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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
F ACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA
PROGRAMA DE PÓS-
GRADUAÇÃO EM
SAÚDE, AMBIENTE E TRABALHO
DILEMAS ÉTICOS E BIOÉTICOS, QUALIDADE DE VIDA
RELACIONADA À SAÚDE E CAPACIDADE PARA O
TRABALHO DO ENFERMEIRO
PAULA DO NASCIMENTO ALVES CARDOSO
Dissertação de Mestrado
Salvador (Bahia), 2015
1
FICHA CATALOGRÁFICA
UFBA / SIBI / Biblioteca Gonçalo Moniz: Memória da Saúde Brasileira
Cardoso, Paula do Nascimento Alves
C268 Dilemas éticos e bioéticos, qualidade de vida relacionada à saúde e capacidade para
o trabalho do enfermeiro / Paula do Nascimento Alves Cardoso. Salvador: PNA Cardoso,
2015.
vi 122 fls. : il. [tab., quadros].
Anexos.
Orientadora: Profª. Drª. Liliane Elze Falcão Lins Kusterer.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Medicina da Bahia,
2015.
1. Ética. 2. Bioética. 3. Enfermagem. 4. Ética em enfermagem. 4. Enfermagem obstétrica.
5. Qualidade de vida. 6. Trabalho. I. Rêgo, Marco Antônio Vasconcelos. II. Universidade Federal
da Bahia. Faculdade de Medicina da Bahia. III. Título.
CDU – 614.257-051
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA
PROGRAMA DE PÓS-
GRADUAÇÃO EM
SAÚDE, AMBIENTE E TRABALHO
DILEMAS ÉTICOS E BIOÉTICOS, QUALIDADE DE VIDA
RELACIONADA À SAÚDE E CAPACIDADE PARA O
TRABALHO DO ENFERMEIRO
Paula do Nascimento Alves Cardoso
Orientadora: Liliane Elze Falcão Lins Kusterer
Dissertação apresentada ao Colegiado do Curso de Pós-
Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho da Faculdade
de Medicina da Bahia da Universidade Federal da Bahia,
como pré-requisito para obtenção do grau de Mestre em
Saúde Ambiente e Trabalho.
Salvador (Bahia), 2015
ii
3
COMISSÃO EXAMINADORA
Liliane Elze Falcão Lins Kusterer(professora orientadora), Professora Adjunta do
Departamento de Medicina Preventiva e Social da Universidade Federal da Bahia.
Fernando Martins Carvalho (examinador interno), Professor Titular do Departamento
de Medicina Preventiva e Social da Universidade Federal da Bahia.
Norma Carapiá Fagundes (examinadora externa), Professora Aposentada da Escola de
Enfermagem da UFBA.
iii
4
Ainda que eu tivesse o dom de profetizar e conheça todos os
mistérios e toda a ciência; ainda que eu tenha tamanha fé, a
ponto de transportar montes, se não tiver amor, nada serei.
1º Coríntios 13:2
Tudo posso naquele que me fortalece: JESUS
Filipenses 4:13
iv
5
Dedico este trabalho à minha mãe, Ester
Evangelista do Nascimento, ao meu
esposo, Ageu Ribeiro Cardoso, à minha
filha, Rebeca, e aos meus irmãos, Kátia,
Kássia, Permínio e Estela, em
agradecimento pelo amor, carinho,
cuidado e confiança.
v
6
AGRADECIMENTOS
A Deus, digno de toda minha honra, glória e louvor.
A todos os participantes da pesquisa, pela confiança e cooperação.
À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Liliane Lins, pela oportunidade,orientação, apoio,
dedicação, e por acreditar no meu desenvolvimento.
Ao professor Fernando Martins Carvalho, pelo empenho e dedicação na realização deste
trabalho.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e
Trabalho.
Aos colegas do Mestrado
À Solange Xavier e a Inha (Marivalda Pereira), pelo cuidado e apoio.
À minha mãе, Ester, pelo amor, incentivo е apoio incondicional, principalmente nаs
horas difíceis de desânimo е cansaço.
Ao mеυ esposo, Ageu, que, apesar dе todas аs dificuldades, mе fortaleceu dе forma
especial е carinhosa.
À minha filha, Rebeca, que me encoraja a romper as barreiras da vida.
Aos meus irmãos, Kátia, Kássia, Permínio e Estela; minhas sobrinhas, Jéssica e
Vanessa; meus tios e primos, que nоs momentos dе minha ausência dedicados ао estudo
superior, sеmprе entenderam qυео futuro é feito а partir dа constante dedicação nо
presente.
Meus agradecimentos аоs amigos, Eryka Rodrigues, Wendel, Rosângela Lessa,
Manuela Maturino, Andréa, Sandra, Ana Caroline, Rita Rocha, Carla Lima, Elza
Queiroz, Jamille Lira e companheiros dе trabalhos qυе fizeram parte dа minha formação
е qυе vão continuar presentes еm minha vida, cоm certeza.
A todos qυе direta оυ indiretamente fizeram parte dа minha formação, о mеυ muito
obrigada.
vi
7
SUMÁRIO LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ................................................................................ 8
LISTA DE TABELAS ................................................................................................................. 9
LISTA DE QUADROS ............................................................................................................. 10
RESUMO ................................................................................................................................... 11
1. APRESENTAÇÃO ............................................................................................................ 12
2. REVISÃO DA LITERATURA ........................................................................................ 15
2.1. DEONTOLOGIA NO EXERCÍCIO DA ENFERMAGEM .................................. 15
2.2. TRABALHO DO ENFERMEIRO OBSTETRA .................................................... 17
2.3. BIOÉTICA ................................................................................................................. 20
2.3.1. BIOÉTICA PRINCIPIALISTA ....................................................................... 21
2.3.2. BIOÉTICA PERSONALISTA ......................................................................... 25
2.4. QUALIDADE DE VIDA EM SAÚDE ..................................................................... 26
2.5. CAPACIDADE PARA O TRABALHO .................................................................. 32
3. OBJETIVOS ...................................................................................................................... 36
3.1. OBJETIVO GERAL ................................................................................................. 36
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS .................................................................................. 36
4. METODOLOGIA ............................................................................................................. 37
5. RESULTADOS E DISCUSSÕES .................................................................................... 40
6. LIMITAÇÕES DO ESTUDO .......................................................................................... 79
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 80
8. SUMMARY ......................................................................................................................... 81
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 82
10. ARTIGO ......................................................................................................................... 87
11. ANEXOS ...................................................................................................................... 108
ANEXO 1 - QUESTIONÁRIO SF – 36 ............................................................................. 108
ANEXO 2 - QUESTIONÁRIO ÍNDICE DE CAPACIDADE PARA O TRABALHO . 111
ANEXO 3 - PARECER DO CEP ....................................................................................... 116
ANEXO 4 - CARTA DE ANUÊNCIA ............................................................................... 119
12. APÊNDICES ................................................................................................................ 120
APÊNDICE 1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......... 120
APÊNDICE 2 - QUESTIONÁRIO DE SÓCIODEMOGRÁFICO................................. 121
APÊNDICE 3 - ROTEIRO PARA ENTREVISTA .......................................................... 122
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CEP – Comitê de Ética em Pesquisa
CDE - Código Deontológico de Enfermagem
CEPE - Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem
COFEN – Conselho Federal de Enfermagem
COREN – Conselho Regional de Enfermagem
CNS – Conselho Nacional de Saúde
CREMEB – Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia
DL – Decreto Lei
EPI – Equipamento de Proteção Individual
FMB – Faculdade de Medicina da Bahia
I – Informante
ICT – Índice de Capacidade para o Trabalho
NHB – Necessidades Humanas Básicas
PO – Pesquisa Orientada
QV – Qualidade de Vida
QVT – Qualidade de Vida no Trabalho
REPE - Regulamento do Exercício Profissional do Enfermeiro
SAE – Sistematização da Assistência de Enfermagem
SF-36 - Short Form 36 Health Survey
TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TJ – Testemunha de Jeová
UCI – Unidade de Cuidados Intensivos
UFBA – Universidade Federal da Bahia
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
9
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Características do trabalho de dez enfermeiros de uma maternidade,
Salvador, 2014 ...................................................................................
43
Tabela 2 Avaliação subjetiva da saúde geral há um ano, por dez enfermeiros
de uma maternidade de Salvador, 2014 .............................................
44
Tabela 3 Escores brutos e normalizados dos domínios e componentes
sumários do SF-36 em dez enfermeiros de uma maternidade de
Salvador, 2014 ...................................................................................
44
10
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Taxonomia do SF-36 ...................................................................
28
Quadro 2 Resumo de conteúdo do SF-36 com a média, desvio padrão,
confiabilidade e limite dos escores em cada domínio .................
30
Quadro 3 Número de questões e pontos dos escores de cada dimensão do
ICT ...............................................................................................
34
Quadro 4 Classificação ICT segundo os seus escores. Pontos Capacidade
para o trabalho. Objetivos das medidas .......................................
35
Quadro 5 Escores normalizados dos Componentes da Saúde Física e
Mental do SF-36, Pontuação e Classificação do ICT,
Comentários e Depoimentos de dez enfermeiros/as de uma
maternidade de Salvador, 2014 ...................................................
46
Quadro 6 Dilemas e conflitos éticos e bioéticos no exercício profissional
da enfermagem, na opinião de dez enfermeiros/as de uma
Maternidade de Salvador, 2014 ...................................................
61
11
RESUMO
Objetivou-se identificar os dilemas éticos e bioéticos referidos pelos enfermeiros
obstetras, e avaliar como os mesmos interferem na sua qualidade de vida relacionada à
saúde e na sua capacidade para o trabalho. Foi realizado um estudo misto, com
abordagem qualitativa e quantitativa, com dez enfermeiros de uma maternidade pública
de Salvador-BA. Num questionário, coletaram-se informações sociodemográficas.
Também foram aplicados os questionários Short Form Health Survey (SF-36) e Índice
de Capacidade para o Trabalho (ICT). A coleta do material qualitativo foi realizada por
meio de entrevistas gravadas e observações registradas no diário de campo. Foram
identificados os principais dilemas éticos e bioéticos vivenciados no trabalho da
Enfermagem, nas temáticas: representação das questões éticas e bioéticas no trabalho da
Enfermagem; percepção da qualidade de vida relacionada à saúde; aspectos éticos e
bioéticos para ter qualidade de vida; influência do trabalho na vida pessoal; capacidade
para o trabalho; descrição do processo de trabalho; principais dilemas éticos e bioéticos
na prática da Enfermagem. Conclui-se que os dilemas éticos e bioéticos vivenciados no
exercício profissional interferem na qualidade de vida e na capacidade para o trabalho
dos trabalhadores de Enfermagem e, consequentemente, poderão prejudicar a qualidade
da assistência prestada aos seus pacientes.
Descritores: Ética; Bioética; Enfermagem; Ética em Enfermagem; Enfermagem
Obstétrica; Qualidade de vida; Trabalho.
12
1. APRESENTAÇÃO
Através do trabalho o indivíduo melhora e promove a qualidade de vida para si e
para os seus familiares. O trabalho tem se transformado em um local de risco de
acidentes e doenças profissionais, que, consequentemente, comprometem a saúde e, às
vezes, a vida do trabalhador (REIS, 2011).
A desvalorização do trabalho pode substituir a satisfação intrínseca do exercício
profissional e a expressão da criatividade humana durante seu exercício. Prevalece então
no trabalho a sua razão instrumental utilitária, sua capacidade de prover as necessidades
básicas e de viabilizar o consumo de bens. A valorização do trabalho possibilita a
obtenção das necessidades básicas da pessoa humana, assim como garante condições
dignas de vida (COLBARI, 1995).
O trabalho da enfermagem exige condições físicas e mentais para o seu
desenvolvimento. É necessário que o trabalhador tenha equilíbrio biopsicossocial e
econômico, pois são fatores que interferem diretamente no desenvolvimento do trabalho
(TUOMI, 2005).
Na condição de enfermeira atuante, a pesquisadora pôde vivenciar na sua
trajetória profissional os conflitos que se estabelecem na atenção à saúde da pessoa
humana, que abrangem as temáticas da vida e da morte. Essa atuação requer extrema
responsabilidade e pode adoecer o trabalhador nas decisões que envolvem os princípios
bioéticos de autonomia, beneficência não maleficência, justiça e vulnerabilidade.
A vivência constante de dilemas e conflitos éticos e bioéticos no exercício da
profissão em vários setores da enfermagem, como unidade de internação, emergência,
centro cirúrgico, gerência de unidade e, até mesmo a docência em enfermagem,
estimularam a reflexão sobre o exercício da enfermagem, qualidade de vida e
capacidade para o trabalho.
13
Durante o processo de elaboração do projeto, a ampla revisão de literatura foi
fundamental para compreender as questões deontológicas envolvidas nas decisões
profissionais e a compreensão dos dilemas relatados, que se somam às inquietações
advindas da carreira profissional da pesquisadora. Dessa forma, foi possível pensar em
um objeto de pesquisa centrado nos dilemas éticos e bioéticos vivenciados pelos
enfermeiros e a relação desses com a qualidade de vida e a capacidade para o trabalho.
O presente estudo teve como objetivo identificar os dilemas éticos e bioéticos
referidos pelos enfermeiros obstetras e avaliar como os mesmos interferem na sua
qualidade de vida relacionada à saúde e na sua capacidade para o trabalho.
Foi realizado um estudo de método misto qualitativo e quantitativo. Os
participantes foram entrevistados, utilizando-se um roteiro para entrevista
semiestruturada. Foi utilizada, como método de avaliação qualitativa, a análise de
Temática de Bardin (2011). Para a análise quantitativa foi desenvolvido um instrumento
de coleta de dados sociodemográficos, aplicado o questionário Short Form Health
Survey (SF-36), versão Brasileira (CICONELLI at al, 1999) e, o questionário de Índice
de Capacidade para o Trabalho (TUOMI et al, 2005).
A pesquisa foi realizada em uma maternidade pública da cidade de Salvador-
BA. Participaram do estudo 10 profissionais que atuavam em diversos setores da
maternidade. Com os resultados do estudo foi possível identificar as seguintes
temáticas: representação das questões éticas e bioéticas no trabalho da enfermagem;
percepção da qualidade de vida; aspectos éticos e bioéticos para ter qualidade de vida;
influência do trabalho na vida pessoal; capacidade para o trabalho; descrição do
processo de trabalho e os principais dilemas éticos e bioéticos identificados na vivência
da enfermagem.
14
A discussão das temáticas identificadas segundo os aspectos éticos e bioéticos
baseou-se na teoria principialista de Beauchamp e Childress, no manual de Bioética de
Elio Sgreccia e na Carta Universal de Direitos Humanos da UNESCO.
15
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1.DEONTOLOGIA NO EXERCÍCIO DA ENFERMAGEM
A enfermagem é definida como a arte do cuidar (LIMA, 1993), exercida de maneira
interativa, atuando nas dimensões física, psicológica, social, ambiental e cultural
(WALDOW, 1998).
O exercício do profissional enfermeiro é composto por aspectos pessoais e sociais,
sensibilidade, respeito e solidariedade. (SILVA et al., 2009).
Ferreira (2006) definiu a enfermagem como a arte do cuidar de enfermos e a ciência
que cuida do ser humano, individualmente, na família ou em comunidade, de modo
integral e holístico. Lima (1993) também descreveu a enfermagem como ciência e arte:
“Fundamenta-se num corpo de conhecimentos e práticas, abrangendo do estado de
saúde ao estado de doença, mediada por transações pessoais, profissionais, científicas,
estéticas, éticas e políticas do cuidar de seres humanos".
No exercício da profissão de enfermagem existe liberdade nas ações, porém essa
liberdade implica em agir com responsabilidade. A preservação e o cuidado da vida
humana exigem que o profissional atue com sabedoria e ética. Partindo desses
princípios, surge a deontologia profissional com obrigações, proibições, direitos e
deveres profissionais pelos quais os trabalhadores enfermeiros são determinados a
cumprir, porém estão sujeitos a penalidades, caso venham a desconsiderar e/ou
descumprir certas normas.
De acordo com a classificação nacional das profissões, a Enfermagem é uma
profissão liberal, na essência do serviço e do compromisso. Representa uma profissão
classificada como intelectual e científica, seguindo o modelo de autorregulação. E para
isso conta-se com o órgão regulador que estabelece o acesso à profissão, o controle do
16
exercício (designadamente pelas regras éticas e deontológicas, pela formulação de
padrões de qualidade para o exercício), assumindo o poder jurisdicional e a sanção
disciplinar, sendo a sua própria finalidade colocada a serviço do público (NUNES,
2007).
O cidadão que se constitui como enfermeiro deve conhecer e respeitar as normas
regulamentadoras da profissão que estão contidas no Decreto-Lei n.º 161/96, que dispõe
sobre o Regulamento do Exercício Profissional do Enfermeiro (REPE); no Código
Deontológico de Enfermagem, disposto no Decreto-Lei 111/2009; e no Código de Ética
de Enfermagem aprovado pela Resolução COFEN-311/2007 para aplicação na
jurisdição de todos os Conselhos de Enfermagem.
O enfermeiro, ao registrar-se como profissional, assume direitos e deveres éticos
e deontológicos, os quais exigem que nas suas relações profissionais observem
princípios e valores que são universais para humanidade.
Na comunidade, o profissional tem a responsabilidade de promover a saúde e
dar resposta adequada às necessidades em cuidados de enfermagem. No que se refere ao
respeito do direito da pessoa à vida, durante todas as etapas da existência humana, o
trabalhador da enfermagem assume deveres de manutenção e recuperação da vida e da
qualidade de vida, agindo sempre com informação dos cuidados de enfermagem,
obtendo o consentimento, garantindo o sigilo, respeitando a intimidade de maneira
humanizada na assistência prestada, acompanhando o doente nas diferentes etapas,
inclusive em fase terminal.
As determinações legais para a execução da profissão foi instituída desde 1973
pela Lei nº 5.905. A autarquia profissional de enfermagem é constituída pelo conjunto
dos Conselhos Federal e Regionais de Enfermagem, com a finalidade de normatizar,
disciplinar e fiscalizar o exercício da Enfermagem e de suas atividades em todo
17
Território Nacional, filiado ao Conselho Internacional de Enfermeiros, sediado em
Genebra, vinculado ao Ministério do Trabalho e à Previdência Social.
Os conselhos de enfermagem reconhecem o direito da população à assistência de
enfermagem, pressupondo uma assistência de qualidade, livre de riscos e acessível,
porém essa responsabilidade profissional leva os enfermeiros à vivência de dilemas e
conflitos éticos e bioéticos.
2.2. TRABALHO DO ENFERMEIRO OBSTETRA
O Ministério da Saúde, em 1984, criou o Programa de Assistência Integral à
Saúde da Mulher (PAISM), que estabelece o cuidado à saúde da mulher pelo sistema de
saúde, com o objetivo de atender a mulher em sua fase reprodutiva. O PAISM, através
de manuais, define o conteúdo das ações em saúde, normatizando os procedimentos e
padronizando as condutas em relação às doenças sexualmente transmitidas; câncer
cérvico-uterino e de mama; planejamento familiar; parto e puerpério; gravidez de baixo,
médio e alto risco; assistência à adolescente e à mulher no climatério; assistência ao
abortamento; assistência à concepção e anticoncepção (BRASIL, 1984).
Atualmente a enfermagem obstétrica está sendo incentivada pelas políticas
nacionais de saúde do Ministério da Saúde pela compatibilidade dessa formação com a
contemporaneidade de atenção à gestação, ao parto e ao puerpério. O Ministério da
Saúde apoia a enfermagem obstétrica e atribui ao enfermeiro a possibilidade de emissão
de laudos de internação, define o enfermeiro obstetra como membro necessário na
composição da equipe, além de regulamentar a emissão de declaração de nascimento
por profissionais de saúde nos partos domiciliares (BRASIL, 1998; 2012).
O trabalho dos enfermeiros obstetras é regulamentado pela lei do exercício
profissional nº 7.498/86, artigo 6º inciso II que assegura ao profissional atuar no
18
acompanhamento do trabalho de parto e execução do parto normal sem distócias,
realização de episiotomia e episiorrafia com aplicação de anestésico local, quando
necessário, identificação das distócias obstétricas e tomada de providências até a
chegada do médico, bem como a emissão de laudo de internação hospitalar
(CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2007).
A atuação do enfermeiro obstetra é de grande importância na atenção à saúde da
mulher no período gravídico-puerperal, contribuindo na melhoria da qualidade da
assistência, desenvolvendo funções gerenciais e assistenciais, e, apesar do respaldo legal
da profissão, enfrentam inúmeras dificuldades com a equipe de saúde do centro
obstétrico. (BRASIL, 2001)
A maternidade pública Albert Sabin, localizada na periferia da Cidade do
Salvador e inaugurada na década de 1990, faz parte dessas ações do Ministério da
Saúde, sendo considerada referência secundária para gestação de alto risco pela Central
Estadual de Regulação (CER). Assim, recebe as gestantes com maior gravidade de todo
Estado, realizando, em média, 300 partos por mês, contemplando as ações de Atenção
Integral à Saúde da Mulher, utilizando a estratégia da Rede Cegonha (CONSELHO
REGIONAL DE ENFERMAGEM DA BAHIA, 2014).
A Rede Cegonha é uma estratégia do Ministério da Saúde, instituída no âmbito do
SUS através da Portaria nº 1.459 de 24 de Junho de 2011, que visa a implementar uma
rede de cuidados para assegurar às mulheres o direito ao planejamento reprodutivo e a
atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como assegurar às
crianças o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis.
Esta estratégia tem a finalidade de estruturar e organizar a atenção à saúde materno-
infantil no País e está sendo implantada, gradativamente, em todo o território nacional,
19
iniciando sua implantação de acordo o critério epidemiológico, taxa de mortalidade
infantil e razão mortalidade materna e densidade populacional (BRASIL, 2012).
O trabalho dos enfermeiros obstetras na maternidade estudada se apresenta com a
alta demanda de atendimentos, superlotação, longos períodos em pé e com
deslocamento em diversos momentos de um setor para outro em busca de resolução de
problemas da unidade, caracterizando um trabalho intenso, com ritmo excessivo e
desgaste físico e mental na execução das atividades. Por isso, os enfermeiros utilizam
diversos artifícios que resultam no aumento das demandas sobre o corpo e sobre as
capacidades cognitivas e psíquicas do enfermeiro (PEREIRA, 2013).
Na organização do sistema de saúde, há incoerência entre a previsão real da
demanda (demanda excedente) e a capacidade instalada disponível (real e necessária),
produzindo perturbações na organização do processo de trabalho na maternidade,
acarretando a sobrecarga de trabalho e sentimento de impotência e sofrimento nos
trabalhadores (PEREIRA, 2013).
Porém, a dificuldade de médicos obstetras e enfermeiros obstetras em delimitar
funções e atribuições constitui a principal causa de conflitos do trabalho em equipe
(TUESTA, 2003).
As situações de conflitos acontecem quando os enfermeiros realizam o
procedimento do parto normal, em que alguns profissionais percebem essa atuação
como enfrentamento na tomada de decisões frente à assistência à parturiente. Essa
dificuldade de aceitação do papel dos enfermeiros obstetras pela equipe médica inibe a
realização do parto normal por enfermeiros, implicando em prejuízos na assistência à
parturiente (ARAÚJO; OLIVEIRA, 2006).
20
No processo de trabalho dos enfermeiros obstetras observa-se a presença
constante de conflitos e dilemas éticos e bioéticos devido principalmente às condições
precárias de trabalho e às divergências dos profissionais da obstetrícia.
2.3. BIOÉTICA
Cotidianamente, os indivíduos se defrontam com a necessidade de pautar o seu
comportamento em normas, as quais são aceitas e reconhecidas como obrigatórias. A
partir da compreensão de que os homens agem moralmente na sociedade é que, de
acordo com as normas, as pessoas guiam as suas ações e compreendem que têm o dever
de agir desta ou de outra maneira, além de refletirem sobre o seu comportamento na
vida prática e o tomarem como objeto da sua reflexão (VAZQUEZ, 2002).
Nesse sentido, a Bioética, sendo um ramo da ética aplicada, contribui para a
reflexão sobre os valores inerentes à vida e à saúde humana, abrangendo diversos
posicionamentos com relação às mesmas situações, ensejando divergências pouco
frequentemente superadas pelo diálogo, que podem evoluir para a discussão áspera e até
para o conflito (SEGRE, 2002).
Entretanto, essa tentativa de reflexão sistemática a respeito de todas as
intervenções do homem sobre os seres vivos assume um objetivo árduo de identificar
valores e normas que guiem o agir humano com relação à intervenção da ciência e da
tecnologia sobre a própria vida e sobre a biosfera (SGRECCIA, 2009).
No senso comum, a terminologia bioética é definida como “ética da vida” (do
grego bios, “vida”, e ethike, “ética”) (PALÁCIOS et al., 2002).
A Bioética considera que, ao vivenciar uma desorientação ou incerteza moral,
somos levados a refletir sobre aquilo que é recomendado ou exigido pela moralidade e a
21
ponderar sobre o que devemos fazer, representando uma necessidade de justificação
moral (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002). Por isso, evidenciamos diversos modelos
éticos, a fim de solucionar os questionamentos em relação às ciências da vida.
Neste estudo, abordaremos a Bioética Personalista, que coloca a pessoa como
critério de avaliação frente a um dilema bioético, e a Bioética Principialista, que tem
como pilares quatro princípios fundamentais: beneficência, não maleficência, autonomia
e justiça. Além destes princípios, outros princípios descritos na Declaração Universal de
Bioética e Direitos Humanos (UNESCO, 2005,) como vulnerabilidade, solidariedade,
responsabilidade social e dignidade humana, serão incorporados às reflexões bioéticas
dessa pesquisa.
2.3.1. BIOÉTICA PRINCIPIALISTA
A utilização de princípios para resolver situações de conflitos e dilemas da ética
biomédica justifica a terminologia da teoria Bioética Principialista. Os princípios
derivam de juízos ponderados no interior da moralidade comum e da tradição médica.
Esses princípios não funcionam como diretrizes de ação precisas que nos informam
como agir em cada circunstância. Os princípios são diretrizes gerais que deixam um
espaço considerável para um julgamento, em casos específicos, e que proporcionam
uma orientação substantiva para o desenvolvimento de regras e políticas mais
detalhadas (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Os quatro princípios são: (1) o respeito pela autonomia (uma norma sobre o
respeito pela capacidade de tomar decisões de pessoas autônomas), (2) a não
maleficência (uma norma que previne que se provoquem danos), (3) a beneficência (um
grupo de normas para proporcionar benefícios e para ponderar benefícios contra riscos e
custos), (4) a justiça (um grupo de normas para distribuir os benefícios, os riscos e os
custos de forma justa) (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
22
No sentido de tornar compreensível e aplicável o conhecimento ético e bioético,
esses quatro princípios foram analisados nesse estudo. Até o momento esses princípios
são os mais utilizados como referencial para abordagem de dilemas éticos na saúde e
podem contribuir para a reflexão de situações no campo da Enfermagem.
Na linguagem comum, a palavra “beneficência” significa compaixão, bondade e
caridade. Refere-se à obrigação moral de agir em benefício de outros. A beneficência
segue algumas regras morais, como: proteger e defender os direitos dos outros; evitar
que os outros sofram danos; eliminar as condições que causarão danos a outros; ajudar
pessoas inaptas; além de socorrer pessoas que estão em perigo (BEAUCHAMP;
CHILDRESS, 2002).
O princípio da beneficência é considerado o princípio fundamental para a
assistência à saúde, por ser compreendido como uma ação a ser realizada em benefício
do outro. No desenvolvimento das atividades da Enfermagem, tal princípio deve ser
evidenciado a todos os profissionais, de forma a conscientizá-los da importância de tal
valor na execução de qualquer ação sobre o ser humano. No gerenciamento dos serviços
da profissão, a beneficência deve ser considerada durante todo o processo de tomada de
decisão do enfermeiro com cargo gerencial, de modo que a decisão resulte em fatores
positivos sobre todos os envolvidos (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
O princípio da não maleficência determina a obrigação de não infligir dano
intencionalmente, ou seja, acima de tudo não causar dano. As regras morais implicadas
nesse princípio são: não matar; não causar dor, ofensa, sofrimento, incapacitação a
outros, e não despojar outros dos prazeres da vida (BEAUCHAMP; CHILDRESS,
2002). Na utilização deste princípio para reflexão e consequente tomada de conduta, é
imprescindível estar atento e concentrado no contexto e, principalmente, nas crenças,
valores e costumes pessoais, pois o que despercebidamente não causa dano a um
23
determinado indivíduo pode causar dano a outrem. No contexto da profissão, os
profissionais devem primar em conhecer o ser humano a quem se destina o cuidado, na
tentativa de compreender seus diversos aspectos sociais, políticos, econômicos,
religiosos, dentre outros, para executar ações que não interfiram de forma negativa em
suas crenças. O enfermeiro na função de gestor necessita fazer com que suas ações
atendam à instituição, aos profissionais e aos clientes envolvidos (MARCON, 2005).
O princípio do respeito à autonomia pode ser definido como uma questão de ter
capacidade de controlar ponderadamente e de se identificar com desejos e preferências
próprias. O respeito à autonomia é o reconhecimento do direito de a pessoa ter suas
opiniões, fazer suas escolhas e de agir com base em suas crenças e valores pessoais, sem
intervenções. Por isso, consideram-se duas condições essenciais para o exercício da
autonomia: a liberdade (independência de influências controladoras), a qualidade de
agente (capacidade de agir intencionalmente e com entendimento). Dizer a verdade,
respeitar a privacidade dos outros, proteger informações confidenciais, obter
consentimento para intervenções nos pacientes e, quando solicitado, ajudar os outros a
tomar decisões importantes são regras morais referentes a esse princípio
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
No fazer da Enfermagem, muitas vezes tal princípio é omitido pela preocupação
central em executar as tarefas em tempo hábil. Tanto na assistência como no
gerenciamento, é imprescindível que os profissionais se conscientizem para a
importância de tal princípio como „guia‟ para toda a atividade a ser executada. Durante
o cuidado, é necessário buscar a autonomia do cliente para prestar um cuidado
personalizado e respeitoso. No gerenciamento, o respeito à autonomia do funcionário
contribui para este sentir-se mais valorizado e respeitado, permitindo sua participação
24
em decisões, de forma que essas resultem em ações participativas e comprometidas pela
equipe de enfermagem (MARCON, 2005).
O princípio de justiça é interpretado como um tratamento justo, equitativo e
apropriado, levando em consideração aquilo que é devido às pessoas. Há também de se
considerar os princípios materiais de justiça que são: a todas as pessoas uma parte igual;
a cada um de acordo com sua necessidade, seu esforço, sua contribuição e seu
reconhecimento (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
O enfermeiro, em todas as áreas do seu processo de trabalho, necessita alicerçar
suas atitudes no princípio da justiça. Como exemplo dessa necessidade, tem-se o
profissional gestor que, possuindo inúmeras atividades, necessita fazer escolhas de
pessoas (para determinado cargo, atividade, horário, folga) e, para isso, precisa deste
princípio muito bem esclarecido, evitando interferências advindas de amizades ou
parentescos. Este princípio não é de fácil utilização, por envolver uma análise crítica
aprofundada da situação em questão para tomar determinados posicionamentos
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Importante ressaltar que a consolidação da enfermagem na prática deveu-se,
também, aos aportes da corrente principialista da bioética, ao adotar os princípios de
autonomia, justiça, beneficência e não maleficência. Isso permitiu avanços importantes
para superação de determinados conflitos produzidos pelo efeito indesejado das
desigualdades no âmbito das relações sociais e profissionais, através da sistematização
dos saberes pertinentes ao ofício, para constituir um campo profissional digno do ser
humano e para o ser humano (BELLATO, 2003).
25
2.3.2. BIOÉTICA PERSONALISTA
A tradição personalista aprofunda suas raízes na própria razão do homem e no
coração de sua liberdade: o homem é pessoa porque é o único ser em quem a vida se
torna capaz de “reflexão” sobre si, de autodeterminação; é o único ser vivo que tem a
capacidade de captar e descobrir o sentido das coisas, e de dar sentido às suas
expressões e à sua linguagem consciente (SGRECCIA, 2009).
O homem é um indivíduo que se governa por si mediante a inteligência e a
vontade; existe não só fisicamente, pois há nele um existir mais rico e mais elevado,
uma superexistência espiritual no conhecimento e no amor.
A pessoa humana se apresenta como o ponto de referência, o fim e não o meio.
Desde a concepção até a morte, em qualquer situação de sofrimento ou de saúde, é a
pessoa humana o ponto de referência e a medida entre o lícito e o não lícito.
O indivíduo é um corpo espiritualizado, um espírito encarnado, que vale por
aquilo que é e não somente pelas escolhas que faz. Em toda escolha a pessoa empenha
aquilo que é a sua existência e a sua essência, o seu corpo e o seu espírito; nesse
contexto a escolha engloba um fim, meios e valores (SGRECCIA, 2014).
Dessa forma, se faz necessária a compreensão do significado da vida humana que
se tem, além de considerar o homem em sua plenitude de valor (SGRECCIA, 2014).
Lembrando que o corpo humano como valor não tem “preço” e, então, não é
comercializável, a única possibilidade de “troca” se torna o “dom” inscritível no
horizonte da gratuidade, da solidariedade, do altruísmo (SGRECCIA, 2014).
Definir a essência humana como corporeidade e espiritualidade unidas significa
explorar as profundezas reais que se escondem do “eu” e do “tu” na relação social
(SGRECCIA, 2009).
26
Diante da pessoa, da saúde e da doença há quatro dimensões da saúde que se
cruzam e se permeiam: a dimensão orgânica, a dimensão psíquica e mental, a dimensão
ecológico-social e a dimensão ética (SGRECCIA, 2009).
Considera-se a bioética como uma área de discussão sobre valores inerentes à vida
e à saúde (SEGRE, 2002). Devido à complexidade de tais atividades, faz-se necessário
adquirir conhecimento sobre ética e bioética, para subsidiar as decisões, de forma que
satisfaça a todos.
A bioética é um espaço multidisciplinar que envolve a área da saúde. Dessa
forma, entendemos que o exercício da enfermagem deve se apropriar desse referencial
de reflexão ética para nortear as suas práticas. No que se refere às relações com os
pacientes tem-se observado, ainda, o paternalismo que remete ao critério bioético da
beneficência (BOEMER, 2004). Presencia-se, no cotidiano das unidades de saúde, um
aumento exponencial de complexidade tecnológica, científica e de relações humanas,
gerando, dessa forma, a necessidade de um novo perfil para o profissional dessa unidade
(TRAMONTIMI, 2002).
Deve-se chamar atenção sobre a necessidade de estudos que avaliem os dilemas
éticos e bioéticos na equipe de enfermagem e a relação desses com a qualidade de vida e
a capacidade para o trabalho do enfermeiro.
2.4. QUALIDADE DE VIDA EM SAÚDE
Nahas (2006) entende a Qualidade de Vida (QV) como a medida da própria
dignidade humana, além de considerar como a percepção de bem-estar resultante de um
conjunto de parâmetros individuais e socioambientais modificáveis, ou não, que
caracterizam condições em que vive o ser humano. Entre os socioambientais: moradia,
transporte, segurança, assistência médica, educação, cultura, meio ambiente; como
27
parâmetros individuais: hereditariedade, estilo de vida (hábitos alimentares, controle do
estresse, atividade física habitual, comportamento preventivo, relacionamentos).
A qualidade de vida é uma percepção única e pessoal, o que denota a maneira
como os pacientes percebem o seu estado de saúde e/ou aspectos não médicos de suas
vidas (GILL; FEISNTEN, 1994).
Considerando ser um conceito intrinsecamente subjetivo, dependente de uma série
de fatores que constituem a percepção do observador de um dado objeto, pessoa ou
evento, qualidade de vida pode ser definida como posicionamento do indivíduo em
resposta física ou mental, diante dos estímulos construídos a partir de suas percepções
em confronto com as expectativas elaboradas para determinadas condições reais ou
aparentes. A qualidade de vida do trabalhador é uma forma simbólica da expressão da
percepção do conjunto das condições de trabalho (BARBOSA FILHO, 2011).
Para a Bioética Personalista, a análise da qualidade de vida deverá procurar dentro
da pessoa a satisfação das necessidades e dos desejos, além do respeito e da promoção
dos valores tipicamente humanos, sendo estes espirituais e/ou morais (SGRECCIA,
2009).
Segundo Chiavenato (2006), a qualidade de vida no trabalho – QVT –implica em
profundo respeito pelas pessoas, para alcançar níveis elevados de qualidade e
produtividade. Nesse sentido, as organizações precisam de pessoas motivadas que
participem ativamente no trabalho e que sejam adequadamente recompensadas pelas
suas contribuições.
A qualidade de vida na prática dos profissionais de saúde tem sido considerada
como qualidade de vida em saúde e, clinicamente, é usado para expressar o impacto
físico e psicossocial causado pelas alterações físicas e biológicas produzidas por
doenças e terapias que interferem nas condições de vida (MINAYO et. al., 2000).
28
Diante da diversidade de conceitos e da imanente subjetividade, alguns
instrumentos foram desenvolvidos para avaliar a qualidade de vida. O Short Form 36
Health Survey Questionnaire (SF-36) é um instrumento genérico de pesquisa utilizado
em inquéritos de saúde. Foi desenvolvido no final dos anos 80 por Ware e Donald
(WARE, 2000), sendo aplicado em numerosas situações. O SF-36 estabelece dois
índices do estado de saúde, que incorpora várias dimensões, combinando aspectos
físicos e cognitivos. A base conceitual de desenvolvimento do SF-36 é composta por
“status funcional” e “bem estar” relacionados com a saúde (CICONELLI et.al, 1999).
A avaliação da qualidade de vida é feita basicamente pela administração de
instrumentos ou questionários que, em sua grande maioria, foram formulados na língua
inglesa, direcionados para utilização na população que fala esse idioma. Portanto, para
que possa ser utilizado em outro idioma, devem-se seguir normas preestabelecidas na
literatura para sua tradução e, posteriormente, suas propriedades de medida devem ser
demonstradas num contexto cultural específico. Sendo assim, o questionário SF-36 foi
traduzido e adaptado culturalmente para a população brasileira de acordo com
metodologia internacionalmente aceita (CICONELLI et.al, 1999).
O SF-36 é autoaplicável, podendo também ser aplicado de forma
computadorizada ou por telefone por um entrevistador treinado para as pessoas com
idade igual ou superior a 14 anos. A duração média de aplicação deste questionário é de
15 minutos, com elevado grau de aceitabilidade e qualidade dos dados.
O questionário contém 36 itens, dos quais 35 encontram-se agrupados em oito
dimensões (capacidade funcional, dor, aspectos físicos, aspectos emocionais, aspectos
sociais, saúde mental, vitalidade e estado geral de saúde) e um último item que avalia a
mudança de saúde no tempo, demonstrado no quadro 1. Para cada dimensão, os itens do
29
SF-36 são codificados, agrupados e transformados em uma escala de zero (pior estado
de saúde) a 100 (melhor estado de saúde).
Quadro 1- Taxonomia do SF-36
ITENS DOMINIOS
3a. Atividades vigorosas
3b. Atividades moderadas
3c. Levantar ou carregar mantimentos
3d. Subir vários lances de escada
3e. Subir um lance de escada
3f. Curvar-se, ajoelhar-se ou dobrar-se
3g. Andar mais de um quilômetro
3h. Andar vários quarteirões
3i. Andar um quarteirão
3j. Tomar banho ou vestir-se
Capacidade
Funcional
4a. Diminuir a quantidade de tempo
4b. Realizar menos tarefas
4c. Limitação em atividades
4d. Dificuldade no trabalho
Aspectos físicos
7. Magnitude da dor
8. Interferência da dor Dor
1. Avaliação global da saúde
11a.Adoecer mais facilmente
11b. Tão saudável quanto
11c. Saúde vai piorar
11d. Saúde excelente
Estado geral de
Saúde
9a.Vigor/vontade/força
9e. Energia
9g. Esgotamento
91. Cansaço
Vitalidade
6. Interferência na vida social
10. Interferência no tempo da vida social Aspectos sociais
5a. Diminuir quantidade de tempo
5b. Realizar menos tarefas
5c. Cuidado com atividades
Aspectos
emocionais
9b. Pessoa nervosa
9c. Deprimido
9d. Calmo/Tranquilo
9f. Desanimado/abatido
9h. Feliz
Saúde mental
Fonte: Ware (2000) / Adaptado
30
A confiabilidade dos oito domínios e das duas medidas sumarizadas tem sido
estimada usando os métodos de consistência interna e teste-reteste. As publicações
relatando estatística de confiabilidade do SF-36 têm demonstrado, com raras exceções,
índices acima de 0,70, e até 0,80, para os diferentes domínios e, para as medidas
sumarizadas, os coeficientes têm excedido 0,90. A revisão dos primeiros 15 estudos
publicados revelou que a média dos coeficientes de confiabilidade para cada um dos
oito domínios foi igual ou maior que 0,80, exceto para o domínio aspectos sociais, com
média 0,76 (WARE, 2000).
O quadro 2 apresenta um resumo do conteúdo do SF-36 com as médias dos
escores em cada domínio para a população dos Estados Unidos, país de origem do
instrumento, demonstrando também a confiabilidade de cada escala e o significado do
menor e do maior escore.
31
Quadro 2- Resumo de conteúdo do SF-36 com a média, desvio padrão, confiabilidade e
limite dos escores em cada domínio.
Domínios
Nº de
itens
Média
DP
Confiabilida
de
Menor escore
possível (floor)
Maior escore
possível (ceiling)
Capacidade
funcional
10
84,2
23,3
0,93
Muito limitado em
realizar todas as
atividades físicas,
incluindo banhar-se e
vestir-se
Realiza todos os
tipos de
atividades físicas
incluindo as mais
vigorosas sem
limitações a
saúde
Aspectos
físicos
4
80,9
34,0
0,89
Problemas com o
trabalho ou outras
atividades diárias
como consequência
da saúde física
Nenhum
problema com
trabalho ou outras
atividades diárias
Dor
2
75,2
23,7
0,90
Dor muito severa e
extremamente
limitante
Nenhuma dor e
nenhuma
limitação devido
à dor
Estado geral
de saúde
5
71,9
20,3
0,81
Avalia sua saúde
geral como muito
ruim e acredita que
ela piorará
Avalia sua saúde
pessoal como
excelente
Vitalidade
4
60,9
20,9
0,86
Sente-se cansado ou
esgotado todo o
tempo
Sente-se cheio de
energia e vigor
todo o
tempo
Aspectos
sociais
2
83,3
22,7
0,68
Interferência extrema
e frequente de
problemas físicos e
emocionais nas
atividades sociais
Atividades
sociais não
sofrem
interferência por
problemas físicos
ou emocionais
Aspectos
emocionais
3
81,3
33,0
0,82
Problemas com o
trabalho ou outras
atividades diárias
como consequência
de problemas
emocionais
Nenhum
problema com
trabalho ou
atividades
diárias.
Saúde
mental
5
74,7
18,1
0,84
Sentir-se nervoso ou
deprimido todo o
tempo
Sentir-se feliz,
calmo e tranquilo
todo o tempo
DP = Desvio padrão
Fonte: WARE, 2000 / Adaptado
32
A validade de cada domínio foi avaliada através de estudos de análise fatorial. O
primeiro é o de capacidade funcional, que tem sido a melhor medida de saúde física; o
último domínio, saúde mental, foi o que teve o melhor desempenho nos testes de
validação para avaliar saúde mental em diversos estudos. Contudo, esse domínio é a
medida com pior desempenho para avaliar componente físico, e o domínio capacidade
funcional é a pior para avaliação de componente mental. Os domínios de vitalidade e
estado geral de saúde são válidos para avaliação de ambos componentes, físico e mental
(WARE, 2000).
Avaliação e interpretação do SF-36
A interpretação dos resultados tem sido feita muito mais facilmente com a
padronização dos escores médios e desvios-padrão para todas as escalas do SF-36,
conforme disposição da segunda tabela. Especificamente, a pontuação normalizada com
média 50 e desvio padrão 10 tem provado ser muito útil ao interpretar as diferenças
entre as escalas no perfil SF-36 e para monitorar grupos de doenças ao longo do tempo
(WERE, 2000).
Apesar de serem amplamente utilizados no Brasil, os dados normativos
disponíveis para a população geral são precários, dificultando a interpretação dos
escores obtidos em diferentes grupos de pacientes (CRUZ,2010).
2.5. CAPACIDADE PARA O TRABALHO
A capacidade para o trabalho pode ser definida como recurso humano que reúne a
capacidade física e mental, habilidades e conhecimentos, estilos de vida, além das
condições sociodemográficas e valores (ILMARINEN, 2001).
Essa capacidade para o trabalho é considerada como a base do bem-estar para
todos, porém pode ser afetada por diversos fatores, influenciando o desenvolvimento da
33
atividade ocupacional bem como estilo de vida e o ambiente de trabalho (TUOMI et at.,
2005).
As exigências físicas e mentais positivas do trabalho promovem e protegem a
saúde e a capacidade funcional do trabalhador (ILMARINEN, 2001). Porém, essas
exigências podem gerar alterações fisiológicas agudas e crônicas, reações psicológicas e
mudanças comportamentais, diminuindo a capacidade funcional e a capacidade para o
trabalho, favorecendo o aparecimento de doenças relacionadas ao trabalho (TUOMI et
al., 2005).
A avaliação da capacidade para o trabalho pode ser realizada por meio da
aplicação do instrumento Índice de Capacidade para o Trabalho – ICT–, que representa
adequada abordagem individual e coletiva. O ICT foi desenvolvido por um grupo de
pesquisadores filandeses com formação em psicologia, medicina, bioestatística,
epidemiologia e profissionais da área de saúde ocupacional (TUOMI et at., 2005).
Baseado na autopercepção dos trabalhadores, o ICT é um instrumento com
objetivo de mensurar o “quão bem está, ou estará, um (a) trabalhador (a) neste momento
ou num futuro próximo, e quão bem ele ou ela pode executar seu trabalho, em função
das exigências, de seu estado de saúde e capacidades físicas e mentais” (TUOMI et al.,
2005).
O ICT é composto de sete itens, cada um avaliado por uma ou mais questões
(quadro 3) que avaliam as exigências físicas e mentais do trabalho, o estado de saúde do
trabalhador e seus recursos, físicos e mentais.
34
Quadro 3- Número de questões e pontos dos escores de cada dimensão do ICT
Item Nº de
questões Número de pontos (escore) das respostas
1. Capacidade atual para o trabalho comparada com a
melhor de toda a vida
1 0 – 10 pontos
(valor assinalado no questionário)
2. Capacidade para o trabalho em relação às
exigências do trabalho
2 Número de pontos ponderados de acordo
com a natureza do trabalho
3. Número de doenças atuais diagnosticadas por médico
1
(lista de 51
doenças)
Pelo menos 5 doenças = 1 ponto.
4 doenças = 2 pontos
3 doenças = 3 pontos
2 doenças = 2 pontos
1 doença = 5 pontos
Nenhuma doença = 7 pontos
4. Perda estimada para o trabalho por causa de doenças
1
1-6 pontos (valor circulado no questionário;
o pior valor
escolhido)
5. Faltas ao trabalho por doenças no último ano (12
meses)
1 1-5 pontos (valor circulado no questionário).
6. Prognóstico próprio da capacidade para o trabalho daqui
a 2 anos
1 1, 4 ou 7 pontos (valor circulado no
questionário).
7. Recursos mentais * 3
Os pontos das questões são somados e o
resultado é contado da
seguinte forma:
Soma 0-3 = 1 ponto.
Soma 4-6 = 2 pontos.
Soma 7-9 = 3 pontos.
Soma 10-12 = 4 pontos.
Fonte: TUOMI et al., 2005
*este item refere-se à vida em geral, tanto no trabalho como no tempo livre.
O resultado atinge um escore de 7 a 49 pontos, que representam o conceito do
trabalhador sobre sua capacidade para o trabalho. Esses escores são classificados em
umas das quatro categorias do ICT (quadro 4), de maneira que indicam medidas
necessárias a serem tomadas para restaurar, melhorar, apoiar e manter a capacidade para
o trabalho.
35
Quadro 4 – Pontuação, escores e medidas necessárias do Índice de Capacidade para o
Trabalho.
Pontos Capacidade para o trabalho Medidas necessárias
7-27 Baixa Restaurar a capacidade para o trabalho.
28-36 Moderada Melhorar a capacidade para o trabalho.
37-43 Boa Apoiar a capacidade para o trabalho.
44-49 Ótima Manter a capacidade para o trabalho.
Fonte: TUOMI et al., 2005
36
3. OBJETIVOS
3.1. OBJETIVO GERAL
Identificar os dilemas éticos e bioéticos referidos pelos enfermeiros
obstetras e avaliar como os mesmos interferem na sua qualidade de vida
relacionada à saúde e na sua capacidade para o trabalho.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Identificar os dilemas éticos e bioéticos referidos pelos enfermeiros obstetras;
Avaliar como esses dilemas éticos e bioéticos interferem na sua qualidade de
vida relacionada à saúde;
Avaliar como esses dilemas éticos e bioéticos interferem na sua capacidade
para o trabalho.
37
4. METODOLOGIA
Trata-se de um estudo de método misto, qualitativo e quantitativo. A pesquisa de
método misto oferece uma terceira alternativa alicerçada na dupla contribuição entre as
duas abordagens metodológicas (TEDDLIE; TASHAKKORI, 2011). De acordo com
Jonshonet al. (2007), o método misto consiste em:
A pesquisa de método misto é o tipo de pesquisa na qual o
pesquisador ou grupo de pesquisadores combinam elementos de
abordagem qualitativa e quantitativa (ponto de vistas, coletas de
dados, análises, inferências e técnicas qualitativas e quantitativas) no
propósito de maior entendimento e compreensão (JONHSON et al.,
2007, p123).
A utilização de método misto é caracterizada pelo paradigma do pluralismo, tendo
em vista: 1- considerar a posição alternativa de paradigma; 2- buscar a alternativa mais
próxima às perspectivas do estudo (TEDDLIE; TASHAKKORI, 2011).
A respeito da combinação de metodologias, a antropologia permite abordagens
mais complexas com as seguintes regras: documentação estatística, observação do
campo de estudo, desenvolver o olhar para diferentes fenômenos sociológicos e
desenvolver a escuta na busca de compreender o objeto de estudo no seu contexto social
(MINAYO, 2010).
A complexidade da pesquisa de método misto envolve questões epistemológicas
da objetividade e subjetividade, tendo-se como entendimento que os fenômenos sociais
podem ser categorizados em sua análise qualitativa inserida em um contexto social.
Na presente pesquisa, procurou-se identificar se os dilemas éticos e bioéticos
vivenciados pela equipe de trabalhadores da enfermagem interferem em sua qualidade
de vida e capacidade para o trabalho.
38
O método utilizado para análise qualitativa dos dados foi análise temática. O
referido método considera a totalidade do texto na análise, passando-o por uma crítica
de classificação e de quantificação, segundo a frequência de presença ou ausência de
itens de sentido. É um método de gavetas ou de rubricas significativas que permitem a
classificação dos elementos de significação constitutivos da mensagem (BARDIN,
2011).
Para análise quantitativa foi desenvolvido um instrumento de coleta de dados
sociodemográficos (Apêndice 1), aplicado o questionário Short Form Health Survey
(SF-36), versão Brasileira (CICONELLI at al, 1999), e o questionário de Índice de
Capacidade para o Trabalho (TUOMI et al, 2005).
A pesquisa foi realizada em uma maternidade pública da cidade de Salvador-BA.
Participaram do estudo 10 enfermeiros que atuavam em diversos setores da
maternidade. Os critérios de inclusão na pesquisa foram: ser enfermeiro atuante de
qualquer setor da maternidade e que voluntariamente desejassem contribuir com o
estudo. Foram excluídos do estudo os enfermeiros que estavam de férias e/ou licença,
bem como aquelas que exerciam cargos administrativos.
A coleta de dados ocorreu nos meses de maio e junho de 2014. Foram realizadas
entrevistas, utilizando-se um roteiro para entrevista semiestruturada, com tópicos
norteadores para identificar se os dilemas éticos e bioéticos podem interferir no trabalho
e na sua qualidade de vida. O instrumento semiestruturado teve como referencial teórico
o Código de Ética do enfermeiro, a Bioética Principialista, segundo Beauchamp e
Childress, a Bioética Personalista, como descreve Sgreccia, assim como questões do
SF-36, instrumento que avalia qualidade de vida em saúde, com medidas de resumo de
saúde física e mental.
39
Após a gravação e transcrição das entrevistas, seguiu-se a técnica de análise
temática, como descreve Bardin (2011), constituída por três etapas: a pré-análise,
realizada com a leitura flutuante, obtendo um contato exaustivo com o material; a
exploração do material, possibilitando a determinação das unidades de registro
codificação e recorte das falas; e na última fase procedeu-se ao tratamento dos
resultados obtidos e a interpretação, além da reflexão das temáticas identificadas com a
literatura científica.
A discussão dos aspectos éticos e bioéticos foi baseada na teoria principialista de
Beauchamp e Childress (2002), no manual de Bioética de Elio Sgreccia (v.1 2009 e v.2
2014) e na Carta Universal de Direitos Humanos da UNESCO (2005).
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Medicina
da Bahia da Universidade Federal da Bahia, com número CAAE
26032313.3.0000.5577. Foram respeitadas as diretrizes e normas regulamentadoras de
pesquisa envolvendo seres humanos do Conselho Nacional de Saúde na sua Resolução
nº 466/12, com utilização do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
As entrevistas foram realizadas pela mesma pesquisadora em ambiente reservado.
Foram utilizados vários locais da própria maternidade, com a finalidade de ser um local
reservado e confortável para o entrevistado, respeitando a privacidade dos participantes.
Os locais utilizados foram a sala da coordenação de enfermagem, o conforto de
enfermagem e a recepção do ambulatório, quando o expediente já havia terminado.
40
5. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Aproximação com o campo de pesquisa
A realização da presente pesquisa representou um desafio para a pesquisadora,
sendo necessário, antes do início do estudo, sua aproximação com o campo de estudo.
Inicialmente, a pesquisa seria realizada numa instituição privada/ filantrópica. No
entanto, houve uma negação da referida instituição, alegando que a mesma estava em
momento delicado com a categoria de trabalhador a ser estudada, inviabilizando a
submissão do projeto no CEP da mesma. A negativa institucional foi acompanhada da
justificativa de que a pesquisa poderia fomentar um comportamento indesejado na
equipe de enfermagem.
Por essa razão, a pesquisa foi realizada no serviço público, sendo o campo de
trabalho definido após reunião com Diretora da Maternidade Albert Sabin. O projeto foi
avaliado pela instituição antes de receber anuência para submissão ao CEP FMB-
UFBA.
No processo de avaliação do projeto pela instituição, foi realizado um encontro
presencial para apresentação do mesmo e esclarecimento de dúvidas. Após recebimento
de anuência da Maternidade Albert Sabin, o projeto foi avaliado e aprovado pelo CEP
FMB-UFBA. Tendo havido a aprovação pelo CEP, comunicamos à Direção da
Maternidade Albert Sabin, a fim deiniciarmos o trabalho de campo. Minha participação
foi marcada por um período de conhecimento institucional, inclusive com participação
de reunião na maternidade, que objetivou melhor condução do processo, sendo feitos os
ajustes de horários de permanência na unidade.
O trabalho começou a ser realizado com grandes expectativas: a experiência do
campo, a delicadeza da abordagem aos colegas e necessidade de afastamento do objeto
41
de estudo no qual a pesquisadora se encontrava inserida como enfermeira atuante. Para
facilitar o acesso aos colegas, o projeto foi divulgado pela coordenação de enfermagem
e registrado no livro de ocorrência local. Antes de iniciar a coleta de dados, os
enfermeiros foram informadas sobre os objetivos da pesquisa, sua metodologia, da
voluntariedade em participar ou não, bem como o direito e liberdade de se retirar o
consentimento em qualquer fase da pesquisa, independente do motivo, e sem nenhum
prejuízo.
A pesquisa somente foi iniciada após a adaptação e aproximação da pesquisadora
com o campo, de forma que a mesma incorporou-se ao espaço, havendo tranquilidade
em sua circulação no campo de estudo. Apesar de a pesquisadora ser enfermeira, não
pertencia à equipe de enfermeiros da instituição da pesquisa. As entrevistas foram
diariamente gravadas e transcritas, sendo realizada leitura exaustiva, ainda na fase de
coleta, determinando o ponto de saturação dos dados e encerramento da coleta.
Durante a coleta de dados, foi possível perceber que o momento da entrevista
funcionava como um desabafo profissional. Os enfermeiros demonstravam interesse
pessoal em participar da pesquisa. A aparência das participantes era de esgotamento
físico mental e até mesmo, aspecto apático. Ainda que houvesse uma negação verbal
desse estado, o mesmo era visível e inquestionável ao observador. Muitos participantes
se esforçavam para dar respostas positivas aos questionamentos. Parecia que algo ou
alguma situação estava sendo encoberta pelos enfermeiros entrevistadas. Após início da
pesquisa, os murais da unidade ganharam um renovo, com mensagens falando sobre o
comportamento ético das pessoas e incentivando as boas práticas.
No ambiente de trabalho, puderam-se observar momentos saudáveis e tensos entre
as equipes multiprofissionais. Esses momentos funcionavam como estimulante ou
desanimador para o exercício profissional.
42
No que tange às reações frente aos dilemas profissionais, foi observado que os
enfermeiros com menos tempo de exercício profissional apresentavam discursos
contraditórios sobre sofrimento no trabalho; já os enfermeiros com mais tempo de
serviço referiram mais frequentemente e abertamente sobre traumas na vida social e
emocional como também na saúde, vinculados ao trabalho. As mesmas manifestavam
sentimentos de ansiedade pela aposentadoria como forma de livramento do sofrimento
no trabalho.
Os discursos das participantes da pesquisa durante as entrevistas foram marcados
com frases impactantes que englobam os mais diversos conteúdos desse estudo. As
principais frases foram: “Enfermagem por amor, sem prazer” (I2), “Enfermagem por
amor, com sacrifício de vida pessoal e sem retorno” (I3), “O trabalho é um refúgio... só
tenho alegria para o trabalho” (I4), “Eu era mais feliz antes de ser enfermeira” (I8), “É
melhor fazer, né?! Não é meu dever? Então vou fazer, sim” (I10), “Existe sofrimento,
não sei se propriamente isso, sofrimento mental, mas um massacre mental para o
profissional enfermeiro sim” (I8), entre outras.
Durante o desenvolvimento do trabalho de campo pude experimentar a
dificuldade em garantir a confiabilidade e legitimidade da pesquisa, tendo que exercer a
capacidade de dominar a técnica de saturação dos dados coletados conforme a técnica
de Bardin (2011). Por ser enfermeira, tive o cuidado de manter distanciamento
necessário para não interferir no estudo, disponibilizando mais tempo para coletar os
dados. A pesquisadora absteve-se de realizar comentários sobre os relatos durante as
entrevistas para não influenciar o objeto de estudo. No processamento e análises dos
dados, a neutralidade e a objetividade do conhecimento científico foram priorizadas.
43
Caracterização da amostra
Foram estudados 10 indivíduos, sendo nove do sexo feminino e um do sexo
masculino. A idade média foi 41,1 anos e o desvio padrão de 8,3. Todos eram não
fumantes e dois indivíduos referiram consumo de álcool.
Tabela 1 - Características do trabalho de dez enfermeiros de uma maternidade,
Salvador, 2014.
Característica Média ± DP Mínimo - Máximo
Carga horária semanal 44,2 ± 12,3 30 - 66
Renda (reais) 4.130 ± 1.625 3.000 – 8.000
Tempo na função 16,2 ± 8,1 8 - 31
ICT (Pontos totais) 35,4 ± 6,5 25 - 46
Capacidade para o trabalho (avaliação subjetiva)a 7,7 ± 1,4 5 - 9
Capacidade Física (avaliação subjetiva)b
4,1 ± 1,0 2 - 5
Saúde Mental (avaliação subjetiva)b 3,9 ± 0,9 2 - 5
Fonte: Questionário sociodemográfico e ICT. a – Numa escala de 0 a 10.
b – Numa escala de 1 a 5.
Uma pergunta do questionário Índice de Capacidade para o Trabalho (ICT)
possibilita a avaliação subjetiva da saúde individual atual, comparada há um ano. Seis
dentre os dez profissionais entrevistados afirmaram a manutenção do estado geral de
saúde (Tabela 2).
Tabela 2 - Avaliação subjetiva da saúde geral há um ano, por dez enfermeiros de uma
maternidade de Salvador, 2014.
Saúde há 1 ano N
Muito melhor 2
Um pouco melhor -
Quase a mesma 6
Um pouco pior 2
Muito pior -
Total 10
Fonte: Questionário SF-36
44
A qualidade de vida relacionada à saúde, medida por meio do SF-36, revelou
escores particularmente baixos para os domínios Aspectos Emocionais (41,7 ± 14,9) e
Aspectos Sociais (43,0 ± 14,3), que contribuíram substancialmente para o baixo escore
do Componente de Saúde Mental (43,3 ± 15,8). (Tabela 3)
Os escores normalizados do SF-36 devem ser interpretados como comparações
com os escores para a população padrão dos Estados Unidos, que assumem média igual
a 50 e desvio padrão igual a 10.
Tabela 3 – Escores brutos e normalizados dos domínios e componentes sumários do SF-36 em
dez enfermeiros de uma maternidade de Salvador, 2014.
Domínio / Componente Sumário
Escore Bruto
Escore Normalizado
Capacidade Física 84,0 ± 17,9 50,4 ± 7,5
Aspectos Físicos 72,5 ± 41,6 48,5 ± 11,8
Dor 73,3 ± 27,5 51,3 ± 11,8
Estado Geral de Saúde 68,7 ± 23,1 49,4 ± 10,8
Vitalidade
61,0 ± 24,0 51,9 ± 11,4
Aspectos Sociais 67,5 ± 32,9 43,0 ± 14,3
Aspectos Emocionais 56,7 ± 47,3 41,7 ± 14,9
Saúde Mental
69,2 ± 22,3 46,6 ± 12,7
Componente Saúde Física _ 52,7 ± 9,7
Componente Saúde Mental
_ 43,3 ± 15,8
Fonte: Questionários SF-36
Seis indivíduos apresentaram níveis baixos do escore do Componente Saúde
Mental, segundo o SF-36, e, destes seis, apenas um reconheceu ter baixa capacidade
mental, segundo a questão 3 do ICT, que avalia subjetivamente a capacidade mental.
Apesar de 60% das participantes apresentarem baixos escores do Componente
Saúde Mental, no escore do Componente Saúde Física apenas dois informantes
estiveram abaixo da média, segundo o SF-36.
45
Na avaliação subjetiva de capacidade física, baseada na questão 1 do ICT, 80%
dos entrevistados se consideraram com capacidade física boa e muito boa; 10%,
moderada; e 10%, baixa.
Os escores normalizados do SF-36 dos Componentes Saúde Física e Saúde Mental, a
classificação do Índice de Capacidade para o Trabalho e os relatos dos participantes
foram correlacionados no Quadro 5.
46
Quadro 5 - Escores normalizados do Componentes Saúde Física e do Componente Saúde Mental do SF-36; Pontuação e Classificação do ICT;
Comentários e Depoimentos de dez enfermeiras de uma maternidade de Salvador, 2014.
SF – 36 ICT
COMENTÁRIOS DEPOIMENTOS
En
ferm
eiro
/a
Saú
de
Fís
ica
Saú
de
Men
tal
Pon
tuaçã
o
Cla
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Cap
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dad
e
Atu
al
Para
o
Tra
balh
o *
Cap
aci
dad
e
Men
tal
Para
o
Tra
balh
o**
1 48,66 24,48 27
Bai
xa
5 3
CSF abaixo da média, CSM muito abaixo da média e
ICT baixo. Análise subjetiva: considerou-se com
qualidade de vida mediana. Demonstrou sofrimento com
ausência de normas e protocolos no trabalho.
Por falta de parâmetros padrões na
equipe, em determinado plantão a equipe
conduz daquela forma; em outro plantão,
a equipe entende que é de outra forma...
Isso desgasta... O que pode em um, não
pode no outro?!
2 50,90 34,75 33
Mo
der
ada
7 4
CSF com valor médio, CSM muito abaixo da média e
ICT moderado. Análise subjetiva: Demonstrou
ansiedade para se livrar do trabalho. Informou trauma
social, emocional e familiar. Relatou que se encontra em
tratamento multidisciplinar com psicólogos,
nutricionistas, psiquiatra, acupuntura e educador físico.
Informa arrependimento por ter priorizado o trabalho.
Enfermagem por amor, sem prazer.
Vamos pensar em cuidar do cuidador
também... Vamos pensar nisso.
3 67,78 18,80 39
Boa 7 2
CSF com valor acima da média, CSM muito abaixo da
média e ICT bom. Análise subjetiva: Demonstrou
indignação com a profissão, desânimo com a pouca
valorização do trabalho e falta de autonomia
profissional.
Enfermagem por amor, com sacrifício de
vida pessoal e sem retorno.
47
4 54,35 62,93 34
Moder
ada
9 4
CSF com valor médio, CSM acima da média e ICT
moderado. Análise subjetiva: Considerou-se com
excelente capacidade física. Relatou Abandonou tudo
pelo trabalho. Informou depressão quando está em casa.
O trabalho é o meu refúgio.
Só tenho energia para o trabalho.
5 60,03 58,67 46 Ó
tim
a 9 5
CSF e CSM acima da média e ICT ótimo. Análise
subjetiva: Considera-se com ótima capacidade física e
mental. Demonstrou esforço em dar respostas corretas
(tentativa de camuflagem?), relatou situações de
sofrimento no trabalho.
Depende muito do plantão, da situação
que agente vive... se você vive uma
situação de superlotação, você vê a
necessidade do seu paciente... você se vê
numa emergência sem leito para atender
esse paciente, isso leva ao sofrimento
mental...
6 43,36 44,83 32
Moder
ada
8 5
CSF e CSM abaixo da média e ICT moderado. Análise
subjetiva: Aparentou calma, porém apresentou-se
deprimida com as exig6encias do trabalho.
Agora ficar sempre essa coisa: tudo é a
enfermagem. Aqui tem muito esse
problema.
7 33,11 29,68 25
Bai
xa
6 4
CSF e CSM muito abaixo da média e ICT baixo.
Análise subjetiva: Discursou com oscilação de
comportamento, ora com disposição, ânimo e aparência
de felicidade no exercício profissional e por vezes
deprimida, abalada emocionalmente e desiludida.
Relatou sobre-esforço no trabalho.
Com todas as restrições, eu sou a primeira
a carregar para disponibilizar aquele
equipamento na hora. A vida do outro é
sempre muito importante, e a gente até
esquece da nossa em prol da vida do
outro.
8 57,68 57,48 40
Boa 9 4
CSF e CSM com valores médios e ICT bom. Análise
subjetiva: Na avaliação subjetiva relatou excelente
capacidade para o trabalho. Relatou satisfação para
exercer a profissão, mas cobrança desigual de
responsabilidade no trabalho.
A todo o momento nós somos cobrados,
não só da clientela, como também dos
outros profissionais... a assistência de
enfermagem está 24 horas, então tudo de
certo que acontece os médicos recebem as
palmas e tudo de errado que acontece o
48
enfermeiro é responsabilizado.
9 51,64 58,76 41
Boa 9 4
CSF e CSM com valores médios e ICT bom. Análise
subjetiva: Relatou satisfação com vinculo estatutário,
mas aparentou sofrimento mental no discurso sem
autopercepção do mesmo.
A gente tem que aprender a se fazer de
maluca mesmo (risos) para sobreviver.
10 58,00 41,04 37
Boa 8 4
CSF mediano, CSM abaixo da média e ICT bom.
Análise subjetiva: Aparentou desânimo, abatimento e
apatia. Evidenciou desgaste físico e mental, fala fraca e
andar arrastado.
É melhor fazer, né?! Não é meu dever?!
Os riscos ergonômicos, sobrecarga de
trabalho, as noites perdidas, entendeu? A
gente tem que ter dois vínculos para
poder realmente ter qualidade de vida. A
gente tem um ambiente sem ventilação,
aumento de pessoas... tudo isso é risco.
*AVALIAÇÃO SUBJETIVA CAPACIDADE TOTAL PARA O TRABALHO/ Questão 1 do ICT – Escala: 0(incapaz para o trabalho) a 10(melhor capacidade para o trabalho).
** AVALIAÇÃO SUBJETIVA CAPACIDADE MENTAL / Questão 2b do ICT – Escala: 1(muito baixa) a 5 (muito boa).
49
Categorias temáticas
Foram identificadas sete temáticas que serão apresentadas a seguir: Representação
das questões éticas e bioéticas no trabalho da enfermagem; Percepção da qualidade de
vida relacionada à saúde; Aspectos éticos e bioéticos para ter qualidade de vida;
Influência do trabalho na vida pessoal; Capacidade para o trabalho; Descrição do
processo de trabalho e Principais dilemas éticos e bioéticos identificados na prática da
enfermagem.
1) Representação das questões éticas e bioéticas no trabalho da enfermagem
Os sujeitos da pesquisa, ao se referirem às questões éticas e bioéticas no trabalho
da enfermagem consideraram de fundamental importância o cumprimento normas e
diretrizes do exercício profissional e o respeito do direito à vida do outro. Constituindo-
se como aspectos deontológicos em detrimento dos aspectos humanísticos; apesar de
alguns momentos ficarem em segundo plano em nome da política de sobrevivência no
ambiente de trabalho, conforme explicitado nas falas seguintes.
[...] Eu vejo como as normas morais que eu sigo para estar
direcionando minha profissão e todo processo de trabalho. E a
bioética são diretrizes éticas, morais as normas que a gente
institui em relação à vida do outro que está sob os nossos
cuidados. (I3)
[...] A bioética ainda em alguns momentos vem sendo colocada
em segundo plano e as pessoas, às vezes para satisfazer o ego,
esquecem. (I8)
Esse comportamento ético se estabelece com a finalidade de garantir o equilíbrio
biopsicossocial do enfermeiro para prestação de uma boa assistência.
O Conselho Federal de Enfermagem enfatiza que o aprimoramento do
comportamento ético do profissional de enfermagem passa pelo processo de construção
de uma consciência individual e coletiva, pelo compromisso social e profissional,
configurado pela responsabilidade do plano das relações de trabalho com reflexos nos
50
campos técnico, científico e político. O decreto nº 94.406 de 1987 traz a incumbência de
todo pessoal de enfermagem cumprir o Código de Deontologia da Enfermagem
(CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2007).
Por ética deontológica entende-se toda concepção ética, que compreende certos
deveres categóricos e certas proibições que têm precedência incondicionada sobre
outras preocupações morais e sobre considerações de índole finalística e funcionalista
(SGRECCIA, 2009).
Oliveira (2011) concluiu que, embora com dificuldade para reconhecer os
conflitos e dilemas éticos, os enfermeiros tomam decisões, e essas são fundamentadas
na deontologia e na bioética. Ao fazê-lo, procuram manter o equilíbrio emocional da
equipe e a harmonia no ambiente de trabalho.
2) Percepção da qualidade de vida relacionada à saúde
Esta categoria, que refletiu a expressão qualidade de vida no trabalho, trouxe
consigo contradições pelo fato de possuir conceito subjetivo dependente de vários
fatores sociais, psicológicos, emocionais, espirituais e até mesmo éticos.
Neste estudo, a percepção dos indivíduos sobre sua qualidade de vida, revelou que
os mesmos a consideram como comprometida, regular, em decorrência de uma carga
horária de trabalho excessiva. A maioria dos profissionais tinham dois vínculos
empregatícios, por necessidade de melhorar a remuneração a fim de atender suas
Necessidades Humanas Básicas (NHB), como moradia, alimentação, bens e conforto,
bem como a garantia da sustentabilidade da família.
Foi possível observar, na descrição das falas citadas abaixo, a diversidade das
definições de qualidade vida dos participantes, como: a) ter tempo; b) bem-estar na
saúde, lazer, trabalho; c) cuidar de si mesmo, viver e não sobreviver; d) estar perto da
família e amigos; e) se divertir e estar presente nos eventos sociais; f) bem-estar
51
biopsicossocial; g) garantir o sustento familiar; h) ter satisfação no trabalho, conquistas
e conforto.
[...] Qualidade de vida são as formas que você escolhe para ser
feliz. Eu estava péssima, porque eu tinha uma sobrecarga de
trabalho muito grande, estava me afastando da minha família e
do meu filho, do meu marido e da minha família como todos os
meus amigos. (I3)
[...] Qualidade de vida é o padrão de saúde, de estar bem para
atender bem. O cuidador tem que ser cuidado também porque
ele é ser humano, então ele precisa estar bem
biopsicossocialmente, precisa estar saudável mentalmente,
precisa estar saudável fisicamente, precisa estar saudável
socialmente, ter saúde social, porque se não se sentir bem com
ele, ele não vai se sentir bem com o grupo de trabalho e também
ele pode transparecer isso para os usuários. (I6)
Na avaliação da Qualidade de Vida, deve-se procurar dentro da pessoa a
satisfação das necessidades e dos desejos, além do respeito e da promoção dos valores
tipicamente humanos, sendo estes espirituais e/ou morais (SGRECCIA, 2014).
Ao interferir em sua qualidade de vida, o profissional muda atitudes, tanto no
âmbito intrafamiliar quanto no intra-hospitalar, podendo comprometer o relacionamento
interpessoal no trabalho e a qualidade do atendimento aos clientes, o que trará
certamente consequências ao indivíduo e/ou à população assistida (FERREIRA;
MARTINO, 2006).
Por isso a saúde deve ser entendida como um equilíbrio dinâmico condicionado
por quatro dimensões: a dimensão biológica, ou física, a dimensão psicológica, a
dimensão socioambiental e a dimensão ética (SGRECCIA, 2014).
3) Aspectos éticos e bioéticos para ter qualidade de vida
Quando abordados sobre os aspectos éticos e bioéticos necessários para ter
qualidade de vida, os enfermeiros referiram a importância do trabalho em equipe, com
respeito, responsabilidade e compromisso. Além disso, foram referidos como fatores de
52
promoção da qualidade de vida: o estabelecimento e o cumprimento da deontologia
como mecanismo de evitar conflitos entre as equipes multiprofissionais; agir com
resolutividade nas tomadas de decisão, redução de carga horária e, consequentemente,
da demanda de trabalho.
[...] Ter normas bem definidas pra você saber exatamente o que
é sua função e não ficar tendo que ficar se chocando com os
outros profissionais pra decidir o que é seu e o que é do outro,
ter embates que firam a própria ética nas relações. (I1)
[...] Quando eu me submeto a vários vínculos empregatícios
quando na verdade, muitas vezes, a questão física e a questão
emocional não favorecem que você dê conta do todo. Mas,
infelizmente, para manter um padrão de qualidade de vida que a
gente julga necessário, a gente acaba se submetendo. (I3)
[...] Essa questão do compromisso, responsabilidade, do
respeito, que eu acho que são fatores imprescindíveis no
ambiente do trabalho, porque se você tem um ambiente saudável
nesse sentido, consequentemente, você vai ter um lado
psicológico mais saudável, e isso se reflete de modo positivo,
porque eu vou sair mais leve do trabalho, consequentemente, eu
não vou chegar em minha casa com nível de stress muito
elevado e, de certa forma, descontando isso em outros setores
como família, ambiente escolar, ambiente de lazer ou numa
academia. (I5)
[...] No momento que as equipes conseguirem se tratar com
ética, eu acho que vai melhorar bastante minha qualidade de
vida, porque um momento que me irrita é esse, às vezes uma
irritação que eu saio daqui em um plantão e levo isso para casa,
porque a gente é ser humano e não tem jeito, não dá pra sair
daqui e deixar aqui e as vezes você tem uma noite ruim por
causa daquilo, até um outro dia ruim por causa daquilo
martelando em sua mente. (I9)
Tratar os colegas e outros profissionais com respeito e consideração faz parte dos
deveres contidos no Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (CONSELHO