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1
INTRODUÇÃO
Entre os diversos problemas enfrentados atualmente pelo setor industrial, um dos
principais é a necessidade de minimizar, quando não é possível eliminar, os efeitos da
agressão ambiental que é causada pelos resíduos gerados pelo processo produtivo de bens
manufaturados.
A minimização destes resíduos faz parte de um novo conceito de gerenciamento
que possui uma estrutura de ação fundamentada na sua prevenção e reciclagem. Essa nova
postura tem se mostrado mais efetiva para combater o aumento da degradação do meio
ambiente, bem como para atender a normas ambientais, além de melhorar a imagem
pública de um governo ou de uma empresa e reduzir desperdícios financeiros.
O setor da indústria de fundição tem tido participação dentro desse novo conceito
de gestão de resíduos, pois um dos principais problemas gerados pelo setor tem sido a
destinação da areia de fundição descartada dentro dos seus processos produtivos, que gera
um ônus devido à sua gestão e disposição final.
Neste contexto, a indústria da construção civil tem apresentado grande potencial no
que diz respeito à utilização destes resíduos na produção dos mais variados produto dentro
do setor, tendo em vista a grande quantidade de matéria-prima utilizada pelo setor
construtivo. Este fato pode ser comprovado pelos vários trabalhos realizados para estudar a
viabilidade técnica e ambiental da areia de fundição como matéria-prima na fabricação de
argamassa/concreto. Como conseqüência desta adição, alguns desses trabalhos mostram
que a incorporação do resíduo pode modificar a microestrutura da pasta de cimento, mas
nenhum deles faz um estudo mais aprofundado da influência do resíduo na hidratação do
cimento.
Portanto, o objetivo desse trabalho foi de investigar a influência da bentonita e do
pó de carvão, presentes na composição da areia de fundição, no processo de hidratação do
cimento Portland, tendo em vista que o processo de hidratação do cimento é uma das
etapas mais significativas para as propriedades e características das argamassas e
concretos. Além disso, os estudos já realizados não apresentaram conclusões precisas em
relação à adição do resíduo na hidratação do cimento.
2 Desta forma, os primeiros capítulos deste trabalho, apresentam uma revisão
bibliográfica sobre assuntos de fundamental importância para o entendimento dos capítulos
finais, que compreendem os materiais, métodos e resultados experimentais.
A primeira parte deste trabalho, capítulo 1, apresenta as principais características
do cimento Portland hidratado, imprescindíveis para a compreensão de todo o trabalho. No
capítulo 2 apresenta-se a composição da areia de fundição e estudos de sua utilização como
matéria-prima na formulação de novos materiais dentro do setor da construção civil. Na
seqüência, no capítulo 3, apresentam-se os materiais, procedimentos e as técnicas
utilizadas nos ensaios necessárias ao desenvolvimento deste trabalho. No capítulo 4 são
apresentados os resultados e discussões. Por último, apresentam-se as conclusões do
presente estudo.
3
CAPÍTULO 1 – COMPOSIÇÃO E MICROESTRUTURA DO CIMENTO
PORTLAND HIDRATADO
Cimento, de modo geral, pode ser considerado todo material com propriedades
adesivas e coesivas, capaz de ligar fragmentos de minerais entre si de modo a formar um
todo compacto [NEVILLE, 1997]. Essa definição, de forma geral, abrange uma grande
variedade de materiais. Mas no campo em estudo, mais especificamente na área da
construção civil, o significado do termo cimento restringe-se aos materiais ligantes que
quando hidratados tem a capacidade de unir pedras, areia, tijolos, blocos etc. Assim, os
constituintes principais desse tipo de cimento são os calcários, de modo que na engenharia
de construções se lida com cimento calcário. Os cimentos que apresentam vantagens para o
preparo do concreto têm a propriedade de dar pega e endurecer em contato com a água
devido a uma reação química, a hidratação, sendo por isso denominado cimentos
hidráulicos.
1.1 - Tipos de cimentos
Existem no Brasil vários tipos de cimento Portland, diferentes entre si,
principalmente em função de sua composição. Sendo que os cimentos mais empregados
nas diversas obras da indústria da construção civil são:
cimento Portland comum;
cimento Portland composto;
cimento Portland de alto-forno;
cimento Portland pozolânico.
Sendo que em menores escalas são consumidos, seja pela menor oferta ou sejam
pelas características especiais de aplicação, os seguintes tipos de cimento:
cimento Portland de alta resistência inicial;
cimento Portland resistente aos sulfatos;
cimento Portland branco;
cimento Portland de baixo calor de hidratação;
cimento Portland para poços petrolíferos.
4A tabela 1.1 a seguir apresenta a nomenclatura do cimento Portland conforme
normas da ABNT.
Tabela 1.1 – Nomenclatura do cimento Portland (ABREU, 2001).
Cimento Portland (CP) Sigla Classe Identificação 25 CP I - 25
32 CP I – 32
Cimento Portland comum
CP I
40 CP I - 40
25 CP I – S – 25
32 CP I – S – 32
Cimento Portland
comum
(NBR 5732)
Cimento Portland comum com adição
CPI - S
40 CP I – S – 40
25 CP II – E – 25
32 CP II – E – 32
Cimento Portland composto com escória
CP II - E
40 CP II – E – 40
25 CP II – Z – 25
32 CP II – Z – 32
Cimento Portland composto com
pozolana
CP II - Z
40 CP II – Z – 40
25 CP II – F – 25
32 CP II – F – 32
Cimento Portland
composto
(NBR 11578)
Cimento Portland composto com filler
CP II - F
40 CP II – F – 40
25 CP III – 25
32 CP III – 32
Cimento Portland de alto forno (NBR 5735)
CP III
40 CP III – 40
25 CP IV – 25 Cimento Portland pozolânico (NBR 5736) CP IV
32 CP IV – 32
Cimento Portland de alta resistência inicial (NBR 5733) CP V - ARI -- CP V – ARI
25 CPB – 25
32 CPB – 32
Cimento Portland branco estrutural (NBR 12989)
CPB
40 CPB – 40
Cimento para poços petrolíferos ( NBR 9831) CPP G CPP-classe G
1.2 - Fabricação do cimento Portland
Segundo a definição de cimento Portland, tem-se que o mesmo é constituído,
principalmente, de material calcário, como a pedra calcária comum ou a greda (giz), e de
óxido de alumínio (Al2O3), conhecido como alumina, e de dióxido de silício (SiO2)
conhecido como sílica, sendo que estes materiais calcários são encontrados sob a forma de
5argila. O processo de fabricação do cimento Portland consiste, essencialmente, na mistura
de matérias-primas que contenha, em proporções convenientes, seus constituintes
finamente pulverizados e homogeneizados, que depois são submetidos à ação do calor em
forno rotativo, até a temperatura de fusão (± 1400° C), que resulta na formação de esferas
denominadas clínquer. O clínquer é então resfriado e moído; adiciona-se um pouco de
gesso, com o intuito de retardar o processo de pega, e o produto final é o cimento Portland
comercial, conhecido em todo o mundo [BAUER, 1999 e NEVILLE, 1997].
1.3 - Composição química do cimento Portland
Os constituintes fundamentais do cimento Portland, representados na forma de
óxidos, são a Cal (CaO), a Sílica (SiO2), a Alumina (Al2O3), o Óxido de Ferro (Fe2O3)
[TAYLOR, 1990]. Além de certa proporção de Magnésia (MgO) e uma pequena
porcentagem de anidrido sulfúrico (SO3), que é adicionado após a calcinação para retardar
o tempo de pega do produto [BAUER, 1999]. Existem ainda, como constituintes menores,
as impurezas, que são: os Óxidos de Potássio (K2O) e Sódio (Na2O), conhecidos como os
álcalis do cimento; o Óxido de Titânio (TiO2) e outras substâncias de menor importância,
como o Óxido de Manganês (Mn3O4) e o Anidrido Fosfórico (P2O5) [PETRUCCI, 1981].
1.4 - Principais fases do cimento Portland Anidro
No processo de fabricação do cimento Portland e obtenção do clínquer ocorrem
combinações químicas, principalmente no estado sólido, que conduzem à formação das
fases do cimento não hidratado [BAUER, 1999 e NEVILLE, 1997], e estas fases sólidas
bem como suas principais características serão comentadas nos itens a seguir.
1.4.1 - Silicato Tricálcico (3CaO.SiO2)
Normalmente constitui de 35% e 65% do cimento Portland; produz médio calor de
hidratação a qual inicia-se em poucas horas contribuindo para a resistência nas primeiras
idades [OLIVEIRA, 2002]. Resulta da combinação da cal restante das demais combinações
com o silicato dicálcico; ocorre em cristais bem definidos, relativamente grandes, com
contornos hexagonais [PETRUCCI, 1981]. O silicato tricálcico é conhecido como alita e
6por conveniência usa-se a sigla C3S para identificá-lo. Pode se apresentar em três tipos de
estruturas: monoclínica, triclínica e romboédrica. Ele reage relativamente rápido com a
água, e é o principal componente para o desenvolvimento da resistência aos 28 dias
[TAYLOR, 1990].
1.4.2 - Silicato Dicálcico (2CaO.SiO2)
Normalmente presente entre 10% e 40% na composição do cimento Portland
[OLIVEIRA, 2002]. Sabe-se que o silicato dicálcico tem três ou mesmo, possivelmente,
quatro formas, sendo, α, α', β e γ. O 2CaO.SiO2-α, que existe em temperaturas elevadas,
transforma-se na forma β a, aproximadamente, 145° C; o 2CaO.SiO2-β sofre outra
transformação para 2CaO.SiO2-γ, em torno de 670° C, mas devido à velocidade de
resfriamento dos cimentos comerciais, o 2CaO.SiO2-β continua existindo no clínquer
[NEVILLE, 1997]. O silicato dicálcico resulta da combinação da sílica com a cal presente
na composição do cimento; ocorre na forma de cristais relativamente grandes, exibindo
forma arredondada ou apresentando bordas irregulares, sem nenhuma evidência de forma
regular [PETRUCCI, 1981]. O silicato dicálcico é conhecido como belita e por
conveniência usa-se a sigla C2S para identificá-lo. Pode se apresentar nas formas
monoclínica e romboédrica. Reage lentamente com a água porque tem uma estrutura mais
regular, ou seja, mais estável que o C3S. Contribui para a resistência nas idades avançadas
[TAYLOR, 1990].
1.4.3 - Aluminato Tricálcico (3CaO.Al2O3)
Presente entre 0% e 15% na composição do cimento Portland [OLIVEIRA, 2002].
Apresenta-se sob a forma intersticial e, segundo Petrucci [1981], resulta da combinação da
alumina restante das demais combinações com a cal. Por conveniência usa-se a sigla C3A
para identificar o aluminato tricálcico. Geralmente é encontrado na forma cúbica ou
ortorrômbica, mas também pode ser encontrado na forma monoclínica. Reage rapidamente
e libera uma grande quantidade de calor [TAYLOR, 1990].
71.4.4 - Ferroaluminato Tetracálcico (4CaO.Al2O3.Fe2O3)
Está presente entre 5% e 15% na composição do cimento Portland [OLIVEIRA,
2002]. São cristais normalmente tubulares, sendo opaco a brilhante em superfície polida,
podendo se apresentar como preenchimentos intersticiais. Segundo Petrucci [1981], resulta
da combinação da cal com o óxido de ferro e a alumina, até esgotar-se o óxido de ferro. O
ferroaluminato tetracálcico é conhecido como ferrita e por conveniência usa-se a sigla
C4AF para identificá-lo. Encontra-se na forma monoclínica, tetraédrica ou octaédrica
[TAYLOR, 1990].
1.4.5 - Cal Livre (CaO)
Os principais fatores que possibilitam a formação da cal livre no clínquer anidro
são: formulação inadequada das matérias-primas, moagem e homogeneização inadequadas,
e a temperatura ou tempo de permanência insuficiente na zona de calcinação do forno [SHI
et al., 2002]. A presença acima de 2% é indesejável, pois segundo Min et al. [1995], possui
estrutura cristalina cúbica, que podem provocar expansões no cimento Portland durante a
hidratação convertendo-se em portlandita [Ca(OH)2].
1.4.6 - Magnésia (MgO)
A origem do óxido de magnésio no clínquer é devida à sua presença na maioria dos
calcários que constituem a matéria-prima do cimento. Segundo Liu et al. [2002], uma parte
do total do óxido de magnésio, isto é, até 2% pode entrar em solução sólida com várias
fases: alita, belita e aluminatos. O restante ocorre como MgO cristalino, denominado de
periclásio; possui estrutura cristalina e são influenciados pelas condições de resfriamento.
A reatividade do periclásio com a água é lenta e expansiva, causando muitas vezes danos
no concreto [COUTINHO, 1973].
1.4.7 - Compostos Alcalinos e Sulfatos
Os constituintes alcalinos, Óxido de Potássio (K2O) e Óxido de Sódio (Na2O),
presentes no cimento Portland, são principalmente provenientes dos componentes da argila
8e estão presentes na estrutura dos principais constituintes do clínquer, os silicatos e
aluminatos. O efeito dos álcalis na água reflete-se principalmente na elevação do pH da
solução, na diminuição da solubilidade do cálcio e aumento na solubilidade do silicato
[GOBBO, 2003]. Segundo Petrucci [1981], os álcalis reagem com alguns agregados e os
produtos destas reações causam a desintegração do concreto, notando-se também efeito
negativo no aumento da resistência do cimento. A origem da maioria dos sulfatos (SO3) é a
gipsita que é adicionada ao clínquer, com o propósito de inibir a reação imediata entre o
aluminato tricálcico e a água [NEVILLE, 1997].
1.5 – Reações durante o processo de clinquerização
Buscando relacionar as fases formadas durante o processo de clinquerização da
matéria-prima que origina o cimento, a tabela 1.2 apresenta as principais reações que
ocorrem a cada intervalo de temperatura no interior do forno onde é aquecida a matéria-
prima, destacando-se os compostos do clínquer formados durante o processo de
sinterização [CENTURIONE, 1993].
Tabela 1.2 - Principais reações do processo de sinterização do clínquer,
[CENTURIONE,1993].
Temperatura(ºC) Reação
100-200 Liberação de água livre 500-700 Desidroxilação dos argilominerais; transformação do quartzo-α em
quartzo-β. 700-900 Decomposição dos carbonatos, com liberação de CO2; primeiras
reações de estado sólido, levando à formação de aluminatos e ferro-aluminatos cálcicos [C12A7 e C2(AF)] e início de formação da belita (2CaO+SiO2→Ca2SiO4); conversão de quartzo-β em cristobalita.
900-1200 Conversão de ferroaluminatos e aluminatos em C4AF e C3A; formação da belita a partir da sílica remanescente e dos cristais de cal livre.
1200-1300 Cristalização das primeiras alitas (em torno de 1200ºC), a partir de cristais pré-existentes de belita e cal livre (Ca2SiO4+CaO→Ca3SiO5); a partir de aproximadamente 1280ºC inicia-se a formação de fase líquida a partir dos aluminatos e ferroaluminatos cálcicos, com conseqüente nodulização do clínquer.
Acima de 1350 Desenvolvimento dos cristais de alita.
91.6 - Principais produtos resultantes da hidratação do cimento Portland
Quando se estuda a hidratação do cimento Portland, o termo hidratação consiste na
totalidade de mudanças que ocorrem quando o cimento anidro, ou uma de suas fases
constituintes, é misturada com água [TAYLOR, 1990]. Então, a hidratação do cimento
pode ser caracterizada pela seqüência de reações químicas entre os compostos sólidos e a
água, levando a reação de pega e o enrijecimento das misturas cimento-água
[CHRISTENSEN et al, 2003]. O enrijecimento da pasta de cimento é caracterizado pela
hidratação dos aluminatos, enquanto a evolução da resistência mecânica é determinada
pelos silicatos hidratados [MEHTA e MONTEIRO, 1994]. Em outras palavras, em
presença de água, os silicatos e os aluminatos formam produtos de hidratação, que com o
decorrer do tempo, dão origem a uma massa firme e dura, que constitui a pasta de cimento
endurecida. Sabe-se que os silicatos de cálcio hidratados são as principais fases da pasta
endurecida do cimento Portland comum, mas existem outras fazes hidratadas presentes em
quantidades significativas e que exercem influência nas propriedades da pasta, sendo elas:
o hidróxido de cálcio e o sulfoaluminato de cálcio hidratado.
1.6.1 - Silicato de Cálcio Hidratado
É conhecido como tobermorita e representa 50 % a 60% do volume total de sólidos
presentes em uma pasta de cimento Portland hidratada [MEHTA e MONTEIRO, 1994],
cuja microestruta pode ser verificada na figura 1.1. O C3S ao entrar em contato com a água
inicia sua hidratação em poucas horas, sendo assim, considerado o principal responsável
pela resistência mecânica nas primeiras idades da hidratação. Em contrapartida, a
hidratação do C2S ocorre lentamente contribuindo pouco para a resistência mecânica nas
primeiras idades [TAYLOR, 1990]. Entretanto, segundo Mehta e Monteiro [1994], o C2S é
o responsável pela resistência mecânica nas idades mais avançadas (> 28 dias). Em relação
à morfologia, os silicatos de cálcio em contato com a água dão origem às fases C-S-H,
nome genérico dado para uma série de fases amorfas ou semi-cristalinas formadas após a
hidratação dos silicatos C3S e C2S devido à relação Ca/Si e ao teor de água quimicamente
combinada [BLACK et al, 2003].
10
Figura 1.1 - Micrografia obtida por MEV de uma pasta de cimento Portland com 3 dias de
idade mostrando cristais de C-S-H [MEHTA e MONTEIRO, 1994].
1.6.2 - Hidróxido de Cálcio [Ca(OH)2]
É conhecido como portlandita, e ocupa de 20% a 25% do volume de sólidos da
pasta hidratada e possui formas prismáticas (figura 1.2) [MEHTA e MONTEIRO, 1994]. O
hidróxido é formado pela presença de cal livre e pelas reações de hidratação dos silicatos
(C3S e C2S). Contribui pouco para a resistência da pasta de cimento endurecida, e por ser
solúvel em água, o Ca(OH)2 pode aumentar a permeabilidade da pasta, comprometendo a
durabilidade em meios sujeitos ao contato constante com a água. Além disso, possui
estrutura cristalina hexagonal [TAYLOR, 1990].
3 μm
Ca(OH)2
Figura 1.2 - Cristais de Ca(OH)2 presentes no cimento Portland hidratado [MEHTA e
MONTEIRO, 1994].
111.6.3 - Sulfoaluminatos de Cálcio Hidratados
Também denominado de etringita (C6AS3H32), segundo Mehta e Monteiro [1994],
ocupam de 15% a 20% do volume de sólidos na pasta endurecida e, conseqüentemente,
desempenha um papel menor nas relações estrutura-propriedades, mas é responsável pelo
fenômeno de pega e desenvolvimento da resistência inicial. Sua formação resulta da
hidratação do C3S na presença da gipsita [CHRISTENSEN et al, 2004]. Formado nas
idades iniciais de hidratação do cimento Portland, a quantidade de etringita aumenta com o
tempo produzindo cristais em forma de agulhas de variados tamanhos. Segundo Taylor
[1990], possui estrutura cristalina trigonal e sua formação pode causar danos pela
expansão. Nas idades iniciais, a expansão pode acontecer sem qualquer dano ao compósito,
porém, se a hidratação continuar na pasta já endurecida gera tensões internas provocando
fissuras e cavidades, e como conseqüência, a deteriorização do concreto.
A relação sulfato/aluminato no início da hidratação favorece a formação de
etringita, em forma de cristais prismáticos aciculares (figura 1.3). Quando a concentração
de sulfatos na mistura diminui devido à cristalização dos sulfoaluminatos de cálcio
hidratado, a etringita torna-se instável e é gradativamente convertido em monosulfato, que
possui estrutura planar (figura 1.3).
Figura 1.3 - Sulfoaluminatos de Cálcio Hidratado – etringita (C6AS3H32) e monossulfato
hidratado [MEHTA e MONTEIRO, 1994].
121.6.4 - Grãos de clínquer não hidratado
Dependendo da distribuição do tamanho das partículas de cimento anidro e do grau
de hidratação, alguns grãos de clínquer não hidratado podem ser encontrados na
microestrutura de pastas de cimento hidratado, mesmo após longo período de hidratação
[MEHTA e MONTEIRO, 1994]. Desta forma, dento da mistura, atua como material não
ligante, não contribuindo com as propriedades coesivas do cimento quando o mesmo é
hidratado.
1.6.5 - Vazios no Concreto
A resistência de um material está baseada na sua parte sólida, como conseqüência,
os vazios existentes prejudicam sua resistência. A reação de hidratação do cimento
Portland produz regiões densas formadas por fases sólidas e áreas porosas, podendo ser a
existência desses poros o resultado da compactação inadequada.
Segundo Mehta e Monteiro [1994], não se trata da porosidade total, mas da
distribuição do tamanho dos poros que controla efetivamente a resistência do concreto.
Essa distribuição do tamanho dos poros é afetada pela relação água/cimento e pela idade de
hidratação, onde os poros grandes influenciam principalmente a resistência à compressão e
a permeabilidade e os poros pequenos influenciam mais a retração por secagem.
Assim a porosidade da pasta de cimento se distribui da seguinte forma:
Poros entre as camadas de C-S-H: vazios muito pequenos, que não influenciam
na resistência da pasta.
Vazios capilares: representam os espaços não preenchidos pelos componentes
sólidos da hidratação do cimento. O volume total, e principalmente, a distribuição
do tamanho dos poros afetam a resistência da pasta. Poros de pequeno diâmetro
(menos que 50 nm) são descritos como pouco prejudiciais ao comportamento
mecânico.
Poros devido ao ar incorporado: possuem forma esférica, com dimensões
superiores aos vazios capilares. Podem ser decorrentes principalmente devido a um
mau adensamento do concreto. Os vazios de ar incorporado variam comumente de
50 a 200 μm. Devido a suas grandes dimensões reduzem bastante a resistência do
concreto e aumentam sua permeabilidade.
131.7 – Processo de hidratação do cimento Portland
Jawed et al [1983] em estudo realizado, apresentaram a curva de hidratação do
cimento Portland (figura 1.4), mostrando a evolução da taxa de liberação de calor pelo
tempo de hidratação. Assim, por meio desta curva, observa-se inicialmente a ocorrência de
um pico de calor decorrente da dissolução dos compostos anidros e formação da etringita;
depois vem o período de indução, em que há a diminui da velocidade de reação com pouco
calor liberado. Em seguida, inicia-se um novo pico devido a rápida formação de C-S-H e
CH, marcando o início da pega. Após algumas horas, ocorre o final da pega. A taxa de
liberação de calor continua aumentando até que ocorra uma diminuição da taxa de calor,
aproximadamente 30 ou 40 horas depois do início da hidratação. Nessa fase da hidratação
há a formação de monossulfoaluminato devido o aumento na concentração de aluminatos,
o que torna a etringita instável, apresentando um pequeno pico de liberação de calor. Essa
reação ocorre somente se houver aluminato disponível na mistura para reagir com a
etringita. Por fim, a taxa de liberação de calor diminui e a velocidade das reações torna-se
lenta, e ocorre a densificação do material cimentício.
Figura 1.4 – curva de calor de hidratação versus tempo de hidratação dos compostos do
cimento Portland [JAWED et al, 1983].
141.8 – Desenvolvimento da Microestrutura do Cimento Portland Hidratado
Para o estudo do desenvolvimento da microestrutura em uma pasta de cimento é
conveniente considerar o processo em termos de períodos inicial, intermediário e final de
hidratação. A figura 1.5 mostra graficamente a seqüência das mudanças ocorridas por um
típico grão de cimento durante o processo de hidratação do cimento Portland observado
por Scrivener [1984].
No período inicial, que ocorre durante as três primeiras horas de hidratação, após
a mistura do cimento com água, uma camada gelatinosa ou membrana se forma sobre a
superfície dos grãos anidros (figura 1.5a). Esta membrana ou camada gelatinosa é
provavelmente amorfa, coloidal e rica em óxido de alumio (alumina) e óxido de silício
(sílica), podendo conter também porções significativas de cálcio e sulfato. Em torno de 10
min pequenos bastões de etringita em forma de agulha também são observados, e estes
ocorrem tanto na superfície do grão como distante dele (Fig. 1.5b) [SCRIVENER, 1984].
Possuem aproximadamente 250 nm de comprimento com 100 nm de espessura. Eles são
provavelmente mais abundantes próximos à superfície dos aluminatos, mas aparecem na
solução como também na superfície externa da camada de gel [TAYLOR, 1990].
No período intermediário, que ocorre após 3 h até 24 h de hidratação, cerca de
30% do cimento encontra-se hidratado. Este período também é caracterizado pela rápida
formação de C-S-H e Ca(OH)2. O Ca(OH)2 forma grandes cristais dentro dos espaços
anteriormente preenchidos pela água. O C-S-H forma uma fina camada sobre a superfície
do grão e que envolve os pequenos bastões de etringita mencionados no parágrafo anterior
(Fig. 1.5c). Uma porção considerável de C-S-H se forma até as 3 h de hidratação, sendo
que após 4 h os grãos encontram-se completamente envolvidos por este C-S-H formado. A
camada de gel cresce em direção a região externa do grão, e em torno de 12 h apresenta
uma espessura de 0,5 a 1,0 µm e assim começa a se incorporar com os grãos adjacentes.
Durante o final do período intermediário de hidratação um novo crescimento de
cristais de etringita acontece. Estes cristais são notavelmente mais aciculares do que os
cristais formados anteriormente; seus comprimentos estão entre 1 a 2 µm, mas as vezes
podem apresentar comprimentos próximos de 10 µm (Fig. 1.5d) [SCRIVENER, 1984].
Após as 24 h iniciais de hidratação tem-se o período final de hidratação. Assim
com a diminuição da permeabilidade da membrana ocorrendo, o C-S-H começa também a
se depositar no seu interior como conseqüência da hidratação do C3S (alita). Grãos
15menores de 5 µm reagem completamente após o fim do período intermediário, e depois
que o C-S-H se deposita dentro da membrana. O produto proveniente da hidratação se
expande da parte interna para fora da membrana e é absorvido pelas membranas adjacentes
dos grãos maiores em contato. Com estes grãos maiores, o espaço entre a membrana e o
núcleo é preenchido e em torno de 7 dias este espaço desaparece; neste estágio, as
membranas possuem espessura de 8 µm e consistem principalmente de material que foi
depositado na sua superfície interior (C-S-H) (Fig. 1.5e e Fig. 1.5f).
Concentrações de SO4 se encontram dentro da membrana como conseqüência da
hidratação dos aluminatos e assim os monosulfatos se formam dentro da membrana; a
etringita formada inicialmente nesta região vai sendo substituída pelo monosulfato como
resultado da contínua reação de hidratação dos aluminatos. Uma amostra pode mostrar a
existência tanto de monosulfato dentro da membrana como de etringita fora dela. Neste
estágio, quantidades significantes de etringita podem persistir; provavelmente este fato se
deve pela existência de material que precipitou na região externa da membrana [TAYLOR,
1990]. Assim, após o preenchimento dos espaços entre a membrana e o núcleo do grão, o
processo de hidratação se torna lento, em contraste com as primeiras idades de hidratação.
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