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Universidade do Minho Escola de Direito Daniela João Gonçalves de Azevedo janeiro de 2016 Tráfico de droga pela internet Tentativa de enquadramento jurídico Daniela João Gonçalves de Azevedo Tráfico de droga pela internet - Tentativa de enquadramento jurídico UMinho|2016

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Universidade do MinhoEscola de Direito

Daniela João Gonçalves de Azevedo

janeiro de 2016

Tráfico de droga pela internetTentativa de enquadramento jurídico

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Daniela João Gonçalves de Azevedo

janeiro de 2016

Tráfico de droga pela internetTentativa de enquadramento jurídico

Trabalho efetuado sob a orientação doProfessor Doutor Mário Ferreira Monte

Dissertação de MestradoMestrado em Direito Judiciário

Universidade do MinhoEscola de Direito

ii

Nome: Daniela João Gonçalves de Azevedo

Endereço eletrónico: [email protected]

Título da dissertação: Tráfico de droga pela internet – Tentativa de enquadramento jurídico

Orientador:

Professor Doutor Mário Ferreira Monte

Ano de conclusão: 2016

Mestrado em Direito Judiciário

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE

INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE

COMPROMETE.

Universidade do Minho, _____/_____/_________

Assinatura:

iii

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais porque sou vocês e é para vocês.

À minha irmã pelo apoio incondicional.

Ao meu orientador, Professor Doutor Mário Ferreira Monte, pelos doutos conselhos e

ensinamentos.

v

Tráfico de droga pela internet

Tentativa de enquadramento jurídico

RESUMO

A presente dissertação tem por objeto o estudo do tráfico de droga e de novas

substâncias psicoativas perpretado pela internet.

A produção sintética e a distribuição de novas drogas é uma realidade em crescimento

que se procura entender pelo que, perante a insuficiência de dados que sustentem o seu

conhecimento e surgindo estas novas drogas para substituir as várias categorias e tipos de

drogas controladas existentes, constata-se que a procura crescente destas reflete as tendências

do mercado de consumo e de oferta daquelas a nível global, europeu e nacional.

O tráfico de drogas que tem como escopo o lucro é perpretado por diversas

organizações criminosas que operam em conjunto pelo domínio dos mercados em várias regiões

do mundo. A globalização atual se contribui para uma maior liberdade de ação em todos os

setores da sociedade, contribui igualmente para a prática de novas modalidades de crime, como

é o caso do tráfico de droga pela internet. Estas novas tendências do mundo criminoso que têm

como agentes principais a criminalidade organizada que atuam também em setores legítimos da

economia reforçam a ideia da sociedade de risco em que atualmente vivemos.

As ações cada vez perigosas, como é a fabricação e venda destas substâncias nos sítios

em linha à superfície ou na chamada deep web, através de softwares de encriptação e de

moedas digitais, são capazes de aumentar as hipóteses da violação do bem jurídico

supranacional protegido pelo tráfico de drogas e de dificultar a sua repressão criminal.

Os organismos internacionais de combate às drogas têm uma função fulcral no

conhecimento deste fenómeno o que auxilia o desenvolvimento progressivo dos Tratados globais

e dos atos legislativos europeus e internos. Para o desenvolvimento do espaço único de justiça

penal e, consequente, melhoria na repressão da criminalidade é urgente que se crie a

Procuradoria Europeia e as Equipas de investigação conjunta.

Ainda deve ser adotado um sistema de definições genéricas para a identificação das

drogas e reforçada a confiança da comunidade nacional na reposição da norma violada pela

atribuição de relevância pelo Direito Penal à modalidade cibernética do tráfico de droga.

PALAVRAS-CHAVE: Drogas, tráfico, internet, anonimato, agravação.

vii

The Internet drug trafficking

Attempting legal framework

ABSTRACT

The present dissertation’s object of study focuses on the study of drug-trafficking and

new psychoactive substances being sold via internet.

The synthetic production and the distribution of new drugs is a growing reality that

we’re trying to understand. Faced with a lack of data that can sustain the knowledge and the fact

that these new drugs have appeared to substitute the various categories and types of controlled

substances already in existence, we’ve concluded that the incremented search for these

substances already reflects the markets tendency to consume these offerings at a global,

European and national scale.Drug-trafficking with a focus on gains is perpetrated by diverse

criminal organizations that operate together for the dominance over the market of various regions

in the world. If current globalization contributes for a larger freedom of action in all of societies

sectors, it also does the same for the exercise of new criminal activities, such as drug-trafficking

via internet. These new tendencies of the criminal world, that have as their main agents,

organized crime that also operates in legit sectors of the economy, reinforce the notion of

“society at risk” that we live in now-a-days.

The ever more dangerous action of production and sales of these substances, in

places that are at the surface or in the so-called “deep web”, through the use of encrypted

software and digital currency, are capable of rising the hypothesis of current national drug laws

being broken and toughening the reprehension of these acts when perpetrated from outside our

borders. The international organisms dedicated to drug prevention have a focal function in the

knowledge of this phenomenon, which helps the progressive development of global treaty’s and

European and internal legal actions. For the development of a sole legal justice space and better

enforcement against criminality it is urgent that we create a “European District Attorney” and co-

investigative teams.

There should also be adopted a system of generic definitions for the identification of

these drugs and a reinforced trust from our national community in the enforcing action against

broken laws by attributing relevancy by the Penal Code towards the activity of: cybernetic drug-

trafficking.

Key-Words: Drugs, Trafficking, internet, anonymity, qualifications.

ix

ÍNDICE

AGRADECIMENTOS…………………………………………………………………………….. iii

RESUMO…………………………………………………………………………………………… v

ABSTRACT………………………………………………………………………………………… vii

LISTA DE FIGURAS……………………………………………………………………………… xi

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS……………………………………………………….. xiii

INTRODUÇÃO…………………………………………………………………………………….. 1

CAPÍTULO I – AS DROGAS E OS SEUS PRECURSORES…………………………….… 5

1.1 As drogas e o seu funcionamento no cérebro humano……………………. 5

1.2 Classificação e enunciação das principais drogas………………………….. 7

1.2.1 Drogas depressoras………………………………………………………………….. 8

1.2.2 Drogas estimulantes ………………………………………………………………… 9

1.2.3 Drogas alucinogénias………………………………………………………………….. 10

1.3 Os precursores das drogas……………………………………………………….. 12

CAPÍTULO II – AS NOVAS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS…………………………… 15

2.1 A compreensão das novas substâncias psicoativas……………………….. 15

2.2 Súmula histórica da produção sintética de drogas………………………… 17

2.3 Categorias de novas substâncias psicoativas e seus aspetos comuns.. 20

2.4 Fornecimento das novas substâncias psicoativas………………………….. 21

2.5 Locais de venda e publicidade das novas substâncias psicoativas……. 22

2.6 Fontes de informação das novas substâncias psicoativas……………….. 24

CAPÍTULO III – O MERCADO DAS DROGAS E DOS SEUS PRECURSORES………. 27

3.1 O mercado global……………………………………………………………………. 27

3.2 O mercado europeu…………………………………………………………………. 29

3.3 O mercado nacional………………………………………………………………… 35

CAPÍTULO IV – NARCOTRÁFICO EUROPEU……………………………………………… 39

4.1 A compreensão do tráfico de droga na europa……………………………… 39

4.2 Branqueamento de capitais………………………………………………………. 44

4.3 Dos conflitos regionais ao terrorismo…………………………………………. 46

CAPÍTULO V – NARCOTRÁFICO VIRTUAL……………………………………………….. 49

x

5.1 As novas tendências (virtuais) no tráfico de droga………………………… 49

5.2 Os Criptomercados………………………………………………………………….. 52

5.2.1 O caso Silkroad…………………………………………………………………………….. 53

5.3 A criptomoeda Bitcoin……………………………………………………………… 55

CAPÍTULO VI – COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NA LUTA CONTRA A DROGA E

A CRIMINALIDADE ORGANIZADA…………………………………………………………… 59

6.1 Dos principais organismos internacionais……………………..…………….. 61

6.2 Dos principais organismos europeus…………………………………………… 63

6.3 Dos principais organismos portugueses………………………………………. 65

6.4 Das medidas internacionais………………………………………………………. 66

6.5 Das medidas europeias de combate às novas substâncias psicoativas 69

6.5.1 O futuro das medidas de cooperação europeias…………………………………. 75

CAPÍTULO VII – REGIME JURÍDICO DO TRÁFICO DE DROGAS E DE NOVAS

SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS……………………………………………………………….. 77

7.1 Critério classificativo das substâncias sujeitas a controlo do direito… 77

7.2 O crime de tráfico de droga………………………………………………………. 79

7.3 O Crime de tráfico de droga agravado………………………………………… 83

7.4 O crime de tráfico de menor gravidade……………………………………….. 87

7.5 O crime de tráfico de precursores……………………………………………… 90

7.6 O crime de associação de traficantes…………………………………………. 91

7.7 A contraordenação por tráfico de novas substâncias psicoativas…….. 93

7.7.1 Entidades competentes na fiscalização das novas substâncias psicoativas… 96

CAPÍTULO VIII – ENQUADRAMENTO LEGAL DO TRÁFICO DE DROGA PELA

INTERNET…………………………………………………………………………………………. 99

8.1 A criminalidade informática………………………………………………………. 99

8.2 A punição do tráfico de droga pela internet…………………………………. 101

8.3 A investigação do tráfico pela internet………………………………………… 103

CONCLUSÃO……………………………………………………………………………………… 111

BIBLIOGRAFIA…………………………………………………………………………………… 117

xi

LISTA DE FIGURAS

Figura 1Payment processor (reproduzido de FRANCO, Pedro) ................................................. 57

Figura 2 Tabela resenha dos critérios utilizados na qualificação da infração por vários países

europeus (Reproduzido de New psychoactive substances in Europe, Innovative legal responses

June 2015, Luxembourg) ........................................................................................................ 73

xiii

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

LSD Lysergic acid diethylamide Ácido lisérgico

CSP Convenção Única de Estupefacientes

CUE Convenção das Substâncias Psicotrópicas

THC Tetrahidrocanabinol

MDMA Ecstasy

NSP Novas Substâncias Psicoativas

APPS Aplicações Infomáticas

GPS Global Position System Sistema de Posicionamento Global

www. World Wide Web

Tor The Onion Router

IP Internet Protocol address

UNODC Organização das Nações Unidas sobre Drogas e Crime

INCB International Narcotics Control Board

INTERPOL Organização Internacional de Polícia Criminal

IDPC Consórcio Internacional sobre Políticas de Drogas

OMS Organização Mundial de Saúde

OEDT Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência

UNCTE Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes

UCI Unidade de Cooperação Nacional da Polícia Judiciária

SICAD Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas

Dependências

INFARMED Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P.

ASAE Autoridade de Segurança Alimentar e Económica.

1

INTRODUÇÃO

O fenómeno das drogas não é recente. Pelo contrário, é algo que acompanha a sociedade

desde os primórdios da humanidade. Tal como evolui a sociedade, também o fenómeno das drogas

evolui. A passagem da mera extração das substâncias químicas ativas de certas plantas para a

produção laboratorial de drogas sintéticas, acompanhou o desenvolvimento da ciência química. De

uma era comedida de criação, encontramo-nos, atualmente, numa era de proliferação agressiva e em

massa de novas drogas. Aliada a esta proliferação está a preocupação do seu controlo por mecanismos

eficientes implementados sob estratégias internacionais que assentam na cooperação. Mas acresce

que, para emergirem soluções dos esforços de prevenção e repressão, é necessário o conhecimento

estatístico e científico destas novas drogas.

Perante a diminuta informação dos mercados das novas substâncias psicoativas, cumpre

conhecer o mercado das drogas tradicionais, pois aquelas são imitações químicas destas. A produção

de efeitos psicoativos e a determinação do homem por experimentar novas sensações é a razão

comum da existência destas substâncias. Todavia, a razão que as distingue é o facto de sobre as novas

drogas permanecer um constante vazio legal. Para existir controlo legal sobre uma droga é necessário

que a mesma esteja incluída nas tabelas legais. Ocorre, porém, que sempre que uma nova droga é

sujeita a controlo, imediatamente são colocadas no mercado novas substitutas que, pela alteração

molecular apresentada, não estão sujeitas a controlo.

A produção de drogas, assim como a produção de diversos bens de consumo, é feita por

precursores químicos. Verifica-se, assim, um aumento do desvio destes químicos do comércio legítimo

para o comércio ilícito de produção de droga.

As redes criminosas de tráfico de droga têm sido cada vez mais dinâmicos no seu modo de

atuação, seja pela criação de alianças com outros grupos criminosos a operar noutros países, seja pela

sofistição na alteração de rotas de tráfico, nos meios de transporte e em técnicas de disfarçar a droga

transportada. As técnicas de disfarce têm sido sobremaneira desenvolvidas ao ponto de o tráfico de

drogas ganhar dimensão na internet. Surgem a cada dia novos sítios em linha, tanto situados na web à

superfície, como na web oculta, que se dedicam à comercialização de drogas, disfarçadas sob nomes

de produtos de consumo.

2

Toda esta dinâmica coloca novos desafios ao mundo, para os quais os legisladores devem

encontrar respostas de prevenção e repressão da posse, oferta e publicidade não autorizadas de novas

drogas. Outro desafio é o tratamento jurídico a dar ao tráfico de droga cibernético, como nova

modalidade que visa, essencialmente, o disfarce tanto dos seus traficantes, como dos negócios. Esta

modalidade permite ainda que o transporte seja ainda mais dissimulado pela expedição em pequenas

quantidades e pelos canais convencionais como os correios.

No presente trabalho procura-se enquadrar a abordar as questões supra mencionadas com

base em duas partes, por forma a que o conhecimento tão completo quanto possível do fenómeno das

drogas permita o indagar das soluções mais adequadas.

A primeira parte pretende demonstrar o mecanismo de atuação drogas no cérebro humano,

quais as categorias de estupefacientes existentes, distinguindo os principais tipos de drogas e os

precursores necessários à sua produção. De seguida, pretende conhecer-se as novas substâncias

psicoativas em todos os ciclos da sua existência. Como parte fundamental do fénomeno das drogas,

impõe-se conhecer a atualidade dos mercados de oferta e de consumo, do narcotráfico e das redes

criminosas a atuar na Europa, assim como do narcotráfico virtual, explorando os mecanismos

informáticos que primam pelo anonimato.

A segunda parte pretende demonstrar os esforços internacionais empreendidos na luta contra

o tráfico, nomeadamente dando a conhecer os diversos organismos internacionais, europeus e

nacionais que cooperaram na prossecução daquele objetivo, com respeito pelas obrigações

decorrentes dos 3 Tratados internacionais em matéria de droga. Pretende ainda abordar as respostas

legais europeias de combate aos mercados das novas substâncias piscoativas e o desenvolvimento dos

atos legislativos da União Europeia neste sentido.

No plano nacional, pretende conhecer-se o regime jurídico do tráfico de drogas e de novas

substâncias psicoativas, assim como o que se entende, na atualidade, por criminalidade informática,

como se pode punir o tráfico de droga pela internet e que mecanismos investigatórios se podem utilizar

na sua prevenção e repressão.

Com a abordagem destas questões procura saber-se as o modelo de identificação das drogas

adotado pelas Convenções internacionais de luta contra o tráfico ilícito de drogas estão elaboradas de

maneira a conseguirem abranger todas as novas substâncias psicoativas que surgem velozmente no

mercado e se a cooperação internacional está a utilizar todos os instrumentos legais que lhe

possibilitam uma luta mais eficaz contra a internacionalização da criminalidade organizada, assim

como se o legislador português tem demonstrado preocupação com a nova forma de globalização do

tráfico de drogas.

3

Em face das dificuldades que se poderão encontrar no desenvolvimento desta temática,

procurará empreender-se esforços no sentido de solucionar ou, pelo menos, obviar em menor escala

os mesmos.

5

CAPÍTULO I – AS DROGAS E OS SEUS PRECURSORES

Neste capítulo dar-se-á conhecimento do modo de funcionamento das drogas no cérebro

humano para que se possa perceber o porquê do seu consumo e os riscos associados ao mesmo.

Seguidamente apresentar-se-ão as categorias de drogas, que diferem entre si, principalmente, pelos

efeitos produzidos e, por fim, descrever-se-ão as principais drogas nas suas dimensões externas –

apresentação e composição – e nas suas dimensões internas – psicoatividade e sintomatologia, assim

como se dará a conhecer os precursores necessários à feitura das mesmas.

1.1 As drogas e o seu funcionamento no cérebro humano

Desde os tempos ancestrais que o Homem sempre teve como um dos seus principais

propósitos a busca pelo prazer, seja pelo amor sentido pelos seus pares, seja pela prática de exercício

físico, seja pelos hábitos quotidianos adquiridos, como beber um café. O consumo de substâncias que

alterem o estado de consciência é um costume antigo da sociedade. O uso de plantas medicinais ou

mesmo o consumo de plantas em ambiente envolvente de misticidade é uma prática que acompanha

gerações tribais ou populacionais de determinadas zonas do mundo.

Segundo a definição da Organização Mundial de Saúde, o termo droga designa “qualquer

substância que, quando introduzida no organismo vivo, pode modificar uma ou mais funções.”1 Nesta

medida, pode definir-se droga como uma substância química que é consumida para que se obtenha

determinados efeitos, designadamente efeitos medicinais e terapêuticos ou efeitos prazerosos e de

bem-estar.

Os Homens, enquanto seres racionais, vão, ao longo dos tempos, desenvolvendo mecanismos

que lhes permitiu – e permite ainda – o uso mais eficiente das drogas, de modo a alterar ou aumentar

os seus efeitos no cérebro. É exemplo paradigmático, numa fase mais longínqua, mas ainda presente

em certas culturas, o uso da dosagem correta de determinadas plantas medicinais para o tratamento

de certas doenças; a passagem da mastigação da folha seca de tabaco para a inalação do seu fumo; o

processo de destilação do vinho ou de outras bebidas alcoólicas; o processo de extração da resina da

planta de cannabis ou das papoilas do ópio, assim como o consumo simultâneo de diversas

1 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 27.

6

substâncias, entre outras práticas. Mais recentemente, aprendemos a criar sinteticamente novas

substâncias, seja pela extração dos componentes químicos das plantas, seja pela criação laboratorial

de drogas sintéticas ou pela criação sintética de análogos destas. Constata-se que a criação deliberada

de estados alterados de consciência pelo ser humano é algo universal ao longo da história da

Humanidade, encontrando-se em todas as culturas e épocas.

A utilização de drogas está relacionada com as mudanças químicas que as mesmas geram no

cérebro humano. Isto é, as drogas atuam no sistema nervoso central, cujo órgão principal é o cérebro

que, por sua vez, é constituído por neurónios que são responsáveis pela transmissão de informações

nervosas. Estas informações nervosas são responsáveis pela maior parte do comportamento do Ser

Humano, tal como a respiração e a coordenação motora. Estes impulsos nervosos realizam-se através

de estímulos químicos que enviam sinais elétricos pelas sinapses – ligação entre os neurónios –

permitindo levar a cabo diversos comportamentos do Homem. É precisamente nas sinapses,

responsáveis pela transmissão de toda a informação, que as drogas atuam.2

Os neurotransmissores são moléculas similares aos recetores específicos aos quais se ligam,

pelo que o seu modo de atuação é similar ao ato de introdução de uma chave numa fechadura. Esta

similitude verifica-se ainda na denominação dos recetores específicos cerebrais, porquanto a

denominação destes é idêntica ao nome da molécula com a qual reagem.

As substâncias químicas, presentes em plantas ou produzidas sinteticamente, tendem, assim,

a produzir respostas químicas idênticas às naturalmente libertadas pelo corpo humano devido a uma

idêntica composição química, ou seja, existe entre a estrutura química das drogas e a estrutura

química dos neurotransmissores uma similitude que permite a sua conexão provisória e temporária

com determinados recetores. Quando existe uma ligação temporária entre estas substâncias e os

recetores, dá-se uma modificação na transmissão de informações nas sinapses o que conduz à

2 “No cérebro, as células nervosas ou neurónios comunicam entre si através de mensageiros químicos que são liberados nas sinapses (...). Quando um

neurónio é excitado, o corpo da célula envia um sinal elétrico ao longo de um prolongamento conhecido como axónio, que tanto pode ser curto para atingir

neurónios próximos como ser longo para atingir outras regiões do cérebro. Na extremidade do axónio existe um botão terminal. Para transmitir a

mensagem do botão terminal de um axónio ao neurónio seguinte, é preciso atravessar um espaço denominado sinapse ou fenda sináptica. O neurónio que

envia a mensagem, ou neurónio pré-sináptico, libera substâncias químicas para o neurónio receptor ou neurónio pós-sináptico. Estas substâncias

químicas, ou neurotransmissores, têm estruturas e funções específicas e o tipo do agente libertado depende do tipo do neurónio. Alguns dos

neurotransmissores mais estudados que estão relacionados com substâncias psicoativas são a dopamina, a serotonina, a norepinefrina, o GABA (ácido

gama-aminobutírico), o glutamato e os opióides endógenos.” Organização Mundial de Saúde (2004). Neurociência de consumo e dependência a

substâncias psicoactivas: resumo. WHO Library Cataloguing-in-Publication Data, p. 15. Disponível em:

http://www.who.int/substance_abuse/publications/en/Neuroscience_P.pdf.

7

produção de efeitos similares ainda que distintos dos ocorridos naturalmente nas funções fisiológicas,

metabólicas e psíquicas do corpo humano.3

Desta forma, as drogas interferem relevantemente na transmissão da informação nervosa entre

as sinapses, sendo responsáveis pelos efeitos comummente descritos pelos consumidores.

1.2 Classificação e enunciação das principais drogas

Todas as drogas atuam no sistema límbico do cérebro e, portanto, nas estruturas ligadas à

motivação e ao comportamento humano. Todavia, por se ligarem a recetores diferentes, umas drogas

aumentam e outras diminuem a carga elétrica dos neurónios. Estas mudanças provocadas na atividade

funcional cerebral conduzem a “diferentes efeitos sobre o comportamento, diferentes taxas de

desenvolvimento de tolerância, diferentes sintomas de abstinência e diferentes efeitos a curto e a longo

prazo (...).”4

Da influência exercida pelas drogas no mecanismo cerebral e, portanto, no comportamento do

consumidor, o consumo provoca, as mais das vezes, sintomas de abstinência que, dependendo da

droga, se podem manifestar a curto ou a longo prazo. Fala-se, aqui, “em farmacodependência como

sinónimo de toxicomania, querendo significar um estado psíquico ou mesmo físico provocado no

organismo vivo por um produto farmacêutico, que se caracteriza por modificação do comportamento e

outras reacções reveladoras de uma pulsão irreprimível para a absorção do produto, de maneira

contínua e periódica, a fim de experimentar os efeitos psíquicos ou, por vezes, para evitar o mal-estar

originado pela privação. A dependência pode ser de uma ou mais drogas (politoxicomania, neste

caso).”5

De seguida, passa-se a indicar as principais categorias de drogas entre depressoras,

estimulantes e alucinogénias cuja razão distintiva é a psicoatividade e a dependência que o consumo

causa. 6

3 “As substâncias psicoativas têm a propriedade de imitar os efeitos de neurotransmissores naturais ou endógenos, ou de interferir com a função normal

do cérebro bloqueando uma função, ou alterando os processos normais de acumulação, liberação e eliminação de neurotransmissores. Um mecanismo

importante de atuação das substâncias psicoativas é o bloqueio da recaptura de um neurotransmissor depois da sua liberação pelo terminal pré-sináptico.

A recaptura é um mecanismo normal de eliminação do transmissor da sinapse pela membrana pré-sináptica. Bloqueando a recaptura, os efeitos normais

do neurotransmissor são exacerbados. As substâncias psicoativas que se ligam e reforçam as funções dos receptores são chamadas agonistas, enquanto

as que se ligam para bloquear a função normal são chamadas antagonistas.” Idem, ibidem, p. 16.

4 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Livraria Almedina, p. 30.

5 Idem, ibidem.

6 A distinção entre drogas leves e drogas duras está abandonada uma vez que as drogas se distinguem umas das outras, nas suas características, efeitos e

dosagem tomada, e também porque seja “pela dificuldade em estabelecer do ponto de vista médico ou farmacológico, (seja) porque a acção de uma

8

1.2.1 Drogas depressoras

As drogas depressoras diminuem a atividade do sistema nervoso central pelo que causam

efeitos de um bem estar tranquilizante. Nesta categoria inclue-se o ópio, a morfina, a heroína, os

barbitúricos e os depressores não barbitúricos, entre outros.

No que se refere ao ópio, esta substância é produzida pela papoila dormideira, papaver

somniferum L, originária dos países do Mediterrâneo e do Levante.

Depois de se fazer um corte na papoila “o suco leitoso escorre e, em contacto com o ar adquire uma

cor castanha, quase preta e solifica; é o ópio em bruto7.”8 A forma mais usual de consumo do ópio,

depois de transformado, é “fumá-lo num tubo de papel de estanho, aplicando debaixo dele uma fonte

de calor,” 9 pode ainda ser “injetado depois de dissolvido em água quente, (ou) ser mastigado

(opiofagia).”10

Já a morfina é a substância química ativa do ópio, do qual é extraída. 11 A substância

“apresenta-se sob a forma de um pó cristalino, inodoro, castanho claro ou branco e, no mercado ilícito,

também sob a forma de blocos, comprimidos ou cápsulas.”12 O seu consumo pode ser feito oralmente

ou por injeção intravenosa e provoca efeitos similares aos da heroína.

Por sua vez, a heroína deriva sinteticamente da morfina e apresenta-se como um pó branco,

sendo que chega ao mercado ilícito sob várias formas pelas substâncias de corte que lhe adicionam. O

seu consumo pode ser feito por inalação ou por injeção subcutânea ou intravenosa. Cumpre realçar

que os efeitos desta droga variam consoante o nível de consumo. Inicialmente, esta substância é

responsável por sensações de elevada satisfação sendo que, após o estado de viciação, o consumidor

tem necessidade de a consumir compulsivamente para acalmar a agonia física e psíquica provocada

pela carência.“Isto significa que o opiáceo se torna num poderoso reforço de seu próprio consumo.” 13

droga não depende somente das suas características mas também das doses tomadas, do modo como são absorvidas e, particularmente, da estrutura

psicológica do indivíduo.” Idem, ibidem, p. 18.

7 “O ópio era utilizado, na antiguidade (Pérsia, Egipto, Grécia, Arábia, Índia e China) com fins medicinais. Hoje esses fins transitaram para alguns dos seus

alcalóides (morfina e codeína) e opiáceos sintéticos (petidina e metadona).” Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao

Tráfico. Coimbra: Almedina, p. 38.

8 Idem, ibidem, p. 37.

9 http://www.sicad.pt/PT/Cidadao/SubstanciasPsicoativas/Paginas/detalhe.aspx?itemId=14.

10 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento - Combate ao Tráfico. Coimbra:Almedina, p. 38.

11 “Antes da descoberta dos narcóticos sintéticos e de outros analgésicos, a morfina era muito usada no alívio das dores agudas de curta duração

decorrentes de intervenções cirúrgicas, fraturas, queimaduras, etc., e nas fases terminais de doenças incuráveis.” Idem, ibidem.

12 Idem, ibidem.

13 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

41.

9

Assim, os opióides são substâncias bastante dependentes pela elevada abstinência que

causam no consumidor, obrigando-o a consumir mais vezes e com maiores quantidades.

No que tange ao depressor “barbitúrico, este estupefaciente «é um sedativo e exerce uma

depressão poderosa ou ação calmante no sistema nervoso central». As finalidades médicas dos

barbitúricos são diversas e extensas: tensão nervosa, hipertensão, insónia, epilepsia.”14

Desde a sua sintetização em 1863, que são investigados e comercializados milhares de fármacos

desta substância, que se distinguem pelo prolongamento dos efeitos.15 Os barbitúricos são

comercializados como comprimidos, cápsulas, ampolas ou supositórios, sendo que no mercado ilícito é

dúbia a correspondência entre a substância e a informação constante do invólucro. O seu consumo é

feito oralmente ou por introdução no reto e causam dependência moderada.

No que se refere aos depressores não barbitúricos, estas substâncias distinguem-se dos

barbitúricos por a intensidade da diminuição da atividade cerebral ser menor, pelo que também se

designam de «tranquilizantes menores.»”16 A forma comum de administração é por via oral, sendo

comercializados identicamente aos depressores barbitúricos. Se a substância for administrada por

períodos curtos, os sintomas de abstinência são escassos, diferentemente do que ocorre se o consumo

se prolongar por períodos mais alongados, em que surgem sintomas de dependência e dificuldade em

abandonar o consumo.

1.2.2 Drogas estimulantes

As drogas estimulantes, vulgo uppers, aumentam a atividade do sistema nervoso central17 e

podem enunciar-se a cocaína e as drogas anfetamínicas como exemplos desta categoria.

A cocaína é uma substância semi sintética que é extraída das folhas de coca Erythroxylum e

das folhas de coca Erythroxylum novogranatense18 – arbustos tropicais originários da América Andina –

14 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Almedina, p. 42.

15 Refere-se que, os “barbitúricos de efeito lento no começo mas de longa duração como o fenobarbital”, está incluído na Tabela IV da CSP, os

“barbitúricos de efeito intermédio, por ex., o betabarbital e amobarbital, os bartúricos de curta duração como o pentobarbital e o secobarbital ” estão

incluídos na Tabela II-C. Idem, ibidem.

16 Nesta cetgoria estão integradas as benzodiazepinas. São exemplos destas substâncias o “Valium, Rohypnol, Serenal, Dormicum etc.” Estes fármacos são

considerados os mais receitados a nível mundial. Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra:

Almedina, p. 43.

17 É comum a utilização destas substâncias na medicina para controlar a obesidade ou para tratamento de dependentes de substâncias depressoras.

18 Nos termos do artigo 1.º, n.º 1, al. e) da Convenção única de 1961 sobre os Estupefacientes, entende-se por arbustos de coca “toda a espécie de

arbustos do género Erythroxylon” ainda nos termos da al. f) a “ «folha de coca» designa a folha do arbusto de coca, com a exceção da folha donde hajam

sido retirados toda a ecgonina, a cocaína e qualquer outro alcalóide ecgnonínico.”

10

Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Chile e Venezuela.19 Apresenta-se como um pó branco que é inalado

pelas vias nasais ou administrado por via endovenosa.20 O seu consumo durante curtos periodos de

tempo provoca dependência psicológica.21

No que se refere às drogas anfetamínicas, tal como a anfetamina22 e a metanfetamina, são

substâncias sintéticas que surgem no mercado ilícito como comprimidos, cápsulas ou pó e são

consumidas por ingestão oral ou por injeção intravenosa.23 São substâncias que provocam elevada

dependência psicológica, sendo responsáveis por psicoses. “Para além disso, têm sido observadas

mudanças psicológicas mais ténues, tais como atitudes de extrema suspeita contra alguém, falta de

concentração, enfraquecimento da memória (especialmente de factos recentes) dificuldade de ligar

factos.”24

1.2.3 Drogas alucinogéneas

As drogas alucinogénias, também conhecidas como drogas modificadoras, são substâncias

que provocam alucinações, entendidas estas como falsas perceções. “Os alucinogéneos são

substâncias que modificam os processos mentais, com distorções de perceção e até alucinações.”25

Desta categoria fazem parte drogas como o ácido lisérgico, vulgo LSD, a cannabis, a mescalina, a

psilocibina e outras substâncias sintéticas. Ressalvada a cannabis herbácea26, as demais substâncias

alucinogéneas têm em comum a sua não utilização para fins médicos e terapêuticos.27

19 A planta de coca é utilizada pelos nativos destas regiões há milhares de anos, sendo a sua folha usada na medicina, em rituais religiosos e no quotidiano

social, fazendo parte da dieta diária da população pelos minerais e vitaminas que contém. A sua folha também é mastigada pela população em geral.

“Conhecidos os seus efeitos psíquicos foi também usada, medicamente, na psicoterapeia da astenia, irritabilidade e desvios sexuais.” Martins, A. G.

Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Almedina, p. 47.

20 Esta substância é comummente consumida juntamente com heroína. Este tipo de consumo é denominado na gíria como speed-ball.

21 Exsite ainda a cocaína crack que é uma substância quimicamente similar à cocaina. Os seus aspetos farmacológicos e a sua psicoatividade

são semelhantes ao da cocaína, mas apresenta maior de dependência.

22 Martins, A. G. Lourenço (1994) Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Livraria Almedina, p. 45.

23 “Medicinalmente, as anfetaminas são utilizadas «para tratar uma gama variada de doenças, incluindo a obesidade, o controlo a curto prazo da fadiga, o

Parkinsonismo, os sintomas depressivos, as desordens do comportamento e a intoxicação por depressores do sistema nervoso central».”

Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

49.

24 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga, Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Almedina, p. 46.

25 Idem, ibidem, pp. 36 e 37.

26 O SICAD refere que “há cannabinoides em uso em alguns países, como antiemético oral para tratar as náuseas provocadas pela quimioterapia.”

Disponível em: http://www.sicad.pt/PT/Cidadao/SubstanciasPsicoativas/Paginas/detalhe.aspx?itemId=8.

27 Nos termos od artigo 32.º, n.º 4 da CSP, é possível “(...) um Estado fazer reserva (...) no sentido de não aplicar a Convenção a certos grupos sociais

restritos que usem substâncias alucinogéneas «por ocasião de cerimónias mágicas ou religiosas.».” A utilização de cogumelos alucinogéneos em rituais de

feitiçaria, na América e na Ásia, tem que ver com os “efeitos de transporte para um mundo de irrealidade.” Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga,

Prevenção e Tratamento, Combate ao Tráfico. Coimbra: Almedina, p. 48.

11

No que tange à planta cannabis sativa28, o princípio ativo responsável pelos efeitos

modificadores é o 29 tetrahidrocanabinol (THC). Esta substância aparece no mercado ilícito sob a forma

de cannabis herbácea e de haxixe. A cannabis herbácea “obtém-se a partir das folhas e extremidades

floridas ou frutificadas parcialmente das plantas femininas que, depois de secas, assumem o aspecto

de tabaco grosso.” O haxixe reveste a forma de resina ou óleo de cannabis. “A resina é extraída das

extremidades floridas da planta seca (às vezes no forno), comprimida e misturada com cera, formando

placas tipo tablete de chocolate ou cubos (...), variando a sua cor, que vai do castanho claro ao preto,

conforme o país ou a zona de origem, podendo conter entre 4% a 11% de THC. O óleo de haxixe, haxixe

líquido, também designado por concentrado de cannabis, obtém-se por destilação sucessiva das folhas

ou da resina do cânhamo (...). Toma o aspecto de uma substância viscosa de cor escura, tipo

alcatrão.”30

O consumo destas substâncias é feito, geralmente, em cigarros, pela junção de tabaco e, no

caso da cannábis herbácea, em cachimbos. Apesar de não produzir dependência física, conduz a

dependência psíquica, “sendo previsível que o consumo desta droga, dita «leve», possa constituir o

início da escalada para as drogas «duras» ou «pesadas».”31

Já o LSD é droga sintética que se obtém dos “esporos do centeio, sob a forma de um fungo

que se desenvolve como parasita na espiga deste cereal (...).” Esta substância tem efeitos poderosos

ainda que ingerida oralmente em doses pequenas, pelo que se apresenta em pó, em comprimidos de

reduzida dimensão, em líquido ou em papéis químicos, vulgo selos. Esta substância é ainda

responsável por produzir a “a impressão de que o espírito se separou do corpo- fenómeno designado

por despersonalização (...)”32 e de ser um fator desencadeador de doenças mentais como a

esquizofrenia.

Relativamente ao ecstasy (MDMA) é uma droga hibrida por se identificar como a anfetamina e

a mescalina. Esta substância é comercializada sob a forma de comprimidos com cores e tamanhos

28 Internacionalmente, “O termo «cannabis» designa a extremidade dos ramos floridos ou frutificados da planta de cânhamo (com a exclusão das sementes

e das folhas que não sejam acompanhadas de sumidades), cuja seiva não tenha sido extraída, qualquer que seja a sua aplicação” - Artigo 1.º, n.º 1, al. b)

da CUE. A “expressão «planta de cannabis» designa toda a planta do género cannabis” - Artigo 1.º, n.º 1, al. c) da CUEnvenção única de 1961 sobre os

Estupefacientes. Como derivado da cannabis, a “ «resina de cannabis» designa a seiva separada, em bruto ou purificado, obtida a partir da planta de

cannabis” - Artigo 1.º, n.º 1, al. d) da CUE.

29 “The cannabis plant originated in Asia and has been used by humans for thousands of years. The plant has had three lives: as a fibre, as a medicine,

and as a pleasure drug. In its first life we have hemp, one of the most versatile plant fibres in nature; in the second we have cannabis indica, which relieves

pain and spasm; and in its third we have "ganja", "weed" or "skunk", the most widely-used recreational drug in the world today after alcohol and tobacco.”

Nutt, David (2012). Drugs – without the hot air. Minimising the harms of legal and illegal drugs. England: UIT Cambridge, p.72.

30 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

58.

31 Idem, ibidem, p. 57. 32 Idem, ibidem, p. 54.

12

diversos, em pó e em cápsulas. Pode ser inalada ou injetada mas a forma mais usual de consumo é

por via oral. Não provoca sintomas físicos de dependência, mas é responsável por uma dependência

psíquica moderada.

A classificação supra exposta não é rigorosa uma vez que algumas drogas são suscetíveis de

produzirem efeitos que se enquadram nas características de mais do que uma categoria.

1.3 Os precursores das drogas

Existem diversas substâncias químicas que são utilizadas, essencialmente, nas indústrias

farmacêuticas, nas indústrias alimentares e nas indústrias cosméticas na produção de diversos bens

de consumo.33 Ocorre que a produção de drogas semi-sintéticas e sintéticas necessita dos mesmos

químicos com usos legítimos. Assim, “a produção de droga tem uma componente tecnológica e

química importantíssima. Se a droga provém de matéria-prima, após uma transformação meramente

física, é submetida a processos de refinação com base em produtos de natureza química como o éter,

o anidrido acético (e na falta deste o cloreto de acetil), a acetona, o álcool, o ácido tartárico, etc. E

existem drogas puramente sintéticas (...) feitas, integralmente, em instalações industriais. É

exatamente nos países tecnologicamente mais avançados que se fabricam esses produtos químicos.”34

Esta circunstância implica que estes químicos, para além de fazerem parte do comércio legal, também

são transacionados no tráfico ilícito, sendo que a maior disponibilidade comercial daqueles reflete-se no

aumento do fabrico clandestino das drogas.

Pode definir-se precursor como “o produto indispensável às operações químicas de certas

substâncias em estupefacientes ou destes em outros tipos de estupefacientes.”35

Apesar de alguns precursores e pré-percursores, tais como diversos produtos químicos e

solventes, já se encontrarem sob controlo internacional, ainda existem muitos químicos livremente

comercializados necessários na confeção ilícita de drogas como a heroína, a cocaína e de todo o tipo

de drogas sintéticas.

Passa-se, de seguida, a descrever os principais precursores e pré-precursores necessários ao

fabrico de drogas semi-sintéticas e sintéticas.

Para a confeção da heroína são necessários diversos químicos sendo o mais utilizado o

anidrido acético – substância constante da tabela I da Convenção de 1988. Este químico permite

33 http://ec.europa.eu/taxation_customs/customs/customs_controls/drugs_precursors/index_en.htm

34 Rocha, João Luís de Moraes (1994). Droga – Regime Jurídico, Legislação Nacional – anotada, diplomas Internacionais. Lisboa: Livraria Petrony, Lda., p.

73.

35 Idem, ibidem, p. 74.

13

transformar a morfina extraída das papoilas de ópio, em heroína. Outros reagentes necessários à

produção ilícita de heroína são o carbonato de sódio, o hidróxido de cálcio, o cloreto de amónio e o

ácido acético glacial. Estas duas últimas substâncias químicas são livremente comercializadas

Para o fabrico da cocaína são comummente utilizados os precursores quimícos permanganato

de potássio, ácido sulfúrico e hidróxido de cálcio. O próprio precursor permanganato de potássio é

produzido através do pré-precursor dióxido de manganeso, substância que está sujeita a controlo

internacional.36 A utilização de ácidos e solventes, a maioria já incluídos na tabela II da Convenção de

1988, também é necessária para produção desta droga. É técnica comum o próprio fabrico, assim

como a reutilização e reciclagem dos pré-precursores utilizados. Exemplificando, através da utilização

de cloridrato de cálcio é possivel a reutilização de diversos solventes.

Existem ainda diversos pré-precursores que não estão sob controlo internacional, mas que

fazem igualmente parte das várias fases da confeção ilícita de cocaína. É exemplo a utilização de vários

solventes para a extração da base da cocaína das folhas de coca, bem como para a transformação da

base em hidrocloridrato e em diversos solventes de acetato.37

Para a produção ilícita de anfetaminas e seus derivados são utilizados precursores

legitimamente utilizados na produção de medicamentos. A efedrina, a pseudoefedrina, a efedra, a

norefredina, o ácido fenilacético e o anidrido acético são alguns exemplos.

No fabrico destas drogas sintéticas também são utilizados diversos químicos utilizados nas

indústrias de cosméstica como o piperonal, o safrole e os seus óleos essenciais. Todos os precursores

acabados de mencionar fazem parte da tabela I da Convenção de 1988. Os pré-precursores utilizados

na confeção destas substâncias estimulantes são o alfa-fenilacetoacetonitrilo - substância mais utilizada

e sob controlo internacional e europeu desde 2014 – os ésteres do ácido fenilacético e a metilamina. A

formamida, o ácido sulfúrico, o benzaldeído, o nitroetano são outros pré-percursores livremente

comercializados e utilizados na produção de drogas estimulantes.

No que se refere às demais substâncias sintéticas, existem diversos químicos precursores

sintéticos ou derivados de plantas que são necessários à sua produção mas que são igualmente

utilizados para fins lícitos. São exemplos os alcaóides da cravagem de centeio – utilizados para

tratamento das enxaquecas, assim como para a produção do LSD – que tem por si só efeitos

psicoativos - e o ácido antranílico.

No que concerne aos químicos utilizados para produzir as novas substâncias psicoativas, é

exemplo a utilização do Gama-butirolactona tanto como droga de consumo, vulgo droga da violação,

36 Idem, ibidem, p. 30.

37 Idem, ibidem.

14

como no fabrico do ácido gama-hidroxibutírico (GHB), assim como a hidroxilimínana para a produção

de cetamina.

Os precursores possuem, portanto, uma dicotomia entre os seus fins legítimos e os seus fins

ilícitos. “Tais precursores servindo também o fabrico de susbstâncais legais, dado que circulam

regularmente e de forma massiva por todo o mundo, são de muito difícil controlo.”38 Pelo que, como

decorrência da obrigação prevista na Convenção de 1988, os Estados signatários devem adotar

medidas de controlo por forma a evitar o desvio destes químicos para o tráfico ilícito.

38 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 60.

15

CAPÍTULO II – AS NOVAS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS

No presente capítulo pretende dar-se a conhecer as novas drogas que, nesta última década, têm

surgido no mercado com o intuito de substituir as drogas sujeitas a controlo internacional. Assim,

procura-se, em primeiro lugar, identificar as motivações sociais do consumo e os sujeitos e as

motivações do fabrico e comercialização das novas substâncias psicoativas, em segundo lugar, faz-se

uma resenha histórica do seu surgimento, com o intuito de procurar saber se este fenómeno é algo

contemporâneo, de seguida, procura-se enunciar as principais categorias destas drogas e, por último,

identificam-se os locais de venda e os métodos de marketing utilizados na sua comercialização, assim

como as fontes de (dis)infomação que as acompanham.

2.1 A compreensão das novas substâncias psicoativas

As novas substâncias psicoativas (NSP) são químicos disponíveis no mercado que produzem

efeitos depressores, estimulantes ou alucinogénicos. O fenómeno das novas substâncias psicoativas

não é algo novo, uma vez que o surgimento e a procura das mesmas está relacionada, tal como as

demais drogas, com a busca incessante do Ser Humano pela felicidade. O seu consumo relaciona-se,

portanto, com a psicoatividade destas substâncias e com a expectativa de retirar um benefício, tal

como ocorre com o consumo de tabaco, álcool, cocaína, erva e demais drogas.

Estas drogas podem, assim, caracterizar-se como variantes sintéticas de grupos químicos

específicos que são produzidas para substituir drogas proibidas, pois a sua composição é idêntica à

composição química destas. Ou seja, estas “novas drogas incluem substâncias sintéticas e naturais

não controladas no âmbito do direito internacional e frequentemente produzidas com a intenção de

reproduzir os efeitos das substâncias controladas.”39

Apesar da sua psicoativadade e do consumo ser causa de danos para a saúde pública, estas

drogas não estão abrangidas pelas Convenção internacionais porque se distinguem quimicamente das

drogas controladas. Acresce ainda que muitas destas substâncias são utilizadas na área comercial e

industrial ou servem propósitos de investigação científica.

39 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre drogas – Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 32. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

16

Estas drogas de síntese são produzidas em laboratórios ilegais através da utilização de

precursores químicos. É possível produzir diversas variantes de drogas pela modificação molecular da

estrutura química das drogas controladas. Através do manuseamento químico de compostos de

carbono é possível reproduzir variados compostos orgânicos, como as substâncias químicas das

drogas vegetais40. Assim, a partir da sintetização da molécula orgânica natural é possível produzir

artificialmente diversas réplicas. As estruturas químicas vão sendo modeladas, em ambientes

laboratoriais controlados, pela aplicação de diversos métodos - adição de calor, ácidos, água - que

permitem alterar, em menor ou em maior medida, a molécula primitiva.

Esta mudança química das drogas faz com que haja alteração dos efeitos que a mesma

provocaria, uma vez que os primitivos efeitos poderão ser diferentes, aumentados, desenvolvidos ou

reduzidos. Nesta medida, os efeitos da nova droga não serão exatamente iguais aos produzidos pela

droga substituída, pois as variadas drogas têm um modo de atuação cerebral diverso.

O processo químico do qual resulta uma nova substância psicoativa denomina-se ring

substitution ou structure-activity-relationship41. Através deste processo, os químicos adicionam ou

retiram moléculas da estrutura química da droga ilícita, para que possam ser consideradas distintas e,

portanto, possam ser livremente comercializadas.

A criação das novas substâncias psicoativas é um processo “fácil” de realizar – quer do ponto

de vista químico, quer do ponto de vista de produção. A maioria das novas substâncias psicoativas são

apenas ligeiras variantes químicas de substâncias conhecidas e identificadas. Os respetivos processos

teóricos de alteração encontram-se com facilidade na literatura publicada, ainda com mais facilidade

na internet. A sua efetivação prática necessita tão somente, na maior parte dos casos, de pequenos

laboratórios caseiros.

Isto deve-se à semelhança entre as novas substâncias psicoativas e as que estão sujeitas a

proibição legal a nível internacional, tais como a fenetilamina, a cocaína, fenciclidina e a triptamina e,

também, e os neurotransmissores endógenos ao ser humano, especificamente a serotonina, a

norepinefrina e a dopamina. Por isso, um químico consegue identificar com facilidade as combinações

moleculares que não estão previstas pela legislação e que, em consequência, podem ser consideradas

“legais”.

As novas drogas produzidas através deste processo químico denominam-se substâncias

análogas. Denominação advinda do facto destas drogas serem basicamente versões legais das drogas

proibídas. Mas “descrever essas substâncias como «lícitas» pode ser incorreto ou induzir os clientes

40 É o caso do MDMA. Esta droga é produzida através de diversos processos de sintetização da planta ayahuasca que contém a substância alucinogénica

N,N-dimetiltriptamina (DMT).

41 Power, Mike (2013), Drugs 2.0– The Web revolution that´s changing how the world gets high, London: Portobello Books, cap. “Vegetable to chemical”.

17

em erro: alguns produtos podem conter substâncias controladas ao abrigo de legislação de combate à

droga e outros podem estar abrangidos pela legislação relativa aos medicamentos ou à segurança

alimentar (OEDT, 2011a).”42 Assim, a modificação das fórmulas químicas, para além de alterar os

efeitos produzidos pelo composto base, tem a capacidade potencial de transformar uma determinada

droga ilegal numa substância livremente comercializada, apesar de produzir efeitos análogos àquela.

A possibilidade de produção de substâncias análogas de forma rápida, diversificada e sem

custos elevados dificulta sobremaneira as estratégias políticas e a feitura das leis que pretendam

regular este fenómeno de verificação crescente.

2.2 Súmula histórica da produção sintética de drogas

A produção artificial de substâncias orgânicas iniciou-se em 1828 com a sintetização da ureia

por Friedrich Wöhler. Este químico alemão através da reação laboratorial entre dois compostos

inorgânicos, o ácido cianídrico e do amoníaco, sintetizou a ureia43. A partir do fim dos anos 90 e início

do século XX até aos dias de hoje, a química orgânica tem sido utilizada para alterar substâncias

terapêuticas e psicoativas e produzir versões diferentes que melhor correspondam ao fim pretendido.

O primeiro registo da produção sintética de uma droga ocorreu em 1858, com a sintetização

da cocaína por Nieman e Wolter. O interesse pela cocaína foi amplo, tendo sido comercializada

livremente e de forma massiva, tendo sido, inclusive, a principal substância da Coca-Cola e do vinho

tónico Angelo Mariani e inumeráveis remédios caseiros, sendo inclusivamente, durante dezassete anos,

a componente mais popular da Coca-Cola. O avanço da ciência verificado nesta época conduziu à

investigação da cocaína, começando a surgir as teorias da dependência. Sigmund Freud defendia a sua

utilidade terapêutica, enquanto que Louis Lewin, autor do trabalho científco denominado

"heroinomania", defendia a teoria da dependência das drogas. Seguindo de perto a doutrina deste

farmacologista alemão, a partir de 1885, Freud desenvolve a teoria de toxicomania.

Em 1898, o químico alemão Alfred Desser, na investigação que efetuou para encontrar uma

substância que ajudasse na desintoxicação da morfina, produziu artificialmente a diacetilmorfina ou

heroína. Este químico adicionou à morfina o reagente químico anidrido acético, entre outros elementos

de acetilação, criando um grupo funcional com a estrutura química da morfina. O novo medicamento

resultou numa substância mais solúvel e que produzia mais efeitos com menos quantidade do que a

morfina.

42 Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (2012), Relatório anual, A evolução do fenómeno da droga na Europa Luxemburgo, p.101.

Disponível em: http://www.emcdda.europa.eu.

43 A ureia é um composto orgânico encontrado na urina, no suor, no sangue e em plantas.

18

Esta substância foi patenteada em 1898 pelo laboratório Bayer para o tratamento de

dependentes da morfina e de outras doenças, como a tuberculose. Após se ter verificado os riscos

associados ao seu consumo, a sua comercialização como fármaco foi proibida internacionalmente,

passando a ser comercializada no mercado ilícito. Este periodo “provocou uma mudança qualitativa

muito importante em relação ao papel social das drogas, tendo, inclusivamente, modificado a perceção

e utilização de outras substâncias e configurado o modelo contemporâneo dos "problemas de drogas"

nas sociedades de consumo.” 44

O uso significativo do processo químico de análogos ocorreu após 1921, com a entrada em

vigor da Convenção internacional contra o ópio de 1912 que regulava a produção e a comercialização

de morfina, de heroína e de cocaína. Nesta altura surgiram no mercado ilícito a acetilpropionilmorfina,

em 1923, e a dibenzoilmorfina, em 1924, como substâncias análogas das substâncias opiáceas

sujeitas a controlo internacional. Estas drogas podem ser consideradas como as primeiras novas

substâncias psicoativas.

Em 1887, o químico Lazar Edeleanu sintetizou, pela primeira vez, na Alemanha, a anfetamina,

cujo uso humano veio a ocorrer em 1920 para o tratamento da fadiga e da asma.

Em 1897, Arthur Heffter, farmacologista alemão, isolou do cato peiote a mescalina. Vinte e

dois anos mais tarde, o químico austríaco, Ernst Spath, produziu sinteticamente a mescalina através do

alcalóide natural denominado fenetilamina que provoca efeitos psicadélicos nos humanos. Esta

substância quimíca é bastante maleável pelo que a manipulação da sua estrutua química produz

diversas drogas estimulantes.

Havelock Ellis, médico britânico, escreveu em 1898, um artigo relacionado com a mescalina,

publicado na revista The Contemporary Review, intitulado Mescal, a New Artificial Paradise, no qual

publicitou o uso da substância, assim como novas perspetivas quanto ao uso de substâncias

psicoativas, fundadas no seu próprio consumo e nas experiências relatadas pelo escritor Aldous Huxley.

Em 1938, o químico suíço Albert Hofmann levou a cabo o estudo científico, na companhia

farmacêutica Sandoz, do alcalóide ergotamina - princípio ativo do fungo ergo – a partir do qual produziu

diversos compostos análogos da substância, sendo um deles a substância alucinogénica denominada

ácido lisérgico (LSD).

Após testes científicos atestarem a sua não utilidade medicinal, o ácido lisérgico deixou de ser

investigado pela companhia alemã, até que, em Abril de 1943, Hofmann voltou a sintetizar a

substância. No decorrer deste procedimento químico, caiu acidentalmente um pouco da mesma nos

44 http://www.sicad.pt/PT/Cidadao/SubstanciasPsicoativas/Paginas/detalhe.aspx?itemId=10

19

seus dedos, tendo o químico suiço relatado os momentos que se seguiram após a administração do

LSD:

“Last Friday, April 16, 1943, I was forced to stop my work in the laboratory in the middle of the

afternoon and to go home, as I was seized by a peculiar restlessness associated with a

sensation of mild dizziness. On arriving home, I lay down and sank into a kind of drunkenness

which was not unpleasant and which was characterized by extreme activity of imagination. As I

lay in a dazed condition with my eyes closed (I experienced daylight as disagreeably bright)

there surged upon me an uninterrupted stream of fantastic images of extraordinary plasticity

and vividness and accompanied by an intense, kaleidoscope-like play of colors. This condition

gradually passed off after about two hours”.45

Levado pela curiosidade, o químico voltou a experimentar a substância mas já com a posologia

de um quarto de miligrama, tendo relatado igualmente os momentos posteriores. “With that (rather

large) quarter-milligram dose of a tasteless white powder, the psychedelic era began, as did the era of

synthetic, man-made and recreational drug-taking that persists to this day.”46

O ácido lisérgico foi amplamente utilizado no tratamento de doentes do foro psiquiátrico,

designadamente no tratamento de esquizofrenia. Ronald Sandison testou a sua eficácia em doentes do

foro psiquiátrico num programa de investigação financiado pelo Governo britânico. Esta substância

ainda foi ilegalmente experimentada em soldados da Guerra Fria pelo Governo Federal dos Estados

Unidos da América no projeto Mkultra.47

Em 1955, R. Gordon Wasson, investidor da banca, numa viagem que fez para o México,

consumiu dezenas de cogumelos mágicos, oferecidos por uma curandeira de Oaxaca. Estes fungos

contêm psilocibina, substância química presente em centenas de cogumelos. O princípio químico desta

substância, a triptamina, provoca efeitos psicadélicos nos humanos e podem ser produzidas milhares

de análogos a partir da sua estrutura molecular. Em 13 de Maio de 1953, Wasson escreveu um artigo

a relatar a experiência tida com a substância, tendo sido publicado numa revista da época.

Em 1912, a empresa farmacêutica alemã Merck sintetizou e patenteou a metilsafrilamina –

3,4-metilendioximetananfetamina ou MDMA - como agente de coagulação. Em 1969 e depois de

45 Power, Mike (2013), Drugs 2.0– The Web revolution that´s changing how the world gets high, London: Portobello Books, cap. “Vegetable to chemical”.

46 Idem, ibidem

47 A título de curiosidade, Francis Crick e James Watson, que descobriram a estrutura do ácido desoxirribonucleico (ADN) em Março de 1953, e Kary Mullis,

que descobriu a reação em cadeia da polimerase, confessaram que, aquando da sua descoberta científica estavam sob o efeito de LSD, tendo atribuído à

substância alguns dos conhecimentos obtidos.

20

longos estudos e investigações, esta substância foi desclassificada pela empresa devido aos efeitos

comportamentais e toxicológicos que provocava.

As instruções da fórmula química da substância permaneceram durante décadas nos registos

do laboratório até que, no fim da década de 70, Alexander Shulgin, bioquímico norte- americano, voltou

a sintetizar o MDMA e produziu centenas de substâncias análogas tendo, inclusivé, experimentado e

reproduzido documentalmente não só as experiências mas também os compostos químicos e as

características e efeitos de cada análogo. Shulgin é, assim, considerado o pai do processo químico

“ring substitution”, tendo escrito dezenas de livros, de entre eles, “The Anarchist Cookbook”, “PiHKAL”

(Phenethylamines i Have Known and Loved) publicado em 1991, “TiHKAL” (Tryptamines i Have Known

and Loved), publicado em 1997. Estes livros representam um manual de instruções da produção de

diversas drogas sintéticas.

Assim, a “expressão «drogas de design» surgiu na década de 1980 com a irupção dos

compostos de ecstasy (MDMA e outros) no mercado das drogas ilícitas. Refere-se a substâncias

psicoativas não regulamentadas com que se pretendem reproduzir os efeitos de drogas controladas

alterando-lhes ligeiramente a estrutura química a fim de contornar os controlos vigentes.”48 Deste

modo, estas novas drogas são substâncias híbridas, diferentes das drogas controladas. O

conhecimento em relação às mesmas é ainda diminuto, permanecendo no desconhecimento a efetiva

ameaça para a saúde pública que o seu consumo poderá provocar.

2.3 Categorias de novas substâncias psicoativas e seus aspetos comuns

No fim do século XX, o mundo químico encontrava-se de maneira avançado na produção de

drogas análogas que rapidamente se intrusaram nos mercados de consumo. Tal como as drogas

ilícitas, as novas substâncias psicoativas podem ser substâncias naturais, tais como plantas, ervas,

fungos ou ser substâncias totalmente químicas, sintetizadas.

Na categoria herbácea das drogas análogas encontram-se substâncias como os canabinóides

sintéticos, substâncias agonistas que simulam os efeitos produzidos pelo principal elemento psicoativo

da cannabis, o THC, e que atuam nos recetores canabinóides. Estas drogas são vendidas sob a forma

de produtos naturais, como incensos, especiarias e sob diversos nomes, tais como “(...) spice, K2,

Kronic, etc.”49 Faz parte desta categoria as substâncias à base de plantas, nas quais estão incluídas

plantas com efeitos psicotrópicos. Alguns exemplos são a salvia divinorium, que cresce em Oaxaca, no

48 OEDT (2012). Relatório anual - A evolução do fenómeno da droga na Europa, Luxemburgo, p.101. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

49 https://www.unodc.org/documents/scientific/NPS_poster_2014_EN.pdf.

21

México, e que contém a substância alucinogénea, salvinorina A; a planta Kratom, (Mitragyna

speciosa Korth), planta originária do sudeste asiático, das Filipinas e da Nova Guiné, que contém o

alcalóide com efeitos estimulantes e sedativos “mitragyne” 50 e a planta “Khat” originária da África

Oriental e da Peninsula Arábica, cujas folhas são compostas pela substância estimulante catinona.

Na categoria de análogos de drogas sintéticas podem encontrar-se substâncias como os

aminoindanos – metilenodioxiaminoindano ou MDAI - cujos efeitos são similares aos produzidos pelo

MDMA; os catinonas sintéticos, tais como a mefedrona e o MDPV, que produzem efeitos semelhantes

aos da planta khat; as triptaminas, análogos derivados da substância natural alucinogénea triptamina,

tal como 5-Meo-DPT; as substâncias do grupo das arilcicloalquilaminas, como a cetamina,

comummente utilizado na medicina veterinária como anestésico de animais de grande porte, que

produz efeitos estimulantes ou sedativos nos humanos, em consonância com a quantidade tomada,

assim como os derivados de fenilciclidina ou PCP e o 4-MeO-PCP (4-metoxi-fenciclidina). Faz ainda

parte desta categoria as piperazinas, cujos efeitos são similares aos produzidos pelo ecstasy, tais como

o BZP (benzilpiperazina) ou o mCPP (meta-clorofenilpiperazina); as fenetilaminas, cujos efeitos são

semelhantes aos produzidos pela anfetamina e pela metanfetamina, tal como o Bromo-Dragonfly, uma

substância que produz também efeitos alucinogéneos, e o DMAA (1,3-dimetilamilamina).

Finalmente, há ainda a considerar toda uma gama de produtos desenvolvidos pelas indústrias

farmacêuticas e alimentares, designadamente bens de consumo com propósito lícitos - emagrecer,

desenvolver a musculatura, a potência sexual, suplementos alimentares, entre outros que contêm

novas substâncias psicoativas.

2.4 Fornecimento das novas substâncias psicoativas

O fornecimento das novas substâncias psicoativas funciona de modo idêntico ao comércio de

bens, pelo que a prossecução do lucro implica que as empresas disponham de planos de negócio,

estratégias de publicidade, assim como de redes logísticas. As indústrias e as empresas que se

dedicam à confeção, à distribuição ou à colocação à venda das NSP operam em várias fases legítimas

do comércio.

As empresas que se dedicam às NSP podem desempenhar várias funções, ou seja, podem

elas próprias fabricar as substâncias a partir de matéria-prima adquirida no exterior ou distribuir as

mesmas após terem sido adquiridas, no seu estado final, aos fabricantes e embaladas para as

poderem colocar no mercado retalhista. Os grupos de criminalidade organizada também estão

50 Idem, ibidem.

22

envolvidos na embalagem e venda destas substâncias. “As autoridades europeias responsáveis pela

aplicação da lei têm descoberto instalações associadas à importação, mistura e embalagem de

substâncias desse tipo.”51

As novas substâncias psicoativas são maioritariamente produzidas nas chamadas shadow

industries situadas na China, na Índia, no Paquistão e noutros países terceiros, tal como a América do

Sul. Apesar da produção ser menor em comparação com a quantidade produzida pelos fabricantes

asiáticos, estas indústrias também estão localizadas no território da União Europeia.

Estas indústrias mantêm-se atualizadas quanto às medidas de controlo internacionais para

que, de modo antecipado, coloquem no mercado substâncias alternativas.

A produção das novas substâncias psicoativas é feita nos mais diversos tipos de laboratórios

que podem ser de pequena a grande dimensão e mesmo com os utensílios mais rústicos ou mais

desenvolvidos tecnologicamente. Algumas empresas ligadas ao ramo farmacêutico e quimíco utilizam a

sua estrutura para produzir estas novas drogas.

A importação de precursores químicos para o fabrico destas substâncias no seio da União

Europeia é feita através de empresas chinesas e indianas. A exportação destes químicos por chineses é

facilitada não só pelas declarações falsas quanto aos produtos a exportar, mas também por alguns dos

precursors químicos serem substâncias livremente comercializadas. A título de exemplo, empresas

sitas em países terceiros exportam, para a produção da mefedrona, o precursor químico metilpropano

largamente utilizado na produção de perfumes, medicamentos.

Acresce que a internet representa uma fonte importante para a importação destes produtos

para o território da União Europeia. Muitas empresas com atividades legítimas compram, via internet,

diversos precursores químicos para posterior revenda a outras empresas europeias.

As NSP chegam à União Europeia pelo recurso às diversas empresas de correio nacional ou

internacional.52

2.5 Locais de venda e publicidade das novas substâncias psicoativas

São várias as estratégias adotadas pelos agentes envolvidos no mercado das novas

substâncias psicoativas, muitas delas corporizam-se em métodos obscuros e fraudulentos para que a

intervenção das autoridades seja escassa.

51 OEDT (2012). Relatório anual - A evolução do fenómeno da droga na Europa Luxemburgo, pp. 100 e 101. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

52 De acordo com os dados fornecidos pelos repronsáveis dos serviços postais do Reino Unido, a maioria das NSP são enviadas por empresas que se

dedicam a entregas expressas a FedEx, entre outras, ou pelo correio. Idem, ibidem.

23

As indústrias das NSP prosseguem uma atividade que, por em grande parte dos países não se

encontrar regulamentada, permite a venda destas novas drogas em locais de venda especializados

como as denominadas “head shops/smart shops”53 ou em lojas virtuais. Para além dos sítios mais

comuns de venda das NSP, a comercialização destes produtos também é feita em quiosques, lojas de

sexo, lojas de conveniência ou lojas de aluguer de filmes, em discotecas ou mesmo em lojas

particulares, tal como detetado no Luxemburgo e na Grécia.54

Com a proibição de funcionamento das head shops/smart shops em diversos Estados

Membros, a comercialização das NSP é feita em grande escala pela internet, mais concretamente por

lojas virtuais, muitas delas exclusivas na comercialização de diversos produtos com efeitos psicoativos

ou de bens de consumo estético, industrial ou alimentar e mesmo em farmácias a operar em linha de

forma irregular.55

A grande maioria das lojas virtuais têm a sua empresa localizada nos Estados Unidos da

América ou no Reino Unido e o idioma prevalecente das mesmas é o inglês.56

As lojas virtuais de comercialização de NSP adotam estratégias que, por força da natureza dos

produtos, priveligiam a proteção do anonimato dos vendedores e dos compradores. Uma das técnicas

adotadas tem que ver com a prossecução da atividade em websites restritos. Ainda por força do risco

dos produtos vendidos serem a qualquer momento objeto de restrições ou mesmo de proibições em

alguns países, o que impossibilita o envio, ou da existência de medidas proibicionistas ou restritivas

noutros, as lojas virtuais tendem a identificar os países onde já existe regulação legal ou a solicitar aos

utilizadores que verifiquem se a substância que pretendem comprar já está sujeita a controlo. Para a

verificação da regulação legal da substância, alguns websites contêm ligações que remetem os

utilizadores para sítios virtuais que tenham esta informação.

As NSP são comercializadas como incensos, sais de banho, produtos para plantas e ainda com

a aposição no rótulo do produto de que o mesmo não se destina ao consumo humano ou como

substâncias para uso industrial. A individualização das mesmas é feita, por vezes, pelo nome do

53 Preparatory study for an Impact Assessment on a new instrument replacing Council Decision 2005/387/JHA on new psychoactive substances (2012).

Final Report to DG Justice GHK, p. 28. Disponível em: http://ec.europa.eu/justice/anti-drugs/files/nps-study-2012_en.pdf.

54 Idem, ibidem, p. 31.

55 “Reports suggest that the vast majority of online pharmacies fall into the illegitimate category. These are not registered with any recognised accreditation

system and do not abide by regulations and professional standards. A growing concern related to illegitimate online pharmacies is their potential role as a

source of drugs of misuse. However, the limited studies in this area indicate that online pharmacies are unlikely to be a reliable source of supply for the

illicit drug market.” EMCDDA (2015). The Internet and drug markets, Summary of results from an Trendspotter study, Lisboa, p. 4.

Disponível em: http://www.emcdda.europa.eu/publications/technical-reports/internet-drug-markets.

56 Em 2011, 197 lojas virtuais, num total de 631, estavam localizadas nos Estados Unidos da América e em 83% predominava a língua inglesa.

Preparatory study for an Impact Assessment on a new instrument replacing Council Decision 2005/387/JHA on new psychoactive substances (2012).

Final Report to DG Justice, GHK, p. 29. Disponível em: http://ec.europa.eu/justice/anti-drugs/files/nps-study-2012_en.pdf.

24

princípio ativo, como por exemplo efedrina, ou pelo nome de plantas. Acresce que algumas das NSP

são compostas por diversos ingredientes ativos e não somente pelo que vem identificado.

Perante a ausência de regulação legal, as NSP não são sujeitas ao controlo de qualidade que

permite atestar a segurança dos produtos para consumo humano. A comercialização destas

substâncias é feita sem qualquer informação do produto que identifique a sua composição química, a

farmacologia, os efeitos toxicológicos, as vias de administração, os efeitos secundários ou mesmo as

contraindicações quando tomadas com outras substâncias. Quando os produtos são acompanhados de

informação, a mesma não corresponde à verdadeira composição ou contém declarações

indeterminadas. De acordo com um estudo feito, em 2009, no Reino Unido, a maioria dos produtos

comercializados na internet não continham a lista dos ingredientes ou continham informação errónea

quanto aos reais compostos

Com esta estratégia pretende-se evitar que o produto, se e quando confiscado, não seja sujeito

à regulação legal em matéria de droga, em matéria de segurança dos produtos ou alimentar ou à

regulação dos medicamentos e produtos farmacêuticos. Acresce que a desinformação que acompanha

o mercado das NSP transmite a informação errónea aos consumidores que o produto é legal e,

portanto, seguro e poderá ainda constituir a primeira razão para que as pessoas interessadas passem

a experimentar ou a consumir.

2.6 Fontes de informação das novas substâncias psicoativas

O principal risco associado ao consumo das NSP tem que ver com a ausência ou com

informação imprecisa quanto ao produto e quanto aos riscos associados ao seu consumo.

Devido à inexistência de informação oficial quanto às NSP, a grande maioria dos consumidores

encontra informação relativa aos diferentes tipos de substâncias em sítios de venda, em fóruns virtuais

ou em redes sociais. A fonte desta informação são os produtores e os consumidores que através da

partilha das próprias experiências dão a conhecer aos interessados a dosagem aconselhável, os efeitos

principais e secundários e a interação de várias NSP.

Esta informação também pode ser assacada por fontes oficiais em determinados Estados

Membros. Por exemplo, no Reino Unido, na Bulgária, no Chipre e na Hungria existem Organizações

Não Governamentais, concelhos locais de droga e serviços especializados na prevenção e redução de

danos que disponibilizam informação relativa às NSP.

A comunicação social é outra fonte de informação, contudo a segurança e fiabilidade que lhe

deve estar subjacente, por vezes é ultrapassada pelo sensacionalismo e pelo populismo das notícias.

25

No Reino Unido, o sistema de avaliação de riscos detetou que somente uma morte estava diretamente

relacionada com o consumo de mefedrona, após a comunicação social ter veiculado a informação que

esta droga tinha causado a morte de diversas pessoas.57

As indústrias, empresas que se dedicam à comercialização destas substâncias tendem a estar

um passo mais à frente do legislador, visto que as entidades competentes não podem testar todos os

produtos que chegam ao mercado em tempo útil de os proibir legalmente. Adicionalmente, mesmo

após uma eventual interdição, as redes de distribuição de drogas ilícitas assumem a tarefa de as

disponibilizar aos consumidores através de drogas substitutas ou continuam a ser comercializadas por

traficantes pertencentes a grupos de criminalidade organizada.

O mercado das novas substâncias psicoativas, tendo subjacente uma atividade que visa o

lucro, caracteriza-se pela constante inclusão de mais produtos, mas ao contrário da informação

existente sobre as drogas controladas, a falta de informação e de monotorização da oferta das novas

substâncias psicoativas impede o conhecimento quanto aos seus níveis e quanto à sua nocividade para

a saúde pública e, nessa medida, que se tomem medidas de controlo mais eficientes.

57 Idem, ibidem, p. 33.

27

CAPÍTULO III – O MERCADO DAS DROGAS E DOS SEUS PRECURSORES

Com este capítulo pretende dar-se a conhecer o estado atual geral do mercado das drogas e

dos seus precursores, a nível mundial, europeu e nacional. Refere-se ainda o mercado das principais

drogas em igual dimensão.

3.1 O mercado global

O tráfico e o consumo de drogas a nível mundial acarretam problemas nefastos que vão desde

o aumento dos grupos de criminalidade organizada, a sua disseminação por vários pontos estratégicos,

o uso da violência, a ameaça à saúde pública e os problemas sociais associados. O fenómeno da droga

impõe que sejam tomadas estratégias para combater todas as dimensões do mesmo.

Mundialmente, calcula-se que, uma em cada vinte pessoas – totalizando 246 milhões de

pessoas - com idade compreendida entre os 15 e 64 anos, consumiu alguma substância psicotrópica

em 2013, sendo que um em cada 3 consumidores são mulheres. Calcula-se, ainda, que 1/6 dos

toxicodependentes teve acesso a tratamento e que, para além de um em cada dez consumidores sofrer

de adição ou de algum transtorno derivado do consumo, um em cada cinco consumidores em

tratamento são mulheres.58

Calcula-se ainda que, em 2013, cerca de 187 100 mortes respeitam ao consumo de drogas,

devido a overdoses ou de infeções por SIDA. 59 Tendência anual de mortes por consumo que se

mantém estável face aos anos anteriores.

Apesar das variações de tendências no uso global de drogas de região para região, o consumo

de heroína e ópio permanence estável – sendo o consumo de opiáceos o mais problemático,60

enquanto que diminuiu o consumo de cocaína e aumentou o consumo de cannabis e de

medicamentos opiáceos não prescritos. O consumo de drogas anfetamínicas é variável de zona para

58 United Nations Office on Drugs and Crime (2015). World Drug Report, Viena, pp. ix e xi.

Disponível em: https://www.unodc.org/documents/wdr2015/World_Drug_Report_2015.pdf.

59 Idem, ibidem, pp. v e xii.

60 “This can be attributed to the relationship between the use of opiates and injecting drug use, HIV, AIDS and overdose deaths and to the fact that the use

of opiates accounts for the majority of treatment admissions for drug use in Asia and Europe.” Idem, ibidem, p. xi.

28

zona, sendo o Continente Asiático o local de maior consumo.61 O sexo masculino é mais predisposto ao

consumo de cannabis, de cocaína e de drogas anfetamínicas, ao passo que o sexo feminino é mais

propenso ao consumo de medicamentos tranquilizantes e opiáceos.62

No que se refere às novas substâncias psicoativas, não obstante a parca informação quanto

aos riscos que causam na saúde dos consumidores, calcula-se que as 500 NSP descobertas causam

sérios riscos e são causa do aumento global da procura de tratamento.63

De seguida, da-se a conhecer os mercados globais das principais drogas ilícitas.

Quanto aos opiáceos, calcula-se que, em 2013 – o ano mais recente para o qual existem

estatísticas oficiais disponíveis – o número de consumidores de opióides - medicamentos e opiáceos - a

nível mundial superava os 32, 4 milhões, enquanto que o número de consumidores de opiáceos -

heroína e ópio, superava os 16, 5 milhões. No mesmo ano, o principal indicador utlizado para calcular

a produção e o consumo – a quantidade total de apreensões – atingiu as 634 toneladas de ópio, as

38, 5 toneladas de morfina e as 77,6 toneladas de heroína. O Afeganistão continua a ser considerado o

maior produtor de heroína.

No que se refere à cocaína, calcula-se que, em 2013 o número de consumidores de cocaína a

nível mundial superava os 17 milhões. No mesmo ano, a quantidade total de apreensões atingiu as

687 toneladas de cocaína. O cultivo global de cocaína afigura-se nos 120 800 hectares, ao passo que o

fabrico de cocaína pura se afigura nas 902 toneladas.64 A América do Sul é o continente onde mais se

cultiva plantações de coca e, por consequência, o local onde mais se produz cocaína.65

Relativamente à cannabis, calcula-se que, em igual período, o número de consumidores de

cannabis a nível mundial superava os 181 milhões. No mesmo ano, a quantidade total de apreensões

atingiu as 1416 toneladas de resina de cannabis e as 5764 toneladas de erva de cannabis.66 A

cannabis é produzida em todos os países do mundo, o que dificulta de sobremaneira o cálculo das

estimativas de produção e consumo. A produção de resina de cannabis, porém, está confinada a

alguns países do Norte de África, Médio Oriente e Sudoeste Asiático.67 Em 2014, calcula-se que a

produção de heroína superava as 526 toneladas e as 7, 554 toneladas de ópio, pelo que se calcula

que o cultivo global superava os 310, 891 hectares.68 A Ásia é o continente que mais produz opiáceos,

61 Idem, ibidem, p. ix.

62 Idem, ibidem, p. xii.

63 Idem, ibidem, p. x.

64 Idem, ibidem, p. 50.

65 Idem, ibidem, p. xii.

66 Idem, ibidem, p. 57.

67 Idem, ibidem, p. xii.

68 Idem, ibidem, p. 41.

29

sendo o Afeganistão o país maior produtor, seguido da República Democrática Popular Laos e

Mianmar.69

No que se refere às drogas sintéticas, calcula-se que, em 2013 o número de consumidores de

anfetaminas – anfetaminas, metanfetaminas, medicamentos estimulantes e novas substâncias

psicoativas - a nível mundial superava os 33, 9 milhões, ao passo que o número de consumidores de

ecstasy superava os 18, 8 milhões. No mesmo ano, a quantidade total de apreensões atingiu as 88

toneladas de metanfetamina, as 32 toneladas de morfina anfetamina e as 4,2 toneladas de ecstasy.70 A

produção de drogas sintéticas verifica-se em todo o mundo, sendo dominada pela metanfetamina, cuja

região predominante de produção é o Leste e Sudeste Asiático.71

Quanto à produção de novas substâncias psicoativas, calcula-se que, em Dezembro de 2004,

95 países e territórios apreenderam um total de 541 de novas substancias psicoativas. Tendência que

é evolutiva face à quantidade e à diversidade existente no Mercado mundial das NSP. 72 Dos dados

disponíveis relativos a 2014, refere-se que os canabinóides sintéticos são as NSP mais prevalecentes

no mercado mundial, representando 39% das apreensões; de seguida encontra-se as fenetilaminas

com 18% e os catinonas sintéticos com 15%.73 Apesar da escassez de informação, a produção de NSP

verifica-se em todas as regiões do mundo.74

No que se refere aos precursores, a sua principal fonte continua o seu desvio para o comércio

ilícito, sendo as substâncias mais desviadas a efedrina e a pseudoefedrina.

Todos os números supra mencionados traçam um quadro global desanimador.

Tendencialmente, e apesar de todos os esforços em contrário, o tráfego e consumo não têm diminuído,

tendo até aumentado significativamente, nos últimos anos, em alguns setores. Os custos sociais, com

elevado número de mortes e doenças graves, são grotescos, equivalendo a um estado de guerra

constante. Os custos económicos totais, verdadeiramente incalculáveis.

3.2 O mercado europeu

A Europa representa um relevante mercado de consumo e de oferta não autorizada de drogas.

Desde os anos 70 e 80 que a maioria dos países europeus constituem grandes mercados de cannabis,

69 Idem, ibidem, p. xii.

70 Idem, ibidem, p. 67.

71 Idem, ibidem, p. 67.

72 Idem, ibidem, p. xvii.

73 Idem, ibidem. 74 Idem, ibidem, p. xii.

30

de heroína e de anfetamina, sendo que a partir da década de 90, outras substâncias estimulantes

começaram a surgir com mais intensidade, como o ecstasy e a cocaína.

Calcula-se que, cerca de 80 milhões de adultos - cerca de 25 % da população adulta da União

Europeia já terão consumido drogas ilícitas. A cannabis é a substância ilícita mais consumida, com

aproximadamente 75,1 milhões de consumidores europeus, de seguida encontra-se a cocaína, com

cerca de 14,9 milhões de consumidores, subsequentemente encontram-se as anfetaminas, com cerca

de 11,7 milhões de consumidores e, por último, é o ecstasy com cerca de 11,5 milhões de

consumidores.75 Prevalece o consumo mais elevado entre os homens, mesmo no consumo mais

regular,76 refletindo-se esta prevalência na quantidade de mortes derivadas do consumo, principalmente

por overdose. 77

Os consumidores de opiáceos são aqueles que recebem mais tratamento médico por

dependência, seguido dos usuários de cannabis e de cocaína, sendo que, cerca de 1,6 milhões já

foram sujeitos a tratamento médico devido ao consumo.78 Calcula-se que, “a taxa média de mortalidade

causada por overdoses na Europa tenha sido de 16 mortes por milhão de habitantes com idades

compreendidas entre 15 e 64 anos.”79

Calcula-se que, o número de apreensões de drogas no território da União Europeia é de

aproximadamente um milhão, sendo que mais de metade das apreensões têm que ver com quantidade

diminutas confiscadas aos consumidores e as restantes com elevadas quantidades confiscadas a

tranficantes e produtores.80 A cannabis é, de longe, a droga mais apreendida, respondendo por 8 em

cada 10 apreensões na Europa, de seguida é a cocaína e “com cerca do dobro das apreensões

notificadas para as anfetaminas ou a heroína. O número de apreensões de ecstasy é relativamente

baixo.”81

Em 2013, os países europeus que mais estão associados ao mercado de droga pelas

apreensões realizadas são a Espanha e o Reino Unido, respondendo por mais de 666.000 apreensões.

Os países que em seguida efetuaram apreensões consideráveis são a Bélgica, Alemanha, Itália e os

países do Norte da europa.82 A Turquia apresenta, igualmente, apreensões consideráveis de droga uma

75 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 40. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

76 Idem, ibidem, p. 39.

77 Idem, ibidem, p. 56.

78 Idem, ibidem, p. 65.

79 Idem, ibidem, p. 57.

80 Idem, ibidem, p. 40.

81 Idem, ibidem, p. 20.

82 Idem, ibidem.

31

vez que é um país importante de trânsito das drogas com destino aos restantes países da Europa e do

Médio Oriente.83

Por forma a melhor perceber o mercado europeu, passa-se a referir os nichos de mercado das

principais drogas.

Relativamente aos opiáceos, estima-se que, em 2013 o número de consumidores de opiáceos

a nível da União Europeia superava os 1,3 milhões.84 No mesmo ano, a quantidade total de apreensões

atingiu as 5,6 toneladas de heroína, num total de 32 000 apreensões.85 86

A heroína é a droga depressora mais comercializada na europa, sendo originária do

Afeganistão, Irão e do Paquistão.87 Os depressores deste tipo mais apreendidos são o ópio e os

fármacos opiáceos, como a morfina, a metadona, a buprenorfina, o fentanil e o tramadol. Alguns

destes fármacos foram desviados do fornecimento das indústrias farmacêuticas, outros foram

produzidos no mercado negro.88

Estima-se que o número de infrações à legislação sobre droga relacionadas com o consumo e

posse de cocaína seja de 37 800 e as infrações relativas à oferta seja de 17 000.

Entretanto, entre os países que comunicam sistematicamente dados, as tendências indexadas

sugerem que a pureza de heroína aumentou em 2013 e alguns países manifestaram preocupação

sobre um possível aumento da oferta.”89

Quanto à cocaína, estima-se que, em 2013 o número de consumidores de cocaína na União

Europeia superava os 3,4 milhões.90 No mesmo ano, o principal indicador utlizado para calcular a

produção e o consumo – a quantidade total de apreensões – atingiu as 62,6 toneladas de cocaína,

tendo sido efetuadas 78 000 apreensões.91

Quantidades significativas da cocaína produzida originariamente na Bolívia, Colômbia e Peru

têm como destino principal a Europa, sendo transportada, primordialmente, por mar ou pela via áerea.

A Espanha é o país onde são efetuadas maiores apreensões desta droga, seguido da Bélgica,

Holanda, França e Itália.

83 Idem, ibidem, pp. 20 e 21. 84 Idem, ibidem, p. 15.

85 A quantidade aumenta para as 19,1 toneladas e o número de apreensões para 39 000, quando se engloba os dados da Turquia e a Noruega aos dados

da União Europeia.

86 Idem, ibidem, pp. 24 e 25.

87 Idem, ibidem.

88 Idem, ibidem.

89 Idem, ibidem, p. 24 e 25.

90 Idem, ibidem, p. 15.

91 A quantidade aumenta para as 63,2 toneladas e o número de apreensões para 88 000, quando se engloba os dados da Turquia e a Noruega aos dados

da União Europeia. Idem, ibidem, p. 26.

32

Estima-se que o número de infrações à legislação sobre droga relacionadas com o consumo e

posse de cocaína seja de 72 300 e as infrações relativas à oferta seja de 29 900.

No que se refere às anfetaminas, estima-se que, em 2013 o número de consumidores de

anfetaminas92 a nível europeu superava os 1,6 milhões.93 No mesmo ano, a quantidade total de

apreensões atingiu as 6,7 toneladas de anfetaminas, correspondendo a 34 000 apreensões94 95 e

atingiu as 0,5 toneladas de metanfetaminas, correspondendo a 7000 apreensões.96

A anfetamina e a metanfetamina são maioritariamente produzidas no seio da Europa, sendo a

primeira considerada uma droga europeia.97 Os países europeus responsáveis pela produção de

anfetamina são a Bélgica, a Alemanha, a Holanda e o Reino Unido, enquanto que os principais

produtores de metanfetamina são os países bálticos e da Europa central. Estes países são, portanto,

responsáveis pelo maior número de apreensões destas drogas. Grandes quantidades de anfetamina

europeia tem como principal destino os países do Médio e do Extremo Oriente, ao passo que os

principais destinos da metanfetamina europeia são os países da África e do Irão para o Extremo

Oriente.98

As infrações relacionadas com o consumo e posse de anfetamina é de 55 000 e as relativas à

metanfetamina é de 1 900. O número de infrações relacionadas com a oferta de anfetamina é de 16

000 e com a oferta de metanfetamina é de 27000.99 Quanto ao grau médio de pureza, as amostras de

metanfetamina determinam um grau superior ao da anfetamina, não obstante o aumento do grau

médio de pureza desta substância.

No que respeita à cannabis, estima-se que, em 2013 o número de consumidores de cannabis

a nível europeu superava os 19,3 milhões. No mesmo ano, a quantidade total de apreensões atingiu as

460 toneladas de resina de cannabis e as 130 toneladas de erva de cannabis100, totalizando 671 000

92 “A anfetamina e a metanfetamina são estimulantes sintéticos com uma relação muito estreita entre si, conhecidos sob a designação genérica de

anfetaminas, sendo difícil diferenciá-las em algumas séries de dados.”

Idem, ibidem, p. 27.

93 Idem, ibidem, p. 15.

94 A quantidade aumenta para as 8,2 toneladas e o número de apreensões para 37 000, quando se engloba os dados da Turquia e a Noruega aos dados

da União Europeia.

95 Idem, ibidem, p. 26.

96 A quantidade aumenta para as 0,8 toneladas e o número de apreensões para 11 300, quando se engloba os dados da Turquia e a Noruega aos dados

da União Europeia.

97 Europol (2013). Eu Drug Markets Report - A strategic analysis, Luxembourg, p. 68. Disponível em: https://www.europol.europa.eu/.

98 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 27 e 28. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

99 Idem, ibidem, p. 28.

100 A quantidade de resina de cannabis aumenta para as 560 toneladas e de erva de cannabis para as 310 toneladas quando englobadas as quantidades

apreendidas na Turquia e na Noruega.

33

apreensões de cannabis na União Europeia, mais concretamente 431 000 de cannabis herbácea e

240 000 de resina de cannabis.101

A cannabis herbácea é maioritariamente cultivada nos países da Europa, ao passo que a

cannabis resina é originária de Marrocos e transportada por mar ou pela via aérea. Os países

responsáveis pela maioria das apreensões são a Espanha, Grécia, Itália e Turquia.

As infrações relacionadas com o consumo e posse de cannabis é de 782 000 e o número de

infrações relacionadas com a oferta é de 116 000. O grau percentual de THC presente na cannabis

tem aumentado entre 2006 e 2013, o que se pode dever à utilização de técnicas de produção massiva

na Europa, e da “mais recentemente, (…) (introdução de plantas de elevada potência em Marrocos.”102

No que concerne ao MDMA, estima-se que, em 2013 o número de consumidores de ecstasy a

nível europeu superava os 2,1 milhões. No mesmo ano, o principal indicador utlizado para calcular a

produção e o consumo – a quantidade total de apreensões – atingiu as 4, 8 milhões de comprimidos

correspondendo a 13 400 apreensões.103 Estima-se que o número de infrações à legislação sobre droga

relacionadas com o consumo e posse de ecstasy seja de 11 000 e as infrações relativas à oferta seja

de 3700. Os Países Baixos e a Holanda são os locais onde existe maior produção ilegal de comprimidos

de MDMA. 104

Quanto aos precursores, em 2013 calcula-se que a quantidade de precursores e de pré-

precursores apreendidos na União Europeia de MDMA e de substâncias conexas é de 20 990 litros.105

No mesmo ano estima-se que a quantidade de pré percursores e de precursores apreendidos na União

Europeia de anfetaminas e de metanfetaminas é de 49 008 litros.106

No que respeita às novas substâncias psicoativas, estima-se que o número de apreensões

totalizava cerca de 35 000, tendo sido detetada a quantidade de 130 canabinóides sintéticos,

correspondente a mais de 10 000 apreensões. 107 No ano de 2014, foram apreendidas 101 substâncias

novas, sendo que 36 eram alucinogéneos sintéticos – 31 catinonas e 5 triptaminas – 30 canabinóides,

101 O número de apreensões de erva de cannabis aumenta para 497 000 e o número de apreensões de resina de cannabis aumenta para 270 000, quando

acrescido as apreensões feitas na Turquia e na Noruega. Idem, ibidem, pp. 15 e 23.

102 Idem, ibidem.

103 A quantidade de comprimidos aumenta para os 9,3 milhões de comprimidos e o número de apreensões para 18 000, quando se engloba os dados da

Turquia e a Noruega aos dados da União Europeia.

104 Idem, ibidem, pp. 15 e 30.

105 “ Em 2013, foram apreendidos 5 061 kg de PMK (3,4-metilenedioxifenil-2- propanona) e 13 836 litros de safrole, que em conjunto poderiam produzir

cerca de 170 milhões de comprimidos de ecstasy.” Idem, ibidem.

106 “Em 2013 foram intercetados, ao abrigo da legislação nacional, mais de 48 000 kg do pré-precursor APAAN (alfa-fenilacetato de acetonitrila), uma

quantidade suficiente para produzir mais de 22 toneladas de anfetamina ou metanfetamina.” Idem, ibidem, p. 36.

107 EMCDDA (2015). New psychoactive substances in Europe. An update from the EU Early Warning System, Luxembourg, p. 21. Disponível em:

www.emcdda.europa.eu.

34

5 opióides sintéticos, 13 estimulantes – 9 fenetilaminas e 4 arilalquilaminas – 4 medicamentos –

benzodiazepinas – e 13 substâncias não enquadráveis nestas categorias.

O mecanismo de alerta rápido da UE está atualmente a monitorizar mais de 450 novas

substâncias psicoativas.”108 Seis das substâncias apreendidas e comunicadas no ano de 2014, foram

sujeitas à avaliação de risco, pelo seu relacionamento com internamentos hospitalares e mortes. “Em

setembro de 2014, realizaram-se avaliações de risco ao 4,4′-DMAR e ao MT-45. Antes destas, em abril

de 2014, tinham-se realizado quatro avaliações de risco, nomeadamente ao 25I-NBOMe (um substituto

da fenetilamina com efeitos alucinogénios e vendido como alternativa «legal» ao LSD), ao AH-7921 (um

opiáceo sintético), ao MDPV (um derivado da catinona sintético) e à metoxetamina (uma

arilciclohexilamina estreitamente relacionada com a cetamina e comercializada como alternativa

«legal»).”109

Ora, do conjunto de grupos de novas substancias psicoativas existentes, os cannabinóides

sintéticos e os catinonas são as NSP mais controladas no seio da União Europeia, seguidas dos

opiáceos. Estima-se que, no ano de 2013, a quantidade de canabinóides sintéticos apreendidos foi de

1, 6 toneladas, correspondendo a 21 000 apreensões. Destas apreensões resultou serem 600 kg de

canabinóides sintéticos em pó e a quantidade restante em produtos para plantas. De 2008 a 2013

verificou-se um aumento de 200 vezes no número de apreensões de canabinóides sintéticos efetuados.

No ano de 2014, o número de canabinóides sintéticos superava os 134.110

Calcula-se que, no ano de 2013, a quantidade de catinonas sintéticos apreendidos na Europa

superava as 1,1 toneladas, correspondendo a 11 apreensões. Destas apreensões resultou que 80 % da

quantidade apreendida faziam parte 341 kg da substância 3-MMC e 201 kg de 4-MEC – substâncias

substitutas da mefedrona – 197 kg de pentedrona e 115 kg de alpha-PVP – substâncias pertencentes

ao grupo dos catinonas. No ano de 2014 foram detetadas mais 31 novos catinonas sintéticos.

O opiáceo fentanil e o análogo mais detetado na União Europeia, pois representou em 2014,

3/5 dos opiáceos análogos apreendidos. “Para além da heroína, as forças policiais dos países

europeus apreenderam em 2013 outros produtos opiáceos: ópio; preparações de ópio bruto (por ex.: o

«Kompot»); medicamentos (morfina, metadona, buprenorfina, fentanil e tramadol); bem como novos

opiáceos sintéticos.”111

108 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 32. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

109 Idem, ibidem, p. 33.

110 Idem, ibidem, p. 8.

111 OEDT (2015). Comunicado da agência da UE de informação sobre droga, Lisboa, p.2.

Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

35

3.3 O mercado nacional

Portugal é um dos principais pontos de trânsito da distribuição internacional de drogas devido à

sua localização geográfica. A principal rota de entrada dos narcotraficantes é pela via marítima, sendo

as rotas terrestres e a via aérea os pontos secundários. A utilização dos serviços postais tem sido um

mecanismo cada vez mais corrente para a entrada de droga no mercado interno.

O mercado nacional é o destino de mais de metade das apreensões efetuadas na União

Europeia, apesar de não ser o país onde se encontrem sediadas as redes de tráfico internacional de

drogas. 112

No ano de 2013, os principais países de origem das drogas introduzidas no mercado nacional

foram os Países Baixos, com o maior número de apreensões de heroína e de MDMA, a Colômbia, o

Brasil e a Venezuela, pela número de apreensões de cocaína e Marrocos, decorrente das apreensões

de cannabis resina.113

Em igual período, “as apreensões114 envolvendo quantidades significativas115 representaram 3%

do número total de apreensões de haxixe, 5% das de liamba, 7% das de heroína, 8% das de ecstasy e

24% das apreensões de cocaína. No entanto, em termos das quantidades apreendidas, estas

apreensões representaram 72% da liamba confiscada, 86% do ecstasy apreendido, e a quase totalidade

da heroína (91%), do haxixe (99%) e da cocaína (acima dos 99%) apreendidas.”116

Cerca de 5559 presumíveis infratores117 foram identificados pelas autoridades competentes,

sendo que foram condenados aproximadamente 1779 indivíduos.118

112 Serviço de Intervenção nos Comportamentos e nas Dependências (2014), Relatório Anual 2013 - A situação do país em matéria de drogas e

toxicodependências, Lisboa, pp. 80 e 89. Disponível em:

http://www.sicad.pt/BK/Publicacoes/Lists/SICAD_PUBLICACOES/Attachments/72/Relat%C3%B3rioAnual_2013_A_Situa%C3%A7%C3%A3o_do_Pa%C3%

ADs_em_mat%C3%A9ria_de_drogas_e_toxicodepend%C3%AAncias.pdf.

113 Idem, ibidem.

114 “Por apreensão entende-se a ação que é levada a cabo por órgãos com responsabilidades na prevenção e investigação criminal das atividades ilícitas

tipificadas no Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com exceção nas posteriormente tipificadas na Lei n.º 30/2000, de 29/11, em que é detetada qualquer

das substâncias compreendidas nas Tabelas anexas a este DL.”

SICAD (2014). Relatório Anual 2013 - A situação do país em matéria de drogas e toxicodependências, Lisboa, p. 187. Disponível em: http://www.sicad.pt.

115 “Por quantidade significativa entende-se no caso da heroína e cocaína as quantidades superiores a 100 g e no caso da cannabis as superiores a 1000 g,

de acordo com os critérios utilizados pela Organização das Nações Unidas. No caso do ecstasy e de acordo com o critério utilizado pela Polícia Judiciária,

foram consideradas como mais significativas, as apreensões envolvendo quantidades superiores a 250 comprimidos.”

Idem, ibidem, p. 188.

116 Idem, ibidem.

117 “Por presumível infrator entende-se o indivíduo que foi identificado ou detido por elementos das forças policiais por atividades ilícitas tipificadas no

Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com exceção das tipificadas na Lei n.º 30/2000, de 29/11.”

Idem, ibidem, p. 187.

118 “Por indivíduo condenado entende-se o indivíduo constante nos processos “findos”, julgado e com pena condenatória, por atividades ilícitas tipificadas

no Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com exceção nas posteriormente tipificadas na Lei n.º 30/2000, de 29/11.”

36

No que se refere “aos mercados de tráfico e de tráfico-consumo, os preços médios das drogas

confiscadas em 2013 não apresentaram alterações relevantes face a 2012, com exceção da heroína

que registou uma vez mais descida, representando o valor mais baixo desde 2002.”119

Faz-se em seguida o ponto de situação dos mercados nacionais do mercado ilícito das

principais drogas.

No que respeita ao mercado de heroína, em 2013 foram apreendidos 55 kg de heroína,

correspondente a 792 apreensões. No que se refere a outras substâncias opiáceas, em igual período,

foram apreendidas 21,55 kg de tebaína, 110 comprimidos de metadona, 106 comprimidos de

buprenorfina, 73,2 kg de codeína, 18,85 kg de de morfina, 6,55 kg de ópio e 16 plantas de ópio.

A Holanda é o principal país de origem da heroína apreendida em Portugal. As maiores

quantidades apreendidas foram transportadas por terra, seguido do transporte por via aérea.120

Em igual período, o número de presumíveis infratores por posse de heroína é de 314

indivíduos e por presumível posse de heroína e de outras substâncias é de 896 indivíduos.

Foram condenados121 por posse de heroína cerca de 183 indivíduos e por posse de heroína e outras

substâncias psicoativas cerca de 357 indivíduos. O valor médio de compra da grama de heroína é de €

25,64. Os preços médios referem-se somente ao mercado de tráfico e de tráfico consumo e são

determinados em conformidade com as declarações prestadas pelos arguidos detidos quanto ao valor

pago pela droga confiscada.

No que concerne ao mercado de cocaína, em 2013, o número de apreensões de cocaína foi de

1108, correpondente à quantidade de 2440 kg. Foram ainda apreendidas 4 g de crack e 173 g de

folhas de coca.

A Colômbia, o Brasil e a Venezuela são os principais países de origem da cocaína apreendida

em Portugal, apesar de uma quantidade considerável se destinar a outros países europeus.122 A cocaína

é transportada maioritariamente por mar e por via aérea.123

Em igual periodo, número de presumíveis infratores por posse de cocaína é de 591 indivíduos

e por presumível posse de cocaína e de outras substâncias é de 1035 indivíduos. Foram condenados124

Idem, ibidem, pp. 88, 142 e 187.

119 Idem, ibidem.

120 Idem, ibidem, p. 138.

121 “De acordo com o critério metodológico utilizado nos anos anteriores, foram consideradas as decisões judiciais datadas de 2012 e 2013 que deram

entrada no SICAD até 31/03/2014.”

Idem, ibidem, 139.

122 Idem, ibidem, 128.

123 Idem, ibidem.

124 “De acordo com o critério metodológico utilizado nos anos anteriores, foram consideradas as decisões judiciais datadas de 2012 e 2013 que deram

entrada no SICAD até 31/03/2014.”

37

por posse de cocaína cerca de 257 indivíduos e por posse de cocaína e de outros estufecientes cerca

de 352 indivíduos. O custo médio da grama da cocaína é de 47,00 €. Os preços médios referem-se

somente ao mercado de tráfico e de tráfico consumo e são determinados em conformidade com as

declarações prestadas pelos arguidos detidos quanto ao valor pago pela droga confiscada.

Relativamente ao mercado interno de cannabis resina e herbácea, em 2013, o número de

apreensões de haxixe foi de 3087, correspondente a 8689 kg, ao passo que o número de apreensões

de cannabis herbácea foi de 764, correspondente a 96 kg. Quanto à produção interna, foram

apreendidas 8462 plantas de cannabis, 2,58 kg de folhas, e cerca de 36 468 sementes.

No que se refere às rotas de tráfico internacional, Marrocos é o país responsável por grandes

quantidades de haxixe apreendidoa em solo português. Quanto às apreensões de cannabis herbácea,

não se conhece os países da sua proveniência. Quanto aos meios de transporte, o transporte marítimo

é o mais utilizado para a distribuição de haxixe e o transporte terrestre para a distribuição de cannabis

herbácea.125

Cerca das 3187 infrações referem-se à posse de cannabis mantendo-se o predomínio do

consumo da cannabis face às outras substâncias. “Uma vez mais, as situações relacionadas só com a

posse de cannabis surgiram com bastante mais importância relativa no grupo de presumíveis

traficantes-consumidores do que no de presumíveis traficantes.”126 Com base nas condenações

proferidas, “em 2013 foram condenados 860 indivíduos na posse apenas de cannabis, representando

49% do total daquelas condenações (...).”127 No que concerne à média dos preços de comercialização, a

grama de haxixe ronda os 2,90 €, ao passo que a grama da liamba ronda os 5,47 €. Os preços médios

referem-se somente ao mercado de tráfico e de tráfico consumo e são determinados em conformidade

com as declarações prestadas pelos arguidos detidos quanto ao valor pago pela droga confiscada.

Relativamente ao tráfico de MDMA, em 2013 foram registadas 80 apreensões de ecstasy,

correspondente à quantidade apreendida de “1239,4 g de ecstasy moído e 2160 comprimidos.”128

A Holanda é o país responsável pelo ecsatsy confiscado em solo português. A via postal é o

método de transporte mais utilizado para a distribuição do MDMA, seguido do transporte terrestre.

Usados.129

O número de presumíveis infratores por posse de ecstasy é de 8, ao passo que o número por

presumível posse desta substância e outros estupefacientes é de 135. As condenações130 por posse de

Idem, ibidem, p. 129.

125 Idem, ibidem.

126 Idem, ibidem, p.119.

127 Idem, ibidem.

128 Idem, ibidem, p. 146.

129 Idem, ibidem.

38

ecstasy recairam sobre 9 indivíduos e as condenações por posse desta droga e outras substâncias

recairam sobre 34 indivíduos.Em 2013, permanece a ausência de informação quanto ao custo médio

do ecstasy no mercado interno.

No que se refere ao tráfico de novas substâncias psicoativas do grupo das fenetilaminas, no

ano de 2013, foram apreendidas 670 g de efedrina, 8 g de metilfenidato, 4,39 kg de metanfetaminas e

“333 g, 17 comprimidos e 2 frascos” de anfetaminas. No que concerne ao grupo das triptaminas,

foram apreendidas cerca de “5 g e 5377 selos”131 de LSD, 256g de cogumelos mágicos e 9,26 Kg de

dimetiltriptamina (DMT). Em gual periodo e quanto às substâncias psicoativas sujeitas a receita

médica, “(...) foram apreendidas uma variedade de benzodiazepinas (1 g e 1581 comprimidos). Foram

também apreendidos 10,6 Kg de Barbital no distrito de Lisboa.” 132

Assim, constata-se das apreensões efetuadas que a cannabis ocupa uma posição de destaque

no mercado nacional de estupefaciente. Em segundo lugar, a cocaína é a substância estimulante mais

comercializada. Relativamente à heroína, em 2013 o mercado desta substância depressora, que teve o

seu auge no ano de 2009 e 2010, tem demonstrado um decréscimo, “reforçando assim a quebra

registada em 2011, (…) com alguns indicadores a registarem os valores mais elevados da década.”133

No que tange a outras substâncias, “apesar dos aumentos verificados nos últimos 3 anos em alguns

indicadores, continuam a apresentar valores relativos residuais.” 134

Considera-se que Portugal situa-se, de uma forma geral, nas tendências europeias de oferta de

drogas ilícitas.135

130 De acordo com o critério metodológico utilizado nos anos anteriores, foram consideradas as decisões judiciais datadas de 2012 e 2013 que deram

entrada no SICAD até 31/03/2014.

Idem, ibidem, p. 147.

131 Idem, ibidem.

132 Idem, ibidem, p. 155.

133 Idem, ibidem, 79. 134 Idem, ibidem, p. 80.

135 Idem, ibidem, p. 79.

39

CAPÍTULO IV – NARCOTRÁFICO EUROPEU

Neste capítulo dar-se a conhecer a dinâmica do narcotráfico na Europa, mais concretamente

os países de origem e de destino das drogas, os meios de transporte utilizados e a criminalidade

organizada envolvida, nomeadamente quanto aos novos modos de atuação, os métodos utilizados para

branquear o dinheiro proveniente do tráfico e o seu envolvimento outras atividades criminosas

transnacionais.

Seguidamente, alude-se ao tráfico das principais drogas e à identificação dos principais grupos

criminosos a operar em território europeu.

4.1 A compreensão do tráfico de droga na europa

O tráfico de droga é o comércio transfronteiriço de substâncias ilícitas. Este comércio ilícito é

prosseguido por associações criminosas e desenvolve-se ao longo de diversas regiões do mundo. “O

tráfico de droga é, atualmente, a atividade mais importante do crime organizado, desenhando-se como

um crime internacional, um crime contra a humanidade.”136

Os grupos criminosos são cada vez mais sofisticados tanto na sua organização como no seu

modus operandi. A ligação dos locais de produção aos locais de consumo baseia-se numa atividade

geoestratégica complexa pela utilização de diversas rotas de tráfico e do controlo exercido nas

mesmas.

Estes grupos que são em simultâneo transnacionais e locais e têm criado alianças com outros

grupos criminosos para expandirem a sua área de atuação por mais regiões do globo e controlarem o

mercado.

A grande dificuldade dos traficantes é o transporte da droga para os países de destino. Pelo

que se servem da criação de sociedades comerciais de fachada para encobrir a verdadeira atividade e

da utilização de múltiplos métodos comerciais legítimos como os serviços postais, o avião, os barcos

de transporte de contentores de expedição de todo o tipo de produtos, as aeronaves, as lanchas

136 Rocha, João Luís de Moraes (1994). Droga – Regime Jurídico, Legislação Nacional – anotada, Diplomas Internacionais. Lisboa: Livraria Petrony, Lda., p.

61.

40

marítimas e os correios de droga137, para poderem transportar e distruir a droga pelos diversos locais

onde vai ser vendida.138

A utilização da violência, nomeadamente de atentados contra a vida, para proteger a

comercialização de drogas e, consequentemente, aumentar o poder financeiro e a influência no meio,

bem como para afastar, deste modo, grupos criminosos concorrentes, é uma prática frequentemente

utilizada pelos agentes envolvidos.

O mercado caracteriza-se pelo tráfico de vários tipo de droga em simultâneo a cargo de

diversas associações criminosas que operam através de várias rotas. “Atualmente existem mais de 3

600 organizações criminais internacionais a operar na União Europeia e 70% são compostas por

membros de diferentes nacionalidades.”139 Os negócios de troca de drogas é outra tendência do tráfico

de drogas, pois os grupos criminosos turcos permutam drogas sintéticas por heroína, ecstasy e cocaína

com os grupos criminosos latino americanos.140

Por forma a melhor se conhecer a dinâmica de atuação das redes criminosas a operar na

Europa, passa-se, de seguida, a mencionar o tráfico ilícito dos principais tipos de drogas.

Para a introdução da heroína no continente europeu são utilizadas quatro rotas de tráfico. “As

duas mais importantes são a «rota dos Balcãs» e a «rota meridional». Uma destas rotas atravessa a

Turquia até aos países balcânicos (Bulgária, Roménia ou Albânia) e prossegue para a Europa Central,

Meridional e Ocidental.” O trânsito pela África Austral começa a ser outra opção para o transporte

desta droga para os vários países e locais de destino. 141

A heroína é transportada pela via aérea e por mar, ”quer diretamente, quer depois de

transitarem por países da África Ocidental, Austral e Oriental. A rota da África Austral parece ter

adquirido importância nos últimos anos.”142

Esta droga é importada do Sul e do Sudoeste Asiático, principalmente do Afeganistão, por

grupos criminosos turcos que, devido à localização da Turquia, têm um papel primordial na importação

e distribuição pelos países europeus.

Os grupos criminosos iranianos operam como intermediários entre os grupos criminosos

afegãos e os turcos que, juntamente com as redes criminosas belgas, francesas, alemãs, holandesas,

137 Os correios de droga, vulgo mulas, “trara-se habitaulamente de pessoas desinseridas social e economicamente, que a troco de alguns proventos

razoáveis, transportam e passam a droga, através das fronteiras, arriscando pesadas penas de prisão, nalguns países mesmo a pena de morte.” Lobo,

Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 55.

138 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 33. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

139http://www.europarl.europa.eu/news/pt/topstories/content/20131016TST22386/html/Criminalidade-organizada-corrup%C3%A7%C3%A3o-e-

branqueamento-de-capitais

140 Idem, ibidem.

141 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 33. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

142 Idem, ibidem.

41

inglesas e dos países balcãnicos, operam em cooperação no empacotamento da heroína e na sua

redistribuição pelos vários países europeus. As redes de tráfico do oeste africano também são

responsáveis pela entrada de heroína no norte ocidental da Europa, cuja distribuição está a cargo,

principalmente, de grupos criminosos turcos e albaneses.

Os grupos criminosos turcos e paquistaneses operam à retarguarda de sociedades

legitimamente constituídas para encobrir o transporte de elevadas quantidades de heroína e lavagem

de dinheiro. Esta droga é também transportada por correios humanos com destino aos mercados do

Reino Unido, de Espanha ou da Alemanha.

O tráfico do precursor químico anidrido acético está a cargo das mesmas redes criminosas

responsáveis pelo tráfico de heroína.143

A entrada da cocaína na Europa realiza-se principalmente pelos países da Europa ocidental e

meridional. Contudo, “há indícios de que as rotas de tráfico com destino à Europa se estão a

diversificar, tendo sido recentemente notificadas apreensões de droga em portos do Mediterrâneo

Oriental, do Báltico e do Mar Negro.144

O tráfico de cocaína na Europa está a cargo de várias organizações criminosas pertencentes a

redes extra Europa, não obstante começarem a surgir redes dos balcãs ocidentais e italianos a operar

na América do Sul e na África.145

As associações criminosas colombianas e mexicanas continuam a ser dos maiores

fornecedores da cocaína, cujos elementos se desfragmentam por diversos locais operacionais sitos em

diversos países da américa latina. Estes grupos também criam alianças com diversos grupos

organizados europeus responsáveis pela distribuição da droga pelos Estados Membros. É o caso dos

grupos criminosos espanhóis e italianos mas também com os grupos criminosos dos balcãs.

Os grupos criminosos sérvios, montenegrinos e croátas através de sociedades comerciais

legítimas estabelecem relações dissimuladas de fornecimento de cocaína com os fornecedores da

América Latina, tendo assim uma posição ativa no mercado ilícito europeu.

As organizações criminosas utilizam os contentores de transporte e correios humanos para

transportarem a cocaína e utilizam empresas de distribuição de alimentos na Europa para mais

facilmente introduzirem a cocaína advinda da América do Sul, sendo eles próprios proprietários ou

corrompendo os funcionários.

Quanto ao tráfico de cannabis, esta droga é produzida em cerca de 176 países, sendo que 54%

é produzida no Continente Americano, 26% em África, sendo Marrocos o principal produtor, 15% na

143 Idem, ibidem.

144 Idem, ibidem, p. 26.

145 Idem, ibidem.

42

Ásia, 4% na Europa e 1% na Oceânia.146 Todavia, o tráfico de cannabis a nível transnacional tem

diminuído devido ao fenómeno crescente da autossuficiência interna147 decorrente da produção nacional

desta planta. Paralelamente, são vários os grupos criminosos na Europa que tentam encabeçar o maior

mercado desta droga.

A nível europeu, a Holanda é o país que mais produz a planta cannabis148. As organizações

criminosas tem alargado a produção desta droga para Bélgica e para a Alemanha e fazem parcerias

com produtores e traficantes individuais e locais para controlar o mercado. As organizações criminosas

holandesas são ainda responsáveis pela distribuição da cannabis e de outras drogas, como os

derivados desta planta e drogas sintéticas, pelos diversos países da Europa.

Os grupos criminosos vietnamitas são responsáveis por um sistema de franquia pelos cultivos

com elevada dimensão realizados em locais fechados e sitos em diversos países europeus, como a

Bélgica, a Alemanha, a Irlanda, a República Checa, a França, a Hungria, a Polónia, a Eslováquia e o

Reino Unido.149

O cultivo e a distribuição ilícitas de cannabis no Reino Unido e na Irlanda é, maioritariamente,

levados a cabo por cidadãos chineses. Os grupos criminosos dos Balcãs ocidentais, principalmente da

Albânia, são responsáveis pela produção de cannabis feita na Albânia e no Kosovo que depois é

distribuída para países como a Itália e a Grécia.

Tradicionalmente, o Afeganistão é referenciado como produtor em grande escala da resina de

cannabis, pelo que, a par de Marrocos, é responsável pela entrada desta droga na Europa. A

cooperação de grupos criminosos afegãos com grupos criminosos turcos e albaneses no tráfico de

resina de cannabis é facilitada pela ligação antiga ao tráfico de heroína. Os grupos criminosos

marroquinos operam no tráfico de resina de cannabis através de parcerias com grupos criminosos

espanhóis, holandeses e britânicos que controlam as zonas de entrada na Europa, como Portugal e

Espanha, e a sua distribuição pelo Noroeste da Europa.

O transporte da droga é feita através de lanchas rápidas e por contentores de transporte de

mercadorias. O transporte de cannabis resina também é feito por pessoas, vulgo correio humano ou

146 http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/organized-crime-and-human-trafficking/drug-control/ic/index_en.htm.

147 A produção de cannabis pode ser feita no exterior, o que requer terrenos com alguma dimensão, ou no interior, requerendo no local da plantação

quantidades elevadas de luz. Acresce que, para a rentabilidade da colheita são necessários diversos produtos químicos, assim como equipamento

industrial que auxilie o cultivo interno desta planta.

148 Os grupos criminosos, para rentabilizar ao máximo a produção e a colheita, adotam estratégicas que vão desde parcerias com agricultores, proprietários

de terrenos agrícolas, com empresas que se dedicam ao fornecimento de químicos e de equipamentos industriais, com proprietários de imóveis, assim

como utilizam equipamento informático que lhes permite controlar à distância o cultivo

149 http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/organized-crime-and-human-trafficking/drug-control/ic/index_en.htm.

43

mulas, que se fazem transportar em aviões. Estas pessoas engolem a droga, em formato de bolotas,

que depois as expelem no país de destino, principalmente em países do norte da Europa.

Por último, quanto às drogas sintéticas, a Europa é o continente onde se produz elevadas

quantidades destas substâncias150, cuja importação de precursores para a sua confeção é feita da

China e da Índia.

A maior produção de anfetamínas encontra-se na República Checa, na Eslováquia, nos Países

Baixos e na Bélgica.Os principais países produtores de ecstasy são a Holanda e a Bélgica, sendo que

os países limítrofes como a Polónia, a Estónia e a Lituânia são produtores desta droga em menor

escala. Os grupos criminosos búlgaros são os maiores responsáveis pela comercialização desta

substância e do seu tráfico para o Médio Oriente, subsequentemente aparecem alguns países do

Nordeste da Europa, principalmente na Polónia, seguida da Lituânia, da Estónia, da Letónia, Finlândia

e da Suécia.

As associações criminosas chinesas a operar nos países baixos, assim como as associações

criminosas marroquinas, são responsáveis pela distribuição destas substâncias para diversos países da

Europa, onde igualmente estão localizados nichos destes grupos asiáticos.

A necessidade de utilização em grande escala de quimícos precursores para a produção de

drogas sintéticas estreita a cooperação entre as redes criminosas chinesas, russas, latino-americanas e

europeias, principalmente holandeses, na distribuição destes quimícos para a europa e a exportação

do produto final para os países terceiros. Estas alianças permite o controlo do fluxo comercial ilícito das

drogas pela aquisição dos precursores e da distribuição do produto final por estas redes criminosas.151

A cooperação destas associações criminosas exterioriza-se na divisão de tarefas, tanto no fluxo

comercial dos precursores, como na aquisição de material laboratorial e na montagem de laboratórios

ambulantes, mas também na angariação e troca de especialistas químicos. Este dinamismo de

mercado exige um reforço de atuações sob empresas legítimas ligadas a produtos químicos, o que

implica que o tráfico de substâncias sintéticas acompanha de perto o fluxo comercial legal, pela

aquisição livre de químicos e equipamentos necessários. Acresce que os grupos organizados dão

preferência à aquisição de precursores, pré precursores e demais substâncias químicas que não sejam

controlados a nível internacional e interno.

150 O tráfico de drogas sintéticas é uma atividade que permite assacar elevados lucros devido à possibilidade da produção destas drogas ser feita em

qualquer local e com custos diminutos. Acresce que, para além do lucro advindo da comercialização das substâncias, o tráfico de drogas sintéticas cria

lucros pela comercialização dos precursores necessários à sua produção. Com esta dinâmica de mercado, são muitas as parcerias estabelecidas entres os

diversos grupos criminosos, assim como as estratégias adotadas que se concretizam na utilização de meios e negócios legais que lhes permite assacar o

lucro esperado.

151 EUROPOL (2013). Eu Drug Markets Report. A Strategic Analysis, Luxembourg, pp. 76 e 77. Disponível em: https://www.europol.europa.eu.

44

A rota dos balcãs está a ser cada vez mais utilizada no tráfico de drogas sintéticas produzidas

na Europa, decorrente da procura elevada destas substâncias no médio oriente, assim como a

utilização das vias aéreas e o recrutamento de cidadãos dos Estados Membros para transportarem

estas drogas, produzidas no oeste africano, para os mercados asiáticos, mais concretamente para o

Japão.

4.2 Branqueamento de capitais

O tráfico de drogas existe por duas razões fundamentais. A primeira, pela elevada procura de

droga para consumo e a segunda porque é uma atividade que proporciona avultados lucros

monetários. Estas elevadas quantias de dinheiro necessitam de ser resguardadas, ou melhor, a

proveniência das mesmas necessita de ser encoberta. Daí que os traficantes, que querem continuar a

traficar e a enriquecer com essa atividade, procurem dissimular o dinheiro através de diversos

mecanismos legais.

O branqueamento de capitais é o procedimento através do qual se procura limpar os proventos

adquiridos através de atividades ilícitas que se pretendem encobrir. A limpeza do dinheiro implica a

realização de diversos atos que têm em comum o facto de necessariamente terem que ser praticados

em três etapas. “Num primeiro momento, designado por colocação (placement stage), procura-se

colocar os capitais ilícitos no sistema financeiro ou noutras actividades; para, numa segunda fase,

chamada de transformação (layering stage), realizar as operações necessárias a ocultar essa

proveniência criminosa; e num terceiro momento, o da integração (integration stage), introduzir os

capitais no circuito económico.”152

Assim, o branqueamento de capitais levado a cabo por organizações internacionais implicadas

no tráfico de droga concretiza-se pelos seguintes atos: “injetar o dinheiro líquido, (…), nos setores que

manipulam os capitais, recorrendo: a centenas de “pequenos” depósitos; ao comércio de metais

preciosos; a investimentos em bares, casinos, hipermercados, carros, imóveis, aviões; sociedades

fictícias criam falsas faturas, reembolsam empréstimos, efetuam transações fictícias. Todas estas

manipulações são feitas com um grande número de intermediários para evitar aos investigadores

encontrar a proveniência do dinheiro (e) multiplicar às centenas as operações para “limpar a nódoa”: a

conversão das notas em “travel cheques”; compra de ações, títulos, obrigações; transferência de

fundos internacionais para os países que têm uma legislação permissiva: falsos orçamentos e falsas

152 Brandão, Nuno (2002). Branqueamento de capitais: o sistema comunitário de prevenção. Coimbra: Coimbra Editora, p. 15.

45

transações são entregues – chaves na mão – a sociedade fictícias. Cada operação é conduzida por

“homens de confiança” que recebem uma comissão de serviço.”153

Os traficantes servem-se de sociedades legalmente constituídas para que nelas façam render

os lucros desviados e não declarados. O esquema mais comummente utilizado e já referido é a

utilização do sistema bancário para fazerem dissipar os proventos dos negócios, em nome da reserva

da vida privada.

São vários os países que têm mecanismos legais que protegem a identidade dos titulares dos

fundos monetários ou que dispõem de um setor bancário permissivo no que toca à diminuta deteção

da proveniência criminosa das quantias introduzidas, pela tutela prevalente que dão ao segredo

bancário.154 Apesar de não taxativa, alguns “investigadores, enunciam listas que, (…), são bem

representativas dos paraísos fiscais do trafico da droga, graças à cumplicidade dos banqueiros. Só na

Europa existem, pelo menos, uma boa dezena deles, desde a Suíça, Luxemburgo, Liechenstein, ilhas

de Man, Jersey e Guernesey até ao Mónaco, Andorra, Gibraltar e Vaticano. Também as Américas não

ficam atrás com as Bermudas, as Baamas, as ilhas Caimão, a Jamaica, Panamá, Belize, Antilhas

Holandesas, ilhas Turcas e Caicos, São Bartolomeu, Antígua e Barbuda. Na Ásia encontram-se centros

financeiros como Hong-Kong, Macau, Taiwan, Singapura, Vanuatu, Nauru e Tonga. De notar que, à

exceção da Suíça e alguns poucos países, todos os paraísos fiscais são criações artificiais, cuja

independência e autonomia são puramente fictícias.”155

A lavagem do dinheiro é um mecanismo que está contra a proteção da sociedade e da

segurança e está ao dispor dos traficantes, beneficiando-os e incentivando-os a na prossecução do

lucro que o tráfico de drogas visa obter, pois “permite à criminalidade organizada usufruir dos

rendimentos provenientes da sua actividade ilícita, mostrando que afinal o crime compensa. O

branquamento de capitais está ligada, portanto, à ““corrupção” e potencia-a, minando as estruturas

sociais, corroendo os pilares do sistema democrático e impedindo o desenvolvimento económico-

social.”156

153 Andrade, Maria Isabel (1994). A face oculta das drogas. Porto: Porto Editora, p. 71.

154 “A impunidade de que beneficiam os traficantes assenta em disposições legais que garantem o anonimato total dos detentores do capital de sociedades

(tal como acontece com os “trusts” no regime anglo-saxão) e a protecção rigorosa do segredo bancário. Além disso, os paraísos fiscais são, antes de tudo,

um espaço para a dissimulação dos lucros das empresas ou dos particulares. O dinheiro “negro”, extraído de atividades criminosas, confunde-se com o

dinheiro “cinzento”, simplesmente ilegal.” Andrade, Maria Isabel (1994). A face oculta das drogas. Porto: Porto Editora, p. 71.

155 Idem, ibidem.

156 Brandão, Nuno (2002). Branqueamento de capitais: o sistema comunitário de prevenção. Coimbra: Coimbra Editora, p. 23.

46

Considera-se, assim que, “o branqueamento de capitais é como que o lado negro do processo

de globalização, da liberalização, da liberalização das trocas comerciais e dos movimentos de capitais,

da abertura dos mercados financeiros, da maciça informatização e do comércio electrónico.”157

4.3 Dos conflitos regionais ao terrorismo

Na década de noventa até a esta parte, que os proventos adquiridos com o tráfico de droga

serve para financiar outros propósitos criminais, como por exemplo os conflitos regionais. “Do Peru

(com Sendero Luminoso) ao Líbano, passando pela Birmânia e a Colômbia, a droga ou o dinheiro daí

retirado são utilizados pelas diferentes forças opostas. No Líbano, por exemplo, todas as milícias são

financiadas com o dinheiro da droga. Na Birmânia, os Shan (…) controlam cerca de 50 fábricas de

heroína.”158

Na mesma senda, as organizações terroristas necessitam de fundos que lhes permita praticar

os seus atos terroristas, maioritariamnete, por diversos países. A aquisição de verbas que permite a

prática dos mais diversos atos criminosos é efetuada tanto pela via legal, com a prossecução de

negócios ou doações efetuadas por simpatizantes ou seguidores, como pela via ilícita, pelo tráfico nas

suas diversas dimensões, como o narcotráfico, muitas vezes logrado através da internet.159

Exemplos demonstrativos foram os ataques bombista ocorridos em Madrid, no ano de 2004,

cujas bombas utilizadas foram obtidas pela troca de grandes quantidades de haxixe. A célula terrorista

que cometeu o atentado era composta por um traficante que se radicalizou ao islão, enquanto estava a

cumprir pena de prisão em Marrocos, cujo dinheiro servia para financiar este grupo espanhol. Ou ainda

a investigação, levada a cabo em 2007, de uma célula sita em Itália que tinha ligações ao Médio

Oriente e ao Leste da Europa e que financiava a sua atividade pelo tráfico de imigrantes ilegais e do

narcotráfico.

O controlo das rotas de tráfico por grupos extremistas é outra forma de financiar a sua

atividade. Estas células terroristas cobram taxas pela passagem dos traficantes em determinados

locais, assim como pela proteção concedida ao longo da rota.

É o caso de filiados ao grupo Islâmico do Magrebre da Al Qaeda que, para além do dinheiro

obtido pela cobrança de taxas, fornecem proteção aos traficantes e aos carregamentos de droga no

percorrer dos pontos de trânsito a troco de dinheiro. Este grupo criminoso tem estreitado relações com

157 Idem, ibidem, p. 16.

158 Andrade, Maria Isabel (1994). A face oculta das drogas. Porto: Porto Editora, p. 72.

159 EUROPOL (2013). Eu Drug Markets Report - A Strategic Analysis, Luxembourg, p. 120. Disponível em: https://www.europol.europa.eu.

47

grupos criminosos latino-americano no tráfico de drogas, principalmente de cannabis herbácea e de

cocaína.

As Forças Armadas Revolucionárias da Colombia (FARC), assim como os Talibãs angariam

financiamento pelo tráfico de heroína e de cocaína na Europa. Nas regiões do afeganistão e do

paquistão, os talibãs estão envolvidas em processos de cultivo, de transformação e colocação no

comércio ilícito de vários estupefacientes, cobrando taxas aos produtores e traficantes de cocaína e de

ópio, para que possam controlar o mercado. Estima-se que, no ano de 2009, os lucros com o

narcotráfico dos talibãs ascendeu a mais de 155 milhões de dólares.

Os grupos criminosos da Somália e o grupo terrorista Al-Shabaab são responsáveis pelo tráfico

de cetamina na Europa, cuja aquisição e distribuição é facilitada pelo não controlo internacional desta

substância e pela sua livre comercialização na África Oriental e em vários países europeus.

Apesar da disseminação dos traficantes por todas as regiões do mundo, o mercado europeu de

drogas é dos mercados globais mais lucrativos, o que atrai todo o tipo de traficantes e de grupos

organizados de criminalidade violenta.160

160 Idem, ibidem, p. 121.

49

CAPÍTULO V – NARCOTRÁFICO VIRTUAL

No presente capítulo dár-se-á a conhecer os “novos” modos de execução do tráfico de droga,

pelo recurso aos sistemas de informação e comunicação, mais concretamente a mecanismos

informáticos que permitem a ocultação da identidade do usuário e das transações, tal como os

criptomercados e as criptomoedas.

5.1 As novas tendências (virtuais) no tráfico de droga

A ligação entre o uso da internet, enquanto sistema de troca de comunicações e de

informação, e o comércio de substâncias ilícitas não é recente161. “(…) Markoff revealed that the world’s

first online transaction was a drug deal: ‘In 1971 or 1972, Stanford students using Arpanet accounts at

SAIL engaged in a commercial transaction with their counterparts at MIT. Before Amazon, before eBay,

the seminal act of ecommerce was a drug deal. The students used the network to quietly arrange the

sale of an undetermined amount of marijuana.”162 Porém, atos individuais, ainda que praticados

frequentemente e em quantidade, serão sempre distintos de um tráfego sistemático e organizado.

O crime cibernético pode ser definido como o conjunto de atos praticados na internet, através

do uso de comunicações eletrónicas e sistemas de informação, com uma qualquer finalidade ilícita.

“Although there is no single universal definition of cybercrime, law enforcement generally makes a

distinction between two main types of Internet-related crime:

Advanced cybercrime (or high-tech crime) – sophisticated attacks against computer hardware and

software;

Cyber-enabled crime – many ‘traditional’ crimes have taken a new turn with the advent of the Internet,

such as crimes against children, financial crimes and even terrorism.”163

161 Como sabemos, a própria existência da internet reduz-se a umas meras décadas, pelo que qualquer referência temporal deve ser interpretada dentro de

tal escala.

162 Power, Mike (2013). Drugs 2.0 – The Web revolution that´s changing how the world gets high. London: Portobello Books, cap. The Birth of an Online

Drugs Culture.

163 http://www.interpol.int/Crime-areas/Cybercrime/Cybercrime.

50

A utilização da internet tem vindo a facilitar a prática de uma abrangente variedade de

atividades criminosas organizadas, fornecendo a tais redes capacidades acrescidas de comunicação,

busca, logística, publicidade, recrutamento, distribuição, financiamneto e pagamento.164

Os sistemas de comunicação e informação virtuais facilitam e transfiguram a prática de uma

panóplia de ilícitos criminais. Desde logo, a criminalidade localizada dá lugar a uma criminalidade

transnacional, em que o ato praticado num certo local, através de um computador com ligação a

qualquer parte do mundo, tem repercussões em locais geograficamente distintos e distantes entre si.

Em segundo lugar, permitem o estabelecimento de comunicações simétricas e assimétricas, isto é,

permitem que uma única pessoa contacte com facilidade a multidão, ou por ela seja contactada, em

simultâneo.

Mas mais: o controlo dos comportamentos dos usuários pelos usuários é outra das

possibilidades dos sistemas de informação virtuais, permitindo uma espécie de panopticismo165 – em

que a multidão de usuários não sabe quando e como está a ser vigiada – bem como o sinopticismo –

em que a multidão vigia uma minoria. A vantagem daí resultante é a formatação dos comportamentos

dos usuários, que não sabem quando estão a ser vigiados. Na sequência, todas as transações na

internet deixam um “rasto informático” inapagável que, com os recursos adequados, pode ser sempre

reconstruído. Ou seja, aumentando as capacidades de vigilância oferecidas pela internet.

Exponenciando ainda tais capacidades, há que mencionar a existência e a utilização, cada vez mais

sistemática e global, das chamadas redes sociais.

Por fim, o desenvolvimento da eletrónica faz com que os preços e as capacidades destas

tecnologias estejam ao alcance de quase todos.

Tudo isto permite que novas gerações de criminosos consigam construir e gerir, com imensa

facilidade, uma rede, de dimensão global, não apenas de tráfego de drogas, mas interligada com

branqueamento de capitais e controlo de informação. 166

Os últimos anos vieram apenas alargar todas estas tendências. As tecnologias Web 2.0

ampliam a democratização da informação e do conhecimento pelo fenómeno dos mídias sociais e da

diversidade de suportes de comunicação. Os smartphones ou os tablets e a diversidade de redes

sociais, como o facebook - redes estáticas e permanentes – ou como o skype - redes dinâmicas e

164 Europol (2013). Eu Drug Markets Report. A Strategic Analysis, Luxembourg, p. 118. Disponível em: https://www.europol.europa.eu.

165 Teoria social desenvolvida pelo filósofo Michel Foucault e aplicada à construção de estabelecimentos prisionais por Jeremy Benthan, que sugeriu um

edifício circular com uma torre de observação no centro. 166 Caneppele, Stefano & Calderoni, Francesco (2014). Organized Crime, Corruption and Crime Prevention, Essays in Honor of Ernesto U. Savona. London:

Springer, pp. 228 e 229.

51

temporárias – são a mais recente concepção das redes sociais virtuais, substituindo as antigas redes

sociais online.

O mais recente desenvolvimento relacionado com o tráfico de drogas foi o aparecimento e a

divulgação mundial das chamadas aplicações infomáticas (apps) para smartphones que vêm

deslocalizar e desmaterializar em absoluto a atividade criminosa. A “(...) oferta e a partilha de drogas,

ou de experiências de consumo de drogas, através das redes sociais, incluindo as aplicações usadas

em telemóveis, um domínio ainda pouco conhecido e difícil de monitorizar.”167

Verifica-se, portanto, que hoje o criminoso nem sequer necessita de possuir um computador

num local fixo, outrossim podendo transportar no seu bolso a capacidade eletrónica suficiente para

construir e gerir uma rede global. A título meramente exemplificativo, mencione-se a existência de uma

app chamada “How to sell weed”, que fornece todas as informações necessárias à produção e

comercialização da droga. Já a “Leafy App” providencia um catálogo interativo das diferentes espécies

de cannabis, respetivas características e disponibilidade, incluindo a possibilidade de pesquisar a

localização do fornecedor mais próximo com base no sistema Global Position System (GPS). Ou seja,

significa isto que os criminosos utilizam satélites para vender droga!168

As crescentes comunidades e serviços virtuais acarretam uma participação maior dos

utilizadores e linhas de comunicação multidimensionais. A disponibilização de conteúdos para toda a

comunidade virtual tem a virtualidade de criar à posteriori relações com determinados usuários. É o

caso de redes de promoção de encontros sexuais em que se verifica a prática de sexo sob o efeito de

várias drogas, vulgo chem sex.169

O mercado da droga prosseguido na internet tem um elevado nível de anonimato pelo que é

uma prática em franco crescimento no século XXI, pois o anonimato das comunicações é vantajoso

tanto para os traficantes, visto que torna mais difícil a sua detenção, como para os consumidores, que

evitam estar expostos ao mercado de rua de tráfico de droga. Os “(...) denominados «mercados

cinzentos» (são) sítios em linha que vendem novas substâncias psicoativas e que operam tanto à

superfície da web como na web oculta, uma parte da Internet que não está acessível através dos

motores de busca normais e onde as vendas de droga podem ser realizadas em mercados, em redes

descentralizadas e entre indivíduos.”170

167 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas. Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 34 Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

168 EMCDDA (2015). The Internet and drug markets, Summary of results from an Trendspotter study, Lisboa, p. 3. Disponível em:

http://www.emcdda.europa.eu/publications/technical-reports/internet-drug-markets.

169 Idem, ibidem, p. 3.

170 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre DrogaS - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 34. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

52

Estes criptomercados somente são alcançáveis atráves de software de encriptação e

disponibilizam aos usuários vendedores e compradores estruturas para que possam negociar os mais

variados bens e serviços e fóruns de discussão e debate, inclusive de classificação da qualidade dos

intervenientes das transações.

As transações são pagas através de diversos métodos de pagamento não detectáveis e as

quantidades, apesar de ser destinarem ao comércio retalhista, são diminutas171 e transportadas dos

canais postais oficiais. É exemplo o paypal, os cartões de pagamento pré-pagos e as criptomoedas ou

moedas digitais.172 Por esta via se destinam aos mercados de todas as regiões do mundo, drogas

controladas, fármacos sujeitos a receita médica e as novas substâncias psicoativas. Note-se que, o

consumo das novas substâncias psicoativas é feito por dosagens pequenas uma vez que, com a

alteração molecular, pretende-se, por um lado, fzer uma nova droga que caia fora do âmbito do

controlo das normas proibicionistas e, por outro lado, o aumento da sua psicoatividade.

Assim, “o crescimento dos mercados de droga em linha e virtuais representa um grande

desafio para as forças da lei e para as políticas de controlo da droga. O facto de fabricantes,

fornecedores, retalhistas, serviços de alojamento de sítios Internet e serviços de processamento de

pagamentos poderem estar todos sedeados em países diferentes torna o controlo dos mercados de

droga em linha particularmente difícil.”173

5.2 Os Criptomercados

A Internet é um mercado global e as lojas em linha que vendem novas substâncias parecem

ser originárias de um grande número de países.174

A distribuição de droga na internet pode ser efetuada em lojas virtuais localizadas na internet

superficial ou na internet escura - darknet. Neste contexto, esta expressão designa redes informáticas

especialmente construídas para garantir o anonimato dos seus usuários. Ao contrário da deep web,

estas redes não existem na world wide web (www.). Exigem que o usuário instale software específico

para conseguir aceder-lhes. A sua principal vantagem é a extraordinária dificuldade em determinar a

171 Note-se que, no que se referes às novas substâncias psicoativas o consumo das mesmas é feito por dosagens pequenas uma vez que, com a alteração

molecular, pretende-se, por um lado, fzer uma nova droga que caia fora do âmbito do controlo das normas proibicionistas e, por outro lado, o aumento da

sua psicoatividade.

172 “Criptomoedas, como a Bitcoin, são utilizadas para facilitar a realização de transações anónimas e o transporte das drogas é efetuado em pequenas

quantidades e em embalagens discretas através dos canais comerciais convencionais. Segundo os relatórios, de entre todos os produtos publicitados nos

criptomercados, os mais disponíveis são as drogas ilícitas tradicionais e os medicamentos sujeitos a receita médica. Os dados sugerem que muitas drogas

ilícitas compradas na web oculta se destinam a revenda.” Ide, ibidem.

173 Idem, ibidem.

174 OEDT (2012). Relatório anual. A evolução do fenómeno da droga na Europa Luxemburgo, p.103. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

53

localização exata, no mundo real, dos servidores que suportam a darknet, bem como em identificar os

endereços de IP dos respetivos usuários.175 Como resulta óbvio, estas são vantagens para os criminosos

e tremendas desvantagens para as polícias e os tribunais.

O serviço virtual anónimo Tor (The Onion Router) esconde o endereço de IP quando o respetivo

computador envia um pedido de acesso a um sítio. Tendo sido desenvolvido em colaboração com os

serviços militares norte americanos, o TOR é um software de encriptação gratuito. Oferecendo muitas

vantagens sociais, na medida em que se torna mais difícil reconduzir a atividade da internet ao

respetivo usuário, tem também inerente a desvantagem de poder ser utilizado pelos criminosos

precisamente com o mesmo objetivo – o de ocultar as suas práticas da investigação policial. 176

Através da utilização da ferramenta virtual Tor são estabelecidos inúmeros mercados ilícitos,

denominados criptomercados. É necessário o Tor para poder aceder aos criptomercados que estão

localizados na internet escura. Um criptomercado pode ser definido como um forum online onde bens

e serviços são transacionados entre partes que utilizam a encriptação digital para ocultarem as suas

identidades reais. Embora não existam exclusiva ou necessariamente para a prática de crimes, são

propícios a uma tal utilização. 177

As lojas virtuais de venda de substâncias psicoativas adotam técnicas de marketing e

“manobras de diversão” para lograrem de forma mais acautelada a venda das várias substâncias. Ou

seja, aproveitando a existência simultânea de um surface web e de uma dark web, vários sítios

apresentam conexões ou duplicações entre as duas redes, apresentando designs e ou endereços de IP

total ou parcialmente idênticos. Este carácter híbrido estende-se aos próprios produtos, abrangendo

pesquisa e comercialização de novas substâncias psicoativas. Esta duplicação da presença eletrónica

facilita a pesquisa e o acesso de eventuais clientes e faz aumentar significativamente as vendas. Dados

recentes indicam que cerca de 18% das lojas adotam já esta técnica híbrida.178

5.2.1 O caso Silkroad

O sítio virtual Silkroad179 era uma plataforma virtual lançada em fevereiro de 2011, tendo sido

considerada o maior criptomercado, dentre os mais de 20 que se verificou existirem na deepweb. Tal

175 Europol (2013). Eu Drug Markets Report - A Strategic Analysis, Luxembourg, p. 118. Disponível em: https://www.europol.europa.eu.

176 EMCDDA (2015). The Internet and drug markets, Summary of results from an Trendspotter study, Lisbon, p. 11. Disponível em:

http://www.emcdda.europa.eu/publications/technical-reports/internet-drug-markets.

177 Idem, ibidem.

178 Idem, ibidem, p. 4.

179 Este sítio virtual de comercialização de drogas foi fechado em Outubro de 2013 pelo FBI (Federeal Bureau of Investigation), tendo sido preso o seu

fundador, Ross William Ulbricht. https://en.wikipedia.org/wiki/Silk_Road_(marketplace).

54

como o ebay, promove a venda de diversas drogas mas que, ao contrário de pontos de venda online,

prima pelo anonimato dos usuários. Caracteriza-se por oferecer todas as funcionalidades de um sítio

destinado a transações eletrónicas, nomeadamente, mecanismos profissionais de resolução de litígios

entre comprador e vendedor, estabelecimento de ratings de vendedores e compradores, inclusão de

fóruns de discussão, que possibilitam a análise de produtos, etc. Embora fossem anunciados e

comercializados todo o tipo de produtos, as drogas controladas e medicamentos sujeitos a receita

médica eram, reputadamente, os mais transacionados.180

A maioria das transações efetuadas no Silkroad eram do tipo business to business – ou seja,

utilizando a terminologia jurídica tradicional, venda por grosso! – oferecendo este sítio virtual

promoções em consonância com a quantidade comprada. Era um sítio que se destinava

essencialmente, portanto, a traficantes e não tanto a consumidores.

Esta loja virtual funcionava com base na criptografia fornecida pelo servidor Tor e ainda

recorrendo à utilização de moedas virtuais, como a bitcoin. Esta dupla estratégia garantia o anonimato

de vendedores e compradores em absoluto, bem como a segurança comercial das transações, na

medida em que o comprador não pagava diretamente ao vendedor: os pagamentos eram depositados

no sítio, que só os transferia para o vendedor quando este acusasse a receção das mercadorias. 181

Este sítio e os demais criptomercados existentes trazem consigo um novo paradigma no modo

de atuar do tráfico de droga. Providenciam aos traficantes quatro enormes vantagens: primeiro, acesso

ao mercado global; segundo, a possibilidade de venderem a clientes totalmente desconhecidos;

terceiro, a capacidade de efetuarem estas transações com um anonimato garantido; quarto, fazerem

tudo isto de uma forma muito segura, quer em relação às transações em si mesmas, quer em relação

à investigação criminal.182

Estes sítios e os demais criptomercados existentes oferecem ainda o benefício adicional da

redução da possibilidade de violência entre comprador e vendedor, já que nunca se encontram

pessoalmente e nem sequer se conhecem. Alguns estudos identificam como características destes

sítios a qualidade dos produtos, nomeadamente quanto à sua pureza, o que origina algumas

interrogações perturbantes acerca da sua existência. Em comparação com o tráfego tradicional, parece

180 EMCDDA (2015). The Internet and drug markets, Summary of results from an Trendspotter study, Lisbon, p. 5. Disponível em:

http://www.emcdda.europa.eu/publications/technical-reports/internet-drug-markets.

181 Europol (2013), Eu Drug Markets Report - A strategic analysis, Luxembourg, p. 118. Disponível em: https://www.europol.europa.eu.

182 EMCDDA (2015). The Internet and drug markets, Summary of results from an Trendspotter study, Lisboa, p. 6. Disponível em:

http://www.emcdda.europa.eu/publications/technical-reports/internet-drug-markets.

55

que oferecem riscos muitos menores para a saúde pública e dos consumidores individuais, bem como

reduzem os níveis de criminalidade. 183

5.3 A criptomoeda Bitcoin

Os mercados virtuais que se situam na parte da internet que só é acessível por programas

informáticos encriptados permite a comercialização de drogas e de novas substâncias psicoativas e a

utilização de moedas digitais, ou criptomoedas, que dissimulam as transações.

São várias as criptomoedas utilizadas nos diversos negócios de bens e serviços mas a primeira

a ser criada, a bitcoin, representa o começo de um novo fenómeno da era da globalização, como

facilitador da liberdade de ação de comércio.

O programa de computador Bitcoin184 é uma moeda digital criada em 2008 por Satoshi

Nakamoto185. Este software cria a sua própria moeda denominada bitcoin que, por representar valor

para os usuários informáticos é por eles utilizada para aquisição de bens e serviços, apesar de não

estar garantido por nenhum banco central. Este sistema monetário digital caracteriza-se pela

descentralização, pois inexiste qualquer entidade ou pessoa que administre e controle o sistema.

O Bitcoin é um software de código aberto, tal como os sistemas operacionais Linux, Android ou

o navegador Firefox, pelo que o código fonte está disponível para qualquer internauta usar, modificar e

redistribuir sem custos associados. O Bitcoin é baseado numa rede par-a-par (P2P) de computadores

que executam o software sendo que todas as transações e as moedas ficam registadas numa rede de

blocos, denominada blockchain, que, ao atingir a base monetária de 21 milhões de bitcoins,

recompensa todos os usuários que auxiliaram a construir a rede, começando de imediato uma novo

cronograma.

Todas as informações financeiras ocorridas na rede Bitcoin são públicas, salvo as identidades

que estão por trás das transações. “Cryptographers recommend that the encryption algorithm is made

public186 and that only the encryption key is kept secret.”187 Este programa somente usa os endereços

183 Idem, ibidem.

184 A designação Bitcoin tem duplo significado, pois deve entender-se como programa computacional quando a primeira letra é escrita com letra maiúscula

e como moeda virtual quando a primeira letra é minúscula.

185 Satoshi Nakamoto é considerado o criador do software Bitcoin. Não se sabe se este é um nome real ou um mero pseudónimo. Ele (ou ela ou eles)

publicou, em 2008, um artigo intitulado “Bitcoin” através de uma rede de contactos de endereços eletrónicos, (vulgarmente designada por mailing list)

dedicada à criptografia. Os respetivos códigos binários de funcionamento foram publicados no ano seguinte em Sourceforge.

Informação obtida em: Franco, Pedro (2015). Understanding Bitcoin. Cryptography, Engineering and Economics United Kingdom: Wiley, p. 168.

186 “Public key cryptography was developed during the 1970s by Diffie, Hellman and Merkle (Levy, 2001)3. Bitcoin does not use public key encryption

algorithms, but a close relative called digital signatures.” Idem, ibidem, p. 53.

187 Idem, ibidem, p. 51.

56

das bitcoins para identificar os detentores de fundos e não as suas informações pessoais. Os

endereços, que são as chaves públicas, são longas sequências de letras e números aparentemente

aleatórias, como "13mckXcnnEd4SEkC27PnFH8dsY2gdGhRvM", sendo praticamente impossível de

estabelecer uma ligação entre esta sequência e o seu titular. A parte privada da chave, que determina

a propriedade da bitcoin, é conhecida exclusivamente do seu titular. O pagamento efetua-se pela

transmissão da parte privada da chave. Significa isto que o titular da chave da encriptação é o

proprietário da respetiva bitcoin.

Cada usuário controla os seus próprios fundos através de uma chave privada de criptografia.

Quando o usuário deseja utilizar os seus fundos, o mesmo utiliza a sua chave privada para assinar uma

mensagem que indica a sua vontade de os enviar para determinado destino, bem como o montante a

enviar. A mensagem é transmitida para a rede e cada usuário recebe uma cópia da mesma e o banco

de dados respetivo é atualizado.“There is a private key corresponding to each public key, and thus to

each Bitcoin address. Public keys can be interpreted as bank account numbers. Private keys can then

be interpreted as the signatures that unlock those bank accounts. To spend the bitcoins in an address,

a transaction authorizing the spending must be signed with the private key. The wallet software creates

a Bitcoin address by running the key generation algorithm, and thus any user can create as many

Bitcoin addresses as wanted.”188 (sublinhado nosso)

As bitcoins podem ser trocadas entre usuários do próprio programa, sendo que estas

transações são armazenados na blockchain o que as torna públicas. Contudo, as transações não

abrangem informações sobre os utilizadores que dão ordem, somente estão abrangidos os endereços

dos Bitcoin com um pseudónimo. Assim, a privacidade do utilizador está escondida sob o endereço

Bitcoin.

As moedas bitcoin também servem como forma de pagamento de bens e serviços de websites

que aceitam esta forma de pagamento. Os comerciantes vendem os bens e serviços ao preço da

moeda corrente, por exemplo em Euros ou em Dólares (USD – United States Dollar) e apresentam o

valor correspondente à moeda digital com a taxa aplicável. Os compradores dão ordem de

transferência das bitcoins para o destinatário e as contas respetivas são creditadas e debitadas, sendo

que após a autorização existe um câmbio de bitcoins com a moeda corrente. Ou seja, quando há

transação o processador de pagamento, que absorve as flutuações das taxas das duas moedas,

converte o valor da moeda digital para o valor correspondente na moeda corrente que é entregue ao

comerciante, fazendo-se uma troca. O sistema de pagamento é demonstrado na imagem infra.

188 Idem, ibidem, p. 56.

Figura

Estas transações não são registadas na cadeia de blocos pois necessitam de um câmbio.

Em súmula:

A bitcoin é uma verdadeira moeda. É verdade que tem uma forma puramente digital, sem

suporte físico tradicional, mas tal não lhe retira a sua natureza essencial de moeda. Desempenha as

funções tradicionais de qualquer moeda, isto é,

uma reserva de valor e uma denominação comum de valores.

Como todas as moedas, o seu valor é determinado pela

emitida por nenhuma entidade oficial, a

usuários da internet. Parte dessa confiança resulta, precisamente, do elevado grau de encriptação que

a compõe e que garante a sua fiabilidade. Igualmente fundamental é o anonimato que proporciona nas

transações. Demonstração última desta fé pública é o facto de várias entidades bancárias aceitarem já

transações nesta moeda e respetivas operações de câmbio.

A garantia do anonimato nas transações efetuadas faz com que toda e qualquer atividade ilícita

tenha uma natural preferência em basear as suas transações financeiras em

momento presente, a sua quase total imunidade face à investigação criminal.

189 http://www.dailymail.co.uk/news/article-3216246/Barclays

Figura 1Payment processor (reproduzido de FRANCO, Pedro)

Estas transações não são registadas na cadeia de blocos pois necessitam de um câmbio.

é uma verdadeira moeda. É verdade que tem uma forma puramente digital, sem

suporte físico tradicional, mas tal não lhe retira a sua natureza essencial de moeda. Desempenha as

funções tradicionais de qualquer moeda, isto é, é um instrumento de troca, um me

uma reserva de valor e uma denominação comum de valores.

Como todas as moedas, o seu valor é determinado pela fé pública. Ora, apesar de não s

emitida por nenhuma entidade oficial, a bitcoin adquiriu rapidamente essa confiança por parte dos

usuários da internet. Parte dessa confiança resulta, precisamente, do elevado grau de encriptação que

a compõe e que garante a sua fiabilidade. Igualmente fundamental é o anonimato que proporciona nas

sações. Demonstração última desta fé pública é o facto de várias entidades bancárias aceitarem já

transações nesta moeda e respetivas operações de câmbio.189

A garantia do anonimato nas transações efetuadas faz com que toda e qualquer atividade ilícita

uma natural preferência em basear as suas transações financeiras em

momento presente, a sua quase total imunidade face à investigação criminal.

3216246/Barclays-UK-high-street-bank-accept-bitcoin.html.

57

Estas transações não são registadas na cadeia de blocos pois necessitam de um câmbio.

é uma verdadeira moeda. É verdade que tem uma forma puramente digital, sem

suporte físico tradicional, mas tal não lhe retira a sua natureza essencial de moeda. Desempenha as

é um instrumento de troca, um meio de pagamento,

fé pública. Ora, apesar de não ser

adquiriu rapidamente essa confiança por parte dos

usuários da internet. Parte dessa confiança resulta, precisamente, do elevado grau de encriptação que

a compõe e que garante a sua fiabilidade. Igualmente fundamental é o anonimato que proporciona nas

sações. Demonstração última desta fé pública é o facto de várias entidades bancárias aceitarem já

A garantia do anonimato nas transações efetuadas faz com que toda e qualquer atividade ilícita

uma natural preferência em basear as suas transações financeiras em bitcoins, garantindo, no

59

CAPÍTULO VI – COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NA LUTA CONTRA A DROGA E A

CRIMINALIDADE ORGANIZADA

A criminalidade organizada que se dedica ao tráfico de droga e de novas substâncias

psicoativas caracteriza-se, essencialmente, por ser transnacional. A produção e a distribuição de todo o

tipo de drogas realizam-se em diversas regiões do mundo. “A droga que chega a Portugal passa por

dezenas de mãos. Depois do camponês, há o dono de um laboratório clandestino que lhe compra o

produto em bruto. Por sua vez este venderá a droga que produziu a um traficante que a levará para a

Europa, que aí a venderá a um outro traficante local.”190

Se se pensar ainda nas drogas opiáceas, verifica-se que o primeiro estádio da cadeia de

fornecimento começa essencialmente no continente asiático, principalmente no Afeganistão, onde

crescem maioritariamente as papoilas. É aqui que se procede à sua cultura e posterior extração de

ópio. De seguida, o ópio pode seguir para outros países asiáticos, que não o da produção, onde as

associações criminosas procedem à extração da morfina para sintetização da heroína para posterior

distribuição entre as redes criminosas que operam, em conluio ou em concorrência, por várias regiões

do mundo até chegar ao mercado de consumo.

Para além do mais, note-se que o processo de sintetização e de empacotamento das drogas

pode já ocorrer em países diversos dos da produção, nomeadamente na Europa. Atente-se no caso da

Holanda, pais europeu onde mais se produz as drogas sintéticos. Como já verificado e exemplificando,

a produção de anfetaminas e de metanfetaminas necessita dos precursores efedrina e pseudoefedrina.

O país onde existe amplamente estes produtos, pela sua utilização nas indústrias internas, é a China.

Nestes caso, estes precursores são desviados do seu curso comercial legítimo para a Holanda para

que se possa produzir diversas drogas que se destinam tanto ao mercado interno como ao mercado de

outros países da Europa ou dos demais Continentes.

Nesta medida, constata-se que a criminalidade organizada “não esgota a acção criminosa

num espaço reduzido de um Estado. Os seus tentáculos espalham-se por vários Estados ligados por

terra ou por mar.”191

190 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, legislação, notas, doutrina, jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa, Quid Juris, pp. 25 e 26.

191 Valente, Manuel Monteiro Guedes (2009). IN A investigação do crime organizado, Buscas domiciliárias nocturnas, o agente infiltrado e intervenção nas

comunicações. Criminalidade organizada e criminalidade de massa – Interferências e ingerências mútuas. Coimbra: Almedina, 2009, p. 179.

60

Por força da globalização, a ligação entre os Estados é ainda mais estreita pela utilização da

internet e dos demais meios de comunicação. A expansão das redes de traficantes “operou-se por via

da sua internacionalização” que se deve à globalização “designadamente da economia.”192

O mercado do tráfico de drogas anda como que de mão dadas com os mercados legítimos de

bens e serviços, pois a atividade como que se dilue no fluxo comercial legítimo. As redes criminosas de

modo organizado operam em regiões de comércio livre, onde existe parco controlo, para satisfazerem o

transporte e a distribuição de substâncias psicoativas. Assim, a “evolução da (economia e da) técnica

propiciou novas e perigosas formas de delinquir.”193 Sendo o tráfico de droga um crime transnacional e

global rapidamente a criminalidade organizada se serviu do mundo global para melhor concretizar os

seus intentos.

Perante este panorama factual, os sistemas legais fundados no princípio da territorialidade cuja

competência da ação penal se dirige aos fatos ilícitos praticados nos limites do seu território, são cada

vez mais ineficazes para combater a internacionalização da criminalidade organizada. O que impõe

“cada vez mais (…) recorrer, em matéria penal, à cooperação internacional.” Nesta medida, “a

globalização é hoje o novo paradigma da política criminal: frente à internacionalização do crime, urge

responder com a internacionalização da política de combate”194 ao tráfico de drogas.

Ora, neste capítulo da-se a conhecer os principais organismos internacionais, europeus e

nacionais que, através de uma atuação conjunta e coordenada, cooperam na luta contra o tráfico de

drogas, seja através da investigação e monotorização, seja através do desenvolvimento de novas

políticas para desenvolvimento e atualização das legislações nesta matéria.

Procura-se conhecer as estratégias e medidas adotadas pela comunidade internacional que,

por acompanharem a evolução do fenómeno da droga, baseiam-se num processo de evolução e que

estão consagradas nas três Convenções internacionais. Dá-se, ainda, a conhecer os atuais e futuros

atos legislativos europeus, que pretendem uniformizar as medidas de combate das novas substâncias

psicoativas e as legislações adotadas nesta matéria pelos vários Estados-Membro.

192 Rodrigues, Anabela Miranda & Mota, José Luís Lopes da (2002). Para uma política criminal europeia, quadro e instrumentos jurídicos da cooperação

judiciária em matéria penal no espaço da União europeia. Coimbra: Coimbra Editora, p.15.

193 Fernandes, Paulo Silva; apontamento introdutório de Monte, Mário Ferreira (2004). Globalização “sociedade de risco” e o futuro do direito penal.

Coimbra: Almedina, p. 35.

194 Rodrigues, Anabela Miranda & Mota, José Luís Lopes da (2002). Para uma política criminal europeia, quadro e instrumentos jurídicos da cooperação

judiciária em matéria penal no espaço da União europeia. Coimbra: Coimbra Editora, p.15.

61

6.1 Dos principais organismos internacionais

Nunca tendo existido uma única autoridade que se pudesse impor a todos os Estados e nesse

sentido que se pudesse impor às próprias soberanias, desde cedo que as relações externas entre os

Estados são reguladas por normas, princípios e costumes internacional e consensualmente aceites.

Com a vinculação a estas fontes pela Sociedade Internacional procura-se a paz da humanidade, no

sentido em que são impostos direitos e deveres comuns em todas as matérias de convivência

supranacional.

Decorre deste âmbito normativo “que as decisões políticas tomadas num estado-nação se

fazem sentir extra-fronteiras, ou que, mesmo, dá-se o fenómeno inverso de muitas e fulcrais dessas

decisões serem tomadas extra-muros, em sede de organizações internacionais, com competências

decisórias múltiplas e provenientes de transferência de poderes e soberanias estaduais, em sede

consensual, para essas mesmas instituições (…) e que se fazem sentir dentro de portas não de um

mas de vários Estados.” Em face da globalização, a transferência de estratégias e de decisões políticas

para “grandes centros de decisão internacionais”195 têm como escopo primordial a uniformização de

“decisões e comportamentos.”196

O combate internacional do tráfico de drogas compete a organismos197 que atuam em várias

regiões do mundo sob ações concertadas entre si, que se identificam de seguida.

O principal centro internacional de decisão nesta matéria é a Organização das Nações Unidas

sobre Drogas e Crime (UNODC), criada em 2002, que tem como principal função a coordenação das

ações supranacionais de fiscalização de drogas, nomeadamente pela vigilância da produção, fabrico,

distribuição e consumo não autorizados e de atividades de repressão contra o branqueamento de

capitais e demais problemas emergentes do fenómeno da droga. A este organismo compete fornecer

aos Estados as melhores estratégias de elaboração e de aplicação de políticas sobre narcóticos.

Anualmente, este organismo publica diversos relatórios, dentre os quais o Relatório Mundial

sobre Drogas que fornece informações sobre o estado atual deste fenómeno

O International Narcotics Control Board (INCB) é o organismo que controla a execução nos

Estados Parte das medidas impostas pelas Convenções em matéria de drogas, tendo sido

implementada em 1968, como decorrência da entrada em vigor da Convenção Única contra os

estupefacientes de 1961.

195 Valente, Manuel Monteiro Guedes, ob. cit., p. 182.

196 Idem, ibidem.

197 Os organismos aqui referidos representam os principais organismos que se dedicam ao combate do tráfico de drogas, havendo muitos mais que

prosseguem esta função.

62

Este organismo tem como principais funções garantir, em cooperação com os Estados

signatários e demais agências especializadas, através de sistemas de avaliação e monitorização, que o

fornecimento de drogas é para propósitos terapêuticos e medicinais; que as drogas e os precursores

químicos não são desviadas para o comércio ilícito e o reforço da eficácia dos sistemas internos de

controlo das drogas. Cabe a este organismo decidir, através de avalição das subtâncias, quais os

químicos utilizados na produção de drogas ilícitas que devem estar sujeitos ao controlo internacional e

nessa medida serem incluídas nas Tabelas da Convenção de 1988.

O INCB divulga anualmente um relatório do qual constam informações quanto aos dados e

estatísticas monotorizados no exercício das suas funções.

A investigação criminal global do tráfico de drogas compete à Organização Internacional de

Polícia Criminal (INTERPOL), enquanto organização internacional de cooperação policial. Esta polícia

distribuí-se por 190 países, nos quais estão localizados Gabinetes Centrais Nacionais que trabalham

em parceria com as polícias dos respetivos membros e com diversas organizações públicas e privadas

na prevenção e na luta contra a criminalidade global.

A INTERPOL tem como funções principais garantir um sistema de informações e de pesquisa

global que reconheça os crimes e os seus agentes, que suporte a ação policial e a aplicação da lei. No

que se refere ao tráfico de droga, esta polícia focaliza-se na identificação dos estupefacientes, nas

tendências do tráfico e das organizações criminosas internacionais. Procede à elaboração de relatórios

e intervenções estratégicas com base em dados recolhidos de todos os parceiros membros quanto a

estas matérias, que servem para auxiliar as organizações internas e internacionais de aplicação da lei

na luta contra o comércio ilegal de droga. No que se refere ao cibercrime, esta polícia presta apoio

operacional e de investigação, dispondo de um quadro de inteligência e de análise forense digital. Esta

polícia presta auxílio nas variadas investigações internacionais contra a criminalidade tendo a obrigação

de coordenação daquelas ações de repressão em que estejam envolvidos no mínimo dois países

membros.

Ao Consórcio Internacional sobre Políticas de Drogas (IDPC) compete como organismo

constituído por cento e quarenta e três Organizações Não Governamentais, a análise dos mercados

mundiais de drogas e das políticas internas e internacionais. Este organismo promove mudanças ou

atualizações das políticas que, baseadas em dados científicos, tenham por fim a redução dos danos

associados às drogas.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) é a agência, pertencente à Organização das Nações

Unidas, com a principal função de preservação da saúde mundial. A OMS publica todos os anos o

63

Relatório Mundial de Saúde, no qual publicita evidências científicas do controlo realizado aos

problemas de saúde derivados do consumo de drogas.

6.2 Dos principais organismos europeus

No seio da União Europeia, a eliminação do controlo das fronteiras trouxe consigo, por um

lado, a liberdade de circulação dos cidadãos europeus e, por outro lado, a mais fácil disseminação das

atividades criminosas de âmbito supranacional. Por forma a combater a criminalidade organizada, a

União Europeia tem reforçado a cooperação judiciária em matéria penal, pela investigação levada a

cabo pelos vários organismos que atuam para alcançar o cada vez mais desejado espaço único de

justiça penal, que se identificam de seguida.

A Eurojust é o organismo, criado em 2002, que tem por função a coordenação de ações

investigatórias e de processos penais entre as entidades competentes dos Estados-Membros da União

Europeia. É a este organismo que compete a tarefa de agilizar a prestação de auxílio judiciário mútuo

em matéria penal e do cumprimento de mandados de detenção europeu e de extradição. Este

organismo europeu intervém ativamente no combate ao crime grave, tal como o tráfico de droga, o

branquemento de capitais e a criminalidade informática e, desde 2007, que atua em cooperação com

o OEDT, sendo realizadas anualmente reuniões nas quais, entre outros trabalhos, se procede à recolha

e análise de dados politicamente relevantes sobre o fenómeno das drogas e na realização dos

relatórios anuais sobre droga publicados por este organismo que são elementos fundamentais para

desenvolver e atualizar a aplicação da lei.

A Rede Judiciária Europeia, criada em 1998, permite o estreitar da colaboração entre os juízes

e os procuradores dos Estados-Membros nas ações de repressão transnacionais.

A Europol tem como principal objetivo prestar assistência e melhorar a cooperação entre todas

as autoridades competentes nacionais na prevenção e no combate de toda a forma grave de

criminalidade que exija uma ação comum e que afete dois ou mais Estados-Membros e ainda a

harmonização de técnicas investigatórias na União Europeia. Para atingir os seus objetivos, em cada

Estado-Membro existe uma unidade da Europol.

A Europol exerce as suas funções, desde 1997, com estrita cooperação com o OEDT no

“intercâmbio de informações, avaliação de risco e controlo das novas drogas sintéticas.”198A

cooperação entre estas duas agências europeias concretizou-se na celebração de dois acordos de

cooperação, em Novembro de 2001, em Bruxelas e, em 2005, em Lisboa, respetivamente. Estes dois

198 http://www.emcdda.europa.eu/about/partners/europol

64

acordos de cooperação deram lugar à implementação da Estratégia de Ação Europeia sobre Drogas de

2009 a 2012 que permitiu a exequibilidade prática da Decisão do Conselho Europeu 2005/387/JHA.

A Europol tem uma ação preponderante na deteção de novas substâncias psicoativas, no

conhecimento das particularidades de cada uma, na avaliação científica dos riscos associadas às

mesmas, assim como na estratégia a adotar para a aplicação de necessárias medidas de controlo na

União Europeia.

O Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT) é a agência europeia criada

em 1993, que é composta pelo Conselho de Administração - principal órgão de tomada de decisões do

OEDT- “por um representante de cada Estado-Membro da UE, um representante da Noruega, dois

representantes da Comissão Europeia e dois peritos independentes no domínio da droga nomeados

pelo Parlamento Europeu.”199

Este organismo tem como objetivo a recolha e transmissão de dados de todas as questões

relacionadas com droga e com a toxicodependência referentes a todos os Estados-Membros e o

desenvolvimento de meios e técnicas de reforço da cooperação europeia nesta matéria, publicitando

anulamente o Relatório sobre drogas.

A principal fonte de informação da OEDT é a Rede Reitox200 da qual fazem parte os pontos

focais nacionais dos Estados-Membros, da Turquia, da Noruega e da Comissão Europeia. A estas

autoridades nacionais compete a cooperação com a OEDT e com os organismos internacionais pela

divulgação das informações recolhidas sobre os mercados da droga no âmbito dos respetivos sistemas

internos, tendo a faculdade de serem auxiliados por outros serviços de informação oficiais.

A nível interno, as informações e estatísticas fornecidas por esta rede de troca de informação

servem para planificar e adotar estratégias mais adequadas ao Estado Membro visado, nomeadamente

na elaboração de legislação, na atualização de legislação vigente e na tomada de medidas com base

na informação científica recolhida.

O Sistema de Alerta Rápido foi criado em 1997 pelo OEDT e pela Europol e funciona em todos

os Estados Membros através dos sistemas nacionais, na sequência da Decisão 2005/387/JAI Do

Conselho da Europa de 10 de Maio de 2005 relativa ao intercâmbio de informações, avaliação de

riscos e controlo de novas substâncias psicoativas na União Europeia.

Cada sistema nacional de alerta rápido é adaptado à realidade do respetivo país. “Na Europa,

os sistemas nacionais de alerta rápido diferem em muitos aspetos, nomeadamente quanto à base

jurídica, ao seu posicionamento na estrutura governamental (nos organismos de saúde ou responsáveis 199 http://www.sicad.pt/PT/RelacoesInternacionais/SitePages/PontoFocalOEDT.aspx.

200 “The abbreviation ‘Reitox’ stands for the French ‘Reseau Europeen d Information sur les Drogues et les Toxicomanies.”

http://www.emcdda.europa.eu/about/partners/reitox-network

65

pela aplicação da lei), à cobertura (local, regional ou nacional) e aos recursos que lhes são atribuídos.

Podem ainda ter composição e capacidade diferentes: por exemplo, há sistemas de alerta rápido que

incluem redes sólidas de polícia científica e peritos em toxicologia, outros monitorizam amostras

recolhidas junto dos consumidores e outros ainda estão ligados a um mecanismo de resposta rápida.

Os sistemas nacionais de alerta rápido podem ser reforçados através da utilização de indicadores

quantitativos de monitorização das drogas, da investigação qualitativa e do recurso a fontes de

informação pluridisciplinares, como prestadores de cuidados de saúde, organismos responsáveis pela

aplicação da lei e investigadores independentes.”201

O Grupo Pompidou é uma instância pertencente ao Conselho da Europa, criado em 1971, que

tem como função “o desenvolvimento da cooperação multidisciplinar no âmbito da luta contra o abuso

e o tráfico ilícito de drogas no espaço europeu.”202

Este grupo de cooperação tem como função o desenvolvimento de políticas em matéria de

drogas e de outras áreas afetadas com este problema, como a saúde pública e a integridade social. A

abordagem multisectorial deste grupo decorre do intercâmbio de informações e dos dados recolhidos

pelos diversos organismos europeus internacionais e de países vizinhos não europeus.203

6.3 Dos principais organismos portugueses

Os organismos estaduais que permitem o cumprimento das obrigações assumidas na luta

contra a droga, enquanto Estado Parte nas Convenções de luta contra a droga e, enquanto Estado-

Membro nos Tratados da União Europeia são identificados de seguida.

No que se refere à investigação criminal, compete à Procuradoria Geral da República as ações

de combate ao tráfico de droga e à criminalidade organizada, sendo os seus procuradores coadjuvados

pelos órgãos de polícia criminal.

A Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes (UNCTE) faz parte da Polícia

Judiciária e tem como competência a repressão dos crimes previstos na legislação nacional de

combate ao tráfico de droga, sendo da sua competência a elaboração e publicação do Relatório Anual

de Combate ao Tráfico de Estupefacientes em Portugal.

A Unidade de Cooperação Nacional da Polícia Judiciária (UCI) é composta por dois organismos

de cooperação policial europeia e internacional. O primeiro denomina-se Unidade Nacional da

EUROPOL e o segundo Gabinet Nacional da INTERPOL. À UCI compete, entre outars funções, dar

201 Idem, ibidem.

202http://www.sicad.pt/PT/RelacoesInternacionais/SitePages/detalhe.aspx?itemId=2&lista=SICAD_GRUPOSTRABALHO&bkUrl=BK/RelacoesInternacionais/

203 http://www.coe.int/T/DG3/Pompidou/AboutUs/default_en.asp.

66

execução aos pedidos detenção decorrentes de processos de extradição; cooperar através dos

respetivos mecanismos com a INTERPOL, a EUROPOL e demais organismos internacionais com

funções investigatórias; assim como a coordenação da polícia judiciária em atividades de cooperação

policial no seio da União Euroepia.204

O Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) cumpre

as políticas internas de saúde para a redução e dissuasão do consumo de drogas e de novas

substâncias psicoativas e para prevenção e minoração de dependências e danos provocados pelas

substâncias psicoativas.

O SICAD é o ponto focal português da rede Retox, competindo a prossecução das

competências de aquisição, com auxílio dos demais organismos português com funções nesta matéria,

e transmissão de dados do fenómeno da droga no território nacional.

Compete ao Diretor-Geral do SICAD transmitir às autoridades de saúde a identificação de

substâncias suscetíveis de serem consideradas novas substâncias psicoativas, para efeito de

fiscalização - Artigo 13.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 54/2013 de 17 de abril. O mesmo orgão propõe ao

membro do Governo responsável pela área da saúde a introdução de novas substâncias psicoativas na

lista das novas substâncias psicoativas constante da Portaria n.º 154/2013 de 17 de abril – Art. 13.º,

n.º 4 do Decreto-Lei n.º 54/2013 de 17 de abril.

O Ponto Nacional Português é responsável, entre outros documentos, pela elaboração e

publicitação anual do Relatório Anual sobre a Situação do País em Matéria de Drogas e

Toxicodependência, do qual “constam vários indicadores indiretos relativos ao consumo e ao tráfico,

que permitem uma caracterização da situação atual e da sua evolução ao longo do tempo.” Elabora

ainda, anualmente, um relatório nacional que espelha a monitorização efetuada e a situação do país e

as novas tendências de estratégias e leis em matéria de droga. Este relatório é remetido

obrigatoriamente para o OEDT.

6.4 Das medidas internacionais

A comunidade internacional cedo reconheceu o caráter transnacional do tráfico de narcóticos.

Desde cedo, portanto, se tornou clara a necessidade da cooperação internacional nesta matéria.

Assim, em 1912, assinou-se a primeira Convenção Internacional de controlo de drogas, no caso

concreto, o ópio.

204 Idem, ibidem.

67

O atual sistema global de combate à droga assenta na cooperação internacional exteriorizada

nas disposições de três Convenções internacionais, cujo cumprimento está sob o controlo e a

fiscalização de um só órgão internacional, as Nações Unidas, auxiliado por agências internacionais

pertencentes a este órgão e criadas especialmente para o controlo mundial de estupefacientes.205

Assim, o regime internacional de controlo de droga é composto pelos seguintes Tratados: a

Convença Única de 1961, a Convenção de Substâncias Psicotrópicas de 1971 e a Convenção Contra o

Tráfico Ilícito de Substâncias Narcóticas e Psicotrópicas de 1988.

O regime das Convenções impõe que os Estados signatários estabeleçam sanções penais para

prevenir e punir o comércio não autorizado de substâncias controladas internacionalmente. Os Países

Signatários devem adotar “(…) todas as medidas necessárias, incluindo medidas legislativas e

administrativas, em conformidade com os princípios fundamentais dos respetivos sistemas jurídicos

internos” para executar nos territórios respetivos as disposições globais de controlo ao tráfico ilícito de

droga e para cooperar entre os Partes na referida execução.

Cumpre agora apresentar, ainda que brevemente, cada uma destas três Convenções de per si.

A Convenção Única de 1961 sobre os Estupefacientes, emendada pelo Protocolo de 1972, foi

elaborada e conclusa em 30 de Março de 1961, em Nova Iorque, tendo sido ratificada e assinada por

154 Estados.206 Entrou em vigor no ordenamento jurídico internacional em 13 de Dezembro de 1964.207

Esta Convenção qualifica a toxicomania como um flagelo individual e um perigo económico e

social para a humanidade. Como tal, os respetivos Estados Parte comprometem-se a tomar medidas

coordenadas e universais para combater a toxicomania, nomeadamente de carácter penal.

Assim, a Convenção proíbe a cultura e a produção, o fabrico, a extração, a preparação208, a

detenção, a apresentação, a comercialização, a distribuição, a compra, a venda, a entrega, seja a que

título for, a corretagem, o envio, a expedição em trânsito, o transporte, a importação e a exportação

dos estupefacientes identificados nas quatro listas que lhe são anexas – Art. 36.º.

De acordo com o artigo 1.º, n.º 1, os estupefacientes sujeitos a controlo são os que resultam

da cultura das dormideiras, do arbusto de coca e da planta de cannabis (j) e as suas preparações.

Compreendendo assim toda a mistura, sólida ou líquida, contendo um estupefaciente (s).

205 As principais agências internacionais são o Conselho Económico e Social (ECOSOC), a Comissão de Drogas Narcóticas (CND), o Órgão Internacional de

Controlo de Estupefacientes (INCB) e o Programa das Nações Unidas para o Controlo Internacional de Drogas (UNODC), cujas funções se explanarão no

capítulo dedicado à cooperação internacional em matéria de droga.

206 https://treaties.un.org/Pages/ViewDetails.aspx?src=TREATY&mtdsg_no=VI-15&chapter=6&lang=en.

207 A Convenção Única de 1961 sobre os Estupefacientes foi aprovada para ratificação, na ordem jurídica interna, pelo Decreto-Lei n.º 435/70 e publicado

em Diário da República I, n.º 212, de 12/09/1970 e teve início de vigêcia no dia 29/01/1972.

208 De acordo com o art. 1.º, n.º 1, al. s), “O termo "preparação" designa uma mistura, sólida ou líquida, contendo um estupefaciente”.

68

As Partes assumem a obrigação de, com reserva das suas disposições constitucionais, punir

criminalmente o tráfico ilícito, bem como qualquer outro acto que, no seu entender, seja contrário às

disposições da Convenção, quando cometidas intencionalmente e as infracções graves devem ser

puníveis com sanção adequada, nomeadamente de penas de prisão, ou de outras penas privativas da

liberdade – Art. 36.º.

A Convenção sobre as Substâncias Psicotrópicas de 1971 foi elaborada em 21 de Fevereiro de

1971, em Viena tendo sido ratificada e assinada por 183 Estados209 e iniciado a sua vigência na ordem

jurídica internacional no dia 16 de Agosto de 1976.210

O objeto essencial desta Convenção é a prevenção e o combate do abuso das substâncias

psicotrópicas, bem como do tráfico ilícito a que dá lugar. Assim, a Convenção proíbe a produção, o

fabrico, a extracção, a preparação211, a detenção, a apresentação, a comercialização, a distribuição, a

compra, a venda, a entrega, seja a que título for, a corretagem, o envio, a expedição em trânsito, o

transporte, a importação e a exportação, sem a devida licença de autorização212, das substâncias

psicotrópicas213 identificados nas quatro listas que lhe são anexas – Art. 22, n.º1.

Novidade o disposto no artigo 20.º, em que as Partes se comprometem (...) a assegurar o

tratamento, a educação, a pós-cura, a readaptação e a reintegração social das pessoas envolvidas,

bem como a coordenar os seus esforços para a consecução desse fim (n.º1).

Por último, a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e

Substâncias Psicotrópicas foi concluída em 20 de Dezembro de 1988, em Viena tendo sido ratificada e

assinada por 189 Estados e teve início de vigência na Ordem jurídica internacional no dia 11 de

Novembro de 1990.214

Esta Convenção aguça o reforço da cooperação internacional pela implementação de medidas

capazes de serem aplicadas a todos os aspetos centrais e colaterais do tráfico ilícito. A comunidade

internacional vem implicitamente reconhecer um determinado grau de insucesso das medidas antes

209 https://treaties.un.org/Pages/ViewDetails.aspx?src=TREATY&mtdsg_no=VI-16&chapter=6&lang=en.

210 A presente Convenção, na ordem jurídica interna, foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 10/79 e publicada em Diário da República I, n.º 25, de 30/01/1979

e teve início de vigêcia no dia 19/07/1979.

211 De acordo com o artigo 1.º, A expressão "preparação" designa: Uma solução ou uma mistura, qualquer que seja o seu estado físico, que inclua uma ou

várias substâncias psicotrópicas (f –i), ou Uma ou várias substâncias psicotrópicas em forma dosificada (f-ii).

212 A utilização das substâncias psicotrópicas limita-se a fins exclusivamente médicos e científicos, em conformidade com o artigo 5.º. A comercialização

está sujeita a licença de autorização e a posse, salvo quando tenha por fim o exercício de funções terapêuticas ou científicas, carece de receita médica,

conforme previsto no artigo 8.º e 9.º

213 De acordo com o art. 1.º, al. e), "substância psicotrópica" designa qualquer substância, de origem natural ou sintética, ou qualquer produto natural das

listas I, II, III ou IV;

214 A Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias psicotrópicas, foi assinada por Portugal em 13/12/1989,

tendo sido ratificada por Decreto do Presidente da República n.º 45/91 e publicada em Diário da República I-A, n.º 205, de 06/09/1991, com início de

vigêcia no dia 03/03/1992.

69

dela adotadas contra o tráfico de drogas, na medida em que reconhece não só a continuada existência

desse mesmo tráfico, mas também a necessiadade de reforçar e complementar as medidas das

convenções anteriores. Alarga também o quadro das preocupações subjacentes ao tráfico, destacando-

se aqui a utilização de crianças como mercado de consumo e para o próprio tráfico, a exorbitante

dimensão dos rendimentos e fortunas geradas pelo tráfico e a necessidade de fiscalização de

determinadas substâncias, tais como os precursores.

6.5 Das medidas europeias de combate às novas substâncias psicoativas

As novas políticas em matéria de droga têm como principais desafios o combate das novas

substâncias psicoativas, tomando na devida consideração as duas seguintes especificidades destas

drogas: o rápido aparecimento no mercado e a imediata substituição por novas drogas quando são

sujeitas a controlo.

A Decisão 2005/387/JAI do Conselho de 10 de Maio de 2005 instituiu um mecanismo de

intercâmbio rápido de informações sobre as novas substâncias psicoativas, assim como previu uma

avaliação de riscos e controlo destas substâncias Esta decisão visa, em conformidade com os

resultados obtidos pela avaliação dos riscos, permitir que as medidas aplicáveis nos Estados-Membros

ao controlo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas também sejam aplicáveis às novas

substâncias psicoativas – Art. 1.º.

Assim, esta decisão, nos termos do art. 2.º, é aplicável às substâncias que não estejam

incluídas em qualquer das listas da: Convenção Única das Nações Unidas de 1961 sobre os

estupefacientes, e que possam constituir uma ameaça para a saúde pública comparável à das

substâncias constantes das listas I, II ou IV (a)) e Convenção das Nações Unidas de 1971 sobre

substâncias psicotrópicas, e que possam constituir uma ameaça para a saúde pública comparável à

das substâncias constantes das listas I, II, III ou IV (b)), assim como dos precursores de drogas.

Ficam ainda excluídos, em nome da preservação dos cuidados de sáude humanos e

veterinários, “as substâncias com valor medicinal estabelecido e reconhecido ficam excluídas das

medidas de controlo baseadas na presente decisão. As substâncias com valor medicinal estabelecido e

reconhecido que sejam indevidamente utilizadas devem ser objecto de medidas regulamentares e de

saúde pública adequadas” – ponto 8 Considerando.

O Conselho, deliberando por maioria qualificada, nos termos da alínea c) do n.o 2 do artigo

34.º do Tratado da União Europeia, e sob a iniciativa apresentada pela Comissão ou por um ou mais

70

Estados-Membros, decide da necessidade de sujeitar a nova substância psicoactiva a medidas de

controlo – Art.8.º

Se o Conselho decidir sujeitar uma nova substância psicoactiva a medidas de controlo, os

Estados-Membros devem esforçar-se, no prazo máximo de um ano a contar da data decisão, por adotar

as medidas necessárias segundo o respetivo direito interno, para sujeitar o novo estupefaciente ou

psicotrópico às medidas de controlo e às sanções penais previstas nas respetivas legislações em

cumprimento das suas obrigações decorrentes da CSP e da CUE, respetivamente – Art. 9.º

Para combater permanenetemente a distribuição não autorizada das novas drogas, nenhuma

disposição da presente decisão obsta a que um Estado-Membro mantenha ou adote, no seu território,

medidas nacionais de controlo que considere apropriadas logo que um Estado-Membro identifique uma

nova substância psicoativa – Art.9.º, n.º 3.

Nesta medida, todos os Países da União Europeia estão vinculados a implementar “(...)

medidas para impedir a oferta de drogas ilícitas ao abrigo das três Convenções das Nações Unidas,

que providenciam um quadro internacional para o controlo da produção, do tráfico e da posse de mais

de 240 substâncias psicoativas.”215 A comercialização não autorizada de drogas deve ser tratada como

crime. Igual obrigatoriedade se aplica à detenção para consumo próprio mas tal sancionamento penal

está condicionado pela salvaguarda “«dos princípios constitucionais e dos conceitos fundamentais dos

respetivos sistemas jurídicos». Esta cláusula não tem sido uniformemente interpretada pelos países

europeus e por outros, facto que se reflete nas diferentes abordagens jurídicas neste domínio.”216 217

O Princípio da Legalidade, previsto no n.º 1 artigo 7.º na Convenção para a Proteção dos

Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, consagra que “Ninguém pode ser condenado por

uma ação ou uma omissão que, no momento em que foi cometida, não constituía infracção, segundo o

direito nacional ou internacional. Igualmente não pode ser imposta uma pena mais grave do que a

aplicável no momento em que a infração foi cometida.”

Considerando que a atual redação das normas penais segue uma técnica legislativa de

enumeração das substâncias químicas proibidas, implica o princípio da legalidade que qualquer

substância nova cuja composição química não seja em absoluto idêntica às identificadas nas listas,

seja considerada como não abrangida pela proibição. A exigência legal da especificação clara de uma

215 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 35. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

216 Idem, ibidem.

217 A Letónia e a Hungria são os únicos Estados Membros que criminalizam a posse para consumo próprio. Na Hungria, a detenção para consumo próprio

de drogas que contenham mais de 10 gramas de novas substâncias psicoativas é criminalizada com pena de prisão até um ano enquanto que na Letónia

a mesma conduta passa a ser considerada crime se, após ter sido aplicada uma mera advertência ou uma multa de valor máximo de € 280,00, o infrator

praticar o mesmo facto no decorrer de um ano.

71

infração em matéria penal impede que a legislação de droga se aplique às substâncias que na mesma

não estejam incluídas.

Para colmatar o vazio legal existente quanto à comercialização não autorizada, bem como

quanto ao consumo das novas substâncias psicoativas que ameaçam a saúde pública, a

“jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem permite, no entanto, que alguns

elementos da infração sejam clarificados e incluídos na definição inicial da infracção.”218

A nível europeu o controlo das novas substâncias psicoativas é feito por “três grandes tipos de

resposta a nível jurídico219. Em alguns países, utilizou-se a legislação em vigor para questões não

relacionadas com as drogas controladas (...); noutros, a legislação ou os processos jurídicos aplicáveis

às drogas foram alargados ou adaptados; e noutros ainda foram elaboradas novas leis. Apesar de as

definições das infrações e de as sanções aplicadas variarem muito, as respostas tendem a centrar-se

na oferta e não na posse das substâncias.”220

A adoção de legislação ou da utilização de procedimentos221 vigentes por determinado Estado

prima, por um lado, pela rapidez com que se logra o combate à oferta não autorizada de novas

substâncias psicoativas e, por outro lado, pela mesma ser construída com definições harmonizadas

nessa matéria no seio da União Europeia.

A utilização da Lei de Defesa do Consumidor prende-se com a obrigatoriedade dos produtos e

bens alimentares conterem nos rótulos das suas embalagens informação completa e precisa quanto ao

composto dos mesmos e quanto à sua utilização.222

218 OEDT (2011). Drogas em destaque, 2.º número, Lisboa, p. 2. Disponível em: www.emcdda.europa.eu

219 “Cerca de metade dos Estados-Membros da UE distingue juridicamente as substâncias com base na sua nocividade, podendo a avaliação dos riscos

contribuir para classificar com exactidão os seus possíveis danos e divulgá-los.” Estes testes científicos “(...) analisam os riscos sociais e para a saúde

colocados (...) nas várias etapas, desde a produção até ao tráfico para consumo. Podem avaliar também o potencial envolvimento da criminalidade

organizada, e as consequências das eventuais medidas de controlo” 219, “ (...) nas quais se podem incluir a substituição de uma substância recentemente

sujeita a controlo por outra não controlada — por vezes, com efeitos mais graves.” “Por exemplo, o controlo do GHB (ácido gama-hidroxibutírico) poderá ter

causado um aumento do consumo do seu precursor químico e metabólico GBL (gama-butirolactona), uma substância pelo menos tão perigosa como o

GHB. Após a imposição de medidas de controlo sobre cogumelos alucinogénios que contêm psilocina, alguns retalhistas começaram a vender o cogumelo

amanita muscaria, que tem grandes riscos de toxicidade. Quando a mefedrona foi submetida a medidas de controlo na Europa, os vendedores online

começaram a publicitar a nafirona como substituta. Contudo, em lugar da nafirona, muitas amostras continham uma ou mais catinonas controladas, ou

outras substâncias sem relação química com a nafirona.” Idem, ibidem, pp. 2 e 3.

220 OEDT (2015). Relatório Europeu sobre Drogas - Tendências e Evoluções, Luxemburgo, p. 34. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

221 Na Suécia, (…), a lei sobre os produtos perigosos para a saúde, permite classificar rapidamente uma substância submetendo-a a sanções penais graves

por venda ou posse, enquanto as autoridades verificam se ela corresponde à definição de «droga», sendo, em caso afirmativo, incluída na lista das

substâncias controladas.

OEDT (2011). Drogas em destaque, 2.º número, Lisboa, p. 3. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

222 A execução desta legislação permitiu o encerramento de todas as headshop em funcionamento na Polónia. Permitiu, também, o confisco de todas as

substâncias denominadas “spice” que estavam a ser comercializadas em Itália sem informação na língua respetiva nos rótulos das embalagens, assim

como permitiu a proibição da venda de mefedrona como sais de banho ou como produtos para plantas no Reino Unido.

72

Alguns Estados Membros utilizaram a legislação relativa aos medicamentos para combater o

mercado das NSP. Esta legislação exige a obtenção de licença para o fornecimento de medicamentos

pelo que os Estados equipararam as novas substâncias psicoativas a medicamentos, pela interpretação

de que estas substâncias não tinham que ter necessariamente efeitos terapêuticos.223 Em Julho de

2014 o Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que os Estados Membros estariam a interpretar

mal a definição europeia de medicamento, impossibilitando assim o recurso a este mecanismo de

combate.

Outra resposta é modificação da legislação de droga em vigor deixando de se identificar

individualmente as drogas para se definir grupos de substâncias que se pode alcançar através do

sistema de definições genérico ou análogo.

No sistema genérico224 a legislação contempla “ (…) definições genéricas das famílias químicas

das substâncias controladas.” No sistema análogo, “as substâncias análogas ou derivadas de drogas

controladas podem incluir as substâncias com estruturas ou efeitos semelhantes, abrangendo, assim,

uma gama de substâncias mais vasta do que a definição genérica; estas classificações podem ser

aplicadas a todas as substâncias sob controlo da legislação em matéria de droga (como acontece na

Bulgária e na Noruega), a categorias selecionadas (Letónia e Malta), ou apenas a um pequeno grupo

de substâncias (Luxemburgo).”225 226

A modificação dos procedimentos legais de feitura das leis227 permite o controlo mais expedito

das substâncias. Esta resposta torna mais célere tanto a verificação dos riscos como a inclusão das

novas substâncias psicoativas nas tabelas ou nas definições legais. Tem ainda permitido a análise mais

aprofundada das novas substâncias psicoativas e a busca de soluções legais mais adequadas, mas

também uma resposta mais rápida no controlo do mercado das mesmas.

223 Por exemplo, “em 2009, a Áustria classificou os produtos «spice» ao abrigo da legislação não penal relativa aos medicamentos, conseguindo assim pôr

termo à venda e distribuição livres do «spice» na Áustria, sem criminalizar os consumidores.” Idem, ibidem.

224 Utilizado pelo Reino Unido e pela Irlanda.

225 Idem, ibidem, p. 2.

226 O Sistema de definições de grupo de substâncias tem sido amplamente adotado nos últimos seis anos por diversos Estados Membros. Ou seja, o

Luxemburgo introduziu na sua legislação o grupo dos sintéticos canabinóides, em 2009; a Itália introduziu o grupo de canabinóides sintéticos e de

catinonas, em 2011; o chipre, em 2011, introduziu a definição destes últimos análogos e de fenetilaminas; a Lituânia introduziu o grupo de canabinóides

sintéticos e de catinonas, em 2011 e em 2012, os canabinoides, as catinonas, as fenetilaminas e as triptaminas; a Dinamarca introduziu, em 2012, o

grupo de canabinoides, catinonas, fetelaminas e triptaminas; a França introduziu, em 2012, o grupo das catinonas; a Noruega, em 2013, introduziu o

grupo de canabinoides, catinonas, triptaminas, fenetilaminas e triptaminas; a Croácia, em 2014, introduziu os catinonas, as fenetilaminas, as triptaminas,

as piperazinas, os aminoindanos e arilalquilaminas e a Turquia introduziu na sua legislação, em 2015, os sintéticos canabinóides, os catinonas, as

fenetilaminas e as triptaminas.

227 Em 2014, a Checoslováquia alterou a competência em matéria de drogas do Parlamento para o Governo, passando as futuras substâncias a serem

abrangidas pela legislação por Decreto Governamental.

73

A execução de medidas transitórias228 permite a retirada temporária de substâncias suspeitas

de provocarem danosidade social, enquanto se procede à avaliação dos riscos. Em função dos

resultados obtidos da avaliação, poderão ser adotadas medidas adequadas aos riscos demonstrados

pelas substâncias.

Outra resposta jurídica adotada é a elaboração de nova legislação229 de combate ao comércio

livre de novas substâncias psicoativas. Apesar do objetivo comum, as legislações diferem entre si no

seio da União Europeia nos seguintes elementos: na formulação adotada para definir o que se entende

por novas substâncias psicoativas, nos procedimentos adotados para colocar sob controlo as

substâncias e a natureza das sanções aplicáveis.

O controlo legal de uma substância tem-se feito em torno de três requisitos distintos: que

produza efeitos depressores ou estimulantes no sistema nervoso central; que a razão do consumo seja

o abuso ou a intoxicação; que constitua uma ameaça grave para a saúde e para a sociedade (ou, em

alternativa que gere dependência para o consumidor). 230

Figura 2 Tabela resenha dos critérios utilizados na qualificação da infração por vários países europeus (Reproduzido de New psychoactive substances in Europe, Innovative legal responses June 2015, Luxembourg)

228 Foi o procedimento adotado pelo Reino Unido, em 2011, que promulgou um ato que permitia a inclusão temporária das novas substâncias psicoativas

nas tabelas, aplicando-lhes assim, no decorrer de um ano, a legislação em matéria de drogas.

229 Portugal, Irlanda, Áustria, Roménia e Suécia foram alguns dos Estados Membros que decidiram elaborar nova legislação para combater o fenómeno das

NSP.

230 A Áustria inclui as novas substâncais psicoativas nas tabelas de controlo após a comprovação destes três requisitos. “Austria, substances can be listed

only if they are likely to be ‘abused’ by certain sections of society and pose a possible threat to consumer health.” OEDT (2015). Perspectives on Drugs -

Legal approaches to controlling new psychoactive substances, Luxembourg, p. 3. Disponível em: www.emcdda.europa.eu

74

A decisão de submeter e de publicitar o controlo das novas substâncias psicoativas compete a

entidades diferentes no seio da União Europeia, uma vez que nuns cabe a orgãos do governo231 e

noutros cabe a organismos independentes da administração estadual232.

As infrações pela comercialização não autorizada de novas substâncias psicoativas também

variam de País para País, tanto na natureza e na periodicidade233 como na medida das sanções. Há

legislações que sancionam administrativamente esta conduta com a mera apreensão e destruição do

produto234, outras que sancionam como ilícito contraordenacional pela aplicação de uma coima235 e, por

fim, existe o sancionamento como crime, com pena de prisão236.

Apesar de inexistir legislação europeia uniformizadora das respostas legais nos Estados

Membros, foram adotadas e estão a ser tomadas medidas para controlar a chegada ao mercado das

novas substâncias psicoativas. Como característica comum é a aplicação de sanções penais de prisão

para o tráfico e a aplicação de sanções contraordenacionais ou meramente administrativas para a

detenção para consumo próprio das novas substâncias psicoativas. Duas tendências parecem emergir:

primeiro a punição com pena de prisão para os traficantes, segundo, a descriminalização da posse

para consumo próprio. 237

Contudo, o diferente tratamento encontrado nos quadros legislativos dos Países Membros pode

ter como consequência a criação de entraves ao funcionamento adequado do mercado único238, assim

como favorece o seu tráfico por redes criminosas e a diferente natureza das sanções previstas nas

novas legislações dos países da União Europeia tem sofrido algumas críticas negativas, devido à

desigualdade existente nas decisões judiciais, totalmente díspares entre si.

231 Na Áustria compete ao Ministro da Saúde a decisão de incluir as novas substâncias psicoativas na lista de drogas controladas e fá-lo através de

Regulamento. Igual situação se verifica em Portugal, na Hungria e na Eslováquia. A decidão de controlo temporário das novas substâncias psicoativas no

Reino Unido tem que ser efetuado por Lei do Parlamento.

232 É o caso da Letónia e da Suécia. Esta decisão está a cargo, no primeiro país, do“Centre for Disease Prevention and Control” e no segundo país do

“Medical Products Agency and Swedish National Institute of Public Health.”

EMCDDA (2015). New psychoactive substances in Europe, Innovative legal responses, Luxemburgo, pp. 8 e 10. Disponível em: www.emcdda.europa.eu.

233 A legislação do Reino Unido e da Eslováquia coloca pelo periodo de um e três anos respetivamente, as novas substâncias nas listas de drogas

controladas, na pendência da avaliação dos riscos.

234 O tráfico de novas substâncias psicoativas na Suécia é punido com o confisco e com a destruição do produto apreendido

235 No caso de Portugal e da Eslováquia a oferta não autorizada de novas substâncias psicoativas é sancionada como ilícito contraordenacional, cuja coima

máxima é de € 45.000,00 e € 332.000,00, respetivamente. Na Polónia a produção e a distribuição é punida como coima cujo valor mínimo é de €

5.000,00 e o máximo de € 250.000,00.

236 No Reino Unido, pela aplicação temporária da legislação comum aplicável ao tráfico de droga, pune a oferta não autorizada de novas substâncias

psicoativa com uma pena de prisão de meio ano até 14 anos.

Na Polónia, a publicidade das novas substâncias psicoativas é punido com pena de prisão até um ano.

237 Idem, ibidem.

238 http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+REPORT+A7-2014-0172+0+DOC+XML+V0//PT#title2.

75

6.5.1 O futuro das medidas de cooperação europeias

Com o desaparecimento do terceiro pilar do funcionamento da União Europeia,

referente à cooperação policial e judiciária em matéria penal, os métodos comunitários passam agora a

constar de instrumentos legislativos, tal como os Regulamentos. Este ato legislativo reforça a

cooperação em matéria criminal239 e o princípio basilar do reconhecimento mútuo, pois visa aproximar

as legislações dos Estados-membros, esbatendo, portanto, as consequências provocadas pelas

diferenças das legislações internas no espaço único de justiça penal.

Assim, está a ser discutido o Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho240 relativo às

novas substâncias psicoativas, que substituirá a Decisão 2005/387/JAI do Conselho.

Este Regulamento procura a aplicação de normas mínimas de direito penal nesta matéria em

toda a União Europeia. Este instrumento legislativo “pretende assegurar que o comércio de novas

substâncias psicoativas para utilizações industriais e comerciais não seja dificultado e aperfeiçoar o

funcionamento deste mercado, protegendo, simultaneamente, a saúde e a segurança das pessoas

relativamente a substâncias nocivas que são motivo de preocupação a nível da UE.”241

As novas substâncias piscoativas que surjam no mercado europeu e que apresentem um risco

imediato para a saúde pública serão temporariamente retiradas do mercado de consumo, enquanto

são sujeitas a avaliação dos riscos pela pelo Comité Científico do Observatório Europeu da Droga e da

Toxicodependência. Após serem conhecidos os resultados dos testes científicos, as novas substâncias

psicoativas são sujeitas a sanções proporcionais aos riscos ou podem ser livremente comercializadas

no mercado.242

As substâncias que apresentem riscos baixos para a saúde, a sociedade e a segurança, não

serão sujeitas a quaisquer medidas restritivas no seio da União Europeia, podendo os Estados-

Membros adotar as medidas adicionais que considerem adequadas ou necessárias, em função dos

riscos específicos apresnetados. Quanto às substâncias que exibam riscos moderadas, a Comissão

proíbirá a sua venda no mercado de consumo, exceto se a posse for expressamente autorizada por

239 No combate à criminalidade organizada foi adotado o auxílio judiciário mútuo em matéria penal que estreita a colaboração entre as autoridades de

repressão na União Europeia, o Mandado de Detenção Europeu que reforçou a extradição entre os Estados-membros e o mandado europeu de obtenção

de provas, são alguns dos métodos que concretizam a cooperação judiciária em matéria penal e que reforçam as garantias processuais dos arguidos e

acusados pelo reconhecimento do seu direito fundamental a um julgamento justo. 240 Compete ao Parlamento e ao Conselh, nos termos do artigo 83.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, “estabelecer regras mínimas

relativas à definição das infrações penais e das sanções em domínios de criminalidade particularmente grave e com dimensão transfronteiriça que resulte

da natureza ou das incidências dessas infrações, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns.”

241 Projeto de Resolução Legislativa do Parlamento Europeu, de 17 de Abril de 2014.

Disponível em: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+REPORT+A7-2014-0173+0+DOC+XML+V0//PT#title1.

242 Idem, ibidem.

76

prescrição médica. A sua utilização será ainda autorizada no mercado comercial, industrial e científico.

As substâncias com riscos graves serão sujeitas a restrições permanentes de acesso ao mercado de

consumo e comercial, salvo se expressamente autorizado ou se destinarem a fins científico. Constituí

crime a sua produção, fabrico e colocação no mercado, incluindo o seu transporte, importação e

exportação.

A proposta é acompanhada de uma proposta de diretiva que altera a Decisão-Quadro

2004/757/JAI do Conselho, que adota regras mínimas quanto aos elementos constitutivos das

infrações penais e às sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga, no que concerne à

definição de droga. A inclusão das novas substâncias psicoativas com riscos graves serão aditadas ao

anexo da Decisão-Quadro pela Comissão sendo que, no prazo máximo de 12 meses, os Estados

Membros devem tipificar como crime a produção, fabrico, extração, preparação, oferta,

comercialização, distribuição, venda ou fornecimento em quaisquer condições, intermediação,

expedição, expedição em trânsito, transporte, importação ou exportação das substâncias respetivas. 243

Não está prevista a criminalização da posse de novas substâncias psicoativas para consumo

próprio, mas os Estados-Membros são livres de criminalizarem esta conduta internamente.

243 Em face das informações estatísticas quanto ao prazo de avaliação de riscos verificada na União Eutropeia, a Comissão das Liberdades Cívicas, da

Justiça e dos Assuntos Internos propõe a alteração do prazo de 12 meses para os Estados-Membros adaptarem o seu direito interno.

http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+REPORT+A7-2014-0173+0+DOC+XML+V0//PT.

77

CAPÍTULO VII – REGIME JURÍDICO DO TRÁFICO DE DROGAS E DE NOVAS SUBSTÂNCIAS

PSICOATIVAS

No presente capítulo enquadrar-se-á o tráfico de droga na Lei de Combate à Droga, aludindo-se

ao bem jurídico tutelado pela norma incriminadora e identificando-se os elementos típicos objetivos e

subjetivos. Procura conhecer-se o crime qualificado e o crime privilegiado do tráfico de drogas, assim

como o crime de tráfico de precursores. Finalmente, da-se a conhecer a natureza da tutela dada ao

tráfico de novas substâncias psicoativa e a solução jurídica encontrada para o concurso de infrações

penais e contraordenacionais. Por último, identificam-se as principais entidades competentes na sua

prevenção e repressão das NSP, em cumprimento da Decisão-Quadro 2004/757/JAI do Conselho, de

25 de outubro de 2004.

7.1 Critério classificativo das substâncias sujeitas a controlo do direito

O Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro consagra o regime jurídico aplicável ao tráfico e

consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas - Artigo 1.º.

A legislação portuguesa, tal como as demais existentes que regulam as drogas, usa o termo

droga “em sentido formal, como referido a todas as substâncias e preparados sujeitos ao controlo” do

Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e na Portaria n.º 94/96, de 26 de Março os “quais incluem as

tabelas anexas às convenções ratificadas por Portugal nesta matéria.”244 Significando assim o termo

droga tanto as substâncias estupefacientes, como as substâncias psicotrópicas.245

O critério adotado pela legislação portuguesa para identificar as substâncias controladas

legalmente segue os termos do critério adotado pela Organização Mundial de Saúde em 1975.

Este critério classificativo baseia-se no nível de perigosidade que a droga provoca no

consumidor. Tendo em conta a dependência física, a tolerância e a psicotoxicidade provocada aparece

a seguinte “«hierarquia» para as principais drogas: opiáceos tipo morfina, heroína, álcool-barbitúricos,

244 Idem, ibidem, pp. 33 e 37

245 No seu sentido etimológico, estupefacientes, são alcaloides que produzem estupefacção/entorpecimento e substâncias psicotrópicas são aquelas que

actuam sobre as funções psíquicas.” Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa,

Quid Juris, p. 27.

78

anfetaminas e sucedâneos, alucinogéneos tipo LSD, cocaína, cannabis, fenacetina, substâncias

voláteis, cafeína e nicotina.”246 Pelo que, a Legislação de Combate à Droga dá ênfase ao grau de

perigosidade que a droga proporciona de consumo abusivo ou de geração de um estado de

dependência.

Adicionalmente ao sentido formal e à acepção científica, cumpre compreender o conceito

droga no seu significado social. É necessário levar em conta a motivação do consumo, “a finalidade

com que se usa a droga, a sua função sociológica, nomeadamente se o fármaco ou a substância são

usados não de acordo com o padrão de uso normal mas para fim diferente dele.”247

A repartição das drogas pelas tabelas das Convenções é realizada segundo o critério da

gravidade das mesmas o que tem repercurssões no nível das sanções penais aplicáveis ao seu

tráfico.248 “A generalidade das legislações utiliza o sistema de listagem taxativa das substâncias (…).

Este sistema tem, segundo Klaus Weber, um efeito constitutivo (eventuais objecções sobre, por

exemplo, a perigosidade de uma substância só podem ser consideradas em termos constitucionais) e

um efeito limitativo (apenas as substâncias indicadas são proibidas).”249 O agrupamento das drogas por

tabelas obedece, assim, ao princípio da tipicidade, porquanto todas as substâncias proibidas são

aquelas que, por decisão das Convenções Internacionais de luta contra a droga, estão especificadas

nas seis tabelas anexas ao Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro. “Estas são as substâncias proibidas,

sendo não proibidas quaisquer outras que não constem das tabelas.”250

De acordo com o art. 3.º da CUE e dos artigos 2.º e 3.º da CSP, as tabelas devem ser

atualizadas sempre que sejam alteradas pelas entidades competentes, após a emissão de parecer ou

de recomendação da Organização Mundial de Saúde – cfr. Art 3.º CUE e arts. 2 e 3.º da CSP. Portugal

e os demais Estados Parte destes Tratados Internacionais assumem a obrigação de integrar nas

tabelas internas de identificação das drogas sujeitas a controlo “as substâncias e preparados

246 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

33.

247 Neste sentido surgem determinados conceitos que explicam o que se entende por uso contrário ao padrão de consumo normal. “O uso abusivo ou

abuso consiste na utilização excessiva, continuada ou esporádica de uma substância, sem relação com a prática médica.” Já a “tolerância é a capacidade

de o organismo para receber uma substância. Acontece que certas substâncias, devido à forma como, ao nível bioquímico, interagem com o organismo

«após um uso repetido e frequente, exigem um aumento progressivo da dose para poder provocar os efeitos originalmente produzidos por uma dose

menor.» E com o aumento das doses vem o aumento dos riscos que acompanham as doses elevadas.” Finalmente, a dependência psíquica ou

“habituação (...) resulta do consumo repetido de uma droga.” Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito

Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, pp. 33 e 37.

248 Os Estados Parte têm a obrigação na adaptação do direito interno de respeitar esses níveis de controlo, sob pena de violação do artigo 8.º, n.º 2 da

Constituição da República Portuguesa.

249 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 27.

250 Idem, ibidem, p. 28.

79

constantes das tabelas anexas àquelas e a adotar as diversas formas de controlo aí prescritas.” 251 252

Nesta medida, fazem parte das tabelas I e II da legislação portuguesa as drogas potencialmente mais

perigosas que correspondem às “tabelas I, II e IV, da CUE e das tabelas I, II e III, da CSP.”253

Assim, o “modelo jurídico-moral põe o acento na periculosidade da droga e no conceito de

legalidade versus ilegalidade, preconizando o que pode chamar-se de educação pelo medo.”254

7.2 O crime de tráfico de droga

O tipo fundamental do tráfico de droga está previsto no artigo 21.º, n.º 1255, segundo o qual:

“Quem, sem para tal se encontrar autorizado256, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer,

puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem,

transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo

40.º257, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de

prisão de 4 a 12 anos.”

O mesmo tipo legal, nos seus números 2 e 3, pune, com uma moldura penal mais elevada

face ao n.º 1, as condutas em que o infrator recorra aos expediente de obtenção de uma autorização

na tentativa de melhor ocultar a ilicitude do seu comportamento. Assim, “2 - Quem, agindo em

contrário de autorização concedida nos termos do capítulo II, ilicitamente ceder, introduzir ou

diligenciar por que outrem introduza no comércio plantas, substâncias ou preparações referidas no

251 Idem, ibidem, pp. 26 e 27.

252 Note-se que, de acordo com o artigo 39.º da CUE e artigo 23.º da CSP, as Partes têm a faculdade de adotar medidas de fiscalização mais restritas e

severas do que as contempladas nas convenções se as considerarem necessárias para a defesa da saúde e a respetiva Constituição o permitir. Idem,

ibidem, p. 27.

253 Idem, ibidem, p. 35.

254 Martins A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito – Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

60. 255 O artigo 21.º caracteriza-se por ter uam “estrutura progressiva (...) pretendendo abarcar a multiplicidade de condutas em que se pode desdobrar a

actividade ilícita relacionada com o tráfico de droga. Tal preocupação, de perfil transversal, concretiza-se, com a integração vertical vertida em três tipos

legais fundamentais que revelam a maior ou menor gravidade desta actividade em relação ao tipo fundamental daquele artigo 21, ou seja, o artigo 24 no

sentido agravativo e o artigo 25 do mesmo diploma no sentido atenuativo.” Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 1/6/2011, proferido no processo

n.º 2/06.3PJLRS, pelo Juíz Relator Santos Cabral.

Disponível em: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/86885a1d72ac068780257919005aa9ca?OpenDocument.

256 Segundo o art. 4.º, n.º 1, a competência para estabelecer condicionamentos e conceder autorizações para a comercialziação de estupefacientes

compete ao Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED). 257 A norma do artigo 40.º foi parcialmente revogada pela Lei 30/2000, de 29 de Novembro. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça uniformizador de

Jurisprudência (AUJ) n.º 8/2008, de 25-06-2008, de 05-08-2008, fixou jurisprudência no sentido de que, apesar desta revogação parcial, «o artigo 40.º,

n.º 2, do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, manteve-se em vigor não só quanto ao cultivo como relativamente aquisição ou detenção, para consumo

próprio, de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual

durante o período de 10 dias». Disponível em:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4aa9050bce1787e28025790b004d3448?OpenDocument.

80

número anterior é punido com pena de prisão de 5 a 15 anos. 3 - Na pena prevista no número anterior

incorre aquele que cultivar plantas, produzir ou fabricar substâncias ou preparações diversas das que

constam do título de autorização.”

Finalmente, no n.º 4 encontramos a punição do tráfico e outras atividades ilícitas referentes

aos barbitúricos de acção lenta que possuam comprovados efeitos antiepilépticos e as substâncias de

tipo ansiolítico que, pela sua composição quantitativa e qualitativa e modalidade do respectivo uso,

apresentem risco de abuso. A gradação mais ajustada da moldura penal (pena de prisão de um a cinco

anos) assenta “na aferição científica rigorosa da perigosidade das drogas nos seus diversos aspetos”.258

O bem jurídico-penal tutelado pela norma incriminadora do tráfico de droga é a saúde pública.

“Protege-se pois a saúde pública, no seu sentido mais amplo, nas suas componentes física e mental,

em ordem a garantir um desenvolvimento são, seguro e livre dos cidadãos e da sociedade, face aos

perigos representados pelo consumo e tráfico de drogas, atentatórios da dignidade humana.”259 Certo é

ainda que o tipo incriminador protege uma multiplicidade de valores fundamentais que a comunidade

reporta como fundamentais. ”Para além do mais, (…) são apontados como abrangidos pelo âmbito de

tutela da norma penal “a protecção da economia do Estado, que pode ser completamente desvirtuada

nas suas regras (…) com a existência desta economia paralela ou subterrânea erigida pelos

traficantes”260 e o “custo social e económico do abuso de drogas (...) se atentarmos nos crimes e

violências que origina e na erosão de valores que provoca.”261

Ora, a finalidade da norma é o combate da degradação e destruição da própria humanidade

causados pelo consumo de drogas que o tráfico fomenta.262

Sendo o tráfico de droga uma atividade assumidamente perigosa para a preservação da saúde

pública, a lesão efetiva na saúde de alguém é presumida pela norma incriminadora, o que constitui o

crime de tráfico de drogas como um crime de perigo abstrato. “O crime consuma-se com a actividade

do tráfico, esgota-se nela, sem necessidade de produção de um efeito exterior separável espáci-

temporalmente.”263 Isto é, “não exige o dano nem o perigo de um dos concretos bens jurídicos

258 Prêambulo do próprio Decreto-Lei.

259 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 43.

260 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito - Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

122.

261 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 1/6/2011, proferido no processo n.º 2/06.3PJLRS, pelo Juíz Relator Santos Cabral.

Disponível em: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/86885a1d72ac068780257919005aa9ca?OpenDocument.

262 “Na Convenção de 1988, que inspira a presente lei, pode ler-se que a produção, procura e tráfico de estupefacientes e psicotrópicos, “representam yma

grave ameaça para a saúde e bem estar dos indivíduos e provocam efeitos nocivos nas bases económicas, culturais e políticas da sociedade”.” Lobo,

Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 43.

263 Idem, ibidem, p. 44.

81

protegidos com a incriminação, mas apenas a perigosidade da ação para as espécies de bens jurídicos

protegidos.”264 265

A descrição típica desta norma tem por fonte o artigo 3.º, n.º 1, a) da Convenção de 1988 que

alerta para incriminação de todas as condutas previstas no artigo 21.º. Pelo que, “são elementos

objectivos do tipo de crime de tráfico de estupefacientes previsto neste artigo: (I) A prática não

autorizada de qualquer das actividades descritas no normativo, (II) a não verificação de actividade de

cultivo, aquisição ou detenção, com finalidade de consumo pessoal exclusivo, (III) a existência de

plantas, substâncias ou preparações, compreendidas nas tabelas anexas I, II, III e IV (não nas tabelas V

e VI, estas a punir pelo art. 25.º).” 266 As condutas descritas na norma incriminadora são alternativas

entre si267, bastando a prática de qualquer uma delas para se ter por preenchido o tipo objetivo, sem

prejuízo da punição da prática conjunta das condutas típicas.268

Para a afirmação do tipo subjetivo do crime é necessário, diante da globalidade factual típica,

aferir do escopo do agente quanto ao destino da droga, para se poder afirmar a perpretação do crime

tráfico de drogas com dolo. Exige-se, assim, para a consumação deste tipo de ilícito “a vontade de

desenvolver sem autorização e sem ser para consumo269, as actividades descritas no tipo e a

representação e o conhecimento por parte do agente da natureza e características estupefacientes do

produto objecto da acção e uma actuação deliberada, livre e consciente de ser proibida a conduta.”270

Apesar de o tráfico de drogas visar essencialmente o lucro, no que tange a intenção lucrativa,

este elemento não faz parte do tipo de ilícito. Todavia, “ela pode não ser indifirente quer em termos de

264 Rocha, João Luís de Moraes (1994). Droga – Regime Jurídico, Legislação Nacional – anotada, Diplomas Internacionais. Lisboa: Livraria Petrony, Lda., p.

61.

265 O Professor Dr. Figueiredo Dias distingue nos crimes de perigo, os crimes de perigo concreto e os crimes de perigo abstrato. Ao contrário daqueles, em

que o tipo de ilícito só se preenche quando o bem jurídico tenha comprovadamente sido posto em perigo, nestes, a norma incriminadora presume de

modo absoluto o perigo que aquela conduta provoca numa ou em várias espécies de bem jurídicos protegidos. Ou seja, “Nos crimes de perigo abstrato

o perigo não é elemento do tipo, mas simplesmente motivo da proibição. (...) neste tipo de crimes são tipificados certos comportamentos em nome da sua

perigosidade típica para um bem jurídico, mas sem que ela necessite de ser comprovada no caso concreto (...).” Verificámos que, quanto ao bem jurídico,

o crime de tráfico de drogas assume esta natureza. Nestes sentido, a prática de qualquer uma das condutas descritas no tipo fundamental do artigo 21.º

constitui por si só uma ameaça grave para a saúde pública. Dias, Jorge Figueiredo (2007). Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais, A

Doutrina Geral do Crime (2ª ed.), Coimbra Editora, p. 309.

266 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 48.

267 O tipo de ilícito de tráfico de drogas trata-se de um “crime exaurido”, “crime de empreendimento” ou “crime excutido”, que se vem caracterizando como

um ilícito penal que fica perefeito com o preenchimento de um único acto conducente ao resultado previsto no tipo.” Idem, ibidem, p. 53.

268 “Importa ter em atenção as diversificadas acções previstas no tipo, que na comissão de outr infracção se poderiam qualificar como meros actos

preparatórios, ou de simples auxílio, mas na economia dos crimes de perigo abstracto, perfectibilizam-se, mesmo individualmente considerados, como

puros actos de execução integrantes do tipo (vg. a detenção, o transporte, o oferecimento…).” Idem, ibidem, p. 49.

269 A “prova de que o cultivo, aquisição ou detenção é para consumo próprio, claramente exclui o tráfico e a não prova de que o cultivo, aquisição ou

detenção é para consumo próprio, admite o tráfico.” Pelo que, a prática de diversa conduta tipificada que não as três mencionadas constitui de imediato a

prática do crime de tráfico de drogas. Idem, ibidem, p. 49.

270 Idem, ibidem, p. 51.

82

punição quer como elemento relevante quando se pretende integrar o tipo de crime praticado.” Ou

seja, “pode a existência (ou não) de intenção lucrativa e a sua intensidade e desenvolvimento serem

decisivos para auxiliar no enquadramento legal do arguido como grande, médio ou pequeno traficante

ou traficante-consumidor.” É ainda crucial na apreciação do circunstancialmento global dos factos, “o

conhecimento da personalidade do arguido, do seu habitat – se era um «dealer» de apartamento ou de

rua, se era um simples intermediário – e, em particular, se não era consumidor de droga, se era um

consumidor ocasional ou se era já um consumidor habitual ou mesmo um toxicodependente.”271 Ainda,

a apreensão da droga na posse ou esfera de disponibilidade do arguido não é necessária para a prova

da prática do crime de tráfico.

O que é necessário saber para que se possa consumar o crime de tráfico de droga é se o

agente pretende utilizar a droga que possui ou detem para consumo próprio ou se para a traficar. Esta

intenção concreta terá que ser inferida de elementos acidentais de qualquer natureza, dede que sejam

provados. Exemplificando, a quantidade de droga detida ou o agente ser consumidor ou não são

circunstâncias de extremo relevo no enquadramento legal. “Todavia, outros são utilizáveis para

patentear a intenção do arguido: se tinha em seu poder balanças de precisão, pequenas bolsas ou

materiais para embalagens, doses já preparadas, substâncias destinadas a «cortar» a droga, vestígios

de manipulação, quantidades apreciáveis de dinheiro ou de outros valores (em conjugação com o seu

nível anterior de vida), uma organização empresarial, ainda que rudimentar, todos serão, em princípio,

indicadores de tráfico.” Ainda, “se a droga foi encontrada fora do domicílio, se na vigilância policial

exercida se detectaram entradas e saídas de pessoas conhecidas como toxicodependentes, com

permanências leves, serão outros elementos a apontar para o tráfico.”272

A severidade das penas aplicáveis aos traficantes tem por fonte as Convenções, mais

concretamente as normas do artigo 36.º da CUE e do artigo 22.º da CSP que dispõem sobre as regras

gerais que os Estados Parte devem adotar na incriminação do tráfico de drogas. A primeira impõe “que

os actos indicados (nas mesmas) quando intencionais, sejam passíveis de castigo adequado,

nomeadamente por meio de pena de prisão ou outra pena privativa da liberdade”, a segunda impõe

que a diversidade da punição “conforme a potencial perigosidade da droga traficada,” verificando-se,

“alguma graduação consoante a sua posição nas tabelas I a III ou na tabela V. Quanto às tabelas V e VI

não existe diferenciação.”273

271 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito - Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, pp.

125 e 126. 272 Idem, ibidem.

273 Idem, ibidem, p. 123.

83

Assim, a norma do artigo 21.º consagra o “tipo matricial ou tipo-base do crime de tráfico de

estupefacientes, (...) tipo esse que, pela amplitude da respectiva moldura penal – 4 a 12 anos de

prisão - e pela multifacetada descrição típica, abrange os casos mais variados de tráfico de

estupefacientes, considerados dentro de uma gravidade mínima, mas já suficientemente acentuada

para caber no âmbito do padrão de ilicitude requerido pelo tipo, cujo limite inferior da pena aplicável é

indiciador dessa gravidade, e de uma gravidade máxima, correspondente a um grau de ilicitude muito

elevada – tão elevada que justifique a pena de 12 anos de prisão. Esse tipo fundamental corresponde,

pois, genericamente, a casos que são já de média e de grande gravidade.”274

7.3 Crime de tráfico de droga agravado

O artigo 24.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, prevê “uma enumeração taxativa das

agravantes da medida das penas previstas nos art.s 21.º (e) 22.º.”275

As penas previstas nestes artigos são aumentadas de um quarto nos seus limites mínimo e

máximo se:

a) As substâncias ou preparações foram entregues ou se destinavam a menores ou diminuídos

psíquicos;

b) As substâncias ou preparações foram distribuídas por grande número de pessoas;

c) O agente obteve ou procurava obter avultada compensação remuneratória;

d) O agente for funcionário incumbido da prevenção ou repressão dessas infracções;

e) O agente for médico, farmacêutico ou qualquer outro técnico de saúde, funcionário dos

serviços prisionais ou dos serviços de reinserção social, trabalhador dos correios, telégrafos,

telefones ou telecomunicações, docente, educador ou trabalhador de estabelecimento de

educação ou de trabalhador de serviços ou instituições de acção social e o facto for praticado

no exercício da sua profissão;

f) O agente participar em outras atividades criminosas organizadas de âmbito internacional;

g) O agente participar em outras actividades ilegais facilitadas pela prática da infracção;

h) A infracção tiver sido cometida em instalações de serviços de tratamento de consumidores

de droga, de reinserção social, de serviços ou instituições de acção social, em estabelecimento

274 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, datado de 2/12/2013, proferido no âmbito do processo 116/11.8JACBR.S1, pelo Juíz Relator Rodrigues da

Costa. Disponível em:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b0c0b8fb08037ef180257c66003f610c?OpenDocument.

275 Rocha, João Luís de Moraes (1994). Droga – Regime Jurídico, Legislação Nacional – anotada, Diplomas Internacionais. Lisboa: Livraria Petrony, Lda., p.

81.

84

prisional, unidade militar, estabelecimento de educação, ou em outros locais onde os alunos

ou estudantes se dediquem à prática de actividades educativas, desportivas ou sociais, ou nas

suas imediações;

i) O agente utilizar a colaboração, por qualquer forma, de menores ou de diminuídos psíquicos;

j) O agente actuar como membro de bando destinado à prática reiterada dos crimes previstos

nos artigos 21.º e 22.º, com a colaboração de, pelo menos, outro membro do bando;

l) As substâncias ou preparações foram corrompidas, alteradas ou adulteradas, por

manipulação ou mistura, aumentando o perigo para a vida ou para a integridade física de

outrem.”

O artigo 24.º consagra o tipo qualificado do tráfico de droga “que se aplica quando o tipo base

do art. 21.º se mostre afectado por um especial e mais intenso juízo de censuro relativamente à

ilicitude e ou à culpa, nos termos ali descritos.”276 Esta norma consagra, portanto, circunstâncias,

referentes “ao agente, à forma, ao local e modo de execução do facto”, agravativas dos limites mínimo

e máximo da pena abstratamente aplicável ao tipo base de tráfico de drogas. “No tráfico qualificado, os

elementos agravantes, não se referem ao chamado tipo de culpa (desvalor da atitude) mas antes ao

tipo de ilicitude (desvalor da acção). Há aqui, na acção típica, um maior desrespeito por um normal

padrão axiológico vigente na sociedade (…),” a que corresponde um “um juízo especial de censura da

ilicitude.”277

Nesta medida, pasas-se a concretizar a ratio de cada uma das circunstâncias modificativas

agravantes especiais consagradas neste artigo.

A circunstância qualificativa prevista nas alíneas a) e i) “visa especialmente proteger os

menores e os diminuídos psíquicos dos malefícios da droga. Os menores e os diminuídos psíquicos

constituem dois grupos de risco, ou seja, especialmente desprotegidos face à droga, os primeiros

dados à personalidade recetiva e imatura e o segundo mercê da sua especial suscetibilidade ao

consumo ilícito.”278 O que difere estas duas qualificativas é que “enquanto na al. a) os menores e/ou os

diminuídos psíquicos são os destinatários do tráfico, na al. i) eles são utilizados como colaboradores na

operação de tráfico.”279

276 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 52.

277 Idem, ibidem, pp. 66 e 67.

278 Rocha, João Luís de Moraes (1994). Droga – Regime Jurídico, Legislação Nacional – anotada, Diplomas Internacionais. Lisboa: Livraria Petrony, Lda.,

pp. 82 e 83.

279 Este preceito refere-se à menoridade enquanto categoria etária inferior a 18 anos, de acordo com o artigo 122.º do Código civil e o “termo diminuído

psíquico deve ser interpretado no seu sentido vulgar, o conceito é suficientemente amplo para abarcar todas as doenças psicopatológicas. A afeção

psíquica terá de ser notória ou sensível.” Idem, ibidem, pp. 82 e 83.

85

Quanto à circunstância qualificativa prevista na al. b), “pune-se a potenciação do risco a

prevenir, representado pela maior disseminação da droga.”280 Assim, a distribuição “terá de ser por

elevado número de pessoas.”281

A agravante prevista na al. c) “visa punir os maiores lucros ilícitos obtidos com o tráfico. Deve

te-se presente que a «avultada compensação remuneratória», refere-se em primeiro lugar, aos lucros

individuais/pessoais de cada traficante, em segundo lugar, refere-se tanto aos lucros passados como

futuros;”282 Assim, “não basta que exista lucro para o funcionamento da agravante (...), ele terá de ser

avultado, i.e., significativo, que dado o seu vulto se evidêncie.”283

Nesta agravante, o legislador não exige que o funcionário284 incumbido da prevenção ou

repressão das infrações previstas nos art.s 21.º a (22.º) atue no exercício de funções”285, sendo, assim,

suficiente que se tenha este cargo profissional. O que sustenta esta qualificativa é “a condição de

funcionário e as suas funções (…) e não a categoria profissional, que é indiferente.”286

Por sua vez, ”na alínea e) acrescentaram-se algumas profissões às mencionadas na alínea d)

anterior, onde se detecta especial responsabilidade e também risco de cometimento destas infracções,

desde que venham a ser cometidas no exercício dessa profissão (...).”287 Esta agravante “fundamenta-

se na especificidade da profissão que, por um lado, permite maior difusão e amplitude de actividade,

por outro, sobre elas faz impender uma especial obrigação de não cometimento do tipo de delitos “in

casu”. Daí que as razões de prevenção se coloquem de forma insistente.” Acresce que, a

“responsabilidade criminal coexiste com a responsabilidade disciplinar, sendo caso.”288

Relativamente à qualificativa da al. f), “agrava-se a responsabilidade do agente que participa

em organizações criminosas internacionais para qualquer fim ilícito, i.e., independentemente de serem

dedicadas ou não ao tráfico de droga.” 289

No que concerne à qualificativa constante da al. g), “agrava-se a responsabilidade de quem

praticando um crime de tráfico, comete ilegalidades (…) associadas ao tráfico ou por ele promovidas ou

facilitadas,” pelo que “o termo actividade ilegal (...) é mais amplo do que actividade criminosa”. 290

280 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 69.

281 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit., p. 83.

282 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 69.

283 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit., p. 83.

284 O conceito legal está revisto no artigo 386.º do Código Penal.

285 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit., p. 82.

286 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 72.

287 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, pp.

143 e 144.

288 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit, pp. 82 e 83.

289 Idem, ibidem, p. 75.

86

Na alínea h) é punível “a quebra da relação de confiança, que merecem certas instalações e

locais e as suas imedidações, nos quais o agente desenvolve as actividades ilícitas, prima facie,

aqueles locais onde existem actividades clínicas, sociais, educativas, sociais ou de reclusão que devem

ser locais de vida ou de recuperação de vida e não de vícios.”291 Acresce que, o ” termo imediações (…)

significa cercania, arredor ou vizinhança.” 292

A qualificativa referida na alínea j), carreia o conceito de «bando» (associação destinada à

prática de crimes indeterminados).”293 Pune-se, assim, “o maior perigo representado pelos bandos

especializados na prática do tráfico à semelhança das associações criminosas, basta duas pessoas

para constituir um bando.”294

Por fim, a agravante prevista na al. l) tem que ver com a acentuada “potencialidade lesiva.”295

Tal como as tabelas de identificação de drogas se diferenciam pela perigosidade potencial das mesma,

esta qualificativa deriva do fundamento base da punição, reforçando a tutela pelos métodos

apreendidos que visam modificar para pior a droga e aumentar os lucros dos traficantes.

“Etimologicamente os conceitos de corrompido, alterado e adulterado são semelhantes, evocando a

ideia de modificação das características genuínas para pior.” Nesta medida, “o conceito de substâncias

ou preparações corrompidas sublinha a ideia de a anormalidade se revelar na decomposição ou

putrefacção ou em apresentação repugnante. Por seu turno, o conceito de alteração sublinha a

modificação da natureza, composição ou qualidade capaz de induzir o consumidor em erro.

Finalmente, adulterada significará alterações para pior. Manipulação é o acto de manipular, i.e.,

arranjar, preparar com as mãos. Mistura, no contexto do preceito, significará adição de substâncias

estranhas.”296

Assim, estas circunstâncias qualificativas297 de natureza heterogénea consagram os “casos

excepcionalmente graves (de tráfico de estupefacientes). (...) O art. 24.º, ao agravar «as penas

previstas no art. 21.º», pressupõe que a ilicitude da conduta corresponde em princípio ao padrão

290 Idem, ibidem.

291 Idem, ibidem.

292 Exemplificando, é o caso de todos os estabelecimentos de bebidas. “O café (...) pode ser local privilegiado de actividade social estudantil, integrando a

agravação prevista na al. h) do art. 24.º.” Idem, ibidem, p. 83.

293 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

144.

294 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 78. 295 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários, Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

144.

296 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit, pp. 83 e 84.

297 “Circunstâncias são, nesta acepção, pressupostos ou conjuntos de pressupostos que, não dizendo directamente respeito nem ao tipo-de-ilícito (objectivo

ou subjectivo), nem ao tipo-de-culpa, nem mesmo à punibilidade em sentido próprio, todavia contendem com a maior ou menor gravidade do crime como

um todo e relevam por isso directamente para a doutrina da determinação da pena».” Idem, ibidem.

87

normal inerente ao tipo matricial, mas a que acrescem circunstâncias agravativas que fazem aumentar

de um quarto os limites mínimo e máximo, já de si bastante elevados.”298 É necessário a verificação do

dolo na prática das circusntancias agravantes para se ter por consumado o tráfico de drogas ou de

precursores qualificados.

7.4 O crime de tráfico de menor gravidade

O artigo 25.º, epigrafado “Tráfico de menor gravidade”, prescreve que: “Se, nos casos dos

artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta

nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a

quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de:

a) Prisão de um a cinco anos, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações

compreendidas nas tabelas I a III, V e VI;

b) Prisão até 2 anos ou multa até 240 dias, no caso de substâncias ou preparações

compreendidas na tabela IV.”

Esta norma consagra o crime de tráfico de estupefacientes privilegiado que pressupõe que a

ilicitude do facto seja consideravelmente diminuída. Pelo que “o que releva é a imagem global do facto,

tudo dependendo da apreciação e consideração conjuntas das circunstâncias, factores ou parâmetros

mencionados” no tipo legal. 299 Convoca-se aqui o bem jurídico e a natureza do crime consagrados nos

artigos 21.º e 22.º. A aplicação do art. 25.º pressupõe necessariamente o preenchimento dos tipos

base do artigo 21.º ou do art. 22.º .

As causas de atenuação previstas no art. 25.º não são taxativas e têm que ver com os meios

utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas,

substâncias ou preparações.

No que se refere aos meios utilizados, a ilicitude refere-se “ao nível organizacional e logístico

atingido pela actividade delituosa”, ou seja, “tudo o que se reporta aos meios físicos afectos ao tráfico

(…).”300

298 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 2/12/2013, proferido no âmbito do processo 116/11.8JACBR.S1, pelo relator Rodrigues da Costa.

Disponível em:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b0c0b8fb08037ef180257c66003f610c?OpenDocument

299 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 82. 300 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 87.

88

A quantidade referida no preceito há-de considerar os limites quantitativos para cada dose

média individual diária. Nos termos do artigo 2.º, n.º 2 da Lei 30/2000, de 29 de Novembro, a

aquisição e a detenção para consumo próprio das substâncias (…) não poderão exceder a quantidade

necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias. Ora, são consideradas

doses diárias as quantidades previstas na Portaria 94/96, de 26 de Março, mais concretamente no

mapa que lhe está anexo, para efeitos de distinção entre posse para consumo e tráfico.

A apreciação, casuística, da quantidade tem em conta múltiplos fatores tais como, “a

qualidade da substância, tipo e grau de misturas introduzidas, etc.” Daí que se proceda à realização do

exame laboratorial através do qual se “identifica e quantifica a planta, substância ou preparação

examinada, bem como o respetivo princípio activo ou substância de referência – 10º, n.º 1 da Portaria

94/96, de 26 de Março, para o qual remete o artigo 62.º 2, n.º 1 e 2 da Legislação de combate à

droga. Assim, “a expressão qualidade deve ser entendida como grau de pureza”, como “uma das

condicionantes dos efeitos mais ou menos gravosos.”301

Quanto à modalidade ou circunstâncias da ação, esta circunstância refere-se à “forma de

actuação do agente, ou agentes, do seu «modus operandi»”.302

Dado que o tipo privilegiado consagra, de modo meramente indicativo, circunstânciais

atenuantes da ilicitude, cumpre à jurisprudências preencher os conceitos indeterminados utilizados

pelo legislador.

O Supremo Tribunal de Justiça303 considerou, assim, “que o agente do crime de tráfico de

menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias

seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas:

a) A actividade de tráfico é exercida por contacto directo do agente com quem consome

(venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com

os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico,

internet);

b) Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um

dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar

301 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit., p. 87.

302 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 87.

303 Este acórdão teve uma declaração de vencido nesta parte pelo Juíz Conselheiro Rodrigues da Costa ao declarar o seguinte: “discordo da parte em que

se tentam fixar as circunstâncias que deveriam ocorrer tendencialmente de forma cumulativa para definir o âmbito normativo desse tipo legal. Entendo que

não compete ao aplicador do direito fixar, de uma forma tendencialmente geral e abstracta, circunstâncias, elementos, pressupostos ou actuações-padrão

em que se deve concretizar uma determinada conduta típica, ou melhor dizendo, um determinado tipo de ilicitude. É essa uma tarefa regulamentadora

que não pode confundir-se com a elaboração jurisprudencial. Acresce que, no caso, a pretexto de uma concretização, ainda que não exaustiva, dos

elementos consubstanciadores da ilicitude consideravelmente diminuída postulada pelo art. 25.º do DL 15/93, de 22/01, se utilizam com frequência

outros conceitos indeterminados, que acrescem aos da própria lei, quando se pretendia concretizá-los.”

89

todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que

ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período

de tempo razoavelmente curto;

c) O período de duração da actividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que

não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam

sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza

os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em

que aquele período poderá ser mais dilatado;

d) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas.

e) Os meios de transporte empregues na dita actividade são os que o agente usa na vida diária

para outros fins lícitos;

f) Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares

dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras

pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente,

no consumo próprio de produtos estupefacientes;

g) A actividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita;

h) Ainda que se verifiquem as circunstâncias mencionadas anteriormente, não podem ocorrer

qualquer das outras mencionadas no art.º 24.º do DL 15/93.”304

Este tipo legal consagra, portanto algumas circunstâncias que não se enquadra no médio e grande

tráfico, pois consagra “fazendo baixar a ilicitude para um limiar inferior ao requerido pelo tipo-base, não

justificam (desde logo por violação do princípio da proporcionalidade derivado do art. 18.º da

Constituição) a grave penalidade prevista na moldura penal estabelecida para o tráfico normal (...).”305

Nesta medida, estão incluídos no crime de tráfico de droga priviligeado “todos os casos de menor

gravidade», ou seja, o «pequeno tráfico», o «pequeno retalhista de rua», surgindo, assim, como “uma

válvula de segurança para que situações efectivas de menor gravidade não sejam tratadas com penas

desproporcionadas ou que, ao invés, se force ou se use indevidamente uma atenuante especial.”306307

304 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/11/2011,, proferido no âmbito do 127/09.3PEFUN.S1, pelo Juíz Relator Santos Carvalho. Disponível

em: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9961da644ecd915e8025795200362d57?OpenDocument.

305 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 2/12//2013, proferido no âmbito do processo 116/11.8JACBR.S1, pelo Juíz Relator Rodrigues da

Costa. Disponível em:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b0c0b8fb08037ef180257c66003f610c?OpenDocument.

306Martins, A. G. Lourenço (1994) Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários, Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p. 146.

307 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/11/2011,, proferido no âmbito do 127/09.3PEFUN.S1, pelo Juíz Relator Santos Carvalho.

90

7.5 O crime de tráfico de precursores

O direito internacional comum tem como objetivo a luta do desvio das substâncias químicas e

dos equipamentos para o mercado ilícito de drogas. O tipo incriminador do artigo 21.º “expressa a

importância com o cultivo, a produção, o fabrico e a detenção ilícita de precursores, i.e, substâncias

que não sendo estupefacientes ou psicotrópicos, estão contudo na base da sua composição e que

estão elencadas nas tabelas IV, V e VI e a necessidade do seu controlo.”308 Pelo que, “o desvio de

precursores para o fabrico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas constitui um tipo

legal imposto pela Convenção de 1988309”310

Nos termos do artigo 22.º, n.º 1, é proibido, na ausência de autorização, fabricar, importar,

exportar, transportar ou distribuir equipamento, materiais ou substâncias inscritas nas tabelas V e VI,

quando o infrator saiba que são ou vão ser utilizados no cultivo, produção ou fabrico ilícitos de

estupefacientes ou substâncias psicotrópicas. A moldura penal é de pena de prisão de 2 a 10 anos. A

detenção, por qualquer título, implica uma moldura penal de pena de prisão de um a cinco anos, nos

termos do n.º 2.

À semelhança do artigo 21.º, o “preceito prevê o agravamento da pena no caso de o agente

ser titular de autorização legal para importar, exportar ou fabricar substâncias precursoras e as destinar

ou saber que se destinam à produção ilícita de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas.” Ou seja,

no caso do n.º1, do artigo 22.º, a pena é de prisão de 3 a 12 anos e no caso do n.º 2, a pena é de

prisão de dois a oito anos. “As sistuações contempladas nos n.ºs 1 a 3 do preceito (...) podem, ainda,

ser agravadas na respetiva penalidade por força do disposto no art. 24.º.”311

A norma incriminadora do artigo 21.º está previsto um crime de perigo, sendo que se apontam

“dois pressupostos de cometimento desta infracção: a) um de carácter negativo, que a pessoa não se

encontre autorizada, (nos termos legalmente previstos); b) que se verifique o nexo finalístico entre a

prática da acção e o conhecimento de que os materiais, equipamentos ou substâncias são (estão a

ser) utilizados ou vão sê-lo, no cultivo, produção ou fabrico de droga.”312 É necessário a prática deste

crime com dolo “pois se produtos, equipamentos e materiais que existem apenas servem para o

fabrico de estupefacientes ou de substâncias psicoatrópicas, o que em regra se verifica é que aqueles

308 Lobo, Fernando Gama (2010). Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência (2.ª ed. rev. e aumentada). Lisboa: Quid Juris, p. 60.

309 Esta obrigação decorre das disposições constantes dos artigos 3.º, n.º 1, al.s a), IV) e ii), 12.º e 13.º da Convenção de 1988.

310 Rocha, João Luís de Moraes, ob. cit., p. 73.

311 Idem, ibidem, p. 75.

312 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

131.

91

servem necessidades legítimas. Por outro lado, o tráfico de precursores apenas se verifica na ausência

de autorização para as atividades constantes do preceito e constitui um crime de perigo, bastando para

a sua verificação a perigosidade da ação.”313

7.6 O crime de associação de traficantes

O artigo 28.º pune com pena de prisão de 10 a 25 anos aquele que promover, fundar ou

financiar grupo, organização ou associação de duas ou mais pessoas que, actuando concertadamente,

vise traficar droga ou precursores (n.º1). O mínimo legal aumenta para 12 anos de prisão para aquele

que chefiar ou apoir o grupo, organização ou associação de traficantes (n.º 3). A moldura penal diminui

para 5 a 15 anos de prisão para quem colabore direta ou indireta, aderir ou apoiar o grupo,

organização ou associação (n.º3).

Ainda prevê o n.º 2 que, “Se o grupo, organização ou associação tiver como finalidade ou

atividade a conversão, transferência, dissimulação ou receptação de bens ou produtos dos tráficos, o

agente é punido, no caso dos n.os 1 e 3, com pena de prisão de 2 a 10 anos (a)) e no caso do n.º 2,

com pena de prisão de um a oito anos (b)).

Finalmente, prevê o n.º 4 que, se o grupo, organização ou associação tiver como finalidade ou

actividade a conversão, transferência, dissimulação ou receptação de bens ou produtos dos crimes do

tráfico de drogas e ou de precursores, o agente é punido nos casos dos n.os 1 e 3, com pena de prisão

de 2 a 10 anos (a)) e no caso do n.º 2, com pena de prisão de um a oito anos (b)).

A severidade das penas previstas nesta incriminação é similar, se bem que mais intensa para

quem promover, fundar ou financiar um aglomerado de traficantes, à severidade das penas que se

destinam a reprimir o terrorismo.314 Esta associação de deliquentes tem “uma posição homóloga da das

associações terroristas.”315

Quanto ao bem jurídico, à associação criminosa está imanente um elevado grau de

perigosidade, pelo que o valor fundamental que se pretende tutelar com esta incriminação é a paz

pública, sendo, ainda, um crime de perigo abstrato. Com este tipo legal, “o que se pune é mais do que

313 Idem, ibidem, p. 74.

314 A Lei de Combate ao Terrorismo prevê no artigo 2.º, a seguinte incriminação: “2 - Quem promover ou fundar grupo, organização ou associação

terrorista, a eles aderir ou os apoiar, nomeadamente através do fornecimento de informações ou meios materiais, é punido com pena de prisão de 8 a 15

anos.

3 - Quem chefiar ou dirigir grupo, organização ou associação terrorista é punido com pena de prisão de 15 a 20 anos.

4 - Quem praticar actos preparatórios da constituição de grupo, organização ou associação terrorista é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

315 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

168.

92

a específica criminalidade que as associações criminosas desenvolvem. O que se pune é o nível

organizacional que atingiram e que representam um grave perigo para os bens comunitários.”316

Este tipo de ilícito encontra-se preenchido com a verificação dos seguintes elementos: “existência

de uma associação criminosa para o tráfico de estupefacientes através da união paralela de várias

pessoas, operando para a realização de proventos pelo comércio da droga, valorizando-se os vínculos

que, de maneira durável, ligam os fornecedores, os vendedores e pequenos distribuidores; não

constitui obstáculo ao vínculo associativo a diversidade de escopos pessoais e diferentes utilidades que

cada um se propõe receber, sempre que da parte de todos haja a consciência de operar no âmbito de

uma organização e de contribuir com a sua acção para o fim comum de tirar proveito do comércio da

droga (...).”317

Encontra-se tipificado no art. 28.º, n.º 4 a associação criminosa com o propósito de branquear os

capitais decorrentes do tráfico de drogas ou de precursores. “O branqueamento é um forte indício de

crime organizado, uma vez que exige meios que só estão ao alcance de entidades dotadas de uma

certa estrutura capaz de levar a cabo essa tarefa.” Assim, “quando o branqueamento é ele próprio o

fim da actividade ilícita e se desenvolve no âmbito do tráfico, por um grupo, organização ou

associação”318 é punido nos termos deste artigo.

Pode verificar-se um concurso real entre crimes porquanto “o crime de associação criminosa para

a prática de actividades de tráfico de droga ou para a prática de branqueamento de bens e capitais

provenientes do tráfico, é um crime autónomo dos próprios crimes de tráfico.” Neste sentido, é

prescindível a efetiva condenação pelo crime de tráfico, sendo “necessário à condenação do crime de

associação criminosa (…) a prova do substrato organizacional e da intenção de o pôr ao serviço de um

fim criminoso.”319

7.7 A contraordenação por tráfico de novas substâncias psicoativas

O Decreto-Lei n.º 54/2013, de 17 de abril “define o regime jurídico da prevenção e proteção

contra a publicidade e o comércio das novas substâncias psicoativas.”320

O sistema jurídico português considera “novas substâncias psicoativas as substâncias não

especificamente enquadradas e controladas ao abrigo de legislação própria que, em estado puro ou

316 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 96.

317 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas Editorial Notícias, p.

169.

318 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., pp. 63 e 64. 319 Lobo, Fernando Gama, ob. cit., p. 96.

320 Art. 1.º do Decreto-Lei n.º 54/2013, de 17 de abril.

93

numa preparação, podem constituir uma ameaça para a saúde pública comparável à das substâncias

previstas naquela legislação, com perigo para a vida ou para a saúde e integridade física, devido aos

efeitos no sistema nervoso central, podendo induzir alterações significativas a nível da função motora,

bem como das funções mentais, designadamente do raciocínio, juízo crítico e comportamento, muitas

vezes com estados de delírio, alucinações ou extrema euforia, podendo causar dependência e, em

certos casos, produzir danos duradouros ou mesmo permanentes sobre a saúde dos consumidores.”321

As novas substâncias psicoativas são as 159 substâncias que constam nas 7 categorias da

Portaria n.º 154/2013 de 17 de abril, “bem como os derivados, os isómeros e os sais daquelas

substâncias, sempre que a sua existência seja possível, compreendendo todos os preparados em que

as mesmas estejam associadas a outros compostos” de acordo com o artigo 3.º do referido Decreto-

Lei.

É expressamente proibída a produção, a importação, a exportação, a publicidade, a

distribuição, a venda, a detenção e a disponibilização destas substâncias. Esta proibição legal estende-

se a qualquer tipo de conduta que se destine a algum destes fins, nomeadamente “a venda ambulante,

os métodos de venda ao domicílio e equiparada, os eventos de exposição e amostra de produtos, bem

como a venda à distância de novas substâncias psicoativas, nomeadamente por catálogo ou em sítios

na Internet.”322

A prática desta infração constitui contraordenação punível, no caso das pessoas singulares,

com coima no valor mínimo de € 750,00 e máximo legal previsto de € 3.740,00 e, no caso das

pessoas coletivas, no valor mínimo de € 5.000,00 e máximo legal previsto de € 44.890,00 – Art. 10.º.

Podem ser cumuláveis a estas coimas algumas dass sanções acessórias previstas no artigo 11.º.

De acordo com o artigo 17.º, n.º 1, sem prejuízo do disposto no presente decreto-lei, quem se

dedicasse às atividades referidas no artigo 4.º, deveria ter entregue, em qualquer posto da Guarda

Nacional Republicana ou esquadra da Polícia de Segurança Pública, todos os produtos que se

encontram na sua posse e que contenham quaisquer novas substâncias psicoativas identificadas na

lista referida no artigo 3.º. 323 As referidas forças de segurança, por sua vez, deveriam remeter tais

substâncias à Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes da Polícia Judiciária para

efeitos da respetiva destruição

321 Art. 2.º do Decreto-Lei n.º 54/2013, de 17 de abril.

322 Art. 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 54/2013, de 17 de abril.

323 O artigo 17.º, n. º 3 do referido artigo estatuía a exclusão da responsabilidade contraordenacional do possuidor que procedesse à entrega das novas

substâncias psicoativas à Guarda Nacional Republicana ou à Polícia de Segurança Pública relativamente aos os produtos entregues, desde que efetuada

no prazo máximo de 15 dias a contar da data de entrada em vigor do presente decreto-lei.

94

A detenção de novas substâncias psicoativas por menores tem por consequência a

notificação324 pelas entidades fiscalizadoras da ocorrência ao respetivo representante legal ou ao núcleo

de apoio a crianças e jovens em risco localizado no centro de saúde ou no hospital da área de

residência do menor, nos casos de reincidência, ou de impossibilidade de notificação do representante

legal – Artigo 14.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2.

As entidades fiscalizadoras devem ainda diligenciar, pelos meios estritamente adequados e

necessários e sempre com preservação da vida privada do menor e da sua família, pela intervenção

para promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo325 – Art. 14.º, 4.º. Estas

entidades podem solicitar a cooperação das autoridades públicas competentes, nomeadamente da

Comissão de Proteção de Crianças e Jovens ou do representante do Ministério Público territorialmente

competentes – Art. 14.º, n.º 5.

Cumpre realçar que, a utilização da internet e dos mecanismos informáticos permite a

distribuição não autorizada não só de droga, mas também de novas substâncias psicoativas. Existe

nesta situação um concurso entre crime e contraordenação que é resolvido nos termos gerais do artigo

20.º do Regime Geral das Contraordenações, por falta de norma especial que regule este caso. Esta

norma impõe a aplicação da pena prevista para o ilícito criminal, podendo ainda ser aplicado as

sanções acessórias previstas para o ilícito contraordenacional.

Apraz sublinhar que, quando se verifique a não utilidade das novas substâncias psicoativas

para fins legítimos ou mesmo quando se verifique esta utilidade, o consumo e a oferta não autorizada

de novas substâncias psicoativas são danosas tanto da saúde pública como do próprio consumidor.

Nesta medida, esta infração contraordenacional, assim como o ilícito penal do tráfico de

estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, visa a proteção da saúde pública.

Constata-se que entre o crime de tráfico de drogas e a contraordenação por tráfico de novas

substâncias psicoativas existe uma “coincidência essencial quanto ao bem jurídico tutelado ou quanto

à área de tutela,” sendo que “o ilícito penal abrangerá a totalidade do desvalor do comportamento,

pelo que não sobra espaço valorativo para uma punição autónoma da contraordenação.”

324 De acordo com o artig 14.º, n.º 3, as notificações são efetuadas através de modelo próprio, que consta do anexo ao presente decreto-lei e que dele faz

parte integrante.

325 De acordo com a Lei de protecção de crianças e jovens em perigo, considera-se que o menor está em perigo quando assume comportamentos ou se

entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o

representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação – Art. 3.º, n.º 1, alínea g) da Lei n.º

147/99, de 01 de Setembro.

95

Nesta situação há uma “confluência entre unidade de facto e unidade de fundamento” 326 e,

nessa medida, um concurso aparente de infrações. Portanto, a distribuição não autorizada de drogas e

de novas substâncias psicoativas constituí a prática do crime de tráfico de drogas, previsto e punido

pelo artigo 21.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que, dependendo das circunstâncias, pode

ser agravado na sua pena, por força do artigo 24.º, ou ser enquadrado no tráfico de menor gravidade,

previsto e punido pelo artigo 25.º, ambos do mesmo diploma legal.

7.7.1 Entidades competentes na fiscalização das novas substâncias psicoativas

O comércio das novas substâncias psicoativas só é legítimo quando a utilização das mesmas

se destine a colmatar necessidades industriais ou farmacêuticas, desde que haja uma licença de

autorização emitida pelo INFARMED- Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P.327

A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) é a entidade por excelência em

matéria de fiscalização e de verificação do cumprimento das normas constante deste diploma. Esta

competência é ainda cometida às forças de segurança, como a Guarda Nacional Republicana, a Polícia

de Segurança Pública e a Polícia Científica da Polícia Judiciária, às autoridades de saúde, como o

Instituto Nacional de Medicinal Legal e Ciências Forenses I.P, o INFARMED e outras entidades como os

Órgãos Municipais e médicos – Art. 5.º n.º 1, in fine.

A instrução dos processos contraordenacionais está cometida à ASAE, a quem as demais

entidades fiscalizadoras remetem os respetivos autos e outros elementos, designadamente probatórios.

Compete ao Inspetor-Geral da ASAE aplicar as coimas328 e as sanções acessórias previstas pela prática

das infrações - Art. 5.º, n.º 5 e 6.

De acordo com o artigo 5.º n.º 2, compete à ASAE promover ações de natureza inspetiva (a);

fiscalizar a cadeia de comercialização (b), assim como coadjuvar as autoridades competentes na

investigação e promoção de inquéritos, realização de perícias e de quaisquer outras diligências,

nomeadamente o encerramento e a cessação da utilização de um determinado local (c).

326 Dias, Augusto Silva (2008). Ramos emergentes do direito penal relacionados com a protecção do futuro (Ambiente, consumo e genética humana).

Coimbra: Coimbra Editora, p. 233.

327 Art. 4.º, n.º 1, 2.º parte.

328 Em conformidade com o artigo 15.º, n.º 1, o produto das coimas é distribuído da seguinte forma: 60% para o Estado (a); 10% para a ASAE (b); 10% para

o SICAD (c); 5% para a Polícia Judiciária (d); 5% para o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, I.P. (e); 10% para a entidade autuante (f).

A afetação do produto das coimas quando aplicadas nas Regiões Autónomas constitui receita própria das mesmas – Art. 15.º, n.º 2.

96

No decorrer das ações inspetivas em estabelecimentos comerciais, a ASAE e as demais

autoridades fiscalizadoras podem decidir, quando necessário, pelo encerramento imediato e provisório

do local pelo período indispensável, que não pode exceder as 12 horas, desde que tal medida vise a

recolha de elementos probatórios, a apreensão de parafernália relacionada com a infração e ou a

identificação dos infratores – Art. 5.º, n.º 2 a) e n.º 3. Esta medida pode ser determinada, por igual

período, “se, perante a deteção de uma infração em flagrante delito, ocorrer perigo sério de

continuação da atividade ilícita.”329

São provisoriamente apreendidos para fiscalização os produtos que contenham novas

substâncias psicoativas e os objetos que sirvam ou estejam destinados a servir para a prática de

alguma das contraordenações ou que por esta forem produzidos, e bem assim quaisquer outros que se

revelem suscetíveis de servir de prova – Art. 8.º, n.º 1.

O Laboratório da Polícia Científica da Polícia Judiciária, o Instituto Nacional de Medicinal Legal

e Ciências Forenses I.P., e o INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde,

I.P., são as autoridades competentes para realizar as análises e perícias previstas no decreto-lei – Art.

5.º, n.º 8.

As autoridades de saúde determinam o encerramento dos locais onde as novas substâncias

psicoativas sejam produzidas, distribuídas, vendidas ou disponibilizadas, ou simplesmente conservadas

para estes fins ou para exportação, sempre que se verifique grave risco para a saúde – Art. 5.º, n.º 7.º,

1.ª parte e Art. 6.º, n.º 1. Sempre que nos locais inspecionados se verifique que, para além da

produção, distribuição, venda, disponibilização ou conservação das novas substâncias psicoativas, são

também produzidos, vendidos ou disponibilizados outros bens ou prestados outros serviços, a

autoridade de saúde determina a suspensão da atividade, sem prejuízo do integral encerramento

transitório do espaço ou estabelecimento, pelo prazo máximo de três meses, se for estritamente

necessário para remover a ameaça à saúde pública – Art. 6.º, n.º 2.

As ordens de encerramento ou de suspensão da atividade são fundamentadas e notificadas e

presumem-se urgentes para efeito de dispensa da audiência dos interessados, prevista na alínea a) do

n.º 1 do artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo – Art. 6.º, n.º 2. Da notificação deve

ainda constar a advertência para as possíveis consequências criminais da desobediência junto de

quem se encontre a trabalhar ou a prestar serviço relacionado com a atividade proibida e, quando

possível, ao proprietário do imóvel – Art. 6.º, n.º 3.

É suficiente, em casos devidamente fundamentados, a afixação de edital junto do acesso

principal ao espaço ou estabelecimento onde são praticadas as atividades proibidas – Art. 6.º, n.º 4.

329 Art. 5.º, n.º 4.

97

As ordens de encerramento e de suspensão da atividade são transmitidas pela autoridade de saúde à

força de segurança territorialmente competente e à ASAE – Art. 6.º, n.º 4.

Compete ainda à autoridade de saúde competente retirar e enviar para análise os produtos

sobre os quais haja suspeita de grave risco para a saúde humana e sejam suscetíveis de serem

considerados novas substâncias psicoativas, bem como os equipamentos ou utensílios afetos ao uso

específico dos mesmos, pelo período necessário à confirmação ou afastamento da suspeita pelo SICAD

– Art. 7.º, n.º 1.

Sempre que o SICAD confirme a suspeita, a autoridade de saúde competente deve proferir

decisão de suspensão provisória da sua comercialização e publicidade, da qual constam as razões por

que se considera o consumo do produto representativo de um grave risco para a saúde pública – Art.

7.º, n.º 2 e 3.

No prazo de 30 dias a contar da publicitação da decisão, o produto pode ser incluído na lista

das novas substâncias psicoativas constante da Portaria n.º 154/2013 de 17 de abril. Caso assim não

ocorra, a decisão da autoridade de saúde competente caduca e o produto passa a ser de livre

comercialização.

Sempre que no exercício das suas funções, seja na prestação de cuidados de saúde ou na

realização de perícias médico-legais, os médicos encontrem indícios de um dano à saúde

potencialmente imputável ao consumo de uma substância, notificam, de imediato, a autoridade de

saúde competente e o SICAD – Art. 7.º, n.º 4.

O Inspetor-Geral da ASAE decide pela restituição dos objetos logo que se tornar desnecessário

manter a apreensão para efeitos de prova, a menos que decida declará-los perdidos a favor do Estado

– Art. 8.º, n.º 2. Em qualquer caso, os objetos são restituídos logo que a decisão condenatória se torne

definitiva, salvo se tiverem sido declarados perdidos a favor do Estado – Art. 8.º, n.º 3.

De acordo com o artigo 12.º, a perda a favor do Estado de objetos pertencentes a terceiro só

pode ter lugar quando os seus titulares tiverem concorrido, com culpa, para a sua utilização ou

produção, ou do facto tiverem tirado vantagens (a) ou quando os objetos forem, por qualquer título,

adquiridos após a prática do facto, conhecendo os adquirentes a proveniência (b).

99

CAPÍTULO VIII – ENQUADRAMENTO LEGAL DO TRÁFICO DE DROGA PELA INTERNET

No presente capítulo pretende enquadrar-se o tráfico de droga por meio de sistemas de

informáticos na criminalidade informática em sentido amplo. Posteriormente, refere-se a punição deste

tipo de ilícito e dá-se a conhecer as regras processuais aplicáveis à investigação criminal dos crimes

informáticos.

8.1 A criminalidade informática

O estado atual de velocidade com que o mundo interage entre si deve-se primordialmente à

comunicação e aos meios facilitadores desta ciência que estão ao dispor dos homens. “ E neste

aspecto particular o uso do computador teve uma extrema importância, até um ponto em que todos os

aspectos da nossa vida se encontram directa ou indirectamente ligados ao uso de um computador (ou

outro suporte), ou de uma rede ou sistema informático ou de tratamento automático de dados.” Após a

criação do computador ou como resultado desta, surge a internet “e com a consequente possibilidade

de comunicação e transferência de dados e informação em tempo real, para todo o mundo e sob o

manto do anonimato.”330

O comportamento delituoso evolui em conformidade com a evolução tecnológica. A utilização

de dispositivos como os comuputador, os tablets ou os smartphones para além de facilitar o quotidiano

das pessoas, facilita também os comportamentos delituosos o que provoca riscos de maior para a

sociedade. “O atractivo para o “criminoso digital” é grande, pelo pouco risco que acarreta, pela

possibilidade de praticar uma acção a grande distância e pela comodidade de, na secretária, ligado em

rede, poder colher grandes frutos em pouco tempo e ao abrigo de grande dificuldade de detecção e

investigação deste tipo de crimes, que por não terem fronteiras exigem uma intensa, e nem sempre

fácil, cooperação internacional.”

É notório que a informática é um fenómeno que, nesta matéria, rema para lado diverso do

Direito Penal, “pois cada vez mais (…) é utilizada para lhe dificultar a vida, colocando novos problemas,

330 Macedo, João Carlos Cruz Barbosa de (2009). In Algumas considerações acerca dos crimes informáticos em Portugal, Direito Penal Hoje – Novos

desafios e novas respostas. Coimbra: Coimbra Editora, pp. 222 e 223.

100

criando novos tipos de agentes criminosos, diferentes dos tradicionais, e com modos de actuar muito

própros.”331

Em face da ligação íntima existente entre o quotidiano diário e a informática, o conceito de

criminalidade informática pode ser demasiado amplo e compreender demasiados comportamentos.

“Para poderem ser caracterizados como fazendo parte da chamada criminalidade informática, (...) os

comportamentos delituosos deverão não apenas ter a intervenção de um computador (ou outro

equipamento), mas, além disso, revelar uma qualquer especificidade juridicamente relevante

relativamente aos crimes em geral, que resulte do uso da informática.

Assim, a criminalidade informática será aquela que, além de ter como objecto ou instrumento

um meio informático, revele, pelo uso desse meio, uma especial característica ou um qualquer

elemento especial relevante para o cometimento daquele crime.” Esta categoria de crimes pode ser

integrada por aquelas condutas “cujo uso da informática, por exemplo, aumente exponencialmente a

perigosidade para bens jurídicos, dificulte a detecção do seu cometimento e do seu agente ou agrave

de modo muito significativo as suas consequências.” Pode ainda ser integrada pelas condutas

criminosas, cujo objeto e instrumento do crime sejam os computadores e a informática. Neste caso,

“os crimes (...) ofendem bens directamente ligados aos meio informático, como o acesso ilegítimo ou o

dano a programas informáticos, que visam proteger o próprio uso da informática e os seus aspectos

característicos, como o software ou a navegação na internet.” 332

Nessa medida, as mudanças sociais provocadas pelas tecnologias da informação têm

repercussões no Direito Penal, uma vez que a informática pode apresentar-se como fator

criminógeno.333 Todavia, e na senda de FARIA COSTA “não parece que a informática seja, por si só,

suficiente para justificar um ramo autónomo do direito penal, consubstanciado no “direito penal

informático.” Na verdade, não há no direito penal da informática regras e princípios próprios que

justifiquem que seja assumido como um ramo especial do direito penal”, apesar de terem sido criados

diplomas legais autónomos. Ou seja, “as soluções encontradas não divergem na sua essência das

encontradas para o direito penal clássico, e nem sequer se poderá falar na protecção de novos bens

jurídicos ou na inovação na construção dos tipos legais (...), nem tão pouco será necessário ao Juiz ter

formação específica no ramo da informática.”

Assim, “a especidificidade prende-se com as características especiais da informática e a sua

influência no desenho do iter criminis, e visam uma maior adequação prática, e não uma nova

331Idem, ibidem, pp. 224 e 225.

332 Idem, ibidem, p. 226 e 277.

333 Martín, Ricardo M. Mata (2001). Delincuencia Informática y Derecho Penal. Madrid: Edisofer, S. L., p. 17.

101

construção dogmática. O “Direito Penal da Informática” (...) é apenas um conjunto de normas penais

com a particularidade de incidirem sobre o meio informático.”334

8.2 A punição do tráfico de droga pela internet

O legislador português não previu expressamente no Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, o

tráfico de droga pela internet.

No ordenamento jurídico português, a modalidade cibernética do tráfico de droga tem a

virtualidade de ser qualificada como média ou grande criminalidade e ser sancionada na sua forma

simples pelo artigo 21.º ou na sua forma agravada pelo artigo 24.º do diploma legal.335 . O recurso aos

sistemas de informação para prosseguir o intento criminoso concretizado nalguma das condutas em

que se pode desenvolver a atividade ilícita relacionada com o tráfico de droga é expressão da

construção progressiva que caracteriza o artigo 21.º que, pela sua abrangência, absorve todos as

formas, métodos e técnicas de tráfico de droga.

Assim, quem utilizar sistemas de informação e de comunicação para traficar drogas é punido

com pena de prisão de 4 a 12 anos, pela prática do crime previsto e punido pelo artigo 21.º. Se se

verificar a prática de algumas das circunstâncias previstas no artigo 24.º, a moldura penal pela prática

do crime de tráfico de drogas é aumentada de um quarto nos seus limites mínimo e máximo.

Exemplificando, a oferta não autorizada de drogas pela internet por quem tenha participado em outras

atividades criminosas organizadas de âmbito internacional é punido pela prática do crime previsto no

artigo 21.º, cuja pena é agravada nos termos da alínea f) do artigo 24.º

O modus operandi e os recursos utilizados neste tipo de tráfico de estupefacientes são

métodos sofisticados de tentativa de ocultação da atividade delituosa. A utilização de criptomercados

para comercialização da droga e a utilização de meios de pagamento não detetáveis tem como fim

conseguir o anonimato dos usuários e das transações. Além do mais, o transporte das drogas é

efetuado através dos canais comerciais convencionais e em embalagens discretas.

Estes elementos factuais concorrem, nos termos do artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal, como

circunstâncias gerais na fixação da medida concreta da pena. A “intervenção de circunstâncias

atenuantes e agravantes336, se não tanto para temperar o rigor punitivo dos códigos penais modernos,

334 Macedo, João Carlos Cruz Barbosa, ob. cit., p. 228.

335 Esta solução legal é aplicável quando se verifique o tráfico ilícito de precursores. 336 “As circunstâncias comuns podem distinguir-se em circunsâncias legais, quando indicadas na lei, e circunstâncias judiciais, cujo reconhecimento é

confiado à discricionariedade do tribunal, que irá agravar ou atenuar a pena de acordo com os seus próprios critérios. Entre as circunstâncias judiciais que

apresentam relevância podem ser indicadas os meios e o local do crime, o tempo da sua duração, as relações entre o autor e a vítima, as consequências

102

pelo menos para adaptar a justa punição às particulares circunstâncias da criminalidade, aparece

consagrada em muitas das suas virtualidades e possibilidades pelos modernos sistemas penais.” Neste

caso, aplicação ao crime de tráfico de droga, das circunstâncias previstas não taxativamente no artigo

71, n.º 2.º servem “para melhor adaptação da punição concreta do crime dentro da respectiva

moldura abstracta.” 337

Constituem circunstâncias comuns, entre outras, o grau de ilicitude do facto, o modo de

execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres

impostos ao agente, tal como vem expressamente refrido no art. 71.º, n.º 2, al. a).

A medida da gravidade do facto é aferida pelo grau de ilicitude do mesmo que“abrange toda a

extensão da alínea a),” que consiste no “modo de execução deste e agravidade das suas

consequências, bem como (no) grau de violação dos deveres impostos ao agente. Quanto o modo de

execução deve observar-se que não pode constituir circunstância o modo de execução típico, pois

nesse crime esse modo de execução constitui elemento essencial do crime. Serão circunstâncias

agravantes relativas ao modo de execução aqueles em que a execução apresenta uma maior gravidade

do que o necessário para a execução do crime, representando um mal maior do que a mera lesão do

bem jurídico tutelado pela norma incriminadora.” 338

O tráfico de drogas por meio de sistemas informáticos é cometido com disfarce. O disfarce

informático constitui agravante do tráfico de drogas por ter com o crime relação direta ou por que se

utilizou esta modalidade para o cometer. Há assim na modalidade cibernética do tráfico de drogas uma

exasperação da ilicitude e uma maior perversidade do agente. “O fundamento das circunstâncias

agravantes tem a sua origem nas considerações mais diversas: umas vêm efectivamente do elemento

subjectivo do crime (...); outras, do excesso de mal que se causa ou seja, da parte objectiva daquele;

um terceiro género, do maior alarme que se infunde na sociedade; um quarto, do respeito que se deve

ao lugar em que se delinque, à situação social de que se goza; a quinta classe, enfim, da dificuldade

de que recaia a pena querendo-se juntar a eficácia da intimidação à escassa segurança do mesmo

castigo. – Ainda na maior parte dos casos, não é nenhuma só destas origens, o que produz a

agravação preceituada pela lei: são duas, são três, são talvez todas elas, que concorrem num mesmo

facto, para justificar mais e mais essa agravação que cada qual pediria.”

do crime, tec., etc.” Silva, Germano Marques da (1999). Direito Penal Português, Parte Geral III, Teoria das penas e medidas de segurança. Lisboa:

Editorial Verbo, p. 139.

337 Correia, Eduardo (2000). Direito Criminall. Coimbra: Almedina, pp. 340 e 341.

338 Silva, Germano Marques da (1999). Direito Penal Português, Parte Geral III, Teoria das penas e medidas de segurança. Lisboa: Editorial Verbo, pp. 140

e 141.

103

Na situação do disfarce pela utilização de sistemas informáticos que primam pelo anonimato,

encontram-se como causas da circunstância agravante “a primeira, a terceira e a quinta,”339 porquanto

existe uma maior perversidade do agente pois utiliza todos os subterfúgios informáticos no

cometimento do crime, “enquanto facilitam a execução, tornam mais difícil a defesa à ofensa e

aumentam o alarme social.”340

Assim, a utilização de sistemas informáticos para prosseguir o tráfico de drogas engloba-se no

grupo das circunstâncias agravantes referentes ao modo de execução do crime ou à modalidade, pelo

que se “projectam (...) na ilicitude e são, portanto, comunicáves.”341

Além do mais, o tráfico de droga pela internet pode ser enquadrado nos crimes informáticos

em sentido amplo, entendido estes “como aqueles em que os sistemas de tratamento automático de

dados e de informação são objecto ou instrumento do crime, ou este está de forma significativa ligado

à utilização desses sistemas.”342

8.3 A investigação do tráfico pela intrenet

As condutas mais perigosas da criminalidade informática “têm hoje uma forte componente

instrumental de uso da informática/telemática.” 343

Visando a criminalidade organizada o lucro, a infiltração nos setores privados e públicos do

mercado lícito e a “limpeza” dos proventos ilícitos, minam os poderes legalmente instituídos. “O crime

organizado (…) necessita da rede estabelecida legalmente para se espalhar e se enraizar quer de forma

directa quer de forma paralela e utiliza as malhas de restrição legal e de lacunas legais para se

trincheirar e ganhar forma em primeira mão ilícita e em segunda mão lícita.”344

Sendo certo que, “a investigação criminal no âmbito do crime organizado não pode socorrer-se

de instrumentos processuais delatores dos direitos fundamentais do ser humano – mesmo no espaço

europeu (…),” a verdade é que é necessário investigar através de “instrumentos jurídicos (…) mais

sofisticados na aquisição da prova.”345 Esta necessidade funda-se no facto de que “o crime organizado

gera, pela sua natureza, estrutura, funcionamento e finalidade, uma dificuldade acrescida de produção

339 Correia, Eduardo, ob. cit., p. 351.

340 Idem, ibidem, p. 363.

341 Idem, ibidem, p. 360. 342 Idem, ibidem, p. 229.

343 Marques, Garcia & Martins, Lourenço (n.d.). Direito da Informática (2.ª ed. Ref. Ver.). Coimbra: Almedina, p. 640.

344 Valente, Manuel Monteiro Guedes (2009). In A investigação do crime organizado, Buscas domiciliárias nocturnas, o agente infiltrado e intervenção nas

comunicações. Criminalidade organizada e criminalidade de massa – Interferências e ingerências mútuas. Coimbra: Almedina, p. 161.

345 Idem, ibidem, pp. 161 e 162.

104

de prova que é essencial para o apuramento da culpabilidade como elemento do facto tipificador das

actividades próprias da tipologia do crime em investigação.”

A investigação do crime de tráfico de droga ou de precursores pela internet beneficia não só da

cooperação internacional em matéria penal previstas no art. 58.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de

Janeiro346, mas também da aplicação das regras processuais constantes da Lei n.º 109/2009, de 15

de Setembro, que transpõe para a ordem jurídica interna a Decisão Quadro n.º 2005/222/JAI, do

Conselho, de 24 de Fevereiro, relativa a ataques contra sistemas de informação, e adapta o direito

interno à Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa.

No artigo 14.º da Convenção, delimitador do âmbito de aplicação das medidas, “prevê-se a

aplicação da Convenção aos crimes que ela define, mas estão previstas duas extensões extremamente

significativas: por um lado, prevê-se que sejam aplicadas a qualquer outro tipo de crime cometido por

via de um sistema de computadores; por outro, prevê-se que sejam aplicáveis à obtenção de prova em

forma electrónica, se respeitante a ilícitos criminais.”347

A aplicabilidade das regras processuais a estes crimes decorre da verificação da alínea b) do

artigo 11.º, ao contemplar os crimes cometidos por meio de um sistema infomático.

Esta lei permite que dados informáticos específicos armazenados num sistema informático

sejam preservados, por quem tenha disponibilidade ou controlo sobre os mesmos, designadamente

pelo fornecedor de serviço, por ordem da autoridade judiciária competente, mediante autorização ou

quando haja urgência ou perigo na demora, tendo em vista a descoberta da verdade material, nos

termos do artigo 12.º, n.ºs 1, 3 e 4. A preservação expedita de dados, no decorrer de um periodo de

tempo, prorrogável até um máximo de 3 meses, permite saber a natureza dos dados, a sua origem e

destino, se forem conhecidos.348 Nos termos do artigo 13.º, o fornecedor de serviço a quem a ordem é

dirigida, indica, logo que o souber, todos os fornecedores de serviços através dos quais os dados de

tráfego relativos a uma determinação comunicação foi efetuada, tendo em vista assegurar a

preservação dos dados de tráfego da mesma e ainda tendo em vista permitir identificar todos os

fornecedores de serviço e a via através da qual aquela comunicação foi efectuada – Art. 13.º

Estes dois artigos contemplam duas “medidas expeditas, impostas pela velocidade da

circulação da informação no ambiente digital.” Uma medida consagra a “preservação expedita de

346 Segundo o art. 58.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, “Em observância da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico de Estupefacientes

e de Substâncias Psicotrópicas de 1988, no tocante a extradição, auxílio judiciário mútuo, execução de sentenças penais estrangeiras e transmissão de

processos criminais, aplicam-se subsidiariamente as disposições do Decreto-Lei n.º 43/91, de 22 de Janeiro.”

347 Verdelho, Pedro; Bravo, Rogério & Rocha, Manuel Lopes com a colaboração de Veiga, Paula (2003). Leis do Cibercrime, Vol. I; (1.ª ed.). Lisboa: Centro

Atlântico, p. 15.

348 Artigo 12.º, n.º 3 al. a), b) e c) da Lei do Cibercrime.

105

dados armazenados num computador e (a outra) a preservação expedita e revelação de dados de

tráfego. (…)

O seu carácter expedito faz diminuir as garantias dos visados pela investigação em causa. Por

isso, se quanto aos meros dados de tráfego está também prevista a sua revelação expedita, o mesmo

não acontece quanto aos outros dados (o conteúdo da comunicação ou dados armazenados). Amabas

as medidas são inovadoras. Por outro lado, ambas são essenciais para o sucesso de eventuais

investigações criminais no domínio digital. A rapidez na preservação de dados é normalmente

imprescindível a qualquer investigação, uma vez que se assim não for, pela natureza, os dados perder-

se-ão.”

Quanto aos dados de tráfego, os mesmos “permitem reconstruir o percurso de determinada

comunicação. Nessa comunicação pode ter sido utilizado mais que um servidor Internet. Por isso, é

importante que o servidor preserve e revele, de forma expedita, qual ou quais os outros operadores

utilizados no percurso da comunicação em causa, permitindo assim, de forma expedita a preservação

e revelação de informação por outros operadores, em tempo útil.”349

Sob pena de punição por desobediência, deve ainda ser comunicada ao processo os dados

informáticos específicos e determinados que se encontrem num determinado sistema informático,

assim como deve-se ter acesso ao próprio sistema, de acordo com o artigo 14.º. Pode igualmente ser

pesquisado o sistema informático para se alcançar aquele fim, de acordo com o artigo 15.º

Nestas normas se prevê expressamente “que os dados em relação aos quais pode ser emitida

uma injunção (ou pesquisa) deverão ser previamente determinados. Esta limitação tem em vista

impedir situações de abuso policial.” Proibindo-se a busca e apreensão de tudo quanto extravase o

necessário para a investigação criminal. “É aquilo que na gíria policial se apelida de fishing expedition

ou de data minig.”350

Quando, no decurso de uma pesquisa informática ou de outro acesso legítimo a um sistema

informático, forem encontrados dados ou documentos informáticos necessários à produção de prova,

tendo em vista a descoberta da verdade, a autoridade judiciária competente autoriza ou ordena por

despacho a apreensão dos mesmos – Art. 16.º. Sempre que forem encontrados, armazenados nesse

sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, mensagens

de correio eletrónico ou os registos de comunicações de natureza semelhante, é autorizada ou

ordenada a sua apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da

verdade ou para a prova – Art. 17.º.

349 Verdelho, Pedro; Bravo, Rogério & Rocha, Manuel Lopes com a colaboração de Veiga, Paula (2003). Leis do Cibercrime, Vol. I; (1.ª ed.). Lisboa: Centro

Atlântico, p. 16.

350 Idem, ibidem, p. 17.

106

A interceção de comunicações destinada ao registo de dados relativos ao conteúdo das

comunicações ou apenas a recolha e registo de dados de tráfego é admissível nos termos do artigo

187.º, n.º 1, al. b) do CPP351, assim como é permitido o recurso a acções encobertas, nos termos

previstos na Lei n.º 101/2001, de 25 de Agosto – Art. 18.º e 19.º.

No que se refere às interceções nas comunicações, este meio de obtenção de prova abrange

todo o tipo de comunicação. “O recurso à intercepção de comunicações – seja telefónica, seja

electrónica, telemática ou presencial – só é (…) possível com autorização ou ordem judicial, i.e., do

Juíz de Instrução Criminal e para fins de natureza criminal.” Acresce que a interceção de

comunicações “obedece ao princípio da indispensabilidade do recurso ao meio ou técnica para se

descobrir a verdade, i.e., ter-se-á que provar que sem a intercepção da comunicação a verdade não se

obterá.”

De acordo com o artigo 187.º, n.º 4 do CPP, a interceção de comunicações pode ser

autorizada contra suspeito ou arguido (a)), pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja

fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito

ou arguido (b)) ou vítima de crime, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido (c)). O

“legislador procurou resolver a problemática dos conhecimentos ocasionais ou fortuitos ao submeter a

valoração dos mesmos à indispensabilidade desse mesmo conhecimento para a prova do processo já

instaurado ou a instaurar e se esse conhecimento resultar da comunicação entre as pessoas sobre as

quais pode recair a intercepção da comunicação (…).”352

Para além do mais, “que a aplicação do regime da intercepção de comunicações telefónicas às

comunicações electrónicas abre também a possibilidade de intercepção de comunicações áudio

realizadas através de “Voice Over IP.” Tanto mais que esta tecnologia, permitindo chamadas áudio, de

qualidade similar às chamadas telefónicas, com possibilidade de ligação entre computadores ou de

computadores para redes telefónicas fixas ou móveis, e com custos para o utilizador consideravelmente

mais baixas que as comunicações telefónicas, está em exponencial crescimento a nível mundial.”353

O despacho do Juíz de Instrução Criminal autoriza a inteceção de comunicações pelo prazo

máximo de 3 meses, prorrogável por igual período, desde que se mantenha a necessidade de

repressão criminal – Art. 187.º, n.º 6. As operações devem seguir as formalidades constantes do artigo

187.º do CPP.

351 De acordo com esta norma, 1 - A intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas durante o inquérito,

se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil

de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público, quanto a crimes: relativos ao tráfico de

estupefacientes – b).

352 Valente, Manuel Monteiro Guedes, ob. cit, p. 177.

353 Venâncio, Pedro Dias (2011). Lei do cibercrime anotada e comentada (1.ª ed.). Coimbra: Coimbra Editora, p. 119.

107

Quanto às ações encobertas, “o agente infiltrado ou encoberto é um dos meios ou técnicas

excepcionais de investigação criminal. O recurso ao agente infiltrado, a par do recurso à vigilância

electrónica ou outras formas de vigilância,é uma das obrigações dos Estados Parte da Convenção das

Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional, conhecida por Convenção de

Palermo – art. 20.º.”354 Assim, “o agente encoberto é o agente da polícia ou um terceiro concertado

com aquele que, sem revelar a sua identidade ou qualidade e sem que conquistem a confiança dos

possíveis infractores, frequenta os lugares conotados com o crime – v.g., bares, cafés, hipermercados,

estações de comboios, bairros de tráfico (…) – com a finalidade de identificar e deter, caso haja

flagrante delito de um crime, possíveis suspeitos da prática de crimes, mais ou menos graves, públicos

ou semipúblicos, sem que haja a determinação da prática de qualquer crime.” Este agente excepcional

“não necessita de autorização judiciária355 para actuar nos meandros do crime e não está restringido a

qualquer catálogo de crimes.”356

Acresce que, para além do recurso a esta técnica investigatória só ser possível pelo respeito do

“princípio da indispensabilidade e da impossibilidade objectiva de alcançar as provas e a verdade por

outro meio menos oneroso”, assim como quando “a acção infiltrada se mostre adequada à prevenção

e repressão criminal e, por isso, à descoberta da prova material e da verdade. Deve ela ser

proporcional aos fins e à gravidade do crime que se está a prevenir ou a investigar.”357

A investigação desta criminalidade é feita através de cooperação internacional, competindo à

Polícia Judiciária através do ponto de contacto permanente a prestação de assistência mútua – Arts.

20.º, 21.º e 29.º.

Outra modalidade de investigação do tráfico de droga pela internet é a entrega controlada,

prevista no artigo 160.º - A da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, alterada pela Lei n.º 104/2001, de 25

354 Ocorre que, “esta obrigação apenas se impõe se o ordenamento jurídico do Estado Parte permitir o uso de técnicas especiais de investigação. Como a

Convenção de palernofala em agente encoberto, impõe-se, desde já, que a Convenção se quer referir à técnica ou meio de obtenção de prova através do

agente infiltrado, cuja natureza e funcionamento difere do agente encoberto.” Ou seja, “O Agente infiltrado é, pois, o funcionário da investigação criminal

ou um terceiro – p.e., cidadão particular, que actue sob o controlo da Polícia Judiciária – que, após autorização judiciária, com ocultação da sua qualidade

e identidade e com o fim de obter provas para a incriminação do suspeito ou suspeitos (sobre quem existe um processo crime a decorrer), ganha a sua

confiança pessoal para melhor o observar, em ordem a obter informações relativas às actividades criminosas de que é suspeito, assim como obter provas

– reais e pessoais – contra ele(s), com as finalidades de prevenção ou repressão criminal, sem que, por qualquer meio material ou psicológico, determine

aqueles à prática de novos crimes.” Valente, Manuel Monteiro Guedes, ob. cit, pp. 169 e 170.

355 O Autor considera que, estando constitucionalmente consagrado no artigo 32.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP) a obrigação de que

os actos ou diligências processuais que afectem os direitos fundamentais têm de ser previamente autorizados ou ordenados pelos Juíz de Instrução

Criminal. A Lei n.º 101/2001, de 25 de Agosto ao permitir que “se o processo estiver na fase de inquérito [i.e., para fins de repressão criminal], o

Ministério Público tem competência para autorizar, devendo esta decisão ser comunicada ao Juíz de Instrução Criminal, que será, automaticamente,

validada se aquele não proferir despacho de recusa no prazo de 72 H”, está a violar aquela norma fundamental e, portanto, “parece-nos que estamos

perante uma inconstitucionalidade material.”Idem, ibidem, p. 172.

356 Idem, ibidem, p. 169.

357 Idem, ibidem, p. 173 e 174.

108

de Agosto, “estabelecendo a possibilidade das entregas controladas, em território nacional ou a partir

dele, terem lugar a pedido de um ou mais Estados estrangeiros, no âmbito de investigações criminais

transfronteiriças relativas a infracções que admitam extradição, com a finalidade de proporcionar, em

colaboração com esses Estados, a identificação e responsabilização criminal do maior número de

agentes da infracção.” 358

Assim, esta técnica “é utilizada na investigação do crime de tráfico internacional de

estupefacientes ou de qualquer outro tipo de crime que implique a distribuição e/ou passagem de

substâncias ou bens proibidos por uma pluralidade de países.” A entrega controlada “tem por fim

permitir que uma determinada mercadoria ilícita, enviada clandestinamente de um país a outro, uma

vez detectada e sujeita a controlo policial, possa chegar ao seu destino sem ser interceptada, com o

objectivo de identificar e responsabilizar criminalmente o maior número possível de intervenientes no

seu percurso e muito particularmente o seu destinatário. Procura-se assim identificar o maior número

de elementos de uma organização criminosa, bem como recolher informação sobre o seu modus

operandi.”359

Estrategicamente, “é uma resposta às dificuldades emergentes da natureza transnacional do

crime organizado e constitui, por isso, um verdadeiro instrumento de cooperação internacional quer a

nível policial, quer a nível judicial, pressupondo elevados níveis de cooperação policial e judicial entre

os Estados envolvidos (existência de pontos de contacto ágeis, rápidos e informais) e de legislações

uniformes que garantam a perseguição penal e a obtenção dos fins a que ela se destina.”360

O enriquecimento célere é o principal objetivo dos traficantes de droga, “conquanto o controlo

do poder económico, social e político são apontados comummente como os grandes objectivos

mediatos, porque através desse controlo manateiam todo o tecido produtivo industrial e não industrial,

podendo, assim, obter um maior lucro económico-financeiro lícito e ilícito, sendo que este será

branqueado para ser introduzido no fluxo comercial legal do mesmo sector. Este controlo gera por si só

o controlo da legisferação – poder legislativo – e, com maior ou menor influência, pode vir a controlar o

mundo judiciário – poder judicial – caso não hajam instrumentos jurídico- constitucionais legitimantes

da actividade jurídico-criminal processual identificadores dos elementos probatórios suficientes e

adequados a determinar os agentes e o tipo de crime a investigar, a acusar e a julgar.”361

Assim,“a prevenção do perigo emergente da actividade do crime estruturado e organizado

devia centrar-se no quadro de competências próprias das polícias, que existem como fundamento de

358 Braz, José (2010). Investigação criminal, A organização, o método e a prova. Os desafios da nova criminalidade (2.ª ed.). Coimbra: Almedina, p. 329.

359 Idem, ibidem, p. 328.

360 Idem, ibidem.

361 Valente, Manuel Monteiro Guedes – ob. cit,, p. 160.

109

garantia e defesa da legalidade democrática, dos direitos dos cidadãos e da segurança (interna) de

todos os cidadãos e num espaço, nacional, regional – europeu – e transnacional. A prevenção deste

perigo dever-se-ia, prima facie, centrar numa actividade jurídico-administrativa policial em áreas como o

controlo e a fiscalização das actividades licenciadas pelo Estado – como os sectores da indústria, da

imigração, da importação e exportação de bens (de consumo ou matérias-primas, da construção civil e

imobiliários, (…), da importação e exportação de fármacos, (…), da banca (através do banco central de

cada Estado-Membro), do desporto, da internet, (etc.). Caso existisse um sério e real controlo e

fiscalização destas actividades lícitas – pois, o mundo do crime estruturado e organizado utiliza as

estruturas organizadas legalmente para proliferação dos seus intentos – e se actuasse no plano

administrativo preventivo e sancionatório, prevenia-se e evitava-se o recurso excessivo ao direito penal

material e processual.”362

Vivemos, assim, na quinta vaga de reformas legislativas363, na qual se faz “apelo ao direito

internacional, no reconhecimento de que neste domínio do uso da informática as fronteiras

desapareceram, tendo natureza planetária o combate à criminalidade informática, sob pena de

insucesso.” No plano jurídico, este movimento “tenta operar uma certa uniformização dos tipos legais

de crimes, procura principalmente mecanismos de cooperação e de celeridade de investigação dos

traços desta criminalidade que cruza horizontalmente a criminalidade mais grave a nível mundial.”364

Nesta medida, cumpre o incremento da “cooperação horizontal – entre as várias polícias – e

vertical – coadjuvação das polícias às autoridades judiciárias.”365

362 Idem, ibidem, pp. 160 e 161.

363 “A evolução normativa ao nível da criminalidade informática começou no ínico dos anos 70 visando essencialmente a protecção da vida privada para

fazer face às novas possibilidades de recolha, transmissão e armazenamento de dados possibilitada pela informática. Apesar de esta intervenção ter como

objectivo a protecção de dados pessoais constituiu já uma indicação no sentido da criação legislativa destinada a proteger outros interesses ligados a

computadores e ao tratamento informático de dados. Posteriormente, nos anos 80, pretendeu-se o combate à criminalidade económica praticada através

da informática, ponto de onde se evoluiu para uma fase de salvaguarda da propriedade intelectual, fazendo face à ameaça da pirataria. Uma quarta fase

tem tomado em atenção os aspectos processuais penais e a investigação deste tipo de crimes. Macedo, João Carlos Cruz Barbosa (2009). IN Algumas

considerações acerca dos crimes informáticos em Portugal. Direito Penal Hoje – Novos desafios e novas respostas. Organizadores: Andrade, Manuel da

Costa & Neves, Rita Castanheira Coimbra: Coimbra Editora, p. 229.

364 Marques, Garcia & Martins, Lourenço (n.d.). Direito da Informática (2.ª ed. Ref. Ver.). Coimbra: Almedina, p. 640.

365 Valente, Manuel Monteiro Guedes, ob. cit, p. 168.

111

CONCLUSÃO

O mercado de drogas foi dominado pela prevalência da cannabis, heroína, cocaína e

anfetaminas o que justificou e continua a justificar, pelos dados estatísticos internacionais, europeus e

nacionais, a sua submissão a diversas medidas legislativas reguladoras do seu consumo e tráfico. É

certo que as penalidades contra os traficantes devem revestir-se de severidade. Todavia, “sabido (...) o

reduzido ou nulo efeito dissuasor da simples previsão de penas severas, há que encontrar formas mais

eficientes de garantir que os traficantes não se escapem às malhas da justiça beneficiando da

impunidade. Daí que se prevejam medidas de combate semelhantes às utilizadas contra as

organizações terroristas, que se viabiliza uma cooperação judiciária mais estreita a nível internacional

com vista a apanhar os tentáculos das grandes redes nos diversos países e que se dedique especial

atenção às fortunas acumuladas pelos suspeitos e arguidos de tráfico, de modo a desapossá-los delas

e a declará-las perdidas para o Estado. Estão demonstradas as reacções cada vez mais apertadas

entre o tráfico de drogas, a criminalidade organizada e até a criminalidade de negócios, a qual passa a

actividade de «purificação» dos fundos obtidos no tráfico ilícito mediante o seu investimento em áreas

inócuas.”366

Ocorre que o mercado das drogas “tradicionais” está a ser substituído pelo mercado das novas

substâncias psicoativas. A oferta feroz destas substâncias psicoativas e a sua procura crescente

acarretam novos desafios ao legislador, seja porque apresentam efeitos “tão ou mais nefastos para a

saúde quando comparadas com as drogas «clássicas»,”367 seja porque estão integradas numa dinâmica

de mercado que visa fugir ao controlo legal.

Os modelos legislativos adotaram “um sistema discriminativo individual de substâncias” para

proibir a distribuição e consumo ilícitos, modelo que foi, igualmente, adotado pelo Decreto-Lei n.º

54/2013 que proibe o consumo e a comercialização das novas substâncias psicoativas identificadas

nas listas da Portaria n.º 154/2013. Todavia, este modo de proibição “ não resolve definitivamente o

problema associado às NSP, visto estas terem um padrão de aparecimento de tipo hidra, ou seja, com

um carácter de drug-by-design e um ritmo de aparecimento de substâncias novas tão elevado, a

366 Martins, A. G. Lourenço (1994). Droga e Direito, Legislação, Jurisprudência, Direito Comparado e Comentários. Lisboa: Aequitas e Editorial Notícias, p.

22.

367 Jacinto, André & Oliveira-Martins, Sofia (2015). Substâncias Psicoativas: Problemática, estudo da legislação atual e da sua adequação face à realidade.

Revista Portuguesa de Farmacoterapia.l. Vol. 7, n.º2, p. 39.

112

proibição de NSP apenas resulta na ocupação desses nichos de mercado por novas substâncias, sobre

as quais ainda não existem documentos legislativos.”368

Quer-nos parecer que poderá existir uma solução distinta da atualmente adotada. Esta implica

que a lei, através do SICAD, esteja permanentemente a “correr atrás” da infração. De facto, sempre

que uma nova substância é incluída nas listagens, nacionais ou estrangeiras, os traficantes limitam-se

a cessar a produção dessa substância, proceder à alteração da composição química e comercializar

uma outra nova substância que, produzindo efeitos idênticos, não está expressamente proibida.

Considerando que esta técnica é já amplamente conhecida e, ainda por cima, relativamente fácil,

parece-nos que seria melhor solução legislativa substituir as listagens por definições abrangentes.

Assim, a solução poderia passar por “considerar uma atualização no modo em que é formulada a

legislação, recorrendo aos mesmos conhecimentos científicos e farmacológicos que permitem a

invenção das NSP.” Ou seja, “pode ser feito o estudo, e subsequente formulação, de um documento

legislativo que submeta a medidas de controlo não só algumas substâncias psicoativas de forma

individual, mas também quaisquer substâncias que, na sua composição molecular, apresentem estes

mesmos farmacóforos.”369

Este modelo legislativo teria a vantagem de “obviar o processo de discriminação individual de

cada uma das NSP que se enquadram em grupos (...), cujos farmacóforos já se encontram

determinados, como também resultaria a salvaguarda de que seriam proibidas quaisquer NSP que

surgissem e fossem classificadas, pelas autoridades competentes, como pertencentes a um dos grupos

discriminados.” A permanência da discriminação individual de algumas substâncias específicas,

permitia ainda “uma ressalva para o eventual caso de aparecimento de NSP cujos farmacóforos não se

encontrem determinados e estudados até à altura.”370

Tal como o modelo atual, este “novo modelo legislativo dependeria (...) do cumprimento dos

protocolos de intercâmbio de informações acerca de NSP entre os países e consequente avaliação

destes dados através dos (sistemas em vigor), de modo a que se mantenha constantemente

atualizado.” Este modelo poderia ser adotado na Convenções Internacionais, principalmente na CSP,

na legislação nacional de combate à droga, assim como no Regulamento que está a ser discutido na

União Europeia. Este novo modelo legislativo para combater as NSP “apresenta-se como uma solução,

baseada no conhecimento científico, para o problema associado ao surgimento de quaisquer NSP e às

atualizações legais que estas exigem sem, no entanto, descurar as substâncias psicoativas previamente

368 Idem, ibidem, p. 38.

369 Idem, ibidem.

370 Idem, ibidem.

113

descritas e legisladas.”371 Assim, poderia ser aferida a viabilidade deste método pelo SICAD, com a

colaboração dos autores do estudo que vem sendo nesta parte citado, para se atualizar a legislação

nesta matéria.

Ainda nesta matéria o labor da União Europeia é notável no sentido de uniformizar a definição

da infração e da sanção penal da distribuição não autorizada de novas substâncias psicoativas que

apresentem maiores riscos para a saúde pública. Todavia, a adoção de um espaço único de justiça

penal exige a instituição premente da Procuradoria Europeia para reprimir, não só os crimes que

atentam contra os interesses financeiros da União Europeia, mas também a criminalidade organizada

grave transnacional, como é o caso do tráfico de drogas. Urge, igualmente, a criação de equipas de

investigação conjuntas por mais do que um Estado-Membro, que poderão ser constituídas por

respresentantes da Europol e da Eurojust, para combater o tráfico de drogas transnacional que se

verifique nos territórios respetivos.

No que tange ao tráfico de drogas, o legislador português não cuida particularmente da cada

vez maior dimensão cibernética conexionada com o tráfico internacional de droga. Significa isto

portanto que, um crime de tráfico praticado utilizando todos os subterfúgios informáticos é punido nos

mesmos moldes que um outro que os dispense – utilizando, admite-se, apenas os subterfúgios

tradicionais, sem prejuízo da aplicação de circunstâncias gerais que concorrem para a determinação

concreta da pena.

A punição mais severa prevista nos artigos 21.º, n.º 2 e 3 e 22.º funda-se em “motivos de

prevenção geral, porquanto as «ocasiões» de prática do delito são teoricamente maiores dada a

generalização das substâncias e produtos.” Igual razão de prevenção geral positiva justifica a

agravação da pena prevista para o tráfico de droga quando praticado pela internet.

O tráfico de droga pela internet deve ser mais severamente punido pois, para além de revelar

uma especial perversidade do agente, por pretender o anonimato na prossecução do crime, a utilização

dos mais diversos subterfúgios informáticos permitem, de outra banda, a mais fácil realização do

tráfico e a dificuldade de sobre o mesmo serem exercidas ações repressivas.

Aflora de todo o circunstancialismo do tráfico de droga perpretado por meio de sistemas

informáticos - como a utilização de softwares de encriptação e de moedas digitais - e ainda do tipo de

drogas que são transacionadas - drogas sintéticas cujo conhecimento da composição e dos riscos é

diminuto, fármacos sujeitos a prescrição médica cujo fabrico escapa às normas reguladoras do setor

farmacêutico e ainda das drogas tradicionais, às quais são adicionadas as mais variadas substâncias

de corte - perigos que abalam o sentimento de segurança que sustenta a vida em comunidade.

371 Idem, ibidem.

114

Verifica-se, assim, que a defesa do bem jurídico tutelado, e a confiança da sociedade na

reposição da norma violada é conseguido com menor sucesso, ao invés da prática deste crime que

tutela o bem jurídico supraindividual da saúde pública.

O tráfico de droga pela internet não é mais do que uma modalidade de comportamento

perigosa. Nesta condutra “a própria liberdade de acção torna-se um perigo em si mesma: em campos

de acção densamente entrelaçados (…) o próprio uso da liberdade em si é perigoso; então o próprio

uso desta deve ser rodeado de especiais exigências de cuidado, dada a gravidade das

consequências.”372

A denominada sociedade do risco em que atualmente vivemos, fruto da globalização

densificada pelos fenómenos comunicacionais tal como a internet, impõe que sejam adotadas soluções

pelo Direito Penal que previnam os efeitos dos perigos que norteiam, atacando, de modo veloz e

circundante a sociedade. Ora, o Direito Penal deve estar presente nas sociedades de risco “enquanto

instrumento de tranquilização comunitária, perante os receios provocados pela insegurança das

actividades industriais perigosas que vão proliferando exponencialmente (…).” Assim, deve atuar “em

certas concepções dos fins das penas exclusiva ou predominantemente orientadas pela prevenção

geral positiva – com tradução na doutrina propugnada por JAKOBS, da estabilização contrafáctica das

expectativas comunitárias, perante a violação de norma penalmente relevante.”373

Nesta medida, ao crime de tráfico de droga pela internet, com utilização de diversos

subterfúgios informáticos para visar o disfarce do infrator e do facto, deve ser aplicada uma pena mais

severa para que se mantenha e reforce “a confiança da comunidade na validade e força de vigência”

da norma que tutela a saúde pública pela incriminação do tráfico de droga “e, assim, no ordenamento

jurídico-penal.” A pena como fim de prevenção geral de integração é o “instrumento por excelência

destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantabilidade da ordem jurídica, apesar de todas as

violações que tenham lugar e a reforçar, por esta via, os padrões de comportamento adequado às

normas.”374

A utilização de meios informáticos para prosseguir o tráfico de drogas, adita, portanto, a esta

modalidade uma especificidade que é valorada pelo Direito. Pelo que se propõe aditar ao artigo 24.º

uma nova circunstância modificativa agravante, nos seguintes termos:

372 Fernandes, Paulo Silva, apontamento introdutório de MONTE, Mário Ferreira (2004). Globalização “sociedade de risco” e o futuro do direito penal.

Coimbra: Almedina, p. 91.

373 Bravo, Jorge dos Reis (2011). Criminalidade económico-financeira e organizada: um desafio sem respostas? Para um conceito estratégico de prevenção

e combate à criminalidade económico-financeira e organizada. Revista do CEJ, 2.º semestre, n.º 16, pp. 159 e 160

374 Dias, Jorge de Figueiredo (2007). Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais, A Doutrina Geral do Crime (2.ª ed.). Coimbra: Coimbra

Editora, p. 51.

115

Artigo 24.º

Agravação

As penas previstas nos artigos 21.º e 22.º são aumentadas de um quarto nos seus limites mínimo e

máximo se:

m) O agente atuar por meio de um sistema informático.

Perante os evoluídos mecanismos de atuação, por meio de criptomercados e de criptmoedas,

este crime informático pode fazer-se não só através dos meios de luta contra a criminalidade

organizada, mas também através das regras consagradas na Lei do cibercrime, nomeadamente pela

colaboração mais estreita da Unidade de Cooperação Nacional da Polícia Judiciária com a INTERPOL,

uma vez que esta polícia internacional adota estratégias e possui instrumentos avançados na luta

contra a criminalidade informática. Cumpre aqui referir o quanto dito quanto à instituição da

Procuradoria Europeia e da criação de equipas de investigação conjuntas.

117

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