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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
ERNANDO GARCIA DA SILVA JUNIOR
CONTRATOS ELETRÔNICOS INTERNACIONAIS
Fortaleza - Ceará 2007
ERNANDO GARCIA DA SILVA JUNIOR
CONTRATOS ELETRÔNICOS INTERNACIONAIS
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Abimael Carvalho
Fortaleza - Ceará
2007
ERNANDO GARCIA DA SILVA JUNIOR
CONTRATOS ELETRÔNICOS INTERNACIONAIS
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Abimael Carvalho
Aprovada em 18 de janeiro de 2007.
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________ Prof. Abimael Carvalho (Orientador)
Universidade Federal do Ceará e Faculdade Integrada do Ceará
________________________________________________ Prof. Clávio de Melo Valença Filho
Faculdade de Direito de Garanhuns/PE
________________________________________________ Prof. Sérgio Bruno Araújo Rebouças
Universidade Federal do Ceará
A Deus, fonte primária de
toda a grandeza do
universo.
A meus pais, Ernando e
Marta, por tudo o que
representam.
AGRADECIMENTOS
Agradecer é reconhecer que nunca estamos sozinhos e que sempre
precisaremos dos familiares, amigos, colegas e até de desconhecidos para
realizar algo na vida, por menor que seja a participação deles. Em princípio
agradeço a Deus pela força constante.
Aos meus pais, Ernando Garcia da Silva e Marta Maria Costa da Silva,
pela educação e respeito à liberdade de escolhas. Em especial, a minha mãe,
sempre presente nos momentos mais difíceis. Agradeço também a toda minha
família.
Ao professor Abimael Carvalho Neto, que com muita presteza e
dedicação me orientou neste estudo monográfico, fornecendo-me subsídios
teóricos e aperfeiçoando a idéia do meu tema, já tratado por mim durante a
graduação, de maneira mais simplificada.
Agradeço também aos professores Sérgio Bruno Araújo Rebouças e
Clávio de Melo Valença Filho por terem aceitado meu convite para compor a
mesa examinadora.
Por conseguinte, agradeço a todos meus amigos e colegas da
faculdade e da vida que contribuíram com a realização do presente trabalho, em
especial à Sibéria Nobre, Régis Peixoto, Fábio Nogueira, Nádia Valesca, Tatyana
Cavalcante, André Luiz, Esdras Rabelo, Tiago Paulo, André Menescal e Larissa
Lima.
“O rio atinge seus objetivos porque aprendeu a contornar obstáculos”.
Lao -Tsé
Nemo nascitur sapiens
"Si avanzo, seguidme; si me detengo, empujadme; si retrocedo, matadme"
Che Guevara
RESUMO
Diante dos avanços dos meios eletrônicos, a questão contratual ganhou novo
formato. Encontra-se a figura do contrato eletrônico possuindo a mesma validade
da forma contratual tradicional. Não se trata de outro instrumento jurídico, posto
que estão presentes em sua formação os requisitos exigidos pela lei brasileira:
partes capazes, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Diretamente a
este fenômeno contratual está a questão do comércio eletrônico, principalmente
no campo dos contratos de compra e venda de bens e serviços por meio de
sistemas de rede. Acentuam-se, também, problemas jurídicos nos contratos
eletrônicos, devido à insegurança que ainda impera na Internet, seu caráter
internacional e os conflitos de lei e de competência. Outro ponto relevante é a
aplicação da defesa do consumidor brasileiro em território estrangeiro. O
legislador pátrio e estrangeiro já busca compreender os recentes fenômenos,
buscando regulamentar as relações contratuais realizadas através da Internet.
Palavras chaves: contratos eletrônicos; Internet; comércio eletrônico; consumidor.
ABSTRACT
Before the advances of electronic resources, the contractual matter has won a
new format. The Electronic Contract has been presented in the legal world,
having the same juridical value as the traditional contract form. It is not necessary
to have another legal tool, though there are found in its formation all requirements
demanding by Brazilian law, such as the capacity of the parts, legal object and
established form or not prohibited by law. This contractual phenomenon is linked
to the Electronic Commerce (e-commerce) subject that consists primarily of buying
and selling products or services trough electronic systems such as the Internet.
Actually, some law problems appear in this contractual form, related to Internet
unreliability, world wild range and law conflicts and competence. Other important
point is applying Brazilian costumer law in international lands. The national and
foreign legislator seeks for a new phenomena understanding, looking for
prescribing Internet contractual relations.
Key Words: electronic contracts; Internet; e-commerce, costumer.
SUMÁRIO
Introdução ................................................................................................... 10 1 Contratos Eletrônicos
1.1. Conceito ........................................................................................ 16 1.2 Adoção do termo eletrônico em detrimento de outros ................... 19 1.3 Classificação dos contratos eletrônicos ......................................... 23 1.3.1 Contratações Intersistemáticas ............................................ 24 1.3.2 Contratações Interpessoais ................................................. 25 1.3.3 Contratações Interativas ...................................................... 27 1.4 Formação dos contratos eletrônicos .............................................. 28 1.4.1 Declaração de vontade ........................................................ 29 1.4.2 Momento da formação ......................................................... 32 1.4.3 Local da formação................................................................. 34 1.5 Condições de validade dos contratos eletrônicos .......................... 38 1.6 Assinatura digital ............................................................................ 44
2 Comércio Eletrônico Internacional 2.1 Conceito e parâmetros.................................................................... 51 2.2 Compra e venda de Bens através da rede .................................... 54 2.3 Fornecimento de serviços na Internet ............................................ 62
3 Aspectos Legais 3.1 Estrutura jurídica dos negócios via Internet.................................... 42 3.2 Lei aplicável e Competência .......................................................... 73 3.3 Competência nas relações de consumo ........................................ 81
Considerações Finais ................................................................................ 87 Referências ................................................................................................. 90
INTRODUÇÃO
Com o advento da Informática e a criação da Internet, as relações entre
os indivíduos ganharam novos formatos. A humanidade passou a deparar-se com
uma nova realidade, na qual as fronteiras e distâncias entre as pessoas foram
reduzidas pelos monitores exibindo informações de toda natureza.
Diversas atividades são realizadas através do meio eletrônico, as quais
não podem ser simplesmente ignoradas pelo legislador, tampouco pelos órgãos
jurisdicionais. Dentre elas, destaca-se o comércio. É evidente que esta atividade
não poderia estar à margem dos meios cibernéticos, já que sempre estão
presentes no cotidiano os mais simples atos de compra e venda, seja de bens ou
de serviços.
Assim, surge uma nova atividade que passa a ser chamada de
comércio eletrônico. É mister que uma das formas mais corriqueiras de contrato, o
de compra e venda, causa uma série de indagações quando realizado através do
meio eletrônico. Nesta modalidade contratual prevalecem o caráter da
impessoalidade e a satisfação incerta.
Para o crescimento sustentável e eqüitativo do comércio eletrônico,
surge a necessidade da criação de medidas de segurança nas transações
realizadas por computadores. Por serem eletrônicas, imateriais e intangíveis, é
11
indispensável uma regulamentação que reconheça a complexidade da
contratação e execução comercial dentro deste meio, adaptando os princípios
gerais do Direito Contratual e Comercial com as particularidades resultantes das
transações eletrônicas.
É importante, antes de tudo, fazer uma distinção óbvia, mas que não é
observada por muitas pessoas que procuram tratar o assunto. A Internet não é
sinônimo de comércio eletrônico, e o comércio eletrônico não é sinônimo de
Internet. A Internet é um meio de comunicação, assim como o rádio, o telefone e
a televisão. O comércio eletrônico é o comércio realizado através de
computadores, cujo principal meio é a Internet. Se uma pessoa se conecta
diretamente ao computador do banco, não utiliza a Internet. Se ela se conecta à
Internet para pesquisar páginas pessoais, não realiza atos de comércio. Um não
depende do outro, apesar de estarem intimamente ligados.
Realizar uma compra ou venda pela Internet possui diversas
vantagens, entretanto existem algumas dúvidas que tornam a atividade temerária
entre os usuários da informática, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas. E
quando se trata da relação entre indivíduos de diversas nações, surge a
necessidade de que seus atos de vontade sejam amparados pelo ordenamento
jurídico, seja ele de seu próprio país ou aquele resultante de tratados e
convenções internacionais.
As transações eletrônicas, atualmente, são governadas por uma
complexa e inconsistente mistura de diferentes aspectos, envolvendo
jurisprudências, a aplicação da analogia, quando cabível, e várias instruções
12
normativas, muitas destas relacionadas a assuntos diversos do comércio
eletrônico.
A inexistência e o desencontro destas normas legais contribuem com a
incerteza que rotunda a comercialização pela Internet, culminando em maiores
custos para esta atividade, e o pior, contribuindo para o seu retardamento, posto
que vultosas quantias são gastas judicialmente devido à incerteza das
responsabilidades advindas da prática do comércio eletrônico, conforme já
verificado em países da Europa.
Tendo em vista que o Brasil é um dos países com um dos maiores
números de internautas do globo e, também, com um dos maiores potenciais de
crescimento, os custos relacionados a esta nova prática comercial, gerados por
tal incerteza, serão de enorme monta. Daí a necessidade da uniformização dos
princípios que estruturarão esta recente modalidade, representando a facilitação e
a redução de custos desta atividade.
O presente trabalho se restringe aos contratos eletrônicos
internacionais, tema que gera muita hesitação por se tratar de algo recente,
embora já se tenha diversos estudos a respeito. É cediço que as atividades
cibernéticas possuem grande mutabilidade em sua forma, posto que o
desenvolvimento tecnológico cria novas formas do relacionamento homem –
máquina – homem.
O assunto em comento é deveras abrangente por sua
interdisciplinaridade. Ao intitular o presente trabalho de Contratos Eletrônicos
Internacionais, busca-se compreender os fenômenos dos contratos ditos
13
eletrônicos, também conhecidos por contratos virtuais, contratos informáticos,
contratos artificiais, contratos cibernéticos, dentre outras denominações.
Utiliza-se aqui o termo internacional, tendo em vista o caráter inerente
desta forma contratual, propícia a facilitar as relações entre indivíduos de nações
distintas, devido à quebra das barreiras geográficas e à velocidade das
informações. Os países possuem cada vez mais integração em termos
econômicos. Cada vez mais, os mercados deixam a esfera nacional para, aos
poucos, se internacionalizarem.
O primeiro capítulo tem por objetivo buscar uma definição para os
contratos eletrônicos e explicar a adoção deste termo em detrimento dos demais.
Sua classificação será apresentada, em conformidade com a doutrina recente,
bem como suas peculiaridades em consonância com a teoria geral dos contratos.
Analisando os elementos de formação e a validade jurídica da
modalidade contratual em epígrafe, encontrar-se-á respostas para as questões
que podem surgir como: Poderá o contrato eletrônico substituir com segurança os
contratos tradicionais? Que garantias possuem os contratantes que utilizam a
Internet como meio para negociar? Qual a maneira efetivamente segura para
celebrar negócios jurídicos eletronicamente? Um documento eletrônico pode ser
utilizado validamente como meio de prova? Como verificar a autenticidade e a
integridade de um documento transmitido em meio eletrônico?
É impossível falar em contrato eletrônico e não adentrar na esfera do
comércio eletrônico. Dito tema está intimamente ligado a esta maneira contratual,
merecendo destaque no capítulo seguinte, no qual será também tratada a teoria
14
geral dos contratos de compra e venda de bens e serviços, servindo de base para
aqueles realizados através da Internet.
O comércio eletrônico se torna uma das mais importantes modalidades
de negócios na atualidade. Não obstante, não há novidade extraordinária na
definição do que caracterize este tipo de comércio, pois nele residem duas idéias
chaves que já faziam parte do nosso cotidiano, e que apenas ganharam uma
nova roupagem: a venda à distância e a venda realizada por máquinas.
A venda à distância remonta-se ao século XIX com a venda por
correspondência, na qual o comerciante faz suas ofertas por meio de catálogos e
o comprador encomenda por via postal, realizando sua compra. Já na década de
1980, temos o exemplo dos processos de telecomunicações para contatar
clientes, no sistema de telemarketing. Em se tratando de venda realizada por
máquinas, encontra-se já há muito tempo a presença de máquinas vendedoras
que fazem simples contratos de compra e venda de mercadorias diretamente ao
adquirente, propiciando-lhe produtos da empresa, a exemplo das máquinas de
refrigerantes, cigarros, jornais, chocolates, dentre outros.
Importante perceber as vantagens da contratação eletrônica em
qualquer tipo de comércio. Ainda que se busque um modelo para as relações
envolvendo troca de dados, existem no mundo eletrônico diversos contratos entre
comerciantes, negociados sem protocolos preestabelecidos, e contratos com
consumidores, surgindo então um ambiente de questões legais. Ditas questões
vão desde a escolha da jurisdição para transações globais no cyberspace e a
possibilidade de formação do contrato sem a intervenção humana até aquela
relativa ao modo de satisfação às formalidade escritas e assinatura das partes em
15
um ambiente "sem papel", onde apenas pressionando um ícone efetiva-se um
contrato entre as partes.
Destarte, no capítulo final, serão abordados os aspectos legais
concernentes aos contratos em tablado, bem como sua aplicação sobre o
comércio eletrônico, seja ele nacional ou internacional. Devido à ausência de
legislação específica, utiliza-se, a exemplo dos doutrinadores e operadores do
direito, a aplicação, seja diretamente ou por analogia, dos preceitos da legislação
vigente, pertinentes aos negócios e práticas tradicionais no comércio, bem como
os princípios inerentes a Lei de Introdução ao Código Civil no que for pertinente,
dado o caráter internacional da forma contratual em tela.
Por fim, não será esquecida a problemática da satisfação do
consumidor, posto que não se pode afirmar categoricamente que a lei
consumeirista brasileira será sempre aplicada, principalmente porque algumas
relações contratuais serão expressamente regidas pela lei estrangeira. A questão
poderá situar-se na validade e eficácia extraterritorial da lei brasileira.
É evidente que este estudo monográfico não tem a pretensão de
esgotar um tema tão amplo e controverso, muito menos dar um parâmetro
definitivo ao tema, não obstante, outrossim, trazer à luz do mundo jurídico
algumas crítica, posições e sugestões com relação a esta recente realidade nas
relações contratuais entre os indivíduos, nacionais ou alienígenas, bem como sua
implicação no comércio eletrônico internacional.
1 CONTRATOS ELETRÔNICOS
1.1 CONCEITO
Contrato, do latim contractu, significa trato com. É a reunião de
interesses de pessoas acerca de determinada coisa, objetivando a produção de
efeitos no mundo jurídico, com a constituição, modificação, manutenção ou
extinção de direitos.
Como afirmado por Washington de Barros Monteiro, “é o acordo de
vontades que tem por fim criar, modificar ou extinguir um Direito". 1
Ulpiano, afirmou que: "duorum pluriumve in idem placitum consensus",
vale dizer contrato é mútuo consenso de duas ou mais pessoas sobre o mesmo
objeto.
Também pode-se utilizar o conceito mais puro de contrato, elaborado
pelo jurista Clóvis Bevilacqua:
Pode-se considerar o contrato como um conciliador dos interesses, colidentes, como um pacificador dos egoísmos em luta. É certamente esta a primeira e mais elevada função social do contrato. E, para avaliar-se de sua importância, basta dizer que debaixo deste ponto de vista, o contrato corresponde ao direito, substitui a lei no campo restrito do negócio por ele regulado. 2
1 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: Direito das obrigações, 2ª Parte. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 2 BEVILÁCQUA, Clóvis, Direito das Obrigação, 3ª edição acrescentada, 1931
17
Segundo a definição elaborada por Maximilianus Fuhrer, o “contrato é a
convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou
extinguir entre elas uma relação jurídica patrimonial.” 3
O contrato possui três princípios básicos, além de suas condições de
validade, quais sejam: autonomia da vontade, o princípio da supremacia da ordem
pública e a obrigatoriedade.
É importante frisar que o Código Civil incorporou expressamente os
princípios contratuais como a boa-fé objetiva e a função social do contrato,
conforme expresso nos artigos 421 e 422.4
Dentre as funções do contrato, não se pode afastar a preservação da
vontade individual que deverá estar em consonância com os interesses do grupo
social. Destarte, os direitos contratuais, além de garantia constitucional como
direitos adquiridos (art. 5º, XXXVI), gozam nos termos da Carta Magna a proteção
do devido processo legal (art. 5°, LIV), no qual ninguém poderá ser privado de
seus bens sem o devido processo legal.
As definições, bem como os princípios acima mencionados, são
perfeitamente aplicáveis aos contratos eletrônicos, visto que do seu conteúdo se
depreende inexistir qualquer elemento incompatível com a teoria geral dos
contratos. A natureza bilateral do negócio jurídico é perfeitamente identificável na
forma contratual em tela, bem como a sua formação pressupõe o encontro da
vontade emanada das partes acordantes, tal qual nos contratos em geral. Assim 3 FUHRER, Maximilianus C.A. Resumo de Obrigações e Contratos. 12ª edição. São Paulo:Malheiros Editores. p.27. 4 Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
18
sendo, são eles perfeitamente aptos a produzirem os efeitos jurídicos inerentes
aos contratos, observando o princípio do pacta sunt servanda.
Ronaldo Alves de Andrade entende que contrato virtual, ou seja,
aquele celebrado por meio eletrônico é:
[...] o negócio jurídico celebrado mediante a transferência de informações entre computadores e cujo instrumento pode ser decalcado em mídia eletrônica, compreendendo nessa categoria os contratos celebrados via correio eletrônico, Internet, Intranet, EDI (Eletronic Date Interchange) ou qualquer outro meio eletrônico, desde que permita a representação física do negócio em qualquer mídia eletrônica, como CD, disquete, fita de áudio ou vídeo. 5
No mesmo sentido, entende Manoel J. Pereira dos Santos citado por
Erica Brandini Barbagalo: “São chamados contratos eletrônicos os negócios
jurídicos bilaterais que utilizam o computador como mecanismo responsável pela
formação e instrumentalização do vínculo contratual.” 6
Pertinente ainda, a colocação de Ronaldo Alves de Andrade:
[...] o contrato eletrônico não tem um perfil ou natureza jurídica distinta da dos contratos em geral. Não se trata de nova espécie não tipificada de contrato, como são os contratos de leasing, de franquia, de cartão de crédito, etc. Em verdade, é tão-somente um novo e atual meio de se efetivar um contrato, cuja instrumentação pode ser aportada em mídia eletrônica.7
E ainda, a sucinta definição dada por Luiz Guilherme Loureiro, “os
contratos eletrônicos nada mais são do que os pactos usuais no meio jurídico,
5 ANDRADE, Ronaldo Alves de. Contrato eletrônico no novo código civil e no código do consumidor. São Paulo:Manole, 2004. 6 BARBAGALO, Érica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001. 7 ANDRADE, Ronaldo Alves de. Contrato eletrônico no novo código civil e no código do consumidor. São Paulo:Manole, 2004.
19
como, por exemplo, a compra e venda, a prestação de serviço e o mútuo,
aperfeiçoados mediante o concurso da informática. 8
Em termos gerais, o contrato eletrônico é aquele realizado ou
executado pela via eletrônica. O contrato celebrado mediantes meios eletrônicos
em toda sua formação, é tido como contrato eletrônico stricto sensu. Por outra
banda, o contrato avençado de modo tradicional, mas executado eletronicamente,
é considerado contrato eletrônico latu sensu. Portanto, ambas as categorias estão
inclusas dentro do conjunto desta forma contratual, presente na atualidade de
forma cada vez mais incisiva.
Diante do exposto, em suma, pode-se definir que contrato eletrônico é
o acordo de vontades individuais, celebrado ou executado pela via eletrônica, que
resulta na constituição, modificação, manutenção ou extinção de direitos,
obrigando todas as partes acordantes ou contratantes.
Cumpre ressaltar que os contratos eletrônicos têm a mesma validade
dos contratos comuns, o que difere um do outro é tão somente a forma da
contratação, através de um computador ligado à Internet, no qual a transferência
e compilação de dados expressa o que anteriormente era feito apenas na forma
impressa.
Destarte, entende-se que a Internet é apenas um meio de formação
contratual, como já entendido pela doutrina dos contratos em geral, não se
podendo ter a idéia fantasiosa de que se trata de um outro instrumento jurídico,
pelo simples fato de ele ser celebrado através de um sistema de redes.
8 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Teoria geral dos contratos no novo código civil. São Paulo: Método, 2002.
20
1.2 ADOÇÃO DO TERMO ELETRÔNICO EM DETRIMENTO DE OUTROS.
Para a forma contratual objeto do presente estudo, são apresentadas
denominações como: “contratos virtuais”, “contratos informáticos”, “contratos
artificiais”, “contratos eletrônicos”, dentre outros.
Os contratos informáticos são os contratos que têm por objeto os bens
produzidos pela informática, tais como contratos de licença de uso de software
(programas), de desenvolvimento de programas, de locação e manutenção de
equipamentos, construção e manutenção de banco de dados. Neste tipo
contratual, a informática fornece os bens por ela tutelados, mas não exatamente
os meios de execução e contratação.
A denominação de contratos virtuais não se aplica aos contratos
celebrados ou executados por intermédio de meios eletrônicos, senão vejamos. A
potencialidade do contrato virtual ensejaria alegações de que os pactos realizados
não teriam eficácia, tendo em vista não constituírem obrigações reais. Assim, os
consumidores tornar-se-iam reféns da faculdade dos proponentes em cumprirem
os pactos realizados, os preços avençados, de modo que as Leis de Consumo
deixariam de assegurar direitos, perdendo sua eficácia.
Por outro lado, faz-se oportuno recorrer às palavras de Pierre Lévy no
qual afirma “virtual é o que não existe como realidade, mas como potência ou
21
faculdade; que equivale a outro, podendo fazer às vezes deste, em virtude ou
atividade; potencial; que não tem efeito atual; possível.”9
Um contrato celebrado em meio eletrônico pode ser executado até
imediatamente à sua aceitação, a exemplo de um download de um programa que
se dá logo em seguida a sua compra realizada, seja por intermédio de débito
automático ou cartão de crédito.
Os contratos eletrônicos verdadeiros, ou seja, os contratos sérios,
realizados respeitando os princípios da boa-fé, são reais, verdadeiros, idôneos,
estando os mesmos distantes de serem potenciais.
Ao passo que o comércio eletrônico toma conta de uma grande parcela
dos negócios realizados entre os indivíduos, ditos contratos devem impor
confiablidade, para que não haja descrédito e conseqüentemente abstenção em
seu uso.
No tocante à denominação contratos artificiais, ao utilizá-la, tem-se, a
exemplo dos contratos virtuais, algo não real. Cumpre ressaltar que a
possibilidade de tornar-se real estaria sometida ao talante dos contratantes, em
contraposição ao pacta sunt servanda, como se o ato realizado não gerasse
nenhum efeito jurídico. Portanto, tais contratos, seja porque praticamente
inexistem, seja pela razão da potencialidade que representam, não interessam ao
mundo jurídico.
No estudo em epígrafe, adota-se o termo contratos eletrônicos, para
aqueles celebrados ou executados por meio eletrônico, ou seja, possuem a forma
9 LEVY, Pierre. O que é virtual. Tradução de Paulo Neves. São Paulo. Ed.34,1996
22
concebida através de dados informatizados, operacionalizados por meio do
computador.
É mister ressaltar que o uso da expressão contrato eletrônico não é
unanimemente aceita entre os juristas pátrios. Apoiados em preciosismos
técnicos, alguns autores defendem como mais correto o uso de termos tais como
contratos cibernéticos, contratos digitais, contratos por computador, contratos on-
line, contratos informáticos ou por meio de informática.
Um dos grandes opositores ao uso da expressão contratos eletrônicos
é Silvânio Covas, que, ao sustentar como mais correto o termo contratos por meio
de informática, adverte:
Trata-se de analisar contratos usuais no meio jurídico, que são aperfeiçoados mediante o concurso da informática. Dessa forma, se apresenta imprópria a denominação de contratos eletrônicos, pois o contrato pode ser de compra e venda, de prestação de serviço, de cessão de uso etc., e o fato de serem realizados por meio eletrônico não lhes retiram as características que lhes dão nome e classificação. Igualmente não se pode falar em contratos por computador, pois o hardware simplesmente dá base para operacionalizar o software, sendo que este, sim, vai oferecer o ambiente para o aperfeiçoamento do contrato. De qualquer forma, ambos, hardware e software integram o conceito mais amplo de informática. Abandona-se, por fim, a opção por contratos on-line, pois a informática também permite a contratação off-line, sem contudo deixar de ser um método informatizado para realização do contrato.
Em que pese todo o esforço do ilustre autor, as diferenças apontadas
para justificar a não utilização de um ou de outro termo, verifica-se, apoiado no
mesmo entendimento de Flúvio Cardinelle Oliveira Garcia10, revestem-se de
sutilezas de natureza técnica que mais interessam às ciências informáticas do
que ao Direito.
10 GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 264, 28 mar. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4992>. Acesso em: 02 jan. 2007.
23
Assim, por ser a mais difundida e usual, adota-se a expressão contrato
eletrônico, como já ressaltado, visando, inclusive, a seguir a mesma linha da
denominação já consagrada nas expressões documento eletrônico, comércio
eletrônico (e-commerce), correio eletrônico (e-mail), mensagem eletrônica e
banco eletrônico, dentre outras.
Diante do exposto, não há que se falar em contratos informáticos,
virtuais ou artificiais, porque os celebrados e os executados eletronicamente
versam sobre quaisquer assuntos, têm objeto diversificado, devendo ser
verdadeiros e reais, respeitando o princípio da boa-fé, o verdadeiro pilar da
atividade contratual.
1.3 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS
A contratação eletrônica pode ser dividida em dois grupos distintos: a
contratação automática e a contratação interpessoal. A primeira é aquela que
ocorre totalmente automatizada, ou seja, estabelecida entre a pessoa e um
sistema previamente programado. Já a segunda, é aquela realizada entre duas
pessoas através de uma rede de computadores, geralmente pela Internet.
Importante destacar que a contratação totalmente automatizada, sendo
aquela que dispensa qualquer intervenção humana, suscita maiores
questionamentos jurídicos, justamente pela ausência de qualquer vontade no
momento da celebração dos negócios jurídicos.
Existem diferentes classificações apresentadas pelos estudiosos do
tema, porém todas são unânimes no tocante ao ponto de partida, os diversos
24
modos possíveis de contratação eletrônica. Diferem, portanto, das classificações
tradicionais, uma vez que se baseiam nas variadas formas de utilização do
computador, conectado em rede, para a manifestação de vontade das partes.
Com o intuito de facilitar a resolução da referida problemática,
apresenta-se o modelo proposto por Marisa Delapieve Rossi11, que divide a
contratação eletrônica em três categorias de contratos: os interpessoais, os
interativos e os intersistêmicos.
1.3.1 Contratações Intersistemáticas
Os contratos eletrônicos intersistêmicos são aqueles em que a
contratação eletrônica se estabelece entre sistemas aplicativos pré-programados,
sem qualquer ação humana, utilizando a Internet como ponto convergente de
vontades preexistentes, estabelecidas em uma negociação prévia. Tal
modalidade ocorre predominantemente entre pessoas jurídicas, para relações
comerciais de atacado.
Nesta forma contratual, as partes estabelecem as regras para a
utilização do sistema de comunicação entre elas, sendo este um contrato
acessório ao principal.
Cumpre enfatizar que a contratação principal é feita em um momento
anterior, sem a utilização de qualquer equipamento de informática. Nessa fase, as
partes emitem suas declarações de vontade, seguindo, em regra, o modelo
tradicional dos contratos, estabelecendo os critérios e protocolos de futuras
transações que serão feitas de forma automática, sem intervenção humana, pelos
11 ROSSI, Marisa Delapievi. Aspectos legais do comércio eletrônico – Contratos de adesão. Anais do XIX Seminário Nacional de Propriedade Intelectual da ABPI, 1999, p.105.
25
sistemas de computador de cada contratante. Estes estarão programados para
realizar, eletronicamente, os negócios jurídicos acessórios, vinculados e regidos
por um contrato escrito previamente ajustado entre as partes.
Marisa Delapieve Rossi esclarece que, na contratação intersistêmica, a
manifestação de vontade dos contratantes se dá no momento em que os sistemas
de computador de cada parte são programados para que a comunicação entre
eles seja estabelecida e, com isso, possibilite a realização de futuras e, via de
regra, sucessivas transações eletrônicas, que poderão constituir-se em contratos
derivados.
Para exemplificar este tipo de contrato, mencionam-se os serviços de
banco de dados, usados pelo comércio e pelos bancos como SERASA, SPC,
Cadastro de Emissão de cheques sem fundos, bem como a assinatura de
provedores de acesso a Internet. Nestes exemplos, as informações são trocadas
entre computadores, entretanto foram negociadas previamente através de outro
contrato.
1.3.2 Contratações Interpessoais
Essa forma contratual é aquela, pela qual, previamente à contratação,
existe uma comunicação eletrônica para a formação da vontade e a
instrumentalização do contrato que é celebrado tanto por pessoas físicas, quanto
jurídicas. Diferentemente da contratação intersistemática, não é uma simples
forma de comunicação de uma vontade pré-constituída, ou de execução de um
contrato concluído previamente;
26
Este tipo de contrato é subdividido em duas espécies: recepção
instantânea da declaração de vontade e aceitação e a não recepção instantânea
da declaração de vontade e aceitação.
Os simultâneos são celebrados em tempo real, quando as partes estão
conectadas respectivamente, ou na melhor linguagem cibernética, on-line,
possibilitando que a declaração de vontade seja recebida pelo policitante no
momento que é declarada pelo oblato. Seriam, nestes casos, os contratos
celebrados através dos bate-papos (chats), vídeo conferências ou através de
programas de comunicação instantânea, como o ICQ, MSN Messenger, Yahoo
Messenger, Skype, Google Talk, dentre outros.
Estes se equiparam aos contratos celebrados através de telefone,
entre pessoas presentes, conforme prevê o artigo 428, inciso I do Código Civil
Brasileiro.12
Nos contratos com recepção não simultânea, a recepção da declaração
de vontade não ocorre simultaneamente, havendo, portanto, certo lapso temporal.
Como exemplo, apresenta-se os contratos celebrados através de correio
eletrônico (e-mail), equiparando-se estes aos celebrados através de
correspondência epistolar comum, prevista nos artigos 433 e 434 do Código Civil
Brasileiro:
Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante. Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:
12 Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante;
27
I - no caso do artigo antecedente; II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta; III - se ela não chegar no prazo convencionado.
A mensagem através de e-mail não pode ser considerada instantânea,
já que é necessário novo procedimento com o computador para que o usuário
possa ter acesso ao conteúdo de suas mensagens, o que afasta de pronto o
caráter imediato.
Nesse sentido, invoca-se a orientação de Erica Barbagalo, que, ao citar
Erica Aoki, explica:
[...] mesmo que a transmissão via correio eletrônico seja muito rápida, esta não pode ser considerada como instantânea. Isso porque, para se ter acesso à mensagem enviada por correio eletrônico, é necessária nova interação com o computador, ou seja, o conteúdo da mensagem não chega ao conhecimento do destinatário involuntariamente: é necessário que este execute nova ação para que possa acessar o conteúdo da mensagem recebida, o que retira a instantaneidade da comunicação.
Posto isto, os contratos eletrônicos que se formarem pela troca de
declarações de vontade efetivadas por correio eletrônico há de serem
considerados como contratos entre ausentes, ou, utilizando a classificação
apresentada, como contratos eletrônicos interpessoais não simultâneos.
1.3.3 Contratações Interativas
Esta talvez seja a mais usual forma de contratação utilizada pelo
comércio eletrônico de consumo, vez que resulta de uma relação de comunicação
estabelecida entre uma pessoa e um sistema previamente programado. Trata-se
de um típico exemplo de contratação à distância, onde os serviços, produtos e
informações são ofertados, em caráter permanente, através do estabelecimento
28
virtual, conhecido por site, acessado pelo usuário, que manifesta sua vontade ao
efetuar a compra.
É válido frisar que a preparação do sistema computacional, que figura
em um dos pólos da relação jurídica, é feita num momento anterior, por uma
pessoa, que estabelece, em seu computador, regras, condições e procedimentos
para a contratação. Em geral, quando da efetiva celebração do contrato, feita
entre um contratante e o sistema eletrônico programado, a parte responsável por
este último não terá ciência imediata de que o negócio jurídico foi firmado.
Sobre esta categoria de contratos eletrônicos, Marisa Delapieve Rossi
leciona que:
As contratações interativas são o resultado de uma relação de comunicação estabelecida entre uma pessoa e um sistema aplicativo. Note-se que o sistema aplicativo com o qual a comunicação se estabelece nada mais é do que um programa de computador que possibilita o acesso a bancos de dados diversos, ao mesmo tempo em que contém funções múltiplas que possibilitam a interação do usuário, para, por exemplo, escolher itens de compra desejados, preencher formulários de dados pessoais e, especialmente, indicar sua aceitação aos termos de fornecimento.
Os contratos interativos são essencialmente contratos de adesão,
quando se apresentarem ao contraente como instrumento contratual cuja
aceitação se dará pela anuência deste às regras já estabelecidas. 13
1.4 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS
Conforme a teoria geral dos contratos, para que ocorra sua formação é
necessário duas declarações de vontade concordando em gerar uma norma
13 BARBAGALO, Érica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001, Pg. 57
29
convencional entre as partes, desembocando no princípio do Pacta Sunt
Servanda.
Alguns juristas entendem que os contratos eletrônicos não constituem
uma nova modalidade de contrato, mas apenas um novo meio de formação do
vínculo negocial, não previsto expressamente pelo nosso legislador. Sob esse
aspecto, não haveria qualquer inovação substancial pertinente aos requisitos de
validade dos contratos eletrônicos e à sua aceitação jurídica com meio de prova.
Com o intuito de dirimir quaisquer dúvidas em relação à existência e
validade do contrato eletrônico, serão analisadas as características e requisitos
concernentes à contratação tradicional, bem como os aspectos relativos à
formação do vínculo contratual. Serão identificadas suas correspondências com
essa recente modalidade contratual, apontando semelhanças e salientando
eventuais diferenças que, apesar de existirem, não podem afastar a credibilidade
e a imperiosa validez da celebração eletrônica nos negócios jurídicos.
1.4.1 Declaração de Vontade
É mister que a partir de atos de manifestação de vontade as partes
acordam em celebrar um determinado negócio jurídico. A exteriorização de uma
declaração de vontade por ser feita por palavras, gestos, desenhos e sinais,
sendo necessária a existência de um meio de comunicação entre os contratantes,
a fim de que um possa conhecer a intenção manifestada pelo outro.
A comunicação utilizada pelas partes para transmitir suas declarações
de vontade não é taxativa, rigorosamente prevista ou determinada. Ao contrário,
30
qualquer maneira eficiente de levar ao conhecimento da parte destinatária o
conteúdo da declaração da parte que a emitiu, será considerada válida.
Destarte, desde que produzam o efeito desejado, poderão ser
utilizados, entre outros: palavras faladas diretamente à parte receptora, seja em
sua presença física ou não, como ocorre nas ligações telefônicas e nas
videoconferências; palavras escritas, expressas por correspondência epistolar ou
por correio eletrônico; e até mesmo gestos, uma vez transmitidos por meio de
recursos televisuais pela rede mundial de computadores. Inúmeras são, portanto,
as combinações possíveis entre meios de exteriorização da vontade e os de
comunicação dessas à parte interessada.
Pelos exemplos expostos, percebe-se que os recursos e as facilidades
presentes no meio magnético possibilitam a perfeita exteriorização de vontades
das partes contratantes. O correio eletrônico é um exemplo de declaração de
vontade expressa por palavra escrita. A videoconferência, por sua vez, é um
exemplo claro de manifestação volitiva feita por meio de palavra falada e, por que
não dizer, gestos e sinais. O meio de comunicação destas vontades, contudo,
será sempre o mesmo: uma rede de computadores.
Sobre a validade desta declaração de vontade, Erica Barbagalo afirma
que não há como questionar sua legitimidade, sendo certo que as interações
feitas em um site não são forçadas, mas envolvem uma atitude deliberada da
parte:
O site não é automaticamente projetado no computador do usuário sem que este tenha agido para tanto. Ao contrário, o usuário precisa praticar uma série de atividades para ter acesso a um Web site: é preciso ligar o computador, acessar a Internet, depois a Web e finalmente o Web site específico. Depois, durante a interação com o Web site, outras atitutes
31
levarão o usuário a confrontar-se com a opção de ‘clicar’, pressionar, a opção que represente sua vontade.14
Outra peculiaridade das declarações de vontade emanadas em meio
eletrônico é que deve existir total compatibilidade técnica entre os sistemas
computacionais utilizados na transmissão e recepção das declarações. Vale dizer
que os computadores das partes contratantes deverão estar em consonância,
proporcionando a ambas partes o pleno conhecimento do conteúdo das
declarações transmitidas pela rede. Assim sendo, as manifestações de vontade
ininteligíveis, obscuras ou criptografadas serão consideradas inválidas se a parte
que as recebeu não tiver meios hábeis para entender seu conteúdo.
Em suma, afirma-se sem sombra de dúvida que se o recebimento e o
entendimento do conteúdo da declaração de vontade atingir os contratantes,
irrelevante será a forma pela qual esta foi manifestada e transmitida.
1.4.2 Momento da Formação
Definir o momento exato de formação do contrato é tarefa das mais
importantes dentro do Direito Civil, no estudo dos contratos. É mister que o
instante de concretização do vínculo negocial é o marco inicial para que o
contrato possa produzir os efeitos jurídicos livremente convencionados pelas
partes. É a partir da formação do vínculo contratual que as partes ficam impedidas
de revogar suas declarações de vontade, sem que isso lhes traga, em regra,
algum ônus contratual. Também será neste momento em que todos os requisitos
de validade do contrato celebrado haverão de ser verificados.
14 BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001.
32
Na esfera contratual, destaca-se a figura do proponente, sendo aquele
que emite a declaração receptícia da vontade, denominada proposta, com o
intuído de contratar. Por outra parte, aparece a figura do oblato, o destinatário da
proposta que emite a declaração receptícia da vontade, denominada aceitação.
O vínculo contratual surge quando a proposta e a aceitação se
entrelaçam, e só se torna perfeito e acabado quando o acordo entre os envolvidos
se verifica quanto a todas as cláusulas, principais ou acessórias.
A policitação ou proposta é a declaração inicial vinda do policitante ou
proponente, no qual é manifestada sua intenção de se vincular a outra parte. O
policitante, por intermédio de uma declaração de sua vontade, suscita a formação
do contrato.
A oferta, proposta ou policitação deve conter todos os elementos
essenciais do negócio jurídico desejado, devendo apresentar seriedade, precisão
e certeza, de tal forma que a simples aceitação finaliza o negócio, formando o
vínculo contratual.
A oferta será destinada a uma pessoa determinada ou determinável,
mesmo nos casos de propostas dirigidas a uma determinada parcela de pessoas
ou ao público. Ainda que incerta, a pessoa deve ser determinável, tornando-se
determinada assim que ocorrer a aceitação da policitação.
A oblação ou aceitação é a declaração da vontade com relação a
proposta, onde há a concordância da parte aceitante, também conhecida por
oblato, com relação a proposta do policitante. Com a oblação, a formação do
33
vínculo contratual esta completa, obrigando o proponente a cumprir o contrato por
ele ofertado.
A aceitação contratual pode ser considerada entre presentes ou
ausentes. Em se tratando de partes presentes, o vínculo contratual se forma
instantaneamente, no qual as partes reúnem suas declarações de vontade, no
momento em que são emitidas. Deste acordo de vontades resulta o contrato, no
qual se forma no local em que se encontram os contratantes.
A ficção legal de que é considerado entre presentes o contrato
celebrado por telefone é conseqüência do fato de que, mesmo diante da distância
física entre as partes, existe a troca imediata de declarações de vontade.
Sendo o contrato eletrônico realizado sob a mesma idéia, ou seja, os
contratantes estão distantes, comunicando-se através da emissão de dados pela
internet, pode-se considerar esta forma contratual realizada entre presentes,
quando realizada on-line, dada o imediatismo da reunião das declarações de
vontade.
No tocante as partes consideradas ausentes, encontra-se na doutrina
as teorias da cognição e agnição, no qual objetivam explicar como o contrato será
constituído.
Segundo a teoria da cognição, o contrato só se aperfeiçoa no momento
que o proponente toma conhecimento da aceitação. É o sistema adotado pelos
34
Códigos: espanhol (art. 1.262,2ª al.), argentino (art. 1454), suíço das Obrigações
(art. 8°, 1ª al.), dentre outros.15
Consoante a teoria da agnição, o contrato se ultima pela declaração do
aceitante. Essa teoria é subdividida pela doutrina em outras três: a subteoria da
declaração, a subteoria da expedição e a subteoria da recepção.
Na subteoria da declaração, o contrato se forma desde que o aceitante
escreve a carta. Ainda que a concepção seja lógica, pois neste momento é
externado o consentimento por parte do oblato, não existe interesse prático, pois
a carta, a despeito da escrita, não terá qualquer eficácia antes de expedida.
A subteoria da expedição entende que o momento do aperfeiçoamento
do contrato é aquele em que a carta ou telegrama é expedido, pois nesse instante
o aceitante não poderá modificar a vontade manifestada, ficando-lhe subtraída a
opção de arrependimento.
O Código Civil Brasileiro seguindo posição do código comercial adotou
como regra a teoria agnição na modalidade da subteoria da expedição. O caput
do artigo 434 do Código Civil diz que “os contratos entre ausentes tornam-se
perfeitos desde que a aceitação é expedida”.
Por fim, a teoria da recepção no qual acredita que só haverá a
conclusão do contrato no momento que a aceitação chega às mãos do
proponente.
15 Código Civil Espanhol, art. 1262, alínea 2ª: “La aceptación hecha por carta no obliga al que hizo la oferta sino desde que llegó a su conocimiento”.
35
1.4.3 Local da Formação.
Superada a aceitação, há que se determinar o local onde pode ser
efetivada a celebração do contrato. O lugar em que o contrato é concluído é
necessário para eleger o foro competente e também qual lei aplicar.
O artigo 435 do Código Civil prevê que o contrato reputar-se-á
celebrado no lugar em que foi proposto, ou seja, onde a proposta foi realizada.
Vale lembrar que o Código Civil é de direito interno, está voltado a disciplinar os
contratos quando as partes têm residência dentro do território nacional.
Em matéria de Direito Internacional Privado, o referido artigo deve ser
conjugado com o preceito do artigo 9º § 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil,
que determina reputar-se constituída a obrigação resultante do contrato no local
em que residir o policitante.
Os contratos eletrônicos intersistêmicos não apresentam, via de regra,
qualquer dificuldade quanto à determinação do local de formação do vínculo
contratual. Isto ocorre porque os negócios jurídicos derivados, celebrados entre
os sistemas de computadores das partes, estarem atrelados a um prévio contrato
principal que, na maioria das vezes, é firmado de forma tradicional, mediante
instrumento escrito. Assim, para se saber o local de formação do contrato, deve-
se analisar o contrato principal, buscando nele, e não nos acessórios, a
identificação do proponente e do aceitante.
Já os contratos eletrônicos interpessoais e os interativos não
apresentam facilidade quando o assunto é determinar com precisão o lugar de
formação do vínculo contratual.
36
Nestas modalidades de contrato, a localização física do proponente é
uma tarefa bastante difícil e complexa, principalmente devido a dois fatores: 1) os
legisladores brasileiros não previram o advento da comunicação móvel; 2) a
identificação que o usuário tem na rede de computadores é lógica, referente ao
endereço de seu computador na rede, e não física; isto significa que uma pessoa
residente no Brasil, utilizando-se, por exemplo, de um provedor de acesso
alemão, terá uma identificação lógica proveniente da Alemanha, sendo indiferente
o local físico onde efetivamente esteja; mesmo que esteja em trânsito, sua
identificação lógica não se alterará, permanecendo a mesma durante toda a
conexão.
Muitos problemas, entretanto, poderiam ser facilmente resolvidos se os
contratantes eletrônicos internacionais, tivessem o cuidado de incluir, entre as
cláusulas do negócio jurídico, uma que dispusesse sobre eleição de foro ou que
indicasse a origem física da proposta. Esse procedimento certamente
proporcionaria maior segurança jurídica aos contratantes no tocante à aplicação
da lei no espaço.
Mas o que se observa é que tais medidas não são tomadas pelas
partes pactuantes, tendo que na falta de legislação específica recorrer às
soluções oferecidas pela tecnologia.
Várias são soluções sugeridas pelos diversos estudiosos do assunto,
entretanto, as que se apresentam mais acessíveis e coerentes com a realidade
37
são as elencadas pela ilustre autora Erica Barbagalo16, em seu livro Contratos
Eletrônicos.
Nos casos de contratos eletrônicos interpessoais não simultâneos,
quando a negociação se der mediante uso de correio eletrônico, é possível o
rastreamento, por meio da rede de computadores, buscando-se, no servidor de e-
mails da empresa provedora de acesso, a procedência física da mensagem. Este
servidor é, na verdade, um computador que provê, para toda uma rede, dados e
serviços relativos às mensagens de correio eletrônico enviadas e recebidas por
todos os seus usuários. Rastreando-se eletronicamente o caminho percorrido pela
proposta, enviada por correio eletrônico, chega-se ao servidor de e-mails, que,
consultando seus registros, poderá informar com segurança a localização física
do computador de onde foi emitida a oferta.
De forma semelhante, é possível o rastreamento eletrônico das
propostas emitidas on-line, ou seja, quando feitas na modalidade de contratação
interpessoal simultânea. Também neste caso, a ajuda da empresa provedora de
acesso é imprescindível para a correta identificação física do proponente.
No tocante aos contratos eletrônicos interativos, no qual o usuário,
eventual aceitante, interage com um sistema de computador, no qual, via de
regra, está inserida a proposta, a solução do problema é um pouco diferente. Se
no site tiver referência à localização do proponente ou se constar no contrato
eletrônico cláusula relativa a essa questão, fica seguramente resolvida qualquer
controvérsia quanto ao local de formação do vínculo contratual.
16 BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001.
38
Não obstante, haja omissão, o simples rastreamento eletrônico talvez
não seja suficiente para identificar com exatidão o proponente, pois o site, onde
consta a oferta, pode estar alojado em um sistema computacional de propriedade
de terceiros, situado em um lugar fisicamente diverso daquele onde o proponente
tem estabelecidas suas ocupações habituais.
Nessas circunstâncias, além daquelas onde eventualmente for
impossível a determinação exata do proponente, seja por restrições técnicas, seja
por falta de um cadastro de informações da provedora de acesso, presumir-se-á
emitida a proposta no chamado domicílio lógico do ofertante, assim considerado o
lugar indicado como de origem de sua identificação lógica na rede de
computadores.
Um problema bastante interessante suscitado por Erica Barbagalo diz
respeito ao proponente que se encontra em trânsito. Especialmente nestas
circunstâncias, entende a autora que o vínculo contratual deve ser considerado
formado no lugar de última residência do proponente. Tal posicionamento é
justificado pelo fato de não poder ser tido como residência o local onde o ofertante
esteja simplesmente passando uma temporada, sem qualquer intenção de ali ser
estabelecida.
A ilustre autora considera que a oferta feita pelo proponente, quando
em trânsito, é emitida de um local acidental, que, mesmo se a contratação não se
fizer eletronicamente, não deverá ser reputado o lugar de celebração do negócio
jurídico. Para ilustrar seu entendimento, Erica Barbagalo apresenta o seguinte
exemplo:
39
Para tornar mais clara essa observação, pode-se utilizar o exemplo de uma pessoa que, durante uma viagem internacional, se utilize de seu telefone celular para fazer uma proposta, formulando-a no momento em que atravessa país intermediário entre sua origem e seu destino, país este estranho a ambas as partes.
Depois desta exposição, não resta dúvida de que, ao reputar formado o
vínculo contratual no lugar de emanação da proposta feita em trânsito, estar-se-ia
incorrendo em um grave equívoco, uma vez que a vontade do legislador, ao optar
pela residência do proponente como local de referência para aplicação das leis no
espaço, foi justamente presumir que o emissor da declaração de vontade inicial,
onde, via de regra, constam as cláusulas essenciais à celebração do negócio
proposto, estaria consciente das normas legais de onde se encontrava.
1.5 CONDIÇÕES DE VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS
Para serem considerados válidos e, conseqüentemente, produzam
seus os efeitos jurídicos, nos contratos eletrônicos devem estar presentes os
elementos estruturais e funcionais, assim definidos pela doutrina, e também
condições previstas no artigo 104 do Código Civil Brasileiro: partes capazes,
objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.
Os elementos estruturais e funcionais podem ser facilmente verificados
nos contratos celebrados eletronicamente. De fato, a formação eletrônica do
negócio jurídico jamais ocorreria sem a convergência de duas ou mais vontades e
a composição de interesses contrapostos, a fim de constituir, modificar ou
extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.
40
Quanto às condições, ou requisitos supramencionados, convém
relembrar a classificação feita pela doutrina, que as distingue em subjetivas,
objetivas e formais.
Os requisitos subjetivos se referem à capacidade e legitimação das
partes contratantes. Também nos contratos eletrônicos, é mister a existência de
duas ou mais pessoas, uma vez que os contratos são bilaterais ou plurilaterais.
Obrigatoriamente, as partes devem manifestar, de forma livre e consciente, seu
consentimento em efetivar a contratação e, tal quais os contratos tradicionais, há
necessidade de possuírem capacidade genérica para os atos da vida civil e
aptidão específica para contratar.
Sem dúvida, a capacidade e a legitimação das partes são, das
condições de validade dos contratos eletrônicos, as que mais preocupam os
juristas, isto porque, no meio eletrônico, a verificação desses requisitos se torna
mais difícil pelo fato de as declarações de vontade serem manifestadas sem que
as partes estejam uma perante a outra.
No tocante a teoria geral dos contratos, importante é a lição de Orlando
Gomes17, que considera os elementos constitutivos dos contratos como
17 GOMES, Orlando. Contratos. Rio Janeiro: Forense, 1990. p.45-46. Para ele, requer o contrato, para valer, a conjunção de elementos extrínsecos e intrínsecos. A doutrina moderna distingue-os sob os nomes, respectivamente, de pressupostos e requisitos. Pressupostos são as condições sob as quais se desenvolve e pode desenvolver-se o contrato (FERRARA). Agrupam-se em três categorias, conforme digam respeito: 1º) aos sujeitos; 2º) ao objeto; 3º) à situação dos sujeitos em relação ao objeto. Todo contrato pressupões: a) capacidade das partes; b) idoneidade do objeto; c) legitimação para realizá-lo. Esses pressupostos devem estar presentes no momento em que o contrato se realiza ou alcança vigor. (BETTI). São, portanto, extrínsecos, embora se integrem posteriormente na relação contratual. Mas, não bastam. A lei exige outras condições para o contrato cumprir sua função econômico-social típica. São requisitos complementares, considerados elementos intrínsecos indispensáveis à validade de qualquer contrato: a) o consentimento; b) a causa; c) o objeto; d) a forma. Porque pressupostos e requisitos se complementam, confundem-se, apesar de serem diverso. Por simplificação, diz-se que são requisitos essenciais à validade do negócio jurídico: a capacidade do agente, a possibilidade do objeto e a forma, esta quando prescrita em lei. Sendo o
41
verdadeira “força propulsora”, posto que eles permitem aos interessados a
condução da intenção de contratar, de modo a permitir ao outro interessado, de
interesse contraposto, o conhecimento e a respectiva condução, visando à
coincidência entre elas como o nascedouro do contrato. Tratam-se das
declarações receptícias de vontade (oferta e aceitação) e ainda da coincidência
entre ambas (o consenso).
Presentes os requisitos iniciais, o contrato eletrônico será eficaz
parcialmente, já que, faz-se necessário observar ainda, a autenticidade da
manifestação de vontade expressada pelos contratantes, no qual deverá
apresentar a capacidade e a legitimidade de quem está contratando. Há que se
verificar se as partes envolvidas tratam-se delas mesmas, já que tal confirmação
se torna difícil, tendo em vista que nesta modalidade contratual os pactuantes não
estão presentes fisicamente, sendo que sem a confirmação deste requisito a
manifestação da vontade das partes não apresentará validade.
Dentre as maneiras de verificação encontradas pela tecnologia atual, a
assinatura eletrônica vem sendo bastante utilizada nos contratos realizados
através dos computadores. Esse método de confirmação das partes é realizado
através de uma entidade certificadora privada ou estatal que confirma os dados
do aceitante e do proponente, afastando desta forma a dúvida quanto às pessoas
e ao objeto de pactuação.
A comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional,
conhecida pela sigla UNCITRAL, United Nations Commission on International
contrato negócio jurídico bilateral, a vontade dos que o realizam requer exame à parte, por ser particularização que precisa ser acentuada. Assim, o acordo das partes adquire importância especial entre os elementos essenciais dos negócios jurídicos bilaterais. É de resto, sua força propulsora.
42
Trade Law, considerando a necessidade de um modelo de lei aceitável aos
diversos países, a fim de facilitar o uso de meios eletrônicos de comunicação,
contribuindo para o estabelecimento de relações comerciais neste meio, aprovou
em 1996, sua Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico. A referida lei modelo tem
por finalidade oferecer um conjunto de regras internacionalmente aceitáveis, que
permitam eliminar obstáculos calcados na incerteza da validade jurídica das
comunicações por meios eletrônicos em âmbito de Direito interno.
Ainda no tocante às partes, Newton de Lucca18 chama a atenção para
a questão dos agentes intervenientes, que atuam na rede de computadores.
Estes, por sua vez, não podem ser considerados parte na celebração eletrônica
de um negócio jurídico.
Um exemplo bastante conhecido destes agentes são as provedoras de
acesso à internet, empresas responsáveis, em princípio, por organizar e manter o
meio físico (cabos, equipamentos etc.) e o logístico (software de comunicação),
viabilizando, assim, a comunicação entre o computador do usuário e a Internet.
Maurício Matte19 considera a empresa provedora de acesso à Internet uma
simples "atravessadora" de informações, que nem sequer tem conhecimento do
conteúdo dos textos transmitidos eletronicamente pela rede.
Os requisitos objetivos de validade dos contratos referem-se à
idoneidade, licitude e possibilidade jurídica do objeto contratado, devendo este ser
certo ou determinável e versar sobre um interesse economicamente apreciável.
Mais uma vez, comprova-se que não há óbice para a aceitação dos contratos
18 LUCCA, Newton de; SIMÃO FILHO, Adalberto (Coord.) Direito & internet - aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: EDIPRO, 2000. 19 MATTE, Maurício de Souza. Internet: comércio eletrônico. São Paulo: LTr, 2001.
43
eletrônicos, posto que o objeto destes são, comumente, os mesmos dos contratos
tradicionais, diferindo apenas no que diz respeito à forma ou meio de entrega.
Por fim, os requisitos formais dizem respeito à forma pela qual o
contrato deverá ser expresso. Torna-se claro diante do exposto, que, não fosse a
forma peculiar característica dos meios magnéticos, nada haveria de novo nos
contratos eletrônicos. Estes inovam justamente no sentido de proporem uma nova
forma de contratação, distinta da clássica forma escrita.
A regra geral, como é cediça, é a liberdade de forma para a maioria
das contratações. A lei, entretanto, exige que alguns tipos de contrato, como por
exemplo, a compra e venda de um bem imóvel, revista-se de uma forma especial,
expressamente prevista no dispositivo legal, a exigência da escritura pública.
Cumpre ressaltar que, inexistindo lei que determine uma forma
preestabelecida para um determinado contrato, este deverá ser considerado
válido se efetivado sob qualquer forma não contrária ao ordenamento jurídico.
Tanto é verdade, que doutrina e jurisprudência são pacíficas em aceitar, nos
casos em que a lei não exige forma solene, até mesmo a contratação feita
oralmente, sem qualquer papel ou escrito que a represente ou prove.
Acerca da validade dos contratos, faz-se oportuno apresentar a
posição do Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Ruy Rosado de Aguiar,
no qual afirmou em nota publicada no Jornal do Commercio de 27/09/2000, que a
maioria dos contratos firmados via internet não podem ter valor jurídico. A simples
impressão do comprovante do negócio pelo consumidor não vale como prova,
apenas como indício. Só com o uso da criptografia é possível, segundo ele,
controlar a autenticidade e a veracidade de informações contidas nas cláusulas
44
do documento eletrônico. Do contrário, sempre haverá a possibilidade de desfazer
o negócio por falta de prova.
Sobre este tema, Almeida20 comenta o momento em que o
pronunciamento do Ministro foi divulgado, e seu efeito no mundo jurídico:
Na última semana, dois fatos atraíram a atenção da opinião pública com relação a contratos eletrônicos e assinatura digital. O primeiro foi a entrada em vigor da lei norte-americana sobre assinatura digital. O segundo foi o pronunciamento de um ministro do STJ afirmando que contratos on-line são inválidos como prova se não forem criptografados. O que ambos têm em que afasta um do outro? O denominador comum é de que tratam de documentos eletrônicos como meios de prova de contratos realizados via Intemet. Ou seja, a pergunta recorrente: "contrato eletrônico, pode"? Em última análise, aqui falamos da çonfluência entre a segurança de dados e o Direito. O divisor de águas é que o ministro do STJ não menciona, ou não admite, outras alternativas de prova de contratos eletrônicos que não a criptografia. Com isso, descarta a validade da prova de contratos eletrônicos não criptografados - que ainda constituem a larga maioria do mercado.
Com base nos textos legais pátrios, verifica-se que não existe qualquer
vedação legal à celebração de um contrato pela via eletrônica. Destarte, não
exigindo o objeto da celebração contratual forma prescrita em lei, os contratos em
tela haverão de ser considerados perfeitamente admissíveis, válidos, eficazes e
aptos à produção dos efeitos jurídicos visados pelas partes contratantes.
1.6 ASSINATURA DIGITAL
Aqueles que optam por exercer atividades comerciais através do meio
eletrônico buscam meios para resolverem as diversas questões que surgem com
20 ALMEIDA, Gilberto Martins de. Validade legal de contratos eletrônicos e assinatura digital. Disponível em: <http://www.modulo.com.br/noticias/artigo_entrevista/a-validade.htm>. Acesso em 11 de nov. de 2000.
45
a forma contratual inerente a esta realidade. Dentre elas, elenca-se algumas: Um
contrato existe pela simples troca de comunicações eletrônicas? Como as
comunicações na Internet podem ser "autenticadas"? O artifício da assinatura
digital pode ser legalmente equivalente a uma assinatura manuscrita?
Os especialistas em comércio eletrônico vêm desenvolvendo um
elemento chave que é a criação de uma assinatura eletrônica legal. Dado a
natureza da contratação eletrônica, não há que se falar em assinatura manuscrita,
até pela sua impossibilidade de utilização, tendo em vista a ausência de papel e
caneta, como realizado na forma tradicional de contratação.
A Assinatura Eletrônica ou Digital é um modo eletrônico confiável de
assinar documentos eletrônicos, que proporciona autenticação do emitente,
integridade da mensagem e aceitação da outra parte. Uma assinatura digital é
uma maneira segura, conveniente e economicamente rápida de assinar
documentos eletrônicos.
O documento eletrônico é aquele gerado ou armazenado em um
computador, como uma carta ou um contrato. Além disso, pode ser um arquivo de
qualquer natureza: uma imagem, um certificado de conclusão de curso, uma
planta de um projeto arquitetônico, um mapa digitalizado, dentre outros, todos
armazenados na memória do computador. A assinatura digital pode ser usada
para assinar todos esses documentos.
É imprescindível que os negócios feitos através do comércio eletrônico
também necessitem apresentar validade jurídica nos tribunais. A assinatura digital
não é tão suscetível a falsificação como a assinatura feita com papel e caneta,
46
posto que as partes podem verificar com quem estão lidando e, por conseguinte,
podem certificar-se que a mensagem não foi alterada durante a transmissão.
O público em geral usa assinaturas digitais, no comércio eletrônico,
para finalizar uma transação na Internet. Devido às assinaturas serem
codificadas, e algumas vezes até as mensagens, seu uso passa a ter grande
freqüência nos negócios conduzidos na Internet.
A questão da validade da assinatura digital ganha cada vez mais
espaço na legislação e na opinião dos operadores do direito. Não resta dúvida
que as assinaturas digitais terão tanta validade quanto às manuscritas.
A IV Jornada de Direito Civil, ocorrida em Brasília, nos dias 25 a 27 de
outubro de 2006, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da
Justiça Federal, aprovou novos enunciados relativos ao Código Civil, e para
ilustrar o presente estudo, destaca-se o de número 297, ao se referir ao artigo
212: “o documento eletrônico tem valor probante, desde que seja apto a
conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar sua autoria,
independentemente da tecnologia empregada”.
O ano de 2006 teve sem dúvida, no tocante às transações por meio
digital, um grande impulso no reforço do uso da certificação digital para melhor
segurança. Dentre os diversos exemplos, destaca-se a adoção da nova
identidade da OAB, contendo chip e certificado digital, propiciando aos advogados
a prática de atos processuais à distância, bem como a manifestação dos atos de
manifestação de vontade através do meio eletrônico.
47
Nos Estados Unidos, esse assunto é regulado pelo UCC - Uniform
Comercial Code. O UCC afirma que uma marca com intenção de ser uma
assinatura será tratada como uma assinatura compromissada.
A solução preconizada pelos especialistas – e já adotada na Alemanha
e em alguns Estados norte-americanos – é a assinatura digital, calcada na
adoção da chamada criptografia assimétrica.
A criptografia, conforme Davi Monteiro Diniz, “consiste em uma escrita
que se baseia em um conjunto de símbolos cujo significado é conhecido por
poucos, permitindo com isto que se criem textos que serão incompreensíveis aos
que não saibam o padrão de conversação necessário para a sua leitura”. 21
Existem duas modalidades de criptografia: a simétrica e a assimétrica.
Na primeira, o programa codificador do texto em caracteres indecifráveis, utiliza a
mesma chave para criptografar e para descriptografar.
No que se refere a criptografia assimétrica ou chave pública, o
programa codificador serve-se de uma chave privada para criptografar e de uma
chave pública para descriptografar.
Já existe consenso formado, no âmbito do comércio eletrônico, no
sentido de fazer-se necessária a utilização da criptografia assimétrica ou de chave
pública por questão de segurança. Nela a chave privada é apenas conhecida pelo
seu titular, não circulando pela rede de computadores.
21 DINIZ, Davi Monteiro. Documentos Eletrônicos. Assinaturas Digitais – Da Qualificação Jurífica dos Arquivos Digitais como Documentos, 1ª ed., LTr, São Paulo, 1999, pág.28.
48
Dado este fato, o sistema de criptografia assimétrica faz parte dos
parâmetros internacionais sobre a questão: ISO 9796 (Organização de Standards
Internacional), ANSI X9.31 (Instituto Americano de Standards Nacionais), ITU-T
X.509 (União Internacional de Telecomunicações), PKCS (Standards de
Criptografia de Chave Pública, SWIFT (Sociedade para as Telecomunicações
Financeiras Interbancárias Mundiais) e ETEBAC nº 5 (Sistema Financeiro
Francês). Na criptografia simétrica, ao revés, há a necessidade do
compartilhamento da chave privada do usuário com os outros usuários.
Com relação à regulamentação das assinaturas digitais, o estado de
Utah, nos Estados Unidos, foi pioneiro neste sentido, através do Digital Signature
Act22, seguido pelo estado da Georgia e da Califórnia.
O estado de Utah é o mais avançado nesse sentido e de acordo com a
regulamentação acima citada, documentos podem ser assinados, criptografados e
transmitidos eletronicamente, através de uma chave privada, e os destinatários
poderão verificar a autenticidade dessa assinatura e o teor do documento por
meio de chaves públicas, com a finalidade de verificar se houve violação dos
mesmos.
Por mais que se busque a efetivação de um sistema que seja utilizado
como paradigma nas relações contratuais através da rede, deve-se ter em mente,
que a força de um sistema de criptografia está calcada na existência de cinco
princípios básicos: identificação, autenticação, impedimento de rejeição,
verificação e privacidade.
22 Utah adotou seu Digital Signature Act (" Utah Act") em 27 de fevereiro de 1995, foi patrocinado pelo senador Craig ª Peterson, assinado pelo governador Mike Leavitt em 9 de março de 1995 e se tornou efetivo em 1° de maio do mesmo ano. Maiores informações podem ser obtidas no próprio site do estado de Utah: http://www.commerce.state.ut.us.
49
Faz-se oportuno verificar em que consiste cada princípio:
1) a identificação é a verificação do remetente da mensagem, se ele é
realmente quem diz ser;
2) a autenticidade é a identificação do verdadeiro remetente do texto
criptografado e a certeza de sua não adulteração;
3) o impedimento da rejeição é a condição de evitar a possibilidade da
pessoa que efetuou o envio de arquivos ou dados vir a negar que o tenha feito;
4) a verificação é a capacidade de, com segurança, proceder-se à
identificação e a autenticação de uma determinada mensagem criptografada;
5) e a privacidade é a possibilidade de o criptossistema tornar
inacessíveis as mensagens aos olhares de pessoas não envolvidas e curiosas.
Partindo do pressuposto, nada pacífico valendo ressaltar – de que a
configuração do verdadeiro documento independe do meio no qual aquele está
armazenado, sendo mais relevante a representação de uma idéia ou de um fato
que se pretende perpetuar23, considerando, ainda, a fórmula aberta do artigo 332
do CPC24 e do artigo 107 do Código Civil25, compreende-se que quando
assegurados os requisitos de autenticidade, integridade e perenidade do
23 Para Francesco Carnelutti, o documento é “una cosa che fa conoscere un fatto”, “Documento (Teoria Moderna)”, pag. 86. Segundo Chiovenda, “Documento em sentindo amplo, é toda representação material destinada a reproduzir determinada manifestação do pensamento, como uma voz fixada duradouramente (vox mortua)”. Vê-se, pois, que o Mestre dos processualistas peninsulares não considera como um elemento necessário da definição de documento, o meio em que ele está representado, tanto que afirma ser documento, a “voz fixada duradouramente” (que, evidentemente, não se vale de meio cartáceo), cfr. Instituições de Direito Processual Civil, pág. 127. 24 “Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.” 25 A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.
50
conteúdo, seria teoricamente possível nas hipóteses as quais a lei não exige
formalidades legais específicas, atribuir-se validade jurídica ao documento
eletrônico.
Segundo explica a UNCITRAL, na elaboração de sua afamada Lei
Modelo, procurou-se seguir o “critério do equivalente funcional”, pelo qual
entende-se que quando presentes as necessidades básicas estabelecidas pela
legislação para a validade do ato, aquela deve ser considerada satisfeita, ainda
que o tenha sido mediante a aplicação de outra forma não prevista e não vedada
por lei. Esse princípio encontra-se no sistema processual pátrio, acatado pelo
princípio da instrumentalidade das formas, conforme expresso nos artigos 154 e
244 da Lei Adjetiva Civil.26
Com o intuito de dirimir as divergências e chegar-se a uma
regulamentação que sirva de base para a aplicação desta nova realidade,
encontram-se atualmente em tramitação Projetos de Lei para que se dê validade
às assinatura digitais, bem como outros assuntos relacionados com os contratos
gerados num ambiente digital:
1) Projeto de Lei nº 1.589/99. Criado pela comissão de informática da
OAB/SP, no qual já delimita sua área de atuação em seu artigo 1º, “A presente lei
regula o comércio eletrônico, a validade e o valor probante dos documentos
eletrônicos, bem como a assinatura digital”. Segue também, estabelecendo
princípios gerais e as meta-regras hermenêuticas que devem pautar a sua
26 Dispõe o CPC, art. 154 “Os atos e termos processuais não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, Ihe preencham a finalidade essencial.” E o art. 244: “Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcançar a finalidade.”
51
aplicação em seu artigo 2º, “A interpretação da presente lei deve considerar o
contexto internacional do comércio eletrônico, o dinâmico progresso dos
instrumentos tecnológicos, e a boa-fé nas relações comerciais”;
2) Projeto de Lei nº 4.734 / 98 - Dispõe sobre a informatização da
escrituração cartorária através de discos ópticos e optomagnéticos ou em outros
meios reconhecidos como legais, sem prejuízo dos métodos atualmente
empregados (câmara - apoiado na Lei Nº 6015, de 31 Dez de 1971 - Lei de
Registros Públicos);
3) Projeto de Lei nº 4.102 / 93 - Regula a garantia constitucional da
inviolabilidade de dados; define crimes praticados por meio de computador; altera
a Lei Nº 7646, de 18 Dez de 1987, que "dispõe sobre a proteção da propriedade
intelectual de programas de computador e sua comercialização no País, e dá
outras providências" (câmara - aprovado no senado).
2 COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL
2.1 CONCEITO E PARÂMETROS
Pode-se definir comércio eletrônico como a compra e venda de
produtos, ou a prestação de serviços, realizada por computador, por meio de
sistema de redes, em sua grande maioria, pela Internet. Baseia-se na
transferência eletrônica de informação entre três grupos básicos de participantes:
empresa, governo e indivíduos.
Para Aldemario Araújo Castro, comércio eletrônico é “o conjunto de
operações de compra e venda de mercadorias ou prestações de serviço por meio
eletrônico, ou, em outras palavras, as transações com conteúdo econômico
realizadas por intermédio de meios digitais”.27
Já Albertin define esta modalidade de comércio como:
a realização de toda a cadeia de valores dos processos de negócios em um ambiente eletrônico, por meio da aplicação intensa das tecnologias de comunicação e de informação, atendendo aos objetivos de negócio. Os processos podem ser realizados de forma completa ou parcial, incluindo as transações negócio-a-negócio, negócio-a-consumidor e intra-organizacional, em uma infra-estrutura de informação e comunicação predominantemente pública, de acesso fácil, livre e de baixo custo.
Entre as modalidades mais recentes de comércio eletrônico estão o m-
Commerce e o t-Commerce. O m-Commerce é a possibilidade de se realizar
27 CASTRO, Aldemario Araujo. Os meios eletrônicos e a tributação. In: Seminário SSJ Direito.com. Rio de Janeiro, 30 de junho de 2000.
53
transações comercias através de aparelho movéis, a exemplo dos celulares,
palmtops, dentre outros.
O t-Commerce, por sua vez, é o termo usado para o e-Commerce
realizado a partir de televisores digitais conectados à web, que funciona como
canal de comunicação para a comercialização, através de simples comandos no
controle remoto.
O setor de m-Commerce possui um potencial considerável de
crescimento no país. Em 2003 movimentou cerca de dez milhões de reais,
segundo um levantamento da E-Consulting, com estimativas de se chegar a R$
30 milhões e R$ 50 milhões em 2004 e 2005. 28
No que se refere ao t-Commerce as perspectivas ainda são discutidas.
A previsão mundial é que 100% de lares americanos e ingleses possuam TV
digital em 2010. Nos Estados Unidos da América, todas as emissoras comerciais
iniciaram transmissões digitais em 2002 e, em 2006, é esperado o encerramento
de todas as transmissões analógicas. Em termos de Brasil, a previsão é de que
em 10 anos, mais de 80% dos aparelhos televisores sejam substituídos pelos
modelos digitais. 29
O comércio eletrônico no Brasil apresenta visíveis sinais de evolução,
respondendo, em 2003, por cerca de 40% da utilização de Internet e, atualmente,
por 75,4% de todos os negócios realizados por intermédio do meio eletrônico
entre empresas da América Latina. 28MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA, Disponível em <http://www.mct.gov.br/Sepin/Imprensa/Noticias_4/Comércio_4.htm> Acessado em 22 de fev. de 2006. 29ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMISSORAS DE RÁDIO E TELEVISÃO, Disponível em <http://www.abert.org.br/D_mostra_clipping.cfm?noticia=27430> Acessado em informação em 22 de fev. de 2006.
54
Estima-se que o volume do mercado brasileiro de comércio eletrônico,
englobando transações entre empresas, (conhecidas pelo termo business-to-
business, “B2B”) e transações entre empresas e consumidores (conhecidas pelo
termo business-to-consumer, “B2C”), se multiplicarão em progressão geométrica
nos próximos anos, a despeito das turbulências ocorridas no mercado de capitais
das empresas de tecnologia durante os anos de 2000 e 2001. Válido lembrar, que
para se ter uma idéia, desde 2001, o varejo eletrônico aumentou em 355% e a
estimativa para este ano era um crescimento de R$ 3,9 bilhões. 30
Dado o desenvolvimento do comércio eletrônico no país, foi criada, em
maio de 2001, a “Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico”, entidade multi-
setorial da economia digita no Brasil e na América Latina, que busca promover,
representar e defender os interesses coletivos de empresas, entidades e usuários
associados, envolvidos em atividades de comércio e negócios eletrônicos.
É oportuno apresentar alguns dados no que se refere ao comércio
eletrônico. As lojas virtuais brasileiras faturaram no primeiro semestre deste ano
R$ 974 milhões. O volume é 30,7% superior aos R$ 745 milhões registrados no
mesmo período do ano anterior. Dentre os produtos que lideram as vendas, estão
os CDs, DVDs, livros e revistas. Entretanto, o comércio eletrônico brasileiro
continua bastante pequeno em relação ao verificado em outros países. Em 2005,
o movimento gerado pelos compradores eletrônicos norte-americanos ultrapassou
os US$ 142 bilhões.31
30CÂMARA BRASILEIRA DE COMÉRCIO ELETRÔNICO, Disponível em <http://www.camara-e.net/interna.asp?tipo=1&valor=3523>. Acessado em 02 de jun de 2006. 31AGÊNCIA CT, MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA, Disponível em <http://agenciact.mct.gov.br/index.php/content/view/28669.html> Acessado em 29 de dez. de 2006.
55
Em consonância com este panorama, a área de serviços
governamentais eletrônicos também vem ganhando forças no cenário político,
principalmente de investimentos em tecnologia e planejamento. Em outubro de
2000 foi criado o Comitê Executivo do Governo Eletrônico, com o objetivo de
implantação do Governo Eletrônico, voltado para a prestação de serviços e
informações ao cidadão.
O serviço de Governo Eletrônico, (e-Gov) é uma ferramenta eletrônica
de relacionamento entre governo-governo (G2G), governo fornecedor (G2B) e
governo-cidadão (G2C), que traz mudanças substanciais no relacionamento entre
o governo e a sociedade, demandando das instituições investimento em infra-
estrutura tecnológica que viabilize o grau de segurança exigido, garantindo o
direito dos cidadãos à privacidade e à transparência dos seus governantes.
Não existe mais dúvida que o comércio realizado pelos meios
eletrônicos e principalmente por meio da Internet se apresenta como um campo
de notável expansão. O comércio eletrônico conta com acentuados incentivos
econômicos: uma redução de custos administrativos e tributários, a diminuição
dos processos de distribuição e intermediação, a possibilidade de operação diária,
a superação das barreiras nacionais, o aumento da celeridade nas transações.
Existem também grandes atrativos legais devido à carência de regulamentação
internacional e a insuficiência das normas nacionais ou a divergência na aplicação
das leis existentes.
O comércio na Internet apresenta numerosos problemas característicos
da organização de um mercado: a diminuição dos custos e a organização de uma
estrutura que facilite tanto a busca dos produtos quanto a busca de
56
consumidores, a segurança das transações, sobretudo quanto aos meios de
pagamento e assegurar a entrega do produto ou a consecução do serviço.
Outra categoria de conflitos, já tratadas acima no tópico relativo aos
contratos eletrônicos, está ligada diretamente às particularidades do meio
eletrônico: a existência de um espaço e um tempo com significado normativo, a
privacidade, a documentação das transações e a assinatura digital.
2.2 COMPRA E VENDA DE BENS ATRAVÉS DA REDE
O artigo 481 do Código Civil traz elementos para a conceituação do
contrato de compra e venda, “pelo contrato de compra e venda, um dos
contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe
certo preço em dinheiro”.
Destarte, trata-se de um contrato donde defluem obrigações mútuas
para os envolvidos. Para o vendedor, a obrigação de transferir o domínio; para o
comprador, a de entregar o preço.
A compra e venda é um contrato consensual, sinalagmático, oneroso,
em regra comutativo, em algumas ocasiões sujeita à forma prescrita em lei,
entretanto, na maior parte das vezes, dispensando qualquer solenidade, a
exemplo do que ocorre nos contratos eletrônicos.
Segundo a maneira pela qual se aperfeiçoa o contrato de compra e
venda é consensual, em oposição aos contratos reais, porque se aperfeiçoa
independentemente da entrega do objeto, pela mera coincidência da vontade das
partes sobre o preço e a coisa. Ademais a lei civil expressamente dispõe em seu
57
artigo 482, “a compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e
perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço”.
Tal maneira de aperfeiçoamento é bastante visível nas compras
realizadas pela Internet, no qual as partes coincidem sua vontade na pactuação
acerca do preço, das condições de pagamento, da coisa e de sua entrega.
No sistema comercial tradicional, a entrega da coisa é quase sempre
realizada após a entrega do preço, causando muitas vezes a idéia de a real
efetivação do contrato de compra e venda resulta após a transferência do
domínio, que ocorre com a tradição, se o objeto do negócio for móvel e pela
transcrição, se imóvel.
Vale destacar que os efeitos derivados do contrato em tablado são
meramente obrigacionais, e não reais, pois de acordo com o sistema civil pátrio, a
compra e venda, não transfere o domínio da coisa vendida, mas gera apenas,
para o vendedor a obrigação de transferi-lo.
Diz-se que o contrato é sinalagmático porque envolve prestações
recíprocas de ambas as partes. O comprador obriga-se a entregar o preço e o
vendedor, por sua parte, a transferir o domínio da coisa vendida. As referidas
obrigações estão diretamente ligadas, sendo que não podem existir isoladamente.
É também um contrato oneroso, porque implica em situações de
alteração patrimonial, posto que o comprador se priva do preço e o vendedor da
coisa objeto da venda.
O contrato ora estudado é, em regra, comutativo, porque a estimativa
da prestação a ser recebida pelas partes pode ser feita no momento do
58
aperfeiçoamento do contrato. Ou seja, ocorre quando o comprador oferece um
preço por uma coisa, sabe qual a prestação que receberá em troca de seu
dinheiro e, de certo modo, agrada-lhe o resultado antevisto.
Superada a natureza jurídica, serão analisados os elementos do
contrato de compra e venda, que estão descritos no artigo 482 já transcrito
anteriormente, destacando os três elementos indispensáveis: acordo, coisa e
preço.
O acordo ou consentimento (consensus) recairá sobre o objeto e sobre
o preço, com a objetivação de alcançar o resultado que o contrato oferece: a
aquisição da res e a transferência do preço.
Abre-se uma oportunidade para distinguir a compra e venda do
contrato preliminar de compromisso de compra e venda. O compromisso tem por
função preparar um futuro contrato de compra e venda, tendo que neste último
contrato as partes se obrigam: uma, a tranferir o domínio da coisa; outra o preço
estabelecido.
O valor ou preço (pretium) é outro elemento do tripé estrutural do
negócio. Ele deverá ser em caráter pecuniário, caso contrário, estaríamos diante
de um contrato de troca.
Não pode ser olvidado que o preço deverá ser determinado ou
determinável, de maneira precisa. A legislação permite que a delimitação do
preço fique a cargo de um terceiro, desde que as partes o designem para tal
incumbência, ou prometam designá-lo, conforme disposto no artigo 485 da lei
civil. Tal fixação poderá também ser realizada através de fixação à taxa do
59
mercado ou da bolsa de valores, em certo e determinado dia e lugar, o que está
claramente disposto no artigo 486.
Entretanto, a lei adjetiva civil não possibilita que seja a estipulação do
preço ao arbítrio de uma das partes, conforme preceitua o artigo 489, porque
então se ingressa no âmbito da proibição das condições meramente potestativas,
de acordo com o artigo 122 do Código Civil.32
Por último, a coisa (res) entre os elementos básicos do contrato.
Podem ser objeto de compra e venda todas as coisas que não estejam fora do
comércio. Destarte, escampam da álea da compra e venda as coisas
insuscetíveis de aprovação e as legalmente inalienáveis.
Desta forma, pode-se dizer que um dos objetos do comércio eletrônico
é a compra e venda de bens. Tudo que tem relevância jurídica para as pessoas é
um bem, algo a ser preservado e protegido, sendo denominado de bem jurídico.
Distinguem-se os bens em corpóreos e incorpóreos. Os corpóreos
seriam os bens dotados de materialidade, enquanto que os incorpóreos são bens
criados pelo Direito, como o ius utendi, fruendi e abutendi, direitos em última
instância. O que está por detrás dessa distinção é a idéia de que o que existe no
mundo dos fatos, ente real, e tem relevância jurídica, seria um bem corpóreo, e o
que existisse apenas no mundo das idéias, mas relevante para o Direito, ente
espiritual, decorrente da ratio humana, seria um bem incorpóreo. Em última
análise, a distinção entre um e outro se daria pela existência independente.
32 Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.
60
Este é o entendimento de Direito Privado de bem. Já mercadoria, é um
conceito diverso e traz consigo um elemento importante, que é a mercancia.
Convém trazer à baila a conceituação de Ivo Teixeira Gico Junior:
Mercadoria é a coisa objeto da atividade de mercancia. Se é comercializado, é mercadoria. Se uma barra de ouro é enterrada e nunca colocada no mercado, ou seja, nunca foi ofertada ou atuou como elemento de uma relação de troca ou outro ato mercantil, jamais poderá ser considerada uma mercadoria, pois nunca lhe foi atribuído tal valor. A mercadoria não é uma qualidade inerente ao ente, mas atribuída a ele pelo interesse humano. Não existe uma definição ontológica de mercadoria, mas apenas teleológica. O problema se põe em se determinar o que seja coisa hoje em dia.33
Discordando desta definição, Marco Aurélio Greco34 entende que
mercadoria poderia significar: 1) certas coisas com algumas qualidades
específicas (mobilidade, corpóreo, tangibilidade, etc.); 2) todo o bem que seja
negociado por um comerciante ou que seja objeto da mercancia; e 3) tudo aquilo
que seja objeto de um determinado mercado.
A adoção de qualquer uma dessas posições traz consigo
conseqüências diversas. Na realidade, para o tema em tela, mais importante é
como diferenciar uma mercadoria de um serviço. Até que ponto um é ato e o outro
é fato?
É interessante diferenciar o que seja bens e serviços no comércio
eletrônico. Esta questão era pacífica quando se falava apenas em mercadorias
corpóreas (bens corpóreos) e serviços como atividade humana (emprego de força
de trabalho). Atualmente, com as inovações eletrônicas, surgiram algumas
dúvidas sobre o liame de distinção entre um e outro.
33 GICO JUNIOR, Ivo Teixeira. Novas formas de comércio internacional. O comércio eletrônico. Desafios ao direito tributário e econômico. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3122>. Acesso em: 12 jan. 2007. 34 GRECO, Marco Aurélio. Tributação do Comércio Eletrônico, folhas soltas, 1999, p. 6.
61
O software foi o primeiro elemento causador deste problema. Seria ele
uma mercadoria ou um serviço? A posição que vem sendo adotada pelo STF35 é
a de que o programa de prateleira, vendido como mercadoria, padronizado, deve
ser encarado e tratado como uma mercadoria qualquer. Entretanto, quando se
trata de programa encomendado, deve ser encarado como serviço, pois a
relevância está na contratação de programador para a realização de um serviço,
que redundará no programa personalizado. Com base neste paradigma para
raciocinar qualquer outro caso de comércio eletrônico, acredita-se que ele será de
fácil solução.
Tudo que pode ser digitalizado pode ser objeto de comercialização por
meios eletrônicos. Tanto mercadorias quanto serviços. Destarte, uma música
quando comercializada na forma de um arquivo, quando copiado para um
dispositivo, e passa a ser utilizável, indistintamente, pelo seu novo detentor, é um
bem, ainda que incorpóreo, e uma mercadoria. Entre esta hipótese e a compra de
um single não há a menor diferença. Da mesma forma, um conjunto inteiro de
músicas, que poderia ser comercializado através de um CD, pode sê-lo por meios
telemáticos. Um caso é idêntico ao outro. Do mesmo modo que a música existe
no CD, existe no dispositivo, podendo ser um MP3 Player, um computador, um
DVD, fita magnética, não importando o meio,
Não obstante, caso o usuário paga pela mesma música, mas não pode
copiá-la para si, deve se conectar ao fornecedor para ouvi-la, então estamos
diante de um caso de fornecimento de serviço, pois a mercadoria não circulou,
mas apenas a sua utilidade, no caso, a audição. Da mesma forma se dará com
vídeos, fotografias, imagens, livros, etc. O exemplo é análogo ao da TV por 35 STF. Recurso Extraordinário 176.626 – SP. Rel. Min. Sepúveda Pertence. DJU 11/12/98.
62
assinatura, no qual se paga para assistir determinada programação. O que
diferenciará uma hipótese da outra é a livre circulação do bem ou de sua utilidade.
No caso de bens consumíveis se dará com o consumo, no caso dos bens
duráveis, com a sua disponibilização para manutenção e uso, e com os serviços
com a utilidade.
O grande equívoco é que sempre foi associada a idéia de mercadoria
com a idéia de coisa, res e a de res com objeto tangível. A mercadoria circula
porque é móvel, e é móvel porque tangível. Quando na verdade, a diferença entre
mercadoria e serviço se dá pelo simples fato de que a primeira é um ente
independente, independente do espírito humano. Tampouco é uma ficção ou
criação do Direito. Enquanto que o serviço é um processo, uma atividade
humana. Uma idéia não se contrapõe a outra, uma fato, stricto sensu, a outra é
ato.
Para evitar essa discussão, a OECD36 vem trabalhando para que seus
Membros adotem a posição de considerar o fornecimento de produto digitalizado
como sendo o fornecimento de serviço.
Nos contratos de venda on-line e de bens informáticos aos
consumidores, os produtos vendidos podem ser materiais, que são entregues
posteriormente no local indicado pelo comprador e venda de produtos imateriais,
cujo envio é imediato ou retardado no tempo, mas pelo mesmo meio eletrônico.
Os problemas mais apontados são a não entrega, ou equívoco de
endereço, as taxas não especificadas de correio ou de recebimento, o retardo da
36 OECD. Electronic Commerce: A Discussion Paper on Taxation Issues. Paris: Organization for Economic Co-operation and Development, 17 de Setembro, 1998, Item 43, b), p. 20.
63
entrega, a falta da sanção pelo retardo na entrega, a falta de garantia para o
produto, a impossibilidade de executar o direito de arrependimento (produto
aberto, software já enviado, endereço incongruente ou incompleto), a lei aplicável
e a jurisdição competente, por vezes até uma jurisdição arbitral virtual
compulsória, a recusa de venda, a falha na segurança dos dados do consumidor,
dados privados e dados sensíveis, como o número de cartão de crédito, a falha
na cobrança da fatura, as diferenças entre as imagens do produto no site e o
produto recebido, a compra involuntária ao apertar o ícone, o erro não sanável na
contratação, etc.
2.3 FORNECIMENTO DE SERVIÇOS NA INTERNET
O setor terciário ou de serviços é, sem dúvida, a atividade que mais
impulsiona a economia dos países mais desenvolvidos. Não se discute mais o
ganho de relevância do serviço na sociedade moderna. O debate atual é acerca
de sua evolução e do próprio termo serviço.
Até bem pouco tempo, os serviços eram caracterizados como
atividades humanas. A idéia por detrás do conceito era do trabalho da força
humana realizando determinada tarefa. Seja um trabalho braçal, seja um trabalho
mental, era sempre um trabalho humano, fruto de uma atividade humana.
Ocorre que, cada vez mais, a noção de serviço vem evoluindo para a
noção de utilidade, em que as pessoas se dispõem a pagar não pelo tempo
64
trabalhado ou pelo serviço realizado, mas pela utilidade que lhes é
disponibilizada. 37
Quanto aos contratos de fornecimento de serviços na Internet,
destacam-se os que visam ao fornecimento de informação e de acesso à Internet,
o fornecimento de lazer (como filmes, músicas, jogos on-line), aqueles que
fornecem serviços de educação à distância e serviços de turismo por meio
eletrônico (passagens combinadas, e-ticket, voucher etc.) e os serviços bancários,
de crédito e financeiros, (home-banking, office-banking etc.).
A prestação de serviços pode ser conceituada como o contrato
sinalagmático pelo qual uma das partes, denominada prestador, obriga-se a
prestar serviços à outra, denominada dono de serviço, mediante remuneração.
Trata-se de contrato bilateral, pois gera direitos e obrigações para
ambas as partes e como decorrência é oneroso, consensual, por se aperfeiçoar
com simples acordo de vontades, e comutativo, porque impõe vantagens e
obrigações recíprocas que se presumem equivalentes, conhecidas pelas partes.
Quanto ao objeto, conforme preceitua o artigo 594 do Código Civil,
absorve toda espécie de serviço ou trabalho lícito, material e imaterial. Assim,
temos uma obrigação de fazer, uma conduta, tanto material, como intelectual. A
lei não faz distinção quanto à natureza do serviço.
Verifica-se, em muitas situações, que esse negócio jurídico vem
acompanhado de outro contrato, como o de fornecimento, assistência técnica, etc.
37 GRECO, Marco Aurélio. Comércio Exterior e Novas Realidades – Problemas Emergentes. Revista Dialética de Direito Tributário, n.º 44, p. 123.
65
É importante lembrar que o Código de Defesa do Consumidor também alcança
essa prestação de serviço.
Para os consumidores, os serviços geralmente contratados são: de
acesso à rede (contratos de provedor); de informação ou revistas eletrônicas; ou
de dados e informações pontuais (por exemplo, quando um indivíduo acessa um
site restrito e paga pela informação de conteúdo exclusivo).
No tocante aos contratos de acesso dos consumidores à Internet e
redes eletrônicas, os temas mais freqüentes de interesse dos consumidores são
as informações sobre os diferentes tipos de planos, a velocidade, a qualidade e
quantidade exata da prestação, assistência e suporte técnico.
Os problemas mais freqüentes são as mudanças do conteúdo
contratual e do preço, as interrupções de sistema, a demora para acessar, a
velocidade esperada não confirmada, o não-bloqueio correto de conteúdos
restritos e sites, o spam, a quebra do sigilo nos endereços eletrônicos e das
senhas de acesso, a não-criptografia estipulada, a falha no webmail, a falta de
estocagem e a perda de informações, os vírus e cookies, os hackers, a venda
casada de equipamentos para rápido acesso, as cláusulas penais e a formação
não informada do preço.38
Nota-se que já existe jurisprudência brasileira sobre o tema, permitindo
a rescisão do contrato, mas impondo perdas e danos em caso de abusividade e
descumprimento de prazos mínimos, seja confirmando contratos de conexão à
Internet:
38 Estes contratos de acesso à Internet são tão conflituosos que o governo francês interveio para impor informações mínimas e proibir certas práticas comerciais.
66
Ação de cumprimento de obrigação de fazer. Continuação de prestação de serviço de conexão à Internet. A denúncia imotivada, pela empresa provedora, do contrato de prestação de serviço de conexão à rede mundial de computadores não satisfaz os requisitos da tutela antecipada de continuação do serviço. Não se pode atribuir o caráter de perpetuidade dos contratos, em especial o celebrado há mais de dois anos. Outros provedores à disposição do usuário. Possibilidade de futuro ressarcimento em caso de perdas e danos” (TJRS, Agravo de Instrumento 70002686053, rel. Des. André Luiz Planella Villarinho, j. 28.06.2001). Agravo de instrumento – Ação cautelar inominada – Contrato verbal de prestação de serviços de conexão à Internet – Rompimento do acordo por parte da contratante – Continuação do negócio pela contratada, locatária da linha junto à Embratel – Desligamento da contratante – Agravo provido, em parte” (TJRS, Agravo de Instrumento 597106962, rel. Des. Alfredo G. Englert, j.07.08.1997).
Nos contratos de bens totalmente desmaterializados, como música, e-
books, revistas on-line, acesso a informações e a bancos de dados, a imagens, a
filmes, a trailers, a histórias em quadrinhos, a videogames e etc., os problemas
mais comuns seriam as próprias condições de uso do bem transmitido (cópia,
download), a garantia de prestabilidade dada, os erros na contratação e o direito
de arrependimento, a desatualização ou imprecisões dos bancos de dados, a
demora na prestação das informações, do lazer, etc.39
Um regime especial, com responsabilidade qualificada dos
fornecedores, é o dos contratos por Internet visando a conselhos, a
aconselhamentos (financeiros, na compra de produtos complexos ou em atividade
como corretor), a pareceres (econômicos, estatísticos, advocatícios, etc.) a
tratamentos (medicinais, psicológicos, médicos, etc.)
39 MARQUES, Cláudia Lima, Confiança no comércio eletrônico e a proteção do consumidor: (um estudo dos negócios jurídicos de consumo no comércio eletrônico), São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2004. A autora enfatiza o alerta de Schmitz, Die vertraglichen Pflichten und die Haftung der Informationsabieter im Internet, p. 131 e ss, se as informações e dados são gratuitos na internet e realmente não remunerados indiretamente, o regime é diferenciado, análogo às doações e liberalidades do Direito Civil geral, mas com um regime sui generis de responsabilidade civil.
67
Os contratos envolvendo educação à distância através da Internet
também envolvem questões específicas, geralmente reguladas por leis especiais,
envolvendo garantias, reconhecimento de diplomas, títulos, qualidade e
quantidade da informação, direitos autorais, modos de cobrança e proibindo
certas práticas comerciais nestes contratos educacionais.
Por fim, os contratos de prestação de serviços on-line, tais como
contratação com agências de viagens, transportadoras, seguradoras, banco e
financeiras, os problemas mais visíveis são os relacionados à qualidade, à
quantidade, ao tempo e modo da prestação do serviço, à segurança deste e, em
especial, tratando-se de home-banking, ao financiamento on-line ou por
automático bancários. Interessante observar que neste tipo de contratação,
aplica-se o direito de arrependimento e reflexão do artigo 49 do Código
Consumeirista.
3 ASPECTOS LEGAIS
3.1 ESTRUTURA JURÍDICA DOS NEGÓCIOS VIA INTERNET
O advento da era digital criou a necessidade de repensar importantes
aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, à
privacidade, à liberdade, aos negócios jurídicos, dentre outros.
Diante desta recente realidade surge a hipótese nada pacífica da
criação de um novo ramo do Direito. Tal questão gera inúmeros questionamentos
se esta “nova área” merece o status de autônoma, a ser discutida e lecionada em
universidades, ou irá permear todas as outras? Juristas e operadores do direito
em áreas tradicionais terão que se aprimorar nos conceitos da Informática
Jurídica?
Discute-se se surgirá uma disciplina autônoma já que toda vez que
surge uma tecnologia inovadora, surge também a necessidade de reunir suas
divergências e peculiaridades em torno de um corpo cognitivo especializado, a
exemplo do direito dos transportes, das telecomunicações, da navegação área,
marítima e outros que provocaram o surgimento de novas disciplinas.
Nessa área de conhecimentos começou-se com a noção de “Direito
Informático”, o qual dá relevo aos computadores e ao processamento da
69
informação, entretanto, atualmente se tem difundido a idéia de um “Direito do
espaço virtual”, que pode abranger diversos aspectos.40
Pode-se acreditar na existência de um novo espaço, o cibernético
(cyberspace)41 que é distinto do espaço físico e que possui uma arquitetura
caracterizada por sua maleabilidade, posto que qualquer indivíduo pode redefinir
códigos e interagir, convertendo-o num objeto de difícil acesso e renitente às
regras legais sobre jurisdição.
É facultativo admitir a existência de uma nova temporalidade que é
caracterizada pela simultaneidade, o “tempo virtual” e a dissolução da distância
na interação imediata, isso coloca problemas legais, como, por exemplo,
estabelecer se se trata de contratos entre presentes e ausentes, ou compras e
venda à distância.
É facultativo ainda reconhecer, uma nova noção de comunidade
distinta da atual, tendo em vista a constituição de numerosos agrupamentos
virtuais formados por pessoas que interagem entre si por interesses delimitados,
criando uma nova realidade com enormes possibilidades, na qual a base passa a
ser a experiência e não o espaço geográfico.
No âmbito legal, o padrão às quais as cláusulas gerais são remetidas é
constituído por práticas sociais definidas geograficamente: moral, boa-fé, justiça,
que se tomam em relação com os parâmetros locais, regionais e nacionais,
40 É a noção difundida nos Estados Unidos da América: “Cyberspace Law”. Por exemplo, conf. Harvard Law Review, vol. 112, nº7, maio de 1999.”Developments in the Law of Cyberspace”. 41 O termo provém do inglês e foi extraído do romance de Willian Gibson chamada “Neuromancer”, de 1984, tendo se difundido largamente.
70
segundo o juiz. No espaço dito virtual, não há essa referência, o que foi notado
nos casos em que se procurou controlar mensagens moralmente ilícitas.42
Pode-se ainda conceber uma nova idéia de cidadãos, os netizens43 que
são “navegantes felizes”, porém socialmente cada vez mais isolados e destituídos
de capacidade crítica. Segundo Ricardo Luis Lorenzetti, isso leva à necessidade
de estabelecer quais são os direitos que esses cidadãos têm na comunidade
virtual.44
Diante da mudança dos pressupostos, leva-se a pensar que o mesmo
deveria ocorrer no Direito, com novas ferramentas e novos conceitos. Até agora o
fenômeno não se produziu, tendo em vista que a Cyberlaw é submetida a exame
mediante as categorias conceituais do direito comum e seus problemas são
similares: regulamentação ou flexibilização, proteção da propriedade, do
consumidor, da privacidade.
As categorias analíticas e metodológicas procedem por analogia e
apesar do fascínio produzido pelos novos termos, acredita-se que é mais
prudente examiná-los mediante uma assimilação dos fenômenos já conhecidos.
Os que defendem a não criação de um pretendido direito eletrônico (ou
internético, ou informático, ou virtual, ou como a criatividade do jurista determinar)
têm um bom embasamento a justificar suas posições, haja vista que a Internet
42 HARVARD LAW REVIEW, Developments in the Law of Cyberspace, vol. 112, nº7, maio de 1999 43 O termo “netizens” é tomado de BRASCOMB, Anne. Anonymity, Autonomy and Accountability: challenges to the first admendmet in cyberspaces. The Yale Law Journal, 1995, vol. 104, pág. 1.639. 44 LORENZETTI, Ricardo Luis. (tradução de BINI, Edson) Informática, Cyberlaw, E-Commerce, originalmente publicado em Tratado de los Contratos, Rubinzal-Culzoni Editores, Santa Fé, Aregentina, 2000, Tomo III.
71
não criou nenhum novo bem jurídico a ser protegido. Logo não há que se discutir
sobre a criação de um novo ramo do Direito.
A ação, segundo os que defendem essa corrente, a qual baseia-se o
presente trabalho, pode ser eletrônica (um contrato, uma ofensa, um estelionato
ou invasão de privacidade, por exemplo), mas o direito não.
Neste sentindo, é válido recorrer a brilhante lógica do canivete suíço
que para tudo serve, comentada por Omar Kaminski.45 Se for inserido um pouco
numa região não vital, pode resultar em lesão corporal leve; no entanto, se for
espetado no coração pode resultar em homicídio. Os antigos legisladores foram
sábios e não legislaram sobre o canivete, mas sobre os efeitos de sua
empunhadura e do resultado.
O país ainda não dispõe de uma lei que trate especificamente de
comércio eletrônico. Expertos e autoridades governamentais ainda discutem a
necessidade de maior ou menor regulamentação sobre o tema.
Atualmente, encontra-se em tramitação no legislativo federal projetos
de lei sobre comércio eletrônico, dentre eles: os Projetos de Lei da Câmara nº
1.589/1999 (apensado ao PL 1483/1999) e nº 3.303/2000 (apensado ao
3.016/2000) e os Projetos de Lei do Senado nº 672/1999 (proposição ordinária),
tendo como seu substituto o PL 4.906/01 com vários apensos.
O Projeto de Lei 1.589/1999, elaborado pela Comissão Especial de
Informática Jurídica da OAB/SP, já anteriormente mencionado quando abordada a
questão da assinatura digital, inspirou-se na proposta de diretiva européia, hoje
45 KAMINSKI, Omar. Direito na rede. Justiça e Legislativo deram novos rumos à Internet. Revista Consultor Jurídico in http://conjur.estadao.com.br/static/text/51375,1 , em 26/12/2006.
72
aprovada sob o nº 1999/93/CE, bem como nas sugestões presentes na Lei
Modelo de Comércio Eletrônico da Comissão de Direito do Comércio Internacional
da Organização das Nações Unidas – UNCITRAL.
Em suma, estão presentes os seguintes aspectos: 1) desnecessidade
de autorização prévia para oferta de bens e serviços em razão do meio eletrônico;
2) obrigatoriedade de identificação do ofertante, do armazenador, do provedor de
acesso e dos sistemas de segurança para o arquivamento eletrônico; 3) regras de
utilização de informações de caráter privado; 4) segurança e certificação
eletrônica das transações; 5) responsabilidades dos intermediários, transmissores
e armazenadores de informações; 6) aplicabilidade das normas de proteção e
defesa do consumidor ao comércio eletrônico; 7) eficácia jurídica das assinaturas
eletrônicas e dos documentos eletrônicos; 8) certificações eletrônicas públicas e
privadas; 9) responsabilidade de tabeliães relacionada à atividade de certificação
eletrônica; 10) competência do Poder Judiciário para autorizar, regulamentar e
fiscalizar o exercício das atividades de certificação; 11) competência do Ministério
da Ciência e Tecnologia para regulamentar os aspectos técnicos das
certificações; e 12) as sanções administrativas e penais aplicáveis.
O Projeto de Lei nº 3.303/2000 regula a operação e o uso da Internet
em âmbito nacional, trazendo como inovações, dentre outras: 1) a classificação
do provedor de acesso como prestador de serviços de valor adicionado ao serviço
de telecomunicação; 2) a instituição de mecanismos de segurança, cadastro de
usuários juntos aos provedores de acesso e meios adequados para a
identificação de práticas ilícitas na Internet; 3) a realização dos registros e a
coordenação dos nomes de domínio pelo Comitê Gestor da Internet do Brasil; e 4)
a criação do Conselho de Ética da Internet.
73
O projeto de Lei nº 672/1999, apresentado apenas poucos meses após
o PL 1.5899/1999, incorpora quase integralmente os preceitos da Lei Modelo da
UNCITRAL e toca nos seguintes tópicos: 1) reconhecimento de efeitos jurídicos
às mensagens de dados; 2) equiparação da mensagem eletrônica à mensagem
impressa; 3) equiparação dos métodos de identificação eletrônicos à assinatura;
4) autenticidade de informações em meio eletrônico; 5) conservação de
mensagem eletrônica; 6) validade das declarações de vontade e formação de
contratos através de mensagens eletrônicas; e 7) princípios aplicáveis à
determinação do remetente, do destinatário, do tempo e do lugar relativos ao
envio e ao recebimento das mensagens eletrônicas.
Finalmente, o Projeto de Lei 4.906/2001 que regula o comércio
eletrônico em todo o território nacional, destacando a necessidade de
uniformização das normas de comércio eletrônico em nível internacional, criando
dispositivos que regulamentam a aplicação de requisitos legais às mensagens
eletrônicas e a comunicação de mensagens eletrônicas, inclusive quanto à
celebração e validade dos contratos celebrados eletronicamente.
3.2 LEI APLICÁVEL E COMPETÊNCIA.
Com a Informática e o uso astronômico da Internet, novas situações
começam a surgir e não podem ser simplesmente ignoradas pelos órgãos
jurisdicionais. A questão reside, então, em como interpretar as regras integrantes
do ordenamento jurídico em face das novas maneiras de se relacionar entre os
indivíduos.
74
Preliminarmente ao estudo da legislação aplicável aos contratos
eletrônicos internacionais, bem como seus efeitos dentro do comércio eletrônico,
faz-se oportuno analisar a definição de competência de Liebman, “quantidade de
jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão”.46
Historicamente, este conceito veio a superar a definição, até então
existente, de competência como medida de jurisdição47, já que esta não é
suscetível de “medidas, restrições ou divisões (todo o juiz, enquanto tal, é a
encarnação do próprio Estado, exercendo naquele momento, em sua inteireza, o
poder jurisdicional”). 48
Enquanto a competência diz respeito às atribuições dos órgãos
jurisdicionais, a jurisdição é a própria manifestação do poder e da soberania
estatal.
É mister que o comércio eletrônico desconhece fronteiras e ultrapassa
os limites das jurisdições dos diversos países, pois constitui uma das modalidades
de contratação à distância.
Não será novidade que se acentuem problemas jurídicos nos contratos
eletrônicos, pois além de ser prevalente seu caráter impessoal, é de satisfação
incerta.
46 LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de Direito Processual Civil, vol. 1, trad. e notas de Cândido Rangel Dinamarco, Forense, Rio de Janeiro, 2ª ed., 1985, pág. 55 47 CHIOVENDA, Giuseppe, Instituzioni di Diritto Processuale Civile, Jovene, Nápoles, 2ª ed., 1936., §25, nº173 e ss., págs. 140 e ss.; idem, Principii di Diritto Processuale Civile, Jovene, Nápoles, 1965, § 26, págs. 483 e ss. 48 LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de Direito Processual Civil, vol. 1, trad. e notas de Cândido Rangel Dinamarco, Forense, Rio de Janeiro, 2ª ed., 1985, pág. 56
75
A primeira dificuldade a se enfrentar, antes mesmo da definição de
competência, mas relevante para sua determinação, diz respeito à determinação
da lei aplicável.
No sistema italiano do começo do século XX, Vivante afirmava que “a
validade, a forma, os efeitos de uma obrigação devem regular-se segundo a lei e
os usos do lugar onde tiveram origem”.49
O artigo 11 da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.567,
de 4 de setembro de 1942) dispõe que a “forma extrínseca dos atos, públicos ou
particulares, reger-se-á segundo a lei do lugar em que se pratique”, mas assim a
solução apresentada não apresenta segurança, pois esse dispositivo apenas
procura elucidar o sentido da regra locus regit actum.
Assim é que esta regra não é possível de ser aplicada aos contratos
eletrônicos internacionais, já que, na maioria das vezes, torna-se difícil determinar
o lugar no qual a obrigação se constituiu.
Diante da inexistência de lei específica para regulamentar as questões
jurídicas oriundas das relações digitais, são aplicáveis ao comércio eletrônico no
Brasil, seja diretamente ou por analogia, os preceitos da legislação em vigor,
pertinentes aos negócios e práticas tradicionais no comércio. Aplicam-se, ainda,
os princípios inerentes a Lei de Introdução ao Código Civil no que for pertinente,
tendo em vista seu caráter internacional nas relações comerciais.
É cediço que os contratos internacionais podem ser definidos como
acordos de vontade celebrado entre dois ou mais sujeitos de direito fazendo
49 VIVANTE, Cesare. Instituzioni di Diritto Commerciale, Hoepli, Milão, 40ª ed., 1929.
76
nascer entre eles direitos e obrigações que potencialmente estejam submetidos
às normas provenientes de mais de um ordenamento jurídico estatal.50
Na atualidade a doutrina, bem como a prática jurisprudencial francesa,
norte-americana e alemã em geral têm admitido a autonomia da vontade às
partes como regra válida para a escolha da lei aplicável aos contratos
internacionais.
O artigo 9º da Lei de Introdução ao Código Civil não utilizou a
expressão “autonomia da vontade”, enfatizando apenas que “para qualificar e
reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”.
A supressão da expressão “autonomia da vontade” fez com que alguns
doutrinadores, como Amílcar de Castro51, negassem a sua existência como
critério apto no Direito Internacional Privado brasileiro para a determinação da lei
aplicável aos contratos internacionais. Outros como Wilson Batalha52 e Oscar
Tenório53 a admitiam apenas no terreno de eleição de normas facultativas ou
supletivas referentes aos contratos internacionais, negando que o artigo 9º
permitisse a utilização exclusiva da vontade como critério para a eleição da lei
aplicável aos contratos internacionais.
Haroldo Valladão54, por sua vez, critica o fato de que nos contratos
celebrados entre ausentes (que se utiliza de fax, telefone, telégrafo, carta, e até
50 FIORATI, Jete Jane, Direito do comércio internacional: OMC, telecominicações e estratégia empresarial, Franca, UNESP – FHDSS, 2006, pág.142. 51 CASTRO, Amílcar. Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro, Forense.1987, p.444. 52 BATALHA, Wilson. Tratado Elementar de Direito Intenacional Privado. v.II. São Paulo, RT, 1977, p.252,254. 53 TENÓRIO, Oscar. Direito Internacional Privado. v.II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1976, p.177-178. 54 VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado. v.I Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980, p.366 e 373-374.
77
de redes de computadores), o parágrafo 2º do artigo 9º da Lei de Introdução
disciplina que “reputa-se constituído o contrato no local onde residir o
proponente”, uma vez que a tradição brasileira sempre foi a adoção do domicílio e
não da residência. Por outra banda, a utilização do termo reputar implicaria,
segundo o autor, numa presunção de aplicação da lei, que terminaria no momento
em que as partes através de sua vontade determinassem a lei aplicável à relação
jurídica por elas criada.
Pode-se verificar, portanto, que o artigo 9º da Lei de Introdução em
vigor não permite a escolha da regra que se regerá o contrato pelas partes,
possibilitando, sim, a escolha do local em que celebrarão o contrato por
conseqüência da regra a ser aplicada. Em suma, trata-se de uma autonomia da
vontade por vias tortas.
Conforme enfatiza Strenger55, a tendência da moderna doutrina
brasileira é de admitir a autonomia da vontade das partes contratantes para fixar o
direito ao qual será regido o contrato celebrado.
A adoção da autonomia da vontade como critério apto para a
determinação da lei aplicável aos contratos realizados em âmbito internacional,
além de ser consentâneo as regras de Direito Internacional Privado Uniformizado
e praticado em toda a sociedade ocidental, é também critério que possibilita a
aplicação de um direito mais adequado ao contrato, especialmente quando se
observa a cada dia a evolução tecnológica abrindo portas para novas
possibilidades de negócios e muitas regras internas nada dispõem sobre a
55 STRENGER, I. Autonomia da Vontade em Direito Internacional Privado. São Paulo: RT. 1968, p.125
78
disciplina jurídica necessária à regulamentação e utilização de novas tecnologias,
bem como seus reflexos nas relações econômico-jurídicas entre as partes.
Destarte, como os atos jurídicos em geral, cuja validade depende
apenas de agente capaz, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei,
aqueles realizados em meio eletrônico reputam-se igualmente válidos quando
presentes os requisitos elencados pela lei civil, conforme anteriormente
demonstrado.
O artigo 435 do Código Civil Brasileiro preceitua que o contrato reputa-
se celebrado no local onde foi feita a proposta. A Lei de Introdução ao Código
Civil, por sua vez, dispões em seu artigo 9º, que as obrigações decorrentes do
contrato regem-se pela lei do país onde se constituírem, estabelecendo, também,
que tais obrigações reputam-se constituídas no lugar onde residir o proponente.
Desta forma, uma operação comercial eletrônica celebrada entre partes
situadas em países distintos será regulada pela lei do país onde residir o
proponente. Em outras palavras, se uma proposta é feita por empresa ou pessoa
residente no estrangeiro, e aceita por empresa ou pessoa residente no Brasil, a lei
a ser aplicada será a do país estrangeiro, e, ao inverso, se a proposta é feita por
empresa ou pessoa brasileira, e aceita por empresa ou pessoa alienígena, a lei
aplicável será a brasileira.
Assim, analisando os dispositivos supra, pode-se estabelecer que a
venda e compra serão regidas pelas leis do país em que se situar o
estabelecimento eletrônico.
79
O estabelecimento eletrônico é definido como “um bem incorpóreo,
constituído de um complexo de bens que não se fundem, mas mantêm
unitariamente sua individualidade própria”56, reunidos pelo empresário para a
exploração de sua atividade econômica.
Porém, devido as crescentes transformações, o estabelecimento é
considerado físico ou virtual. Essa definição é feita de acordo com o “meio de
acesso aos consumidores e adquirentes interessados nos produtos, serviços ou
virtualidades que o empresário oferece ao mercado. Se o acesso é realizado pelo
deslocamento destes no espaço até o imóvel em que se encontra instalada, a
empresa, o estabelecimento é físico, se acessado por via de transmissão
eletrônica de dados, é virtual”. 57
Como é cediço, a competência para julgamento dos conflitos oriundos
dos contratos eletrônicos não foi regulamentada, no Brasil, por legislação. A
ausência de fronteiras e referências físicas na Internet dificulta a identificação do
órgão jurisdicional competente para o julgamento.
O projeto de Lei 679/99 adota as linhas básicas da Lei Modelo da
UNCITRAL, que, em matéria de competência, institui que o lugar de envio ou
recebimento de uma mensagem eletrônica será sempre o do estabelecimento dos
contratos, salvo quando o remetente e o destinatário não possuírem
estabelecimento, quando será considerada, para fins de competência, a
residência habitual destes; e quando os contratantes tiverem mais de um
56 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial., Saraiva, São Paulo, 9ª ed., 1979, nº 158, pág. 192. 57 COELHO, Fábio Ulhoa. O estabelecimento virtual e o endereço eletrônico. In Tribuna do Direito, novembro de 1999, pág. 32.
80
endereço, hipótese em que será considerado o local que guarde mais relação
com a transação.
A competência internacional geral do judiciário brasileiro, quando o
contrato é celebrado entre contratantes situados em países distintos, observa-se
as regras dos artigos 88 a 90 do Código de Processo Civil, que dispõem:
Art. 88. É competente a autoridade judiciária brasileira quando: I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III - a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil. Parágrafo único. Para o fim do disposto no no I, reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal. Art. 89. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; II - proceder a inventário e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território nacional. Art. 90. A ação intentada perante tribunal estrangeiro não induz litispendência, nem obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que Ihe são conexas.
Assim, no contrato eletrônico celebrado por duas empresas situadas
em países diferentes, sendo a proponente sediada no estrangeiro, sem possuir
filial no Brasil, a lei aplicável será a do país estrangeiro. Considerando que a
obrigação decorrente do contrato tenha que ser cumprida no Brasil, a justiça
brasileira será competente para processar e julgar o caso.
O problema da jurisdição e territorialidade, presente nas transações
internacionais, foi objeto de estudo do Relatório da American Bar Association.58
Foram apresentadas como hipóteses cabíveis para a escolha do foro de eleição
em caso de problemas legais: 58 nota publicada no Jornal do Commercio de 18/07/2000.
81
1) o foro de eleição pode ser no país de destino, onde reside o
consumidor; como conseqüência as empresas de comércio eletrônico teriam que
se sujeitar às leis do país de cada consumidor, a cada compra realizada;
2) o foro de eleição pode ser no país de origem, onde a empresa está
legalmente sediada; como conseqüência o consumidor estaria desprotegido e
teria que conhecer a legislação de diversos países;
3) estabelecimento de um acordo entre comprador e vendedor no
momento da transação, para decidirem sobre o foro de eleição; como
conseqüência o governo não participaria do acordo e perderia o controle sobre as
transações on-line (pode ser problemático se as mercadorias são medicamentos
ou softwares).
A solução técnica proposta pelo Relatório foi a criação de robôs,
agentes inteligentes, que negociariam os termos de cada transação, com base em
parâmetros pré-estabelecidos, de acordo com os endereços de IP de origem e de
destino.
3.3 COMPETÊNCIA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO
A partir do momento em que há a celebração do contrato eletrônico
com o site responsável pela venda, ou seja, de um site cuja sede social não está
no Brasil, cria-se, obviamente, uma obrigação de adimplemento do contrato
celebrado entre o vendedor virtual estrangeiro e o consumidor brasileiro. Com
efeito, caso a empresa vendedora possua filial ou sucursal em território brasileiro,
estas serão acionadas em eventual processo judicial..
82
A Carta Magna, em seu artigo 5.º, inciso XXXII, prevê a proteção
estatal do consumidor através de lei ordinária. Essa lei é o Código de Defesa do
Consumidor, Lei n.º 8078/1990. Além disso, o artigo 170, V, erige a defesa do
consumidor a condição de princípio da ordem econômica.
A proteção conferida pelo Código abrange todas as pessoas, sejam
elas físicas ou jurídicas, desde que estas sejam destinatárias finais do produto ou
do serviço.
É de suma importância ressaltar que após duríssimos anos que
levaram à devida efetivação e a prática do respeito ao consumidor brasileiro,
através do advento da lei consumeirista em vigor, o comércio eletrônico não
possui o condão de afastar a sua aplicabilidade. Esta recente forma de contratar
deve ser entendida apenas como um meio de efetuar as transações, assim como
o telefone ou o telefax.
Sendo prevalente o entendimento que de que as regras de proteção e
defesa das relações de consumo são de ordem pública e tem caráter indisponível,
as ofertas de produtos e serviços feitas por fornecedor situado no exterior são
disciplinadas pelo código de defesa do consumidor.
Esse diploma define em seu artigo 3º, caput, o que vem a ser
fornecedor, ou seja, “toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional
ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem
atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação,
importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação
de serviços”. Sendo o fornecedor estrangeiro e exportando seus produtos ou
83
serviços para o Brasil, aplicar-se-ão as normas do Código de Defesa do
Consumidor.
Por outra banda, é preciso considerar que a já citada Lei de Introdução
ao Código Civil, em seu artigo 1º, caput e § 1º, dispõe que a lei brasileira vigora
em todo o país, mas a sua obrigatoriedade nos Estados estrangeiros depende de
que estes expressamente a admitam.
Portanto, não se deve afirmar categoricamente que nossa lei
consumeirista será sempre aplicada, principalmente porque algumas ofertas de
contratação serão expressamente regidas pela lei estrangeira. A questão parece
situar-se na validade e eficácia extraterritorial da lei brasileira.
Diante de um caso de inadimplemento contratual, isto é, o não
cumprimento da data correta de entrega do produto, a existência de vícios, as
características do produto, dentre outros, é importante ressaltar que tais
desobediências infringem, frontalmente, uma obrigação que deve ser executada
em território brasileiro. Por conseguinte, aplicar-se-á o artigo 9.º § 1.º, da Lei de
Introdução ao Código Civil, (elemento de conexão) que preceitua:
Art. 9.º : Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § 1.º Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será está observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2.º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.
O elemento de conexão acima referido em uma relação regida pelo
direito civil, poderia ser aplicado. Não obstante, trata-se de direito do consumidor
e este, por sua vez, está previsto nos direitos e garantias fundamentais da
84
Constituição Federal Brasileira, e, como é mister, o artigo 5.º é cláusula pétrea.
Permitir a aplicação do direito estrangeiro seria negar a Constituição Federal, e tal
conduta não é da tradição jurídica brasileira.
Como se trata de obrigação não cumprida, isto é, não houve a entrega
do produto ou a realização do serviço pela empresa estrangeira ao consumidor
brasileiro, portanto deve-se aplicar o art. 9.º § 1.º da LICC.
Ademais, o Código de Processo Civil em seu artigo 88 trata da
competência internacional e em especial seu inciso II, conforme já explanado
anteriormente.
Importante ressaltar, também, que o próprio Código de Defesa do
Consumidor, em seu artigo 101, I, é taxativo quanto a possibilidade de opção pelo
domicílio.59
Por fim, interessa asseverar que em uma compra realizada pela rede,
cuja empresa vendedora possua sede social em país estrangeiro, o consumidor
brasileiro terá dois caminhos:
Poderá mover uma eventual ação judicial no país sede da empresa, ou,
poderá processar no Brasil, pois está amparado pela Constituição Federal, Lei de
Introdução ao Código Civil, por normas de caráter processual e principalmente
pelo Código de Defesa do Consumidor.
59 Artigo 101: Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos ou serviços, sem prejuízo no disposto nos capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas: I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor.
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Por conseguinte, deve-se destacar que se consumidor move uma ação
judicial no Brasil e vence a demanda, tem-se, por conseqüência, que a execução
da sentença brasileira deverá ser realizada no país de origem da empresa virtual.
Dessa forma, os requisitos do artigo 15 da Lei de Introdução ao Código
Civil, de forma analógica deverão ser observados. Caso a execução do comando
judicial brasileiro afronte a soberania nacional, a ordem pública e os bons
costumes, tal execução poderá ter restrições na sua eficácia em solo estrangeiro,
como por exemplo, se a sentença brasileira determinar a inversão do ônus da
prova da relação consumerista, e não existir previsão semelhante na legislação
estrangeira.
Finalmente, mister se faz mencionar que há dois caminhos a seguir,
quais sejam, a ação judicial poderá ser movida no estrangeiro em conformidade
com o direito alienígena e também há a opção de se mover o processo no Brasil,
em consonância com o ordenamento pátrio e realizar sua posterior execução em
solo estrangeiro, com suas possíveis implicações jurídicas com o ordenamento
local.
Pelo menos em relação aos negócios jurídicos exclusivamente
nacionais, pode-se afirmar com toda a certeza que a venda e compra realizada
por meio eletrônico é contrato eletrônico regido pelo Código de Defesa do
Consumidor, no qual o fornecedor de produtos ou o prestador de serviços
(vendedor), titular do estabelecimento virtual, exterioriza a oferta e o internauta
(comprador) manifesta a sua aceitação mediante computadores ligados via
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eletrônica em rede. A troca de informações se realiza apenas pelo processamento
e transmissão eletrônica de dados. 60
Nesses casos, aplica-se a regra constante do art. 49 do Código de
Defesa do Consumidor, que, ao disciplinar a contratação realizada fora do
estabelecimento comercial, concede ao consumidor o direito de arrependimento,
no prazo de sete dias do recebimento do bem e não da celebração do negócio
jurídico, sem nenhum encargo. Mas isso não é suficiente, pois medidas judiciais
podem originar-se da contratação pactuada por meio eletrônico.
O estatuto dos direitos do consumidor no Brasil é compatível com as
mais modernas leis no mundo. As cortes pátrias tem sido cautelosas em aplicar a
lei, de modo que ela alcance o objetivo principal, que é proteger os consumidores
enquanto ao mesmo tempo aumenta a competição saudável entre os
participantes do mercado de suprimento.
Para a indústria brasileira, significa que o país possui o cenário certo
para o desenvolvimento de seus fabricantes, de modo que eles possam vencer os
competidores baseados em território alienígena, e ao mesmo tempo os coloca em
sintonia com possíveis parceiros no Brasil e no exterior. Entender os direitos do
consumidor nas várias jurisdições ajudarão pessoas de negócios a se integrarem
melhor, mais rápido e de uma maneira mais lucrativa.
60 COELHO, Fábio Ulhoa. O contrato eletrônico: conceito e prova”, in Tribuna do Direito, fevereiro de 2000.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Baseado no presente estudo, é possível entender a essência dos
contratos eletrônicos e possuir uma melhor compreensão acerca do comércio
eletrônico internacional e suas relações realizadas através dessa recente forma
contratual.
Conceituou-se então o contrato eletrônico como o acordo de vontades
individuais, celebrado ou executado pela via eletrônica, que resulta na
constituição, modificação, manutenção ou extinção de direitos, obrigando todas as
partes acordantes ou contratantes.
Não há dúvida de que os contratos eletrônicos são perfeitamente
considerados válidos e produzem seus os efeitos jurídicos, pois apresentam os
elementos estruturais e funcionais, assim definidos pela doutrina, e também
condições previstas no artigo 104 do Código Civil Brasileiro: partes capazes,
objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.
A Internet é, sem dúvida, apenas mais um meio utilizável de
comunicação para se contratar, e sendo que o nosso Código Civil em seu art.
428, inciso I, já prevê a validade dos contratos celebrados por telefone ou por
meio de comunicação semelhante, não resta dúvida alguma que os contratos
celebrados via Internet serão perfeitamente válidos, desde que munidos de seus
88
requisitos necessários apresentados no presente estudo, conforme o
posicionamento majoritário da doutrina recente.
A tecnologia traz comodidade aos contratantes em realizar seus
negócios jurídicos via Internet, proporcionando-lhe mecanismos capazes de
assegurar a autenticidade e a integridade que necessitam para adquirirem força
probante em nossos tribunais.
Comparada à forma contratual documentado em papel, pode-se ousar
a afirmar que o contrato eletrônico é até mais seguro, desde que assinado
digitalmente. Se alguns temem os negócios jurídicos eletrônicos por acreditarem
que podem ser facilmente copiados, no caso, os contratos realizados através de
certificação digital são praticamente impossíveis de serem modificados. Tal
segurança não ocorre em um contrato documentado em papel, podendo ser
facilmente impresso com informações adversas das originais e suas assinaturas
manuscritas mais vulneráveis à falsificação, levando-se em conta, ainda, que a
identificação de tal assinatura dar-se-á geralmente pelo olho humano, susceptível
a erros, enquanto a autenticação da assinatura digital dar-se-á por computador.
Cumpre ressaltar ainda que inexiste no ordenamento jurídico do país
lei que determine uma forma preestabelecida para os contratos de compra e
venda de bens e serviços pela Internet, devendo os mesmos serem considerados
válidos se efetivado sob qualquer forma não contrária ao ordenamento jurídico.
Já é visível que o legislador pátrio apresenta sinais de interesse acerca
do assunto, posto que já tramitam no congresso nacional diversos projetos de leis
concernentes aos contratos eletrônicos, comércio eletrônico, assinatura digital,
dentre outros.
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Sem dúvida que diante da inexistência de lei específica para
regulamentar as questões jurídicas oriundas das relações digitais, são aplicáveis
ao comércio eletrônico, seja diretamente ou por analogia, os preceitos da
legislação em vigor, pertinentes aos negócios e práticas tradicionais no comércio.
Aplicam-se, ainda, os princípios inerentes à Lei de Introdução ao Código Civil no
que for pertinente, tendo em vista o caráter internacional das relações comerciais.
O presente estudo utilizou-se da interdisciplinaridade de diversos
ramos do direito, dentre eles, em especial, o Direito Civil e o Direito do
Consumidor, os quais forneceram maiores subsídios.
Apresentou-se também a discussão acerca da necessidade de criação
de um novel ramo do direito, ou seja, o direito eletrônico (ou internético, ou
informático, ou virtual, dentre outros). Como já explanado, defende-se que não
existe tal necessidade, haja vista que a Internet não criou nenhum novo bem
jurídico a ser protegido.
Por fim, acredita-se que o trabalho monográfico servirá de marco para
um perfeito aprofundamento do tema, ultrapassando assim o nível acadêmico e
passando a integrar uma maior discussão doutrinária e operacional a nível
profissional, buscando sempre enquadrar a legislação com a realidade
contemporânea.
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