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118 VANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 1 Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC KARINA MARZANO FRANCO 1 Resumo O presente artigo visa relacionar, sob a perspectiva do Direito Internacional Público, Comércio e Trabalho. O enfoque da pesquisa é o tratamento dispensado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) ao tema, levando-se em consideração sua interação com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e os desaos à frente. Abstract The following article is aimed to relate, under the perspective of Public International Law, Trade and Labour. The research’s approach is the treatment given by the World Trade Organization (WTO) to this theme, considering its interaction with the International Labour Organization (ILO) and the challenges ahead. Sumário 1. Introdução; 2. Contexto Histórico de Regulamentação entre os Temas Comércio e Trabalho; 3. A Diculdade de se Encontrar um Padrão Trabalhista Universalmente Aceitável; 3.1 Custo Trabalhista Enquanto “Vantagem Comparativa”; 3.2 Relação entre o Conceito de Vantagem Comparativa e o Direito de Resposta a Violação de uma Obrigação Internacional; 4. Os Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho no Âmbito da OIT; 4.1 O Relatório Final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização; 5. Alternativas Viáveis dentro da Legislação Vigente da OMC; 5.1 Aplicação dos Princípios Gerais de Direito Internacional; 5.2 O Possível Futuro Caso dos EUA — S. 1631; 6. A Retomada da Querela — a “Busca em Vão” de uma Posição Única e Denitiva; 6.1 Viabilidade/Imperiosidade das Cláusulas Sociais; 7. Conclusão 1. Introdução A presente pesquisa relaciona os temas Comércio e Trabalho, sob o enfoque do tratamento a eles dispensado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) 2 . Na 1 Mestranda em Direito da Integração Européia pelo Europa-Institut der Universität des Saarlandes, Alemanha. Graduação em Direito pela UFMG. Coordenadora do Centro de Direito Internacional - CEDIN. Consultora do Nemer Caldeira Brant Advogados. 2 Esta organização, existente em sua forma institucionalizada desde 1995, quando da entrada em vigor doAcordo de Marrakesh , principal resultado da Rodada Uruguai, tem como seu escopo principal fornecer o “quadro institucional comum para a condução das relações comerciais entre seus Membros. (Assim o é conforme ponto 3 do “Final Act Embodying the Results of the Uruguay Round of Multilateral Trade Negotiations”- Ato Final englobando os resultados da Rodada de Negociações Multilaterais sobre Comércio, o Acordo OMC entrou

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma CláusulaSocial na OMC

KARINA MARZANO FRANCO1

ResumoO presente artigo visa relacionar, sob a perspectiva do Direito Internacional

Público, Comércio e Trabalho. O enfoque da pesquisa é o tratamento dispensado pelaOrganização Mundial do Comércio (OMC) ao tema, levando-se em consideração suainteração com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e os desafios à frente.

AbstractThe following article is aimed to relate, under the perspective of Public

International Law, Trade and Labour. The research’s approach is the treatment givenby the World Trade Organization (WTO) to this theme, considering its interactionwith the International Labour Organization (ILO) and the challenges ahead.

Sumário1. Introdução; 2. Contexto Histórico de Regulamentação entre os Temas Comércio

e Trabalho; 3. A Dificuldade de se Encontrar um Padrão Trabalhista UniversalmenteAceitável; 3.1 Custo Trabalhista Enquanto “Vantagem Comparativa”; 3.2 Relaçãoentre o Conceito de Vantagem Comparativa e o Direito de Resposta a Violação de umaObrigação Internacional; 4. Os Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho noÂmbito da OIT; 4.1 O Relatório Final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Socialda Globalização; 5. Alternativas Viáveis dentro da Legislação Vigente da OMC; 5.1Aplicação dos Princípios Gerais de Direito Internacional; 5.2 O Possível Futuro Casodos EUA— S. 1631; 6. A Retomada da Querela — a “Busca em Vão” de uma PosiçãoÚnica e Definitiva; 6.1 Viabilidade/Imperiosidade das Cláusulas Sociais; 7. Conclusão

1. Introdução

A presente pesquisa relaciona os temas Comércio e Trabalho, sob o enfoque dotratamento a eles dispensado pela Organização Mundial do Comércio (OMC)2. Na

1 Mestranda emDireito da IntegraçãoEuropéia peloEuropa-Institut derUniversität desSaarlandes,Alemanha.Graduação emDireito pela UFMG. Coordenadora do Centro de Direito Internacional - CEDIN. Consultorado Nemer Caldeira BrantAdvogados.

2 Estaorganização,existenteemsuaformainstitucionalizadadesde1995,quandodaentradaemvigordoAcordode Marrakesh , principal resultado da Rodada Uruguai, tem como seu escopo principal fornecer o “quadroinstitucionalcomumparaaconduçãodasrelaçõescomerciaisentreseusMembros. (Assimoéconformeponto3 do “FinalAct Embodying theResults of theUruguayRound ofMultilateralTradeNegotiations”-Ato Finalenglobando os resultados da Rodada de Negociações Multilaterais sobre Comércio, oAcordo OMC entrou

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medida em que o Trabalho é fator no custo de produção, de certo a sua regulamentaçãorepercute no comércio, bem como, logicamente, nas normas que visam regulamentá-lo,por conseguinte, naOMC. Entretanto, enquanto um dos ramos doDireito InternacionalPúblico, o Direito Internacional do Comércio não é o único que se preocupa com aquestão, como será discutidomais à frente, devendo-se, portanto, igualmente, levar emconsideração a regulamentação do assunto de uma perspectiva mais global, incluindo-se, então, a interação da OMC com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) eos desafios que se colocam para o futuro.A relação entre comércio e trabalho, como dito acima, é de interdependência3.

Isto porque o trabalho é um dos fatores de produção de bens e serviços, ao lado devários outros como capital, tecnologia, etc. O resultado desta combinação é vendidono mercado, sendo este expandido através do comércio. A expansão dos limites domercado consumidor implica, porém, num crescimento do risco de competição.A questão é, que se do ponto de vista do comércio exercido dentro das própriasfronteiras de um país, a competição pode ser regulada através da legislação interna, talsolução não se apresenta tão simples do ponto de vista internacional4. Isso porque aslegislações diferenciam-se entre si, principalmente no que diz respeito, por exemplo,aos padrões de proteção trabalhista5.Diantedaintensificaçãodasrelaçõescomerciaisedainfluênciaqueregulamentações

internas podem apresentar, frente ao vivo processo de globalização, o contexto quese apresenta é de contraposição de interesses entre países em desenvolvimento,que apresentam mão-de-obra barata, e os países desenvolvidos, nos quais já foramimplantados altos padrões de proteção trabalhista. A título comparativo, em 2004, amédia do salário bruto do trabalhador urbano e rural – anual e por trabalhador – naChina era de 4,397 PPP; na Tailândia, em 2001, de 4,509; e 6,143 no México, em

em força em 1º de Janeiro de 1995; Ato final da Rodada Uruguai e Acordo de Marrakesh Estabelecendo aOrganizaçãoMundial doComércio -AcordoOMC, assinado pelos 124 países e aComunidadeEuropéia queparticiparam da Rodada Uruguai de Negociações; a Declaração de Marrakesh foi assinada em 15 deAbrilde 1994, que de acordo com seu ponto 6, a assinatura do ditoAto Final significa o início da transição oGATTpara a OMC;Artigo I.1 doAcordo de Marrakesh Estabelecendo a OMC, Marrakesh, 15 de abril de 1994).AOMC assume, neste seu papel, algumas atividades basilares, com destaque: em proteção de um comérciolivre, visa participar ativamente das concessões em matéria tarifária, de modo a se alcançar uma reduçãosignificativa destas barreiras, tendo como fim a sua extinção, bem como proíbe, igualmente, barreiras não-tarifárias (Conforme artigos I, II, III e XI, especialmente, do GATT – General Agreement on Trade andTariffs). Se propõe ainda enquanto fórum internacional para a negociação em assuntos relativos às relaçõescomerciais multilaterais de seus Membros (Artigo III.2 doAcordo de Marrakesh Estabelecendo a OMC) eapresenta um Sistema de Solução de Controvérsias, responsável pela efetivação de suas regras comerciais(Funções da OMC,Artigo III.3Acordo deMarrakesh Estabelecendo a OMC).

3 MENG, Werner, ‘International Labor Standards and International Trade Law’, chapter 11 in Benvenisti,Eyal & Nolte, Georg, The Welfare State, globalization, and International Law (Berlin, Heidelberg, NewYork, Hong Kong, London, Milan, Paris, Tokyo: Springer, 2003), p. 374.

4 Ibid.5 Conforme site da Organização Internacional do Trabalho (www.ilo.org), são 183 os Membros da OIT, que

apesar da tentativa de uma normativização mínima e do compromisso de implementação de uma padrãomínimo de proteção trabalhista, apresentam códigos de direito de trabalho distintos.

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2002. Já nos países de economia avançada, 36,444 naAlemanha em 2003; 42,028 nosEUA, em 2005; e 37,094 na Noruega em 20046.

Os países desenvolvidos declaram serem os países em desenvolvimento umaameaça aos seus interesses comerciais, diante da competição dos produtos e serviçosmais baratos emfunçãodosmenores custos trabalhistas7. Frente a tal prenúnciodeperdade espaço no mercado, dois mecanismos são empregados pelos países desenvolvidospara restabelecer sua posição de competitividade: (i) o recurso a barreiras comerciaisou (ii) a pressão para que os países aumentem seus padrões de proteção trabalhista8.As barreiras comerciais são, em regra, proibidas pela OMC, que apresenta, como jádito, seu Sistema de Solução de Controvérsias como mecanismo efetivo para fazervaler suas normas comerciais. Neste sentido, o tema do Trabalho torna-se pertinenteao escopo da OMC9. Isto porque ela é o alicerce da Globalização Econômica10, sendoque sua lei limita a soberania dos seus Membros em erguer barreiras comerciais contraoutros Membros.Por outro lado, o segundo recurso, ou seja, influência para a melhoria dos

padrões trabalhistas até ao menos um padrão tido como “mínimo necessário”11, oschamados “core labour rights”, ou direitos fundamentais do trabalho12, representauma preocupação (real ou de um altruísmo falacioso há que se discutir) com violaçõesa direitos humanos no campo do direito trabalhista. Muitas instituições incentivamo aumento da proteção ao trabalho, por exemplo, ao determinar este índice comocondição para o recebimento de empréstimos (Fundo Monetário Internacional – FMI;Banco Mundial). Mas também Estados, ao garantir preferências comerciais pendentesdo tratamento trabalhista implantados por outros países, visam a interferir no direitoadotado nacionalmente – Sistema Geral de Preferência (SGP)13.

6 Segundo o site http://www.worldsalaries.org , que fornece uma base de dados para comparação internacionalda média salarial de vários países, em valores do dólar americano em 2005, o qual denominam “PPPDolar”.

7 Neste sentido, ver “Fallacy#5” – Falácia nº 5, do discurso doDiretor Geral da OMC, Pascal Lamy, em 12 deabril de 2010 – “Facts and Fictions in International Trade Economics - Conference on Trade and InclusiveGlobalization”. http://www.wto.org/english/news_e/sppl_e/sppl152_e.htm - Lamy critica o argumento deEmmanuel Todd, segundo o qual “livre comércio entre países em desenvolvimento como a China e paísesindustrializados é a razão para a crise econômica.” Na opinião de Todd, “a competição oriunda de paísesde baixo custo de mão-de-obra pressiona os salários dos países desenvolvidos e causam uma deficiência nademanda agregada.”

8 MENG,Werner, Ob. Cit, p. 372.9 Justamente porque esta organização trata das sanções comerciais em geral.10 MENG,Werner, Ob. Cit, p.373.11 Ibid. p. 372.12 Em inglês, utiliza-se a expressão “core labor rights”, traduzida para o português como direitos fundamentais

no trabalho, conforme texto em português da Declaração da OIT sobre os princípios e direitos fundamentaisno trabalho e seu seguimento, 86ª. Sessão, Genebra, junho de 1998, presente no site da OIT Brasil, visitadoem 19 de Janeiro de 2010. http://www.oitbrasil.org.br/info/download/declaracao_da_oit_sobre_principio_direitos_fundamentais.pdf

13 Sistema Geral de Preferências (SGP) – Trata-se da concessão de tratamento tarifário preferencial a certosprodutos oriundos de certos países em desenvolvimento ou de menor desenvolvimento relativo quepreencham os requisitos impostos pelos países desenvolvidos outorgantes desse programa, em especial,

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O que se observa é uma situação de assimetria quanto à regulamentação do trabalhono cenário do Direito Internacional Público, marcada por uma série de indefinições,tanto do ponto de vista do posicionamento dos países frente à questão, seja de formaindividual ou conjuntamente, como também sob o próprio ponto de vista institucional,na medida em que o tema se imiscui no âmbito de competência de duas importantesorganizações internacionais, OMC e OIT, sendo que ambas não apresentam, ainda,uma normativização objetiva do tema, nem uma construção jurisprudencial sólida.Ao lado da constatação dessa assimetria, coloca-se o debate sobre a necessidade

de, no futuro, a OMC introduzir uma cláusula social14 em um de seus acordos,enquanto uma interface com o tema Trabalho15. Independentemente da inclusão destacláusula, a OMC não pode abster-se das discussões relativas a direito do trabalho.Assim o é porque questões como a permissão de certos países ao trabalho infantil,ou a autorização de uso de trabalho forçado, sempre levantam a demanda pelo usode sanções comerciais para combatê-las. E a compatibilidade de tal recurso com asregras existentes da OMC sempre será questionada16.Dessa forma, uma distinção deve ser feita, posto que aqui se enquadram duas

questões: uma quanto à aplicação de medidas preventivas, como as barreirascomerciais, devendo esta ser respondida pela aplicação e interpretação das regrasvigentes da OMC e de direito internacional público, ao passo que questões sobreuma possível introdução de uma cláusula social diz respeito ao desenvolvimentodeste direito no futuro17, e a escolha da organização internacional competente paralidar com o tema.Este trabalho discute, portanto, o cenário apresentado acima, focando-se

especificamente nas questões de direito substantivo, ou seja, direito material e vigentedaOMC,mas sempreas enquadrandonasdiscussõespolíticas enocontextoeconômico,vez que o estudo desta temática pressupõe uma reflexão simultânea em um “únicoâmbito sócio-político-econômico-jurídico”18, assinalado por uma interdependência devalores, formando um todo indissociável.

requisitos em matéria trabalhista e social. DI SENA JR., Roberto. Ob. cit. p. 156. Council Regulation (EC)No 980/2005 of 27 June 2005, applying a scheme of generalised tariff preferences, OJ L 169/1, 30/06/2005,pp. 1-11 +Annexes I and III European Communities – Conditions for the Granting of Tariff Preferences toDeveloping Countries, complaint by India, Report of theAppellate Body,AB-2004-1,WT/DS246/AB/R, 7April 2004, at pp. 29-30, par. 78, pp. 34-49, paras. 89-118 and pp. 58-77, paras. 142-191.

14 Cláusula social pode ser definida, em termos legais, como qualquer cláusula em um acordo comercial queobriga os países signatários a respeitar direitos fundamentais do trabalho - GRANGER, Clotilde ; SIROEN,Jean-Marc. Core Labor Standards in Trade Agreements. From Multilateralism to Bilateralism. UniversitéParis Dauphine, Département d’Économie Appliqué. p.4. http://www.iddri.org/Activites/Conferences-internationales/21102005_CAT&E_siroen_com.pdf. E justamente por sua natureza contratual, é maisvinculativa que um compromisso moral, como ocorre na Declaração de Cingapura

15 MENG,Werner, Ob. cit., p. 373.16 Ibid.17 Ibid, p. 374.18 GAVA, Rodrigo. Ricos & Mendazes – O Dilema das Cláusulas Sociais nas Relações Multilaterais de

Comércio Internacional (Um Itinerário Sinuoso-Bloqueante para o Direito ao Desenvolvimento). EdiçõesAlmedina: 2008. p. 37.

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2. Contexto Histórico de Regulamentação entre os Temas Comércio e Trabalho

O comércio internacional, apesar de ser considerado o mais importante e maisantigo vínculo econômico entre os povos19, evoluiu ao longo dos séculos, com destaquepara a expressiva expansão, tanto do ponto de vista do alcance territorial, como daescala de produção20. O que se percebe, portanto, são os efeitos da Globalização21diretamente interligados ao comércio internacional. Neste contexto, por ocasiãodas chamadas Conferências de Bretton Woods, que representam a necessidade dospaíses, ao final da 2ª Guerra, e tendo em vista o flagelo resultante das batalhas quedesestabilizou todas as relações econômico-comerciais, de discutir uma reestruturaçãodo cenário internacional, foram determinadas as bases da atual configuração dosistema multilateral do comércio.

Notadamente quanto à interação entre Comércio e Trabalho é justamente nestaocasião que se teve a possibilidade de se desenvolver a primeira regulamentação dotema, regulamentação esta que, porém, logo percorreu outros rumos22. O comérciointernacional passou a ser compreendido pelos Estados, por ocasião do fim da Guerra,como um instrumento essencial para a recuperação do progresso23, e é esta motivaçãodos principais atores desta Conferência que é importante de ser compreendida, poisinfluencia exatamente os objetivos que eram, àquele tempo, almejados e a forma comoa questão trabalhista veio a ser regulamentada.Acontece que, dentro da estrutura dos Acordos Bretton Woods, em que foram

instituídos o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional para aReconstrução e Desenvolvimento (BIRD ou Banco Mundial), somava-se a criação daOrganização Internacional do Comércio (OIC).A fim de desenhar a OIC, foi elaborada a Carta de Havana (1948). Trata-se de

“documento precioso”, uma vez que identifica como “o comércio poderia ser ummecanismo de promoção de riqueza no mundo”24. Este documento, porém, jamais

19 A principal fonte de receita dos governos, no passado, provinha especialmente da tributação dos negóciosmercantis, sendo que, inclusive, vários impérios tiveram seu desenvolvimento atrelado ao controle das rotascomerciais da África e da Ásia -AMARAL JÚNIOR,Alberto do –ASolução de Controvérsias na OMC eaAplicação do Direito Internacional – Tese apresentada para Concurso de Provas e Títulos para Provimentode Cargo de Professor Titular no Departamento de Direito Internacional – Área de Direito InternacionalPúblico – da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – São Paulo: 2006 - pág. 25

20 As últimas décadas foram marcadas, especialmente, por um expressivo aprofundamento do intercâmbiomercantil, devido principalmente à liberalização do comércio de mercadorias no pós 2ª Guerra Mundial.

21 Pode-se definir Globalização Econômica, nas palavras do ex-Economista Chefe do BancoMundial, JosephStiglitz, como uma “maior integração dos países e pessoas, causada pela enorme redução dos custos detransporte e comunicação, além da extinção de barreiras artificiais ao fluxo de bens, serviços, capital econhecimento, e, de formamenos expressiva, de pessoas através das fronteiras”. STIGLITZ, J.Globalizationand Its Discontents (Penguin, 2002).

22 É o que se verá à frente quando da análise dos efeitos da não entrada em vigor da Carta de Havana e daexistência, em seu lugar, do GATT.

23 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 48.24 BARRAL, Welber Oliveira. O Comércio Internacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. 168p. - Coleção

Para Entender, p. 28.

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entrou em vigor. Isto porque, apesar dos Estados Unidos terem sido os iniciadores dasnegociações e a força por trás delas, o CongressoAmericano não conseguiu aprová-la.Sem a aprovação americana, a criação de uma organização internacional do comércioem que os Estados Unidos, enquanto nação líder da economia e do comércio mundial,não fossem membros, não pareceu, obviamente, muito atrativa. Essa falha levou a umburaco significativo da estrutura de Bretton Woods25.O que (r)existiu, em seu lugar, foi o chamado GATT – Acordo Geral de Tarifas e

Comércio, que consistia na segunda e terceira parte do trabalho para elaboração daCarta da OIC, feito pelo Comitê Preparatório estabelecido em 1946 e que se reuniuem Londres em outubro do mesmo ano e continuou em Abril a Novembro de 1947em Genebra. A segunda parte deste trabalho dedicou-se a negociações de acordosmultilaterais de redução recíproca de tarifas, e a terceira parte concentrou-se emdesenhar as “cláusulas gerais” referentes à obrigação de redução de tarifas26. Comodito, essas duas partes formavam o GATT, tendo sido acordado em Outubro de 1947,ao passo que as negociações da OIC sofriam menores avanços.Apesar de ser o GATT considerado parte da Carta, negociadores alegaram que não

se poderia esperar a conclusão das negociações da OIC para que o mesmo entrasse emvigor, especialmente porque os negociadores americanos estavam agindo de acordocom os poderes delegados pelo US Trade Legislation, renovado em 1945, mas cujoato expiraria em meados de 1948.Para que o GATT entrasse em vigor imediatamente, oito dos vinte e três países

que o negociavam assinaram o Protocolo Provisional de Aplicação do GATT (PPA),tendo os demais países, posteriormente, também o assinado. Mas apesar da conclusãoda Carta de Havana em 1948, tendo esta, porém, jamais entrado em vigor, só restou oGATT, enquanto uma organização internacional de facto para o comércio27.Assim, o que prevaleceu foi uma estrutura “capenga e provisória28” como era o

GATT, significando uma grande perda, visto que a Carta de Havana almejava associarà idéia de desenvolvimento econômico através da liberalização, o pleno emprego. Emseu texto continha dispositivo específico para eliminação das condições iníquas detrabalho, ao reconhecer que estas afetam negativamente as operações comerciais29. Talcapítulo trabalhista da Carta de Havana, porém, jamais foi incluído no GATT, dada acrença de que a OIC viria a substituí-lo.

25 VAN DEN BOSSCHE, Peter. The Law and Policy of the World Trade Organization. Text, Cases andMaterials. Second Edition. Cambrigde.

26 JACKSON, John. The World Trade Organization: Constitution and Jurisprudence. Royal Institute ofInternationalAffairs, 1998.

27 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.80.28 BARRAL,Welber Oliveira. Ob. cit., p.29.29 do Amaral Júnior, Alberto. Cláusula social: um tema em debate. Revista de Informação Legislativa.

Brasília a. 36 n. 141 jan./mar. 1999. p. 135.

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A Carta de Havana considerava violações aos direitos dos trabalhadores umaquestão internacional, cuja inclusão da cláusula social foi discutida na Conferência daONU sobre Comércio e Emprego30 1946-831. Artigo 7º, Capítulo II estabelece32:

OsMembros reconhecem…que todos os países têm um interesse comumno alcance e manutenção de padrões trabalhistas justos, relacionadosà produtividade, além da melhoria das condições salariais e detrabalho que a produtividade permitir. ... Reconhecem que condiçõesinjustas de trabalho, particularmente na produção para exportação,criam dificuldades para o comércio internacional, e, dessa forma, cadaMembro deve tomar todas as ações que sejam apropriadas e razoáveispara eliminar tais condições dentro do seu território.Membros que sejam também Membros da Organização Internacionaldo Trabalho (OIT) devem cooperar com aquela organização para darefeito a esse compromisso.Em todas as questões relacionadas com direitos trabalhistas que foremreferidas à Organização..., esta deve consultar e cooperar com a OIT.

Porém, com a falha em ratificar a Carta, somente um aspecto dos direitos dostrabalhadores foi levado em conta pelo GATT: produtos feitos por trabalhadorespresos. Além do Artigo XX(e) do GATT, que trata das Exceções Gerais, permitindoaos governos banirem o comércio de produtos que sejam resultado do trabalho depresos, não há nenhuma outra referência a direitos trabalhistas, apesar da demandapor esta inclusão ter crescido ao longo dos anos, com destaque para as negociaçõesda Rodada Uruguai33. Os Estados Unidos apresentam-se como o principal ator nadefesa da inclusão de padrões trabalhistas34. Porém, devido à falta de consenso entreos Membros, não há referência ao vínculo comércio e direitos trabalhistas no Acordode Marrakesh35, quando da criação da Organização Mundial do Comércio, principalresultado das negociações da Rodada Uruguai. Tal falta de consenso quanto ao temase repetiu em 1996, na Declaração Ministerial de Cingapura e seguiu este padrão nasrodadas seguintes36, mantendo o mesmo modelo até os dias atuais.

30 Ato final da Conferência da ONU sobre Comércio e Emprego: Carta de Havana para uma OrganizaçãoInternacional do Comércio (1947).

31 K.D.Raju. Social Clause inWTO andCore ILOLabour Standards: Concerns of India andOther DevelopingCountries. Federation of Indian Chamber of Commerce and Industry (FICCI) - Stakeholders meeting 20December 2002.

32 GRANGER, Clotilde ; SIROEN, Jean-Marc. Ob. cit.33 Hoe Lim. The Social Clause: Issues and Challenges.34 STERN, Robert M. Labor Standards and Trade Agreements. Revue D’Economie Du Developpement,

“Analyser les Relations Nord-Sud” (Analyzing North-South Relations), Essais en l’honneur d’Elliot Berg.University of MichiganAugust 18, 2003.

35 Ato final da Rodada Uruguai e Acordo de Marrakesh Estabelecendo a Organização Mundial do Comércio(Acordo OMC).

36 Genebra, 1998; Seattle, 1999; Doha, 2001; Cancún, 2003; Hong Kong, 2005; Genebra, 2009.

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Isto mostra como a preocupação social, fortemente presente nos primórdios daregulamentação do comércio internacional, esvaneceu-se, transformando o sistemaao longo dos anos em um aparelho cada vez mais focado essencialmente em questõescomerciais técnicas e pragmáticas.

3.A Dificuldade de se Encontrar um Padrão Trabalhista UniversalmenteAceitável

Cada país passou por uma evolução cultural e histórica diferente, que influenciamdiretamente a forma como cada sociedade se organiza, tanto do ponto de vista socialcomo político. Assim o é também com a questão de proteção dos direitos humanos37,em maior ou menor grau, neste conceito inserindo-se também o direito do trabalho38.Apesar da distinção entre as diversas legislações trabalhistas, importante ressaltar

que padrões salariais, condições e garantias mínimas laborais, além dos benefíciostrabalhistas, tudo isso representa custos na produção. Poder-se-ia dizer que, bens eserviços produzidos com custos trabalhistas mais baixos seriam mais competitivos nomercado.Tal competição forçaria os demais produtores a baixar seus custos, e isso seriafeito, segundo os países desenvolvidos, através da redução dos seus elevados padrõestrabalhistas, com o objetivo de recuperar a competitividade de determinados produtos.Este fenômeno é conhecido pela expressão “race to the bottom39” e contribuiriapara uma regressão do avanço já alcançado sob o ponto de vista dos direitos sociaislegalmente reconhecidos. Dessa forma, dissemina-se na sociedade o medo de queos investimentos, que antes se concentravam em países de altos padrões de proteçãotrabalhista, tenham seu fluxo de capital invertido, em direção aos países em que tais

37 Umexemplo precioso para entender os diferentes estágios de proteção dos direitos humanos por cada Estadoé aAlemanha.Oconceito de “dignidade da pessoa humana”, por exemplo, apresenta na legislação germânicaum significado mais amplo que em outros sistemas e possui posição basilar na sua Constituição.A razão deassim o ser é devido às graves violações a direitos humanos ocorridas nos tempos de Hitler, que causaramgrande mobilização da comunidade internacional e, igualmente, na sociedade alemã. Por este motivo, aproteção de direitos humanos naAlemanha tem um caráter único, fruto de sua própria história. E esse mododiferenciado com que aAlemanha lida com a questão de direitos humanos já foi reconhecido pela Corte deJustiçaEuropéia, nocasoOmegaSpielhallen-undAutomatenaufstellungs-GmbHv.OberbürgermeisterinderBundesstadt Bonn, C-36/02 – Julgamento pela Corte (Primeira Câmara) 14 deOutubro de 2004; http://curia.europa.eu. No referido caso, a proibição alemã da comercialização, em seu território, de um jogo que simulahomicídio, conhecido como “Laserdrome”, foi reconhecida como legal.ACorte reconheceu a interpretaçãoconstitucional alemã deste direito fundamental, apesar de ser o direito diferentemente interpretado em outrospaíses membros da Comunidade Européia, significando importante precedente para a jurisprudência daCorte Européia.

38 A Declaração da OIT de 1998 sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho reconhece aqualidade de direitos humanos às garantias trabalhistas (item 2). DI SENA JR., Roberto. Ob. cit. p.106.

39 Esta expressão em inglês é de difícil tradução, pois trata de fenômeno sócio-econômico que ocorre entreEstados, quandoacompetiçãoentre eles éde tal graude intensidadequeessespaíses se sentiriamincentivadosa desmantelar padrões regulatórios já existentes.

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padrões não foram implantados, pelo menos não em um alto grau, chamados de paísesde “cheap labor” 40, ou seja, de mão de obra barata.

3.1 Custo Trabalhista Enquanto “Vantagem Comparativa”A questão não pode, porém, ser analisada sob enfoque tão simplista. É claro que

há outros fatores que influenciam na atração de investimentos, como, por exemplo,estabilidade política, infra-estrutura adequada, presença de recursos naturais,direito empresarial desenvolvido, confiança no sistema judiciário, baixos índicesde corrupção, segurança, dentre outros. Além do que, eficiência na produção étambém determinada por outros elementos além do custo da mão de obra, como aprodutividade, esta apurada em função do nível de desenvolvimento tecnológicoe da capacitação da força laboral41. Com propriedade sustenta a Organização paraCooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) exatamente que maiores padrõestrabalhistas são um fator de sucesso econômico e não uma falha econômica42.Ademais,como desenvolvido na teoria neoclássica do comércio internacional, as vantagenscomparativas são influenciadas por todos os fatores de produção, que podem atuar nadiferença de custos de produção, e, não apenas, o fator trabalho43.Entretanto, frente ao medo de perder competitividade no mercado para os produtos

elaborados com menores gastos trabalhistas, a resposta dos países que se vêemameaçados acaba sendo a busca da solução mais fácil, qual seja, protecionismo44.Buscam evitar a perda, primeiramente, em seus mercados internos, do espaço ocupadopelo produto. Em seguida, expandem este objetivo para os mercados de países aliadossob o ponto de vista econômico, através de acordos que os obriguem a implementarcertos padrões de proteção trabalhista, de forma que os produtos oriundos destes paísesnão sejam competidores dos seus. Neste último caso, temos, por exemplo, o AcordoNorte-Americano sobre Cooperação Trabalhista (NAALC45), acordo suplementarao Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA). Basicamente, atravésdele, EUA, Canadá e México comprometem-se a implementar seu direito trabalhistanacional46. Trata-se do primeiro acordo internacional sobre trabalho a ser vinculado aum acordo sobre comércio internacional47.Protecionismo, no entanto, é fortemente combatido pela OMC. Tal organização

visa, justamente, evitar a tentação de se valer de medidas protecionistas. Os objetivos

40 MENG,Werner, Ob. cit., p. 375.41 Ibid.42 OECD, Trade and Labour Standards: A Study of Core Worker’s Rights and International Trade (1996).

http://www.oecd.org/dataoecd/2/36/1917944.pdf visitado em 04 de Fevereiro de 201043 Teoria Heckscher-Ohlin – “TH-O” in GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p.55.44 MENG,Werner, Ob. cit., p. 375.45 North American Agreement on Labor Cooperation (NAALC), assinado em 14 de Setembro, Entrou em

força em 1º Janeiro de 1994.46 HEPPLE,Bob,LabourRegulation in InternationalizedMarkets, chapter 10 inPicciotto,Sol andMayne,Ruth

(eds.) Regulating International Business: Beyond Liberalization (London: MacMillan Press in Associationwith Oxfam, 1999), p.108.

47 Site oficial da NAALC, visitado em 18 de Janeiro de 2010. http://www.naalc.org

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da OMC baseiam-se no reconhecimento de que o recurso a medidas protecionistasem prol de alguns poucos acaba gerando prejuízos maiores e mais profundos do queos benefícios que se almejava. Tal assimetria já foi denunciada por vários estudiosos,incluindo o Diretor Geral da OMC, Pascal Lamy48, em defesa do livre comércio.Ele denuncia o recurso ao protecionismo como um dos mais antigos e seguros dosrecursos de política doméstica, mas que muitas vezes leva em conta os ganhos declasses especiais, e não da sociedade como um todo49.Se a forma tradicional do protecionismo configura-se na imposição de barreiras

tarifárias – protecionismo clássico, no pós GATT (1947) e o compromisso dos Estadosem reduzir progressivamente as barreiras tarifárias, tendeu-se à criação de novasbarreiras comerciais “não-tarifárias”, especialmente com as crises dos anos 7050, dentreas quais incluem-se as barreiras “sócio-laborais”. O protecionismo reconfigurou-se,portanto, na era globalizada: neoprotecionismo51.A idéia de que países podem se beneficiar do comércio internacional, porém, tem

suas origens já em 1776, quandoAdam Smith, em A Riqueza das Nações, já defendia oargumento da especialização. Smith revoluciona a teoria comercial existente até então,basilar de toda a era mercantilista, quando se acreditava que a riqueza de uma naçãocorrespondia à quantidade absoluta de ouro e prata que esta possuía52. Assim, na fasemercantilista, os países realizavam suas relações comerciais em um processo de “soma-zero”, em que uma nação somente se enriqueceria às custas de outra53. Smith faz cairpor terra essa idéia de que a riqueza seria limitada, pois considera o trabalho a fonte detoda riqueza, e defende que interesses das nações poderiam se tornar complementares54.Segundo ele, cada país deveria se especializar naquele produto em que seja capaz deproduzir com menores custos, e utilizar parte desses produtos para adquirir de outropaís o produto que aquele é capaz de produzir com menor custo, ao invés de investi-lona produção nacional certamente mais cara e menos produtiva.Assim, os recursos serãoempregados de forma que o país tenha, ao menos, alguma vantagem55.Tais idéias foram posteriormente desenvolvidas por David Ricardo em sua teoria

das “vantagens comparativas”56. Seu objetivo é dar sustentação teórica à argumentação

48 LAMY, P. Trends and Issues FAcing Global Trade. Discurso proferido em Kuala Lumpur, Malásia em 17de Agosto de 2007. http://www.wto.org/english/news_e/sppl_e/sppl65_e.htm visitado em 18 de Janeiro de2010.

49 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p. 21.50 DI SENA JR., Roberto. Comércio Internacional e Globalização – A Cláusula Social na OMC. 1ª. Ed.

(2003), 3ª. tir. Curitiba: Juruá, 2006. p. 69.51 “Umavezqueoprotecionismoabertopossui várias restriçõesnegociadas e acordadas emâmbitomultilateral,

os países procuram novas alternativas para defender a indústria doméstica e dar vazão às pressões exercidaspor grupos internos que buscamcompensar a falta de competitividade internacional combarreiras comerciaisdisfarçadas sob o manto da isenção técnica”, por exemplo. DI SENAJR., Roberto. Ob. Cit. p. 72.

52 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 42.53 Ibid. p. 43.54 Ibid. p. 44.55 SMITH, Adam. An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations (1776), editado pela E.

Cannan (University of Chicago Press, 1976), vol.1.56 Sua obra mais famosa Os Princípios de Economia Política e Tributação em 1817.

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em favor da liberdade de comércio e justificar a existência do comércio entre asnações. Segundo esse pensamento, cada país deve se especializar na produção daquelamercadoria em que é relativamente mais eficiente, ou seja, que tenha um custo deprodução para o país relativamente menor. Uma vez se especializando na produção,deverá focalizar neste produto a sua exportação. Por outro lado, esse mesmo país deveimportar aqueles bens cuja produção implicar num custo relativamente maior – nosquais a sua produção for considerada relativamente menos eficiente. Deve procederdesta forma, mesmo se há outro país que produz este produto melhor do que ele,porque este mesmo país deverá investir em outro produto, que será o que ele produzmelhor. Neste modelo, a vantagem, quando analisada comparativamente, beneficiarásempre os países investidores, que estarão se especializando na produção que têmmais chances de prosperar.

O objetivo de tal teoria é buscar a idealização de um modelo que garanta atodos os países que participam do comércio internacional um resultado o maislucrativo possível, em prol de uma igualdade econômica. Tal modelo se baseia numacomunidade internacional idealmente livre no âmbito comercial, em que os paísesgozariam de tamanha liberdade na escolha de seus investimentos que os aplicaria naprodução de bens que possa produzir com o menor custo de produção possível, dadosseus recursos naturais, sua mão-de-obra e seu capital. O excedente desta produçãoespecializada seria exportado, e no tocante às demais mercadorias que a populaçãonecessitasse, o país as importaria dos países especializados na produção de cada umarespectivamente, vez que estes seriam os mais aptos a produzi-las com o menor custo.Os preços da mercadoria no mercado se aproximariam, desta forma, ao preço doscustos de produção do bem. Com a produção baseada nos menores custos existentes,os lucros seriam os maiores possíveis, o que favoreceria a lógica capitalista.Dentro desta lógica, os custos trabalhistas seriam um importante fator de vantagem

para certos países, carentes, porém, de tecnologia ou capacidade econômica57. E,teoricamente,omecanismoéclaro,ondeamão-de-obraébarata,produçãoquenecessitede mão-de-obra intensiva deve ser transferida para este local58, caso não haja grandediferença nos outros fatores de produção. Tal transferência, porém, geraria nos paísesdesenvolvidos, perda de emprego e demandaria auxílio governamental, investimentosem requalificação profissional, reorientação econômica, dentre outros. Esta adaptaçãoaos novos requerimentos do mercado, porém, é difícil e a solução implantada acabasendo a imposição de medidas restritivas59, que ao ajudar, artificialmente, os vencidosem matéria de competição internacional, gera uma perda coletiva.60.

57 MENG,Werner, Ob. cit., p. 377.58 Ibid.59 Taismedidas seriam,comoafirmaRobertoDiSenaJr. emseu livropolíticasde secondbest, ou seja, “as tarifas

seriam a “segundamelhor” opção, caso nenhuma outra medidamenos negativa pudesse ser empregada”. DISENAJR, Roberto. Ob. cit. p. 54.

60 “Os Estados devem enfrentar seus problemas internos com políticas eficazes, ao invés de buscar soluçõestemporárias cujos custos superammuitas vezes os benefícios”. Ibid. p. 59.

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Argumenta-seque retirar avantagemcomparativadeumpaíséomesmoqueprivá-lodeseu direito ao desenvolvimento61. Ou seja, os países em desenvolvimento “ao conseguiremdispor no mercado mundial produtos com preços diferenciados, mesmo que dependentesdos baixos custos de mão-de-obra, nada fazem além de beneficiarem-se dessa vantagemcomparativa para, a posteriori, consolidarem-se no mercado global em setores comerciaisintensivos em trabalho, acumularem riqueza, distribuírem e aplicarem esse recurso demaneira eficaz62 e, ao final, apresentarem verdadeiras “vantagens comparativas”, maisestruturantes e permissivas de um sustentável desenvolvimento”63.AOMC, e mais precisamente, O Entendimento sobre Solução de Controvérsias da

OMC (DSU), enquanto uma das principais ferramentas para garantir o funcionamentodo conceito de vantagem comparativas64, reagem exatamente contra o recurso amedidas protecionistas.

3.2 Relação entre o Conceito de Vantagem Comparativa e o Direito de Respostaa Violação de uma Obrigação Internacional

Durante a Reunião Ministerial da OMC em Cingapura, em Dezembro de 1996,novamente não se alcançou um consenso acerca da introdução de uma cláusula socialno texto legal daOMC, sendo esta, então, negada65. Ficou estabelecido pelaDeclaraçãoMinisterial de Cingapura, e futuramente reafirmado na 4ª Conferência Ministerial emDoha, que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) seria o órgão competente“para estabelecer e lidar com os direitos fundamentais no trabalho internacionalmentereconhecidos”66.De acordo com o item 4 da Declaração Ministerial de Cingapura fica entendido:

“Nós renovamos nosso compromisso de observância dos direitosfundamentais no trabalho internacionalmente reconhecidos... Nósrejeitamos o uso de normas trabalhistas para fins protecionistas, econcordamos que não se deve questionar de forma alguma a vantagemcomparativa dos países, particularmente os países em desenvolvimentode baixos salários.”67

61 O Direito ao Desenvolvimento seria hoje aceito mais facilmente pela comunidade internacional, ainda queinexistente unanimidade. GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 75.

62 DI SENA JR., Roberto. Ob. cit. p. 52. Valendo-se do raciocínio desenvolvido por este autor, necessáriodiferenciar, portanto, a defesa do livre comércio enquanto gerador de riqueza da sua distribuição, assuntoeste da seara da política econômica, ou seja, os impactos do liberalismo sobre a distribuição de renda devemser administrados pelos governos locais. O liberalismo objetiva estimular uma eficiente alocação dos fatoresde produção, mas a justiça social e a distribuição da riqueza fazem parte de uma agenda mais ampla.

63 MENG,Werner, Ob. cit., p. 333.64 Ibid. p. 377.65 GRANGER, Clotilde ; SIROEN, Jean-Marc. Ob. cit.66Flasbarth,Axel; Lips,Markus. Effects of aHumanitarianWTOSocialClause onWelfare andNorth-SouthTradeFlows. January 2003 Discussion paper no. 2003-03 Department of Economics. University of St. Gallen. www.fgn.unisg.ch/public/public.htm

67 Tradução para o português com o uso das versões em inglês e espanhol do texto oficial presente no siteda OMC, visitado em 20 de Janeiro de 2010. http://www.wto.org/english/thewto_e/minist_e/min96_e/

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Percebe-se que, com a Declaração Ministerial de Cingapura, o vínculo entrecomércio e trabalho é invertido, quando comparado com a Carta de Havana. Enquantonesta, a violação de normas trabalhistas é considerada, potencialmente, origem dedisputas comerciais, devendo-se, portanto, velar pela equalização da proteção dedireitos trabalhistas. EmCingapura, ao contrário, rejeita-se tal incentivo à aplicaçãodosdireitos fundamentais do trabalho, ao passo que estes poderiam ser contra-produtivos,ao distorcer as vantagens comparativas e prejudicar o comércio68. Países de mão-de-obra barata argumentam que admitir o contrário do que o afirmado em Cingapuraimpediria os mesmos de implementarem, no futuro, graças ao desenvolvimentoeconômico, padrões trabalhistas mais elevados, justamente por restringir a capacidadecomercial dos mesmos.Baseiam-se, para tanto, principalmente, na evolução do termo desenvolvimento,

que anteriormente utilizado como desenvolvimento econômico, já se fala hoje emdesenvolvimento sustentável, ou seja, levando-se em conta o aspecto social, enquantoum desenvolvimento inclusivo69.Apesar do estabelecido em1996, osEstadosUnidos entenderamqueo assunto havia

sido deixado em aberto70, e continuou a pressionar para que o assunto fosse incluído naagenda da OMC71, sempre sofrendo a resistência dos países em desenvolvimento, queacusam haver um protecionismo disfarçado por trás do argumento retórico72. EstadosUnidos e Europa também continuaram a insistir no tema, não só pela via multilateralde negociação, mas igualmente, através de vários acordos regionais73.No mais, ficou estabelecido na Declaração Ministerial de Cingapura que as

Secretarias daOMCeOITcontinuarão a colaboração existente74.TambémaDeclaraçãoda OIT sobre os princípios e direitos fundamentais no trabalho e seu seguimento75, emseu item 5, proíbe o uso de normas trabalhistas para fins protecionistas: “Estabelece-se que as normas do trabalho não deveriam ser utilizadas para fins de protecionismocomercial e que nada na presente Declaração e seu seguimento poderá ser invocado ouutilizado de outromodo para tais fins; ainda, não deveria demodo algum colocar-se emquestão a vantagem comparativa de qualquer país com base na presente Declaração eseu seguimento.76”

wtodec_e.htm; http://www.wto.org/spanish/thewto_s/minist_s/min96_s/wtodec_s.htm68 GRANGER, Clotilde ; SIROEN, Jean-Marc. Ob. cit.69 GAVA, Rodrigo. Ob. Cit. p. 73.70 STERN, Robert M. Ob. cit.71 Conferência Ministerial em Genebra, 1998; Conferência Ministerial em Seattle, 1999; Conferência

Ministerial de Doha, 2001.72 K.D.Raju. Ob. cit.73 Ibid.74 Tradução para o português com o uso das versões em inglês e espanhol do texto oficial presente no site

da OMC, visitado em 20 de Janeiro de 2010. http://www.wto.org/english/thewto_e/minist_e/min96_e/wtodec_e.htm; http://www.wto.org/spanish/thewto_s/minist_s/min96_s/wtodec_s.htm

75 86ª. Sessão, Genebra, junho de 1998, presente no site da OIT Brasil, visitado em 19 de Janeiro de 2010.http://www.oitbrasil.org.br/info/download/declaracao_da_oit_sobre_principio_direitos_fundamentais.pdf

76 Ibid.

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Percebe-se, porém, que há pontos permissivos de questionamento no raciocínio.Defensores da causa dos países do Primeiro Mundo afirmam que, apesar daconfirmação da teoria de David Ricardo, de que, de fato, as vantagens comparativassão a força principal que move as relações comerciais, este fato não prejudicaria,nem se conflitaria, com a possibilidade do uso de sanções comerciais como medidapreventiva para violações de direitos humanos, normas de tratados internacionais ou,ainda, direito costumeiro de outros países77. Isso se deve ao fato de que, a violaçãode uma obrigação internacional não deveria ser entendida como a realização deuma vantagem comparativa78. Apesar de poder diminuir o com este fim, o uso desanções comerciais não seria considerado protecionismo per se, apesar de se admitira possibilidade de questionar se usá-las seria, no caso, razoável ou estrategicamenterecomendável79.Adiscussãonocenário internacional é, portanto,marcadademáximacomplexidade,

bem definida a discussão no fato de, no conflito entre ricos e pobres, todos estãoa sustentar “argumentos altruístas com doses de protecionismo ou argumentoscomerciais com doses de barbárie80”. Por isso que, frente à complexidade da questãoe dos interesses conflitantes em jogo, faz-se necessária a análise dos resultados finaisperseguidos pelas medidas tomadas pelos países desenvolvidos. Assim o seria com oobjetivo de se certificar se a real intenção por detrás é assegurar o cumprimento pelacomunidade internacional de suas obrigações relativas a direitos humanos, ou se seriaeste recurso apenas uma forma sutil de compensar as perdas de mercado sofridas.Diante de tal conflito teológico, pertinente é ainda uma segunda indagação. Seria umauniformização dos direitos trabalhistas algo a ser imposto ao Terceiro Mundo, sobpena de sancionamentos?Direitos humanos são, de fato, vinculantes aos Estados que os aceitaram, seja

pela via dos tratados internacionais, seja por configurarem estes, direito costumeiro81.Direitos humanos tambémno campo trabalhista já forammencionados emvários textoslegais, como, por exemplo, pela ONU, na Declaração Universal dos Direitos Humanos(1948), que consagra o direito ao trabalho, à liberdade de profissão, a condições justasde emprego, limitação da jornada de trabalho e igualdade de remuneração, sendaesta capaz de garantir a existência digna do trabalhador e sua família. Consagra-se, igualmente, o direito de organização sindical82. Também no âmbito da ONU, oPacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966)83, direitostrabalhistas são reconhecidos enquanto direitos humanos, por exemplo, impõe-se aos

77 MENG,Werner, Ob. cit., p. 378.78 Ibid.79 Ibid.80 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 35.81 Artigo 38 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.82 Artigos 23 e 24 da Declaração Universal dos Direitos Humanos http://www.un.org/en/documents/udhr

visitado em 09 de Fevereiro de 2010.83 Entrou em vigor em 3 de Janeiro de 1976 conforme artigo 27.

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Estados a obrigação de estabelecer limite de idade para o trabalho, punindo quemdesrespeite a proibição do trabalho infantil84.Também do ponto de vista regional, organizações dedicadas à proteção dos direitos

humanos incluem normas trabalhistas sob seu escopo. É o caso, por exemplo, noSistema Interamericano de Direitos Humanos, em que se proíbe o trabalho forçado e aescravidão, conforme artigo 6º do Pacto de San José da Costa Rica (1969).Deve-se, contudo, ressaltar que a forma como os direitos trabalhistas são

proclamados nos textos legais é variável. Podem estar estabelecidos como verdadeirosdireitos individuais especificamente definidos e com a possibilidade clara do uso desanções no caso de sua violação, ou são declarados apenas como obrigações estataisde se garantir, progressivamente, maiores padrões de proteção trabalhista, de umaforma mais ampla85. É o caso, por exemplo, do Pacto Internacional dos DireitosEconômicos, Sociais eCulturaismencionado acima, e segundo o qual, os Estados-parte“comprometem-se a adotar medidas... até o máximo de seus recursos disponíveis”,com o objetivo de assegurar, progressivamente, os direitos reconhecidos no pacto86.Apesar de submetidas à condição dos “recursos disponíveis”, tais tratados

internacionais estipulam verdadeiras obrigações para os Estados. E o desrespeito deuma obrigação internacional, em Direito Internacional Público, acarreta, em tese, aresponsabilidade do Estado87, sendo este, portanto, um dos principais argumentos quefundamentam a posição dos países desenvolvidos.

No que se refere a obrigações trabalhistas internacionalmente reconhecidas,indispensável o estudo da OIT, uma vez que esta já definiu os princípios e direitosfundamentais no trabalho.

4. Os Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho no Âmbito da OIT

Por não apresentar nenhuma exceção geral em seu texto, salvo no caso de produtosresultantes do trabalho de presos88, discute-se a necessidade de se introduzir umacláusula social aos acordos da OMC, visando-se, assim, solucionar as dificuldadesinerentes à relação entre Comércio e Trabalho. Mas, por detrás desta questão, coloca-se, de forma ainda mais basilar, a pergunta: Seria, de fato, a OMC a organização maisapropriada a lidar com as práticas laborais injustas89?

84 Artigo 10(3) do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais http://www2.ohchr.org/english/law/pdf/cescr.pdf visitado em 09 de Fevereiro de 2010.

85 MENG,Werner, Ob. cit., p. 384.86 Artigo 2(1) do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais http://www2.ohchr.org/

english/law/pdf/cescr.pdf visitado em 09 de Fevereiro de 2010.87 Projeto de Artigos sobre Responsabilidade Internacional dos Estados por Ato Internacionalmente

Ilícito(2001)- Comissão de Direito Internacional – visitado em 09 de Fevereiro de 2010 http://untreaty.un.org/ilc/texts/instruments/english/draft%20articles/9_6_2001.pdf

88 Artigo XX(e) do GATT.89 Alega-se que os especialistas em comércio, atuantes naOMC, não deteriam, necessariamente, conhecimento

em direito do trabalho. MENG,Werner, Ob. cit., p. 379.

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC 133

Ao contrário deste entendimento reconheceu-se, em Cingapura, em 1996, aOIT como “órgão competente” para lidar e estabelecer os direitos fundamentaisdo trabalho e afirmou-se o suporte dos Membros da OMC ao trabalho da OIT empromovê-los90. Em resposta a esta declaração da OMC, foi elaborada a Declaração daOIT de 1998 sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho91. Esta declaraçãoestabelece que, ainda que não tenham sido ratificadas as Convenções da OIT, todosos seus Membros, devido ao simples fato de participarem da Organização, têm ocompromisso de respeitar os princípios relativos aos direitos fundamentais que sãoobjeto dessas Convenções92. Estabelece tais princípios como sendo:

(a) a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito denegociação coletiva;

(b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ouobrigatório;

(c) a efetiva abolição do trabalho infantil; e(d) a eliminação da discriminação em matéria de emprego eocupação93.

Aimportância destaDeclaração está, principalmente, no reconhecimento da qualidadede direitos humanos a essas garantias trabalhistas94. No que tange o relacionamentotrabalho e comércio, nega a possibilidade de se usar sanções contra a violação de taisprincípios, ao ressaltar que as “normas do trabalho não deveriam ser utilizadas para finsde protecionismo comercial95”.De fato, é repassadapara aOITa responsabilidadeemlidar comasnormas trabalhistas.

Diante disto, é imperioso avaliar o funcionamento da OIT para saber se esta organizaçãoestaria, realmente, capacitada para lidar com a temática comércio-trabalho.AOIT,agênciadoSistemadasNaçõesUnidas, criadaem191996, quandodaelaboração

de sua Constituição (Tratado de Versailles), já consiste hoje em 188 Convenções97 e 199Recomendações98 sobre a proteção de direito trabalhistas, concentrando conhecimento eexperiêncianoassunto.Trata-sedeumaorganizaçãopraticamenteuniversal, apresentandoum total de 183 países99. É a única organização internacional com uma estrutura tripartite,

90 Item 4 da Declaração de Cingapura, 1996.91 MENG,Werner, Ob. cit., p. 380.

KAUFMANN, Christine,Globalisation and Labour Rights: The Conflict between Core Labour Rights andInternational Economic Law (Oxford and Portland, Oregon: Hart Publishing, 2007), p.68.

92 Item 2 da Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (1998) http://www.oitbrasil.org.br/info/download/declaracao_da_oit_sobre_principio_direitos_fundamentais.pdf visitado em05 de Fevereiro de 2010.

93 Ibid.94 DI SENAJR., Roberto. Ob. cit. p. 106.95 Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (1998), Item 5.96 Conferência da Paz, 1919.97 http://www.ilo.org/ilolex/english/convdisp1.htm visitado em 05 de Fevereiro de 2010.98 http://www.ilo.org/ilolex/english/recdisp1.htm visitado em 05 de Fevereiro de 2010.99 http://www.ilo.org/public/english/standards/relm/country.htm visitado em 05 de Fevereiro de 2010.

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em que cada um de seusMembros, nas reuniões da Conferência Geral, é representado poruma delegação com dois representantes do governo, um representante dos trabalhadorese um representante dos empregadores100, apresentado todos eles os mesmos direitos.Quando comparada à OMC, porém, tal organização apresenta uma estrutura

desvantajosa em termos de escopo, adjudicação e execução das suas normas101. Assimo é porque as recomendações da OIT não são legalmente vinculantes e suas convençõesapenas são obrigatórias aos países que as assinaram e ratificaram102. Diferencia-se,portanto, dosAcordosdaOMC,vezquenestaprevalecea regrado“singleundertaking103”,ao passo que na OIT abri-se a possibilidade de seus membros escolherem as regras àsquais desejam vincular-se, variando o número de países signatários de acordo com cadaConvenção104.Além disso, não há nenhum sistema de solução de controvérsias obrigatório na OIT,

restando somente para a resolução dos conflitos os instrumentos clássicos de direitointernacional público, como recurso à Corte Internacional de Justiça105, cuja jurisdiçãodepende, no entanto, de aceitação expressa dos países106.Dentro, ainda, do sistema de controle da OIT, há mecanismos de fiscalização,

através do qual os países-membros têm a obrigação de apresentar relatório anual sobre aimplementação de cada uma das convenções ratificadas107. O Comitê de Especialistas naAplicação de Convenções e Recomendações examina tais relatórios e a conformidadedas legislações e da prática dos países com as convenções ratificadas, o que serádiscutido pelo Comitê de Aplicação de Normas da Conferência tripartite. Há aindaprocedimentos dentro da OIT para atender a reclamações quanto à conformidade ounão dos seus membros com as normas de Convenções por eles ratificadas, seja por parte

100 Artigo 3(1) da Constituição da OIT. http://www.ilo.org/public/english/bureau/leg/amend/constitution.pdfvisitado em 05 de Fevereiro de 2010.

101 MENG,Werner, Ob. cit., p. 379.102 Ibid.103 Em seu atual formato, o sistema é governando pelo princípio do single undertaking, ou seja, um

pacote único, significando que, para se tornar um Membro, e em todas as negociações, os países têmque aceitar as regras da OMC em sua integralidade. Não há mais espaço para negociar separadamentecada área, o que, por um lado, provê uma balança de poderes, uma vez que os Estados terão que levarem consideração o interesse dos demais quando desejarem negociar em seu próprio interesse. Esteequilíbrio é criado quando os Membros têm que ceder em algum aspecto para que ganhem em outro.Por outro lado, tal modelo pode tornar o processo de negociação muito moroso e complicado, assimcomo ocorreu com a última experiência com a Agenda de Desenvolvimento de Doha (DDA) e osdesacordos sem fim sobre agricultura e subsídios entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.Neste sentido, há discussões se um modelo de pacote único é o mais apropriado e se este deveriacontinuar a definir os termos da DDA. Sobre este tem aver: Craig VanGrasstek and Pierre Sauvé - TheConsistency ofWTORules: Can the Single Undertaking Be Squared with Variable Geometry? Journalof International Economic Law Vol. 9 No. 4 Oxford University Press 2006.

104 Por exemplo, a Convenção 141 da OIT sobre Organizações dos Trabalhadores Rurais (1975) foi ratificadasomente por 40 Membros e a Convenção 131 sobre a Fixação dos Salários Mínimos (1970) foi ratificadasomente por 51Membros. http://www.ilo.org/ilolex/english/newratframeE.htm visitado em 05 de Fevereirode 2010.

105 Artigo 29 e 33 da Constituição da OIT.106 Artigo 36 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça.107 Artigo 22 da Constituição da OIT.

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC 135

das organizações de trabalhadores e empregadores108, seja por parte de outros países109,sendo que uma Comissão independente de Inquérito, após investigar tais reclamações,expede recomendações110.Além das dificuldades expostas acima, adiciona-se que ainda não se chegou a um

consenso acerca da admissibilidade ou não de sanções comerciais a fim de se fazercumprir direitos fundamentais do trabalho. Países desenvolvidos demonstram-se a favorde se utilizar os instrumentos da OMC em disputas relativas às diferentes legislaçõestrabalhistas. Porém, teme-se que o uso demecanismos que combatem práticas comerciaisinjustas, como é já ocorrido no caso dasmedidas compensatórias de dumping ou subsídiosestatais, sejam usados com objetivos protecionistas111.Mas resta uma questão ainda mais basilar a ser ponderada, visto que o problema

do protecionismo poderia ser solucionado por medidas sancionatórias de abusos nestesentido. Trata-se de alcançar consenso, em primeiro lugar, sobre quais comportamentossão, de fato, violações a direitos trabalhistas internacionalmente vinculantes. Difícilatingir um denominador comum sobre o que seja injusto do ponto de vista do direitodo trabalho. Em matéria de cláusulas sociais e dumping social certeza, somente, quantoà falta de consenso112. Não resta claro se, ao ser rejeitado pelos Membros o uso desanções comerciais para fins protecionistas, proíbe-se seu uso até mesmo como medidaspreventivas contra violação de direitos trabalhistas ditos “universais”. Seria, porém,alcançável tal universalidade? Coloca-se a questão do universalismo x relativismo dosdireitos fundamentais, isto é, o debate acerca de um tratamento igualitário em todasas nações ou se os direitos fundamentais estão sujeitos a diferentes bases culturais oupolítico-estratégicas sobre as quais se desenvolveu uma sociedade113. Isso porque ospadrões sócio-laborais são development dependent.Igualmente resta obscuro se a preservação das vantagens comparativas também

impede o uso de sanções comerciais, visto que mão-de-obra barata nem sempre seriaresultado de uma vantagem comparativa114.Dessa forma, apesar de não existir uma disposição expressa no texto dos Acordos

da OMC relativa a uma cláusula social, não se pode dizer que a matéria não seja umassunto para a organização lidar. Isto porque questões como as acima expostas continuamdemandando resposta, e o tema trabalho, enquanto fator de produção, está intimamenteligado com o contexto do comércio.No entanto, acrescenta-se que, fora a Declaração da OIT de 1998, a organização

não alcançou muitos outros resultados tangíveis115 no campo da inter-relação

108 Ibid.Artigo 24.109 Ibid.Artigo 26.110 Relatório final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização http://www.ilo.org/public/

english/wcsdg/docs/report.pdf visitado em 08 de Fevereiro de 2010.111 MENG,Werner, Ob. cit., p.382.112 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 205.113 Ibid. p. 78.114 MENG,Werner, Ob. cit., p.383.115 Ibid. p. 380.

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Comércio e Trabalho. Em 2002, a OIT criou a Comissão Mundial sobre a DimensãoSocial daGlobalização, como uma tentativa de resposta à dificuldade em se encontrar,no sistema multilateral, mecanismo que abrangesse adequadamente a dimensãosocial dos vários aspectos da globalização e das mudanças sem precedentes que estacausou na vida dos indivíduos e na sociedade em que eles vivem.116 O Relatório finalda Comissão foi publicado em 2004, quando denuncia ter-se chegado a um estágiocrítico quanto à legitimidade das instituições políticas, demandando, portanto umareestruturação da governança econômica global117.

4.1 O Relatório Final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social daGlobalização

A problemática sobre o que seriam direitos trabalhistas fundamentaisuniversalmente aceitos, apresentada no tópico acima, estaria, pretensiosamente, deacordo com o Relatório final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social daGlobalização, resolvida. Juntamente com os 4 princípios fundamentais expressosna Declaração da OIT em 1998, seriam oito o número total de convenções da OITque definem os direitos fundamentais do trabalho118. Ter-se-ia, assim, alcançadoconsenso nesta questão, e definido as regras básicas de trabalho na economiaglobal119. E justamente esses core labor standards seriam os “únicos sobre os quaisse discute a aglutinação de forças OMC/OIT”120.Igualmente no que tange à questão, também posta acima, relativa às vantagens

comparativas, o Relatório esclarece que, implicitamente à proibição de se questionarvantagens comparativas de outros países, através do uso dos direitos trabalhistas comobjetivos comerciais protecionistas, está, obviamente, a proibição de se alcançar oumanter vantagem comparativa que seja baseada em desrespeito deliberado dos princípiose direitos fundamentais do trabalho121.O próprio Relatório, ao assumir as dificuldades encontradas pela OIT em lidar com as

constantes violações dos direitos trabalhistas fundamentais, declara que atenção é entãovoltada para a OMC, devido à possibilidade de se aplicar sanções comerciais aos países

116 http://www.ilo.org/fairglobalization/mandate/lang--en/index.htm visitado em 08 de fevereiro de 2010.117 http://www.ilo.org/fairglobalization/report/lang--en/index.htm visitado em 08 de fevereiro de 2010.118 Estas seriam: Convenção sobre Trabalho Forçado, 1930 (No. 29); Convenção sobre a Abolição de

Trabalho Forçado,1957 (No. 105); Convenção sobre Liberdade de Associação e Proteção do Direito deSindicalização, 1948(No. 87); Convenção sobre o Direito de Sindicalização e Negociação Coletiva, 1949(No. 98); Convenção sobre Igualdade de Remuneração, 1951 (No. 100); Convenção sobre Discriminação(Emprego e Profissão), 1958(No. 111); Convenção sobre a IdadeMínima, 1973 (No. 138);Convenção sobreas Piores Formas de Trabalho Infantil,1999 (No. 182). Tais Convenções teriam cada uma por volta de 130 e162 ratificações formais, o que indicaria a aceitação quase- universal de suas obrigações. Conforme citaçãonº 61 do Relatório.

119 Item 419 do Relatório final da Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização: “A fairglobalization: Creating opportunities for all”, p.92. http://www.ilo.org/public/english/wcsdg/docs/report.pdfvisitado em 08 de Fevereiro de 2010.

120 DI SENAJR., Roberto. Ob cit. p. 105.121 http://www.ilo.org/fairglobalization/report/lang--en/index.htm visitado em 08 de fevereiro de 2010.

Item 421.

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC 137

que não respeitem tais normas122. E apesar de não defender ser tal uso possível ou não,afirma que o respeito a direitos fundamentais do trabalho formam parte de uma agendainternacional de desenvolvimento mais ampla, o que abrangeria o envolvimento dossistemas multilaterais conjuntamente, devendo cada instituição internacional assumir suaparte na promoção destes direitos123.Neste sentido, propõe-se averiguar quais as alternativas restam para a OMC, dentro

da sua estrutura legal disponível, para lidar com o tema quando um caso relacionado àtemática conjunta comércio e trabalho de fato for apresentado para solução na OMC.

5. Alternativas Viáveis dentro da Legislação Vigente da OMC

Para a apreciação dos dispositivos da OMC que se relacionam aos temas Comércioe Trabalho, sugere-se a análise do fato fictício e exemplificativo124. Suponha que umpaís Membro da OMC utilize uma sanção comercial contra outro Membro, proibindo aimportação de produtos produzidos por crianças de 6-10 anos de idade (no caso, bolasde futebol). O país exportador recorreria então ao sistema de solução de controvérsiasda OMC, e o painel, como também, provavelmente, o Órgão de Apelação, teriam quelidar com a questão de dizer se tais sanções seriam ou não justificadas conforme asregras da OMC125. Serviria, neste sentido, a proibição do trabalho infantil, enquanto umprincípio fundamental do trabalho reconhecido pela OIT, como justificativa para proibira importação do produto in casu?Em atenção ao caso, deve-se constatar que, apesar das declarações feitas em

Cingapura, em 1996 e reafirmadas na Rodada de Doha em 2001, não foram grandes ostrabalhos desenvolvidos no âmbito da OMC sobre o tema, posto que não há Comitêsou Grupos de Trabalho da OMC lidando com o tema da relação entre livre comércioe direitos trabalhistas. Frente à tal situação de estagnação, importante analisar como aOMC, diante do seu atual conjunto normativo, poderia tratar o tema, sem desconsiderareventuais mudanças institucionais para o futuro.De fato, o Órgão de Solução de Controvérsias teria que lidar com a questão. Não cabe

a este referi-la inteiramente à OIT visto que, conforme artigo 23 do Entendimento sobreSolução de Controvérsias126 (DSU), a OMC é o fórum exclusivo para decidir acercade possíveis violações das normas de não-discriminação e proibição de barreiras nãotarifárias127. Segue-se à análise, portanto, do direito material, visando-se ponderar quaisas alternativas restantes à OMC para resolver a questão.

122 Ibid. Item 424.123 Ibid. Item 426.124 O fato a ser apresentado a seguir, utilizado de forma exemplificativa pelo Professor Meng, é fictício, mas,

naturalmente, bastante crível de ocorrer.125 MENG,Werner, Ob. cit., p.383.126 Dispute Settlement Understanding (Understanding on Rules and Procedures Governing the Settlement of

Disputes)127 Artigo 23.1 doDSU: “WhenMembers seek the redress of a violation of obligations or other nullification

or impairment of benefits under the covered agreements or an impediment to the attainment of any

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A primeira pergunta a ser respondida é se o produto do caso em análise, ou seja,exemplificativamente, bolas de futebol produzidas por crianças, poderia receber umtratamento menos favorável no mercado de um determinado país que condena trabalhoinfantil, quando comparado com produtos similares produzidos internamente ouprovenientes de outros países.Para o exame do caso, importante destacar, dentre as regras da OMC, (i) o princípio

da não discriminação, (ii) a regra da proibição geral de restrições quantitativa e o (iii)princípio da não-reciprocidade.O princípio da não discriminação é o princípio basilar da OMC, que se desdobra em

duas principais normas. O artigo I do GATT consagra norma da nação mais favorecida.Segundo tal cláusula, os Membros da OMC obrigam-se a estender a todos os produtossimilares dos demais Membros o tratamento comercial mais benéfico que for concedidoa um produto originário do território de qualquer outro país, ainda que este não seja partecontratante do GATT128. Trata-se do tratamento aplicado a todos os produtos importados,comparando-os entre si.Outro expoente do princípio da não-discriminação é a norma do tratamento nacional,

disposta no artigo III do GATT. Segundo ela, aos produtos importados, originários doterritório de qualquer dos Membros da OMC, será concedido o mesmo tratamento queum produto doméstico similar receber internamente129.Para a interpretação destes dois artigos, vem-se à tona a discussão abordada pelo

próprio Órgão de Solução de Controvérsias sobre o que seriam “produtos similares”,enquanto termos integrantes da norma. Isto porque somente entre produtos similaressão aplicáveis a obrigação da nação mais favorecida e a regra do tratamento nacional.Questiona-se se, para a classificação de dois produtos como similares, seria o modo deprodução dos produtos um fator a se levar em conta. Para o caso em questão a perguntafaz-se relevante, especificamente para se decidir se o mesmo produto, no caso, bola defutebol, produzido respeitando-se direitos humanos do trabalho, poderia ser classificadocomo similar a outra bola de futebol, bola esta produzida por crianças de 6-10 anos. Se a

objective of the covered agreements, they shall have recourse to, and abide by, the rules and proceduresof this Understanding.”

128 Artigo I.I do GATT - General Most-Favoured-Nation Treatment: “With respect to customs duties andcharges of any kind imposed on or in connection with importation or exportation or imposed on theinternational transfer of payments for imports or exports, and with respect to the method of levyingsuch duties and charges, and with respect to all rules and formalities in connection with importationand exportation, and with respect to all matters referred to in paragraphs 2 and 4 of Article III,* anyadvantage, favour, privilege or immunity granted by any contracting party to any product originating inor destined for any other country shall be accorded immediately and unconditionally to the like productoriginating in or destined for the territories of all other contracting parties.”

129 Artigo III.4 do GATT - National Treatment on Internal Taxation and Regulation: “The products of theterritory of any contracting party imported into the territory of any other contracting party shall beaccorded treatment no less favourable than that accorded to like products of national origin in respectof all laws, regulations and requirements affecting their internal sale, offering for sale, purchase,transportation, distribution or use. The provisions of this paragraph shall not prevent the application ofdifferential internal transportation charges which are based exclusively on the economic operation ofthe means of transport and not on the nationality of the product.”

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC 139

conclusão for que tais produtos não são similares, podem estes então receber tratamentodiferente130.Por não ser o conceito de “produtos similares” definido noGATT, os painéis e oÓrgão

deApelação tiveram que considerar a questão.Alguns casos paradigmáticos destacam-se.Em Japan – Alcoholic Beverages II131 usou-se a imagem de um acordeão para apresentara idéia de que o conceito de “produtos similares” possui significados diferentes quandoos contextos são diversos132. Em Spain – Unroasted Coffee133, ao analisar se diferentestipos de café seriam produtos similares conforme o sentido do termo empregado no artigoI:1 do GATT, o painel considerou relevante os seguintes pontos: a) características doproduto; b) sua destinação final e c) o regime tarifário empregado por outrosMembros.Atais critérios somam-se os costumes e preferências dos consumidores134.No contexto do debate sobre a relevância do processo e método de produção de um

produto (PPM135) para a determinação se determinados produtos são similares, o casoEC-Asbestos136 é crucial. Assim o é porque se decidiu, neste caso, que a definição desimilitude não está restrita às características físicas dos produtos sob análise137.Apesar doque havia sido estabelecido em US-Tuna (Mexico)138, quando se afirmou que processose métodos de produção que não afetem as características ou propriedades do produto emquestão (NPR PPMs) não são relevantes para se determinar a similitude dos produtos139,o conceito de “produtos similares” evoluiu desde então e a questão dos NPR PPMsagora demanda uma análise mais profunda. Constatou-se que tais NPR PPMs podem terum impacto sobre a preferência dos consumidores, e assim, na natureza e extensão dacompetição entre os produtos140. Este seria o caso, por exemplo, da bola produzida porcrianças, mas também de outros processos que utilizem substâncias degradantes ao meioambiente ou prejudiciais ao bem-estar de animais. No entanto, na maioria dos mercados,o que é definitivo para a escolha dos consumidores por produtos são aspectos outros,como, mais provavelmente, o preço.Em EC-Asbestos141, de fato, afirma-se que discriminação só poderia ocorrer se

os produtos analisados estivessem em um relacionamento competitivo, posto que,do contrário, não se pode argüir que tratamento diferenciado a tais produtos seria uma

130 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.329.131 DS10 - Japan –Alcoholic Beverages II http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds10_e.htm132 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.329.133 BISD 28S/102 Spain - Tariff treatment of unroasted coffee http://www.wto.org/english/tratop_e/

dispu_e/80coffee.pdf134 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.331.135 PPM – Product´s ProductionMethod.136 DS 135 European Communities - Measures Affecting Asbestos and Products Containing Asbestos http://

www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds135_e.htm137 MENG,Werner, Ob. cit., p.387.138 DS 381 - United States - Measures Concerning the Importation, Marketing and Sale of Tuna and Tuna

Products http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds381_e.htm139 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.381.140 Ibid.141 DS 135 European Communities - Measures Affecting Asbestos and Products Containing Asbestos http://

www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds135_e.htm

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violação à regra, in casu, do tratamento nacional142. Um “enfoque comercial” seria, então,necessário, e o relacionamento competitivo dos produtos e os lugares do mercado por elesocupados podem ser definitivos na caracterização de produtos como similares ou não.Assim, após a mudança interpretativa do termo “produtos similares” desde o

caso Asbestos, a questão está aberta a discussão novamente. No entanto, ainda que seconsiderassem os produtos em questão como não similares, aceitando-se, portanto, queestes recebessem tratamento diferenciado, sanções comerciais ainda iriam, a princípio,violar a segunda regra que se cumpre analisar no presente caso. Trata-se da já referidaproibição geral de restrições quantitativa, expressa no artigo XI do GATT143, para o qualo conceito dos produtos similares não se aplica.Segundo artigo XI do GATT fica proibida a imposição de barreiras não alfandegárias

contra produtos estrangeiros. Esta categoria abrange as proibições ou restrições deimportação144, na qual se incluiria a recusa em receber nomercado interno de determinadoMembro da OMC produtos elaborados através de trabalho regulamentado por normasditas violadoras de direitos sócio-laborais.Para se evitar que uma sanção seja considerada violadora do artigo XI, teria que haver

uma justificativa dentre as cláusulas do catálogo de exceções gerais do artigo XX doGATT145. Tal catálogo corresponde a uma série de normas para reconciliar liberalizaçãocomercial com outros valores sociais146. Assim é o seu funcionamento: “tais exceçõespermitem aos Membros, sob condições específicas, adotar e manter leis e medidas quepromovem ou protegem outros importantes valores e interesses sociais, ainda que taisleis ou tais medidas sejam inconsistentes com disciplinas substantivas impostas peloGATT”147. Assim, ainda que inconsistente com o artigo XI, se a medida legislativatomada por um Membro enquadrar-se nas hipóteses do artigo XX, esta será, portanto,uma conduta permitida.Conforme já dito, o artigo XX(e) contém uma exceção quanto aos produtos feitos em

estabelecimentos prisionais. Isso que implica que os países Membros estão livres parabarrarem a importação de tais produtos.Aquestão sobre uma possível aplicação analógicadesta cláusula para os produtos feitos por crianças aparenta-se bastante improvável, postoque apesar da consciência sobre diferentes formas desumanas de trabalho, optaram oslegisladores por uma específica. A razão de tal opção seria, talvez, não o fato de queo trabalho é desumano, mas sim porque não implica em condições iguais de custo demão-de-obra. No entanto, nada impede que uma evolução interpretativa caminhe para ainclusãodebensproduzidos emcondiçõesde trabalho escravooucondições contrárias aos

142 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.375.143 Artigo XI.1 do GATT: “No prohibitions or restrictions other than duties, taxes or other charges, whether

made effective through quotas, import or export licences or other measures, shall be instituted or maintainedby any contracting party on the importation of any product of the territory of any other contracting party or onthe exportation or sale for export of any product destined for the territory of any other contracting party.”

144 MENG,Werner, Ob. cit., p.387. Esquema legal de raciocínio conforme o desenvolvido pelo autor.145 MENG,Werner, Ob. cit., p.387.146 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.615.147 Ibid.

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padrões trabalhistas mais fundamentais148. Este não é o caso frente à atual jurisprudênciado Órgão de Solução de Controvérsias.Analisando-se, ainda, as exceções gerais do artigoXX, sua alínea (b) defende o direito

dos países Membros em adotar medidas para a proteção da saúde e da vida das pessoas.Questionável é se poderia tal dispositivo ser também interpretado na proteção da saúdedos trabalhadores.Mais controverso ainda seria seEstados poderiamvaler-se de restriçõesa importação comomeio de proteger o direito à saúde de trabalhadores situados e naturaisde outros países.Aquestão de uma limitação jurisdicional do artigo XX, porém, continuaindeterminada. Não há nenhuma limitação explícita, mas, implicitamente, estariam osMembros da OMC proibidos de invocar a proteção de valores não-econômicos forade sua jurisdição territorial? Tal questão ainda aguarda esclarecimento do Órgão deApelação149.Ainda dentro da estruturas de exceções do artigo XX do GATT, a alínea (a) aparenta

ser uma alternativa viável à introdução da temática dos direitos humanos no contextolegal da OMC. Esta defende o direito dos países de proteger a moralidade pública.Trata-se, portanto, de conceito amplo, que vem sendo moldado ao longo dos anos e dodesenvolvimento do Direito Internacional Público. Uma vez interpretando-se moralidadepública como sinônimo de ética150, e definindo-se direitos humanos como parte dafundação ética dos Estados, não estaria a OMC totalmente indiferente à questão dosdireitos humanos como poder-se-ia criticá-la. A interpretação de tal dispositivo, nestesentido, porém, não poderia basear-se em uma convicção moral isolada de um ou maisEstados151, mas sim a valores morais comuns em todos osMembros, ou pelo menos, comummínimo de universalidade. Daí a importância, portanto, de se indagar da possibilidadede se delimitar os direitos fundamentais do trabalho, enquanto um núcleo duro do tema,cuja proteção é defendida ainda que quase-universalmente. Neste sentido, a importânciado trabalho desenvolvido pela OIT, e, igualmente, a necessidade de se pensar para ofuturo, mecanismos de cooperação entre esta e a OMC em suas regras procedimentais.Na tentativa de se justificar a legalidade de uma ação de determinado Estado por esta

se enquadrar em uma das hipóteses das exceções gerais do artigo XX, deve-se aplicar omecanismo interpretativo desenvolvido pela jurisprudência daOMC.Conforme afirmadoem US – Gasoline152 e US – Shrimp153, deve-se aplicar a regra do equilíbrio, implicando-se em sobrepesar o ideal do livre comércio com outros valores sociais154. Neste sentido, opainel determinou emUS – Shrimp que não se poderiam justificar no artigo XXmedidas

148 Ibid. p. 640.149 Ibid. p.619.150 MENG,Werner, Ob. cit., p.388.151 Ibid.152 DS2 United States — Standards for Reformulated and Conventional Gasoline http://www.wto.org/english/

tratop_e/dispu_e/cases_e/ds2_e.htm153 DS58 United States — Import Prohibition of Certain Shrimp and Shrimp Products http://www.wto.org/

english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds58_e.htm154 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.619.

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que contradigam o sistema multilateral de comércio, que deve-se ser pensando como umtodo, dentro de uma perspectiva sistêmica.Além do que, enquadrando-se a medida em uma das alíneas do artigo XX, ainda

estaria esta submetida aos requisitos do caput, quais sejam: não deve ser aplicada quer deuma maneira que constitua um meio de discriminação arbitrária, ou injustificada, entreos países onde existem as mesmas condições, quer uma restrição disfarçada ao comérciointernacional. Ainda, e especificamente quanto às demandas com base nas alíneas (a) e(b), estas não se aplicam quando não se provar a “necessidade” que exige o dispositivolegal. Entende-se este requisito como a comprovação da inexistência de outramedida queseja o menos incompatível possível com os Acordos da OMC e que permita alcançar omesmo objetivo155.Porfim, deve-se ter emmente ainda o princípio da não-reciprocidade, conforme artigo

XXXVI, 8156. Segundo este princípio, não se deve esperar que os países de menor grau dedesenvolvimento relativo, no curso das negociações comerciais, assumam compromissosincompatíveis com seu desenvolvimento individual157.Além das normas específicas da OMC, resta ainda questionar a possibilidade de se

justificar as medidas comerciais restritivas em função dos Princípios Gerais de DireitoInternacional.

5.1 Aplicação dos Princípios Gerais de Direito InternacionalUm dos princípios gerais de Direito Internacional determina que os Estados

podem tomar contra outros Estado medidas em relação a violações às sua obrigaçõesinternacionais, desde que aquelas sejam proporcionais158 e com o objetivo de induzir oEstado violador a trazer seu comportamento em conformidade com o Direito159.Qual o lugar ocupado, entretanto, peloDireito Internacional PúblicoGeral, no cenário

das regras daOMC?Avisão daOMCcomoum sistema de regras“self-contained” já caiupor terra, sendo, atualmente, entendida como parte integrante do Direito Internacional160.Pascal Lamy alegou que a efetividade e legitimidade da OMC dependem de como ela serelaciona com normas de outros sistemas legais, sendo que esta organização está longede ser hegemônica161. Reconhece-se, portanto, sua competência limitada. No caso US -

155 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 240.156 Artigo XXXVI.8 do GATT: “The developed contracting parties do not expect reciprocity for commitments

madeby them in tradenegotiations to reduceor remove tariffs andother barriers to the tradeof less-developedcontracting parties.”

157 GAVA, Rodrigo. Ob. Cit, p. 240158 Artigo 51 do Projeto da CDI - Projeto deArtigos sobre Responsabilidade Internacional dos Estados porAto

Internacionalmente Ilícito(2001)- Comissão de Direito Internacional – visitado em 09 de Fevereiro de 2010http://untreaty.un.org/ilc/texts/instruments/english/draft%20articles/9_6_2001.pdf

159 Ibid, artigo 49.160 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.60.161 LAMY, Pascal. “The Place of the WTO and Its Law in the International Legal Order” EJIL, 2007 In VAN

DENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.60.

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Desenvolvimento e Comércio: a Viabilidade de uma Cláusula Social na OMC 143

Gasoline, o Órgão deApelação estabeleceu que o GATT “não deve ser lido em isolaçãoclínica do direito internacional público162.Por outro lado, deve-semanter emmente que artigo 3.2 doDSUdelimita claramente a

possibilidade de interpretações extensivas feitas pelo Órgão de Solução de Controvérsias,cujas recomendações não podem aumentar ou diminuir os direitos e obrigações presentesnosAcordos da OMC.Mas no mesmo parágrafo, os procedimentos do DSU servem paraclarificar os dispositivos existentes de tais acordos, conforme as regras costumeiras deinterpretação do direito internacional. Assim, de acordo com o artigo 31 da Convençãode Viena sobre o Direito dos Tratados, enquanto uma codificação das regras costumeirasde direito internacional, “quaisquer regras pertinentes de Direito Internacional aplicáveisàs relações entre as partes” serão levadas em consideração para a interpretação de umtratado. Deve-se levar em conta, portanto, o relacionamento legal entre os EstadosMembros de um ponto de vista mais abrangente, e isto não violaria a regra do artigo 3.2do DSU desde que não se adicione ou diminua direitos ou obrigações, mas tão somenteinterpretem-se as normas dos Acordos da OMC em conformidade com outras normasinternacionais, que sempre as definem163.Resumindo-se, além das exceções enumeradas no Artigo XX do GATT, defende-se

poder um Estado valer-se, igualmente, das regras gerais de responsabilidade Estatal. Talpossibilidade tornaria, portanto, o artigo XX não um catálogo de menor importância,mas tão somente um catálogo não exaustivo164. Para este, as exceções do artigo XX sãolimitadas porque sua lista é exaustiva165. Porém, admitindo-se que os princípios geraisdo Direito Internacional não têm sua aplicação excluída, a interpretação da lista doartigo XX como sendo uma listagem numerus clausus seria reavaliada. Assim sendo,a exclusividade de que trata o artigo 23 do DSU diz respeito somente à proibição de sevaler de contra medidas para as violações das próprias regras da OMC. E o medo deque, com a possibilidade de se alegar regras gerais de direito internacional público paradefender barreiras comerciais, abrir-se-ia espaço para protecionismo é mitigado pelo fatode que todos os casos de sanções comerciais seriam automaticamente submetidos aospainéis e, eventualmente, ao Órgão de Apelação, alcançando-se o sucesso de serem taissanções não mais uma prerrogativa unilateral dos Estados166.Apesar dos riscos envolvidos, não se pode aceitar um isolamento das normas da

OMC frente às demais normas de direito internacional. E este é um problema típicoderivado da ausência de um órgão legislativo e judiciário internacional central, que deveser enfrentado se os Estados almejarem evitar uma fragmentação do direito internacional.A doutrina clássica já se apresenta obsoleta para enfrentar as novas demandas dasrelações inter-Estatais, e as mudanças apresentam imperiosas, assim como o são naturaisnos demais ramos do direito ou em qualquer ciência social. E apostam-se as fichas no

162 US-Gasoline – Standards for Reformulated and Conventional Gasoline (WT/DS2/AB/R).163 MENG,Werner, Ob. cit., p.390.164 Diferentemente do que defende Van den Bossche165 VANDENBOSSCHE, Peter. Ob. cit., p.617.166 Idib. p.391.

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Sistema de Solução de Controvérsias da OMC, neste caso específico, como um meiode controle dos eventuais desvios do recurso às regras gerais de responsabilidade dosEstados apresentado, além de se defender uma cooperação entre OMC e OIT.

5.2 O Possível Futuro Caso dos EUA – S. 1631Ainda que dado real, a informação prestada a seguir não se tornou uma questão em

debate frente a OMC, mas com grande probabilidade de assim o ser e para o qual oDireito Internacional Público, aqui representado por suas organizações internacionais decunho temático específico deve estar preparado. Trata-se do recentemente introduzido“Customs Facilitation and Trade Enforcement Reauthorization Act” (S. 1631), queestende, significativamente, a barreira sobre importaçõesdeprodutos feitos comutilizaçãode trabalho forçado ou infantil. Tal ato legislativo é uma emenda ao § 1307, Título 19(Customs Duties), Capítulo IV (Tariff Act of 1930) do “United State Code”, sendo esteuma compilação e codificação das leis federais gerais e permanentes dos Estados Unidos.As seguintes alterações são promovidas: primeiramente, remove a cláusula denominada“demanda consumidora”, eliminado assim uma isenção que permitia a importação nosEUAde produtos proibidos se este país não fosse capaz de produzir suficientemente paraatender a demanda interna. Além disso, barra a importação de produtos produzidos com“trafficked labor”167. Para garantir efetividade à medida, previu-se, além de penalidadescivis, a criação de um escritório dentro do órgão de imigração americano “U.S.Immigration and Customs Enforcement” para a função de monitoramento.O S.1631 não é a única medida recém adotada pelo governo dos EUA referente a

trabalho infantil e trabalho forçado. Em 2009, o “Department of Labor” (DOL) publicouuma lista de produtos em que se acredita sejam produzidos com uso de trabalho infantil.O objetivo é garantir que estes produtos não entrem em território norte-americano, tantopelo controle de importação a ser exercido pelas agências americanas, como, igualmente,pela expectativa de que importadores e consumidores dos EUA hesitem em adquirirprodutos incluídos na lista168. Dentre os países listados encontram-se Índia, Argentina,Colômbia, Tanzânia, Ucrânia, China e vários outros. O Brasil é igualmente citado, tantono que se refere a produtos agrícolas, como cana-de-açúcar, abacaxi e arroz, mas tambémprodutos industrializados, como calçados dentre outros.169OTariffActof1930 já foiquestionadoemdisputas tanto frenteaoGATT1947,comono

pedido de realização de consultas frente aoSistemadeSolução deControvérsias daOMC.Trata-se do questionamento específico da Seção 337. No Relatório do painel adotado em7 de novembro de 1989, ou seja, antes mesmo da criação da OMC, formando, portanto,a jurisprudência do GATT, ao analisar uma reclamação feita pela Comunidade Européia,concluiu-se que a Seção 337 do United States Tariff Act of 1930 é inconsistente com a

167 Reportagem visitada no dia 25 de Fevereiro de 2010 em http://www.rila.org/news/newsletters/trade/Volume1Issue14/Pages/CustomsBillWouldExpandBanonImportsMadewithForcedChildLabor.aspx

168 Ibid.169 The Department of Labor’s List of Goods Produced by Child Labor and Forced Labor http://www.dol.gov/

ilab/programs/ocft/PDF/2009TVPRA.pdf visitado em 26 de Fevereiro de 2010.

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regra de tratamento nacional do artigo III:4 do GATT, ao impor a produtos importados,cuja infração a lei de patentes americana é questionada, tratamento menos favorável queo tratamento dispensado a produtos originários dos EUAem situação similar170.Novamente em 2000, agora sim dentro do sistema da OMC, a Comunidade Européia

solicitou o procedimento de consultas comosEUAacerca damesmaSeção 337, alegandoviolaçãodoartigo III doGATTedoTRIPS171.AComunidadeEuropéiadeclaraque, apesardas emendas realizadas pelos EUA através do “1994 US Uruguay Round AgreementsAct”, na tentativa de trazer o estatuto em conformidade com as recomendações do painelem 1989, as principais inconsistências levantadas na época não foram eliminadas172.Estes questionamentos dizem respeito, no entanto, ao princípio da não-discriminação

dentro da sistemática do direito da propriedade intelectual, sem nenhum apontamentoespecífico no que tange questões jus-laborais. Há que se esperar qual será a reaçãointernacional frente a esta medida, e talvez assim uma posição mais esclarecedora sobreo tema seja desenvolvida, através dos órgãos jurisdicionais internacionais, ou quem sabe,ainda, pela via de uma regulamentação jurídica vinculativa do assunto.

6. A Retomada da Querela – a “Busca em Vão” de uma Posição Única eDefinitiva

Frente ao discurso histórico, político e jurídico aqui apresentado, a busca de umasolução objetiva e irrefutável para a problemática apresenta-se, porém, difícil, ou, diriaainda, impossível. O título deste capítulo, entretanto, já merece cair por terra em seuprimeiro parágrafo. Isto porque a busca, como admitida acima, não foi em vão. E assimnão o foi porque nos possibilitou, ao menos, refletir acerca da complexidade da questão,e, buscou-se, por muitas vezes, desmistificar alguns pontos através da apresentação dasvisões antagônicas que permeiam a temática.Neste sentido, propõe-se a esta altura do presente trabalho, realizar uma retomada

do cenário internacional sócio-econômico-comercial que justifica as questões até entãoapresentadas, aprofundando-se na sua complexidade, ainda que para contribuir para aindefinição de uma resposta.Assim, retomemos, primeiramente, a questão da mão-de-obra. De fato, quanto

a ela, alguns países dispõem de certas particularidades nacionais, seja em relação aosseus custos mais baixos de produção, a flexibilidade de seus ordenamentos laborais,menores encargos sociais ou ainda sistemas de seguridade social menos avançados173.

170 UNITED STATES - SECTION 337 OF THE TARIFF ACT OF 1930 Report by the Panel adopted on 7November 1989(L/6439 - 36S/345)§6.3 http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/87tar337.pdf visitadoem 02 deMarço de 2010.

171 United States—Section 337 of theTariffAct of 1930 andAmendments thereto http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds186_e.htm visitado em 02 deMarço de 2010.

172 WT/DS186/1 IP/D/21-18 January 2000 - UNITED STATES – SECTION 337 OF THE TARIFFACT OF1930 ANDAMENDMENTS THERETO - Request for Consultations by the European Communities andtheir member States.

173 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 130.

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Dentre estes países há que se diferenciar, porém, entre aqueles que de fato gozam dasditas vantagens comparativas e aqueles que, de má-fé, as criam demaneira intencional174,ou seja, propositalmente rebaixam as condições jus-laborais vigentes, com o fito de seaproveitarem das vantagens competitivas que elas proporcionam, configurando-se, nestesegundo caso, uma concorrência desleal175. Por diferentes serem as hipóteses, diferente,portanto, deve ser o tratamento a elas despedido.Somente a segunda hipótese poderia, de fato, conformar a prática do chamado

“dumping social”, contra qual se insurgem os países centrais, valendo-se das CláusulasSociais como “outro escudete comercial, ora fundamentado no contra-argumento daprática concorrência desleal”176. Ao passo que o dumping social não é respaldado pelaOMC, defendem os países desenvolvidos a regulamentação do assunto com a devidaconsagração de padrões trabalhistas mundiais, que uma vez descumpridos, seriam osautores retaliados por um direito antidumping177. Para diferenciar, portanto, a hipóteseintencional de diminuição das condições trabalhistas, da hipótese em que esta ocorrecomo conseqüência da estrutura histórico-político-econômico-social (ou seja, baseada narelação oferta-demanda de mão-de-obra e progresso nacional) de determinados países,a análise dos padrões laborais deve ser feita conjuntamente com a análise dos “fatoresmotivacionais e dos seus resultados práticos”178.No caso do alegado dumping social, suas conseqüências são, de fato, graves para

a conjuntura internacional. Isto porque, além do medo de um “race to the bottom”, jáapresentado acima, enquanto umapressão para aminimização dos direitos trabalhistas emvirtude da concorrência, há também que se falar em duas grandes questões sociológicasque aflingem o cenário mundial: o fenômeno da “deslocalização” das unidades deprodução para regiões de mão-de-obra barata e o movimento intenso de migração dostrabalhadores para os países do eixo norte em busca de melhores salários e qualidade devida179.Primeiramente, com a opção de empresas por construírem suas bases de

produção ou parte delas em territórios outros que o seu de origem, em busca defatores de produção a menores custos, tem lugar o fenômeno de desterritorializaçãoe reorganização do espaço de produção, ao lado, também, da fragmentação dasatividades produtivas180. Essa deslocalização pode ter efeitos positivos para dospaíses de destino, qual seja, através da aplicação de investimentos diretos em seusterritórios e transferência de tecnologia que possibilitarão um crescimento estrutural

174 “Afirma-seque raramenteospaísesdeterminamseuspadrões trabalhistaspara influenciarfluxoscomerciais...Ao contrário, os escolhem baseados em condições sociopolíticoeconômicas predominantes em determinadomomento histórico... Sendo, portanto, as políticas trabalhistas que condicionam a política comercial e não ocontrário”. DI SENAJR., Roberto. Ob. cit. p. 98

175 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 133.176 Ibid. p. 131.177 Ibid. p. 132.178 Ibid.179 Ibid. p. 134.180 Ibid. p. 154.

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e econômico do país, para que estes se livrem, enfim, da eterna condição de paísem desenvolvimento. O efeito pode ser, por outro lado, negativo, se o mecanismoutilizado for o demeras licenças e subcontratações, em que as empresas transnacionaisagem como verdadeiras sanguessugas, sem agregar valor ao país em que implantamfases de sua produção. Agindo dessa forma negativa, portanto, o comportamentodos países centrais apresenta-se incoerente, vez que bradam contra um existentedumping social, ao passo que são justamente co-responsáveis deste processo, pois asempresas originárias destes países, ao deslocarem suas unidades produtivas para ospaíses em desenvolvimento, acabam por acirrar uma concorrência entre os Estadospelo fornecimento de mão-de-obra mais barata181, vez que seria esta mais atrativa.Asegundaquestão,amigração,porsuavez,alteradeformasignificativaaconfiguração

do mercado de trabalho do país de destino, causando desemprego ou rebaixamento dascondições salariais e de trabalho vez que estes imigrantes se sujeitam a contratos maisflexíveis que os nativos admitem como justos. Enquanto grave conseqüência social destequadro tem-se a xenofobia, que talvez ainda não se faça marcante na realidade brasileira,mas de assustadora expressividade em países como Alemanha, França, Inglaterra, EUAe outros. O tratamento despendido aos imigrantes pelos países do norte igualmentequestiona o altruísmo que estes defendem quando do posicionamento dos mesmos emprol da introdução de cláusulas sociais182.Portanto, deve-se atentar para o fenômeno como uma realidade resultante do

próprio processo de globalização, em que se coloca em contato trabalhadores eempresas de vários países, e a partir deste entendimento, buscar uma normativizaçãoque potencialize os pontos positivos que são conseqüências desta nova estruturaglobal, corrigindo, simultaneamente, as moléstias do sistema. A regulamentação deveter como norte, portanto, o direito ao desenvolvimento, principalmente dos paísesperiféricos, admitindo-se que suas vantagens comparativas reais são o recurso para aimplantação de um bem-estar maior para sua população, que ali será capaz de construirsuas vidas dentro dos padrões mínimos de dignidade, aumentados em grau ao longo dodesenvolvimento observado. Deve-se aceitar o fato de que a conjugação dos fatores daglobalização, tais como livre comércio, melhoria nas telecomunicações e do transporteatenuou as desvantagens apresentadas pelos países em desenvolvimento em relação aosdesenvolvidos183. E tal conjuntura deve permitir e ser usada como meio de inserção dospaíses em desenvolvimento no mercado e no cenário internacional184.Uma “nova fórmula neoprotecionista dos países ricos185” iria de encontro à

política de liberalização mundial, e representaria um retrocesso à idéia de livrecomércio em que eles são os maiores defensores, justamente quando as primeirasdificuldades de readaptação apresentam-se, demandando uma reestruturação de

181 Ibid. p. 158.182 Ibid. p. 259.183 Ibid. p. 152.184 Ibid. p. 153.185 Ibid. p. 144.

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seus próprios mercados. Representaria verdadeira fraqueza, senão que desvelaria aintenção puramente individualista destes países quanto à liberalização comercial, emque o discurso do aumento da riqueza sob ponto de vista global seria somente maisum argumento por eles mesmo desacreditado com o fim de meramente convencer osdemais países a jogar um jogo para benefício de poucos186.O que se diz, portanto, é que “salários e padrões sócio-laborais relativamente

mais baixos são resquícios de um processo histórico”187, resultados da conjunturaexcludente do cenário mundial, cuja situação apenas se agravaria com a inclusãode cláusulas sociais. Mas que, novamente, uma diferenciação, a este respeito, faz-se necessária. Não se aspira defender que infrações graves a direito humanos dotrabalhador não ocorrem. Pelo contrário, trabalho escravo e infantil ainda é umarealidade existente e condenável. E como tal, deve ser devidamente punida e revertida,primeiramente, pelos Estados com o devido apoio das instituições internacionais.Acontece, porém, que estas situações não ocorrem com objetivos de “conquistarmercados ou como estratégia política dos Estados”188 e a definição, como de fato éfeita, bem como a intervenção nestes casos violadores mais graves deve ficar a cargoda OIT. E talvez o âmbito de atuação da OMC, porém sempre em cooperação com aOIT em busca de um sistema internacional uno, deva se restringir no campo da relaçãocomércio-trabalho somente aos casos em que os padrões trabalhistas são utilizados,intencionalmente e de modo estratégico, como forma de concorrência desleal entreos países. Os mecanismos para a realização de tal diferenciação devem ser, porém,desenvolvidos, o que não se apresenta tarefa de fácil procedimentalização. E paraeste fim, mais uma vez ressalta-se a necessidade de cooperação entre as organizaçõesinternacionais, em destaque neste tema a OMC e a OIT189, vez que impossível retirartotalmente a competência da OMC na matéria uma vez que o trabalho é fator deprodução e, portanto, elemento central e influenciador do mecanismo do comérciointernacional.

6.1 Viabilidade/Imperiosidade das Cláusulas SociaisA definição de cláusula social apresentada na introdução deste trabalho merece

revisão. Isso porque além de se caracterizar, em sua forma negativa, pela fixaçãode condições e padrões mínimos em matéria sócio-laboral, ou seja, de arrolarrequisitos que devem ser observado para que as transações comerciais aconteçam,

186 Confirma-se, portanto, a frase do filósofo Newton Bignotto, segundo quem “Numa sociedade como a nossa,o interesse é constituidor das relações do homem com omundo. Muitas vezes a gente mascara o interesse, eo interesse mascarado é socialmente muito mais difícil de lidar do que o interesse explícito como interesse”.Frase retirada do vídeo Café Filosófico: Bem Comum eVida Privada, comNewton Bignotto.

187 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 143.188 Ibid.189 “O Conselho da EU determinou que a Entidade defendesse 3 medidas principais na Reunião de Seattle,

a saber: 1- ampliação da cooperação da OMC e OIT; 2- apoio ao trabalho da OIT e sua atuação comoobservador da OMC; e 3- criação do Fórum de Trabalho Conjunto OMC/OIT sobre globalização, comércioe trabalho.” DI SENAJR., Roberto. Ob. cit. p. 109-110.

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vinculando a concretização de acordos comerciais ao cumprimento pelo(s) país(es)de determinadas normas trabalhistas sob pena de sanções (restrições comerciaisou retaliações), as cláusulas sociais também admitem uma configuração positiva.Em sua forma positiva, as cláusulas sociais, ao invés de apresentarem naturezasancionatória, o são de caráter premial, ou seja, o cumprimento das normas sociaise trabalhistas torna os países merecedores de bônus que funciona como incentivo aodesenvolvimento, em matéria jus-laboral, dos parceiros comercias190. Como exemplodesta configuração positiva das cláusulas sociais tem-se o SGP191.As cláusulas sociais positivas atendem, mais adequadamente, o ideal de elevação

da proteção social e trabalhista em escala global, apresentando um menor risco de secaracterizar como um protecionismo disfarçado dos países do Primeiro Mundo, vistoque não têm como conseqüência a retirada de parcela de participação dos países emdesenvolvimento no mercado internacional.Tomemos, por exemplo, a problemática do trabalho infantil. Ela se dá, com maior

freqüência, em Estados falidos, em que a diminuição do acesso ao mercado globalpor via das barreiras comerciais agravaria ainda mais a situação daquela parcelacarente da população e os levaria a buscar alternativas ainda mais drásticas parase sustentarem, quiçá piores formas de trabalho, como, prostituição e escravidão192,dentre outras. Impor barreiras comerciais não é, no caso, a solução, mas sim aimplantação de melhores políticas públicas pelo próprio Estado193, seja enquantoreinvestimento dos lucros do comércio internacional seja pela fiscalização e suporteda OIT, por exemplo.A imposição do pensamento ocidental pela economia, ou pela OMC enquanto

ferramenta institucional desta, não parece atender os objetivos de melhoria dascondições sociais em escala mundial. Primeiro porque uma universalização dosdireitos trabalhistas se caracteriza pela pretensão de se uniformizar realidadesnacionais díspares, desconsiderando totalmente a existência de raízes culturaismilenares, objetivando a instauração, implausível, de uma noção única para umapluralidade mundial. Difícil, para não dizer arbitrária, seria encontrar respostaspara as perguntas sobre quem decidiria os padrões a serem implantados, quaisseriam estes e como se daria tal implantação194. Esquece-se que a RevoluçãoIndustrial ocorrida a expensas dos trabalhadores foi a base para se atingir o graude riqueza de hoje dos países do norte e só assim os altos padrões sociais tiveramespaço para serem implantados. Impô-los aos demais países que percorreramdiferentes evoluções históricas parece um tanto quanto inadequado e insensato.Não se defende, entretanto, que se use o mesmo caminho de exploração humanavivenciado há séculos, mas sim que adequações às realidades nacionais devem

190 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 167.191 Ver nota de rodapé nº. 5.192 DI SENAJR. Roberto. Ob. cit. p. 181.193 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 185.194 Ibid. p. 276.

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ser observadas195. Nem tampouco se defende um uso infinito da vantagemcomparativa196, mas tão somente o direito ao desenvolvimento, para que asvantagens comparativas possibilitem aos países do Terceiro Mundo, no futuro,gozarem de verdadeiros benefícios do comércio internacional. Mas questões comoa dos subsídios agrícolas, por exemplo, ou as restrições mundiais ao comérciode têxteis197 ainda pendem solução, e enquanto fruto do protecionismo, aindaimpede o crescimento de vários países em desenvolvimento198, notadamente nacondição de exportadores de commodities199.Há quem defenda, ao se questionar o pretenso altruísmo dos países desenvolvidos,

que no caso de uma eventual introdução de cláusulas sociais sancionatórias, que ovalor pagos pelos ditos países infratores seja convertido em um fundo oriundo daspenas pecuniárias para então serem reaplicados “no próprio país-réu”200, ou seja,reinvestido no combate do trabalho escravo, infantil e demais males que assolam ospaísesmenos desenvolvidos.Apesar de ser uma tentativa válida de argüir o argumentofilantrópico, tal fundo não se apresenta como a ferramenta mais adequada, postoque seria caracterizado como uma ingerência excessiva nos assuntos internos de umEstado, que apesar da superação da teoria clássica do Direito Internacional Público,continua soberano. Mais plausível é a competência doméstica para tomar decisões nosentido de penalizações e conversão da multa aplicada em programas públicos.Portanto, para que uma aceitação das cláusulas sociais sejaminimamente defendível,

alguns fatores teriam que ser levados em conta, dentre eles, principalmente: as realidadesnacionais, realizando-se, conseqüentemente, adaptações, o que descarta a idéia deuniversalidade e uniformização máxima das normas sociais; igualmente, necessita-senortear o processo por um objetivo de progresso coletivo e continuado, permitindo-se às nações desfrutarem dos benefícios do comércio internacional; e ainda, a melhorconfiguração, para tanto, seriam as chamadas cláusulas positivas não sancionatórias.

7. Conclusão

Diante do exposto, resta clara que segundo a vigente legislação da OMC éimpossível justificar sanções comerciais ao chamado dumping social baseadosomente em critérios de injustiça sem assim agir ilegalmente201.

195 DI SENA JR. Ob. cit. p. 107. Vale completar que “não se opões à adoção de um patamar social para aglobalização... se opõe ao emprego de sanções comerciais como forma de se atingir padrões trabalhistasmaiselevados, mas não aos padrões em si”.

196 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 333.197 DI SENAJR., Roberto. Ob. cit. p. 64.198 Como no caso brasileiro em que o agronegócio responde, em dados de 2006, no livro de Roberto Di Sena

Jr., a 32%do PIB brasileiro, representa 38%das exportações e emprega 40%da população economicamenteativa do país. DI SENAJR., Roberto. Ob. cit. p. 65.

199 GAVA, Rodrigo. Ob. cit. p. 335.200 Ibid. p. 262.201 Da mesma forma conclui MENG,Werner. Ob. cit. p. 393.

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Damesma forma, mão-de-obra barata não significa, necessariamente, dumpingsocial, mas é muito mais um reflexo do desenvolvimento histórico, das tradiçõesculturais e do nível de progresso econômico. E enquanto avista-se a dificuldadede um consenso sobre o que compõe a lista dos direitos universalmente aceitos(ou se tal lista será, algum dia, possível de ser elaborada de comum acordo),é altamente improvável que todos os países da OMC irão concordar com aintrodução de uma cláusula social202.Neste limiar temporal, a OITvemdesempenhando seu papel no reconhecimento

de padrões trabalhistas reconhecidos em uma base universal na forma de tratadosinternacionais, portanto, vinculativos. E além dos mecanismos de controle,promoção, suporte técnico, fiscalização que a OIT já presta aos seus Membros,já demonstrou, como, por exemplo, no caso de Mianmar203, sua capacidadede valer-se de ações repressoras cogentes no caso de graves e persistentesviolações a normas laborativas. Neste sentido, uma atuação mais pró-ativa daOIT é recomendável, principalmente para assegurar seu papel como organizaçãointernacional especializada em matéria trabalhista.Juntamente ao exposto, é necessário o desenvolvimento de uma cooperação

entre OMC e OIT através de regras procedimentais, para que a atuação de ambasseja mais uníssona tanto do ponto de vista do desenvolvimento jurisprudencialcomo na promoção de melhores condições de vida e trabalho em escala global.Os desafios desta cooperação, entretanto, estão na própria configuraçãoestrutural do Direito Internacional Público, que na eventualidade de conflitosentre normas, competência e procedimentos dos sistemas institucionalizados,a dificuldade de se manter uma coerência vem, justamente, da ausência deum órgão jurisdicional central e de uma Lei de maior hierarquia que faria asvezes da Constituição nos sistemas legais domésticos. Mas, para se evitar umafragmentação do Direito Internacional, ou ainda, o que seria pior, uma falta dedescrença no sistema e a existência de normas contraditórias que levasse à totalineficiência e inaplicabilidade dos tratados, cooperação entre as instituições deveser perquerida.

202 Ibid. p. 394.203 GAVA,Rodrigo. Ob. cit. p. 294. – Combase no artigo 33 daConstituição daOIT, que admite serem tomadas

medidas convenientes para obtençãodo cumprimento das recomendações,Mianmar, que fora condenadoporpersistentes violações àConvenção sobreo trabalho forçadoenão tendodadocumprimento ao recomendado,foi alvo da autorização da OIT de que Estados-Membros terminassem suas relações comerciais com aquelepaís de modo a findar o sistema de trabalho forçado vigente.

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REFERÊNCIAS

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