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o CONCEITO DE UM MERCADO NACIONAL E AS SUAS IMPLlCACOES NO CRESCIMENTO DA ECONOMIA WALT W, ROSTOW rsomente ... mercados domésticos ampliados e exportação di'L'Zrsificada podem formar a base para a expansão da estrutura industrial." Êste trabalho foi escrito por um dos mais respeitados nomes da equipe "que planeja a política externa dos Estados Unidos. O autor sustenta que o papel da Mercadologia para ativar a economia das nações em desenvolvimento, há muito ignorado por economistas de ambos os lados da Cortina de Ferro, é, de muitas maneiras, vital. Homens de merketing devem desem- penhar um papel, pelo menos tão ativo quanto o dos "agentes municipais" ao transmitir informações sô- bre técnicas agrícolas. Ambas as formas de produti- vidade, bens de incentivo e bens de consumo como estímulo ao esfôrço, devem ser efetivamente distri- buídos nas áreas rurais; eficientes instituições merca- dológicas devem ser desenvolvidas para resolver os problemas de venda dos produtos do campo. Além de outras, essas são situações nas quais as técnicas de mercadização tornam-se necessárias para o desenvol- vimento de nações tanto comunistas como ocidentais. WALT W. RoSTOW - Conselheiro e Presidente do Conselho de Planejamen- to Político do Departamento de Estado dos Estados UIiidos. Nota da Redação: Traduzido do original publicado na Marketing anã Eco- nomic Development, por HAMILTON MADUREIRA VILELA, e reproduzido sob au- torização da American Marketing Association.

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o CONCEITO DE UM MERCADONACIONAL E AS SUAS IMPLlCACOES

NO CRESCIMENTO DA ECONOMIAWALT W, ROSTOW

rsomente ... mercados domésticos ampliados eexportação di'L'Zrsificada podem formar a base paraa expansão da estrutura industrial."

Êste trabalho foi escrito por um dos mais respeitadosnomes da equipe "que planeja a política externa dosEstados Unidos. O autor sustenta que o papel daMercadologia para ativar a economia das nações emdesenvolvimento, há muito ignorado por economistasde ambos os lados da Cortina de Ferro, é, de muitasmaneiras, vital. Homens de merketing devem desem-penhar um papel, pelo menos tão ativo quanto o dos"agentes municipais" ao transmitir informações sô-bre técnicas agrícolas. Ambas as formas de produti-vidade, bens de incentivo e bens de consumo comoestímulo ao esfôrço, devem ser efetivamente distri-buídos nas áreas rurais; eficientes instituições merca-dológicas devem ser desenvolvidas para resolver osproblemas de venda dos produtos do campo. Além deoutras, essas são situações nas quais as técnicas demercadização tornam-se necessárias para o desenvol-vimento de nações tanto comunistas como ocidentais.

WALT W. RoSTOW - Conselheiro e Presidente do Conselho de Planejamen-to Político do Departamento de Estado dos Estados UIiidos.

Nota da Redação: Traduzido do original publicado na Marketing anã Eco-nomic Development, por HAMILTON MADUREIRA VILELA, e reproduzido sob au-torização da American Marketing Association. •

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Posso dizer-lhes; sem vaidade, que acredito nas técnicasque essa organização postula e representa e que se reve-larão cruciais na próxima geração, para o desenvolvimentode países e regiões que abrigam a maioria da populaçãomundial. Estou me referindo às nações em desenvolvimen-to da Ásia, Oriente Médio, África e América Latina. Refi-ro-me igualmente à União Soviética e aos países do Leste-,Europeu. Diria mesmo que, venha a China Comunistaalgum dia a formular uma estratégia racional e efetiva dedesenvolvimento - o que ainda não fêz - para que amercadização venha desempenhar um papel nôvo e im-portante sob todos os aspectos.

II

A fim de entender por que essa proposição é válida, deve-se lançar os olhos às teorias e políticas de desenvolvimen-to que tem sido aplicadas a essas regiões, nas últimas ge-rações, examinar onde elas agora se situam e para ondedevem ir à medida em que aquelas regiões avançam pelosestágios do desenvolvimento.

Com poucas exceções, as nações em desenvolvimento daÁsia, Oriente Médio e América Latina iniciaram d.elibera-damente seu primeiro estágio de modernização concen-trando esforços em duas áreas: produção de bens manu-faturados para substituir bens de consumo importados ecriação de infra-estrutura básica, isto é, estradas, energia,portos, educação, etc. A agricultura e a modernização davida rural foram sistemàticamente negligenciadas, cujo re-sultado presente é um perigoso declínio na produção dealimentos per capita em algumas regiões importantes.

Havia uma certa legitimidade nesse estabelecimento deprioridades iniciais. O desenvolvimento de uma econo-mia, em seu núcleo básico, consiste na progressiva difusãodos frutos da ciência e da tecnologia modernas. A Indús-tria é a forma mais dramática que a ciência e a tecnologiamodernas podem assumir; uma infra-estrutura básica édiretamente necessária para a industrialização.

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Mas existia também um elemento de irracionalidade: aagricultura associada à época colonial e/ou à excessivadependência com relação aos mercados de exportação dospaíses industrializados, parecia ser uma atividade de se-gunda categoria, para não dizer humilhante, quando com-parada às atividades industriais.

A combinaçãodêsses dois fatôres, racional e irracional, temocasionado uma fase de desenvolvimento grandementeconcentrado em poucas cidades, em tôrno de algumas in-dústrias e uma negligência sistemática da contribuição quea agricultura pode e deve oferecer em têrmos de alimen-tos, matérias-primas industriais, divisas estrangeiras emercados internos ampliados.

o início do processo de industrialização variou, tanto notempo como entre as nações em desenvolvimento no mun-do contemporâneo. Os países latino-americanos deram iní-cio ao processo no período imediatamente anterior à Se-gunda Guerra Mundial, ou durante ela, enquanto muitosoutros somente o iniciaram, de modo sério, a partir de1945. Na verdade, alguns ainda nem lançaram sua pri-meira fase de industrialização sistemática. Todavia, é ge-ralmente verdade que já chegamos (ou estamos chegan-do) ao fim da fase em que a estratégia inicial de desen-volvimento do pós-guerra pode ser encarada como viável,embora limitada sob certos aspectos.

Nas nações em desenvolvimento está se difundindo .a idéiade que a próxima fase de desenvolvimento deve se basearna difusão sistemática, entre os agricultores, de técnicasmodernas hoje concentradas preferencialmente nas áreasurbanas; na constituição de mercados nacionais eficientes;e, de um ponto de vista amplo, na criação de novas linhasdiversificadas de exportação que prometam produzir as di-visas de que os países em desenvolvimento necessitarãonos próximos anos. Somente êsse esquema de mercadosdomésticos ampliados e exportação diversificada pode for-necer a base para a expansão da estrutura industrial (dosetor de bens de consumo ao de bens de capital e indús-

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tria pesada) exigida por uma moderna sociedade in-dustrial.

Tomo a liberdade de fazer uso de um vocabulário que cha-maria de particular/ para dizer que na última geração,em muitas partes do mundo, ocorreu uma decolagem(take-ofi) no qual os setores líderes se compõem de in-dústrias construídas para substituir importações de bensde consumo; e para essas nações adquirirem o estímulo,que eventualmente as conduza à maturidade industrial, épreciso que as suas concentrações industriais urbanas, ain-da um tanto isoladas, sejam convertidas em centros ativose dinâmicos que, deliberadamente, promovam a difusão,em escala nacional, do processo de modernização. Porém,ao mesmo tempo, êles devem gerar recursos que, baseadosnesses mercados mais amplos, possam financiar sua tran-sição para sociedades inteiramente industrializadas.

Essa é uma idéia rudimentar da tarefa que se apresenta àpróxima geração das nações do Mundo Livre, que possuia maioria das populações da Ásia, Oriente Médio, Áfricae América Latina; bem como, o problema a ser resolvido,se uma China modernamente industrializada, deve surgirno cenário mundial.

IH

O problema na União Soviética e em grande parte da Eu-ropa Oriental,é, evidentemente, um pouco diverso. Ali asorigens do processo de industrialização localizam-se noúltimo quartel do século passado para algumas regiões, esão anteriores a êsse período em outras. Essas nações, salvopoucas exceções, no período seguinte à Segunda GuerraMundial, têm avançado em direção à total maturidadeindustrial. Assim fizeram a partir de ideologias que enca-ravam a expansão da indústria pesada como um objeto emsi mesma, ou seja, a indústria pesada era desenvolvida ou

1) o Dr. RoSTOW refere-se ao seu livro, The stages ot Economic Growth:A Ncn-Commumst Manifesto, Cambridge: Cambridge University Press,1960.

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para equipar as fôrças militares ou para construir maisIndústria pesada. Chegaram agora a um estágio de desen-volvimento que justificou a atitude de Krushchev, ao ata-car o queêle chamou de "comedores de aço". Deve estarainda na lembrança a pergunta que êle fêz: "o que que-rem vocês que nós façamos com mais aço, comê-lo?" É oinevitável e previsível declínio nos setores de indústria pe-sada que são os principais responsáveis pela apatia gene-ralizada dessas economias. Já se exauriu a capacidade deos setores de indústria perada liderar o processo de desen-volvimento.

Nesse sentido, como os países em desenvolvimento, aUnião Soviética e os países do Leste-Europeu negligen-ciaram a agricultura. Ademais, ela foi mantida sob formascoletivas de organização que se revelaram bastante inefi-cientes no emprêgo de mão-de-obra e capital. Em certaspartes do Leste-Europeu, porém, essa experiência coleti-vista está sendo abandonada num esfôrço para se oferecerincentivos reais aos agricultores.

o próximo estágio de desenvolvimento na União Soviéticae países do Leste-Europeu deve, evidentemente, ser basea-do não apenas na correção da ineficiência da agricultura,mas também na mudança de seus complexos industriaisrelativamente maduros a fim de oferecer aquilo que a po-pulação deseja, quando níveis médios de renda atingem oponto que já alcançaram nesses países.

Se taxas elevadas de crescimento vão reaparecer nessespaíses, elas o farão através de alguma versão da revoluçãoeconômica e social que, nos Estados Unidos, nós inicia-mos na década de 1920 e que começou a se apossar daEuropa Ocidental e do Japão na década de 1950. Em ou-tros têrmos, a revolução desenvolvida em tômo da rápidadifusão do automóvel, de bens de consumo durável, expan-são dos subúrbios e de tôdas as coisas que hoje estão in-corporadas ao nível de vida de nossas populações urbanas.

Devo dizer, nesse ponto, que essa revolução não deve serentendida simplesmente em têrmos de produtos indus-

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triais. Atrás do desejo de possuir Um automóvel, uma tele-visão, uma residência num bairro confortável, com jardime espaço de sobra, existem dois profundos desejos huma-nos que, de tudo o que pudemos observar, são universais:o desejo de mobilidade, superar seus próprios horizontes,e o desejo de preservar sua própria individualidade. Osaparelhos que usamos representam, simplesmente, os ca-rninhos que a indústria moderna encontrou para satisfa-zer êsses profundos, legítimos e justificados desejos "hu-manos.

Novamente, retornando às minhas próprias palavras, eudiria que, da mesma maneira que a maioria dos países emdesenvolvimento encontra-se em um processo de ajusteda decolagem ( take-cif) ao estimulo dirigido à maturi-dade tecnológica, a União Soviética e o Leste da Europaencontram-se no processo de ajustar a sua própria versãodaquele estímulo ao estágio de elevado consumo em massa.

IV

Aqui, então, é que se insere a Mercadologia.

Obviamente, a modernização do interior dos países emdesenvolvimento possui muitas dimensões. A partir de ex-periências práticas, conhecemos o suficiente para poderdizer que, pressupondo-se a existência de estradas e de ummínimo de educação básica, bem como a de um certoacúmulo de tecnologia agrícola, há quatro condições ne-cessárias e suficientes para uma revolução agrícola.

• O agricultor deve receber um preço justo e razoávelpelo seu produto.

~ Deve poder dispor de crédito, a taxas razoáveis, paraque possa mudar a natureza do seu produto ou alterar oesquema de produtividade desejado.

• Deve ter à sua disposição assistência técnica que sejapertinente ao solo, clima e à desejada mudança de pro-duto ou produtividade que quiser introduzir.

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• Finalmente, deve ser capaz de adquirir, a preços ra-zoáveis, fertilizantes químicos, inseticidas e implementosagrícolas, e bens de incentivo, isto é, bens de consumo, deboa qualidade, que êle e sua família comprariam em maio-res quantidades, ou trabalhariam mais para adquiri-los, secustassem menos ou se a sua renda fôsse mais elevada.

Essas quatro condições podem ser satisfeitas de várias ma-neiras. Em minhas viagens de estudo por áreas em desen-volvimento, impressionou-me a variedade de formas ins-titucionais que a atividade agrícola pode assumir: coope-rativas de produtores, indústrias de processamento de ali-mentos, fazendas comerciais, etc.; mas tôdas essas formaspossuem a característica básica de reunirem em tôrno doagricultor aquelas quatro condições necessàrias e sufi-cientes.

Convém observar que a mercadização entra diretamenteem tôdas as fases do processo levando bens e serviços docampo à cidade e vice-versa.

Para o agricultor receber um preço justo pelo seu produ-to, sem um aumento correspondente no preço dos alimen-tos nas cidades, deve haver uma modernização dos pro-cessos mercadológicos, a fim de que tal ocorra.

Nenhum acontecimento nos países em desenvolvimentome impressiona mais do que a situação generalizada emque o agricultor recebe 15 ou 20 por cento do preço devenda do seu produto, sendo elevados os preços nas cida-des, e enorme o desperdício entre os dois pontos extremos.

Argumenta-se, às vêzes, que os processos mercadológicosexistentes, fragmentados e caros para muitos produtos nospaíses em desenvolvimento, são simplesmente um aspectodo subdesenvolvimento, que desaparecerá com o tempoe com a modernização. Mais especificamente, às vêzes, diz-se que a modernização do processo de mercadização po-deria causar o desemprêgo de pessoas, mesmo trabalhan-do a baixos níveis de produtividade.

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Três tipos de considerações contradizem êsse pensamentotão complacente.

Primeiro, em muitos casos, os processos mercadológicosque se apresentam a um agricultor num país em desenvol-vimento, são o que os economistas chamam de monopsô-nico; ou seja, o agricultor individual enfrenta uma situa-ção na qual só há um intermediário a quem êle pode ven-der o seu produto. No ponto crítico da estação da colhei-ta, fica à mercê dêsses intermediários. Essa condição desi-gual de barganha é agravada, pois o comprador do produ-to, geralmente, é também a sua única fonte de crédito. Emresumo, os processos mercadológicos tradicionais são nãoapenas ineficientes; na maioria dos casos, êles não possuemas características competitivas que os economistas supõemlhes sejam implícitas.

Segundo, a diferença entre os preços do campo e os preçospara o consumidor urbano constitui uma barreira entre ocampo e a cidade, cujo efeito deve ser medido não só emtêrmos de emprêgo alternativo de mão-de-obra, mas tam-bém nos das relações cidade-campo como um todo. Espe-cificamente, processos mercadológicos arcaicos tornamnão-lucrativo para o agricultor o seu comprometimentoem processos produtivos agrícolas de maior produtivida-de; assim, por êsse motivo, reduzem o volume de bens agrí-colas produzido e, simultâneamente, o tamanho do mer-cado para produtos manufaturados. No processo de mo-dernização das relações mercadológicas, devemos conside-rar não apenas o possível deslocamento da mão-de-obrautilizada no sistema mercadológico existente, mas os efei-tos agregados na produção e nos mercados, e aquilo queum presidente latino-americano chamou de "Muralha Chi-nesa", erguida entre a cidade e o campo.

Terceiro, em têrmos práticos, onde processos mercadoló-gicos modernos foram introduzidos (sob a forma de coope-rativas de produtores, indústrias de alimentos, etc.) aabsorção da mão-de-obra, liberada de outras atividades,pelo setor mercadológico, não apresentou maiores dificul-dades.

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Em resumo, estou confiante em que a modernização dosprocessos mercadológicos, do campo para a cidade, é umacruzada em que podemos entrar com a convicção de queos benefícios a serem obtidos mais do que compensarãoos custos de readaptação exigidos.

Visto sob outro aspecto, isto é, da cidade para o campo, amodernização da vida rural exige meios novos e efetivospara fazer chegar ao fazendeiro as coisas de que necessitapara aumentar a sua produtividade, e os bens de incentivo.

Com respeito aos fertilizantes químicos, inseticidas, se-mentes e implementos, há um papel importante a ser de-sempenhado pelo vendedor que excede os quadros con-vencionais da atividade mercadizadora. Embora alguns oconsiderem um sacrilégio, está realmente provado que oagente mais poderoso na difusão da nova tecnologia agrí-cola tem sido a emprêsa comercial, ao invés das institui-ções públicas especialmente criadas para oferecer assis-tência técnica ao campo. Não pretendo diminuir a impor-tância que, nos Estados Unidos, possui o "agente munici-pal", ou aquêles que desempenhem papel semelhante nasáreas em desenvolvimento; acontece, simplesmente, quenão existe um número suficiente dêsses "agentes" paraexecutar a tarefa nos países em desenvolvimento. Entreoutras razões, existem técnicos agrícolas demais trabalhan-do em escritórios oficiais, nas cidades, em vez de estaremno campo. Um trabalho excelente e prático de difusão deconhecimentos técnicos pode ser, e está sendo feito, emmuitas partes do mundo, por aquêles que têm um interês-se estritamente comercial em vender o seu produto. Ovendedor sabe que precisa gastar o seu tempo com fregue-ses em potencial.

Com respeito aos bens de incentivo, devemos aceitar o fatobásico de que as populações rurais dos países em desen-volvimento são pobres. Até que suas rendas aumentem,elas possivelmente não poderão comprar muito mais doque estão comprando agora. Por outro lado, é também ver-

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dade que os produtos manufaturados que podem comprarnas vilas que freqüentam são quase sempre caros e de máqualidade. Conhecemos através da história rural dos Es-tados Unidos - mesmo na recente experiência na área doVale do Tennessee - que a disponibilidade de bens deconsumo, baratos e atraentes, pode representar um im-portante estímulo à produção e à produtividade. Preçosmais baixos podem produzir mais compras, a curto prazo;preços baixos e a disponibilidade de bens de incentivo deboa qualidade podem determinar mais produção, maiorrenda, e mais compras a longo prazo. O mesmo exemplopode ser observado no México e noutras áreas em desen-volvimento onde os esforços para aumentar a produtivi-dade são combinados com tais incentivos.

O problema técnico-mercadológico, da cidade para o cam-po, consiste em descobrir meios de reduzir os custos uni-tários de distribuição a mercados rurais geogràficamenteesparsos e onde o volume de qualquer mercadoria a servendida, em qualquer ponto da área, é baixo. Nas naçõesem desenvolvimento, o exemplo de maior sucesso é o damercadização de refrigerantes e cerveja. Nesse caso, toda-via, o volume de vendas é suficiente para justificar a en-trega regular por caminhão mesmo em áreas rurais debaixa renda. O que parece ser necessário é o desenvolvi-mento de processos mercadológicos unificados para umagrande variedade de mercadorias, a fim de que os custosgerais de distribuição para cada produto sejam reduzidos.

Quando vejo caminhões carregados de refrigerantes diri-girem-se a povoados distantes, desejaria que levassem umreboque carregado de tecidos, sapatos, utensílios domés-ticos, lanternas, rádios transistorizados, livros e outras coi-sas que os habitantes dêsses locais comprariam se custas-sem menos.

Cooperativas de produtores, indústrias de processamentode alimentos, e outras instituições pertinentes às áreasrurais podem freqüentemente servir de centros para a ar-

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mazenagem e distribuição de tais bens de incentivo, bemcomo de fertilizantes, inseticidas, etc., necessários para au-mentar a produtividade.

v

Tentei indicar de modo concreto os tipos de operações mer-cadológicas necessárias, para que aquêles envolvidos ematividades de distribuição contribuam para a derrubadada "Muralha Chinesa", que existe entre o campo e as CI-

dades, nos países em desenvolvimento, bem como auxi-liem a criação de mercados nacionais. A modernização davida rural, fator básico dêsse problema estrutural, eviden-temente abrange elementos que ultrapassam os limites daprópria atividade distributiva. Em recente carta aos pre-sidentes dos países latino-americanos e ao presidente dosEstados Unidos, os membros do CIAP - Comité Inter-americano da Aliança para o Progresso relacionaram seteelementos-chave para acelerar a modernização da vidarural. Além de distribuição mais eficiente, os elementossão os seguintes: mudanças no sistema de arrendamentode áreas rurais em certas regiões dos países latino-ameri-canos; mudanças em algumas políticas governamentais depreços agrícolas; expansão de produção e da distribuiçãode fertilizantes químicos; expansão e aperfeiçoamento docrédito rural; estabelecimento de instituições rurais comocooperativas de produtores, emprêsas de processamentode alimentos; programas de cooperação popular e desen-volvimento comunitário. Dentro dêsse complexo de ações,destinado a quebrar a apatia e a estagnação da vida e daprodução nas áreas rurais, processos mercadológicos mo-dernos desempenham um papel vital.

A variedade de medidas específicas, exigidas pelas condi-ções da União Soviética e Europa Oriental, é semelhanteàs exigidas nos países em desenvolvimento; mas as naçõesde regime comunista estão limitadas pelo seu comprome-timento herdado às instituições coletivas de produção edistribuição. De um modo geral, essas instituições se re-

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velaram ineficientes e resistentes a reformas que formam,ou estão sendo, tentadas em vários países da Cortina deFerro. Conheço pouquíssimas agências de distribuição,criadas e administradas por governos, que se provarameficientes; e conheço muitas que exigem maciços subsí-dios oficiais para apenas se manterem em funcionamento.A razão é a falta de interêsse direto, por parte do burocra-ta, em obter aquela redução de custo e aquela margemextra de venda que fazem a diferença.

Todavia, é certo que existem discussões na União Sovié-tica e Europa Oriental a respeito da falta de incentivospara a produtividade agrícola e sôbre métodos que tor-nem o sistema de distribuição mais adequado às necessi-dades, interêsses e preferências do consumidor. Existe umatomada de consciência crescente da profunda contradiçãoentre as formas de organização, criadas no passado a par-tir de compromissos ideológicos, e o imperativo de pro-gresso. Ninguém pode predizer o resultado dêsses deba-tes e as mudanças de diretrizes que advirão; mas êles cons-tituem um importante e interessante elemento de mudan-ça no cenário mundial, o que é particularmente es-perançoso.

VI

A formação de mercados nacionais. através da união maisefetiva entre as áreas rurais e urbanas, tem implicaçõesdiretas sôbre a outra importante tarefa dos países subde-senvolvidos, ou seja, a sua necessidade de diversificar asexportações. Todo um conjunto de técnicas e esforços es-peciais são necessários para mercadizar novos produtos noexterior. Mercados potenciais devem ser cuidadosamenteestudados em função das preferências locais; vias de dis-tribuição devem ser estabelecidas; fluxos regulares demercadorias devem ser mantidos e financiados; contrôlede qualidade deve ser instituído e produção eficiente deveser assegurada, ou as exportações não disporão de condi-ções competitivas. Para aquêles países, cuja primeira fase

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de industrialização ocorreu internamente, à sombra dealtas barreiras alfandegárias, que protegeram o mercadolocal, uma mudança de mentalidade, profundamente revo-lucionária, é necessária antes que as emprêsas possam gerara eficiência que lhes permita enfrentar as tempestades dacompetição internacional. Essa mudança está apenas co-meçando a ocorrer em uns poucos países latino-america-nos no momento, embora, na Ásia, Formosa já tenha feitoa transição para exportações diversificadas de artigos ma-nufaturados, e a Coréia do Sul já andou mais da metadedêsse caminho. Em mercados internacionais altamentecompetitivos, não são' precisos muitos casos de mercado-rias entregues com atraso, ou de qualidade duvidosa, paraque o esfôrço de exportação falhe.

O setor da técnica de distribuição ligada ao setor exporta-dor, evidentemente, terá importância crescente nas áreasem desenvolvimento nos próximos anos.

Mas existe uma outra relação que vale a pena ser men-cionada. Historicamente, a exportação de artigos manu-faturados comumente acompanha, ou é paralela ao desen-volvimento de mercados nacionais. O exemplo clássico éo dos tecidos de algodão. Começando com a Inglaterra,um país após o outro entrou no comércio exportador detecidos, como uma espécie de reflexo do seu aprendizadode como produzir e distribuir eficientemente em seu pró-prio mercado, pois tecido de algodão é o primeiro produtomanufaturado moderno capaz de desenvolver um merca-do de massa, num país pobre. Outros bens manufaturados,por sua vez, inundaram as vias de distribuição internacio-nal, na medida em que se afirmavam em seus mercadosnacionais - até mesmo no caso da sensacional exporta-ção de rádios transistorizados por parte do Japão. Atra-vés da concentração, nos próximos anos, no desenvolvi-mento de mercados nacionais, as nações em desenvolvi-mento estarão lançando as bases para as exportações da-queles artigos manufaturados, sôbre as quais repousarágrande parte de sua capacidade futura para angariardivisas.

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VII

As considerações que tentei alinhar aqui têm especial sig-nificação para o desenvolvimento do pensamento econô-mico bem como para diretrizes governamentais. Indepen-dente de estarmos ou não cônscios dêsse fato, a verdade éque quando pensamos em têrmos econômicos, nosso ra-ciocínio está ainda matizado por idéias que voltam aoseconomistas clássicos do século dezenove e, na verdade,ao mundo fisiocrata do século dezoito. Êles começaram aorganizar o seu pensamento, focalizando os fatôres físicosda produção, especialmente o trabalho e a terra. O con-ceito de expansão do mercado foi introduzido e efetiva-mente dramatizado por ADAMSMITH.Mas o que se fazianecessário para expandir o mercado, além dos meios fí-sicos de transporte, não foi considerado seriamente pelosfundadores do pensamento econômico moderno. Na ver-dade, a distribuição e os serviços em geral tendiam a serignorados, ou encarados como um tipo inferior de ativi-dade econômica. Mesmo nos dias de hoje, é difícil fazercom que economistas de desenvolvimento e formuladoresde diretrizes emprestem aos problemas sôbre eficiência dedistribuição a mesma atenção que dão automàticamenteaos problemas de produção, investimentos, e finanças.

Para os comunistas, o problema é complicado pela natu-reza da economia marxista. KARL MARX, como econo-mista, era enraizado na tradição clássica. Suas proposiçõesperpetuaram a tendência de menosprezar a distribuiçãode uma maneira particularmente incisiva, e em tal mag-nitude que ela é formalmente excluída dos conceitos co-munistas de renda nacional.

Assim, confrontados agora com a tarefa de ampliar o mer-cado, nas áreas em desenvolvimento, na União Soviéticae Europa Oriental, os governos devem dominar aquela for-ma de pressão que é a mais insidiosa, isto é, as pressõescriadas pela aceitação, às vêzes, inconsciente, de idéias dopassado que obscurecem a natureza e a prioridade dosproblemas atuais.

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Se eu estiver certo em dizer que os homens devem, nageração seguinte, difundir o processo de modernização aáreas rurais há muito esquecidas, criando novas e eficien-tes rêdes de distribuição, assistiremos não somente a tare-fas novas e desafiadoras se apresentarem àqueles que co-mandam as técnicas de distribuição, mas também a umrespeito nôvo e teórico pela arte da expansão de merca-dos que, por tanto tempo, foi tido como pré-existente.

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