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Centro Universitário de Belo Horizonte - UniBH DANIELA ALEIXO LEITE O FUTEBOL COMO INSTRUMENTO DE INTEGRAÇÃO ÁRABE-ISRAELENSE: limites e possibilidades Belo Horizonte 2010

Daniela Leite - O Futebol como Instrumento de Integração ... · taxa de fertilidade mais alta do que a judia, que cresce, sobretudo graças à imigração, porém esta imigração

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Centro Universitário de Belo Horizonte - UniBH

DANIELA ALEIXO LEITE

O FUTEBOL COMO INSTRUMENTO DE INTEGRAÇÃO

ÁRABE-ISRAELENSE: limites e possibilidades

Belo Horizonte

2010

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DANIELA ALEIXO LEITE

O FUTEBOL COMO INSTRUMENTO DE INTEGRAÇÃO

ÁRABE-ISRAELENSE: limites e possibilidades

Monografia apresentada ao Centro Universitário de Belo Horizonte

– UniBH como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em

Relações Internacionais.

Orientador: Professora Alexandra Nascimento

Belo Horizonte

2010

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RESUMO

O presente estudo analisa o papel do futebol como integrador de dois povos distintos que

ocupam o mesmo território: judeus e árabes. A convivência entre árabes e judeus em Israel é

conflituosa, os árabes são, na maioria das vezes, excluídos pela maioria judaica, e ficam

marginalizados em um país em que são minoria. Percebe-se, porém, que a arena esportiva tem

se sobressaído na missão de desenvolvimento de laços entre esses dois diferentes povos,

principalmente através do futebol, esporte mais comum entre a minoria árabe em Israel. Esse

esporte é capaz de possibilitar que a sociedade experimente momentos de inclusão,

independentemente das diferenças que os indivíduos possam ter. Verifica-se também que a

preservação do futebol como um enclave integrativo necessita de um considerável

investimento de energia e seu colapso é muito raro, o que não significa que não ocorra. O

futebol foi e ainda é a maior esfera na qual muitos cidadãos árabes tem procurado aceitação.

Considera-se então, que um profundo envolvimento na arena do futebol não se constitui

solução para a difícil situação dos árabes, mas minimiza, ainda que em determinados

momentos, o sentimento de discriminação sofrido por eles. Palavras-chave: Conflito árabe-

israelense; futebol; enclave integrativo.

ABSTRACT

This study examines the role of football as an integrator of two distinct peoples occupying the

same territory. Jews and Arabs. The coexistence between Arabs and Jews in Israel is

conflicting, the Arabs are in many areas excluded by the Jewish majority, and are

marginalized in a country where they are the minority. It is noticed however, that the arena

has been outstanding in the mission to develop links between these two different peoples,

mainly through football, a sport more common among the Arab minority in Israel. This sport

is capable of enabling the society to experience moments in which everyone can feel

included, regardless of the differences that individuals might have. It also appears that the

preservation of football as an integrative enclave requires a considerable investment of energy

and its collapse is very rare, does not mean it does not happen. The football was and still is the

largest sphere through which many Arab citizens have been looking for acceptance. It is felt

that a deep involvement in the arena of football is no solution to the plight of Arabs, but

minimizes, although at certain times, the feeling of discrimination suffered by them.

Keywords: Arab-Israeli conflict, soccer; integrative enclave.

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O CONFLITO ÁRABE-ISRAELENSE: HISTÓRIA E DESDOBRAMEN TOS

O conflito árabe-israelense tem perdurado por muito tempo e acarretado sérias

conseqüências. No final do século XIX, com o início do chamado Movimento Sionista1, os

judeus começam a retornar para a região da Palestina. No entanto, a região já era habitada por

outro povo: os árabes palestinos. Tem início a partir de então o conflito pela posse do

território e as reivindicações pelo estabelecimento de estados soberanos (ARAGÃO, 2006).

O palco desse conflito é Israel, um pequeno território localizado no Oriente

Médio, cuja área total é de 20.770 km². Com a chegada dos judeus e a fundação do Estado de

Israel em 1948, a população palestina, de aproximadamente oito milhões de pessoas, foi

dispersa pela a faixa de Gaza, Cisjordânia e países árabes vizinhos.

As negociações de paz para esse conflito parecem distantes, já que na disputa pela

terra e pela soberania, ambos reivindicam seus direitos com bases religiosas, históricas e

culturais. Os palestinos se vêem em condições precárias, pois não possuem um Estado

Independente e muito menos um território, ficando a espera de concessões israelenses. Os

palestinos não possuem um espaço para a manutenção de sua sobrevivência: local para

habitação, trabalho, manutenção de sua cultura, o que se constitui motivo de insatisfações,

revoltas traduzidos no surgimento de grupos extremistas e terroristas que ameaçam a

segurança em Israel. Motivo crucial desse impasse sobre o território é o fato de que Jerusalém

é uma terra sagrada para ambas as religiões dos povos envolvidos no conflito – Judaísmo e

Islamismo: trata-se do local onde foi enterrado Maomé e também onde foi construído o

templo de Salomão. Isso torna mais complexa a negociação entre os dois povos, pois nenhum

deles tem a intenção de ceder locais sagrados para o outro.

Pode-se observar também outros obstáculos para a criação de um acordo de Paz.

Um deles é a existência de grupos extremistas em ambos os lados. Os palestinos possuem

pelo menos dois dos maiores grupos fundamentalistas do mundo (Hezbollah e Hamas). Do

lado dos judeus, porém não tão famosos como os grupos palestinos, encontra-se por exemplo

o grupo terrorista Kach e Kahane Chai, que tem como principal objetivo a implantação do

território conforme expresso na Bíblia.

1 A palavra sionismo é derivada de Sião, o antigo nome de Jerusalém. O movimento Sionista, que teve como principal mentor Teodoro Herze, despertou a idéia da criação de um estado judaico em Israel, para que os judeus pudessem satisfazer suas profundas aspirações.

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Outro obstáculo é a existência de colonos em Gaza e na Cisjordânia, que se

recusam a retirar seus assentamentos.

A insatisfação de aproximadamente três milhões de palestinos refugiados que

vivem em condições precárias ao redor do mundo é uma questão complicada: além de todas

as questões políticas que envolvem essa situação, estes refugiados se sentem deixados de lado,

sem local para criar raízes e desfrutar sua cultura e costumes. A situação destes palestinos é

crítica, uma vez que Israel não aceita em seu território essa população, pois geraria problemas

econômicos como indenizações; problemas sociais (já que o território compartilharia cultura e

identidades que não judaicas); e problemas demográficos gerado pela superação demográfica

de palestinos em número de israelenses.

A superação demográfica dos palestinos é uma grande preocupação para Israel.

Especialistas acreditam que em breve os judeus serão uma minoria em Israel, na Faixa de

Gaza e na Cisjordânia. Isso porque de acordo com a UNICEF 2 a população árabe tem uma

taxa de fertilidade mais alta do que a judia, que cresce, sobretudo graças à imigração, porém

esta imigração tem sofrido grande queda devido à situação de segurança em Israel.

De acordo com Zimmermman (2005), os demógrafos afirmam que dentro de vinte

anos a população árabe, que atualmente é minoria, vai aumentar de vinte por cento da

população para vinte e cinco ou até trinta por cento, o que é motivo de preocupação para o

governo israelense. Diante do fato, o Conselho de Segurança Nacional de Israel preparou

novos regulamentos para a lei sobre a naturalização, cujo objetivo é dificultar a naturalização

de árabes palestinos que se casam com árabes israelenses.

Esses dados preocupam também os judeus israelitas. Com o crescimento da

população árabe israelense e consequentemente a superação demográfica deles em relação aos

judeus, os últimos ficariam em uma situação muito delicada dentro do território de Israel,

sendo cada vez mais pressionados pela população árabe que terá mais forças e instrumentos

para impor suas vontades.

Além do mais, há a disputa por recursos hídricos na região. Embora Israel tenha

sérios problemas com recursos hídricos, detém o controle dos suprimentos de água. No ano de

1967, Israel anexou dos palestinos os territórios de Gaza e Cisjordânia e da Síria tomou as

Colinas do Golã, ricos em fontes de água, para assim possuir o controle dos afluentes do Rio

Jordão.

2 Disponível em: <http://www.unicef.org/infobycountry/index.html>. Acesso em: 12 de junho de 2010.

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Os palestinos exigem que os recursos hídricos sejam repartidos com mais

equidade, já que dependem de Israel para o abastecimento de água. Argumentam também que

sua população cresce mais rapidamente e sofrem com uma falta crônica deste recurso natural

indispensável.

A questão da água em Israel é um enorme problema já que esta área não é rica em

recursos naturais, e essa escassez gera maior tensão e desentendimentos entre judeus e

palestinos.

O conflito árabe-israelense se desdobra então em várias outras variáveis que

repercutem em escala global. A questão demográfica envolvida no conflito é relevante, pois

demonstra como movimentos migratórios trazem fortes impactos na vida política da nação, na

geografia, na identidade destes, e na ordem mundial.

Além dos palestinos refugiados, que foram expulsos de Israel pelas várias guerras

travadas na região, muitos palestinos continuam vivendo dentro dos territórios de Israel e hoje

estão submetidos às leis do Estado. A convivência entre estes palestinos israelenses e os

judeus em Israel é muito complicada, os árabes são em muitas áreas excluídos pela maioria

judaica, e ficam marginalizados em um país em que são minoria.

Existe, porém em algumas áreas o desenvolvimento de laços entre esses dois

diferentes povos. A arena esportiva tem se sobressaído nessa missão, por ser uma área em que

a integração árabe-israelense mesmo que timidamente tem sido alcançada. O principal esporte

que tem desempenhado esse papel em Israel é o futebol.

O FUTEBOL E OS DILEMAS DE INTEGRAÇÃO NACIONAL

O futebol é um fenômeno social muito importante do mundo moderno. De acordo

com a historiografia, o futebol moderno apareceu pela primeira vez na Inglaterra, a

modernidade de estruturas socioeconômicas do país foram favoráveis e impulsionaram tanto o

nascimento quanto o desenvolvimento do esporte (COUTO, 2009).

A partir do final do século XIX, o futebol, junto com outros esportes burgueses,

adentrou na sociedade inglesa e de forma rápida chegou aos proletários. O futebol já era

praticado por cerca de um milhão de pessoas antes mesmo da Primeira Guerra Mundial

começar. Todavia, foi na classe média da sociedade que, os esportes ajudaram a promover a

distinção de classes (HOBSBAWM, 1988).

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Apesar de o futebol ter procedência popular, ele foi muito usado por classes mais

ricas da Inglaterra desde o século XVI. Neste período ele foi utilizado para fins pedagógicos

no complexo universitário de Oxford/Cambridge. O futebol possui recursos éticos e morais

entre eles a liderança e a disciplina. As universidades, com intenção de adaptar esses jovens à

sociedade capitalista, utilizaram então do futebol para o controle social de jovens da

aristocracia, com o objetivo de, por exemplo, conter brigas e motins (GIULIANOTTI, 2002).

De acordo com Da Matta citado por Couto (2009),

[...] desde seu crescimento e disseminação como esporte de massa, o futebol comporta diferentes significados ao assumir, de uma só vez, as dimensões de uma brincadeira, de um jogo, de um esporte e de um espetáculo. Em cada uma dessas categorias, ele promove diferentes formas de sociabilidade, desde as relações construídas no microcosmo do indivíduo até as configurações mais consistentes de identidade nacional. (Da Matta, 1982 citado por COUTO, 2009, p.39).

O esporte foi levado para a Palestina pelos soldados britânicos, e seu

desenvolvimento se deu baseado em classes e dominado pela esfera masculina, onde árabes,

judeus e soldados britânicos interagiam. Com o tempo o esporte começou a ser visto

como um indicador de saúde, progresso e revitalização social. “O esporte assumiu o poder de

cultivar a modernidade na Palestina, e se tornou um instrumento necessário tanto para a

construção da nação quanto para a luta anti-colonial’’ (SOREK, 2007, p. 21).

O esporte é apresentado pelos árabes como uma ferramenta essencial para os

jovens, pois prepara o corpo, a mente e gera obediência. E o investimento feito nessa área é

considerado um passo a mais para a modernização.

De acordo com Sorek (2007), o surgimento do futebol como um enclave 3

integrativo tem raízes nas duas primeiras décadas de existência do Estado Israelense. Durante

esses anos, o futebol foi usado tanto pelo aparelho de Estado tanto pela minoria palestina para

diferentes propósitos e a fim de satisfazer diferentes necessidades, mas o efeito dessas duas

forças moldou o futebol árabe como uma esfera de integração limitada.

Os árabes em Israel são privados de exercerem atividades que segundo sua cultura

são importantes para a figura masculina. Por isso, o esporte se tornou uma esfera essencial em

que os árabes retomam essa imagem masculina. O futebol, por exemplo, tem o potencial

mesmo que limitado de simular batalhas militares, o que ajuda imensamente os árabes em sua

masculinidade, já que em sua maioria eles não fazem parte do exército de Israel.

3 De acordo com Peter Marcuse (2001:3), “um enclave é uma área de concentração espacial na qual os membros de um grupo populacional específico, auto-definidos por etnia ou religião ou de outra forma, se congregam como uma forma de proteger e melhorar seu desenvolvimento econômico, social, político e / ou desenvolvimento cultural”.

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Nesse sentido, cabe ressaltar que as mulheres árabes nunca foram e até hoje não

são incentivadas ao esporte. A função destinada a elas é o trabalho de casa, que segundo os

árabes oferece a elas uma boa saúde e muita força e energia, assim como o esporte oferece aos

homens. As mulheres também não são levadas ao campo para assistirem aos jogos de futebol,

mesmo que elas se interessem pelo esporte. Não são bem vistas pelos homens que acham que

uma mulher no estádio é uma mulher vulgar, principalmente por estar exposta a todo tipo de

palavreado comum no futebol. Sorek (2007) afirma que os árabes em Israel também têm

medo que as mulheres queiram adquirir um modo de vida semelhante às judias, o que na

cultura árabe não é tolerado.

Até o final de 1970, os times eram praticamente divididos pelas etnias, ou

completamente árabes ou completamente judeus. Nos Jogos Olímpicos de 1976, em Montreal,

um jogador árabe representou Israel no cenário Internacional pela primeira vez. A partir desse

evento desencadeou um período de crescimento da integração de árabes em times judeus e de

judeus em times árabes.

A presença de jogadores árabes no time nacional deixa transparecer as tensões e

contradições de ser um cidadão árabe em um Estado judeu, mas também possibilita inclusão

para os árabes israelenses. O esporte em geral e o futebol em particular se tornou uma

ferramenta para uma limitada e seletiva integração, reconstruindo a identidade árabe em

Israel.

Futebol em Israel é visto como uma oportunidade para integração, enquanto

expressões de nacionalismo palestino dentro da arena esportiva são vistas como uma ameaça a

essa integração. Apesar disso o ambiente do futebol em Israel nunca foi um local apropriado e

usado para protestos.

O sucesso dos times árabes em Israel se dá principalmente devido aos municípios

árabes que dão um suporte financeiro aos clubes de futebol. O futebol é o esporte mais

comum entre a minoria árabe em Israel. Políticos locais acreditam que manter controle sobre

um time de futebol é um objetivo político importante. Assim,

No ambiente do futebol, os jogadores, funcionários e fãs dividem uma linguagem

universal, segundo a qual passados culturais não concedem uma vantagem para qualquer lado,

facilitando assim o desenvolvimento de uma interação igualitária. O sucesso de clubes de

esporte árabes pode ser percebido pelos municípios como uma oportunidade de resgatar a

cidade árabe da marginalização social (derivada da inferioridade política) e levar a uma

integração cultural dentro de uma área que não ameaça o orgulho árabe dos residentes.

(SOREK, 2007).

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De acordo com Elias e Dunning (1986), a maior função do esporte na sociedade é

de prover uma válvula de segurança, um enclave social em que formas moderadas e reguladas

de violência são permitidas. Nesse sentido, a divisão entre as classes sociais relaciona-se com

o envolvimento com o esporte. As classes menos favorecidas, como os árabes em Israel,

buscam esportes como o futebol, porque este, se comparado a tantos outros, não impõe um

alto custo para sua prática.

Bourdieu (1983), ao se referir à prática do esporte entre alunos, observa:

Quando os alunos estão no campo de esportes, é fácil vigiá-los, dedicam-se a uma atividade “sadia” e direcionam sua violência contra os colegas ao invés de direcioná-la contra as próprias instalações ou de atormentar seus professores. Sem dúvida, esta é uma das chaves da divulgação do esporte e da multiplicação das associações esportivas que, originalmente organizadas sobre bases beneficentes progressivamente foram recebendo o reconhecimento e a ajuda dos poderes públicos. Este meio extremamente econômico de mobilizar, ocupar e controlar os adolescentes estava predisposto a se tornar um instrumento e um objeto de lutas entre todas as instituições total ou parcialmente organizadas para a mobilização e a conquista política das massas e que ao mesmo tempo competiam pela conquista política das massas e que ao mesmo tempo competiam pela conquista simbólica da juventude - partidos, sindicatos, igrejas é claro, mas também patrões paternalistas. (BOURDIEU, 1983, p. 146).

Nesse sentido, é possível inferir que os clubes locais de esporte desempenham

notável uma função política. Segundo entrevistas realizadas por Sorek (2007), os prefeitos dos

municípios árabes argumentam que o grande investimento no futebol se deve principalmente

a dois fatores: o primeiro, explica um dos entrevistados, deve-se a energia acumulada pelos

jovens, que se não for gasta em esportes pode se deslocar para as drogas, crimes ou com

envolvimento com o extremismo político. O segundo fator que justifica os investimentos é o

cultivo do orgulho local.

Long e Sanderson (2001) afirmam que o esporte pode reduzir a exclusão social e

o crime urbano, e essa crença faz com que as autoridades locais invistam no esporte. Edward

Miguel (2004) ressalta que as políticas públicas possuem uma importância crucial na

construção de uma coesão da sociedade, pois possuem a capacidade de promoverem a

interação, divulgar a informação e contribuir para a abertura de espaços para diálogos,

minimizando assim as diferenças entre grupos distintos.

Quando um jovem engaja no esporte ele sente que pertence a um grupo do time,

um grupo da idade ou do local onde reside. Bourdieu (1983), afirma que diferentemente das

crianças da classe burguesa, que dificilmente engajam na carreira esportiva, as crianças das

classes dominadas têm o esporte como uma das poucas vias de ascensão social.

Para Sorek (2007), o esporte é visto como uma socialização complementar que

conecta o indivíduo com a comunidade e fortalece seu comprometimento com suas normas e

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seus valores. O esporte é também um meio para aliviar as tensões internas. Roberto da Matta

(1982) reforça que o futebol é capaz de promover sentimento de igualdade entre pessoas que

pertencem à diferentes classes sociais, etnias e religiões.

Segundo Canclini (2003), as lutas entre classes ou entre etnias é, na maior parte

dos dias, uma luta metafórica. Às vezes, a partir das metáforas, irrompem lenta ou

inesperadamente práticas transformadoras inéditas. “Abordagens neo-marxistas na sociologia

do esporte têm defendido que este é o papel que o esporte deve necessariamente desempenhar,

na medida em que sua ideologia otimista cria uma ilusão de falta de apoios estruturais e,

portanto, serve ao status quo’’ (SOREK, 2007:55).

No entanto, para o antropólogo Roberto Da Matta (1982) citado por Couto (2009),

os esportes, têm a capacidade de gerar sentimento de igualdade por pessoas de religiões,

classes ou etnias distintas. Em algumas sociedades hierarquizadas como o Brasil, o futebol,

esporte mais popular do país, possibilita à sociedade experimentar momentos em que todos

podem se sentir incluídos, independente das diferenças que os indivíduos possam ter.

Esses sentimentos são ampliados em períodos como os de Copa do Mundo,

quando pode-se perceber um aspecto fundamental da conformação da identidade nacional,

que possui como ingrediente mais importante o amor pela seleção nacional de futebol:

Ora, num país onde a massa popular jamais tem voz e quando fala é através dos

seus líderes, dentro das hierarquizações do poder, a experiência futebolística parece permitir

uma real experiência de “horizontalização do poder”, por meio da reificação esportiva. Assim

o povo vê e fala diretamente com o Brasil, sem precisar dos seus clássicos elementos

intermediários, que sistematicamente, totalizam o mundo social brasileiro para ele, e em seu

nome. (Da Matta, 1982, citado por Couto, 2009 p.22).

O antropólogo Roberto da Matta (1982), defende que apesar do futebol ser usado

por governos autoritários com a finalidade de se beneficiarem dele, essas experiências têm um

grande significado já que oferecem à “massa” a oportunidade de gozarem de um sentimento

pleno de nacionalidade.

A BUSCA PELA INTEGRAÇÃO: DILEMAS E PERSPECTIVAS

A construção de uma identidade comum é um poderoso instrumento para criar

um sentimento de “comunidade”. Em Israel, o futebol fornece elementos para a construção de

uma “comunidade imaginada”. No entanto, a forma com que a imprensa apresenta as notícias

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sobre futebol, e os comentários que as acompanham, reflete as tensões e contradições na

condição existenciais dos árabes palestinos em Israel.

Curiosamente, segundo estatísticas, as competições entre dois times árabes

tendem a serem mais tensas e conflituosas comparadas com os jogos entre um time árabe

contra um time judeu, ou um jogo entres dois times judeus. A contratação de jogadores judeus

por times árabes é muito recorrente. Porém, muitos árabes tradicionais não agradam disso,

pois para eles esse tipo de contratação faz com que os próprios árabes se inferiorizem ao

preferirem investir dinheiro em jogadores judeus (SOREK, 2007). A infiltração dos jogadores

judeus na área do futebol muitas vezes é comparada com o roubo das terras dos palestinos.

Para alguns líderes árabes tradicionais, os árabes devem jogar futebol e o futebol deve ser

árabe.

A comparação do jogo de futebol com um campo de batalha é muito comum

quando a imprensa árabe comenta sobre os jogos entre times árabes contra times judeus. A

presença de jogadores árabes em times judeus abre portas para um a interpretação integrativa.

Para a imprensa árabe, a dimensão dessa integração é delimitada. Um árabe jogando pelo

Estado de Israel não tem um status de membro integral, e sim de um convidado.

Apesar de críticas na contratação de jogadores judeus nos times árabes, esses são

em sua maioria aceitos favoravelmente. O aparecimento de jogadores árabes com o uniforme

da seleção nacional deveria criar um fenômeno único na sociedade - um símbolo dividido por

judeus e árabes cidadãos do Estado.

Do ponto de vista dos cidadãos árabes, uma participação ativa na seleção nacional

de Israel, que é um símbolo nacional secular, oferece uma excelente oportunidade para

identificar com um símbolo nacional israelense. Jogadores árabes dizem que no time nacional

eles não se sentem como árabes, mas como qualquer um ali. Alguns árabes até afirmam que

são orgulhosos de serem israelenses e que ficam emocionados quando toca o hino nacional de

Israel (SOREK, 2007).

Apesar da excelência no futebol abrir oportunidades para os cidadãos árabes, a

idéia de controle social fica evidente: a participação dos árabes em times de futebol

israelenses não lhe garante acesso a outras áreas, como por exemplo, a política. No entanto, ao

compor um time de futebol israelense, o jogador árabe se sente, ainda que parcialmente,

inserido naquela sociedade, o que o torna mais permeável à aceitação dos valores israelenses.

Para a maioria judaica, a participação dos árabes também revela sentimentos

contraditórios. Segundo Hobsbawm (2007), essa maioria pode se tornar divida entre o

sentimento de orgulho que eles têm pelos seus clubes e o sentimento que possuem pela

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seleção nacional, já que nesta se incluem jogadores árabes que têm cada vez maior

proeminência e importância para a seleção israelense.

Segundo pesquisas realizadas por Sorek (2007), os jornais árabes são sempre

empenhados em defender a honra dos jogadores árabes quando sua posição na equipe

nacional está ameaçada. Pois alguns acham que mesmo que o jogador árabe sempre mostre

excelência, ele será sempre deixado de lado.

Interpretar o futebol como um caminho desejável para a integração na sociedade

israelense não é rara nas seções de esporte dos jornais árabes, mas é sempre acompanhado

pelo constante medo da assimilação e dos jogadores árabes perderem sua identidade árabe.

Isso simboliza a distância entre os repórteres, que são um grupo engajado politicamente e com

consciência nacional, dos jogadores que em sua maioria não se engajam na política e não

estão preocupados com a identidade nacional e por isso são muito influenciados pela cultura

hebraica que reina nos campos de futebol. Sorek (2007) afirma que o esporte tem sido bem

sucedido enquanto muitos outros têm falhado. O sistema de educação, por exemplo, nunca

obteve êxito em incentivar os valores da coexistência como o esporte promoveu.

Quando o primeiro time árabe ganhou o campeonato nacional, a imprensa judaica

foi muito receptiva, e, por uma noite, a minoria árabe se sentiu em igualdade com os judeus,

já que um time árabe era o time do Estado, que representaria Israel no exterior.

Os fãs de esporte árabes são muito mais expostos ao discurso integrativo

dominante apresentado pelos jornais judeus do que o discurso de orgulho nacionalista que

domina a imprensa árabe. Ainda assim, a imprensa árabe também percebe a oportunidade

integrativa que o futebol oferece.

Em seu livro, “Arab Soccer in a Jewish State: the integrative enclave’’, Tamir

Sorek apresenta um caso de uma partida entre um time árabe de Israel contra um time de

palestinos refugiados na Jordânia. O time árabe israelense possuía jogadores judeus e isso fez

com que houvesse um grande desconforto para o time dos palestinos refugiados que não

queriam que esses jogadores judeus participassem da partida.

Segundo Sorek (2007), esse incidente ilustra a complexidade da existência da

minoria árabe israelense em Israel4. A solidariedade do time árabe israelense que não aceitou

a pressão dos palestinos para que os judeus fossem barrados do jogo, não mostra

necessariamente uma integração entre a maioria judaica com a minoria árabe em Israel.

4 Esse termo se refere aos milhões de árabes que são cidadãos israelenses, que não saíram do país durante as guerras ocorridas e permanecem sob as leis Israelenses.

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A fonte do incidente é o papel paradoxal que o futebol tem para os palestinos em Israel: um enclave integrativo. O enclave integrativo é a esfera social que é guiada por um discurso liberal-integrativo de cidadania – em grande contraste com o discurso étnico que governa a esfera publica de Israel em geral. É a esfera que permite uma bem delimitada inclusão na cidadania de Israel. (SOREK, 2007, p. 2).

Os Palestinos em Israel enfrentam dificuldades em relação a sua identidade, já que

não são totalmente aceitos nem pelos judeus em Israel e nem pelos palestinos refugiados.

Enquanto a identidade árabe-palestina deles os coloca na posição de inimigos para a maioria

judaica, eles são ao mesmo tempo considerados suspeitos pelos palestinos de fora de Israel

(SOREK, 2007).

Apesar de serem excluídos pelos judeus em Israel, os árabes israelenses ainda

possuem mais liberdade política e oportunidades econômicas do que os refugiados palestino

na Faixa de Gaza e na Cisjordânia e até mesmo da maioria dos cidadãos árabes em países

vizinhos. Essas contradições complicam ainda mais as questões de pertencimento e

identificação (SOREK, 2007).

Um fato interessante é que os árabes israelenses se sentem muito diferentes dos

judeus israelenses, porém, muito mais diferentes dos árabes refugiados em Gaza ou na

Cisjordânia.

Separação e substituição são duas táticas usadas pelos árabes israelenses para lidar

com a tensão criada pelo conflito Israelense-Palestino. A primeira consiste na total separação

dos árabes israelenses para com os judeus em todas as esferas. Já a segunda tática faz com que

os árabes israelenses se afastem de toda e qualquer identidade nacional, e se aproximem de

identidades não nacionais.

Sorek (2007) argumenta que o futebol é uma excelente esfera para que essas duas

estratégias sejam realizadas. O futebol então seria uma parte da estratégia de facilitar a

segregação espacial das identificações divergentes.

O futebol então serve como uma esfera em que os árabes cidadãos de Israel

tentam “suspender” sua identidade como Palestinos, e muitas vezes usam da estratégia da

substituição para trocar identidade palestina pela identificação com os times de futebol. Esse

esporte oferece para os homens árabes uma esfera segura de competitividade masculina,

fraternidade e identificação com bandeiras e emblemas, e ao mesmo tempo evita identificação

tanto palestina quanto Israelense.

Segundo Allison (1986), o sucesso e visibilidade do futebol árabe têm implicações

políticas. A arena esportiva possui um considerável poder simbólico e por isso é uma esfera

onde recursos políticos estão prontamente disponíveis.

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O esporte pode ser visto como uma oportunidade de integração dos árabes dentro

da sociedade dos judeus israelenses e aceitação por essa maioria, mas também como um palco

para a promoção política e orgulho nacional. Isso se deve pelo fato do conflito árabe

israelense ter uma grande intensidade e pelo futebol ser uma área de maior visibilidade dos

cidadãos árabes.

Surpreendentemente, apesar do lugar significativo que os homens árabes em Israel

dão para o esporte em geral e o futebol em particular, o futebol está longe de ser o local para

resistência política ou identificação nacional (SOREK, 2007).

Porém, caracterizar uma esfera como apolítica é uma tática de sucesso para atingir

alguns objetivos políticos, esse é precisamente um dos segredos da eficiência do esporte como

uma arma política nos conflitos sociais.

AS CONTRADIÇÕES INERENTES À “COMUNIDADE IMAGINADA”

Tamir Sorek (2007) apresenta o caso do time Maccabi Haifa, que possui fãs

tanto judeus quanto árabes. Esses fãs dividem os mesmos bancos nas arquibancadas dos

jogos, gerando um fenômeno muito significativo. O estádio de futebol se torna então um

espaço que lida com uma reconstrução temporária de identidades, um projeto que cria um

temporário “nós”. Segundo Hobsbawn (2007), o futebol seria a atividade pública que combina

discussões entre globalização, xenofobia e a identidade nacional.

A “imagem apolítica” do futebol faz com que ele seja o caminho escolhido para a

integração dentro da sociedade judaica. A grande similaridade entre as formações simbólicas

das cerimônias nacionais e ser um torcedor em um estádio de futebol é outro fator que

proporciona o sucesso do futebol entre os cidadãos árabes, ser fã de futebol é uma prática

alternativa para identificação nacional. Cabe ressaltar que para ser um bom cidadão, o

palestino deve ser apolítico (Sa’ár 1998), ou seja, não deve ser cidadão pleno.

Quando um jogador árabe entra para um time judeu, os fãs começam a apoiar esse

time por causa dele, e mesmo se depois de um tempo esse time fica sem jogadores árabes, os

torcedores continuam a apoiá-lo, como o que aconteceu no time Maccabi Haifa com o jogador

árabe Armeli.

Haifa é uma cidade mista em Israel, onde árabes e judeus, apesar dos conflitos do

passado, vivem em harmonia. As relações entre árabes e judeus em Haifa caracterizam-se por

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uma relativa tolerância e baixos níveis de separação mental e distância física em comparação

com outras cidades mistas. O apoio ao time judeu por árabes cria a oportunidade de tolerância

em Haifa. O fato dos times em Haifa incluírem freqüentemente jogadores árabes proporciona

uma nova e decisiva dimensão.

Muitos torcedores declaram que não suportavam a seleção nacional e nem torciam

por ela, mas não tinham medo de dizer que apoiavam o Maccabi Haifa e nem sua bandeira e

música, e que por fazerem isso não tinham nem um confronto com sua família e nem amigos,

diferentemente do que aconteceria se torcessem pela seleção nacional. Muitos árabes se

sentem bem quando a seleção nacional é derrotada, principalmente pelo fato dela não os

representar. O hino não os representa, nem qualquer símbolo usado pela seleção. Representa

Israel, mas não representa os árabes.

Então para esses fãs árabes de futebol, o seu time se torna seu Estado, é ele que os

representa: é o único lugar em Israel onde eles possuem um sentimento de pertencimento. No

estádio, todos os torcedores, a despeito de serem árabes ou judeus são fãs do mesmo clube, o

que gera um sentimento de profunda identificação. Para os árabes, apoiar um time de futebol

judeu é parte de uma configuração geral de padrões de envolvimento na sociedade judaica. O

apoio a um time de futebol cria uma oportunidade para um árabe ser fiel a uma bandeira sem

ser classificado por árabes como simpatizante de símbolos sionistas ou pelos judeus como um

traidor. Os fãs do esporte querem acreditar que no futebol não existem árabes ou judeus, e por

isso não existe conflito, não existe questões de segurança.

O desejo pela integração é a variável responsável pelas diferenças na freqüência

de idas aos jogos entre árabes e judeus, e também pela falta de demonstração de orgulho

nacional palestino. A experiência no estádio pode oferecer aos palestinos uma experiência

“quase” nacional. Pelo fato da nacionalidade palestina não ser próxima à identidade

israelense, outras identidade não nacionais são desenvolvidas para satisfazer a necessidade

emocional pelo orgulho e pertencimento.

Um time de futebol pode ser visto como um foco de pertencimento, preenchendo

um papel similar para resolver o dilema da identidade nacional. Ser fã de futebol serve para os

palestinos em Israel como um nacionalismo substituto.

A imagem construída do futebol como uma “arena apolítica”, livre de conflitos e

não nacional requer a exclusão de todos os sinais explícitos de posições políticas ou

identificação nacional. Existem dois eventos que minam a definição “apolítica” do evento:

gritos anti-árabes de torcedores judeus e a execução do hino nacional em jogos internacionais.

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Esses eventos desestabilizam a definição que os árabes tentam atribuir a arena e

criam linhas que dividem os fãs. Afrontas aos jogadores árabes por parte dos judeus “recriam”

o conflito árabe-judeu para dentro do campo de futebol e ameaçam a existência de uma

“esfera apolítica” que o Estado tenta criar. A execução do Hino nacional israelense, por sua

vez, inflama o orgulho sionista. Os árabes justificam que o hino nacional 5 é executado

somente para os judeus: nem o hino nem a bandeira de Israel os representam.

Os símbolos do Estado em geral representam um problema. Espera-se que os

jogadores árabes na equipe nacional cantem o hino de Israel. No entanto, o primeiro verso do

hino já causa um constrangimento enorme para os árabes pois diz "Enquanto no fundo do

coração palpitar uma alma judaica...". Esse hino não os representa, e por isso inviabiliza sua

aceitação por parte dos árabes israelenses, que são cidadãos de Israel, mas são excluídos até

mesmo pelo hino do seu próprio Estado. A discussão sobre as letras, no entanto, continua

sendo um tabu.

Depois há a questão da bandeira azul e branca com a Estrela de Davi, um símbolo

unicamente judaico. A bandeira está presente em todas as aldeias árabes de Israel, mas não

serve como um símbolo de identificação para os árabes. A maioria judaica ainda não achou

uma boa resposta para a resolução deste problema.(ZIMMERMMAN, 2005)

São muitas as táticas usadas pelos árabes quando tocado o hino israelense. Alguns

trocam palavras da canção, outros se levantam para não criar problemas, mas não cantam o

hino, enquanto outros afirmam não conhecer a língua e por isso não conseguem cantar. Tais

afirmações deixam transparecer a contradição dos sentimentos árabes e judeus. Interagindo

com judeus, muitos árabes preferem enfatizar seu apoio ao time judeu, se despindo naquele

momento do sentimento árabe palestino.

Uma pesquisa nacional descobriu que a Seleção israelense de futebol tem uma

grande popularidade entre os árabes. Essa descoberta é muito interessante já que a seleção é

marcada pela presença de inúmeros símbolos sionistas. A pesquisa aponta ainda que muitos

árabes consideram a seleção nacional como um canal para integração dentro da sociedade

judaica. A presença de jogadores árabes é motivo de orgulho (SOREK, 2007).

A seleção israelense é um símbolo nacional divido por árabes e judeus cidadãos

do Estado. A seleção é o único símbolo secular que permite identificação. A aceitação pelos

5 O hino nacional de Israel foi escrito por Naftali Herz Imber. O significado de seu título, HATIKVA, é: “A Esperança”. Hatikva expressa a esperança do povo judeu cumprir a profecia da Bíblia de, um dia, retornar para a terra de seus antepassados. Os judeus foram exilados pelo exército romano, e durante os dois mil anos que ficaram em exílio, olhavam para o leste, em direção a Jerusalém, e faziam orações diárias especiais, para retornarem para Israel.

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judeus de jogadores árabes como seus representantes e a decisão dos árabes de representar o

Estado de Israel são escolhas de pertença.

O apoio a seleção nacional é para os cidadãos árabes uma excelente oportunidade

para identificação com um símbolo nacional israelense. O apoio de árabes ao time dá chance a

eles de ganharem reconhecimento como cidadão de direitos iguais. Mas claro que essa

identificação está longe de estar livre de problemas e restrições. Couto (2009) argumenta que

[...] na medida em que o futebol promove a união, o nivelamento e a excitação, é criado – tanto no momento do jogo como nas relações perpetuadas por ele – um espaço altamente significativo para que se reproduzam os antagonismos e conflitos que permeiam a vida social. Seguindo esse raciocínio, os embates políticos encontram no futebol, ou melhor, no espaço simbólico criado por ele, um terreno fértil para sua reprodução. Nesse sentido, é possível perceber, na abrangente rede de relações que cerca o jogo da bola, a conformação de uma cultura política, ou seja, de um conjunto de representações que são compartilhadas por aqueles indivíduos e grupos cujo nível de participação varia de acordo com sua adesão a determinado ambiente cultural [...] (COUTO, 2009 p. 23).

Percebe-se então que o futebol pode criar para os árabes em Israel um sentimento

de integração e pertencimento junto a maioria judaica, mas que ao mesmo tempo pode se

tornar um ambiente em que os conflitos da vida social são projetados, ou seja, o conflito

árabe-israelense pode se reproduzir nas arenas esportivas.

Segundo Sorek (2007), existem algumas estratégias usadas pelos árabes para lidar

com os símbolos sionistas no time nacional. A primeira é a estratégia da ignorância: não

cantam o hino porque não sabem, se levantam, mas não cantam por simplesmente não

conhecerem as palavras e não as absorverem. É como se a ignorância os protegesse da

necessidade do confronto com o significado simbólico do hino de Israel.

A segunda estratégia usada é a da separação, como se o hino fosse judeu, mas o

time de Israel. O hino não é deles, mas eles respeitam como respeitariam o hino de qualquer

outro país. Porém a seleção representa tanto árabes como judeus, pois ambos jogam.

A terceira estratégia é a distinção entre o jogador árabe e o time. Quando a seleção

joga, eles querem que ela perca, mas que o jogador árabe faça um gol e se destaque mostrando

assim o quanto é bom.

Os árabes em Israel possuem um forte desejo de participar da arena pública

israelense e não continuar sendo marginalizados pela maioria judaica. Por isso, quando uma

oportunidade mesmo que simbólica, como a seleção nacional de futebol é aberta eles a

aproveitam ao máximo, com identificação e apoio. Diante de tudo isso, existe uma grande

contradição pelo fato da arena do futebol poder dar esperança e também ilusão à minoria

árabe em Israel.

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POSSIBILIDADES DE INTEGRAÇÃO: SUCESSOS E FRACASSOS

Segundo Woodward (2000), a construção da identidade é tanto simbólica quanto

social. As desigualdades e conflitos sociais são conseqüências da luta para a afirmação das

diferentes identidades. Os efeitos de um grupo simbolicamente marcado como inimigo ou

como tabu são reais, porque o grupo será socialmente excluído e terá desvantagens materiais.

De acordo com Woodward (2000):

O social e o simbólico referem-se a dois processos diferentes, mas cada um deles é necessário para a construção e a manutenção das identidades. A marcação simbólica é o meio pelo qual damos sentido a práticas e a relações sociais, definindo, por exemplo, quem é excluído e quem é incluído. É por meio da diferenciação social que essas classificações da diferença são ‘‘vividas’’ nas relações sociais. (WOODWARD, 2000 p.14)

As identidades surgem a partir do jogo de modalidades específicas de poder e são,

assim, mais o resultado de uma forte marcação da diferença e da exclusão do que uma

unidade idêntica, em seu significado tradicional - uma identidade construída naturalmente,

inteira e sem diferenciação interna.

No norte de Israel, há um homem, e uma equipe por trás dele, que passou a maior

parte da última década, mostrando aos judeus israelenses que seus concidadãos árabes são

companheiros dignos. Ao fazer isso, ele destacou a discriminação que eles experimentam dia

a dia.

Na Galiléia há uma aldeia chamada Sakhnin, onde as estradas não são todas

pavimentadas. Durante anos, as crianças de Sakhnin, todas árabes israelenses, foram cercadas

pelo posto avançado do exército situado nos arredores da cidade, e pelas expectativas, ou a

falta dela, para os cidadãos árabes de Israel.Tudo isso foi verdade, mas a situação de

esquecimento da cidade mudou quando Abbas Suan, um jogador de futebol alterou mesmo

que por um momento, a forma como o país vê os seus cidadãos árabes. (WILDMAN, 2010)

Em um país onde o futebol é visto por todos os homens e mulheres, cristãos,

muçulmanos e judeus, o jogo tem uma chance de mostrar a israelenses e palestinos como o

futuro do Oriente Médio poderia parecer.

B'nei Sakhnin, uma equipe da cidade, é formada por uma mistura de jogadores:

árabes, judeus, muçulmanos e cristãos. Dirigido por um treinador judeu que estimula seus

jogadores a ver uns aos outros como irmãos, o clube conquistou o título nacional israelense de

futebol, em 2004, um momento que superou todas as expectativas, e trouxe Sakhnin e Abbas

Suan ao palco internacional. A equipe não tinha lugar de treinamento adequado, e durante

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anos, não possuía um estádio apropriado. Em 2005, Abbas Suan, um meio-campista e capitão

do Sakhnin, foi convocado para jogar pela equipe nacional de Israel. Suan era um dos dois

jogadores árabes israelenses que iria jogar em nome do Estado judeu.

De acordo com Zimmermman (2005), isso apresenta claramente o grande

paradoxo vivido pela sociedade israelense: Abbas Suan é um jogador de futebol árabe-

israelense, um artilheiro para o time local da cidade árabe de Sakhnin, bem como para a

seleção nacional de Israel.

Woodward (2000) afirma que a identidade é relacional. Ou seja, a identidade

árabe depende, para existir de uma outra identidade, que não é a sua, distinta da identidade

árabe, mas que, entretanto, fornece as condições para que ela exista. A identidade árabe se

diferencia por aquilo que ela não é. Ser um árabe é ser um ‘‘não-judeu’’. A identidade é

assim, marcada pela diferença.

Os sistemas representacionais que destacam a diferença na afirmação das

identidades nacionais, podem ser por exemplo, um uniforme, uma bandeira nacional ou até

mesmo alimentos e bebidas.

Em um jogo contra a Irlanda pelas classificatórias para a Copa do Mundo, Suan

conseguiu marcar o gol empatando o jogo aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo. O

gol de Abbas Suan no último minuto, salvou a honra de Israel e sua chance de tentar chegar

ao Mundial de 2006.

O fato de um árabe ter a honra de salvar o Estado judeu no campo de futebol é

muito difícil de ser aceito pelos racistas de Israel no estádio ou na frente da tela da televisão.

Alguns não estavam prontos para vê-lo naquela altura, e chegavam a gritar para ele que ele

não os representava, ou até mesmo fizeram insultos cruéis ao jogador, como em um amistoso

contra a Croácia, em Jerusalém, no coração do racismo do futebol de Israel, Suan foi vaiado e

amaldiçoado por usar as cores de Israel. Mas foi Suan que marcou um gol contra a Irlanda e

manteve Israel na disputa para jogar a Copa do Mundo pela primeira vez. (ZIMMERMMAN,

2005)

De acordo com Mazen Ghanaim, o proprietário do B'nei Sakhnin, é por causa dos

jogadores árabes na equipe nacional, que muitos países em todo o mundo sabem que existe

uma minoria árabe dentro de Israel. Para Ghanaim o futebol é uma ponte, mas a paz e a

convivência são feita com dois lados e não somente com um. (WILDMAN, 2010)

A marcação da diferença é fundamental nos momentos em que se constroem as

posições de identidade. As identidades são fabricadas por meio da marcação da diferença, que

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ocorre por meio de sistemas simbólicos de representação e também por meio de formas de

exclusão social. Assim,

[...]A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade depende da diferença. Nas relações sociais, essas formas de diferença - a simbólica e a social - são estabelecidas, ao menos em parte, por meio de sistemas classificatórios. Um sistema classificatório aplica um princípio de diferença a uma população de uma forma tal que seja capaz de dividi-la (e a todas as suas características) em ao menos dois grupos opostos - nós/eles (por exemplo, servos e croatas); eu/ outro. Na argumentação do sociólogo francês Émile Durkheim, é por meio da organização e ordenação das coisas de acordo com sistemas classificatórios que o significado é produzido. Os sistemas de classificação dão ordem à vida social, sendo afirmados nas falas e nos rituais.[...] ( WOODWARD, 2000 p. 40)

A maneira que a cultura estabelece fronteiras e distingue a diferença são

fundamentais para entender as identidades. A diferença é aquilo que está entre uma identidade

e a outra, que estabelece diferenças, que estão normalmente na forma de oposições, como

‘‘nós’’e ‘‘eles’’. A marcação da diferença é então o principal componente em qualquer

sistema de classificação.

Wildman (2010) salienta que para entender o contexto para a milagrosa vitória

Sakhnin e o tão importante gol de Suan, necessita-se de uma retrospectiva. Em 1948, quando

o Estado de Israel declarou independência, 160.000 árabes permaneceram no interior do

Estado novo. Esta minoria hoje chega a cerca de 1,4 milhões. Embora oficialmente eles

gozem de plena igualdade, na realidade eles são discriminados, e não são totalmente

integrados na sociedade israelense. E toda a situação fica mais crítica quando acontecem

atentados terroristas em Israel. Pois os árabes israelenses, embora não sejam responsáveis,

sentem o impacto de toda a raiva, ansiedade e o ódio que ecoa através de Israel. Árabes

israelenses são marginalizados na sociedade israelense, sempre lutando por seus direitos.

Em outubro de 2000, os árabes israelenses foram às ruas protestar contra a

discriminação. Os protestos coincidiram com revoltas na Cisjordânia e Faixa de Gaza entre os

palestinos. Apavorados pelo fato de que a população árabe israelense estava aumentando, a

polícia israelense disparou contra os manifestantes, matando 13 ao todo, dois de Sakhnin. Foi

um golpe devastador para a comunidade. Em Sakhnin foi erguido um monumento aos mortos,

que tornou-se um constante lembrete da fragilidade da paz. Para os jogadores da equipe

Sakhnin, foi também um lembrete de que a cidade olhava para eles como um símbolo de

esperança.

“Para lidar com a fragmentação do presente, algumas comunidades buscam retornar a um passado perdido, “ordenando... por lendas e paisagens, por historias de eras de ouro, antigas tradições, por fatos heróicos e destinos dramáticos localizados em terras prometidas, cheias de paisagens e locais sagrados...” (Daniels, 1993 p.5)”

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Algo que é muito comum no caso das identidades nacionais é o apelo a mitos

fundadores. As identidades nacionais existem, na maioria das vezes, por meio de

‘‘comunidades imaginadas’’. Por não existir uma ‘‘comunidade natural’’ em torno da qual

possam se reunir as pessoas que constituem um determinado agrupamento nacional, a

comunidade passa a ser imaginada, criada. Criam-se laços imaginários que ‘‘ligam’’

indivíduos isolados que não possuíam o ‘‘sentimento’’ de terem qualquer coisa em comum.

(SILVA, 2000)

A língua tem sido um dos elementos principais desse processo, pois, normalmente

a história da imposição das nações modernas coincide com a história da imposição de uma

língua nacional única e comum. Algo central como a língua é a construção de símbolos

nacionais, como por exemplo, hinos e bandeiras.

As tentativas de recuperar uma história perdida e reescrevê-la, caracterizam

muitas vezes os conflitos nacionais e étnicos. A afirmação política das identidades requer um

tipo de autenticação. E essa autenticação muito frequentemente é feita por meio da história do

grupo cultural.

Até certo ponto, Suan sempre soube que a mistura desses dois mundos - o conflito

árabe-israelense e do futebol - era potencialmente volátil. Ele só tinha de olhar para trás vinte

anos na história de Israel, para Rifaat "Jimmy" Tourk, um grande astro do futebol da década

de 1970 e 1980. Tourk também é um árabe israelense, nasceu em Jaffa, e foi o primeiro árabe-

israelense na equipe nacional. Para ele, torcedores e jogadores gritavam: "Vai jogar no

Líbano!" (WILDMAN, 2010)

A diferença dos dias de hoje é a resposta da sociedade israelita e a condenação

rápida destes atos. Quando Abbas Suan foi vaiado pela torcida em um dos jogos pré-Copa do

Mundo, todos os jogadores e dirigentes foram até ele e afirmaram que eram contra esse

incidente e que estavam com ele. Suan pode ser um símbolo dos esforços para coexistir com

os judeus, mas primeiramente ele é jogador de futebol.

Para além dos êxitos obtidos pela integração via esporte, o futebol, em todo o

mundo, apresenta casos graves de racismo. Durante a última década foram fundadas

organizações para lidar com os problemas que envolvem fãs que insultam jogadores negros e

asiáticos, torcedores que gritam para as equipes tradicionalmente judaicas que elas devem ser

enviados para as câmaras de gás, e onde os jogadores árabes israelenses suportam ameaças tão

terríveis como "morte aos árabes", simplesmente por pisar no campo de futebol.

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O hibridismo6, para a teoria cultural contemporânea, contrapõem aqueles

processos que percebem as identidades como fundamentalmente separadas, divididas,

segregadas. O processo em que ocorre a hibridização confunde a hipotética pureza e

insolubilidade dos grupos que se reúnem debaixo de identidades nacionais, raciais ou étnicas

diferentes. As identidades formadas através do hibridismo não são integralmente as

identidades originais, mas possuem traços delas.

Não se pode esquecer, entretanto, que a hibridização se dá entre identidades situadas assimetricamente em relação ao poder. Os processos de hibridização analisados pela teoria cultural contemporânea nascem de relações conflituosas entre diferentes grupos nacionais, raciais ou étnicos. Eles estão ligados a histórias de ocupação, colonização e destruição. Trata-se, na maioria dos casos, de uma hibridismo “desigual”. O que a teoria cultural ressalta é que, ao confundir a estabilidade e a fixação da identidade, a hibridização, de alguma forma, também afeta o poder. [...] ( SILVA, 2000 p. 87)

O hibridismo está ligado aos movimentos demográficos que possibilitem que

diferentes identidades entrem em contato. Estes movimentos são: diásporas, deslocamentos

nômades, viagens, cruzamentos de fronteiras, entre outros.

Em 2003, o ‘’New Israel Fund’’, uma organização que apóia os direitos civis em

Israel, reuniu uma equipe de voluntários de cinqüenta monitores de futebol de um programa

para reduzir a violência nas arquibancadas. Embora os incidentes de racismo não tenham

acabado, tiveram uma considerável queda. O poder social das estrelas de futebol é imenso,

assim como a necessidade de haver heróis nessa arena. O projeto dá às crianças a

oportunidade de conhecer seus ídolos, além de enviar monitores para as arquibancadas. Os

próprios jogadores começaram a tomar posições contra o racismo na imprensa.

A pluralidade é tanto um ideal político quanto um slogan metodológico. O

problema existe em como conseguir negociar entre duas histórias diferentes. Como seria

possível recuperar aquilo que se tem em comum: a intercessão de vários passados e vários

presentes, as inevitáveis relações entre significados partilhados e significados contestados

entre valores e recursos materiais.

A identidade tem um papel de destaque nas discussões contemporâneas, no

contexto das reconstruções globais das identidades nacionais e étnicas e da emergência dos

‘‘novos movimentos sociais’’, que se preocupam em reafirmar as identidades pessoais e

culturais.

Em geral, o chamado ‘‘multiculturalismo’’ apóia-se em um vago e benevolente apelo à tolerância e ao respeito para com a diversidade e a diferença. É particularmente problemática, nessas perspectivas, a idéia de diversidade. Parece difícil que uma perspectiva que se limita a proclamar a existência da diversidade

6 De acordo com Silva (2000:87), o hibridismo é a mistura, a conjunção, o intercurso entre diferentes nacionalidades, entre diferentes etnias, entre diferentes raças.

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possa servir de base para uma pedagogia que coloque no seu centro a crítica política da identidade e da diferença. Na perspectiva da diversidade, a diferença e a identidade tendem a ser naturalizadas, cristalizadas, essencializadas. São tomadas como dados ou fatos da vida social diante dos quais se deve tomar posição. Em geral, a posição socialmente recomendada é de respeito e tolerância para com a diversidade e a diferença[...] (SILVA, 2000 p. 73)

Quando uma pessoa afirma que ela é árabe, na verdade, isto faz parte de uma

cadeia de negações, de expressões negativas de identidade, de diferenças. Por trás da

afirmação de que uma pessoa é árabe deve-se entender também que ela não é judia, e assim

por diante, numa cadeia, neste caso, quase interminável.

As afirmações sobre diferença também dependem de uma cadeia, em geral oculta,

de declarações negativas sobre (outras) identidades. A identidade e a diferença são

inseparáveis, uma depende da outra, e sempre possui um traço da outra. Essas relações não

são do mundo natural, e sim do mundo cultural e social, elas têm que ser ativamente

produzidas. Elas são fabricadas pelas próprias pessoas, no contexto de relações culturais e

sociais.

Identidade e diferença são relações sociais, que não são meramente definidas e

coexistem, são relações impostas e disputadas.

De acordo com Silva (2000), na disputa pela identidade está envolvida uma

disputa mais ampla por outros recursos simbólicos e materiais da sociedade. A afirmação da

identidade e a enunciação da diferença traduzem o desejo dos diferentes grupos sociais,

assimetricamente situados, de garantir o acesso privilegiado aos bens sociais. A identidade e a

diferença estão, pois, em estreita conexão com relações de poder. O poder de definir a

identidade e de marcar a diferença não pode ser separado das relações mais amplas de poder.

A identidade e a diferença não são, nunca, inocentes.

O poder está presente nas relações de identidade e diferença. São outras tantas

marcas da presença do poder: excluir/incluir (‘‘estes pertencem, aqueles não’’); demarcar

fronteiras (‘‘nós e eles’’); classificar (‘‘bons e maus’’; ‘‘puros e impuros’’; ‘‘desenvolvidos e

primitivos’’; ‘‘racionais e irracionais’’); normalizar (‘‘nós somos normais; eles são

anormais’’). Nesse sentido,

[...] a identidade e a diferença se traduzem assim, em declarações sobre quem pertence e quem não pertence, sobre que está incluído e quem está excluído. Afirmar a identidade significa demarcar fronteiras, significa fazer distinções entre o que fica dentro e o que fica fora. A identidade está sempre ligada a uma forte separação e distinção, supõem e, ao mesmo tempo, afirmam e reafirmam relações de poder. ‘‘Nós’’ e ‘‘eles’’ não são, neste caso, simples distinções gramaticais. Os pronomes ‘‘nós’’ e ‘‘eles’’ não são, aqui, simples categorias gramaticais, mas evidentes indicadores de posições-de-sujeito fortemente marcadas por relações de poder. ( SILVA, 2000 p.82)

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A alegria dos dois sucessos - a vitória improvável do B'nei Sakhnin do

campeonato nacional de futebol, que os levou a representar Israel na Europa, e o gol de Abbas

Suan - foi manchada por racismo impregnado. Mas existem pessoas que reconhecem que a

história de Sakhnin fornece uma janela, um vislumbre de um outro caminho para o Oriente

Médio - imperfeita, com certeza, profundamente falha. Mas ainda assim melhor para o esporte

O time de Sakhnin, foi o primeiro time árabe a ganhar a Copa do Estado de Israel,

ganhando a oportunidade de representar Israel internacionalmente, porém a cidade ainda

espelha a dificuldade na relação entre árabes e judeus. Na esfera do futebol, os moradores

árabes da cidade tentam um diálogo na tentativa de serem aceitos pela maioria judaica.

Sakhnin é marcada como o foco do protesto nacional árabe palestino. É o símbolo da luta

nacional, tem uma posição alta na hierarquia nacional árabe-palestina e importância islâmica.

Por isso a cidade é mal vista pelos judeus, mas ganhou o campeonato nacional e então, através

do futebol, adquiriu novo status.

A popularidade dos times de futebol árabes resulta em parte de seu potencial para

fornecer um orgulho guerreiro, masculino e competitivo que é não nacionalista e por isso não

contradiz a “israelinização”. Os moradores da cidade de Sakhnin apresentam um alto nível de

orgulho local, sua maior identificação é com a sua cidade.

O futebol teve um grande papel para unir o povo de Sakhnin que antes era

totalmente dividido. Orgulho local e ser fã de futebol estão muito relacionados. O futebol é

para eles uma área de integração sem riscos, onde eles podem querer ser considerados como

cidadãos israelenses comuns. O futebol dá a oportunidade do povo da cidade ser considerado

bons cidadãos: buscam demonstrar por meio do futebol que eles não são pessoas violentas,

que não são racistas e que querem viver com dignidade e paz.

A bandeira palestina nunca é vista nos jogos de futebol, e nem são escutados

slogans palestinos. Ao invés disso, o espaço do futebol é marcado por patriotismo local não

nacional, que não possuem o potencial para ameaçar a maioria judaica, pois, expressões de

nacionalismo palestino entre os árabes em Israel são considerados atos de árabes contra

judeus (SOREK, 2007).

Jogadores de futebol árabes fazem o máximo que podem para burlar sua

identidade nacional e evitar qualquer coisa que tenha uma conotação palestina. Eles se

consideram israelenses como qualquer judeu.

As músicas, torcidas e gritos escutados em jogos de Sakhnin são quase todos em

hebraico. Pode-se dizer que o grande uso do hebraico pode ser uma ferramenta que possibilita

a minoria para comunicar com a maioria: a maior parte dos árabes adultos em Israel fala árabe

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e hebraico. Os árabes adotam os padrões de torcida utilizados pelos judeus, o hebraico além

de ser a linguagem pública em Israel, que facilita a comunicação com as instituições do

Estado, é também a linguagem do futebol. Usar o hebraico no campo e nas arquibancadas

pode ser visto como um fator de integração.

Existem também em Israel times de futebol que são conhecidos por seus fãs terem

posições anti-árabes. É o caso do Beitar Yerushalaim, um time conhecido por ter fãs racistas e

que defendem slogans anti-árabes. Alguns jogos do time contra times árabes acabam em

confrontação verbal por parte dos torcedores.

Sorek (2007) relata um jogo entre o Beitar Yerushalaim e o Ittihad Abnaa

Sakhnin. Os torcedores do Beitar não demoraram a começar as provocações gritando morte

aos árabes. Durante todo o tempo os torcedores árabes do Sakhnin tentaram ignorar as

afrontas dos torcedores do outro time, e quando algum árabe manifestava alguma reação

contra os judeus, ele era rapidamente silenciado pelos outros. O interessante é que

rapidamente os torcedores árabes mudaram a essência do conflito de étnico para político, ao

começaram a gritar pelo nome do candidato a primeiro ministro que os representava,

ignorando assim o “morte aos árabes”. Isso mostrou o desejo dos torcedores de Sakhnin de

transformar o fato em uma disputa interna de Israel e não em um conflito árabe x judeus.

Mas esse não foi o único obstáculo que os torcedores árabes enfrentaram no jogo.

Antes de começar a partida, foi executado o hino nacional. Criou-se uma grande expectativa

em torno da reação dos árabes: se estes iriam se levantar ou não. Após um momento, a

maioria dos árabes se colocou de pé, ainda que com um imenso desconforto. Para os próximos

jogos, os árabes adotaram uma estratégia: antes mesmo do início do jogo, todos os árabes

permaneciam de pé. Assim, quando o hino era executado, eles não precisariam se levantar em

sinal de respeito, uma vez que já que estavam de pé. Desse modo, não desrespeitavam o hino

nacional – pelo menos de maneira explícita.

Os torcedores do Sakhnin foram bem sucedidos em seus esforços de manterem a

definição da situação como simplesmente esportiva. A preservação do futebol como um

enclave integrativo necessita de um considerável investimento de energia. O colapso do

enclave integrativo no futebol é muito raro, mas quando acontece é muito sério.

Um exemplo que aconteceu nesse mesmo jogo se deu quando os torcedores árabes

se irritaram com um bandeirinha e começaram a ofendê-lo. Rapidamente a polícia se

posicionou perto do bandeirinha. Essa reação da polícia rompeu com a frágil distância que o

esporte tem em relação ao conflito étnico. Os torcedores árabes ficaram ofendidos com a

reação da polícia em defesa do bandeirinha pelo fato dele ser judeu, o que desencadeou uma

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revolta entre os torcedores que começaram a chamar a polícia de racista e ameaçá-la

fortemente. O jogo se tornou um confronto aberto entre árabes e judeus: os policiais eram

agentes do Estado israelense cumprindo seu dever contra os cidadãos árabes (SOREK, 2007).

Esse incidente é uma exceção, raramente acontecem conflitos desse tipo nos

estádios. Mas o futebol como uma esfera não conectada ao conflito árabe-israelense é muito

frágil e quando os árabes se sentiram descriminados pela posição da polícia a linha tênue se

rompeu. Os judeus têm uma concepção de que os árabes são um povo não desenvolvido. O

futebol está intimamente relacionado à modernidade, e por isso o futebol não dá somente

orgulho aos árabes, mas também aumenta a posição deles na escala imaginada de

modernidade para os judeus.

O futebol proporciona a criação de uma forma integrativa de comportamento civil,

tanto para os propósitos de uma cidade como Sakhnin quanto para o público judeu israelense.

A tentativa de construir uma esfera “apolítica” por meio do futebol e seu potencial para

facilitar a integração, criou um domínio no qual o povo de Sakhnin tende a enfatizar sua

semelhança com os cidadãos judeus de Israel mais do que com os seus compatriotas

palestinos. Por isso, os torcedores nas arquibancadas, também como os jogadores,

empresários e políticos locais fazem um grande esforço para diminuir tensões nacionais e usar

a arquibancada do futebol para esculpir um território diferente promovendo a integração.

Zimmermman (2005), relata também que apenas três dias após o acontecimento

com Suan, um outro evento ganhou as manchetes. Na rodada seguinte das eliminatórias da

Copa, desta vez contra a França, Israel estava perdendo o jogo até sair o gol de empate, que

foi chutado por ninguém menos que Walid Badir. Badir que é também um árabe-israelense, é

mais famoso que Suan, e não foi a primeira vez que ele marcou um gol pela seleção de Israel.

Dificilmente qualquer outra coisa pode ilustrar melhor o paradoxo da sociedade

israelense que estes dois gols. Um árabe membro do Knesset, em referência aos

acontecimentos, sugeriu mudar o slogan popular da direita israelense, "Sem árabes - sem

ataques terroristas" (ou seja, expulsar todos os árabes para prevenir ataques terroristas), pelo

slogan " Sem árabes - sem gols ".

Embora o jogador de futebol árabe-israelense Suan, seja adorado como um herói

nacional de Haifa a Tel Aviv, a tolerância exibida para com os cidadãos árabes de Israel

continua a ser mínima. No entanto, são precisamente as relações com os árabes israelenses,

que compõem 20 por cento da população, que representam um grande desafio para a

democracia israelense. Aconteça o que acontecer nesta frente - tanto em situações cotidianas

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ou em tempos de crise- indica a direção em que a democracia israelense e a sociedade em

geral estão se dirigindo.

É uma ironia da história que o segundo gol em questão foi marcado em um jogo

contra a França, de todas as nações, um país em que estádios de futebol foram transformados

em um palco para tocar a luta entre o racismo e a integração das minorias, muçulmanos e

negros, na sociedade francesa. O público israelense não parece ser tão certo se deve

desenvolver uma atitude para com Suan e Badir semelhante à dos franceses para Zidane e

Henry.

Zimmermam (2005) ressalta que as aparências podem ser enganosas. Os árabes

israelenses não querem ser apenas tolerados, mas esperam ser tratados como cidadãos

normais. A disponibilidade da maioria judaica, a este respeito ainda é limitada. Qualquer

conversa sobre a natureza do Estado judeu, leva à conclusão de que os árabes não podem ter

direitos iguais como cidadãos de Israel.

O esporte porém, se tornou o grande equalizador, uma oportunidade para que os

atletas se encontrem em um contexto fora da desigualdade e longe de discriminação. Mas para

atingir essa elevada meta, é necessário que os desportistas quebrem barreiras, para convencer

o público através de atos e palavras, do seu valor e capacidade. É também necessário que

times, diretores e presidentes de equipes, permitam a integração e desencorajem o racismo

entre os torcedores nas arquibancadas.

Entretanto, o futebol foi e ainda é a maior esfera através da qual muitos cidadãos

árabes tem procurado aceitação. Mesmo após situações traumáticas do conflito árabe-

israelense, algumas cidades como Sakhnin fazem um enorme esforço para usar o futebol

como uma arena para melhorar as relações. A falta de protesto nacional e o domínio de um

discurso integrativo na esfera do futebol em Israel são resultados de uma específica dinâmica

histórica e circunstâncias estruturais contemporâneas.

Debaixo das regras israelenses, esportes árabes em geral e o futebol em particular

se tornaram uma ferramenta para diluir a identificação nacionalista da minoria árabe enquanto

ao mesmo tempo evitando fermentação política. O futebol se tornou uma das ferramentas

utilizadas pelo Estado para aumentar sua legitimidade sobre a minoria árabe.

O discurso liberal é o único canal onde os árabes em Israel podem ser aceitos

como cidadãos e ganharem acesso a recursos. Em um nível fundamental, a maioria judaica

não tem interesse de expandir o discurso integralista da arena esportiva, e a minoria árabe por

sua vez isola a arena esportiva de qualquer atitude nacionalista palestina. É como se fosse

então uma “negociação” feita por eles.

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Já que a luta política externa constantemente enfatiza as identidade étnico-

nacionais, um grande esforço é feito por fãs e jogadores para afastar qualquer coisa que possa

prejudicar esse discurso no futebol. Existem outras áreas também nas quais é possível formar

um enclave integrativo como o teatro, a música e área médica, mas nenhum desses tem a

popularidade que o futebol possui.

A maioria dos torcedores e jogadores se esforçam para construir a arena esportiva

como apolítica, e fortificar a ligação entre isso e a esfera política. Mas eles a transformam em

uma área política ao utilizarem do seu sucesso no futebol para demandar igualdade política,

bem como o Estado de Israel utiliza o espaço para “simular” a igualdade e assim evitar

confiltos.

Segundo Bordieu (1983), como qualquer outra prática, o esporte é um objetivo de

lutas entre partes da classe dominante e também entre classes sociais. Ou seja, o esporte é um

dos espaços da luta política entre os árabes e os judeus em Israel. É possível descrever o

futebol como um agente de despolitização da minoria árabe em Israel, pois o apego ao esporte

está fortemente ligado ao cerceamento da expressão de orgulho do palestino. Enquanto o

conflito árabe-israelense durar em Israel, a identidade palestina dos árabes continuará a irritar

os judeus e continuará a ser considerada como política.

De acordo com Sorek (2007), os árabes buscam compreender a esfera do futebol

como apolítica ou neutra, já que esta é a área na qual eles podem aceitos e integrados aos

judeus em Israel. Tendem a colocar de lado o conflito árabe-israelense e se focar no esporte.

Nesse sentido, os árabes acreditam que demandar igualdade através do futebol é menos

ameaçador do que demandar através de outras áreas. Acreditam ou almejam que o “talento”

mostrado no campo pode abrir portas que são fechadas para eles. Acreditam ou esperam

também que o esporte supera obstáculos e erradica preconceitos e estereótipos.

Sorek (2007) afirma que não existem ainda evidências de que a integração na

esfera do esporte contribui para a aceitação dos árabes pelos judeus como cidadãos com

direitos iguais. Os árabes em Israel sofrem em discriminação em assuntos de governo, de

oportunidades de emprego e muitas outras. Porém um profundo envolvimento na arena do

futebol pode até não resolver essa situação, mas diminui o sentimento de discriminação

sentida pelos árabes. A integração de árabes cidadãos de Israel através do futebol é uma triste

história de sucesso.

Nos jogos de futebol, os torcedores tentam, na maioria das vezes com sucesso,

definir a situação como esportiva e ignorar a identidade nacional que os separa dos torcedores

judeus. A arena do futebol possui o potencial para ofuscar as distinções étnicas-nacionais

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entre judeus e árabes, e isso é muito importante por dividirem um mesmo país. O futebol pode

ser um “modelo ideal” de igualdade entre eles.

O perigo é transformar o futebol em um enclave delimitado no tempo e no espaço,

no qual igualdade existe, mas cujo poder simbólico é explorado a fim de distrair a atenção da

privação e discriminação que rege em quase todos os outros domínios da vida.

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