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UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ
GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS JURÍDICAS - 4º A
Eric Hideki Goia
José Tadeu de Oliveira
Mateus Ferraz Lima
Murilo Lopes S. de Paula
Pedro Homem Clabunde
DIREITOS REAIS
DIREITO DE PROPRIEDADE
TAUBATÉ
2014
2
SUMÁRIO
1. DIREITO DAS COISAS...................................................................................................... 4
1.1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 4
2. DIREITO DE PROPRIEDADE E DIREITOS REAIS ........................................................... 4
3 CONCEITOS: ATUAL E TRADICIONAL ............................................................................. 5
4 EVOLUÇÃO HISTÓRICA .................................................................................................... 7
5 DA EXCLUSIVIDADE DO DIREITO SUBJETIVO ............................................................... 9
5.1 DAS LIMITAÇÕES ..................................................................................................... 11
6. EVOLUÇÃO DO DIREITO CIVIL COM O DIREITO SUBJETIVO ..................................... 15
6.1 DAS FONTES HISTÓRICAS ...................................................................................... 15
6.1.1 COSTUME ........................................................................................................... 15
6.1.2 OUTRAS FONTES .............................................................................................. 16
6.1.3. LEIS E PLEBISCITOS ........................................................................................ 16
6.1.4. SENATUS CONSULTUM ................................................................................... 16
6.2 DIREITO SUBJETIVO EM SEUS ELEMENTOS ........................................................ 16
6.2.1 DIREITO SUBJETIVO X DIREITO OBJETIVO .................................................... 16
6.2.2. JUSNATURALISMO X JUSPOSITIVISMO ......................................................... 17
6.3. ELEMENTOS ............................................................................................................ 17
6.3.1. ELEMENTOS INTRÍNSICOS ................................................................................. 17
6.3.2 ELEMENTO EXTRÍNSICO .................................................................................. 17
6.4. O SUJEITO DE DIREITOS ........................................................................................ 17
6.5. O OBJETO DO DIREITO .......................................................................................... 18
7. DA AQUISIÇÃO ............................................................................................................... 18
7.1. AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL ............................................................... 18
7.1.2 REGISTRO DE TÍTULO ....................................................................................... 20
7.1.3 ACESSÃO ........................................................................................................... 22
7.2. AQUISIÇÃO E PERDA DE PROPRIEDADE MÓVEL.................................................... 24
7.2.1 USUCAPIÃO ........................................................................................................ 24
7.2.2 OCUPAÇÃO ........................................................................................................ 24
7.2.3 ACHADO DO TESOURO ..................................................................................... 25
7.2.4 TRADIÇÃO .......................................................................................................... 25
7.2.5 ESPECIFICAÇÃO ................................................................................................ 25
7.2.6 CONFUSÃO, COMISTÃO E ADJUNÇÃO. ........................................................... 26
8. DA PERDA DA PROPRIEDADE ...................................................................................... 26
3
8.1 DA PERDA VOLUNTÁRIA ......................................................................................... 26
8.2 DA PERDA POR CAUSA LEGAL ............................................................................... 27
9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 28
4
1. DIREITO DAS COISAS
1.1 INTRODUÇÃO
Conforme a exemplar significação de Clóvis Beviláqua, seguida pelo ilustre
autor Carlos Roberto Gonçalves: direito das coisas “é o complexo de normas
reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação
pelo homem. Tais coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é
que é possível exercer o poder de domínio"1.
Logo para Maria Helena Diniz: "direitos das coisas vêm a ser um conjunto de
normas que regem as relações jurídicas concernentes aos bens materiais ou
imateriais suscetíveis de apropriação pelo homem."2
Em resumo, é possível constituir que direito das coisas é o aglomerado de
normas que adequam os eventos jurídicos ocorridos entre os sujeitos de direito e os
bens suscetíveis de apropriação, além das maneiras de emprego econômico dos
bens, gerindo o domínio do homem perante a natureza física nas mais distintas
revelações, por arquétipo a conservação, a reivindicação, a aquisição, o exercício e
a perda de tais bens.
2. DIREITO DE PROPRIEDADE E DIREITOS REAIS
Tanto direitos reais e direitos pessoais são espécies distintas de gêneros
distintos. Direitos reais (espécie) é parte elencada do direito das coisas (gênero). E
direitos pessoais (espécie) é parte elencada de direito das obrigações (gênero).
O direito real caracteriza-se como uma relação entre o homem e a coisa,
traduzindo apropriação de riquezas, tendo por objeto um bem material ou imaterial
erga omnes; isto é, o direito real é o vínculo existente entre o seu titular e a coisa. É
uma relação direta e única.
1 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 13.ed. São Paulo : Saraiva, 2012.
2 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - 4º vol. Direito das coisas. 28.ed. São Paulo:
Saraiva, 2014.
5
O direito pessoal caracteriza-se como uma relação entre Pessoas. Tem por
objeto uma prestação (um ato ou uma abstenção), vinculando o sujeito ativo ao
sujeito passivo (credor e devedor). “Bens” são meramente instrumentos para o
cumprimento da obrigação vinculada e pactuada entre pessoas.
O direito real também se distingue de direito das coisas pela primeira ser espécie da
segunda que seria gênero. O direito das coisas abrange o direito de posse e os
direitos reais. Já os direitos reais têm como característica usar, gozar, dispor e
reaver, e a posse propriamente dita são meramente o uso da coisa, que pode se
estender ao gozo de suas benfeitorias, pois caso o possuidor não o faça, terá direito
de indenização pela benfeitoria necessária, útil ou voluptuária da coisa.
Direito real então é espécie de Direito das coisas (Livro III, parte especial, Código
Civil); e Direito pessoal é elencadono Direito das obrigações (Livro I, parte especial,
Código Civil.). Uma é relação de pessoa e bem, e a outra é a relação entre pessoas
que se comprometem, e caso o comprometimento seja frustrado, usa-se bem como
reparo do não cumprimento de uma obrigação.
3 CONCEITOS: ATUAL E TRADICIONAL
É perfeitamente aceitável e plausível afirmar que a propriedade, direito real
previsto no Código Civil em seu artigo 1228, no âmbito do Direito das Coisas, seja o
direito matriz de toda a matéria e do direito privado, como ensina Silvio Rodrigues
em sua visão tradicionalista, “a espinha dorsal do direito privado 3”, vez que todos os
conflitos e lides em que os homens adentram, a imensa maioria deles tem como
motivo a propriedade de bens. Sendo assim, ante a importância do instituto
estudado, devemos, por primeiro, conceituá-lo.
Não obstante fosse interessante conceituar o direito de propriedade, o Código
Civil em seu dispositivo competente para tal, não define o direito de propriedade,
somente elencando os poderes inerentes ao proprietário. Senão vejamos:
3 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das Coisas. São Paulo: Saraiva. 27ª Ed. 2002. vol. Pag. 76
6
“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e
o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
Por tal motivo, observando os princípios inerentes à propriedade e seus
elementos, temos a definição aproximada do que vem a ser o direito de propriedade.
Na ótica de Washington de Barros Monteiro4 “constitui o direito de propriedade o
mais importante e mais sólido dos direitos subjetivos, o direito real por excelência, o
eixo em torno do qual gravita o direito das coisas”. Eis a visão tradicionalista do
Direito Brasileiro sobre a matéria, sendo interessante ressaltar que ao longo das
épocas da história, dificilmente chegou-se a um único denominador para o conceito
de propriedade, por questões políticas, econômicas, etc.
O conceito atual de propriedade, na visão de doutrinadores contemporâneos
brasileiros, é dotado da gama de todos os princípios inerentes aos direitos reais, os
quais norteados pela visão constitucionalista e humanista (dignidade da pessoa
humana) do Direito Civil. Para Carlos Roberto Gonçalves, direito de propriedade é o
“poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo
ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como
de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha5. Vale ressaltar o conceito de
Cunha Gonçalves, na mesma toada e norteado pelos mesmos ditames
constitucionais, sobre a matéria: “o direito de propriedade é aquele que uma pessoa
singular ou coletiva efetivamente exerce numa coisa determinada em regra
perpetuamente, de modo normalmente absoluto, sempre exclusivo, e que todas as
pessoas são obrigadas a respeitar6”.
Observamos principalmente na visão mais atual do conceito de propriedade
os princípios do absolutismo, exclusividade e perpetuidade. O primeiro diz respeito
ao efeito erga omnes inerente ao direito de propriedade, que se dá devido ao direito
de reavê-la de quem quer que seja, bem como de utilizá-la em sua plenitude. O
segundo tem-se na exclusividade dos direitos do proprietário em utilizar os poderes
a eles inerentes, os quais protegidos pelo ordenamento jurídico. O ultimo, em
4 MONTEIRO, Washington de Barros, (apud.). GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro:
Direito das Coisas. São Paulo: Saraiva. 4ª Ed. 2009. vol. 5. Pag. 207. 5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. São Paulo: Saraiva. 4ª Ed.
2009. vol. 5 Pag. 209. 6 GONÇALVES, Cunha. (apud.). GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das
Coisas. São Paulo: Saraiva. 4ª Ed. 2009. vol. 5. Pag. 208.
7
concordância com o principio da legalidade, denota que o proprietário exerce de
forma perpétua o uso dos poderes a ele dados por direito, salvo se previstos em lei,
porventura, sua perda, por exemplo.
Os conceitos até aqui expostos sofreram mudança drástica no que diz
respeito à ótica do Código Civil de 1916, para o atual Código Civil vigente, não no
tocante ao plano existencial e objetivo, mas sim em sua valoração e princípios
norteadores, matéria esta que faremos estudo no próximo tópico.
4 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Desde os primórdios da Historia da humanidade, a propriedade, quando de
seu surgimento, passou por diversas mudanças em sua valoração axiológica e em
sua relação com a sociedade. Classicamente, no direito romano, observávamos o
caráter singularista ou individualista da propriedade, época em que o uso da
propriedade tratava-se de puro direito subjetivo do proprietário, do senhor de
determinado bem.
Logo em sequência, na Idade Média, observamos a evolução do direito no
tocante à propriedade, vez que em tal época tinha se a figura dos senhores e dos
servos, de forma que o primeiro administrava economicamente a propriedade, e por
outro lado os servos nela trabalhavam e viviam, mediante o pagamento de quantias
para ali permanecerem, beirando a miséria.
Marco da história, a Revolução Francesa trouxe marcas do absolutismo,
sobretudo com a ascensão da burguesia, os quais passaram a dominar
economicamente os ambientes sociais em todo o mundo, passando a propriedade a
ter um caráter extremamente individualista, de forma jamais vista, de forma a
proporcionar uma concepção de que a função da propriedade somente tratava-se de
satisfazer e proporcionar a seu senhor aquilo que deveria proporcionar, excluindo-se
qualquer toque de humanidade ou solidariedade para com a sociedade.
Advindo a modernidade, após as Guerras Mundiais, regimes extremamente
totalitários, e a Guerra Fria, sobretudo com as novas ideias de centralização da
8
pessoa humana como aquela a qual o Estado visa e deve proteger, as novas ordens
jurídicas acabaram por adotar essas vertentes jurídicas, nas quais a dignidade
humana tem de ser protegida pelo Estado, assim ordenado pelas Leis Maiores a
fazê-lo.
Eis que surge mediante os novos preceitos Constitucionais, no tocante ao
estudo da matéria de domínio de bens, a função social da propriedade, vertente esta
que passaria a nortear diretamente o ordenamento jurídico brasileiro, com a
promulgação da Constituição Federal de 1988 e sua afirmação com o Código Civil
promulgado no ano de 2002. Considerado o precursor da ideia de função social para
a propriedade, o doutrinador Duguit pregou a ideia de que a propriedade deveria, de
certa maneira, ser funcionária da sociedade, ou seja, deveria atender ao que ela
precisa, ter uma função para com a coletividade, em uma visão solidária e
coletivista, e não mais individualista como consagrada no Código Civil de 1916. Para
Duguit: “a propriedade deixou de ser o direito subjetivo do individuo e tende a se
tornar a função social do detentor da riqueza mobiliária e imobiliária; a propriedade
implica para todo detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o
crescimento da riqueza social e para a interdependência social. Só o proprietário
pode executar uma certa tarefa social. Só ele pode aumentar a riqueza geral
utilizando sua própria; a propriedade não é, de modo algum,um direito intangível e
sagrado, mas um direito em contínua mudança que se deve modelar sobre as
necessidades sociais Às quais deve responder7”.
Para o precursor da função social da propriedade, esta última possuía o
intuito de mera ostentação de riqueza, e o proprietário não possuía a mínima
obrigação e interesse em contribuir com o bem estar coletivo, utilizando sua própria
riqueza para fazê-lo. Sendo assim, o Poder Constituinte na Lei Maior de 1988
acabou por decidir em embutir no ordenamento jurídico brasileiro, em sua Carta
Magna, o princípio da função social da propriedade, em seu artigo 5º, inciso XXIII,
igualmente o que ocorreu com o legislador, em sede ordinária, no Código Civil
Brasileiro.
7 DUGUIT, (apud). GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. São
Paulo: Saraiva. 4ª Ed. 2009. vol. 5 Pag 223.
9
Abandonando os preceitos individualistas e patrimonialistas incrustados nos
dispositivos do Código Civil de 1916, a função social da propriedade trouxe a
obrigação de que a propriedade contribua para o coletivo, para com a sociedade, de
forma que o ordenamento jurídico passou a proteger aqueles que seguem seus
ditames, conservando, por exemplo, um terreno baldio, retirando seu lixo,
delimitando suas extensões, limpando-o regularmente, construindo uma casa, etc.
Tais ações citadas em exemplo, embora simples, denotam que a propriedade, no
caso o terreno, passou a ter uma função social, ou seja, de moradia, contribuindo
com todo o local e a coletividade à sua volta, em vista que não mais ali estará
presente focos de doenças, possivelmente haverá melhor iluminação, pessoas
passarão a conviver e morar no local, etc., de forma que todos esses benefícios
foram desencadeados em virtude de o terreno ter tomado uma função, um motivo
para existir, sendo estes princípios e melhorias sociais que passaram a ser
protegidos e utilizados no ordenamento jurídico brasileiro, com a vinda da função
social da propriedade em seu sistema.
5 DA EXCLUSIVIDADE DO DIREITO SUBJETIVO
A Constituição da República brasileira de 1988 estabelece em seu artigo 5º,
inciso XXII, ser garantido o direito de propriedade, encetando, ao mesmo tempo, um
direito e uma garantia fundamentais. De outro lado, no inciso XXIII do mencionado
dispositivo, afirma que a propriedade atenderá a sua função social, criando
claramente uma limitação àquele direito. A partir disso, a Carta traz institutos que
regulam a utilização da propriedade e que possibilitam a intervenção do Estado
neste domínio privado, permitindo, ainda, ao ordenamento inferior a criação de
outras formas de ingerência.
O conjunto de normas constitucionais sobre a propriedade revela que ela não
pode mais ser considerada como mero instituto de direito privado, devido à sua
constitucionalização, atuando como direito fundamental e como princípio. Além
disso, as facetas da função social, as limitações e a interferência estatal
demonstram a perda do caráter absoluto de outrora, relativizando-se seu conceito e
10
aplicação, passando a ser considerada como um dos instrumentos capaz de
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.
O direito de propriedade também pode ser entendido como a vinculação do
proprietário a uma coisa, mas que ensejaria a figuração dos demais indivíduos da
sociedade em posição passiva, com um dever de abstenção de violar os atributos do
dono.
O direito subjetivo representa a faculdade ora concedida a determinados
indivíduos de agirem conforme os preceitos da norma garantidora, pois, esta tem
como finalidade a preservação dos fins e interesses, podendo exigir de outrem, o
que lhes for devido segundo a lei.
Assim, verifica-se que o direito de propriedade também pode ser encarado
como a constituição de uma relação jurídica, sendo esta entre o proprietário e a
demais pessoas. Importante salientar que estes têm o dever jurídico de se absterem
da realização de qualquer espécie de ato que venha a ofender o direito daquele.
A teoria do direito subjetivo de propriedade acabou colecionando várias
críticas, principalmente, por não prever qualquer espécie de dever dos proprietários
em relação as demais pessoas.
Embora, a concepção da propriedade como direito subjetivo tenha sua
importância, parece-nos que atualmente este tema representa uma situação jurídica
totalmente complexa.
O direito de propriedade representa uma relação jurídica, tanto em sua
estrutura como em sua função. Assim, no aspecto estrutural as situações subjetivas
acabam por se contrapor, estabelecendo, portanto, um determinado liame objetivo.
Em relação ao aspecto funcional, acaba por sintetizar a disciplina trazida pela
própria lei como meio de solucionar os conflitos considerados como de interesse.
Surge, assim, a indeterminação do sujeito passivo, sendo este considerado
como um aspecto impeditivo para a qualificação do direito de propriedade como uma
espécie de relação jurídica.
Neste contexto, a objeção não é fator relevante, pois, o sujeito que é
considerado como o titular de uma situação ativa em relação a propriedade, não faz
11
existir um sujeito determinado, mas, sim, a coletividade, que deverá respeitar a
situação, não se inserir na esfera do titular.
Em relação ao perfil estrutural, a relação de propriedade é na realidade uma
ligação entre a situação vivenciada pelo proprietário e os demais que entrem em um
conflito com esta, e, assim, acabam por constituírem centros de interesses
considerados antagônicos.
Importante salientar que esta concepção trazida não tem o condão de
desconsiderar a existência dos direitos subjetivos, pois, estes são na realidade
integrantes da situação inerente do proprietário, principalmente em relação as
demais situações jurídicas advindas de terceiros, que acabam se caracterizando em
relações jurídicas complexas.
Portanto, as limitações ora impostas ao proprietário, por meio da função social
da propriedade, não são apenas um aspecto externo ao conteúdo, mas, sim, algo
interno, pois, não se encontra fora da estrutura da propriedade, representando os
direitos de propriedade e também o direito individual, fazendo, portanto, parte de
uma situação jurídica subjetiva complexa.
Neste diapasão, a propriedade pode ser considerada como o direito exclusivo
de usar, gozar e dispor da coisa, sendo, assim, ela conferida e garantida ao seu
titular pelo nosso ordenamento jurídico, devendo ser exercido pelo proprietário,
sempre se observando os limites e também o cumprimento das obrigações que o
mesmo ordenamento lhe imponha para o perfeito cumprimento da função social.
5.1 DAS LIMITAÇÕES
O direito de propriedade, por não mais ostentar o caráter absoluto e intangível
de outrora, que permitia ao seu titular o uso indiscriminado de suas posses, bem
como o seu desuso de forma indefinida, sofre limitações de diversas naturezas
impostas pelo Poder Público, a partir de sua política intervencionista, em prol do
interesse coletivo. A adequação da propriedade particular aos anseios de ordem
pública consigna conditio sine qua non para a sobrevivência jurídica do domínio
privado. As limitações que incidem sobre o direito de propriedade garantem a
12
conservação desses às mãos dos seus respectivos titulares desde que o seu
exercício se submeta ao alvedrio do interesse social.
Todas as formas de limitação ao direito de propriedade advindas da
intervenção estatal possuem fundamento genérico nas disposições constitucionais
sobre o tema, algumas delas sendo previstas diretamente pelo texto constitucional.
Isso porque a Carta de 1988 estabeleceu em seu artigo 5º, inciso XXIII, que a
propriedade atenderá a sua função social. Ademais, reafirmou o legislador
constituinte a sua preocupação com a propriedade privada e sua função voltada
para o bem-estar social quando, no artigo 170, incisos II e III, classificou-a como
princípio da ordem econômica.
Limitações ao direito de propriedade consistem nos condicionamentos que
atingem os caracteres tradicionais desse direito, pelo que era tido como direito
absoluto, exclusivo e perpétuo. Absoluto, porque assegura ao proprietário a
liberdade de dispor da coisa do modo que melhor lhe aprouver; exclusivo, porque
imputado ao proprietário, e só a ele, em princípio, cabe; perpétuo, porque não
desaparece com a vida do proprietário, porquanto passa a seus sucessores,
significando que tem duração ilimitada (CC, art. 1.231), e não se perde pelo não uso
simplesmente.
Importa ter em mente esses caracteres, porque as limitações são
classificadas em função deles. Limitações constituem gênero: tudo que afete
qualquer dos caracteres do direito de propriedade, o que pode verificar-se com
fundamento no Direito Privado ou no Direito Público. Daí a primeira classificação em
limitações de Direito Privado (como as de direito de vizinhança) e limitações de
Direito Público (como as urbanísticas e as administrativas). Importante, contudo, é
observar as espécies de limitações, que são: restrições, servidões e desapropriação.
As restrições limitam o caráter absoluto da propriedade; as servidões (e
outras formas de utilização da propriedade alheia) limitam o caráter exclusivo; e a
desapropriação, o caráter perpétuo.
Concentrando as atenções nas limitações de Direito Público, com fundamento
genérico ou direto na Constituição Federal, o que caracteriza a intervenção estatal
na propriedade, Carvalho Filho explica que esta ingerência é toda e qualquer
13
atividade estatal que, amparada em lei, tenha por fim ajustá-la aos inúmeros fatores
exigidos pela função social a que está condicionada. Isso revela um poder jurídico
do Estado calcado em sua própria soberania.8
Por serem diversificados os fins colimados pelo Poder Público, diferentes são
também as formas de intervenção na propriedade. Há, primeiramente, a intervenção
restritiva, na qual o Estado impõe restrições e condicionamentos ao uso da
propriedade, sem, no entanto, tirá-la de seu dono. Este não poderá utilizá-la a seu
exclusivo critério, devendo subordinar-se às imposições do Poder Público,
conservando-a em sua esfera jurídica. São modalidades deste tipo a servidão
administrativa, a requisição, a ocupação temporária, as limitações administrativas e
o tombamento.
Há, ainda, a intervenção supressiva, pela qual o Estado, valendo-se da
supremacia que lhe é inerente, transfere coercitivamente para si a propriedade de
determinado particular, tendo como modalidade por excelência a desapropriação.
Ainda segundo Carvalho Filho, servidão administrativa é o direito real público
que autoriza o Poder Público a usar a propriedade imóvel particular para execução
de obras e serviços de interesse coletivo. Possui fundamento genérico nos artigos
5º, XXIII, e 170, III, da CF, e fundamento específico no artigo 40 do Decreto-lei nº
3.365/41, rezando que “o expropriante poderá constituir servidões, mediante
indenização na forma desta lei”. Constitui-se através de acordo entre proprietário e
Poder Público ou por decisão judicial, devendo a indenização ser prévia e
condicionada à existência de prejuízo.9
Outra modalidade de intervenção é a requisição, pela qual o Estado utiliza
bens móveis, imóveis e serviços particulares em situação de perigo público iminente,
prevista especificamente no texto constitucional, artigo 5º, inciso XXV. Garante-se ao
proprietário o direito à indenização ulterior em caso de prejuízo causado pelo Poder
Público. Possui, ainda, fundamento genérico no artigo 5º, XXIII, e no artigo 170, III,
ambos da Constituição Federal. Ainda, é caracterizado como direito pessoal do
8 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2010. 9 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2010.
14
Poder Público, incidindo sobre bens móveis, imóveis e serviços e é dotada de
transitoriedade.
Sobre as mesmas bases genéricas está assentado o instituto da ocupação
temporária, previsto ainda pelo artigo 36 do Decreto-lei nº 3.365/41: “é permitida a
ocupação temporária, que será indenizada, afinal, por ação própria, de terrenos não
edificados, vizinhos às obras e necessários à sua realização”. Essa conceituação
legal é muito restrita e não tem a abrangência que se deve emprestar ao seu
sentido, realçando que o preceito legal não é a única modalidade de ocupação, mas
sim uma espécie das possibilidades de uso de bens imóveis privados pelo Poder
Público.
Carvalho Filho conceitua o instituto como “a forma de intervenção pela qual o
Poder Público usa transitoriamente imóveis privados, como meio de apoio à
execução de obras e serviços públicos”. Entende, ainda, ser direito pessoal do
Estado, incidindo apenas sobre bens imóveis, com caráter de transitoriedade,
baseado na necessidade de realização de obras e serviços públicos normais.10
Limitações administrativas, por sua vez, são determinações de caráter geral,
através das quais o Poder Público impõe a proprietários indeterminados obrigações
positivas, negativas ou permissivas, para o fim de condicionar as propriedades ao
atendimento da função social. Exemplos disso é a imposição ao proprietário de
limpeza de terrenos, parcelamento ou edificação compulsória, proibição de construir
além de determinados números de pavimentos, tolerância a uma atividade
administrativa, como vistorias, entre outros.
Possuem a característica de serem atos legislativos ou administrativos de
caráter geral, bem como serem dotadas de definitividade, com base nos interesses
públicos abstratos, não havendo direito à indenização.
Por sua vez, o tombamento é a forma de intervenção na propriedade pela
qual o Poder Público visa à proteção do patrimônio cultural brasileiro. Assim, o
proprietário não pode, em nome de interesses egoísticos, usar e fruir livremente
seus bens se estes traduzem interesse público atrelado a fatores de ordem histórica,
10
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Pag. 860.
15
artística, cultural, científica, turística e paisagística. De acordo com Moreira Neto, o
tombamento é a intervenção ordinatória e concreta do Estado na propriedade
privada, limitativa de exercício de direitos de utilização e disposição, gratuita,
permanente e indelegável, destinada à preservação, sob regime especial, dos bens
de valor cultural, histórico, arqueológico, artístico, turístico ou paisagístico.
Fundamenta-se diretamente no artigo 216, parágrafo primeiro, da
Constituição Federal, ao dispor que o Poder Público, com a colaboração da
comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de
inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas
de acautelamento e preservação.
Por último tem-se a desapropriação. Segundo José Afonso Silva, é a limitação
que afeta o caráter perpétuo da propriedade, porque é o meio pelo qual o Poder
Público determina a transferência compulsória da propriedade particular,
especialmente para o seu patrimônio ou de seus delegados. Este instituto só pode
ser verificado por necessidade ou utilidade pública, ou interesse social, mediante
justa e prévia indenização em dinheiro, conforme determina o artigo 5º, XXIV, da
Constituição Federal. Fora estas hipóteses, somente é cabível a desapropriação sob
a forma de sanção, por não estar a propriedade cumprindo sua função social,
através de indenizações por título da dívida pública ou da dívida agrária.11
6. EVOLUÇÃO DO DIREITO CIVIL COM O DIREITO SUBJETIVO
6.1 DAS FONTES HISTÓRICAS
6.1.1 COSTUME
Thomas Marky: "Entre as fontes do direito romano, está o costume, que, no
período arcaico, foi quase exclusivamente a sua única fonte. O costume é a
observância constante e espontânea de determinadas normas de comportamento
11
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011
16
humano na sociedade”. Para Cícero: "Aprovação sem lei, pelo decurso de
longuíssimo tempo e pela vontade de todos: quod voluntateomniumsine lege
vetustas comprobativ".
6.1.2 OUTRAS FONTES
O costume não é a única fonte histórica importante do direito. Existiram outras
fontes do direito como as leis e plebiscitos, os senatum consultum, as constituições
imperiais, os editos dos magistrados e a jurisprudência. Assim, abaixo descrevo
duas fontes do direito.
6.1.3. LEIS E PLEBISCITOS
Através destes que o povo se manifestava. As leis eram discutidas nos
comícios em que só participavam os cidadãos romanos. Já os plebiscitos eram
decisões da plebe, reunidas sem os patrícios.
6.1.4. SENATUS CONSULTUM
Eram deliberações do senado. No principado, eram propostos pelos
imperadores, e no início, consistiam, também, em instruções aos magistrados sobre
o exercício de suas funções. Mas tarde passou-se a aprovar simplesmente, por
aclamação, a proposta do imperador, transformando-se numa forma indireta de
legislação imperial.
6.2 DIREITO SUBJETIVO EM SEUS ELEMENTOS
6.2.1 DIREITO SUBJETIVO X DIREITO OBJETIVO
É a possibilidade que a norma dá de um indivíduo de exercer determinada
conduta descrita na lei. É a lei, que aplicada ao caso concreto autoriza a conduta de
uma parte. Exemplo: se uma pessoa te deve um valor em dinheiro, a lei te concede
o direito de cobrar a dívida por meio de um processo judicial de execução.
17
Diferente do direito objetivo que é a norma propriamente dita. Ex.: O Direito
Civil busca a defesa das partes nas relações jurídicas interpessoais.
6.2.2. JUSNATURALISMO X JUSPOSITIVISMO
O jusnaturalismo e o juspositivismo, correntes do pensamento jurídico,
sempre geraram muitas discussões por defenderem posições diversas, sendo o
direito subjetivo uma das discussões basilares entre essas correntes. Para o
jusnaturalistas, o direito subjetivo é anterior ao direito objetivo, cabendo a este
garantir, pela coação, os direitos subjetivos. Em outras palavras, pode-se dizer que,
para esta corrente, o direito subjetivo independe do ordenamento jurídico positivo. Já
o juspositivistas, ao contrário, sustentam que os direitos subjetivos são criações do
direito objetivo.
6.3. ELEMENTOS
6.3.1. ELEMENTOS INTRÍNSICOS
Sujeito Ativo (Titular dos direitos)
Sujeito Passivo (Devedor dos direitos)
Relação Jurídica (Vínculo entre o sujeito e o objeto + vínculo entre o suj. ativo
e o suj. passivo)
6.3.2 ELEMENTO EXTRÍNSICO
Proteção Jurisdicional (Garante o exercício do direito e pune sua violação).
6.4. O SUJEITO DE DIREITOS
São as pessoas naturais ou jurídicas pertencentes de direitos, que possuem
prerrogativas e requisitos para exercer tais direitos.
18
De acordo com a corrente majoritária, não pode existir sujeitos sem direitos.
Mas sim, sujeitos em expectativa (herança jacente, nascituro) e sujeitos
indeterminados (titulares dos direitos difusos).
6.5. O OBJETO DO DIREITO
Bem (algo que pode ser tutelado pelo direito): coisas, pessoas e ações; São
objetos mediatos; Ex.: casa.
Prestação: Obrigação que deve ser cumprida; Objeto Imediato; Ex.: aluguel
da casa.
7. DA AQUISIÇÃO
O ordenamento jurídico brasileiro separa o instituto da aquisição como sendo
da aquisição de propriedade móvel e aquisição de propriedade imóvel, tratando-os
de maneira distinta, dada a sua importância, haja vista que para o Código Civil,
dentro do campo do direito das coisas, a propriedade imobiliária é tratada com
distinta riqueza, uma vez que o legislador considera-os mais estáveis e mais
disputados frente aos bens móveis. Para Silvio Rodrigues, isto é provavelmente
devido à "não só à inflação, como também a outros fatores, assim a ainda pequena
tradição comercial e industrial das grandes empresas nacionais, e a menor
remuneração dos valores mobiliários em relação à alta imobiliária."12
7.1. AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE IMÓVEL
Como fora supracitado, a aquisição de propriedade imóvel recebeu especial
tratamento do legislador ao elaborar suas formas, predispostas entre os artigos 1238
12
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 92.
19
a 1259 do Código Civil, falando sobre a usucapião, o registro do título e a acessão
como formas de aquisição de propriedade imóvel. Há de se destacar, além destas, o
direito hereditário, regulado no art. 1784, também deste Código, uma vez que
também é forma de aquisição de propriedade imóvel.
Quanto aos modos de se adquirir, podem ser separados em originários ou
derivados. São originários quando não houver qualquer relação jurídica causal entre
o domínio atual e o estado jurídico anterior, que é o que verifica-se na usucapião e
na acessão, por exemplo. No modo originário, a "propriedade passa ao patrimônio
do adquirente escoimada de quaisquer limitações ou vícios que porventura a
maculavam."13 Já no modo derivado, há entre o domínio do adquirente e do
alienante uma relação de causalidade por motivo de algum fato jurídico qualquer,
como contrato por tradição ou direito hereditário. Neste modo, exige-se a
comprovação da legitimidade do direito do antecessor, além de que eventuais
atributos e limitações anteriores também são transferidos junto com a propriedade.
7.1.1. USUCAPIÃO
Usucapião é um termo que deriva da palavra latina usucapio e pode ser
traduzido como "adquirir pelo uso", ou seja, significa dizer que um indivíduo, após
utilizar determinado bem por um período de tempo, de forma contínua e
incontestada, adquirirá direito de domínio sobre o bem móvel ou imóvel, adquirindo
status de dono. Em nosso direito, a usucapião também é conhecida como
"prescrição aquisitiva". Em síntese, é a usucapião como meio de adquirir a
propriedade, tanto móvel, quanto imóvel, através da posse mansa, pacífica e
ininterrupta da coisa, exercendo sobre ela animus domini, durante certo período de
tempo.
Em nosso ordenamento, a usucapião admite três espécies distintas, a saber:
usucapião ordinária, usucapião extraordinária e usucapião especial, dividida em
urbana e rural, cada uma com seus elementos, porém, todos englobados nos
elementos essenciais da usucapião, que serão:
Coisa hábil: Para a coisa ser objeto de usucapião, é indispensável que a
mesma não esteja fora do comércio e não seja constituída como bem público.
Portanto, fora do comércio são todos aqueles bens que são naturalmente
indisponíveis, que se encontram fora da alçada de apropriação humana, os
legalmente indisponíveis, como bens de uso comum e aqueles indisponíveis
13
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 13.ed. São Paulo : Saraiva, 2012.
20
pela volição humana, como bens inalienáveis por cláusula em testamentos.
Quanto aos bens públicos, estes não podem ser objeto a usucapião por não
possuírem natureza que os sujeite a prescrição.
Posse: nada mais é que dotar uma simples ação de relação factual de
juridicidade. Para a posse gerar efeitos da usucapião, ela precisa preencher
os requisitos existentes nos artigos 1238 a 1242 do Código Civil, para que se
possa configurar como posse ad usucapionem, devendo o possuidor agir com
ânimo de dono; ser a posse justa, isto é, livre dos vícios de violência,
clandestinidade ou precariedade; ser a posse mansa e pacífica e ser
contínua, embora sendo admitido que o possuidor acrescente à sua posse a
dos seus antecessores (art. 1243, Código Civil) para dar continuidade ao
lapso temporal requisitado na usucapião.
Decurso do tempo: Toda usucapião só se consuma dentro de um período de tempo
previamente fixado em lei. Para fins legais, o tempo é contado por meio de dias
dentro do ano ao invés de horas, fruindo-se o primeiro dia como o dia seguinte ao da
posse. Como foi explicitado alhures, cada espécie de usucapião tem um determinado
período de tempo necessário para a sua consumação.
Justo título: Figura o justo título como um dos elementos dispensáveis em algumas
espécies de usucapião, como na extraordinária e na especial. Na ordinária,
entretanto, a lei condiciona a usucapião ao fato de o possuidor ter um justo título,
que é o documento através do qual se faz a transferência do domínio da coisa
Boa-fé: Assim como o justo título, a boa-fé não é elemento indispensável em todas
as espécies de usucapião, até porque costuma vir atrelada ao justo título, apesar de
ser instituto jurídico autônomo. É possuidor de boa todo aquele que ignora o vício ou
o obstáculo que lhe impede a aquisição da coisa. Para que ela exista de fato na
relação de usucapião, deve existir no começo da posse e permanecer em todo o
decurso do prazo e, uma vez que venha o possuidor a saber da existência de
qualquer vício, perde o status de boa-fé.
7.1.2 REGISTRO DE TÍTULO
Para o direito brasileiro, a simples existência do contrato não basta para a
aquisição do domínio sobre a propriedade, uma vez que por ele só se dá origem a
obrigações e direitos, conforme o artigo 481 do Código Civil: " Pelo contrato de
21
compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa,
e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro."14 Porém, para que haja a
transferência do domínio, em se tratando de coisa imóvel, mister se faz o registro do
título translativo, conforme preceitua o artigo 1245 do Código Civil: "Transfere-se
entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de
Imóveis."15
Dada a já mencionada importância que o legislador conferiu aos bens
imóveis, esta medida de registro se faz necessária para cumpri-la integralmente,
inclusive valendo-se de legislação própria, que é a Lei n. 6015 de 31 de dezembro
de 1973, chamada de Lei dos Registros Públicos, através da qual elabora um
sistema de registros públicos, onde os "negócios imobiliários devem ser registrados
nas próprias circunscrições onde se encontram os prédios. Dessa maneira, qualquer
interessado pode, a todo tempo, verificar a existência, ou não, de um negócio, tendo
por objeto determinado imóvel."16
Norteiam o sistema de registro público vários princípios, criados pelo
legislador afim de proporcionar maior segurança aos negócios imobiliários. O
primeiro destes princípios é o da publicidade, uma vez que o registro é público e
acessível a todas as pessoas. O segundo princípio é o da presunção, também
conhecido como força probante, que conferem fé pública aos registros, garantindo
que eles tenham presunção de veracidade até que do contrário se demonstre, haja
vista o teor da presunção ser juris tantum e não absoluta. Em terceiro lugar,
podemos mencionar o princípio da legalidade e diz respeito ao oficial do cartório, a
quem cabe examinar a legalidade e validade dos títulos que lhe são apresentados,
em todos seus aspectos. Em quarto lugar, o princípio da territorialidade também é
muito importante, vez que exige-se que o registro seja feito na circunscrição
imobiliária da situação do imóvel, como fora mencionado alhures. Em quinto lugar,
temos o princípio da continuidade, pelo qual se admite registro apenas se a pessoa
aparecer como alienante e figurar, também, como proprietário no registro. Em sexto
lugar, o princípio da prioridade, que protege aquele que primeiramente registrar o
seu título. Em sétimo, figura o princípio da especialidade, que visa a individualização
14
BRASIL. Código Civil de 2002. Artigo 481. 15
BRASIL. Código Civil de 2002. Artigo 1245. 16
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 95.
22
do bem a ser registrado no título. Finalmente, o princípio da instância, pelo qual o
oficial de cartório não pode proceder a registros de ofícios, mas somente quando o
interessado fizer requerimento, verbalmente ou de forma escrita.
O ato do registro se faz de forma simples; após a compra e venda de imóvel,
o interessado apresenta o instrumento público no cartório do Registro de Imóvel e,
uma vez que o oficial receba o título, anotá-lo-á no Livro de Protocolo. Se tudo
parecer legal para o oficial, procede-se ao registro. Caso contrário, exigirá que o
interessado que o regularize. Quanto aos livros obrigatórios ao ato de registro do
título, são em cinco: Protocolo, Registro Geral, Registro Auxiliar, Indicador Real e
Indicador Pessoal.
7.1.3 ACESSÃO
Acessão é modo originário de aquisição da propriedade, tendo como ponto de
partida tudo aquilo que é incorporado a um bem primário e fica pertencendo ao seu
proprietário. Em linhas gerais, é um "aumento do volume ou do valor da coisa
principal, em virtude de um elemento externo"17. No instituto da acessão temos uma
clara predominância do princípio de a coisa acessória seguir a principal, além do que
veda o enriquecimento sem causa. Desta feita, atribui-se o domínio da coisa
acessória também ao dono da coisa principal. Segundo o artigo 1248 do Código
Civil:
Art. 1.248. A acessão pode dar-se: I - por formação de ilhas; II - por aluvião; III - por avulsão; IV - por abandono de álveo; V - por plantações ou construções.
Assim sendo, vemos que a cessão pode se dar por meio de causas naturais,
como avulsão ou aluvião ou por meio de atos humanos, como no caso de
plantações ou construções.
17
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 97.
23
No caso das acessões físicas ou naturais, à formação de ilhas interessa ao
nosso direito civil somente as que surgem nos rios não navegáveis, que seriam de
domínio particular. O aluvião significa o aumento indiscriminável que o rio anexa às
terras, de modo tão lento que seria impossível mensurar a quantidade acrescida
que, segundo a acessão, pertence ao dono dos terrenos marginais, livre de qualquer
indenização. Por avulsão, entende-se como sendo a força súbita da corrente ou
qualquer força natural agindo de modo a arrancar uma parte considerável de um
prédio, que passa a sobrepujar outro. Quando a avulsão for de coisa não suscetível
de aderência natural, deve ser devolvida ao dono; caso contrário, o acréscimo
pertencerá ao dono da coisa principal. Em respeito ao álveo, considera-se como a
"superfície que as águas cobrem sem transbordar para o solo natural e
ordinariamente enxuto."18 Em caso de rio público ou particular, o álveo abandonado
pertencerá aos proprietários ribeirinhos das duas margens, na devida proporção, até
a linha mediana daquele.
Já em relação às acessões industriais, ou seja, as construções e plantações,
temos o que define o artigo 1253 do Código Civil: "Toda construção ou plantação
existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se
prove o contrário"19. Esta é a regra básica, independendo se a plantação ou
construção se deu através de materiais alheios, o que importa é o bem acessório
seguindo a sina do principal. Entretanto, como o enriquecimento sem causa é
vedado, deverá reembolsar o valor de que se utilizar o dono do bem principal,
respondendo ainda por perdas e danos em caso de procedência de má-fé. Já por
outro lado, quem planta ou constrói em terreno alheio perde o proveito do
proprietário mas, em caso de boa-fé, tem direito à indenização, segundo o artigo
1255 do Código Civil. Em caso de má-fé, pode ser obrigado a repor as coisas ao
status quo ante e pegar eventuais prejuízos. Quanto à construção invadindo terreno
alheio, preceitua o artigo 1258 do Código Civil:
Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo
alheio em proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o
construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o valor da
construção exceder o dessa parte, e responde por indenização que
18
BRASIL. Código de Águas. Art. 9º. 19
BRASIL. Código Civil. Art. 1253.
24
represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área
remanescente.
Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste
artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que
invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção
exceder consideravelmente o dessa parte e não se puder demolir a porção
invasora sem grave prejuízo para a construção.
7.2. AQUISIÇÃO E PERDA DE PROPRIEDADE MÓVEL
Também na questão da propriedade, encontra-se a aquisição da propriedade
móvel, dispondo de seis formas de aquisição, a saber: usucapião, ocupação, achado
de tesouro, a tradição, a especificação e a confusão.
7.2.1 USUCAPIÃO
Diferentemente das coisas imóveis, a usucapião de coisa móvel é
demasiadamente mais simples e menos importante, vez que conta com prazos
drasticamente reduzidos. Em síntese, adquirirá a propriedade da coisa móvel aquele
que a possuir como sua, de forma continua e incontestada, durante um prazo de três
anos, valendo-se de justo título e boa-fé, segundo o artigo 1260 do Código Civil.
Esta, uma espécie de usucapião ordinária. Em sua forma extraordinária, o tempo da
posse será de cinco anos, independente de justo título ou boa fé.
7.2.2 OCUPAÇÃO
Segundo Silvio Rodrigues, "ocupação é a tomada da posse de coisa sem
dono, com a intenção de adquirir o domínio"20. Em suma, consiste na tomada de
posse de coisa sem dono, tanto as res nullius quanto as res derelictas. Essa
aquisição se faz imediata e não é defesa por lei. Ressalta-se que a ocupação
somente recai sobre as coisas móveis e sem dono.
20
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 189.
25
7.2.3 ACHADO DO TESOURO
Segue o disposto no artigo 1264 do Código Civil, no qual: "O depósito antigo
de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória, será dividido por igual
entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro casualmente."21Se o tesouro
for encontrado em prédio alheio, o que se encontrar será dividido igualmente entre o
proprietário e aquele que o encontrar. Se for encontrado pelo proprietário do prédio,
a ele lhe pertencerá integralmente, ou caso se encontre em pesquisa que ele
ordenou ou por terceiro não autorizado. O aquinhoamento de quota a que tem o
direito o proprietário por um terceiro caracterizará crime, previsto no artigo 169 do
Código Penal.
7.2.4 TRADIÇÃO
A forma de aquisição mais comum e importante em matéria de coisa móvel, a
tradição é entrega da coisa do alienante ao alienatário, com motivação de vontade
de lhe transferir o domínio. Segundo o nosso ordenamento jurídico, a simples
vontade expressa em contrato não garante a aquisição da propriedade, para o bem
móvel a tradição é fundamental para a aquisição do domínio. Acontece que o
contrato gera apenas direito pessoal inter partes, enquanto a tradição transforma o
direito do alienatário, de pessoal para real.22 A tradição pode ser real, simbólica ou
ficta. Na real, há a entrega material da coisa. Na simbólica, há ato que simboliza a
entrega da coisa, como entregar as chaves de um novo apartamento comprado. Na
ficta, ela se consuma pelo constituto possessório, onde o alienante mantém a coisa
vendida por um outro título, como por exemplo o de locatário.
7.2.5 ESPECIFICAÇÃO
A especificação ocorre quando uma pessoa trabalha em determinada matéria-
prima e obtém uma espécie nova. De acordo com nosso direito civil, a espécie nova
será do especificador se a matéria originária era sua, mesmo que só em parte e não
for possível a restituição da forma ante. Caso a matéria não lhe pertencesse e a
restituição ainda for impossível, restará saber se foi produzida a nova com boa ou
má-fé do especificador. Em alguns casos, como o de uma obra de arte, mesmo que
21
BRASIL. Código Civil. Art. 1264. 22
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 188.
26
realizada em má-fé a lei concederá a propriedade da obra ao especificador, mas de
forma que quem obteve prejuízo possa pedir indenização pelo valor da matéria
prima e recolher eventuais perdas e danos.23
7.2.6 CONFUSÃO, COMISTÃO E ADJUNÇÃO.
Ocorre confusão quando se misturam coisas líquidas, comissão quando se
misturam coisas sólidas e adjunção quando temos a justaposição de uma coisa à
outra. Se os proprietários forem diversos e a mistura ocorrer sem o seu
consentimento, continuarão com a propriedade, uma vez que seja possível a separar
da matéria sem sua deterioração. Caso não seja possível tal separação, a espécie
agora formada pertencerá a todos os donos da matéria prima, cada qual com seu
quinhão proporcional ao valor do material.
8. DA PERDA DA PROPRIEDADE
É perpétuo o direito de propriedade. Assim sendo, apenas a volição do dono,
ou qualquer causa legal, podem desfazer este direito. Como causas de vontade do
dono, podemos citar a alienação, a renúncia ou o abandono. Legalmente, tem-se a
usucapião, o perecimento, a desapropriação entre outros, todos elencados no artigo
1275 do Código Civil. É válido ressaltar que o simples desuso do bem não
caracteriza sua perda automaticamente, a não ser em caso de usucapião e
decorrido o lapso temporal estipulado em lei.
8.1 DA PERDA VOLUNTÁRIA
Temos a perda voluntária da posse por alienação, renúncia ou abandono. A
alienação se dá através de negócio jurídico bilateral, isto é, por intermédio de um
contrato, figurando o alienante, que é aquele que transfere o domínio e o alienatário,
23
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 13.ed. São Paulo : Saraiva, 2012.
27
que será o receptor do domínio transferido. A alienação pode ocorrer a título
onerosos, como na compra e venda, ou ser realizada a título gratuito, como ocorre
na doação. A renúncia é ato unilateral do titular que, por meio de manifestação
formal e expressa, abre mão do direito de domínio da propriedade. O ato de
renúncia deve ser registrado publicamente no Registro de Imóveis competente,
exigindo-se, para tanto, escritura pública. Já o abandono, também ato unilateral, diz
respeito ao titular abrir mão dos seus direitos sobre a coisa, sem manifestação
expressa, isto é, neste caso inexiste qualquer formalidade, apenas a derelição da
coisa, assim sendo, não obriga seu registro público. A figura do abandono
caracteriza-se, precipuamente, pelo animus do proprietário em não mais ter a coisa
para si. Uma vez abandonado o imóvel, qualquer um pode ter a coisa para si, exceto
se for arrecadado pelo Município ou Distrito Federal como coisa vaga, por se manter
nas respectivas circunscrições, permanecendo como "coisa de ninguém" por três
anos se for localizado em zona urbana.24
8.2 DA PERDA POR CAUSA LEGAL
Além das causas volitivas, a perda pode se dar por vias legais, como é o caso
do perecimento da coisa ou da desapropriação. O perecimento da coisa se dá pela
perda do objeto, isto é, sua extinção. Exemplo utilizado pelo brilhante Silvio
Rodrigues é o da ilha que é engolida pelo oceano e seu proprietário a perde,
simplesmente pelo perecimento da coisa.25 Já a desapropriação está expressa na
Constituição Federal e impõe ao proprietário a obrigação inarredável de alienar o
bem em tela. É também ato unilateral, porém sendo muito mais de direito público do
que privado, onde o proprietário entrega aquilo que possui mediante justa e prévia
indenização em valor monetário.
24
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 13.ed. São Paulo : Saraiva, 2012. 25
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003. p. 177.
28
9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 13.ed. São Paulo : Saraiva, 2012.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas, vol. 5. 28 ed. São Paulo: Saraiva 2003.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - 4º vol. Direito das coisas.
28.ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil - Direitos Reais. Volume V. 6ª Ed. São Paulo:
Editora Atlas, 2006.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2011
JURIS WAY. O que é Direito Objetivo e Direito Subjetivo? Disponível em:
<http://www.jurisway.org.br/v2/pergunta.asp?idmodelo=6334>. Acesso em 04 out.
2014.