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135 REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS VETERINÁRIAS RPCV (2001) 96 (539) 135-144 Contribuição das diversas endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) endógenas para a maturação da carne * Contribution of the different endogenous endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) to meat ageing José António Mestre Prates Secção de Bioquímica, Faculdade de Medicina Veterinária - CIISA, Universidade Técnica de Lisboa. Rua Professor Cid dos Santos, Pólo Universitário do Alto da Ajuda, 1300-477 Lisboa, Portugal. Tel.: 351 21 365 28 00; Fax: 351 21 365 28 82; E.mail: [email protected] Resumo: Neste trabalho estuda-se a contribuição das dife- rentes endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) endógenas para as modificações da tenrura, do teor de fragmento de 30 kDa e da estrutura/ultra-estrutura das miofibrilas, características da maturação da carne de coelho (Oryctolagus cuniculus L.) em refrigeração (4 °C), nos seus diferentes tipos histoquímicos de músculo esquelético (tipos I, IIB e IID). Com base no pressuposto geralmente aceite de que o mecanismo de matu- ração da carne é comum a todas as espécies de mamíferos, os resultados constituem um forte indício experimental da acção predominante das endopeptidases cisteína (EC 3.4.22), com um possível papel principal das calpaínas (EC 3.4.22.17), na tenrificação dos vários tipos de músculo esquelético da carne dos mamíferos. É possível que esta tenrificação dependa principalmente do enfraquecimento da estrutura miofibrilar ao nível da região N 2 do sarcómero, devido à cisão dos fila- mentos de titina e de nebulina. Obteve-se também um forte indício experimental de uma contribuição significativa das endopeptidases cisteína, possivelmente devido à acção predo- minante das calpaínas, para a fragmentação da troponina T com formação do fragmento de 30 kDa (músculos do tipo II) e para as principais modificações estruturais e ultra-estrutu- rais das miofibrilas (muito importante para a fractura trans- versal dos sarcómeros ao nível da região N 2 ), durante a maturação dos vários tipos de músculo esquelético da carne dos mamíferos. Palavras-chave: endopeptidases; carne; coelho; mamíferos; maturação. Summary: In this work it is described the contribution of the different endogenous endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) for tenderness, 30 kDa fragment content and structural/ultra- structural changes of rabbit (Oryctolagus cuniculus L.) meat ageing, at refrigeration temperatures (4 °C), in their different types of skeletal muscle (types I, IIB and IID). Based on the generally accepted presupposition for a common mechanism of mammalian meats ageing, the results provided a strong evidence for a major role of cysteine endopeptidases (EC 3.4.22), possibly mainly due to calpains (EC 3.4.22.17), in the tenderising process of the different skeletal muscle types of mammalian meats. It is possible that tenderising is mainly due to structural myofibrillar weakening at N 2 -lines level, as result of the scission of titin and nebulin filaments. It was also provided a strong evidence for a significant contribution of cysteine endopeptidases, possibly mainly due to calpains, in troponin T hydrolysis with formation of 30 kDa fragment (type II muscles) and in main structural/ultra-structural chan- ges of myofibrils (very important for transversal disruption of sarcomeres at N 2 -lines level), during ageing of the different types of skeletal muscle of mammalian meats. Key-words: endopeptidases; meat; rabbit; mammalians; ageing. * Trabalho galardoado com o Prémio Aboim Sande Lemos 2000 (Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias, Lisboa). Introdução A actividade das endopeptidases (EC 3.4.21- 24,99) endógenas foi pela primeira vez relacionada com a tenrificação da carne, durante o seu armazena- mento a temperaturas de refrigeração, em 1917 (Hoagland et al. citados por Alarcon-Rojo e Dransfield, 1995). Depois dessa data, numerosos estudos foram efectuados tendo em vista o esclarecimento da acção das endopeptidases na transformação do músculo esquelético em carne, em particular, no seu processo de tenrificação. No entanto, os factores e os meca- nismos responsáveis pelas modificações características da maturação da carne, principalmente pela sua ten- rificação, são ainda desconhecidos e por isso objecto de muita controvérsia. Com efeito, têm sido sugeri- dos factores e mecanismos de natureza muito varia- da para a maturação da carne, concretamente: factores físico-químicos (pH, pressão osmótica, iões cálcio e processos oxidativos), enzimas sem activi- dade peptidásica (enzimas glicolíticas, ATPases e glicosidases) e peptidases (catepsinas, calpaínas, complexo endopeptidásico multicatalítico e outras endopeptidases musculares) (ver discussão em Pra- tes, 2000). A tenrificação é a modificação mais importante da transformação do músculo esquelético em carne, uma vez que é ela que determina a sua aceitação, selecção e consumo pelos consumidores (Morgan et al., 1991). A inconsistência na tenrura da carne é mesmo um dos principais problemas com que a indústria das carnes se depara actualmente (Kooh- maraie et al., 1995). Deste modo, é essencial para a

Contribuição das diversas endopeptidases (EC 3.4.21-24,99 ... · dos mamíferos. É possível que esta tenrificação dependa principalmente do enfraquecimento da estrutura miofibrilar

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R E V I S TA P O R T U G U E S ADE

CIÊNCIAS VETERINÁRIAS

RPCV (2001) 96 (539) 135-144

Contribuição das diversas endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) endógenaspara a maturação da carne *

Contribution of the different endogenous endopeptidases (EC 3.4.21-24,99)to meat ageing

José António Mestre Prates

Secção de Bioquímica, Faculdade de Medicina Veterinária - CIISA, Universidade Técnica de Lisboa.Rua Professor Cid dos Santos, Pólo Universitário do Alto da Ajuda, 1300-477 Lisboa, Portugal.

Tel.: 351 21 365 28 00; Fax: 351 21 365 28 82; E.mail: [email protected]

Resumo: Neste trabalho estuda-se a contribuição das dife-rentes endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) endógenas para asmodificações da tenrura, do teor de fragmento de 30 kDa e daestrutura/ultra-estrutura das miofibrilas, características damaturação da carne de coelho (Oryctolagus cuniculus L.) emrefrigeração (4 °C), nos seus diferentes tipos histoquímicosde músculo esquelético (tipos I, IIB e IID). Com base nopressuposto geralmente aceite de que o mecanismo de matu-ração da carne é comum a todas as espécies de mamíferos, osresultados constituem um forte indício experimental da acçãopredominante das endopeptidases cisteína (EC 3.4.22), comum possível papel principal das calpaínas (EC 3.4.22.17), natenrificação dos vários tipos de músculo esquelético da carnedos mamíferos. É possível que esta tenrificação dependaprincipalmente do enfraquecimento da estrutura miofibrilarao nível da região N2 do sarcómero, devido à cisão dos fila-mentos de titina e de nebulina. Obteve-se também um forteindício experimental de uma contribuição significativa dasendopeptidases cisteína, possivelmente devido à acção predo-minante das calpaínas, para a fragmentação da troponina Tcom formação do fragmento de 30 kDa (músculos do tipo II)e para as principais modificações estruturais e ultra-estrutu-rais das miofibrilas (muito importante para a fractura trans-versal dos sarcómeros ao nível da região N2), durante amaturação dos vários tipos de músculo esquelético da carnedos mamíferos.

Palavras-chave: endopeptidases; carne; coelho; mamíferos;maturação.

Summary: In this work it is described the contribution of thedifferent endogenous endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) fortenderness, 30 kDa fragment content and structural/ultra-structural changes of rabbit (Oryctolagus cuniculus L.) meatageing, at refrigeration temperatures (4 °C), in their differenttypes of skeletal muscle (types I, IIB and IID). Based on thegenerally accepted presupposition for a common mechanismof mammalian meats ageing, the results provided a strongevidence for a major role of cysteine endopeptidases (EC3.4.22), possibly mainly due to calpains (EC 3.4.22.17), inthe tenderising process of the different skeletal muscle typesof mammalian meats. It is possible that tenderising is mainlydue to structural myofibrillar weakening at N2-lines level, asresult of the scission of titin and nebulin filaments. It wasalso provided a strong evidence for a significant contribution

of cysteine endopeptidases, possibly mainly due to calpains,in troponin T hydrolysis with formation of 30 kDa fragment(type II muscles) and in main structural/ultra-structural chan-ges of myofibrils (very important for transversal disruption ofsarcomeres at N2-lines level), during ageing of the differenttypes of skeletal muscle of mammalian meats.

Key-words: endopeptidases; meat; rabbit; mammalians; ageing.

* Trabalho galardoado com o Prémio Aboim Sande Lemos 2000(Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias, Lisboa).

Introdução

A actividade das endopeptidases (EC 3.4.21-24,99) endógenas foi pela primeira vez relacionadacom a tenrificação da carne, durante o seu armazena-mento a temperaturas de refrigeração, em 1917(Hoagland et al. citados por Alarcon-Rojo e Dransfield,1995). Depois dessa data, numerosos estudos foramefectuados tendo em vista o esclarecimento da acçãodas endopeptidases na transformação do músculoesquelético em carne, em particular, no seu processode tenrificação. No entanto, os factores e os meca-nismos responsáveis pelas modificações característicasda maturação da carne, principalmente pela sua ten-rificação, são ainda desconhecidos e por isso objectode muita controvérsia. Com efeito, têm sido sugeri-dos factores e mecanismos de natureza muito varia-da para a maturação da carne, concretamente:factores físico-químicos (pH, pressão osmótica, iõescálcio e processos oxidativos), enzimas sem activi-dade peptidásica (enzimas glicolíticas, ATPases eglicosidases) e peptidases (catepsinas, calpaínas,complexo endopeptidásico multicatalítico e outrasendopeptidases musculares) (ver discussão em Pra-tes, 2000).

A tenrificação é a modificação mais importante datransformação do músculo esquelético em carne,uma vez que é ela que determina a sua aceitação,selecção e consumo pelos consumidores (Morgan etal., 1991). A inconsistência na tenrura da carne émesmo um dos principais problemas com que aindústria das carnes se depara actualmente (Kooh-maraie et al., 1995). Deste modo, é essencial para a

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µmol/kg p.c.v.). Foram definidos outros 3 lotes deanimais, lotes controlo, nos quais os coelhos foraminjectados com igual volume dos solventes dos inibi-dores, concretamente: SFE (soro fisiológico esterili-zado), DMSO a 10% e DMSO a 20%.

Colheita das amostras musculares

Imediatamente após o abate dos animais (0 dias) eao fim de 3, 6 e 9 dias de acondicionamento das car-caças a 4 °C (período de maturação), foram colhidospara análise os seguintes músculos esqueléticos: se-mimembranoso próprio (semimembranosusproprius; SP), músculo homogéneo do tipo I (100%de fibras do tipo I, segundo Appel e Hammersen,1979 e Bacou e Vigneron, 1988); semimembranosoacessório (semimembranosus accessorius; SA), mús-culo com predomínio de fibras do tipo IIB (59% defibras do tipo IIB, 39% de fibras do tipo IID e 2% defibras do tipo IIA, segundo Aigner et al., 1993); pso-as maior (psoas major; PM), músculo homogéneodo tipo IID (100% de fibras do tipo IID, segundoHamalainen e Pette, 1993). Não existem no coelhomúsculos com predomínio de fibras do tipo IIA (Pe-ter et al., 1972).

Determinação objectiva da tenrura

A força de resistência ao corte da carne foi efectu-ada transversalmente ao eixo maior das miofibrilas,nos músculos esqueléticos inteiros sem qualquer tra-tamento prévio, pelo método de referência de War-ner-Bratzler (Boccard et al., 1981). A média de trêsdeterminações sucessivas da força de corte, paracada músculo esquelético, foi expressa por unidadede área da secção do músculo (N/cm2).

Análise electroforética das proteínas miofibrilares//citoesqueléticas

A semi-quantificação do fragmento de 30 kDa dacarne foi efectuado em duplicado por SDS-PAGE(10%T, 3%C), segundo o método descrito porLaemmli (1970) e Porzio e Pearson (1977). Paralela-mente às amostras dos extractos musculares, que fo-ram adicionadas de albumina sérica bovina (ASB),correram-se padrões proteicos externos de baixa e deelevada massa molecular. Os perfis densitométricosdos géis foram obtidos com um densitómetro laser eas áreas sob os picos determinadas por integraçãoelectrónica. O teor específico do fragmento de 30kDa da carne foi expresso em unidade equivalenteao miligrama de ASB por grama de proteína citoes-quelética total (u.e. mg ASB / g proteína citoesquelé-tica).

Microscopia óptica de contraste de fase

O enfraquecimento da estrutura miofibrilar/citoes-quelética foi avaliada após homogeneização mecâni-ca do músculo esquelético em 100 volumes desolução tampão (3x10 s @ 18,000 r.p.m.), tal comofoi previamente descrito por Prates et al. (1997). O

indústria das carnes a compreensão do mecanismoda tenrificação, de modo a desenvolver metodolo-gias que possam manipular o processo vantajosa-mente (Dransfield, 1994, Koohmaraie, 1994 eWarkup et al., 1995). Dado que as propriedadesmecânicas do colagénio ("dureza de fundo") nãosofrem alteração significativa durante a maturaçãoda carne, a tenrificação da carne tem que estar de-pendente de modificações das miofibrilas ("durezamiofibrilar") (Ouali, 1992, Takahashi, 1996 eNishimura et al., 1998). Muitas modificações miofibri-lares têm sido relacionadas com o processo de tenri-ficação, entre as quais se encontram: o aparecimentode um fragmento de 30 kDa resultante da degradaçãoda troponina T (Ho et al., 1994 e Negishi et al.,1996); a fragmentação transversal das miofibrilas,induzida mecanicamente, ao nível da região N2 dosarcómero (Valin e Ouali, 1992 e Costa et al., 1998);e diversas modificações ultra-estruturais dos sarcó-meros (Hattori e Takahashi, 1982 e Taylor et al.,1995a).

No músculo esquelético de mamífero, aos níveisda fibra muscular esquelética e extracelular, foramidentificadas endopeptidases de todos os tipos, asaber: 1) endopeptidases serina: proliloligopeptidase(EC 3.4.21.26); 2) endopeptidases cisteína: catepsinaB (EC 3.4.22.1), catepsina L (EC 3.4.22.15), catepsinaH (EC 3.4.22.16) e calpaínas (EC 3.4.22.17); 3)endopeptidases aspártico: catepsina D (EC 3.4.23.5);4) endopeptidases metal: colagenase intersticial (EC3.4.24.7); 5) e endopeptidases desconhecidas: com-plexo endopeptidásico multicatalítico (CEM; EC3.4.99.46). Os objectivos deste trabalho consistemprecisamente no estudo da contribuição das diferentesendopeptidases endógenas para o processo de tenri-ficação da carne dos mamíferos e dos mecanismosassociados, durante a sua maturação em refrigeração(4 °C), nos seus diferentes tipos histoquímicos demúsculo esquelético.

Material e métodos

Tratamento administrado aos animais

Foram utilizados coelhos (Oryctolagus cuniculusL.) machos, da variedade neo-zelandesa branca, com12 ± 1 semanas de idade e 2,8 ± 0,1 kg de peso cor-poral vivo (p.c.v.). Os coelhos foram distribuídosaleatoriamente por 6 lotes de tratamento e injecta-dos, 15 minutos antes do abate (por via endovenosa),com os inibidores mais recomendados para as se-guintes endopeptidases (Beynon e Salvesen, 1989):1) endopeptidases serina e CEM (3,4-DCI emDMSO (dimetilsulfóxido) a 10%, 5 µmol/kg p.c.v.);2) endopeptidases cisteína (E-64 em DMSO a 10%,5 µmol/kg p.c.v.); 3) endopeptidases aspártico (peps-tatina A em DMSO a 10%, 5 µmol/kg p.c.v.); 4) cal-paínas e catepsinas B e L (N-acetil-Leu-Leu--norleucinal em DMSO a 20%, 50 µmol/kg p.c.v.);5) catepsinas B e L (Z-Phe-Ala-diazometano emDMSO a 20%, 10 µmol/kg p.c.v.); 6) e catepsina H(L-Leu-clorometilcetona em DMSO a 20%, 100

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nível de fragmentação das miofibrilas foi observadopor microscopia óptica de contraste de fase, fotografadoe expresso como o número médio de sarcómeros porfragmento de miofibrila ou miofibrila inteira (nms//fm).

Microscopia electrónica

A observação da ultra-estrutura do músculo esque-lético foi efectuada em microscópio electrónico detransmissão, regulado a um potencial de aceleraçãoelectrónico de 60 kV. Foram efectuadas fotomicro-grafias electrónicas de campos representativos dasmodificações mais notórias observadas em cadagrelha. Com base nas fotomicrografias electrónicasobtidas, procedeu-se à semi-quantificação das prin-cipais modificações ultra-estruturais (-, modificaçãoausente; +, modificação ligeira; ++, modificaçãomoderada; e +++, modificação acentuada) caracte-rísticas da transformação do músculo esquelético emcarne. A classificação semi-quantitativa final de umadada amostra de músculo esquelético resultou daapreciação de vinte e sete fotomicrografias electróni-cas (três fotomicrografias por grelha, três grelhas porbloco e três blocos por amostra muscular esquelética).

Análise estatística

O desenho experimental baseia-se no efeito de trêsfactores principais (tratamentos administrados ante-mortem aos animais, com 9 níveis; tipos imuno-his-toquímicos de músculo esquelético de coelho, com 3níveis; e tempos de maturação das carcaças, com 4níveis) sobre vários parâmetros físico-bioquímico-

estruturais sujeitos a modificação durante a maturaçãoda carne. Os referidos parâmetros foram analisadospor ANOVA num nível de significância de 5% (H0:p<0,05). A comparação das médias foi efectuadapelo método LSD também num nível de significânciade 5%. Os coeficientes de correlação linear foramcalculados pelo método de Pearson e as suas signifi-câncias lidas nas tabelas estatísticas de Fisher et al.(1963).

Resultados e discussão

Efeito dos inibidores peptidásicos sobre a tenrura

Dos vários inibidores das endopeptidases injectadosante-mortem aos coelhos, apenas dois deles (E-64 eN-acetil-Leu-Leu-norleucinal) inibem significativa-mente (H0: p<0,05) a evolução da tenrura da suacarne, nos três músculos esqueléticos estudados,desde o abate dos animais até aos 9 dias de matura-ção a 4 °C (Figura 1).

A injecção ante-mortem do inibidor E-64 pára oprocesso de tenrificação (H0: p>0,05) da carne decoelho nos músculos SP e SA, o mais tardar a partirdos 3 dias de acondicionamento da carcaça, o quenão se verifica no músculo PM. Pelo contrário, coma injecção do inibidor N-acetil-Leu-Leu-norleucinalnão se consegue mais do que a inibição parcial datenrificação, nos três músculos esqueléticos estuda-dos, mesmo após 9 dias de maturação (23% acimada "dureza de fundo" e 73% de inibição, no músculoSP; 28% acima da "dureza de fundo" e 63% de inibi-ção, no músculo SA; e 34% acima da "dureza de

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Figura 1 - Efeito da administração ante-mortem de inibidores das endopeptidases sobre a evolução da tenrura da carne de coelho, aolongo da maturação em refrigeração (4 °C), para cada um dos seus diferentes tipos de músculo esquelético (tipo I, semimembranoso pró-prio; tipo IIB, semimembranoso acessório; e tipo IID, psoas maior). As barras verticais representam o desvio padrão associado a cadauma das médias de r réplicas; as médias assinaladas com * são estatisticamente significativas (H0: p<0,05).

EFEITO DOS INIBIDORES PEPTIDÁSICOS A TENRURA DA CARNE DE COELHO(diferentes tipos de músculo esquelético)

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fundo" e 72% de inibição, no músculo PM).A inibição muito acentuada (músculo PM) ou

mesmo total (músculos SP e SA) da tenrificação dacarne, no lote de coelhos injectados ante-mortemcom E-64, constitui um forte indício experimentaldo papel predominante das endopeptidases cisteínano processo de tenrificação da carne de coelhodurante a sua maturação em refrigeração (4 °C).

A marcada ou mesmo total inibição da tenrificaçãonos diferentes tipos histoquímicos de músculo dacarne de coelho, obtida com a injecção ante-mortemde E-64 aos animais, constitui um forte argumentoexperimental contra um papel significativo de quais-quer outros factores físico-químico-enzimáticos noreferido processo de tenrificação. Com efeito, osresultados dos lotes de animais injectados ante-mor-tem com 3,4-DCI e com pepstatina A não sugeremqualquer papel determinante das peptidases dos tiposserina e aspártico, nem do CEM, na tenrificação dacarne de coelho, durante a sua maturação em refrige-ração (4 °C). Também não é de supor qualquer acçãoda colagenase intersticial sobre a estrutura miofibrilar,dado que é uma enzima extracelular com uma activi-dade muito específica apenas sobre o colagénio(Asghar e Bhatti, 1987).

A inibição marcada (cerca de 2/3) da tenrificaçãodos três músculos estudados da carne de coelho, peloN-acetil-Leu-Leu-norleucinal, juntamente com aausência de inibição da tenrificação, pelo Z-Phe-Ala-diazometano e pela L-Leu-clorometilcetona,sugerem o papel principal das calpaínas na tenrificaçãoda carne de coelho a 4 °C. Esta sugestão da acçãopredominante das calpaínas é reforçada pela obser-vação de que a evolução da tenrura parece ser mais

limitada pelos factores físico-químico-enzimáticosdo que pelos substratos/reagentes, o que ocorreexclusivamente no caso das calpaínas. O facto da ini-bição da tenrificação dos diferentes tipos de músculoda carne de coelho ser menor do que a inibição obtidacom o E-64, pode ter que ver com um efeito apenasparcial do N-acetil-Leu-Leu-norleucinal e/ou com aacção de outras endopeptidases cisteína. O possívelefeito parcial do N-acetil-Leu-Leu-norleucinal podedever-se à circunstância de, por razões de solubilidade,este ter sido administrado numa quantidade inferiorà necessária para se alcançar a concentração inibitóriaefectiva in vitro, bem como também ao facto da suaacção sobre as endopeptidases alvo ser de naturezareversível. Dado não ser possível garantir a inibiçãodas peptidases alvo, após a injecção ante-mortem deZ-Phe-Ala-diazometano e de L-Leu-clorometilcetona,não se pode excluir a possibilidade de outras endo-peptidases cisteína, para além das calpaínas, desem-penharem algum papel na tenrificação da carne decoelho durante a maturação (4 °C).

Efeito dos inibidores peptidásicos sobre a forma-ção do fragmento de 30 kDa

A formação do fragmento de 30 kDa ocorre nosmúsculos do tipo II da carne de coelho (SA e PM)mas não nos seus músculos do tipo I (SP). A evolu-ção do fragmento de 30 kDa é modificada significa-tivamente apenas por dois dos inibidoresadministrados ante-mortem aos coelhos (E-64 e N-acetil-Leu-Leu-norleucinal), nos músculos esqueléti-cos do tipo II (Figura 2).

Figura 2 - Efeito da administração ante-mortem de inibidores das endopeptidases sobre a evolução do teor específico de fragmento de30 kDa da carne de coelho, ao longo da maturação em refrigeração (4 °C), para cada um dos seus diferentes tipos de músculo esquelético(tipo I, semimembranoso próprio; tipo IIB, semimembranoso acessório; e tipo IID, psoas maior). As barras verticais representam o des-vio padrão associado a cada uma das médias de r réplicas; as médias assinaladas com * são estatisticamente significativas (H0: p<0,05).

EFEITO DOS INIBIDORES PEPTIDÁSICOS SOBRE O TEOR ESPECÍFICO DE FRAGMENTO 30 kDa DACARNE DE COELHO (diferentes tipos de músculo esquelético)

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Os coelhos injectados ante-mortem com E-64apresentam um teor específico de fragmento de 30kDa significativamente menor no músculo PM, aofim de 3 dias de maturação, e no músculo SA, ao fimdos 9 dias de maturação. Verifica-se, no entanto, quenão ocorre formação do fragmento de 30 kDa nestesdois músculos esqueléticos do tipo II (H0: p>0,05),para os animais injectados com este inibidor, durantetodo o período de maturação. Relativamente ao N-acetil-Leu-Leu-norleucinal, a inibição da formaçãodo fragmento de 30 kDa nos músculos SA e PM ésignificativa apenas no final da maturação. Comefeito, no final da maturação da carne de coelho, estainibição é de 58% no músculo SA e de 53% no mús-culo PM.

A inibição total da formação do fragmento de 30kDa nos músculos SA e PM (tipo II) da carne decoelho, nos animais injectados ante-mortem com E-64, constitui um forte argumento experimental afavor do envolvimento das endopeptidases cisteínana formação deste fragmento proteico durante o pro-cesso de maturação em refrigeração (4 °C). A cir-cunstância da inibição da formação do fragmento de30 kDa ser completa (músculos esqueléticos do tipoII), nos animais injectados com E-64, parece excluirfortemente a participação de outros factores físico-químico-enzimáticos neste processo. Com efeito, osresultados dos animais injectados ante-mortem com3,4-DCI e com pepstatina A não sugerem qualqueracção das peptidases dos tipos serina e aspártico,nem do CEM, na formação do fragmento de 30 kDada carne de coelho, durante a sua maturação emrefrigeração (4 °C).

A inibição moderada (superior a 1/2) da formaçãodo fragmento de 30 kDa no final da maturação dacarne de coelho (músculos esqueléticos do tipo II)pelo N-acetil-Leu-Leu-norleucinal, juntamente coma ausência de inibição pelo Z-Phe-Ala-diazometanoe pela L-Leu-clorometilcetona, sugerem um papelmuito importante das calpaínas, ao contrário dasoutras endopeptidases cisteína, na formação destefragmento proteico durante a maturação da carne decoelho a 4 °C (músculos esqueléticos do tipo II). Ofacto da inibição da formação do fragmento de 30kDa da carne de coelho ser menor do que a inibiçãototal obtida com o E-64, pode explicar-se pelacircunstância do efeito do N-acetil-Leu-Leu-norleu-cinal ser apenas parcial e/ou por uma acção de outrasendopeptidases cisteína. Com efeito, sabe-se que nãosó as calpaínas, mas também as catepsinas B e L(não a catepsina H), conseguem degradar in vitro atroponina T com formação do fragmento de 30 kDa(Mikami et al., 1987, Ouali et al., 1987 e Koohma-raie, 1992).

Efeito dos inibidores peptidásicos sobre a frag-mentação miofibrilar

O comportamento da fragmentação miofibrilar aolongo dos 9 dias de maturação da carne de coelho (4°C), nos três músculos esqueléticos observados, sãoapenas modificados significativamente por dois dosvários inibidores administrados ante-mortem aos

coelhos, concretamente: pelo E-64 e pelo N-acetil-Leu-Leu-norleucinal (Figura 3).

A diminuição da fragmentação miofibrilar induzidapelo E-64 é significativa ao fim de 6 dias de matura-ção nos músculos SP e SA, e logo ao fim dos 3 diasde maturação no músculo PM. No final do períodode maturação, a inibição do aumento da fragmentaçãomiofibrilar da carne de coelho é de 37% no músculoSP, 44% no músculo SA e 36% no músculo PM. Poroutro lado, o inibidor N-acetil-Leu-Leu-norleucinalpromove uma diminuição significativa da fragmen-tação miofibrilar no músculo SA, a partir dos 6 diasde maturação, e nos músculos SP e PM, ao fim de 9dias de maturação. No final da maturação, a inibiçãodo aumento da fragmentação miofibrilar da carne decoelho é de 26% no músculo SP, 24% no músculoSA e 20% no músculo PM.

A inibição moderada (superior a 1/3) da diminuiçãoda resistência das miofibrilas à fragmentação mecâ-nica ao longo da maturação (4 °C) da carne de coe-lho (vários tipos histoquímicos de músculoesquelético), nos animais injectados ante-mortemcom E-64, fornece um forte argumento experimental afavor da implicação das endopeptidases cisteína nafractura transversal das miofibrilas ao nível daregião N2. A circunstância desta inibição da diminui-ção da resistência das miofibrilas à fragmentaçãomecânica, pelo E-64, ser apenas parcial, pode significaruma inibição incompleta das endopeptidases cisteínae/ou a existência de outros factores físico-químico-enzimáticos igualmente contribuintes para este en-fraquecimento miofibrilar. No entanto, os resultadosdos lotes de animais injectados ante-mortem com3,4-DCI e com pepstatina A não sugerem qualquerpapel das peptidases dos tipos serina e aspártico,nem do CEM, na fractura transversal das miofibrilasda carne de coelho, durante a sua maturação a 4 °C.Os nossos resultados não permitem, no entanto,excluir a contribuição de factores físico-químicospara a diminuição da resistência das miofibrilas àfragmentação induzida mecanicamente. De entreestes factores destacam-se os iões cálcio, uma vezque esta região N2 tem sido considerada um local deacumulação intracelular de iões cálcio (Vignon etal., 1989).

A inibição ligeira (cerca de 1/4) da diminuição daresistência das miofibrilas à fragmentação mecânica,durante a maturação (4 °C) da carne de coelho (trêstipos de músculo esquelético), pelo N-acetil-Leu-Leu-norleucinal, juntamente com a ausência deinibição pelo Z-Phe-Ala-diazometano e pela L-Leu-clorometilcetona, sugerem um papel importante dascalpaínas, ao contrário das outras endopeptidasescisteína, na fractura transversal das miofibrilas aonível da região N2 do sarcómero. Esta sugestão éreforçada pelo facto da evolução da fragmentaçãomiofibrilar parecer ser mais limitada pelos factoresfísico-químico-enzimáticos do que pelos substratos//reagentes, o que apenas se verifica no caso dascalpaínas. A circunstância da inibição da diminuiçãoda resistência das miofibrilas à fragmentação mecânicaser menor com o N-acetil-Leu-Leu-norleucinal doque com o E-64, pode dever-se a um efeito apenas

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parcial do primeiro inibidor e/ou a uma acção deoutras endopeptidases cisteína na fractura transversaldas miofibrilas da carne de coelho. Sendo conhecidoque a catepsina H não consegue provocar esta modifi-cação estrutural em miofibrilas intactas, contrariamenteao que acontece com as catepsinas B e L, não se podeexcluir um papel significativo destas duas últimascatepsinas na referida modificação miofibrilar. Umoutro argumento a favor da sua participação nesteprocesso é a observação de que a actividade principaldas catepsinas, na miofibra esquelética, se situa pre-cisamente no retículo sarcoplasmático próximo daregião N2 (Taylor et al., 1995b).

Efeito dos inibidores peptidásicos sobre as modi-ficações ultra-estruturais

Foi apenas estudado o efeito do inibidor das endo-peptidases do tipo cisteína (E-64) sobre as modifica-ções ultra-estruturais da carne de coelho, uma vezque só este consegue inibir significativamente asmodificações estruturais nos seus vários tipos demúsculo esquelético. Os resultados obtidos mostramque a injecção ante-mortem de E-64 inibe parcial-mente as principais modificações ultra-estruturaisdas miofibrilas da carne de coelho, nos três músculosesqueléticos observados, logo ao fim de 3 dias dematuração a 4 °C (Quadro 1).

A inibição da degradação das linhas Z e da perdada densidade electrónica das linhas M, induzida peloE-64, é inibida ligeiramente (de modificação mode-rada para modificação ligeira) logo ao fim de 3 diasde maturação nos três músculos esqueléticos obser-vados (com excepção da degradação das linhas Z no

músculo SP, que não se observa nem nos animaiscontrolo, nem nos animais injectados com E-64),inibição essa que se mantém até aos 6 dias de matu-ração do músculo esquelético post-mortem. A fracturatransversal dos sarcómeros ao nível da região N2,por seu turno, é moderadamente inibida (de modifi-cação acentuada para modificação ligeira) pelo E-64,nos três músculos esqueléticos observados, duranteos 6 dias de acondicionamento da carne de coelho a4 °C. A evolução desta inibição da fractura transversaldos sarcómeros, durante os 6 dias de maturação,relaciona-se muito bem com a inibição da tenrificaçãoda carne de coelho induzida pelo mesmo inibidordas peptidases. Por último, verifica-se que o E-64inibe moderadamente (de modificação acentuadapara modificação ligeira) a fissura longitudinal dasmiofibrilas e a perda do alinhamento transversal dasmesmas, ao fim de 3 dias de maturação, mas apenasligeiramente (de modificação acentuada para modifi-cação moderada), ao fim dos 6 dias de acondiciona-mento em refrigeração (4 °C), de forma paralela emtodos os músculos esqueléticos observados.

A inibição (ligeira ou moderada) de todas asprincipais modificações ultra-estruturais observadasnas miofibrilas da carne de coelho, nos animais in-jectados ante-mortem com E-64, constitui um forteindício experimental da existência de uma contribui-ção importante das endopeptidases cisteína para agénese dessas modificações ultra-estruturais (muitoimportante para a fractura transversal dos sarcómeros).O facto da inibição destas modificações ultra-estru-turais pelo E-64 ser apenas parcial, pode significaruma inibição incompleta das endopeptidases cisteínae/ou a existência de outros factores físico-químico-

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Figura 3 - Efeito da administração ante-mortem de inibidores das endopeptidases sobre a evolução da fragmentação miofibrilar da carnede coelho, ao longo da maturação em refrigeração (4 °C), para cada um dos seus diferentes tipos de músculo esquelético (tipo I, semi-membranoso próprio; tipo IIB, semimembranoso acessório; e tipo IID, psoas maior). As barras verticais representam o desvio padrãoassociado a cada uma das médias de r réplicas; as médias assinaladas com * são estatisticamente significativas (H0: p<0,05).

EFEITO DOS INIBIDORES PEPTIDÁSICOS SOBRE A FRAGMENTAÇÃO MICROFIBRILIAR DA CARNE DE COELHO (diferentes tipos de músculo esquelético)

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-enzimáticos igualmente contribuintes para essasmodificações.

Dentro das endopeptidases cisteína, a acção predo-minante nestas modificações ultra-estruturais pareceser desempenhada pelas calpaínas. Com efeito,embora as catepsinas B e L também consigam pro-vocar in vitro as modificações ultra-estruturais emcausa (Ouali, 1992), contrariamente ao que acontececom a catepsina H (Oulai et al., 1987), a limitaçãofactorial das modificações (que terminam ao fim de3 dias de maturação, muito embora só uma pequenapercentagem dos sarcómeros as apresentem) sugerefortemente uma acção predominante das calpaínas.Por outro lado, o papel muito importante que ascalpaínas parecem ter na fragmentação miofibrilarao nível da região N2, constitui outro argumento depeso a favor da sua acção na fractura transversal dossarcómeros ao nível da mesma região. No entanto, alocalização da actividade principal das catepsinas noretículo sarcoplasmático próximo da região N2 (e daslinhas Z), sugere que as catepsinas B e L tambémpodem contribuir para a generalidade destas modifi-cações ultra-estruturais.

Pelas razões já anteriormente mencionadas, não éde admitir qualquer papel das restantes endopeptidasesnas modificações ultra-estruturais da carne de coelhodurante a maturação em refrigeração. Em contrapar-tida, não se pode excluir a contribuição de factoresfísico-químicos para a génese destas modificaçõesultra-estruturais. Dentro destes factores físico-quími-cos, os iões cálcio têm sido responsabilizados peladegradação das linhas Z e pela fractura transversaldos sarcómeros ao nível da região N2. A possívelcontribuição dos iões cálcio, para as referidas modi-

ficações ultra-estruturais, é apoiada pela supostaacumulação destes iões na região N2 do sarcómero(Vignon et al., 1989).

Possíveis factores e mecanismos responsáveis pelatenrificação da carne

Os resultados da injecção ante-mortem de inibidoresdas endopeptidases constituem um forte indícioexperimental de que o processo de tenrificação dacarne de coelho durante a sua maturação a 4 °C, nosseus vários tipos de músculo esquelético, se devepredominantemente à acção das endopeptidasescisteína. Dentro deste tipo de endopeptidases, osresultados fornecem um argumento experimental afavor da acção predominante das calpaínas no referidoprocesso de tenrificação da carne de coelho. Éadmissível que outras endopeptidases cisteína, paraalém das calpaínas, desempenhem também algumaacção, ainda que minoritária, na tenrificação dacarne de coelho em refrigeração (4 °C). Ao invés, osresultados constituem um forte argumento experi-mental contra um papel significativo de quaisqueroutros factores físico-químico-enzimáticos, paraalém das peptidases do tipo cisteína, na referidatenrificação da carne de coelho. Assim sendo, osnossos resultados não suportam qualquer papelimportante de nenhum dos muitos factores sugeridoscomo responsáveis pela tenrificação da carne, paraalém das endopeptidases cisteína.

O mecanismo de tenrificação da carne de coelhoparece ter que ver, principalmente, com o enfraque-cimento da estrutura miofibrilar ao nível da regiãoN2 do sarcómero. Esta proposição apoia-se nos

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Quadro 1 - Apreciação semi-quantitativa do efeito da administração ante-mortem de E-64 sobre as principaismodificações ultra-estruturais das miofibrilas da carne de coelho, em função do tempo de maturação (4 °C) edo tipo de músculo esquelético (tipo I, semimembranoso próprio - SP; tipo IIB, semimembranoso acessório -SA; e tipo IID, psoas maior - PM). O significado dos sinais, utilizados para expressar as modificações ultra--estruturais das miofibrilas, é o seguinte: -, modificação ausente; +, modificação ligeira; ++, modificaçãomoderada; e +++, modificação acentuada.

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seguintes argumentos experimentais: 1) na existên-cia de uma correlação muitíssimo elevada entre asevoluções da tenrura e da fragmentação miofibrilarinduzida mecanicamente (região N2), nos três tiposde músculo esquelético da carne de coelho, duranteos 9 dias de maturação a 4 °C (H0: p<0,001, df=6);2) no facto das evoluções da tenrura e da fragmenta-ção miofibrilar induzida mecanicamente pareceremser limitadas pelos factores (calpaínas), uma vez queos processos param antes dos seus substratos teremsido completamente degradados; 3) na constataçãode uma relação estreita entre as evoluções da tenrurae da fractura transversal dos sarcómeros ao nível daregião N2, ao longo da maturação da carne de coe-lho, nos três tipos de músculo esquelético estudados;4) na inibição moderada da fractura transversal dossarcómeros ao nível da região N2, nos coelhos injec-tados ante-mortem com E-64, em todos os tipos demúsculo esquelético; 5) e na ausência de relaçõesestreitas entre as evoluções da tenrura e de todas asoutras modificações ultra-estruturais observadas,bem como da formação do fragmento de 30 kDa nosmúsculos do tipo I. Estes argumentos experimentaisvêm assim reforçar a hipótese, já previamenteformulada para outras espécies de mamífero, de quea fractura transversal dos sarcómeros (região N2)constitui a principal modificação ultra-estrutural res-ponsável pela tenrificação da carne, durante a suamaturação em refrigeração (Valin e Ouali, 1992,Koohmaraie, 1994 e Taylor et al., 1995b). Pelo con-trário, os nossos resultados experimentais contrariamqualquer papel importante da degradação das linhasZ na tenrificação da carne, conforme propõem osdefensores da teoria da linha Z (Davey e Gilbert,1969 e Robson, 1995).

Por seu turno, propõe-se também que o enfraque-cimento da estrutura miofibrilar, ao nível da regiãoN2 do sarcómero, seja provocado pela cisão dos fila-mentos elásticos de titina (no domínio PEVK) e dosfilamentos inextensíveis de nebulina (próxima da ex-tremidade carboxílica). Esta hipótese baseia-se nofacto destes dois tipos de filamentos longitudinais dosarcómero, que desempenham um papel fundamen-tal na estabilização da estrutura miofibrilar, se cindi-rem numa posição próxima da região N2 durante amaturação das carnes de mamífero. Com efeito, amolécula/filamento de titina apresenta um sítio sus-ceptível de cisão no domínio PEVK, localizado pró-ximo da região N2 do sarcómero e possivelmenteresponsável pela elasticidade da molécula (Labeit eKolmerer, 1995). Por outro lado, encontra-se bemidentificada uma região na molécula das calpaínas, aregião IS2, com capacidade de ligação à região N2

da titina (Sorimachi et al., 1997). Relativamente àmolécula de nebulina, esta exibe igualmente um sítiosensível à fragmentação numa das extremidades damolécula, que pode estar relacionada com o desapa-recimento da região N2 do sarcómero (Taylor et al.,1995a). O facto da titina e da nebulina apresentaremgeralmente uma velocidade de fragmentação inferiore superior à velocidade de tenrificação da carne,respectivamente, sugere também um contributo

conjunto de ambas as proteínas para a tenrificaçãoda carne (Fritz e Greaser, 1991). Um papel impor-tante da titina e/ou da nebulina para o processo detenrificação da carne, durante a maturação em refri-geração, tem sido proposto por várias teorias,concretamente: 1) pela teoria do cálcio para a tenrifi-cação da carne (titina e nebulina, entre outras, frag-mentadas por acção dos iões cálcio); 2) pela teoriado domínio PEVK da titina para a textura da carne(titina fragmentada por acção dos iões cálcio); 3)pela teoria dos filamentos elásticos de titina para atenrificação da carne (titina degradada por acção daspeptidases em geral); 4) e pela teoria de Taylor et al.(1995a) para a tenrificação da carne (titina e nebulina,entre outras, degradadas por acção das calpaínas).Embora os valores de tenrura da carne de coelho seencontrem inversamente correlacionados (H0:p<0,01) com os teores de fragmento de 30 kDa nosmúsculos SA e PM (tipo II), o mesmo não se passano seu músculo SP (tipo I), onde este fragmentoproteico não se forma durante toda a maturação dacarne de coelho. Deste modo, a formação dofragmento de 30 kDa não pode estar directamenteenvolvida na tenrificação da carne de coelho durantea maturação visto não ocorrer em todos os músculosesqueléticos. Mesmo assim, o teor deste fragmentoproteico pode ser um bom indicador da maturaçãoda carne de coelho, dado que nesta espécie animalexiste um largo predomínio dos músculos esqueléticosdo tipo II (Aigner et al., 1993).

É geralmente aceite que os factores e mecanismosresponsáveis pela maturação da carne, a temperaturasde refrigeração, são comuns a todas as espéciesanimais (Ouali, 1990, 1991 e 1992). O modelo deDransfield et al. (1981a e 1981b) mostra que a tenri-ficação das várias carnes de mamífero, durante a suamaturação entre 0 e 20 °C, obedece a uma mesmacinética de primeira ordem, relativamente poucoinfluenciada pela espécie animal, concretamente: 32vezes menos do que pela temperatura de maturaçãoe 3 vezes menos do que pelo tipo de músculo esque-lético. Assim sendo, admite-se a validade da extra-polação dos resultados obtidos na carne de coelhopara carnes de mamífero com maior interesse comer-cial (bovino, suíno e ovino), em iguais condições dematuração (4 °C) e para os mesmos tipos histoquí-micos de músculo esquelético.

Conclusões

Com base no pressuposto geralmente aceite de queo mecanismo de maturação da carne é comum atodas as espécies de mamíferos, os resultados consti-tuem um forte indício experimental da acçãopredominante das endopeptidases cisteína no processode tenrificação dos vários tipos de músculo esquelé-tico da carne dos mamíferos, durante a sua maturaçãoem refrigeração (4 °C). Dentro deste tipo de en-dopeptidases, parecem ser as calpaínas a desempenhara acção principal no referido processo de tenrificação.Os nossos resultados não suportam qualquer papelimportante de nenhum outro factor físico-químico-

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-enzimático na tenrificação da carne dos mamíferosem refrigeração.

O mecanismo desta tenrificação da carne dosmamíferos parece ter que ver, principalmente, com oenfraquecimento da estrutura miofibrilar ao nível daregião N2 do sarcómero. Ao nível molecular, o refe-rido enfraquecimento da estrutura miofibrilar podeser provocado pela cisão dos filamentos elásticos detitina (domínio PEVK da molécula de titina) e dosfilamentos inextensíveis de nebulina (próxima da ex-tremidade carboxílica da molécula de nebulina).

Os resultados obtidos fornecem um poderoso indí-cio experimental da existência de um contributo im-portante das endopeptidases cisteína para afragmentação da troponina T com formação dofragmento de 30 kDa, bem como também para asprincipais modificações estruturais e ultra-estruturaisdas miofibrilas (muito importante para a fracturatransversal dos sarcómeros), durante a maturação (4°C) da carne dos mamíferos. As calpaínas parecemdesempenhar um papel importante em todas essasmodificações das miofibrilas, muito embora ascatepsinas B e L, e os iões cálcio (estes últimos apenasna degradação das linhas Z e na fractura transversaldos sarcómeros), possam contribuir também deforma significativa para essas modificações caracte-rísticas da maturação da carne.

Agradecimentos

Agradece-se ao CIISA - Centro de InvestigaçãoInterdisciplinar em Sanidade Animal (Faculdade deMedicina Veterinária da Universidade Técnica deLisboa) o financiamento do presente trabalho deinvestigação científica, através do Projecto CII-SA/1994/9.CARNE VERDE.

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