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200 FRAGA, V. S. O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen... Per Musi, Belo Horizonte, n.27, 2013, p.200-217 Recebido em: 19/03/2012- Aprovado em: 18/06/2012 O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen: contexto, análises e interpretações Vinicius de Sousa Fraga (UFBA, Salvador, BA) [email protected] Resumo: Composto em 1928, o Concerto para Clarineta, Op.57, de Carl Nielsen (1865-1931) tornou-se uma obra fundamental na literatura da clarineta no século XX. A presente pesquisa procura discutir algumas de suas questões de performance através de uma contextualização da época em que foi escrito, com ênfase nos aspectos relevantes sobre o compositor e a produção da obra. São observadas as divergências entre a edição da Samfundet e os originais manuscritos. Por meio de uma análise da obra, busca-se discutir sua recepção inicial e seu papel na literatura da clarineta. Palavras-chave: Carl Nielsen; concerto para clarineta; análise e interpretação musical. Carl Nielsen’s Clarinet Concerto, Op.57: context, analysis and performance Abstract: Composed in 1928, Carl Nielsen’s Clarinet Concerto, Op.57 became a fundamental work in the twentieth- century clarinet literature. This study discusses some of the work’s performance aspects by means of examining its context related to its composer and compositional procedures. The discrepancies between the Sanfundet edition and the composer’s manuscripts are observed. Analysis aspects of the work support the discussion about its initial reception and its role in the clarinet literature. Keywords: Carl Nielsen; clarinet concerto; music analysis and interpretation. PER MUSI – Revista Acadêmica de Música – n.27, 236 p., jan. - jun., 2013 1 – Introdução Composto em 1928, o Concerto para Clarineta, Op.57, de Carl Nielsen (1865-1931) foi dedicado ao clarinetista dinamarquês Aage Oxenvad como parte da promessa de composição de um concerto para cada membro do quinteto de sopros do qual Oxenvad fazia parte. Gradativamente, o Concerto tornou-se uma obra importante na literatura da clarineta no século XX, sendo executado em concursos e concertos, além de amplamente gravado por instrumentistas do mundo todo. Com frequência, a linguagem do compositor associada à textura densa e à complexidade estrutural dessa obra suscitam questões inerentes à sua performance que permitem múltiplas abordagens interpretativas. As gravações pesquisadas demonstram que esse caráter subjetivo da performance permite certo grau de flexibilidade da interpretação como um ato de reconstrução que justapõe o mundo do compositor e do intérprete (NATTIEZ, 1993, p.144). Ainda assim, a tímida menção na literatura à gravação do Concerto de Nielsen pelo jazzista Benny Goodman demonstra que a interpretação não pode ser definida somente como expressão de sentimentos, já que incorpora aspectos como a estética, a filosofia e a história (LABOISSIÈRE, 2007, p.187). A questão implícita nesse caso é que ao intérprete (e ao público) informado, a coerência dessas escolhas está ligada, entre outros aspectos, à sua relação com as evidências conhecidas sobre a obra e seu contexto, e ao uso que se faz delas.

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    FRAGA, V. S. O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen... Per Musi, Belo Horizonte, n.27, 2013, p.200-217

    Recebido em: 19/03/2012- Aprovado em: 18/06/2012

    O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen: contexto, anlises e interpretaes

    Vinicius de Sousa Fraga (UFBA, Salvador, BA)[email protected]

    Resumo: Composto em 1928, o Concerto para Clarineta, Op.57, de Carl Nielsen (1865-1931) tornou-se uma obra fundamental na literatura da clarineta no sculo XX. A presente pesquisa procura discutir algumas de suas questes de performance atravs de uma contextualizao da poca em que foi escrito, com nfase nos aspectos relevantes sobre o compositor e a produo da obra. So observadas as divergncias entre a edio da Samfundet e os originais manuscritos. Por meio de uma anlise da obra, busca-se discutir sua recepo inicial e seu papel na literatura da clarineta.

    Palavras-chave: Carl Nielsen; concerto para clarineta; anlise e interpretao musical.

    Carl Nielsens Clarinet Concerto, Op.57: context, analysis and performance

    Abstract: Composed in 1928, Carl Nielsens Clarinet Concerto, Op.57 became a fundamental work in the twentieth-century clarinet literature. This study discusses some of the works performance aspects by means of examining its context related to its composer and compositional procedures. The discrepancies between the Sanfundet edition and the composers manuscripts are observed. Analysis aspects of the work support the discussion about its initial reception and its role in the clarinet literature.

    Keywords: Carl Nielsen; clarinet concerto; music analysis and interpretation.

    PER MUSI Revista Acadmica de Msica n.27, 236 p., jan. - jun., 2013

    1 IntroduoComposto em 1928, o Concerto para Clarineta, Op.57, de Carl Nielsen (1865-1931) foi dedicado ao clarinetista dinamarqus Aage Oxenvad como parte da promessa de composio de um concerto para cada membro do quinteto de sopros do qual Oxenvad fazia parte. Gradativamente, o Concerto tornou-se uma obra importante na literatura da clarineta no sculo XX, sendo executado em concursos e concertos, alm de amplamente gravado por instrumentistas do mundo todo.

    Com frequncia, a linguagem do compositor associada textura densa e complexidade estrutural dessa obra suscitam questes inerentes sua performance que permitem mltiplas abordagens interpretativas. As

    gravaes pesquisadas demonstram que esse carter subjetivo da performance permite certo grau de flexibilidade da interpretao como um ato de reconstruo que justape o mundo do compositor e do intrprete (NATTIEZ, 1993, p.144). Ainda assim, a tmida meno na literatura gravao do Concerto de Nielsen pelo jazzista Benny Goodman demonstra que a interpretao no pode ser definida somente como expresso de sentimentos, j que incorpora aspectos como a esttica, a filosofia e a histria (LABOISSIRE, 2007, p.187). A questo implcita nesse caso que ao intrprete (e ao pblico) informado, a coerncia dessas escolhas est ligada, entre outros aspectos, sua relao com as evidncias conhecidas sobre a obra e seu contexto, e ao uso que se faz delas.

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    A presente pesquisa procura discutir algumas dessas questes atravs de uma reviso na literatura especfica sobre o Concerto para Clarineta, Op.57, de Carl Nielsen. Inicialmente, buscou-se explorar a contextualizao poca do Concerto, com nfase nos aspectos relevantes sobre o compositor e a produo da obra. Em seguida, assinalam-se algumas das divergncias encontradas na literatura que compara a edio impressa da Samfundet conhecida e os originais manuscritos. Passando por uma abordagem analtica da obra, a pesquisa busca discutir ainda aspectos interpretativos do Concerto, com nfase na sua recepo inicial e o que representou desde ento at nossos dias.

    2 - Contextualizao histricaDe origem camponesa, o dinamarqus Carl Nielsen aprendeu a tocar violino, piano e trompete desde cedo. Nascido em Sortelung em 9 de janeiro de 1865, Nielsen tornou-se o principal compositor de seu pas e um dos principais sinfonistas do sculo XX (BURROWS & WIFFEN, 2007, p.312). Defensor do folclore e do nacionalismo musical, ele no demonstrou interesse pela escola de Schoenberg (BUTLER, 2004, p.77), podendo ser considerado um dos primeiros a transformar os complexos harmnicos verticais de Strauss e Reger na polifonia linear moderna (Jacobsen citado por NELSON, 1987, p.40). Esse aspecto, realado pela sua predileo por obras contrapontsticas de compositores como Palestrina, Bach e Mozart, associado aparente constituio rstica e primitiva de sua msica so suas caractersticas marcantes (NELSON, 1987, p.32-30). Niels KRABBE argumenta ainda como a imagem do compositor harmonioso que a tradio evoca demonstra ser apenas a aparncia externa da sua personalidade, e que a vida pessoal de Nielsen, suas dvidas e receios, alm da frustrao com a recepo com muitas de suas obras o aproximam mais do homem que do mito (KRABBE, 2012).

    Sua obra para clarineta no extensa, e inclui uma curta Fantasia para clarineta e piano de 1891, e sobretudo msica de cmara, como a Serenata in Vano de 1914 e o famoso Quinteto de Sopros de 1922. As poucas obras escritas para o instrumento somado aos fatores conhecidos sobre a contextualizao do Concerto para Clarineta indicam que, como muitos compositores, a sua contribuio provavelmente no teria se dado sem a participao de um intrprete que o influenciasse. Essa relao compositor-intrprete no s comum na literatura da clarineta como tornou possvel obras importantes para o seu repertrio. Exemplo disso a colaborao entre Mozart e Anton Stadler, Spohr e Hermstedt, Weber e Baerman, Brahms e Mhlfeld, citando ainda Boulez e Damiens (ARAJO, 2006, p.3). No caso do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen, essa colaborao foi com um intrprete em particular, Aage Oxenvad (WESTON, 1982, p.190). O clarinetista atuou conjuntamente com Nielsen durante a sua composio, e h vrias referncias que sugerem certa similaridade entre o carter do Concerto e a personalidade de Oxenvad (NELSON, 2012a; GIACONA, 2009; MONROE,

    2008; PETERSEN, 2002; BRYANT, 2001, p.207; BINGHAM, 1990; NELSON, 1987).Amigo pessoal de Carl Nielsen e de origem camponesa tal qual o compositor, Oxenvad foi um amante da vida no campo e optou por viver numa pequena casa na periferia de Copenhagen. Ele era tido como um homem de humor instvel; considerado um homem de carter forte e cuja personalidade era uma mistura enigmtica de ternura e agresso (BRYANT, 2001, p.207), e ainda um clarinetista nico e temperamental (PETERSEN, 2002, p.xxxvi). Ele prprio julgava-se como um rabugento terrvel quando contrariado, alm de considerar que a clarineta era um instrumento somente para homens (NELSON, 2012b). Sobretudo, ele mostrava-se ctico em relao performance da clarineta que era feita fora da Dinamarca, e um de seus alunos lembra que, quando da vinda de Louis Cahuzac a Copenhagen, Oxenvad teria incentivado seus pupilos a v-lo, mas no muito de perto (NELSON, 1987, p.31).

    Apesar da personalidade controversa, Oxenvad demonstrava um conhecimento dinmico e amplo do processo de performance. Muito provavelmente ele tocava com embocadura dupla1 e fazia as prprias palhetas, atividade que ensinava aos seus alunos (NELSON, 1979b). Alm disso, pode ter sido o primeiro a utilizar o sistema Boehm na orquestra em que tocava e, ao que tudo indica, na Dinamarca (NELSON, 1979b). Ele estudou no Royal Conservatory de 1903 a 1905 com Carl Skjerne, ele prprio um discpulo de Richard Mhlfeld, e ocupou a vaga de primeiro clarinetista da Royal Chapel Orchestra de 1919 at 1944, embora j fosse integrante dela desde 1909 (NELSON, 1987, p.31). No obstante, firmou-se como uma referncia na clarineta em seu tempo, sendo convidado a participar do Concertgebouw em Amsterd (convite que no aceitou), e da premire dinamarquesa da verso em trio da Histria do Soldado de Igor Stravinsky, com o compositor ao piano (NELSON, 1987, p.31).

    De fato, como clarinetista, Aage Oxenvad era tido em alta conta por Carl Nielsen. Em uma carta de recomendao em fevereiro de 1921, o compositor afirmava que no s seu talento e habilidade como instrumentista eram excepcionais, como sua fora criativa e conhecimento terico eram incomuns (PETERSEN, 2002, p.xxxvii). Oxenvad demonstrava que a considerao que tinha de Nielsen era recproca, nutrindo um sentimento de adorao pelo compositor. Segundo suas prprias palavras, Nielsen era o grande compositor da Dinamarca (NELSON, 2012b).

    Em 1922, Nielsen comps o seu Quinteto, Op.43, para o grupo do qual Oxenvad fazia parte, motivado inicialmente por t-los ouvido ensaiar a Sinfonia Concertante de Mozart (FELUMG, 2012). A promessa de composio de um concerto para cada integrante do grupo no se realizou de imediato, e somente foi concretizada em partes; em 1926 ele escreveria o Concerto para Flauta e em 1928, o Concerto para Clarineta, Op.57, uma velha promessa a

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    Oxenvad segundo o compositor em entrevista datada de janeiro do mesmo ano (PETERSEN, 2002, p.xxxviii).As mensagens trocadas entre compositor e intrprete demonstram que eles discutiam regularmente os detalhes da obra durante a sua composio. Em meados de junho de 1928, Nielsen pedia a Oxenvad que viesse almoar com ele e trouxesse o instrumento porque ele estava quase acabando e queria ver algumas coisas sobre o staccato outra vez (PETERSEN, 2002, p.xxxix), numa referncia provvel longa passagem em staccato dos c.189 a c.195. Nos manuscritos enviados a Oxenvad h um comentrio do compositor referente a uma longa passagem em legatto dos c.688 a c.6962, onde ele perguntava como o clarinetista poderia gerenciar a questo da respirao. A resposta tranquilizadora de Oxenvad escrita logo abaixo pede para que ele no se preocupasse que ele daria um jeito, ao que o compositor torna a responder agradecendo (NELSON, 2012b; PETERSON, 2002, p.xl). Ainda segundo Oxenvad com relao ao Concerto, Op.57, ele teria recebido os manuscritos medida que iam ficando prontos, com observaes amigveis do compositor entre as notas (OXENVAD, 1928).

    Por volta de agosto de 1928 quando a pea estava terminada, Nielsen escreveu a Carl Johan Michaelsen dizendo-se ansioso para ouvir o que Oxenvad faria dela, e que se ele no pudesse faz-lo, ningum poderia (PETERSEN, 2002, xli). O Concerto foi estreado em 14 de setembro desse mesmo ano numa audio privada na casa de Carl Johan Michaelsen, em Hjtofte, tendo como solista Oxenvad e a direo de Emil Telmnyi. Os msicos da orquestra eram todos integrantes da Royal Orchestra, trazidos de nibus de Copenhagen (SCHOUSBOE, 1983, p.301). A primeira performance pblica foi dada no ms seguinte, no dia 11 de outubro, novamente com Oxenvad, Temnyi e a Royal Orchestra; uma segunda foi feita em 10 de dezembro do mesmo ano, desta vez com o compositor como regente (PETERSEN, 2002, p.xliii). Na ocasio, ele demonstrou maior satisfao com a interpretao de Oxenvad e julgou que o pblico teria entendido melhor a performance e a obra. A obra foi executada por seis vezes durante a vida de Nielsen, sedo que ele conduziria o Concerto Op.57 pela ltima vez em 26 de outubro de 1929.

    Com a sade debilitada desde 1926, quando sofreu o primeiro de uma srie de ataques cardacos (MONROE, 2004, p.ii), Nielsen veio a falecer em 1931, sendo o

    Concerto para Clarineta sua ltima obra de grande porte (BRYANT, 2001, p.207; NELSON, 1979a, p.47). O clarinetista para quem a obra foi composta faleceu em 1944, treze anos aps a morte do compositor. E embora ele tenha sido um profissional bem sucedido com uma influncia no ensino e na performance da clarineta na Dinamarca, sua trajetria ficaria marcada principalmente pela sua relao com o Concerto Op.57 de Nielsen. Por ocasio da morte de Aage Oxenvad, o obosta Svend Christian Felumb, integrante do quinteto do qual ambos faziam parte, teria escrito que o Concerto Op.57 no era uma obra para clarineta, mas sim para Oxenvad. Ele afirmava que o compositor havia sido profundamente inspirado pela sua maneira peculiar de expresso na clarineta, e que provavelmente ele nunca teria escrito essa obra sem ter ouvido Oxenvad tocar (NELSON, 2012a).

    3 - Comparando as edies e os manuscritos originaisNo vero de 1931, Nielsen havia assinado um contrato com a Samfundet til Udgivelse of Dansk Musik para editar e publicar o Concerto, mas no chegou a v-lo pronto (PETERSEN, 2002, p.xliv). A morte prematura do compositor acontece em meio ao trabalho de preparao da verso final, deixando questes em aberto na leitura dos manuscritos da grade orquestral e da reduo para piano, como demonstram a correspondncia entre os editores (PETERSEN, 2002, p.xlvi). Assim, embora essa edio seja a referncia provvel para boa parte dos instrumentistas que estudam o Concerto, Op.57, quando confrontada com os manuscritos originais preservados, possvel perceber algumas divergncias entre as suas notaes.

    Em um artigo publicado na revista The Clarinet, o clarinetista Eric Nelson chegou essa concluso ao analisar comparativamente os manuscritos originais e a verso impressa (NELSON, 1987). NELSON partiu de trs fontes principais: a grade orquestral mais antiga (chamada por ele de MS I), a parte solo de Oxenvad, com suas anotaes pessoais (MS II) e uma verso final da partitura preparada para a sua publicao (MS III). Ele constatou, por exemplo, que no c.528, diferente da edio impressa, encontra-se nas verses manuscritas uma fermata na primeira das notas Sib em sequncia quase no fim da linha (Ex1). A fermata seguida por

    Ex.1 - Fermata e cesura na cadncia do c.528 tal como consta nos originais manuscritos do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen.

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    uma cesura, para ento dar a continuidade em agitato. Nenhuma dessas indicaes (incluindo a fermata) consta na edio da Samfundet.

    Outras fontes parecem confirmar a incluso da fermata e da cesura nesse ponto; a nova edio do Concerto de Nielsen realizada em 2002 pela Wilhelm Hansen3 traz essa alterao, exatamente como demonstrada no Ex1. De acordo com PETERSEN (2002, p.xlvi), ela justifica-se por ser feita de prprio punho pelo compositor na cpia do manuscrito original do acompanhamento pelo piano, considerado fidedigno por ser revisado por Nielsen.

    Logo em seguida, em outra passagem controversa no c.531, a comparao entre manuscritos originais e verso impressa pode causar confuso sobre quais seriam as notas realmente desejadas pelo compositor. De acordo com NELSON (1987, p.30), na quinta sequncia de fusas desse compasso, as notas grafadas como Lb e Fb na partitura editada seria um erro evidente de impresso. Ambas as notas seriam na verdade Sol# e Mi, respectivamente, alterando a prxima sequncia para L natural, conforme demonstrado nos Ex2.a e Ex2.b.

    Entretanto, os trabalhos para a edio da Wilhelm Hansen disponveis no prefcio da obra (PETERSEN, 2002, p.xvii) indicam que, apesar dessas alteraes realmente constarem tal como grafado no Ex2.b tanto na parte solo manuscrita de Oxenvad quanto na de Emil Telmnyi4, elas no so transferidas para a cpia revisada pelo compositor. Telmnyi, entretanto, no era uma referncia adequada como se ver a seguir. Quanto ao c.531, Elly PETERSEN argumenta pela manuteno das notas Lb e Fb (Ex2.a), uma vez que Nielsen era tido como cuidadoso ao indicar alteraes (PETERSEN, 2002, p.xvii).

    Mesmo uma anlise fraseolgica no chega a sugerir um argumento claro para essa mudana; a sequncia ascendente inicia ainda no compasso anterior com [D-R-Sol-Lb], [F-Sol-D-R], [Sib-D-F-Lb] e [Fb-Lb-D-Mi]. Em cada sequncia dessas, se considerarmos que as duas primeiras notas iniciam um movimento

    meldico ascendente, mas que so as duas ltimas que estabelecem uma relao de tenso crescente por aumento intervalar (meio tom na primeira, Sol-Lb, um tom na segunda, D-R, e assim por diante), ainda assim no seria possvel determinar qual das verses (Ex2.a ou Ex2.b) seria a correta. Segundo o editor da Wilhelm Hansen, o mais provvel que os copistas de ambas as cpias tenham se esquecido da alterao nas partes manuscritas (PETERSEN, 2002, p.xlvii).

    A pouca quantidade de rascunhos que Nielsen deixou indica que ele trabalhava as ideias relativas s obras que compunha no momento da composio, no sendo costume manter ideias anotadas para futuros projetos. De fato, esse parece ser um padro do seu processo composicional (PETERSEN, 2005, p.197). Dessa maneira, parece razovel supor que as obras podiam sofrer considerveis alteraes por motivos mais variados possveis; seja por um pedido do intrprete, uma primeira apresentao pouco convincente, e assim por diante. sabido, contudo, que embora seus esboos contenham poucas informaes sobre articulaes e dinmicas, eles so bastante consistentes no que diz respeito sua publicao posterior em relao notao grafada e ao ritmo (PETERSEN, 2005, p.197). Isso pode indicar que a opo de manter a notao tal qual o Ex2.a a mais adequada por basear-se nesses esboos feitos para a impresso da obra. Alm disso, esse fato pode indicar que algumas questes eram deixadas em aberto para discusses com os intrpretes, mas que outras eram imprescindveis em sua opinio, ou ao menos se no constitussem um problema performance.

    Esse parece ser o caso desse exemplo em particular, em que a comparao dos manuscritos possibilita entender como Nielsen e Oxenvad pensaram e solucionaram certas passagens. No c.192, pgina 4, linha 9 da edio da Sanfundet, h uma pausa durante a sequncia de staccatos. Nas verses manuscritas pesquisadas, a indicao inicial parece ser a de uma linha contnua de staccatos, conforme indicado no manuscrito da parte solo de Oxenvad, Ex3.a.

    Ex.2 Enarmonia verificada na comparao entre verso editada da Samfundet, na qual a ltima sequncia Lb (a) e originais manuscritos (b), onde seria L natural, no c.531 do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen.

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    Entretanto, ao que tudo indica, Oxenvad teria sugerido ao compositor uma pausa pequena para respirao nesse trecho (PETERSEN, 2002, p.xlvi). Essa pausa aparece como correo na grade orquestral manuscrita (Ex3.b), bem como na verso editada da Samfundet (Ex3.c) e na nova edio da Wilhelm Hansen (PETERSEN & PETERSEN, 2002, p. 206). A longa passagem em staccato constitui-se ainda hoje num dos principais problemas tcnicos a ser resolvidos pelo intrprete da obra. A grafia anterior de uma linha ininterrupta por seis compassos sugere de fato que a dificuldade do trecho seria ainda maior, fator que Oxenvad deve ter sublinhado ao compositor.

    Na edio da Wilhelm Hansen, possvel constatar ainda diversas alteraes nas indicaes tanto da parte solo da clarineta quanto da orquestra em relao edio da Samfundet. De uma forma geral, elas divergem no tocante ao incio e trmino de algumas ligaduras e forma de ataque de algumas notas. Sobretudo, h uma mudana significativa nos ltimos compassos da parte solista, no trecho em decrescendo a partir do c.724 (Ex4).

    Observa-se que na parte solista editada pela Samfundet, h duas indicaes de crescendo e decrescendo (< >) dentro do mbito do diminuendo geral (Ex4.a). Essas indicaes, no entanto, no aparecem na nova edio da Wilhelm Hansen (Ex4.b), que toma como base para resolver eventuais duplicidades os manuscritos revisados pelo compositor (PETERSEN, 2002, p.xvi). As fontes utilizadas pelos editores da Wilhem Hansen constituem-se, sobretudo, de manuscritos originais autografados pelo compositor, que incluem um esquema contendo os principais temas da clarineta com uma reduo orquestral em dois pentagramas, projetos nos quais as cpias para impresso se baseariam, a prpria edio da Samfundet til Udgivelse af Dansk Musik, alm de outras cpias que estavam em posse de Oxenvad e foram doadas por ele Royal Library (PETERSEN, 2002, p.254-256).

    Conforme informao disponvel no prefcio da obra, os critrios adotados na edio foram de remover as adies feitas por amigos e colegas, salvo excees comentadas no prefcio (PETERSEN, 2002, p.viii). H indicaes que Emil

    Ex.3 Diferentes grafias no c.192 nos trechos em staccato constantes nos manuscritos originais de Oxenvad (a), na grade orquestral (b) e na edio Sanfundet (c), do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen.

    Ex.4 - Compassos finais das edies Samfundet (a) e Wilhelm Hansen (b) do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen, com as diferentes indicaes de dinmica em cada uma.

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    Telmnyi teria sugerido modificaes no Concerto Op.57 que foram aceitas por Nielsen, como a troca do acorde que as trompas executavam dos c.546 a c.551 para que fizessem a mesma melodia dos fagotes (PETERSEN, 2005, p.198). Entretanto, ele tambm teria, aparentemente por sua conta, suprimido a parte do baixo da orquestrao logo aps a sua premire (PETERSEN, 2002, p.314), no que KRABBE chamou de um dos muitos relatos na tradio de Nielsen de maestros atendendo o chamado de melhorar sua partitura (KRABBE, 2003, p.103). Como os originais manuscritos do Concerto que estavam em sua posse esto repletos de alteraes que fez de prprio punho (PETERSEN, 2002, p.314-315), e uma vez que no se sabe o que seria aprovado por Nielsen e o que no, a deciso de retirar seus acrscimos parece coerente nesse caso.

    No entanto, embora esses e outros critrios sejam discutidos previamente no prefcio da obra, que inclui algumas pginas dos manuscritos citados, uma das decises controversas no indicar graficamente na partitura quais foram as adies editoriais. As indicaes presentes a esse respeito so confusas, com fontes pequenas e uma quantidade de detalhes que, sem a visualizao do compasso em questo, dificultam o acesso a essas informaes. Segundo os editores, articulaes, dinmicas, hastes e ligaduras foram normalizadas com base em analogias entre passagens semelhantes (PETERSEN, 2002, p.viii). Essas alteraes no indicadas, entretanto, podem induzir o leitor a pensar

    que o documento corresponde sob todos os aspectos ao revisado por Nielsen. Aos intrpretes interessados na escrita original do compositor e cujos manuscritos originais so inacessveis, esse cuidado fundamental na tomada de decises e escolhas interpretativas.

    4 - Anlise e interpretaoA orquestrao requerida para o Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen parece modesta se comparada s grandes massas orquestrais de seus contemporneos. Escrito para clarineta em L como solista, a instrumentao inclui alm das cordas (violinos, violas, violoncelos e contrabaixo), somente dois fagotes, duas trompas e a caixa clara. Em sua correspondncia, Nielsen deixa claro que tanto a clarineta solista quanto as partes orquestrais foram tratados da forma mais individual possvel, e que seus objetivos eram a clareza e o rigor (PETERSEN, 2002, p.xli), numa narrativa extensa e ininterrupta.

    Contudo, mesmo sendo executado continuamente e sem pausas, o Concerto normalmente considerado em quatro movimentos distintos na literatura pesquisada (GIACONA, 2009; MONROE, 2008; ROSENBERG, 1966; MAEGARD, 1956; MEYER, 1947), seguindo de uma maneira geral a meno que o prprio Nielsen faz a essa diviso em suas cartas (PETERSEN, 2002, p.xxxviii). Essas sees so normalmente nomeadas como 1 Movimento, indo do comeo do Concerto at o c.218 (Ex5.1) e englobando

    Ex.5 - Diviso formal do Concerto, Op.57 de Carl Nielsen, numerados como 1 (c.1-218), 2 (c.219-313), 3 (c.314-546) e 4 (c.547 ao fim).

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    os andamentos Allegretto un poco, Allegro non tropo, Pi Allegro e Tempo I; 2 Movimento, Poco Adagio, do c.219 at c.313 (Ex5.2); 3 Movimento, do c.314 a c.546 (Ex5.3), que inclui o Allegro non tropo, Poco pi mosso e Adagio; e 4 Movimento, do c.547 at o fim (Ex5.4), cujos andamentos so Allegro Vivace, Poco adagio e Allegro.

    Ainda assim, essa diviso no unnime ou ainda desnecessria na viso de intrpretes como o clarinetista Kjell-Inge Stevensson. Para ele, a obra mais uma questo de humores e alternncias, sem a necessidade de uma diviso em sees distintas (Stevensson citado por NELSON, 1979a, p.76).

    De fato, a relao intrnseca entre esses movimentos devido recorrncia do material temtico e suas transformaes durante a obra contribuem para a unidade da pea, ainda que essas transformaes por vezes criem ambientes sonoros absolutamente contrastantes. O prprio Nielsen comentou seu entusiasmo nessa obra pela quantidade de coisas expressas a partir de um tema quase infantil, ainda que no soubesse dizer se isso seria uma coisa boa ou no (PETERSEN, 2002, p.xxxvi). Alguns acham que no.

    Em seu livro The Clarinet and the Clarinet Playing, David PINO (PINO, 1980) salienta essa prolixidade como um dos principais problemas da obra. De acordo com o autor, h elementos temticos suficientes para muitos concertos, mas eles no so desenvolvidos de uma forma significativamente satisfatria (PINO, 1980, p.264). Alm disso, o Concerto se moveria de ideia em ideia sem cuidado ou conexo, e com quase total ausncia de recapitulao ou desenvolvimento (PINO, 1980, p.264). No entanto, aparentemente o autor tenta incluir o Concerto, Op.57 numa viso formal pouco adequada, e cujas condies a estrutura da pea no satisfaz, o que pode ter sido determinante no enfoque do seu comentrio. Uma observao atenta demonstra que as transformaes rtmicas e meldicas do tema principal so a base para o agrupamento das ideias do Concerto em torno de sees ou trechos.

    Esse tema principal ouvido j nos primeiros compassos (conforme demonstrado nos Ex6.1 e Ex6.2), uma quinta justa que soa como uma dana tradicional camponesa, no formato longa-curta-longa (Ex6.2), ou bate-chuta-bate [o p] 5. Esse tema inicial do Concerto incorpora o elemento de unificao da narrativa, com um carter mais movido e agitado na sua forma ascendente, mais reflexivo quando aparece invertido, conforme Ex6.3 (MONROE, 2008, pp.20-21). Alm disso, o mesmo motivo usado por vezes no contraponto da orquestra em relao ao solista (Ex6.5).

    O segundo tema aparece no c.79, com uma figurao geralmente descendente e claramente mais lrico que o anterior. Esse contraste com o primeiro tema reforado com a indicao de que a passagem seja tocada de forma mais tranquila e em dinmica piano espressivo. Nesse ponto, o acompanhamento orquestral feito inicialmente pelos fagotes, que se movem mais lentamente (em semnimas) com intervalos de teras e quintas entre eles. Do c.109 em diante, h uma tenso crescente tanto na orquestrao quanto na parte solista, construda com uma troca de passagens curtas marcadas pela rapidez e uma estridncia cada vez maior entre ambos. Essa tenso conduz a obra at a primeira grande cadncia da clarineta no c.133, que apresenta uma srie de variaes dos principais motivos meldicos e rtmicos usados at ento no Concerto, Op.57.

    Pouco depois do fim dessa cadncia, h uma reexposio clara no c.150 (ou n.8 na partitura) em que o primeiro tema ouvido integralmente, embora no haja qualquer meno ao segundo. Em seu lugar, Nielsen inicia o que GRIMLEY chama de um cuidadoso processo controlado de colapso composicional (GRIMLEY, 2003, p.34), em que a clarineta repete de forma incisiva o primeiro tema e a orquestra executa uma progresso em semicolcheias por ciclos de quintas que impe um carter cada vez mais movido e intenso, com eventuais trocas de material rtmico e meldico entre solista e orquestra, e que segue praticamente at o incio do segundo movimento, Poco Adagio, no c.210.

    Ex.6 - Excertos demonstrando a recorrncia temtica do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen.

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    Esse movimento foi esquematizado pela clarinetista Ann Marie BINGHAM (BINGHAM, 1990), tal qual como demonstra o Ex7. O esquema faz parte de uma proposta analtica da autora sobre cada um dos movimentos (Bingham citado por GIACONA, 2009, p.12), partindo inicialmente da diviso formal da obra proposta por ROSENBERG (1966).

    Alm de algumas das caractersticas salientadas anteriormente, o esquema de BINGHAM chama a ateno por ressaltar ainda outros aspectos considerados importantes pela autora, como por exemplo, a delimitao da estrutura da pea com base no aparecimento de temas e seus desenvolvimentos, quando considerou o caso. possvel notar a nfase dada pela autora na forma de exposio, desenvolvimento e recapitulao, seguida de uma coda que encerra o movimento, tal qual uma forma sonata.

    Sobretudo, so ressaltados os centros tonais da obra, com uma predominncia das tonalidades de F e Mi maior, cadenciadas pela presena dos acordes de D e, menos frequentemente, Si maior, respectivamente suas dominantes. Passagens modulatrias (Ex7, c.27) e duas atonais (Ex7, c.68 e c.189) so destacadas no esquema. De acordo com a autora, esses dois acordes, D e Si maior, dominariam a exposio do tema no segundo movimento, formado por trs sees internas distintas, no que chamou de forma A-B-A. A sua anlise nos outros dois movimentos d continuidade ao conflito tonal entre F e Mi. No terceiro (em 3/8 a partir do c.305), definido como uma seo intermediria entre o formato ternrio proposto no segundo movimento e a forma rond encontrada no quarto (Bingham citada por GIACONA, 2009, p.14), elas aparecem alternadamente na sucesso de temas, cadenciando em Mi maior aps a cadenza final da clarineta no movimento; no quarto e ltimo movimento, Mi e Si maior aparecem eventualmente, mas o esquema sublinha o trmino do movimento em F maior.

    Ann Marie Bingham no nica a destacar o papel desse conflito tonal no Concerto, Op.57 de Nielsen. Abordagens semelhantes so encontradas na literatura especfica (GIACONA, 2009; MONROE, 2008; SIMPSON, 1986; NELSON,1979a), demonstrando um vis analtico que tende a caracterizar a obra, embora no exclusivamente, por essa ambiguidade tonal.

    Assim, aspectos como o conflito tonal entre F e Mi maior foram sublinhados pela anlise de NELSON (1979a, p.71), mas tambm a manipulao meldica na obra, as passagens politonais (c.210 a c.213, por exemplo) e em escalas de tons inteiros (c.64 na parte da clarineta), bem como passagens atonais, como na cadncia solo da clarineta em staccato do c.189 ao 196, ainda que com uma leitura mais pessoal do termo por parte do compositor (NELSON, 1979a, p.71). Ainda mais longe projeta MONROE (2008), que prope uma anlise atravs de significados extras musicais do Concerto, Op.57, e para quem as transformaes do tema inicial atravs da obra so um reflexo de raiva, terror e loucura (MONROE, 2008, p.23). O autor traa um paralelo entre a obra de Nielsen com a teoria da doutora Elizabeth Kbler-Ross sobre a aceitao da morte iminente atravs dos estgios de negao, raiva, barganha, depresso e aceitao. Para ele, possvel identificar na obra reflexos desses estgios, que so por sua vez fruto da sade cada vez mais debilitada de Nielsen poca da composio do Concerto. Mas as evidncias que fornecem so insuficientes para apoiar suas concluses. Por exemplo, ele assume sem maiores explicaes que as variaes rtmicas do tema so um sinal ao ouvinte que algo no est bem (MONROE, 2008, p.16). E em alguns aspectos, seu trabalho soa como um ajuste dos fatos teoria.

    Com efeito, sabido que atribuir ideias extramusicais ao discurso musical uma associao delicada, uma vez que o significado uma construo que envolve o que o ouvinte conhece a respeito, varia com o contexto e muitas vezes depende de interpretao subjetiva (BURKHOLDER, 2006, p.102). Onde o autor v raiva ou desespero, qualquer outro ouvinte poderia ver somente um carter marcial, ou mesmo cmico. Se mesmo noes bsicas de consonncia e dissonncia podem gerar significaes mltiplas, quando no contraditrias (Butler citado por GREEN & BUTLER, 2006, p.265), buscar atravs da anlise da estrutura da obra motivaes que a ultrapassem pode ser extremamente difcil, quando no impossvel.

    Sobretudo, o problema de anlises com uma nfase nessa dicotomia tonal do Concerto, Op.57 de Nielsen que a tentativa de enquadramento da estrutura da obra em modelos formais convencionais tende a sublinhar excessivamente aspectos particulares e por vezes de

    Ex.7 - Anlise do 1 Movimento do Concerto, Op.57 de Carl Nielsen por Ann Marie Bingham.

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    menor importncia. Em sua anlise da 4 Sinfonia, Op.29 do compositor, WHITE salienta que a ocorrncia tonal em Nielsen possui no geral uma inteno mais ampla, independente da evidncia aural local que possua (WHITE, 1991, p.xxii). Assim, no Concerto para Clarineta, o significado estrutural atribudo ao conflito tonal entre F e Mi maior comprometido pela forma redundante que os centros tonais diatnicos so considerados na sintaxe harmnica do compositor, tornando difcil discernir detalhes de expresso musical locais com eventos estruturais de importncia em maior escala (GRIMLEY, 2003, p. 31).

    Do ponto de vista da performance, o reflexo mais ntido a negligncia de uma srie de eventos no descritos em detrimento de uma polarizao tonal do Concerto. A qualquer intrprete que j estudou a obra, o esquema tonal citado anteriormente por BINGHAM soa claramente insuficiente para dar conta do fraseado cromaticamente alterado ou da complexa relao construda entre solista e orquestra.

    possvel verificar, por exemplo, que na primeira grande cadncia da clarineta no c.133, que como j referido inclui variaes meldicas e rtmicas dos temas recorrentes apresentados no Concerto, o compositor mantm a mesma figurao rtmica durante passagens inteiras em que os padres intervalares so sucessivamente alterados, criando contrastes e direcionando a frase. Por exemplo, na linha descendente do trecho indicado no Ex8.1, o padro de trs notas repetido e intensificado cada vez mais at o reaparecimento do tema inicial do Concerto de duas formas. Uma pela aproximao das duas primeiras notas de cada grupo, que nas cinco primeiras sequncias constituem intervalos de quarta e quinta, e posteriormente ser de tera. A outra delas pelo afastamento intervalar da ltima nota de cada conjunto da primeira (e da segunda, por extenso). Esse afastamento, combinado com o direcionamento para o registro grave do instrumento constri uma tenso que atinge seu ponto mximo quando o tema inicial ouvido a plenos pulmes com a indicao de marcato e ambas as notas acentuadas (Ex8.1).

    Ex.8 - Excertos da cadncia da clarineta no c.133 do Concerto, Op.57 de Carl Nielsen, demonstrando a variao do padro intervalar na construo das frases.

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    Outro dos recursos utilizados a manuteno de uma nota pedal que constantemente reiterada pela clarineta, enquanto as notas superiores, que guardam uma relao de sexta entre si (conforme demonstrado no Ex8.2), tensionam variando a distncia entre elas e esse pedal. Essa variao intervalar utilizada tambm na construo de motivos rtmicos um pouco maiores, como os constitudos de dois segmentos (Ex8.a e b, respectivamente) que se completam e que aparecem por trs vezes em sequncia (Ex8.3). Observa-se aqui que o segmento indicado pela terceira chave (indicada como a) uma transposio exata um semitom abaixo dos dois primeiros. Alm disso, enquanto o segundo segmento (indicado por b) aparece com distncias intervalares diferenciadas no primeiro, segundo e terceiro quadro assinalado.

    Esses procedimentos utilizados por Nielsen constroem de forma cuidadosa o aspecto catico de algumas das passagens de maior tenso entre a clarineta solista e a orquestra. De acordo com a anlise de GRIMLEY (2003), um dos recursos contrapontsticos do compositor constituiu-se de uma progresso linear atravs de um fragmento meldico de doze notas. Baseando-se inicialmente numa progresso harmnica em quintas (Sib-F-D-Sol, respectivamente) do c.158 a c.1656, Nielsen inicia uma sequncia com um contraponto

    rigoroso utilizando o mesmo motivo meldico (no Ex.9 so sublinhadas as suas duas primeiras aparies no contexto) e que passa a coincidir em intervalos de oitava (sempre na terceira nota do motivo descendente) e dcima (na ltima nota), num padro que o autor chamou de 8-10 (GRIMLEY, 2003, p.34), tal como demonstrado no Ex.9.

    Entretanto, a manuteno desse padro torna impossveis as consonncias de oitavas e dcimas e elas passam a ser aumentadas, como sublinhado no fim da primeira linha do Ex9. O efeito cumulativo dessa alterao leva o compositor a abandonar as consonncias e utilizar intervalos de nonas menores e stimas maiores, ou padro 9-7, como chamado por GRIMLEY (2003, p.34). Alm disso, a clula meldica diminuda de doze para oito notas (Ex10.a) e depois seis (Ex10.b), levando a uma antecipao cada vez maior no incio de cada uma delas.Toda essa seo inicia com a indicao de poco a poco accelerando, e os cromatismos e a tenso resultantes direcionam para o c.173, marcado para ser ainda mais movido com a indicao de pi allegro. Nesse ponto, a mesma clula meldica utilizada anteriormente passa a ser executada pela clarineta solista enquanto o tema inicial do Concerto lembrado esporadicamente pelos outros instrumentos. A orquestra retoma o cromatismo anterior acelerando ainda mais enquanto a clarineta sustenta uma nota no agudo em

    Ex.9 - Extrato da anlise de GRIMLEY (2003, p.35) dos c.163-169 do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen, demonstrando o padro contrapontstico utilizado pelo compositor no trecho.

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    trinado. A conjuno desses elementos leva diretamente cadncia em staccato que a clarineta executa dos c.189 a c.195, como demonstrado no Ex11. Nela possvel verificar procedimentos semelhantes, como a compresso meldica (Ex11.a), a recorrncia de padres transpostos (Ex11.b e c) e ainda a progresso por quintas (Ex11.d).

    A cadncia, que apresenta material meldico extrado da relao intervalar do tema principal (como demonstrado em Ex11.e), termina com uma escala ascendente (ltima linha do Ex11) em com a indicao de crescendo molto, cabendo orquestra e s intervenes da caixa clara a retomada de um andamento menos movido, necessria para o incio do segundo movimento, Poco Adagio, introduzido pelas trompas.

    Nesse sentido, importante salientar o papel que a caixa clara exerce no Concerto, Op.57. Geralmente utilizada como forma de pontuar as passagens solistas da clarineta e da orquestra, sua parte consiste em execues rtmicas intrincadas, passagens em ostinato ocasionais e uma vasta gama de dinmicas (GAUTHREAUX, 1989, p.108). As intervenes do instrumento foram analisadas por David DAVENPORT (1993.a; 1993.b), que sugeriu uma atuao irnica e humorstica da caixa como contraponto ao solista, especialmente nas passagens em que a clarineta comea a levar-se muito a srio (DAVENPORT, 1993.b, p.52-60). Entretanto, embora a afirmao do crtico musical R. Gregory sobre o Concerto de Nielsen tratar-se de um concerto duplo em funo da sua atuao

    Ex.10 - Extrato da anlise de Daniel GRIMLY (GRIMLY, 2005, p.35) dos c.170-172 do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen, demonstrando a compresso meldica e o padro intervalar dissonante.

    Ex.11 - Cadncia da clarineta em staccato dos c.189-195 do Concerto, Op.57 de Carl Nielsen, demonstrando a recorrncia temtica.

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    (Gregory citado por DAVENPORT, 1993.b, p.53) soe claramente infundada, a participao do instrumento de fato importante e muitos intrpretes optam por inclu-la quando da execuo do Concerto, Op.57 com piano. A razo dessa importncia est relacionada no sua execuo em particular, mas forma atravs da qual ela integra-se ao discurso da clarineta, dando-lhe maior dramaticidade e intensificando os contrastes entre as passagens mais intensas e complexas com os momentos de maior lirismo.

    Todos esses aspectos passam despercebidos a uma anlise cujo enfoque seja o conflito tonal entre F e Mi maior. Segundo GRIMLEY, os procedimentos utilizados no Concerto, Op.57 baseiam-se antes na conduo linear de intervalos que em princpios tonais (GRIMLEY, 2003, p.32). Esses recursos e a forma como o compositor constri a complexa relao entre solista e orquestra ajudam tambm a explicar sob uma nova perspectiva o atonalismo encontrado por BINGHAM (BINGHAM, 1990) e indicado no Ex7, bem como a expresso usada por NELSON sobre a leitura pessoal do termo pelo compositor (1979a, p.71). A esse respeito, as evidncias encontradas no parecem justificar a incluso do termo atonal ao Concerto, Op.57; mesmo uma anlise mais detalhada na obra de Nielsen parece no sugerir nada mais substancial que simetrias intervalares, transposies locais e funes de retrogradao (Petersen citado por GRIMLEY, 2003, p.32).

    Essas anlises sugerem que a clarineta solista integra-se ao conjunto numa narrativa que construda por meio de um tema inicial simples, mas que ganha contornos mais amplos medida que desenvolvida pelos procedimentos composicionais de Nielsen. Como ele prprio salientou, a inocncia do tema inicial era uma necessidade para contrastar com o que viria depois (Nielsen citado por PETERSEN, 2002, p.xxxviii). Esse contraste obtido por variaes de dinmicas combinadas com o rigor do contraponto, que somado ao aspecto rtmico que caracteriza o Concerto, Op.57 potencializa os pontos de maior tenso. Sobretudo, as transformaes meldicas por meio de variaes intervalares parecem ser uma das principais formas de unidade da obra. Nessas transformaes, h indcios que sugerem o carter folclrico, por vezes o caos e mesmo a comicidade por meio de um contorno meldico anguloso tanto nas partes da orquestra quanto na clarineta solista.

    A longa jornada desses quatro movimentos ininterruptos encontra uma resoluo pouco usual num final que trai o virtuosismo em funo de uma nota que ouvida longamente harmonizando-se com a orquestra (ver Ex4). Na literatura do instrumento, obras assim geralmente dividiram os intrpretes e o pblico, seja pelo entusiasmo e contraste em relao tradio de execuo, seja por escandalizar ou causar indiferena.

    5 - Interpretao e performanceDesde sua estreia em 1928, o Concerto de Nielsen dividiu opinies, demonstradas pela polarizao da crtica em publicaes dinamarquesas da poca. Hugo Seliman ressalta que a obra incorpora ao mesmo tempo tanto a natureza selvagem da clarineta quanto o seu lirismo (Seliman citado por PETERSEN, 2002, p.xlii); da mesma forma, Willliam Behrend enfatiza a lgica interna da obra atravs da insistncia das ideias pelo compositor (Behrend citado por PETERSEN, 2002, p.xliii). Mas so, sobretudo, as crticas desfavorveis que mais se sobressaem.

    Em uma longa crtica, o compositor suo Petersen-Berger considerou o tema do Concerto uma dana dinamarquesa prevaricante, cujo solo tocado por Oxenvad cacareja, grita, chora, lamenta e grune, razo pela qual Nielsen termina confessando-se um cacofonista (Berger citado por NELSON, 1979a, p.57). O jornal dinamarqus Ekstrabladet considerou que a obra era passageira, ou se aquela era a msica do futuro, seria de se esperar que as prximas geraes no se sentissem confortveis nas salas de concerto. Essa opinio partilhada por uma crtica no jornal Nationaltidende, acrescentando ainda que mesmo um ouvido acostumado modernidade sente dor ao ouvir o Concerto (PETERSEN, 2002, p.xlii). Some-se a isso o comentrio do maestro que regeu sua premire, Emil Telmny, considerando a obra msica para outro planeta (LAWSON, 1997, p.205).

    De fato, com uma linguagem inovadora e difcil, o Concerto iria requerer uma interpretao com grande apuro tcnico, e pode ter tido sua compreenso prejudicada por uma performance ainda pouco sedimentada, embora a obra tenha sido executada seis vezes durante a vida de Nielsen (PETERSEN, 2002, p.xliii). Ele estava ciente dessa dificuldade, e chegou a negar oportunidades de performance da obra por outros intrpretes, temendo uma leitura inconsistente e prematura (PETERSEN, 2002, p.xlv). Mesmo o clarinetista Aage Oxenvad afirmou que Nielsen devia realmente ser hbil no instrumento, j que teria escolhido sistematicamente as notas mais difceis de tocar (KETTING, 2010). Essa dificuldade parece ter sido determinante para que ele no se sentisse confortvel o suficiente para grav-lo, e nunca o fez (NELSON, 1979a, p.59).

    Entretanto, com o tempo as resistncias ao Concerto diminuram e ele passou a ser amplamente difundido. Em 1947, o clarinetista francs Louis CAHUZAC realizou a primeira gravao da obra com a orquestra de Copenhagen pela Columbia (em 78 rotaes). A gravao sem dvida um registro importante j que a orquestra contava ainda com muitos dos contemporneos de Nielsen (Oxenvad havia falecido trs anos antes), mas CAHUZAC, que contava ento j com sessenta e sete anos, apresenta pequenos problemas tcnicos, uma sonoridade pouco focada e uma certa descontinuidade entre a parte da orquestra e a da clarineta. Entretanto, possvel perceber seu fraseado delicado e as nuances de timbre nas passagens mais lricas.

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    O ano de 1965 marcou as comemoraes do centenrio do nascimento de Nielsen, com uma gravao premiada da sua 3 Sinfonia por Leonard Bersntein. A partir de ento, o compositor comeou a ter maior impacto nas salas de concertos ao redor do mundo e tambm ser extensivamente gravado (KRABBE, 2012, p.47). No por acaso, em 1967 o clarinetista Stanley DRUCKER, sob a regncia do prprio Bernstein, gravou a obra pela Sony Classical e ao que tudo indica, terminou por popularizar a obra na Amrica do Norte, tornando-se referencial (GIACONA, 2009, 10). No mesmo ano, o clarinetista de jazz Benny GOODMAN teria gravado o Concerto pela RCA e com Morton GOULD na regncia, mas ela acabou no sendo to bem recebida (NELSON, 1979a, 58). Por outro lado, nas dcadas seguintes, o Concerto seria gravado por uma srie de influentes intrpretes do instrumento, como John Bruce YEH (1985, Centaur), Janet HILTON (1988, Chandos), Richard STOLZMAN (1990, RCA), Philippe CUPER (1992, ADDA), Walter BOEYKENS (1994, Harmonia Mundi), Kevin BANKS (1998, Naxos), Robert PLANE (1999, BBC), Sabine MEYER (2006, EMI), Martin FRST (2007, BIS SACD), Franois BENDA (2008, Genuin), entre outros.

    A gravao de BOEYKENS demonstra uma sonoridade plena da clarineta, pela qual o intrprete conhecido, embora as cadncias soem pouco contrastantes, especialmente a primeira, no c.133. J a de MEYER utiliza um andamento um pouco mais lento em relao mdia das demais, o que lhe permite criar alguns contrastes bastante convincentes em termos de andamento. Porm, sua interpretao das cadncias apresenta passagens bastante rpidas, mas sem muita continuidade, o que demonstra um virtuosismo que parece, por vezes, desconectar-se da obra. Melhor abordagem parece ser a de BENDA, com uma sonoridade cheia, grande apuro tcnico e a interpretao das cadncias mais reflexiva e ao mesmo tempo com maior dramaticidade, com grandes acelerandos e diminuendos. Paradoxalmente, a difuso e popularizao da obra foram acompanhadas de um relativo obscurantismo sobre a forma atravs da qual ela foi concebida na cultura dinamarquesa do comeo do sculo XX. Essa ausncia de informaes sobre o contexto do Concerto pode estar ligada ao fato do dinamarqus no ser uma lngua de domnio comum, mas sobretudo, uma nfase muito mais prtica do que de contextualizao terica numa cultura onde esses aspectos so de conhecimento geral (NELSON, 2012a).

    Durante dois meses do ano de 1979, o clarinetista Eric Nelson estudou no Royal Conservatory de Copenhagem com Tage Scharff, ele prprio um ex-aluno de Oxenvad, e umas das suas principais referncias quanto tradio de execuo do Concerto. Ele corrobora sua experincia de campo como entrevistas e aulas com Tage Scharff, alm de analisar a correspondncia entre compositor e intrprete e dados analtico-estruturais presentes na obra de Nielsen. Assim, no artigo publicado na revista The Clarinet (NELSON, 1987), enunciando a tradio de

    performance dinamarquesa propriamente dita, o autor deixa claro o desdm ou indiferena que encontrou entre clarinetistas dinamarqueses por interpretaes no escandinavas do Concerto como a de Stanley DRUCKER e mesmo Louis CAHUZAC.

    Por outro lado, o autor cita trs gravaes que considera representantes dessa tradio de performance (NELSON, 2012a). Entre elas esto a do suio Kjell-Ingle STENVENSSON (1975, EMI), a de Hkan ROSEGREN (1991, Sony), mas, sobretudo, a de Niels THOMSEN (1990, Chandos). A de STENVENSSON tem grande apuro tcnico, e apresenta acima de tudo uma liberdade maior nas cadncias do Concerto, com um dilogo bastante efetivo nas passagens entre solista e orquestra. Por outro lado, na gravao de THOMSEN notrio o contraste em relao s gravaes como a de MEYER, BOEYKENS e CAHUZAC em termos de carter da obra. Embora no tenha a mesma fluidez tcnica que a de BENDA no geral, a interpretao conecta-se bem com a orquestra formando um todo coeso. Alm disso, a sonoridade do instrumento soa por vezes extremamente agressiva nos registros extremos do instrumento, e o intrprete vale-se de pequenos rubatos em diversas situaes. Especialmente no tocante expressividade nas cadncias, o tratamento dado bastante enrgico (sobretudo na ltima), com grandes expanses de dinmica que beiram o limite das possibilidades do instrumento, alm de usar pausas mais longas entrecortando as retomadas da melodia. Na verso de THOMSEN, o Concerto assume uma postura mais dramtica que explora os extremos do instrumento em variaes de andamento e dinmica, mas que ainda assim soam convincentes no contexto da obra.

    Em suas observaes sobre a partitura de Oxenvad, NELSON relata uma srie de anotaes encontradas, com expresses como feio!, manaco depressivo, improvisacional, contemplativo, satnico, brilhante, humorstico, entre outras (1987, p.35). Alm disso, nos comentrios de Scharff sobre a obra, possvel perceber uma nfase na construo intervalar da melodia, muito mais que do virtuosismo em si. Segundo Scharff, a nica passagem que considera virtuosstica a escala ascendente em meio ltima cadncia (c.519, stima e oitava linha da partitura da clarineta), com as tercinas a seguir marcadas por ele como satanicamente lento (NELSON, 1987, p.34).

    Discusses interpretativas sobre o Concerto podem ser encontradas no trabalho de GIACONA (2009), que analisou quatro gravaes da obra e entrevistou os intrpretes, sendo eles os norte-americanos Stanley Drucker, Elsa Ludewig-Verdehre, John Bruce Yeh, e o escandinavo Hgan Rosengren. Numa discusso sobre a relevncia da obra, praticamente todos os intrpretes concordam que o Concerto, Op.57 de Nielsen pode ser equiparado ao de Mozart na literatura da clarineta (GIACONA, 2009, p.143). Alm disso, ela explora as alternativas propostas pelos intrpretes baseadas em suas concepes pessoais para

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    FRAGA, V. S. O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen... Per Musi, Belo Horizonte, n.27, 2013, p.200-217.

    resolver os problemas tcnicos, incluindo as mudanas de articulao, diferentes posies e digitaes no instrumento, bem como a interpretao das cadncias.

    Nesse sentido, digna de nota a diferena de abordagens do Concerto pelos intrpretes; profundamente influenciado pela gravao de Cahuzac (GIACONA, 2009, p.20), Drucker por sua vez uma clara influncia nos outros dois intrpretes norte-americanos, sobretudo em Yeh. Essa influncia fica mais evidente ao comparar a concepo da obra dos trs intrpretes com a do escandinavo Rosengren. Nascido em Stocolmo e criado ao sul da Sucia, Rosengren familiarizou-se desde cedo com a cultura dinamarquesa e sua tradio de performance. Assim, enquanto Drucker defende uma postura de fidelidade partitura impressa, Rosenberg a interpreta buscando compreender as motivaes por trs das marcaes7 (GIACONA, 2009, p.84). Ele tambm fala sobre como a obra de Nielsen transformou-se em sua fase final e como o Concerto se encaixa nessa perspectiva, especialmente com a construo de diferentes reas tonais. Sobretudo, ele considera que a obra no virtuosstica j que sempre associou sua dificuldade tcnica expresso musical. Para Rosengren, a dificuldade tcnica no grande se comparada ao desafio musical de interpret-la em seu devido contexto (GIACONA, 2009, p.83).

    Outros trabalhos sobre a performance do Concerto de Nielsen ainda incluem o de LANZ (1989), que analisa juntamente com outros dois concertos de Nielsen, o para violino e o para flauta. Alm dele tambm Ann Marie Bingham analisou a interpretao das cadncias do Concerto por vrios intrpretes, e incluiu o seu prprio trabalho de preparao da obra com as anotaes de Tage Scharff, com quem tambm estudou (BINGHAM, 1990).

    Dentre as gravaes pesquisadas, relevante que os intrpretes familiarizados com a tradio cultural da Escandinvia demonstrem certos aspectos em comum, como a busca por maior contraste e expressividade, alm de uma abordagem mais livre das cadncias. Essa expressividade claramente diferenciada na forma de interpretar indicaes como o ad libitum depois da escala ascendente na ltima cadncia, no c.519 (conforme indicado no Ex12).

    Nesse trecho selecionado no Ex12, foi possvel observar que enquanto intrpretes como CAHUZAC, DRUCKER e CUPER tendem a interpret-lo de forma mais literal, respeitando a proporo da notao, MEYER, BOEYKENS, mas sobretudo STENVENSSON e THOMSEN permitem-se uma liberdade maior, variando o ritmo mais livremente e com acentos mais pronunciados.

    Por outro lado, atravs da importante gravao de CAHUZAC com a Royal Copenhagen Orchestra, possvel perceber uma acentuao sutil da orquestra na nota mais longa do tema inicial (destacado no Ex11.e), diferente da maioria das gravaes modernas que tendem a execut-la mais como a nossa compreenso moderna do tenuto. Essa acentuao discreta mas presente em toda a obra proporcionou uma ntida diferena na interpretao da orquestra, que contando com msicos que integravam o meio social do compositor, permitem a suposio do quanto das sutilezas dessa natureza na tradio de performance original da obra j no so mais ouvidas.

    No obstante a diferena de abordagem entre as performances e as pesquisas que a suportam, h uma inteno geral de dar subsdios ao instrumentista numa tentativa de contornar o que PINO chama de dez pginas de uma slida e bestial dificuldade (PINO, 1980, p.264). Dentro do contexto da sua composio, entretanto, as discusses sobre a demanda tcnica assumem um aspecto secundrio, abrindo caminho para consideraes sobre uma melhor compreenso do carter que a obra incorpora.

    6 - Consideraes finaisDe uma forma geral, o que se percebe numa leitura mais detalhada desses aspectos que a maneira precisa atravs da qual uma obra influente como o Concerto para Clarineta, Op.57 foi composta encontra sua razo de ser na forma como Nielsen expressa-se dentro da cultura dinamarquesa de sua poca. Assim, a sua densidade de textura, bem como a dificuldade tcnica da qual o compositor estava consciente e sublinhada j por Oxenvad, alm de sentida por muitos ouvintes e intrpretes ao longo do tempo, so na verdade a estrutura de superfcie da sua slida tcnica de composio. Nesse

    Ex.12 Excerto da cadncia no c.519 do Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen, com destaque para o trecho indicado como ad libitum.

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    mesmo lastro, alguns autores consideram o seu Concerto para Clarineta no s como a sua maior conquista, mas tambm um marco na literatura da clarineta (Maegard citado por NELSON, 1979a, p.53).

    Combinar os diferentes problemas de digitao, articulao e dinmica com um carter que oscila de humorstico a manaco-depressivo dentro de uma narrativa ininterrupta de aproximadamente vinte e cinco minutos de msica foi de fato uma abordagem inovadora. Nesse sentido, o Concerto de Nielsen difere de outras obras de seus contemporneos, especialmente pela envergadura estrutural. No Concerto, a estrutura ampla d conta de uma narrativa essencialmente complexa. O tema danante da abertura se transforma durante a obra, emergindo aqui e ali meldica e ritmicamente modificado, ganhando cada vez mais diferentes contornos expressivos.

    Carl Nielsen tinha uma viso particular sobre certos aspectos da sua msica, e sua obra j era conhecida por seus contemporneos por ser excessivamente difcil. Avesso ao que chamou de sentimentalismo superficial e virtuosismo sem sentido, mas tambm s correntes modernas representadas por Schoenberg e Stravinsky, o nacionalismo de Nielsen talvez o tenha alinhado mais com Bartok. Entretanto, Nielsen construiu uma slida tcnica de composio por conta prpria, conjugando os procedimentos polifnicos que admirava em Palestrina e Bach com uma orquestrao aparentemente rude e, por vezes, brutal, como demonstrada no Concerto, Op.57.

    Ao utilizar uma dana folclrica como fio condutor, Nielsen cria uma narrativa densa, cuja dramaticidade fica evidente no dilogo entre o solista e a orquestra, pontuados percussivamente pela incluso da caixa clara. Sua instrumentao vale-se de uma linguagem difcil e uma abordagem individual dos instrumentos, que explora limites de tessitura e dinmica, enfatizando a construo meldico-intervalar e a complexidade rtmica, muito mais que a questo tonal da obra, cujas evidncias demonstraram ser secundria.

    De uma forma geral, a aceitao e popularizao do Concerto no decorrer do tempo foi paradoxal, na medida em que desconsideraram aspectos do contexto onde a obra foi realizada, o que pode ser constatado na indiferena dos clarinetistas dinamarqueses com os intrpretes no escandinavos observada por Eric Nelson. Por outro lado, o trabalho de gravao por intrpretes como o francs Louis Cahuzac e o norte-americano Stanley Drucker foi um dos principais meios de divulgao e propagao da obra, influenciando decisivamente na sua incluso no repertrio de concerto da clarineta.

    Dentre os trabalhos pesquisados, ficou claro que as questes tcnicas devem ser entendidas como parte de um processo maior que busque incorporar performance as significaes histricas e analticas necessrias ao equilbrio da complexa relao entre solista e orquestra. Por isso mesmo, tal qual salientou o clarinetista Hgan Rosengren, a obra melhor entendida em seu contexto, evitando uma interpretao que preze por um virtuosismo puro e simples sobre o carter da obra.

    Esse tipo de abordagem comumente manifestada na falsa relao em medir o nvel de um instrumentista por ter ou no estudado o Concerto, Op.57 de Nielsen (PINO, 1980, p.265). Alm de propagar uma viso um tanto superficial da obra e da performance em si, esse tipo de relao pode gerar uma frustrao nos estudantes que se julgam inaptos a interpret-lo naquele momento adequadamente, incitando-os a crer que no sero bons instrumentistas sem faz-lo. Isso, claro, no verdade.

    Uma perspectiva mais razovel que a obra necessita realmente de uma boa base tcnica para ser interpretada, mas que essa exigncia vem em funo da expresso de um carter complexo da cultura dinamarquesa; inicialmente campesino, ele se transforma rapidamente e assume contornos mais densos. Escolher expressar-se ou no atravs dessa obra e seu carter uma opo do instrumentista, e por si mesmo, nada diz sobre o nvel tcnico de quem quer que seja.

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    FRAGA, V. S. O Concerto para Clarineta, Op.57 de Carl Nielsen... Per Musi, Belo Horizonte, n.27, 2013, p.200-217.

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    Notas1 Tambm chamada de embocadura de duplo lbio, onde os lbios superior e inferior recobrem os dentes em contato com a boquilha e palheta (PINO,

    1980, p.59). Informao obtida de acordo com entrevista concedida por Robert Naum a Eric Nelson (NELSON, 1979b).

    2 ltima cadncia do Concerto, no trecho correspondente pgina 8, linha 8 da edio impressa. Como a edio da Samfundet til Udgivelse af Dansk Musik no apresenta numerao de compassos, eles foram includos para fins de referncia dos trechos citados nesse trabalho. Inicialmente, os critrios para a numerao no levariam em conta os compassos indicados por linhas pontilhadas no fim da primeira longa cadncia da clarineta no compasso 133, exatamente por estar incluso ainda na referida cadncia. Essa deciso seria a mais adequada em termos de coerncia e suportada por numerao equivalente em trabalhos de anlise como o recentemente publicado por Daniel GRIMLEY (GRIMLEY, 2003). Entretanto, como a nova edio da Wilhelm Hansen tambm citada nesse trabalho resolve inclu-los como compassos numerados (PETERSEN & PETERSEN, 2002, p. 201), a numerao utilizada passou a seguir essa ltima por questes de praticidade. Assim, o compasso aps a cadncia acima citada ser o nmero 143, ao invs de 134, e assim por diante.

    3 Cujo prefcio e grade orquestral esto disponveis para download aqui .

    4 Maestro que regeu a premire do Concerto e genro de Nielsen.

    5 Na referncia original, stamp-kick-stamp (NELSON, 1987, p.32).

    6 A numerao que o autor utiliza diferente da adotada nesse trabalho. Assim optou-se pela mudana nos nmeros de compasso visando a sua padronizao. Para mais detalhes, ver nota 2.

    7 Segundo ele, as marcaes de tenuto devem ser interpretadas de forma similar a um acento na msica vocal (GIACONA, 2009, 84).

    Vincius de Sousa Fraga Bacharel em Clarineta pela Universidade Federal de Santa Maria-RS (UFSM) sob a orientao do Prof. Dr. Guilherme Sampaio Garbosa e Mestre em Execuo clarineta pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) sob a orientao do Prof. Dr. Pedro Robatto. Sua dissertao discutiu aspectos da interpretao da Fantasia Sul Amrica para clarineta solo de Cludio Santoro. Atualmente, Doutorando em Execuo Musical pela mesma instituio.