Informática, devemos
13
obrigatoriamente entender como essa tecnologia é absorvida pelas
redes de ensino e, especialmente, pelos professores enquanto agentes
indispensáveis nesse processo.
Assim, partindo dessas vivências, busquei, nesta investigação,
compreender se “a Informática Educativa está sendo concebida e
utilizada pelos professores com os alunos que possuem NEEs de
forma a favorecer o processo de inclusão dos mesmos”.
E, acreditando que para a eficácia dessa prática existem alguns
fatores que são determinantes e que por isso prescindem de serem
analisados, tracei os seguintes objetivos para a realização desta
pesquisa:
- Investigar se os professores que fazem uso da Informática em
suas práticas pedagógicas possuem formação em Informática
Educativa;
- Identificar qual a abordagem de utilização do computador na
Educação que está fundamentando o desenvolvimento de práticas
pedagógicas frente ao computador;
- Verificar qual o envolvimento das escolas no desenvolvimento
das práticas educativas que utilizam a Informática;
- Verificar sob quais concepções os professores fundamentam o
desenvolvimento de suas práticas pedagógicas frente ao computador
com alunos que possuem NEEs;
- Identificar aspectos necessários à utilização da Informática
Educativa para que a mesma se constitua como uma prática
pedagógica que favoreça o processo de inclusão de alunos com NEEs.
14
Apresento então minha dissertação de mestrado, ressaltando a
importância cada vez maior de refletirmos sobre a utilização da
Informática na Educação Inclusiva e, de, acima de tudo, através de
espaços de discussões e reflexões sobre o tema, tentarmos contribuir
para uma possível transformação.
16
2.1 Informática e Educação Inclusiva
Sobre o que estamos falando?
A inclusão de alunos com necessidades especiais (NEs) no
sistema regular de ensino e a utilização da Informática na Educação
são dois grandes desafios que a sociedade atual impõe aos
profissionais da Educação. Nesse contexto, devemos pensar esses dois
processos como um convite ou uma proposta de transformação das
práticas pedagógicas atuais que apresentam ainda raízes tradicionais
tão fortes.
Podemos afirmar que tanto a utilização da Informática na
Educação quanto a inclusão escolar de alunos com NEs nas classes
comuns do sistema regular de ensino são processos resultantes de uma
longa caminhada histórica, que se entrecruzam em muitos momentos.
Ressaltamos, no entanto, que o paradigma de inclusão representou e
representa uma luta de uma parcela significativa da população
mundial em busca de respeito a direitos básicos de cidadania e
igualdade de oportunidades constituindo, portanto, uma trajetória
muito mais longa e relevante.
Propor uma pesquisa sobre esses dois temas, interligando-os, é
propor uma discussão repleta de dúvidas, questionamentos, medos e
inseguranças, sentimentos esses que muito provavelmente são
resultantes do desconhecimento ainda presente nas práticas
17
pedagógicas atuais no que se refere a esses assuntos. Nesse sentido,
para compreendermos com maior clareza “sobre o que estamos
falando” quando abordamos o tema Informática e Educação Inclusiva
e quais são os fatores influenciadores desses processos, resgatamos
aspectos históricos acerca dessas duas temáticas. Tais resgates
possibilitam-nos compreender porque a Educação Inclusiva e a
Informática Educativa são processos determinantes no sistema
educacional atualmente.
2.1.1 Educação Inclusiva: uma trajetória em busca de respeito
e oportunidades no exercício da cidadania
Trate as pessoas como se elas fossem o que deveriam ser, e você as ajudará a se tornarem o que são
capazes de ser.
(Goethe)9
Sabemos que a relação existente hoje entre a sociedade e as
pessoas com NEs resulta de um longo percurso sócio-histórico,
demarcado pelas escolhas que atendiam às necessidades dos homens,
num certo contexto e em uma determinada época. Assim, para
entendermos muitas das atitudes e crenças que a sociedade atual
mantém sobre as pessoas com NEs, sem fazermos falsos julgamentos
morais, é extremamente importante que façamos, através de uma visão
9 Disponível em http://www.starnews2001.com.br/literatura.html.
18
histórica, um resgate das concepções de deficiência e diferença que
permearam essa relação ao longo do desenvolvimento humano.
Na Idade Antiga, a sociedade grega tinha dois grandes
objetivos pelos quais vivia. Em Esparta, os gregos cultuavam a beleza
do corpo e buscavam a formação de soldados que lutassem nas
batalhas, enquanto em Atenas os homens se dedicavam à reflexão e à
compreensão dos fenômenos da vida. Nesse momento histórico, a
sociedade era dividida em duas grandes classes sociais determinadas
de acordo com a situação econômica de cada indivíduo. Os livres,
ricos e poderosos, mandavam e governavam, enquanto os escravos
apenas obedeciam e executavam as tarefas delegadas a eles pelos
detentores do poder. Podemos, então, facilmente concluir que, para o
cumprimento das exigências de ambas as classes sociais, espartana ou
ateniense, os seres humanos necessitavam ou de capacidade de
raciocínio ou de força física, fato que possibilita a compreensão das
atitudes de exclusão e abandono das pessoas com deficiência10,
fossem elas físicas ou mentais.
Na Idade Média, com a difusão do cristianismo na Europa, a
base das relações passou a ser teológica. Nessa época, conforme
Bianchetti (2003) ressalta, a dicotomia que explicava o ser humano
deixou de ser compreendida como corpo e mente e passou a ser
entendida como corpo e alma. A pessoa considerada diferente, que
não se enquadra no padrão de normalidade estabelecido pela
sociedade da época, ganha nesse momento histórico direito à vida,
10 Por se tratar de um resgate histórico, os termos deficiência e/ou deficientes serão empregados nessa parte do trabalho conforme a bibliografia utilizada para a construção da mesma. No entanto, ressaltamos que tais nomenclaturas não correspondem à concepção da pesquisadora.
19
mas passa a ser estigmatizada uma vez que, para a igreja, a diferença é
sinônimo de pecado.
A relação entre diferença física e pecado vai então se
intensificando nesse período e, através dessa relação, pode-se
compreender o processo de preconceito, segregação e estigmatização
que sofreram os considerados diferentes. Considera-se importante
reiterar que esse processo deve ser estudado e entendido como um
fenômeno histórico que ocorreu em um determinado contexto no qual
tais práticas não eram, a princípio, executadas por maldade, mas sim
com o consenso de uma sociedade em que a igreja tinha o poder de
tomar decisões que influenciavam a vida de todas as pessoas. Essa
sociedade era dividida também em duas grandes classes sociais e tinha
como base econômica o sistema feudal, em que os cidadãos pobres
viviam para produzir a subsistência dos governantes, trabalho para o
qual também necessitavam de força física e mental. Nesse contexto, o
único papel possível de ser desempenhado pelos deficientes era o de
palhaço ou bobo da corte para divertir a monarquia.
No século XVI, início da Idade Moderna, a Revolução
Burguesa trouxe consigo, além da queda do poder hegemônico da
igreja e da monarquia, um novo sistema econômico de produção,
chamado capitalismo. Com a transição do feudalismo para o
capitalismo, houve inúmeras transformações na sociedade. Surge a
burguesia como nova classe social em processo constante de
fortalecimento, constituída pelos empreendedores que começaram a
faturar com a venda de seu trabalho. Nessa época a produção era
voltada para o comércio e não mais para a subsistência. Nesse
20
contexto econômico, a visão de homem passa a ser mecanicista, o
corpo humano agora é concebido como uma máquina e nessa visão a
deficiência ou a diferença passa a ser concebida como uma disfunção
dessa máquina. E assim, continuam se perpetuando nesse momento as
práticas segregacionistas e preconceituosas em relação às pessoas com
deficiência.
No século XVII, com o fortalecimento do capitalismo e a
ascensão cada vez maior da burguesia, começou a existir a crença em
relação à concepção de que os indivíduos não eram essencialmente
iguais e de que as diferenças precisavam ser respeitadas. Esse
princípio, no entanto, não veio defender os direitos dos grupos sociais
menos favorecidos, mas sim legitimar a desigualdade social crescente
na época. Tal fato também teve sua repercussão no sistema
educacional, que deixou de ser oferecido apenas pela igreja e passou a
ser ofertado também pelo Estado. Ambos os fatores foram
determinados principalmente pelos interesses do governo,
influenciados pelo sistema econômico da época, pois era preciso
preparar e capacitar mão-de-obra barata para suprir a demanda do
novo modo de produção.
Nesse momento histórico, novos estudos desenvolveram-se na
área da Medicina, Filosofia e Educação. John Locke (1632-1704)
surge com uma crítica forte sobre a concepção inatista defendida até
então, que embasava os estudos e práticas nas áreas sociais e
humanas. Locke interessava-se essencialmente pelos meios através
dos quais a mente adquiria o conhecimento. Para ele o ser humano, ao
nascer, não é provido de capacidades intelectuais. Acreditava que o
21
conhecimento era adquirido através das experiências fornecidas pelo
meio e, portanto, para esse médico-filósofo, o conhecimento tinha
base empírica.
Explicava seu princípio de que as idéias advêm da sensação, da
estimulação direta causada por objetos físicos no ambiente, afirmando
que é a mente que age sobre essas impressões sensoriais, gerando os
conceitos. A função mental de reflexão sobre esses conceitos só é
possível por terem sido idéias já experimentadas.
Ao defender que o homem é uma tábula rasa que vai sendo
preenchida com as experiências vividas pelo indivíduo, Jonh Locke
demonstrava acreditar na possibilidade de educação do deficiente
mental através de uma prática que pudesse dar ênfase à importância
dos “sentidos” no processo de aprendizagem dos seres humanos.
Nesse contexto, a relação estabelecida entre as pessoas com
NEs e a sociedade passa a ser caracterizada pela busca de tratamento
médico e de estratégias de ensino para os deficientes. Como
importante referência desse momento, segundo Banks-Leite&Galvão
(2000), temos o médico Jean Itard (1774-1838) e seu trabalho com
“Vítor”, menino de hábitos selvagens, aparentando ter entre 12 a 15
anos, encontrado nu e abandonado em uma floresta francesa. Opondo-
se a todos os grandes médicos da época, que acreditavam que o
menino era acometido de idiotismo, numa condição incurável e não
suscetível de espécie alguma de sociabilidade e de instrução, Itard
(1774-1838) defende a idéia de que o estado do garoto devia-se à
privação do contato social, declarando com convicção que ele poderia
ser educado, sendo possível reintegrá-lo à sociedade.
22
Através do trabalho desenvolvido com Victor, Itard ficou
conhecido como o médico-pedagogo, sendo o introdutor da Educação
Especial na história da Educação. Foi a primeira pessoa a acreditar na
educação das pessoas com deficiências cognitivas e a sistematizar uma
proposta de ensino para elas. Portanto, as experiências de Itard com o
selvagem de Aveyron, embasadas na estimulação sensorial,
constituem-se ainda hoje em uma importante referência para as
práticas pedagógicas em Educação Especial.
Ressaltamos que nessa época, as práticas em educação especial
tinham como aporte o modelo médico de deficiência, segundo o qual o
deficiente é um doente que precisa ser cuidado por outras pessoas. Em
conseqüência dessa condição, leva uma vida passiva, sem
possibilidade de realizar atividades laborais, nem exercer suas
responsabilidades como cidadão. Sassaki (1997, p. 29) nos diz que
“segundo esse modelo, a pessoa deficiente é que precisa ser curada,
tratada, reabilitada, habilitada etc. a fim de ser adequada à sociedade
como ela é, sem maiores modificações”.
No final da década de 50, início dos anos 60, fundamentado
nesse modelo de deficiência, surge o movimento da
institucionalização. As práticas sociais desenvolvidas a partir desse
movimento consistiam basicamente na retirada das pessoas com
deficiência de seus lares e a sua manutenção em Instituições públicas
e/ou privadas que tinham um caráter puramente segregacionista,
embora se autodenominassem instituições para proteção, tratamento
ou atendimento educacional das pessoas com deficiência. Uma vez
23
institucionalizadas, as pessoas nunca mais retornavam ao convívio
familiar e muito menos ao convívio social.
As primeiras críticas à institucionalização das pessoas com
NEEs começaram a surgir poucos anos após sua implementação
prática. Tais críticas foram determinadas principalmente pela
proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)
que, de uma forma geral, assegurava às pessoas com deficiência o
direito a uma vida digna, à educação fundamental, à liberdade, ao
desenvolvimento pessoal e social e à plena participação na
comunidade. Aliados aos princípios defendidos por essa Declaração,
alguns interesses particulares também fortaleceram a marcha contra a
institucionalização, pois para os governos, por exemplo, não
interessava mais, economicamente, manter uma parcela da população
ociosa e improdutiva dentro de uma instituição; assim, o discurso de
autonomia, igualdade e respeito às diferenças proclamado na época
vinha ao encontro dos seus interesses políticos e econômicos.
Dentre os autores que publicaram estudos enfocando as
características da Institucionalização e seus efeitos na pessoa
institucionalizada, destaca-se o trabalho de Goffmam (1962) apud
Aranha (2001, p. 05) segundo o qual
(...) estar institucionalizado é uma experiência que afasta significativamente o indivíduo da sociedade, bem como o liga à vida institucional, constituindo um estilo de vida difícil de ser revertido.
A partir de Goffmam, inúmeras críticas a esse sistema foram
feitas, principalmente no que se refere à ineficácia para concretizar seu
24
princípio inicial, que consistia em favorecer, dentro da instituição, a
recuperação dessas pessoas para que tivessem condições de viver em
sociedade.
Assim, segundo Aranha (2001), após o fracasso desse sistema,
inicia-se um movimento de desinstitucionalização, que buscava uma
reformulação de idéias e, com isso, o estabelecimento por parte da
sociedade de novas práticas em relação à pessoa com deficiência. Esse
movimento teve como fundamento o princípio da normalização como
uma nova tentativa para integrar à sociedade a pessoa com deficiência.
O princípio da normalização garantia a toda pessoa com
deficiência o direito de experimentar o modo de vida considerado
normal na sua cultura. Ou seja, deveriam ser proporcionadas a todos
os indivíduos de uma mesma sociedade oportunidades iguais de
participação em atividades comuns àquele grupo. No entanto, na
prática, esse princípio foi confundido e as pessoas, em geral, passaram
a interpretá-lo erroneamente, compreendendo que, a partir dele, era
preciso “tornar normal” as pessoas com deficiência. A esse respeito
Mendes (2002, p. 07) nos diz que
Desde seu surgimento, o princípio de normalização foi criticado, geralmente pela falta de compreensão de que não se tratava de uma teoria científica, mas sim de um princípio filosófico de valor, que estabelecia que todas as pessoas, a despeito de suas inabilidades, deveriam ser tratadas, antes de tudo, como seres humanos plenos.
25
Fundamentado, então, nessa ideologia da normalização, um
novo modelo de relação entre a sociedade e as pessoas com
deficiência acabou se configurando, denominado de integração.
Tal modelo consistia na introdução da pessoa com deficiência
na sociedade, visando à aquisição de padrões de comportamentos mais
próximo do normal quanto possível para que lhe fosse possibilitada a
vida em sociedade. Nesse contexto, integrar significava transformar o
indivíduo, tornando-o apto à vida social, sem que a sociedade
precisasse se reorganizar para favorecer e garantir o acesso dessas
pessoas aos serviços assegurados a todos os cidadãos que não
apresentavam deficiências.
Diante desse contexto, surgiram novas alternativas de
atendimento às pessoas com deficiência em instituições denominadas
de “transição” e que deveriam ser mais protegidas do que a sociedade
e menos protegidas do que uma instituição típica do movimento
anterior. Para tanto, foram planejadas visando a promover a auto-
suficiência dessas pessoas através do trabalho. Como exemplo de
atendimentos fundamentados nessa filosofia, Aranha (2001) cita as
Casas de Passagem e os Centros de Vida Independente; na área
educacional, as escolas e classes especiais em escolas regulares e no
âmbito profissional, as oficinas abrigadas e os centros de reabilitação.
O trabalho desenvolvido nessas modalidades de atendimento tinha
como meta principal o desenvolvimento de atividades de vida diária e
de vida prática, dentre outras, que estimulassem as pessoas com
deficiência à vida independente.
26
Em relação ao âmbito educacional, Mendes (2002) nos lembra
que as dificuldades para a aplicação prática da Integração não foram
poucas. Além das escolas especiais, as escolas da rede regular de
ensino passaram a aceitar alunos com deficiência, principalmente em
classes especiais, e, em raras exceções, em classes comuns. No
entanto, em decorrência da má compreensão do princípio da
normalização, nenhuma adaptação era feita nem na estrutura da
escola, nem na preparação dos professores para receber esses alunos,
que permaneciam passivos dentro das salas de aula, esperando que
alguém lhes desse a devida e necessária atenção. Os avanços na
aprendizagem também não eram significativos; as atividades diárias,
os conteúdos e as avaliações eram os mesmos para todos e, assim, os
ritmos diferentes e as possíveis dificuldades desses alunos não eram
considerados.
A esse respeito, Mendes então (2002, p. 10) afirma
No âmbito da Educação de crianças e jovens com necessidades Educativas especiais, por razões históricas (...) o termo “Integração” passou a significar, na prática, a mera colocação de pessoas com deficiência juntamente com pessoas não-deficientes na mesma escola.
É relevante salientar que, segundo Carvalho (2002), as ações
educacionais, na época, eram embasadas pela Lei n° 5.692/71, que
demonstrava, em seu texto, que a Educação deveria ter como objetivo
principal a profissionalização dos alunos para suprir o mercado de
trabalho e assim colaborar com o desenvolvimento econômico do país,
27
que nesse momento histórico vinha tentando superar uma forte crise
econômica. Apenas um artigo da referida lei fazia referência à
Educação Especial e previa o atendimento segregado para as pessoas
com deficiências.
Os alunos que apresentam deficiências físicas ou mentais ou os que se encontram em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação. (LDB n.° 5.692/7, Art. 9°)
Considerando que ainda hoje, seja pela falta de oportunidades,
seja pelas suas limitações, as pessoas com deficiência contribuem
muito pouco para o desenvolvimento econômico do país, compreende-
se porque não convinha, na época, trabalhar com esses alunos nas
salas de aula do ensino regular. Aliado a essa realidade estava o fato
de que as escolas estavam acostumadas a lidar pedagogicamente com
alunos que se enquadrassem em um padrão de normalidade e,
portanto, acomodadas à exclusão e segregação daqueles que, por
algum motivo, fugissem desse padrão.
Visto que, embora tenha existido nesse momento histórico um
maior envolvimento da sociedade com as pessoas com deficiência, o
foco principal da mudança continuava a centrar-se no sujeito
deficiente, logo as primeiras críticas à Integração começaram a surgir.
A concretização dos objetivos iniciais propostos pelo
movimento da Integração havia se tornado difícil. O “processo de
28
normalização” do indivíduo com deficiência, como já era de se
esperar, acabou encontrando inúmeras barreiras e limites. Enquanto
alguns conseguiam alcançar autonomia e desenvolviam um nível de
vida independente, tantos outros, devido às suas características e a um
grau maior de comprometimento, permaneciam dependentes de outras
pessoas durante toda a vida.
Diante dessa realidade a expectativa existente até então – de
que era possível transformar a pessoa com deficiência, tornando-a
semelhante à pessoa não deficiente – deixou de ser perseguida pela
totalidade social. Pesquisadores, estudiosos, familiares e pessoas
envolvidas diretamente com aqueles que possuíam NEs passam a
discutir e debater o princípio norteador do movimento da Integração
(princípio da normalização), através de questionamentos envolvendo
os conceitos de igualdade e diferença. Acreditavam ser impossível um
homem tornar-se “igual” ao outro, e por isso defendiam que as
diferenças deviam ser respeitadas e não mais vistas como um motivo
para a discriminação e desqualificação de qualquer ser humano.
Inaugura-se uma nova concepção para alicerçar a relação entre
sociedade e pessoas com NEEs. Fundamentada nesse novo olhar em
relação à diferença do outro e com o objetivo de embasar uma nova
proposta para as práticas sociais relacionadas às pessoas com
deficiência, a Inclusão convida a sociedade a (re)pensar e (re)elaborar
alguns conceitos responsáveis pela marginalização dessas pessoas ao
longo da história da humanidade.
29
Assim, no final do século XX a “deficiência” passa a ser
pensada através de um enfoque social no qual, de acordo com Sassaki
(1997, p. 47)
(...) os problemas da pessoa com necessidades especiais não estão nela tanto quanto estão na sociedade. Assim, a sociedade é chamada a ver que ela cria problemas para as pessoas portadoras de necessidades especiais, causando-lhes incapacidade (ou desvantagem) no desempenho de papéis sociais (...).
A partir da inclusão, estrutura-se então um movimento
mundial em prol da construção de um processo bilateral em que as
pessoas excluídas do convívio social e a sociedade juntas procuram
formas de efetivar a equiparação de oportunidades para todos.
No Brasil, a década de 90 inicia-se sob o impacto dos avanços
conquistados na Constituição Federal de 1988, que prevê, em seu
artigo 206, igualdade de condições de acesso e permanência na escola
e, em seu artigo 208, reafirma a Educação como dever do Estado,
devendo este garantir o ensino fundamental obrigatório e gratuito para
todos e, ainda, atendimento educacional especializado aos portadores
de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
Também em 1990, a Conferência Mundial de Educação para
Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, considerada como um
importante marco do movimento mundial pró-inclusão, convida todos
os países a se comprometerem com a efetivação do direito à Educação
de qualidade para todos, ressaltando que é preciso que existam
30
medidas que garantam a Educação das pessoas com deficiência como
parte integrante do sistema educativo das nações.
No entanto, dentro do contexto do movimento mundial a favor
da ideologia da Educação Inclusiva, consideramos que o documento
que merece maior destaque é a Declaração de Salamanca, resultante
da Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais:
Acesso e Qualidade, promovida pelo governo espanhol em conjunto
com a UNESCO, em junho de 1994, cujo foco principal era discutir a
atenção educacional aos alunos com NEEs.
Assim, o direito à Educação de qualidade para todos alunos,
que já havia sido proclamado na Declaração Universal dos Direitos
Humanos (1948) e que foi fortemente reafirmado pela Declaração
Mundial de Educação para Todos (1990), acaba se fortalecendo ainda
mais a partir da Declaração de Salamanca (1994, p. 17-18), que prevê
que
(...) as escolas deveriam acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras. (...) deveriam incluir crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desavantajados ou marginalizados.
Baseados nesse princípio, podemos constatar como
conseqüência imediata da Declaração de Salamanca o aumento da
clientela da Educação Especial através da ampliação do conceito de
31
necessidades educacionais especiais. Conforme seu próprio texto
afirma (1994), durante os últimos 10 ou 15 anos, tem-se tornado claro
que o conceito de necessidades educacionais especiais teve que ser
ampliado para incluir todas as crianças que não estejam conseguindo
se beneficiar com a escola seja por que motivo for. O conceito de
NEEs, dessa maneira, inclui agora, além dos alunos com deficiências,
os que estejam experimentando dificuldades na escola, sejam elas
temporárias ou permanentes e causadas por quaisquer que sejam os
motivos. Ressalta-se aqui a importância da abrangência desse
conceito, uma vez que nos faz refletir sobre o fato de que,
potencialmente, todos os seres humanos possuem, já possuíram, ou
poderão possuir NEEs.
A esse respeito, Carvalho (2004) lembra-nos que tal expressão
consagrou-se em 1978, no Relatório de Warnock que foi produzido na
Inglaterra, e que atualmente tem sido objeto de inúmeras criticas
exatamente pela sua abrangência. No entanto, como a própria autora
defende (2004, p. 156)
ela permite na fala e na escrita, uma referência a todos os que demandam a melhoria da qualidade das respostas educativas de nossas escolas, por apresentarem características ou condições de aprendizagem significativamente diferentes.
Pode-se dizer então que, a partir desse documento, a Educação
Especial passou a representar muito mais do que uma escola especial,
não se voltando apenas para as pessoas com deficiências. Seus
sujeitos, sua área de atuação, seus métodos e seus objetivos foram
32
ampliados. Trabalhamos hoje com o ideal da Educação Inclusiva que
deve acontecer nas escolas regulares e abranger todos os alunos.
No entanto, fica evidente que a efetivação dessa escola
inclusiva só ocorrerá se houver uma melhoria significativa nos
sistemas de ensino dos países, caso contrário corre-se o risco de
oferecer uma Educação que não garanta oportunidades efetivas de
aprendizagem a todos.
(...) O desafio que enfrentam as escolas inclusivas é o de desenvolver uma pedagogia centralizada na criança, capaz de educar com sucesso todos os meninos e meninas, inclusive os que sofrem de deficiências graves. O mérito dessas escolas não está só na capacidade de dispensar educação de qualidade a todas as crianças; com sua criação dá-se um passo muito importante para tentar mudar atitudes de descriminação, criar comunidades que acolham a todos e sociedades inclusivas. (Declaração de Salamanca, 1994, p. 18)
Como conseqüência dos ideais reforçados nessa Declaração,
vimos emergir em nossa sociedade o consenso sobre a escolarização
de alunos com NEEs na rede regular de ensino. Chegamos assim ao
conceito de escola inclusiva, que deve, através do desenvolvimento
de uma prática educativa centrada no educando, oferecer a todos,
inclusive àqueles mais comprometidos, uma Educação de qualidade.
Ressalta-se que a compreensão das diferenças individuais como
característica inerente aos seres humanos preconiza a transformação
das práticas pedagógicas às peculiaridades de cada aluno e, por isso,
33
tal proposta educacional desenvolve-se através da conscientização de
que a aprendizagem é individual.
(...) As escolas que se centralizam na criança são, além disso, a base para a construção de uma sociedade centrada nas pessoas, que respeite tanto a dignidade como as diferenças de todos os seres humanos. Existe a imperiosa necessidade de mudança da perspectiva social. Durante muito tempo, os problemas das pessoas com deficiência foram agravados por uma sociedade mutiladora que se fixava mais em sua incapacidade do que em seu potencial.. (Declaração de Salamanca, 1994, p. 18-19)
Segundo Carvalho (2002), essa mudança de perspectiva social
exigida na Declaração de Salamanca é um reflexo das lutas pelos
direitos humanos e das conquistas alcançadas pelos homens ao longo
do seu processo de desenvolvimento, que culminaram em uma
concepção social, política e cultural de Educação. De acordo com essa
concepção, cria-se um novo conceito de Educação, que determina que
as escolas estão abertas às diferenças, respeitando e ressignificando a
diversidade humana e, em conseqüência, opondo-se à homogeneidade
e ao conceito de normalidade historicamente construído.
Em consonância com os preceitos da Declaração de Salamanca
elabora-se, no Brasil, no ano de 1996, a atual Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBEN), n° 9.394/96. Primeira LDB na qual
um capítulo inteiro é dedicado à Educação especial (Capítulo V), ela
prevê em seu texto, Artigo 58, a criação de serviços especializados em
atender às peculiaridades da clientela da Educação especial (§ 1°);
34
oferta de atendimento educacional em classes, escolas ou serviços
especializados quando, em função de condições específicas, não for
possível a inclusão do aluno nas classes do ensino regular (§ 2°) e a
oferta de Educação Especial durante a Educação infantil (§ 3°).
Já o Artigo 59 assegura, principalmente, aos educandos com
NEs as adaptações necessárias para atender às suas necessidades
(Inciso I); terminalidade específica para aqueles que não puderem
atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental e
aceleração para os superdotados (Inciso II); especialização e/ou
capacitação aos professores (Inciso III), dentre outros.
E o artigo 60 (parágrafo único) delega ao Poder Público o
compromisso de ampliar o atendimento aos educandos com NEs na
rede regular de ensino.
Apesar dos aparentes avanços e conquistas alcançados através
da elaboração dessa lei, uma análise mais detalhada e aprofundada nos
possibilita constatar que ela tem um caráter dúbio e impreciso.
Conforme seu Artigo 58, “Entende-se por Educação especial (...) a
modalidade de Educação escolar oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino para educandos portadores de necessidades
especiais". Ao estabelecer que o atendimento às pessoas com
deficiência deve acontecer preferencialmente na rede regular de
ensino e não prioritariamente na rede regular de ensino, abre
"espaços" para que a Educação desses alunos se realize de acordo com
os interesses das instituições e conforme a preferência de seus
dirigentes. Sempre que não for possível essa inclusão, devido às
condições específicas dos alunos, o atendimento se dará em serviços
35
especializados. Ressalta-se que, para efetivação do previsto na lei, o
sistema de ensino deve garantir aos estudantes com NEEs, professores
com especialização adequada para o atendimento nas diferentes
alternativas em Educação especial, bem como professores do ensino
regular capacitados para a inclusão desses estudantes nas classes
comuns.
A partir de então, intensificaram-se, em todo o país, sob
diferentes vertentes teóricas, discussões e propostas sobre a inclusão
de pessoas com NEEs no ensino regular.
Em 2001, com a criação da lei nº 10.172/ 01, que aprova o
Plano Nacional de Educação (PNE), definem-se metas para a
Educação como um todo, as quais devem ser concretizadas em dez
anos a contar de sua aprovação e publicação. Nesse sentido, o PNE
constitui um avanço significativo para o sistema nacional de
Educação, pois incorpora prazos para que a efetivação de seus
dispositivos realmente aconteça, apontando então para uma possível
transformação em nossa estrutura educacional.
Dentre os seus objetivos, vinte e sete são destinados à
Educação de pessoas com NEEs. De forma sucinta, podemos afirmar
que eles prevêem a ampliação da oferta de atendimento às pessoas
com NEEs em todo o país, através do desenvolvimento de programas
educacionais desde a Educação infantil até a qualificação/capacitação
profissional dessas pessoas; enfatizam e especificam ações
preventivas na área da deficiência visual e auditiva; preconizam o
atendimento preferencialmente na rede regular de ensino e apenas em
casos extraordinários em classes e/ou escolas especiais e propõem aos
36
professores em exercício a Educação continuada. Incentivam,
também, a formação desses em instituições de ensino superior e a
pesquisa e estudos sobre as diversas áreas relacionadas aos alunos que
apresentam necessidades especiais para aprendizagem.
Destaca-se no ano de 2001, no entanto, a resolução CNE/CEB
nº 02/2001 que instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica. Tal documento, de suma importância
para as ações educacionais voltadas aos educandos com NEs em nosso
país, busca a organização dos sistemas de ensino para o atendimento
ao aluno que apresenta NEEs e a formação dos professores para essa
realidade. Representa um marco na perspectiva de atenção à
diversidade pois ratifica a obrigatoriedade da matrícula de todos os
alunos, declarando:
Os sistemas escolares deverão assegurar a matrícula de todo e qualquer aluno, organizando-se para o atendimento aos educandos com necessidades especiais nas classes comuns. Isso requer ações em todas as instâncias, concernentes à garantia de vagas no ensino regular para a diversidade dos alunos, independentemente das necessidades especiais que apresentem (...). (Resolução CNE/CEB n° 02/2001, p. 12)
A proposição da política expressa nesse documento vem
corroborar de maneira determinante com o movimento da inclusão
uma vez que compreende
37
O conceito de escola inclusiva implica uma nova postura da escola comum, que propõe no projeto pedagógico – no currículo, na metodologia de ensino, na avaliação e na atitude dos educadores – ações que favoreçam a interação social e sua opção por práticas heterogêneas. A escola capacita seus professores, prepara-se, organiza-se e adapta-se para oferecer Educação de qualidade para todos, inclusive para os educandos que apresentam necessidades especiais. Inclusão, portanto, não significa simplesmente matricular todos os educandos com necessidades educacionais especiais na classe comum, ignorando suas necessidades especiais, mas significa dar ao professor e à escola o suporte necessário a sua ação pedagógica. (Resolução CNE/CEB n° 02/2001, p. 17-18)
A partir dessa resolução, pela primeira vez no Brasil,
encontramos em um documento oficial um comprometimento tão
intenso do governo federal com “o desafio de construir coletivamente
as condições para atender bem à diversidade de seus alunos.”
(Resolução CNE/CEB n° 02/2001, p. 06). Tal documento traz para o
centro das discussões a função social da escola, e propõe que esta,
consciente de seu papel, coloque-se à disposição do aluno, tornando-
se assim um espaço inclusivo.
Chegamos então aos dias de hoje, século XXI, acreditando
que, apesar dos inúmeros avanços conquistados, ainda há muito que se
alcançar e muito que se reivindicar. A mesma análise histórica que nos
mostra que a relação entre as pessoas com NEs e a sociedade em geral
vem evoluindo, tendo como alicerce o respeito pela individualidade de
cada ser humano, mostra-nos também que ainda não é consenso no
planejamento de serviços, educacionais ou sociais, oferecidos à essas
38
pessoas o respeito às raízes históricas, legais, filosóficas e políticas
que constituíram essa relação ao longo dos anos.
E assim, apesar das conquistas alcançadas, deparamo-nos
atualmente com uma Educação Inclusiva que em sua totalidade só
existe realmente no discurso político, pois não há ainda o
estabelecimento de uma base concreta que sustente a aplicação prática
de tal filosofia.
Enquanto leis, decretos, diretrizes continuarem a prever ações
inclusivistas sem que, no entanto, toda a sociedade se responsabilize
pela sua concreta efetivação, precisaremos continuar reivindicando a
igualdade de oportunidades para todos. Amaral (1994, p. 70) já
afirmava que todos nós, deficientes e não deficientes, que trilhamos ao
longo da história um caminho em busca da inclusão social e
profissional da pessoa com NEs, na tentativa de construirmos uma
sociedade mais igualitária, somos co-responsáveis pelos caminhos
futuros, assim como “também o são, infelizmente, aqueles que têm
calado.”
De acordo com os estudos que vêm sendo desenvolvidos em
Educação ao longo do desenvolvimento da humanidade e que
embasam a produção do conhecimento na área, podemos concluir que
hoje, para o desenvolvimento de uma sociedade inclusiva, é
indispensável que a Educação tenha como meta formular e apresentar
a todos os alunos situações desafiadoras, provocando naturalmente a
interação desses com o meio em que vivem e buscando dessa forma o
desenvolvimento deles.
39
Diante desse contexto, concordamos que a utilização da
Informática na Educação deva continuar a ser pensada como uma
importante aliada nesse processo de busca de desafios para os alunos.
A rapidez com que a sociedade vem evoluindo obriga-nos a (re)pensar
a necessidade de (re)significação das práticas Educativas, e
principalmente a qualificação dos professores enquanto agentes
fundamentais nesse processo. O professor precisa desenvolver
competências para educar-se permanentemente e assim acompanhar a
dinâmica que as novas tecnologias impõem à sociedade.
Acreditamos que trabalhar com alunos que possuem
necessidades especiais em ambientes informatizados, além de
enriquecer o processo pedagógico, colabora na perspectiva da
inclusão. Nesse processo há um envolvimento mútuo entre educando e
educador, pois ambos passam a viver experiências em que são
estimulados a vencer suas dificuldades, possibilitando a superação de
seus limites e a construção de novos conhecimentos. Justifica-se,
portanto, a necessidade de se concretizar essa nova forma de Educação
onde os processos de aprendizagem sejam trabalhados a partir de uma
metodologia que permita a produção do conhecimento de forma mais
efetiva e dinâmica, através da utilização de novos recursos nessas
práticas.
Ressaltamos que a utilização da Informática na Educação,
assim como a inclusão de alunos com NEEs, é um processo que
atualmente se encontra em fase de aplicação nas escolas, mas que
ainda apresenta inúmeros obstáculos a serem superados. Para que
possamos compreender quais são esses obstáculos e como eles
40
interferem nas práticas pedagógicas de professores que trabalham com
alunos que possuem NEEs com o auxílio do computador,
dissertaremos a seguir sobre a expansão do uso pedagógico do
computador no sistema educacional brasileiro.
2.1.2 Informática Educativa: na era da informação o
computador “invade” a escola
O computador pode se tornar apenas mais um “modismo” da Educação, cujos benefícios no que diz
respeito ao avanço da qualidade educacional poderão ser muito duvidosos. (...) o desafio está em se apropriar
criticamente dessa tecnologia, dominando-a e não sendo dominado por ela, colocando-a no lugar de apenas mais
uma técnica, e não como o objetivo “per se” da Educação.
Raquel de Almeida Moraes (2002, p.118)11
Assim como no resto do mundo, no Brasil, os eventos
relacionados à Informática tiveram sua criação e desenvolvimento
influenciados por interesses e intenções militares. Segundo Oliveira
(1997), os primeiros computadores começaram a chegar a nosso país
no final da década de 1950, concentrando-se na região sudeste,
estados de São Paulo e Rio de Janeiro e destinados a órgãos do
11 MORAES, R. A. Informática na educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 118.
41
governo e a universidades. Eram importados por duas grandes
empresas internacionais que tinham se instalado no Brasil em 1924,
visto que não havia, na época, capital nacional destinado à produção
de equipamento de processamento de dados e tampouco política
específica direcionada a esse setor.
No final dos anos 60, a Marinha brasileira sentiu a necessidade
de adquirir equipamentos ingleses que dependiam, para o seu
funcionamento, de um considerável aparato tecnológico. Apreensiva
quanto à dependência estrangeira do nosso país nesse setor, começou
a desenvolver seu próprio quadro de técnicos em processamento de
dados, fator que fortaleceu ainda mais os argumentos já existentes em
prol da criação de uma política nacional de Informática e que
culminou em um movimento a favor de uma indústria nacional de
computadores.
Conforme Moraes (2002, p. 46) o ponto decisivo para a
atuação do Estado brasileiro na Informática deu-se “quando a
Diretoria de Comunicações da Marinha (DCM) elaborou um projeto
de protótipo de computador que pudesse substituir os equipamentos
estrangeiros no controle bélico das embarcações que a Marinha
desejava adquirir.”
A partir de então, na década de 70, o Brasil passou a buscar
sua independência tecnológica no campo da Informática, começando a
desenvolver políticas públicas direcionadas à industrialização de
artefatos tecnológicos. Em 1979 rompe definitivamente com a
dependência científico-tecnológica estrangeira, e cria a Secretaria
42
Especial de Informática (SEI), responsável pela coordenação e
execução da Política Nacional de Informática.
Dentre as inúmeras ações da SEI, está a articulação de
políticas com alguns Ministérios do Governo Federal, acreditando
que, através dessa articulação, dar-se-ia um importante passo em prol
de uma sociedade moderna, informatizada e capaz de promover as
interações necessárias entre avanço científico-tecnológico e
patrimônio cultural. Nesse contexto, em 1979, a SEI determina que os
setores da agricultura, saúde, indústria e Educação devem receber
maior apoio de sua parte para que possam utilizar recursos
computacionais em suas atividades. Começam então a acontecer as
primeiras ações governamentais direcionadas à relação
InformáticaXEducação, que, como podemos perceber, não teve sua
gênese no ambiente educacional, mas, sim, nas decisões do governo
brasileiro, que julgou importante envolver a escola pública em um
movimento que já havia sido iniciado nos países desenvolvidos.
Em 1980 uma Comissão Especial de Educação, originada na
SEI, buscou levantar dados que subsidiassem a elaboração de normas
e diretrizes para a área de Informática na Educação, mas somente em
1981 a comunidade educacional é convidada a se envolver nessa
discussão. Realiza-se, nesse ano, nos dias 25, 26 e 27 de agosto, em
Brasília-DF, o I Seminário Nacional de Informática na Educação,
promovido pela SEI, pelo MEC e pelo CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico), evento que é considerado
o marco inicial do envolvimento das pessoas ligadas diretamente ao
processo educacional nas discussões sobre Informática na Educação.
43
A maioria das recomendações apresentadas pelos participantes desse
seminário são referendadas ainda hoje nas definições sobre o uso do
computador no processo educacional. No entanto, destaca-se como
uma das recomendações mais relevantes do I Seminário a necessidade
da criação de projetos-piloto para o desenvolvimento de pesquisas
sobre a utilização de Informática na Educação.
Em dezembro de 1981, MEC/SEI/CNPq lançam o documento
“Subsídios para implantação de Informática na Educação”, que criou
instrumentos legais para a consolidação da Comissão Nacional de
Informática na Educação. A referida comissão, no entanto, só se
efetivou em dezembro de 1983, com a denominação de Comissão
Especial de Informática na Educação (CE/IE). Integrada por
representantes do MEC, da SEI, do CNPq e da Finep (Financiadora de
Estudos e Projetos) e, mais tarde, por membros da Embratel, tinha a
finalidade de desenvolver discussões e implementar ações que
concretizassem a implantação dos computadores nas escolas públicas
do país.
Dando continuidade às discussões iniciadas no I Seminário,
realizou-se, no ano de 1982, em Salvador, o II Seminário Nacional de
Informática Educativa, que teve como tema gerador de suas
discussões “O impacto do computador na escola: subsídios para uma
experiência piloto do uso do computador no processo educacional
brasileiro, em nível de 2° grau”.
Na tentativa de concretizar algumas das sugestões feitas no
seminário anterior, a organização desse segundo encontro buscou a
participação de pesquisadores das áreas de Educação, Informática,
44
Psicologia e Sociologia, garantindo a interdisciplinaridade no
momento da elaboração de sugestões resultantes do evento.
Dentre as recomendações acerca da implantação de centros-
pilotos (tema central do encontro) feitas por esses grupos de
pesquisadores, fundamentamo-nos nas considerações de Oliveira
(1997) e destacamos aquelas que, acreditamos, foram determinantes
nesse processo e que desencadearam muitas das ações atuais em
Informática Educativa:
- os núcleos de estudos e experiências na área de Informática na
Educação devem ser vinculados a universidades;
- é preciso que compreendamos os limites do computador como
um recurso tecnológico ligado à Educação. Ele deve ser
concebido sob a forma de ferramenta auxiliar no processo
educacional e, como tal, submeter-se a este, sem nunca
determiná-lo;
- a utilização do computador não pode ser restrita a nenhuma
área de ensino;
- é indispensável que se priorizem ações voltadas para a
formação de professores envolvidos com a Informática
Educativa;
45
- a compra dos equipamentos utilizados nas experiências pilotos
deve ser definida pelos objetivos educacionais a que se
destinarão as máquinas, e não pela força do mercado;
buscando sempre utilizar tecnologia de procedência nacional
nos projetos-piloto.
No ano de 1983 a Secretaria Geral do MEC lança as Diretrizes
e Bases para o Estabelecimento da Política de Informática no Setor da
Educação, Cultura e Desporto, que busca sintetizar as principais idéias
discutidas sobre o assunto até aquele momento. Tal documento tinha
como ponto de referência a Política de Informática, que na época
ainda não havia sido aprovada, e demonstrava, de acordo com suas
diretrizes, que o MEC almejava abranger todos os níveis de relação
entre Informática e Educação.
Em julho de 1983, partindo das recomendações resultantes do
II Seminário, o Comitê Executivo da CE/IE, elabora e aprova o
Projeto Educom – Educação com Computadores – através do qual
buscava realizar estudos e experiências em Informática Educativa,
capacitar recursos humanos e desenvolver programas de Informática
através de equipes multidisciplinares. Para tanto, a SEI solicitou que
as Universidades brasileiras elaborassem propostas para a
implementação dos centros-piloto. Vinte e seis instituições públicas de
ensino superior candidataram-se; no entanto, apenas foram
selecionadas as que apresentaram propostas que mais se adequaram
aos objetivos da CE/IE. Dentre elas estão a Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS), a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a
46
Federal de Pernambuco (UFPe), a de Minas Gerais (UFMG) e a
Universidade Federal de Campinas (UNICAMP).
Oliveira (1997) ressalta então que a partir desse momento, o
MEC sentiu a necessidade de organizar-se estrutural e financeiramente
para a implementação prática do Projeto Educom. Criou então o
Centro de Informática Educativa (Cenifor), que, dentre outras
finalidades, deveria coordenar o financiamento do Projeto, através da
coordenação e repasse dos recursos financeiros; buscar a integração
dos cinco centros-piloto; garantir o repasse das informações
alcançadas para outros órgãos das redes federal, estadual e municipal
de ensino e acompanhar o andamento das atividades desenvolvidas
pelos centros-piloto. Ressaltamos que, em 1984, o Cenifor, vinculado
até então à Secretaria Especial de Informática, passou para a alçada da
Funtevê, órgão do Governo Federal responsável pela supervisão da
aplicação de tecnologia educacional. A sustentação financeira para a
operacionalização do Educom nas universidades deu-se através do
estabelecimento de convênios entre a Finep (Financiadora de Estudos
e Projetos), a Funtevê e o CNPq.
Resolvidas as questões estruturais e financeiras para sua
implementação, os centros-piloto puderam enfim dar início aos seus
trabalhos. A esse respeito, Oliveira (1997, p. 36) afirma que:
Criados para desenvolver atividades de pesquisa sobre Informática e Educação, em especial no ensino médio, estes centros, desde sua criação, dedicaram-se, em sua trajetória de pesquisa, principalmente à formação de recursos humanos e produção de alguns softwares educativos, além da Educação especial.
47
De modo geral as maiores dificuldades encontradas para o
desenvolvimento do projeto estavam no âmbito financeiro e, ainda
assim, segundo Moraes (2002), os centros cumpriram seu objetivo de
ser um espaço de experiências e reflexões sobre a utilização da
Informática na Educação. Os resultados da aplicação dos recursos
computacionais no processo de aprendizagem de alunos das escolas
públicas foram bastante otimistas frente à realidade educacional
brasileira. Também conforme a autora, os níveis de repetência e
evasão diminuíram, houve um aumento de interesse e motivação dos
alunos e a relação entre professor e aluno tornou-se mais democrática.
Apesar dos resultados positivos da aplicação prática do Projeto
Educom, fazia-se necessário que o MEC delineasse uma política a ser
seguida, definindo de forma mais objetiva quais os rumos que seriam
tomados a partir de então.
Diante desse contexto, em fevereiro de 1986, é criado o
Comitê Assessor de Informática para Educação de 1° e 2° graus
(Caie/Seps), que se configurou como espaço de discussão e de
encaminhamento da Política Nacional de Informática na Educação, e
era constituído por professores que não tinham poder deliberativo,
mas, sim, de assessoramento.
Dentre as principais atividades desenvolvidas pelo MEC a
partir do assessoramento do Caie, a mais relevante é a elaboração do
Programa de Ação Imediata em Informática na Educação, no ano de
1987, que tinha como meta principal a concretização de uma política
mais bem definida de Informática Educativa. Nesse momento, o MEC,
através desse Programa, buscava não só elaborar ações a serem
48
implementadas, mas também estabelecer os aspectos filosóficos que
deveriam nortear as ações nessa área. Na tentativa de estabelecimento
dessa política mais definida, vários planos, programas e projetos
foram elaborados, através dos quais o MEC pretendia realizar o
levantamento das necessidades do sistema de ensino do país na área
da Informática, elaborar uma Política de Informática Educativa para o
período de 1987 a 1989, estimular a produção de softwares
educativos, possibilitar a efetiva formação dos professores (Projeto
Formar) e a implantação dos Centros de Informática e Educação
(Cied).
Esses dois últimos programas destacam-se dos demais pela
importância de suas metas e objetivos, além de se complementarem. O
Projeto Formar buscava a capacitação de professores e técnicos para o
trabalho que seria desenvolvido nos Centros de Informática Educativa
(Cied). A criação desses centros representa um momento importante
nas ações voltadas para a efetivação do uso dos computadores nas
escolas públicas brasileiras, pois, a partir de sua existência, as
intervenções na área saíram do âmbito do MEC e passaram para o
âmbito dos governos estaduais e municipais, através das Secretarias
Estaduais e Municipais de Educação.
Em 1987 os Cieds começaram a ser implantados, sendo que no
período de 1988 a 1992 as atividades de 19 Centros de Informática
Educativa foram iniciadas.A partir de então a Informática Educativa
ultrapassa os muros das universidades e seus projetos-piloto e começa
a ocupar as escolas públicas de alguns estados do país.
49
Apesar desses avanços, havia no país a necessidade da
existência de uma Política Nacional de Informática Educativa e por
isso realiza-se na cidade de Florianópolis/SC, no mesmo ano de 1987,
a jornada “Trabalhos de Informática na Educação: subsídios para
políticas”. Partindo então das recomendações resultantes desse evento,
em 1989 o governo Federal elabora o Programa Nacional de
Informática Educativa – Proninfe - a partir do qual ficou definido o
modelo de inserção dos computadores nas escolas a ser seguido e
adotado e que está em vigor ainda hoje.
Em 1991 a lei que regula a Política de Informática no Brasil
abre espaço para a Informática Educativa, ficando então estabelecido
que cabe ao MEC a responsabilidade de formação de recursos
humanos na área. Também em 1991 foi desenvolvido o Plano de Ação
Integrada (Planinfe), que ressaltava novamente a necessidade de os
programas de capacitação dos professores estarem alicerçados em
bases sólidas, para que as mudanças realmente pudessem ocorrer.
Defendia também que núcleos de Informática distribuídos
estrategicamente em universidades, escolas técnicas e secretarias de
Educação fossem implantados no país.
Assim, como resultado desse sólido movimento nacional em
prol da efetivação prática da Informática Educativa, no dia 9 de abril
de 1997, tornou-se possível o lançamento oficial do Programa
Nacional de Informática na Educação – ProInfo, através da portaria
522. Esse Programa tem como meta promover o uso da Informática
como ferramenta de enriquecimento no processo de ensino nas escolas
públicas de ensino fundamental e médio. É um programa
50
desenvolvido pela Secretaria de Educação à Distância – SEED,
através de parcerias com as Secretarias Estaduais de Educação e
algumas poucas Secretarias Municipais12. “O Programa funciona de
forma descentralizada. Sua coordenação é de responsabilidade federal
e a operacionalização é conduzida pelos Estados e Municípios.”
(PROINFO, 2004)
O ProInfo tem na preparação de recursos humanos - os
professores - sua principal condição de sucesso. Os professores são
capacitados em dois níveis: multiplicadores e de escolas.
O professor-multiplicador é um especialista para a formação
de professores (de escolas) para o uso da Informática em sala de aula:
o Programa adota, portanto, o princípio professor formando professor.
Os multiplicadores capacitam os professores das escolas nas
bases tecnológicas do ProInfo nos estados - os Núcleos de Tecnologia
Educacional (NTE) - que são estruturas descentralizadas de apoio ao
processo de informatização das escolas, auxiliando tanto no processo
de planejamento e incorporação das novas tecnologias, quanto no
suporte técnico e formação dos professores e das equipes
administrativas das escolas.
Dentre suas diretrizes está a previsão de instalação desses
Núcleos de Tecnologia Educacional – NTE - para apoiar o processo de
informatização das escolas. Atualmente cada NTE, localizado em
regiões estratégicas, dá suporte a um grupo de aproximadamente
cinqüenta escolas públicas, buscando promover, segundo Silva (2003,
p. 20):
12 Informação disponível em: http://www.proinfo.gov.br
51
(...) a sensibilização e motivação das escolas para incorporação da tecnologia da Informática e comunicação, apoio ao processo de planejamento tecnológico da escolas para aderirem ao projeto estadual de Informática na Educação, capacitação e reciclagem dos professores e das equipes administrativas das escolas, realização de cursos de especialização para as equipes de suporte técnico, apoio para a resolução de problemas técnicos decorrentes do uso do computador nas escolas, assessoria pedagógica para uso da tecnologia no processo de ensino-aprendizagem, acompanhamento e avaliação local do processo de informatização das escolas.
Como já foi ressaltado anteriormente, o ProInfo tem sua
aplicação prática viabilizada através de parcerias com governos
estaduais e municipais. Para tanto, fica estabelecida como estratégia
de ação a necessidade da criação de políticas estaduais de Informática
Educativa.
No Rio Grande do Sul, as diretrizes da Política Estadual de
Informática na Educação são estabelecidas pelo MEC e pelo
CONSED (Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação),
que determina que em cada estado do país exista uma Comissão
Estadual de Informática na Educação responsável pela introdução das
Novas Tecnologias de Informação e Comunicação nas escolas
públicas de ensino médio e fundamental. Dessa forma, a equipe
responsável pela elaboração do Projeto Estadual de Informática na
Educação no RS foi formada por representantes da Secretaria de
Educação - SE, Secretaria de Cultura e Trabalho - SCT, PROCERGS,
52
UNDIME, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS.
A execução do projeto estadual no RS é de responsabilidade
da SE, que, para alcançar seus objetivos, previu a necessidade de uma
infra-estrutura física dando suporte às ações propostas no Projeto. Tal
estrutura compreende a existência de uma rede de telecomunicações,
NTEs e unidades educacionais equipadas.
Atualmente existem quatorze NTEs no RS, localizados em
Porto Alegre, Gravataí, Osório, Caxias do Sul, Passo Fundo, Santana
do Livramento, Santa Maria, Pelotas, Novo Hamburgo, Santo
Ângelo, Carazinho, Bagé, Uruguaiana e São Luiz Gonzaga.
O NTE de Santa Maria abrange a Região Central (RC) do
estado do Rio Grande do Sul, denominada região de abrangência da 8ª
Coordenadoria de Educação. Em consonância com o Projeto Estadual
de Informática na Educação, os objetivos gerais do NTE - RC de
Santa Maria são:13
- Educar para a cidadania global numa sociedade
tecnologicamente desenvolvida e interdependente;
- Criar novas formas de construção do conhecimento nos
ambientes escolares, através do uso adequado das novas
tecnologias de informação e comunicação;
13 Informação disponível em http://w3.ufsm.br/nte/metas.htm
53
- Disseminar a tecnologia de Informática nas escolas públicas
de maneira a possibilitar um alto padrão de qualidade na
Educação e de modernizar a gestão escolar.
Assim, em consonância com esses objetivos, em Santa Maria o
NTE - RC14 vem desde sua fundação, no ano de 2000, trabalhando em
favor da inserção da Informática nas escolas de ensino público. Está
constituído atualmente por uma equipe de quatorze pessoas, dentre
elas quatro professores multiplicadores, que são responsáveis pelo
desenvolvimento de atividades de formação dos professores,
assessoria pedagógica nas escolas no uso da tecnologia no processo de
ensino-aprendizagem, formação continuada dos professores já
capacitados, divulgação do trabalho realizado nas escolas, promoção
de encontro de professores para troca de experiências, além de
trabalhos com alunos da Educação especial e com dificuldade de
aprendizagem.
Até o momento, discutimos sobre o processo através do qual
se deu no Brasil o planejamento da aplicação prática da Informática na
Educação, destacando aspectos legais, diretrizes e metas da política
nacional de Informática Educativa.
No entanto, faz-se mister refletirmos sobre outros fatores que
influenciam de forma determinante o desenvolvimento dessa prática
educacional. Dentre esses fatores, destacamos a formação dos
professores para atuar nessa nova realidade, e a abordagem de
utilização do computador na educação, pois o emprego da Informática
14 Núcleo de Tecnologia Educacional da Região Central do Estado do Rio Grande do Sul
54
no desenvolvimento de práticas pedagógicas pode apresentar funções
bastante diferenciadas, definidas de acordo com a concepção
educacional que embasa a atuação do professor frente à máquina.
Nesse contexto, a aplicação pedagógica do computador pode ser
analisada segundo duas grandes perspectivas: Instrucionismo ou
Construcionismo.
Fundamentado na teoria comportamentalista, o
Instrucionismo é a forma de utilização do computador na Educação
em que o computador transmite para o aluno a informação, através da
utilização de softwares educativos. “Esses softwares são sistemas nos
quais o aluno interage diretamente com o computador, que é
programado para apresentar o material instrutivo e verificar, por meio
de testes, o que ele realmente assimilou. Nessa concepção, o
computador "ensina" ao aluno como ocorre nos métodos tradicionais
de ensino ou método instrucionista.” (SCHLÜNZEN, 2000, p. 73-74).
Sob essa concepção, a atuação do professor não exige uma
preparação efetiva, pois ele terá apenas que selecionar o software e
acompanhar os alunos durante a exploração do mesmo. No entanto,
como o software instrucionista não deixa explícito o caminho
percorrido pelo aluno para alcançar suas respostas, o professor precisa
estar atento a todos os passos da exploração para que possa descobrir
o que o aluno está pensando, sendo então capaz de questioná-lo e
levá-lo a reflexões sobre o seu fazer.
Existe uma grande variedade de programas de computador
destinados ao uso educacional que têm como fundamento a
abordagem instrucionista. São considerados softwares fechados,
55
porque são construídos tendo como alicerce um conceito acabado de
conhecimento. Por isso, apresentam o conteúdo que deve ser ensinado
conforme o pensamento de quem o criou, e têm como objetivo instruir
o aluno sobre determinado assunto.
Buscando maior detalhamento sobre tais programas,
embasamos-nos em Valente (1991) para caracterizar os softwares que,
conforme o referido autor, podem ser agrupados de acordo com a
seguinte classificação:
- Tutoriais: possibilitam um diálogo entre o aluno e o
computador, que consiste em o computador fornecer informações ao
aluno (podem vir sob forma de textos, animações, sons, vídeos ou
simulações) e, em seguida, propor questões para que o aluno
responda. Valente (1991) ressalta a facilidade de utilização de tais
programas nas escolas, pois os mesmos constituem uma versão
computadorizada do que já acontece nas salas de aula. “São de fácil
utilização, pois tanto o professor quanto o aluno não necessitam de um
grande conhecimento computacional e nem precisam desenvolver
lógica de programação. Eles atuam simplesmente como usuários
desses softwares.”. (SCHLÜNZEN, 2000, p. 74)
- De exercício e prática: fundamentados na teoria
comportamental de Skinner, têm como objetivo o desenvolvimento da
memorização e da repetição de conteúdos, por isso são usados
basicamente para a revisão da matéria trabalhada em sala de aula.
56
- Jogos Educacionais: foram desenvolvidos sob a concepção
de que o aluno constrói conhecimento quando lhe são proporcionadas
vivências em que esteja livre para descobrir sozinho suas respostas.
“A pedagogia por trás dessa abordagem é a exploração autodirigida ao
invés da instrução explícita e direta.” (VALENTE, 1991, p.23).
Sob essa ótica tais programas podem ser vistos como aliados
no processo de aprendizagem das crianças principalmente, pois essa é
uma maneira divertida de aprender. Valente (1991) ressalta, no
entanto, que existe o risco de os aspectos competitivos que envolvem
os jogos de uma maneira geral se sobreporem aos aspectos
pedagógicos da utilização de tais programas, e assim o objetivo
passaria a ser unicamente a vitória.
- Simulação: possibilita que o aluno desenvolva hipóteses,
teste-as e as analise. Trata-se da reprodução de uma situação real
através de símbolos, o que possibilita ao usuário “a modificação de
certos parâmetros e a observação de como eles se comportam, de
acordo com os valores atribuídos. Essa categoria permite a exploração
de situações fictícias, de riscos, de alto custo, complicadas, ou que
demandam um tempo.” (SCHLÜNZEN, 2000p. 74)
Valente (1991, p.24) considera a utilização de tais programas
na Educação muito útil para o desenvolvimento de trabalhos em
grupos, no entanto pondera que “por si só ela não cria a melhor
situação de aprendizado”. Deve ser vista como um complemento do
que está sendo discutido em sala de aula, para que realmente haja o
aprendizado e assim o conhecimento possa ser aplicado na vida real.
57
Vimos que, de uma forma geral, os softwares acima
apresentados são caracterizados pela memorização e repetição de
conteúdos, e/ou pelo alcance de respostas do tipo certo e errado.
Concebem a aprendizagem pelo viés da instrução, e por isso são
chamados de softwares de Instrução Auxiliada pelo Computador
(CAI) (PRADO & FREIRE, 2001).
A utilização prática da Informática na Educação teve início
com o próprio ensino de Informática e de computação, sendo esse o
momento caracterizado pela criação de cursos (nível técnico ou
superior) que tinham como finalidade instruir profissionais para
funções específicas da área. Tal concepção embasou as primeiras
formas de aplicação pedagógica do computador nas escolas, quando o
objetivo do emprego da máquina, através da utilização de softwares de
CAI, restringia-se a preparar os alunos para o domínio da Informática.
Em decorrência, surgia uma nova “disciplina” no currículo das
escolas, desenvolvida no laboratório de Informática, cujas atividades
eram desvinculadas das demais disciplinas, e a pessoa habilitada para
a realização das mesmas precisava dominar os recursos
computacionais, mas não necessariamente ser professor.
Ainda hoje, podemos encontrar experiências educacionais
dentro dessa perspectiva. Muitas instituições de ensino que se
empenharam em busca da implantação de um laboratório de
Informática, acabaram contratando uma pessoa para ser responsável
pelas atividades desenvolvidas no mesmo. Tais atividades consistem
na utilização de um software instrucionista que, na medida do
58
possível, possui vinculação com o conteúdo trabalhado na sala de
aula.
Quanto ao papel desempenhado pelo professor nessa realidade,
Almeida (2000, p. 26-27) esclarece-nos que
(...) existe um instrutor responsável pela mediação dos alunos com os recursos computacionais que assume todo o desenvolvimento das atividades. O instrutor é considerado o detentor do saber sobre a máquina, o que leva o professor a sentir-se ameaçado e inibido até mesmo para fazer perguntas. O resultado é que, aos poucos, o professor se desinteressa totalmente e, se lhe for permitido, usará o horário para outras atividades.
Assim, ao contrário do que ocorria anteriormente, o professor
freqüentemente acompanha seus alunos nas atividades do laboratório,
porém quem realiza a interação do aluno com a máquina é o instrutor,
cabendo ao professor observar passivamente o desenvolvimento das
atividades.
Existe, no entanto, uma segunda abordagem de utilização do
computador na Educação, a abordagem Construcionista, na qual o uso
do computador possibilita a criação de ambientes de aprendizagem
que priorizam a construção do conhecimento. “Nessa concepção, o
aluno exerce o papel de quem usa o computador, também por meio de
um software, para explicitar suas idéias, ao invés de ser ensinado por
ele, produzindo algo palpável.” (SCHLÜNZEN, 2000p. 76)
Conforme Valente (2001), Seymour Papert desenvolveu a
abordagem Construcionista com o objetivo de mostrar que o
59
computador pode servir como auxílio durante o processo de
aprendizagem e construção do conhecimento. Deu início a esses
estudos com a criação da Linguagem de programação Logo, no final
da década de 1960. Inspirado na Teoria Psicogenética de Jean Piaget e
partindo da Linguagem Logo, Papert organizou uma releitura dos
princípios construtivistas educacionais, baseando-se no uso da
tecnologia.
Para estabelecer uma diferenciação entre sua abordagem e a
abordagem Construtivista de Piaget, Papert usou o termo
construcionismo como sinônimo de um nível de construção do
conhecimento em que o aluno constrói algo do seu interesse, através
do uso do computador e, para o qual está afetivamente e
emocionalmente imbricado.
Assim, nessa abordagem o computador não é considerado o
detentor do conhecimento capaz de “ensinar” os conteúdos para o
aluno, mas ao contrário, é concebido como uma ferramenta
educacional utilizada pelo aluno para a resolução de problemas. “Essa
abordagem consiste em criar situações que permitem ao aluno resolver
problemas reais e aprender com o uso e com a experiência, com os
conceitos envolvidos no problema que está sendo resolvido.”
(SCHLÜNZEN, 2000, p. 76)
Como vimos, os softwares utilizados no construcionismo
devem priorizar a resolução de problemas, por isso chamam-se
abertos. Valente (2001) explicita o processo de utilização desses
instrumentos, através do ciclo descrição-execução-reflexão-
depuração-descrição, como vemos na Figura 1.
60
Figura 1: Ciclo descrição-execução-reflexão-depuraçã-descrição que se estabelece na interação do sujeito aprendiz com o computador na resolução de tarefas usando softwares abertos. (VALENTE, 2001, p. 36)
Utilizando um software aberto, o aluno descreve para o
computador os passos que julga necessários para a execução da tarefa
ou resolução do problema. O computador então executa as ações
indicadas pelo aluno e apresenta na tela o resultado obtido. Assim que
o computador fornece o resultado ao aluno, ele irá refletir, na
tentativa de identificar se esse resultado coincidiu com o esperado;
caso coincida, a tarefa estará resolvida, no entanto, se o resultado não
corresponder ao desejado, o aluno terá que depurar sua ação,
identificando o erro e procurando novas informações que deverão ser
61
descritas novamente ao computador, e através dessas etapas um novo
ciclo se inicia.
A resolução de problemas passa a ser um processo controlado
pelo aluno, pois é ele que comanda o computador, ensinando-o a
fazer. É o aluno que usa o seu conhecimento, “colocando-o” no
computador para indicar as operações que devem ser executadas para
o alcance das respostas desejadas.
Nesse sentido, consideramos oportuno recordar Valente (2001,
p. 35), quando ele nos diz que
Quando o aluno tem de realizar a depuração, ela é facilitada pela existência da descrição explícita de suas idéias sobre como o problema foi resolvido pela máquina. A descrição é a explicitação do raciocínio do aluno, descrito em uma linguagem não ambígua, em que existe uma correspondência direta entre o comando fornecido e o comportamento da máquina. Essas características do processo de resolução de problemas por meio do computador facilitam a análise da descrição feita, de modo que o aprendiz pode achar seus erros (bugs) e o professor pode entender o que ele está fazendo e pensando.
Por isso, através da utilização de softwares construcionistas, o
professor tem maiores possibilidades de compreender o caminho
mental percorrido pelo aluno, seja ajudando-o a interpretar as
respostas dadas pelo computador, seja questionando-o sobre as
mesmas, propondo-lhe desafios que o levarão à construção do
conhecimento.
62
Inseridos nessa situação, os professores também aprendem,
observando como seus alunos pensam e procedem no processo de
construir seu saber. Segundo os estudos de Vygotsky (1984), através
de questionamentos, desafios e reflexões sobre o que está sendo
produzido os professores poderão intervir na zona de desenvolvimento
proximal do aluno, levando-o a evoluir do seu nível de
desenvolvimento real (determinado pela capacidade de resolver
problemas sozinho) para seu nível de desenvolvimento potencial
(determinado pela solução de problemas com orientação de outra
pessoa), fazendo com que funções ainda não consolidadas venham a
amadurecer.
Para tanto, Almeida (2000, p. 110) lembra-nos que o professor
deve estar preparado para utilizar o computador em suas práticas
pedagógicas sendo capaz de incitar seus alunos a:
- aprender a aprender;
- ter autonomia para selecionar as informações pertinentes à
sua ação;
- refletir sobre uma situação-problema e escolher a alternativa
adequada de atuação para resolvê-la;
- refletir sobre os resultados obtidos e depurar seus
procedimentos, reformulando suas ações;
- buscar compreender os conceitos envolvidos ou levantar e
testar hipóteses
Portanto, a execução do ciclo descrição-execução-reflexão-
depuração-descrição não estará concretizada se a interação aluno-
63
computador não estiver mediada por um professor que esteja apto a
compreender as idéias de seus alunos e saber como, quando e de que
forma intervir.
Nessa perspectiva, cabe ao professor conscientizar-se de que a
Educação escolar passa por um momento de transformação, e que ele
possui um papel fundamental nesse processo, de agente transformador
da Educação que temos para a Educação que queremos. No entanto,
ressaltamos que ele não pode caminhar sozinho por esse percurso. É
preciso que toda a comunidade escolar se responsabilize e se
comprometa em desenvolver estratégias que possibilitem que o
professor desempenhe novas funções e assuma novos papéis nessa
escola marcada pelo domínio da tecnologia. Tanto a escola como o
docente devem assimilar que o computador é um possibilitador de
atividades significativas para o educando e que apresentará bons
resultados quando houver interação entre educador-educando-
computador.
Para tanto, a inserção dos computadores no ambiente escolar
deve estar permeada pelo envolvimento de todos os que nele atuam, os
quais, mediante discussões, críticas, comparações, alcançarão uma
consciência reflexiva e coletiva em relação à presença dessas
máquinas no cotidiano escolar. Schlünzen (2000, p. 42) muito bem
fundamenta essa idéia quando nos coloca que
64
Certamente, mudanças na prática pedagógica envolvem mudanças nas concepções básicas do professor e têm implicações no currículo, na avaliação e na organização geral da escola. Portanto, qualquer tentativa de mudança da prática deverá estar inserida em uma proposta maior de mudança, envolvendo os demais membros da organização escolar: alunos, dirigentes e comunidade.
Nesse contexto, conciliando nossas concepções com as
concepções da autora acima citada, ousamos destacar algumas das
brilhantes contribuições da mesma em sua Tese de Doutorado
intitulada “Mudanças nas Práticas Pedagógicas do Professor: Criando
um Ambiente Construcionista, Contextualizado e Significativo para
Crianças com Necessidades Especiais Físicas” (2000) acerca do
movimento que as escolas devem realizar na busca do
desenvolvimento de um ambiente construcionista de aprendizagem.
Ressaltamos que ousamos reproduzir na íntegra algumas das suas
reflexões sobre o tema em questão, pois acreditamos que dessa forma
estaremos respeitando as idéias da autora ao mesmo tempo em que
enriquecemos a fundamentação deste estudo. Assim, embasando-se
em Valente (1993c) e D’Ambrósio (1997), a autora prevê que:
a escola dê abertura para que os professores busquem as
mudanças em suas práticas pedagógicas e encontrem uma certa
harmonia nas relações de todos os envolvidos no trabalho. É preciso
incentivar a troca, contribuir para o desenvolvimento de um novo
fazer pedagógico, modificar um enfoque totalmente fechado, para
construir algo que permita a melhoria do ensino e o reconhecimento
do papel do computador como um instrumento que facilita a
65
construção por meio da descrição, execução, reflexão e depuração
(Valente, 1993c) (p. 223-224);
o espaço físico possa ser mudado de maneira que as
crianças possam sentir-se mais próximas e o professor possa atuar
nesse ambiente de maneira dinâmica, pois ele terá que trabalhar em
diferentes atividades que estarão ocorrendo simultaneamente. (...)
Devemos buscar um ambiente mais justo, onde os alunos terão uma
relação igualitária com o professor, não favorecendo aqueles que
ficam nas carteiras mais próximas do professor, saindo do ambiente
tradicional criticado por D’Ambrósio (1997) (p. 224);
o coordenador pedagógico e o de Informática devem
trabalhar em conjunto para integrar o aspecto pedagógico com o
técnico, principalmente quando estiverem fazendo a capacitação dos
professores. Acredito que não se pode achar que existe uma solução
técnica “mágica” para resolver problemas pedagógicos já existentes. O
papel do coordenador de Informática é fundamental nesse processo,
não para definir o projeto da sala de aula e, sim, para auxiliar o
professor na busca da sua autonomia. Ele pode trocar com o professor
as possibilidades dos software analisados e, juntos, sentirem de que
forma os programas poderão ser úteis para a construção do
conhecimento dos alunos. Assim, é necessário que o caminho seja do
desenvolvimento do projeto para o uso do software (p. 224);
exista ainda o acompanhamento periódico de um
coordenador pedagógico que entenda muito bem a nova metodologia.
Isto porque dúvidas surgirão, tais como: Como atuar de forma lúdica e
integrar os conceitos a serem trabalhados? A forma como estão sendo
66
trabalhadas as atividades é adequada aos princípios da proposta
educacional? Como os pais percebem o nosso trabalho e, se não o
entendem, como atuar? Como traduzir em números o desempenho do
aluno sem cometer injustiças? Entre outras inúmeras questões. Além
disso, dessa forma ele estará participando de toda a mudança dos
envolvidos e estará dando suporte ao professor. Ele precisa ter
sensibilidade suficiente para realimentar, apoiar e respeitar as
dificuldades e o estilo do professor para que ele encontre por si o seu
caminho, buscando também ter uma postura interdisciplinar (p. 224-
225);
a escola ou instituição como um todo esteja envolvida na
nova prática do professor, pois será necessário que o professor tenha
suporte e apoio em sua nova empreitada. Com o envolvimento de um
supervisor, que acompanhará o processo, haverá a possibilidade de ele
construir mudanças necessárias na instituição, como posicionando-se
frente a nova forma de conceber a aprendizagem, o novo currículo, o
planejamento, à nova forma de o aluno atuar e a avaliação na escola
(p. 225).
Assim, o emprego do computador no desenvolvimento de
práticas pedagógicas deve primar pela utilização crítica e
contextualizada dessa tecnologia, relacionada aos princípios da escola,
aos objetivos do professor e às necessidades e interesses dos alunos.
Nessa perspectiva, a utilização pedagógica do computador vai
implicar o desenvolvimento de uma nova forma de ensinar e,
conseqüentemente, possibilitará que os alunos vivenciem novas
67
formas de aprender, conforme Sampaio & Leite (2004, p. 66) nos
afirmam:
Para utilizar pedagogicamente as tecnologias (...) é necessário desenvolver também uma nova pedagogia, pois não adianta “empregar uma nova tecnologia para aplicar uma velha pedagogia (Marinho, 1987, P. 82).” As tecnologias e sua linguagem, ao mesmo tempo, requerem e propiciam um modelo didático diferente, de caráter participativo, ativo, contextualizado, interativo, interdisciplinar, em que seja permitido e necessário construir. Em resumo: as novas linguagens “geram novos modos de pensar e sentir, e por conseqüência de aprender” (Belloni, 1991, p. 43). Portanto, requerem novas formas de ensinar.
No entanto, enfatizamos que vivenciar essa nova forma de
ensinar e aprender, através da utilização pedagógica do computador,
requer muita atenção à preparação e formação do professor, pois
“nenhuma tecnologia é tão perfeita que possa prescindir do
organizador da atividade didática.”(GADOTTI, apud SAMPAIO &
LEITE 2004, p. 67).
Apesar da amplitude de fatores existentes hoje no ambiente
escolar, os quais exercem constantemente influências no processo de
aprendizagem dos alunos, o trabalho da escola continua a se
concretizar através do trabalho do professor, pois é ele o mediador da
relação aluno-conhecimento.
Diante da presença imprescindível do professor nessa relação
de aprendizagem, algumas inquietações invadem nossos pensamentos:
68
Como prepará-lo de maneira eficaz para atuar nessa escola
caracterizada pela velocidade e diversificação de informações? Que
postura esse profissional precisa adotar para inserir o computador
dentro do seu planejamento pedagógico e relacioná-lo com seus
objetivos e conteúdos? Como usá-lo de maneira democrática,
priorizando a construção do conhecimento de todos os alunos?
Na tentativa de encontrar respostas para esses
questionamentos, basear-nos-emos nos estudos de Cox (2003) que
elenca algumas características fundamentais à formação do professor
para implantação da Informática na Educação escolar.
Para atender as exigências que a implantação dos recursos
computacionais impõe à sua prática, o professor precisa ter disposição
para estudar, pois precisará compreender o que a Informática pode
oferecer ao seu planejamento pedagógico e como utilizar o
computador como uma ferramenta na concretização de objetivos
educacionais. Portanto, diante da necessidade da construção desses
novos conhecimentos para a implantação da tecnologia computacional
na Educação, faz-se mister que existam momentos dedicados a
leituras, interpretações e discussões no cotidiano dos professores, seja
no ambiente escolar ou fora dele.
Sabemos que é através da interação com o meio que a
humanidade evolui. Essa interação possibilita que façamos as
intervenções que julgamos necessárias para atingir a qualidade de vida
que desejamos. Da mesma forma, a capacidade de intervenção dos
professores no ambiente educacional que utiliza a Informática com
fins de aprendizagem é indispensável. No entanto, para que essa
69
intervenção seja possível, é necessário que o professor tenha, além de
domínio em sua área de atuação, conhecimentos técnicos e habilidades
específicas sobre Informática. Precisa conhecer quais ferramentas
computacionais podem auxiliar sua prática e compreender como
explorá-las para atender aos seus objetivos.
Contudo, torna-se oportuno ressaltar que o professor não
precisa ser um exímio programador ou analista de sistemas, precisa,
sim, compreender como seus alunos constroem conhecimento e de que
forma ele pode, através do computador, favorecer esse processo de
construção, tendo clara a teoria de aprendizagem que embasa sua ação
docente, pois nenhuma máquina será capaz de “salvar” uma prática
educacional que não tenha uma fundamentação teórica bem
delimitada. “É importante que o professor saiba que não é a
Informática a vilã ou a salvadora, mas que o uso que se faz dela é que
pode ser maléfico ou benéfico à educação escolar.” (COX, 2003, p.
110)
E, apesar da necessidade de indissociabilidade entre teoria e
prática estar evidente nos dias de hoje, se formos analisar as práticas
pedagógicas que se desenvolvem no cotidiano escolar da Educação
como um todo, notaremos que ainda hoje a epistemologia subjacente a
essas práticas é em grande parte empirista, e que professores que
buscam um embasamento diferente não possuem ainda clareza
epistemológica no seu fazer pedagógico, agindo muito através de sua
intuição.
Faz-se necessário, no entanto, pontuar os motivos que levam
esses profissionais a conviver com essa realidade. Dentre os mais
70
diversos fatores que influenciam o cotidiano escolar, podemos
destacar aqueles que, sob nosso ponto de vista, exercem apenas
influências negativas como: a desvalorização da profissão e, por
conseqüência, a baixa remuneração do professor; a baixa qualidade da
formação desse profissional e o escasso investimento em cursos de
formação e educação continuada para os profissionais em exercício, o
que representa um grande obstáculo para a melhoria de suas práticas,
pois tal aspecto influi para que suas concepções se tornem cada vez
mais arraigadas, cristalizadas, o que acaba comprometendo sua
capacidade de reflexão e motivação para mudar. Nesse sentido,
Sampaio & Leite, (2004, p. 67-68) afirmam que
Muitos fatores concorrem para que a escola enfrente dificuldades em promover a educação sistematizada, visando proporcionar à população melhores condições de atuação social. Entre estas dificuldades, e, talvez, atuando como principal desencadeador das outras, está o descaso com que os governos têm tratado a educação, embora sempre mantenham um discurso que exalta a prioridade desta área. Este descaso se traduz em baixos salários dos professores, nas precárias condições físicas das escolas, na sucessão rápida e constante de propostas pedagógicas e na visão fragmentada que impera na formação inicial e permanente dos professores.
Ainda que compreendamos tais dificuldades, ressaltamos que,
para corresponder à velocidade com que a sociedade contemporânea
vem-se desenvolvendo, o professor precisará desenvolver
competências para educar-se continuamente. “Em uma época marcada
71
por intensa aceleração das descobertas cientificas, a formação do
professor, eminentemente contínua, é um processo que não pode ter
fim. Sem constante revitalização “a escola corre o risco de ficar fora
do seu tempo”. (SILVA E. apud SAMPAIO & LEITE, 2004, p. 70). A
educação continuada apresenta-se no contexto dinâmico atual como
impreterível, pois é através dela que o professor vai continuar
desenvolvendo atividades de pesquisa, buscando sempre novas formas
de pensar e de aprender a aprender.
Essas atividades de eterna busca, reflexão e auto-avaliação
propiciarão a ele a capacidade de analisar criticamente a utilização dos
recursos da Informática na Educação, corroborando para que a história
dessas práticas seja realmente efetiva e válida. Quando o professor
assume uma postura cotidiana crítica, questionadora, percebe-se capaz
de criar e recriar continuamente, passa a acreditar na sua capacidade
de ousar, de fazer diferente, de tentar novas maneiras de trabalho e
liberta-se, assim, das verdades absolutas, da cópia e da reprodução.
Quanto a esse aspecto, buscamos reforço em Cox (2003, p. 113),
quando ela afirma que
A ousadia é ingrediente indispensável ao processo de implantação dos recursos computacionais na Educação escolar pública, pois a necessidade de estudar Informática exigirá que os professores avancem, além dos limites da sua área de conhecimento, o que não se constitui tarefa fácil, principalmente ao se considerarem as especificidades das formações docentes.
72
Acreditar em seu potencial é uma característica indispensável
para que o profissional tenha condições de tomar iniciativas,
libertando-se das correntes que muitas vezes sua formação lhe impõe.
O professor que se permite aventurar-se através das possibilidades que
a Informática na Educação apresenta, precisa acreditar nessas
possibilidades e estar disposto a vencer as dificuldades que por
ventura vierem a aparecer ao longo do desenvolvimento do trabalho. É
preciso, acima de tudo, que tenhamos coragem de romper com o
comodismo que faz com que fiquemos esperando pela tomada de
decisões dos administradores políticos, e avancemos em busca da
concretização de nossos ideais.
Assim mostraremos comprometimento com o compromisso
assumido quando optamos pela educação e decidimos nos dedicar à
formação humana, não só através da construção de conhecimentos dos
alunos, mas também através do desenvolvimento de aspectos morais e
éticos na construção da cidadania. Acreditamos que cumprir esse
compromisso é uma questão de competência profissional, e, como
afirma Oliveira (1997), a competência profissional talvez seja o
primeiro compromisso político que o professor deva assumir para a
transformação da sociedade. Será por meio de sua competência que
ele formará sujeitos críticos, detentores de conhecimento e capazes de
atuar conscientemente na sociedade.
Nessa perspectiva, a formação do professor para utilização do
computador com fins pedagógicos não pode estar reduzida a uma
simples instrumentalização de habilidades e conhecimentos
específicos, mas, ao contrário, como afirmam Sampaio & Leite (2004,
73
p. 69), deve garantir que o professor adquira “uma visão crítica e um
domínio autônomo em relação às tecnologias já existentes na escola e
àquelas presentes na sociedade, no sentido de também dominar e
promover entre seus alunos o domínio das tecnologias que hoje fazem
cada vez mais parte do cotidiano.”
De acordo com os avanços científicos e tecnológicos
conquistados nas últimas décadas, e em virtude deles, as escolas hoje
precisam estar preparadas para interagir com uma geração mais
atualizada e mais informada, necessitando apropriar-se dos
conhecimentos tecnológicos, uma vez que os modernos meios de
comunicação, principalmente a Internet, viabilizam aos alunos o
acesso instantâneo ao conhecimento. Assim, a utilização do
computador no desenvolvimento de práticas pedagógicas não é mais
simplesmente uma opção no sistema educacional, mas sim uma
realidade.
A esse respeito, o próprio texto do ProInfo (2004) já havia nos
afirmado que
O acesso à informação é imprescindível para o desenvolvimento de um estado democrático. Uma nova sociedade jamais será desenvolvida se os códigos instrumentais e as operações em redes se mantiverem nas mãos de uns poucos iniciados. É, portanto, vital para a sociedade brasileira que a maioria dos indivíduos saiba operar com as novas tecnologias da informação e valer-se destas para resolver problemas, tomar iniciativas e se comunicar. Uma boa forma de se conseguir isto, é usar o computador como prótese da inteligência e ferramenta de investigação, comunicação, construção, representação, verificação, análise,
74
divulgação e produção do conhecimento. E o locus ideal para deflagrar um processo dessa natureza é o sistema educacional.15
Portanto, quando falamos em Informática Educativa,
obrigatoriamente nos reportamos à necessidade de as escolas e seus
professores redefinirem posturas e concepções, possibilitando que
todos os alunos construam conhecimento em um ambiente de
aprendizagem que utilize o computador como um recurso pedagógico
concebido sob uma abordagem construcionista, em que aluno e
professor, juntos, através da reflexão, resolvem problemas, superam
desafios, transcendem obstáculos e limitações. Dessa forma todos,
independentemente de suas dificuldades, terão a possibilidade de
alcançar a construção de conhecimentos, o exercício consciente da
cidadania e uma efetiva participação na sociedade.
15 Disponível em www.proinfo.gov.br, acessado em 22/03/2004 (elaborado em julho de 1997)
76
3.1 Construindo conhecimento em Ciências Sociais
Na tentativa de compreendermos o mundo que nos cerca,
construímos conhecimento desde que nascemos. Recebemos e
transmitimos informações a todo momento durante o curso do nosso
desenvolvimento. Convivemos e interagimos com outros seres
humanos, também receptores e transmissores de informações
diariamente e, dessa forma, familiares, amigos, colegas, professores,
se transformam em colaboradores nesse processo “despretensioso” de
interpretação dos fenômenos que cercam nossas vidas.
Desde os primórdios da existência humana os mitos, a religião
e a filosofia (entre outros) são considerados valiosos instrumentos
para a explicação da existência humana, seja ela individual ou
coletiva.
No entanto, ao longo do desenvolvimento da humanidade, a
existência de apenas essas formas de conhecimento acabou não
satisfazendo completamente os indivíduos mais críticos. Da
necessidade de obtenção de conhecimentos seguros, capazes de
responder a questões técnicas e tecnológicas, impostas pelos avanços
conquistados pelos homens, bem como a questões de compreensão
dos fenômenos sociais, a humanidade passou a desenvolver a Ciência,
considerada hoje, conforme Gil (1999, p. 20) “um dos mais
importantes componentes intelectuais do mundo contemporâneo (...)
caracterizada como uma forma de conhecimento objetivo, racional,
sistemático, geral, verificável e falível.”
77
Porém, apesar de toda essa sistematização e normatividade, a
produção de conhecimento no campo científico, encontra-se
“permeada por conflitos e contradições.” (MINAYO, 2001, p. 10).
Na tentativa de esclarecer um dos conflitos mais suscetíveis de
discussões (na opinião da pesquisadora) e que vem ao encontro da
presente pesquisa, por se tratar esta de uma pesquisa desenvolvida na
área da Educação, faremos uma breve reflexão acerca da controvérsia
existente entre as ciências sociais e as ciências naturais.
Segundo Gil (1999), o panorama atual da pesquisa nas ciências
sociais, que se caracteriza pela sua complexidade, é resultante de duas
décadas de questionamentos na busca de métodos mais adequados aos
seus propósitos.
No entanto, uma grande parcela de pensadores e estudiosos
cientistas divergem quando debatem a relevância e cientificidade das
pesquisas sociais desenvolvidas no mundo. Argumentam que o
pesquisador social, devido a sua condição de ser humano, não
consegue “despir-se” de certas normas e critérios de julgamento moral
quando desenvolve uma investigação, o que prejudica
determinantemente o resultado dos dados pesquisados.
Tais pensadores afirmam ainda que a realização de pesquisas
científicas pressupõe a utilização do método experimental,
principalmente através do controle das variáveis que podem interferir
no fenômeno que se está estudando, e que os fenômenos sociais, por
envolverem uma variedade tão grande de fatores influenciadores,
tornam inviável a realização de uma pesquisa experimental.
78
E, como último, porém não menos importante argumento, eles
ressaltam que as pesquisas sociais trabalham com fenômenos humanos
não previsíveis e de difícil quantificação, e assim, alguns autores
chegam até mesmo a afirmar veementemente que a ciência social não
deveria nem mesmo ser classificada como uma verdadeira ciência.
Segundo Gil (1999), pesquisadores das áreas da Educação,
Filosofia, Psicologia, Sociologia e todos aqueles que desenvolvem
pesquisas em busca de explicações para fenômenos sociais e que por
isso acreditam no caráter científico de tal estudo consideram sérias as
objeções acima citadas, afirmando ser impossível negar que a ciência
social trabalha com variáveis de difícil quantificação, da mesma forma
que consideram difícil discordar do argumento de que a precisão de
um dado levantado pode ser determinada pelos instrumentos de
medida utilizados. Porém, ainda assim, estruturam sua defesa
afirmando que os problemas da quantificação nas ciências sociais,
quando analisados em profundidade, mostram-se menos críticos do
que aparentam ser.
Para tanto, os pesquisadores sociais lembram que o
determinismo absoluto das ciências naturais há muito está sendo
questionado, pois pesquisadores da área estão cada vez mais valendo-
se de explicações de natureza probabilística para compreender
fenômenos naturais. Nesse sentido Gil (1999, p. 22) afirma que
79
Em função das explicações probabilísticas cada vez mais em voga, o determinismo vem sendo rejeitado por muitos cientistas, como Heisenberg, Born e Bohr (...). Assim, a diferença entre as ciências naturais e sociais, no tocante às suas explicações, estará somente em que as últimas são mais probabilísticas que as primeiras.
É fato que o comportamento humano é muito mais complexo e
suscetível a mudanças do que o comportamento de animais, rochas ou
metais, no entanto, ressalta-se que tal aspecto por si só não
impossibilita o estudo do comportamento humano pelo viés da
ciência. Ainda que os fenômenos humanos não possam ser
quantificados com a mesma precisão dos fenômenos naturais,
devemos considerar que aspectos subjetivos como a inteligência, as
emoções, atitudes..., são também fenômenos responsáveis pela
transformação social e, portanto, determinantes na evolução da
sociedade ao longo do percurso histórico.
Podemos então inferir que pesquisadores sociais não almejam
a quantificação, mas, sim, a compreensão das relações humanas,
imersas em crenças, valores, hábitos. Pesquisam a vivência, o
cotidiano, a experiência. Lidam com a ação humana.
Assim, por acreditarmos que nos aspectos acima explicitados
reside um argumento significativo para que continuemos, apesar das
críticas, a realizar pesquisa social, e por almejarmos a compreensão de
fenômenos que se constituem dentro do âmbito educacional, sem nos
preocuparmos em quantificar dados, mas, sim, em compreender a
dinâmica da relação existente entre professores-computadores-alunos,
80
suas causas e suas conseqüências, realizamos esta pesquisa, confiando
em sua relevância para o desenvolvimento da Ciência.
Podemos definir pesquisa como um processo formal e
sistemático através do qual procuramos respostas para determinados
problemas mediante o emprego de procedimentos científicos. Nessa
perspectiva, Gil (1999, p. 42) define pesquisa social como
o processo que, utilizando a metodologia científica, permite a obtenção de novos conhecimentos no campo da realidade social. Realidade social entendida aqui em sentido bastante amplo, envolvendo todos os aspectos relativos ao homem em seus múltiplos relacionamentos com outros homens e instituições sociais.
Como pretendíamos com este estudo identificar como a
tecnologia computacional tem sido utilizada pelos professores de
alunos com NEEs incluídos na rede regular de ensino do município de
Santa Maria/RS, com intuito de compreender sob que enfoque o
computador pode e está sendo utilizado no processo de inclusão
desses alunos, procurando analisar quais metodologias e concepções
educacionais embasam a atuação dos professores frente à referida
tecnologia, realizamos uma pesquisa descritivo-interpretativa, cujos
dados foram analisados sob uma abordagem qualitativa, acreditando
que, através desse percurso metodológico tenhamos atingido os
objetivos propostos no início deste trabalho.
As pesquisas do tipo descritivo-intepretativas são normalmente
realizadas por pesquisadores preocupados com a realidade social, pois
tem como principal finalidade “a descrição das características de
81
determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações
entre variáveis” (GIL, 1999, p.43-44).
Na busca de coerência durante o percurso investigativo, mas,
principalmente por estarmos caminhando em uma ciência em que os
aspectos subjetivos são determinantes, a análise dos dados coletados
foi feita sob a abordagem qualitativa pois, conforme Minayo (2001, p.
21):
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha como o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
Nessa abordagem, tem-se o pesquisador como o principal
instrumento de investigação, do que decorre a necessidade do
estabelecimento de contato direto entre pesquisador e campo da
pesquisa, pois somente através desse contato prolongado será possível
ao pesquisador captar os significados dos dados coletados, dada a
natureza predominantemente subjetiva dos mesmos. Destaca-se ainda
o fato de os dados serem predominantemente descritivos na pesquisa
qualitativa, por isso a preocupação em reunir falas e descrições de
comportamentos e contextos; a necessidade de o pesquisador estar
atento às interações estabelecidas entre os sujeitos pesquisados e a
82
importância de se captar valores, preferências e crenças dos sujeitos,
normalmente imersos em suas falas.
Ressaltamos novamente a coerência na opção pela abordagem
qualitativa, que se justifica pela pertinência das características aqui
expostas com o estudo em questão. E, para elucidar ainda mais tal
aspecto, delimitamos a seguir as questões de pesquisa que nortearam
este trabalho: Os professores que fazem uso da Informática em suas
práticas pedagógicas possuem formação em Informática Educativa?
Qual a abordagem de utilização do computador na educação que está
fundamentando o desenvolvimento de práticas pedagógicas frente ao
computador? Qual o envolvimento das escolas no desenvolvimento
das práticas pedagógicas que utilizam a Informática? Sob quais
concepções os professores fundamentam o desenvolvimento de suas
práticas pedagógicas frente ao computador com alunos que possuem
NEEs? Quais aspectos são necessários à utilização da Informática
Educativa para que a mesma se constitua como uma prática
pedagógica que favoreça o processo de inclusão de alunos com NEEs?
Fundamentalmente precisamos ter em mente que uma pesquisa
destinada a uma investigação que procura compreender um
determinado problema, prescinde necessariamente de um plano que
serve como orientação para indicar aonde o pesquisador quer chegar e
os caminhos que almeja seguir. Portanto, neste estudo, para o alcance
dos objetivos a que ele se propôs, o caminho trilhado pelo pesquisador
foi da seguinte maneira estruturado:
83
3.1.1 Sujeitos envolvidos na Investigação
Considerando que esta pesquisa buscou analisar as práticas
pedagógicas em Informática Educativa desenvolvidas no atual
contexto da Educação inclusiva, a seleção das escolas que constituem
a amostra da pesquisa foi realizada de acordo com os seguintes
critérios:
- as escolas deveriam possuir laboratório de Informática
instalado através de convênio estabelecido com o ProInfo;
- possuir alunos com necessidades educacionais especiais
matriculados e incluídos nas classes comuns do ensino
regular.
O que resultou em uma amostra constituída por quatro escolas
estaduais da rede regular de ensino público do município de Santa
Maria/RS.
Da mesma forma, os sujeitos colaboradores desta pesquisa
foram elencados por responderem ao critério, a priori definido pela
pesquisadora, que estabelecia que os sujeitos deveriam ser professores
de classes regulares das escolas citadas acima, que possuíssem em
suas turmas alunos com NEEs incluídos e que desenvolvessem
atividades no laboratório de Informática com seus alunos.
Nesse momento consideramos indispensável relatar que
apenas em três escolas encontramos professores que atendessem a
esses critérios e, que em uma escola não havia nenhum professor
regente de turma que utilizasse o laboratório de Informática com seus
84
alunos, sendo essa função delegada unicamente aos dois responsáveis
pelo laboratório de Informática. Assim, ainda que não respondessem
ao critério de seleção de sujeitos estabelecidos na pesquisa, a
pesquisadora optou em entrevistar os responsáveis por esse
laboratório, buscando compreender como a prática em Informática
educativa está constituída nessa escola. Como argumento para
justificar o desenvolvimento da pesquisa também nessa instituição
está o fato de que a mesma compõe, juntamente com as outras escolas
estudadas, um conjunto de escolas que possuem no município de
Santa Maria-RS laboratórios de informática implantados pelo ProInfo,
e por isso, acreditou-se que as entrevistas realizadas com os
professores da instituição em questão poderiam influenciar de maneira
determinante o processo de análise de dados desta dissertação,
conforme está constatado no final do trabalho.
Uma vez que a pesquisa tinha como um de seus objetivos
identificar se os professores que fazem uso da Informática educativa
possuem formação na área, buscando assim compreender as
concepções sob as quais os professores fundamentam o
desenvolvimento de suas práticas pedagógicas frente ao computador
com alunos com NEEs, e qual a abordagem de utilização do
computador na educação que está fundamentando o desenvolvimento
dessas práticas, tornou-se necessária a colaboração de uma professora
multiplicadora do Núcleo de Tecnologia Educacional de Santa
Maria/RS, por se tratar oficialmente de umas das pessoas responsáveis
pela formação dos professores em Informática Educativa na cidade.
85
Dessa forma, os sujeitos que colaboraram com este estudo
constituem um grupo de seis pessoas sendo três professoras de turmas
regulares das escolas CECP, EPC e EEBÉV; dois responsáveis pelo
laboratório de Informática da escola EEEFEF e uma professora
multiplicadora do NTE-RC.
3.1.2 Instrumentos de Coleta de Dados
O instrumento utilizado para a coleta de dados neste estudo foi
a entrevista semi-estruturada com os sujeitos envolvidos na pesquisa.
Segundo Gil (1999, p. 117) a entrevista pode ser definida
como
a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção dos dados que interessam à investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. Mais especificamente, é uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca dados e a outra se apresenta como fonte de informação.
Utilizada como técnica principal para coleta de dados no
âmbito das ciências sociais, a entrevista é considerada muito adequada
para a obtenção de informações sobre o que as pessoas pensam,
sabem, crêem, sentem, desejam, pretendem..., sendo até mesmo
considerada por muitos autores como a técnica por excelência na
investigação social.
86
A utilização da entrevista nas ciências sociais deve-se
principalmente ao fato de que a entrevista possibilita a obtenção de
dados em profundidade a cerca dos mais diversos aspectos da vida
social e do comportamento humano. Possui ainda outros aspectos
também importantes e que lhe conferem mais prestígio do que outras
técnicas de coleta: não exige que a pessoa entrevistada seja
alfabetizada; oferece flexibilidade no momento da realização, pois
permite que o entrevistador esclareça o significado das perguntas e
possibilita a captação de expressões, tonalidade da voz e ênfase no
momento das respostas.
Logicamente, a utilização da entrevista no processo de coleta
de dados de uma pesquisa possui limitações que podem, de alguma
forma, comprometer a qualidade e veracidade dos dados. Entre tais
limitações, destacamos a falta de motivação do entrevistado para
responder às perguntas; a compreensão inadequada das perguntas
(ainda que o pesquisador tenha tentado esclarecê-las); o fornecimento
de respostas falsas; a influência exercida pelo entrevistador sobre o
entrevistado e/ou a influência das opiniões pessoais do pesquisador
sobre as respostas do entrevistado, no entanto, todas essas limitações
podem ser contornadas se o pesquisador dedicar atenção especial tanto
ao momento de elaboração e planejamento das entrevistas quanto ao
momento de sua execução.
Através da entrevista o pesquisador busca a obtenção de
informações contidas nas falas dos sujeitos enquanto atores da
realidade que se deseja compreender, portanto, não podemos reduzi-la
87
a uma conversa despretensiosa, mas sim concebê-la como uma
conversa com propósitos bem delimitados.
Geralmente as entrevistas são estruturadas ou não-estruturadas,
correspondendo ao nível de elaboração das perguntas e da aplicação
das mesmas. Podemos então trabalhar com uma entrevista não
estruturada na qual o sujeito da pesquisa aborda livremente o tema
pesquisado, ou utilizar uma pesquisa estruturada, que pressupõe
perguntas previamente elaboradas. No entanto, podemos também
trabalhar com a entrevista semi-estruturada, caracterizada pela
articulação das duas modalidades anteriores, que apresenta um certo
grau de estruturação, e que corresponde à técnica de coleta de dados
utilizada nesta pesquisa.
A opção pela utilização de entrevistas semi-estruturadas deu-se
devido à natureza do tema investigado, pois acreditávamos que os
professores entrevistados não se sentiriam plenamente à vontade para
responder a indagações formuladas com rigidez acerca do
desenvolvimento de práticas pedagógicas envolvendo temas tão atuais
e desafiantes quanto a Informática Educativa e a inclusão de alunos
com NEEs no sistema regular de ensino.
Assim, as entrevistas foram elaboradas observando as
categorias posteriores de análise dos dados, buscando sempre manter a
relação entre os tópicos abordados. No momento da aplicação da
entrevista, a pesquisadora procurou fazer poucas perguntas diretas,
possibilitando que o entrevistado expusesse seu pensamento. Quando
por ventura o sujeito se afastava dos tópicos pré-estabelecidos de
88
forma a comprometer a entrevista, a pesquisadora sutilmente
intervinha, procurando preservar a espontaneidade do processo.
Falando mais especificamente do processo de coleta de dados,
ressaltamos que o mesmo se constituiu primeiramente em um
levantamento junto ao NTE de Santa Maria/RS (Núcleo de Tecnologia
Educacional), visando a identificar quais eram as escolas atendidas no
referido município que respondiam ao critério estabelecido para a
definição da amostragem.
Ainda nesse momento uma das entrevistas foi realizada com
uma professora multiplicadora do NTE de Santa Maria/RS. Como já
foi anteriormente explicitado, trata-se oficialmente de uma das
pessoas responsáveis pela formação dos professores em Informática
Educativa no município. Essa entrevista foi realizada para que fosse
possível a pesquisadora identificar como se dá o processo de formacão
dos professores em Informática Educativa; buscando assim
compreender sob quais concepções eles estão (ou deveriam estar)
fundamentando o desenvolvimento de suas práticas pedagógicas
frente ao computador.
Em um segundo momento, após a realização da entrevista e a
conclusão do levantamento junto ao NTE de Santa Maria/RS, a
pesquisadora dirigiu-se às escolas onde, através de entrevistas semi-
estruturadas aplicadas aos professores, buscou identificar aspectos
determinantemente significativos que vinham ao encontro dos
objetivos traçados para a realização da pesquisa.
89
Assim, por compreender que os dados coletados em uma
entrevista não se limitam às respostas dos entrevistados, a
pesquisadora buscou identificar na fala, nos olhares, nas expressões e
até mesmos nas omissões dos professores, aspectos significativos que
lhe possibilitassem concluir se os professores entrevistados (que
faziam uso da Informática em suas práticas Educativas) possuíam
formação em Informática Educativa, além de verificar qual a
abordagem de utilização do computador na educação que está
fundamentando o desenvolvimento de práticas pedagógicas frente ao
computador; qual o envolvimento das escolas no desenvolvimento
dessas práticas e sob quais concepções os professores fundamentam o
desenvolvimento das mesmas.
3.1.3 Plano de Análise dos dados
O momento da análise na pesquisa qualitativa é o momento em
que o pesquisador finalmente olha atentamente para os dados da
pesquisa e os confronta com o aporte teórico construído durante a
mesma.
No entanto, Minayo (2001, p. 68) apoiada em Triviños (1987)
lembra-nos que “na medida em que estamos tratando de análise em
pesquisa qualitativa, não devemos nos esquecer de que, apesar de
mencionarmos uma fase distinta com a denominação “análise”,
durante a fase de coleta de dados a análise já poderá estar ocorrendo. ”
90
Considerando então que esse é um momento fundamental na
realização da pesquisa, e trazendo novamente Minayo (2001) para
destacar que realizar a análise dos dados significa compreender os
dados coletados; responder aos objetivos da pesquisa; e ampliar o
conhecimento acerca do assunto estudado, articulando-o ao contexto
do qual faz parte, passaremos assim à análise dos dados propriamente
dita. Somente depois da conclusão desse momento da pesquisa, será
possível a pesquisadora responder ao seu objetivo final, que consiste
em identificar aspectos necessários à utilização da Informática
Educativa para que a mesma se constitua como uma prática
pedagógica que favoreça o processo de inclusão de alunos com NEEs.
Como já afirmamos anteriormente, o momento da análise dos
dados é o momento em que o pesquisador finalmente se volta para os
dados coletados e os confronta com o aporte teórico. No entanto, para
introduzirmos a análise dos dados desta pesquisa, gostaríamos
primeiramente de tecer algumas breves considerações acerca dos seis
sujeitos colaboradores do estudo.
Sabemos que estamos trabalhando com temas atuais,
desafiantes e que provocam ainda muitas críticas, dúvidas e
discordâncias em relação a suas efetivações práticas, por isso, para
que os sujeitos se sentissem confortáveis para expressar seus
pensamentos acerca dos mesmos, na ocasião das entrevistas
afirmamos que preservaríamos seu anonimato e por esse motivo, neste
momento do trabalho, optamos por referendá-los através das letras A,
B, C, D, E e F.
Professor A
Possui formação em magistério com Licenciatura em Letras,
trabalha no magistério há dezesseis anos, atuando sempre em sala de
aula. Atualmente trabalha com uma turma de primeira série do ensino
fundamental que possui uma aluna com necessidades educacionais
especiais em processo de inclusão. Trabalha também com ensino
médio em outra escola da cidade.
93
Professor B
Formado em Pedagogia com habilitação em Pré-escola, atua
no magistério há três anos, estando em estágio probatório. Atualmente
trabalha com uma turma de terceira série do ensino fundamental que
possui quatro alunos com necessidades educacionais especiais em
processo de inclusão. Também atua com outra turma do ensino
fundamental em outra escola do estado.
Professor C
Possui formação em magistério com licenciatura em Estudos
Sociais e atualmente está concluindo o curso de graduação em
História pela Universidade Federal de Santa Maria. Trabalha na escola
há oito anos, sempre com ensino fundamental séries iniciais, hoje atua
em uma turma de 2ª série que possui um aluno com necessidades
educacionais especiais em processo de inclusão, mas afirma que desde
que iniciou seu trabalho nessa escola vem trabalhando com alunos
incluídos.
Professor D
Professor responsável pelo laboratório de Informática de uma
das escolas estudadas. Licenciado em Pedagogia, com Pós-Graduação
em Supervisão Escolar, atua como professor há 32 anos, sendo 20 na
escola em questão. Trabalhava na escola com a Disciplina de Técnicas
Agrícolas e, devido à reformulação do currículo que resultou na
94
extinção dessa disciplina, precisou redefinir seu papel na escola,
passando então a desenvolver suas atividades no laboratório de
Informática no ano de 1996, conforme ele mesmo afirma. Atende
nesse laboratório, juntamente com outro professor, porém em horários
opostos, todas as turmas de primeira a quarta série do ensino
fundamental, além dos alunos da classe especial da escola.
Professor E
Formada em Ciências da Computação, trabalha na escola
desde maio de 2003. Não possui nenhuma formação na área da
educação, tem especialização em Informática e foi contratada para
desenvolver atividades específicas no laboratório de Informática.
Atende nesse laboratório, juntamente com o professor D, porém em
horários opostos, todas as turmas de primeira a quarta série do ensino
fundamental da escola.
Professor F
Professora multiplicadora do NTE-RC. Formada em
Pedagogia, possui curso de especialização em Informática Educativa e
Informática na Educação Especial. Trabalha no NTE-RC desde sua
implantação no final de 1998, compondo atualmente a equipe
responsável pelas atividades que lá são desenvolvidas, juntamente
com mais três professores multiplicadores.
95
Após, a apresentação dos sujeitos que gentilmente
concordaram em colaborar com esta pesquisa, passaremos a analisar
os dados que foram coletados através das entrevistas semi-estruturadas
com os professores acima apresentados, considerando, para tanto, os
objetivos delineados no início deste estudo.
Durante o percurso traçado em busca da elaboração de uma
Política Nacional de Informática Educativa que subsidiasse e
fundamentasse as ações pedagógicas desenvolvidas com o auxílio do
computador, sempre existiu uma clara preocupação com as questões
relacionadas à formação dos professores para a utilização pedagógica
do computador, pois bem se sabe que é esse o profissional que está
diretamente envolvido com o processo de aprendizagem dos alunos,
independentemente dos recursos que são usados.
Nesse sentido, como resultado dessa Política Nacional de
Informática Educativa, nasceu em 1997 o ProInfo cujo objetivo
buscava promover o uso do computador como ferramenta de
enriquecimento no processo de ensino nas escolas públicas, tendo na
preparação de recursos humanos sua principal condição de sucesso.
Segundo seu próprio texto nos diz
O Programa Nacional de Informática na Educação, ora proposto pelo Ministério da Educação, pretende iniciar o processo de universalização do uso de tecnologia de ponta no sistema público de ensino. A garantia de otimização dos vultosos recursos públicos nele investidos, reside, em primeiro lugar, na ênfase dada à capacitação de recursos humanos,
96
que precede a instalação de equipamentos e responde por 46% do custo total do programa. 16
Para tanto, previu a formação de professores multiplicadores
que deveriam atuar nos NTEs, formando os professores das escolas
que possuíssem os laboratórios. Conforme o ProInfo (2004), o
professor-multiplicador é um especialista para a formação de
professores para o uso da Informática em sala de aula, por isso os
multiplicadores capacitam os professores, dando apoio ao processo de
informatização das escolas, auxiliando tanto no processo de
planejamento e incorporação das novas tecnologias, quanto no suporte
técnico e formação dos professores e das equipes administrativas das
escolas.
Nesse contexto, a formação de professores constituiu-se como
um pré-requisito para a implantação dos laboratórios de Informática
nas escolas e para a utilização do computador com fins pedagógicos.
Dessa forma, na região de abrangência do NTE de Santa Maria,
segundo dados do Professor F, a formação de professores dá-se em
dois níveis: coordenadores dos laboratórios e professores de sala de
aula. De acordo com seu relato, primeiramente foram organizados
cursos para os coordenadores dos laboratórios, buscando assim
cumprir a exigência do ProInfo e possibilitar que as escolas que
estavam por receber os laboratórios possuíssem professores já
capacitados.
16 Disponível em www.proinfo.gov.br, acessado em 22/03/2004 (elaborado em julho de 1997)
97
(...) nós começamos a capacitar os professores que receberam os laboratórios na época, ensinando como trabalhar com o computador de uma forma pedagógica com os professores e os alunos. Então nós capacitávamos um professor, chamado coordenador do laboratório, e foi assim que nasceu o trabalho do NTE. (Professor F)
F afirma também que “esses professores formados (...) eram
responsáveis em trabalhar na escola com os professores e os alunos”.
E, quando questionado se é papel desse profissional formar os outros
professores, ele esclarece-nos que “já teve muitos casos, mas não é
regra geral de o coordenador do laboratório fazer a capacitação
conosco e ele retornar para a escola e ter como objetivo elaborar um
plano de gestão tecnológico para a escola”. Ressalta ainda que na
escola EPC “o professor coordenador teve como primeira proposta
fazer a capacitação de todos os professores da escola e ensinar como
usar esse recurso”. Lembra que, assim como essa escola, outras
também tiveram essa proposta de formação dos professores da sala de
aula pelo coordenador do laboratório, “mas não quer dizer que este
coordenador tenha que fazer isso, não. Ele pode pegar um grupo de
professores, ele pode pegar dois professores, aí fica a critério do
planejamento da escola”. (Professor F)
Percebe-se então que existe uma linha de ação delineada para
os coordenadores dos laboratórios a ser desenvolvida quando esses
concluem seus cursos de formação e retornam às escolas. No entanto
não há uma diretriz específica em relação à formação dos professores
das salas de aula, ficando essa relação determinada pela realidade de
cada escola.
98
Segundo os dados coletados, dos três professores de sala de
aula entrevistados, nenhum possuía formação para utilizar o
computador no desenvolvimento de atividades pedagógicas, o que
pode nos sugerir que as ações voltadas para a preparação desse
profissional para atuar pedagogicamente frente ao computador, sejam
elas desenvolvidas pelo NTE ou pelos coordenadores dos laboratórios,
não estão sendo suficientes para atingir a demanda existente, como
veremos nas seguintes falas:
Não possuo nenhum curso de formação em Informática. Inclusive eu padeço no laboratório porque eu não tenho muita destreza com as máquinas. (...) Acho que o curso de formação do NTE só a professora do laboratório que tem.(Professor A)
A ainda lembra que
o laboratório de Informática foi implantado na escola em 2000. Três pessoas responsáveis já passaram pelo laboratório, mas para os professores da sala de aula, que eu saiba, nunca houve curso de capacitação. Todos os professores e alunos do currículo vão para o laboratório, e alguns dos professores do turno da manhã inclusive estão sempre lá. (Professor A) Não tenho nenhum curso de formação em Informática Educativa. Trabalho muito com Informática na outra escola, eu fui convocada ano passado para lá e fiquei auxiliando a professora do laboratório, ficava de manhã e cuidava de algumas turmas. Fui descobrindo sozinha como trabalhar e
99
também tive ajuda de outra professora. (Professora B) Acompanhei todo o processo de implantação do laboratório aqui na escola, mas não participei de nenhum dos cursos no NTE. Não sei o que é trabalhado nesses cursos e nem a periodicidade com que acontecem. (Professor C)
Em uma das escolas, devido à inexistência de professores de
sala de aula que freqüentem o laboratório de Informática, conforme já
explicamos anteriormente, os sujeitos entrevistados foram os dois
coordenadores do laboratório, sendo que, dos dois, apenas um possui
curso de formação, como se vê nos depoimentos abaixo:
Eu trabalhava com técnicas agrícolas na escola, mas, com a renovação do currículo, essa disciplina foi extinta, e eu precisei redefinir meu papel aqui dentro, então surgiu a oportunidade de participar do curso de capacitação em Informática através do NTE. Na época eu fui indicado pela diretora porque nenhum outro professor demonstrou interesse em ir. (Professor D) Trabalho na escola desde maio de 2003, fui contratada para dar aula de Informática, para ficar aqui no laboratório mesmo. Não tenho nenhum curso na área da educação e nunca fiz cursos no NTE. Acho que aqui na escola só o D que já fez cursos lá. (Professor E)
Diante dessa realidade, e considerando os estudos de Valente,
a quem nos reportamos para fundamentar nossos pensamentos,
quando nos diz que uma efetiva interação entre o aluno e computador
100
apenas será concretizada quando estiver mediada por um professor
capaz de compreender como e de que forma intervir nesse processo,
questionamos a existência de uma estrutura bem definida para que se
possa utilizar o computador de maneira eficaz na construção de
conhecimentos pelos alunos.
De acordo com os dados coletados, constatamos que as
atividades em Informática Educativa vão sendo desenvolvidas sem a
existência de uma base concreta de apoio a essas atividades, pois
conforme Cox (2003) nos lembra, o professor apto a realizar essa
interação precisa, além de ter domínio em sua área de atuação,
conhecer os softwares que podem auxiliar sua prática e saber como
explorá-los para atender seus objetivos, precisa, por isso, ter formação
na área.
Outro aspecto observado e extremamente relevante diz
respeito à contratação de um profissional com formação técnica em
uma das escolas, pois tal fato sinaliza-nos a existência de uma prática
instrucionista de utilização da Informática nessa instituição. Sobre
esse aspecto, Almeida (2000) ressalta que, apesar de os cursos de
formação em Informática Educativa, bem como os estudos que vêm
sendo desenvolvidos na área apontarem para uma perspectiva
construcionista de utilização do computador no desenvolvimento de
práticas pedagógicas, buscando dessa forma uma efetiva construção de
conhecimentos, ainda encontramos nas escolas atualmente
experiências educacionais dentro da perspectiva instrucionista.
Julgamos importante ressaltar nesse momento que, antes de
nos determos mais profundamente nas atividades desenvolvidas frente
101
ao computador pelos alunos e analisarmos se as mesmas são também
instrucionistas, refletiremos sobre as posturas dos professores, dos
coordenadores dos laboratórios e sobre a relação estabelecida entre
ambos os profissionais, por considerarmos esses aspectos
determinantes do processo.
Como já vimos, a perspectiva instrucionista consiste na
utilização de um software instrucionista que sempre que possível terá
relação com os conteúdos que estão sendo trabalhados na sala de aula.
A esse respeito E nos diz que:
A gente trabalha com jogos que estão disponíveis no laboratório, então tem um jogo que trabalha a tabuada, tem outro que é um livro e eles constroem a história... então eu procuro dar Matemática, Português, palavra cruzada, forca... (Professor E)
Percebe-se que existe uma certa preocupação por parte desse
profissional em desenvolver atividades que tenham um cunho
pedagógico, principalmente quando ela afirma que “quanto maior a
turma menos eles querem esse tipo de jogo, querem mais esses de
guerra, só que a gente andou tirando esses jogos... tinha um do homem
aranha e a gente tirou porque não tinha sentido”. (Professor E) No
entanto, sua formação técnica impõe-lhe uma barreira que apenas
poderia ser transposta se houvesse um acompanhamento do professor
da sala de aula nas atividades que são desenvolvidas no laboratório de
Informática, pois nesse caso ambos os profissionais teriam condições
de, juntos, cada um dominando sua área de formação, sanar suas
102
dificuldades e planejar atividades que favoreceriam a aprendizagem
dos alunos.
Porém, como já esclarecemos, não há a participação dos
professores nem no desenvolvimento das atividades de Informática,
nem no planejamento do que será trabalhado no laboratório, o que
comprovamos com a seguinte fala:
Eu procuro trabalhar o pedagógico, mas os professores não me exigem nada... não há procura dos professores para fazer os planejamentos, até nós pedimos no início do ano para discutir o tipo de trabalho que eles queriam que a gente fizesse, pedi que eles fizessem um projeto, mas até agora nada, por enquanto nenhum professor me procurou. (Professor E)
Considerando a formação técnica desse profissional,
poderíamos supor que essa é uma peculiaridade das atividades
desenvolvidas por ele, mas observando a fala do outro coordenador do
laboratório da escola que, além de ter formação na área da educação
tem formação no NTE, concluímos que é dessa maneira que a prática
em Informática Educativa está constituída e estruturada nessa escola.
A professora da sala de aula nunca vem ao laboratório, só quando eles sentem necessidade procuram o laboratório, mas, é muito raro. Quanto ao planejamento das atividades afirma: eu não tenho planejamento, o planejamento é do professor, é ele que me diz o tema que preciso trabalhar. Ele me diz o tema, daí os alunos pesquisam na Internet, constroem um texto (que fica arquivado no laboratório, a professora da sala de aula não toma
103
conhecimento dessas produções dos alunos) e quando terminam podem ficar jogando algum joguinho. (Professor D)
Em relação ao papel que o professor desempenha nessa
perspectiva instrucionista de utilização da Informática na Educação,
Almeida (2000) esclarece-nos que o instrutor que assume o
desenvolvimento das atividades acaba sendo considerado pelo
professor como o detentor do saber sobre o computador e por isso os
professores acabam sentindo-se ameaçados e inibidos para fazer
perguntas e desinteressados em participar das atividades do
laboratório, preferindo ocupar o horário para desenvolver outros
trabalhos.
A referida autora esclarece-nos ainda que, nessa perspectiva,
àqueles professores que decidem acompanhar seus alunos nas
atividades de Informática cabe o papel de observador do
desenvolvimento das mesmas, assim como podemos constatar na fala
descrita a seguir:
Eu mais auxilio porque a pessoa responsável pelo laboratório tem os seus voluntários, alunos da escola mesmo. Então ninguém deixa os alunos sozinhos no laboratório, sempre ficamos auxiliando, alguma coisinha a gente ajuda. (Professor A)
Em atuação semelhante, encontramos o Professor B que,
apesar de mostrar-se menos instrucionista, procurando oportunizar
através do computador atividades com um certo grau de desafio aos
104
seus alunos, acaba delegando ao coordenador do laboratório a
responsabilidade de desenvolver as atividades.
Aqui no laboratório sou eu e a E. (Coord. Lab.). Eu digo o que quero trabalhar, peço sugestões para ela e ela pega, faz e traz para a aula. (...) Nós combinamos o que vai ser trabalhado. Eu acho essencial o trabalho aqui do laboratório ser relacionado com o que eu estou fazendo em sala de aula porque ele ajuda muito. (...) Estou fazendo eles pesquisarem, descobrirem, é mais complicado porque eles estão mal acostumados, né, mas eu estou tentando direcionar e mostrar que o computador também é educativo. (Professor B)
Considerando então que os laboratórios de Informática das
escolas em questão são provenientes do ProInfo, e que para a
instalação dos mesmos essa formação constituiu-se como um fator
indispensável, e ainda ressaltando que de acordo com o NTE, o
embasamento dos cursos de formação em Informática Educativa
atualmente é predominantemente construcionista, concluímos que a
falta de formação não possibilita que os professores conheçam os reais
limites e possibilidades do uso do computador com fins pedagógicos,
o que acaba resultando em uma inversão de papéis dentro desse
laboratório, pois, conforme F ressalta, “esses professores formados,
chamados coordenadores do laboratório são responsáveis em trabalhar
na escola com os professores e os alunos. Eles devem orientar os
professores nas atividades que estão sendo desenvolvidas no
laboratório” (Professor F). E, no entanto, vimos que na realidade são
os professores que auxiliam o coordenador do laboratório a
105
desenvolver as atividades com os alunos, ressaltando que quem
planeja o que será trabalhado e realiza as atividades é o coordenador.
Sobre esse aspecto, Schlünzen (2000, p. 224) ainda lembra que
é papel do coordenador de Informática auxiliar o professor na busca
da sua autonomia, pois juntos eles podem analisar as possibilidades
dos softwares disponíveis e sentir de que forma tais programas
poderão ser úteis para a construção do conhecimento dos alunos.
o coordenador pedagógico e o de Informática devem trabalhar em conjunto para integrar o aspecto pedagógico com o técnico, principalmente quando estiverem fazendo a capacitação dos professores. Acredito que não se pode achar que existe uma solução técnica “mágica” para resolver problemas pedagógicos já existentes. O papel do coordenador de Informática é fundamental neste processo, não para definir o projeto da sala de aula e, sim, auxiliar o professor na busca da sua autonomia. Ele pode trocar com o professor as possibilidades dos softwares analisados e, juntos, sentirem de que forma os programas poderão ser úteis para a construção do conhecimento dos alunos.
E nesse sentido encontramos ainda uma outra realidade, que
acreditamos ser preocupante. Trata-se do Professor C, que, tendo
consciência da importância das atividades desenvolvidas com o
recurso do computador para seus alunos, procurava proporcionar
atividades menos mecânicas, buscando favorecer a capacidade de
criação dos alunos, mas, no entanto, nesse último ano acabou não
utilizando o laboratório de Informática porque não se sentiu assistido
pelo coordenador do laboratório. Sente-se atualmente desmotivado
106
pela falta de apoio do coordenador para o planejamento das atividades
e exploração dos softwares.
Eu só sei trabalhar no Word e na Internet e sei que é muito pouco, porque a Informática oferece muitas coisas que eu desconheço para trabalhar com os alunos. Mas a pessoa que está hoje no laboratório não é receptiva, não cumpre o seu papel ali. Todo o tempo que eu ficava lá com meus alunos ele nunca perguntou se eu precisava de ajuda, e eu acho que a pessoa que está lá é para isso. Ele acabou se tornando um obstáculo para eu utilizar o laboratório, porque eu sei que é o professor que tem que ver o que quer trabalhar lá, mas tem que ter uma pessoa que nos ajude. (Professor C)
Assim, analisando os aspectos acima expostos e ponderando
que cabe ao NTE através de seus professores multiplicadores auxiliar
tanto no processo de planejamento e incorporação das novas
tecnologias, quanto no suporte técnico e formação dos professores e
das equipes administrativas das escolas, através de um
acompanhamento sistemático e periódico das atividades de
Informática desenvolvidas nas mesmas, nós nos questionamos se a
freqüência com que esse acompanhamento é realizado está sendo
suficiente. Ponderando que as quatro escolas pesquisadas são as
únicas credenciadas pelo ProInfo para possuir, no município de Santa
Maria, laboratórios de Informática17, acreditamos que, se houvesse
17 Sabemos que tantas outras escolas públicas estaduais do município de Santa Maria possuem laboratórios de informática instalados através de parcerias estabelecidas com a comunidade, ou através de doações. No entanto, referimo-nos aqui unicamente àquelas escolas que possuem laboratórios de informática através do ProInfo, por ser esse um dos critérios estabelecidos neste estudo para a seleção das escolas a serem pesquisadas. Ressaltamos ainda que, conforme informações retiradas da página eletrônica do NTE-RC, endereço http://w3.ufsm.br/nte.htm.as escolas que não possuem laboratórios pelo ProInfo não recebem assistência do NTE.
107
uma maior atenção com as atividades desenvolvidas nesses
laboratórios, a utilização do computador como ferramenta no processo
de aprendizagem dos alunos seria mais eficaz.
A construção de conhecimentos através da utilização da
Informática nos processos de ensino é um reflexo direto da forma
como os professores estão desenvolvendo suas atividades frente a essa
tecnologia. Conforme as palavras de F, o trabalho no laboratório, que
não deve ser uma atividade isolada das demais, constitui-se como um
meio para o aluno ter uma forma diferenciada de construir
conhecimento, e
por isso o coordenador tem que estar trabalhando junto com os professores e o que é trabalhado no laboratório tem que ter continuidade no trabalho da sala de aula e vice-versa. Uma coisa não pode ser separada da outra. (Professor F)
Em relação a esse aspecto, todos os professores entrevistados
dizem-se preocupados em realizar atividades que possuam alguma
relação com o conteúdo trabalhado em sala de aula, mas sabemos que
isso apenas é possível quando existe uma real interação entre
professores e coordenadores. E, ainda que essa forma de realização
das atividades de Informática Educativa nos pareça bastante positiva
para a aprendizagem dos alunos, devemos considerar que a construção
do conhecimento com o auxílio do computador está diretamente
relacionada com a abordagem de utilização do mesmo no
desenvolvimento das práticas pedagógicas. Nesse sentido, trazemos
Valente (2001) para, novamente, lembrar que a aprendizagem dos
108
alunos apenas será favorecida quando o computador for considerado
uma ferramenta utilizada para a resolução de problemas que levarão o
aluno à construção do conhecimento.
Conforme já constatamos há um predomínio de características
da abordagem instrucionista na postura dos professores entrevistados
frente às atividades desenvolvidas no laboratório, o que por sua vez
acarreta no desenvolvimento de atividades instrucionistas na
utilização do computador com fins pedagógicos.
Assim, apesar de os dados coletados e as práticas observadas
nos mostrarem atitudes diferenciadas, encontramos ainda, segundo
nossa concepção, um predomínio de atividades instrucionistas nas
escolas, realidade essa já denunciada por Papert (1985) há duas
décadas, quando afirmou que “a maior parte de tudo o que tem sido
feito até hoje sob o nome genérico de “tecnologia educacional” ou
“computadores na educação” acha-se ainda no estágio da composição
linear de velhos métodos instrucionistas com novas tecnologias”.
(PAPERT, 1985, p. 56)
Conforme Almeida (2000), no Instrucionismo as atividades
não visam à construção de conhecimentos, mas sim, à memorização
de conteúdos e, por isso, ocupam-se da instrução dos alunos assim
como ocorre no método tradicional de ensino. Nessa perspectiva, a
formação em Informática Educativa apresenta-se como fator
dispensável (grifo nosso), uma vez que cabe aos professores apenas
escolher o software que será trabalhado e acompanhar os alunos
durante a utilização do computador.
109
Considerando que a utilização da Informática no
desenvolvimento de práticas pedagógicas pode apresentar funções
bastante diferenciadas que serão definidas de acordo com as
concepções que embasam a atuação do professor frente à máquina, e
acreditando que os cursos de formação são também responsáveis pela
construção de tais concepções, é que levantamos a hipótese de que as
práticas que foram analisadas sejam predominantemente
instrucionistas, devido principalmente à não formação dos professores
para o uso pedagógico do computador.
Trazendo Almeida (2000), reforçamos os aspectos acima
defendidos, ressaltando que o professor que está preparado para
utilizar o computador em suas práticas pedagógicas precisa ser capaz
de, através da utilização de softwares abertos, instigar seus alunos a
refletir sobre o problema que está tentando resolver e escolher a
alternativa adequada para resolvê-lo, bem como refletir sobre os
resultados alcançados, identificando “erros”na busca das respostas
certas.
Veremos nas próximas falas aspectos que fundamentam nossa
análise em relação ao predomínio das atividades instrucionistas,
desenvolvidas principalmente através de jogos. Nesse momento
reiteramos que a não-preparação dos professores para o
desenvolvimento de práticas pedagógicas frente ao computador faz
com que os professores, apesar de demonstrar preocupação em
relacionar os conteúdos das atividades desenvolvidas nos laboratórios
com o que está sendo trabalhado em sala de aula, não possuam
consciência do potencial que o computador oferece como ferramenta
110
na educação e tampouco compreendam como, quando e de que forma
intervir nesse processo.
No início do ano, as professoras e a coordenadora do laboratório fazem um pequeno projeto sobre o que nós desenvolveríamos durante o ano. A gente leva os conteúdos para ela, claro que é mais a parte lúdica, mas ela coloca atividades que a gente coloca na sala de aula: substituição de figuras, elaboração de frases, exercícios matemáticos em joguinhos... é bem lúdico, mas é dentro do conteúdo que eles estão estudando. A gente tenta pelo menos aproximar o máximo possível. (Professor A) Aqui no começo era muito solto, muito joguinho, muita Mônica, Iguinho... então agora eu comecei a direcionar, trazer jogos da outra escola, jogos de Matemática, estou tentando trazer um de história em quadrinhos, estou tentando adaptar o trabalho aqui do laboratório à minha aula, porque senão fica só jogo, só jogo, somente para divertimento. (Professor B) Eu tento colocar jogo de memória, de Matemática, coisas que eles entendam e consigam fazer, mas tem uns que só querem joguinho de carro, e não tem como eu não por. Eles só aceitam esse jogo, se não for esse jogo eles não fazem mais nada. (Professor E)
Sabemos que a utilização do computador através de jogos
educacionais constitui-se como uma atividade muito prazerosa para os
alunos, e sendo assim não estamos querendo diminuir a importância
de tais atividades em momentos de lazer e até mesmo educacionais, no
111
entanto, lembramos que tais programas, em sua grande maioria
apresentam-se como softwares fechados que não dão liberdade de
pensamento aos alunos, mas, sim, visam à repetição e à memorização
de conteúdos.
Ressaltamos neste momento que algumas características
encontradas nas escolas estudadas denotam que os professores,
mesmo sem possuir formação, compreendem a utilização da
Informática com fins pedagógicos como uma questão de compromisso
seu com seus alunos, e nesse sentido, esforçam-se para proporcionar-
lhes essas vivências. Tais aspectos podem ser confirmados a seguir:
Acho que essa é uma oportunidade que temos de permitir que quem não tem acesso em casa tenha acesso na escola. Eu não gosto muito da Informática, particularmente eu não gosto, mas acho necessário, acho importante. (Professor A) Eu acredito na importância desse trabalho para a minha prática, até mesmo porque o nosso papel de professor é fazer o aluno ir além do que ele tem, né, e eu tenho assim alguns alunos que nunca tinham chegado perto de um computador, ficavam até meio receosos, com medo... daqui a pouco tu vê que eles estão teclando e dando comandos e isso é enriquecedor. (Professor C)
Pode-se perceber que existe, apesar das dificuldades, um
movimento dos professores em busca do novo, na tentativa de
proporcionar aos alunos situações diferentes que os deixem motivados
para aprender. Indo mais além, acreditamos que existe a consciência
de que a educação de hoje, permeada pelo paradigma da inclusão e
112
caracterizada pela busca de respeito às diferenças individuais de cada
aluno, não pode mais ser marcada por práticas pedagógicas puramente
tradicionais, pois dessa forma não conseguiremos acompanhar o ritmo
avassalador com que a sociedade vem se desenvolvendo e tampouco
alcançar a todos os alunos. No entanto, conforme eles próprios
declaram, essa não é uma responsabilidade única e exclusiva dos
professores, mas sim, de toda a comunidade escolar que deve estar
imbricada em possibilitar essa mudança.
Eu acredito que a escola precisa ajudar os professores a desenvolver sua prática. Quando os setores da escola não trabalham para auxiliar o professor a desenvolver suas atividades, fica muito difícil, fica mais difícil ainda. (Professor C)
Neste momento acreditamos ser oportuno lembrar Schlünzen
(2000), quando nos afirma que as inovações nas práticas pedagógicas
só vão se materializar quando houver mudanças no currículo, na
avaliação e na organização geral da escola.
Logo, para que a utilização do computador como ferramenta
no processo de aprendizagem de todos os alunos se constitua num
processo que proporcione a construção de conhecimentos, é preciso
que a escola se envolva com as questões relacionadas à formação dos
professores, ao planejamento das atividades e, ao desenvolvimento das
mesmas. É preciso que a Informática Educativa esteja inserida no
Projeto Político Pedagógico da escola para que possa se materializar
nas ações da sala de aula. A esse respeito o ProInfo, (2004) argumenta
que
113
A capacitação de professores para o uso das novas tecnologias de informação e comunicação implica redimensionar o papel que o professor deverá desempenhar na formação do cidadão do século XXI. É, de fato, um desafio à pedagogia tradicional, porque significa introduzir mudanças no processo de ensino-aprendizagem e, ainda, nos modos de estruturação e funcionamento da escola e de suas relações com a comunidade.18
Nesse sentido, encontramos nas falas dos professores
concepções diferentes acerca do envolvimento das escolas no
desenvolvimento de atividades pedagógicas frente ao computador:
Eu percebo um envolvimento de toda a escola. Desde o “prezinho” até o ensino médio, todos utilizam o laboratório de Informática. Nós inclusive temos uma grade de horários para utilizar o laboratório e esse horário é cumprido “à risca”. (Professora A) Eu acho que seria melhor para os alunos se houvesse um maior envolvimento das professoras da escola com o nosso trabalho no laboratório. Para mim não faz diferença, mas para elas talvez fizesse porque o conteúdo que é dado na aula poderia ser aplicado um exercício aqui, eles poderiam aprender melhor. Para elas eu acredito que ia ser diferente, para mim não. (Professor E) Nas reuniões até tem um espaço para nós falarmos sobre o trabalho de Informática, mas como ninguém nunca pergunta... e as reuniões tratam mais de assuntos pedagógicos, de sala de aula mesmo, quase nunca eu participo. (Professor D)
18 Disponível em www.proinfo.gov.br, acessado em 22/03/2004 (elaborado em julho de 1997)
114
Eu não vejo envolvimento da escola com o trabalho desenvolvido aqui no laboratório. É assim, o campo é muito aberto na escola, mas eles não se detêm no laboratório de Informática. (Professor B)
Tendo em vista tais declarações e ainda considerando as
observações feitas durante a (curta) vivência dentro das escolas,
ressaltamos que em muitos momentos ficamos com dúvidas sobre se o
envolvimento a que os professores estavam se referindo não estava
sendo confundido com o número de professores que utiliza o
laboratório, pois apenas em uma escola conseguimos encontrar um
coordenador pedagógico que possuísse conhecimento sobre as
atividades de Informática, bem como sobre o processo de implantação
do laboratório e a formação dos professores. Nas demais apenas os
professores de sala de aula que utilizam o laboratório e os
coordenadores destes tiveram condições de conversar sobre os
aspectos que envolvem a utilização desse ambiente.
Nesse contexto, constatamos que na maioria das escolas o
trabalho desenvolvido no laboratório de Informática é considerado um
trabalho isolado, que não faz parte das preocupações diárias de setores
como direção, coordenação pedagógica, secretaria, etc. Acreditamos
que tal aspecto merece ser questionado nesta análise, pois, assim como
a falta de formação dos professores, esse é um fator que influencia de
maneira determinante o resultado das atividades desenvolvidas em
Informática Educativa.
E assim, para fundamentarmos nossas idéias baseadas na
realidade descrita acima, lembramos as premissas levantadas por
115
Schlünzen (2000, p. 223) que prevê que “a criação de um ambiente
construcionista, contextualizado e significativo requer uma mudança
de ordem pedagógica e administrativa. Portanto, não deve ser
implantada somente na sala de aula e, sim, em toda a escola.” Da
mesma forma, a autora ressalta a indispensabilidade do trabalho
integrado entre coordenador pedagógico e coordenador de
Informática, pois somente de tal modo haverá integração entre os
aspectos pedagógicos e os aspectos técnicos de utilização da
Informática na Educação, o que constituirá uma base de apoio aos
professores para o desenvolvimento de suas práticas.
Além dos aspectos até o momento analisados, acreditamos que
existem outros que determinam a existência ou não dessa base de
apoio para a realização de práticas pedagógicas. Assim, quando
traçamos os objetivos a que este estudo se proporia no início do
caminho investigativo, procuramos identificar fatores que,
acreditamos, exercem influências significativas no desenvolvimento
de práticas em Informática Educativa no atual contexto da educação
inclusiva. Por isso, além de nos preocuparmos com questões
relacionadas à formação dos professores para o uso pedagógico do
computador, à abordagem de utilização do computador com fins
pedagógicos e ao envolvimento das escolas para o desenvolvimento
de tais práticas, buscamos identificar quais as concepções dos
professores sobre a utilização da Informática no processo de inclusão
de alunos com NEEs, para que, ao término deste estudo, pudéssemos
responder ao problema de pesquisa proposto no início deste trabalho.
116
Ao longo do processo de desenvolvimento humano, como nos
lembra Carvalho (2002), os homens vêm construindo uma história de
luta pelo respeito aos seus direitos básicos como cidadãos. Como
reflexo dessa história, cria-se um novo conceito de educação,
fundamentando em concepções de cunho social, político e cultural,
que determina que as escolas devem estar abertas às diferenças,
respeitando e ressignificando a diversidade humana. No entanto, hoje
sabemos que essa escola apenas se efetivará quando houver uma
melhora nos sistemas de ensino e uma mudança na postura e
concepção da sociedade em relação às pessoas com NEEs.
Ressaltamos que para que essa melhora nos sistemas de ensino
seja possível, existem alguns fatores que são determinantes e por isso
precisam estar presentes nesta discussão. Assim, como primeiro e
mais importante aspecto, acreditamos estar as questões relacionadas à
formação dos professores para trabalhar em um sistema de educação
que pretende ser inclusivo. Sabemos que a LDB, Lei nº 9.394/96,
quando prevê principalmente aos alunos com NEEs adaptações
necessárias para atender suas necessidades, prevê também capacitação
ou formação para os professores; e, da mesma forma o PNE aprovado
pela Lei nº 10.172/01 propõe aos professores em exercício a educação
continuada, incentivando a formação desses em instituições de ensino
superior que os guiarão no desenvolvimento de estudos e pesquisas
sobre as diversas áreas relacionadas com os alunos que possuem
NEEs. No entanto, fazendo uma correlação entre o que está previsto
nas legislações que regem o ensino no país com as práticas que estão
sendo desenvolvidas nas escolas públicas, veremos que continuamos
117
não conseguindo proporcionar aos professores condições ideais de
trabalho.
Novamente esbarramos no obstáculo “falta de formação” para
a efetivação prática, com qualidade, de uma política nacional.
Conforme os professores entrevistados, a maior dificuldade
encontrada para trabalhar com os alunos incluídos é exatamente o não-
conhecimento de aspectos mais específicos relacionados às
necessidades desses alunos.
Tenho dificuldades em relação à inclusão. Gostaria de ter formação porque assim: eu sei que é psicótico porque a educadora especial disse, e a outra aluna que eu nem sei o que é que ela tem, como eu vou trabalhar com ela? (Professor B) A inclusão é uma coisa que não nos prepararam pra isso. Eu me formei em 1991, não é recente, mas também não faz tanto tempo, e de repente eu me deparei com alunos incluídos na minha sala de aula. Não nos prepararam para isso, de repente muda a lei e tu não ta capacitado e tem que assumir. Ta ali, ta na tua sala. Eu acho que primeiro nós deveríamos ter sido preparadas para trabalhar com essas crianças. (Professor A)
Citam ainda como outro fator determinante para que consigam
desenvolver uma prática pedagógica eficaz, contextualizada com a
realidade dos alunos e capaz de motivá-los a superar suas
dificuldades, aspectos como a carga horária e a falta de
comprometimento de todos os professores das escolas.
118
Eu sou preocupada, tento inovar, mas meu tempo é curto. Eu trabalho de manhã, de tarde e de noite, tu entende, fica complicado. Eu tento, no começo eu me sentia muito angustiada, culpada porque em vez de tu formar tu deforma. (Professor B) Eu trabalho com alunos que tem NEEs desde 2002. Eu acho que a gente deveria ter uma estratégia diferente para trabalhar com eles, conseguir planejar mais, mas eu tenho 40 horas, três turmas de ensino médio e essa de alfabetização e não tenho tempo para isso. Eu queria fazer alguma coisa diferenciada com a minha aluna desse ano porque eu sei que ela renderia mais, mas eu não consigo chegar nesse ponto de ter tempo para determinada coisa. É difícil. E as crianças é que perdem com isso. Tu vai para casa pensando “poxa, poderia ser diferente”. Tu quer fazer a coisa diferente, mas tu não consegue. Não é a escola, é o todo, é o sistema que te prejudica. (Professor A) Percebo que a escola se envolve com esses alunos, mas eles vão bem até a quarta-série, quando chegam na quinta-série levam um susto e sempre tem aqueles que questionam e não querem receber os alunos incluídos. Como se os alunos devessem chegar na quinta-série com um padrão médio alto para conseguir acompanhar o conteúdo. Não há preocupação com as dificuldades dos alunos? (Professor C)
Já havíamos discutido sobre as dificuldades encontradas há
muito tempo pelos professores para promover uma educação que
possibilite aos seus alunos melhores condições de atuação na
sociedade. Entre os fatores levantados encontramos a desvalorização
da profissão, que leva à baixa remuneração profissional que, por sua
119
vez, faz com que os professores assumam uma carga horária muito
elevada, que conseqüentemente não possibilita que os mesmos tenham
um tempo reservado ao planejamento e aos estudos... e assim, como
um fator desencadeia outro, acreditamos não precisar continuar
pontuando tantos outros ora esquecidos nesta relação.
Contudo, descobrimos que os professores estudados percebem-
se capazes de superar tais obstáculos, pois, apesar de não possuírem
formação em Informática Educativa e tampouco em Educação
Inclusiva, encontram-se trabalhando com alunos que possuem NEEs
em ambientes informatizados. Buscam libertar-se dos métodos
tradicionais de ensino, da cópia, da memorização de conteúdos porque
se sentem comprometidos com o desenvolvimento dos seus alunos e
têm consciência de que, sem a coragem de ousar trabalhar com
métodos diferentes, não conseguirão alcançar a velocidade com que a
sociedade contemporânea vem-se desenvolvendo.
Nessa perspectiva, temos a utilização do computador como um
recurso capaz de democratizar o acesso ao conhecimento para todos os
alunos, corroborando então com o ideal de Educação Inclusiva.
Sabemos que, para que tal proposta se efetive realmente, é
preciso que haja um comprometimento com os fatores relacionados à
utilização da Informática na Educação, conforme já discutimos, e
também uma postura positiva dos professores e da comunidade
escolar em relação às pessoas com NEs. Urge que acreditemos nas
possibilidades desses alunos para que estejamos motivados e aptos a
motivá-los, na superação dos obstáculos em busca do alcance de sua
120
aprendizagem e desenvolvimento. A esse respeito os professores
afirmam
Eu acho que os alunos incluídos na escola têm avanços, só que eles têm um desenvolvimento mais lento. Mas agora tu vê, nós temos crianças ditas normais com dez anos na primeira série, então que patamar que vai se estabelecer? Que paralelo dá para se faze,r né? (Professor A) Eu vejo benefícios no projeto de inclusão, pela minha experiência consigo enxergar muitos aspectos positivos. (Professor C) Faz oito anos que eu estou aqui na escola e desde então eu venho trabalhando com a inclusão. Quando cheguei eu me assustei um pouco com isso porque eu nunca tinha trabalhado, pensei “Meu Deus, o que é que eu faço?!”, mas as coisas foram acontecendo. É um desafio realmente, a gente sabe que tem problemas, mas eu acho que tem que ser uma adaptação meio a meio, né, o aluno se adaptar à sala e a sala se adaptar ao aluno. A gente tem trabalhado sem maiores problemas, adaptando as formas de trabalhar. (Professor C) Trabalho com a inclusão desde março deste ano (2004), consegui notar progresso esse ano em dois dos quatro alunos que tenho incluído. A relação da turma com eles é muito boa. Na verdade eu tenho uma turma muito diversificada, então eu tenho que preparar vários materiais, vários trabalhos diferenciados. Também procuro fazer com que aqueles que estão mais adiantados ajudem os outros, sabe, bem Vygotsky mesmo, e eles ajudam muito, muito mesmo. (Professor B)
121
Ousamos constatar nesse momento, partindo das falas acima
expostas, que existe, sim, a crença de que é possível alcançarmos
avanços significativos na aprendizagem dos alunos com NEEs quando
esses se encontram atuando em espaços não segregados de produção
de conhecimento e, dessa forma, compreendemos o desenvolvimento
das práticas em Informática Educativa que serviram como base para
este estudo, como uma aposta no desenvolvimento desses alunos.
Carvalho (2004, p. 80) já afirmava que o ideário da Educação
Inclusiva não se apresenta como uma “tarefa fácil, mas felizmente
também não se trata de missão impossível. Alicerçados nos princípios
democráticos, sustentados por marcos conceituais e por resultados de
pesquisas, devemos ter crença no potencial humano; a certeza de que
todos podem aprender e de que existe a vontade sincera de provocar
mudanças.” E, oportunamente a referida autora (2004, p. 80) ainda
avisa-nos que
Ainda que, aparentemente, por caminhos ideológicos distintos, todos os educadores de boa-vontade, lutam por escolas responsivas e que exercitem a cidadania de sujeitos solidários, participativos, emancipados e com capacidade crítica e reflexiva para dirigir, eticamente, seu próprio destino e contribuir para o bem-comum.
Assim, concordando com a autora acima referendada,
acreditamos que os professores entrevistados têm como suporte para o
desenvolvimento das atividades no laboratório de Informática com os
alunos que possuem NEEs suas convicções de que se trata de uma
122
prática difícil, porém, possível, mas, principalmente necessária. Dessa
forma os resultados vislumbrados são positivos.
A menina que eu tenho é hiperativa, então para ela se concentrar em sala de aula é um sacrifício. E lá (laboratório) eu vejo que ela se concentra um pouco mais em função do computador. Ela tem nove anos e agora está conseguindo se alfabetizar. Esse ano ela evoluiu, está reconhecendo letras e associando os sons. (...) tenho certeza que a Informática ajudou nesse progresso que ela teve. (Professor A) Aqui no laboratório eles também se ajudam. Os alunos que tem dificuldades trabalham com aqueles que tem mais facilidade. Eles estão se procurando porque eles estão aprendendo um a trabalhar com o outro. (...) São crianças muito lindas que estão aprendendo com consciência do que estão fazendo. (Professor B) Eu acredito que o trabalho aqui do laboratório ajuda muito no trabalho em sala de aula. Ajuda bastante, esse de cálculo, por exemplo, eles acertam aqui e entendem o que fizeram, quando vão para a sala de aula acertam também. (Professor B) Esse ano o aluno que eu tenho é um caso mais complicado. Ele é agitado, tem algumas coisas que ele não quer fazer, então ele atira o material no chão. Nos dias que ele veio na aula e eu fui para o laboratório com a turma ele estava agitado, desligou o computador várias vezes então eu ainda não consegui ver progressos no desenvolvimento dele. Mas com os alunos dos outros anos, sim,
123
conseguia ver benefícios nesse trabalho, com todos os alunos, não só os incluídos. (Professor C) Eu trabalho com um aluno que estava antes na classe especial e agora está incluído. Notei melhora no comportamento dele. Agora ele está menos nervoso, menos violento. Hoje ele me ouve mais. (Professor E)
Sabemos que o direito à igualdade de oportunidades previsto
como dever da escola inclusiva não consiste em oferecer um modo
igual de educar a todos, mas sim de oportunizar a cada aluno o que ele
necessita, em função de suas peculiaridades, para que possa ter as
mesmas possibilidades de construção de conhecimentos e de avanços
no seu desenvolvimento dentro das escolas e, para que possa usufruir
dos mesmos espaços sociais que as pessoas que não possuem NEEs.
Nesse sentido, vimos que a metodologia de aplicação das
atividades realizadas nos laboratórios de Informática depende de uma
gama de fatores que, por sua vez, influenciam-se entre si. Assim, o
modo como o computador é utilizado no trabalho com os alunos que
possuem NEEs vai depender do modo como o professor desenvolve
suas atividades com os alunos em sala de aula; de sua formação (ou
não) para desempenhar tal função; de suas concepções, das
concepções do coordenador do laboratório, do envolvimento das
escolas com as propostas de utilização da Informática Educativa e de
educação inclusiva e das características individuais dos alunos.
Portanto, como estamos com este estudo caminhando por um
solo ainda muito fértil e pouco explorado, concluímos que as práticas
analisadas, ainda que não apresentem condições ideais de
124
desenvolvimento, constituem-se como uma aposta no futuro. Falamos
em processos dinâmicos e não estanques, que a cada momento podem
evoluir, melhorar, transformar-se, e assim, finalizamos este momento
do trabalho e passamos a indicar aspectos que acreditamos poderão
colaborar com a utilização da Informática Educativa para que a
mesma se constitua cada vez mais como uma prática pedagógica que
favoreça o processo de inclusão de alunos com NEEs.
5.1 Considerações Finais
Estamos nos aproximando do final deste caminho
investigativo, e, portanto, temos a necessidade de escrever algumas
palavras para concluí-lo. Sabemos que o fenômeno ora analisado nesta
dissertação de mestrado continua com o seu movimento
acompanhando o dinâmico desenvolvimento da humanidade,
influenciando e sendo influenciado por outros tantos fatores aqui não
abordados. Assim, lembramos que as conclusões a que chegamos com
a finalização desta pesquisa não têm a pretensão de propor um ponto
final à temática estudada. Esperamos, sim, que, através da elucidação
daquilo que apreendemos no transcorrer desse percurso, possamos
despertar em outros pesquisadores sociais novas reflexões e
questionamentos acerca do tema em questão, e que esses, motivados
pelo mesmo desejo de conhecer, acabem inserindo-se nessa incerta,
porém contagiante, área da pesquisa científica.
O objetivo que nos propomos neste momento busca apontar as
considerações a que chegamos ao final do trabalho. Estamos cientes
de que tais considerações apresentarão limites, pois foram construídas
tendo como base um estudo que também apresenta suas limitações,
sejam elas de ordem teórica, de ordem metodológica ou de concepção
da autora. No entanto, na nossa compreensão, tais limites podem
também apontar para a possibilidade de este estudo ser visto com
outros olhos, sob um outro viés e, assim, a partir daquilo que não foi
aqui explorado, teremos novas contribuições para que o processo de
utilização da Informática na educação inclusiva se constitua cada vez
127
mais como uma prática que favoreça o processo de inclusão dos
alunos com NEEs.
O desenvolvimento de práticas pedagógicas no atual contexto
educacional deve primar pela realização de atividades desafiadoras,
que instiguem nos alunos a capacidade de criação, de descoberta e de
construção de conhecimentos. Nesse contexto, o computador
apresenta-se atualmente como um recurso capaz de possibilitar que os
alunos desenvolvam tais habilidades.
No entanto, partindo da realidade analisada, constatamos que,
apesar de o processo de utilização do computador nas escolas
encontrar-se em pleno desenvolvimento, ainda não encontramos uma
transformação significativa nas práticas pedagógicas.
Nesse sentido, ressaltamos a necessidade de haver um maior,
mais constante e mais estruturado acompanhamento dos órgãos
competentes nas práticas pedagógicas desenvolvidas frente ao
computador nas escolas, pois detectamos que há nessas instituições
posturas profissionais que vêm de encontro às diretrizes e metas
traçadas pelo ProInfo.
A falta de formação dos professores constitui-se hoje, no nosso
ponto de vista, no principal problema a ser enfrentado. Acreditamos
que as ações desenvolvidas pelo NTE não estão sendo suficientes para
atender a demanda crescente de professores que precisariam possuir
maiores e mais específicos conhecimentos para a utilização da
Informática em suas práticas pedagógicas.
Acreditamos ainda que é exatamente a falta de conhecimento
(ou de formação) que resulta na realização de práticas em Informática
128
Educativa não tão eficientes. Estamos aqui nos referindo
principalmente a predominância de posturas instrucionistas, tanto dos
professores das salas de aula quanto dos coordenadores dos
laboratórios frente ao computador e, que, sabemos, acarretam
basicamente atividades instrucionistas dentro dos laboratórios. A
predominância do trabalho sob essa abordagem é, para nós,
conseqüência direta do desconhecimento dos professores acerca de
outras maneiras de utilizar os computadores.
É fato que, já há alguns anos, a tendência das pesquisas
desenvolvidas na área, e a linha dos cursos de formação em
Informática Educativa advertem-nos quanto à inadequação de tal
abordagem no que tange à construção efetiva de conhecimentos,
apontando, sim, para o construcionismo como sendo a perspectiva
capaz de favorecer a aprendizagem dos alunos. No entanto, ainda
encontramos significativos obstáculos para que as práticas em
Informática Educativa se efetivem sob essa abordagem.
Lembramos também que o não-envolvimento de outros setores
das escolas com as atividades desenvolvidas nos laboratórios de
Informática é um fator merecedor de destaque nas práticas estudadas.
Não há nas escolas uma preocupação com as atividades que estão
sendo realizadas no laboratório de Informática, ficando essa
preocupação apenas como “obrigação” dos coordenadores dos
laboratórios e dos professores que lá trabalham com seus alunos.
Diante dessa realidade, perguntamo-nos quem acompanha o que está
sendo trabalhado nos laboratórios? Existe uma troca de informações
129
sobre as atividades lá desenvolvidas? Em que medida tais atividades
estão inseridas no currículo escolar?
Ressaltamos que estamos neste momento referindo-nos às
escolas de modo geral. Logicamente que tivemos condições de
detectar casos isolados de atitudes muito positivas em relação ao uso
da Informática na Educação, já ressaltados durante a análise dos dados
nesta pesquisa. Não estamos aqui querendo passar a impressão de que
as práticas analisadas são merecedoras apenas de críticas e não
possuem aspectos positivos a ser enfatizados. No entanto,
compreendemos que uma pesquisa que se propõe a analisar um
fenômeno social não pode, frente aos fatos, eximir-se de revelar dados
que precisam ser no mínimo questionados, com vistas a uma possível
transformação e/ou ressignificação.
Tendo como base os objetivos traçados no início do estudo, os
dados coletados e a análise construída em relação aos mesmos,
podemos finalmente concluir que, apesar dos obstáculos existentes e
que precisam ser superados em médio prazo, a forma como a
Informática Educativa está sendo concebida e utilizada pelos
professores com os alunos que possuem NEEs favorece o processo de
inclusão desses alunos. Ainda que apresente significativas limitações,
a prática pedagógica dos professores entrevistados está possibilitando
que todos os seus alunos, tenham eles ou não NEEs, vivenciem
atividades frente ao computador. Nesse sentido, mesmo que a
aprendizagem de conteúdos não seja diretamente favorecida,
acreditamos que o uso do computador de forma democrática,
igualitária e não excludente proporciona aos alunos com NEEs em
130
processo de inclusão o desenvolvimento da autonomia, da auto-
estima, de aspectos sociais e cognitivos do desenvolvimento, que por
sua vez possibilitam que esses alunos sintam-se parte integrante dessa
turma, rompendo com processos de isolamento e permitindo que eles
possam interagir com seus colegas.
Percebemos que, ainda que esses professores não tenham sido
preparados para a educação inclusiva (conforme eles mesmos
afirmam), os professores receberam esses alunos e com eles
estabeleceram uma relação de confiança em suas capacidades.
Encontram, apesar das dificuldades, aspectos positivos a ser
lembrados e apostam nos benefícios desse trabalho. Afirmam também
em seus relatos que observam benefícios em relação à aprendizagem
dos alunos com as atividades frente ao computador, para as quais
procuram relacionar conteúdos, adaptar atividades e até em alguns
casos propor desafios e/ou problemas a ser resolvidos.
Acreditamos que o fato de termos encontrado professores que,
mesmo sem possuir formação em Informática Educativa e tampouco
em Educação Inclusiva, realizam suas práticas pedagógicas
preocupados com o desenvolvimento e aprendizagem de seus alunos,
merece ser ressaltado. Sabemos que, quando optamos pela carreira
educacional, estamos assumindo um compromisso com o
desenvolvimento humano e só por isso talvez pudéssemos afirmar que
tais professores apenas estão demonstrando competência e cumprindo
esse compromisso. No entanto, não podemos ignorar o fato de que a
formação inicial de tais professores não lhes deu embasamento para
estar trabalhando com alunos que possuem NEEs e que, prevista em
131
lei como garantia da qualidade desejada aos sistemas de ensino
inclusivos, a formação dos professores para atuar nessa realidade
constitui-se hoje como um direito adquirido por tais profissionais no
momento em que receberam em sua sala de aula alunos em processo
de inclusão.
Logicamente sabemos que estamos tratando de um processo
lento que se encontra em início de caminhada. Ainda é preciso que
haja uma mudança de concepção e de atitudes em relação às pessoas
com NEEs. É preciso que todos tenham consciência de que, por uma
questão de direito, assim como as pessoas que não possuem NEEs, os
cidadãos com NEEs devem ter a possibilidade de freqüentar os
mesmos espaços sociais e cumprir os mesmos papéis na sociedade.
Dentro desse contexto, a escola inclusiva também se estrutura para
podermos em breve (sejamos otimistas, assim falou Savater (2000))
presenciar a valorização da diversidade humana materializar-se em
práticas pedagógicas predominantemente inclusivas que proporcionem
que todos os alunos tenham acesso ao conhecimento historicamente
produzido. E, nessa perspectiva, a utilização do computador
representa um início de democratização do acesso ao conhecimento.
Assim, ao nos aproximarmos do final deste trabalho, embora
não tenhamos a presunção de apontar um modelo ideal de prática em
Informática Educativa, reiteraremos alguns aspectos que julgamos
necessários para que a mesma se constitua como uma prática
pedagógica que favoreça o processo de inclusão de alunos com NEEs:
- em relação à formação dos professores, acreditamos que é
preciso que seja estabelecida uma linha de ação bem definida, na qual
132
o coordenador do laboratório de Informática tenha como uma de suas
ações proporcionar a efetiva formação dos professores das salas de
aula, para que os mesmos tenham autonomia nas ações do laboratório
e para que esse espaço se torne efetivamente um ambiente
construcionista de produção de conhecimentos;
- quanto às funções desempenhadas pelo NTE, ressaltamos a
importância de um maior acompanhamento das atividades realizadas
nos laboratórios, bem como a realização com mais freqüência de
cursos de formação para novos coordenadores dos laboratórios e
cursos de formação continuada para os coordenadores que foram
inicialmente formados;
- enfatizamos também a necessidade de haver um maior e mais
sistemático envolvimento das escolas com as atividades relacionadas
ao uso pedagógico do computador. É preciso que as atividades em
Informática Educativa estejam presentes no Projeto-Político-
Pedagógico das escolas, pois assim farão parte do planejamento das
atividades como um todo;
- consideramos igualmente importante que o educador especial
da escola participe do planejamento das atividades que serão
desenvolvidas nos laboratórios, visando assim que sejam feitas as
adaptações necessárias para os alunos com NEEs.
Embora reconheçamos a existência de aspectos que se fizeram
presentes nas entrelinhas deste estudo, principalmente no momento da
análise dos dados, esclarecemos que preferimos não analisá-los, em
virtude de compreendermos que isso fugiria aos objetivos traçados no
início da pesquisa. Assim, buscando concluir estas considerações
133
finais, indicamos novos caminhos a ser percorridos por aqueles que se
permitirem adentrar no campo da pesquisa social. Considerando os
dados analisados, acreditamos que alguns fatores muito significativos
emergiram e por isso precisam ser pesquisados aprofundadamente,
como os aspectos relacionados às atividades desenvolvidas pelo NTE
(formação, formação continuada, avaliação das atividades
desenvolvidas, acompanhamento nas escolas, periodicidade dos
cursos...); ou mesmo os aspectos relacionados às práticas
desenvolvidas nas escolas (levantamento dos professores formados,
acompanhamento dos resultados alcançados pelos alunos,
identificação das dificuldades, interação entre professores que usam o
laboratório, sistemática de planejamento das atividades, papel do
educador especial nesse processo...).
Finalizamos então este trabalho, acreditando que a grande
contribuição proveniente do mesmo decorre da possibilidade de que
os professores e as pessoas envolvidas com as atividades de
Informática nas práticas em Educação Inclusiva possam, após uma
leitura crítica do mesmo, analisar suas práticas, repensar e reelaborar a
forma como as conduzem, se assim julgarem necessário.
RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS
ALMEIDA, M. E. ProInfo: Informática e Formação de professores. Brasília: SEED/MEC, 2000.
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141
Anexo 1: Carta de apresentação do projeto para a 8ª Coordenadoria de Educação solicitando autorização pra o desenvolvimento da pesquisa nas escolas
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Santa Maria, 05 de agosto de 2004 Ilma Srª Coordenadora da 8ª Coordenadoria de Educação Prezada Senhora
A temática “Informática e Educação inclusiva” é um objeto de estudo recente e que se constitui como um dos grandes desafios da Educação nos dias de hoje. Nesse contexto, venho desenvolvendo minha pesquisa como mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria sob o título “Informática e Educação Inclusiva: articulando uma prática possível”.
Pretendo através deste estudo analisar as práticas Educativas envolvendo a utilização da Informática na Educação inclusiva e os benefícios que tais práticas proporcionam ao processo de inclusão e aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados no ensino regular.
142
Para tanto, venho através deste solicitar a sua autorização para a realização da coleta dos dados nas escolas CECP, EPC, EEBÉ e EEEF, durante os meses de agosto e setembro de 2004.
Desde já agradeço.
________________________ ________________________ Eliana C. Pereira Soraia Napoleão Freitas Mestranda PPGE/UFSM Prof.ª Dr.ª Orientadora do projeto
143
Anexo 2: Carta da 8ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação) encaminhada as escolas autorizando a realização da pesquisa
144
Anexo 3: Carta de apresentação às Escolas onde a pesquisa foi realizada
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Santa Maria, 05 de agosto de 2004 Ilma Srª Diretora da Escola ....... Prezada Senhora
A temática “Informática e Educação inclusiva” é um objeto de estudo recente e que se constitui como um dos grandes desafios da Educação nos dias de hoje. Nesse contexto, venho desenvolvendo minha pesquisa como mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria sob o título “Informática e Educação Inclusiva: articulando uma prática possível”.
Pretendo através deste estudo analisar as práticas Educativas envolvendo a utilização da Informática na Educação inclusiva e os benefícios que tais práticas proporcionam ao processo de inclusão e aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados no ensino regular.
Para tanto, venho através deste solicitar a sua autorização para o desenvolvimento desse estudo nesta escola através da realização de entrevistas com os professores do ensino regular que trabalham com
145
alunos que possuem necessidades especiais no laboratório de Informática, conforme liberação da 8ª CRE.
Desde já agradeço.
________________________ ________________________ Eliana C. Pereira Soraia Napoleão Freitas Mestranda PPGE/UFSM Prof.ª Dr.ª Orientadora do projeto
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Anexo 4: Carta de apresentação da pesquisa aos professores pedindo a colaboração para a realização das entrevistas
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Santa Maria, 09 de agosto de 2004 Prezada Professora
Venho por meio deste solicitar a sua colaboração no sentido de participar na condição de sujeito da pesquisa de dissertação de mestrado intitulada “Informática e Educação Inclusiva: articulando uma prática possível”, cujo objetivo é compreender como a Informática está sendo trabalhada com alunos incluídos no sistema regular de ensino.
Desde já agradeço.
________________________ ________________________ Eliana C. Pereira Soraia Napoleão Freitas Mestranda PPGE/UFSM Prof.ª Dr.ª Orientadora do projeto
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Anexo 5: Roteiro da entrevista aplicada ao professor do Núcleo de
Tecnologia Educacional de Santa Maria – RS
Nome:
Formação:
Tempo de atuação no NTE:
Área de atuação:
1. Como você teve contato com a Informática Educativa? Descreva
seu processo de formação em Informática Educativa (Qual o curso que
você fez, data, local, tempo de abrangência, demais características).
2. Como está constituída atualmente a equipe técnica deste NTE?
3. Quais as atividades desenvolvidas por vocês? Qual a abrangência
dos trabalhos desenvolvidos?
4. Quais as teorias que fundamentam as práticas da equipe técnica
deste NTE?
5. Falando mais especificamente do trabalho desenvolvido por você,
quem são os professores que você forma?
6. Quais os objetivos dos cursos de formação para professores que
trabalham com alunos que possuem NEEs e para professores que não
trabalham com esses alunos?
148
7. Existem diferenças entre os cursos de formação em Informática
Educativa realizado com os professores do ensino regular e com os
professores do ensino especial?
8. Especificamente, em que se constituem tais diferenças? Descreva
esses cursos:
9. Sabemos que atualmente, de acordo com o paradigma da Educação
inclusiva, os alunos com NEEs devem estudar em salas de aula do
ensino regular. Aqui no NTE vocês consideram tal processo quando
desenvolvem seus cursos de capacitação com os professores do ensino
regular?
10. Como acontece o processo de escolha das escolas e do número de
vagas para cada uma?
11. Quão indispensável é para você que os professores tenham
formação pra trabalhar com Informática Educativa?
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Anexo 6: Roteiro da entrevista aplicada aos professores da rede
regular de ensino de Santa Maria/RS
Entrevista com os professores
Nome:
Formação:
Tempo de atuação em sala de aula:
Área de atuação:
1. Você trabalha com seus alunos no laboratório de Informática?
Recebeu formação para realizar tal trabalho?
2. Se sim, descreva seu processo de formação em Informática
Educativa (Qual o curso que você fez, data, local, tempo de duração,
demais características).
3. De acordo com suas experiências práticas, qual a sua opinião em
relação a esses cursos? Em que medida os conhecimentos construídos
durante o mesmo embasam sua prática em Informática Educativa?
4. Como acontece o processo de escolha dos professores que
foram/são capacitados dentro da sua escola? (Critérios uilizados)
5. Em que teorias você embasa sua prática em Informática Educativa
para o desenvolvimento de suas atividades no laboratório de
150
Informática? Você pode descrever algumas características de sua
prática para mim?
6. Quais as dificuldades que você encontra para a utilização da
Informática em suas práticas pedagógicas?
7. Como a Informática se insere na organização do currículo e se
materializa em práticas pedagógicas na sua sala de aula?
8. Qual o envolvimento da escola no desenvolvimento de práticas
pedagógicas que utilizam a Informática?
9. Quais são suas concepções sobre:
- Informática Educativa?
- inclusão de alunos com NEEs no ensino regular?
10. Há quanto tempo você está trabalhando com alunos que possuem
necessidades especiais? Descreva sua experiência com a inclusão,
apontando suas principais dificuldades.
11. Quais os seus objetivos no trabalho com os alunos incluídos?
Quais são os aspectos em relação aos alunos com NEEs lembrados por
você quando você realiza seu planejamento?
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12. Levando em consideração suas vivências, quais são suas
expectativas em ralação à Educação inclusiva?
13. Como você percebe o trabalho desenvolvido com os alunos que
possuem necessidades especiais matriculados nas turmas regulares na
sua escola?
14. Para você, qual é a contribuição da Informática no processo de
aprendizagem dos seus alunos?
15. Em relação a inclusão de alunos com NEEs, quais os benefícios
que você observa com a utilização da Informática Educativa?
16. Como a tecnologia pode enriquecer o ambiente da sala de aula,
transformando-o em um ambiente mais inclusivo?
17. Existe uma aproximação entre as atividades do laboratório de
Informática com os objetivos de seu planejamento?
18. Com que freqüência você desenvolve atividades no laboratório de
Informática? Todos os alunos conseguem utilizar o laboratório de
Informática? Todos utilizam?
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19. A temática “Informática e Educação inclusiva” é um objeto de
estudo recente e que se constitui como um dos grandes desafios da
Educação nos dias de hoje. Para você, quais são os elementos
necessários à formação dos professores em Informática Educativa para
que a utilização da Informática favoreça o processo de inclusão e
aprendizagem dos alunos com NEEs matriculados no ensino regular?