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ANATEL DISCRIMINAÇÃO DE CHAMADAS TELEFÔNICAS LOCAIS Maio/2008 AÇÃO: enviar, acompanhando o documento de cobrança, relação discriminada das chamadas locais efetuadas a partir do terminal do usuário SÍNTESE DO PEDIDO : requer a condenação da prestadora de Serviço telefônico fixo comutado - STFC a emitir relação discriminada das chamadas locais efetuadas; a repetição dos valores cobrados a título de pulsos excedentes em dobro (acaso dirigido o pedido também à Anatel); bem como a condenação da Anatel a compelir as concessionárias ao cumprimento da obrigação imposta. ELEMENTOS DE FATO : cobranças de prestação de STFC anteriores a agosto de 2008, quando, em razão da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ainda não era obrigatória a discriminação dos pulsos telefônicos locais. A partir da data referida, todas as prestadoras ficaram obrigadas a fornecer, desde que solicitada, a relação detalhada das chamadas locais efetuadas. Nos locais em que não foi possível a implantação da tecnologia necessária, ficou proibida a cobrança de chamadas excedentes à franquia oriunda do pagamento da assinatura básica. PREQUESTIONAMENTO : é recomendável o prequestionamento relativo à afronta aos artigos 7º, 25 e 31, inciso I, da Lei 8.987/95; ao artigo 6º, X, da Lei 8.078/90 e aos artigos 19 e 83 da 9.472/97, para efeito de futura interposição dos recursos excepcionais.

Discriminação de Chamadas Telefônicas Locais - Mai 2008

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Defesa jurídica - discriminação de chamadas telefônicas

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ANATEL

DISCRIMINAÇÃO DE CHAMADAS TELEFÔNICAS LOCAIS

Maio/2008

AÇÃO: enviar, acompanhando o documento de cobrança, relação discriminada das chamadas locais efetuadas a partir do terminal do usuário

SÍNTESE DO PEDIDO: requer a condenação da prestadora de Serviço telefônico fixo comutado - STFC a emitir relação discriminada das chamadas locais efetuadas; a repetição dos valores cobrados a título de pulsos excedentes em dobro (acaso dirigido o pedido também à Anatel); bem como a condenação da Anatel a compelir as concessionárias ao cumprimento da obrigação imposta.

ELEMENTOS DE FATO: cobranças de prestação de STFC anteriores a agosto de 2008, quando, em razão da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ainda não era obrigatória a discriminação dos pulsos telefônicos locais.

A partir da data referida, todas as prestadoras ficaram obrigadas a fornecer, desde que solicitada, a relação detalhada das chamadas locais efetuadas. Nos locais em que não foi possível a implantação da tecnologia necessária, ficou proibida a cobrança de chamadas excedentes à franquia oriunda do pagamento da assinatura básica.

PREQUESTIONAMENTO: é recomendável o prequestionamento relativo à afronta aos artigos 7º, 25 e 31, inciso I, da Lei 8.987/95; ao artigo 6º, X, da Lei 8.078/90 e aos artigos 19 e 83 da 9.472/97, para efeito de futura interposição dos recursos excepcionais.

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TESE DE DEFESA

II – DAS PRELIMINARES

II. i. Da ausência de interesse de agir - perda do objeto da ação

Como adiante será demonstrado, o pleito em análise perdeu seu objeto. Com efeito, desde 01/08/2007, tornou-se obrigatório, sempre que solicitado à prestadora, o fornecimento de relação discriminada de todas as chamadas locais efetuadas pelo usuário. Onde não foi possível a implementação de tal serviço, ficaram as concessionárias proibidas de cobrar pelas chamadas locais. Nestas localidades, passou-se a ser cobrada tão-somente a tarifa básica.

Destarte, o autor carece de interesse processual, uma vez que já está disponível, independentemente de condenação judicial, o bem da vida pleiteado. In casu, intenta o demandante a emissão de cobrança acompanhada de relação discriminada de cada ligação efetuada a partir de seu terminal. Ocorre, contudo, conforme se comprovará, que tal pleito tornou-se obrigação das prestadoras do serviço de telefonia fixa, nos termos do contrato de concessão, desde agosto de 2007.

Bem por isso, não há, no caso posto, utilidade do provimento jurisdicional, razão por que deve ser extinto o processo sem julgamento de mérito.

III. ii. Da ilegitimidade passiva da Agência Nacional de Telecomunicações para integrar o pólo passivo da demanda formulada.

Cabe salientar, por extremamente oportuno, a competência reservada pela Carta Magna vigente à Autarquia demandada. A Constituição Federal de 1988, com a redação que lhe foi dada pela Emenda n.º 8 de 1995, prevê a criação de um órgão regulador do setor de telecomunicações.

Tendo em vista o mandamento constitucional, foi criada a Agência Nacional de Telecomunicações. Sua atribuição primordial é a regulamentação do setor de telecomunicações. Incumbe-lhe, ainda, como conseqüência necessária do seu papel institucional, a fiscalização das pessoas privadas delegatárias dos serviços de telecomunicações.

A Anatel foi criada com o objetivo de organizar a exploração dos serviços de telecomunicações, de modo a evitar que as pessoas privadas pratiquem o abuso de poder econômico, lucrando excessivamente à custa dos usuários, que dependem do serviço público outorgado. Destarte, seus interesses não se confundem com os das concessionárias.

O fato de a Anatel, enquanto agência reguladora, ser responsável pela regulamentação do setor não acarreta sua responsabilidade jurídica para responder às ações em que o usuário litiga com a concessionária. O ônus de qualquer condenação, nesses autos, só será suportado pela prestadora do serviço, que é quem lucra com a exploração da atividade.

Usando de uma analogia “por absurdo”, se Agência reguladora é parte legítima para demanda entre usuário e concessionária, a União deveria participar de todas as lides em que se discutisse matéria de sua competência. Assim, todas as vezes que a causa posta em Juízo envolvesse alguma das matérias elencadas nos artigos 21 ou 22 da Constituição da República, como o direito civil, por exemplo, a União deveria ser parte legítima para compor a lide.

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Importante deixar claro que a Anatel não é titular de interesse que se opõe ou resiste à pretensão da parte autora. Em outras linhas, não há lide em relação à Autarquia, contra quem a tutela jurisdicional não apresentará qualquer efeito, este restrito à Concessionária, prestadora do serviço de telecomunicação. No conflito gerado na relação entre as prestadoras do serviço e os consumidores, não há nenhum interesse da agência reguladora, senão um interesse prático que não a qualifica como litisconsorte necessária.

O vínculo entre sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada só existe com a Concessionária. Tal relação não se confunde com existente entre a Agência e o ente delegatário. Esta é marcada pelo direito administrativo, nela a Administração goza de todas as prerrogativas inerentes a esse regime. In casu, não há interesse jurídico da Agência, muito menos há relação consumerista entre Autarquia e usuário. Nesse sentido, julgado do Superior Tribunal de Justiça, proferido no ano corrente, in verbis:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. TELEFONIA FIXA. LEGITIMIDADE. ANATEL. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO NA LIDE. DETALHAMENTO DAS CONTAS. PRORROGAÇÃO DO PRAZO PARA IMPLEMENTAÇÃO DO SERVIÇO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211 DO STJ.1. Nas ações em que o autor busca o detalhamento de conta telefônica, não se faz presente o interesse jurídico da ANATEL, pois a repercussão dos efeitos da declaração da obrigação da empresa de telefonia em promover a discriminação de pulsos não atingirá sua órbita jurídica, mas tão-somente a da ora recorrente.2. A ausência de prequestionamento inviabiliza o conhecimento da questão federal suscitada. Incidência da Súmula nº 211/STJ.2. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesse ponto, improvido.(REsp 964011 / PB Relator Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (juiz convocado do TRF 1ª região) Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA. Data do Julgamento 04/03/2008. Data da Publicação/Fonte DJ 01.04.2008 p. 1)”

A pertinência subjetiva afere-se diante da relação jurídica substancial deduzida em juízo. Ou seja, a legitimidade é traduzida pela relevância que o resultado da ação produz na esfera de direitos de alguém, seja para favorecê-la ou para restringi-la. Sempre que a procedência de uma demanda seja apta a melhorar o patrimônio ou a vida do autor, ele será parte legítima; sempre que ela for apta a atuar sobre o patrimônio do réu, também esse será parte legítima.

No caso em tela, pode-se observar que a Agência Nacional de Telecomunicações não participa da relação jurídica de direito exposta pelo autor. O aspecto ativo da causa de pedir é o contrato de prestação de serviço. O aspecto passivo, ou seja, o fato lesivo do direito alegado é o “descumprimento de cláusula”. Observa-se, com clarividência, que a ANATEL não integra o contrato e, por isso, não pode descumpri-lo.

Pelo exposto, não há vínculo entre o usuário, Agência e contrato de prestação de serviço de telecomunicações. A ANATEL não está autorizada a litigar acerca de uma relação da qual não faz parte. Isto posto, requer seja a Agência ré excluída do pólo passivo, por ilegitimidade ad causam.

II. iii. Da incompetência absoluta da Justiça Federal para processar o feito.

A competência da Justiça Federal encontra-se taxativamente enumerada na Constituição Federal de 1988. É desnecessário reproduzir nos autos o texto constitucional para saber que a hipótese dos autos não se enquadra no rol de competência dos juízes federais.

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Em razão da pessoa, o constituinte dispôs que seriam levadas ao Juízo Federal as causas em que fosse parte interessada, na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, a União, suas entidades autárquicas ou empresa pública federal.

Comprovada a ilegitimidade passiva da Agência Nacional de Telecomunicações, autarquia federal, e sua conseqüente exclusão do feito, os autos devem ser remetidos para o órgão competente da Justiça Estadual, por incompetência absoluta superveniente deste Juízo.

III – DO MÉRITO – SOBRE A DISCRIMINAÇÃO DOS PULSOS TELEFÔNICOS

III. i. A Compatibilidade entre o sistema de regulação das concessões e o sistema de proteção ao consumidor.

No que tange ao argumento do autor acerca da ofensa à legislação consumerista, cabem tecer algumas considerações sobre a compatibilidade entre a política regulatória e o Código de Defesa do Consumidor.

O sistema de regulação das concessões não colide com o sistema de proteção do consumidor, ao contrário, tais subsistemas devem coexistir de forma harmônica. O Código de Defesa do Consumidor serve de complemento à Lei Geral de Telecomunicações. Isso, porque a Lei n.º 8.987/95, que regula o regime de concessões e permissões de serviços públicos, afirma expressamente, no seu art. 7º, a aplicação subsidiária do Código de Defesa do Consumidor.

Ainda no CDC, o art. 6º, X, afirma serem direitos básicos do consumidor a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. Quem define o que é “prestação eficaz e adequada” é o conjunto da regulamentação editada pela Agência Reguladora. A Lei Geral de Telecomunicações, por sua vez, contém diversos dispositivos que abrigam direitos dos usuários do serviço de telecomunicações, inclusive, com expressa referência ao sistema de proteção e defesa do consumidor, podendo ser citados, por exemplo, os arts. 3º, XI; 5º e 19, XVIII.

Extrai-se, assim, que o cumprimento da regulamentação editada pelo agente regulador implica o respeito aos direitos dos consumidores. Em outras linhas, só existirá direito do consumidor violado, quando antes for violada alguma regra definida pela Agência reguladora. Nesse sentido a argumentação de Carlos Ari SUNDFELD e Jacintho Arruda CÂMARA1:

“no caso de defesa do consumidor a legislação prevê regras de conteúdo amplo, fazendo uso quase sempre de conceitos vagos ou indeterminados. Quando sua aplicação recai sobre área não regulamentada, como ocorre na maioria das vezes em matéria de atividades econômicas, o conceito genérico é posto diretamente a disciplinar situações concretas, cabendo ao aplicador da legislação de proteção ao consumidor enquadrar ou não o caso concreto na hipótese genérica.

Portanto, a interação entre os dois sistemas regulatórios envolvidos (o de proteção ao consumidor e o de telecomunicações) leva à conclusão de que a violação de regras de proteção ao consumidor, relacionadas ao modo de cobrança pela prestação do serviço, somente poderia ser imputada às prestadoras se houvesse desobediência, por parte destas, das regras especificamente editadas pelo poder público (Ministério das Comunicações e, posteriormente, ANATEL) para disciplinar o assunto”. (Sem destaques no original)

1 Tarifas dos Serviços de Telecomunicações e Direitos do Consumidor. Fórum Administrativo – v. 2, n. 1. Belo Horizonte: Ed. Fórum, pág. 1.021, agosto de 2002.

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Com o mesmo entendimento o Superior Tribunal de Justiça, em julgado proferido em dezembro de 2007, verbis:

“RECURSO ESPECIAL – PROCESSO CIVIL E DIREITO ADMINISTRATIVO – SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÕES – TELEFONIA FIXA – TARIFA DE ASSINATURA BÁSICA – LEI GERAL DE TELECOMUNICAÇÕES X CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.(...)5. Não existe incompatibilidade entre o sistema de regulação dos serviços públicos de titularidade do estado prestados de forma indireta e o de proteção e defesa do consumidor, havendo, ao contrário, perfeita harmonia entre ambos, sendo exemplo disso as disposições constantes dos arts. 6º, inc. X, do CDC, 7º da Lei 8.987/95 e 3º, XI; 5º e 19, XVIII, da Lei 9.472/97.6. omissis.7. Recurso especial conhecido e não provido. (RESP 978629 / MG RECURSO ESPECIAL 2007/0187906-0 – Publicado no DOU em 18/12/2007, p. 266)”

Pode-se concluir, portanto, que o cumprimento das regras ditadas pela Agência nunca pode ser visto como ofensa ao sistema de proteção ao consumidor. Tais sistemas são harmônicos. Não há ofensa ao direito consumerista , quando observado o sistema normativo de regulação do setor. É este, em última análise, que delimita e dá efetividade aos conceitos amplos e indeterminados contidos no CDC. Nesse passo, forçoso reconhecer que não se pode considerar ofensivo ao consumidor conduta da Concessionária-ré, que obedece fielmente às normas editadas pelo Agente regulador do mercado.

III. ii. Sobre a ponderação de interesses dos usuários postos em conflito.

Inicialmente, cumpre ressaltar que é incontroverso, nos autos, o direito do usuário à informação adequada, o que lhe é garantido pelas Leis n. º 9.472/97 e 8.987/95, pelo Código de Defesa do Consumidor e também pela Constituição vigente. É importante esclarecer, contudo, que o exercício de direito, muitas vezes, carece de efetividade, sejam por questões jurídicas, técnicas ou financeiras.

É cediço que nem mesmo os direitos fundamentais são direitos absolutos. Muito difundida também é a classificação feita pelo Professor José Afonso da Silva sobre a eficácia das normas constitucionais. No passo dessa argumentação, não se pode discordar que se mesmo os direitos fundamentais podem ser alvo de limitações, com muito mais certeza são passíveis de restrições os direitos de natureza infraconstitucional.

Assim, é válido lembrar que a proporcionalidade, extraída no direito brasileiro do princípio do devido processo legal em sua dimensão material, funciona como espécie de termômetro para a aferição da legitimidade dos atos do Estado, âmbito em que estão inclusos os atos do Poder Legislativo. O princípio da proporcionalidade faz a censura entre adequação e necessidade.

No caso em análise, temos o confronto entre o direito do usuário à informação adequada e o custo de viabilização desse interesse, frise-se, legítimo. Não é demais recordar a premissa de que nos contratos administrativos deve ser mantida a equação econômico-financeira pactuada. Tal regra se fundamenta na índole do contrato administrativo, que se assenta no respeito mútuo de interesses.

O móvel do Poder Público é sempre o atendimento do interesse público. Para o particular, o interesse é diverso, é o lucro. A Administração deve agir com absoluta lisura e respeito aos interesses da outra parte. Nada resta ao postulante, no âmbito do contrato

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administrativo, senão a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Este é a contrapartida das prerrogativas da Administração.2

Ciente desse cenário, coube ao Poder Público traçar diretivas que melhor atendessem aos interesses dos usuários, em última análise, administrados. Ponderando os direitos dos usuários a tarifas módicas e informação, decidiu o Administrador, pautado no princípio da proporcionalidade, por uma forma de implantação do segundo direito diluída no tempo, para que se mantivesse equilibrado o primeiro. Nesse sentido, foi publicado o Decreto n.º 4.733/2003.

No exercício de seu mister, a Agência Nacional de Telecomunicações expediu as Resoluções n.º 423, de dezembro de 2005, e n.º 432, de fevereiro de 2006. A primeira Resolução tratou da alteração do modo de tarifação do serviço de telefonia fixa. A segunda Resolução, prevendo a impossibilidade do cumprimento das metas da primeira no tempo determinado, prorrogou por 1 ano o termo para cumprir a obrigação definida.

Extrai-se do período que permeou a edição das duas Resoluções – pouco mais de 2 meses – que a medida de adiamento não foi tomada em razão do descumprimento das operadoras e sim por questões de ordem técnica, reavaliadas pelos especialistas. A Agência, considerando tais questões, exerceu o dever-poder de autotutela de seus atos.

Fosse determinada pela Agência a obrigação de detalhar os pulsos imediatamente, certamente o ônus do desequilíbrio do contrato seria suportado pelo usuário, através do repasse do custo às tarifas. Como se viu, a cláusula do equilíbrio econômico-financeiro do contrato é intangível. O móvel do particular é exatamente o lucro firmado no momento da pactuação. Foi com vistas ao interesse público que a obrigação de detalhar os pulsos excedentes na conta telefônica passou a ser exigível somente em agosto do ano de 2007.

Vê-se que o ente estatal especializado no trato técnico do tema reconheceu a inviabilidade econômica de se transformar, instantaneamente, os métodos de medição. Por isso, foram estabelecidas metas diluídas no tempo, tudo com vistas a atender o interesse público, finalidade sempre perseguida pelo Administrador.

Nos termos do art. 19 da Lei n.º 9.472/97, compete à ANATEL adotar medidas necessárias ao atendimento do interesse público.

Infere-se disso a legitimidade das normas expedidas pelo órgão regulador, autorizado que foi pela Lei n.º 9.472/97. Conclui-se, ademais, que as concessionárias devem obedecer à normatização firmada pela Agência. Nesse passo, não é juridicamente exigível, antes de vencido o prazo, a obrigação de as concessionárias promoverem a instalação de aparelhos de medição de pulsos.

Além de não ser juridicamente exigível a instalação de qualquer equipamento para discriminação de pulsos, antes do termo fixado, soma-se a esta questão o óbice técnico. A discriminação automática dos pulsos somente foi viabilizada, quando todas as centrais comutadas existentes tornaram-se digitais. A meta a ser atingida foi a digitalização toda a rede. Para isto, foi assegurado um prazo, dados os custos e a complexidade técnica da medida.

A Lei que trata das concessões de serviços públicos, em seu artigo 31, I, estabelece dispositivo em que exige da concessionária a prestação do serviço adequado, na forma das normas técnicas aplicáveis.

Deste dispositivo extrai-se a ilegalidade de se impor às concessionárias a adoção de providências tecnicamente inviáveis, qual seja, a digitalização imediata da rede. Com essa 2 Mello, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo.

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observação, quer-se esclarecer que, ainda que pudessem os usuários suportar os custos da medida, ela não poderia ser implementada imediatamente.

Cabe repisar o legítimo exercício regulador exercido pela Agência. Como a fixação do prazo de implementação do serviço, obrigatoriamente, atinge questões de ordem técnica, tais como custo, tempo de implantação, tecnologia a ser utilizada, agiu a Anatel nos estritos limites de sua competência normativa.

Há de evidenciar que o núcleo essencial do direito foi preservado, uma vez que a legislação nunca negou sua existência, apenas condicionou no tempo sua exigibilidade. Tal condicionamento se fez necessário, tendo em vista o interesse público. Consoante já afirmado, a decisão envolvia a ponderação de interesses, entre eles o direito à modicidade das tarifas, direito este estreitamente ligado à universalização do serviço.

Não parece razoável que se privilegie interesse privado daquele que pode pagar pelo aumento, em detrimento do interesse da maioria da população que restaria ainda mais distante do acesso ao serviço público posto em disponibilidade. A conduta do Poder Público demonstrou-se em sintonia com o princípio da proporcionalidade. Através da medida, encontrou-se um meio adequado para atingir o interesse público. Foi, também, um meio necessário, pois não tinha o Administrador outra forma menos gravosa de conferir efetividade ao direito.

Por todo exposto, extrai-se a conduta legal da concessionária em somente disponibilizar o detalhamento dos pulsos excedentes após o termo fixado pelo agente regulador. Desse modo, afasta-se a alegação de cobrança indevida sustentada pelo autor. Não há assim valor algum a se repetir.

É no sentido da legalidade do prazo fixado pela ANATEL para implantação do sistema de detalhamento dos pulsos telefônicos locais que inclina a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em decisão proferida neste ano. Citamos trechos do voto condutor, da lavra da Ministra Eliana Calmon, verbis:

“Vê-se de todo esse contexto que o processo de modernização e digitalização das centrais de comutação era essencial para que pudesse ser oferecida a nova sistemática de medição e de detalhamento dos serviços de telefonia, a fim de dar cumprimento à também moderna tendência de transparência nas relações de consumo trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 6º, III, a qual encontrou eco no art. 3º, IV, da Lei Geral de Telecomunicações.”

No que tange à compatibilidade da medida com o Código de Defesa do Consumidor, continua a eminente Ministra:

“Abro aqui um parênteses para salientar que a Lei Geral de Telecomunicações éperfeitamente compatível com o Código de Defesa do Consumidor, contendo diversos dispositivos que abrigam direitos aos usuários do serviço de telecomunicações, inclusive, com expressa referência ao sistema de proteção e defesa do consumidor, podendo ser citados, por exemplo, os arts. 3º, XI; 5º e 19, XVIII.

Nessa linha, salientam Carlos Ari SUNDFELD e Jacintho Arruda CÂMARA(Tarifas dos Serviços de Telecomunicações e Direitos do Consumidor. FórumAdministrativo – v. 2, n. 1. Belo Horizonte: Ed. Fórum, pág. 1.021, agosto de 2002) que:‘no caso de defesa do consumidor a legislação prevê regras de conteúdo amplo, fazendo uso quase sempre de conceitos vagos ou indeterminados. Quando sua aplicação recai sobre área não regulamentada, como ocorre na maioria das

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vezes em matéria de atividades econômicas, o conceito genérico é posto diretamente a disciplinar situações concretas, cabendo ao aplicador da legislação de proteção ao consumidor enquadrar ou não o caso concreto na hipótese genérica.’

Esclarecem os autores que a interação entre ambos os sistemas é tão válida que somente poder-se-ia falar em ofensa ao sistema de defesa do consumidor no caso em que houvesse desrespeito, por parte das concessionárias, das regulamentações editadas pelos órgãos reguladores, como se pode ver do seguinte trecho conclusivo da obra citada:

‘Portanto, a interação entre os dois sistemas regulatórios envolvidos (o de proteção ao consumidor e o de telecomunicações) leva à conclusão de que a violação de regras de proteção ao consumidor, relacionadas ao modo de cobrança pela prestação do serviço, somente poderia ser imputada às prestadoras se houvesse desobediência, por parte destas, das regras especificamente editadas pelo Poder Público (Ministério das Comunicações e, posteriormente, ANATEL) para disciplinar o assunto.’

Sobre a razoabilidade da regulamentação expedida pela Agência Nacional de Telecomunicações, expõe a Relatora, verbis:

“Em conclusão, entendo que, após o necessário processo de modernização do setor de telecomunicações capitaneado pela ANATEL, a transparência exigida pelo art. 6º, III, do CDC e pelo art. 3º, IV, da Lei Geral de Telecomunicações no que toca à política de tarifação dos serviços públicos prestados pelas concessionárias encontra-se, na atualidade, plenamente atendida, não havendo que se falar em violação a tais dispositivos legais.

Ademais, EXAMINADA A QUESTÃO SOB A ÓTICA DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE, VÊ-SE QUE A COMPLEXIDADE TÉCNICA E OPERACIONAL EXIGIDA PARA PROMOVER A ALTERAÇÃO NA SISTEMÁTICA DE MEDIÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA, BEM COMO PARA A IMPLEMENTAÇÃO DO DETALHAMENTO DE TODAS AS LIGAÇÕES LOCAIS, OBJETO DE GRADATIVA E PROGRESSIVA POLÍTICA PÚBLICA PARA MODERNIZAÇÃO DO SETOR DE TELEFONIA, NÃO PODERIA SER DETERMINADA DE FORMA SIMPLISTA EM CURTO ESPAÇO DE TEMPO, MEDIANTEINTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO, COMO PRETENDIDO PELA AUTORA DA PRESENTE DEMANDA”

Legítima, portanto, está a conduta do Poder Público que implementou o direito de informação do usuário sem, contudo, onerá-lo excessivamente. Dessa maneira, cumpre admitir que não houve negligenciamento do direito por parte do ente regulador. Ao reverso, através de comportamento ativo interveio no mercado, exigindo das concessionárias a substituição de toda rede, dentro do menor tempo possível.

III. iii. Da implantação da obrigação de discriminar as chamadas telefônicas locais no documento de cobrança

Por fim, cabe relatar que, a partir de 01/08/2007, as concessionárias foram obrigadas a enviar, quando solicitadas, relação discriminada de todas as chamadas locais efetuadas pelo usuário. Onde não foi possível a implementação de tal serviço, ficaram as concessionárias proibidas de cobrar pelas chamadas locais. Nessas localidades, passou-se a ser cobrada somente a tarifa básica.

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Vê-se, assim, conforme vem sendo defendido nos autos, que agiu bem a Agência ao regulamentar um prazo para a implementação do detalhamento de pulsos locais. Hoje, todas as concessionárias do serviço telefônico fixo comutado estão obrigadas a oferecer o detalhamento da conta telefônica. Essa medida, porém, foi implantada paulatinamente, para que houvesse a manutenção do equilíbrio financeiro-econômico do contrato sem, com isso, onerar excessivamente o usuário

IV – PREQUESTIONAMENTO

Eventualmente procedente o pedido formulado, o que se admite apenas em atenção ao princípio da eventualidade, pugna-se pelo enfrentamento da questão relativa à afronta aos artigos 7º e 31, I, da Lei 8.987/95; ao artigo 6º, X, da Lei 8.078/90 e ao artigo 19 da Lei Geral de Telecomunicações, para efeito de futura interposição dos recursos excepcionais.

A matéria fica, portanto, desde já, prequestionada, para fins recursais.

IV - PEDIDO:

Pelo exposto, requer-se a extinção do processo sem julgamento de mérito em decorrência da ausência de interesse processual do autor, demonstrada pela perda do objeto da ação, uma vez que a tutela jurisdicional não é meio necessário para o alcance de sua pretensão.

Ainda, denota-se a ilegitimidade flagrante da Agência para compor o pólo passivo da ação, uma vez que não há interesse jurídico seu discutido nos autos. Desse modo, a exclusão da Anatel do feito, com fundamento no art. 267, VI do Código de Processo Civil, implicará a incompetência absoluta superveniente do Juízo Federal, nos termos da Constituição.

No mérito, verifica-se a conduta regular da Anatel no exercício de seu mister, bem como da concessionária demandada, que só está obrigada a fornecer a relação discriminada dos pulsos, após o prazo fixado pela Autarquia especial. Comprovada a regularidade da conduta, não há que se falar em pagamento de quantia indevida e, muito menos, em repetição desses valores.

Em função dos argumentos expendidos nesta Contestação, requer a Agência Nacional de Telecomunicações:

a) a extinção do feito sem julgamento de mérito, por carência de ação;

b) caso ultrapassado o primeiro pedido, a sua exclusão do feito, por ilegitimidade passiva, uma vez que não faz parte da relação jurídica deduzida em juízo;

c) a declaração de incompetência absoluta deste Juízo, para remeter os autos à Justiça Estadual;

d) em sendo ultrapassadas as preliminares argüidas, seja reconhecida a improcedência do pedido;

e) a condenação da autora nos ônus da sucumbência, nos termos da lei.

Protesta provar o alegado por todos os meios de provas admissíveis.

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