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Cinema e Psicologia Processos Psicológicos Básicos à Luz das Teorias Cinematográficas Cristiane Nova Cinema e Psicologia Processos Psicológicos Básicos à Luz das Teorias Cinematográficas Cristiane Nova e Helen Copque * Resumo: O artigo faz uma discussão sobre as relações do Cinema com temas da Psicologia, embasada em diferentes abordagens teóricas sobre o Cinema, a exemplo das reflexões de Munsterberg, de Arnheim, da Filmologia, de Morin, da Semiologia, da Psicanálise e da Teoria Analítica/Cognitivista. Visto que a teorização fílmica ainda não construiu uma análise dos seus dispositivos a partir da perspectiva do Behaviorismo Radical, o texto tem ainda como objetivo contribuir nessa discussão, trazendo alguns conceitos que ajudam a levantar hipóteses sobre o funcionamento dos processos básicos psicológicos, especialmente a percepção e a atenção, aplicados ao Cinema. 1 / 69

Cinema e Psicologia Processos Psicológicos Básicos à Luz ...revistas.unijorge.edu.br/intersubjetividades/pdf/2009_Artigo2.pdf · Cinema e Psicologia Processos Psicológicos Básicos

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Cinema e Psicologia Processos Psicológicos Básicos à Luz das Teorias Cinematográficas Cristiane Nova e Helen Copque* Resumo: O artigo faz uma discussão sobre as relações do Cinema com temas da Psicologia, embasada em diferentes abordagens teóricas sobre

Cinema e PsicologiaProcessos Psicológicos Básicos à Luz dasTeorias Cinematográficas

Cristiane Nova e Helen Copque*

Resumo: O artigo faz uma discussão sobre asrelações do Cinema com temas da Psicologia,embasada em diferentes abordagens teóricassobre o Cinema, a exemplo das reflexões deMunsterberg, de Arnheim, da Filmologia, deMorin, da Semiologia, da Psicanálise e daTeoria Analítica/Cognitivista. Visto que ateorização fílmica ainda não construiu umaanálise dos seus dispositivos a partir daperspectiva do Behaviorismo Radical, o textotem ainda como objetivo contribuir nessadiscussão, trazendo alguns conceitos queajudam a levantar hipóteses sobre ofuncionamento dos processos básicospsicológicos, especialmente a percepção e aatenção, aplicados ao Cinema.

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Palavras-chave: cinema, psicologia, cinema epsicologia, cinema e behaviorismo radical,espectatorialidade.

As relações entre o cinema e a psicologiaconstituem-se objeto de reflexão de muitosteóricos, desde o surgimento do cinematógrafo.Não é por acaso que se tornou famoso o caso(considerado por muitos como uma lenda) deuma das primeiras exibições públicas de umfilme, em 1895, na qual a imagem de um tremse descolando deslocando na tela teriaprovocado medo em alguns expectadores,dada a verossimilhança das imagens emmovimento. Esse exemplo nos conduz a refletirsobre uma das principais características docinema: criar uma ilusão representativa, quefaz com que os espectadores vivenciem ouniverso diegético  do filme como realidade.Isto se dá graças à capacidade do cinema de

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reproduzir fotográfica e mecanicamente asimagens e de restituir o movimento, a duraçãoe o ambiente sonoro de situações narradas.Esta ilusão representativa foi tomada peloscriadores da linguagem cinematográfica comoum elemento essencial para a construção dasnarrativas ficcionais e como fórmula paragarantir a atenção dos espectadores. Comoafirma Betton:Desde o início do cinema, buscou-se umareprodução cada vez mais fiel e completa darealidade (...) a imagem fílmica suscitacertamente um sentimento de realidade (...) édotada de todas as aparências da realidadepara o espectador. Mas o que aparece na telanão é a realidade suprema, resultado deinúmeros fatores ao mesmo tempo objetivos esubjetivos, imbricações de ações e interaçõesde ordem ao mesmo tempo física (integração eparâmetros “sensoriais” e, principalmente, docontinuum espaço-tempo) e psíquica (comtodos os sentimentos e reflexos pessoais); oque aparece é um simples aspecto (relativo e

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transitório) da realidade, de uma realidadeestética que resulta da visão eminentementesubjetiva e pessoal do realizador. É notávelcomo que esse realismo captado pelapercepção (...) possa se misturar intimamente ede modo tão fecundo àa magia, ao sonho, aofantástico, àa poesia . (BETTON, 1987, p.9 ). Mas para que esta ilusão se efetive comsucesso, são necessários alguns elementosadicionais na criação dos filmes. Um desteselementos é a verossimilhança. O verossímildiz respeito a tudo que existe num filme quesugere uma associação com a realidade, desdeo processo de ilusão representativa, até aadoção de convenções técnicas e narrativasque vão se padronizando, se difundindo e setornando tão habituais para os espectadores,que estes passam a vê-las comorepresentação real do mundo perceptível. ParaChristian Metz,a obra verossímil quer ser equer ser tida como diretamente traduzível emtermos de realidade (...) Trata-se de se fingir deverdadeiro (...) O verossímil é simplesmente

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este batalhão suspeito de procedimentos etruques que procura tornar o discurso natural eque se esforça em disfarçar a regra,mascarando-a para escondê-la do grandepúblico. Não existe um Verossímil, existemapenas convenções aceitas como verossímeis.(METZ, 1972, p.239-40)Essas convenções (de atuação, de montagem,de fotografia, de composição de cenário etc.)transformam-se com as mudanças culturais e aevolução das técnicas cinematográficas.Trata-se de um processo de naturalização deum tipo de representação construído com oobjetivo de ocultar suas marcas enunciativas. Um dos primeiros teóricos a sistematizar esseprocesso foi Andre Bazin, que, através danoção de decupagem clássica,  abriga umconjunto de parâmetros formais que incluempráticas de montagem, trabalho de câmera esom. O autor evoca a relevância de elementoscomo a coerência interna, a causalidade linear,o realismo psicológico, a aparição dacontinuidade espacial e temporal, dentre

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outros, para a construção do universo diegéticodos filmes. Não podemos deixar de assinalarque a atualização da noção de perspectiva e ouso da estrutura narrativa da literaturadominante no século XIX pelo cinema sãotambém componentes que fortalecem orealismo cinematográfico. Esses padrões também devem ser levados emconsideração, para que o espectador possacompreender a história, tanto do ponto de vistadenotativo quanto conotativo. Essainteligibilidade do filme passa por algumasinstâncias, como: 1) a simulação perspectiva;2) o reconhecimento dos objetos, ações e sons;3) os “códigos de nominação icônica”, queservem para dar nome aos objetos e aos sons;4) os códigos cinematográficos (a exemplo damontagem, movimentos de câmera, iluminaçãoetc.); 5) a coerência interna da narrativa; 6) aordem da narrativa e seu ritmo, que sãoestabelecidos em função de um tipo de leiturado filme que é, assim, imposto ao espectador.(AUMONT et al., 1995).

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Através da manipulação desses elementos, umfilme consegue manter a atenção doespectador, construir pontos de vista, assimcomo induzir emoção em relação às situaçõesapresentadas e a certos personagens.Hitchcock tem uma frase célebre que sintetizaessa possibilidade:Com Psicose, eu dirigia espectadores,exatamente como se estivesse tocando órgão(...) Minha principal satisfação é que o filmeagiu sobre o público (...) Em Psicose, o temapouco me importa, os personagens meimportam pouco, o que me importa é que amontagem dos fragmentos de filme, afotografia, a trilha sonora e tudo o que épuramente técnico conseguiam arrancar berrosdo público. (...) O modo de construir a história ede contá-la levou o público a reagir de ummodo emocional. (TRUFFAUT, 1984,p.273;287).Estamos aqui focalizando a maneira como osfilmes constroem o lugar virtual do espectador,ou seja, analisando os elementos fílmicos que

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foram produzidos visando o controle emocionalde um espectador potencial, chamado na teoriado cinema de espectatário. Não devemosconfundir o espectatário com o espectador,visto que este é sempre um indivíduo particular,cuja subjetividade e contexto vão atuar, ao ladoda espectatorialidade, como elementosconstrutores da significação e inteligibilidade deum filme.Nesse sentido, por mais bem planejada queseja a espectatorialidade de uma narrativa, sualeitura jamais será completamente passiva eprevisível. A história do sujeito e o contexto derecepção do filme interferem e podemtransformar seu processo de significação. Emfunção desta variável, a teoria do cinematambém se ocupa com o estudo dos processosde sensação, percepção, emoção, motivação einterpretação construídos por imagens e sons.Há ainda uma vertente de pesquisa queconcebe os filmes como discursosmodeladores de valores e comportamentos degrupos sociais. Grande parte dos estudos

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sobre o cinema enquanto veículo depropaganda partem dessa perspectiva.Retomaremos, a seguir, as discussões dessesaspectos da relação do cinema com apsicologia, esboçados brevemente acima, à luzde algumas perspectivas da teoriacinematográfica. Inicialmente, destacaremos asabordagens de Munsterberg (1916) e Arnheim(1937).Cinema como Construção MentalHugo Munsterberg foi, sem dúvida, o primeiroteórico a se ocupar das relações entre ocinema e a psicologia, através do livro “ThePhotoplay. A Psychological Study”, de 1916,momento em que a linguagem cinematográficaencontrava-se num estágio embrionário.Apesar disto, o autor conseguiu identificar edescrever muitas das estratégias psicológicasutilizadas pelo dispositivo cinematográfico,complexificadas nos anos 20. Ao antecipardiversas discussões que seriam retomadasposteriormente por outros teóricos, este textoconstitui-se numa referência fundamental para

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o estudo dos aspectos psicológicos do cinema.Sua principal tese sinalizava para o fato de queo espectador seria um sujeito ativo no processode significação fílmica, preenchendopsicologicamente os vazios e lacunas danarrativa cinematográfica, através dosprocessos da atenção, da memória, daimaginação e da emoção. Ele começou seuestudo analisando a ilusão de profundidade edo movimento contínuo criados pela projeçãofílmica, além de afirmar que o sentido dasimagens se relacionaria com a nossasubjetividade. Nesse sentido, ele propôs que:a mera percepção das pessoas e do fundo, daprofundidade e do movimento, fornece apenaso material de base. A cena que desperta ointeresse certamente transcende a simplesimpressão de objetos distantes e emmovimento. Devemos acompanhar as cenasque vemos “com a cabeça cheia de idéias”.Elas devem ter significado, receber subsídiosda imaginação, despertar vestígios deexperiências anteriores, mobilizar sentimentos

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e emoções, atiçar a sugestionabilidade, geraridéias e pensamentos, aliar-se mentalmente àcontinuidade da trama e conduzirpermanentemente a atenção para um elementoimportante e essencial: a ação.(MUNSTERBERG, 1983, p.27).E ainda que:a peça cinematográfica conta-nos uma históriahumana ultrapassando as formas do mundoexterior – a saber, espaço, tempo ecausalidade – e ajustando os acontecimentosàs formas do mundo interior – atenção,memória, imaginação e emoção (...) Estesacontecimentos alcançam isolamento total domundo prático através da perfeita unidade deenredo e forma pictórica. (Idem).Munsterberg antecipou as idéias de RudolfArnheim sobre percepção no cinema. Esteúltimo defenderá, nos anos 30, que a visão nãoé um mero resultado da estimulação sensorial,mas sim da recriação mental. Baseado naPsicologia da Gestalt, ele afirmou que:o recente pensamento psicológico encoraja-nos

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a chamar de visão uma atividade criativa damente humana. A percepção alcança, no nívelsensorial, o que no domínio da razão éconhecido como compreensão. O olhar decada homem também antecipa, de modomodesto, a admirada capacidade do artista deproduzir padrões que interpretavamvalidamente a experiência através da formaorganizada. (ARNHEIM, 1986, p.37).Embora defendesse o Gestaltismo, acreditasseque a percepção do sujeito expressa suarelação com o “universo” e defendesse umaperspectiva mentalista da arte, ele fez questãode pontuar o entrelaçamento da subjetividadehumana com o mundo.Teorias Psicológicas da MontagemNa fase do cinema mudo, é importantedestacar as teorias da montagem dos cineastasrussos, especialmente as de Eisenstein. Antesdele, pontuamos a relevância dos trabalhos dePudovkin, que analisou a organização dosfilmes hollywoodianos, concluindo que o núcleobásico do realismo destes discursos, assim

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como do cinema em geral, se encontraria namaneira como eles eram montados. Seria ajustaposição dos planos que definiria o sentidodo filme. A partir dessas premissas, Pudovkinsistematizou alguns estudos sobre o cinemahollywoodiano, descrevendo suas técnicas demontagem utilizadas com o objetivo demanipular as emoções e o processo designificação dos espectadores. A “irrealidade”das imagens isoladas seria sobreposta pelacriação de um universo dotado de sentido, apartir da construção de noções de tempo eespaço feitas pela montagem. Esta não seriaapenas “um método para juntar cenas ou osplanos separados, e sim um método quecontrola a ‘direção psicológica’ do espectador”.(PUDOVKIN, 1983, p.63).Partindo dessas teorias e vivendo um novocontexto histórico (início da Revolução Russa),Eisenstein concluiu que a montagem realista elinear do cinema comercial era utilizada comoinstrumento de propagação da ideologiaburguesa, começando a desenvolver um

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projeto de cinema revolucionário que pudesseinfluenciar o espectador numa outra direção.Ele defendeu que a montagem deveriaincorporar momentos chocantes (as atrações)que gerassem no espectador novos efeitospsicológicos. Estes "momentos abaladores",não amarrados à intriga, seriam conseguidosatravés da utilização da montagem deatrações, através da utilização de mecanismosespecíficos como a presença de fortescontrastes, a repetição, o ritmo frenético dasimagens e as digressões simbólicas. Umaspecto contraditório do percurso do cineasta éque, apesar do sucesso e das futurasaplicações de suas teorias em outros contextoscinematográficos, os filmes de Eisenstein nãoconseguiram um dos efeitos inicialmenteesperados pelo autor, em virtude dacomplexidade da linguagem cinematográficapor ele utilizada: possibilitar, aos espectadores,refletir sobre a necessidade da revolução.Outro dado interessante é que as formulaçõesde Eisenstein, construídas para serem

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aplicadas no cinema revolucionário, foramretomadas e ressignificadas pelo cinemacomercial e político da época e, em certosentido, ajudaram o dispositivo cinematográficoa se transformar numa poderosa“máquina-psicológica” de manipulação doespectador, na perspectiva de fortalecer amontagem realista e o cinema de propaganda.Mas se este é o Eisenstein mais conhecido ecitado historicamente, não podemos esqueceroutro elemento central de sua teoria: noconjunto, o filme deveria propiciar aoespectador a percepção dos aspectosideológicos daquilo que foi exposto, ou, emoutras palavras, ele deveria possibilitar umdistanciamento psicológico em relação à obra.Neste ponto, vemos uma aproximação dasteorias de Eisenstein com as idéias de Brechtsobre o teatro.É relevante também destacarmos que o diretorreformulou boa parte de sua concepção sobreo cinema, inaugurando outro tipo demontagem, denominada por ele de intelectual,

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cujas aplicações foram realizadas nos filmesOutubro (parcialmente censurado) e A LinhaGeral (proibido pelos agentes da burocraciasoviética). Nesta fase, Eisenstein se distancioudas idéias de Pudovkin e se aproximou dasteorias de Marx sobre a dialética e dosprincípios da Arte Construtivista. Esse métodovisava a narrativização cinematográfica deconceitos abstratos, de fenômenos intelectuaise de teses. Uma película não teria por objetivoa narração de acontecimentos, mas sim aconstrução de noções que seriam apreendidaspelo espectador através do esforço intelectual,auxiliado por estímulos visuais e auditivos.Vemos aqui claramente uma tentativa dodiretor de ampliar nos filmes o processo dedistanciamento psicológico do espectador,possibilitando-lhe níveis diversos de reflexão. Arecepção dos filmes pelo público geral foi muitonegativa, visto que a compreensão de suasmetáforas exigia um repertório cultural ecinematográfico muito elevado.Filmologia

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Em 1947, após o lançamento da RevueInternationale de Filmologie, surgiu umaabordagem teórica denominada de Filmologia,com o propósito de estudar a relação docinema com a sociedade, com outras artes eáreas do conhecimento, assim como apercepção dos filmes pelo público. Inicialmente,ela enfatizava a necessidade de entendimentoda forma como o filme é lido pelo espectador,focalizando temas como percepção,compreensão, memorização e aquilo que elesdenominaram de participação (processo a partirdo qual o espectador adere psicologicamente àficção, vivenciando-a como uma realidade). Aprincipal referência teórica destes estudosvinha da Psicologia da Gestalt. Em meados dos anos 50, as discussõestornaram-se mais complexas e diversificadas,abordando outras questões, a exemplo decomo os processos de memorização serelacionariam com os processos emocionais,subordinados às modificações do estadopsicológico do espectador ao longo do filme.

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Algumas pesquisas investigaram aspectosfisiológicos do processo de visionamento de umfilme, condicionados pela narrativa, a exemploda tensão muscular, da freqüência respiratória,da temperatura do corpo etc. Outra abordagemda Filmologia, denominada de ecológica,concebia que perceber significaria identificarcertas estruturas invariantes, presentes nofluxo de estímulos da realidade, em constanteevolução. Embora esta abordagemconsiderasse o fenômeno perceptual comoresultante apenas dos mecanismos dos órgãosdos sentidos, sem necessidade de recorrer aconhecimentos prévios ou esquemas deinterpretação, ela salientava que, nesseprocesso, os movimentos dos espectadoresseriam cruciais para o entendimento do filme: apercepção se apoiaria nas possibilidades doindivíduo de conectar as mudanças presentesem seu campo de visão com os movimentosvoluntários de seu corpo. E ainda que acâmera, o projetor, o filme e a tela formariamum dispositivo capaz de gerar um processo de

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percepção semelhante ao vivido por umindivíduo diante de acontecimentos reais. Acena cinematográfica simularia, desta forma, oenquadramento do campo de visão que umobservador humano teria num contexto natural.Isso ocorreria em razão de diferentes fatores,tais como o recebimento de indicações óticasque geram o efeito cinestésico, dando aoespectador a sensação de estar presente nacena, e as técnicas cinematográficas quesimulam o efeito tridimensional das imagens.Esta abordagem seria retomada pelas teoriascognitivistas no fim dos anos 70. É importantepontuar aqui que a revista, ao longo dos anos,foi ampliando suas abordagens, dando espaçopara publicações de diferentes perspectivasteóricas. Atualmente, a Filmologia éconsiderada por muitos, não como umaabordagem teórica específica, mas como umaárea do conhecimento que tem como objeto oestudo do cinema.O Cinema e o Homem ImaginárioEdgard Morin, através de seu livro “O Cinema e

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o Homem Imaginário”, de 1962, auto-intituladocomo um estudo sociológico/antropológico,partiu da teoria de que o realismo do cinemaseria resultante do processo de reproduçãomecânica da realidade, originário da sua basefotográfica (tese defendida por autores comoBazin e Krackauer). Num momento posterior dotexto, ele desconstrói esta teoria, na medidaem que passa a defender que o filme é tambémproduto da subjetividade do olhar doespectador, ou melhor, da participação desteno processo de significação do que é visto. Aparticipação era compreendida por ele comoum mecanismo de “projeção-identificaçãopolimorfa”, no qual o espectador não apenas seprojetaria no mundo ficcional, mas oabsorveria, de forma inconsciente, como numsonho ou nas fantasias infantis. Ele pontuoutambém a presença da subjetividadecinematográfica, a partir do que chamava de“experiência psicológica (mobilização defaculdades mentais e processos cognitivos),dimensão antropológica (afirmação do eu) e

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dimensão lingüística (o eu como fonte deexpressão e de comunicação)”. Objetividade esubjetividade, dessa forma, se entrelaçavam noprocesso de significação fílmica.Para o autor, o cinema incorporaria umadimensão imaginária, não por representar oque é falso, mas porque, ao utilizardeterminadas técnicas cinematográficas,estimularia a imaginação dnos sujeitos. Aomesmo tempo, ele entendia que a realidadeimaginária produzida pelo cinema revelariaaspectos culturais da sociedadecontemporânea. Ele concebia o imagináriocomo:o que existe de mais multiforme emultidimensional em nossa vida, no qualestamos imersos. É o infinito princípio virtualque acompanha o real que é único, limitado efinito no tempo. Trata-se da estruturaantagonista e complementar do queconcebemos como real, e sem a qual,indubitavelmente, não existiria realidade para ohomem, ou melhor, realidade humana.

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(MORIN, 1980, p.84).Com este livro, Morin antecipou algumasabordagens do cinema, articulandoperspectivas que seriam retomadas pelasociologia, pela psicanálise, pela semiologia epela filosofia de Deleuze.Cinema, Estruturalismo e PsicanáliseCom a difusão do estruturalismo, o tema daespectatorialidade vai ser analisado emprofundidade. Christian Metz foi, na França, ogrande teórico estruturalista do cinema, ao ladode tantos outros autores que focalizaram ocinema como texto, como linguagem e deramênfase à análise da forma fílmica, ou seja, aoselementos significantes dos signoscinematográficos. Metz começou suateorização dizendo que, de todos os problemasda teoria do cinema, um dos mais importantesé o da impressão de realidade vivida peloespectador diante do filme. (...) existe nodomínio fílmico o segredo de uma presença ede uma proximidade que aglomera o grandepúblico e consegue lotar mais ou menos as

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salas. Impressão de realidade, fenômeno demuitas conseqüências estéticas, cujosfundamentos são sobretudo psicológicos (...) ofilme nos dá o sentimento de estarmosassistindo diretamente a um espetáculo quasereal. Desencadeia no espectador um processoao mesmo tempo perceptivo e afetivo de“participação” (...) conquista (...) credibilidade.(METZ, 1972, p.16).Baseado nas idéias de Barthes sobre afotografia, ele afirma que:o que nos é apresentado não estáverdadeiramente aqui (...) o espectador nãoapreende um ter-sido-aqui, mas um ser-aquivivo. A impressão de realidade que o filme nosdá não se deve de modo algum à fortepresença do ator, mas sim ao frágil grau deexistência destas criaturas fantasmagóricasque se movem na tela incapazes de resistir ànossa constante tentação de investi-las de uma“realidade” que é a da ficção (noção de“diegese”), de uma realidade que provém denós mesmos, das projeções do filme. Se o

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espetáculo cinematográfico dá uma forteimpressão de realidade, é porque elecorresponde a “um vazio no qual o sonhoimerge facilmente”. (METZ, 1972, p.17;23). Trabalhando com os processos narrativos dofilme, Metz começou a defender a existência deuma lógica, uma estrutura, que presidiria aforma de organização dos signos fílmicos,especialmente os de montagem, gerando oprocesso de realismo nos espectadores, aoqual se refere acima. Ele comparou a estruturado cinema à da linguagem verbal, fazendo umaanalogia em que a imagem isolada eracomparada à letra, o plano à palavra e aseqüência à frase. A organização dasseqüências, chamada por ele de sintagma, éque daria sentido à narração, da mesma formaque as ordenações das frases dariaminteligibilidade ao texto escrito. Ele estudou ofuncionamento do cinema clássico e concluiuque, por trás da diversidade das histórias,existiria uma estrutura sintagmática que serepetiria em todos os filmes. Ele construiu,

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assim, a chamada Grande Sintagmática,estrutura composta por oito tipos de sintagmas(formas de organização dos planos), cujautilização num filme gerava tipos específicos derepercussão psicológica nos espectadores. AGrande Sintagmática foi, em certo sentido, atentativa de Metz de isolar as figurassintagmáticas mais importantes do cinemanarrativo, respondendo à questão: de quemodo o cinema se constitui como discursonarrativo? Dessa forma, a Grande Sintagmáticaconstitui uma tipologia das diversas formas nasquais o espaço e o tempo podem serordenados através da montagem dentro dossegmentos do cinema narrativo. São três oscritérios para identificação e separação dossegmentos autônomos: 1) unidade de ação; 2)o tipo de demarcação ou de pontuação; 3) aestrutura sintagmática (os princípios depertinência que identificam o tipo sintagmático).

O cinema, nesse sentido, foi quase reduzido auma estrutura de signos, muitas vezes binários,

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que traduziam, em termos simbólicos, algumascontradições e oposições da vida social.Mesmo que consideremos que muitos filmes docinema clássico podem ser analisadosparcialmente à luz da Grande Sintagmática, asua universalização foi um dos equívocos deMetz, que, em função das diversas críticas aele realizadas, acabou admitindo, nummomento posterior, que esta estruturaaplicava-se apenas a um grupo específico defilmes e que não explicava a totalidade dofuncionamento do cinema.Mas a abordagem textual do cinema englobaoutras vertentes, algumas ligadas à teorialiterária e outras à chamada narratologia.Destacaremos os conceitos que consideramosessenciais para nossa discussão, por seremelementos fundamentais para o controleemocional do espectador: ponto de vista,narrador, voz narrativa, focalização eenunciação.O ponto de vista é entendido geralmente comoa perspectiva ótica de um personagem cujo

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olhar ou visão domina uma seqüência ou, emseu sentido mais amplo, a perspectiva geral donarrador frente aos personagens e fatos domundo ficcional (diegético). A manipulação doponto de vista de um filme pode modelar oolhar e a interpretação do público em relação àhistória em curso, até mesmo porque oprocesso de participação se inicia quando oespectador identifica-se com o ponto de vistade um dos personagens. Os filmes podemutilizar um único ponto de vista ou pontos devista distintos, privilegiando ou não um delescomo hierarquicamente superior aos demais.O narrador é a figura que conduz a narrativa,ou seja, direciona a narração da história. Emgeral, o narrador constitui-se no elementofundamental do contrato ficcional que anarração estabelece com o público, porque é apartir dele que o espectador dá credibilidade aodiscurso produzido pelo filme. Existem trêstipos de narradores: 1) o intra-diegético, aqueleque pertence à história narrada, a exemplo dopersonagem do filme Brás Cubas, que conta

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sua própria história ao longo filme; 2) oextra-diegético, que corresponde a umpersonagem do filme que narra uma história daqual não participa, a exemplo dos narradoresdos filmes Terra e Liberdade e Titanic; 3) porfim, o narrador cinematográfico, que é umainstância narrativa oculta que dirige, atravésdos elementos fílmicos, a condução da históriae não está personificado.A voz narrativa relaciona-se com as conexõesentre o narrador e a história contada eresponde a questões como: Como se situa apresença do narrador temporalmente emrelação à história? É anterior, posterior,simultânea ou intercalada? Qual a extensão dapresença do narrador no relato? Qual a suarelevância?A enunciação é um termo lingüístico quedistingue o que se diz (o enunciado) dos meiosutilizados para dizê-lo (enunciação). Osestudos sobre a enunciação enfatizam osmodos pelos quais o falante e o narrador seinscrevem na mensagem, ou seja, o modo

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como se dirigem ao espectador. Na teoriafílmica, a enunciação significa também aconstituição da subjetividade na linguagem e,em segundo lugar, as marcas de sua produçãono texto fílmico e, por conseguinte, o controledo espectador através do nexo imaginárioestabelecido entre ele e o narrador. “As teoriasda enunciação permitiram levar emconsideração a maneira pela qual o textofílmico se desenha, se enraíza e se volta sobresi mesmo” . (AUMONT; MARIE, 2003). Filmescomerciais geralmente escondem as marcas deenunciação e mostram-se como transparentese naturalistas. Filmes alternativos buscam umaopacidade do discurso, relevando suas marcasde produção no tecido do texto. A focalização diz respeito àquilo que umpersonagem vê e sabe da história narrada e asua relação com o saber do narrador e, porconseqüência, do espectador. Existem trêstipos de focalização: 1) um narrador oniscienteque vê mais do que sabem os personagens; 2)um narrador que só vê aquilo que um

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personagem sabe; 3) um narrador que vêmenos do que sabe o personagem. Amanipulação da focalização é fundamental parao que o espectador acredita em relação aorelato e, conseqüentemente, na sua situaçãopsicológica. Essa manipulação é criada nofilme, em pelos menos três níveis, que se unemformando um sistema geral de narração: 1 -Pró-fílmico (os elementos presentes numaimagem); 2 - Produção (processo deenquadramento, englobando movimentos,planos etc.); 3 - Montagem (combinação deplanos, onde na qual as relações temporais eespaciais são estabelecidas).Dando continuidade ao nosso histórico,apontamos que, no interior do movimentoestruturalista, surgem diversas perspectivas deleitura dos filmes e de análise do espectadorinfluenciadas pela psicanálise lacaniana que,especialmente nos anos 70, embasaramgrande parte da teorização sobre o cinema.Alguns teóricos sinalizavam para o fato de queo funcionamento da psique humana (em geral)

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e a representação cinematográfica (emparticular) guardavam semelhanças. Nessesentido, a teoria freudiana do inconsciente e dasubjetividade humana poderia contribuir para acompreensão dos processos textuaisimplicados na realização e na análise de umfilme. Outra utilização da teoria freudianaconsistia em enxergar os filmes como sintomasreveladores de questões psíquicas do autor,sendo o processo de análise fílmicaequivalente ao processo psicanalítico.Uma perspectiva psicanalítica do cinema muitoexplorada foi aquela que propunha umaanalogia entre os sonhos e os filmes. Oespectador era colocado na condição desonhador (semi-desperto), inclusive pelasituação em que se encontrava (sala escura,isolamento, abandono psicológico, irrealidadedas imagens vivenciadas como reais,passividade, adesão empática à narrativa).Acrescentava-se a isto a presença do processode identificação (que levava o espectador avivenciar os acontecimentos a partir do ponto

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de vista de um personagem) e de projeção (emque o sujeito projeta suas questões existenciaise psicológicas para o enredo do filme). Nestecaso, o espectador, sujeito desejante, seria oelemento central da significação fílmica(irrelevante sem seu trabalho inconsciente).Outra linha de pensamento defende que oaparato cinematográfico teria sido construídocomo uma máquina psicológica, visando criarno espectador não apenas a impressão derealidade, mas uma satisfação psíquica e umeterno desejo de retorno. Esses processosestariam relacionados com a base técnica docinema, com as condições de projeção dofilme, com as características narrativas daspelículas, assim como com os própriosmecanismos psicológicos do espectador(conscientes e inconscientes). Para Baudry(apud AUMONT, 1986), por exemplo, o regimede crença de quem assiste ao filme, onde noqual “tudo é aceito como real”, não ocorreriaapenas em função da impressão de realidade,mas seria intensificado pela condição de sonho

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do espectador, o que ele chama de “efeito deficção”. Ele afirma que o espectador entrarianum estado de regressão artificial que consistena ativação de um desejo inconsciente deretornar a uma fase de desenvolvimentopsíquico, anterior à formação do ego, onde naqual o sujeito ainda não conseguiria distinguir apercepção (de uma coisa real) darepresentação (de uma imagem).Seguindo essa linha, há ainda abordagens querelacionam o cinema com os mecanismos deidentificação para a Psicanálise. Segundo estateoria, a identificação primária passa peloprocesso de constituição imaginária da noçãode eu, no qualonde os sujeitos começam a sediferenciar dos objetos e dos outros. O eu sedefine, assim, por uma identificação com aimagem do outro: “por um outro e para umoutro”. Esse processo é denominado “fase doespelho”. As identificações secundárias seriamaquelas posteriores ao Complexo de Édipo e àentrada do sujeito no simbólico. Essasidentificações seriam a matriz de todas as

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identificações futuras do sujeito e originárias desuas neuroses. No cinema, a identificaçãoprimária seria aquela pela qual o espectador seidentifica com seu próprio olhar e se sentecomo foco da representação, como sujeitoprivilegiado e central da visão. A secundáriaseria aquela realizada com a estruturanarrativa, com os personagens e com a ação(AUMONT, 1986). Alguns teóricos fizeram umaequivalência entre a identificação primária nocinema e a fase do espelho, assim como entrea identificação secundária e a estruturaedipiana. Nos filmes, as identificações sóseriam possíveis porque o espectador já teriasofrido processos identificatórios individuais nasua infância. Parte da fascinação pelo cinemaviria desse mecanismo. Decorre disto aconcepção do filme como uma resposta aonosso desejo de plenitude, visto que ele nosoferece mundos estruturados, coerentes enão-contraditórios com o eu. Três são asrazões evocadas para a defesa da afinidade docinema com a cena primária: 1) a solidão do

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espectador e a imposição de sua concentraçãona tela transformam-no em sujeito maisfragmentado e isolado; 2) o cinema é compostode pessoas e fatos ausentes; 3) existe umasegregação de espaços, em que se separa oespetáculo do espectador. Narratologicamente,Aumont explica essa relação da seguinteforma:Qualquer narrativa clássica inaugura acaptação de seu espectador, impondo umadistância inicial entre um sujeito desejante eseu objeto de desejo. Toda a arte da narraçãoconsiste, depois, em regular a perseguiçãosempre relançada desse objeto do desejo,desejo cuja realização é incessantementeadiada, impedida, ameaçada e retardada até ofinal da narrativa. O percurso narrativo clássicoemprega, portanto, duas situações de equilibro,de não-tensão, que marcam seu início e seufinal. A situação de equilíbrio inicial é marcadarapidamente por uma falha, por um desvio, quea narrativa tentará preencher, ao final de umasérie de impedimentos, de pistas falsas, de

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contratempos devidos ao destino ou à maldadedos homens, mas cuja função narrativa émanter a ameaça dessa falha e o desejo doespectador de ver finalmente sua solução, quemarca o final da narrativa, o retorno ao estadode não-tensão, seja pelo preenchimento dadistância entre sujeito e o objeto de desejo, ou,ao contrário, pelo triunfo definitivo da lei, queproíbe para sempre esse preenchimento.(AUMONT, 1986, p.263).No final dos anos 70 e início dos 80, essasteorias vão ser duramente criticadas peloschamados pós-estruturalistas, assim como pornovas correntes de pensamento que surgiriamno cenário francês e anglo-saxão. Não temoscomo proceder a uma revisão completa dessepercurso. Finalizaremos nosso históricoresumindo as idéias relacionadas com achamada Teoria Analítica, de influênciacognitivista, que emerge com força no final doséculo XX, especialmente nos paísesanglo-saxões.Teoria Analítica/Cognitivista

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Uma das características da Teoria Analíticaseria o resgate da noção de ciência “como umrecurso e um modelo” (ALLEN; SMITH, 2005,p. 101) e a de racionalidade prática para oestudo do cinema. Walton (2005), em “TemoresFictícios”, ao se referir às emoções quesentimos quando assistimos a um filme,defende a hipótese de que, em função deestarmos diante de uma ficção e sabermos quenão estamos vivendo o real, não poderíamosproduzir emoções de fato. Ele explica nossasreações como sendo quase emoções,derivadas do processo de fazer-de-conta que oque estaríamos assistindo seria verdade,processo realizado pelo espectador de modoconsciente ou automático. Smith (2005), aofalar dos processos emocionais do espectador,critica o conceito de ilusão projetiva no cinema,assim como a metáfora do sonho, afirmandoque eles “não são capazes de explicaradequadamente nossa experiência com aficção” e tenta “demonstrar que, de modo geral,as peculiaridades de nossa experiência

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ficcional seriam muito mais bemcompreendidas utilizando-se os conceitos deatenção, imaginação, percepção e sensação doque o de falsa crença” (SMITH, 2005, p. 143).Ele chega a sugerir que as teorias da crençanos processos de projeção e identificaçãocinematográficos, em última instância,conduziriam à idéia, por exemplo, de que filmesviolentos gerariam comportamentos agressivosnos espectadores, o que, ao nosso ver,constitui-se como uma leitura deturpada dosconceitos criticados pelo autor. Em seguida, eleafirma que a metáfora da ilusão sobreviveriadevido a sua articulação com as teoriasbrechtianas, althusserianas e lacanianas, emque estaríamos “subjugados por estruturaspsíquicas e sociais”. (Idem). Sobre as emoções do espectador diante de umfilme, ele nos dá, primeiramente, duaspossíveis explicações: “1) o que está implicadona apreensão da ficção é uma forma defingimento ou faz-de-conta, e não de crença, eque o que parece ser resposta emocional é de

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fato apenas quase-emoção [tese expostaacima por Walton]; 2) que não é precisoacreditar em uma série de eventos para a elesresponder emocionalmente; basta entreter-seimaginativamente em uma situação ficcionalpara sentir-se sensibilizado por ela” (SMITH,2005, p.151-2). Em seguida, o autor descartaas duas explicações, afirmando que asmesmas desconsideram uma questão básicapara o entendimento das emoções noespectador: a ficção dependeria sempre deuma correspondência com acontecimentosreais. Por fim, ele defende a hipótese daemoção do espectador como uma atividadeimaginativa, ou seja, que “os espectadores nãosofrem a perda de sua consciência habitual (...)em lugar disso, entretêm imaginativamenteproposições e imagens dos textos ficcionais”.(SMITH, 2005, p.154). O espectador, assim,imaginaria uma situação que hipoteticamentepoderia ser real. A imaginação diria respeito anossa capacidade de compor representaçõesmentais de objetos ausentes (objetos reais,

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mas não presentes) ou objetos irreais(fictícios). O cinema, com seus dispositivos,estimularia nossa capacidade imaginativa, poroferecer uma experiência sensorial mais forteque outros meios, aumentando nossorepertório experiencial. Ele argumenta que atransparência da montagem invisível ocorrepelo fato das convenções da decupagemclássica terem sido concebidas para que nãotenhamos nossa atenção centrada nelas, masna ação, “que tem uma continuidade para-alémdo corte” (SMITH, 2005, p.159). Já Taylor (2005) afirma que a ficção e aimaginação nos permitem quase-experiências,oferecem-nos um meio para avaliarmos nossasprováveis respostas emocionais a situaçõeshipotéticas e apreciarmos os sentimentos deoutras pessoas, passando por situações queainda não tivemos a possibilidade deexperimentar. Temos aqui a noção denão-engajamento no filme, que permitiria aoespectador a realização de uma análisedistanciada da narrativa. Na mesma linha,

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Currie (2005) defende que o mecanismo defaz-de-conta da ficção cinematográfica,afirmando que culturalmente ele traz vantagenspara o desenvolvimento da mente dos sujeitos,tais como experienciar eventos, explicar eprever o comportamento de outras pessoas.Quando fazemos-de-conta, somos capazes(espontaneamente) de experimentar, em nossaimaginação, o resultado da ação e selecioná-la,posteriormente, como apropriada ou não paranossos contextos. Por fim, diz que as ficçõesvisuais exploram mais a capacidade deprocessamento de informação do aparelhovisual humano por nos disponibilizar umagrande quantidade de detalhes, facilmenteassimilados. Não é por acaso que muitoscognitivistas começaram a utilizar filmes comoformas de sensibilização de contextostraumáticos na clínica.Cinema e PropagandaA questão da influência do cinema sobre ocomportamento dos espectadores na sua vidacotidiana, apesar da sua importância, não é um

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objeto de estudo da teoria do cinema. Noentanto, trata-se de um tema amplamentedebatido pelas ciências humanas e, sobretudo,pela mídia. Iremos abordá-lo rapidamente, poracreditarmos que a maior parte das suasdiscussões não possui uma base teórica sólida.Exemplos dessa fragilidade teórico-conceitualpodem ser vistos nas abordagens queconsideram que o cinema pode agirisoladamente sobre os sujeitos e naquelas quedefendem que os espectadores assimilam osconteúdos e propostas dos filmes de maneirapassiva.É inquestionável que os audiovisuaistornaram-se importantes veículos culturais aolongo do século XX, e daí sua conseqüenterelevância na construção de valores e crençasdos espectadores, ao lado de outros artefatossócio-culturais e políticos. Não é por acaso queos regimes totalitários e a políticainstitucionalizada preocupam-se tanto com ocontrole da produção e da veiculação docinema e da tTelevisão. Todavia, isto não

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significa que os sujeitos encontrem-seaprisionados numa estrutura ideológica que sólhes possibilite uma postura passiva diantedestas mídias e muito menos que ocomportamento dos indivíduos seja modeladopelas mesmas. Esta é uma postura ingênua elimitada sobre comportamento e subjetividadehumana.Essa discussão nos remete à compreensãodos conceitos de verdade, poder e controle,instâncias que funcionam, nas organizaçõessoócio-culturais, de forma entrelaçada. Hoje, aciência não trabalha mais com a noção deverdade universal, privilegiando a idéia deconstrução de verdades, em função dascaracterísticas e contingências específicas decada rede social.Em geral, nas sociedades, os indivíduos e/ougrupos que constroem as noções de verdadeencontram-se associados a algum tipo deagência de poder. Mas é importante sinalizarque o poder não é produzido apenas pororganizações institucionalizadas, como o

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Estado, a Religião, a Educação etc., mas quese encontra presente em todas as relaçõeshumanas, manifestando-se em diversos níveise de formas variadas, influenciando asatividades e a existência dos homens.Para Skinner (1981), as instituições ouagências controladoras desenvolveriamtecnologias específicas de manipulação dasvariáveis controladoras de determinados tiposde comportamento. Conseqüentemente, essasagências operariam com mais sucesso, isto é,manteriam um controle social mais eficiente,pelo menos dentro de suas áreas de atuação.Nesse sentido, podemos ver o cinema tambémcomo uma agência de controle quedesenvolveu (não necessariamente de formaintencional) tecnologias de manipulação devariáveis controladoras do comportamentohumano, para fins econômicos, políticos,culturais e estéticos.Mas Skinner (1972) também argumentou que,se o indivíduo (nessa discussão, o espectador)tomasse consciência dos processos de controle

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dos dispositivos com os quais ele interagia, ouseja, se fosse capaz de analisar ascontingências envolvidas na situação, elepoderia exercer um tipo de contracontrole,dando-lhe a possibilidade de reagir aos tipos decontrole aos quais que estava submetido,viabilizando, assim, a construção decomportamentos diferentes daqueles previstospelas tecnologias de controle.Para a discussão da influência dos filmes nosespectadores, é interessante ainda analisar ofenômeno da motivação, explicadotradicionalmente através de processos internos,como expectativas, vontades ou desejos. ParaSkinner, a motivação deveria ser vista comouma variável controladora do comportamento.A palavra motivação foi substituída poroperação estabelecedora, sendo compreendidacomo uma variável que momentaneamentealterava a efetividade reforçadora de algumobjeto, estímulo ou evento (efeitoestabelecedor do reforço); e,momentaneamente, alterava a freqüência de

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um tipo de comportamento que tinha sidoreforçado por aquele objeto, estímulo ou evento(efeito evocativo). As operaçõesestabelecedoras poderiam ser incondicionadas(de origem filogenética, variando a depender daespécie) e condicionadas (de origemontogenética e cultural). Ou seja, o efeitoestabelecedor do reforço poderia ser inato ouaprendido. Uma agência de controle, aoconhecer o funcionamento desse mecanismo,poderia utilizá-lo para direcionar ocomportamento dos sujeitos em determinadocontexto, o que não equivaleria a um processode manipulação comportamental, visto nãoseria possível ter controle sobre todas asvariáveis envolvidas nesse processo. É por istoque não podemos concluir que filmes violentosproduzem comportamentos agressivos nosespectadores, visto que o processo derecepção e significação dos mesmos leva emconsideração a história individual de cadasujeito. No máximo, pode-se hipotetisarsuporque a presença intensa de representações

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midiáticas violentas amplia a possibilidade deconstituição de valores culturais sobre aviolência que, em determinados sujeitos,podem se tornar-se um elementosinfluenciadores de comportamentos tidossocialmente como agressivos.Citaremos aqui uma experiência que ilustra oque estamos questionando. Durante o contextoda Segunda Guerra Mundial, o governo dosEUA encomendou a alguns cineastas aprodução de uma série de documentários (WhyWe Fight), visando convencer a opinião públicada necessidade do Estado entrar na guerra,depois de um contexto em que se defendiauma postura de neutralidade. Paralelamente,foi constituída uma equipe de pesquisadores,liderada por psicólogos, cujo objetivo eraavaliar o grau de influência dos filmes naopinião dos espectadores que participariam dapesquisa. Os resultados da investigaçãosugeriram que, embora os filmes exercessemalguma repercussão sobre os sujeitos, não erapossível delimitar e/ou identificar em que

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extensão e de que forma o processo deinfluência havia se estabelecido.(FURHAMMAR; ISAKSSON, 1976).Para concluir o artigo, abordaremos o temacinema e psicologia, a partir da perspectiva doBehaviorismo Radical, reflexão ainda nãosistematizada pela teoria do cinema, nem pelospsicólogos comportamentais. Por isto, achamosimportante situar o leitor diante de algunsconceitos básicos do Behaviorismo, para entãoprocedermos a uma discussão do cinema apartir deste referencial.Cinema e Behaviorismo RadicalSkinner, ao longo do tempo, veio construindo omodelo de seleção por conseqüências comoeixo de sua teoria, em que, influenciado porDarwin, utilizou os conceitos de variação e deseleção como fundamentais para acompreensão do comportamento humano. Apartir da elaboração do conceito decomportamento operante,  Skinner passou aafirmar que os comportamentos seriamselecionados pelas conseqüências que eles

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próprios produziriam.O Behaviorismo Radical, filosofia da Ciência doComportamento, desenvolvida por Skinner, aocontrário do que se costuma pensar, trabalhacom uma noção de causalidade particular. Paraesta abordagem, o indivíduo apresenta umrepertório comportamental variado e, na suainteração com o mundo, algunscomportamentos são selecionados peloambiente . Skinner introduziu, portanto, anoção de ambiente como um selecionador decomportamentos.Skinner também fez uma críitica à noção deintencionalidade do comportamento, e seumodelo teórico de seleção pelasconseqüências lhe concedeu unidadeconceitual, na medida em que o mesmoprincípio que explicava as leis quedeterminavam a origem dos comportamentoshumanos e de outras espécies explicavatambém as diferenças entre a espécies e entreos diversos comportamentos. Além disso, omodelo de seleção pelas conseqüências

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possibilitava a interpretação de qualquer eventocomportamental, a partir de uma perspectiva demúltipla determinação. Para o Behaviorismo Radical, a explicação doscomportamentos está na inter-relação doorganismo com o mundo, denominada decontingências de reforçamento. Skinner criticouas teorias que sugeriam uma ação direta doambiente sobre o sujeito e também aquelasque sugeriam um mundo “criado pelo sujeito”.Para o Behaviorismo Radical, o ambiente afetao organismo antes e depois dele responder.Para analisar uma contingência dereforçamento, precisamos especificar pelomenos três processos: 1) a ocasião em que oestímulo ocorre (evento antecedente); 2) aprópria resposta; 3) as conseqüênciasproduzidas pela resposta. Assim, um estímulo,dentro de um contexto em que uma resposta éreforçada, pode passar a controlar a resposta.Estímulo pode ser concebido como uma partedo ambiente que afeta o comportamento.Um fenômeno relevante para esta abordagem

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é aquele denominado de controle de estímulos,que, na nossa perspectiva, explica algumasestratégias utilizadas pelo cinema parainfluenciar os espectadores. Para acompreensão do controle de estímulos, doisprocessos mostram-se essenciais:discriminação e generalização. No processo dediscriminação de estímulos, o sujeito sóresponde diante de um estímulo específico. Aspesquisas têm mostrado um aspecto curioso nadiscriminação de estímulos. Junto com ele,sempre ocorre o processo de generalização.Aqui, a discriminação de um determinadoestímulo faz com que sua resposta sejageneralizada a outros estímulos compropriedades comuns ao mesmo. (SÉRIO,2002).Tais pesquisas têm produzido resultadosanimadores com relação à compreensão docomportamento humano complexo, queengloba, por exemplo, o comportamento verbal,a percepção, a atenção, a abstração, dentreoutros. É importante enfatizar mais uma vez

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que todo comportamento é resultado decontingências de reforçamento. No caso dapercepção e da atenção, são os estímulosantecedentes os principais agentes de controle.Elas sofrem a influência da história do indivíduoe de circunstâncias presentes no momento emque o indivíduo se comporta:entre as variáveis que controlam a percepção,no sentido de respostas controladas por umestímulo, estão: 1) características físicas doestímulo; 2) a presença concomitante de outrosestímulos; 3) a história do indivíduo comrelação ao estímulo”. (POLING et al. apudSÉRIO et al, 2002, p 57).O comportamento de perceber não écontrolado nem pelas estruturas dos órgãosdos sentidos, nem pelo contexto do momentoem que ocorre, nem pelos estímulos a eleassociados, ou seja, nenhum desses aspectosisolados abrange o fenômeno perceptivo, quesó pode ser compreendido através da relaçãoda história do sujeito com tais estímulos.Assim, uma pessoa não é um espectador

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indiferente a absorver o mundo como umaesponja (...) não estamos simplesmente‘cientes’ do mundo ao nosso redor;respondemos a ele de maneirasidiossincráticas por causa daquilo queaconteceu quando estivemos em contato comele. (SKINNER, 1974, p.66).É interessante destacar ainda que algumasrespostas perceptivas, a exemplo daquilo que apessoa vê, são controladas também pela forçados estímulos (a probabilidade do estímulo depossibilitar, num maior grau, uma determinadaresposta). Quando um estímulo é fraco, o que apessoa vê está sendo controlado por outrosestímulos mais fortes dentro daquele contexto.Em outras palavras, “uma pessoa vê uma coisacomo alguma outra coisa, quando aprobabilidade de ver esta é grande e o controleexercido por outra é pequeno”. (SKINNER,1974, p.67).Algumas ilusões, por exemplo, parecemirresistíveis; vemos aquilo que sabemos nãoestar realmente ali. Alguns exemplos parecem

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ser razoavelmente explicados em termos deseleção natural; não é de surpreender que, aover um pássaro voar por trás de um tronco deuma árvore, agimos como se ele continuasse aexistir fora do alcance de nossa visão (...)pequenas lacunas em configuraçõesordenadas são proveitosamentenegligenciadas, assim como “negligenciamos”os pontos cegos de nossa retina. Nãoprecisamos postular princípios estruturais paraexplicar tais características. As contingênciasde reforço também contribuem parapercepções irresistíveis. (SKINNER, 1974, p.68).Para explicar como uma pessoa interpreta umasituação, precisamos analisar seucomportamento em relação à própria situação,inclusive suas descrições sobre a mesma.Sidman afirma que: “uma das observaçõesmais fascinantes é que nós muitas vezesreagimos às palavras e a outros símbolos comose fossem coisas ou eventos aos quais sereferem” (SIDMAN apud BATISTA, 2000, p.

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90), porque isto está relacionado com algo denossa história de vida,  que gerando esseprocesso de equivalência. Há muitas maneiras de levar uma pessoa a veralgo, e todas elas podem ser analisadas comoum arranjo de contingências para fortalecer ocomportamento perceptivo. O cinema, atravésde seus componentes cinemáticos, utiliza-sedesse conhecimento para produzir, dentreoutras coisas, o reconhecimento daquilo queconhecemos anteriormente.O cinema trabalha em especial com estratégiasque mantêm, direcionam ou focalizam aatenção e a motivação do espectador. Para oBehaviorismo, a atenção também é umcomportamento controlado por estímulosantecedentes:O controle exercido por um estímulodiscriminativo é tradicionalmente tratado sob orótulo de atenção. Este conceito inverte adireção da ação sugerindo, não que umestímulo controla o comportamento de umobservador, mas que o observador atenta para

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o estímulo e, assim, o controla. No entanto,algumas vezes reconhecemos que o objeto“chama ou mantém a atenção” do observador.O que usualmente queremos dizer, neste caso,é que o observador continua a olhar para oobjeto (..). a atenção é uma relação de controle– a relação entre uma resposta e um estímulodiscriminativo. Quando alguém está prestandoatenção está sob controle especial de umestímulo. (SKINNER, 1981, p.122).A partir do Behaviorismo Radical, portanto,podemos inferir que o cinema utiliza a relaçãoentre controle de estímulos e oscomportamentos do espectador, construindouma espectatorialidade que lhe permite induzirdeterminadas respostas no processo devisionamento de um filme. Os processos decontrole de estímulos (discriminação egeneralização), além do encadeamento derespostas e a equivalência funcional deestímulos, são amplamente utilizados para estefim. Mas não podemos deixar de pontuar que asignificação do espectador está condicionada

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também à sua história, assim como ao contextode observação. Iremos agora exemplificaralgumas técnicas da linguagemcinematográfica, demonstrando como elaspodem atuar na esfera psicológica dosespectadores.Podemos afirmar que o cinema comercialcomeça a apresentar padrões defuncionamento já na elaboração do roteiro. Ashistórias roteirizadas convencionalmente sãodivididas em três atos, um de apresentação,outro de confrontação e um último deresolução. Cada um destes atos é compostopor eventos ordenados numa cadeiapré-definida. Num filme americano que tem emmédia duas horas, o ATO I dura 30 minutos. Osdez primeiros minutos são fundamentais naconstrução do filme, pois é o tempo necessáriopara que certos estímulos funcionemcontrolando os comportamentos de atenção epercepção e para que o espectador entre nouniverso diegético. Neste ato, apresenta-se asituação dramática que o filme trabalhará,

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expõe-se um contexto, mostra-se uma situaçãoque o desestabiliza, cria-se uma expectativa deque o problema pode se resolver, antecipam-sealgumas dificuldades para, finalmente, surgir oconflito. Progressivamente, o espectador vai seenvolvendo com a narrativa e se identificandocom o ponto de vista do herói. O ATO II, quetem aproximadamente 60 minutos, é omomento em que o personagem principal e oscoadjuvantes enfrentam obstáculos para aresolução do problema que vai se complicando,até se tornar dramático. Depois, apresenta-seuma tentativa de solucionar o caso com açõesextremas que geram uma crise. O ATO IIIproduz o clímax do filme, no qual, através dochamado ponto de virada, ocorre algumacontecimento que muda o curso da história,conduzindo a uma estabilização da situação.Dessa forma, a organização do roteiro nos trêsatos constitui-se numa estratégia demanutenção do interesse do espectador pelofilme, em função da constante expectativa daresolução do problema original.

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Praticamente todo procedimento de expressãofílmica tem por função produzir efeitospsicológicos no espectador. Com relação àforma de montar o filme, citamos o exemplo douso da chamada montagem invisível pela maiorparte das narrativas comerciais, que tem comoprincipais objetivos: 1) a justaposição dosplanos de maneira que sua transição se torneimperceptível, criando uma ilusão decontinuidade; 2) a manutenção contínua daatenção do espectador. A linguagemcinematográfica construiu uma variedade deregras que regem a forma de montagem dosfilmes.A montagem rítmica relaciona-se com amaneira de manipular a duração de cada planoe é construída em função do direcionamento daatenção do espectador para aquilo que estásendo destacado. Devido a característicaspróprias do processo de controle de estímulos,os cineastas sabem que a atenção doespectador se modifica ao longo da duração decada plano. Num primeiro instante, o

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espectador reconhece as imagens, depois suaatenção é dirigida para o aspecto fundamentaldo plano. Passado este momento, ele tende ase entediar com o restante do conteúdo.Baseada nesta constatação, a montagemrítmica visa cortar os planos no momento emque o espectador está mais atendto, mantendoum ritmo constante de interesse pelo que émostrado. Como afirma Marcel Martin, “odiretor não estabelece mais a duração dosplanos em função do que tem a mostrar(materialmente), mas do que tem a sugerir(psicologicamente), isto é, em função dadominante afetiva do roteiro”. (MARTIN, 2003,p.149). A atenção e o interesse, dessa forma,tornam-se mais importantes do que apercepção dos conteúdos da cena. Ofundamental neste tipo de montagem éconhecer quais aspectos ou propriedades dosestímulos são fundamentais para o que édramaticamente interessante e necessário noprocesso de percepção do público.O tamanho dos planos é outra variável que tem

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o poder de controlar o espectador em suasrespostas emocionais. Planos muito longos, porexemplo, provocam normalmente sensaçõesde espera, de ansiedade ou de tédio. Por outrolado, os planos tendem a diminuir de tamanhocom a aproximação do momento do clímax,ampliando a tensão do público. Outracaracterística da montagem que fortalece anoção de continuidade e a atenção doespectador é a relação de continuidade de umplano com o seguinte. O movimento dos atoresno interior dos planos é, por exemplo, umatécnica fundamental para se cortar a cena,dando a sensação de continuidade aoespectador e fazendo com que ele se interesseem conhecer o que se sucederá àquela ação, oque para o Behaviorismo Radical é umaoperação estabelecedora condicionada,aumentando a probabilidade do espectadorestar constantemente motivado em relação ànarrativa.A ordem dos tipos de planos numa seqüênciatambém sugere respostas esperadas no

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público. Uma maneira, por exemplo, depossibilitar ao espectador uma compreensãomaior do contexto da narrativa, dando-lhe umasensação de conforto e segurança, é colocaros planos numa ordem preé-estabelecida, talcomo a seqüência a seguir: 1) plano geral; 2)plano médio 3) close-up (ou primeiro plano) 4)plano médio 5) plano geral. O tipo de plano aser utilizado na cena é também importante.Sobre o uso do primeiro plano, Bergman afirmaque, quando composto com objetividade,conduzido e representado com perfeição, ele éo meio mais poderoso de que o diretor dispõepara influenciar seu público. A angulação éoutro fator relevante. Segundo Betton, Oângulo de uma tomada nunca é gratuito, ésempre justificado pela configuração docenário, pela iluminação, pela valorizaçãodesse ou daquele aspecto do assunto, peloângulo do plano precedente e do seguinte, mastambém e sobretudo pelo desejo de mostrarfenômenos afetivos, suscitar determinadossentimentos, determinadas emoções.

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(BETTON, 1987, p. 34).O plongée, a câmera que filma uma cena decima para baixo, geralmente cria um efeito dediminuição do personagem, podendo sugerirsufocamento, anguústia e sujeição do mesmoem relação a um contexto narrativo. Ocontre-plongée, contrariamente, evoca umasensação de superioridade e de poder.Trata-se, assim, de uma técnica de induzir oespectador a perceber determinadascaracterística nos personagens.Não podemos deixar de pontuar a relevânciado fora-de-campo como instância fundamentalpara a interação psicológica do espectador como filme. O fora-de-campo diz respeito aoselementos que não estão presentes na cena,mas que são imaginados pelo espectador.Estes elementos se encontram ligados aocampo (o que se vê na tela) por continuidadesonora, vínculo narrativo ou evocação visual.Quase sempre o fora-de-campo se relacionacom cenas que já foram mostradasanteriormente e que são recordadasos num

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determinado contexto pelos espectadores. Osplanos gerais têem a função, normalmente, demostrar a totalidade do espaço de umaseqüência, fornecendo ao espectadorinformações para que ele recrie a unidadeespacial de cenas posteriores, cujo espaçoestará todo fragmentado. Nos filmes de terror,o medo e a tensão do espectador são maiscontrolados pelo fora-de-campo do que poraquilo que ele vê na tela. Podemos citar outros elementos que atuam nocontrole psicológico do espectador: aprofundidade de campo; o contraste doclaro-escuro; o efeito da câmera lenta; autilização extra-diegética da música etc.Buscamos, assim, resumir algumas técnicas oudispositivos cinematográficos que atuampsicologicamente no espectador,compreendidos pelo Bahaviorismo Radicalcomo controle de estímulos doscomportamentos operantes. Enfatizamos ocomportamento de percepção, de atenção emotivação, procurando demonstrar que,

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mesmo não possuindo uma teorizaçãosistematizada sobre o cinema, esta abordagempsicológica pode ser útil para a compreensãode muitos dos mecanismos de funcionamentodos filmes.Referências BibliográficasALLEN, R., SMITH, M. Teoria do Cinema eFilosofia. In: RAMOS, F. (Org) TeoriaContemporânea do Cinema, Volume I. SãoPaulo: Senac, 2005. p.71-112.ANDREW, J. D. As Principais Teorias doCinema: uma Introdução. Rio de Janeiro: JorgeZahar, 1989.ARNHEIM, R. Arte & Percepção Visual: umaPsicologia da Visão Criadora. São Paulo:Pioneira, 1986.AUMONT, J. et al. A Estética do Filme.Campinas: Papirus, 1995.AUMONT, J., MARIE, M. Dicionário Teórico eCrítico de Cinema. Campinas: Papirus, 2003.BAPTISTA, M. Q. G. Equivalência deEstímulos: Referência, Significado eImplicações para a Linguagem e Compreensão

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