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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
CHRISTIANE GUISANTES PEREIRA
PERCEPÇÃO DO MEDO CONTEMPORÂNEO POR MEIO DO FILME “ALIEN” 1979
CURITIBA
2008
2
CHRISTIANE GUISANTES PEREIRA
PERCEPÇÃO DO MEDO CONTEMPORÂNEO POR MEIO DO FILME “ALIEN” 1979
Monografia apresentada à disciplina Estágio Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito parcial à conclusão do curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná.
Orientador: Prof. Dr. José Roberto Braga Portella
CURITIBA
2008
3
Aos Meus Pais, à minha
irmã e ao amigo Paulo por
tudo que alcancei e por
todo amor e paciência.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiro a Deus, depois a Nossa Senhora que me deram a fé
e a coragem para fazer essa monografia.
Aos meus pais pelo apoio incondicional e a minha irmã, pelo amor,
compreensão, incentivos e principalmente por estarem presentes sempre que
precisei.
As minhas tias que sempre me deram a maior força na faculdade,
principalmente a tia Cândida e tia Lucia.
Agradeço o apoio, amizade e pela colaboração dos amigos Adreane,
Tiago, Fabiana, Juliane, as minhas véias Marcela e Evelin por tolerarem meu
mau humor e as noites no computador. E principalmente ao amigo Paulo
Romanowski, que foi um guia nesta monografia.
5
DAS UTOPIAS Se as coisas são inatingíveis... ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos, se não fora A presença distante das estrelas!
Mário Quintana
6
RESUMO
O medo sempre esteve presente na vida humana. Ele se desenvolve de várias maneiras, como instinto, como um meio moral e é muitas vezes transmitido através das gerações. Percebe-se como se utiliza o medo em questões políticas e religiosas. O medo também faz com que o imaginário da população modifique seu cotidiano por fatores sociais, por suas crenças e costumes. Isso é mostrado nesta monografia como através dos séculos o medo sofre alterações e preserva algumas características na civilização ocidental, como por exemplo, o medo do desconhecido, o medo diferente e o medo do outro. O imaginário faz a tradução do momento que a população vive através de livros, desenhos, pinturas e mais recentemente o cinema. As descobertas e inovações de cada época ajudam esse imaginário. Mas podemos perceber que a época influência o imaginário e seus receios. Ao analisar o medo no filme “Alien”, se enxerga como as mudanças sociais, econômicas e políticas deixaram sua marca na película. Assim, o filme se torna uma grande fonte de analise dos medos e do imaginário da época.
Palavras-chave: medo do desconhecido, ficção e cinema.
7
SUMÁRIO
Introdução..........................................................................................................8
1 Discussão da origem do medo. O medo do desconhecido, o medo do outro e o medo do alienígena.........................................................................11
2 contextualização histórica do filme e contextualização contemporânea do imaginário no cinema.................................................................................24
3 A análise do filme “Alien” e como as questões do medo e do imaginário coletivo se aplicavam nele..............................................................................33
3.1 A superioridade do ser alienígena..............................................................36
3.2 O medo do outro como alegoria: a presença alienígena como dispersão do sentimento de sociedade...................................................................................38
3.3 O alienígena e a ciência Artificial: o medo máximo da contemporaneidade...........................................................................................41
Considerações finais.......................................................................................44
Bibliografia.......................................................................................................46
Anexos: Imagens do filme................................................................................49
8
INTRODUÇÃO
O filme Alien - o oitavo passageiro será utilizado como fonte para
mostrar o medo no cotidiano da população e no imaginário coletivo. Pretendo
mostrar como o medo foi se transformando durante os séculos até chegar aos
dias em que o filme foi rodado. Por isso nessa análise descreverei alguns dos
pontos que é possível, de acordo com o contexto da época, a ação do medo e
do imaginário através do filme.
O filme Alien conta à história de uma tripulação que está retornando a
terra, mas a nave é desviada da sua rota para investigar um sinal
desconhecido enviado de outro planeta. Quando chegam a esse planeta se
deparam com uma criatura poderosa que começa a caçá-los. Esse filme foi
lançado em 1979.
No primeiro capítulo mostrarei como o medo tem origens antigas e
mostrarei o medo do desconhecido, do outro e do alienígena. O medo é um
sentimento que nos deixa em estado de alerta, um instinto de sobrevivência.
Entretanto, há várias maneiras de sentir medo e através dos séculos ele
perdurou de diversas formas. O pouco que sabemos do medo da Idade Antiga
é que era relacionado à religiosidade, aos deuses. Na Idade Média já podemos
definir melhor o medo pelos estudos feitos, o seu imaginário com os monstros
além mar e o medo de ir para o inferno era o pior que poderia acontecer.
Também havia o medo do outro, do diferente que foi intensificado pelas
invasões. Até as pessoas de outras vilas ou apenas diferentes eram perigosas.
Nos séculos posteriores pouco mudou sobre a religiosidade, o medo de
ir para o inferno continuava, mas o medo do outro apenas passou por algumas
mudanças com as novas descobertas científicas. O imaginário também afetou
essa nova maneira de sentir a realidade.
Com o cinema veio às representações desse imaginário como a
representação mais palpável de discussões sobre vidas em outros planetas.
9
Assim junto com o medo do outro veio o medo do alienígena e a possibilidade
de uma inteligência artificial.
No segundo capítulo podemos ver a contextualização do filme e as
influências que trouxe na produção do mesmo. Para podermos analisar o filme
as informações do que se passava na época em que o filme era gravado é
primordial, pois isso de alguma maneira influenciou durante as gravações.
O filme Alien o Oitavo passageiro foi lançado em 1979. Nessa época
muitas questões influenciavam direta e indiretamente um filme. Era a primeira
vez que uma mulher, Margaret Thatcher concorria ao cargo de primeiro
ministro na Inglaterra com grandes possibilidades de vencer, o que ocorreu no
mesmo ano, a inserção do governo pacificador de Jimmy Carter nos Estados
Unidos, sendo ele um país pró-bélico e o desenvolvimento tecnológico em prol
armamentista e com fins lucrativos pós Guerra Fria.
Há o imaginário que a guerra fria trouxe para o cotidiano da população e
como isso foi transformado para e literatura e principalmente para o cinema. O
cinema após a década de 1960 modernizou-se, não apenas por causa do
avanço tecnológico, mas por causa das novas técnicas e conceitos
empregados. Esse avanço tecnológico permitiu viagens ao espaço trazendo
novas possibilidades para o ser humano, como também novos medos. No filme
podemos perceber diversos momentos em que o medo é mostrado. Primeiro é
o medo do desconhecido, por não saber o que iriam encontrar quando
chegassem à origem do sinal que é enviado pela outra nave neste planeta
longínquo, o segundo o medo do alienígena (pois este usava métodos
diferentes para dizimar a tripulação), e o terceiro o medo do outro, pois a
insegurança e o pânico deixam as pessoas suscetíveis à desconfiança
excessiva (nesse caso bem fundamentada, pois ela se confirma com a
descoberta que Ash, o oficial cientista arruína várias vezes a possibilidade de
matar a criatura a mando da companhia que os contratou).
Além disso, podemos perceber como o momento em que o filme é
gravado influenciou em pequenas mudanças nas filmagens, como a mudança
10
da personagem Ripley ser uma mulher, onde no roteiro seria um homem. Ou
mesmo no roteiro do filme onde os personagens são acuados a seguirem a
investigação do sinal para não perderem os seus salários.
Como o imaginário e outras questões influenciaram a produção do Alien
e essa exploração de uma visão e abordagem sobre o tema no cinema
mostraram outras mudanças no meio cinematográfico. Ele foi um grande
sucesso por causa dessa abordagem, pois esses assuntos são curiosidades e
especulações de um futuro próximo.
11
1 DISCUSSÃO DA ORIGEM DO MEDO. O MEDO DO DESCONHECIDO, O
MEDO DO OUTRO E O MEDO DO ALIENÍGENA.
Em todas as épocas o homem teve seus medos. Medos reais e medos
imaginários. Teve medo dos animais perigosos; do desconhecido, pois não
sabia o que poderia encontrar; do outro, o estranho, o diferente dele e por fim
as criaturas que estiveram presentes no imaginário do homem por vários
séculos.
O medo é um meio de defesa e sobrevivência. Acontece quando nos
sentimos estimulados pelo ambiente. Contudo esse medo é natural e todos os
animais têm, mas no ser humano ele é reforçado pelo meio em que vivemos,
pela sociedade, pela família.
Mesmo sendo instintivo, para sobreviver aos perigos, com a
organização em comunidade e em sociedade, isso mudou. O medo também
pode ser gerado por sentimentos diferenciados, por sua educação, por seus
valores e por sua fé. Se for repetido, pode gerar crises de angústia,
inadaptação e pavor.
Quando não lidamos com o medo, real ou imaginário, ele pode se tornar
muito mais amplo e prejudicial.
“No sentido estrito e estreito do termo, o medo (individual) é uma emoção-choque, freqüentemente precedida de surpresa, provocada pela tomada de consciência de um perigo presente e urgente que ameaça, cremos nós, nossa conservação. Colocado em estado de alerta, o hipotálamo reage por uma mobilização global do organismo, que desencadeia diversos tipos de comportamentos somáticos e provoca sobretudo modificações endócrinas.”1
O desconhecido gera inquietação e angústia, sendo o medo uma defesa
essencial, que faz parte da nossa natureza e nos ajuda a escapar
provisoriamente. No entanto, quando passa de um limite suportável, cria
bloqueios e se torna patológico.
1 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 23
12
“A necessidade de segurança é portanto fundamental; está na base da afetividade e da moral humanas . A insegurança é símbolo de morte e a segurança símbolo de vida.”2
No que se refere à Idade Antiga e principalmente Medieval, temos
exemplos diversos do imaginário popular. A exemplo: deuses, semideuses,
monstros e demônios habitavam de forma abundante a mitologia da Idade
Antiga e os monstros marinhos na Idade Média.
Os povos da antiguidade realizavam vários rituais e sacrifícios,
oferecidos aos deuses para que os protegessem de todos os males. Para isso
utilizavam vários meios: eles sacrificavam animais, faziam oferendas e algumas
civilizações praticavam inclusive o sacrifício humano.
Sabemos que a civilização Romana considerava os Germanos e os
Bretões homens bárbaros e por isso propenso as guerras. Contudo mesmo
com certa superioridade dos gregos e dos romanos eles descreviam suas
diferenças de civilização e barbárie.
“Esta atenção etnográfica assume um carácter diferente em Tácito. Com uma óptica rousseauiana, ele contrapõe à corrupção da civilização, de que Roma é o grande exemplo, a salubridade dos <<bons selvagens>> que são o Bretão e o Germano.(...)”3
Mas pouco se sabe mesmo sobre os verdadeiros medos da Idade
Antiga, pois nas suas fontes pouco é revelado sobre o medo, eles tentavam de
todas as maneiras escondê-lo. Pois Caio Júlio César, Marco Túlio Cícero,
Cornélius Tácito escreveram livros, sobre a sociedade. Mas o que eles
escreviam relatava a nobreza, suas guerras e suas conquistas. Pouco se sabe
como os povos da época se sentiam, muitos menos como a população vivia e
quais eram os seus anseios e o que eles pensavam.
Posteriormente, com o cristianismo, os nascimentos, casamentos,
funerais, que aconteciam nas vilas e nas cidades eram relatados, alguns
somente com descrições simples, outras com descrições minuciosas, detalhes
que mostram um pouco do cotidiano e onde podemos entender um pouco do
que acontecia na sociedade da Idade Média. Assim, pode-se fazer um estudo
2 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 19 3 LE GOFF, Jacques. O maravilhoso e o cotidiano no ocidente medieval. p. 180
13
maior sobre o que eles pensavam e temiam. O cristianismo regrou a sociedade
ocidental e todo o conhecimento que existia estava em suas mãos.
“No que toca à Idade média (476 – 1453), propriamente, é oportuno lembrar que a Igreja foi agente de ligação entre o mundo antigo e o mundo medieval. Herdeira da autoridade de Roma, ela ajudou a forjar a nova civilização da qual resultou o nascimento da Europa, identificando-se perfeitamente com o conjunto da sociedade, como jamais ocorreu na época histórica. De fato Igreja e Idade média confundem-se. Os historiadores sempre souberam disso, como sabem também que não teríamos nenhuma documentação escrita anterior a 1150 se não fosse a Igreja. Tanto isso é verdade que grandes medievalistas elaboraram seus trabalhos com base em fontes eclesiásticas.”4
Os estudiosos medievalistas descobriram através dos relatos do
cotidiano o quanto esses povos foram afetados pelas invasões bárbaras que
ocorreram durante o começo da Idade Média. Essas invasões ficaram
marcadas na memória da civilização européia. O medo de ser dominado por
um pagão, um estrangeiro, o outro era impensável.
As invasões começaram no século IV e terminaram no século IX. Foram
grandes migrações que assolaram o Império Romano Ocidental. Tiveram duas
fases de invasões, cada qual com seu modelo. Essas ondas de migrações
desestabilizaram o Império Romano fazendo com que a Igreja fosse agora o
grande refúgio e a grande união desses povos, pois na segunda fase ela
estava em forma de colonização armada.
Essas invasões mudaram a estrutura do mundo romano. As partes
conquistadas foram dominadas e escravizadas. Mas não por muito tempo logo
os “bárbaros” (como denominavam os romanos quem não era romano ou não
era igual a eles) foram subjugados belos bizantinos e pelos francos.
Os pagãos, todos aqueles que não eram cristãos e que assim foram
denominados após a conversão do Ocidente ao cristianismo, eram tão temidos
pelo povo medieval, quanto o terror gerado pelo medo de novas invasões.
“Nos tempos de São Luís, as hordas que surgiam do leste provocavam terror e angústia no mundo cristão. O medo do estrangeiro oprime novamente as populações. (...) Essas invasões tinham tornado menos claras as fronteiras entre o mundo pagão e a cristandade e estimulado o crescimento econômico. (...) Se o homem medieval teme,
4 RIBEIRO, Daniel Valle. A cristandade do Ocidente medieval. p.2
14
sobre todas as coisas o pagão, o muçulmano e o judeu, infiéis a converter ou a destruir, desconfia também do outro, seu vizinho de aldeola.”5
Esse temor foi fortemente influenciado pela Igreja que agora não
aceitava mais as outras religiões. Pregava sobre a salvação das almas, e como
elas poderiam ser salvas de todo o pecado, os flagelos da carne nada
importavam perante a vida eterna. A Igreja via mal em “todos” os lugares e
pessoas. Somente através da penitência a alma se salvaria e mesmo assim
não era garantido. O mundo mudava rapidamente nessa época. A população
triplicou pela grande produção agrícola, isso por causa do grande progresso
material.
“Num país atormentado por querelas religiosas e enquanto os turcos rondam as fronteiras do império, todo estrangeiro é suspeito, sobretudo à noite. Ao mesmo temo, desconfia-se do homem ”comum” cujas “emoções” são imprevisíveis e perigosas. Assim, dá-se um jeito para que não perceba a ausência dos soldados habitualmente estacionados sob o dispositivo complicado da porta falsa. No interior desta, empregam-se os últimos aperfeiçoamentos da metalurgia alemã da época; graças a isso, uma cidade particularmente cobiçada consegue, se não afastar completamente o medo para fora de seus muros, ao menos enfraquecê-lo o suficiente para que possa viver com ele.”6
Mas não era somente o estrangeiro que era temido, o próprio vizinho
poderia ser suspeito, se não fosse amigo, conhecido, todos cuidavam da vida
de todos. A Santa Inquisição ganhou muitos processos por isso, os vizinhos
ficavam vigiando qualquer movimentação ou ato “suspeito” que pudesse indicar
algo que fosse contra as convicções religiosas pré-estabelecidas.
Por muito tempo ainda se convivia em grande parte da Europa com o
paganismo, existindo inclusive uma incorporação dos elementos dessas
crenças para que os fiéis se aproximassem e entendem a fé católica.
Entretanto com o tempo isso foi se modificando e o paganismo foi apenas
tolerado. Depois com a Inquisição começou a perseguição e a pregação da
Igreja, contra outras crenças reduzindo a sua importância e significados a
representatividade do mal.
“(...) E há-o, sem dúvida; mas não representa no cristianismo nada de essencial, pelo que tenho a impressão de que se formou já havia essa presença e essa pressão de um
5 DUBY, Georges. Ano 1000, ano 2000. p. 50
6 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 12
15
maravilhoso anterior, perante o qual o cristianismo não podia deixar de pronunciar-se, de tomar posição. O sobrenatural, o miraculoso, que constituem o que é o princípio do cristianismo, parecem-me diferentes, por natureza e função, do <<maravilhoso>>, embora tenham marcado com seu selo o maravilhoso cristão.(...)”7
No século XI e XII há uma grande produção no Ocidente, onde se firma
o dualismo cristão sobre a figura do demônio como devorador de homens e
com olhos vermelhos, cabelos e asas de fogo, além de uma série de outras
criaturas infernais.
“Esse discurso religioso sobre a morte (...) revelou-me uma mensagem que aclara um panorama histórico muito amplo: para a Igreja, o sofrimento e a aniquilação (provisória) do corpo são menos temíveis do que o pecado e o inferno. O homem nada pode contra a morte, mas – com a ajuda de Deus – lhe é possível evitar as penas eternas.”8
Não apenas as feiticeiras, o estrangeiro e as guerras estavam assolando
a Europa. Mas qualquer distúrbio na natureza era visto como um aviso, de
Deus ou como um ato do demônio. As pestes foram sem dúvidas vistas como
uma punição Divina aos pecados dos homens. Por isso, cada pequeno
distúrbio, era analisado e interpretado, pelos detentores do saber, os
eclesiásticos de modo a favorecer e reforçar o poder e a manipulação do medo,
limitando o seu livre arbítrio e questionamentos.
Mas outra coisa que trouxe muito medo foi à Peste Negra. Pois ela
devastou a população européia em pouco tempo, por esta não ter ainda nesse
momento condições e nem conhecimento básicos de higiene. A peste se
alastrou muito rápida por toda a Europa. Os médicos da época tinham uma
idéia de como a peste se alastrava, mas não de como ela realmente era
transmitida.
“A epidemia determinou uma elevação geral no nível de vida. Ela livrou a Europa de um aumento de população. Durante meio século, a peste permaneceu no estado endêmico, com retornos em quatro ou cinco anos, até por volta de 1400, quando o organismo humano finalmente desenvolveu anticorpos que lhe permitiram resistir. A cada trégua, a vida recomeçava ainda com mais intensidade. Durante os anos de peste, os arquivos dos notórios ficam repletos de testamentos e, logo que a doença entra em remissão, de contratos de casamento. Na minha opinião, é no campo cultural que as repercussões do choque são mais visíveis. O macabro instala-se na literatura e
7 LE GOFF, Jacques. O maravilhoso e o cotidiano no ocidente medieval. p. 19
8 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 36
16
na arte. Propagam-se imagens trágicas, o tema do esqueleto, da dança macabra. A morte está em toda a parte.”9
Sobretudo a peste era mais um castigo aos homens, para purgar seus
pegados aqui na terra, era um castigo que Deus enviava.
O mar se apresenta como um dos perigos mais temidos na Idade Média
e Renascença, pois no imaginário coletivo a causa das tempestades, ou a falta
dos ventos nas viagens marítimas era culpa dos monstros que existiam nesses
lugares. Acima de tudo o mar era o domínio do demônio.
Os monstros descritos pelos marinheiros são impressionantes, lulas e
peixes gigantes, sereias, dentre outros. Esses monstros derrubavam os navios,
ou arrancavam partes deles, assim diziam os marinheiros em seus relatos. E
por muito tempo se acreditou e se mistificou o mar.
“Por trás dessas crenças legendárias ou desses exageros assustadores, adivinha-se o medo do outro, isto é, de tudo que pertence a um universo diferente.”10
Poucos se aventuravam nos mares, os relatos da época são
assustadores. Muitas vezes para engrandecer os capitães da frota e para que o
outro país não se aventurasse a fazer expedições e explorar outros territórios,
evitando assim a conquista de novos territórios e riquezas.
Nessa época não existiam dúvidas sobre a existência do outro mundo, e
de animais fantásticos. Para eles, isso tudo era muito real. Acreditavam
fielmente na vida após a morte e fariam tudo o que fosse possível para salvar
suas almas. Isso era comum entre guerreiros e camponeses.
O nobre apesar de também temer o inferno e os mares não podia
demonstrar esse medo, pois os mesmos eram superiores na sociedade e
distintos do resto da população.
“A literatura das crônicas é igualmente inesgotável sobre o heroísmo da nobreza e dos príncipes, sendo estes a flor de toda a nobreza. Apresenta-os como impermeáveis a todo temor.”11
9 DUBY, Georges. Ano 1000, ano 2000. p. 86 10 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 54
17
Para a nobreza demonstrar essa fraqueza significava igualar-se ao
restante da população. Os nobres precisavam fazer com que os camponeses
sentissem medo deles. E por natureza, a partir do senso comum da época, os
humildes eram medrosos e não poderiam mudar este fato mesmo que
quisessem. Um soldado seria apenas um “soldado medroso” e nunca chegaria
a ser cavaleiro, por falta da nobreza de sua alma e principalmente de seu
sangue.
A população tem medo dos cavaleiros, pois quando não guerreavam,
invadiam as casas, roubavam o que podiam. Assim a Igreja fez desse ofício,
sagrado. Eles lutavam por Deus e pelo rei, pois o rei era escolhido por Deus. A
partir do ano 1000 um código foi a “paz de Deus”:
“Os bispos e os príncipes diziam-lhes: ‘Se não quiserdes ser condenados, prestai juramento, engajai-vos, perante Deus e por vossa alma, a respeitar algumas proibições. Podeis matar-vos, mas não mais devereis, doravante, brigar nos arredores das igrejas, locais de asilo onde qualquer um pode refugiar-se. Não podereis brigar em determinados dias da semana, em memória à Paixão de Cristo. Nada de guerra na sexta-feira, portanto, nem no domingo. Além disso, não devereis atacar as mulheres, não as nobres, em todo caso, nem os comerciantes, os padres e os monges’.”12
Nas Cruzadas os cavaleiros viram sua real utilidade, para fazer grandes
feitos, e ainda reaver o Túmulo de Jesus. Tudo com a benção do Papa e
grandes possibilidades de recompensas.
“Esse arquétipo do cavaleiro sem medo, perfeito, é constantemente realçado pelo contraste com uma massa considerada sem coragem. (...) No século XVII, La Bruyère por sua vez aceita como uma certeza a idéia de que a massa de camponeses, artesãos e criados não é corajosa porque não busca – e não pode buscar – a fama.”13
Na sociedade medieval os homens estavam sempre em bandos, mesmo
na vida privada. Suas casas eram apenas separadas por cortinas, por vezes
compartilhando em grande número o mesmo leito. Se as pessoas saíssem
sozinhas ou eram consideradas loucas ou criminosas. Haviam os eremitas que
adentravam as florestas e isolavam-se para expiar seus pecados e por isso
eram considerados santos e corajosos. Isso porque era perigoso para as
pessoas, no imaginário delas isso atraia o mal. Mesmo assim se acreditava nos
11 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 14 12 DUBY, Georges. Ano 1000, ano 2000. p. 102 13 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 14
18
vestígios de que Dragões e outros seres maléficos agrediam crianças
irrefutavelmente.
Com a Renascença, muitos conceitos estavam mudando, não somente
no comércio, mas na forma de ver o mundo e na própria Igreja. Foi uma época
de grandes mudanças em questão de inovações de idéias, da economia, das
artes. Na economia a significativa abertura das grandes casas bancárias
influenciadas pelo pensamento antropocêntrico e humanístico; as muitas
descobertas no campo da ciência durante esse período, como as técnicas de
imprensa, novas técnicas de arquitetura, pensamento com o Decamerão de
Boccaccio e a Divina Comédia de Dante Alighieri e muitos outros como
Leonardo da Vinci.
As novidades nunca foram aceitas de bom grado pela sociedade
ocidental. As descobertas por muito tempo foram refutadas. Pois isso
significava novas perspectivas no modo como eles conheciam o mundo.
Novidades sempre trouxeram medo para o ocidente.
A teoria do heliocentrismo, desenvolvida por Nicolau Copérnico, depois
estudada por Galileu Galilei, onde a terra girava em torno do sol, foi contestada
varias vezes e por séculos não foi aceita. O livro de Nicolau Copérnico no qual
expôs sua teoria, na época da inquisição fez parte do Index Librorum
Prohibitorum, a lista dos livros proibidos pela Igreja. E Galileu Galilei por
defender suas idéias sobre o processo passou os últimos anos de sua vida em
prisão domiciliar.
Com o renascimento, o homem passa a perceber o mundo a sua volta
de uma forma mecanicista. Dessa maneira, o homem passa a pensar mais no
cotidiano, dando valor aos prazeres da vida. Surgem as primeiras
universidades, responsáveis pelo resgate dos valores greco-romanos. O
comércio se expandiu, e a descoberta do novo mundo, trouxe muito mais
experiência científicas e culturais.
19
Houve muitos conflitos com esses pensamentos, essas novas maneiras
de ver o mundo. O grande cisma criado pelas noventa e cinco teses de Lutero,
e as idéias de Calvino causaram a Reforma protestante, que nada mais era do
que uma forma de voltar a pregar como Jesus nos primórdios, e como os
apóstolos seguiram pregando no princípio da Igreja. Diante desses
acontecimentos, a Igreja precisou rever alguns de seus antigos conceitos e
dogmas. Haviam muitas revoltas por toda a Europa entre cristãos e
protestantes e a Igreja precisava tomar posição. Este medo de mudança é
muito presente em várias facções da Igreja ainda hoje.
Mesmo na modernidade, na França, houve um massacre dos católicos
para com os protestantes, isso fomentado pela monarquia, conhecido como
massacre de São Bartolomeu14. Foi um massacre organizado pela monarquia
francesa, que matou vários huguenotes (protestantes calvinistas) durante
vários meses. Esse episódio deixou a população em conflito e com medo uns
dos outros.
Com as guerras entre os países, e o poder da igreja se separando do
poder monárquico, o povo fica desprotegido.
“Refinados que somos por um longo passado cultural, não somos hoje mais frágeis diante dos perigos e mais permeáveis ao medo do que nossos ancestrais? É provável que os cavaleiros de outrora, impulsivos, habituados às guerras e duelos e que se lançavam com impetuosidade nas disputas, fossem menos conscientes do que os soldados do século XX dos perigos do combate, e portanto menos sensíveis ao medo. Em nossa época, em todo caso , o medo diante do inimigo tornou-se a regra.”15
O absolutismo se espalhou em vários países da Europa, a Igreja perdeu
muita de sua influência, riqueza e poder, pois, os reis afirmavam que sua
escolha era feita por Deus e sua vontade era divina, deixando desta forma a
igreja sem poder para interferir diretamente nos assuntos de Estado. Ao
mesmo tempo em que contavam com o apoio dela para validar certas ações.
Com as dificuldades que o povo passava e os intelectuais instigando a
população à revolta, tem início os primeiros incidentes que levaram a explosão
14 Esse massacre foi feito em várias cidades francesas. 15 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 18
20
da Revolução Francesa, trazendo abertura das mentalidades que desde o
Renascimento havia iniciado, porém somente nesta época atingia seus
objetivos criando espaço para o inicio da Revolução Industrial. Com o início do
fortalecimento do capitalismo gerado pelas muitas horas de trabalho e poucas
horas de lazer, o mundo desse período bem mais jovem do qualquer outro
anterior: cheios de crianças, com jovens casais ou pessoas no auge da
juventude estimulou muito a economia, embora devêssemos considerá-las
como uma conseqüência mais do que uma causa exterior da revolução
econômica, pois sem ela um crescimento populacional tão rápido não poderia
ter sido mantido durante mais do que um limitado período. A segunda maior
mudança foi nas comunicações, pois as ferrovias estavam apenas na infância;
o Império Austríaco acrescentou mais de 30 mil milhas de estradas entre 1830
e 1847, a Bélgica e a Espanha quase duplicaram suas teias viárias, os Estados
Unidos multiplicou seu sistema viário de 21 mil milhas em 1800 para 170 mil
milhas em 1850. Enquanto a Grã Bretanha adquiria seu sistema de canais, a
França construía duas mil milhas deles entre 1800 e 1847 e os Estados Unidos
abriam rotas fluviais tão importantes como as do Lago Erie, do Chesapeake e
do Ohio. Já os navios a vapor união Grã Bretanha e a França (1822) e subiam
e desciam o Danúbio. Os navios à vela se tornaram não apenas mais rápidos e
seguros eram em média, maiores também, o serviço de correio que depois de
1824, ia de Berlim a Magdeburgo em 15 horas ao invés de dois dias e meio
anteriormente foi suplementado pela brilhante invenção de Rowland Hill da
cobrança padronizada para matéria postal em 1839 em logo em seguida pela
invenção do selo adesivo em 1841, multiplicaram os correios. Entre 1830 e
1840 o número de cartas anualmente despachados na França subiu de 64 para
94 milhões.
O volume do comércio e da imigração gerado por essas imigrações foi
surpreendente, entre 1816 e 1850 cerca de 5 milhões de europeus deixaram
seus países nativos (quase 4/5 deles para as Américas), e dentro dos países
as correntes de migração interna eram bem maiores. Entre 1780 e 1840 o
comércio internacional em todo o mundo ocidental mais do que triplicou. O
ritmo de mudança social e econômica acelerou-se visível e rapidamente
21
trazendo com estes também a criação do medo do outro16. O poder da Igreja
subsistia embora, muito enfraquecido tendo em vista o conhecimento adquirido
sobre o funcionamento do corpo humano, da astronomia e das ciências em
geral, restando ainda o medo do inferno e do além, campo ainda nas mãos da
Igreja.
Com o aprimoramento do uso da Câmara Escura, desde Kepler e suas
descobertas astronômicas até o uso popular das primeiras Câmeras
fotográficas por Daguerre em 1839, percebe-se um novo medo, agora por parte
dos pintores que viam sua função desvanecer-se diante da nova invenção e
também a crença da perda da alma ao ser fotografado. Esta descoberta trouxe
a possibilidade posterior da invenção do cinema.
Vários livros sobre ciência-ficção, astronomia-ficção são lançados nessa
época como forma de manter a população alfabetizada com acesso as
inovações e transformações que ocorrem nesses campos, como o livro de
Mary Shelley – Frankenstein; Herman Melville – Moby Dick; Goethe – Fausto,
entre outros.
Com o início das tentativas de transplantes de órgãos, as mentes
extremamente férteis de alguns autores, criam livros, contos, relatos de fatos e
ficções trazendo, desta forma ao imaginário do povo as notícias dos avanços
da medicina, como um novo potencial gerador de medo das possíveis criações
de monstros e seres malévolos que passam a habitar o cotidiano da população
crédula, assim reafirmando a crença na Igreja e um novo paradigma diante das
descobertas. Após algum tempo, tendo em vista a dificuldade da manutenção
de vida dessas criaturas, o medo dá lugar a um entendimento da medicina com
suas reais limitações. O lugar de Deus é reassegurado, pois, a medicina
reconstrutiva ainda é uma ciência em fase inicial e a Igreja tenta de várias
formas incutir o medo na forma de pensar e agir dos cientistas.
Com os princípios descobertos por Isaac Newton que explicam como os
movimentos dos planetas podem ser explicados pela Lei da gravitação e das 16 cf. HOBSBAWM, Eric J. A era das revoluções 1789-1848
22
Leis da dinâmica cria-se uma nova perspectiva de entendimento da vida na
Terra e questiona-se a possibilidade de vida extraterrestre. Isto gera um novo
tipo de medo que é apresentado nos primeiros romances sobre a invasão do
nosso mundo por seres alienígenas agressores.
Arthur C. Clarke e Isaac Asimov foram os precursores da literatura de
ficção científica, trazendo ao cotidiano vários avanços tecnológicos ainda
inexistentes em nosso tempo, mas que a seguir se tornariam em parte reais,
tais como o satélite geoestacionário e as viagens à Lua. Filmes como “O dia
em que a terra parou” (The Day the Earth Stood Still), dirigido por Robert Wise
baseado no conto de Harry Bates, conta à história de dois alienígenas, sendo
um deles robô, vêm visitar a Terra com a missão de falar com os líderes
mundiais para avisar que com seu instinto agressivo e suas viagens espaciais
estavam sendo um perigo para própria humanidade. Mas logo na sua chegada,
quando eles pousam na Terra, em Washington, são recebidos de forma hostil.
E assim um deles é ferido e vai para um hospital, mas consegue fugir e passa
a conviver com uma família local, descobre como as pessoas na terra se
envolvem com guerras facilmente e como o poder nuclear está dirigido para
fins bélicos, visando somente destruição. Na impossibilidade de frear estes
instintos, pede auxílio aos cientistas terráqueos e descobre que estes também
pensam da mesma forma, tenta então numa demonstração do poder por ele
representado parar o funcionamento de todos os setores energéticos, deixando
apenas fora de sua força os setores médicos hospitalares, mas mesmo assim
não é ouvido e termina ferido de morte deixando um alerta para a população da
terra de como sua atitude belicista poderá trazer um desastre futuro e quem
sabe sua aniquilação por meio nuclear. E o filme “Alien” que foi sucesso de
bilheteria por sua abordagem capitalista, mostrando operários, a hierarquia, e
por mostrar nas telas a tecnologia disponível na época (1979) e sua inovação
em colocar uma heroína, baseado no novo papel da mulher na sociedade,
contra um predador alienígena.
Com a tecnologia possibilitando a descoberta dos novos planetas e
galáxias, o imaginário popular cria fantasias sobre extraterrestes os vendo
23
como seres hostis, refletindo a própria hostilidade humana que agora deixa o
espaço físico terrestre e adentra o espaço sideral, colonizando-o com criaturas
próximas a nossa própria imagem, mas ao mesmo tempo dotadas de atributos
superiores ao do ser humano e assim os catalogando como possíveis
agressores, outras vezes, não os reconhecendo como tais, mas sempre os
vencendo no final. Esta indiferenciação entre o bom e o mau visa à
manutenção do medo do desconhecido, do alijado, daquele que por estar
distante do comum é assustador.
“Porque é impossível conservar o equilíbrio interno afrontando por muito tempo uma angústia incerta, infinita e indefinível, é necessário ao homem transformá-la e fragmentá-la em medos precisos de alguma coisa ou de alguém. “O espírito humano fabrica permanentemente o medo” para evitar uma angústia mórbida que resultaria na abolição do eu. É esse processo que reencontraremos no estágio de uma civilização. Em uma seqüência longa de traumatismo coletivo, o Ocidente venceu a angústia “nomeando”, isto é, identificando, ou até “fabricando” seus medos particulares.”17
O temor humano que tanto serviu no passado para proteção e
preservação da vida é hoje criado para a manutenção da crença em algo
superior do qual por não termos conhecimentos precisos, criamos poderes que
existindo nos colocam sob riscos inimagináveis. E o medo desse poder se
voltar contra a própria humanidade é maior a cada nova tecnologia e
descobertas científicas. E apesar de todo conhecimento, crenças e fé ainda
tememos o desconhecido como sendo algo individual e ao mesmo tempo
coletivo, o que nos aproxima cada vez mais do mundo globalizado.
17 DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente. p. 26
24
2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DO FILME E
CONTEXTUALIZAÇÃO CONTEMPORÂNEA DO IMAGINÁRIO NO CINEMA.
No fim da Segunda Guerra Mundial, os representantes dos países
Inglaterra, União Soviética e Estados Unidos, se encontraram em Yalta, na
Ucrânia, para decidir os rumos pós-guerra, ficando assim dividido o território
alemão em quatro zonas de ocupação, em 1949 esse mesmo território foi
dividido em dois países: a República Federal Alemã (Alemanha Ocidental), sob
influencia dos Estados Unidos e a República Democrática Alemã (Alemanha
Oriental) sob a influencia da União Soviética. Com o crescente clima de
hostilidade político-ideólogica (Guerra Fria), entre os governos dos Eua e da
URSS levou também a divisão de Berlim em duas partes. O apoio financeiro
dos EUA reergueu e tornou Berlim Ocidental um lugar atraente e
economicamente próspero, para impedir a fuga populacional à Alemanha
Oriental conduziu a rápida construção de um muro de cimento na noite de 13
de agosto de 1961.
O envolvimento dos Estados Unidos e da União Soviética na Guerra da
Coréia, na qual os EUA enviavam tropas para lutar ao lado dos Sul-Coreanos
contra a URSS e os Chineses que tinham adotado o comunismo no ano
anterior entram no conflito em defesa da Coréia do Norte.
Guerras como a da Coréia e a corrida armamentista que se estendeu
pelas décadas seguintes provocaram a indignação em várias partes do mundo,
a consciência de que uma guerra nuclear levaria a aniquilação da Terra fez
com que proliferassem os movimentos pacifistas. Em fins da década de 1970
esses movimentos colhiam seus primeiros frutos, pois acordos que limitavam a
fabricação de armas nucleares começaram a serem assinados. Como o
debochado filme “MASH”, ou os dramas “O franco atirador” e “Apocalypse now”
que falam da guerra da coréia, cada um da sua maneira.
Nesses tempos de Guerra Fria criaram-se os sistemas de espionagem e
contra-espionagem, levados depois às telas de cinema eternizando agentes
como o famoso 007 e popularizando a CIA e sua arquiinimiga a KGB, que além
de espionar seus adversários os agentes da CIA participaram na organização
25
de golpe de Estado que instalaram ditaduras militares em vários países na
América Latina, como, por exemplo, na Guatemala em 1954. Do lado socialista
a KGB era encarregada de reprimir qualquer oposição ao governo de Moscou
tanto na URSS quanto nos países sob sua influência.
Em 1960, os sul-vietnamitas organizaram a Frente Nacional de
Libertação, liderado pelos comunistas, o braço armado desta era o vietcongue,
um exército guerrilheiro que recebia apoio e armas do Vietnã do Norte, da
China e da União Soviética; percebendo que a maioria vietnamita apoiava a
sua unificação sob o regime comunista, os Estados Unidos decidem apoiar o
governo ditatorial instalado no Vietnã do Sul.
Em 1961, o então presidente John Kennedy envia armamentos e
milhares de soldados para o Vietnã do Sul iniciando uma guerra que se
estenderia por mais de uma década. A televisão levava ao mundo todo,
imagens da guerra fazendo surgir um forte movimento de marchas e de
protestos nos Estados Unidos e em várias outras partes do mundo ao ver as
enormes perdas humanas e a impossibilidade de vencer o povo vietnamita
acabou por levar os EUA a retirar suas tropas do Vietnã em 1973. O uso das
armas químicas como o agente laranja e o napalm que além de matar e mutilar
milhares de pessoas, trouxeram danos quase irreparáveis ao meio ambiente.
A seqüência dessa guerra com a ocupação de Saigon pelas forças
socialistas permaneceu até 1976 quando após as eleições gerais o país foi
unificado com o nome de República Socialista do Vietnã, o qual vem adotando
uma política mais flexível e intensificando suas relações comerciais com países
capitalistas, inclusive os Estados Unidos.
O aspecto mais óbvio da Guerra Fria embora fosse o confronto militar e
a corrida armamentista não foi esse o seu grande impacto. As potencias
nucleares não se envolveram em guerras entre si, abalados pela vitória
comunista na China, os EUA e seus aliados após intervir na Coréia e no Vietnã
com o mesmo objetivo, perderam. A URSS retirou-se do Afeganistão após
fornecer ajuda militar ao governo para combater guerrilhas apoiadas pelos
americanos e abastecidas pelo Paquistão. Em suma o material caro e de alta
26
tecnologia da competição das superpotências revelou-se pouco decisivo. O
medo da ameaça constante de guerra produziu movimentos internacionais de
paz essencialmente dirigidos contra as armas nucleares; esses movimentos tão
pouco foram decisivos, embora um movimento contra a guerra específico e
eficaz foi os dos jovens americanos contra o seu recrutamento para a Guerra
do Vietnã. Também há mais filmes sobre a Guerra Fria como “A caçada a
outubro vermelho” e da guerra da Coréia como ”Os que sabem morrer”. São
muitos os filmes produzidos pela situação mundial da época.
“Na verdade, o resultado líquido dessa fase de ameaças e provocações mútuas foi um sistema internacional relativamente estabilizado, e um acordo tácito das duas superpotências para não assustar uma à outra e ao mundo, simbolizado pela instalação da “linha quente” telefônica que então (1963) passou a ligar a Casa Branca com o Kremlin. (...) Os anos 60 e 70 na verdade testemunharam algumas medidas significativas para controlar e limitar as armas nucleares: tratados de proibições de testes, tentativas de deter a proliferação nuclear (aceitas pelos que já tinham armas nucleares ou jamais esperaram tê-las, mas não pelos que estavam construindo seus próprios arsenais nucleares, como a China, A França e Israel), um Tratado de Limitação de Armas Estratégicas (SALT) entre os EUA e URSS, e mesmo alguns acordos sobre Mísseis Antibalísticos (ABMs) de cada lado.”18
Em fins da década de 1940, os cientistas ainda se angustiavam em torno
da questão de entrarem ou não em estabelecimentos do governo
especializados em pesquisa de guerra química e biológica, inesperadamente,
foi na região soviética que a ciência tornou-se mais política a medida que
avançava a segunda metade do século. Andrei Sakharov, foi o principal
responsável pela construção da bomba de hidrogênio soviética, o primeiro
satélite artificial (Sputnik – 1957), o primeiro vôo espacial tripulado, por Yuri
Gagárin, tornando-se o primeiro astronauta a fazer o vôo orbital em torno da
Terra. E os primeiros passeios espaciais foram todos russos (1961-1963).
Os Estados Unidos tiveram várias tentativas de vôos espaciais, alguns
até com mortes, como o da Apollo 1 que mesmo nos teste de solo já
apresentou problemas e matou os 3 astronautas. Mas foi só em 1969, com a
nave espacial Apollo11, tripulada por 3 astronautas também, mas está
conseguiu chegar ao seu destino, a Lua. Consagrando o astronauta Neil
Armstrong, como o primeiro homem a pisar em solo lunar e seus
companheiros. Essa também foi uma viagem que proporcionou grandes
18
HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos. p. 240
27
conhecimentos e possibilidades para as telecomunicações, meteorologia,
observação militar e ainda expandiu mais o imaginário popular.
“A desconfiança e o medo da ciência eram alimentados por quatro sentimentos: o de que a ciência era incompreensível; o de que suas conseqüências tanto práticas quanto morais eram imprevisíveis e provavelmente catastróficas; o de que ela acentuava o desamparo do individuo, e solapava a autoridade. Que era inerentemente perigosa na medida em que interferia na ordem natural das coisas. Estes sentimentos partilhados por cientistas e leigos, sendo que estes só podiam reagir contra seu senso de impotência buscando coisas que “a ciência não pode explicar”, (...) recusando-se acreditar que elas pudessem algum dia serem explicadas pela ciência oficial, e ansiando por acreditar no inexplicável porque parecia absurdo. Quanto maiores os triunfos palpáveis os triunfos da ciência maior a fome de buscar o inexplicável.(...) Esse medo também foi espalhado inata hipocondria da cultura americana, a medida que a vida era cada vez mais submersa pela tecnologia moderna, incluindo a tecnologia médica com seus riscos.(...) De maneiras diferentes tanto o stalinismo quanto o nacional socialismo alemão, rejeitavam a ciência mesmo quando a usavam para fins tecnológicos; o que contestavam era seu desafio a visões de mundo e valores expressos em verdade a priori.”19
Na URSS os avanços tecnológicos já eram conquistados desde o fim da
Segunda Guerra Mundial. Kruschev no poder se destacou por defender uma
política pacífica (a convivência em paz entre países capitalistas e socialistas), o
processo conhecido como desestalinização, ou seja anulação das medidas
autoritárias adotadas por Stalin que inicialmente libertou os prisioneiros
políticos dos campos de trabalho forçado e tornou a censura à imprensa menos
rígida; isso somado a revelação ao mundo dos crimes praticados por Stalin,
bem como a campanha de culto a sua personalidade chocou o mundo,
afetando a população soviética .
A sucessão de Kruschev por Leonid Brejnev de 1964 a 1982 trouxe um
retrocesso ao adotar os métodos stalinistas na repressão aos opositores, tendo
como base a idéia de salvar o socialismo. Após invadir a Tchecoslováquia em
1968, afim de impedir uma tentativa de democratização do regime comunista
local. Em 1979 envia tropas ao Afeganistão para derrotar forças islâmicas que
lutavam para derrubar o governo aliado da União Soviética. Dois anos depois
apóia um golpe militar contra a força sindical polonesa. A Intervenção no
Afeganistão recebeu várias represálias do ocidente, uma delas a recusa dos
EUA a enviar atletas para as Olimpíadas de Moscou, represália esta que a
19 HOBSBAWM. Eric J. Era dos extremos. p. 511
28
URSS revidou nos jogos olímpicos de Los Angeles, onde seus atletas não
compareceram.
Ainda no governo de Brejnev a União Soviética sofre uma grave crise
econômica, sua produção de grãos e combustíveis escasseia e é necessário a
importação; com isto sobrava menos para investir na construção de moradias,
e na produção de gêneros de primeira necessidade: é a escassez de tudo e as
longas filas e prateleiras vazias tornam-se fatos corriqueiros para o povo já que
para os funcionários graduados do Partido Comunista haviam as beriozkas –
lojas especiais onde ao lado dos artigos nacionais encontravam-se produtos
importados de boa qualidade. Essa crise refletia a queda da qualidade de vida
da população soviética, crescendo o desemprego, consumo de drogas, o
alcoolismo, e o crime organizado. Por falta de capitais a indústria não se
modernizava e assim perdia terreno para o Japão e os EUA e isto tudo
continuou até a chegada de Mikhail Gorbachev em 1985, onde a glasnost
(transparência) na política interna e externa visava a Perestroika
(reestruturação).
Nos Estados Unidos depois da Segunda Guerra Mundial com o advento
da aceleração da indústria de eletrodomésticos e dos automóveis, a população
entrou numa era de descartabilidade e consumismo desenfreado, gerando a
sensação de país mais rico do mundo e criando o sonho americano em vários
meios de comunicação com sua propaganda de país de conquistas e
realizações, com isso a imigração tornou-se um problema para os americanos
nativos, pois a criação de empregos para esses imigrantes, que no início era
uma mão de obra barata, logo mais estava tirando empregos dos mesmos, fato
este que ainda persiste.
“(...) A dinâmica de uma sociedade “do descarte”, como a apelidaram escritores como Alvin Toffler(1970), começou a ficar evidente durante os anos 60. Ela significa mais do que jogar bens produzidos (criando um monumental problema sobre o que fazer com o lixo); significa também ser capaz de atirar fora valores, estilos de vida, relacionamentos estáveis, apego a coisas, edifícios, lugares, pessoas e modos adquiridos e agir e ser."20
20 Harvey, David. A condição pós-moderna, p. 258.
29
Os Estados Unidos da América durante os anos de 1970 estava sob o
governo do presidente democrata James Earl Carter Jr, mais conhecido como
Jimmy Carter, onde empregava políticas pacifistas e diplomáticas. Durante este
período conquistou importantes acordos políticos como: tratado com a China,
fez um acordo de paz entre Israel e Egito; influenciou de forma direta a
abertura democrática de vários países, assinou ainda, o acordo SALT II21 com
a União Soviética, no qual a URSS reduziria seu poderio bélico nuclear.
Todavia, os acordos políticos conquistados por Jimmy Carter não
amenizaram os problemas exaltados a princípio, com a Revolução Iraniana22,
seguida do seqüestro dos 52 funcionários da embaixada americana no Teerã, e
da interferência soviética no Afeganistão.
As medidas pacifistas adotadas pelo governo Carter acabaram por gerar
desaprovação por parte do povo americano e ele não conseguiu se reeleger.
Por exemplo em “E.T. – O Extraterrestre” de 1982, que conta a história de um
E.T. bonzinho, que é deixando na terra e é descoberto por um garoto de dez
anos que o ajuda e faz de tudo para que os adultos não o descubram e ele se
torne cobaia da Nasa, assim ele ajuda o E.T. regressar ao seu planeta, depois
de viver uma emocionante aventura na Terra. É um filme mostrando a pureza
de que o ser humano é capaz de mostrar pelo outro, pelo desconhecido, pelo
alienígena,sem querer nada em troca, mas ao mesmo tempo esse filme
demonstra o que somos capazes de fazer pelo medo.
No Reino Unido, Margaret Thatcher era considerada a líder mais
enérgica do Partido Conservador ascendeu à liderança em 1975. É eleita à
primeira ministra mulher, no ano de 1979 e é considerada a “Dama de Ferro” e
defensora do liberalismo econômico. Adotou a política de privatização das
empresas estatais, eliminação do salário mínimo, combate aos sindicatos,
aumento dos impostos indiretos entre outras coisas, conseguiu reduzir a
inflação e melhorou a cotação da libra esterlina. Mesmo com a severa
administração com o intuito de diminuir a inflação a economia Britânica
mergulhou numa profunda recessão. O índice de desempregos passou de 21
Esse acordo viria a substituir o SALT I porém, nunca foi ratificado. 22
Como um ato de repressão ao sistema de ocidentalização imposto pelo Xá Reza Pahlevi.
30
menos de um milhão para quase três milhões, gerando ainda diminuição da
produção industrial. Em 1981, 365 jornalistas escreveram um manifesto de
repúdio à política econômica de Margaret Thatcher, para colocar um fim a
recessão. No conflito das Ilhas Malvinas sua intervenção foi bem vista pela
população britânica e isto possibilitou sua reeleição com uma folga que não se
via desde 1935. E Margaret Thatcher era mais um estereótipo da nova mulher
que estava surgindo na sociedade capitalista.
“Margaret Thatcher é o melhor homem da Inglaterra." A frase é do ex-presidente americano Ronald Reagan, com quem "Maggie" formou uma dupla afinada. Quando ela assumiu o cargo, em 1979, a Inglaterra era a menos viável das nações industrializadas. Em onze anos e meio no poder, Thatcher privatizou furiosamente, peitou sindicalistas, encolheu o governo e recuperou a prosperidade dos ingleses. A receita de Maggie atraiu ira e admiração em doses descomunais. "Se quiser que um político diga algo, chame um homem. Se quiser que faça, chame uma mulher", afirmava. Quando VEJA falou com ela em 1994, em Londres, o liberalismo à moda de Thatcher começava a ser copiado em diversas partes do mundo.”23
Já havia nessa época vários filmes que mostravam a mulher como
trabalhadora, que sai de casa para o conseguir o sustento da família ou ajudar
a manter esse sustento, como “Kramer vs Kramer” ou “Julia” entre outros.
Com os avanços tecnológicos, o uso dos efeitos especiais agora
possibilitados e o imaginário de diretores como Hitchcock, Orson Welles e mais
tarde Spielberg tem-se um novo tipo de cinema onde, o realismo fantástico
ganha espaço. Este modelo de cinema utiliza a junção de fatos reais,
verossímeis e a criação de possíveis enredos, que apesar de fictícios geram
um medo real nos expectadores.
No filme “The Lodger: A Story the London Fog” (O locatário) ou mais
conhecido como “Jack, o Estripador”, de 1926, Hitchcock mostra com cores
fortes os assassinatos praticados levando o espectador a sentir “um bafo na
nuca” ao sair do cinema e passar por uma rua mais escura, tal a intensidade
deste primeiro suspense. Em “The Birds” (Os Pássaros) de 1963, inovou a
trilha sonora e os efeitos especiais que fizeram do filme ser nomeado ao Oscar
e ser um clássico dos filmes de suspense. Sua filmografia é extensa, muito
recorrentes os filmes com temas sobre confusão de identidade e intriga
internacional.
23 VEJA, 35anos. Edição especial de aniversário. 24 de setembro de 2003
31
Orson Welles em 1938, produziu uma transmissão radiofônica intitulada
“Guerra dos Mundos”, nela ele fez parecer que a Terra estava sendo invadida
por extraterrestres e era tão verossímil sua narração que causou pânico nos
ouvintes, por imaginarem um exército invadindo o nosso planeta. Mas no dia
seguinte, percebendo a “pegadinha”, todos queriam saber quem era
responsável pela narração. Assim Orson Welles ficou famoso.
No filme “Cidadão Kane” (Citizen Kane) de 1941, Welles inovou com
técnicas de angulações de câmera (uso de plongée e contra plongée), a
narrativa não linear, edição/montagem que era muito sofisticada para a época e
a exploração do campo (campo e contra campo).
Outro diretor muito conhecido por inovações e por temas que estimulam
o medo é Steven Spielberg. Ele fez vários filmes como Tubarão (Jaws) de
1975, que conta a história de vários ataques de um tubarão branco a um
balneário, onde um xerife tenta controlar a situação, mas o tubarão é mais
agressivo que o normal. Nesse filme tiveram vários problemas durante as
filmagens, pois Spielberg não quis filmar o numa piscina e sim na água
salgada, o que danificou o tubarão mecânico.
“(...)Várias sequências em que o Tubarão apareceria, Spielberg teve que substituí-lo por filmagens de marolas e movimentos de água. Mesmo nas poucas ocasiões em que o Tubarão podia ser usado, a responsável pela montagem teve que usar de muita habilidade, para que as cenas não parecessem falsas. As platéias do mundo todo não notaram essas falhas, graças ao exímio trabalho de direção e montagem. Mas para todos os artistas que trabalharam no filme ficou a irritação com aquele "maldito tubarão", conforme diziam nas entrevistas e depoimentos posteriores.” 24
Em “Contatos imediatos de terceiro grau” (Close Encounters of theThird
Kind) de 1977, alienígenas estão chegando na Terra e um chefe de família
muda totalmente seu comportamento, como outras pessoas que sentem a
presença desses extraterrestres, e se dirigem ao local do pouso, assistindo
extasiados um show de sons e luzes, maneira utilizada para o contato .
São filmes que mexem muito com o imaginário da população, pois além
de mostrarem uma história envolvente, colocam os novos feitos da ciência em
24disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/jaws>, acessado em 03/11/2008
32
destaque e acrescentam uma ficção com toques realistas que possibilitam a
crença naquilo que se vê. A habilidade destes diretores ao criarem cada vez
melhores suspenses tecnológicos mais realísticos e assim tratando dos
conflitos individuais e das questões de segurança mundiais são
impressionantes, tornando impossível não ficar extasiados e grudados na
cadeira aguardando o desfecho do filme. Esse medo imaginário gerado pelo
que vemos, retrata bem a necessidade do ser humano confrontar-se com o
desconhecido mas de forma segura, tal qual um salto no abismo preso a um
bom pára-quedas ou uma volta na mais alta montanha russa, enfim, a
necessidade de adrenalina para nos sentirmos mais vivos e alertas pode ser
conseguida de várias formas e no cinema há espaço para que todos nos
sintamos em todos os papéis e assim passeamos pelas sensações de ter todo
o poder e ao mesmo tempo nenhum.
Esse medo aqui descrito é como reviver o que sabemos e o que o
ambiente nos instiga com imagens e sons. Além da crença individual nos
deparamos com aquela ali representada e a sentimos também, por isso certos
filmes tornam-se épicos, lendários, cults. Como discernir entre o medo
imaginário e o real quando o que se apresenta é uma mistura de ambos?
Mesmo os intelectuais mais abalizados reconhecem a dificuldade da população
mais idosa ou menos esclarecida em fazer essa distinção nos dias atuais, onde
contam como lenda a chegada a Lua, mas crêem na existência do Saci Pererê,
mula sem cabeça, boi tatá, Monstro do Lago Ness, entre vários outros.
O medo e o imaginário que o alimenta, é parte integrante de nossa
cultura e modus vivendis, isso é evidenciado tanto na História como nas
estórias da literatura, bem como de todas as formas de comunicação seja ela
radiofônica, televisiva, teatral ou cinematográfica.
3 A ANÁLISE DO FILME ALIEN E COMO AS QUESTÕES DO MEDO E DO
IMAGINÁRIO COLETIVO SE APLICAM NELE.
33
Durante todos os séculos o homem teve seus medos, como foi mostrado
no primeiro capítulo. Esses medos poderiam ser provocados por vários
motivos, pela sociedade, pelo homem e por seu imaginário. O homem produziu
durante todas essas épocas meios de expressar esses medos. Através de
livros, teatro, pinturas e mais tarde o cinema, muitos autores demonstraram o
que temiam, o que a sociedade temia. Com os avanços tecnológicos e as
novas ideologias novos medos foram incorporados na sociedade ocidental.
Isso não significa que os medos anteriores foram esquecidos, como o medo da
fome, da peste, do outro, do diferente em si.
No filme “Alien – o oitavo passageiro” (Alien, 1979), podemos analisar as
influências de medos da sociedade e como o contexto histórico influenciou o
filme. Pois somos criados em um meio onde é impossível não ser influenciado
pelo o que acontece ao redor. Esse filme é classificado como terror /ficção
/suspense, e foi um sucesso desde seus trailers, e depois do lançamento se
tornou um filme clássico do gênero. O filme lançado em 1979, conta sobre uma
tripulação em futuro próximo onde os recursos minerais da Terra já foram
extintos e por isso eles têm que procurá-los fora do planeta. Nessa época eles
já sabiam que os recursos minerais são esgotáveis, principalmente o petróleo.
Sete tripulantes estão nessa nave cargueira, a Nostromo, são os oficiais: Dallas
(Tom Skerrit), Kane (John Hurt), Ripley (Sigourney Weaver), Ash (Ian Holm),
Lambert (Veronica Cartwright) e os operários Parker (Yaphet Kotto) e Brett
(Harry Dean Stanton), que estão em um estágio de hibernação. Na volta para a
Terra, essa nave é desviada de seu curso pela “Mãe”, a inteligência artificial
que comanda a nave enquanto eles estão num estágio de hibernação e analisa
dentre outras coisas o quando é para eles acordarem e tem diretrizes da
empresa para passar ao capitão ou ao seu sucessor. Isso porque a Mãe
interceptou um sinal desconhecido onde às regras da Companhia os obriga a
investigar o local de onde vem o sinal, senão eles perdem as suas “cotas”, o
pagamento pelo serviço.
34
Assim, são tirados do estado de hipersono, sem entender o porque, se
não estão próximos da Terra. O capitão Dallas é chamado, por um tipo de bip
pela Mãe e vai questioná-la porque foram acordados antes do tempo.
Os outros tripulantes tentam se localizar e descobrem que estão fora da
rota e estão num Sistema longínquo ao nosso Sistema Solar e esperam a
respostas da conversa do capitão com a Mãe. Quando o Dallas explica que
foram tirados da rota para a Terra por causa de uma transmissão seqüencial
desconhecida e eles terão de investigar, Parker lembra que eles são uma nave
cargueira e não de resgate. Mas eles são lembrados pelo capitão e pelo Ash
que se não forem ver o que é, eles perdem as cotas, mas também o que for
descoberto pode render algum dinheiro para eles.
Ao descerem ao local indicado, a nave tem alguns problemas, o que os
deixa presos nesse planeta por umas 25 horas até ficarem funcionais. O
Capitão Dallas, e os outros oficiais, Kane e Lambert vão atrás do sinal
enquanto o resto da tripulação fica consertando a nave que ficou avariada no
pouso. Os três oficiais acham a origem do sinal, vem de uma nave alienígena e
segurem até ela. Na busca por sinais de vida, um deles, Kane, fica preso a um
dos espécimes encontrados por ele. Ao ser trazido de volta à nave, mesmo
desobedecendo à oficial em comando Ripley, Ash desrespeita a quarentena e
os deixa entrar, mesmo ouvindo a Ripley sobre o perigo por não saberem o que
era aquilo no rosto de Kane.
Depois de examinar e tentar tirar o Alien (nessa fase um tipo parasita,
numa comparação bem grotesca, uma mistura de aranha com polvo) do rosto
de Kane, e percebem a impossibilidade, pois Kane está respirando através
dele. Assim eles vão embora do planeta logo que a nave está restaurada e já
saiu do local onde foi encontrada a espécime desconhecida. Após um tempo
ela simplesmente desprende-se do rosto de Kane e morre. Depois de um
tempo, Kane acorda como se nada tivesse acontecido e eles se preparam pra
voltar à hibernação fazendo a última refeição.
Durante a refeição Kane passa mal e do seu tórax sai um alienígena
pequeno. Após lançarem o corpo dele no espaço, o restante da tripulação têm
35
que capturar o alienígena. Para auxiliar na procura Ash constrói um localizador.
Forma-se dois grupos para localizá-lo. Ripley, Brett e Kane com o localizador
vão à caça do Alien, mas são ludibriados, pois encontram o gato Jones, ao
invés do Alien, então para não confundir o localizador, Brett fica encarregado
de pegar o gato. Na busca por Jones, Brett é pego e morto pelo alienígena
(que não tem mais os trinta centímetros que tinha ao sair do tórax de Kane). A
partir desse ponto a tripulação tem medo do alienígena em si e começa a
combatê-lo.
A tripulação faz um lança chamas para matar o Alien. O corpo de Brett
não é achado. Dallas entra nos dutos de ventilação por onde o Alien está se
movimentando e mesmo com o localizador não consegue ver o Alien e também
é morto.
Ripley passa ao comando da nave e vai procurar mais informações que
ajudem na destruição da criatura com a Mãe, o computador da nave, e
descobre que a prioridade da Companhia é levar o Alien vivo e que a tripulação
é descartável. Quando Ash descobre que Ripley tem essa informação tenta
matá-la, mas Parker chega a tempo e o impede, acertando com um extintor de
incêndio. Deste modo eles descobrem que ele é um andróide colocado pela
companhia na nave para trazer o alienígena para a Terra.
A tripulação remanescente decide explodir a nave e retornar a terra num
pequeno módulo. Então Ripley fica preparando o módulo, Parker e Lambert
vão recolher os cilindros de oxigênio e nessa operação Lambert encontra a
criatura, parker tenta salvá-la, mas ambos são mortos. Ripley consegue pegar
o gato e acionar o dispositivo de autodestruição da nave e parte no módulo.
Quando ela se prepara para entrar nas cápsulas de hibernação, ela percebe a
presença do alienígena no módulo. Com calma, ela veste o traje espacial e
abre a escotilha do módulo e com a ajuda de um arpão consegue expulsar o
Alien.
36
3.1. A SUPERIORIDADE DO SER ALIENÍGENA
Após a Segunda Guerra Mundial, muitos filmes de ficção mostram o
extraterrestre com mais capacidades do que o ser humano. Pelo imaginário
conseguimos analisar pelo menos o que uma parcela da população vivia e
imaginava, nesse caso a Norte americana. Nos filmes de ficção científica, na
maioria das vezes, conta sobre um tempo futuro no qual é projetava como a
população da terra estará.
No filme há muitas cenas onde a imaginação humana monta seu futuro,
como a nave espacial cargueira Nostromo buscando minérios fora do planeta e
com possibilidades de trazê-lo em grande quantia. Uma nave com tecnologia
para isso, contudo a tecnologia possível ser imaginada em 1979. Vemos ainda
como a tecnologia que eles concebiam era mecânica. Observamos isso na
cena em que o Cap.Dallas vai falar com a Mãe, o acesso é todo manual e o
computador enorme. Também o vemos utilizando apenas o comando do
Programa MS-DOS, e todos na nave utilizam esse programa pra tudo. As
portas também são mecânicas e a maioria da nave é escura, cinza e com cara
de indústria. Apenas os cômodos de sociabilidade são claros. Eles podem
fumar dentro da nave, como se fosse um espaço normal na terra de trabalho e
as coisas e mesmo os personagens, são como se fossem pessoas comuns
trabalhando nessa “indústria”.
O futuro criado no filme não consegue avançar muito além daquela
tecnologia disponível na própria sociedade e como culturalmente ela se porta.
Por isso ao assistir um filme antigo sobre extraterrestre ou sobre qualquer outro
tema, vemos a sociedade contemporânea do filme, por seus medos, preceitos
e mesmo pela conjuntura política da sociedade da época. Podemos perceber
isso com os dois operários, Brett e Parker, que se dizem discriminados e
somente se importam com o pagamento. Eles apenas aceitam em ir atrás do
sinal, pois senão eles perderiam suas cotas. Do outro lado vemos Ash, o oficial
cientista, que se importa mais com o que foi trazido para dentro da nave do que
com a tripulação.
37
Após a descoberta que Ash é um humanóide mandado pela Companhia,
eles religam o Ash para descobrir se ele sabe como matá-lo, mas ele responde
que não e que eles tem sua simpatia. O Alien aparece nesse filme como uma
raça predadora e um organismo perfeito, como o próprio Ash personagem do
filme diz: ”perfeição estrutural igualada apenas pela hostilidade” e a Lambert
afirma: “você o admira”, e Ash reponde: “Admiro sua pureza. Um sobrevivente
não tolhido por consciência, remorso ou ilusões de moralidade”. Para a época
sobreviver estava num impasse com a moralidade da humanidade. Isso porque
a sociedade vive o dilema da sobrevivência e da moralidade, por causas das
guerras que ocorrem nessa época, e por causa do capitalismo, e os países
desse sistema que muitas vezes “diz que matar pessoas é justificável pela
causa desse país”. Ao mesmo tempo isso é uma crítica a sociedade da época
que não respeita mais a própria humanidade, que vive o dilema da moralidade
e da sobrevivência a qualquer preço.
O Alien se torna uma espécie importante no filme, exatamente porque a
sua luta é por sua sobrevivência. O mesmo acontece com os operários Brett e
Parker, mas sua sobrevivência é ganhar mais, aumentar o pagamento. Quando
o Alien começa a atacá-los, o que importa não é nem mesmo a hierarquia,
apesar de ainda mantê-las, mas viver e matar a criatura. O resquício das duas
Guerras Mundiais fez a população ocidental temer ainda mais as diferenças de
pensamentos e o que um líder poderia fazer com total aceitação da população.
E a Guerra Fria não minimizou isso, muito pelo contrário, trouxe mais angustia
com a disputa do domínio internacional e o medo do comunismo.
A população norte americana, após a Guerra do Vietnã queria que sua
influência não significasse mais jovens mortos de seu país. O sentimento de
progresso e de esperança tinha se defasado durante a guerra. A população
não queria mais que homens morressem nessa luta que quebrava com ideal
norte americano que sua nação era a “salvadora” do mundo ocidental.
Sentimento que haviam construído durante a Segunda Guerra Mundial. Nessa
sociedade que reestruturou a partir da nova conjuntura em que mulher sai do
posto doméstica para dentro de todos os outros campos de trabalho que a
38
sociedade possuía. Esse quadro também tem eco na película de Ripley Scott.
Recuperando os momentos de organização das gravações para frisar que em
um primeiro esboço do filme, o personagem de Ripley seria feito por um ator. O
diretor muda sua escolha influenciando pelo contexto atual em que a mulher
recebe novos postos, inclusive na cultura, sendo possível ela representar o
“herói” da trama do filme.
O ato de sobreviver também tem está presente na sociedade norte
americana que cultiva essa temática por ser composta de indivíduos que tem
na figura da luta pelo existir exemplos palpáveis, a Segunda Guerra Mundial
traz a tona o imaginário do sobrevivente. Dando a questão “Quem tem mais
direito a sobreviver” uma posição de destaque no imaginário social. Essa
diretriz produzida pela sociedade ganha lugar em “Alien”. Alegoricamente
exposta na posição da Companhia e do Ash, os quais protegem o alienígena. A
sobrevivência humana é considerada descartável, criando a condição do grupo
de humanos ter lutar com o alienígena que tem de sobreviver e contra sua
própria instituição, que deveria ajudá-los, mas se mostra favorável a criatura
contraria a sua condição de civilização. Quem deve viver é aquele mais útil, no
caso o alienígena, pois este pode trazer conhecimentos e capitais para a
Companhia. Algo que a tripulação, mesmo sendo de origem semelhante aos
membros da Companhia, não poderia trazer, eram descartáveis logo que
fizessem o que valia, ou seja, trazer a criatura.
3.2 O MEDO DO OUTRO COMO ALEGORIA: A PRESENÇA
ALIENÍGENA COMO DISPERSÃO DO SENTIMENTO DE SOCIEDADE
A desconfiança a partir do momento que Ash não respeita a quarentena,
este momento faz uma quebra com a vivencia quase “familiar” que as primeiras
cenas do filme apresentam da tripulação, logo que estes saem da “hibernação”.
Mostrando um prelúdio do que nomeamos com “dispersão do sentimento de
sociedade”. Lembramos Edgar Alan Poe, que escreve várias obras que falam
desses sentimentos de isolamento no coletivo que a modernidade possui,
quando em seu texto “O homem na multidão”, faz o leitor pensar sobre como a
39
vida sociedade, mesmo em grandes cidades se torna solitária. Podemos
observar que Scott tem no desenvolver de sua trama cinematográfica esse
intuito de admoestar o espectador com essa posição moderna de
individualismo. Criticando a futilidade do companheirismo dentro da nave,
mostrando que a coletividade aparente dos membros da equipe é facilmente
desorganizada pela presença do ser alienígena.
O medo do outro ganha essa nova forma para demonstrar que existe
em cada membro da tripulação um instinto “natural” para sobrevivência. A
desconfiança de Ripley é a mais evidente, pelo fato do personagem ser o
protagonista humano do filme. A entrada de Kane preso a uma espécie animal
desconhecida abala o primeiro fator de confiança do grupo, a hierarquia
instituída pela Companhia, é contestada primeiro por Ripley. Ao longo da trama
ela some ao ponto do membro que possuía uma das patentes mais altas e
qualificado como “cientista25”, o que dava ao personagem uma qualidade
imagética de curador do grupo, as instituições modernas como a empresarial,
que é bastante frisada no filme, perde toda a validade. O ambiente do filme se
torna mais fechado, o mundo externo é cortado pela falta de confiança das
atitudes de Ash. O palco construído pelo roteirista passa a dar apenas
importância ao grupo da nave, que vai cada vez mais sendo dizimando, a
hierarquia interna chega ao fim com o desaparecimento do Capitão Dallas.
Ripley agora tendo acesso à “Mãe” e sendo a primeira oficial da equipe,
posição que não bem vista pelos membros ainda vivos do grupo, descobre que
a vida dessa tripulação é dispensável, e a principal meta do Oficial cientista é
trazer a criatura viva para a Companhia. O sentimento de traição,
desorientação começa agregar ao ambiente de medo e escuridão da nave.
Ao tentar continuar o plano do Capitão Dallas de eliminar a criatura,
Ripley é atacada por Ash na sala de sociabilidade. Nesta cena o espectador
começa identificar Ash não como um simples humano. Pois a força que o
personagem apresenta em seu ataque a Ripley é superior a condição humana
25
Observamos um jogo do roteirista em dar ao membro cientista da equipe a posição de estopim do desmantelamento da confiança social que existia na equipe da nave. N do A
40
natural. Em uma cena extremamente agonizante Lambert e Parker aparecem
em socorro de Ripley, mesmo assim, tem dificuldades em derrubar Ash. O qual
somente é derrubado depois de Parker acertá-lo com um extintor. A cabeça de
Ash desprende, utilizando a sensação aversão ao que é expelido de dentro do
corpo humanóide Ridley Scott mostra que Ash é uma máquina. As cenas
seguintes mostram o grupo reativando e interrogando Ash que explica sua
posição e admiração pela criatura. Que pode ser resumido na frase que
citamos no começo desse capitulo, qual a condição tão cultivada do ser
humano como uma criatura exemplar por ser moral e civilizado e abandonada
em troca da captura de uma criatura alienígena. A desvalorização do homem é
um dos pontos que este filme apresenta, outra idéia que vem sendo cultivada
desde obras do século XIX. Provavelmente mais um eco, da critica ao
capitalismo existente no ambiente norte americana do começo dos anos 80.
Tem lugar em “Alien” pois a futilidade do individuo é um tema recorrente nas
obras artísticas. “Alien” a traz para o panorama da ficção científica
contemporânea. Aquele medo que ronda a vida norte americana da Guerra Fria
de ser atacado a qualquer momento tem seu espelho no micro cosmos da
Nostromo.
As cenas parecem inicialmente levar o espectador a ver na atitude do
oficial cientista um ato de humanidade, pois quebra a quarentena para salvar
Kane. Situação que mostrada como sendo irreal, pois a atitude visava evitar
que a criatura fosse prejudicada. Pois ela tinha valor para a Companhia. A
personagem de Ripley também choca a mente do espectador por suas atitudes
dentro da nave, criando até um antipatia, suas atitudes são contrárias a que
teria um personagem mulher normal, o diretor criar o contraste entre a sua
visão de personagem feminino com a visão típica da mulher em filmes de
ficção, por meio da utilização da personagem Lambert. A qual entra em conflito
com Ripley e se mostra sensível e descontrolada. Ripley também é vista com
uma nova representação da personalidade que a mulher pode ter na
sociedade. Os conflitos com cada membro da equipe com Ripley apontam para
a quebra do estereotipo da “frágil mulher” do cinema americano das décadas
passadas. Ela mexe no maquinário que deveria estar restrito a Parker e Brett ;
41
Discuti com o cientista e tenta saber mais sobre a criatura; Pressiona o Cap.
Dallas sobre a função de Ash; Sendo ela o último elemento a sobreviver e
vencendo o Alien em última instancia. Ripley toma a posição organizar a frágil
união existente dos tripulantes sobreviventes após a descoberta da ferocidade,
esperteza do ser, que é demonstrada pela sua capacidade de enganar
Cap.Dallas durante a seqüência de cenas nos dutos de ventilação da nave.
Porém na trama os membros vão sendo eliminados pela criatura
individualmente, destacamos o momento em que Parker e Lambert são
eliminados da história, o diretor utiliza um jogo de câmeras para não mostrar o
Alien por inteiro e deixá-lo mais assustador. Apenas com a sombra dele ou a
visibilidade das partes mais perturbadoras do ser. Lambert traz em seu
momento de agonia a imagem do desespero e medo que a deixam paralisada.
Parker por isso não consegue ajudá-la, sendo morto.
A sociedade vai sendo eliminada até Ripley se encontrar sozinha no
ambiente industrial da nave. Aqui a Sociedade termina e começa a angustia da
sobrevivência do individuo. Tema que o terror vai aproveitar em outros
momentos futuros. Porém o individuo apresentado na trama do filme tem
características peculiares que estão nascendo na sociedade contemporânea,
Scott traz as telas Ripley como uma mulher, mas masculinizada e
independente, representando essa nova mulheres da sociedade dos anos 80,
que tem em figuras como Margareth Thatcher como expoente. Quebrando com
estereotipo dos filmes onde a mulher é sempre a figura frágil e precisa ser
protegida. A sociedade desmantelada pelo alienígena é um espelho do que
cerca Scott.
3.3 O ALIENÍGENA E A CIÊNCIA ARTIFICIAL: O MEDO MÁXIMO DA
CONTEMPORANEIDADE
Desde o princípio do filme podemos perceber o imaginário que está
presente nele, como a conquista do espaço, com viagens longas e distantes a
outros planetas. Vemos que a corrida espacial e o homem conseguir pisar na
Lua trouxe várias “esperanças” de que num futuro muito próximo essas viagens
42
e a tecnologia para fazê-las seriam alcançadas sem risco. Toda a disputa entre
os EUA e a URSS pela “conquista” do espaço só fez com que isso ficasse mais
palpável. Já havia a questão de existir vida em outros planetas e essa corrida
parecia alimentar o imaginário da sociedade. Esse novo elemento social, que
era a visão científica passa a ser parte do próprio consumir da população. Ver
e ler sobre a ciência se torna mercadoria e cria a necessidade de estar sempre
atualizado ou em alguns casos faz parte da vida de indivíduos. A proximidade
com o cientifico torna-se um elemento de bem estar psicológico e material.
Porém, essa tecnologia não somente vista com algo positivo e benéfico. Até
pelo fato de ser uma sociedade onde a tecnologia tinha mostrado seu lado
letal, lembramos as tecnologias de destruição atômica. A inteligência artificial
poderia gerar um “outro” capaz de eliminar facilmente o ser humano. O gosto
pela tecnologia caminha junto com seu medo, pois o cotidiano mostra as
utilidades das novidades da ciência. Ainda sim, existe um ar de desconfiança
sobre tudo que cerca a tecnologia. A produção cultural sempre absorve “teor”
da vida de cada época. A transformação da cultura em um industria faz esses
medos aparecerem em seus produtos, com a cultura de massas, isso ficou
mais forte. As comunicações se expandem, logo a indústria se apropria disso,
fazendo com que a população tivesse o mesmo padrão, a população mais
pobre, mas que não deixasse de comprar o gosto pela tecnologia e junto o seu
medo. O filme que analisamos não foi inovador no tema, já havia outros filmes
feitos sobre o esse assunto. Lembramos “Guerras dos Mundos” e o “Dia que a
terra parou”. Que mostram o alienígena sempre superior à raça humana.
Contudo, apesar do alienígena ser superior, este não tem humanidade. Fator
que mantém Ripley viva, mostrando assim uma critica as novas tecnologias
que estavam esquecendo o elemento mais importante da sociedade que é o
Homem.
Um elemento que destacamos por último é analogia do alienígena com a
tecnologia, pois precisamos saber se existe o extraterrestre e quais suas
intenções com o homem. Como a ciência à figura do alienígena é distribuída
pelos meios de comunicação de massa e passa a ser parte do cotidiano e
mesmo uma necessidade de vida de certos indivíduos. Todo aquele elemento
43
que se torna comum e necessário para alguns se torna aversivo e intimidador
para outro. Alien entra exatamente nessa questão, mostrando o outro lado do
imaginário da ciência e da figura do ser extraterrestre.
44
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos no primeiro capítulo, o medo vem desde tempos
imemoriais. A sociedade sempre tenta controlar seus medos, pois há sempre
insegurança no desconhecido. Tudo que não conhecemos, tememos e
fazemos desse temor, na maioria das vezes, pré-julgamentos. Estes pré
julgamentos fazem que a sociedade crie um imaginário em torno desse
desconhecido, e na maioria das vezes é pior do que ele é. Com o medo do
desconhecido vem o medo do outro, do diferente. Tudo que é estranho se torna
fonte de temor.
O temor gera conflitos e faz com que a população transmita esses
medos de geração para geração. Mas estes medos sempre mudam com a
sociedade e com as ações dos homens. Por vários séculos passamos de
medos e os transmitimos as próximas gerações que mudam um pouco a face
desse medo. Mas no fundo é sempre o medo do diferente, do outro, do
desconhecido. A partir do imaginário da civilização ocidental podemos perceber
como esse processo se dá, pelos vestígios que foram deixados durante os
anos, como desenhos, livros, pinturas e mais recentemente o cinema, entre
outros. Nessa nova maneira de demonstrar a sociedade, o imaginário,
utilizando vários recursos que podemos aproveitar para análise de um filme.
Seu tema, a época, os recursos, tudo é passado mesmo “sem querer”.
Há varias maneiras de analisar um filme, a histórica, a cinematográfica
entre várias outras. A histórica foi a escolhida nesse trabalho para mostrar
quanto somos influenciados pelo passado e o presente. Mesmo querendo
passar uma noção de futuro no filme “Alien”, não podemos deixar de notar
como somos afetados pela sociedade. Vemos às influências da Corrida
Espacial e da Guerra Fria nesse trabalho, com a localização da história se
passar no espaço e como o modo capitalista esta presente no dia a dia da
tripulação. Vemos também como a influência do novo papel da mulher pode
mudar a escolha de um diretor para o papel principal. Tudo isso gera novos
medos na população. Mudanças muito rápidas aconteceram nesse último
século. Os valores e a moral das pessoas mudaram de acordo com a noção de
45
“progresso” e o individualismo na sociedade. Isso tudo faz com que as pessoas
se identifiquem com o filme, por isso foi um sucesso, pois temer aquilo que
desconhecemos é natural, mas lutar contra isso não.
E o filme mostra exatamente esse medo do desconhecido, do diferente
do alienígena, tudo de uma vez. Mexe com a imaginação de uma sociedade
que acredita no futuro próximo, mas vê nele um perigo.
Por isso podemos perceber que o medo do desconhecido gera o medo
do outro e assim por dizer do alienígena. Em todas as sociedades há o medo
de alguma coisa, de algum perigo. Um medo às vezes inexplicável e isso se
traduz no cinema. Cinema é um espelho do imaginário da população de sua
época, alguns filmes conseguem até ultrapassar sua época ficando em voga
por várias décadas.
46
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49
ANEXOS:
Essa é a capa original do filme (Reino Unido).
50
Essa é a capa brasileira da edição dupla do DVD.
Esses são os atores do filme, já caracterizados como a tripulação.
51
Essa é a cena do filme em que eles saem do hipersono.
Essa imagem é de quando a nave principal se separa da carga para ir ao planeta desconhecido.
52
Essa é a nave alienígena, já no planeta em que a tripulação vai verificar o sinal.
Essa é a cena de alguns tripulantes na nave alienígena.
53
Essa é a cena em que Kane desce para verificar o que existe no andar inferior da nave.
Nessa cena ele encontra os ovos alienígenas onde se abre um dele ao sentir a presença de Kane, onde a criatura sai e gruda na cabeça dele.
54
Essa é a cena onde se abra o capacete para verificar como está Kane.
Nessa o oficial cientista, Ash, tentando tirar a criatura do rosto de Kane.
55
Nessa cena, depois da criatura se soltar do rosto dele e morrer, a tripulação da nave vai fazer uma última refeição e Kane passa mal.
Sai do peito de Kane o Alien e o mata.
56
Este é o Alien em sua forma primitiva.
Aqui vemos o primeiro tripulante, Brett, pouco antes de ser morto pelo Alien.
57
Aqui é a criatura depois de se transmutar e ficar com o tamanho de uma pessoa.
Essa cena é antes de atacar um tripulante.
58
Aqui é o Alien atacando a Lambert.
Esse é o módulo onde a Ripley vai escapar da explosão da nave, junto com a criatura.
59
Nesta cena Ripley se prepara para o hipersono, mas ainda não percebeu o Alien na nave. Também podemos ver a cabeça dele no centro da imagem.
Nessa cena já vemos Ripley com o traje espacial, pouco antes de abrir a escotilha.