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DOI: http://dx.doi.org/10.11606/issn.1982-8160.v8i1p81-92

V. 8 - Nº 1 jan./jun. 2014 São Paulo - Brasil THOMAS TUF TE | OSCAR HEMER p. 81-92

T H O M A S T U F T E **

O S C A R H E M E R ***

ComDev no mundo midiatizado*

ComDev in the mediatized world

* Publicado originalmentena Nordicom Review, vol. 33,Número especial, p. 229-237Jul. 2013. DOI: http://dx.doiorg/10.2478/nor-2013-0038

** Pro essor de Estudosde Comunicação noDepartamento deComunicação, Negócios eTecnologia de In ormaçãoda Universidade de RoskildeRoskilde, Dinamarca.E-mail: ttu [email protected]

*** Pro essor-Assistente eCoordenador Mestrado emComunicação parao Desenvolvimento daUniversidade de Malmö,Skåne, Suécia. E-mail:[email protected].

RESUMONo m de , nos encontramos no início de uma revolução que pode ou não ser maisabrangente que aquela vista em . Um denominador comum nessa revolução é opoder mobilizador da mídia social. Mesmo que rótulos como revolução doTwitter ou doFacebook sejam re utados, a Primavera Árabe é um exemplo claro de um poderde comunicação sem precedentes, ora do controle das autoridades. Apesar do papelcrucial da mídia e da comunicação nos processos de mudança social nalmente setornar evidente, ele não está, contudo, associado ao campo da comunicação para o

desenvolvimento. Ainda que esse campo historicamente tenha desenvolvido receitasnormativas da comunicação para algum desenvolvimento, é hora da sua atenção voltar--se a processos de mudança deliberativos e não institucionais.Palavras-chave: Globalização, midiatização, desenvolvimento

ABSTRACTIn late we are in the beginning o a revolution that may or may not turn out tobe more far-reaching than the one unleashed in . A common denominator inthis revolution is the mobilizing power o the social media. Even i labels such as theTwitter or Facebook revolution are re uted, the Arab Spring is a clear-cut example oan unprecedented communication power, out o the authorities’ control. While thecrucial role of media and communication in processes of social change at last becomesevident, it is however not associated with the eld of communication for development.While that eld historically has been about developing prescriptive recipes o com-munication for some development, it is time attention is re ocused to the deliberative,non-institutional change processes.Keywords: Globalization, mediatization, development

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INTRODUÇÃO

Q de Berlim foi derrubado, em , todos soube-

mos que estávamos testemunhando a História acontecendo. Mas nãosabíamos que processos de transformações globais que eram tanto

causa quanto e eito do m da Guerra Fria iriam, nas décadas seguintes, serre eridos comoGlobalização. O conceito oi cunhado, naquele mesmo ano,pelo sociólogo da cultura Roland Robertson (Robertson, ). No entanto,

oi só em meados dos anos que realmente pegou (Castells, , , Held et al. ). E permaneceu controverso por muitos outros anos, com

orte posicionamento a avor e contra. Os céticos armavam ser apenas outroeufemismo para o capitalismo global neoliberal – não havia nada de novo nele.

(Paradoxalmente, o movimento antiglobalização aparece, em retrospecto,como talvez a mais notável evidência da globalização.) Agora, a palavra perdeusua antiga vantagem provocadora. Mesmo seus antigos oponentes ervorososfalam desapaixonadamente sobre a globalização como uma das condiçõespara o desenvolvimento mundial.

No momento da elaboração desse artigo, no nal de , estamos nocomeço de outra revolução histórica – que pode ou não ser ainda mais abran-gente do que a vista em . Começando na Tunísia, onde foi espirituosamentebatizada detunisami conforme se espalhava para o Egito e pelo resto do mundoárabe. Governos ocidentais – e a mídia ocidental – foram tomados de surpresa.

A mobilização social no Oriente Médio coincidia com uma nova crise nan-ceira na Europa e nos EUA, e os protestos populares se espalharam até Grécia( Aganaktismenoi), Espanha (Indignados), através do Pacíco ao Chile (Inviernochileno), e chegou aos EUA (Occupy Wall Street ). Alcançou também, em formasmenos articuladas e destrutivas, o Reino Unido (England riots).

Um denominador comum nessa revolução ressurgente, que se mostroucapaz de derrubar três governos autoritários (na Líbia com a prestativa assis-tência dos antigos aliados ocidentais do recém- alecido general Gadaffi), é opoder mobilizador danova, assim chamada mídia social. Mesmo que rótuloscomo revolução doTwitter ou doFacebook sejam merecidamente re utados, aPrimavera Árabe em andamento, que em alguns lugares se tornou verão, e emoutros, outono, é um exemplo claro de um poder de comunicação novo e semprecedentes, que está amplamente ora do controle das autoridades. (E assimcomo os protestos ingleses, aparentemente sem outra razão especíca além dopróprio protesto, e em muitos casos atraindo reações diametricamente opostasda mídia ocidental.)1 O que testemunhamos agora, em grande medida, sãoas consequências da globalização, mas igualmente, estão associadas a outroconceito, também elusivo e abrangente: Midiatização .

1. Para uma análise apro-undada do duplo poder

da mídia social, tanto emmobilizar em direção àdemocracia, quanto em

oprimir, ver o trabalho daestudiosa de mídia ameri-co-palestina e documen-

tarista Helga Tawil-Souri.

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e experiência acumulados, e um número recorde de novos estudantes matri-culados e inscritos.

Em Roskilde, a pesquisa em comunicação para o desenvolvimento evoluíraesporadicamente desde a década de . O fato de que a RUC estava sediando omaior programa de pesquisa em estudos de desenvolvimento na região nórdicae o maior programa de estudo de comunicação na Dinamarca indicava umfuturo promissor. A partir do começo da década de , os cursos mais expli-citamente envolvidos com a ComDev foram oferecidos e um número crescentede estudantes conectou análises da comunicação e desenvolvimento em seustrabalhos de tese. Cerca de - teses na última década se voltaram à direçãoda comunicação para o desenvolvimento e a mudança social.

Em , coeditamos a antologia Media and Glocal Change, que desdeentão serviu como uma leitura fundamental para os estudantes de mestrado, nãoapenas em Malmö e Roskilde, mas em muitas das ainda relativamente poucasuniversidades ao redor do mundo que oferecem cursos em comunicação para odesenvolvimento e mudança social. O livro foi lançado simultaneamente com acriação, em Los Baños, Filipinas, da primeira Rede Universitária internacionalno campo, com Malmö e Roskilde como dois dos doze membros- undadores4.A revista online do mestrado ComDev,Glocal Times, oi lançada em conjuntocom a antologia Media and Glocal Changes em , com a intenção de setornar “uma re erência digital indispensável e um órum vívido para a discus-

são e disseminação de questões sobre comunicação para o desenvolvimentoe a mudança social”. Com suas até agora edições,Glocal Times, de ato, seestabeleceu como um pilar indispensável da empreitada ComDev. Muitos dosestudiosos e praticantes de renome do campo guram entre seus colaboradores,e a revista online, que a partir de agora toma passos importantes para se tornarum periódico cientíco aberto, serviu como fórum para os pós-graduandos doMestrado de Malmö e Roskilde com orientação ComDev apresentarem suasteses a uma audiência global.

Igualmente importante na região foi a emergente pesquisa, no campo maisamplo da comunicação, cultura e mudança social. A partir de , tantopequenos quanto grandes projetos oram realizados em áreas como a comuni-cação para a saúde (Tufe, e no prelo/ ), cultura; memória e mudançasocial (Hemer, e ; Høg Hansen, e ); comunicação participativa (Tufe e Me alopulos, ); mídia social (Gansing, ; Wildermith,

a; Ekström, Høg Hansen e Boothby, ); comunicação, cidadania e empo-deramento (Navarro, e ; Tufe e Enghel, ; Wildermuth, b)gênero sexual, comunicação e cultura popular (Andreassen, ; Ekström,

), celebridades e auxílio ao desenvolvimento (Richey e Ponte, ).

4. A rede enquanto tal nãoestá mais em operação,contudo o encontro deLos Baños serviu para

iniciar uma colaboraçãoin ormal, mas continuada,

entre muitos partici-pantes, por exemplo, ointercâmbio de pessoal

e desenvolvimento decurso com a Universidade

de Guelph no Canadá.

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O que começou como colaboração interpessoal ao longo do estreito deÖresund, que separa a Suécia da Dinamarca, se associou a um ambiente depesquisa e, desde , oi institucionalizado no Ørecomm, uma plata ormatransnacional estabelecida pelas universidades de Malmö e Roskilde, mas ser- vindo como comunidade de investigação transnacional, oferecendo suportee buscando colaborações em projetos de pesquisa, con erências e seminários,assim como no ensino e parcerias com prossionais. Hoje nossa comunidade écomposta por cerca de membros, dos quais dez são estudantes de doutorado.Assim, também começamos a ver os contornos do que, esperamos, possa sedesenvolver como um programa transnacional de doutorado no campo5.

COMDEV ENTRE A MIDIATIZAÇÃO E A GLOBALIZAÇÃOEm retrospecto, nossos doze anos de colaboração parecem ser uma história desucesso. Mas o Mestrado ComDev em Malmö e a emergente colaboração empesquisa inter-regional foram, de fato, resultado de uma série de circunstânciasfelizmente coincidentes. Da mesma forma que a Globalização ocorreu, de acordocom Castells, não por determinismo histórico – como Marxistas ou Liberais vitoriosos armariam – mas na verdade por conta do acaso.

É um importante e intrigante ponto, que o mundo poderia ter acabadobem diferente. E, em consequência, que pode – e provavelmente irá – ser muitodi erente daqui a doze anos. A década de oi delimitada por dois eventos

marcantes na Europa e nos EUA: a queda do Muro de Berlim em , e o desetembro de . A primeira década do novo milênio foi marcada pela Guerraao Terrorismo, mas ainda mais importante, pela ascensão de novos podereseconômicos (Brasil, Rússia, Índia e China). Em termos de comunicação, a trans-

ormação dos anos continuou em ritmo ainda mais acelerado. A revoluçãodigital é talvez o mais próximo a que cheguemos de uma revolução permanente.Todos os setores da cultura e sociedade estão saturados com, e cada vez maisinuenciados pela, comunicação mediada. Para a ComDev, a midiatização,como a globalização, cada vez mais desaa nossa pesquisa e agenda de estudo.Quais são as relações causais entre o desenvolvimento da mídia, a agência e amudança social? E como estudamos essas dinâmicas? Essas são questões-chavepara Ørecomm. A mídia inuenciando a sociedade não é, em si, um fenômenoinédito – nem uma ideia nova. Dependendo de como denimos “a mídia”, elapode retroagir até aPoética de Aristóteles, ou pelos menos até a teoria de mídiade Marshall McLuhan dos anos , com citações marcantes comoo meio é amensagem. Entre os estudiosos da ComDev, Jesús Martín-Barbero foi o primeiroa fazer uso sistemático do conceito demediação ( ), desenvolvendo umenquadramento analítico pro undo – mapa noturno, como ele chama – para

5. Como pode ser vistonos exemplos acima e nasequência da discussão,nossa (re)de inição dessecampo é muito mais amplado que a compreensãotradicional da comuni-cação para o desenvolvi-mento. Essa reorientaçãoé, acreditamos, umaexplicação importantepara o sucesso da ComDev.

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estudar as relações entre as subjetividades, as trajetórias culturais e a culturapopular, e o uso da mídia nesse contexto, movendo, dessa orma, o oco dasanálises midiacêntricas da mídia e sociedade, para centrar-se na mídia e emseu uso cotidiano. Martín-Barbero foi o principal expoente da valiosa pesquisados estudos culturais latino-americanos que surgiu a partir dos anos . Tevemuitas similaridades com os estudos culturais que emergiram no Reino Unidoao mesmo tempo, ambas as tradições precederam à atual proliferação de estudossobre a midiatização que foram deagrados pela crescente onipresença da mídianão apenas nas práticas culturais das pessoas comuns, mas também nas lógicase práticas de organizações e instituições na sociedade. Na descrição do atualprojeto de pesquisa Mediatized Worlds , os pesquisadores alemães de mídia

Friedrich Krotz e Andreas Hepp descrevem, portanto, a midiatização como“um processo de desenvolvimento compreensivo similar à globalização eà indivi-dualização” (www.mediatizedworlds.net )6. De fato, globalização e midiatizaçãoestão, é claro, inseparavelmente enredadas. O que vemos agora, podemos dizer,são os e eitos sinergéticos desses dois processos entrelaçados. Em sua trilogiasobre a Sociedade em Rede, Castells curiosamente não teve muito a dizer sobrea mídia e a comunicação em particular. EmO Poder da Comunicação ( ),sua continuação à trilogia, entretanto, ele realmente coloca a comunicação em

oco como a chave para a política, a economia e todos os campos de interaçãohumana na sociedade em rede, armando que “o poder na sociedade em rede

é o poder da comunicação”. Consequentemente, para a ComDev, permanece odesao de compreender o papel da mídia e o poder da comunicação nos níveismeta, meso e micro na sociedade. Remete-nos às preocupações clássicas dasrelações causais entre mídia e comunicação, por um lado, e a mudança sociale cultural por outro. Os processos de globalização e midiatização estão nocentro de tais análises.

O desenvolvimento também está fazendo seu retorno triunfal, nos últimostempos, depois de ter sido questionado e rejeitado tanto por neoliberais quantopor antiliberais. Na atual crise nanceira global – que é principalmente umacrise da América do Norte e da Europa Ocidental – testemunhamos o que osociólogo Jan Nederveen Pieterse ( ) descreveu como a implosão do modeloneoliberal anglo-americano e o retorno do estado de desenvolvimento (nãonecessariamente democrático). Isso sem dúvida terá enormes implicações para acooperação de desenvolvimento internacional. A indústria de desenvolvimentobilateral e multilateral, até recentemente dominada pelas potências Ocidentaise pelo Japão, agora é emaranhada e desaada pelos novos modelos para odesenvolvimento social e econômico, aos quais os países pobres aspiram. AChina, a Índia e, em grau menor, mas possivelmente crescente, o Brasil, são

6. Para um panoramacompreensivo da

área emergente deestudo, ver Couldry,Hepp e Krotz 2010.

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os modelos abrangentes. Com a recente entrada da China como um poderosoator no cenário do desenvolvimento africano, oferecendo enormes concessões einvestimento, e sem nenhuma condicionalidade desagradável, exceto o acesso àextração de recursos naturais, a economia política, lógicas e dinâmicas políticasda indústria do desenvolvimento estão fundamentalmente mudando. Dessa

orma, o desenvolvimento entrou novamente em cena, mas de ormas novase trans ormadas.

AGENDAS EMERGENTES PARA O CONHECIMENTO EM COMDEVA proeminência renovada tanto da comunicação quanto do desenvolvimento,devido à combinação de globalização e midiatização deveria implicar um novo

impulso para a comunicação para o desenvolvimento. Os desenvolvimentosintensos da mídia, o bastante difundido ativismo político, as redes de defe-sa transnacional, em plena ascensão de uma gigantescaação de baixo paracima, representam novos desaos para a nossa conceitualização da ComDev.O ambiente em mudança da indústria de desenvolvimento, como descritaacima, também apresenta novos desaos tanto aos pesquisadores quanto aosprossionais.

É ácil prever que o mundo terá de en rentar, nos próximos anos, desaosmais severos e complexos de comunicação, com os quais os atuais agentes dedesenvolvimento não estão adequadamente preparados para lidar. Um desa-

o central nesse campo deve ser, de ato, ultrapassar o obstáculo da própriaindústria do desenvolvimento. Os agentes ocidentais tradicionais de desenvol- vimento estão se habituando ao novo ímpeto de desenvolvimento e mudançasocial – aqueles que são conduzidos por movimentos sociais de todos os tipos,iniciativas de base e de baixo para cima, que na maioria dos aspectos operammuito diferentemente das tradicionais organizações de desenvolvimento, sejamelas governamentais ou não.

Paradoxalmente, o papel da mídia e da comunicação na cooperaçãoem desenvolvimento presenciou uma estranha guinada depois do primeiroCongresso Mundial sobre Comunicação para Desenvolvimento, ocorridoem Roma em e coordenado pela Organização das Nações Unidas paraAgricultura e Alimentação (FAO), pelo Banco Mundial e pela CommunicationInitiative, em parceria com uma ampla vertente de organizações importantesdo campo. O encontro em Roma conseguiu mobilizar quase mil participantesda pesquisa e da prática, governamentais e não governamentais. Seu intuitoera marcar uma ruptura denitiva na ciência e na prática da ComDev. Aoinvés disso, o que aconteceu teve mais o caráter de uma implosão do campo daComDev, que apenas recentemente começou a ganhar novo impulso.

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Hoje, estamos vendo uma extensa série de novas iniciativas institucionaisno mundo da ComDev, tanto em práticas quanto no desenvolvimento curricularda universidade. Por exemplo, a UNICEF recentemente revisou sua estratégiade ComDev e seu trabalho, clamando por uma conexão mais forte com asuniversidades e desenvolvendo uma capacidade bastante di undida dentro desua própria organização global. No nível universitário, novos mestrados emComDev se desenvolveram em lugares como Albânia, Á rica do Sul, Quênia,Espanha, Paraguai, Reino Unido e Colômbia – todos nos últimos três anos.O campo está nalmente se tornando signicativamente mais instituciona-lizado no mundo acadêmico, apesar de ainda ter diculdade em encontrarsua identidade entre os estudos de mídia e de comunicação, por um lado, e os

estudos culturais, a ciência política e, não menos importante, os estudos dodesenvolvimento em alguns dos outros lados. A interdisciplinaridade envol- vida na ComDev, combinada com os processos delineados na globalização,na midiatização e a proli eração da ação de baixo para cima contribuem paracolocar a ComDev em uma encruzilhada.

A midiatização e a recorrente mobilização social por meio de novasmídias estão no âmago das questões que desaam o campo da ComDev 7.Tradicionalmente, as comunicações para o desenvolvimento foram associadasa grandes instituições, bilaterais ou multilaterais, e/ou a pequenas ONGs quetrabalham próximas a ou são completamente dependentes dessas instituições

maiores. Agora, esseespaço que incita a participação , que as práticas institu-cionalizadas de ComDev ofereceram aos cidadãos, está sendo severamentedesaado pelos espaços impulsionados pelos cidadãos, ou o movimento demídia social, como o estudioso John Downing descreve-os (Downing, ).

Ainda que a participação tenha sido o termo em voga mais notável –comunicação participativa – a ação permaneceu amplamente nas instituições eorganizações queconvidaram os cidadãos a participar, se mobilizar e atuar. Analidade de iniciativas de comunicação estratégica pode, no m das contas,estimular a atividade de base – mas quando a iniciativa vem realmente daprópria base, os agentes de desenvolvimento são, muitas vezes, surpreendidos.O ano de oi paradigmático nesse sentido. A compreensão ainda comumda ComDev como intervenções de comunicação estratégica por agentes dedesenvolvimento do mundo desenvolvido – ou seja, Ocidente + Japão – empaíses em desenvolvimento, ainda referidos como de terceiro mundo8 – éobviamente obsoleta. O conceito já era ultrapassado em , com o m daGuerra Fria. Mas a antiga concepção de Comunicação para o Desenvolvimento– como meio de atingir um desenvolvimento, ou seja, a modernização, atravésda comunicação, quer dizer, campanhas de informação para a difusão das

7. Também são umdesa io para os estudos de

Cultura e Mídia, que nasúltimas décadas tendema en ocar as audiênciase a recepção – como aspessoas interpretam a

mídia, mas não tanto sobrecomo azem uso dela para

a ação política e social.

8. O termo provém dostempos da Guerra Fria, da

liberação pós-colonial e daformação do movimento dospaíses não alinhados. O pri-meiro mundo era a Europa

Ocidental, a América doNorte, a Austrália e o Japão,

ou seja, mais ou menos omundo liberal capitalista.

O segundo mundo era omundo socialista da União

Soviética e seus satélitesorientais. O terceiro mundo

era composto peloresto,misturando países comple-

tamente diferentes comoMéxico, Arábia Saudita ePapua Nova Guiné – e as

duas Coreias! (A Coreia doSul ainda era vista nos anos

70 como parte do terceiromundo). E tanto a China

quanto a Índia, é claro.

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subjugados. Os desaos do desenvolvimento, a exclusão de muitas pessoasdos processos de desenvolvimento, estão no cerne do que está ocorrendoglobalmente agora mesmo.

Estamos vendo uma remodelagem dos ambientes de mídia – as paisagensmidiáticas, para usar o termo do antropólogo indo-americano Arjun Appadurai( ) – na qualvelhas e novas mídias convergem em formas em contínuamudança, radicalmente transformando as arenas da opinião pública e a agência– redenindo o próprio conceito da es era pública – e trazendo novas ormasde expressão que ultrapassam as antigas ronteiras de gênero e mídia.

Além disso, devemos estar cientes que o novo poder da comunicação tam-bém pode ser usado para nalidades destrutivas. Nos últimos tempos, desde

de julho de , o oco – pelo menos na Escandinávia – tem sido, em grandemedida, no que pode ser chamado de lado negro da midiatização: a mistura dediscurso de ódio anônimo, racismo e xeno obia em certos sites da internet queagressivamente estimulam o fundamentalismo de direita por toda a Europa. Domesmo modo que a proliferação da nova mídia destaca a abertura e expande asperspectivas daqueles que já têm uma mente aberta, pode também servir paratornar mais estreitas às daqueles mais limitados. O massacre de adolescentesengajados politicamente na ilha norueguesa de Utøya demonstrou a tênue linhaentre as visões de mundo completamente distorcidas das comunidades online,e as ações criminosas, como as tomadas por um autodenominado Cruzado9.

Na conclusão do painel sobre a “Nova Mídia no Oriente Médio” na con-erência da IAMCR em Istambul, em , Marwan Kridy do Líbano, que é

tanto pesquisador de mídia quanto especialista no Oriente Médio, associou aatual moda da mídia social com a alegoria de Platão sobre a caverna – ou seja,a noção que estamos presos em uma caverna vendo o mundo real, ou o mundode ideias, meramente como sombras projetadas na parede da caverna.

Encontramos na caverna digital uma útil metá ora para o paradoxo dessemomento histórico que nenhum de nós é capaz de compreender. Apesar de serimportante para nós como pesquisadores da ComDev sair da caverna – tambémé importante examinar e entender os mecanismos que dão orma e mantêmessa caverna virtual.

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9. Ver, por exemplo, o

comentário de ThomasHylland Eriksen no evento“Anders Behring Breivik :

Tunnel vision in an onlineworld”,The Guardian ,

25 de julho de 2011.

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