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Universidade de Lisboa Faculdades de Letras Departamento de Língua e Cultura Portuguesa Diálogo entre a linguística e a pedagogia: a voz dos docentes e o seu conhecimento genológico. Carolina Celeste Locci Costa Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Avelar Mestrado em língua e cultura portuguesa (PL2/PLE) 2012

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Universidade de Lisboa

Faculdades de Letras

Departamento de Língua e Cultura Portuguesa

Diálogo entre a linguística e a pedagogia: a voz dos docentes e o seu conhecimento genológico.

Carolina Celeste Locci Costa

Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Avelar

Mestrado em língua e cultura portuguesa

(PL2/PLE)

2012

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Universidade de Lisboa

Faculdades de Letras

Departamento de Língua e Cultura Portuguesa

Diálogo entre a linguística e a pedagogia: a voz dos docentes e o seu conhecimento genológico.

Carolina Celeste Locci Costa

Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Avelar

Mestrado em língua e cultura portuguesa

(PL2/PLE)

2012

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AGRADECIMENTO

Agradeço imensamente à minha família por oferecerem-me a oportunidade de

realizar mais esta conquista profissional e académica. Agradeço, também, a

todos os professores que fizeram parte desta jornada, e muito contribuíram

para a minha formação como mestre. Em especial, ao professor orientador

António Avelar, por toda ajuda e dedicação prestada, e também, pelas portas

que me ajudou a abrir. Na verdade, só tenho a agradecer; foram dois anos de

muita aprendizagem, tanto académica, quanto para a vida.

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Resumo

Esta dissertação em Linguística Aplicada tem como foco principal indagar

sobre o modo como o conhecimento genológico informa as práticas de ensino

das línguas no ensino básico e secundário, incluindo o ensino de Português

língua não materna.

Ao compreender o modelo de formação de professores, pretendemos contribuir

com propostas sustentadas para a (re) construção de um modelo de formação,

no que concerne à área do ensino das línguas. Para o efeito, levamos à prática

um inquérito junto de professores de língua (materna e não materna) que

revelou elementos significativos para o estabelecimento de nexos entre as

novas propostas curriculares e a praxis. Toda a análise dos dados do inquérito

está informada pela Teoria do Registo e do Género (J. Martin e J. Rothery) e

pelas propostas pedagógicas daí resultantes.

Investigamos a visão e as metodologias empregadas atualmente no uso e

ensino de textos e géneros textuais pelos professores de línguas com o intuito

de oferecer informações reais e melhorar o planeamento de cursos de

formação continuada, identificando caminhos e processos para a melhoria do

desempenho dos alunos portugueses no decorrer da vida escolar.

Palavras-chave: Literacia, Géneros textuais, Ensino e aprendizagem das

línguas, Texto, Contexto, Registo.

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Abstract

This paper, in Applied Linguistics, aims at questioning in what ways the textual

genre knowledge informs the practices of language teaching in basic and

secondary schools, including the teaching of Portuguese as a foreign language.

From understanding the teacher’s education model, we intend to contribute with

sustained propositions to a (re) construction of a training model, regarding the

language teaching area. In order to achieve it, we have developed an inquiry to

be answered by language teachers (mother tongue and second languages)

which has revealed meaningful elements for the establishment of nexus

between the newest curricular proposals and the practice. All the inquiry data

analysis is informed by the Genre and Register Theory (J. Martin and J.

Rothery) and by its pedagogical proposals.

We have investigated the language teacher’s vision, as well as, the

methodologies employed by them, nowadays, in the use and teaching of texts

and genres with the intention of offering real data and improving the planning of

teacher’s in-job training courses, identifying ways and processes to the benefit

of Portuguese students during their school years.

Keywords: Literacy, Textual genres, Language teaching and learning, Text,

Context, Register.

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Índice

Lista de abreviaturas ........................................................................................ 17

Lista de figuras, gráficos e tabelas ................................................................... 19

Introdução ........................................................................................................ 23

Capítulo I Referências teóricasBBBBBBBBBBBBBBBBBBBB.31

1. Fundamentos da Linguística Sistémico-Funcional nesta dissertação .......... 31

1.1 Língua em contexto social .......................................................................... 31

1.2 Contribuições de M. Halliday ...................................................................... 32

1.3 Conceito de género textual ......................................................................... 36

1.4 Língua em contexto educacional ................................................................ 38

1.5 Teoria do Registo e do Género .................................................................. 39

1.5.1 Géneros: o ensino das línguas e através das línguas ............................. 43

2. Pedagogia Linguítica (genológica) .............................................................. 45

2.1 As etapas do processo de ensino e aprendizagem .................................... 45

3. Desenvolvimentos programáticos do pensamento genológico..................... 53

3.1 As famílias genológicas .............................................................................. 55

3.2 Desenvolvimento da metalinguagem ......................................................... 58

3.3 Texto em contexto ...................................................................................... 59

3.3.1 Padrões: texto, frase e palavra ................................................................ 60

3.3.2 Contexto da cultura ................................................................................. 62

3.4 Evolução da teoria à prática ....................................................................... 63

4. Conversas entre a Linguística e a Pedagogia: uma possibilidade ............... 65

4.1 Estratégias tripartidas do R2L .................................................................... 68

4.1.1 Primeiro nível: Preparação antes da leitura ou Desconstrução,

Construção Coletiva e Escrita independente ................................................... 70

4.1.2 Segundo nível: Leitura detalhada, Construção coletiva e Reescrita

individual .......................................................................................................... 71

4.1.3 Terceiro nível: Reconstrução de estruturas, Ortografia, Escrita de frases

......................................................................................................................... 72

4.2 Seleção de textos ....................................................................................... 74

4.3 Avaliação da leitura e da escrita ................................................................. 76

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Capítulo II Apresentação dos dados recolhidos ............................................... 79

1. Abordagem de análise dos dados ................................................................ 79

2. Apresentação dos resultados do inquérito ................................................... 81

2.1 Perfil dos inquiridos .................................................................................... 81

2.1.1 Ordenação por contexto de ensino ......................................................... 82

2.1.2 Ordenação por cilco de estudos .............................................................. 83

2.1.3 Ordenação por tempo de ensino ............................................................. 84

2.2 A voz dos inquiridos: práxis e opiniões ...................................................... 84

2.2.1 Opinião dos inquiridos quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal

......................................................................................................................... 85

2.2.2 Projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos .............................. 86

2.2.3 Grau de interferência creditado aos docentes de outras disciplinas ....... 87

2.2.4 Fontes utilizadas na seleção de textos escritos e orais ........................... 88

2.2.4.1 Finalidades da obtenção de textos de várias fontes ............................. 89

2.2.5 A escrita de textos individuais ................................................................. 92

2.2.5.1 Atividades de pré-escrita ...................................................................... 94

2.2.6 Escrita de textos coletivos e grau de intervenção do professor ............... 96

2.2.6.1 Estratégias de intervenção mais comuns durante a escrita de textos

coletivos ........................................................................................................... 97

2.2.7 A prática de textos orais e as dificuldades apresentadas pelos alunos

portugueses ...................................................................................................... 98

2.2.7.1 Fontes utilizadas na seleção de textos escritos e orais ...................... 100

2.2.8 Planeamento: a seleção de textos para o ensino da escrita quanto ao

tema, o tipo de texto e o uso mais comum ..................................................... 103

2.2.9 Os tipos de textos ou géneros .............................................................. 107

Capítulo III Análise dos dados apresentados ................................................. 109

1. Discussão dos dados obtidos desta investigação ...................................... 109

1.1 Acerca do perfil dos inquirirdos ................................................................ 109

2. Análise das relações entre as opiniões dos inquiridos quanto à autoria e o

grau de interferência creditada a outros espcialistas no ensino de línguas ... 112

2.1 Comparação ao grau de intervenção creditado aos outros especialistas 116

2.2 Análise da rara existência de projetos interdisciplinares .......................... 118

14

15

3. O ensino da literacia através de tipos de textos diversos ........................... 118

3.1 Tipos de textos (géneros) mais recorrentes no ensino de línguas ........... 119

3.2 Quanto às principais finalidade para a seleção de textos de diversas fontes

....................................................................................................................... 122

3.3 Sobre a escrita de textos individuais e as etapas da pré-escrita .............. 130

3.3.1 Etapas da pré-escrita dos textos individuais em relação à escrita de textos

coletivos e aos tipos de texto trabalhados ...................................................... 134

3.2 Textos coletivos: análise dos graus de intervenção empregados nesta

modalidade de escrita .................................................................................... 139

3.3 Quais os textos orais mais produzidos e suas dificuldades...................... 141

3.4 Planeamento e as fontes de informação que baseiam a escolha de temas e

tipos de textos (ou géneros textuais) .............................................................. 146

Capítulo IV Considerações finais ................................................................... 151

1. Reflexões sobre a práxis ............................................................................ 151

2. Reflexões sobre a formação linguística dos docentes ............................... 153

Referências bibliográficas .............................................................................. 157

Apêndice I Questionário ................................................................................. 161

Apêndice II Quadro 1: Opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência

creditada aos docentes de outras especialidades .......................................... 167

Apêndice III Quadro 2: Comparação entre à distribuição de autoria e de

capacidade de todos os docentes para o ensino da literacia ......................... 191

Apêndice IV Quadro 3: Fontes para seleção de textos e suas finalidades .... 221

Apêndice V Quadro 4: Textos individuais e atividade de pré-escrita ............. 264

Apêndice VI: Quadro 5: Textos coletivos: grau de intervenção ...................... 303

Apêndice VII: Quadro 6: Textos orais: dificuldades na produção dos mesmos

....................................................................................................................... 329

Apêndice VIII: Quadro 7: Planeamento: fontes de informações na seleção

temas e tipos de texto .................................................................................... 356

Apêndice XIX: Quadro 8: Tipos de texto mais trabalhados ............................ 381

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Lista de Abreviaturas

QECR = Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas

LSF = Linguística Sistémico-Funcional

R2L = Reading to Learn

TR&G = Teoria do Registo e do Género

LP = Língua Portuguesa

PLM = Português como língua materna

PLNM = Português como língua não-materna

PLE = Português como língua estrangeira

LE = Língua estrangeira

CNEB = Currículo Nacional do Ensino Básico

LPEB = Programas de Português do Ensino Básico

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Lista de figuras, tabelas e gráficos

Figura 1: Campo, relações e modo em relação às metafunções

Figura 2: Língua em relação ao registo e género

Figura 3: Estratificação da linguagem segundo a LSF

Figura 4: Género em relação ao Registo

Figura 5: Literacy in Society: The teaching cycle

Figura 6: Functional Model of language in context

Figura 7: Ciclo de aprendizagem por etapas

Figura 8: Três níveis de estratégias no programa R2L

Tabela 1: Adaptação do Mapa de géneros na escola “Map of genres in school”

Tabela 2: Seleção de fontes de textos com finalidades temática e genológica

Tabela 3: Fontes de informação para a seleção de textos sugeridas pelos

inquiridos

Gráfico 1: Perfil dos inquiridos: Ordenação por contexto de ensino

Gráfico 2: Perfil dos inquiridos: Ordenação por ciclo de estudos

Gráfico 3: Perfil dos inquiridos: Ordenação por tempo de ensino

Gráfico 4: Opinião quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal

Gráfico 5: Envolvimento em projetos interdisciplinares.

Gráfico 6: opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada aos

docentes de outras especialidades

Gráfico 7: Finalidades de seleção de textos fora dos manuais escolares

Gráfico 8: Número de textos individuais escritos por ano letivo segundo os

inquiridos

Gráfico 9: Atividades mais comuns realizadas pelos inquiridos antes da escrita

de textos

Gráfico 10: Média de textos coletivos escritos por alunos portugueses em um

ano letivo

Gráfico 11: Texto coletivo: estratégias de intervenção

Gráfico 12: A prática de textos falados em sala de aula

Gráfico 13: Apresentação das dificuldades mais comuns na produção do texto

oral

20

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Gráfico 14: Fontes usadas na seleção de textos quanto ao tema

Gráfico 15: Fontes para a seleção dos tipos de textos (géneros) ao planear

atividades de escrita

Gráfico 16:Tipos de textos mais recorrentes no ensino de línguas em Portugal

Gráfico 17: Percentagem de inquiridos que determinam o tema mas não o tipo

de texto a ser escrito por ordenação de tempo de serviço

22

23

Introdução

O pensar sobre as línguas e o papel delas nas sociedades já levou muitos

investigadores a teorizar sobre esta relação. Nesta dissertação, considera-se

que as línguas fazem parte de toda a atividade humana, seja de forma oral ou

escrita. Consideram-se as línguas, portanto, desenvolvendo uma função social

através do seu uso, e não apenas confinadas ao seu sistema gramatical

(léxico-gramática). Trata-se de uma questão teórica que tem especial equidade

no âmbito desta dissertação já que, estão em causa duas dimensões

concorrentes, o ensino das línguas e o ensino através das línguas. Pretende-

se, também, demostrar a possibilidade de uma união e integração entre duas

das principais áreas de estudo ligadas ao desenvolvimento intelectual do ser

humano: a pedagogia e a linguística.

A visão usual e prática da língua vem sendo estudada há muitos anos, Bakhtin

(1986), por exemplo, ao tomar a língua como objeto de estudo disse ser

imprescindível que se determine a natureza dos enunciados estudados, para

que o objeto de estudo (a língua) não fique excessivamente abstrato, mas sim,

o mais próximo da vida, ou seja, da sua função social.

No mundo ocidental, é regra, e também senso comum, dizer que a escola é

responsável pela formação global das crianças e jovens e isso envolve, entre

muitas outras responsabilidades, a alfabetização e a formação literária dos

futuros cidadãos que irão gerir o mundo dentro de alguns anos. Em 1996, no

Relatório para a UNESCO “Educação, um tesouro a descobrir” da Comissão

Internacional sobre Educação para o século XXI, organizado por Jaques

Delors, Presidente da Comissão Europeia até 1995, preconizou-se que:

“À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele.” (Delors,1996:89)

As estatísticas em várias partes do globo não são animadoras. Muitas

pesquisas mostram que os alunos de hoje não obtêm bom desempenho

escolar no que diz respeito ao uso e à compreensão das línguas. De acordo

24

com uma 1pesquisa, entre 2000 e 2009, a performance dos alunos portugueses

em níveis de leitura aumentou apenas 1% neste período com base nos últimos

resultados apresentados pelo relatório de PISA2.

Pensar a língua através de um olhar funcional e social pode facilitar a tarefa de

ensinar, e formar leitores críticos, capazes de interpretar e inferir, através da

leitura, escrita e fala, o mundo que os cerca, participando socialmente como

agentes de um período histórico.

“Em todo o mundo, a educação, sob as suas diversas formas, tem por missão criar, entre as pessoas, vínculos sociais que tenham a sua origem em referências comuns. Os meios utilizados abrangem as culturas e as circunstâncias mais diversas; em todos os casos, a educação tem como objetivo essencial o desenvolvimento do ser humano na sua dimensão social. Define-se como veículo de culturas e de valores, como construção de um espaço de socialização, e como cadinho de preparação de um projeto comum.” (Delors, 1996:51) (sublinhado meu).

O ser humano é por natureza um ser social e a educação não pode ignorar

este fato, por isso, este e outros textos e relatórios costumam marcar

constantemente esta premissa. Talvez seja também por tais razões que, nos

dias de hoje, as teorias que, porventura, mais aceitação tem entre os

educadores são as construtivistas ou as sociointeracionistas, baseadas nas

teorias apresentadas, por exemplo, por Piaget (1959) e Vygotsky (1989)

respectivamente. Ambos teóricos estudaram a linguagem, assim como o

processo de ensino e aprendizagem do ponto de vista biológico, social e

psicológico.

Jean Piaget (1959), colaborou muito, com suas pesquisas epistemológicas e

1 Pesquisa realizada pelo professor Ulf Fredriksson, PhD. Associate professor Institute of

International Education (IIE) Department of Education in Stockholm University. Resultados apresentados pelo autor em Conferência na Suécia, Estocolmo em 15 de maio de 2012. 2 PISA (Programme for International Student Assessment) é um estudo internacional realizado pela OECD (The Organisation for Economic Co-operation and Development) desde 1997. O principal objetivo do PISA é mostrar em que medida os alunos, no final da escolaridade obrigatória, estarão preparados para fazer face às novas exigências da sociedade. Ocorre em sistemas educacionais ao redor do mundo a cada três anos, avaliando competências dos alunos com 15 anos de idade em disciplinas essenciais: leitura, matemática e ciências. Em 2009 65 países participaram do exame.

25

relatos de suas experiências, para a compreensão que se tem hoje de como os

seres humanos aprendem e por quais fases de aprendizagem passam no

decorrer de seu desenvolvimento. Piaget, através de inúmeras observações de

crianças em diferentes idades, realizando tarefas simples do quotidiano,

classificou o desenvolvimento humano enquanto pensamento e inteligência, em

quatro estágios: sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e de

operações formais. Enquanto Vygotsky (1989) classificou o pensamento

enquanto fases: fase pré-linguística do pensamento, pensamento verbal e

linguagem racional e fase pré-intelectual da linguagem. Esses conceitos não

serão aqui profundamente explorados, porém, estão mencionados por sua

relevância nos avanços entre as teorias psicológicas e também educacionais,

de base epistemológica, biológica e social. Ambos os autores e muito outros

como por exemplo, Henri Wallon (2004), contribuíram para a formação das

teorias genéticas de desenvolvimento psicológico dos seres humanos que, por

sua vez, transformaram o pensar em educação, de forma a se contrapor à

pedagogia tradicional que considerava a punição pelos erros e insucessos

cometidos pelos alunos, uma forma eficaz de ensino, com a qual os

professores podiam classificar, rotular e coagir os alunos, não só em relação à

aprendizagem de conteúdos escolares, mas também como ferramenta

ameaçadora para a manutenção da disciplina nas salas de aula.

Os conceitos construtivistas e sociointeracionistas sobre desenvolvimento e

aprendizagem se fazem sempre presentes, e levam investigadores e

professores à reflexão sobre tais processos. O papel do professor como

mediador da construção do conhecimento, sugerido por ambas as teorias é,

entretanto, muitas vezes mal interpretado, e em muitos casos, falível. A relação

entre a aprendizagem da língua, dos conteúdos escolares e suas relações com

o mundo, tendo em vista a formação de futuros cidadãos críticos e socialmente

participantes, são tarefas muito complexas para serem realizadas

independentemente, com alguma mediação (ajuda) do professor, considerado

o participante mais experiente do processo. Passar de um extremo autoritário

para outro extremo acabou, possivelmente, por diminuir a importância do papel

do professor na sociedade e pode ser considerado um dos índices do

decrescente nível de formação dos jovens atualmente.

26

“The fact that some children can perform tasks like these without any apparent teacher preparation is one factor behind the constructivism notion that Learning emerges from within the individual and should not be constrained by teacher instruction.” (Rose e Martin, 2012:10)

No que concerne à área da linguística, o construtivismo e o sociointeracionismo

são subsidiários do trabalho realizado no interior da sociolinguística,

amplamente estudada em várias partes do mundo. Esta área da linguística

estuda a língua sob a perspectiva da estreita relação existente entre a língua e

a sociedade onde se origina, portanto, funciona paralelamente à visão

sociointeracionista da linguagem em teorias educacionais; ambas partem do

pressuposto que a língua existe enquanto interação social, criando e

transformando-se em função do contexto sócio histórico. O contributo mais

significativo para o desenvolvimento desta terorização, terá sido do linguista

norte-americano William Lablov (1969, 1972, 1983), que em termos bem

gerais, estudou a linguagem em campo, registando-a, descrevendo-a e

analisando-a sistematicamente, tendo a variação linguística como seu principal

objeto de estudo. Enquanto teorias linguísticas e de desenvolvimento humano,

as teorias, acima citadas, contribuem muito para o progresso de seus

respectivos objetos de estudo.

Nesta dissertação tenho como referência o ensino das línguas em instituições

formais de ensino (escolas, universidade, institutos, liceus, entre outros) pelo

que é avisado não partir de um campo teórico que seja, em si, excludentes,

mas sim, capaz de somar-se aos conhecimentos que temos hoje sobre

desenvolvimento, aprendizagem e linguística. Como já foi mencionado

anteriormente, as teorias epistemológicas e psicológicas de ensino exerceram,

e ainda exercem muita influência sobre as práticas educativas; porém, os

resultados, apesar dos significativos contributos para o desenvolvimento

educacional das últimas décadas, têm-se mostrado insuficientes para diminuir

a lacuna de desempenho entre os alunos que aprendem mais ou melhor e os

que aprendem menos ou com menor qualidade, independentemente dos

fatores sócio económicos associados. Paralelamente, a imagem do papel do

professor na sociedade está um tanto deturpada. As reações a estes

fenómenos e a mudança de valores e conceitos vieram em forma de novas leis,

27

novos parâmetros de ensino, estudos de qualidade do ensino, relatórios

mundiais, entre muitos outros esforços que mereceriam destaque, porém cita-

se apenas alguns que tiveram impacto a nível mundial e europeu nos últimos

anos.

O Relatório Jacques Delors (1996), no seu quarto capítulo estabelece os

‘Quatro Pilares da Educação’. Neste documento introduziu-se definitivamente

na educação, a noção de competências que devem ser inicialmente adquiridas

durante a vida escolar, e utilizadas posteriormente, no que se nomeou

‘educação ao longo da vida'. Ao vivenciar em idade escolar os quatro pilares:

aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser,

todos os jovens deveriam sair da escola preparados para continuar aprendendo

ao longo da vida e, à medida que a sociedade em que vive transforma-se. Tais

preceitos foram repetidos em muitos outros documentos, já mais

detalhadamente, e dando maior importância à noção de aquisição de

competências, como é o caso o Quadro Europeu Comum de Referência para

as Línguas (2001) (doravante QECR) que dedica o capítulo quinto inteiro à

importância do desenvolvimento de competências gerais e específicas (em

especial comunicativas) no ensino das línguas. A noção de competências,

também se reflete nos níveis comuns de referência para as línguas, adotado

por toda a União Europeia, e já muito expandido em outras partes do globo,

como ferramenta para a avaliação dos níveis de proficiência em línguas. O

QECR revelou-se de grande utilidade e está adaptado para todas as línguas da

União Europeia.

As reações mundiais, ou como no último documento citado europeias, são

sempre seguidas pelas reações nacionais, que baseadas num tronco comum,

visam adaptar-se às novas tendências e tem por objetivo melhorar a qualidade

do ensino dentro de cada país. Algumas das mais recentes e importantes

medidas do governo português foram a publicação do novo Programa de

Português do Ensino Básico, em março de 2009 e a revisão da Organização

Curricular e Programas do Ensino Básico em Janeiro de 2004, entre outros.

No entanto, apesar de tantos avanços, pesquisas e eficientes diretrizes para a

28

avaliação, o desempenho dos alunos em Portugal e em outros países continua

desnivelado e apresenta dificuldades em superar seus problemas. Institutos e

universidades portuguesas dedicam parte substancial da sua investigação na

procura de formas sustentáveis para melhorar o desempenho geral dos alunos

e eliminar, ou pelo menos diminuir, a desigualdade nos níveis de

aproveitamento.

Acreditamos que pode coexistir, também, uma significante lacuna entre os

objetivos governamentais, teóricos e ideológicos, e a realidade das práticas

dentro das salas de aula, pelo que se justifica procurar saber o que pensam os

professores portugueses sobre como se ensina língua e o reflexo destes

conhecimentos em suas práticas educativas.

Foi a partir de um panorama semelhante a este, que os linguistas australianos

(Martin, Rose, Rothery, entre outros) foram buscar na linguística sistémico-

funcional, mais especificamente, nas ideias difundidas por Halliday, uma

solução para a diminuição das desigualdades dentro das escolas.

Esta dissertação, na senda do trabalho da Escola de Sydney, tem como

referência os princípios da linguística sistémico-funcional (doravante LSF), a

Teoria de Registo e Género, e o modelo de pedagogia linguística baseada na

abordagem genológica. Pretendo, deste modo, tentar contribuir para a melhoria

das propostas e serviços educacionais portugueses, ambicionando que estes

sirvam de exemplo para outras realidades no mundo lusófono. Estes

fundamentos teóricos estão apresentados no capítulo primeiro dedicado ao

enquadramento teórico.

Na tentativa de trazer à tona, as reais práticas de ensino da leitura e escrita nas

salas de aula portuguesas realizei um inquérito extensivo a um número

significativo de docentes portugueses profissionalizados. Trata-se de um

conjunto de questões pensadas com o objetivo de descobrir se, e até que

ponto, o conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no

ensino básico e secundário português, incluindo o ensino de Português língua

não materna.

29

No segundo capítulo desta dissertação, apresentam-se os dados da amostra

do inquérito realizado, cujo componente principal foi um questionário enviado

(principalmente por via eletrónica) a centenas de professores de línguas,

denominado ‘O conhecimento genológico (sobre géneros textuais) nas práticas

do ensino de línguas’. (Apêndice I) Neste capítulo apresentam-se os dados

recolhidos e alguns comentários prévios sobre os mesmos.

No terceiro capítulo são analisados e discutidos os dados frente aos

referenciais teóricos apresentados no capítulo primeiro, que por sua vez,

recaem sobre a abordagem genológica proposta pela Escola de Sydney, mais

recentemente desenvolvida através do projeto “Reading to Learn” e que está

sendo levada à prática em países europeus e de outros continentes; e também,

frente às propostas dos Programas Curriculares do Português no Ensino

Básico (2009), ou ao QECR (2001), ou ainda ao Currículo Nacional do Ensino

Básico (2001).

A partir da análise do questionário realizada sob a luz das teorias estudadas,

identificadas eventuais lacunas no processo de formação dos professores que

podem estar associadas ao baixo rendimento escolar obtido pelos alunos

portugueses (cf., por exemplo, o relatório PISA), apresentaremos nossas

propostas nas considerações finais.

30

31

Capítulo I

Referências Teóricas

O texto é considerado em todas as formas possíveis, monológicas ou dialógicas, interactivas ou não-interactivas, faladas ou escritas, formais ou informais, ou outras. Não importando se é composto por apenas uma palavra ou por centenas delas, desde que tenha significado em um determinado contexto. (Avelar, 2008:33).

1. Fundamentos da Linguística Sistémico-Funcional nesta

dissertação.

Antes de discutir propriamente as teorias escolhidas para o enquadramento

teórico desta dissertação, reafirmo a noção de língua enquanto realidade

semiótica, operando em contexto social como princípio orientador considerado

no decorrer deste trabalho.

Muitos teóricos em diferentes épocas, escolas e partes do mundo definiram os

conceitos de texto e contexto, tendo pensado as línguas na sua relação com o

contexto social. Referirei, brevemente, alguns destes autores, porém sem me

deter no aprofundamento destas teorias.

1.1 Língua em contexto social

Começando pela tradição americana, focada, sobretudo, nos estudos de

análise do discurso, sobressaem autores como Hymes and Fought (1981).

Hymes, em 1972, definiu competência comunicativa a partir da observação das

formas em que os falantes realizam o significado de um evento comunicativo.

Na tradição europeia, os contributos do contextualismo britânico, em especial o

trabalho de Monaghan (1979) e Mitchel (1957) que se dedicaram a examinar a

linguagem em contexto. Antes, o primeiro linguista a utilizar o termo “contexto

da situação”, Firth (1937 1966, 1970) havia construído um modelo de análise

da linguagem falada, baseado em contextos de situações que se repetiam no

processo social. De acordo com Firth (1937, 1966, 1970), o significado das

32

palavras resulta da relação de diversos fatores e suas interações com o meio.

Em outras palavras, o ambiente, os gestos, os participantes, os tons de voz, os

sons produzidos ou local de publicação, o comportamento dos envolvidos

direta ou indiretamente, juntamente com as palavras formam o “contexto da

situação”. Firth chama a atenção para outra palavra essencial no estudo das

línguas “meaning” (significado), defendendo que, tal como o contexto da

situação, o significado também é criado por e pertence às pessoas nele

envolvidas. Uma vez que os enunciados escritos ou orais se realizam num

contexto, o significado deste contexto e dos enunciados também é interpretado

e tem um valor único para cada participante, pois os indivíduos também são

seres únicos e capazes de produzir ou receber as mensagens de formas

distintas uns dos outros. Finalmente, Halliday, um dos discípulos de Firth, deu

continuidade ao seu esquema, reorganizando-o em um modelo tripartido, que

será apresentado na secção seguinte.

1.2 Contribuições de M. Halliday

A linguística sistémico-funcional foi desenvolvida para ser um modelo de

organização da linguagem em contexto, ordenada por subsistemas, ou seja,

por um lado é dada importância ao significado em contexto e, por outro,

estudam-se subsistemas linguísticos relacionados com semântica, léxico-

gramática, fonologia e fonética.

Halliday (1985, 1994, 2004) estabelece, na sua base teórica, uma relação

sistemática entre a língua e o ambiente. A sua construção teórica relaciona,

pois, a situação social, o texto, o sistema linguístico e o sistema social; por

outras palavras, Halliday descreve o sistema da língua, (no caso, língua

inglesa) e a formas pelas quais esse sistema se relaciona com os textos. Esta

visão da língua em contexto relacionada com o significado (base semântica) e

com o uso (base funcional), com estreita relação ao sistema social, é portanto,

aquela que aqui se considera ser a mais adequada para a obtenção dos

objetivos educacionais maiores, na senda de outros autores como Rothery:

33

“Given the framework of a model with sociocultural orientation to meaning such as the systemic functional model, there exists the rich possibility for developing an alternative perspective on language and learning (...) A strong and rich model of language description enables us to model the curriculum in terms of its literacy requirements, to map possible paths of development in literacy and learning and to develop criteria for assessment and evaluation.” (Rothery,1996:87)

Desenvolveu-se, a partir das ideias hallidayanas (1985, 1994, 2004), uma

abordagem linguística que trata a língua de forma fundamental para a

experiência humana, designadamente porque se enfatiza que a língua não

pode estar dissociada do significado e como o próprio nome sugere, a função e

o significado são a base da linguagem humana e das atividades comunicativas.

Diferentemente das abordagens estruturais e chomskyanas que privilegiam a

sintaxe, a LSF inicia a análise da linguagem a partir do contexto social

procurando descrever o modo como a língua atua, é controlada e/ou

influenciada pelo contexto social, sendo o seu trabalho, em última análise, de

pendor semântico.

A definição de Halliday (1985, 1994, 2004) de contexto aponta para uma

sistemática relação entre o ambiente social e a função organizacional da

língua. No modelo organizacional da linguagem sugerido por Halliday, as

escolhas de vocabulário e estruturas feita pelos indivíduos são influenciadas

por três variações: Modo (Mode), Campo (Field) e Relações (Tenor). Estas

variações organizam a linguagem e cada uma delas realiza uma metafunção.

As três metafunções podem ser entendidas como mecanismos semânticos do

sistema linguístico, e relacionam a língua ao ambiente em que ocorre. Esta

organização foi representada por Halliday através do gráfico abaixo e será

mencionada muitas vezes no decorrer desta dissertação, por serem via

norteadora do trabalho dos linguistas da Escola de Sydney, cujas contribuições

serão apresentadas na próxima secção.

34

Figura 1: Campo, relações e modo em relação às metafunções – adaptação a partir de Martin e

Rose, 2008:12)

“O estabelecimento das três variáveis é feito com base no pressuposto de que, se a língua é, realmente, estudada nas suas instâncias situacionais, algumas variáveis contextuais estão sistematicamente co-relacionadas com o modo como a língua é realizada em texto: logo, semelhantes ambientes contextuais conduzirão a idênticas instâncias textuais” (Avelar, 2008:43)

Como Halliday (1985, 1994, 2004) considera a língua um recurso para fazer

significados, sua perspectiva gramatical considera o papel dos itens linguísticos

de um texto em relação às suas funções na construção de significados. Por

esta razão, a classificação e nomeação dos itens linguísticos são baseados nas

respectivas funções que realizam.

“The purpose of functional labeling is to provide a means of interpreting grammatical structure, in such a way as to relate in any given instance to the system of the language as a whole” (Halliday, 1994:29)

O termo “função” em Halliday (1985, 1994, 2004) é utilizado para referir a

codificação do significado no interior da gramática, unindo as categorias

gramatical e semântica do estudo da linguagem, assim como as categorias de

função comunicativa.

O texto, segundo esta visão da linguística sistémico-funcional, é uma

relações

campo

modo

interpessoal

ideacional

35

realização social semiótica, dialógica e interativa. Portanto, pode-se dizer que é

uma realização dos tipos de contextos, e consequentemente, da atuação dos

membros culturais envolvidos em dada situação.

A figura 1 apresenta a organização da língua segundo Halliday (1985, 1994,

2004) e sua visão de linguagem tripartida em metafunções. Mais

detalhadamente, Modo (Mode) está associado à metafunção textual, que se

refere às escolhas linguísticas quanto ao vocabulário e estruturas, dependentes

do significado que se pretende transmitir. A metafunção interpessoal realizada

a nível do Registo pela variável relações, diz respeito à presença e ou ausência

de recursos linguísticos que demonstrem atitude, valor e o papel do autor do

texto na sociedade. E o Campo, associado à metafunção ideacional, refere-se

às evidências linguísticas textuais que exprimem recursos intertextuais,

conhecimentos que um discurso ou tema assume ser de conhecimento do

receptor da mensagem.

Em outras palavras, cada metafunção da linguagem tem um significado

funcional no contexto social. Quando se fazem escolhas linguísticas para

organizar experiências e significados interpessoais de forma linear e coerente

como um todo, faz-se uso do que Halliday (1985, 1994, 2004) nomeou (textual

meanings) significados textuais que se realizam no modo de um texto. Quando

se usa a língua para decodificar interação e para mostrar e defender opiniões,

atitudes e relacionamentos, faz-se uso do que Halliday nomeou como

(interpersonal meanings) significados interpessoais que se realizam nas

relações do texto. E ainda, quando se usa a língua para decodificar as

experiências de um indivíduo no mundo, ou seja, uma representação da

realidade, faz-se uso do que Halliday nomeou como (ideational meanings),

significados ideacionais que se realizam no campo do texto.

36

1.3 Conceito de Género Textual

A linha de pesquisa australiana foi inspirada nas pesquisas de Hasan (1977;

1984; 1985, Halliday e Hasan, 1980: apud Eggins e Martin, 1997). A

abordagem de registo sugerida por Halliday enfatiza a inter-relação sistémica

entre a organização da linguagem e a organização do contexto.

Um texto portanto possui muitos significados que se comunicam através de um

código, formado, por sua vez, de um sistema gráfico e fónico. Sendo assim,

qualquer amostra de língua que seja operacional e que funcione como uma

unidade semântica num determinado contexto de situação é considerado, pela

LSF como um texto. (Halliday & Hasan, 1976:293)

Por estes mesmos motivos e também, para facilitar o ensino da linguagem em

contexto escolar formal, a definição de Género, dos géneros ocorrentes numa

língua e cultura, impôs-se ao desenvolvimento deste trabalho. Depois de

muitos estudos feitos por Eggins e Martin (1997) e outros investigadores

australianos, o círculo do género correspondendo a um novo nível de

abstração) foi adicionado ao esquema de linguagem proposto inicialmente por

Halliday (1985, 1994, 2004) e pode ser visto na figura 2. O género corresponde

ao plano do contexto cultural das sociedades, como pode ser observado

abaixo:

Figura 2: Língua em relação ao registo e género (Martin,1996:307 apud E. Pedro) – trad. minha

género

interpessoal

ideacional

modo

relações

campo

Género

registo

língua

Meta redundância (realização)

37

A cultura, conceito sempre de manuseamento difícil, encontra aqui uma nova

abordagem:

“... os sistemas linguísticos são estruturados pelo uso. E esse uso, enquanto actividade de produção textual, faz-se em função de e no seio de contextos particulares (...) De facto, um texto ocorre sempre em dois contextos, um dentro do outro: o contexto de situação e o contexto de cultura.” (Gouveia, 2009:1-2)

A língua em uso e em contexto social é, portanto, o objeto de estudo de

aprendentes de línguas por todo o mundo. Sendo, a língua, um objeto de

estudo em uso e interrelacionado a contextos e aos seus participantes, é

possível afirmar que não é um objeto de estudo estático. Da mesma forma que

o ensino e aprendizagem das línguas não o pode ser, como nos coloca Rivers

ao comentar sobre o ensino e a aprendizagem de línguas:

“From time to time, we need to sit down, ponder the possibilities for the harvest, and change course if we find our present direction is not leading us where we need to go.” (Rivers,1983:133)

Apesar de estarem em constante movimento as línguas foram, ao longo do

tempo, estudadas e para isso, classificadas de diversas formas, os géneros

textuais são um exemplo.

Género é o termo usado para nos referirmos a determinados textos e tipos de

discurso que apresentam uma coesão interna idêntica e o mesmo propósito

social. A descrição de diferentes géneros textuais atua apenas como uma

sugestão dos tipos de texto, uma vez que estes são construídos socialmente, e

portanto, passíveis de constante mudança e evolução. Devido à possibilidade

humana de reinventar textos quase que constantemente ao usar a linguagem

para atuar nas situações do cotidiano, a descrição e classificação das

características de um ou outro género textual torna-se um grande desafio.

“Genres respond to cultural contexts in which they achieve their purposes, so their realizations vary and evolve as they are created in new ways in different contexts.” (Schleppegrell,2004:83)

Apesar deste objeto de estudo ser tão flexível, devido à evolução constante das

línguas, acreditamos ser de grande valia investir na classificação e ensino de

38

géneros em contexto escolar, com o intuito de melhorar o nível de formação

académica dos alunos. Uma vez que os géneros servem às necessidades

sociais, ter habilidades para expressar-se através da linguagem permite ao ser

social (aluno) compreender e participar de contextos sociais em que emergem

os diferentes géneros.

“Em sociedades multiculturais cada vez mais complexas, a educação deve auxiliar-nos a adquirir as competências interculturais que nos permitam conviver com as nossas diferenças culturais e não apesar delas. Os quatro princípios de uma educação de qualidade definidos no Relatório da Comissão Mundial sobre Educação para o Século XXI (aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a viver em conjunto) somente podem aplicar-se com êxito se a diversidade cultural for seu elemento central.” (Unesco, 2009:16)

1.4 Língua em contexto educacional

Para que haja aprendizagem da leitura e escrita, as crianças precisam

aprender a decodificar um sistema linguístico, ou seja, reconhecer as letras e

sílabas ou fonemas das palavras. Precisam também compreender o significado

literal das palavras decodificadas dentro das orações, ou seja, do que ou de

quem se está falando, onde, como, porque ou o que estão fazendo. Além

disso, precisam ser capazes de compreender os significados inferenciais, nada

menos do que compreender os significados das conexões apresentadas ao

longo do texto, sejam de frase a frase ou de parágrafo a parágrafo. E ainda há

de se aprender os significados interpretativos, que representam as conexões

entre o texto e o contexto a que este se refere, em outras palavras, seu

propósito social, o tópico disciplinar em que está inserido e as relações que

provocam entre as pessoas.

A figura 3 abaixo, portanto, pode ser usada como modelo de organização do

processo de ensino e aprendizagem da leitura e escrita com base nos níveis de

estratificação da LSF.

39

Figura 3 – Estratificação da linguagem segundo a LSF3

A partir desta estratificação o ensino da leitura e escrita através da genologia

foi organizado partindo do contexto, para depois focar-se nas fases do texto e

nas características da linguagem.

As diferenças de aproveitamento dentro de um mesmo grupo de alunos é

notável ao saber que todos os alunos saem da escola capazes de decodificar

um texto e escrever textos simples, portanto, tem vasta compreensão do

significado das palavras e conhecimentos dos significados das frases.

Entretanto, muitos não são capazes de compreender todos os significados do

texto, o que requer não apenas a compreensão do significado das palavras

mas também, habilidades de compreensão interpretativa e poucos com a

habilidade de produzir um texto que contenha variações linguísticas suficientes

para todas as etapas acima descritas o componham, esses dados podem ser

ainda piores ao considerarmos alunos de Português como Língua não-materna

ou de uma língua estrangeira.

1.5 Teoria do Registo e do Género

Ao agrupar enunciados que ocorriam em determinados contextos e ao estudá-

los a partir de sua função social, vários linguistas já aqui mencionados, como

3 Modelo apresentado em seminário em Lisboa, em 15 de dezembro de 2011.

40

Firth, Hasan, Martin, Christie, Rose entre outros contribuíram para a formação

do que é hoje mais largamente conhecido como ‘Register and Genre Theory’

(R&GT), (Eggins e Martin, 1997) ou, em português ‘Teoria do Registo e do

Género’ (TR&G) (Avelar, 2008).

A teoria do Registo e do Género surgiu da tentativa desses linguistas, de

diversas áreas, com objetivos educacionais ou não, de investigar como os tipos

de discurso ou textos diferenciam-se ou assemelham-se e suas razões para tal.

Martin, Rose, Christie entre outros teóricos, em especial no Reino Unido,

partiram dessas pesquisas e contribuem com a formação teórica da linguística

sistémico-funcional quanto à sua aplicação em contexto escolar através da

TR&G. A TR&G, baseada na perspectiva sistémico-funcional da linguagem,

será aqui apresentada porque, além do mais, fundamenta toda a futura análise

de resultados e a coleta de dados que será apresentada no segundo capítulo.

As pesquisas realizadas por Martin e Rose (2008), entre outros profissionais da

escola de Sydney, têm colaborado muito com os avanços no desempenho

escolar em parte da Austrália. J. Martin definiu os géneros textuais da seguinte

maneira:

“As a working definition we characterised genres as staged, goal oriented social processes. Staged, because it usually takes us more than one step to reach our goals; goal oriented because we feel frustrated if we don’t accomplish the final steps; social because writers shape their texts for readers of particular kinds.” (Martin,2008:6)

Esta definição sustenta o trabalho de descrição de alguns géneros escritos de

escolas primárias e secundárias da cidade de Sydney na Austrália e, no nosso

ver, ilustra com clareza a relação entre os géneros, os participantes e o

contexto social. Seja qual for a intenção ou forma de comunicação (oral ou

escrita) há sempre uma relação de dependência entre quem fala/escreve e

quem ouve/reage, sendo essa relação dialética e constante, como sugerido por

Halliday previamente (1985, 1994, 2004). Quando o enunciado não atinge o

seu objetivo, vêm a frustração e as tentativas de se atingir o objetivo social do

enunciado que passa a ser trabalhado, modificado até que se cumpra o

objetivo social.

41

A aprendizagem da leitura e escrita (literacia), sob este olhar, tem caráter de

processo e não é vista como produto a ser analisado. Essa é uma forma

simplista de explicar o conceito acima; ao refletirmos sobre textos escritos, o

processo pode ocorrer de outras formas, pois o escritor realiza os enunciados

com mais tempo de preparo, do que na fala espontânea; o que queremos

realçar com esta afirmação é que os géneros estão intimamente ligados ao

contexto e aos participantes, ou atores sociais.

A TR&G foi investigada através da comparação de diversos textos escolares,

na busca de encontrar diferenças e similaridades. Três áreas de investigação

foram utilizadas por Eggins e Martin (1997) com o objetivo de descrever formas

linguísticas (palavras e estruturas) são elas: formalidade textual, expressão da

atitude e conhecimento prévio, em uma primeira etapa da análise. A segunda

etapa constituiu na tentativa de explicar as diferenças linguísticas encontradas

na primeira etapa. Uma das conclusões deste estudo relaciona-se ao contexto:

“Our explanation has highlighted a very important observation about the text: that

each text appears to carry with it some influences from the context in which it was

produced. Context, we could say, gets ‘into’ text by influencing the words and

structures that text-producers use.” (Eggins e Martin, 1997:232)

A relação entre língua e contexto é fundamental para a compreensão de como

o contexto está dentro do texto. É através dos contextos que os participantes

de uma situação escolhem as estruturas e palavras que irão utilizar. Por

exemplo, dois economistas podem falar sobre a crise económica europeia,

tanto na mesa de um bar como em uma entrevista de trabalho e certamente, as

palavras e estruturas de língua que escolherão para expressar suas opiniões

quanto à crise económica serão muito diferentes, dada a situação em que se

encontram. Nesta perspectiva, texto e contexto são inseparáveis, a menos que

por razões de estudo e análise da língua.

A dimensão social do contexto, portanto, influencia a escolha das palavras e

estruturas que utilizaremos, tanto na fala quanto na escrita. Com o objetivo de

analisar as escolhas, similaridades e diferenças da língua, esta abordagem

genológica utiliza as três dimensões da linguagem, sugeridas por Halliday

42

(1985, 1994, 2004): modo, relações e campo, assim como suas respectivas

metafunções: textual, interpessoal e ideacional. Entretanto, como vemos na

figura 4 sugerida por Martin (1992, 1997) há um novo conceito representado

por um círculo que envolve toda a organização da linguagem: o género. Como

pode ser observado no gráfico a seguir.

Figura 4 – Género em relação ao Registo (Eggins and Martin, 1997:243) – trad. minha

O ensino e aprendizagem da literacia baseada na TR&G é realizada de cima

para baixo, isso quer dizer que o ensino inicia-se pelo género (propósito social

e cultural), depois passa para o registo (como, o que e para quem) e finalmente

para as estruturas de linguagem propriamente ditas (sentenças, palavras,

ortografia, etc.)

O conceito de registo também está intimamente ligado ao significado, citando

Eggins e Martin: “The concept of register is a theoretical explanation of the common-

sense observation that we use language differently in different situations”. (1997:234)

Mais especificamente, o contexto exerce influência na linguagem gerando

certos significados relacionados com a situação em questão. O Registo, nestes

termos, refere-se ao contexto da situação, enquanto o Género se refere ao

contexto da cultura e, portanto, são as duas principais dimensões de variação

entre os textos.

“P register and genre variation are two realizational planes in a social semiotic view of the text. This view is inherently dialogic and interactive: text is both the

Contexto (nível 2) Género – acima e para além das

metafunções

Contexto (nível 1) Registo - organizado por

metafunção

Linguagem - organizada por metafunção

Género

campo

relações

modo

ideacional

interpessoal

43

realization of types of context, and the enactment of what matters to cultural members in situations.” (Eggins e Martin 1997:251)

1.5.1 Géneros: o ensino das línguas e através das línguas.

Um importante aspecto da TR&G, agora em relação ao ensino da literacia é o

fato de que esta considera fundamental a responsabilidade de todas as áreas

do currículo pelo ensino da linguagem, consequentemente, torna-se também

fundamental para a formação de professores.

Assim sendo, a experimentação dos diferentes contextos na escola faz-se

necessária, e isso pode ocorrer através de atividades direcionadas à

descoberta dos propósitos e efeitos funcionais das escolhas gramaticais

oferecidas pela língua, mesmo que o significado e a compreensão de tais

textos só se realizem em situações sociais reais.

Uma pedagogia baseada no ensino através de géneros textuais prevê o

envolvimento de todas as matérias escolares no ensino da leitura e escrita. A

linguagem falada ou escrita que envolve o ensino da matemática, ciências,

história, geografia, e assim por diante, merecem tanto destaque quanto a

literatura e os tipos de textos escolares de responsabilidade do ensino das

disciplinas de línguas. Cada profissional responsável pelo ensino das diferentes

áreas do currículo deve ter consciência dos tipos de texto relevantes ao ensino

do currículo das disciplinas nos diversos níveis escolares, assim como, deve

possuir recursos e habilidades para levar os seus alunos a compreender tais

textos, serem capazes de inferir significados e também de construí-los

independentemente, de maneira apropriada e coerente à área em questão. J.

Rothery menciona esta necessidade ao descrever as mudanças de currículos

educacionais australianos:

“Across a range of learning areas these documents state, not only that language is learned through use, but it varies according to the context in which it is used. This approach to language development is in marked contrast to that of earlier decades where school subject English or Language Arts, was seen to have sole responsibility for language developmentP” (Rothery,1996:86)

44

Na escola professores e alunos envolvem-se por meio de diferentes tipos de

texto, falados e escritos, em diversos contextos de acordo com as

necessidades dos níveis de escolaridade e da parte do currículo em questão.

Segundo a perspectiva sistémico-funcional, os alunos desenvolvem a escrita

gradualmente, e vão aos poucos, incluindo as características gramaticais

aprendidas em seu discurso argumentativo, até atingirem o nível de escrita

académica, e serem capazes de sintetizar um maior número de informações

em cada frase, adotando as propriedades estruturais e semânticas adequadas.

A leitura e a escrita, adequada aos níveis escolares, é aprendida a partir dos

recursos léxicos e gramaticais previamente aprendidos, mesmo ao iniciar a

escolarização, as crianças têm recursos lexicais e gramaticais aprendidos na

comunicação com adultos, que tem a tendência de ensinar, mesmo que não

formalmente ou conscientemente. Caso a aprendizagem dos recursos

linguísticos em qualquer das fases não ocorra de forma eficaz,

consequentemente, o desenvolvimento da leitura e escrita será prejudicado.

(Christie, 1998:52)

A fim de melhorar o desempenho escolar e, consequentemente, as habilidades

de participação social das crianças de hoje, é imprescindível que os

professores estejam cientes da realidade, e tenham formação adequada e

continuada para que todo o sistema educacional possa atingir seu maior

objetivo atual, formar cidadãos ativos e críticos. Já na década de 90, Delors

chamava a atenção para a necessidade de envolver a educação na formação

social para a conscientização do poder que tem os profissionais da educação

no mundo:

“A educação pode ser um fator de coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos grupos humanos, evitando tornar-se um fator de exclusão social. O respeito pela diversidade e pela especificidade dos indivíduos constitui, de fato, um princípio fundamental, que deve levar à proscrição de qualquer forma de ensino estandardizado.” (Delors,1996:54)

O exemplo australiano, a partir da teorização sobre registo e género e sua

aplicação em diversas escolas, sugere que professores e linguistas

educacionais podem juntos contribuir para diminuição das lacunas encontradas

45

nos sistemas escolares que causam o fracasso de muitos alunos. Segundo

Rothery (1996:107) professores de vários estados australianos que testaram a

pedagogia baseada na TR&G, concluiram, através da prática, que a concepção

da pedagogia linguística com base genológica fornece estratégias para

planeamento, ensino e avaliação das aulas que promovem o desenvolvimento

da aprendizagem e da linguagem.

Acreditamos que a partir de uma pedagogia de base genológica e sociocultural,

baseada nos princípios da LSF, poderemos traçar planos seguros na busca

pela realização dos objetivos traçados para a educação em Portugal e não só.

2. Uma abordagem de base genológica

Depois de sete anos de pesquisa sobre como os professores australianos

lidavam com o ensino da literacia, Martin e Rothery (1996:92) investigaram o

ensino da leitura e escrita em escolas primárias a partir de uma perspectiva

linguística e sociocultural, partindo destes estudos para o desenvolvimento de

uma abordagem de ensino e aprendizagem baseada na linguagem. Foi

importante, pois, proceder a uma descrição dos géneros que envolviam o

currículo escolar tanto da escola primária como, posteriormente da escola

secundária.

2.1 As etapas do processo de ensino e aprendizagem

A primeira distinção na análise de textos é entre a fala e a escrita, cada um tem

formas particulares e muito diferentes de uso da linguagem. Sendo assim,

podemos dizer que o ensino através de uma pedagogia linguística permitirá ao

leitor prever os significados de um texto, a partir do contexto da situação e do

contexto cultural, assim como, deduzir em que contexto algum texto foi

produzido, a partir da análise das seleções de linguagem e do seu propósito

social. Este conhecimento sobre o funcionamento explícito da língua imbuído

de significado, facilita o aprendizado da escrita dos diversos géneros existentes

em uma sociedade.

46

A abordagem de base genológica está estruturada segundo um esquema que

envolve quatro etapas que abaixo sintetizo:

1. Negociação do campo (negotiating field) – representa as etapas antes

da desconstrução: definir o campo, qual parte será explorada, o que os

alunos já sabem sobre este, que experiências e atividades farão parte

da exploração, como serão organizadas e anotadas as informações

colhidas através das atividades.

2. Desconstrução (Deconstruction) – envolve o Contexto da Cultura: qual o

propósito social do género, quem o utiliza e por quê; o Contexto da

Situação: qual o registo, ou seja, campo, modo e relações; e o Texto:

qual a função dos estágios, algumas características da linguagem, como

saber sobre do que trata o texto, as relações entre o escritor e o leitor.

3. Construção conjunta (Joint Construction) – Preparação para a escrita

independente, reunindo informações sobre o campo através de

pesquisas, usando questões guiadas para atividades graduadas

incluindo: observações, entrevistas, filme e vídeo, exibições, leituras,

anotações.

4. Construção independente (Independent Construction) – escrita individual

de um texto do mesmo género (como na Construção Conjunta), pode

haver consulta com o professor e os colegas sobre a produção escrita,

edição ou reconstrução da escrita. Deve ocorrer uma avaliação crítica do

sucesso. A consolidação com o professor e colegas pode acontecer

durante ou depois da primeira escrita (que também pode conter

aspectos de edição, etc) em busca de uma Literacia Crítica quando os

alunos usam o género para desafiar ideologias, teorias e práticas.

O modo como estas etapas se desenvolvem e interrelacionam está

representado na figura 5:

47

Figura 5: Literacy in Society: The teaching cycle (Rothery, 1996:102)

O formato circular do esquema foi assim posto para indicar que há sempre a

possibilidade de voltar a uma ou outra etapa, dependendo do desenvolvimento

dos alunos no tópico (campo), constantemente avaliado pelo professor.

A denominação das etapas do ciclo fornece aos professores a metalinguagem4

necessária para a aplicação pedagógica, ou seja, torna explícita qual a função

de cada parte do género estudado no processo de obtenção dos objetivos de

uma unidade de trabalho. A seguir explicaremos a função de cada parte da

abordagem.

O início de uma intervenção pedagógica baseada na abordagem genológica

dá-se com a negociação do campo, isso ocorre, via de regra, porque os alunos

4 A metalinguagem a que nos referimos será apresentada mais adiante na secção 3.2

48

precisam estar familiarizados com o tema que envolverá a produção de textos,

para que sejam capazes de produzir textos de um determinado género de

forma eficaz. Os géneros são previamente escolhidos pois devem estar em

concordância com os objetivos do currículo para cada nível de escolaridade. A

etapa de negociação do campo envolve a construção de conhecimento sobre o

tema entre professor e alunos. É fundamental, nesta etapa, que o professor

conduza as aulas partindo do conhecimento prévio dos alunos e, dependendo

do tema, das suas experiências não escolares para envolve-los na

aprendizagem, além de aos poucos, introduzir o conhecimento curricular,

formal, necessário para a obtenção dos objetivos educacionais. Ao mesmo

tempo, professor e alunos estão construindo o conhecimento do campo e

aprendendo/ensinando a linguagem usada em determinada área de

conhecimento da língua em questão. Nesta etapa o objetivo do professor é

preparar os alunos para a leitura de um texto modelo do género selecionado.

“P as the work progresses the teacher will need to take a more strongly guiding role in pointing students towards types of texts and areas of knowledge relevant to understanding the text or texts students need to read in the Deconstruction stage.” (Rothery, 1996:103)

O tempo ou o número de sessões desta etapa dependerá muito do

conhecimento que os alunos já possuem do tema e do nível de

aprofundamento requerido pelo estágio de escolaridade. Assim como, das

atividades e/ou experiências escolhidas para a exploração do tema e tipo de

organização do conhecimento acumulado (notas, gráficos, referências

bibliográficas) que oferecerão suporte aos alunos nas etapas seguintes.

O planeamento dessas estratégias é de fundamental importância, pois o

conjunto de pesquisas, resumos, notas, perguntas/respostas, vídeos, entre

outras atividades possíveis, não são essenciais apenas, para a aprendizagem

do tópico curricular, servirão também, de base para a futura construção da

escrita do género.

A etapa da desconstrução é relevante, principalmente, para a familiarização

dos alunos com o género; é o momento em que os textos modelo, previamente

49

selecionados pelo professor, serão lidos e desconstruídos em conjunto pelo

grupo de alunos e professor. Além de serem, por motivos óbvios, relacionados

ao tema discutido na fase de negociação do campo, os textos modelo devem

ser bons exemplos do género, para que a fase de desconstrução seja

completa. Reservaremos uma secção mais adiante para tratar da seleção de

textos. Esta etapa deve levar em conta o contexto cultural, ou seja, definir o

propósito social do género, quem os utiliza e por quais razões; e também, os

estágios de organização do texto, quanto às suas funções, às características

linguísticas e à relação entre escritor e leitor. Nas atividades e discussões que

envolverão a desconstrução do texto, o professor apresentará a

metalinguagem referente ao género que será de grande importância para a

etapa seguinte do processo, a construção conjunta.

Uma vez que os alunos adquiriram conhecimento técnico sobre o campo na

primeira etapa, e depois construíram conhecimento sobre o texto e a

metalinguagem que envolve o género estudado, sem perder de vista o currículo

escolar e o propósito social, os consideramos prontos para iniciar o processo

de escrita.

A terceira etapa do processo, construção conjunta, é feita com o auxílio da

metalinguagem aprendida na etapa anterior, com base nos conhecimentos

adquiridos sobre o campo, e sob o constante direcionamento do professor. “In

the Joint Construction stage the teacher is expected to take up a similar role

with the whole class, or with a small group.” (Rothery, 1996:105). Porém, o

trabalho do professor nesta fase envolve muita atenção, preparo e foco nos

objetivos do contexto, tanto cultural (género), quanto da situação (registo). É

essencial que a sequência de perguntas, e atividades preparadas pelo

professor guie as respostas dos alunos em direção à construção do género.

Estas atividades podem envolver, entrevistas, filmes, leituras, observações, etc.

O envolvimento de todos os alunos na construção conjunta também merece

atenção, principalmente, para aqueles alunos, que por diversas razões, tentam

esquivar-se da participação conjunta. Ninguém melhor que o professor para

saber quais perguntas ou comentários irão engajar os seus alunos,

50

independentemente, do quão próximo ou não eles estão do objetivo final da

etapa.

Finalmente, é papel do professor ensinar aos alunos a forma escrita da

linguagem, através de modelos de escrita do género ou mesmo, sugerindo

outras palavras e estruturas mais apropriadas à linguagem escrita. Nesta

etapa, os alunos farão uso das notas e atividades que fizeram nas etapas

anteriores para os apoiarem na construção conjunta, por isso, é importante que

os alunos aprendam a fazer notas, selecionar informações relevantes de um

texto e organizá-las devidamente.

Estas etapas podem demorar algum tempo, em especial, quando os alunos

estão aprendendo um novo Campo ou um Género escrito pela primeira vez;

porém, tornam-se mais curtas e fáceis de realizar à medida que os alunos se

tornam mais confiantes e independentes. Gradualmente, a seriação dos

géneros pode ser removida e os estudantes serão capazes de pesquisar e se

mover no ciclo de aprendizagem independentemente. (Rothery, 1996:107)

Em qualquer sistema pedagógico, os alunos desenvolvem-se em diferentes

ritmos, neste caso, alguns precisarão de mais tempo ou um maior número de

atividades na etapa de desconstrução dos textos, outros talvez na construção

conjunta, e assim por diante. Considerando o panorama real de uma sala de

aula, o ciclo apresentado na figura 5 não pode ser tratado de forma estanque,

movimentos dentro do ciclo devem ocorrer à medida que todos os alunos de

um grupo mostram-se prontos ou não a prosseguir.

Ao chegar á última etapa do ciclo, quando os alunos irão iniciar as suas

tentativas de construção independente do género trabalhado, as situações de

diferentes níveis de desenvolvimento continuam sendo reais, enquanto alguns

alunos não conseguirão atingir o nível esperado na primeira tentativa e

precisarão de mais apoio; outros o farão bem, neste momento, estes alunos

precisam ser desafiados de alguma forma, seja para aumentar o nível de

vocabulário, estruturas, ou o nível de escrita ou discurso do próprio campo, por

isso, o professor deve ter sempre atividades preparadas para as diferentes

51

respostas dos diversos alunos.

As etapas do ciclo de aprendizagem proposto servem a todos os níveis

escolares, e podem ser aplicadas a qualquer conteúdo, género, de qualquer

disciplina ou tópico a ser estudado, em outras palavras, são adaptáveis aos

currículos, transversalmente. De acordo com relatos da experiência de uso da

pedagogia linguística baseada em uma abordagem genológica já mencionada

anteriormente, à medida que os alunos se vão familiarizando com a forma de

ensino e aprendizagem sugerida, as etapas tornam-se cada vez mais curtas e

a aprendizagem mais eficaz em todas as disciplinas curriculares.

O conteúdo disciplinar é, via de regra, ensinado através de textos ou, pelo

menos, com textos de apoio, no caso de disciplinas mais práticas como

matemática e ciências. Em muitos casos, o fracasso ou a causa de dificuldades

de aprendizagem dos alunos em qualquer disciplina está na falta de

compreensão destes textos, por isso, a introdução de uma pedagogia

linguística pode trazer muitos benefícios à aprendizagem e à formação de

leitores competentes em qualquer área de conhecimento.

Contudo, a pedagogia linguística, apesar de focada no discurso (seja oral ou

escrito) não dispensa as técnicas, estratégias e recursos usados e necessários

ao ensino dos diversos conteúdos escolares, como por exemplo, a leitura de

mapas, os números e equações matemáticas, os recursos visuais dos livros,

entre tantos outros. Acreditamos, entretanto, que a união desses recursos, à

total compreensão dos textos, através de um sistema consistente de ensino de

leitura, compreensão e produção (seja oral ou escrita) de textos, tende a

melhorar o desempenho global dos alunos, assim como promover o processo

de formar alunos independentes, que no futuro serão capazes de dar

continuidade à aprendizagem ao longo da vida. Lê-se no QECR que:

“Pode ser, dependendo do esquema cognitivo do aprendente, que a memorização de formas faladas seja grandemente facilitada pela sua associação às formas escritas correspondentes ou vice-versa, que a percepção das formas escritas possa ser facilitada, ou até fulcral, pela sua associação aos enunciados orais correspondentes. Se assim for, a competência não exigida pelo uso – e, consequentemente, não declarada como objectivo – pode, de algum modo, ser

52

integrada na aprendizagem da língua como um meio para atingir um fim. Deve decidir-se (de forma consciente ou não) que competências, tarefas, actividades e estratégias, como objectivos ou como meios, deverão ter algum papel no desenvolvimento de um dado aprendente.” (Conselho da Europa, 2001:29)

Apesar de sabermos que o QECR não propõe um conjunto de estratégias para

o ensino, sabe-se que este está impregnado de algumas premissas da

chamada abordagem comunicativa. Ao ler a citação acima referente às

competências comunicativas necessárias à aprendizagem da leitura e escrita,

encontra-se ainda uma mistura de conceitos da pedagogia tradicional,

exemplificado pela necessidade de ‘memorização’; por outro lado, o conceito

de facilitação do conhecimento preconizado pela abordagem comunicativa; e

inclusive, podemos incluir alguma referência à abordagem genológica, quando

menciona a existência de textos orais e escritos e a relação entre eles, apesar

de não explicar nenhuma delas de forma clara.

O mais confuso, porém, e o que provocou a citação deste parágrafo aqui, foi a última frase:

“Deve decidir-se (de forma consciente ou não) que competências, tarefas, actividades e estratégias, como objectivos ou como meios, deverão ter algum papel no desenvolvimento de um dado aprendente.” (Conselho da Europa, 2001:29)

Parece claro que o trabalho do professor em sala de aula ou fora dela, ao

planear tarefas, atividades e estratégias para atingir objetivos claros e

desenvolver competências, não é levado muito a sério quanto à consciência da

forma, em que serão apresentados conteúdos e em que será promovido o

desenvolvimento de competências.

A seguir será apresentado um programa de ensino australiano baseado na

Teoria de Registo e Género aqui apresentada, fundamentado nos princípios da

Linguística Sistémico-Funcional e na Pedagogia Linguística de base

genológica. Este programa foi escolhido para servir de modelo nesta

dissertação, por ser um programa, consistente, coerente e principalmente, por

incluir um módulo de formação de professores consciente, considerado

cinequanom para o sucesso do programa e da aprendizagem.

53

3. Desenvolvimentos programáticos do pensamento genológico

As primeiras pesquisas da escola de Sydney tiveram início nos anos 80 com o

projeto “Writing Project and Language as Social Power” que teve como foco o

estudo da escrita nas escolas primárias australianas. Este projeto foi expandido

na década de 90 através do projeto “Write it Right” investigando e descrevendo

os géneros textuais que os alunos supostamente deveriam aprender a ler e

escrever durante a escola secundária. Nesta fase foram explorados géneros

em ciências e história, e a descrição feita através de uma base semântica. A

última grande fase deu origem ao projeto “Reading to Learn", desenhado por

volta do ano 2000, faz uso do conhecimento adquirido até então para criar uma

metodologia que integre a leitura e a escrita, na aprendizagem curricular tanto

em escolas primárias, secundárias quanto no ensino superior. (Rose e Martin,

2012:2)

Apresento o programa de ensino Reading to Learn (doravante R2L) porque

sustenta o que de mais recente há em pesquisas educacionais que tem como

foco o ensino das línguas e porque sustenta os princípios da TR&G e da LSF

apresentados no início desta dissertação. Considero um complemento sério de

base sedimentar na formação de qualquer professor de língua, seja qual for o

contexto em que for ensinada.

O programa de literacia foi desenvolvido para capacitar aprendentes, em todos

os níveis escolares, a ler e a escrever adequadamente em correspondência à

idade, área de estudo e nível escolar. De acordo com avaliações

independentes, as estratégias do R2L têm consistentemente acelerado a

aprendizagem, duas ou até mais de quatro vezes do que o esperado, da

experiência, nível ou escola estudados. Estes dados foram reportados por

Lovstedt, A. (2010); Carbines, R., Wyatt, T. & Robb, L. (2005), Culican, S.J.

(2006), entre outros profissionais envolvidos no programa, em especial, na

Austrália e na Suécia.

Este programa teve início há mais de dez anos, envolve professores do ensino

primário, secundário, médio e universitário na Austrália e em outros países, tem

54

por objetivo integrar a leitura e a escrita ao ensino curricular durante todo o

percurso escolar e em todos os níveis. As estratégias incluem avançadas

pesquisas sobre língua e sobre aprendizagem em sala de aula em consonância

com o currículo pré-estabelecido. Acredita-se que seja um modelo digno de ser

apresentado pela sua formatação acessível, prática e que visa atender às

necessidades de professores e estudantes, através de bases linguísticas

sólidas, já que tem a chancela, entre outros, dos linguistas J. Martin e D. Rose.

Um dos procedimentos do programa R2L consiste em desafiar os estudantes

com textos cada vez mais complexos, tendo em conta o nível de cada grupo

e/ou individuo. O programa apresenta-se ambicioso, ao desafiar os alunos a

todo momento com textos mais complexos; todavia, é sustentado numa

pedagogia que dá todo o suporte necessário à aprendizagem dos géneros

textuais escolares, ensinando língua para facilitar a aprendizagem eficaz de

todas as matérias escolares. Isso se dá através de um programa que visa

deixar os alunos continuamente engajados e preparados para superar cada

etapa.

A adaptação e tradução do R2L e dos géneros textuais para a língua

portuguesa não foram, no entanto, ainda realizadas. Entretanto, está a ser

construída por um grupo de professores e investigadores portugueses

envolvidos no Projeto Multilateral Comenius 5TeL4ELE (Teacher Learning for

European Literacy Education) como parte do Programa de Aprendizagem ao

Longo da Vida da União Europeia. Devido a estes fatores, a apresentação da

nomenclatura, nomeadamente, metalinguagem pedagógica, em inglês, terá

uma breve explicação em português, o que não corresponderá, porventura, à

tradução definitiva da metalinguagem, nem dos géneros escolares em língua

portuguesa, até porque, este não é um trabalho de simples tradução, mas de

adaptação dos géneros de uma língua para outra, cujas origens são bem

diferentes. O que importa nesta dissertação é que os propósitos sociais e

comunicativos (função dos textos), tanto na língua inglesa quanto na língua

portuguesa podem ser considerados semelhantes.

5 Este projeto consiste na exploração da pedagogia linguística baseada num modelo funcional

da língua e terá duração de dois anos, tendo sido recomendado pelo projeto Comenius: European Core Curriculum for Mainstreamed Second Language – Teacher Education

55

3.1 As famílias genológicas

Para que possam escrever, os alunos precisam não só conhecer as

características gramaticais da língua em questão, mas saber quando e como

usá-las nos diferentes textos e contextos. Martin (1989) propôs três categorias

de classificação de géneros escolares. São elas: Personal, (Pessoal) Factual

(Factual) e Analytical (Analítica).

As três categorias de classificação de géneros escolares: Pessoal, Factual e

Analítico; resumem os propósitos e as características de sete géneros

escolares, são eles: recount (conto), narrative (narrativa), procedure

(procedimento), report (relato), account (relato), explanation (explicação) e

exposition (exposição). Cada uma das três categorias de géneros tem sua

própria sequência de desenvolvimento. O aumento da demanda gramatical

surge conforme estágios mais complexos são exigidos pela introdução de

textos mais avançados, no decorrer da vida escolar.

As famílias de géneros escolares sugeridas pela Escola de Sydney e utilizadas

no R2L têm fundamentação teórica na LSF e na TR&G e estão divididas por

três propósitos socio comunicativos, apresentados a seguir:

‘Envolver’ textos produzidos para envolver o leitor, podem ser construídos

através de uma sequência de eventos, nomeadamente ‘sequence of events’,

que por sua vez podem ou não apresentar uma complicação; e ainda, podem

ser construídos sem uma estrutura temporal nomeadamente, ‘not time

structured – news stories’ ou notícias.

‘Informar’ textos informativos como ‘histories – staged in time’, ou seja, histórias

cujo formato tem base cronológica, são exemplos, autobiografias, biografias e

textos históricos; ‘explanations – cause and effects’, ou textos informativos que

tenham causa e efeito, por exemplo, uma sequência de eventos ‘sequential’; ou

ainda, textos informativos escritos com base em várias causas produzindo um

resultado ‘factorial’; ou então o contrário, textos informativos que tenham uma

causa responsável por produzir múltiplos resultados ‘consequential’. ‘Reports’

textos descritivos não estruturados temporalmente que podem descrever algo

56

‘descriptive’; ou podem descrever várias coisas ‘classifying or taxonomic’; e

textos que descrevem partes de um todo ‘compositional’. Estes tipos de textos

são comumente encontrados em disciplinas escolares como ciências,

matemática e outras.

‘Instruir’ textos com função instrutiva, por sua vez, podem ser textos que

explicam como realizar uma atividade, ‘procedure’ por exemplo, receitas,

experimentos, algoritmos; textos que informem o que se deve ou não fazer,

‘protocol’ como regras, avisos e leis; e também textos os quais, recontam como

procedimentos foram realizados ‘procedural recount’, por exemplo, um texto

que informe como uma experiência científica tenha sido realizada na prática.

O quadro a seguir foi construído a partir dos propósitos socio comunicativos

envolvidos em cada tipo de texto reconhecido e apresenta os géneros

escolares, seus respectivos propósitos sociais e os estágios que apresentam

em suas estruturas, em outras palavras, as fases que os professores devem

reconhecer no texto, para poder ensinar seus alunos a fazerem o mesmo. O

quadro está ainda dividido pelo tipo de texto na margem esquerda. Explica-se,

mais uma vez, que a versão em língua inglesa foi mantida, porque a

metalinguagem e reformulação do quadro para a língua portuguesa está a ser

construída através do projeto TeL4ELE.

57

Tabela 1 – Adaptação do Mapa de géneros na escola “Map of genres in school” (Martin e

Rose, 2012:312) apresentado por D. Rose em Conferência do Projeto Tel4ELE, em Portugal

em 15 de dezembro de 2011.

58

Os estágios sugeridos para cada género são altamente variáveis e não

precisam, necessariamente, aparecer no mesmo parágrafo. Da mesma forma

que todo texto passa por uma série de estágios para atingir seu objetivo final.

Os passos mais facilmente reconhecidos em um texto são denominados

‘stages’ ou seja, estágios. Em uma narrativa, por exemplo, e como se pode

confirmar no quadro 1 os estágios são ‘orientation’, ‘complication’ e ‘resolution’

(orientação, complicação e resolução).

Os estágios são compostos por fases, e todas estas partes do texto que se

permeiam para construir significado foram nomeadas, com objetivos didáticos

para este programa, essa nomeação chama-se metalinguagem e precisa ser

ensinada clara e explicitamente, como descrito a seguir.

3.2 Desenvolvimento da Metalinguagem

Ao falar sobre os estágios de um texto, o professor vai ao mesmo tempo

introduzir a metalinguagem referente ao mesmo. Para que os diferentes

nomes, usados nesta metalinguagem, sejam claramente diferenciados,

enquanto a metalinguagem usada para os estágios dos géneros é escrita em

letras maiúsculas, as suas respectivas fases, são escritas com letras

minúsculas. Independentemente da estratégia escolhida para diferenciar estes

dois níveis de metalinguagem, a ênfase está em apenas, não apresentar listas

com nomes estranhos à realidade dos alunos, mas só apresentá-los em

contexto, ao passo que os estágios e fases aparecem no texto. Cada estágio

de um género pode incluir uma ou mais fases, que dependem não só do

estágio a que pertencem mas também do género e do campo do texto.

Os estágios, como visto no quadro 1, organizam a estrutura global do texto,

portanto, as fases são responsáveis por organizar como o texto se desenrola

dentro desta estrutura global.

“PFor this reason it is important to be able to identify the phases in a text, in order to teach our students how to read it with understanding, and to write new texts that use similar patterns.” (D. Rose, seminário em Glasgow, dia 23 de fevereiro de 2012)

59

Isso vem reforçar a ideia da necessidade de oferecer aos professores mais

conhecimentos linguísticos em sua formação, seja na licenciatura, seja em

programas de educação continuada. Se o responsável pelo ensino não tem

pleno domínio da língua que ensina, seja de ensino de língua materna ou não,

não poderá formar leitores e escritores conscientes e capazes de usar a língua

em questão de forma clara e eficiente. Não se trata apenas de conhecer toda a

gramática, estruturas de frases e modelos de texto, trata-se de serem

profissionais tão competentes quanto um linguista, para interpretar, inferir,

discernir, avaliar os textos com os quais trabalha para poder formar cidadãos,

pessoas capazes de ler as entrelinhas, de fazer uso dos recursos linguísticos,

como as metáforas, por exemplo, de forma consciente.

3.3 Texto em contexto

O R2L também considera o texto sempre em contexto. A figura 6 representa

um modelo funcional de linguagem em contexto que serve o ensino das línguas

e suas adaptações à realidade escolar e ao processo de ensino e

aprendizagem. Faz-se importante ressaltar que, a primeira instância a ser

considerada no ensino baseado nesta pedagogia genológica é o contexto, e

assim por diante, como indica a seta de cima para baixo na figura.

Figura 6 - Functional Model of language in context (Martin e Rose, 2012:215)

letter pattern

syllableword

word group

sentence

paragraph

textcontext

patterns

within the

sentence

patterns

within

the text

patterns

within

the word

Functional model of language in context

60

A seta indica que o contexto move-se de cima para baixo, permeando cada

etapa do modelo. Ao pensar o ambiente educacional, o contexto encontra-se

no tópico ou matéria escolar, nos participantes envolvidos no texto, e também

nos propósitos sociais inseridos no texto, ou seja, aquilo que os leitores,

escritores, falantes e ouvintes querem atingir.

Considerando o contexto escolar, ao comparar a organização tripartida da

língua segundo Halliday com a proposta deste modelo funcional de estudo da

linguagem temos:

• Padrões no interior dos textos- padrões encontrados primeiramente em

um género proveniente dos currículos das disciplinas, e que depois

representam os significados das estruturas nos textos, tanto dos

parágrafos quanto das ligações entre eles. Encontramos aqui o Campo,

a metafunção ideacional, que se refere às evidências linguísticas

textuais, exprime recursos intertextuais e conhecimentos de um discurso

ou tema.

• Padrões no interior das frases- que representam o conhecimento sobre

as estruturas do discurso e sobre as estruturas gramaticais, como formar

frases e quais grupos de palavras escolher dependendo do significado

que se quer atingir. Na organização de Halliday, Modo, a metafunção

textual, que diz respeito às escolhas linguísticas quanto ao vocabulário e

estruturas, dependentes do significado que se pretende transmitir, seja

em textos escritos ou orais.

• Padrões no interior das palavras- o conhecimento sobre o sistema

grafológico e fónico revelam a metafunção relacional, Relações, que

atribui a presença e ou ausência de recursos linguísticos que

demonstrem atitude, valor e o papel do autor do texto na sociedade

através da relação entre os falantes ou escreventes e leitores.

3.3.1 Padrões da língua: Texto, frase e palavra

O modelo funcional de língua em contexto exprimido na figura 6 expõe três

padrões que fazem parte do estudo das línguas através dos estudos

genológicos. Na instância dos padrões do texto existem, e são objectos de

61

ensino, o contexto cultural e também o situacional, que permitem explorar a

língua como um todo e ensinar aos alunos a ler conscientemente consoante

aos propósitos sociais do mesmo; assim como a organização do texto em si,

enquanto suas estruturas gramaticais, os parágrafos, formas mais comuns de

compor significados em um texto e que facilitam a identificação das

características comuns a um género.

Os objectos de estudo na instância dos padrões das frases são a gramática e a

estruturação e sistematização da língua através de conjuntos de palavras, que

se unem em uma frase para comunicar um significado. A leitura detalhada das

frases permite aos alunos descobrirem o conteúdo e a linguagem usada pelo

escritor para comunicá-lo. Portanto, leva-o a conhecer diferentes grupos de

palavras.

O estudo dos padrões na instância das palavras está posto por último, mas é

tão importante quanto os outros para uma comunicação eficaz em qualquer tipo

de género textual. Além da aprendizagem de vocabulário, a instância das

palavras envolve o ensino da ortografia, relação grafia e som, consciência

fonética, acentuação, entre outros, dependendo da língua em questão.

A complexa tarefa de aprender a ler e escrever é, de certa forma, simplificada

ao planear-se conjuntos de atividades coerentes que partem do

reconhecimento daquilo que faz sentido no mundo real (contexto) e do assunto

de que trata o texto (campo), para que depois todos os alunos se sintam

seguros, tanto para compreender como para escrever cada etapa de um texto.

Esse conhecimento inicial informa os alunos sobre o que se espera de um texto

ou sobre o caminho a seguir na produção do mesmo.

Depois desta etapa, passar para a compreensão das frases já tem significado e

a interação entre as frases faz sentido, por estas dependerem umas das outras

num texto, assim como a compreensão do significado das palavras só é

possível dentro de um grupo de palavras.

62

A aprendizagem da grafia, fonética, ortografia é mais abstrata, por isso,

aparentemente menos interessante, mas ao perceber a dependência dessa

aprendizagem para conseguir produzir significado, ou seja, produzir textos

compreensíveis a quem os vai ler ou ouvir, a aprendizagem das características

mais minuciosas da língua, sejam elas estruturas gramaticais, fonéticas,

silábicas, ou outras torna-se significativa e indispensável para o processo de

ensino-aprendizagem.

3.3.2 Contexto da cultura

Foi a partir dos propósitos sociais dos textos que se fez o agrupamento de

textos em géneros textuais, e também foi a partir daí, que J. Martin e D. Rose

(2008) definiram os géneros textuais escolares para a língua inglesa. O

contexto da situação primeiramente sugerido foi engobado ainda pelo contexto

da cultura, já que vivemos em um mundo globalizado.

O contexto da cultura leva em consideração a situação em que os textos,

escritos ou orais, ocorrem e seus propósitos sociais, assim como sugerido por

Firth, Halliday, e inclui nessa organização do sistema linguístico, as

peculiaridades culturais, tão variáveis em relação às diversas línguas ou

mesmo intrínsecas a uma só língua. Tendo em vista que cada língua apresenta

variações quanto ao estilo, vocabulário, estrutura e outros, dependendo da

comunidade cultural em que está sendo utilizada, seja dentro de um grupo ou

entre continentes; tendo sido aprendida como língua materna ou não-materna,

segunda ou estrangeira, as diversas culturas que envolvem as línguas devem

estar presentes no dia-a-dia da sala de aula, devem ser de conhecimento geral

dos professores e valorizadas, por representarem uma riqueza cultural

inestimável.

“As línguas são os vetores das nossas experiências, dos nossos contextos intelectuais e culturais, dos nossos modos de relacionamento com os grupos humanos, com os nossos sistemas de valores, com os nossos códigos sociais e sentimentos de pertencimento, tanto no plano coletivo como individual. Sob o ponto de vista da diversidade cultural, a diversidade linguística reflete a adaptação criativa dos grupos humanos às mudanças no seu ambiente físico e social. Nesse sentido, as línguas não são somente um meio de comunicação,

63

mas representam a própria estrutura das expressões culturais e são portadoras de identidade, valores e concepções de mundo.” (UNESCO, 2009:12)

Como mencionado anteriormente os géneros são conhecidos, para além de

suas características semânticas e organizacionais comuns, também pelo seu

propósito social, ou seja, o propósito socio comunicacional de qualquer texto

ajuda a definir que tipo de género está sendo lido e/ou escrito.

Em qualquer tipo de comunicação os participantes de um texto passam por

etapas até atingirem seus objetivos comunicacionais. Consequentemente, os

textos em geral consistem em uma sequência de estágios que podem ser

reconhecidas. Assim, para ser possível identificar o género de um texto há que

se considerar os dois aspectos: o propósito social e os estágios do texto.

3.4 Evolução da teoria à prática

Um dos maiores desafios da implementação de um novo programa educacional

é a adaptação curricular, e/ou modificações curriculares que, normalmente, são

necessárias. O programa R2L sugere integrar as suas metodologias de ensino

da leitura e a escrita nos programas e o currículo existentes em cada nível

escolar, considerando tanto o desenrolar das habilidades de leitura adquiridas

nos diferentes estágios quanto os conteúdos a serem estudados em cada ano

letivo para cada área de conhecimento específica. No âmbito deste trabalho

daremos apenas atenção às questões do ensino da língua, todavia, o programa

R2L envolve todas as disciplinas escolares, pelo que será inevitável referir,

quando for apropriado, os diversos conteúdos escolares, mesmo não sendo

componentes principais da investigação.

Os promotores do programa acreditam ser possível unir o currículo referente

aos conteúdos a serem ensinados tendo como base linear um currículo de

desenvolvimento da leitura e escrita ao longo dos níveis escolares.

Sabe-se que muitas vezes a aprendizagem curricular inicia-se fora da escola,

geralmente em casa, através do convívio entre crianças e adultos. Nos dias de

hoje, podemos ainda acrescentar os vastos meios de comunicação presentes

64

no dia-a-dia das crianças desde a primeira infância pelo que, ao chegar à

escola, uma grande parte das crianças já possui habilidades e conhecimentos

de alguns conteúdos curriculares.

“Crucial to this is the talk around the text that many parents do with their children, discussing the meanings in stories as they read. This preparation gives these children an immense advantage when they start school” (J. Martin, seminário em Lisboa, dia 15 de dezembro de 2011).

A aprendizagem da leitura fora da escola está relacionada geralmente ao

prazer e envolvimento das crianças com o mundo das letras, na maioria das

vezes os adultos têm uma tendência natural para ensinar quando interagem

com as crianças. Por exemplo, muitos adultos ao ouvirem uma criança

pronunciar ‘podo pegar a boneca’ ao invés de ‘posso pegar a boneca’, repetem

a frase com a pronúncia correta. Este exercício de dedução realizado

brilhantemente pelas crianças é comum, e parte do processo de

desenvolvimento da fala, até atingirem a forma correta. Considerando os textos

orais, há os diálogos da interação diária entre as pessoas, contos e relatos do

quotidiano, em que a criança participa ativamente ou apenas ouve, e que

também tem o seu papel de ‘ensinantes’ da língua.

Os grupos escolares, porém, são de tal forma heterogéneos que se torna

impossível analisar caso a caso, sendo assim, coloca-se a necessidade de

traçar planos consistentes para todos, o que é primeiramente definido pelos

currículos escolares e foi incrementado por este programa com um plano de

ação complementar, o currículo de leitura e escrita.

Nos primeiros anos escolares todas as crianças devem ser preparadas para se

tornarem leitores independentes, sejam quais tenham sido as suas

experiências fora da escola; positivas ou negativas, mais ou menos ricas ou

mesmo inexistentes, todas devem chegar o mais próximo possível dos

objetivos curriculares de cada nível escolar. Na segunda fase do ensino básico,

os alunos devem adquirir a habilidade de aprender a aprender através da

leitura, enquanto no ensino secundário a leitura torna-se uma habilidade

fundamental de aprendizagem.

65

“Successful readers spend six years developing their reading and writing skills across the curriculum, so that they are well prepared for independent study at university.” (D. Rose, seminário em Lisboa, dia 15 de dezembro de 2011)

O programa australiano R2L foi criado com o objetivo de diminuir a diferença

entre os alunos mais bem-sucedidos e os que apresentam dificuldades ao

ponto de abandonarem precocemente o sistema educativo sem assimilarem os

conteúdos, muitas vezes por conta das deficiências na aprendizagem da leitura

e escrita. Diminuir esta lacuna, porém, envolve questões políticas e

administrativas, culturais e sociais que têm feito a escola, ao longo dos anos,

colaborar com a desigualdade de formação em várias partes do globo. Visto

que, a premissa fundamental do programa é superar as grandes diferenças

entre as habilidades dos alunos em cada sala de aula, e em todas as áreas de

conhecimento. Tal como previmos na introdução deste trabalho, regista-se uma

lacuna entre os objetivos governamentais, teóricos e ideológicos, e a realidade

das práticas dentro das salas de aula.

A aprendizagem foi organizada em ciclos, por ser uma pedagogia de base

linguística, (vide figura 5, Literacy in Society: The Teaching cycle) e realiza-se

por meio de tarefas, o que não apresenta nenhuma grande novidade dentro

daquilo que os professores já fazem em sala de aula. O que esta forma circular

vem garantir é que todos tenham a oportunidade de realizar bem as tarefas e

aprender através delas.

4. Diálogo entre a Linguística e a Pedagogia: uma possibilidade

Segundo os proponentes do programa R2L, preparar os alunos para

responderem aquilo que se quer ouvir é uma habilidade muito importante que

todo professor deve adquirir. Por isso, a planificação das aulas deve ser

minuciosamente realizada, residindo aí a chave do sucesso na integração dos

conhecimentos linguísticos e pedagógicos. Quando se sabe qual a resposta

que os alunos precisam dar, elaborar o plano de aula e as perguntas indutoras

das tarefas permite uma gestão mais segura de cada momento de aula.

Permite guiar os alunos em direção às respostas mais corretas tendo como

66

pano de fundo o conteúdo curricular; iniciá-los na linguagem mais apropriada

para o tópico (conteúdo linguístico) e envolver todos no processo é uma das

exigências principais se colocadas a um professor que abrace esta pedagogia.

Esta estratégia também serve para promover a confiança do grupo, pois ao ter

as perguntas formuladas previamente, o professor já pensou nos seus alunos

que precisarão de apoio, e nos que precisarão ser desafiados, podendo incluir

no seu planeamento ferramentas suficientes para envolver a todos e manter o

grupo disciplinado. Todo o planeamento se faz, portanto, de forma circular,

como representado no gráfico abaixo.

Figura 7 – Etapas de apoio (Scaffolding learning cycle, apresentado por Martin e Rose em

Conferência do Projeto Tel4ELE, em Portugal em 15 de dezembro de 2011) trad. minha

Este ciclo de aprendizagem é aplicável a três escalas de aprendizagem que

podem ser unidades curriculares inteiras, atividades de uma aula ou a

interação entre professor-aluno em aula.

A nível curricular observou-se que o trabalho que envolve um tópico ou cada

unidade curricular leva em média um semestre ou em alguns casos a metade

de um semestre para completar-se. Para que isso aconteça de forma

sistemática é normal dividir os tópicos em subtópicos e estes em atividades

aplicáveis às aulas. A diferença sugerida está na sistematização da

Tarefa

Elaboração

Preparação

67

aprendizagem dos conteúdos curriculares ao mesmo tempo que se ensina a

linguagem específica de disciplina. Daí a importância de se pensar o ensino

como algo cíclico, que pode ir e voltar dependendo das necessidades e/ou

barreiras encontradas no caminho em qualquer nível de aprendizagem, de

forma coletiva ou individual. Sendo assim, ao planear uma unidade didática, o

professor deve considerar que a preparação conterá diversas tarefas

elaboradas tanto anteriormente, como no decorrer da unidade e assim por

diante, e que podem ser interrompidas, ou mesmo repetidas, para que todos os

alunos atinjam o objetivo de aprendizagem em todas as unidades.

O mesmo pode ocorrer em uma aula, que geralmente envolve mais de uma

tarefa, para garantir que todos os alunos acompanhem as etapas de realização

de uma tarefa, seja ela de leitura, escrita, interpretação ou que envolva a

aquisição de conhecimentos específicos do conteúdo através das mais

diversas técnicas escolhidas pelos professores para suas turmas, a

flexibilidade cíclica desta forma de ver a sistematização da aprendizagem

ensina ao professor como e quando, pode ou deve, ir e vir dentro do ciclo.

Novamente, a diferença está em planear-se para que todos os alunos se

encontrem preparados para atingir os objetivos específicos de cada tarefa.

Considerando a interação entre professor e alunos, também não se foge muito

da já conhecida comunicação baseada em perguntas e respostas, com a

intenção de verificar a compreensão do que foi ensinado, envolver os alunos

em um tema, levá-los à reflexão, ou mesmo das perguntas que todos os

professores fazem ao longo do dia, de acordo com o que os alunos produzem e

dizem, com objetivos diversos como: expandir um assunto, exemplificar ou

generalizar, repetir uma ideia usando outros recursos linguísticos, fazer

ligações aos objetivos curriculares ou discutir em torno das experiências e do

conhecimento prévio dos alunos. Os princípios desta interação são mantidos, o

que se insere nesta interação diz respeito ao planeamento das tarefas feito

previamente pelo professor.

Assim que podemos concluir que o trabalho do professor antes das aulas é

bastante maior se feito desta forma, e como tudo o que se aprende na vida,

68

leva tempo de adaptação, esforço e flexibilidade, mas não se pode perder o

foco: diminuir as diferenças de desempenho existentes dentro das salas de

aula.

Outra importante questão em relação ao ir e vir do ciclo está em como isso

ocorre sob o olhar de uma pedagogia genológica. Nos três níveis acima citados

(preparação, tarefa e elaboração) é possível que a preparação para uma tarefa

não tenha sido suficiente, e portanto, há duas formas de se resolver o

problema, aperfeiçoar o momento da elaboração ou recomeçar com uma nova

preparação, para a mesma ou outra tarefa semelhante e/ou uma nova

elaboração, como já mencionámos, tudo leva tempo de adaptação, mas o ciclo

torna os planos de aula mais flexíveis e ao mesmo tempo mais objetivos por

serem detalhados.

4.1 Estratégias tripartidas do R2L

O projeto R2L inclui três níveis de apoio que podem ser integrados nos

programas de ensino em vários momentos. Este organiza-se em torno de

etapas ou níveis que passo a referir:

O primeiro nível Preparação para a leitura prepara os alunos para a leitura e

compreensão de textos previstos no currículo, usando posteriormente, estes

mesmos textos como modelos para escrita, que pode ser guiada ou

independente. Tal estratégia pode ser utilizada para qualquer aula no ensino

primário e secundário.

O segundo nível Leitura Detalhada é usado para que os estudantes

aprofundem a compreensão dos textos escritos, e possam utilizar as

informações e formas linguísticas encontradas em suas produções escritas.

Estas estratégias voltadas para os detalhe da oração permitem aos estudantes

lerem textos curriculares de maior complexidade com total compreensão dos

mesmos, e consequentemente, os leva a escrever bons textos, independente

do nível escolar em que se encontrem. Estas estratégias são, geralmente,

69

aplicadas diariamente no ensino primário e semanalmente no ensino

secundário.

O terceiro nível Estratégias Intensivas oferece apoio intensivo para que os

estudantes possam manipular as formas linguísticas em orações selecionadas,

praticar ortografia, estabelecer correspondência entre grafia e som e a escrita

fluente.

O Reading to Learn inclui um programa de aprendizagem profissional para que

os professores possam planear, implementar e avaliar com base nos altos

níveis de ensino de análise de textos exigidos pelo programa. As estratégias de

ensino envolvem o planeamento detalhado de interações em sala de aula, para

assegurar que todos os estudantes sejam capazes de participar ativamente e

mantendo níveis de produção elevados. O planeamento destas aulas também

exige conhecimento linguístico para a seleção de textos apropriados e para

análise das formas linguísticas.

A figura 8 foi construída para explanar as fases tripartidas do ciclo de

aprendizagem R2L.

Figura 8 – Três níveis de estratégias no programa R2L (Three levels of Strategies in Reading to Learn) (Martin, 2012:147) – trad. minha

70

As etapas do ciclo devem ser interpretadas de fora para dentro, na figuração,

pelo que a primeira parte será dedicada ao ciclo de cor verde composto pela

preparação antes da leitura ou desconstrução, construção conjunta e escrita

independente. Mais adiante, dedica-se ao segundo ciclo, em vermelho,

designadamente leitura detalhada, escrita conjunta e reescrita individual, e em

seguida, ao terceiro ciclo, amarelo, referente a construção de frases, ortografia

e escrita de frases.

Como se pode observar, há em azul um outro círculo que está ligado aos

restantes, representando os fatores responsáveis pela organização,

sistematização, planeamento e avaliação de pedagogia a que se refere. Este

círculo e suas componentes estão mencionados em cada nível, já que são

interdependentes, e mesmo assim, serão explorados mais adiante na secção

que tratará da avaliação.

4.1.1 Primeiro nível: Preparação antes da Leitura ou Desconstrução,

Construção Coletiva e Escrita Independente

A primeira fase do primeiro nível, Preparação para a Leitura, já é realizada por

muitos professores em muitas das suas aulas, a intenção do programa é que a

mesma seja levada a sério, planeada e que ocorra sempre que haja um texto

novo a ser trabalhado. As estratégias são simples e comuns aos educadores e

visam garantir que todos os alunos tenham conhecimentos gerais sobre o texto

que irão ler, portanto, cabe ao professor resumir o que irá acontecer no texto

oralmente, para dar suporte aos alunos em relação ao tema. A diferença está

na escolha do texto, se o texto selecionado estiver no nível de compreensão de

todos os alunos, essa preparação vai fazê-los perder o interesse na leitura já

na primeira frase. O que estas estratégias trazem de benefício é a possibilidade

de usar, nas aulas, textos cujo nível de linguagem seja superior ao da média do

grupo, desafiando-os e colaborando para que possam aumentar o nível de

leitura com compreensão total do texto.

A estratégia de Preparação para a Leitura também favorece a aprendizagem

da escrita. Neste caso, usa-se um pequeno texto ou seleciona-se um trecho de

71

um texto para que sirva de modelo para a escrita do género a ser aprendido. A

partir deste modelo, os alunos irão construir um texto em conjunto (do mesmo

género).

Na fase da Construção Coletiva é fundamental que o professor guie os alunos

na construção do texto, e preferencialmente, faça o trabalho da escrita para

que os alunos concentrem-se no conteúdo e formato do género, posteriormente

o texto coletivo será distribuído (ou copiado) por todo o grupo, pois este

também lhes vai servir de apoio para as respectivas Construções Individuais,

quando os alunos escreverão um texto, seguindo o mesmo modelo, e serão,

consequentemente avaliados em suas produções individuais.

Este primeiro nível é o que está mais intimamente ligado ao currículo escolar,

ao planeamento das aulas e à seleção dos textos usados para ensinar e avaliar

o que os alunos aprenderam.

4.1.2 Segundo nível: Leitura Detalhada, Construção Coletiva e Reescrita

Individual

A Leitura Detalhada será, porventura, a etapa do ciclo mais importante,

podendo levar algum tempo até que se atinja o objetivo principal: fazer com

que todos os alunos de um grupo compreendam o texto e possam fazer uso

das estruturas que contenha em sua própria produção.

Para este fim, um pequeno excerto do texto lido é previamente selecionado

pelo professor para a Leitura Detalhada. Detalhada, aqui, significa que o

professor irá ler o pequeno texto criteriosamente selecionado, e em seguida, ler

cada frase com os alunos identificando e sublinhando grupos de palavras

encontrados ao longo do texto.

A escolha do excerto do texto deve ser cuidadosa e consciente quanto ao nível

elevado de estruturas que se quer levar à compreensão dos alunos. Lembre-se

que esta pedagogia utiliza textos de nível mais avançado, se comparados aos

textos que os alunos já conseguem ler sozinhos, e deve sempre considerar

72

tanto os alunos mais avançados, quanto os que precisam de maior suporte,

para gradualmente diminuir a distância entre eles.

Após ter o texto todo sublinhado, o professor guiará os alunos para uma

Construção Coletiva deste pequeno excerto de texto. Neste momento, os

alunos vão emprestar, do texto lido, as estruturas sofisticadas que estão lendo,

provavelmente, pela primeira vez. Esta preparação e leitura têm como foco o

género do texto modelo, e as fases e passos de cada estágio. Esta mesma

técnica pode ser usada depois pelos alunos na Escrita Individual.

A Leitura Detalhada é realizada, geralmente, antes da Construção Coletiva.

Usa-se o excerto de texto rico em estruturas do género a ser aprendido,

realiza-se a tarefa de reconstrução deste texto de forma muito guiada e dando

todo o suporte necessário aos alunos, depois realiza-se outra tentativa de

construção do género individualmente, com base no mesmo trecho variando,

agora, apenas o tema.

A Leitura Detalhada visa a identificação, compreensão e preparação para as

primeiras tentativas de utilização de estruturas de frases sofisticadas, e das

estruturas que ligam e compõem as frases, em sua escrita ou fala.

“In sum, where wordings are comparatively easy to read and understand, they can be prepared with literal ‘wh’ cues; but where they may not be understood, they are prepared with synonyms or paraphrases. (P) Any text worthy of Detailed Reading will involve inferential and interpretative levels of meaning that are scaffolded in elaborations, even where the literal wordings are apparently transparent.” (Martin e Rose, 2012:158)

4.1.3 Terceiro nível: Reconstrução de Estruturas, Ortografia e Escrita

de Frases

Como já mencionado acima, ao fazer referência às estratégias específicas

deste nível, os alunos terão todo o suporte necessário para desenvolver as

habilidades necessárias à compreensão da leitura, ortografia e escrita.

A primeira atividade desta etapa, Reconstrução da Estruturas, é feita com o

excerto do texto já utilizado previamente, por ser conhecido e compreendido

73

por todos os alunos. As estratégias para se chegar ao objetivo desta atividade

vão variar de acordo com a disponibilidade de materiais e com as habilidades

dos diversos grupos de alunos, o importante é que eles sejam capazes de

manipular a língua contida naquelas frases de forma a reconstruí-las utilizando

os mesmos grupos de palavras e mais, que sejam levados a perceber que o

significado das palavras pode mudar, ou não fazer sentido se postos de outra

maneira.

É importante que o professor tenha o excerto impresso/escrito em caracteres

grandes, para que os alunos do primeiro ciclo recortem os grupos de palavras

assim como foram previamente sublinhados, e possam literalmente manipulá-

los em grupos e discutir como eles se relacionam para recompor o texto. Em

grupos etários mais avançados na pedagogia é aconselhável propor novas

possibilidades de uso para aqueles grupos de palavras.

A aprendizagem da Ortografia também é feita a partir deste mesmo excerto de

texto previamente escolhido. O professor deve selecionar palavras que julgue

serem necessárias para atividades de ortografia. Mais uma vez, a intenção é

que os alunos manipulem as letras, as sílabas e os sons das palavras. Na

sequência do exemplo dado, os alunos continuam com a mesma técnica,

recortam as palavras para dividi-las em estruturas menores (sílabas, sons), as

reconstroem e reescrevem em uma lousa ou caderno. Para os níveis mais altos

de escolaridade pode-se desafiá-los a encontrarem sinónimos, ou outras

estruturas do mesmo género mantendo o significado.

Depois de manipular frases e palavras novas, porém já conhecidas em pelo

menos três contextos diferentes dentro de um mesmo género (Leitura

Detalhada, Construção Coletiva e Reescrita Individual), é imprescindível que os

alunos voltem a colocar as palavras aprendidas (quanto à grafia e fonética) na

frase a que pertenciam, para perceberem que elas pertencem a um grupo

semântico apesar de terem significado próprio, e muitas vezes aprender que,

porventura, o significado de uma palavra pode mudar quando posto de volta ao

contexto de onde foi retirado. Esta fase, nomeadamente Escrita de Frases, é

um momento riquíssimo para que o professor explore a área da semântica em

74

contexto e fora de contexto, e de como os autores em um ou outro género

fazem uso das palavras para produzir significados.

O número de atividades e o tempo que se levará em cada fase e em cada nível

dependerá da necessidade do grupo; e ainda podem ser indicadas outras

atividades para serem feitas em casa, se algum aluno precisar. Ou seja, as

etapas do ciclo podem ser realizadas com inúmeras estratégias (muitas já

utilizadas pelos professores) e de forma coletiva ou individual, dependendo das

necessidades encontradas no processo de ensino e aprendizagem.

Novamente aqui, a forma cíclica de aprendizagem não acontece de maneira

rígida e igual para todas as turmas, disciplinas e textos, a organização da

sequência de atividades, usando os três ciclos de aprendizagem, varia de

acordo com o tempo, o currículo e o nível escolar.

Importante é ressaltar que como ponto de partida sempre está a Preparação

antes da Leitura, tanto para os textos previstos em todo o currículo, como para

os excertos de textos escolhidos para as Leituras Detalhadas.

4.2 Seleção de Textos

Um dos objetivos desta dissertação é tentar nos aproximar da realidade dos

professores portugueses de línguas para prever, como estão habituados a

fazer uso de textos em sala de aulas e também, de quais fontes fazem uso

para selecionar os textos para as aulas, mais adiante na análise dos resultados

da pesquisa faremos referência à seleção de textos novamente. No momento,

utilizaremos as sugestões do programa australiano, sob a ótica da genologia,

com a intenção de simplificar esta tarefa.

Consideramos três critérios para a seleção de textos quando planeia-se aulas

sob esta ótica, são eles: o campo, o género e o modo. Analisa-se o campo do

texto à luz do currículo, para ponderar a sua relevância em relação a este, ao

ser um texto selecionado para a Leitura Detalhada, por exemplo, este deve

conter o conteúdo principal do tópico a ser estudado. Ao mesmo tempo,

75

espera-se que seja um texto interessante e bem escrito, para engajar os alunos

nas atividades

Em segundo lugar, deve-se considerar o género do texto, em uma pedagogia

linguística, como já dito anteriormente, currículo escolar é acompanhado por

um currículo linguístico, sendo assim, o género textual que apresenta o

conteúdo curricular será também ensinado, para que isso ocorra de forma

simples, a seleção de bons modelos de textos do género em questão é

essencial. Vários textos serão usados nas diversas atividades planeadas, e

mesmo aqueles textos que não serão usados como modelo para a escrita nas

etapas acima descritas, servem sempre, de certa forma, como modelos para os

alunos, sendo bons modelos do género podem contribuir significativamente

para a compreensão do género, sua análise e descrição durante as leituras dos

mesmo.

O terceiro critério, não menos importante, é o modo, pois é o que define o nível

da linguagem textual apropriada para cada estágio de aprendizagem, nível

escolar e idade dos alunos. É importante que os textos sejam apropriados ao

nível escolar, mas também, que sejam desafiadores, sugere-se que os textos

trabalhados em sala de aula sejam sempre um nível superior ao nível de leitura

independente da média dos grupos.

De acordo com o programa R2L a avaliação da leitura e escrita tem três

propósitos, são eles: ter acesso ao progresso de aprendizagem dos alunos ao

longo das aulas, e decidir o quanto ainda precisam desenvolver-se para atingir

o nível esperado para determinado nível escolar; criar um relatório de

desenvolvimento para os alunos, pais e para o Estado; e ainda, saber que

recursos e habilidades linguísticas os alunos já possuem, para que se possa

planear o programa de ensino e discutir explicitamente sobre essas habilidades

e recursos com os alunos em sala. (D. Rose, seminário em Estocolmo, 15 de

maio de 2012). Para um professor experiente, não há nada de novo nestas

ideias, o que sugere-se é um modo de avaliação da leitura e escrita.

76

4.3 Avaliação da leitura e escrita

De acordo com o programa R2L a avaliação da leitura e escrita tem três

propósitos, são eles: ter acesso ao progresso de aprendizagem dos alunos ao

longo das aulas, e decidir o quanto ainda precisam desenvolver-se para atingir

o nível esperado para o nível escolar; criar um relatório de desenvolvimento

para os alunos, pais e para o Estado; e ainda, saber que recursos e habilidades

linguísticas os alunos já possuem, para que se possa planear o programa de

ensino e discutir explicitamente sobre essas habilidades e recursos com os

alunos em sala. Para um professor experiente, não há nada de novo nestas

ideias, o que sugere-se é um modo de avaliação da leitura e escrita.

Ao avaliar a leitura considera-se aqui três níveis de compreensão: literal,

inferencial e interpretativo, assim como preocupa-se em ensinar os três níveis

de compreensão simultaneamente. Apesar de saber-se que estes acontecem

em simultâneo em um texto, para que os alunos possam responder a questões

corretamente precisam reconhecer cada nível, e para que isso aconteça

precisam ser guiados passo a passo pelo texto. Analisar os níveis de

compreensão dos textos pode ajudar os professores a planear melhor e de

forma a aprofundar o conhecimento dos alunos cada vez mais.

Guiar os alunos passo a passo em um texto significa ensinar os alunos a

encontrar os significados no texto, em outras palavras, mostrar aos alunos o

que fazer para encontrar as respostas das diversas perguntas de compreensão

de texto.

O significado literal é ensinado desde os primeiros anos e muitas vezes nem

precisa ser ensinado propriamente, pois está escrito nas frases dos textos, uma

vez que a Leitura Detalhada tenha sido feita corretamente, e as Estratégias

Intensivas tenham sanado todas as dúvidas dos alunos, provavelmente,

poucos alunos precisarão de especial atenção na compreensão do significado

literal de um texto e poderão responder às perguntas deste tipo.

77

O significado inferencial, por sua vez, não está explícito no texto como o literal,

e pode estar em outros lugares, outras frases ou palavras, secções do texto, ou

mesmo em ilustrações. Este significado envolve também a aprendizagem de

metáforas, expressões idiomáticas, expressões fixas, parábolas, entre outros

recursos linguísticos usados na escrita dos textos. Para a compreensão destes

recursos os alunos precisam aprender como relacionar o significado literal das

palavras e o significado inferencial, ou seja, o que significa, mas não está

necessariamente expresso em palavras.

O significado interpretativo, por sua vez, está fora do texto, e envolve as

experiências vividas, as atitudes, os conhecimentos prévios sobre o tópico,

tanto da parte do leitor quanto da parte do escritor.

O ensino e a avaliação da compreensão em todos os seus significados são

feitos de forma explícita neste programa. Isso se deve ao fato de acreditar-se

que os alunos precisam ter conhecimento sobre os níveis de compreensão, e

saber o que precisam fazer para responder corretamente às questões.

O ensino da compreensão também foi organizado em três níveis, como se

segue. Primeiro, é preciso considerar os três níveis de compreensão no

momento de planear as aulas de leitura. Sugere-se que o professor comece

com seis questões de compreensão para o texto que irá usar em aula, duas

para cada significado. Durante a leitura, o professor vai usá-las como modelo

de compreensão, ou seja, durante a leitura o professor faz pausas, coloca as

questões planeadas aos alunos, e os guia para encontrar as respostas.

Depois das outras atividades previstas no planeamento, que podem variar

entre leitura e escrita, as questões de compreensão são dadas aos alunos

escritas, como em um teste de compreensão. Neste momento, o professor

ainda está usando este texto e estas perguntas como modelo, portanto, levará

os alunos a encontrarem as respostas no texto, inserindo a metalinguagem

literal, inferencial e interpretativa. Assim todos os alunos terão um modelo

correto e construídos em conjunto. Em outra aula, com outro texto, as

atividades podem ser repetidas, mas desta vez com menos controle da parte

78

do professor, ao invés de levar os alunos às respostas corretas, pode-se

sugerir que trabalhem em grupos e discutam as respostas antes de as

anotarem. Depois que todos os alunos tenham a compreensão necessária dos

diferentes significados e possam responder perguntas de compreensão de

texto independentemente, em um ou outro género a ser trabalhado, é que se

usa os testes de compreensão da escrita como ferramenta avaliativa.

Como mencionado no início desta dissertação, as crianças já possuem

conhecimentos do sistema linguístico ao entrar na escola, portanto, o papel da

escola é tornar esse conhecimentos, e o aprofundamento da aprendizagem

linguística conscientes.

Ao propor este ciclo de realização de tarefas, o programa R2L acredita estar

reforçando o conhecimento consciente das estruturas linguísticas das crianças

enquanto lêem.

Para que o ensino ocorra em via dupla e através de discussões sobre como

funcionam as línguas, usa-se a metalinguagem funcional, que segundo os

próprios autores não vem substituir os nomes tradicionais das partes do

discurso, mas sim, adicionar-se a eles e organizá-los, para que possam ser

usados de forma consciente e explícita. Além disso, o foco desta

metalinguagem não poderia ser outro que senão, o significado, os reais

significados das estruturas de linguagem que encontramos ao ler e utilizamos

ao escrever.

Na sequencia a este capítulo daremos início à apresentação e discussão de

dados recolhidos através das respostas dos professores de língua portugueses

ao questionário proposto.

79

Capítulo II

Apresentação dos dados recolhidos

A operacionalização específica será feita na perspectiva de cada disciplina ou área curricular tendo em conta os saberes, procedimentos, instrumentos e técnicas essenciais de cada área do saber e visando o desenvolvimento pelo aluno destas competências. (Ministério da Educação Português, 2001:18) (competências gerais curriculares).

1. Abordagem de análise dos dados

Este capítulo é dedicado à apresentação dos dados recolhidos para esta

dissertação. Além da apresentação será feita uma breve descrição das ideias

que serão mais profundamente analisadas no terceiro capítulo.

O inquérito por questionário foi respondido por professores de língua

profissionalizados, preferencialmente em exercício, incluindo os professores de

português como língua não-materna, ou qualquer outra língua estrangeira

ensinada aos alunos do ensino básico e secundário em Portugal. Os inquiridos

foram assim selecionados porque a pesquisa bibliográfica está voltada para o

ensino de línguas (materna ou não-materna), mais especificamente, em

relação às metodologias empregadas no uso e ensino de textos e géneros

textuais.

Além disso, considero que novas soluções e propostas em educação, quando

ocorrem dos níveis escolares mais baixos para os mais altos, ao serem levadas

à prática, podem ser avaliadas e melhoradas em processo, para depois serem

ampliadas aos níveis mais altos de escolaridade, possibilitando também a

familiarização dos alunos com novas práticas desde o princípio da

escolarização. Partir da escola básica, e consequentemente a secundária, foi,

portanto, a melhor forma encontrada para iniciar uma pesquisa que ambiciona

contribuir com informações para a melhoria do ensino da língua portuguesa

como um todo, e quiçá servir como referência para o ensino de outras línguas.

80

Para o efeito, analiso o inquérito respondido por professores de língua

(materna ou não) que revela elementos significativos para o estabelecimento

de nexos entre as novas propostas curriculares e a praxis. Destaco aqui, três

competências gerais, pregadas pelo Currículo Nacional, aquelas quais

colaboram para a justificação e análise desta pesquisa:

“(2) Usar adequadamente linguagens das diferentes áreas do saber, científico e tecnológico para se expressar; (3) Usar correctamente a língua portuguesa para comunicar de forma adequada e para estruturar pensamento próprio; (4) Usar línguas estrangeiras para comunicar adequadamente em situações do quotidiano e para apropriação de informação; P”(Ministério da Educação, 2001:15)

Além de basear o trabalho de análise nas referências bibliográficas discutidas

no primeiro capítulo, relacionarei as novas propostas programáticas com as

práticas de ensino apresentadas pela amostra de professores participantes

nesta investigação. Pretendo assim, compreender o modelo de formação de

professores quanto ao ensino das línguas e contribuir com propostas

sustentadas para a (re) construção de um modelo mais adequado de formação

continuada de professores, designadamente, os professores de língua.

Os professores responderam ao questionário anonimamente por meio

eletrónico, através da plataforma ‘Google Docs.’; ou em versão impressa,

ambos os meios ofereceram aos inquiridos total privacidade, assim como,

forneceram ao investigador as ferramentas necessárias para uma análise mais

transparente dos dados. Cerca de dez professores colaboraram ao responder o

questionário, ainda em fase de elaboração (pré-teste), para a construção de um

questionário com questões claras, fáceis de serem compreendidas e

rapidamente respondidas.

Fazer chegar o questionário aos professores não foi uma tarefa fácil, mas com

a colaboração de colegas ligados ao ILTEC6, professores portugueses do

6ILTEC: Instituto de Linguística Teórica e Computacional.

81

ensino básico e secundário, e alguns centros de formação de professores

conseguimos atingir o número significativo de 160 respostas.

O questionário teve por objetivo principal indagar sobre o modo como o

conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no ensino

básico e secundário, incluindo o ensino de português língua não materna.

As primeiras questões são dedicadas à apresentação dos inquiridos, mesmo

que anónimo, o questionário foi montado de forma a oferecer informações

sobre o contexto de ensino, os ciclos nos quais realizam suas atividades, assim

como, o ano de formação aproximado dos inquiridos.

As seguintes questões estão propriamente focadas no planeamento e na

prática de sala de aula, ou seja, em como os professores usam os recursos

que possuem para ensinar língua aos alunos portugueses nos diferentes níveis

de ensino. Tendo como horizonte uma hierarquia de pensamento cujo vértice é

ocupado pela voz dos docentes ao expressarem suas opiniões e a respectiva

praxis.

2. Apresentação dos resultados do inquérito

A seguir apresentarei as respostas dos inquiridos, através de gráficos e

comentários, que serão brevemente analisadas nesta secção. Mais adiante os

dados aqui apresentados serão analisados tendo em conta as novas propostas

programáticas e às pretensões da autora em contribuir para a melhoria do

ensino de línguas, em especial, a língua portuguesa sob a luz das teorias

estudadas, nomeadamente, a abordagem baseada em Género, que tem como

referência a Teoria de Registo e do Género e a Linguística Sistémico-

Funcional.

2.1 Perfil dos inquiridos

Os gráficos 1, 2 e 3 mostram o perfil dos inquiridos, respectivamente quanto ao

contexto de ensino no qual atuam, quanto aos ciclos de estudos com os quais

trabalham e por fim, quanto aos anos de profissionalização.

82

Sabe-se que muitos professores de línguas costumam trabalhar em mais de

um contexto de ensino ao mesmo tempo, por exemplo, professores de

português como língua materna (doravante PLM), podem perfeitamente serem

professores de português como língua não-materna (doravante PLNM) ao

mesmo tempo. Da mesma forma que podem atuar em diferentes ciclos em um

mesmo ano letivo. Sendo assim, os inquiridos puderam assinalar mais de uma

opção quanto ao contexto de ensino e aos ciclos de estudos portugueses,

consequentemente, a percentagem dos dois primeiros gráficos apresentados

pode somar mais do que 100%. Este fato se repetir-se-á ao longo do

questionário, para todas as perguntas de escolha múltipla, cujas respostas,

possam conter mais de uma alternativa assinalada.

2.1.1 Ordenação por contexto de ensino

Uma primeira arrumação dos inquiridos que importa apreciar é feita a partir do

contexto de ensino em que os inquiridos desenvolvem a sua atividade.

Gráfico 1: Perfil dos inquiridos: Ordenação por contexto de ensino

Dentro da amostra, os professores de PLM representam a maioria (74%),

seguidos por professores de PLNM (39% dos inquiridos), e por professores de

outras línguas estrangeiras (doravante LE), que representam 31% da amostra.

Por fim, temos os professores de português como língua estrangeira

(doravante PLE), representando 19% dos inquiridos. Este últimos podem

também atuar em centros de ensino de línguas e explicações, não

118

50

30

62

74%

31%

19%

39%

PLM

LE

PLE

PLNM

Ordenação por contexto de ensino

Série2 Série1

83

necessariamente em escolas regulares, esta percentagem minoritária pode

significar que os professores de PLE em Portugal atendem a uma pequena

parcela de crianças e jovens em idade de escolarização básica e secundária,

ou também, que este último grupo de professores esteja à margem da

formação continuada de professores e do contato com outros professores e

instituições de formação, tendo menores oportunidades de responder ao

questionário.

2.1.2 Ordenação por ciclo de estudos

A segunda arrumação considerada para enquadrar os inquiridos é feita a partir

dos ciclos de estudos dos alunos portugueses.

Gráfico 2: Perfil dos inquiridos: Ordenação por ciclo de estudos.

A maioria dos inquiridos trabalha no terceiro ciclo (41% dos inquiridos) e no

ensino secundário (40%). Temos alguma representação do segundo ciclo (13%

da amostra) e pouca representatividade do primeiro ciclo, apenas 7% dos

inquiridos. É relevante ressaltar que grande parte dos professores que trabalha

com alunos do secundário, também trabalha com alunos do terceiro ciclo.

14

28

86

84

9%

18%

54%

53%

ciclo 1

ciclo 2

ciclo 3

secundário

Ordenação por ciclo de estudos

Série2 Série1

84

2.1.3 Ordenação por tempo de ensino

A última questão feita para a arrumação do perfil da presente amostra aprecia

o tempo de profissionalização dos inquiridos para exercer o ofício, ou seja,

quando qualificaram-se para dar aulas de línguas para alunos do ensino básico

e/ou secundário português. Esta ordenação é muito relevante ao ter em

consideração as últimas mudanças legislativas e/ou de referências para a

educação portuguesa e europeia, no sentido de verificar se o tempo de

profissionalização representa alguma diferença na opinião dos professores.

Gráfico 3: Perfil dos inquiridos: Ordenação por tempo de ensino

Os números mostram que 64% dos inquiridos se profissionalizaram há mais de

quinze anos, uma considerável diferença em relação aos restantes, divididos

entre 15% de professores formados de dez a quinze anos atrás, 12% formados

entre cinco e dez anos de e 9% a cinco anos ou menos.

2.2 A voz dos inquiridos: práxis e opiniões

Nesta secção apresento as repostas que trazem à luz a práxis realizada nas

salas de aula portuguesas, o que revela por um lado, parte7 da formação dos

7 Uso a palavra parte porque a formação de um professor não se limita à formação linguística.

14

18

22

106

9%

12%

15%

64%

5 anos ou menos

entre 5 e 10 anos

entre 10 e 15 anos

mais de 15 anos

Ordenação por tempo de ensino

Série2 Série1

85

professores, e por outro, abre os caminhos para futuras propostas de formação

continuada, no que concerne ao ensino de línguas.

2.2.1 Opinião dos inquiridos quanto a autoria do ensino de línguas

em Portugal

A primeira questão revela a opinião dos professores de línguas sobre a

responsabilidade da autoria do ensino das línguas. Pergunto-lhes se

consideram que o ensino de línguas, seja materna ou não materna, deve ser

da única responsabilidade dos professores de línguas ou não. Logo após

responderem sim ou não, os inquiridos são levados a justificarem a sua

escolha.

As respostas afirmativas (SIM) somam 30 e as negativas (NÃO) 130. Isso quer

dizer que apenas 19% dos inquiridos acreditam ser os professores de línguas,

os únicos responsáveis pela autoria do ensino das línguas, enquanto 81% dos

inquiridos acreditam que a responsabilidade pelo ensino das línguas possa ser

repartida entre todos os professores envolvidos no processo de ensino e

aprendizagem dos alunos.

Gráfico 4: Opinião quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal.

No que concerne aos estudos apresentados no primeiro capítulo, e a intenção

de capacitar a todos os professores para o ensino das línguas nas

especificidades de cada disciplina, esta é uma avaliação muito positiva.

Hipoteticamente, a maioria dos professores de línguas mostra-se disposto a

dividir conhecimentos e responsabilidades.

1; 81%

2; 19%

Opinião quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal

86

O quadro 1 (apêndice II) contém as justificativas dadas pelos inquiridos em

relação a esta resposta, nomeadamente quais os responsáveis pela autoria do

ensino das línguas e seus porquês. Note que ambas as respostas eram

obrigatórias. As respostas SIM/NÃO da quarta coluna explicam-se: SIM,

considero as aulas de língua, as únicas responsáveis pela aprendizagem do

conteúdo programático da disciplina e NÃO, considero que todos os

professores sejam responsáveis pelo ensino da língua, independentemente da

disciplina que ensinem. Para facilitar o trabalho de análise, as justificativas

foram agrupadas; primeiramente, todas as respostas afirmativas ‘SIM’ e

posteriormente, as negativas ‘NÃO’. Em negrito, no quadro 1, encontram-se as

frases consideradas mais relevantes para futura análise entre as diversas

respostas.

2.2.2 Projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos

Após descobrir a opinião dos inquiridos quanto à autoria do ensino das línguas

importa verificar quantas vezes por ano os inquiridos desenvolvem projetos

com colegas de outras disciplinas, tendo em vista a formação linguística dos

alunos. A pergunta foi assim elaborada para que os projetos com foco cultural,

de cidadania, entre outros, muito comuns e igualmente importantes, mas que

não contenham ao menos um objetivo linguístico, fossem desconsiderados

pelos inquiridos. Os resultados estão expostos no gráfico a seguir.

Gráfico 5: Envolvimento em projetos interdisciplinares.8

8 Duas das respostas não foram consideradas por não conter o conteúdo numérico solicitado.

64

54

20

18

4

40%

34%

13%

11%

3%

nunca

1 a 2

três (1 por período)

mais do que 4

respostas anuladas

Envolvimento em projetos interdisciplinares

Série2 Série1

87

Em linhas gerais, a maioria dos inquiridos (74%) não realiza projetos em

comum com outras disciplinas tendo em vista objetivos de ensino das línguas,

ou então, realiza apenas de um a dois projetos interdisciplinares por ano letivo.

Dado que 81% dos professores acredita que o ensino das línguas possa ser

partilhado entre todos os professores, como foi constatado, essas informações

me parecem um tanto adversas e serão analisadas no capítulo III.

Outros 20 inquiridos (13% da amostra) realizam projetos interdisciplinares

tendo objetivos linguísticos três vezes ao ano. Assim como, 11% dos inquiridos

que realizam tais projetos com maior frequência. Somando-os, cerca de 24%

dos inquiridos realizam projetos interdisciplinares com algum foco no ensino

das línguas.

2.2.3 Opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada

aos docentes de outras especialidades

A próxima questão indaga os professores de língua suas opiniões, de acordo

com experiências profissionais individuais, até que ponto os professores de

história, geografia, ciências naturais, matemática, artes, química, entre outras

disciplinas curriculares estão aptos a contribuir para a formação dos alunos em

língua materna ou não-materna. Três opções de respostas eram possíveis e

encontram-se representadas no gráfico 6.

88

Gráfico 6: opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada aos docentes de outras especialidades.

O gráfico parece animador, considerando que a maioria dos professores de

línguas (60%) vê a possibilidade de obter contribuições dos docentes de outras

disciplinas na formação linguística de seus alunos, enquanto apenas 6% dos

professores não crêem nesta possibilidade. Ressalto que 34% dos inquiridos

mostram-se preocupados com a necessidade de formação complementar, via

norteadora desta pesquisa.

O quadro 2 combina as duas respostas para facilitar futura análise dos dados,

contendo informações sobre a opinião quanto à autoria do ensino de línguas

em Portugal, representada no gráfico 4; e quanto ao grau de interferência

creditada aos professores de outras especialidades sobre esta questão. O

quadro foi dividido de acordo com as respostas SIM e NÃO respectivamente,

para facilitar a posterior análise.

2.2.4 Fontes utilizadas pelos inquiridos na seleção de textos escritos e

orais

Depois de obter dados sobre a opinião dos professores, as duas questões que

seguem fornecem informações sobre as fontes utilizadas pelos inquiridos para

a seleção dos textos escritos e orais que utilizam em sala de aula e

consecutivamente, as finalidades pretendidas para o uso de tais textos. O

96

10

54

60%

6%

34%

SIM, SÃO CAPAZES DE CONTRIBUIR

NÃO SÃO CAPAZES DE CONTRIBUIR

SERIAM CAPAZES SE TIVESSEM

FORMAÇÃO COMPLEMENTAR

Grau de interferência creditada aos

docentes de outras especialidades.

Série2 Série1

89

quadro 3 (apêndice IV) traz estes dados, apresentados quanto às diferentes

categorias de tempo de profissionalização, o que será útil para a análise

posterior. Neste momento, apenas apresento os dados gerais.

Dos 160 inquiridos, apenas quatro responderam somente fazer uso de textos

escritos e orais trazidos nos manuais escolares adotados. Todos os outros

professores, eventualmente, obtêm, em outras fontes, textos escritos e orais

que possam ser utilizados em sua prática docente. Ao buscarem modelos de

textos em outras fontes, os inquiridos demonstram que, conscientemente ou

não, há necessidade de fornecer aos alunos vários modelos dos tipos de textos

(géneros) trabalhados.

Independentemente dos objetivos, considero uma prática valiosa para esta

investigação. O hábito de pesquisar textos facilitará muito o trabalho dos

próprios professores ao serem levados a trabalhar com os diversos géneros

textuais através de uma pedagogia linguística.

2.2.4.1 Finalidades da obtenção de textos de diversas fontes

O gráfico 7 mostra as principais finalidades dos inquiridos ao selecionar textos

de outras fontes, que não os manuais escolares adotados pelas instituições de

ensino em que trabalham. Foram criadas opções de respostas a partir dos

objetivos curriculares portugueses e com base nos programas atuais, para que

a análise que realizarei frente aos mesmos seja coerente e o mais próximo da

realidade, quando analisadas. Vale ainda ressaltar que, mais uma vez, os

inquiridos puderam assinalar mais de uma resposta, e neste caso, podiam

também incluir uma resposta pessoal na alternativa ‘outro’. O Programa de

Português do Ensino Básico (doravante LPEB) ao referir-se à questão da

seleção dos textos coloca já para o primeiro ciclo:

“Salienta-se que, mesmo na fase inicial de aprendizagem da leitura, deve haver uma preocupação muito grande em seleccionar textos de autor, com qualidade, mesmo que isso signifique que há palavras que as crianças ainda não conseguem ler. Nas obras traduzidas, a qualidade da tradução deve ser igualmente um componente a considerar.” (Ministério da Educação, 2008:75)

90

Gráfico 7: Finalidades de seleção de textos fora dos manuais escolares.

A. Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.

B. Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto

trabalhados.

C. Para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

D. Para usar em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

E. Para desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

F. Para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em

questão.

G. Outro.

A resposta mais popular entre os inquiridos foi a primeira, 88% dos inquiridos

buscam textos de outras fontes para que seus alunos tenham mais material de

leitura em relação ao conteúdo que está a ser abordado.

A segunda finalidade mais assinalada por 120 inquiridos (75% da amostra),

relaciona-se ao estudo da gramática, os professores precisam recorrer a textos

extras para construir mais exercícios de ortografia, sintaxe, vocabulário e

outros. Este resultado era esperado, uma vez que estas práticas são comuns e

usadas há muito tempo dentro do ambiente escolar, considerando a maioria de

inquiridos profissionalizados há mais de 15 anos.

140

108

109

120

88

74

3

88%

68%

68%

75%

55%

46%

2%

A

B

C

D

E

F

G

Seleção de textos: finalidades

Série2 Série1

91

Muitos deles, 68% dos inquiridos, fazem uso de tais textos para a reflexão

sobre a estrutura textual e os usam como material de leitura para formação de

modelos autênticos e atuais dos tipos de textos trabalhados. Considero este

um número significativo na obtenção de melhores resultados de aprendizagem

da literacia em Portugal, pois tanto o exercício da reflexão sobre as estruturas,

quanto o uso de modelos autênticos nas salas de aula são etapas

fundamentais para a melhor formação linguística dos professores.

Outros 88 inquiridos (55%) usam textos de outras fontes para desvendar os

propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado. Apesar de não saber como

esta estratégia é levada a cabo, podemos afirmar que existe entre muitos

professores portugueses a preocupação e intenção de ensinar que os textos,

sempre são escritos com algum propósito social, mesmo que seja uma simples

nota sobre uma ligação telefónica. Outra importante característica constatada

para o objetivo desta dissertação.

Apesar de ser a finalidade menos assinalada, 74 inquiridos, que representam

quase metade da amostra (46%), responderam que fazem uso de textos extras

para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

Este dado é animador considerando que mesmo que os manuais que a escola

adote ainda tragam textos adaptados ou estejam desatualizados, o que é

comum acontecer, dependendo do nível socioeconómico da escola ou região,

boa parte dos professores da amostra fazem uso de materiais autênticos para

o ensino das línguas.

Outras teorizações sobre o ensino de géneros textuais também trabalham com

a desconstrução e análise de textos, o que pode também favorecer a

implantação de novas teorias linguísticas na educação portuguesa.

Por fim, há que considerar as três respostas dadas por inquiridos na opção

‘outros’, transcritas a seguir: “Para reescrever criativamente, resumir, sintetizar,

esquematizar, parafrasear e outras transformações de texto (de narrativo para

dramático) ”; “Para alargar horizontes culturais.”; “Fomentar o gosto pela leitura e

escrita.”

92

Os 2 últimos citaram questões importantes, mas que não são tratadas

especificamente nesta dissertação, as questões culturais e o gosto pela leitura,

ambas atuais e necessárias. A primeira entretanto, usa técnicas muito ligadas à

linha de pesquisa aqui apresentada como a reescrita, o parafrasear e o uso,

mesmo que inconsciente de géneros textuais “P de narrativo para dramático.”

2.2.5 A escrita de textos individuais

Duas questões foram levantadas acerca da escrita individual, ou textos escritos

por cada um dos alunos, sem a colaboração de outros colegas ou do professor.

Ambas apresentadas no quadro 4 (apêndice V), mais uma vez organizado pelo

tempo de profissionalização dos inquiridos.

A primeira pergunta pedia um número aproximado de quantos textos

individuais os alunos escreviam por ano letivo. Cinco destas respostas foram

desconsideradas por não divulgarem um número aproximado.

De forma abrangente, temos alunos que escrevem de 3 a 36 textos individuais

por ano letivo, demonstrando uma grande disparidade. Mais adiante tentarei

analisar e tirar conclusões para tal diferença. Agora chamo atenção para os 40

inquiridos (25%) cujos alunos escrevem cerca de 10 textos individuais e

representam a maioria das respostas. Em seguida, apresentam-se 27

inquiridos (17%) cujos alunos escrevem 6 textos por ano letivo, o que pode

significar a escrita de 2 textos por cada período; e ainda 2 grupos

representados por 12 inquiridos, cujos alunos escrevem 5 ou 20 textos por ano

letivo. Há os que escrevem 12 textos por ano, 10% da amostra, e também

podem escrever três textos por período, dependendo da organização escolar, o

que pode ser um número razoável, devido à grande extensão dos programas,

segundo os próprios inquiridos mencionaram em algumas justificativas vistas

no quadro 1 quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal.

93

Gráfico 8: Número de textos individuais escritos por ano letivo segundo os inquiridos.

Há que considerar, ainda, os poucos (cerca de 5%) que escrevem de 3 a 4

textos por ano letivo, o que considero uma produção muito baixa para a escola

básica e secundária. Em via contrária, não podem ser esquecidos os poucos,

mas significativos para este trabalho, que escrevem 18 ou 36 textos por ano, o

que demonstra que estes alunos, 1% e 3% respectivamente, apesar de não

terem muita representação na amostra, devem escrever respectivamente 6

textos por período e um texto a cada quinzena, números mais interessantes

dependendo do ciclo de estudos, uma vez que o ano letivo em Portugal é

dividido em três períodos.

Há ainda um dado que me soa demasiado, principalmente, ao considerar os

níveis mais baixos de escolaridade: alunos que produzem um texto em todas

as aulas. Mais adiante, cuidarei de analisar melhor esta curiosidade.

9

8

12

27

10

6

40

16

6

2

12

4

5

3

6%

5%

8%

17%

6%

4%

25%

10%

4%

1%

8%

3%

3%

2%

3 textos

4 textos

5 textos

6 textos

8 textos

9 textos

10 textos

12 textos

15 textos

18 textos

20 textos

36 textos

anulados

1Xaula

Número de textos individuais escritos

por ano letivo

Série2 Série1

94

2.2.5.1 Atividades de pré-escrita

A segunda questão, relacionada a escrita de textos individuais, questiona quais

as atividades de preparação para a escrita dos textos, mais utilizadas pelos

inquiridos. Foram fornecidas nove alternativas para serem assinaladas, e uma

denominada: ‘outro’ para atividades não sugeridas. Os inquiridos puderam

assinalar tantas quantas utilizassem. As alternativas foram construídas a partir

das práticas mais comuns e também, visando a análise da práxis frente às

teorias estudadas.

O gráfico 9 expõe as atividades mais frequentes, em correspondência com as

letras A – J aqui descritas:

A. Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,

relatório...)

B. Determino o tema e/ou título do texto, mas não específico o tipo de texto

C. Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas, deixo o

tema à escolha dos alunos

D. Analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido

E. Forneço informações sobre o tema sugerido

F. Forneço informações sobre o tema sugerido

G. Peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido

H. Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual) devem

ser escritos os diversos tipos de texto

I. Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais de

um certo tipo de texto

J. Outro

O gráfico revela 132 inquiridos (83%) que determinam o tema e/ou título do

texto + o tipo de texto, não permitindo ao aluno usar da sua criatividade para a

escolha de um tema na produção dos textos trabalhados; 116 inquiridos (73%)

afirmam fornecer informações sobre o tema sugerido, assim se estes últimos

assinalaram também a primeira alternativa, podemos concluir que trabalha-se

muito com atividades dirigidas para a construção de textos bem específicos, e

95

que se valoriza a necessidade de prover conhecimento sobre o conteúdo a ser

escrito.

Gráfico 9: Atividades mais comuns realizadas pelos inquiridos antes da escrita de textos.

Outro dado significativo vem dos 104 inquiridos (65%) que afirmam escrever

textos colectivos para ensinar como devem ser escritos os diversos tipos de

texto (estrutura textual), o mesmo número de inquiridos fornece informações

sobre o tema sugerido. Um número muito próximo a este, de 102 inquiridos

(64%) afirma analisar e desconstruir um modelo do tipo de texto trabalhado.

Considero as três práticas de imenso valor na obtenção de melhores resultados

nacionais para o processo de ensino e aprendizagem das línguas.

Quanto à opção, ‘determino o tipo de texto a ser escrito mas, deixo o tema à

escolha dos alunos’, assinalada por 72 inquiridos (45%) demonstra que alguns

inquiridos têm maior preocupação com a forma do que com o conteúdo,

saberemos adiante se esta visão está misturada entre as categorias de

ordenação do perfil.

Cerca de 5% dos inquiridos afirmam utilizar três práticas: determinar o tema

e/ou título do texto, sem especificar o tipo de texto; pedir aos alunos que

132

40

72

102

104

116

38

104

42

16

83%

25%

45%

64%

65%

73%

24%

65%

26%

10%

A

B

C

D

E

F

G

H

I

J

Atividades de pré-escrita

Série2 Série1

96

pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido; escrever textos colectivos

para ensinar quais os propósitos sociais de um certo tipo de texto. Tais práticas

podem revelar avanços no caminho à excelência em ensino de línguas,

promovidas, também, por influência de outras linhas de pesquisas anteriores à

pedagogia linguística, as quais já mencionei no primeiro capítulo.

Há ainda 16 inquiridos, que representam apenas 2% da amostra, os quais

sugeriram outras alternativas que serão discutidas no terceiro capítulo.

2.2.6 Escrita de textos coletivos e grau de intervenção do professor

Interessa aqui apreciar a média de textos coletivos escritos por alunos

portugueses em um ano letivo; e ainda que tipos de estratégias de intervenção

são mais comuns entre o professorado português ao realizar tal tarefa.

O gráfico 10 revela que a maioria dos professores portugueses (26%) escreve

textos coletivos com seus alunos três vezes por ano letivo, imagino que este

número reflita que seja escrito um texto coletivo por cada período. Logo a

seguir cerca de 15% dos inquiridos representam dois números muito distintos

de produção: 15% dizem não promover a escrita coletiva; outros 15% dizem

que seus alunos escrevem 2 textos coletivos por ano.

Depois ainda temos alguma representatividade de inquiridos (cerca de 10%)

que promovem a escrita coletiva, uma, quatro ou dez vezes ao ano; e por fim

os menos representativos promovem os textos coletivos cinco, seis ou oito

vezes ao ano, respectivamente, 6%, 8%, 3% dos inquiridos.

O dado mais geral é coerente, já que um texto por período pode fazer sentido

dependendo do nível de estudos que representam, e do tipo de texto a ser

trabalhado. Os outros números propostos não me parecem, no momento,

coerentes a nenhuma linha teórica, o que pode se relacionar a muitas variantes

do ensino. Deixo portanto, deixo a discussão mais aprofundada desses dados

para o próximo capítulo.

97

Gráfico 10: Média de textos coletivos escritos por alunos portugueses em um ano letivo

2.2.6.1 Estratégias de intervenção mais comuns durante a escrita de textos coletivos

O gráfico 11 revela os tipos de estratégia mais comuns utilizados pelos

inquiridos na forma de intervenção durante a escrita de textos coletivos. Foram

fornecidas três alternativas de resposta, aquelas que acredito serem mais

comuns ao trabalhar-se textos coletivos com um ou vários grupos.

Esta questão não era de resposta obrigatória, uma vez que se os inquiridos

podem não utilizar textos coletivos em suas aulas, por outro lado, a questão

permitia assinalar mais de uma alternativa.

Como previsto os 26 inquiridos que afirmaram não utilizar textos coletivos para

o ensino de línguas nas suas aulas, consequentemente, não responderam a

esta questão. Estes dados podem ser verificados no quadro 5 que contém o

número de textos coletivos escritos por ano letivo e as respectivas respostas

quanto às estratégias de intervenção.

26

14

22

42

16

10

12

4

14

16%

9%

14%

26%

10%

6%

8%

3%

9%

nenhum texto coletivo

1 texto coletivo

2 textos coletivos

3 textos coletivos

4 textos coletivos

5 textos coletivos

6 textos coletivos

8 textos coletivos

10 textos coletivos

Escrita de textos coletivos

Série4 Série3 Série2 Série1

98

Os outros inquiridos dividem-se em 34% de professores que usam, mais

frequentemente, a estratégia de guiar toda a turma na construção de um só

texto coletivo, em percentagem muito próxima, 32% dos inquiridos costumam

pedir a grupos de alunos que construam os textos coletivos e os monitoriza,

auxiliando na construção do tipo de texto pedido.

Gráfico 11: Texto coletivo: estratégias de intervenção.

Outros 24% pedem a grupos de alunos que construam um texto coletivo,

apenas colocando-se à disposição para tirar eventuais dúvidas, o que parece

um número ainda muito elevado, dada a complexidade conhecida do ensino

das línguas atualmente.

2.2.7 A prática de textos orais e as dificuldades apresentadas pelos

alunos portugueses.

Textos escritos e textos orais têm o mesmo peso e medida no ensino das

línguas se se adotar uma qualquer das abordagens de ensino

36% 53% 49% 15%

58

84 78

24

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

Pede a grupos que

construam um textoe se coloca à

disposição para tirar

eventuais dúvidas;

Guia toda a turma na

construção de um sótexto

Pede a grupos que os

construam emonitoriza os grupos,

auxiliando na

construção do tipo de

texto pedido.

Não responderam

Texto coletivo: estratégias de intervenção

Série1 Série2 Série3 Série4 Série5 Série6 Série7

Série8 Série9 Série10 Série11 Série13 Série12

99

contemporaneamente dominantes, designadamente as de base genológica.

Perguntei, portanto, aos inquiridos quais textos orais seus alunos praticam em

aula. Consequentemente, os indaguei sobre as diversas dificuldades

apresentadas pelos alunos na produção destes textos, já que sabemos que

estes, ainda não representam géneros escolares privilegiados, apesar de

aparecerem no Currículo Nacional, diretrizes para as competências do modo

oral no ensino da língua portuguesa (2001:32) e também, através das diretrizes

para a comunicação, expressas repetidamente na parte dedicada ao ensino

das línguas estrangeiras (2001:38-54).

A primeira pergunta continha algumas opções, aquelas quais julguei mais

comuns entre as possíveis respostas, todavia, para não limitar as respostas

dos professores, estes poderiam escrever outros tipos de texto oral praticado

por seus alunos em sala de aula no campo ‘outro’. A resposta a esta questão

era obrigatória e os inquiridos podiam assinalar mais de uma resposta. Segue-

se o conjunto de alternativas postas tal como no inquérito: Diálogos em

diversas situações da vida quotidiana; entrevistas; discurso; debate;

apresentação de pesquisa; seminários sobre conteúdo específico;

dramatizações e outro.

Gráfico 12: A prática de textos falados em sala de aula.

125

82

56

114

136

26

104

8

78%

51%

35%

71%

85%

16%

65%

5%

Diálogos

Entrevistas

Discurso

Debate

Apresentação

Seminários

Dramatizações

Outro

Textos orais praticados na sala de aula

Série2 Série1

100

O gráfico 12 expõe os dados assinalados pelos professores, revelando maior

preferência pela forma oral de apresentação de pesquisa, 85% dos inquiridos;

seguida pelos diálogos, muito comuns em aulas de LE e PLE, 78% dos

inquiridos; e pela promoção de debates, 71%.

Considero as 104 respostas (65%) de inquiridos que praticam o texto dramático

em aula muito significativas, não só pelo riquíssimo género textual que

representa, mas por revelar que o ensino das artes também modificou-se na

escola, no decorrer do tempo, esta é uma mudança cujos louros pertencem em

grande escala às linhas educacionais psicológicas.

Menos representativos, mas não menos importantes, aparecem

consecutivamente os seguintes géneros: entrevista (13%); discurso (9%) e

seminários sobre conteúdos (4%). Ressalvo que este último costumava ser um

dos únicos géneros orais praticados na escola antes da rutura com as teorias

da pedagogia tradicional, o que pode explicar o baixo interesse por tal género

na atualidade.

2.2.7.1 Dificuldades mais comuns na produção do texto oral.

Exponho agora as dificuldades mais comuns, entre os alunos portugueses, na

produção dos textos que os inquiridos afirmaram praticar com os mesmos na

secção anterior, segundo os seus professores. Nesta segunda questão, sobre

os textos orais, perguntei quais as dificuldades que os alunos apresentam na

produção de tais textos, a resposta apesar de aberta, era obrigatória.

O quadro 6 (apêndice VII) contém os tipos de textos orais mais praticados e as

respectivas respostas quanto às dificuldades apresentadas. As dificuldades

agrupadas de A a J para a feitura do gráfico 13 foram retiradas da interpretação

das respostas mais recorrentes, que podem ser facilmente identificadas através

das diferentes cores na última coluna. Assim como a coluna dedicada aos tipos

de textos, também foi marcada por diferentes cores para facilitar a visualização

das respostas de cada inquirido, por sua vez, agrupados por tempo de

profissionalização.

101

O gráfico 13 quantifica as dificuldades mais comuns agrupadas da seguinte

maneira:

A. Vocabulário pobre ou inadequado

B. Incorreção gramatical / dificuldades sintáticas

C. Dificuldades com ortografia, pontuação e acentuação

D. Dificuldades de pronúncia ou fluência

E. Dificuldades quanto ao tema ou quanto ao conteúdo e falta de

criatividade

F. Interferência linguística (entre línguas maternas e não-maternas)

G. Desenvolvimento estrutural do texto, coerência de discurso,

argumentação critica, sistematização das ideias, coesão e coerência

H. Compreensão dos modelos, géneros textuais e das tarefas

I. Desenvoltura e postura na prática oral.

J. Planificação e uso de suporte escrito

Gráfico 13: Apresentação das dificuldades mais comuns na produção do texto oral. Observamos que 51% inquiridos mencionam que seus alunos têm dificuldades

ao estruturar os textos orais, assim como com a coerência do discurso, a

56

44

30

12

16

6

82

26

46

16

35%

28%

19%

8%

10%

4%

51%

16%

29%

10%

A

B

C

D

E

F

G

H

I

J

Dificuldades mais comuns na produção de textos orais

Série2 Série1

102

capacidade de argumentar criticamente, e de sistematizar as ideias, outros

mencionam ainda falta de coesão e coerência.

Outro número alto, 35% dos inquiridos apresenta dificuldades relacionadas às

escolhas de vocabulário nas produções orais. A seguir, temos uma média de

30% dos inquiridos que comentam dificuldades quanto à correção gramatical e

sintática, assim como, dificuldades quanto à postura e desenvoltura ao

expressarem-se oralmente.

Inquiridos que representam por volta de 20% da amostra comentam sobre

dificuldades acerca de ortografia, pontuação e acentuação que serão mais bem

exploradas no próximo capítulo.

Outros 16% comentam dificuldades em relação à compreensão dos modelos

de textos fornecidos previamente, ou do género em questão, e até mesmo falta

de compreensão das tarefas e dos enunciados propostos. Esta questão tem

especial relevância numa dissertação que trata da formação docente. O baixo

número de comentários deste tipo pode ser positivo ou não.

Entre as dificuldades apresentadas menos citadas (cerca de 10%) estão: as

relacionadas com a pronúncia ou fluência, características essenciais dos textos

falados, mas mais comumente avaliadas em aulas de LE ou PLE que não

representam a maior parte desta amostra; as dificuldades quanto à escolha ou

desenvolvimento do tema ou conteúdo, assim como a falta de criatividade.

Espanta-me imaginar que crianças e jovens não tenham criatividade, portanto,

uni estas características no mesmo grupo por acreditar que a falta de

criatividade ou imaginação citadas esteja relacionada, justamente, com as

estratégias de ensino dos temas e/ou conteúdos escolares; e ainda,

dificuldades quanto à planificação e o uso de suporte escrito, ambas

características presentes na produção do texto oral.

A dificuldade comentada pelo menor número de inquiridos refere-se às

interferências linguísticas, os quais creio que sejam provenientes de inquiridos

103

que ensinem PLE, LE ou PLNM, o que será mais largamente analisado no

terceiro capítulo.

2.2.8 Planeamento textual: a seleção de textos para o ensino da escrita

A última etapa do questionário centra-se na seleção de textos, pretendendo

saber quais as fontes de informações mais comuns usadas pelos inquiridos na

seleção dos temas abordados e na seleção dos tipos de textos (narrativas,

artigos, relatos, discursos, debates, etc.) a serem ensinados, na fase do

planeamento das aulas.

Tais questões são de múltipla escolha e foram organizadas com o objetivo de

descobrir se os professores portugueses se prendem apenas aos manuais

escolares; se conhecem e usam os documentos oficiais europeus e

portugueses; e também, se fazem uso de recursos do quotidiano que estejam

próximos da realidade dos alunos. Entre as alternativas estavam os manuais

escolares, a Internet, o Currículo Nacional do Ensino Básico 2001, o Programa

de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008, o Plano Nacional de

Leitura (1 e 2 ciclos), o Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino

das línguas, e ainda havia a possibilidade de preencher o campo ‘outros’, como

alternativa. Estas respostas estão organizadas no quadro 7 (apêndice VIII), por

sua vez, dividido por ciclos de ensino para futura análise.

A primeira questão sobre a seleção de textos inquiriu sobre as fontes de

informação usadas para a seleção dos temas abordados na escola, ao planear

aulas que envolvem a escrita ou preparação para a escrita de textos. Os

resultados obtidos estão apresentados no gráfico 14.

104

Gráfico 14: Fontes usadas na seleção de textos quanto ao tema.

Os dados da pesquisa mostram que 94% dos inquiridos usam os manuais

escolares como referência para a escolha dos temas a serem trabalhados.

Julgo uma atitude normal e razoável, afinal, os autores dos manuais devem

apoiar-se no currículo e programas nacionais. Nota-se que 71% dos inquiridos

também faz uso da Internet para os apoiarem na escolha dos temas, creio que

muitas vezes este recurso é usado para tratar de assuntos momentâneos que

nenhum manual escolar á capaz de conter, ou ainda para tratar de assuntos

atualizados relacionados ao tema principal da unidade ou aula.

As outras fontes selecionadas apresentam-se na seguinte ordem: 44% usam o

QECR; 35% o Plano Nacional de Leitura (1º/2º ciclos); 29% o Programa de

Português do Ensino Básico (2008); e 21% o Currículo Nacional do Ensino

Básico (2001).

O Currículo Nacional não é popular entre os professores de línguas para a

seleção de temas, porque não contém sugestões de temáticas para nenhum

150

114

34

46

56

70

24

94%

71%

21%

29%

35%

44%

15%

Manuais escolares

Internet

Currículo Nacional do Ensino Básico

Programa de Português do Ensino Básico

Plano Nacional de Leitura (ciclos 1/2)

Q.E.C.R. para o ensino das línguas

Outros

Fontes para seleção de temas

Série7 Série6 Série5 Série4 Série3 Série2 Série1

105

nível de ensino. De certa forma, ao serem interpretadas, tanto a parte dedicada

à língua portuguesa, quanto a parte das línguas estrangeiras direcionam o

planeamento, através de diretrizes traçadas, para a seleção dos tipos de

textos.

Outros textos foram citados como fontes para a seleção de temas, como livros,

revistas, outros programas, planificações, entre outros, que serão melhor

explorados na análise de dados.

A outra questão relacionada às fontes utilizadas no planeamento, para a

seleção de textos no ensino da leitura e escrita, inquiriu sobre os tipos de texto

(géneros textuais) mais utilizados. As alternativas de respostas eram as

mesmas da questão anterior, apenas dispostas em diferente ordem.

De acordo com o gráfico 15, mais uma vez, a maioria dos inquiridos (95%) faz

uso dos manuais escolares para seleccionar os tipos de textos que ensinarão

aos alunos portugueses, colocando uma grande responsabilidade sobre este

recurso. Contudo, existe uma significativa percentagem (80%) de inquiridos

que afirmam fazer uso da internet para a seleção dos tipos de textos (géneros

textuais), o que pode significar que apesar de apoiarem-se nos manuais,

buscam outros géneros na internet para tornar o ensino da literacia mais útil e

significativo sob a perspectiva do alunado.

Uma das competências gerais de transversalidade disciplinar preconizada pelo

currículo nacional visa a comunicação de forma correta e adequada em

diversos contextos e com seus objetivos particulares. (cf. Currículo Nacional,

2001:31)

O Plano Nacional de Leitura para o 1º e 2º ciclo é utilizado por 65% dos

inquiridos, dado que releva-se pelo fato de termos uma pequena

representatividade da amostra que trabalha com estes ciclos de estudos, juntos

somam apenas 27% dos inquiridos.

106

Gráfico 15: Fontes para a seleção dos tipos de textos (géneros) ao planear atividades de escrita.

O Programa de Português do Ensino Básico (2008) vem logo em seguida no

gráfico, sendo utilizado por mais da metade dos inquiridos (53%). Cerca de

40% dos inquiridos afirmam fazer uso do Q.E.C.R. e do Currículo Nacional do

Ensino Básico (2001). Suponho que aqueles que utilizam o QECR devem

representar em sua maioria por professores de LE e PLE que juntos somam

50% da amostra.

Entre as respostas dos inquiridos que afirmam fazer uso de outras fontes para

a seleção de textos destaco livros, artigos de jornais e revistas; textos dos

média, programa de línguas, fontes autênticas, plano nacional de leitura do 3º

ciclo, entre outros que serão abordados na análise dos dados.

152

128

64

84

104

64

20

95%

80%

40%

53%

65%

40%

13%

Manuais escolares

Internet

Currículo Nacional do Ensino Básico 2001

Programa de Português do Ensino Básico

Plano Nacional de Leitura (ciclos 1/2)

Q.E.C.R. para o ensino das línguas

Outros

Fontes para seleção de tipos de texto

Série6 Série5 Série4 Série3 Série2 Série1

107

2.2.9 Os tipos de textos ou géneros escolares mais recorrentes em

Portugal

Antes de partir para a análise mais detalhada dos dados, verificaremos quais

os tipos de textos (ou géneros textuais) que os inquiridos utilizam em sala de

aula com maior frequência. A questão perguntava quais os tipos de texto que

os inquiridos costumam usar no ensino da língua. Foram fornecidas oito

opções e a possibilidade de escrever outros tipos de textos trabalhados, que

não estivessem na lista de escolha múltipla. Mais de uma alternativa podia ser

selecionada. Todas as respostas podem ser verificadas no quadro 8 (apêndice

XIX) e estão quantificadas no gráfico a seguir.

Gráfico 16:Tipos de textos mais recorrentes no ensino de línguas em Portugal.

O gráfico 16 mostra que o tipo de texto mais usado pelos professores são as

narrativas (93%), como era esperado, uma vez que os textos narrativos sempre

foram privilegiados no ensino das línguas, desde os tempos da pedagogia

134

148

66

58

128

62

118

50

41

84%

93%

41%

36%

80%

39%

74%

31%

26%

Histórias

Narrativas

Procedimentos

Relatórios

Relatos biográficos

Relatos históricos

Relatos pessoais

Resenhas

Outros

Tipos de textos mais recorrentes

Série4 Série3 Série2 Série1

108

tradicional. As histórias são um tipo de texto narrativo, portanto, não poderiam

estar muito atrás, representando 84% da amostra.

A seguir os tipos de textos mais populares são os relatos biográficos e os

relatos pessoais. Estes últimos são tipos muito comuns de textos no ensino

escolar, para que os alunos possam expressar-se enquanto agentes deste

mundo, quanto aos relatos biográficos, podem ser autobiográficos ou sobre a

biografia de outrem e servem a todos os níveis de escolarização.

Os relatos históricos (39%), relatórios (36%) e procedimentos (41%) têm menor

representatividade para os professores de línguas, talvez, por serem mais

comumente encontrados em outras disciplinas, por exemplo, relatórios de

experiências científicas; relatos sobre um período histórico marcado por algum

acontecimento específico, como uma guerra ou a mudança de um governo;

entre outros.

Por fim, temos as resenhas com representatividade de apenas 31% dos

inquiridos. Este, como no caso dos seminários (texto oral) citado na secção

2.2.7, era um tipo de texto muito comum na escola tradicional, o que pode

explicar, de certa forma, a baixa percentagem.

Os dados acima apresentados serão melhor explorados no capítulo a seguir,

que fará referência aos números e dados, gráficos e quadros.

Concluímos por ora que certas práticas docentes apresentadas condizem tanto

com as pretensões estatais para o ensino das línguas, quanto para os objetivos

desta dissertação, enquanto outros dados podem significar entraves à

reelaboração da formação continuada dos professores de línguas (e não só),

porém, estes não parecem representar maiorias nesta amostra.

109

Capítulo III

A necessidade e o desejo de comunicar surgem numa situação específica e a forma e o conteúdo da comunicação são uma reacção a essa situação. (Conselho da Europa, 2001:75)

1. Discussão dos dados obtidos nesta investigação

Este capítulo é dedicado à discussão dos dados recolhidos e apresentados no

segundo capítulo. Esta investigação é tanto quantitativa, como apreciado nos

gráficos expostos no segundo capítulo, quanto qualitativa tendo por base as

teorias estudadas e já apresentadas no primeiro capítulo.

A discussão dos dados será realizada tendo como referência o Currículo

Nacional do Ensino Básico de 2001 (doravante CNEB), os programas LPEB de

2008, ao QECR de 2001 e o campo teórico já apresentado, na tentativa de

trazer à tona relações entre o que pensam e fazem os professores ao ensinar

língua nas salas de aula e os objetivos oficiais expostos nos documentos acima

citados.

1.1 Acerca do perfil dos inquiridos

Inicio esta análise por apreciar os dados do perfil da amostra que obtive nesta

investigação. Os inquiridos representam, como vimos, maioritariamente

professores que ensinam o português como língua materna, mas não só; dos

118 professores que lecionam PLM, 72 também ministram aulas de outras

línguas ou de língua portuguesa (doravante LP) em outros contextos. Estes são

seguidos pelos professores que se dedicam ao ensino de PLNM que somam

62 inquiridos, dentre os quais 46 também lecionam PLM. Isso significa que

apenas 16 professores de PLNM não lecionam PLM, o fator mais provável para

a apresentação deste quadro deve ser o crescente número de imigrantes ou

filhos de imigrantes presentes nas salas de aulas em Portugal.

Apesar de tal questão não ter sido levantada neste inquérito, podemos criar a

hipótese de que este quadro se deve ao crescente número de alunos

estrangeiros dentro das salas de aulas das escolas regulares portuguesas.

110

Sendo assim, os professores que inicialmente atendiam um público que tinha o

português como língua materna, tornaram-se por via das circunstâncias,

professores de português como língua não-materna também. Concluo que já

existe uma considerável preocupação das escolas que atendem alunos do

ensino básico e secundário, cujas línguas maternas podem ser outras que não

a portuguesa, em capacitar professores para ensinar PLNM.

Os professores que trabalham com PLE representam apenas 30 dos inquiridos

da amostra, ressalto aqui que estes professores podem atuar tanto em centros

de ensino de línguas e de explicações, assim como em escolas regulares, pois

acredito que todas as instituições de ensino, desde que trabalhem com

professores profissionalizados, exercem influência sobre a formação dos

alunos. Sendo assim, foram consideradas respostas de professores de línguas

que trabalhassem em realidades outras que não a escola regular, desde que

atendessem alunos portugueses dentro da faixa etária determinada.

Como citamos na secção 2.1.1, o baixo número de respostas de professores

de PLE pode ter dois significados. O primeiro, e que considero mais fiável, é o

fato de os professores de PLE em Portugal atenderem uma pequena parcela

de crianças e jovens em idade de escolarização básica e secundária, pois

sabe-se que o público do ensino de PLE é mais alargado nos programas de

intercâmbios entre universidades, ou seja, de jovens que já passaram da faixa

etária desta amostra, ou o público adulto, imigrante ou não. Os alunos desta

amostra, devido à delimitação da faixa etária escola, estão mais largamente

representados nas aulas de PLNM que ocorrem em escolas regulares de

ensino.

Outra hipótese que levanto é a possibilidade deste grupo de professores estar

à margem da formação continuada de professores e do contato com

professores de outras áreas e institutos de formação. Não podemos esquecer

que, se há público adulto imigrante, consequentemente, há uma parcela de

indivíduos em idade escolar, filhos(as) destes imigrantes nas escolas regulares.

A contribuição dos professores especialistas em PLE nestes casos poderia ser

muito valiosa.

111

Segundo dados do Ministério da Educação, em 2004 havia mais de 81 mil

alunos estrangeiros nas escolas portuguesas. (cf. Jornal Público, 15 de

dezembro de 2006, em www.publico.pt/educação). Estes últimos (alunos de

PLNM) são considerados nos programas LPEB, como especiais e aos quais se

dedica especial atenção.

“Se muitas vezes designamos o Português como língua materna, não o fazemos certamente por acaso: naquela imagem representa-se bem a noção de que a língua que aprendemos (e que a escola depois incorpora como matéria central) está directamente ligada à nossa criação e ao nosso desenvolvimento como seres humanos. Naturalmente que são diferentes destas as vivências dos alunos que não têm o Português como língua materna, alunos cuja integração na língua de acolhimento se processa em termos que, como é óbvio, são distinto e para os quais existem orientações.” (Ministério da Educação Português, 2008:6)

Acrescento ainda que o documento de referência considerado mais apropriado

para o ensino de PLE é o QECR para as línguas, pois abrange diretrizes

comuns a todas as línguas estrangeiras, inclusive a LP ensinada e aprendida

como tal. Nesta investigação os inquiridos que ensinam LE e PLE somam 80,

um número significativo de professores que se mostram interessados e

envolvidos nas questões de aprendizado ao longo da vida e que podem

contribuir positivamente para a formação da literacia dos alunos como um todo.

De acordo com o QECR, um dos objetivos das políticas linguísticas europeias

está em:

“ P responder às necessidades de uma Europa multilingue e multicultural, desenvolvendo de forma considerável a capacidade dos europeus comunicarem entre si, para lá de fronteiras linguísticas e culturais, o que exige um esforço bem alicerçado ao longo da vida, que deve ser encorajado, visto numa base mais organizada e financiado em todos os níveis de ensino pelas autoridades competentes;” (Conselho da Europa, 2001:22)

Ainda em relação ao perfil dos inquiridos há considerável diferença entre os

inquiridos que representam os dois primeiros ciclos, em relação aos demais,

portanto, afirmo que esta análise abrange mais os professores e o ensino do

terceiro ciclo e do ensino secundário. As razões que levaram a esta realidade

podem ser tão diversas que não nos caberá discutir, apenas ponderar. Outra

ponderação significativa para esta análise é o fato da maioria dos inquiridos

112

terem sido profissionalizados há mais de 15 anos, ou seja, tiveram sua

formação antes das tendências atuais de ensino e aprendizagem das línguas, e

também da realidade multilingue e multicultural citada acima.

2. Autoria e grau de interferência creditada a outros especialistas no

ensino das línguas.

A teoria de registo e do género e a proposta da escola de Sydney suporta a

ideia de que a língua deve ser aprendida enquanto permeada por todo o

currículo, além da dedicação especial para os estudos peculiares e gerais da

língua nas aulas de línguas maternas ou não. Ao identificar que os próprios

professores de línguas acreditam poder dividir esta tarefa com colegas de

outras áreas, penso que é possível capacitar todos os professores da escola

básica para ensinar as linguagens específicas de suas áreas de conhecimento

como a linguagem matemática, científica, histórica e assim por diante. Almejo,

ainda, a possibilidade de ter a colaboração dos especialistas em línguas e

linguística para que o projeto seja bem estruturado e que faça parte das

equipes de professores de dentro de cada escola, ao invés, de receberem

informações apenas dos que vem de fora, a academia, eles poderão ter a

oportunidade de aprender uns com os outros assim como seus alunos o fazem.

No que diz respeito à opinião dos inquiridos quanto a autoria do ensino de

línguas em Portugal e suas razões para tal, apresentadas na secção 2.2.1 e no

quadro 1 (apêndice II) constata-se que aqueles inquiridos que consideram as

aulas de língua, as únicas responsáveis pela aprendizagem do conteúdo

programático desta disciplina, e portanto, responderam ‘SIM’ (vide quadro 1)

são minoria. Em geral, atribuem esta responsabilidade aos professores de

línguas por estes “dominarem” a língua, terem especialização na área da

linguística, deterem as ferramentas necessárias ao ensino, assim como

habilitação e competência para a realização de tal tarefa.

Os inquiridos que partilham desta opinião são em sua maioria

profissionalizados há mais de 15 anos, quando as diretrizes para o ensino eram

outras e, consequentemente, mais ligadas ao ensino multidisciplinar.

113

Acrescento ainda o facto de apenas 2 dos inquiridos deste grupo trabalhar no

primeiro ciclo, enquanto os outros dividem-se em sua maioria em ensinantes do

terceiro ciclo e secundário, com alguma representatividade no segundo ciclo.

Outro dado relevante, apresenta-se em 6 comentários sobre a existência de

equipas multidisciplinares responsáveis pelo ensino das línguas, a palavra

interdisciplinaridade aparece em apenas 2 respostas como algo existente.

Infiro, portanto, que as equipas multidisciplinares devem ser responsáveis pela

veiculação da interdisciplinaridade, considerando que ao unir em uma só

equipa pessoas especialistas em diversas disciplinas, estas estarão pensando

em um foco comum.

Alguns traços da transversalidade da língua aparecem em algumas

justificativas, apesar da descrença na partilha da autoria do ensino das línguas.

A maior parte delas, com relação à necessidade de correção de erros

cometidos e ao bom uso da língua pelos docentes para que sirvam de bons

modelos - outra evidência da formação de docentes profissionalizados a mais

de 15 anos. (vide quadro1)

As respostas deste grupo que mais chamam atenção enquanto um discurso

mais elaborado sobre necessidade de ter as línguas como transversais ao

ensino remontam às contribuições quanto às competências linguísticas

específicas de cada disciplina, à necessidade de formação dos docentes para

poderem assumir tal responsabilidade e à grande extensão dos programas de

português. Os traços da transversalidade das línguas aparecem como uma

vertente central no LPBE como se constata na citação:

“P se o ensino do Português previsto nestes programas se desenrola numa aula específica e com um professor formado para tal efeito, isso não significa que nessa aula e com esse professor se esgote, para o aluno, a aprendizagem do idioma e a sua correcta utilização.” (Ministério da Educação, 2008:6)

Ao mesmo tempo, o LPBE responsabiliza a extensão do ensino da LP a:

“um coletivo de instrumentos e de agente com responsabilidades próprias: os materiais didácticos (em particular os manuais) P; as famílias P; os

114

equipamentos escolares PTodos estes e antes deles os professores, com a formação de base que possuem e com formação complementar de que regularmente carecemP” (Ministério da Educação Português, 2008:6)

Mesmo concordando com a necessidade de um ambiente de ensino favorável

e com a importância do apoio social e familiar, não acredito que a

“aprendizagem do idioma e sua correcta utilização”, como acima mencionado,

seja eficientemente cumprida, sem a ajuda de outros professores, assim como

a maioria dos inquiridos, os quais responderam que consideram o ensino das

línguas de responsabilidade de todos os professores envolvidos no processo

de ensino aprendizagem dos alunos do ensino básico e secundário.

Esta possibilidade é mencionada no documento citado ao fazer referência a

uma observação feita na Conferência Internacional sobre o Ensino do

Português9 quando foi sugerido que os professores de todas as disciplinas

cooperassem em vista da correta aprendizagem linguística em todos os

momentos. (cf. Ministério da Educação, 2008:6)

Em princípio, pode-se dizer que a balança é positiva se considerarmos a TR&G

e ao compararmos este quadro, à proposta de criação de um currículo

linguístico paralelo ao de conteúdos específicos, via norteadora do R2L.

Entretanto, ao analisar cada justificativa, inclusive daqueles que representam a

maioria e responderam ‘NÃO’, distribuindo a autoria do ensino das línguas

através das áreas curriculares, apenas uma delas refletiu real conhecimento

sobre a genologia e a importância de se ensinar a ler e escrever textos de

todas as áreas curriculares, preocupando-se com os géneros específicos de

cada disciplina. Outro inquirido cita a necessidade do conhecimento das

metalinguagens de cada disciplina, porém a delimita ao público de PLNM;

ainda outro, comenta a possibilidade de formar professores em ensino

aprendizagem de línguas não maternas com o intuito de tornar as equipas

capazes de trabalhar junto aos professores de PLNM, apesar de não ver esta

possibilidade como uma probabilidade. (Essas justificativas estão destacadas

em vermelho no quadro 1).

9 Conferência Internacional sobre o Ensino do Português realizada em Lisboa, na Universidade

Aberta em 2008.

115

Vale anotar que estas repostas foram dadas por professores profissionalizados

em épocas diferentes, apesar de todos exercerem seu ofício com alunos do

terceiro ciclo e ensino secundário.

Sob outra perspectiva, muitos inquiridos dividiram suas opiniões entre PLM e

PLNM, dando especial atenção aos grupos de alunos em PLNM e afirmando

que este é o público que precisa da colaboração de toda a comunidade

escolar. Torna-se relevante apontar que 18 professores consideram a língua

como um meio para ensinar ou um meio de comunicação essencial para que

ocorra aprendizagem; 10, citam a existência das várias linguagens que

envolvem o ensino curricular em relação ao vocabulário e a uma forma de

acrescentar na formação linguística dos alunos; 24 professores mencionam a

palavra transversal, principalmente em relação à língua materna, o conceito de

língua não fica claro, mas todos eles entendem que a língua transpassa os

outros conteúdos curriculares e este dado é muito positivo, considerando as

intenções deste trabalho.

Vale ressaltar que sete professores mencionaram agentes extra escolares

como a família, os pais, a comunidade e a sociedade como também

responsáveis pelo ensino das línguas.

Por último, verificamos que, assim como alguns professores do primeiro grupo

responderam (SIM), alguns dos que responderam NÃO, também vêem a

responsabilidade dos professores das demais disciplinas limitadas ao uso

correto da língua (10 menções/referências) e à necessidade de correção

gramatical, tanto oral, quanto escrita e em algumas vezes, também como forma

de punição através das avaliações das diversas disciplinas (5 menções).

Apesar de os professores em geral verem a língua como o meio pelo qual se

aprende e se ensina nas escolas, percebe-se que a atribuição de

responsabilidades aos professores de todas as disciplinas está ainda muito

ligada à avaliação, à soma de conhecimentos e ao vocabulário específico de

cada disciplina, traduzida na tentativa de somar as várias aptidões das diversas

especialidades.

116

2.1 Comparação ao grau de intervenção creditado aos outros

especialistas

Quando indagados sobre o grau de interferência creditada aos docentes de

outras especialidades na formação linguística dos seus alunos, (secção 2.2.3)

60% dos inquiridos assinalaram que professores de outras disciplinas são

capazes de colaborar com a formação linguística dos alunos, o que condiz com

a resposta da maioria dos inquiridos acima, ao creditarem a autoria do ensino

das línguas às diversas áreas curriculares. Também é positivo notar que

poucos inquiridos negam esta possibilidade. (vide gráfico 6)

Por outro lado, apenas 34% dos inquiridos mostram preocupação com a

necessidade de formação complementar para a realização de tal tarefa, via

norteadora desta pesquisa. Levanto aqui duas hipóteses: ou boa parte dos

professores de línguas portugueses confiam nos seus colegas, acreditando

serem capazes de o fazer, sem nenhuma capacitação extra, ou então, o

conceito das estruturas e propósitos socias dos diferentes géneros textuais, em

suas diversas especialidades, ainda não esteja bem claro entre os inquiridos.

Ensinar uma língua tendo como base paralela um currículo linguístico,

ultrapassa a leitura e compreensão de textos. Todos os professores, neste

caso, devem estar aptos a ensinar seus alunos a lerem critica e

conscientemente, descobrindo e deduzindo os propósitos sociais dos textos

trabalhados. Isso decorre da aprendizagem das estruturas típicas de cada

género, das suas componentes, da ordem em que se realizam e as razões

para tal, das estruturas textuais, grupos de palavras, entre outros, utilizados

para transmitir certos conteúdos disciplinares, seja na forma oral ou escrita,

visando formar alunos também capazes de produzir textos dos diversos

géneros com segurança e consciência. Segundo o CNEB cabe ao professor

“Apoiar o aluno na escolha de linguagens que melhor se adeqúem aos objectivos

visados, em articulação com os seus interesses” (Ministério da Educação, 2001:15)

Ao comparar os gráficos 4 e 6 cabe aqui referir a uma notável diferença nas

respostas, que se reafirmam na distribuição de autoria e da capacidade de

117

todos os docentes no ensino da literacia. Para facilitar a análise desta

comparação construí o quadro 2 (apêndice III) que compara as respostas

quanto à distribuição de autoria e da capacidade de todos os docentes no

ensino da literacia. Note que as opiniões positivas nas duas colunas possuem o

símbolo ‘•’, enquanto os que não creditam autoria de ensino de línguas a todos

os professores não estão assinalados e as diferentes respostas quanto à

capacidade dos professores em geral, na contribuição ao ensino de línguas

foram copiadas no quadro.

Cerca de 22% dos inquiridos (34) não creditam autoria de ensino das línguas a

outros professores, que não os especialistas da área, entre eles 14 creem na

capacidade dos outros especialistas em poder ensinar línguas, enquanto

apenas 4 afirmam não acreditar nesta possibilidade - todos profissionalizados

há pelo menos mais de 10 anos. Os outros 16 inquiridos mencionam a

necessidade de capacitação linguística para os especialistas de outras

disciplinas. Este grupo de inquiridos está bem distribuído entre os diferentes

níveis de ensino. (destacados em amarelo no quadro 2)

Podemos também perceber, através do quadro 2, que 6 dos inquiridos crentes

na autoria do ensino transversal das línguas, opinam em sentido contrário

quando avaliam a capacidade de colegas de outras disciplinas. (destacados em

verde no quadro 2). Este dado comprova a hipótese levantada de que nem

todos os inquiridos que opinam positivamente sobre a autoria do ensino de

línguas transdisciplinar acreditam que os outros professores sejam capazes de

ensinar línguas. Ressalvo que nenhum deles trabalha no primeiro ciclo,

dividindo-se entre os outros níveis.

O mais relevante, todavia, é o facto de que entre os crentes na autoria do

ensino de línguas repartido, há 38 inquiridos que acreditam na possibilidade de

contribuição, sob a condição de capacitação prévia, vindo de encontro ao

objetivo deste trabalho. Estes, por sua vez, também se distribuem bem entre os

diferentes níveis de ensino. (destacados em vermelho no quadro 2)

118

Acredito que este resultado positivo abre algumas portas quanto à

possibilidade de implantação de um sistema curricular linguístico que

transpasse todo o currículo.

2.2 Projetos interdisciplinares

A partir da análise dos dados apresentados no quadro 2, analiso agora o

gráfico 5 que expõe uma maioria de inquiridos que não costuma realizar

projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos. Independentemente de

suas opiniões, isso pode se dar devido ao fato de que as ideias individuais não

contribuam para o funcionamento das equipas de trabalho, ou do planeamento

curricular. Outra hipótese relaciona-se com capacitação dos professores; pode

não haver formação suficientemente adequada para este tipo de trabalho nos

ambientes escolares, ou pode ainda existir certa resistência por parte de alguns

professores, de línguas ou não, em envolver-se no ensino da linguagem.

Levanto estas hipóteses à luz dos dados previamente analisados, já que 81%

dos inquiridos dizem acreditar que a autoria do ensino das línguas possa ser

partilhada entre todos os professores. (vide gráfico 4)

Em relação aos que realizam projetos interdisciplinares com objetivos

linguísticos temos, inquiridos que o fazem uma vez a cada período do ano

letivo ou três vezes ao ano; e outros que trabalham em projetos com

professores de outras disciplinas mais do que quatro vezes ao ano. Apesar de

a percentagem não ser muito significativa, temos indícios de algumas escolas

atendendo à necessidade de uma formação linguística mais holística e não só

literária.

3. O ensino da literacia realizado através de tipos de textos diversos

Antes de analisar como o ensino da literacia através dos diversos tipos de

textos ocorre em Portugal, analisaremos os dados do quadro 8 e do gráfico 16,

que expõem os tipos de textos usados mais comumente no ensino de língua

segundo os inquiridos desta amostra.

119

3.1 Tipos de textos (géneros) mais recorrentes no ensino de línguas

em Portugal

O termo ‘tipos de textos’ foi utilizado no questionário, e será utilizado nesta

análise por ser do senso comum, e mesmo assim, expressar bem a ideia que

aqui se pretende transmitir. Não usamos, repetidamente, o termo géneros

textuais pois este termo é usado com valores diversos nos documentos oficiais,

e junto da generalidade dos professores por falta de teorização adequada;

além do mais, ainda não foram definidos e estudados para língua portuguesa

um quadro dos géneros escolares, segundo as propostas da TR&G. O que não

significa que os tipos de textos utilizados no questionário, não possam ser

considerados géneros textuais escolares, pelo contrário, é a partir do que se

conhece e do que já é utilizado nas escolas que poderemos construir uma

tabela comum de géneros textuais escolares da língua portuguesa para os

diferentes níveis de ensino. Daí a ambição de que estes dados e de que a voz

dos professores desta amostra possam colaborar para a melhoria do ensino de

línguas em Portugal.

Além dos 93% de inquiridos que trabalham as narrativas10, há 84% deles que

também trabalham com histórias, um tipo de texto narrativo, a diferença está no

nível de ensino em que costuma ser empregado, histórias fazem parte de um

género textual, apropriado ao ensino nos primeiros anos de escolarização, no

processo de ensino dos textos narrativos.

Apesar disso, colocamos as duas alternativas de resposta por prever que nem

todos os professores têm consciência desta diferença. O que foi comprovado

pelo elevado número de professores que a selecionaram, muitos mais do que

os 27% de inquiridos que atendem ao público dos dois primeiros ciclos desta

amostra.

Observamos no quadro 8, dividido por níveis de ensino, que 86 inquiridos

trabalham com histórias no 3º ciclo e no ensino secundário, assim como os

10

Exemplo de termo que, seguramente é entendido como domínio retórico e que tem um valor genológico na definição dos géneros inspirada pela Escola de Sydney.

120

mesmos 86 dizem trabalhar com a narrativa, demonstrando o frágil

conhecimento sobre os diversos géneros textuais. As narrativas, contudo,

foram selecionadas por 22 inquiridos que não trabalham com histórias nestes

níveis de ensino. Entre estes 22 inquiridos 2 dizem ensinar apenas narrativas,

16 também trabalham com relatos biográficos e com relatos pessoais, 8 com

relatórios, 6 com relatórios históricos, 4 com resenhas, 2 com procedimentos.

Concluo que entre os inquiridos que sabem que o género história não é

comumente ensinado nos últimos níveis de escolaridade, a maioria também

ensino os relatos pessoais e biográficos, que representam os tipos de textos

mais populares depois das histórias e narrativas.

É comum em todos os níveis escolares que os alunos escrevam sobre suas

experiências de vida (relatos pessoais), mas mais uma vez creio que este tipo

de texto deveria ser mais comum nos primeiros anos de escolarização, ou com

objetivos outros, que não sejam necessariamente linguísticos nos últimos dois

níveis de escolaridade. Quanto aos relatos biográficos, são importantes tipos

de textos para o ensino, para que compreendam a significância de cada

história contada sobre a vida de indivíduos significantes ao ensino das diversas

áreas do saber.

Os relatos históricos, relatórios, procedimentos e resenhas com menor

representatividade entre os professores de línguas, são mais comumente

encontrados em disciplinas como história, ciências, geografia, matemática. O

que importa apreciar enquanto especialistas em línguas e em educação é qual

o grau de conhecimentos, as capacidades, e o tempo que tais professores tem

ou já despendem no ensino explícito de tais géneros textuais.

A segunda parte do quadro 8 expõe os tipos de textos mais comuns usados por

inquiridos que trabalham no ensino básico (1º, 2º 3º ciclos). Em geral, 34

inquiridos ensinam histórias, 30 narrativas, 26 relatos biográficos, 24 relatos

pessoais, 16 relatos históricos, 12 procedimentos e 8 resenhas.

121

Mais uma vez, os procedimentos e as resenhas são menos ensinados, o que

para o ensino básico pode ser prejudicial, uma vez que alguns procedimentos

como receitas, como utilizar uma ferramenta digital, como jogar um jogo, fazem

parte do quotidiano das crianças atualmente. Assim como, fazer uma resenha

sobre um texto estudado, ensina aos alunos como escrever um resumo

criticamente, e se começarmos a ensinar estes géneros desde o princípio da

escolaridade com textos curtos, de linguagem apropriada ao chegarem no

ensino secundário estes alunos terão menos dificuldades.

Neste grupo, apenas 2 inquiridos, professores do 1º ciclo em contexto de PLM

não selecionaram o tipo de texto história e sim narrativa, o que pode significar

que ensinem outros tipos de textos narrativos, até porque alguns deles

mencionaram no campo outros ‘notícias’ e ‘panfletos’.

Outros 6 não selecionaram narrativas, mas todos estes selecionaram histórias,

os 2 que trabalham com o 1º ciclo, também selecionaram relatos pessoais,

sendo que um deles incluiu a leitura de imagens, muito comum nas histórias

infantis, mas que envolve estudos de multimodalidade e não serão discutidos

neste trabalho. Os outros 4, ensinantes do 2º e 3º ciclos, também trabalham

procedimentos, relatórios, relatos biográficos, relatos históricos e relatos

pessoais, um deles incluiu o ensino de texto poético.

Outra separação por ciclo de ensino engloba os inquiridos que trabalham

simultaneamente com alunos dos 2º, 3º ciclos e secundário. Em termos gerais,

o quadro não se diferencia muito dos demais grupos; a maioria, 14 inquiridos

ensina histórias, narrativas, relatos biográficos e relatos pessoais. Enquanto os

relatórios, resenhas, procedimentos, relatos históricos têm baixa representação

de ensino no quadro. O que neste caso é um pouco mais grave, pois estes

professores, além de trabalharem com o ensino básico, estão também no

ensino secundário, dos quais esperava uma maior diversidade de géneros,

dada a diversidade do público que atendem.

122

3.2 Principais finalidades para a seleção de textos de diversas fontes.

A seleção de textos é tratada na TR&G e no R2L como tarefa crucial para a

preparação de uma boa aula de ensino da literacia, independente dos objetivos

traçados. Os professores portugueses nas secções 2.2.4 e 2.2.4.1 revelaram

que realizam tal tarefa com diferentes finalidades. O número de docentes que

utiliza outras fontes, que não os manuais escolares, para a seleção de textos é

relevante, o que considero fundamental para a promoção da melhoria no

ensino de forma menos dramática, quero dizer que, ao ter o hábito de

selecionar textos, aperfeiçoar esta prática pode ser mais fácil, ao passo que

para aqueles que pouco pesquisam fontes fora dos manuais, este seria mais

um desafio.

Quanto às finalidades apresentadas (vide quadro 3) é inevitável notar ainda

traços marcantes da pedagogia tradicional, que porventura, promoveu a

diversificação de textos para aumentar e/ou facilitar os conhecimentos em

relação ao conteúdo, assim como conhecimentos gramaticais de ortografia,

sintaxe e vocabulário, etc. Lembrando que a maior parte dos inquiridos foram

profissionalizados há mais de 15 anos estes dados não são inesperados.

Entre os 14 professores com menos tempo de profissionalização (5 anos ou

menos) encontramos estas mesmas finalidades ainda muito presentes; em

contrapartida, há inquiridos neste grupo que não demonstram nenhum

resquício de tal prática, tendo focado as suas respostas na formação de

modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados, na reflexão sobre a

estrutura do tipo de texto, desvendando os propósitos sociais destes e

permitindo a análise e desconstrução de bons modelos textuais. Estes, mesmo

que poucos, representam todos os níveis de ensino investigados.

Quanto aos 18 profissionalizados entre 5 a 10 anos atrás também observa-se

uma boa distribuição entre os níveis de ensino. Todos eles assinalaram a

primeira opção ‘Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo

abordado’ e ainda há forte presença (14 inquiridos) que assinalam do uso de

textos em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, 2 deles afirmam usar

123

textos de outras fontes com esta única finalidade. Considerando que ambos

inquiridos se profissionalizaram, no máximo, há 10 anos, esta é uma resposta

que chama atenção para a possibilidade da formação de professores, quanto

às novas propostas educacionais não atingir a todos, via de regra, dado

estatístico comum em qualquer pesquisa.

Por outro lado, os outros inquiridos deste grupo, além de promoverem a leitura

para obtenção de mais informações sobre o conteúdo, também fazem uso dos

textos para outros fins. O mais popular é a ‘leitura para formação de modelos

autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados.’ (14 inquiridos) seguido pela

leitura ‘para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.’ (12

inquiridos); ‘desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.’

(10 inquiridos) e por último ‘para análise e desconstrução de bons modelos do

tipo de texto em questão’. (8 inquiridos). Dois deles assinalaram todas as

opções e nenhum apresenta grande discrepância em relação às escolhas que

fizeram.

Analisando os (22) inquiridos profissionalizados entre 10 anos e 15 anos,

observa-se um quadro parecido, a maioria (16) também assinalou a primeira e

a quarta opção respectivamente: ‘Leitura para informação extra relativamente

ao conteúdo abordado’ e ‘para usar em atividades de ortografia, sintaxe,

vocabulário, etc..’ Entretanto, neste grupo nenhum inquirido limita o uso dos

textos retirados de fontes diversas a estas finalidades.

Dois deles, inclusivamente, também selecionaram todas as alternativas,

revelando que há possibilidade de haver entre os professores de línguas,

conhecimento linguístico suficiente para a realização de todas as etapas da

aprendizagem da leitura e escrita segundo as teorias apresentadas. Estes

inquiridos em particular lecionam PLM, LE e PLNM no terceiro ciclo. Dos acima

mencionados, um também lecciona PLM, LE e PLNM no terceiro ciclo,

enquanto o outro leciona PLM ao segundo ciclo.

Outros 14 inquiridos deste grupo selecionaram a finalidade ‘para reflexão sobre

a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.’; 12 inquiridos selecionaram

124

‘leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto

trabalhados.’; 10 inquiridos assinalaram ‘desvendar os propósitos sociais do

tipo de texto a ser trabalhado.’; e 10 ‘para análise e desconstrução de bons

modelos do tipo de texto em questão’.

Intriga-me, neste grupo, a descontinuidade das finalidades assinaladas por

cada inquirido; por exemplo, espera-se que para desvendar os propósitos

sociais de um tipo de texto, seja feita a análise e desconstrução de bons

modelos do tipo de texto em questão, porém, apenas 6 inquiridos assinalaram

ambas as opções. Assim como a leitura de modelos autênticos e atuais dos

tipos de textos a serem trabalhados deveria levar à reflexão sobre a estrutura

do texto e a descoberta dos propósitos sociais dos mesmos, estas três opções,

contudo, só foram assinaladas ao mesmo tempo por 4 inquiridos. Há um

número mais significativo, de 10 inquiridos, que assinalou a leitura de modelos

autênticos e a atuais, seguidos da reflexão sobre a estrutura do tipo de texto, o

que não significa que os mesmos dêem continuidade ao trabalho de analisá-los

e desconstrui-los, desvendando os propósitos sociais e fazendo uso das

atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, para a construção de textos do

mesmo tipo posteriormente.

Até o momento, nenhum inquirido havia sugerido outra finalidade para o uso de

textos retirados de outras fontes, que não dos manuais escolares. O que

aparece entre a maioria dos inquiridos profissionalizados a mais de 15 anos. Já

citadas na secção 2.2.4.1 são elas: “Para reescrever criativamente, resumir,

sintetizar, esquematizar, parafrasear e outras transformações de texto (de narrativo

para dramático) ”; “Para alargar horizontes culturais.” e “Fomentar o gosto pela leitura

e escrita.”

As duas últimas sugestões citam questões importantes, mas que foram

brevemente abrangidas neste trabalho, tratam de questões culturais e do gosto

pela leitura, ambas as quais considero significativas e necessárias no contexto

escolar.

125

A primeira, todavia, comenta o uso de técnicas muito ligadas à linha

pedagógica aqui apresentada como a reescrita, o parafrasear e o uso, mesmo

que inconsciente, de géneros textuais “P de narrativo para dramático.” Face a

esta afirmação, vinda de um(a) professor(a) com mais de 15 anos de trabalho,

com alunos do ciclo 3 e do ensino secundário, lecionando em contextos de

PLM e PLNM, sinto-me impelida a considerar que os programas de formação

continuada em Portugal podem, na verdade, estar contribuindo para mudanças

na educação e que uma parcela dos professores representados por esta

pequena amostra pode estar plantando sementes em várias escolas pelo país.

No geral, este grupo (101 inquiridos) também privilegia a ‘leitura para

informação extra relativamente ao conteúdo abordado’, assinalado por 82

inquiridos e o ‘uso em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.’

assinalado por 72 inquiridos, e na maioria das vezes, são assinaladas pelo

mesmo inquirido.

O que muda positivamente em relação ao grupo anterior é a organização do

pensamento, parece-me aqui que os professores seguem uma linha de

raciocínio mais coerente no planeamento das aulas de leitura e escrita e dos

seus objetivos. Isso revela-se através das combinações de opções assinaladas

mais comuns entre eles.

Entre os 101 inquiridos, 18 assinalaram todas as opções; apenas 2 inquiridos

assinalaram uma única opção que foi ‘Leitura para informação extra

relativamente ao conteúdo abordado.’

Os outros 81 assinalaram mais de uma opção. Sendo que, 10 assinalaram 2

opções variando entre as seguintes combinações expostas nos esquemas

abaixo:

126

As seleções destes 10 inquiridos revelam traços das teorias psicológicas da

aprendizagem mencionadas na introdução deste trabalho. As mudanças na

visão do ensino da língua partiram da ideia de leitura para obtenção de

informação extra, para reflexão sobre os tipos e propósitos sociais dos textos,

assim como já se falava em usar textos autênticos ou ao invés dos que eram

adaptados aos manuais; e isso ocorreu, principalmente, nos níveis escolares

mais altos. Contudo, os inquiridos acima referidos ainda revelam traços da

pedagogia tradicional no ensino da gramática, por ainda não haver recursos

mais bem fundamentados para o ensino da mesma. Uma das falhas do ensino

baseado no construtivismo ou sócio construtivismo, em relação ao ensino das

línguas, estará na falta de diretrizes para o ensino da gramática, fazendo com

que os professores continuem a usar estratégias e conceitos que já conheciam.

Outros 28 inquiridos selecionaram 3 opções, cujas combinações estão

expostas nos esquemas abaixo, cada um dos esquemas representa quatorze

inquiridos, dados que também podem ser conferidos no quadro 3 (apêndice IV).

Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.

Desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

Reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhado.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

127

As respostas reforçam o sentido do comentário acima sobre processo de

mudança da pedagogia tradicional para uma pedagogia mais funcional e social,

baseada a princípio nas teorias sócio psicológicas.

Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.

Desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhado.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

Análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

Reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados.

Análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

Desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

Reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

128

A outra metade se distingue por não ter selecionado a primeira opção, tendo

em comum outra finalidade, combinada, mais uma vez com diferentes

alternativas expostas no esquema acima.

Estes inquiridos já revelam maiores mudanças em relação às estratégias

tradicionais, e psicológicas do ensino das línguas, considerando a leitura de

textos autênticos como uma ferramenta de formação dos tipos de textos

combinados à reflexão sobre as estruturas textuais, e também levando estas

ideias mais adiante analisando e desconstruindo os modelos, assim como

descobrindo os propósitos sociais dos mesmos; e consequentemente,

ensinando os pormenores das línguas significativamente.

Outros 10 inquiridos, por sua vez, assinalaram quatro opções. A maioria, mais

uma vez, tem em comum a primeira opção, observe o esquema de

combinações de finalidade

Assim como dentre os inquiridos que assinalaram 3 opções há um grupo de 4

inquiridos aqui que também tem em comum a finalidade ‘Leitura para formação

de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados’ combinados da

seguinte forma:

Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.

Desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhado.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

Análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

Reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

129

Ainda dentro do grupo de profissionalizados há mais de 15 anos, 16 inquiridos

assinalaram 5 opções deixando apenas uma de lado. Ao analisá-las percebo

diversidade nas exclusões, sendo que:

• 4 Inquiridos excluíram a finalidade “Desvendar os propósitos sociais do

tipo de texto a ser trabalhado”.

• 2 Inquiridos excluíram a finalidade “Atividades de ortografia, sintaxe,

vocabulário, etc.”

• 1 Inquirido excluiu a finalidade “Análise e desconstrução de bons

modelos do tipo de texto em questão”.

• 1 Inquirido excluiu a finalidade “Leitura para a formação de modelos

autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados”.

Outras teorizações sobre o ensino de texto também trabalham com a

desconstrução e análise de textos, o que pode também favorecer a

implantação de nova informação sobre a praxis de base genológica na

educação portuguesa.

Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados.

Análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

Atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.

Desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

Reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

130

3.3 Sobre a escrita de textos individuais e as etapas da pré-escrita

Na secção 2.2.5, deparamo-nos com um quadro muito diverso tendo em conta

o número de textos individuais escritos pelos alunos portugueses. Tentarei

agora, com o apoio dos dados organizados por tempo de profissionalização, no

quadro 4, descobrir quem são esses alunos e inferir sobre os porquês de tal

disparidade, com base nos número e nas formas com que esses textos são

trabalhados com os alunos previamente.

Entre os inquiridos profissionalizados há menos de cinco anos (9% da amostra)

houve uma resposta anulada. Os alunos dos outros 13 inquiridos deste grupo

escrevem de 3 a 8 textos individuais por ano letivo. Dado que parece muito

baixo, ao analisar os ciclos de estudos que atendem descobri que os inquiridos

que trabalham com o 1º ciclo e são professores de PLM dizem que os seus

alunos escrevem 6 textos individuais por ano, tendo o ano letivo 3 períodos,

podemos concluir que estes escrevem cerca de 2 textos por período.

Os outros inquiridos deste grupo trabalham em sua maioria com alunos do 3º

ciclo e do ensino secundário, porém, lecionam LE e/ou PLE, o que justifica o

baixo número de textos individuais que variam de 3 a 8. A justificativa mais

racional para o fato é que estes alunos frequentem essas aulas poucas vezes

por semana, o que é comum neste contexto de ensino.

Passando para o grupo de profissionalizados entre cinco e dez anos, temos

apenas 2 inquiridos que trabalham com o primeiro ciclo, sendo que um trabalha

com PLM e PLNM e o outro só com PLM, responderam que seus alunos

escrevem 10 e 9 textos por ano letivo, respectivamente. Considerando que

estes contextos de ensino, via de regra, acontecem em uma escola regular,

para o primeiro ciclo de estudos, três textos individuais por período é uma boa

estatística.

Outros quatro inquiridos trabalham com alunos do segundo ciclo, 2 em contexto

de PLM e outros 2 em contextos diversos, PLM, PLNM, LE; porém, todos

responderam que seus alunos escrevem 10 textos por ano. Em comparação

131

com o primeiro ciclo, pode parecer que não há aqui nenhum avanço, mas ainda

assim, à luz das teorias estudadas considero um bom número para a faixa

etária, porque o ensino de textos na educação básica demanda tempo, e o

segundo ciclo, não deixa de ter a função de consolidar, as primeiras

aprendizagens formais de literacia e dos géneros trabalhados. De acordo com

o CNEB, as competências específicas por ciclo baseiam-se para os dois

primeiros ciclos no desenvolvimento da consciência linguística, alargamento da

compreensão dos diversos géneros, consolidação das técnicas instrumentais

necessárias para a escrita, enfim, o domínio progressivo das competências

necessárias à aprendizagem da literacia. (cf. Ministério da Educação, 2001: 33-

35)

O restante e maioria dos inquiridos atendem alunos do 3º ciclo e secundário, a

maioria destes alunos escrevem cerca de 10 textos individuais por ano letivo,

aqui, considero que o número pode ser baixo, dado o avançado nível de

conhecimentos, capacidades e compreensão de formas complexas da língua,

tanto oral quanto escrita, esperadas que os alunos atinjam ao final do 3º ciclo e

a caminho do ensino secundário. (cf. Ministério da Educação, 2001: 33-35)

Se a maior parte dos alunos no final do terceiro ciclo atingem as metas

traçadas pelo CNEB, acredito que sejam capazes de produzir mais textos por

ano letivo e, provavelmente, conhecerem vários géneros textuais. Pelo menos

aqueles que representam alunos de PLM e PLNM em contexto escolar regular,

uma vez que entre estes inquiridos, oito são professores de PLM, mas não só,

seis deles também lecionam PLE ou PLNM ou LE, 2 lecionam apenas LE e

outros 2 apenas LE e PLE.

No grupo de inquiridos profissionalizados entre dez e quinze anos temos,

novamente, apenas quatro representantes do 1º ciclo, sendo que 2 deles

trabalham em outros ciclos de estudos também. Os que trabalham

exclusivamente no 1º ciclo e são professores de PLM dizem que os seus

alunos escrevem trinta e seis textos individuais em um ano letivo, comparado

aos dados descritos acima, creio que seja um número excessivo. Ao entrar em

contato com um género textual, pela primeira ou segunda vez na vida escolar,

132

é necessário que ocorram muitas etapas prévias à escrita de um texto

individual. O mais interessante notar é que estes mesmos inquiridos dizem

analisar e desconstruir um modelo do texto pedido, assim como, escrever

textos coletivos com foco na estrutura textual, além de fornecer e solicitar

informações sobre o tema. Para que tenham tempo de escrever 36 textos,

imagino que a escrita se limite a poucos géneros, o que configura as práticas

reveladas pelos poucos estudos disponíveis sobre o assunto.

Os outros 2 inquiridos que lecionam no 1º ciclo, também lecionam no 2º e 3º

ciclos, estes responderam que seus alunos escrevem 5 ou 6 textos individuais

por ano letivo, fazendo mais sentido ao considerar, os 1º e 2º ciclos, mas como

já mencionei, considero um número baixo para alunos do 3º ciclo. Outros 2

inquiridos que trabalham apenas no 2º ciclo também responderam 6 textos, em

concordância com as ideias acima. Outros 2 responderam que seus alunos

escrevem 10 textos individuais, mas como também são professores do 3º ciclo

e foi perguntado um número médio, não representam disparidades.

Quanto aos alunos do 3º ciclo e secundário, segundo os inquiridos, podem

escrever de quatro a dezoito textos individuais em um ano letivo. Os inquiridos

cujos alunos escrevem apenas quatro textos são professores de LE e parece-

me um número razoável devido à modalidade de ensino. Porém, 2 inquiridos

professores de PLM e PLNM afirmam que seus alunos do ensino secundário

escrevem apenas cinco textos por ano letivo, o que me parece muito pouco,

dado o número de géneros textuais que devem ser aprendidos durantes estes

anos de escolaridade. Para o ensino secundário sugere-se o conhecimento de

cerca de 20 tipos de textos, entre orais e escritos, em cada ano letivo deste

nível. (cf. Ministério da Educação, 2002:33-47).

Os inquiridos restantes trabalham com 10, 12 ou 18 textos individuais por ano,

em contextos de PLM, PLNM, PLE e inclusive LE. Mais uma vez, reafirmamos

que a pergunta pedia um número médio, sendo que estes dados podem variar

dependendo do contexto de ensino.

133

Os inquiridos profissionalizados há mais de quinze anos são maioritariamente

professores do 3º ciclo e do ensino secundário, como nos demais grupos, há

poucos representantes do 1º ciclo (4) e do 2º ciclo (26), sendo que quase todos

os professores do segundo ciclo também lecionam nos demais ciclos de

ensino, são professores de PLM, alguns deles também lecionam PLNM, LE ou

PLE, cujas respostas que variam de 8 a 36 textos individuais por anos letivo,

mais uma vez, apresenta-se uma grande discrepância de dados nos primeiros

ciclos e no ensino de PLM.

Entre os demais inquiridos que lecionam no 3º ciclo ou secundário, temos 32

professores de LE, sendo que os alunos destes escrevem no máximo seis

textos por ano letivo, um número aceitável para este contexto de ensino, como

já discutido anteriormente. Alguns destes 32 professores, também lecionam

PLM, neste cenário os números variam entre 6, 10 e 20 textos individuais por

ano; outros lecionam também PLNM, cujos alunos escrevem 4, 8, 6 ou 12

textos individuais, estas variações são um pouco mais distintas e devem

depender muito dos contextos escolares.

A grande maioria dos professores deste grupo, 84 inquiridos, são professores

de PLM e a maioria deles também leciona LE, PLNM, PLE, e entre os que

lecionam apenas PLM a diversidade de respostas também é grande, por isso,

não os separei dos demais. Segundo a lista abaixo, os alunos do 3º ciclo e

secundário escrevem de 3 textos individuais por ano letivo a um texto por aula.

Esses dados são discrepantes e revelam a falta de diretrizes mais específicas

que visem a unidade do ensino para que toda a população estudantil tenha

oportunidades mais igualitárias.

• 2 inquiridos cujos alunos escrevem 1 texto por aula;

• 1 inquiridos cujos alunos escrevem 36 textos;

• 12 inquiridos cujos alunos escrevem 20 textos;

• 3 inquiridos cujos alunos escrevem 15 textos;

• 10 inquiridos cujos alunos escrevem 12 textos;

• 20 inquiridos cujos alunos escrevem 10 textos;

134

• 4 inquiridos cujos alunos escrevem 9 textos;

• 10 inquiridos cujos alunos escrevem 6 textos;

• 8 inquiridos cujos alunos escrevem 5 textos;

• 8 inquiridos cujos alunos escrevem 3 textos.

A maioria deles, 57 inquiridos, diz que seus alunos escrevem entre 9, 10, 12,

15 e 20 textos que acaba por ser uma média mais razoável para a maioria dos

alunos de PLM neste grupo. Por outro lado, alunos de 26 inquiridos escrevem

apenas de 3 a 6 textos individuais por ano letivo, o que é muito pouco

considerada a faixa etária dos alunos e os objetivos educacionais portugueses

e europeus.

Há ainda, que considerar o oposto os pouco alunos do 3º ciclo e secundário

que escrevem 1 texto individual por aula, o que já me parece muito. E outros,

alunos de apenas 1 inquirido desta amostra, que escrevem 36 textos

individuais por ano letivo, considerando os três períodos e a média de semanas

por período, podemos concluir que estes alunos escrevem 1 texto individual por

semana, o que julgo ser ideal, para estes níveis de ensino, tendo por base as

etapas de pré-escrita e a escrita coletiva, depois da análise e desconstrução de

bons modelos do género. Um grupo de alunos destes níveis escolares, já

familiarizados com a pedagogia linguística e o ensino das línguas por géneros

textuais poderiam perfeitamente escrever com sucesso um texto a cada

semana, não necessariamente de géneros diferentes. Como foi mencionado no

primeiro capítulo a aprendizagem de um género textual e todas as suas facetas

demora o quanto for necessário nas distintas realidades.

3.3.1 Etapas da pré-escrita dos textos individuais em relação à escrita

de textos coletivos e aos tipos de texto trabalhados.

Os inquiridos profissionalizados a 5 ou menos dizem que ao preparar os alunos

para as atividades de escrita costumam usar as seguintes estratégias:

• Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,

relatórioB);

135

• Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas,

deixo o tema à escolha dos alunos;

• Forneço informações sobre o tema sugerido;

• Peço aos alunos que pesquisem sobre o tema;

• Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual)

devem ser escritos os diversos tipos de texto;

• Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais

de um certo tipo de texto.

Dois deles usam apenas a primeira estratégia, revelando entre os professores

recém-formados práticas pouco elaboradas do ponto de vista teórico atual. Os

outros 2, porém fazem uso de todas as estratégias acima mencionadas, o que

comprova que parte desses professores fazem uso de algumas das estratégias

necessárias para o ensino da literacia do ponto de vista aqui defendido, apesar

de pularem a etapa de análise e desconstrução de bons modelos dos textos,

fundamental para a formação do conhecimento explícito. Como sugere o CNEB

relativamente ao conhecimento explícito na parte direcionada ao ensino da LP:

“Desenvolver a consciência linguística, tendo em vista objectivos instrumentais e atitudinais, e desenvolver um conhecimento reflexivo, objectivo e sistematizado da estrutura e do uso do Português padrão.”

Entre os profissionalizados entre 5 e 10 anos (18 inquiridos) quanto às

estratégias na fase de pré-escrita, todas as nove alternativas foram

selecionadas por 2 inquiridos que trabalham no 3º ciclo e foram

profissionalizados a mais de 5 anos e menos de 10, portanto, espera-se que a

formação destes os habilitem para considerar, todas as alternativas, das mais

antigas às mais recentes, que apresentam-se na lista abaixo.

A. Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,

relatórioB);

B. Determino o tema e/ou título do texto, mas não especifico o tipo de

texto;

C. Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas,

deixo o tema à escolha dos alunos;

D. Analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido;

136

E. Forneço informações sobre o tema sugerido;

F. Peço aos alunos que pesquisem sobre o tema;

G. Peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto

sugerido;

H. Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual)

devem ser escritos os diversos tipos de texto;

I. Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais

de um certo tipo de texto.

Em geral, 16 inquiridos selecionaram a estratégia B; 14 inquiridos a estratégia

G; 10 deles as estratégias A, D, E e H; e apenas 6 inquiridos assinalaram as

estratégias C e I.

A maioria de 16 inquiridos que utiliza a estratégia B, muito comum em qualquer

nível de escolaridade e condizente com a pedagogia linguística dependendo da

fase de trabalho. De qualquer forma, vale ressaltar que 2 dos inquiridos

selecionaram apenas esta alternativa trabalham com o primeiro ciclo, em

contextos de PLM e PLNM, e foram profissionalizados entre cinco e dez anos

atrás.

Nesta época, a formação de professores de línguas já considerava muitas

outras técnicas para atividades de pré-escrita, provenientes das diversas

teorias em voga desde os anos 60, por isso, considero estas respostas muito

limitadas, ainda mais por tratarem-se de alunos do primeiro ciclo, que

costumam ser mais dependentes e precisar de maior acompanhamento e

informações para a realização de tarefas.

Os dez inquiridos deste grupo, os quais utilizam a estratégia mais controlada,

definindo tanto o tema quanto o tipo de texto a ser produzido, trabalham com

alunos dos 2º e 3º ciclos e secundário, em contextos diversos, PLM, PLNM, LE

e PLE. No segundo ciclo esta é uma estratégia que me parece bastante

coerente, mas deve ser gradualmente diminuída durante os níveis seguintes,

quanto à determinação do tema, para que os alunos criem mais autonomia e

exercitem mais o exercício da investigação.

137

Os outros assinalaram também estratégias como pedir aos alunos que

pesquisem, assim como fornecer informações sobre o tema; alguns escrevem

textos coletivos com o objetivo de ensinar a estrutura textual e de desvendar os

propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado. Um dos professores deste

grupo que trabalha em contexto de PLM no ensino secundário também sugeriu

outras alternativas, nomeadamente:

‘Faço uma síntese das aprendizagens construídas sobre o género de texto e explico como essa síntese não só orienta a escrita como também a auto ou heterorrevisão e a avaliação do texto. Tenho muitas vezes em conta a evolução, quando há versão inicial no início de uma sequência de ensino.’(inquirido de número 55, vide quadro 4)

Este é o único comentário deste grupo de inquiridos que revela conhecimentos

sobre a genologia e o uso de estratégias mais elaboradas no ensino das

línguas.

Quanto à estratégia B ‘Determino o tema e/ou título do texto, mas não

especifico o tipo de texto’ há um número relevante de 6 inquiridos deste grupo

que o utilizam, somados a 2 do primeiro grupo analisado (profissionalizados a 5

anos ou menos), formam um grupo de oito inquiridos que por vezes solicitam a

escrita de textos sem especificar o género. Todos eles trabalham com o ensino

secundário e/ou o 3º ciclo, não justificando tal atitude, sendo que os alunos

destes níveis de ensino já possuem conhecimentos sobre muitos géneros

textuais.

Esta prática, mais esperada entre os inquiridos profissionalizados a mais tempo

foi selecionada por seis professores entre os 22 profissionalizados entre 10 e

15 anos atrás estes e apenas 24 vezes entre os 106 profissionalizados há mais

de 15 anos, ao colocá-los em uma escala obtemos o gráfico a seguir, que

contraria minha primeira hipótese, mostrando que a maioria dos inquiridos que

usam desta estratégia foram profissionalizados entre 5 e 15 anos atrás.

138

Gráfico 17: Percentagem de inquiridos que determinam o tema mas não o tipo

de texto a ser escrito por ordenação de tempo de serviço.

Outro dado que interessa apreciar relaciona-se com a construção de textos

coletivos, cujos graus de intervenção serão analisados na próxima secção.

Entre os inquiridos deste grupo (profissionalizados entre 5 e 10 anos atrás)

somados aos poucos inquiridos profissionalizados a 5 anos ou menos, temos

14 inquiridos que trabalham textos coletivos para ensinar sobre as estruturas

textuais e 10 que trabalham textos coletivos para desvendar os propósitos

sociais dos textos, ambas as práticas são importantes em todos os níveis.

Apesar disso, a habilidade de desvendar propósitos sociais de um texto, deve

ser mais praticada a partir do segundo ciclo, pois depende muito da capacidade

de aprendizagem abstrata, da maturidade cerebral tão bem definida por Piaget

quando descreve o nível de desenvolvimento cognitivo a que nomeou

operatório formal, quando a criança passa a ter habilidade de engajar-se no

raciocínio proposicional. As deduções lógicas realizam-se através do

pensamento formal abstrato. Sendo assim, constato que 8 destes inquiridos

trabalham com esta faixa etária, e os outros 2 apenas com alunos do primeiro

ciclo. Não é impossível tratar de propósitos sociais com estes alunos, mas há

que se planear muito bem as intervenções e formas de apresentação do texto

para que a aprendizagem realmente ocorra.

Entre os profissionalizados a mais de 15 anos temos apenas 24 inquiridos que

trabalham os propósitos sociais dos textos, entre os quais nenhum trabalha no

23%

27%

33%

14%

mais de 15 anos

entre 10 e 15 anos

entre 5 e 10 anos

menos de 5 anos

Determino o tema e/ou título do texto, mas não especifico o tipo de

texto

Série3 Série2 Série1

139

primeiro ciclo. Este dado pode ser considerado esperado, do ponto de vista do

tempo de profissionalização, mas por outro lado, evidencia a necessidade de

melhorias na formação continuada da língua.

Quanto às alternativas que envolvem a investigação, temos nos dois primeiros

grupos (profissionalizados entre 5 e 10 anos) 22 inquiridos que costumam pedir

aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados, 18 que fornecem

informações sobre os temas e 8 que pedem aos alunos que pesquisem outros

modelos do tipo de textos trabalhado.

No grupo dos profissionalizados entre 10 e 15 anos atrás há 14 inquiridos que

costumam pedir aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados e que

fornecem informações sobre os temas; e também 8 inquiridos que pedem aos

alunos que pesquisem outros modelos do tipo de textos trabalhado. Não

apresentando grandes diferenças de resultados por tempo de

profissionalização.

Entre os inquiridos profissionalizados há mais de 15 anos, há 74 inquiridos que

costumam pedir aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados para 68

que fornecem informações sobre os temas; em contrapartida, apenas 18

inquiridos que pedem aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de

textos trabalhado. Há, claramente, uma maior diversidade na diferença de

resultados entre os que promovem a pesquisa de outros modelos do tipo de

texto estudado. Talvez o facto de as teorias de base genológicas serem muito

recentes explique tal diversidade.

3.2 Textos coletivos: graus de intervenção usados nesta modalidade

de escrita.

Como pudemos observar no gráfico 10, 84% dos inquiridos trabalham com

textos coletivos, sendo que entre os alunos dos inquiridos profissionalizados há

menos de 5 anos e entre 5 e 10 anos são escritos de 1 a 6 textos coletivos num

ano letivo. Já nos dois grupos seguintes, profissionalizados entre 10 e 15 anos

e há mais de 15, a variação vai de 1 a 10 textos coletivos, sendo que estes

140

últimos representam, em sua maioria, professores do 3º ciclo e secundário.

Considero os números praticados por estes mais significativos e que os mais

recentemente formados não deveriam aumentar o número de textos coletivos

que escrevem com seus alunos, pelo menos que seja escrito um texto coletivo

para cada género ensinado.

Se nos voltarmos ao quadro 8, a maioria dos inquiridos, independente do

tempo de profissionalização, afirma mais recentemente trabalhar no mínimo 3

tipos de textos diferentes.

Sabemos também que a intervenção mais popular entre os inquiridos é a de

guiar toda a turma na escrita de um só texto, seguidos pela construção do texto

em grupos e consequente monitorização, em menor escala os alunos estão

mais livres para construir tais textos, estando o professor apenas disponível

para tirar dúvidas (vide gráfico 11).

Vale a pena apreciar que 22 inquiridos utilizam as três estratégias de

intervenção sugeridas, entre eles há professores de PLM, LE e PLNM, todos

trabalham com alunos do 3º ciclo e/ou ensino secundário. Nestes níveis de

ensino é possível utilizar as várias estratégias desde que os alunos estejam

familiarizados com o tipo de construção textual e suficientemente envolvidos na

tarefa, para evitar que apenas alguns trabalhem.

Segundo a pedagogia de base linguística proposta pela Escola australiana, a

escrita do texto coletivo é uma etapa de desconstrução do modelo de texto a

ser estudado, por isso, sugerem que toda a turma seja guiada na construção

de um só texto.

Entre os 136 inquiridos que promovem a escrita coletiva, existem 50 nesta

amostra que não utilizam esta estratégia, dividindo-se entre os que utilizam a

construção coletiva em grupos mais ou menos controladas e outros que dizem

fazer uso das duas estratégias de intervenção. Estes representam professores

em todos os níveis de ensino do 1º ciclo ao ensino secundário.

141

Considerando as diversidades culturais, o número de alunos em sala de aula,

entre outros fatores regionais, concluo que o resultado geral é positivo. A

escrita de textos coletivos em grupos pode servir a muitos objetivos

educacionais, como a promoção do trabalho em grupo, a convivência entre

pessoas diferentes, entre outros. Porém, para concretizar objetivos linguísticos,

acredito que a monitorização constante deste trabalho seja imprescindível e

que a melhor estratégia de intervenção na desconstrução e análise de géneros

textos é a construção de um só texto, dando oportunidade a todos os alunos

que participem e tendo a possibilidade de sanar todas as dúvidas a partir das

contribuições individuais, como já mencionamos anteriormente. Ninguém

melhor que o professor para saber administrar o seu grupo de alunos em uma

atividade coletiva, pois este conhece as dificuldades e sucessos de cada um

poderá fazer uso deste conhecimento durante a aplicação da estratégia.

Ao não guiar toda a turma corremos o risco de a aprendizagem só ocorrer para

os alunos mais bem-sucedidos, os medianos e fracos podem ficar à margem;

uns podem tentar aprender, os últimos, por muito que estejam motivados

acabam por soçobrar perante o grau de complexidade que as tarefas

relacionadas com o texto lhe oferecem. Outra hipótese que levanto é de que os

alunos que já saibam mais deixem o trabalho na mão dos outros não se

interessando pela atividade e afinal, não promovendo nem a aprendizagem

linguística, nem os objetivos sociais e internacionais da estratégia.

3.3 Textos orais mais produzidos e suas dificuldades

De acordo com a apresentação dos dados na secção 2.2.7, os tipos de textos

orais mais frequentemente produzidos são a apresentação de pesquisas, os

diálogos do quotidiano, os debates e as dramatizações.

Primeiramente, interesso-me por descobrir quem são os inquiridos cujos alunos

não dialogam, ou mais provavelmente, não consideram os diálogos um tipo de

texto avaliável em sala de aula. Como previsto a maioria deles são professores

de PLM (26 inquiridos), porém um número significativo de 12 inquiridos que

trabalham no contexto de PLNM também não consideram os diálogos do

142

quotidiano um tipo de texto oral importante, assim como me espanta saber que

2 professores de PLE, e outros 2 de LE, também têm a mesma opinião. Os

diálogos corriqueiros como, por exemplo, a apresentação de um indivíduo a um

grupo, diálogos sobre o tempo, as horas, profissões, etc. costumam ser os

primeiros textos orais presentes em qualquer manual de ensino de línguas

estrangeiras, seja qual for a língua.

Há por outro lado, quatro inquiridos, 2 professores de PLM do 1º ciclo,

profissionalizados há 5 anos ou menos afirmam que seus alunos só praticam

diálogos em diversas situações da vida cotidiana, tais alunos apresentam

dificuldades ‘na construção de um discurso coerente’ e ‘dificuldades comuns à

idade’, o que provavelmente se deve à falta de intervenção do professor; assim

como à falta de promoção do ensino de textos orais. Os outros inquiridos, cujos

alunos apenas praticam diálogos cotidianos são professores de PLM e PLNM,

trabalham com o 2º e 3º ciclos e estão profissionalizados a mais de 15 anos, as

justificativas destes porém, recaem sobre os textos escritos, afinal não

consideram diálogos textos orais passíveis de correção e avaliação, nem

trabalham outros tipos de textos orais.

Os inquiridos que não trabalham com a apresentação de pesquisa, por sua

vez, estão bem distribuídos na amostra, trabalham em contextos de LE, PLE,

PLM, PLNM, em níveis de ensino e tempo de profissionalização variados.

Os debates que possuem grande representação na mostra, como tipos de

textos ensinados na escola, são comuns aos meios de comunicação, e muito

importantes na formação da cidadania das crianças; afinal, para realmente

compreender um debate político, por exemplo, em todas as suas entrelinhas, é

preciso conhecer bem o género, ou seja, ser capaz de distinguir as

possibilidades genológicas á disposição do falante no interior dos “argumentos”

(e.g. exposição, discussão) e até da “reação a textos” (eg. Opinião, resenha e

interpretação). Por isso, é relevante saber quais os professores que não se

interessam por este tipo de texto e qual o público mais afetado.

143

Neste grupo há 20 inquiridos que ensinam PLM, especialmente no 3º ciclo e

ensino secundário, porém também tem alguma representatividade no 1º ciclo.

Estes são seguidos pelos 12 inquiridos em contexto de LE que também

ensinam principalmente alunos dos dois últimos níveis considerados e tem

alguma representatividade do 2º ciclo. Os últimos inquiridos que ensinam PLE

(4) e PLNM (4) seguem o mesmo quadro pois em geral são os mesmos

inquiridos trabalhando em diferentes contextos.

Os textos dramáticos, ensinados por 65% dos inquiridos tem uma boa

dispersão entre os contextos de ensino, os ciclos de estudos e mesmo entre os

diversos inquiridos em suas especialidades e tempo de profissionalização.

Os géneros, entrevista e discurso, têm maior representatividade entre o público

mais velho, a partir do 2º ciclo, mas em especial, no 3º e secundário. Poucos

professores que trabalham no 1º ciclo também assinalaram o género discurso,

que é um dado interessante e possível, apesar de não muito comum nesta

faixa etária. Assim como os textos dramáticos, os poucos inquiridos que

trabalham o género seminário sobre conteúdos específicos tem uma boa

dispersão entre os contextos de ensino, os ciclos de estudos e quanto às

especialidades e tempo de profissionalização dos inquiridos.

Outras sugestões de textos orais foram somadas à lista de opções

apresentada, são elas: ‘declamação e apresentação de tertúlias’ em aulas de PLM

no 3º ciclo; ‘leitura expressiva’ em contexto de PLM e PLNM no 3º e secundário;

‘exposição, sinopse de livro ou filme, relato de vivências’ em contexto de PLM ou LE

no 3º ciclo e secundário. As duas primeiras são géneros textuais orais

coerentes com o nível e contextos de ensino, além de muito válidos para

posterior construção dos géneros escolares da LP; a segunda pode ser

considerada um tipo do género dramático, se interpretarmos a leitura

expressiva, por um leitor que expressa através da fala e dos gestos as

expressões interpretadas da leitura que está fazendo em voz alta. O terceiro e

último mistura géneros escritos e textuais, as exposições podem conter ambos

os géneros e envolver recursos visuais, mais uma vez caímos na área da

multimodalidade, que afinal, parece muito presente entre as atividades

144

escolares. As sinopses de filmes e livros são géneros escritos, o que pode ter

sido confundido com comentários ou resumos orais, e por fim, os relatos de

vivências que já foram mencionados como géneros escritos mas ocorrem

frequentemente na forma oral, a ainda pode representar um rico momento de

avaliação das dificuldades dos alunos na oralidade, por ser um género informal.

Quanto às dificuldades apresentadas pelos alunos, expostas no quadro 6 e no

gráfico 13, observamos que a maioria dos inquiridos sente que seus alunos não

atingem bons níveis de desenvolvimento genológico ou seja, têm dificuldades

em estruturar o texto oral ou um discurso coerente, em relação às ideias a

serem apresentadas e/ou comentadas; assim como dificuldades na construção

frásica, sequência de parágrafos e uso correto dos articuladores do discurso.

Isto pode significar que o ensino e a aprendizagem de géneros textuais orais

não sejam muito populares na escola, apesar de a comunicação ser um dos

principais focos no ensino das línguas, na atualidade. Levanto aqui a hipótese

de que uma boa parte dos professores de línguas não têm uma categorização

adequada para os géneros, designadamente os que são prioritariamente

ensinados e/ou observados e aprendidos no contexto formal escolar.

Muitos inquiridos citam problemas de desenvoltura e postura para a prática

oral, muitas vezes expressadas pela timidez e vergonha, mas que podem

evidenciar a falta de conhecimento da apresentação em público, nas diversas

situações da vida, produzindo diferentes textos orais.

Outros inquiridos mencionam dificuldades sintáticas e de incorreção gramatical,

que podem, dependendo do contexto de ensino, interromper ou mesmo impedir

a comunicação. Dificuldades na articulação temática, algumas vezes ligada à

falta de conhecimentos do conteúdo estudado, outras em relação ao tema

estudado e à falta de criatividade são dificuldades que podem ser facilmente

superadas caso os alunos detenham o conhecimento do género e passem a

sentir-se desafiados em cumprir com todos os requisitos para uma boa

produção em um discurso, uma apresentação ou qualquer outro tipo de texto

oral.

145

Alguns inquiridos apontam dificuldades na escolha e/ou conhecimento de

vocabulário apropriado aos géneros; outros em relação a dificuldades acerca

de ortografia, pontuação e acentuação. Faz-se necessário explicar porque

considerei estas respostas, já que se trata da análise de textos orais. Alguns

professores citaram a construção de painéis, digitais ou de outros tipos para

apresentações, daí concluo que os erros ortográficos citados sejam

provenientes dos recursos visuais utilizados em geral. Quanto à pontuação e

acentuação, levanto duas hipóteses. Podem os inquiridos estar ainda a

referir-se aos recursos visuais? Podem, também, estar a referir-se às pausas,

entoação, ritmo e outros aspectos próprios do texto oral que se relacionam com

as características de pontuação e acentuação da forma escrita?

Observamos também que uma pequena parcela dos inquiridos, porém não

menos importante, cita dificuldades encontradas na compreensão de

leitura/audição dos modelos oferecidos, e também dos enunciados

apresentados aos alunos; assim como mencionam as dificuldades na

desconstrução dos modelos oferecidos para poderem argumentar criticamente

e de forma consistente.

Com respeito ao planeamento, seja na organização de uma apresentação ou

discurso, preparação para a fala, em especial quanto às escolhas

léxico-sintáticas, postura, sistematização e expressão de ideias, em suma, no

processo de construção de textos orais formais, muitos alunos apresentam

dificuldades, e isso se dá, muito provavelmente, pelo fato de que a fase de

planeamento do texto oral não seja explicitamente ensinada.

O uso de suporte escrito, característica presente na produção de textos orais

formais, como a apresentação de uma pesquisa, é visto como algo negativo

por alguns inquiridos, o que chama a minha atenção para as ferramentas

tecnológicas visuais altamente valorizadas nos dias de hoje, e frequentemente

utilizadas pelos próprios professores em suas aulas. Se os adultos utilizam

recursos escritos para a produção de textos orais, o que falta é ensinar aos

alunos como se deve fazer uso destes, não impedi-los.

146

3.4 Planeamento e as fontes de informação para a escolha de temas e

tipos de textos (ou géneros escolares)

Nesta secção trataremos dos dados referentes aos gráficos 14 e 15, fazendo

referência aos dados organizados no quadro 7. Verificamos que os inquiridos,

em sua maioria, fazem uso de vários materiais de diferentes fontes quando

selecionam os textos que a serem trabalhados em suas aulas de ensino das

diversas línguas.

Tanto para a seleção temática quanto para a seleção genológica (tipos dos

textos), quase todos os inquiridos utilizam os manuais escolares e a internet.

Imagino que os manuais escolhidos por cada escola ou pelo governo devam

ser seguidos, pois devem estar de acordo com as novas tendências e leis

educacionais.

Considerando as restrições apresentadas por um manual escolar em número

de textos, sendo que a finalidade de um manual não se delimita a fornecer

modelos de textos aos alunos, considera-se o uso da internet para a busca de

modelos autênticos, ou de outros modelos dos géneros trabalhados, assim

como temas trazidos pelos manuais que podem ser melhor explorados com

ferramentas encontradas na rede uma simples e rápida opção aos professores.

A única ponderação que coloco é em relação à realização de uma boa seleção

de textos; ter objetivos traçados antes de ir em busca do texto ideal para cada

momento da aprendizagem. O apoio da internet também pode trazer as

notícias do mundo para a sala de aula em tempo real, além de ter criado novos

géneros textuais, como os correios eletrónicos, que contém algumas estruturas

do género carta, mas ao mesmo tempo pode ser tão diverso.

Quanto aos demais recursos listados para a seleção temos maiores diferenças

entre os mais frequentemente usados para a seleção de temas e os mais

utilizados para a seleção dos tipos de textos. Isso ocorre porque cada

documento dedica-se a um fim diferente. A partir desta comparação poderemos

inferir sobre o grau de consciência que os professores de línguas têm sobre os

147

documentos oficiais em prol do ensino em Portugal e na Europa. A tabela

abaixo compara os números expostos nos gráficos do capítulo II.

Documento Seleção temática Seleção genológica

Plano Nacional de

Leitura (1º/2º ciclos

35% 65%

Programa de Português

do Ensino Básico

(2008)

29% 53%

Currículo Nacional do

Ensino Básico (2001).

21% 40%

QECR 44% 40%

Tabela 2: Seleção de fontes de textos com finalidades temática e genológica

O Currículo Nacional não é popular entre os professores de línguas para a

seleção de temas, o que considero razoável, ou que podemos considerar 21%

um número alto sob esta perspectiva. Isso se deve ao fato de o CNEB (2001)

basear-se em competências essenciais, sejam elas gerais ou específicas, que

informam os docentes quanto às capacidades, conhecimentos e percursos de

aprendizagem a serem seguidos, com o objetivo de levar os ão alunos, dos

diferentes níveis de ensino, a atingir os respectivos graus de autonomia

esperados, não contendo sugestões de temas, mas sim direcionando o

planeamento, através de diretrizes traçadas, para a seleção dos tipos de

textos.

O QECR, como previsto, é mais largamente utilizado por professores de LE,

PLE e PLNM, porém alguns inquiridos que se dedicam ao ensino de PLM

também fazem uso deste documento. Vale ainda ressaltar que a maior parte

dos inquiridos que selecionou o QECR como fonte de informação temática

também o selecionou como fonte de informação para a escolha dos tipos de

textos a serem ensinados, o que é coerente, pois este documento destina-se

ao público acima citado e traz referências para ambas as informações.

148

O Programa de Português para o ensino básico, assim como, o Programa de

português para o 10º, 11º e 12º anos fornecem diretrizes mais operacionais

para os professores de PLM e alguma referência aos de PLNM. Considerando

que estas são as ordenações por contexto de ensino mais representadas nesta

amostra esperava que o número de utilizadores deste documento fosse maior

do que os 29% e 53% respectivamente, para a seleção de temas e de tipos de

textos.

Seleção temática Seleção genológica

Livros de didática da língua Livros: narrativas, poesia e teatro),

jornais e revistas

Planificação anual de Inglês Plano Nacional de Leitura do 3º ciclo

Temas atuais Revistas

Exames nacionais e GAVE:

gabinete de avaliação do Ensino

que produz itens para os

exames de avaliação, em

especial, no ensino secundário

Jornais e revistas

Textos de minha autoria, outros

textos recolhidos Livros

Materiais autênticos Revistas, livros e jornais

Programas do ensino

secundário Textos dos mass media

Livros de diversas tipologias Livros e artigos de jornais

Revistas, livros e jornais Autores portugueses

149

Tabela 3: Fontes de informação para a seleção de textos sugeridas pelos inquiridos

O mais curioso foi notar que muito professores que não trabalham nos dois

primeiros níveis de ensino, utilizem o Plano Nacional de Leitura desenhado

para tais ciclos. No quadro 7 podemos notar que 26 inquiridos que se dedicam

ao ensino do 3º ciclo e secundário fazem uso do Plano na seleção de textos

tendo em vista ambos objetivos.

A maioria dos inquiridos que trabalham com os três primeiros ciclos de

escolarização também faz uso deste documento, os que não utilizam o Plano

de Leitura são os 4 professores que limitam suas fontes de informação aos

manuais escolares.

Outras fontes de informação foram sugeridas por alguns inquiridos na seleção

de textos quanto ao tema e também quanto aos tipos de textos. Estes

encontram-se organizados na tabela 2 abaixo.

A maioria das sugestões vem de jornais, revistas e livros diversos, ou seja,

materiais autênticos, no sentido de que tem estrutura formalizada e propósito

social definido. Essas podem ser ricas fontes de textos, se bem selecionados,

pois nem tudo o que se publica na imprensa, representa um bom modelo dos

géneros de imprensa, como artigos, anúncios, propaganda, notícias, entre

outros.

Em negrito, encontram-se as sugestões que considero mais significativas para

esta análise, apesar de poucos, alguns professores demonstram conhecimento

sobre os documentos que norteiam o trabalho de suas especialidades, há

também a preocupação com os exames, presentes na educação portuguesa. E

ainda o apoio da leitura dos livros didáticos que são escritos com o propósito

Textos dos mass media

Leituras pessoais

150

de auxiliar os professores em suas práticas, mas muitas vezes, não atingem

seu objetivo.

Destacadas em itálico, estão as sugestões que me preocupam. ‘Textos de

minha autoria’ serão adaptações de textos originais feitas por um professor de

PLM do 3º ciclo, ou serão textos que este escreve e publica ou não, mas que

pertence a um género e tem propósito social?

‘Livros de diversas tipologias’ e ‘Autores Portugueses’ podem ser fontes

interessantes, mas devem ser selecionadas com cuidado e de acordo com o

público e o nível de ensino a que se destinam, com base nas diretrizes

traçadas, neste caso ao ensino de PLM. Quanto às ‘leituras pessoais’ a

preocupação é maior, pois como leituras de um professor de PLM

profissionalizado a mais de 15 anos podem servir ao ensino das línguas nos 2º

e 3º ciclos, e no ensino secundário?

Algumas questões ficam, mas no quadro geral, a maioria dos professores de

línguas faz uso de fontes fiáveis e coerentes ao nível e contexto de ensino.

151

Capítulo IV

Considerações Finais

P aqueles que aprenderam uma língua sabem muito acerca de várias outras línguas, sem que necessariamente se dêem conta disso. A aprendizagem de mais línguas possibilita geralmente a activação deste conhecimento e torna-o mais consciente, o que é um factor a considerar e não a ignorar. (Ministério da Educação, 2001:233)

1. Reflexões sobre a práxis

Esta dissertação nasceu do contato com propostas baseadas em género para

os problemas da compreensão e expressão escrita que afligem grande parte

dos professores, designadamente, os professores de língua. A Escola de

Sydney promove um conjunto de ideias cuja aplicação tem vindo a ser

comprovada em vários contextos suficientemente poderoso para alimentar o

desenvolvimento completo de um programa; ideias essas que informam os

parâmetros utilizados para analisar os dados recolhidos através do inquérito

por questionário a professores portugueses de línguas (materna ou não-

materna).

Senti ser necessário considerar a perspetiva do professor para, a um tempo,

entender o estado do conhecimento ou sensibilidade dos agentes de ensino

sobre as questões do género e perspetivar o possível terreno a percorrer em

termos de formação de professores.

As propostas dos autores do R2L são bem simples, mas globais. A forma

circular do esquema pedagógico sugerido permite que se trabalhe em um só

ciclo, por exemplo, partindo da Desconstrução para a Construção Coletiva e

direto para a Escrita Individual. Isso acontece muito nos últimos anos

escolares, no ensino secundário, quando se tem menos tempo para aprofundar

as peculiaridades da língua e há mais conteúdos específicos a serem

estudados.

152

Considerando, aqui, uma escola que inicie este programa no primeiro ano do

primeiro ciclo, provavelmente, poucas dificuldades seriam apresentadas nos

últimos níveis de ensino, pois os alunos nesta idade já estariam acostumados à

pedagogia e saberiam lidar com as dificuldades, inclusivamente, colocando

suas dúvidas quando preciso; e o professor teria total liberdade para realizar as

etapas de Leitura Detalhada e Construção Conjunta ou Reescrita Individual, ou

mesmo usar as estratégias do ciclo amarelo (vide figura 8) sempre que for

necessário, possível ou importante, e isso poderá ser feito com todo o grupo ou

de forma individualizada em todos os níveis escolares.

Introduzir novas técnicas e estratégias de estudo no decorrer da vida

académica dos grupos, pode significar maiores desafios para alguns alunos e

mesmo para os professores, porém, não é impossível, devido à flexibilidade de

adaptação dos ciclos de aprendizagem.

As sugestões e propostas apresentadas não são, com efeito, novidade

absoluta para o mundo escolar e para o conhecimento pedagógico

contemporâneo; porém, é importante sublinhar que se trata de ideias que

juntam a linguística à pedagogia pelo que exigem reflexão adequada em

ambos os domínios.

Considerando a maioria de inquiridos que acreditam na possibilidade de

aprimoramento do ensino das línguas através da cooperação dos colegas de

outras disciplinas, em especial, se através de formação complementar, vejo

nesta dissertação informações valiosas para a reconstrução de um modelo de

formação continuada para o ensino das línguas, seja para os professores de

língua ou não.

No que diz respeito à lacuna entre os objetivos governamentais, teóricos e

ideológicos, e a realidade das práticas analisadas, por vezes encontrada na

discussão dos dados, concluo que não representem uma grande barreira à

implantação de novas estratégias no ensino das línguas, devido à

disponibilidade revelada pela maioria dos inquiridos para compartilhar

conhecimentos com colegas de outros grupos em prol da melhoria dos

153

resultados linguísticos dos alunos. Tal constatação sugere a necessidade da

formulação de um currículo consistente e explícito, coerente na construção

interna dos conceitos.

Os docentes que na amostra desta investigação se apresentaram muitas vezes

interessados no ensino dos vários tipos de textos, propondo sugestões ou não,

ao mesmo tempo que, em larga escala, se apresentam navegando entre

teorizações e objetivos diversos, sem um norte comum. Algumas vezes por

falta de interesse, outras por falta de conhecimento da legislação, outras por

falta de coerência entre os diversos recursos educacionais de base, seja em

forma de documentos legais, seja em forma de teorias pedagógicas e

linguísticas, ou proveniente dos manuais escolares.

2. Reflexões sobre a formação linguística dos docentes portugueses

A falta de congruência entre os recursos educacionais oferecidos aos docentes

e algumas diretrizes vagas preconizadas pelos documentos oficiais, como já

referido, explicam os traços marcantes das práticas provenientes da pedagogia

tradicional na sala de aula. Tais práticas são, via de regra, rechaçadas pelas

abordagens comunicativas do ensino das línguas, baseadas em teorias

construtivistas e sociointeracionistas; porém, pudemos constatar, através da

voz dos docentes, que elas ainda fazem parte do dia-a-dia escolar. Assim

como pudemos constatar que as práticas mais atualizadas e informadas se

realizam muitas vezes de forma incompleta, principalmente evidenciadas na

apresentação das finalidades de seleção de textos.

Em contrapartida, foram observadas evidências do conhecimento genológico,

em muitas respostas apresentadas pelos inquiridos da amostra, por exemplo,

quanto ao número de textos individuais escritos por ano letivo e a realização de

várias importantes etapas para a boa produção de um género. Muitas vezes

estas apareceram de forma incoerente, e poucas realmente demonstraram total

desconhecimento da necessidade de se ensinar os vários géneros, da

importância das etapas de desconstrução e construção de modelos, assim

como do ensino dos propósitos sociais dos mesmos. Estes dados denotam

154

maior confiança nas teorias apresentadas, na importância do envolvimento da

linguística na área da educação, mais especificamente, das influências

positivas que a TR&G e a LSF podem oferecer à promoção do ensino em

Portugal. Primeiramente, o ensino de língua, mas que como pudemos

observar, com reflexo por todas as áreas curriculares, uma vez que, a

transversalidade das línguas no ensino formal, além de real, já faz parte do

inconsciente coletivo dos docentes.

Entre as mais recentes sugestões programáticas para o ensino da literacia,

tanto os alunos do secundário, quanto os alunos do ensino básico têm uma

lista de cerca de 20 tipos de textos, entre escritos e orais, em seus respetivos

programas. (cf. Ministério da Educação, 2002:33-47 e Ministério da educação,

2008: 42-60) para serem aprendidos. Constatamos; porém, que o conceito de

géneros e do ensino funcional da língua ainda é incipiente, assim como faltam

estudos neste domínio, resultando na dependência dos professores em

teorizações ditas ultrapassadas, que podem afinal, não serem assim tão

descartáveis. Por outro lado, a maioria dos inquiridos informaram-nos que

mesmo que inconscientemente, todos eles entendem que a língua transpassa

os outros conteúdos curriculares, na maioria das vezes sob uma visão

avaliativa, de correção gramatical e de aprendizagem de vocabulários

específicos às diversas áreas de conhecimento.

Para que os objetivos intervencionistas almejados neste trabalho possam servir

à formação linguística dos docentes há que ser ter em conta muitos aspetos,

em especial, a falta de clareza em relação ao ensino e aprendizagem das

estruturas textuais que formam os géneros, e produzem propositalmente

significados, que por sua vez, têm propósitos socias nos diferentes contextos

em que são empregados nas sociedades.

Outra consideração primordial refere-se às diferenças constatadas entre o

ensino de textos escritos e orais. Apesar de não ser um facto inédito, dado que

o ensino da escrita sempre foi privilegiado no ambiente escolar, as mudanças

educacionais, tecnológicas, o estreitamento do mundo levaram-nos a

considerar os textos orais de igual importância no ensino das línguas, daí um

155

dos grandes sucessos da abordagem comunicativa para o ensino das línguas,

em especial LE e PLE.

Os inquiridos, porém, não revelaram grande preocupação com o ensino dos

textos orais ensinados e/ou observados e aprendidos no contexto formal

escolar, fato provavelmente, decorrente da falta de informação genológica na

formação dos docentes. Até os inquiridos mais recentemente formados, não

apresentaram respostas significativas quanto ao ensino de géneros textuais,

nem mesmo os especialistas em LE e PLE.

As perplexidades reveladas por este inquérito, neste domínio, encontram forte

confirmação nos manuais, na sua organização, categorização e propostas de

exploração textual. Já dissemos anteriormente que os manuais não são

exclusivamente desenhados para o ensino de textos, mas tendo a

comunicação como principal foco do ensino das línguas, parece-me que os

manuais, também não contêm informações genológicas suficientemente

detalhadas e explícitas, capazes de orientar os professores para o ensino dos

géneros, em especial os géneros orais.

Além da necessidade de se construir uma tabela de géneros textuais escolares

para cada nível de ensino da LP, algo já iniciado no CNEB, será preciso formar

os professores aproveitando o potencial relevado, trazendo-os a um

conhecimento funcional da TR&G.

Acredito que os professores, conscientes ou não das lacunas existentes por

entre as suas práticas mais bem-intencionadas, sejam capazes de interpretar

os objetivos estatais e os resultados produzidos no ensino das línguas de

forma a encarem o sucesso dos seus alunos, designadamente na

compreensão e expressão escrita, como um desígnio alcançável através de

práticas de base genológica.

156

157

Referências Bibliográficas

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http://www.publico.pt/educação (Jornal Público, 15 de dezembro de 2006) visualizado em 02/09/2012

160

161

Apêndice I

Questionário

Pesquisa em Linguística Aplicada: O conhecimento genológico (sobre géneros textuais) nas práticas de ensino das línguas

Este questionário deve ser respondido preferencialmente por professores de

língua em exercício, seja Português língua materna ou não-materna, ou

qualquer outra língua estrangeira ensinada aos alunos do ensino básico e

secundário. Este inquérito é peça importante de uma investigação em

Linguística Aplicada que visa relacionar as novas propostas programáticas com

as práticas de ensino, pretendendo contribuir para a construção de um modelo

mais adequado de formação continuada de professores, designadamente, os

professores de língua. Pretendemos indagar sobre o modo como o

conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no ensino

básico e secundário, incluindo o ensino de Português língua não materna. A

participação dos professores é essencial para a realização desta pesquisa, por

isso, desde já agradecemos imensamente vossa disponibilidade. Precisamos

de cerca de 5 minutos do vosso tempo. Muito obrigado! Carolina Costa aluna

de Mestrado em Língua e Cultura Portuguesa Faculdade de Letras da

Universidade de Lisboa

Selecione (x) em quais categorias se inscreve: *Pode ser mais de uma categoria

• Sou professor(a) de Língua Portuguesa como língua materna

• Sou professor(a) de Língua Estrangeira (inglês, francês, alemão, hindi, etc.)

• Sou professor(a) de Português como língua estrangeira

• Sou professor(a) de Português língua não materna

Selecione (x) em quais categorias se inscreve: *Caso não esteja trabalhando em uma escola do ensino básico ou secundário, mas sim, com explicações ou em cursos livres, também pode responder a esta questão, seleccionando o ciclo ao qual pertençam seus alunos. Pode marcar mais de uma categoria.

• Trabalho com alunos do ciclo 1

162

• Trabalho com alunos do ciclo 2

• Trabalho com alunos do ciclo 3

• Trabalho com alunos do ensino secundário

Há quanto tempo se profissionalizou? *Quando terminou a licenciatura ou curso equivalente que lhe permita ser professor.

• 5 anos ou menos

• entre 5 e 10 anos

• entre 10 e 15 anos

• mais de 15 anos

Considera que o ensino das línguas, materna ou não-materna, sejam de responsabilidade única dos professores destas disciplinas? *

• SIM

• NÃO

Justifique aqui a resposta da pergunta anterior. *Se sim, porque acredita que apenas os professores de língua são responsáveis por ensinar as línguas? Ou se não, porque ou com quem compartilha ou poderia compartilhar esta responsabilidade?

Quantas vezes por ano desenvolve projetos com colegas de outras disciplinas, tendo em vista a formação linguística dos alunos? *Pode ser um número

aproximado, caso não desenvolva projetos nesse sentido coloque 0.

Até que ponto os professores de história, geografia, ciências naturais, matemática, artes, química, entre outras disciplinas curriculares estão aptos a contribuir para a formação dos alunos em língua materna? *Queremos saber a sua opinião, de acordo com as suas experiências profissionais ao longo dos anos de serviço.

• sim, são capazes de contribuir

• não são capazes de contribuir

• seriam capazes de contribuir se tivessem formação complementar

163

Quais os tipos de texto que costuma usar no ensino da língua? *Assinale apenas os que realmente utiliza e use ‘outro’ para adicionar outros tipos de texto que utilize.

• Histórias

• Narrativas

• Procedimentos

• Relatórios

• Relatos biográficos

• Relatos históricos

• Relatos pessoais

• Resenhas

• Outro:

Além dos textos escritos e orais fornecidos nos manuais adotados, faz uso de

textos retirados de outras fontes? *Responda SIM ou NÃO

Se respondeu sim à questão anterior, com qual finalidade usa tais textos selecionados de outras fontes? Pode assinalar mais de uma opção.

• Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.

• Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados.

• Para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.

• Para usar em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário.

• Para desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.

• Para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.

• Outro:

Quantos textos individuais os teus alunos costumam escrever por ano letivo? *Pode ser um número aproximado, se não escrevem textos individuais

use 0.

Ao solicitar a escrita de textos individuais quais das etapas abaixo realiza previamente? Assinale as que utiliza com frequência, pode assinalar mais de uma alternativa.

164

• determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história, relatório...)

• determino o tema e/ou título do texto, mas não especifico o tipo de texto

• determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas, deixo o tema à escolha dos alunos

• analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido

• forneço informações sobre o tema sugerido

• peço aos alunos que pesquisem sobre o tema

• peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido

• escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual) devem ser escritos os diversos tipos de texto

• escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais de um certo tipo de texto

• Outro:

Quantos textos coletivos seus alunos costumam escrever em um ano letivo? *Pode ser um número aproximado, caso não escrevam textos coletivos

use 0.

Ao pedir que os alunos escrevam textos coletivos, qual o grau de intervenção que mais utiliza? Assinale os que utilize mais frequentemente na sua prática em sala de aula.

• Pede a grupos que construam um texto e se coloca à disposição para tirar eventuais dúvidas

• Guia toda a turma na construção de um só texto

• Pede a grupos que os construam e monitoriza os grupos, auxiliando na construção do tipo de texto pedido

Que textos orais praticam os seus alunos em aula? Assinale apenas os que são praticados pelos seus alunos em sala de aula. Pode ter mais de uma resposta.

• Diálogos em diversas situações da vida quotidiana.

• Entrevistas

• Discurso

• Debate

• Apresentação de pesquisa

165

• Seminários sobre conteúdo específico

• Dramatizações

• Outro:

Que tipos de dificuldades seus alunos apresentam na produção destes textos? *Sinta-se à vontade para escrever o que analisa e avalia em sua sala de aula.

Ao planear aulas que envolvem a escrita ou preparação para a escrita de textos, de quais fontes de informações faz uso para a seleção dos temas abordados? Assinale todas as que utilizar, pode ser mais do que uma e escreva no campo ‘outro’ outras fontes utilizadas.

• Manuais escolares

• Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino das línguas

• Plano Nacional de Leitura (1 e 2 ciclos)

• Internet

• Currículo Nacional do Ensino Básico 2001

• Programa de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008

• Outro:

E para selecionar os tipos de textos (narrativas, artigos, relatos, discursos, debates, etc.) a serem ensinados, faz uso de quais fontes: Assinale todas as que utilizar, pode ser mais do que uma e escreva no campo ‘outro’ outras fontes utilizadas.

• Manuais escolares

• Internet

• Currículo Nacional do Ensino Básico 2001

• Programa de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008

• Plano Nacional de Leitura (1 e 2 ciclos)

• Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino das línguas

• Outro:

166

Apêndices II a VIII em CD anexado.