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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO
Nivaldo Tadeu Marcusso
Os níveis de maturidade dos projetos de inclusão digital e o
desenvolvimento sociocomunitário: Uma visão através da
implantação dos Centros de Inclusão Digital da Fundação
Bradesco.
Americana
2015
2
CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO
Nivaldo Tadeu Marcusso
Os níveis de maturidade dos projetos de inclusão digital e o
desenvolvimento sociocomunitário: Uma visão através da
implantação dos Centros de Inclusão Digital da Fundação
Bradesco.
Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação à Comissão Julgadora do Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL - sob a orientação da Profº Drº Renato Kraide Soffner.
Americana
2015
3
FICHA CATALOGRÁFICA
Os níveis de maturidade dos projetos de inclusão digital e o
desenvolvimento sociocomunitário: Uma visão através da
implantação dos Centros de Inclusão Digital da Fundação
Bradesco.
Marcusso, Nivaldo Tadeu.
M277n Os níveis de maturidade dos projetos de inclusão digital e o desenvolvimento sociocomunitário: Uma visão através da implantação dos Centros de Inclusão Digital da Fundação Bradesco/ Nivaldo Tadeu Marcusso. – Americana: Centro Universitário Salesiano de São Paulo, 2015.
222 f. Dissertação (Mestrado em Educação). UNISAL – SP. Orientador: Prof.º Dr.º Renato Kraide Soffner Inclui bibliografia. 1.Inclusão digital. 2. Educação não formal. 3. Tecnologias
sociais. I. Título.
CDD 372.3
Catalogação elaborada por Carla Cristina do Valle Faganelli Bibliotecária UNISAL – Americana CRB-8/9319
4
DEDICATÓRIA°
Nivaldo Tadeu Marcusso
A Inclusão Digital e a Educação Não Formal.
Dissertação apresentada como
exigência parcial para obtenção
do grau de Mestre em Educação
no Centro Universitário
Salesiano de São Paulo -
UNISAL.
Trabalho de Conclusão de Curso defendido e aprovado em ____/____/______ pela
comissão julgadora:
Banca examinadora
Profº Drº Antonio Carlos Miranda
Instituição:
Assinatura: _______________________________________________________
Profº Drº Eduardo Chaves
Instituição: Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL
Assinatura: _______________________________________________________
Profº Drº Renato Kraide Soffner (Orientador)
Instituição: Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL
Assinatura: _______________________________________________________
Americana
2015
5
Dedico este trabalho à minha família pela compreensão, apoio e suporte para
realização do Mestrado.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos os amigos que de forma direta ou indireta
incentivaram e contribuíram para a realização deste trabalho, com destaque
para aqueles com quem convivi por vinte oito anos na Organização Bradesco.
Aos amigos do Computer Clubhouse, que sempre acreditaram na realização do
projeto de inclusão digital, um agradecimento especial pelas informações e
contribuições para realização desta dissertação.
Ao Professor Doutor Renato Kraide Soffner, coordenador do Programa
de Mestrado em Educação Sociocomunitária do Centro Universitário Salesiano
de São Paulo – Unisal, unidade Americana – SP, e também orientador deste
trabalho, pela oportunidade de termos trabalhado juntos em vários projetos de
tecnologia educacional e social, bem como pelo apoio, incentivo e
compreensão das idas e vindas decorrentes da longa jornada para elaboração
desta dissertação.
Aos professores do curso, Prof. Eduardo Chaves, que tive oportunidade
de trabalhar em vários projetos de tecnologia educacional, ao Prof. Antônio
Carlos Miranda, a Profa. Maria Luiza Bissoto e Profa. Sueli Maria Pessagno
Caro, responsáveis pelas disciplinas que forneceram subsídios importantes
para elaboração deste trabalho e ampliação do conhecimento em educação
sociocomunitária.
Aos colegas Marice Balducci e Marcos Telles, respectivamente pelos
“insights” e troca de informações, experiências durante as aulas e durante a
implantação dos projetos, que contribuíram muito para elaboração desta
dissertação.
Aos entrevistados do Computer Clubhouse pelo resgate de informações
valiosas para a contextualização deste trabalho, bem como nas discussões em
busca de um projeto de sustentabilidade, aqui representados pela Gilma Maria
Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins Machado.
7
“Quando se diz ao educador como fazer tecnicamente uma mesa e não se
discute as dimensões estéticas de como fazê-la, castra-se a capacidade de ele
conhecer a curiosidade epistemológica”. (Paulo Freire, 1994-1995)
8
RESUMO
O presente trabalho procura apresentar uma proposta de uma
metodologia para análise da maturidade de projetos de inclusão digital e
educação sociocomunitária, tendo como pano de fundo a evolução do projetos
de inclusão digital desenvolvidos no entorno das escolas da Fundação
Bradesco, no período de 2002 a 2012. O impacto é analisado no decorrer das
gerações, ou seja, do nível de envolvimento das comunidades nos projetos e
através das ondas de inclusão digital, ou ainda, dos tipos de parcerias e
projetos, através de um modelo proposto de maturidade de inclusão digital,
baseado em cinco níveis de referência. O relato das ações e a classificação
dos níveis de maturidade, de cada geração foram desenvolvidos através da
minha vivência na implantação dos projetos, como membro e responsável pela
implantação dos projetos no lado da Fundação Bradesco, mas com
interpretação própria, visão priveligiada e com total isenção em relação aos
resultados esperados e obtidos na implantação dos centros de inclusão digital.
Palavras chaves: Inclusão Digital; Educação Não Formal; Tecnologias Sociais.
9
ABSTRACT
This paper seeks to present a proposal for a methodology for
analysis of the maturity of digital inclusion projects and socio-communitarian
education, with the backdrop of the evolution of digital inclusion projects
developed around the schools of the Bradesco Foundation, from 2002 to 2012.
The impact is analyzed through the generations, that is, the level of community
involvement in the projects and through the waves of digital inclusion, in others
words, the types of partnerships and projects, through a proposed model of
digital inclusion maturity, based on five levels of reference. The report of the
actions and the classification of maturity levels of each generation have been
developed through my experience in project implementation, as a member and
responsible for the implementation of projects on the side of the Bradesco
Foundation, but with own interpretation, privileged view and with exemption for
the expected and achieved results in the execution of digital inclusion centers.
Key words: Digital Inclusion; Non-Formal Education; Social Technologies.
10
LISTA DE QUADROS
QUADRO 4.2.1 Fatores que influenciam nos níveis de maturidade.
Fonte: Adapatado pelo autor do Modelo do Gartner
IT Score.
75
QUADRO 4.3 As gerações e ondas de inclusão digital. Fonte:
Autor (2014)
79
QUADRO 4.3.2 Relação de cursos oferecidos nos CIDs, através da
Escola Virtual. Fonte: Departamento de Tecnologia
Educacional da Fundação Bradesco (2001).
85
QUADRO 4.3.3 Comparação dos princípios para inovação entre MIT
Media Lab e BIT. Adptado dos princípios de
constituição do Media Lab MIT (1985) e do BIT
(2004).
90
QUADRO 4.3.4 Quadro de iniciativas norteadoras para a pesquisa
aplicada e desenvolvimento de projetos. Autores:
Prof. Marcos Telles e Nivaldo T. Marcusso (2004).
92
QUADRO 4.3.5 Quadro 4.3.5. Portfólio de Inovação em tecnologia
educacional. Adaptação do Modelo de Gilly Salmon.
Fonte: Prof. Marcos Telles, Prof. Renato Soffner e
Nivaldo T. Marcusso (2005).
95
QUADRO 4.3.6 Estrutura organizacional do CCH. Fonte: Entrevista
com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda
Karla Martins Machado em 16/07/2014.
119
QUADRO 4.3.7 Quadro de atendimento do CCH de 2004 a 2013.
Fonte: Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva
120
11
Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em
16/07/2014.
QUADRO 4.3.8 Total de atendimento da primeira geração de
Centros de Inclusão Digital – Fonte: Entrevista com
Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla
Martins Machado em 16/07/2014.
125
QUADRO 4.3.9 Sinergia entre as ações desenvolvidas pelos CIDs e
a rede ATN. Fonte: o Autor (2014)
133
QUADRO 4.3.9.1 Doação e distribuição de computadores para a ATN.
Fonte: Fundação Bradesco e ATN (2008).
135
QUADRO 4.3.9.2 Relação de Projetos da Cidade que a gente quer.
Fonte: Escolas da Fundação Bradesco
159
QUADRO 4.3.9.3 Parcerias do D-Lab no Brasile projetos com a Fund
ação Bradesco. Fonte: Leo Burd, Coordenador do
D-Lab Brasil, 2010.
170
QUADRO 4.3.9.4 Atividades Intensivas Realizadaspela Poli Cidadã
até 2008. Fonte: Maria Inês Piffer. Disciplina com
Foco Social: Uma proposta para o ensino de
Engenharia, Escola Politécnica da USP, 2008.
182
QUADRO 4.3.9.5 Princípios Norteadores da Educação
Sociocoumunitária e Tecnologia Social, através das
experiências da Fundação Bradesco, MIT D-LAB e
USP Poli Cidadã. Fonte: Autor (2014).
189
QUADRO 4.5.1 As gerações e ondas de inclusão digital 2004 a
2010 da Fundação Bradesco.
216
12
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 4.1 Mapa de Maturidade corrente (atual) x desejado.
Fonte: ITScore Overview for Business Process
Management, Sinur e Hill, Gartner, 2010.
62
GRÁFICO 4.3 Índice Paulista de Vulnerabilidade Social – IPVS 2000.
Fonte: Relatório de atividades do CCH do Jd.
Conceição, 2004.
102
GRÁFICO 4.4 Perfil de atendimento durante o período de 2004 –
2013. Fonte: Entrevista com Gilma Maria Ramos da
Silva Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em
16/07/2014.
121
GRÁFICO 4.5 Tipo de utilização dos recursos das TICs no CCH.
Fonte: Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva
Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em
16/07/2014.
123
GRÁFICO 4.6 Utilização da Internet no CCH. Fonte: Entrevista com
Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla
Martins Machado em 16/07/2014.
124
13
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 2.6.1 Exclusão e Inclusão Social nas Sociedades
Modernas. Fonte Borba & Lima, 2011
53
FIGURA 2.6.2 Exclusão e Inclusão Social nas Sociedades
Modernas. Fonte: Borba & Lima, 2011.
53
FIGURA 4.1 Maturidade do BPM (Business Processs
Management) – Fonte: ITScore Overview for
Business Process Management, Sinur e Hill,
Gartner, 2010.
62
FIGURA 4.2.1 Modelo de Maturidade de inclusão digital, Fonte:
Adaptado pelo autor do Modelo IT Score do
Gartner.
70
FIGURA 4.3
Locais de implantação dos CIDs na primeira onda.
Fonte: Departamento de Tecnologia da
Informação, Fundação Bradesco, 2006
80
FIGURA 4.3.1 Arquitetura de interconectividade do projeto dos
CIDS. Fonte: Departamento de Tecnologia
Educacional, Fundação Bradesco, 2004.
82
FIGURA 4.3.2 Centros de Inclusão Digital nas cidades de
Cacoal/RO e Caucaia/CE. Fonte: Departamento
de Tecnologia da Informação da Fundação
Bradesco.
83
FIGURA 4.3.3 Portal Escola Virtual. Acesso de www.ev.org.br em 86
14
10/10/2014.
FUGURA 4.3.4 CID de Cacoal/RO. Fonte: Departamento de
Tecnologia da Informação, Fundação Bradesco,
2004.
87
FUGURA 4.3.5 CID da Universidade dos Palmares. Fonte: Revista
“Afirmativa”, Unipalmares, 2006.
88
FIGURA 4.3.6 Lay-out do STIC – BIT. Fonte: Microsoft Research
(2008)
96
FIGURA 4.3.7 Hype Cycle de Inovação do STIC. Fonte: Microsoft
Research (2009)
97
FIGURA 4.3.8 Treinamento de Professores e Líderes Sociais.
Fonte: Departamento de Tecnologia da Informação
da Fundação Bradesco, 2009.
98
FIGURA 4.3.9 Bairro do Jd. Conceição na época da implantação
do CCH. Fonte: Relatório de atividades do CCH do
Jd. Conceição de 2004.
101
FIGURA 4.4 Mapa do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
– IPVS 2000. Fonte: Relatório de atividades do
CCH do Jd. Conceição, 2004.Fonte: IBGE –
Censo Demográfico de 2000. Fundação SEADE.
103
FIGURA 4.5 Organograma de operação do Computer
Clubhouse durante a fase de implantação. Fonte:
Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva
Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em
16/07/2014.
117
FIGURA 4.6 Atividades no Computer Clubhouse em Osasco.
Fonte: Relatório de atividades de 2011 do CCH,
Osasco.
122
FIGURA 4.7 Nível de maturidade da primeira geração de 127
15
inclusão digital. Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
FIGURA 4.8 Organização da Rede ATN. Fonte: MDIC, 2006,
adaptado por Liliam, M. A. de Resende em
Telecentros de informação e negócio, como
veículo de educação corporativa nas
microempresas e empresas de pequeno porte.
129
FIGURA 4.9 Organização da Rede ATN. Fonte: Adaptado por
Liliam M. A. de Resende do MDIC, 2006.
130
FIGURA 4.9.1 Framework de sustentabilidade da ATN. Fonte:
Adaptado por Liliam M. A. de Resende do MDIC,
2006.
131
FUGURA 4.9.2 Telecentro de Informação e Negócios – Centro de
Inclusão Digital, Bairro de Santa Felícia, São
Carlos, SP. Fonte: ATN, 2008.
137
FIGURA 4.9.3 Proposta de Rede de Colaboração Social – CDI e
Fundação Bradesco. Fonte: CDI, 2007
139
FIGURA 4.9.4 Portal da Comunidade Indígena. Fonte:
Departamento de Tecnologia da Informação,
Fundação Bradesco, 2006.
141
FIGURA 4.9.5 CID da Comunidade dos Javaés, Ilha do Bananal,
Canuanã, Formoso do Araguaia/TO. Fonte:
Departamento de Tecnologia da Informação,
Fundação Bradesco, 2006.
143
FIGURA 4.9.6 Centro de Inclusão Digital – Escola Municipal Dom
Miguel Alagna, São Gabriel da Cachoeira, AM,
2010. Fonte: Autor
147
FIGURA 4.9.7 Nível de maturidade da segunda geração de
inclusão digital. Fonte: Elaborado pelo autor, de
151
16
acordo com o framework de inclusão digital.
FIGURA 4.9.8 Placa GOGO. Fonte: Roger Sipitakiat, Ggrupo
Learning Hub, MIT Media Lab (2002).
156
FIGURA 4.9.9 Lego Mindstorm. Fonte: Mitchel Resnick, MIT
Media Lab (2000).
157
FIGURA 4.9.9.1 Poluição dos Igarapés na comunidade de
Sapolândia, Manaus/AM. Fonte: Fundação
Bradesco, Escola de Manaus, 2002.
161
FIGURA 4.9.9.2 Workshop de desenvolvimento do Projeto
Cerquinha, com o Prof. David Cavallo. Fonte:
Escola Fundação Bradesco Manaus, 2002.
162
FIGURA 4.9.9.3 Site do MIT D-Development – Fonte: Acessado em
22 de Outubro de 2014.
165
FIGURA 4.9.9.4 Ciclo de Design do D-Lab. Fonte: MIT D-Lab – Leo
Burd, 2004.
167
FIGURA 4.9.9.5 Atividades do D-Lab na Aldeia dos Javaés e
Assentamentos de Canuanã/TO. Fonte: Leo Burd -
Coordenador do D-Lab no Brasil, 2004.
171
FIGURA 4.9.9.6 Orientação sobre a necessidade do descarte
correto de pilhas e baterias. Fonte: Fundação
Bradesco de Canuanã, 2004.
175
FIGURA 4.9.9.7 Planejamento Estratégico da Poli 2015. Fonte:
Maria Inês Piffer. Disciplina com Foco Social: Uma
proposta para o ensino de Engenharia, Escola
Politécnica da USP, 2008.
178
FIGURA 4.9.9.8 Desenvolvimento de mesa portátil para exame de
câncer de colo. Fonte: Poli Cidadã – Escola
Politécnica da USP, 2008.
179
17
FIGURA 4.9.9.9 Ciclo de Influência. Fonte: Maria Inês Piffer.
Disciplina com foco social: Uma proposta para
ensino de engenharia, EPUSP.
183
FIGURA 4.9.10 Representação do ciclo de evolução dos CIDs.
Elaborado pelo autor em 2010.
188
FIGURA 4.9.11 Nível de maturidade de terceira geração de
inclusão digital. Fonte: Elaborado pelo autor
195
FIGURA 4.9.12 Plaforma baseada no conceito dos Legos sociais.
Fonte: Autor
198
FIGURA 4.9.13 Modelo de inteligência coletiva nos serviços de
desenvolvimento humano. Fonte: A esfera
semântica, Pierre Levy, 2011.
200
FIGURA 4.9.14 Modelo FLIRT de Crowdsourcing. Fonte: Sami
Viitamäki, 2006.
203
FIGURA 4.9.15 Requisitos para um Portal de Crowdsourcing:
Adptado de Crowdsourcing: Why the Power of the
Crowd is Driving the Future of Business, Jeff
Howe, 2009.
210
FIGURA 4.9.16 Nível de maturidade proposto para a quarta geração
de inclusão digital. Fonte: Autor.
213
FIGURA 5.1 Modelo de maturidade de inclusão digital. Fonte:
Elaborado pelo autor, a partir do modelo IT Score do
Gartner.
217
18
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ATN Associação de Telecentros de Negócios
CDI Comitê para a Democratização da Informática
CID Centro de Inclusão Digital
CMMI O CMMI (Capability Maturity Model - Integration ou Modelo
de Maturidade em Capacitação - Integração)
C&T Ciência e Tecnologia
OCIP Organização com Interesse Público
ONU Organização das Nações Unidas
POLI Escola Politécnica da USP
TA Tecnologia Apropriada
19
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 22
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 23
2.1 A Educação ........................................................................................................... 23
2.2 A Educação Não-Formal ....................................................................................... 25
2.3 A Educação Sociocomunitária .............................................................................. 30
2.4 A Economia Social................................................................ 36
2.5 Tecnologia Social.................................................................. 39
2.6 A Inclusão Digital .................................................................................................. 46
3 METODOLOGIA ................................................................................................... 55
4 AS GERAÇÕES DE INCLUSÃO DIGITAL E O
DESENVOLVIMENTO SOCIOCOMUNITÁRIO: UMA
VISÃO ATRAVÉS DOS NÍVEIS DE MATURIDADE DE
INCLUSÃO DIGITAL E DA IMPLANTAÇÃO DOS
CENTROS DE INCLUSÃO DIGITAL DA FUNDAÇÃO
BRADESCO..........................................................................
57
4.1 Proposta de um framework para análise do nível de
maturidade dos programas de inclusão digital, com
impacto na melhoria da inclusão social. ...............................................................
57
4.1.1 ITScore – Metodologia para levantamento de maturidade
de soluções e serviços de TI.................................................
57
4.1.2 CMMI – “Capability Maturity Model –
Integration” ou Modelo de Maturidade em Capacitação –
Integração............................................................................
62
4.2 A proposta de um modelo de maturidade para avaliação de
centros de inclusão digital.....................................................
63
4.3 As gerações e ondas de inclusão digital: Uma análise da
maturidade, através das iniciativas de inclusão digital da
20
Fundação Bradesco.............................................................. 75
4.3.1 A Primeira Geração de Inclusão Digital ................................................................ 79
4.3.1.1 A primeira onda de centros de inclusão
digital.....................................................................................
..
81
4.3.1.2 A segunda onda dos centros de inclusão
digital.....................................................................................
.
88
4.3.1.3 A terceira onda de centros de inclusão
digital ....................................................................................
100
4.3.1.4 Identificação do nível de maturidade da primeira geração de
centros de inclusão digital.........................................................
125
4.3.2 Segunda Geração de Centros de Inclusão Digital: Rede de
Inclusão Social (RIS) ............................................................
127
4.3.2.1 A primeira onda: Desenvolvimento da sustentabilidade dos
CIDs......................................................................................
128
4.3.2.2 Segunda onda: Parceria com as Comunidades
Indígenas..................................................................................
140
4.3.2.3 Identificação do nível de maturidade da Segunda Geração
de Centros de Inclusão digital...................................................
149
4.3.3 Terceira Geração: Rede de Tecnologia
Social.....................................................................................
151
4.3.3.1 Terceira Geração de Inclusão Digital, primeira onda:
Projeto “A cidade que a gente
quer”......................................................................................
151
4.3.3.2 Terceira Geração de Inclusão Digital, segunda onda:
Parceria com o MIT D-Lab e USP/Poli
Cidadã...................................................................................
163
21
4.3.3.2.1 Parceria com o MIT D-LAB – Development
Laboratory.............................................................................
163
4.3.3.2.2 Parceria com o Programa Poli Cidadã da Escola
Politécnica da USP................................................................
176
4.3.3.3 Nível de Maturidade da Terceira Geração de Centros de
Inclusão Digital..........................................................................
194
4.4 Uma proposta para a quarta geração de Centros de Inclusão
Digital: Crowdsourcing Social ...............................................
199
4.4.1 O Crowdsourcing e o terceiro setor....................................... 205
4.4.2 Uma proposta de Crowdsourcing para a 4ª Geração de
Centros de Inclusão Digital...................................................
209
4.4.3 Nível de Maturidade desejado para a Quarta Geração de
Centros de Inclusão Digital.......................................................
211
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................. 215
6 REFERÊNCIAS.....................................................................
.
220
22
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo primário propor uma
metodologia para a análise do impacto provocado por projetos de inclusão
digital no desenvolvimento sociocomunitário das comunidades carentes.
A implantação no período de 2002 a 2012 dos Centros de Inclusão Digital da
Fundação (CIDs) e respectivos projetos, no entorno dessa iniciativa foram os
contextos e “panos de fundo” para aplicação dessa metodologia.
A metodologia proposta está centrada em um modelo de gerações e
suas ondas de maturidade de inclusão digital, com cinco níveis de referência,
do menor chamado de reativo até o maior chamado de inovação efetiva.
O impacto é analisado na sucessão de gerações (cada geração
correspondendo a um nível de envolvimento da comunidade e respectivos
stakeholders nas iniciativas) e nas ondas de cada geração de inclusão digital
(cada onda correspondendo a um nível de parceria e tipos de projetos
desenvolvidos).
O relato das ações e a classificação dos níveis de maturidade de
cada geração foram feitos a partir do envolvimento pessoal do autor, que foi
membro da equipe responsável pela implantação dos projetos ao lado da
Fundação Bradesco; assim, a visão aqui expressada tem carater pessoal e não
envolve avaliações de expectativas e resultados segundo perspectivas
institucionais.
O objetivo secundário é a proposição de um modelo para a chamada
quarta onda de inclusão digital, baseada em plataformas colaborativas de
“Crowdsourcing Social”, com o objetivo da busca da sustentabilidade contínua
tanto financeira como de mobilização das comunidades atendidas.
Os temas tratados são a educação sociocomunitária, inclusão
digital, tecnologia social, economia social e as principais iniciativas de uma
instituição privada de educação formal, no apoio do desenvolvimento da
inclusão social no entorno das suas escolas.
23
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 A Educação
A educação é uma forma de ensino e aprendizagem adquirida ao
longo da vida das pessoas, pela leitura, interpretação e assimilação dos fatos,
eventos e acontecimentos, que os indivíduos fazem de forma isolada ou em
contato com grupos e organizações, de acordo com Maria da Glória Ghow
(1997). As atividades educacionais não ocorrem somente no espaço da
educação formal, nas escolas formais, que são autorizadas pelos órgãos
reguladores e seguem padrões de currículos nacionais, mas também fora dele,
através de atividades extracurriculares, projetos em parceria com as
comunidades, em centros comunitários, em ONGs e em centros de inclusão
digital, onde a aprendizagem ocorre simultaneamente com a transformação do
sujeito, como o principal protagonista e das comunidades, com as ações
transformadoras que podem proporcionar a melhoria da mobilidade social.
A educação pode ser definida como um fenômeno social que se
produz em todas as sociedades humanas, cuja unidade, continuidade e
evolução a supõem e implicam, como uma de suas condições e funções
fundamentais (AZEVEDO, 1951). Nessa linha é possível pensar a educação
como um evento essencialmente social, considerando tratar-se de um processo
educativo estabelecido socialmente, através dos relacionamentos, reflexões,
colaborações, trocas de experiências, engajamentos e construções coletivas.
O educador Bernard Charlot apresenta a questão da educação
vinculada a uma tríplice construção do ser humano: sua hominização (tornar-se
homem), sua singularização (tornar-se exemplar único de homem) e de
socialização (tornar-se membro de uma comunidade, partilhando seus valores
e ocupando lugar nela). Essa colocação nos leva a refletir que o conteúdo da
educação é, obrigatoriamente, algo que encontra sua razão de ser na vida
social, na relação do homem com os seus pares e com a comunidade. Este
mesmo conteúdo (seja da educação formal ou não, laica ou religiosa, dirigida a
24
adultos ou a crianças) também representa ou é impactado pela influência dos
valores sociais da classe predominante e das disputas e relações de poder
presentes em cada sociedade ou comunidade.
A educadora Maria Montessori, uma das mais influentes
educadoras do início do século XX, argumentava que a educação é feita a
partir de objetos e conhecimentos produzidos através da interação social e que
o raciocínio de uma criança, nos seis primeiros anos de vida se formava a partir
dos estímulos exteriores captados pelos sentidos, o que explica a valorização
do sensorial na educação infantil. Entretanto, todos os sons, aromas, imagens,
ruídos e sensações táteis percebidas, mesmo quando relacionadas a aspectos
da natureza (como o calor, frio, vento etc.) são captadas em um contexto
imerso em uma cultura que, por sua vez, influência sobre o modo e a
intensidade de tais percepções. E toda cultura é, por definição, uma construção
social de acordo com Roque Laraia (LARAIA, 2001).
O psicólogo Lev Vygotsky, fundador da escola soviética de
psicologia histórico-cultural entendia que todos os objetos que circundam o ser
humano foram imaginados, construídos, apropriados ou modificados a partir de
uma utilização socialmente concebida. Por isto a importância da intermediação
de um outro sujeito que, conhecendo a utilidade social de cada objeto e tendo a
noção do mundo que o cerca, poderia ajudar a criança na obtenção de novos
conhecimentos e formulação de novos pensamentos. Esse seria o grande
papel do educador no processo de ensino e aprendizagem.
A educação, na sua essencialidade é baseada no conteúdo e nas
suas estruturas, mas pode ser complementada pelos objetivos e finalidades.
Para o filósofo Jean-Jacques Rousseau, a educação teria o objetivo de
preparar o indivíduo para a vida e a liberdade, e não necessariamente para as
rotinas sociais. A sua reflexão sobre educação apontava motivos individuais da
educação, mas uma análise mais aprofundada sobre a sua obra revelará que
os objetivos individuais estão sujeitos às questões sociais. Por exemplo, ao
preconizar a educação para a liberdade, Rousseau certamente considerava a
possibilidade de que o indivíduo viesse a perdê-la, ou não adquiri-la, ou
25
possuindo-a, dela não se utilizasse plenamente. Isto porque a liberdade versa
sobre a relação entre pessoas e entre comunidades. Logo, esta só pode ser
entendida em um contexto social e comunitário. (Josué Carvalho & Lindalva
Carvalho, 2006).
A educação de acordo com educador e filósofo John Dewey deveria
considerar a importância de habilitar a criança para "viver o seu mundo",
trazendo a realidade social do mundo adulto para dentro da escola e não
menos relevante o educador. Já o educador Paulo Freire considerava que só
através da educação o ser humano poderia se libertar das elites opressoras, do
status-quo. (Josué Carvalho & Lindalva Carvalho, 2006).
A educação como um movimento para o desenvolvimento das
competências essenciais individuais (pessoas) e comunidades (coletivas), para
a busca da autonomia, emancipação e mobilização para melhoria da inclusão
social, através das iniciativas de inclusão digital e tecnologia social será o tema
central e norteador deste trabalho, analisados através das gerações e ondas de
inclusão digital. A educação não formal, caracterizada principalmente pelas
iniciativas para o desenvolvimento das competências dos membros das
comunidades analisadas, fora da escola tradicional ou formal será o principal
fio condutor das iniciativas de educação sociocomunitária e tecnologia social e
elementos complementadores do tema central, através e com pano de fundo as
iniciativas de inclusão digital da Fundação Bradesco.
2.2 A Educação Não Formal
A educação não formal tem o papel de ensinar a criar, de ensinar a
pensar, mas também a intenção de transformar e o compromisso de favorecer
diferentes possibilidades de exercício e vivência de diálogos, conforme Valéria
Aroeira Garcia (2005). A educação não formal não está no mesmo contexto da
educação formal, apesar de estarem entrelaçadas, ou seja, não possuem os
mesmos delimitadores, métodos de avaliação e mecanismos de governança e,
portanto não se trata de dizer quem é melhor ou pior. A educação não formal
26
reflete intensamente o contexto histórico, pois apresenta propostas para
trabalhar o desenvolvimento do sujeito, que se constitui nas relações sociais
desenvolvidas ao longo do tempo (Garcia, 2005).
As ações de educação não formal no Brasil começaram a ter
visibilidade a partir dos anos 90, em decorrência das mudanças na economia,
na sociedade e no mundo do trabalho. O crescimento do terceiro setor surgiu
como uma alternativa entre o Estado, as populações e como espaços de novas
vivências sociais e políticas. Muitos projetos de educação não formal foram
estruturados em parcerias com o Estado, buscando construir propostas
curriculares alternativas para as crianças e adolescentes excluídos das escolas
formais, através de currículos etnocêntricos e pouco voltados para a
diversidade cultural, étnica, econômica e social das populações menos
favorecidas, no contexto social e econômico.
Na difusão e propagação de projetos de educação não formal é
necessário considerar a influência do neoliberalismo, termo associado ao livre
comércio, redução da despesa e participação pública na economia e portanto,
o fortalecimento do setor privado com condutor e gerador de riqueza. O
professor e geógrafo Milton Santos (2006), ao descrever a questão da
participação do terceiro setor na educação, argumentava que, nos últimos
anos, houve uma ampliação de organizações da sociedade civil, das formas de
cooperativismo e associação dos cidadãos na defesa dos direitos humanos. No
entanto, ele também aponta diferentes matrizes teóricas sobre estas
organizações. Para ele, ao mesmo tempo em que, características como
altruísmo, compaixão, sensibilidade, começaram a fazer parte da ideologia das
Organizações Não Governamentais (ONGs), é preciso analisar como os
projetos de educação não formal têm se constituído. Questiona-se se são
espaços de emancipação das pessoas atendidas ou de adaptação social, ou
configuração a um padrão social dominante. Todavia, apesar das críticas
significativas, o autor afirma que é preciso valorizar os projetos de educação
não formal, pois, para ele, a escola não é o único local de lócus do processo
ensino e aprendizagem. Esta concepção dos projetos de educação não-formal,
como propostas curriculares alternativas a educação formal e projetos
27
emancipadores também são citados nas publicações sobre educação não-
formal de Gohn (1999) e Von Simson (2001), de acordo com Paula (2009).
A educação não formal na sua concepção e constituição não é
estática, é uma atividade aberta que ainda está em construção, portanto não
tem uma identidade pronta e acabada. O não da educação não-formal não
representa uma conotação negativa ou de menor grau de importância e sim de
uma iniciativa diferenciada da educação formal, pois é caracterizada pela
diversidade, pelo processo contínuo de construção e adaptação às demandas
sociais presentes na comunidade. A educação não formal, quando
consideramos os projetos voltados para crianças e jovens oriundos das
camadas mais carentes da sociedade, ainda é concebido por diferentes
setores, inclusive o educacional, como oferecedora de atividades para passar o
tempo, brincar, ocupar a cabeça com coisas mais interessantes, do que
aquelas que fazem parte do mundo da rua, além de serem oferecidas com o
intuito de tirá-los das ruas e reduzir o risco social (Garcia, 2005).
A educação não formal visa contribuir para o desenvolvimento de
crianças e adolescentes, e também pode ser utilizada para reduzir o trabalho
infantil. Esse modelo de educação é recente na história do Brasil e vem se
construindo como uma alternativa de melhorar a inclusão social, mobilizar as
comunidades em busca dos interesses comuns e o despertar pelo interesse e
engajamento em prol da educação formal.
A educação não formal permite o diálogo, valoriza a importância do
outro na constituição do sujeito, daí sua grande relevância para um processo
de ensino-aprendizagem, que é capaz de incentivar a transformação social das
pessoas e comunidades. A integração da educação formal e não formal deve
ocorrer de forma espontânea, onde os saberes adquiridos em sala de aula
devem ser conectados as demandas sociais locais, permitindo o
desenvolvimento das competências necessárias para a formação de um
cidadão responsável e atuante para o exercício pleno da cidadania, com uma
relação equilibrada de convivência, sob o amparo dos mútuos direitos e
deveres.
28
A educação não formal pode ser considerada como uma iniciativa de
educação social, quando o contexto social é colocado como agente a ser
transformado pela educação, através de ações que ocorrem de dupla mão, nas
comunidades e nas escolas. A educação social de acordo com Trilla (1996)
pode ser classificada como:
1. Desenvolvimento social do indivíduo: Torna-se um conceito onde
o adjetivo “social” se refere a um objetivo da educação, o desenvolvimento
social da pessoa. Portanto é uma definição que parte de critérios psicológicos,
uma vez que, a psicologia é uma ciência que estuda as dimensões da
personalidade dos indivíduos.
2. Destinatários dos indivíduos que se encontram em risco social:
Um conceito que remete para as questões e os problemas sociais dos
indivíduos. Faz parte, portanto, de um critério sociológico (psicossocial).
3. Educação não formal: Agentes, que encontram nos contextos
sociais. Podemos comparar esta educação não formal com a educação
escolar. Neste caso, a base é fundamentalmente pedagógica, isto é, uma vez
que segue alguns critérios da educação formal, da educação não formal, e da
educação informal.
Os objetivos da educação não formal podem ser caracterizados pela
educação voltada a cidadania, baseada nos seguintes eixos e fios condutores,
de acordo com Gohn (2006):
1. Educação para justiça social;
2. Educação para direitos (humanos, sociais, políticos, culturais);
3. Educação para liberdade;
4. Educação para igualdade;
5. Educação para democracia;
6. Educação contra discriminação;
29
7. Educação pelo exercício da cultura, e para a
manifestação das diferenças culturais.
A educação formal predominante no Brasil, desde a última década
(2.000) tem sido caracterizada pela visão “conteudista”, onde a aquisição do
conhecimento se faz em grande parte pelo conteúdo, sem a priorização da
aquisição de competências necessárias para a melhoria da inclusão social ou
da mobilidade social das comunidades. As competências como protagonismo,
pensamento crítico, socialização, mobilização pelas causas sociais, solução de
problemas através da aplicação da ciência e tecnologia e empreendedorismo
social podem ser melhores exploradas e desenvolvidas, quando as iniciativas
ocorrem na educação não formal.
A educação formal, na forma institucionalizada, ou seja, articulada
através de uma instituição previamente constituída normalmente tem um raio
definido de ação e um currículo a ser seguido, determinado pelos órgãos
reguladores da educação brasileira. A educação não formal pode ser então
considerada como a educação que ocorre fora da escola, ou seja, por aí nas
comunidades e na sociedade como um todo, sob forma institucional ou não.
“Um bom exemplo desse processo seria o movimento dos educadores de rua.
Embora os educadores de rua possam estar organizados por instituições, sua
prática educativa não tem por instrumento uma instituição que se defina por um
ambiente específico – e isolado – como o escolar. Para o estudo de processos
educacionais desse tipo, poderíamos propor uma divisão como a Educação
Social”. (Paulo de Tarso, 2008).
O papel do educador transita entre quem educa ou é o agente do
processo de construção do saber, quando tratamos dos tipos de educação. Na
educação formal sabemos que são os professores, pois eles são contratados e
tem um papel definido nas escolas. Na educação não-formal, o grande
educador é o outro, aquele com quem interagimos, colaboramos, convivemos,
compartilhamos os problemas e as reflexões do contidiano das comunidades.
O presente trabalho trata as iniciativas de inclusão digital, através
das gerações e ondas de inclusão digital, com ênfase respectivamente no
30
envolvimento das comunidades na busca da melhoria da mobilidade social,
através das iniciativas de educação não formal, como o agente essencial e
norteador, bem como no desenvolvimento de parcerias com instituições de
ensino e empresas (iniciativas de responsabilidade social) em busca da
sustentabilidade dos projetos de educação não formal. As iniciativas de
educação não formal foram contextualizadas às necessidades de cada
comunidade, principalmente para o desenvolvimento de competências, que
possibilitem a busca da igualdade social, o exercício pleno da cidadania e a
garantia dos direitos humanos e sociais.
2.3 A Educação Sociocomunitária
A educação sociocomunitária pode ser contextualizada em um
campo da educação ainda em definição, com delimitações baseadas em
grande parte pela educação salesiana e pelas iniciativas e publicações dos
pesquisadores e Professores da Unisal Americana, Mestrado em Educação.
A “Educação Sociocomunitária”, de acordo com Paulo de Tarso em
“Educação Sociocomunitária: delimitações e perspectivas” (2009) poderia ser
uma solução muito prática dizer que toda educação é social e que, portanto, há
uma tautologia em se falar de educação social e uma inutilidade pensar tal
campo. A praticidade de asserções desse tipo morre pela simples conversão
de que nem todo social é educação e, finalmente, pela tipificação de que a
educação é um processo social, entre muitos outros. “Alguém muito
personalista, pelo mesmo equívoco, poderia dizer que toda educação é
especial ou, para espanto do mais tecnicista dos matemáticos, que toda
educação é moral.”
Ainda, de acordo com Paulo de Tarso em “Educação
Sociocomunitária: delimitações e perspectivas”, que “..., cabe ao cientista em
educação deter-se e explicar o que é e se é mesmo possível existir ou praticar-
se educação inclusiva. Não há nenhuma censura aos educadores que atuam,
por exemplo, num certo tipo de instituição educativa, para que não se
31
apaixonem pela educação inclusiva. Aliás, nem se deve negar que educação
seja uma paixão, mas o método nos pede que a lógica preceda a paixão na
ciência. E nisso devemos, ainda, ser modernos, porque a racionalidade é o
caminho que temos para mensurar nossos discursos e neles identificar tanto as
propostas como as paixões”.
Um caminho a explorar em relação à colocação do Paulo de Tarso
seria dizer que a educação leva ao desenvolvimento social, pois promove o
desenvolvimento de competências pessoais e profissionais, que podem
proporcionar a melhoria da mobilidade social, aqui entendida como ascensão
nas classes sociais, geração de renda nas comunidades e melhoria das
condições de infraestrutura básicas (saneamento, energia, telecomunicações e
segurança).
A proposta de divisão tradicional (oficial) na educação baseada na
faixa etária e nos processos educacionais e pedagógicos, como no caso da
Educação Infantil, da Educação Especial e da Educação de Jovens e Adultos,
muitas vezes desconsidera a necessidade de contextualizar o processo e
aprendizagem com as demandas individuais ou coletivas dos alunos daquela
comunidade. O conhecimento pelo conhecimento sem contexto, associação
com a realidade local e sem “significação” não levam a retenção de conteúdo
desejada e nem possibilitam a transformação social da comunidade, através do
ativismo, voluntariado e mobilização por causas sociais.
As mudanças provocadas pela educação normalmente encontram
barreiras nas comunidades, como afirma Paulo de Tarso “...a comunidade,
como local e prática do cotidiano, é também o local onde se reiteram as
tradições, onde se fixam os preconceitos, onde se praticam de forma
transparente as exclusões menos perceptíveis, sob a égide serena dos hábitos
e costumes. Pode ainda ser o refúgio e o lugar da resistência a mudanças, a
ruptura possível e concreta em relação à sociedade, a comunidade alternativa,
que se propõe sempre como melhor do que está aí, numa sentença que tanto
pode inspirar um projeto utópico como um profundo sentimento sectário e
32
isolacionista, a construção concreta do projeto do medo, como ensina
Baumann”.
As comunidades tendem a rejeitar processos de mudanças que
poderiam ser provocados pela educação, quando uma das forças (grupos)
dominantes é afetada pelas ações decorrentes do processo educativo ou
quando as mudanças não são percebidas como promotoras de transformações
de longo prazo. Uma das questões levantadas com frequencia pelas
comunidades, que recebem projetos das instituições de fora do seu entorno é
sobre a permanência e a perenidade das iniciativas nas comunidades. O fato
das iniciativas serem conduzidas pelas escolas ou centros comunitários de
dentro das comunidades facilita o processo de mudança ou de adoção das
práticas ou conhecimentos decorrentes do processo de aprendizagem. A
intervenção nesse caso ocorre de forma natural, de agentes da própria
comunidade, com ou sem rupturas com os modelos mentais locais, mas com
ações que podem refletir de forma significativa as necessidades da
comunidade.
A intervenção pode provocar uma ruptura tanto no modo de ser,
como no modo de educar a sociedade. O professor Paulo Tarso afirma que “...
Em algum sentido, a intervenção é negativa, deve, ao menos, negar o estado
das coisas tal como estão. Parece-me que nem toda educação
sóciocomunitaria é um processo que se caracteriza por intervenção, nesse
sentido restrito. Porém, em toda proposta educativa há um momento criador,
há o momento de se discutir e fazer, ou refazer, a proposta e esse é, ao menos
em sentido lato, o momento da intervenção”. A intervenção provoca uma
reflexão em relação ao “status quo”, onde as escolas, centros comunitários e
membros das comunidades buscam propostas para as soluções dos problemas
sociais locais. O fio condutor que leva a educação sociocomunitária passa pela
mobilização dos principais agentes integrantes das comunidades, como
escolas, centros comunitários, centros de inclusão digital, igrejas,
departamentos públicos e empresas privadas que valorizem a aplicação do
conhecimento na busca de propostas para as demandas sociais locais.
33
A intervenção nas comunidades deve ser ocorrer pelo diálogo, pela
reflexão e como escreveu Paulo Freire na Pedagogia do Oprimido: “Desta
maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto
educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também
educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e
em que os “argumentos de autoridade” já não valem. Em que, para ser-se,
funcionalmente autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e
não contra eles”. Na educação sociocomunitaria os professores são os
mediadores e conectadores do conhecimento gerado nas escolas com as
demandas sociais, provocando reflexões e discussões para a intervenção
através de projetos e mobilização comunitária e social.
A mobilidade social é o movimento de indivíduos, famílias e grupos a
partir de uma posição social para outra. A teoria da mobilidade social tenta
explicar as frequências com que ocorrem estes movimentos. O estudo da
mobilidade social relaciona o presente ou futuro em relação a uma posição no
passado e trata a questão da seleção social, ou seja, de como as pessoas são
distribuídos em diferentes posições sociais. No entanto pode ser muito difícil
estudar de forma eficaz a influência da posição social no passado, sem
considerar o contexto de outras influências, que determinam a condição social
do indivíduo no presente.
A mobilidade social pode ser a consequencia mais desejada nas
comunidades através da educação sociocomunitária. O significado de
mobilidade passa pela necessidade da transferência, mudança e movimento. A
mudança pode ocorrer em um lugar ou de uma posição para outra. Além disso,
a mudança é livre de valores ou seja, não se pode dizer que a mudança é para
o bem ou mal. Quando o prefixo 'social', juntamente com a mobilidade
implicaria que as pessoas ou indivíduos ocupando uma determinada posição
social, movem para outra posição ou ganham um novo status social,
principalmente em busca das necessidades básicas.
A mobilidade social, segundo Pitirin Sorokin em “Social e Cultural
Mobility” (1959), que foi o primeiro sociólogo a tratar formalmente o tema diz
34
que que não há sociedade que esteja totalmente fechada (sistema de casta na
Índia) e nenhuma sociedade que esteja completamente aberta (sistemas de
classes), que tenham a mesma movimentação social. Além disso, a velocidade
do movimento ou alteração pode diferir de um período de tempo para outro. A
taxa de variação depende do nível de modernização de uma determinada
sociedade ou de engaajamento e mobilização das comunidades.
A mobilidade social para Bernard Barber, em “Social Stratification: A
Comparative Analysis of Structure and Process” (1957) refere-se ao
movimento, seja para cima ou para baixo entre as classes sociais mais altas ou
mais baixas. Este movimento deve ser concebido como um processo que
ocorre ao longo do tempo, com os indivíduos que se deslocam de um lado para
outro em termos de classe social, através de várias interações sociais. A
mobilidade surge na interação social, uma vez que cada indivíduo reage com
os outros, proporcionado mudanças dos papéis sociais. Neste sentido, a
mobilidade oferece ao indivíduo mais ou menos os benefícios que a sua
economia e a sociedade têm para oferecer. O filho de um operador de máquina
torna-se um advogado; o filho de um funcionário torna-se um médico. Em cada
caso, a mudança de papéis entre pai e filho proporciona aos mesmos a
melhoria da qualidade de vida.
A relação da comunidade e escola pode ser de dupla mão através
da educação sociocomunitária, ou seja, a comunidade intencionalmente busca
mudar algo na sociedade por meio de processos educativos e a escola dá um
significado e contexto para o conhecimento produzido com os alunos. Nesse
movimento a comunidade desenvolve autonomia, conforme Paulo de Tarso
“....a proposta não é feita como hipótese de resolução de todos os problemas
sociais e educativos, mas como problematização das possibilidades de
emancipação de comunidades e pessoas em constituir articulações políticas,
expressas em ações educativas, que provoquem transformações sociais
intencionadas”.
A educação sociocomunitária, de acordo com Soffner (Tecnologias
sociais e a educação para a práxis Sociocomunitária, 2014) trata-se da
35
“...transformação social, da emancipação e da autonomia. Investiga a
articulação comunitária de caráter emancipatório ou instrumentalizado, que se
expressa por meio de intervenções educativas para a consecução de
transformações sociais”. As comunidades articuladas através de desejos e
demandas sociais comuns mobilizam-se em busca de propostas e soluções
para os problemas sociais, dando significado para os conhecimentos
adquiridos na educação formal nas escolas e da educação não formal,
resultados das interações sociais e das aprendizagens em centros
comunitários e de inclusão digital.
A educação sociocomunitária é caracterizada pelo cultivo do
princípio sociocomunitária de relações sociais e humanas, de acordo com
GROPPO (2012): “....A lógica ou princípio sociocomunitário caracteriza-se por
relações sociais que, ao menos inicialmente, atendem necessidades
propriamente humanas: a sobrevivência, cuidado e identidade (em seu viés
comunitário) e a liberdade, autonomia e criação (em seu viés societário)”. Uma
reflexão a colocação de Groppo seria que os membros da comunidade, através
de projetos e iniciativas, principalmente de educação não formal buscam
transformar a realidade na busca de soluções, que atendam as necessidades
básicas, a auto realização humana na questão do pertencimento, engajamento
e mobilização para a melhoria da mobilidade social, aqui entendida como
acesso a uma renda digna, com segurança, educação e saúde compatíveis aos
objetivos de desenvolvimento do milênio (ONU, 2000).
Outra vertente tratada por Tarso (2008) é que a educação
sociocomunitária seja um tema ou área pertinente à educação social, na
medida em que seu problema ultrapassa tanto a questão do lugar institucional,
como da finalidade em relação ao educando, para situar-se no modo de
articulação da comunidade e no alcance do processo educacional conseqüente
a essa articulação em relação às transformações sociais. Dizemos que
ultrapassa porque não há censura a que se investiguem relações escola-
comunidade, nem há obrigatoriedade de que haja relações comunidade-
instituições educativas.
36
A escola será sujeito de estudo se a articulação da comunidade, em
seu desenvolvimento histórico seja ele instrumentalizado ou emancipado,
incluir a participação da escola. Dentro dessa linha vale destacar projetos como
os centro de inclusão digital (CIDs) da Fundação Bradesco e Computer
Clubhouse, do MIT e Museu de Ciências de Boston, onde a intervenção da
escola (educação formal) e dos centros de inclusão digital ocorrem de forma
integrada e complementares, através de projetos que atendam as demandas
sociais da comunidade, como as iniciativas do Computer Clubhouse no Jardim
Conceição(Osasco/SP) tratado neste trabalho.
2.4 A Economia Social
A economia solidária pode ser definida como conjunto de atividades
econômicas, cuja lógica é diferenciada da lógica do mercado capitalista, como
também da lógica do Estado, de acordo com Laville (1994). A economia
capitalista é centrada no capital a ser acumulado e que funciona a partir de
relações competitivas, cujo objetivo é o alcance de interesses individuais, a
economia solidária organiza-se a partir de fatores humanos, favorecendo as
relações onde o laço social é valorizado através da reciprocidade e adota as
formas comunitárias de propriedade, com ênfase a inclusão social.
O conceito de economia solidária para Laville e Roustang (1999)
enfatiza o desejo primário da economia social na sua origem de evitar o fosso
entre o econômico, o social e o político, pois é na articulação destas três
dimensões que situa o essencial da economia social ou solidária. O termo,
segundo esses autores, tenta dar conta da originalidade de numerosas
iniciativas da sociedade civil que não se encaixam na trilogia legalizada na
França das cooperativas, mutualidades e associações.
O historiado francês André Guélin (1998) define economia social
como composta de organismos produtores de bens e serviços, colocados em
condições jurídicas diversas das quais, a participação dos homens resulta de
sua livre vontade, onde o poder não tem por origem a detenção do capital e
37
onde a detenção do capital não está fundamentada na aplicação dos lucros e
sim a busca da equidade social.
O terceiro setor pode ser visto como um dos agentes para o
desenvolvimento da economia social, de acordo com Defourny, Develtere e
Fonteneau (1999). Como prova disto, citam a associação “International Society
for Third Sector Research”, criada em 1992. Mas se olharmos para regiões
geográficas específicas, observam eles, outros termos são preferidos. Assim,
nos EUA fala-se em “non-profit sector” ou “independent sector”, que
corresponde à apelação inglesa de “voluntary organizations”. No caso da
América Latina os termos mais utilizados são economia solidária e
“organizaciones de economía popular”.
A concepção de economia social é mais ampla do que “non-profit
sector”, pois, ao lado das associações sem fins lucrativos, ela inclui um tipo de
empresa, as cooperativas, que difundidas no mundo inteiro, buscam a terceira
via entre o capitalismo e as ações públicas do estado. Além disto, incorpora um
outro tipo de organização, as mutualidades que, também muito presentes em
vários países, desempenham um papel central na organização da saúde e da
previdência social. Assim, resumindo, o terceiro setor pode ser apresentado
como constituído por três grandes componentes: as cooperativas, as
organizações mutualistas e as organizações sem fins lucrativos
(essencialmente associações), de acordo com Noëlle Marie Paule Lechat
(2002).
A economia solidária no Brasil, por muito tempo foi vista como
autogestão, cooperativismo, economia informal ou economia popular, de
acordo com Noëlle Marie Paule Lechat (2002). Uma prova disto é a polêmica,
ainda existente, a respeito do atributo popular acrescido à economia solidária
ou ao cooperativismo, denominados então de economia popular solidária, ou
cooperativismo popular. Quanto à economia informal, termo que foi criado na
década de 60, no âmbito do Programa Mundial de Emprego da Organização
Internacional do Trabalho – OIT, se outrora os analistas a consideravam como
um fenômeno transitório ligado ao subdesenvolvimento dos países
38
dependentes, hoje é uma questão que se impôs aos cientistas sociais, políticos
e econômicos pela sua persistência e crescimento. O conceito economia de
solidariedade aparece pela primeira vez no Brasil em 1993 no livro Economia
de Solidariedade e Organização Popular, organizado por Gadotti, onde o autor
chileno Luis Razeto o concebe como “.....uma formulação teórica de nível
científico, elaborada a partir e para dar conta de conjuntos significativos de
experiências econômicas -...-, que compartilham alguns traços constitutivos e
essenciais de solidariedade, mutualismo, cooperação e autogestão
comunitária, que definem uma racionalidade especial, diferente de outras
racionalidades econômicas”. (Razeto, 1993: 40), de acordo com Noëlle Marie
Paule Lechat (2002).
O termo terceiro setor é divulgado em 1994 com a publicação de
Fernandes. Privado, porém público. Mas devemos esperar até 1995 para que
brasileiros escrevam sobre economia solidária referindo-se a ela desta
maneira. Alguns encontros vão constituir um marco para a construção de um
pensamento e/ou movimento social em prol da economia solidária no Brasil;
apresentarei uns seis conjuntos, mas não são os únicos. O primeiro aconteceu
por ocasião de uma mesa redonda sobre o tema Formas de Combate e de
Resistência à Pobreza realizada em setembro de 1995 durante o 7º Congresso
Nacional da Sociedade Brasileira de Sociologia e o segundo ocorreu no III
Encontro Nacional da Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas
12 de Autogestão e Participação Acionária - ANTEAG -, que teve lugar em São
Paulo nos dias 30 e 31 de maio de 1996, de acordo com Noëlle Marie Paule
Lechat (2002).
Alguns encontros vão constituir um marco para a construção de um
pensamento e/ou movimento social em prol da economia solidária no Brasil, de
acordo com Noëlle Marie Paule Lechat (2002). O primeiro aconteceu por
ocasião de uma mesa redonda sobre o tema Formas de combate e de
resistência à pobreza realizada em setembro de 1995, durante o 7º Congresso
Nacional da Sociedade Brasileira de Sociologia e o segundo ocorreu no III
Encontro Nacional da Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas
39
de Autogestão e Participação Acionária - ANTEAG -, que teve lugar em São
Paulo nos dias 30 e 31 de maio de 1996. Os trabalhos apresentados na mesa
redonda do 7º encontro foram organizados em coletânea por Luiz Inácio Gaiger
e publicados em 1996. Na apresentação, ele escreve: “A comparação entre
essas diversas experiências permite identificar, como tipo promissor e como
alternativa viável para a economia popular, os empreendimentos solidários que
reúnem, de forma inovadora, características do espírito empresarial moderno e
princípios do solidarismo e da cooperação econômica apoiados na vivência
comunitária” (Gaiger, 1996: 11).
A economia social ou solidária será explorada neste trabalho como
a geração de recursos em busca da sustentabilidade das iniciativas de
educação não formal, caracterizada pelos projetos de inclusão digital para a
melhoria da mobilidade social e inclusão social. Iniciativas como a da ATN em
parceria com CIDs (Centros de Inclusão Digital) propiciavam a geração de
renda à comunidade local e suporte para a manutenção dos centros de
inclusão digital.
2.5 A Tecnologia Social
A tecnologia social, que também é chamada de apropriada por
alguns autores pode ser compreendida como produtos, técnicas ou
metodologias replicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que
representem efetivas soluções de transformação social e melhoria da
mobilidade social. O movimento da tecnologia apropriada que teve seu auge
nas décadas de 1960 e 1970, para contextualizar uma nova perspectiva
representada pelos conceitos de tecnologia social, economia solidária e capital
social. Alguns autores consideram as várias propostas nada mais do que as
várias dimensões da tecnologia, podendo ser classificadas em dimensões
econômica, sociocultural, política, científico-tecnológica e ecológica.
40
O Professor Ramon Garcia (1987), esclarece que a tecnologia
apropriada ou social é nada mais que um novo rótulo: "os rótulos podem ser
vários, mas o conteúdo é um só... não obstante as várias designações, a ideia
básica é uma só: a valorização das condições globais de produção - técnicas e
sociais - de uma dada coletividade". A tecnologia apropriada, que o economista
Ernst Friedrich Schumacher (1979) também chama de intermediária busca os
formatos tecnológicos mais apropriados para os países subdesenvolvidos, com
o objetivo de diminuir o gap entre estes e os países desenvolvidos. Ainda
Garcia (1987) afirma que a tecnologia apropriada deve suportar as opções
existenciais mais profundas dos seres humanos: "voltada não só para os
aspectos de organização da produção e do trabalho. Mas, sobretudo, ligada às
opções existenciais mais profundas dos seres humanos, suas valorizações de
vida e de morte; às suas valências mais íntimas, relacionadas ao bom, ao belo,
ao verdadeiro e ao justo".
A tecnologia apropriada (TA) surgiu nas décadas de 1960 e 1970,
como um movimento contra o desencanto e o ceticismo em relação aos
processos de desenvolvimento econômico, praticados até aquele momento,
bem como uma reação aos padrões de crescimento econômico do pós-guerra,
tanto nos países denominados de primeiro mundo, quanto nos denominados
terceiro mundo, de acordo com Rodrigues & Barbieri (2008).
A origem do conceito de TA pode ser considerada como um
acontecimento na Índia do século XIX, através da valorização das tecnologias
tradicionais, praticadas nas comunidades, com uma forma de resistência ao
domínio britânico. A iniciativa de Gandhi e a luta para popularizar a roca de fiar
manual seria o primeiro equipamento tecnologicamente apropriado. As obras
de Schumacher, entre elas “Small is beautiful”, de 1973, têm sido amplamente
reconhecidas como marcos importantes na evolução do movimento da TA.
Outros autores preferem tratar a tecnologia apropriada, com visões
complementares, como David Dickson, ex-editor da New Scientist, que preferia
chamar de tecnologia alternativa e Arthur C. Clarke, autor de ficção cinetífica
que chamava de tecnologia suave. As expressões como tecnologia
ambientalmente saudável, comunitária, de baixo custo, da era solar, do terceiro
41
milênio, participatória, progressiva, com face humana e muitas outras citadas
por Kevin Willoughby, Professor da “Skolkovo Institute of Science and
Technology” mostram tanto a vitalidade desse movimento nesse período,
quanto a sua diversidade de propostas, de acordo com Rodrigues & Barbieri
(2008).
O movimento da tecnologia apropriada ressurgiu, mantendo a chama
acesa em circuitos mais fechados, como o “Consortium Rural Technology”, na
Índia; a “Asian Alliance of Appropriate Technology Practioners”, nas Filipinas; o
“Appropriate Technologies for Enterprise Creation”, no Quênia; e a organização
criada por Schumacher, a “Intermediate Technology Development Group”
localizada na cidade de Londres. Refluiu, mas não desapareceu e nem poderia,
pois as mazelas que as diversas vertentes desse movimento denunciavam não
foram eliminadas e ao contrário, muitas se agravaram. Portanto, muitas das
suas propostas começam a ser revisitadas no momento e incorporadas ao
discurso official, tanto do lado público como no privado (empresas), como
sendo parte da estratégia pública de ações ou da estratégia de negócio.
A tecnologia apropriada ou social é baseada no capital social, no
conceito da economia solidária, de acordo com o economista Paul Singer e
também na capacidade das comunidades locais de superarem seus próprios
problemas. As tecnologias para suporte a base da pirâmide social, de acordo
com C. K. Prahalad (2009) baseiam-se nos recursos, no poder e na capacidade
das empresas multinacionais de investir em novos mercados e em novas
tecnologias, o que é coerente com o modus operandi recorrente dessas
empresas: perseguir permanentemente novas oportunidades de negócios,
onde quer que estejam, criando os meios apropriados para isso (Rodrigues &
Barbieri, 2008). O economista Prahalad afirma que estratégias de negócios
podem, quando bem implementadas, eliminar a miséria e, portanto as
empresas devem buscar a sustentabilidade dos seus negócios, balanceando
os benefícios sociais do desenvolvimento de produtos e processos
sustentáveis, com os custos financeiros de investir em negócios com
sustentabilidade.
42
A definição de tecnologia social pelo ITS - Instituto de Tecnologia
Social e OSCIP - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público,
dedicada a irradiar conhecimento sobre tecnologia social passa por dois
elementos fundamentais na correta adoção: a tecnologia desenvolvida e
praticada na interação com a comunidade e aquela que é apropriada por ela. O
ITS considera três categorias para a correta adoção da tecnologia social:
princípios, parâmetros e as implicações.
- Princípios: Aprendizagem e participação, como processos que
caminham juntos, e que a transformação social requer a
compreensão da realidade de maneira sistêmica e o respeito às
identidades e necessidades locais.
- Parâmetros: Critérios para a análise das ações sociais, nas quais
se destacam quanto a:
1. Razão de ser dessa tecnologia: demandas sociais concretas
vividas e identificadas pela população, como a razão de ser dessa tecnologia;
2. Processo de tomada de decisão: democrático e desenvolvido a
partir de estratégias especialmente dirigidas à mobilização e à participação da
população;
3. Papel da população: participação, apropriação e aprendizado
por parte da população e de outros atores envolvidos;
4. Sistemática: planejamento, aplicação ou sistematização de
conhecimento de forma organizada;
5. Construção do conhecimento: produção de novos
conhecimentos a partir da prática;
6. Sustentabilidade: visa à sustentabilidade econômica, social e
ambiental;
7. Ampliação de escala: gera aprendizagem que serve de
referência para novas experiências.
43
- Implicações: As implicações do conceito de tecnologia social podem
ser organizadas em três eixos:
1. Relação entre produção de C&T e a sociedade
2. A direção da produção de conhecimentos
3. Modo de fazer específico de intervir sobre a realidade e que se
relaciona tanto aos parâmetros, quanto aos resultados.
A tecnologia social pode ser mais produtiva e gerar produtos com
mais qualidade do que a tecnologia industrial convencional operada por
grandes empresas, desde que a responsabilidade social empresarial esteja no
radar da estratégia dessas empresas. Várias Fundações e Institutos ligados a
grandes empresas têm desenvolvido e contribuído com projetos e iniciativas de
apoio a comunidades carentes, através da tecnologia educacional, com a
Fundação Bradesco, Fundação Banco do Brasil e Fundação Lemman, Itaú
Social, entre outros.
O conceito de tecnologia social resulta de um trabalho coletivo, que
encontra sustentação e legitimidade no diálogo e relacionamento com as
comunidades. O diálogo com as entidades da sociedade civil organizada e a
observação de seu modo de ação, possibilita a percepção da tecnologia social
como um princípio para definição das práticas de intervenção social, que se
destaquem pelo êxito na melhoria das condições de vida da população,
construindo soluções participativas, estreitamente ligadas às realidades locais
em que forem aplicadas. Sem dúvida, a tecnologia social começa pela
construção de seus próprios instrumentos, das suas próprias ferramentas de
trabalho, em função do diálogo com a sociedade civil organizada, numa busca
conjunta de práticas de intervenção social que possam contribuir para a
melhoria das condições de vida da população, ou seja, da inclusão social.
A tecnologia social para Soffner (2014) é a unidade entre prática e
teoria, que descobre e elabora instrumentos de ação social. Em pedagogia a
prática é o horizonte, a finalidade da teoria. O educador vive a dialética entre o
seu cotidiano da escola vivida, e da escola projetada. O homem educado é o
44
ponto de chegada, a promessa. A educação, que copia e reproduz modelos
não deixa de ser práxis, mas se limita a uma práxis reiterativa, imitativa,
burocratizada. Aquela transformadora é criadora, ousada, crítica e reflexiva,
parte da auto-organização e do trabalho coletivo. Um complemento reflexão a
essa definição seria que a tecnologia social pode ser caracterizada como
instrumento de iniciativas de transformações sociais e uma das etapas da
educação sociocomunitária, quando considera que as práticas desenvolvidas
nas escolas e comunidades convergem em ações sociais transformadoras,
dando significado e contexto para o conhecimento adquirido nas escolas e nas
relações sociais entre os membros da comunidade.
Ainda segundo Soffner (2014) as tecnologias sociais buscam o
desenvolvimento autônomo das comunidades em suas diferentes demandas -
alimentação, habitação, renda, educação, energia, saúde, meio ambiente -
fazendo dialogar o saber técnico-científico como saber popular. Como todo
conceito, está em evolução, modificando-se e sendo reinventado nas práticas
concretas. A definição de tecnologia social de Paulo Freire, de acordo com
Soffner (2014) passa pela questão do protagonismo da comunidade,
respeitando-se o saber do beneficiado e o beneficiado se apropriando da
tecnologia. Consumidor que se torna produtor de tecnologia. Aquele que não é
apenas reprodutor e receptor, mas produtor em termos de publicação. Como
diz Gadotti (debate: “O poder multiplicador das tecnologias sociais”, TV Fórum,
2012), “....quando as pessoas entendem o que é tecnologia social,
rapidamente, identificam, nas suas práticas, alguma ação concreta”. A
tecnologia social pode ser articulada ou aplicada em qualquer local ou setor da
sociedade, onde a ação coletiva protagonizada pelos membros da comunidade,
através de instrumentos e ferramentas conduz a ações e transformações
sociais esperadas pela sociedade.
A tecnologia social conectada a inteligência coletiva, às redes de
colaboração e produção coletiva do conhecimento trazem oportunidades nunca
antes exploradas, em termos de mobilização, engajamento, escala e propostas
de solução dos problemas, principalmente através da Internet e da conexão
das inteligências distribuídas. De acordo com Pierre Levy (Inteligência Coletiva,
45
2003), a inteligência coletiva pode ser compreendida como um princípio onde
as inteligências individuais são somadas e compartilhadas por toda a
sociedade, potencializadas com o advento de novas tecnologias de
comunicação, como a Internet. Ela possibilita a partilha da memória, da
percepção, da imaginação. Isso resulta na aprendizagem coletiva e na troca de
conhecimentos.
As plataformas sociais, um conjunto de tecnologias sociais, de
acordo com Fisher (Futuros Antropológicos, 2009) podem se tornar pontos
potenciais de solução de problemas locais e de criação de infraestruturas. As
teletecnologias podem servir como doenças autoimunes, que desencadeiem
uma “escala de posições” no termos de Jacques Derrida (desconstrução), ou
como caminhos alternativos a instuições petrificadas, instutições educativas
decadentes e burocracias e intermediários gananciosos. Esse é o
cosmopolitismo que se preocupa em investir nos recursos de deliberação da
sociedade, que se preocupa com os processos quanto com o conteúdo, com as
novas formas de favorecer a adaptação e cooperação, com a transformação de
tecnologias em unidades úteis para todos, com a mudança das relações de
poder, com a garantia de acesso, com superação de velhas e frágeis
instituições, mas também com novos modos de organização, de obtenção de
dados para novos modeos de investigação social e científica. As plataformas
sociais podem ser um grande “hub” de inteligência coletiva, conectando as
demandas sociais das comunidades com possíveis propositores de soluções,
intermediados pelos centros comunitários e de inclusão digital.
A aplicação da inteligência coletiva na educação sociocomunitária
pode ocorrer na forma de tecnologia social, como eixo educativo e de
desenvolvimento de propostas para a solução de demandas sociais em rede,
utilizando a internet como canal. Soffner (2014) afirma que quando as
tecnologias sociais de cunho educativo são utilizadas em redes, suportam e
encorajam a aprendizagem presencial e online, ao mesmo tempo em que
respeitam o controle individual sobre o tempo, espaço, presença, atividade e
identidade, sendo, portanto, ferramentas de práxis tecnológica. Nesse sentido
uma evolução do modelo de evolução da tecnologia social, como iniciativa de
46
educação sociocomunitária é o “Crowdsourcing Social”, uma plataforma
conectando membros das comunidades, escolas, universidades e voluntários
em busca de soluções para os problemas sociais locais, mas com dimensões
proporcionadas pela internet. Esse tema será explorado no capítulo 4 (4.4),
como uma proposta para a 4ª geração do movimento dos centros de inclusão
digital e “Crowdsourcing”.
As ferramentas tem um poder transformador através da aplicação do
conhecimento contextualizado e significativo, permitindo a associação,
multiplicação e disseminação das tecnologias sociais, conforme Soffner (2014).
A educação fora da escola e da sala de aula são potenciais complementos e
aliados da educação formal. Deve entender que as tecnologias sociais vêm da
base da sociedade, como inversão política em relação ao domínio vindo de
fora. Uma aplicação do conceito da tecnologia social são as iniciativas
protagonizadas pelos membros do Computer Clubhouse, onde as demandas e
problemas sociais são discutidos entre os membros da comunidade e escolas
no entorno. Dessa reflexão são propostos projetos, que podem utilizar a
tecnologia da informação ou não, como possíveis soluções a serem
implantadas pelos membros das comunidades ou articulados com o poder
público. Outras iniciativas como os centros de inclusão social (CIDs), do D-Lab
e da Poli Cidadã também serão tratados no capítulo 4 (4.2 a 4.3), como
exemplos de desenvolvimento de aplicação da tecnologia social e ações de
educação sociocomunitária.
2.6 A Inclusão Digital
O conceito do “Digital Divide” ou exclusão digital começou com o
desenvolvimento da tecnologia da informação, durante a década de 1970. A
tecnologia digital ou da informação foi usada pela primeira vez em um
laboratório, como acontece com a maioria das inovações e foi considerada
como um legado inovador para gravação, armazenamento e a transferência de
informações. Durante a década de 1980 houve alguns ganhos obtidos com as
47
tecnologias digitais, mas seu uso ainda era bastante complicado e restrito a
poucas pessoas. O boom tecnológico da década de 1990 colocou a tecnologia
digital entre as realizações mais importantes de tecnologia dos últimos 50 anos,
com a consolidação da Microsoft e da visão de um computador em cada mesa,
de Bill Gates, seu fundador e a propagação da Lei de Moore, um dos
fundadores da Intel, sobre a duplicação da capacidade dos processadores a
cada 18 meses.
A tecnologia digital obteve um grande sucesso, através da intensa
adoção dos consumidores, devido à quantidade de aplicações úteis e
acessíveis que foram disponibilizadas para os consumidores a partir da década
de 90. A outra razão principal foi a forma como as empresas incorporaram as
TICs nos negócios e o ganho de produtividade, que essas tecnologias
proporcionaram para os negócios. Inicialmente a preocupação era maior com o
acesso do que a aplicação da tecnologia para a geração de valor, ou seja, a
ênfase era maior no “o que” do que “como” ela poderia transformar a vida das
pessoas e a geração de valor para os negócios.
A chamada divisão digital (do inglês “Digital Divide”) principalmente
na década de 90 era caracterizada pelo elevado preço dos equipamentos. As
novas tecnologias e produtos quando são lançadas no mercado tendem a
apresentar um elevado preço. A produção inicial é geralmente cara, e as novas
tecnologias precisam gerar receita para compensar o investimento incial, ou até
o pagamento de patentes. Portanto, no caso dos microcomputadores durante a
década de 80 e 90, muitas pessoas não podiam nem mesmo comprar um
computador, tornando o uso da internet na década de 90 um fator irrelevante
do problema central. Enquanto a adoação dos computadores estava
gradualmente ocorrendo na sociedade e os pobres e grande parte da classe
média baixa não podiam participar da chamada revolução digital, a emergência
dos centros de inclusão digital passava a ser um fato relevante para a melhoria
da inclusão social. A inclusão digital insere-se no movimento de maior de
inclusão social, um dos grandes objetivos compartilhados por diversos
governos e uma das principais metas para um país com tantas diferenças
sociais como o Brasil.
48
A Cúpula do Milênio das Nações Unidas lançou em 2.000 um
conjunto de 8 objetivos e metas para serem acompanhadas e perseguidas em
escala global. As Metas do Milênio incluiam, entre seus indicadores, a
cobertura e adoação das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs).
Entretanto, essa meta não recebeu a devida atenção da comunidade
internacional, pelo menos em comparação com outras, como a meta de
redução de pobreza ou de mortalidade infantil. A falta de hábito de utilização
das TICs e a relevância quanto à melhoria da mobilidade social, mais do que a
oferta abundante de dados e informações sobre o tema, talvez expliquem a não
priorização do tema, o que significa que muitas oportunidades foram perdidas
de compartilhar as conquistas proporcionadas pela chamada era da
informação.
A telefonia celular é provavelmente a aplicação mais visível da TICs
na melhoria da inclusão digital e consequentemente na melhoria da mobilidade
social, mas há muitas outras soluções tecnológicas que tem um papel
importante no desenvolvimento social. O infoDev do Banco Mundial
(http://www.infodev.org), cataloga centenas de informações sobre aplicações
de tecnologia em comunidades carentes, como de energias sustentáveis,
aplicação na agricultura, para acesso ao financiamento (micropagamentos) e
empreendedorismo das mulheres. A maioria desses projetos ainda ocorre de
adaptações de tecnologias desenvolvidas nos países desenvolvidos para
aplicação nos países em desenvolvimento, que na maioria das vezes encarece
o custo e não atende plenamente as necessidades locais de cada comunidade.
O informacionalismo (por alguns chamado de pós-industrialismo) foi
definido por Castells (2003), como o surgimento de um novo estágio do
capitalismo global, após a invenção do transistor, do computador pessoal e das
telecomunicações. Algo maior, portanto, que a simples ocorrência da Internet,
que seria parte de um processo maior, e não seu habilitador principal. Para ele
o informacionalismo é caracterizado por: a) o papel da ciência e da tecnologia
para o crescimento econômico; b) desvio do foco da produção material para o
processamento de informação; c) a emergência e expansão de novas formas
49
de organizações industriais conectadas em rede; e d) o surgimento da
globalização socioeconômica.
As TICs podem efetivamente contribuir para melhoria da inclusão
social, quando as soluções desenvolvidas são apropriadas pelas comunidades,
através de centros comunitários, centros de inclusão digital, ONGs e igrejas.
Os fatores que contribuíram para a disseminação das TICs nos países em
desenvolvimento foram a lei de Moore, a maior disponibilidade de
comunicações sem fio e o surgimento de um ambiente de negócios mais
dependentes da tecnologia da informação. O impacto da lei de Moore foi a
contribuição com redução do custo do processamento dos computadores, bem
como na disseminação de novas tecnologias de armazenagem e
processamento de imagens. Em segundo lugar, a produção de alto volume de
dispositivos de comunicação sem fio, principalmente celulares e Wi-Fi, também
diminuiu os custos e permitiu o acesso à internet de comunidades carentes,
não só localizada em favelas como também em zonas rurais. Finalmente, em
terceiro, ligar a difusão da tecnologia em todo o mundo e o crescente acesso
ao capital criaram um ambiente favorável de empreendedorismo e
experimentação, permitindo o surgimento de iniciativas em centros
comunitários, centros de inclusão digital e outros, através da aplicação das
TICs.
A educação e o aprendizado tem um papel preponderante na
construção de uma sociedade da informação, de acordo com Warschauer
(2003). Para ele não bastaria às iniciativas que visam promover inclusão digital,
a exemplo de centros de inclusão digital, disponibilizarem uma infraestrutura
moderna de comunicação, mas sim a transformação da informação em
conhecimento. As TICs na educação funcionam como excelentes facilitadoras
do acesso ao conhecimento, porém Warschauer alerta para a necessidade do
desenvolvimento de habilidades críticas na busca de informações na Internet.
Daí a importância do recurso humano para a mediação, principalmente nos
programas que visam à inclusão social. O facilitador ou mediador de acesso a
tecnologia e o desenvolvimento de aprendizagem executa uma atividade
fundamental nos espaços de aquisição de competências em tecnologia da
50
informação e comunicação (TICs), que é chamado de centros de inclusão
digital. A aquisição das competências será significativa se apoiar a geração de
valores para as comunidades, principalmente na melhoria da mobilidade social.
A relação das tecnologias de informação e comunicação e a inclusão
social defende a visão de que não existe mais uma ‘divisão digital’ (digital
divide), de acordo com Soffner (2014), ou seja, a divisão entre quem tem e
quem não tem acesso a computadores e à Internet, que geraria exclusão social
do ponto de vista de oportunidades de acesso; o que existe, na verdade, é uma
incompreensão em relação ao fato de que apenas fornecer hardware e
software, e não trabalhar sistemas humanos e sociais (que precisam mudar),
não gera efeitos expressivos na aplicação de tecnologia às comunidades. A
apropriação das tecnologias da informação e comunicação pelos membros das
comunidades e a conexão com as demandas sociais podem provocar a
verdadeira inclusão digital e social.
Os centros de inclusão digital e telecentros somente trarão valores
permanentes para as comunidades, quando os projetos e iniciativas baseadas
nas TICs tragam o engajamento e a mobilização das comunidades na busca de
soluções para os problemas sociais, na geração de renda e na disseminação
do conhecimento, que proporcione a melhoria da mobilidade social. A
tecnologia da informação deve se transformar em tecnologia social, para que
as comunidades percebam o potencial de transformação das TICs e a
possibilidade da ascensão, através da geração de renda proporcionada pelo
conhecimento.
A inclusão social do ponto de vista do enfoque digital envolve
recursos sociais, humanos, físicos e digitais, num contexto econômico, social e
tecnológico - modelo de acesso, e, em especial para os fins deste trabalho, as
estruturas sociais e instucionais educativas (WARSCHAUER, 2004). A inclusão
social é, portanto, a proporção na qual indivíduo, famílias e comunidades estão
aptos a participar plenamente da sociedade, exercer a sua cidadania e
controlar seus respectivos destinos: finanças, emprego, saúde, educação,
habitação, recreação, cultura, cidadania, que podem ser suportados pela
51
inclusão digital. A era da informação em que vivemos pode ser pensada dos
níveis conceitual e metodológico; a aprendizagem num momento epistêmico
em que ela em si mesma é o meio mais dramático daquela mudança. A
tecnologia não é uma revolução, mas o potencial para a aprendizagem
compartilhada e interativa/colaborativa, através de: 1) Uso criativo e
desenvolvimento de novas tecnologias para a aprendizagem e pesquisa; 2)
Entendimento crítico do papel das novas mídias na vida, aprendizagem e na
sociedade/comunidade; 3) Avanços pedagógicos dos objetivos de
aprendizagem participatórios.
As tecnologias sociais educativas podem se constituir em meio
privilegiado de construção da autonomia social entendida como o processo, em
que se relacionam os âmbitos econômico, social e cultural, e por meio das
quais sujeitos históricos se associam e vão produzindo sua identidade como
agentes das práticas que lhes dizem respeito na vida cotidiana, tendo como
característica principal a capacidade de administrar suas vidas com
independência e criatividade. As tecnologias sociais podem intensificar os
processos de autonomia e cidadania, ou seja, através da praxis se desenvolve
o conceito de autonomia social e da educação, como apropriação e construção
de conhecimentos socialmente significativos.
A interface entre as novas tecnologias da informação e da
comunicação e o desenvolvimento de uma comunidade leva ao conceito da
práxis comunitária, ou seja, do suporte da tecnologia (práxis tecnológica e
sociocomunitária) para o desenvolvimento social das comunidades. A práxis é,
portanto, aquela associada à melhoria da vida das pessoas por meio do
emprego de tecnologias de informação e comunicação. Baseia-se nas
definições de capital humano (conhecimentos, habilidades e atitudes), do
capital físico (financeiro) e de capital social, que seriam as relações sociais e a
confiança advindas destas, ou seja, a capacidade de indivíduos gerarem
benefícios a partir de relacionamentos pessoais e da participação em redes e
estruturas sociais, buscando apoio, suporte e oportunidades. (Warschauer,
2004).
52
A divisão digital, ou exclusão digital, conforme Mark Warschauer
(“Technology and Social Inclusion”, 2003) é marcada, não somente pelo acesso
físico aos computadores e conectividade, mas também aos recursos que
permitem que a tecnologia seja utilizada pelas pessoas, como conteúdos de
relevância para as comunidades, educação, alfabetização e recursos sociais e
comunitários. A segunda questão mencionada por Warschauer é que não se
trata de quem tem acesso ou não, ou de ricos e probres e sim do acesso a
diferentes graus de tecnologia da informação.
As soluções digitais mencionadas por Warschauer não devem se
concentrar somente nos computadores e nas telecomunicações, sem envolver
um conjunto importante de recursos complementares e intervenções
complexas para apoiar a inclusão social, que se trata da participação plena das
pessoas, famílias e comunidades em controlar os seus próprios, de acordo com
uma variedade de fatores relacionados aos recursos econômicos, emprego,
saúde, educação, habitação, recreação, cultura e engajamento social (visão
européia e também brasileira).
A exclusão social, de acordo com Borba e Lima (2011) é constituída
por fatores que são estabelecidos pela negação, a certos indivíduos ou grupos,
da possibilidade de igualdade de oportunidades. Por outro lado a inclusão
social possibilita a equidade social. Os fatores predominantes que afetam tanto
a inclusão como exclusão social podem ser representados através das figuras
2.6.1 e 2.6.2:
53
Figura 2.6.1. Exclusão e Inclusão Social nas Sociedades Modernas. Fonte:
Borba & Lima, 2011.
Figura 2.6.2. Exclusão e Inclusão Social nas Sociedades Modernas. Fonte:
Borba & Lima, 2011.
O retrato da inclusão digital no Brasil, o principal motor da praxis
comunitária, pode ser retratado através do mapa de inclusão digital do Brasil
(a visão positiva da divisão digital). O mapa elaborado pela FGV (coordenado
54
por Marcelo Neri, 2012), mostra que o Brasil é um país que transita entre o
primeiro e terceiro mundo em relação adoção da tecnologia da informação e
comunicação. A cidade de São Caetano do Sul (SP) possuía o maior índice do
país de acesso à internet em casa (74%), similar ao do Japão, representando a
presença no primeiro mundo, mas Aroeiras (PI), com acesso quase nulo,
representava a presença no terceiro mundo. Fazendo um zoom no município
do Rio de Janeiro, apelidada de cidade partida, o maior acesso está na Barra
da Tijuca, com 94% de pessoas conectadas em suas casas, índice similar ao
da Suécia e Islândia, líderes mundiais de domicílios conectados. Já Rio das
Pedras, a favela vizinha, possui o menor percentual da cidade (21%), parecido
com o do Panamá, mas bem diferente do zero virtual de Aroeiras.
A inclusão digital será tratada neste trabalho através dos resultados
obtidos pelos projetos apoiados pela Fundação Bradesco, em todo o Brasil, no
período de 2002 a 2012, como pano de fundo a aplicação do framework
proposto de maturidade de implantação dos centros de inclusão digital e de
educação sociocomunitária, através da aplicação dos conceitos de gerações,
caracterizados pelo nível de engajamento e participação das comunidades e
das ondas, através do nível de parcerias e apoio, com instituições de ensino e
empresas apoiadoras de projetos sociais.
55
3. METODOLOGIA
A pesquisa usada neste artigo é de caráter qualitativo e utilizou o
método de estudo de caso na condução de sua investigação. Segundo Yin
(1988), “a preferência pelo uso desse método deve ser dada quando do estudo
de eventos contemporâneos, em situações na quais os comportamentos
relevantes não podem ser manipulados, mas é possível se fazer observações
diretas e entrevistas sistemáticas”. Para o tema em discussão, o método
permite identificar as decisões importantes tomadas pelos agentes envolvidos
dentro de uma realidade complexa, descrever o contexto dessa realidade e
explorar situações que não estão claramente definidas. É apropriado, portanto,
para confrontar uma realidade específica com os conceitos discutidos na
revisão conceitual, bem como para revelar aspectos novos sobre os temas
tratados.
O presente trabalho define uma metodologia para a análise do
impacto provocado por projetos de inclusão digital no desenvolvimento
sociocomunitário de comunidades carentes. A pesquisa foi desenvolvida com
base do estudo do caso da Fundação Bradesco, que criou unidades de
inclusão digital para a população do entorno de algumas de suas escolas, e
com base no período de 2002 a 2012.
A metodologia proposta está centrada num modelo de gerações e
suas ondas de maturidade de inclusão digital, com cinco níveis de referência.
O impacto é analisado na sucessão de gerações (cada geração
correspondendo a um nível de envolvimento da comunidade) e nas ondas de
cada geração de inclusão digital (cada onda correspondendo a um nível de
parcerias e projetos).
A identificação das características de cada onda contribui para o
aprimoramento da qualidade das decisões e para a escolha de focos
operacionais.
O relato das ações e a classificação dos níveis de maturidade de
cada geração foram feitos a partir do envolvimento pessoal do autor, que foi
56
membro da equipe responsável pela implantação dos projetos no lado da
Fundação Bradesco; assim, a visão aqui expressa tem carater pessoal e não
envolvem avaliações de expectativas e resultados segundo perspectivas
institucionais, objetos específicos de outros domínios de conhecimento.
57
4 AS GERAÇÕES DE INCLUSÃO DIGITAL E O
DESENVOLVIMENTO SOCIOCOMUNITÁRIO: UMA VISÃO
ATRAVÉS DOS NÍVEIS DE MATURIDADE DE INCLUSÃO
DIGITAL E DA IMPLANTAÇÃO DOS CENTROS DE INCLUSÃO
DIGITAL DA FUNDAÇÃO BRADESCO.
4.1 Proposta de um framework para análise do nível de maturidade dos
programas de inclusão digital, com impacto na melhoria da inclusão
social.
A proposta do framework para análise do nível de maturidade de
programas de inclusão digital foi desenvolvido com a finalidade de avaliar as
gerações e ondas de inclusão digital e os impactos na transformação social das
comunidades carentes (mobilidade social), desencadeados pelas iniciativas
dos projetos de tecnologia educacional e inclusão digital da rede de escolas da
Fundação Bradesco, em parceria com provedores de tecnologia da informação
e social, nos 26 estados brasileiros e DF, durante o período de 2002 a 2010.
O framework desenvolvido considerou cinco níveis de maturidade de
inclusão digital, ou de praxis para a educação sociocomunitária através da
inclusão digital, baseado em dois referenciais de mercado utilizados para
levantamento da maturidade das soluções de tecnologia da informação:
ITscore do Gartner, uma empresa de pesquisa em tecnologia da informação e
comunicação e o oferecido pelo CMMI, desenvolvido na Universidade Carnigie
Melon na década de 80 e utilizado para avaliar o nível de maturidade do
desenvolvimento de software.
4.1.1 ITScore – Metodologia para levantamento de maturidade de
soluções e serviços de TI
A proposta do framework de maturidade da inclusão digital
considerou a metodologia do ITScore do Gartner, uma empresa de pesquisa
58
em tecnologia da informação e comunicação. O ITScore fornece uma visão
holística de nível de maturidade da tecnologia da informação e comunicação
(TICs), que vai além das visões funcionais para chegar a uma avaliação
diferenciada e abrangente, que constitui verdadeiramente um diagnóstico e
produz ações recomendadas significativas para melhorias baseadas em
referências e padrões do mercado. O ITScore difere de outros modelos de
maturidade, pois examina não só a eficácia da liderança no desenvolvimento
de projetos de TICs, bem como incorpora comportamentos organizacionais das
empresas na avaliação, como cultura, percepções e expectativas. Outra
dimensão analisada é de como os recursos das TICs estão alinhados com a
estratégia da empresa, para busca da eficácia e vantagem competitiva.
Os modelos de maturidade geralmente concentram-se em
determinados atributos, sem um detalhamento exato de como contribuem para
a melhoria dos processos e resultados desejados. O ITScore procura entender
em qual nível de maturidade a empresa se encontra e em qual nível deveria
estar, de acordo com a estratégia estabelecida, segmento de mercado
(concorrentes) e competências adquiridas ou desenvolvidas. Um exemplo de
aplicação do ITScore, para contextualização da metodologia e do Framework é
o levantamento do nível de maturidade de gerenciamento dos processos de
negócios (BPM). O nível de maturidade do BPM é baseado na análise da
maturidade em seis áreas ou disciplinas:
- Organização e Cultura: A estrutura organizacional baseada no
desenvolvimento de uma cultura voltada as mudanças, de acordo com as
necessidades de melhoria dos processos de negócio.
- Competências de Processos: Valores coletivos e atitudes
relacionadas com os processos, bem como conhecimentos e habilidade para a
melhoria dos processos de negócios.
- Metodologias: Utilização de metodologias e frameworks de
referência no mercado e baseado nas melhores práticas, para a melhoria
contínua dos processos.
59
- Tecnologia e Arquitetura: Software, hardware e sistemas de
informação, que permitem que os processos sejam mapeados, melhorados,
otimizados e digitalizados, de acordo com as melhores práticas de mercado.
- Métricas e medidas: Estes são os principais indicadores de
desempenho necessários para determinar o sucesso de um processo e sua
contribuição para as metas e resultados organizacionais.
- Governança: Liderança para a prestação de contas, comunicação
e processos de tomada de decisão, de forma transparante e de acordo com as
normas e procedimento internas e do mercado.
Os níveis de maturidade do ITScore podem ser representados
através de um diagrama, com na figura 4.1. Nesse exemplo, a maturidade da
area de gerenciamento de processos de negócios (BPM) é analisada, de
acordo com as seis disciplinas mencionadas anteriormente. Os níveis de
maturidade compreendem:
- Nível 1: Consciência de Processo – O programa de BPM está
apenas começando. Neste nível de maturidade, as iniciativas compreendem
levantamentos iniciais de alguns processos, compreendendo a modelagem,
monitoramento parcial (KPIs) e a integração com a TI.
- Nível 2: Processo Coordenado – Os processos estão em fase de
melhoria, mas apresentam várias deficiências de maturidade, em relação as
disciplinas estabelecidas. As iniciativas individuais começam a ser
coordenadas, em busca de melhorias sistêmicas e contínuas.
- Nível 3: Gerenciamento de processos multi departamentais - Os
benefícios da implantação do BPM são sentidos em várias áreas da empresa,
um escritório de BPM é implantando para coordenar os projetos, padronizar a
metodologia e garantir que a eficiência (melhoria dos processos) esteja
alinhada com a eficácia (objetivos e metas). Nessa fase ainda não existe uma
sustentabilidade a logo prazo, dos projetos e iniciativas.
- Nível 4: Processos baseados nas metas - O BPM está entregando
valor e é repetível a longo prazo. O alinhamento entre os processos e as metas
60
ocorre perfeitamente e a eficiência e eficácia caminham de forma sincronizada.
Nesse nível a agilidade dos processos é acompanhada pela gestão eficaz das
mudanças na empresa.
- Nível 5: Processos otimizados - Este nível indica que a empresa
alcançou um alto nível de maturidade. Os processos podem alcançar os
resultados desejáveis, equilibrando os múltiplos objetivos, que podem ser
conflitantes, com a excelência obtida nos processos. Nesse nível poucas
empresas atingem a maturidade, devido a necessidade de alinhar uma
experiência de logo prazo, com as mudanças culturais e uma arquitetura de TI,
que proporcione a agilidade necessária para a empresa.
Após o levantamento do nível de maturidade, que no caso do
ITScore é através das respostas obtidas em mais de cem (100) questões,
tratando as seis disciplinas informadas anteriormente é elaborado um gráfico
tipo radar, com o nível de maturidade encontrado e o desejado, considerando a
estratégia estabelecida e a maturidade do mercado, no segmento de atuação
da empresa, conforme o figura 4.1.
61
Figura 4.1: Maturidade do BPM (Business Processs Management) – Fonte:
ITScore Overview for Business Process Management, Sinur e Hill, Gartner,
2010.
No exemplo do nível de maturidade de BPM, Gráfico 4.1, a empresa
possui um gap maior (corrente x desejado) na disciplina de organização e
cultura e o menor em competências de processos. Portanto a empresa deverá
priorizar os projetos e planos de ação para melhoria da gestão de mudanças e
desenvolvimento da liderança, na disciplina de organização e cultura.
62
Gráfico 4.1. Mapa de Maturidade corrente (atual) x desejado. Fonte: ITScore
Overview for Business Process Management, Sinur e Hill, Gartner, 2010.
4.1.2 CMMI – “Capability Maturity Model – Integration” ou Modelo de
Maturidade em Capacitação - Integração
O CMMI é um modelo de referência que contém as boas práticas de
desenvolvimento e manutenção de produtos de software, de acordo com a
maturidade em disciplinas específicas, como Engenharia de Sistemas,
Engenharia de Software, Desenvolvimento Integrado de Processo e Produto,
fornecedores de produtos e serviços (SS). O CMMI foi desenvolvido na década
de 80 pelo SEI (Software Engineering Institute) da Universidade Carnegie
Mellon, com a finalidade de avaliar o risco na contratação de empresas de
software pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos.
Os níveis são usados em soluções CMMI para descrever caminhos
evolutivos recomendados para as organizações, que desejam melhorar seus
processos usados para adquirir, desenvolver e entregar produtos e serviços. O
CMMI pode ser dividido em CMMI para Aquisição, CMMI para
63
Desenvolvimento, CMMI para Serviços e CMMI para pessoas e todos são
utilizados para avaliar o nível de capacidade e maturidade dos produtos e
serviços de TI.
Os níveis de maturidade baseados no CMMI fornecem uma
encenação de processos para melhoria em toda a organização, a partir do nível
1 até o nível de maturidade 5. A possibilidade de melhoria envolve a execução
dos objetivos das áreas de processos, em cada nível de maturidade. Para
chegar a um nível particular, uma organização deve satisfazer todos os
objetivos das áreas de processos ou conjunto de áreas de processo. Ambas as
opções são válidas para a melhoria dos processos e para alcance dos objetivos
estratégicos do negócio. As metas de melhoria de processos devem sempre
estar baseadas nos objetivos estratégicos de negócio (Kaplan, 2008). A
experiência tem demonstrado que as organizações se beneficiam de um nível
apenas quando o foco de melhoria é sobre os objetivos para suportar o nível
superior (metas). Quando o foco está em atingir os objetivos estratégicos de
negócios, os níveis são conseguidos naturalmente.
4.2 A proposta de um modelo de maturidade para avaliação de centros
de inclusão digital
A proposta de um modelo de maturidade para implantação de
centros de inclusão digital considera as duas metodologias, ITScore do Gartner
e CMMI como referência para a especificação dos cinco níveis de maturidade
para suportar a adoção das melhores práticas de inclusão digital. Os cinco
níveis forma determinados de acordo com uma evolução sequencial, variando
do nível 1 (Reativo) para o nível 5 (Colaborativo e Inovador). Os níveis são
compostos por atividades de desempenho crescente, considerando as cinco
dimensões, que além de relevantes estão interrelacionadas: pessoas, projetos,
colaboração, tecnologia e mobilidade social. A proposta da classificação em
níveis é identificar o nível de maturidade que as instituições encontram-se em
uma onda (fase) de inclusão digital e indicar os caminhos em busca da próxima
fase. A educação sociocomunitária é o principal condutor para análise dos
64
níves de maturidade e, portanto, posso afirmar que o nível de maturidade dos
centros de inclusão digital reflete o nível de maturidade das ações de educação
sociocomunitária nas comunidades.
O modelo de maturidade para centros de inclusão digital foi baseado
em funções, de acordo com a concepção do Gartner de maturidade. Os cinco
níveis, de 1 e 5 são considerados como mais influenciados pela cultura
organizacional da instituição, ou seja valores, princípios, capacidade de
engajamento e intervenção nas comunidades para solução de problemas
sociais e também pela maturidade das instituições, em proporcionar mudanças
significativas nas comunidades, como a melhoria da mobilidade e consciência
social. As capacidades coletivas, como as iniciativas colaborativas afetam mais
os níveis de 2 a 3, de acordo com o modelo proposto.
O modelo de maturidade para centros de inclusão digital considera
cinco níves de maturidade, com funções e parâmetros que permitem identificar
o nível que os projetos de inclusão digital se encontram, bem como mostrar os
caminhos para o próximo nível. O framework é baseado nos seguintes níveis:
- Nível 1: Reativo
Nenhuma organização de forma conscientemente deseja estar no
nível 1 de maturidade. De um modo geral, algum evento externo, como o
rápido crescimento de uma demanda social (problemas de segurança, saúde,
desemprego), alterações das condições de sustentabilidade (financeira) e de
mercado (surgimento de novas instituições ou de novas tecnologias) fazem
com que a organização saia do estado chamado de hibernação ou aceitação.
Nessa fase a organização é reativa, ou seja, demandada externamente sem
nenhuma articulação coletiva, as inciativas são individuais e os agentes sociais
da sociedade (escolas, igrejas, centros de educação não formal) não agem de
forma articulada ou integradas às demandas sociais. Os espaços comunitários
são ocupados pelos membros das comunidades sem a pretenção de discutir,
articular e propor iniciativas para minimizar os problemas sociais. O movimento
é “ad-hoc” e sem um fio condutor que leve a articulações coletivas. O nível 1
65
caracteriza-se na maioria das vezes pela presença no espaço comunitário, sem
pretensões e foco nas questões sociocomunitárias.
- Nível 2: Iniciativas Emergentes
O nível 2 é definido como "Iniciativas Emergentes", porque este é o
ponto em que a organização decide que não é mais possível manter as ações
na forma reativa, pontuais e sem uma articulação coletiva, que permita gerar
intervenções e impactos significativos a médio prazo nas comunidades, para
melhoria da mobilidade social (geração de renda, segurança, saúde,
educação).
Uma liderança social começa a emergir e as primeiras iniciativas de
discussão das demandas sociais são articuladas através de projetos pontuais e
de alcance restrito. Nessa fase os espaços caminham além da oferta de cursos
de educação não formal, como de informática, nos centros de inclusão digital,
ou cursos profissionalizantes em igrejas e orgão públicos ou projetos
extracurriculares das escolas. A temática social começa a tornar-se uma
demanda comum dos agentes sociais das comunidades e algumas iniciativas e
projetos são direcionados como propostas para a solução de problemas, que
são comuns e de interesse das comunidades.
As organizações nessa fase agem isoladamente nas suas entregas
e algumas vezes consideram uma “reserva de mercado” em relação ao
atendimento de demandas específicas, afastando ou dificultando a realização
de parcerias para a realização de projetos integrados.
- Nível 3: Integração Inicial
A mudança mais significativa proporcionada pelo atingimento ao
nível 3 é a integração entre os vários agentes sociais na articulação e no
desenvolvimento de iniciativas, para a melhoria da mobilidade social nas
comunidades. O processo de colaboração é iniciado através do mapeamento
das demandas sociais, a identificação das prioridades, o nível de contribuição
de cada agente social no desenvolvimento de iniciativas e projetos, que
66
possam contribuir na mitigação dos problemas sociais comuns a todos,
daquela sociedade ou comunidade.
As iniciativas e projetos estão alinhados, buscando atender
demandas sociais comuns, mas carece de uma plataforma de comunicação,
colaboração e gerenciamento de projetos, que permita que as organizações
sociais sejam eficientes nas suas entregas e eficazes para a transformação
social desejada pelos membros da comunidade.
- Nível 4: Colaboração Efetiva
O nível 4 poporciona o desenvolvimento de uma plataforma social,
baseada no conceito da arquitetura “Lego”, onde os agentes sociais locais
conectam-se a um hub central, como um centro comunitário, contribuindo cada
um com entregas basedas nas suas respectivas competências. As escolas,
centros comunitários, igrejas, ONGs, orgãos públicos e empresas, com seus
projetos de responsabilidade sócioambiental estão conectados no
desenvolvimento de iniciativas e projetos, que de forma significativa trarão a
transformação social desejada pelas comunidades.
Nessa fase um agente fundamental conecta-se ao hub social
formando o centro de desenvolvimento de competências, para o
desenvolvimento da mobilidade social: Universidades, Centros Universitários e
Centro de Pesquisas, que serão os agentes geradores dos conhecimentos e
tecnologias necessárias para suportar a transformação social. A participação
desses agentes ocorre em um período de tempo necessário para o
desenvolvimento dos conhecimentos e habilidades dos membros da
comunidade, para que a intervenção ocorra de dentro para fora e tenha
recorrência e sustentabilidade. As escolas de educação básica pertencentes às
comunidades têm um papel fundamental na propagação e disseminação
contínua do conhecimento e de forma significativa para as demandas sociais. A
educação sociocomunitária articulada pelos vários agentes do hub social passa
a ser um catalizador das ações comunitárias.
67
- Nível 5: Inovação Efetiva
O atingimento do nível 5 proporciona àxs organizações sociais o
compartilhamento das demandas sociais e projetos locais com agentes
geradores de conhecimento coletivo, dispersos em qualque lugar do planeta.
Nessa fase há a predominância do chamado “Crowdsourcing Social”, que tem
a inteligência coletiva como o principal combustível para a disseminação das
melhores práticas sociais, que estão distribuídas em todos os cantos do
planeta.
Nessa fase, a tecnologia da informação e comunicação tem um
papel fundamental no desenvolvimento da plataforma de Crowdsourcing e os
agentes sociais da comunidade passam a ocupar novas posições e papéis, na
chamada rede de inclusão sociocomunitária, de acordo com os seguintes
papeis:
- Organizador da rede: Nó central da rede, que pode ser ocupado
por uma organização social, com ascendência em relação às demais
instituições, devido a capacidade de articulação, engajamento e o nível de
representatividade (credibilidade e confiabilidade) dos seus líderes sociais.
- Conectador da Rede: Organizações sociais que conhecem as
demandas sociais das comunidades. A contribuição principal é na identificação,
apresentação da demanda social e a conexão com possíveis solucionadores.
- Selecionador de propostas: Membros das comunidades que
conhecem as demandas sociais e especialistas do tema tratado, representando
escolas e universidades pertencentes à plataforma de “Crowdsourcing Social”.
- Contribuidores: O público em geral, interno ou externo à
comunidade, caracterizados por voluntários ou especialistas das temáticas
tratadas no desafio social.
Os níveis de maturidade consideram as seguintes dimensões para
análise das organizações sociais: pessoas, projetos, tipo de colaboração,
tecnologia e mobilidade social. A dimensão pessoas considera o nível de
engajamento dos membros das comunidades na discussão e busca de
68
soluções, para as demandas sociais das comunidades, os quais elas estão
inseridas. A questão do surgimento ou formação de líderes sociais também é
um fato relevante para o sucesso da transformação social desejada nas
comunidades.
A dimensão de projetos é caracterizada pela qualidade do
gerenciamento dos projetos e pelo nível de impacto que esses projetos
provocam na melhoria da mobilidade social. Aqui são tratadas as questões da
eficiência, quanto ao gerenciamento do projeto e a eficácia em relação ao nível
de contribuição para a comunidade.
A dimensão refere-se ao nível de colaboração entre as organizações
sociais para o desenvolvimento de projetos ou iniciativas de interesse da
comunidade. A colaboração é caracterizada não somente pela integração das
iniciativas existentes e executadas pelas organizações, mas principalmente
pelo desenvolvimento colaborativo, onde as competências essenciais de cada
comunidade são alocadas no projeto e o resultado obtido reflete a ação
coletiva, e não de organizações específicas. A colaboração ocorre quando as
organizações aceitam fazer parte de um projeto coletivo, onde a visibilidade
será dada pelo resultado da transformação social e não pela contribuição
isolada de uma organização.
A dimensão da tecnologia compreende o nível de adoção de
plataformas tecnológicas pelas organizações sociais, compreendendo o tipo e
nível de atualização de plataforma adotada, proprietária ou aberta (esta mais
desejada), bem como o impacto para o projeto sociocomunitário. A adoção
compreende desde a implantação da arquitetura, como a plena utilização pelos
membros das comunidades e entidades parceiras (empresas, escolas,
universidades, orgão públicos e outros). Uma iniciativa importante nessa
dimensão é de cursos on-line e plataformas colaborativas para design social
(troca de ideias e de propostas, articulação de iniciativas e projetos, conexões
com provedores de informação e conhecimento, desenvolvimento do
voluntariado e outros).
69
Finalmente a dimensão de melhoria da mobilidade social indica o
quanto os membros de uma comunidade evoluíram em termos de resultados
positivos, em relação a melhoria da qualidade de vida, baseada em indicadores
socioeconômicos, como geração de renda, empregabilidade, nível educacional,
segurança, saneamento básico e atração de investimentos públicos. A
educação sociocomunitária tem um papel importante na melhoria da
mobilidade social, pois proporciona o desenvolvimento e aplicação de
conhecimentos e engajamento comunitário, na busca de soluções para as
demandas sociais locais.
O diagrama de maturidade de centros de inclusão digital proposto na
figura 4.2.1 representa o nível de estágio dos projetos de inclusão digital e os
requisitos para alcançar os níveis superiores. Os níveis são caracterizados por
fatores que são impactados pelas dimensões representadas pelas pessoas,
projetos, colaboração, tecnologia e mobilidade social.
70
Figura 4.2.1. Modelo de Maturidade de inclusão digital, Fonte: Adaptado pelo
autor do Modelo IT Score do Gartner.
Os fatores que influenciam e suportam a identificação dos níveis de
maturidade de inclusão digital, ou seja, os fatores sociais, econômicos,
culturais e tecnológicos são detalhados conforme Quadro 4.2.1.
Níveis Fatores determinantes
dos níveis de maturidade
Descrição dos níveis
Lideranças sociais não
estão formalizadas
As organizações sociais realizam
atividades de inclusão digital e educação
sociocomunitária sem a presença de
uma liderança forte, que tenha
ascendência e influência nas
71
comunidades.
1 Iniciativas isoladas de
educação
sociocomunitária
As iniciativas de educação
sociocomunitária como cuidados básicos
de higiene, saúde, segurança, cursos de
informática, educação sexual, incentivo a
leitura e outros, são realizadas pelas
organizações, sem uma integração ou
articulação com outras organizações.
Projetos sem conexão
com as demandas sociais
As iniciativas e projetos que são
realizados nas comunidades não estão
conectados às demandas sociais e,
portanto, não tem como prioridade a
busca pela melhoria da mobilidade
social.
Emergência da liderança
nas organizações sociais
Uma liderança com credibilidade e
capacidade de articulação começa a se
destacar nas comunidades e as
organizações sociais passam a ser vistas
não somente como um ponto de
encontro e para realizações de cursos de
educação sociocomunitária, mas
também com um ponto de discussão e
propostas para as demandas sociais
locais.
2 Oferta de cursos de
educação não formal para
empregabilidade
Cursos de informática básica, com
aplicativos MS Office, cursos de redes de
computadores, elaboração de currículos,
comunicação escrita e verbal, técnicas
de entrevista e outros.
72
Projetos isolados para
atender as demandas
sociais
Algumas organizações sociais
desenvolvem projetos isolados para
propor melhorias em relação às
necessidades básicas (Pirâmide de
Maslow). O impacto é reduzido devido à
falta de articulação coletiva em benefício
da comunidade.
Reserva de espaço para
atuação das organizações
sociais
As organizações socias procuram
estabelecer limites de atuação, para
apropiar-se daquela causa ou demanda
social. Algumas vezes as organizações
sociais comportam-se como
concorrentes na mesma comunidade.
Colegiado de lideranças
sociais promovendo o
engajamento da
comunidade
A formação de um grupo de líderes
sociais, conectados pela necessidade de
discussão dos problemas sociais locais,
para alinhamento dos projetos em
desenvolvimento e em busca de
proposta e soluções de comum
interesse.
3 Mapeamento e priorização
das demandas sociais
As demandas sociais são mapeadas
pela liderança social das comunidades,
as prioridades são definidas em função
das capacidades disponíveis nas
organizações (pessoas, orçamento
financeiro, parcerias, articulação política
e conhecimento da área e outros).
Ausência de plataformas
colaborativas e de
comunicação
As iniciativas e projetos são executados
e monitorados manualmente, sem
ferramentas de comunicação e de
colaboração. As organizações são
73
impactadas pela ineficiência das
entregas e a articulação coletiva não
ocorre no grau desejado, para o
atendimento das demandas sociais.
Articulação coletiva de
projetos para atendimento
das demandas sociais
A mobilização das comunidades pelas
lideranças sociais para possibilitar a
discussão e elaboração de propostas,
que ampliem o desenvolvimento do
voluntariado, o sentido de pertencimento
e a autoestima quanto a capacidade de
contribuição para a melhoria e
transformação social.
Plataformas sociais
modulares, como “Legos
Sociais”
Os projetos estão integrados e alinhados
com entregas complementares, de forma
a construir um movimento único. Os
elementos centrais conectadores são as
demandas sociais, que foram mapeadas
e priorizadas, para que as organizações
sociais possam contribuir, de acordo com
as suas competências essenciais.
4 Emergência dos centros
de competências para a
mobilidade social
Os centros de competências permitem
que as organizações sociais adquiram os
conhecimentos, habilidades e
comportamentos necessários ao
atendimento das demandas sociais. As
universidades e centros de pesquisa
tornam-se polos irradiadores de
competências e a aquisição e
disseminação de responsabilidade das
organizações sociais daquelas
comunidades.
74
Educação
sociocomunitária, como
canal das ações
comunitárias.
A educação sociocomunitária passa a ter
um papel agregador dos projetos com as
demandas sociais, permitindo que as
organizações sociais tornem-se as
principais conexões entre os nós
geradores de conhecimento da rede
social, formado pelas universidades,
centros de pesquisa e escolas de
educação básica.
Escolas de educação
básica, como
propagadores contínuos
do conhecimento.
As escolas básicas no entorno das
comunidades tem um papel fundamental
no desenvolvimento e aplicação contínuo
do conhecimento necessário, para
atendimento das demandas sociais. O
papel passa a ser o principal agente das
universidades e centros de pesquisa na
curadoria do conhecimento disseminado
na comunidade, bem como o agente
mobilizador para a aplicação desse
conhecimento nas comunidades.
Emergência da inteligência
coletiva através do
“Crowdsourcing Social”
A inteligência coletiva permitirá que as
demandas sociais das comunidades
sejam compartilhadas com agentes de
transformação social espalhados em
qualquer país e lugar, conectados pela
internet. As demandas sociais passarão
a se transformar em desafios sociais,
onde as melhores propostas para
solução dos problemas serão
recompensadas na forma de
reconhecimento ou remuneração
(suportada por empresas ou agentes
75
públicos).
5 Plataformas de TICs
emergentes para suporte
ao “Crowdsourcing” e PPM
As plaformas de tecnologia da
informação e comunicação permitirão a
otimização dos processos de gestão dos
projetos (prazo e custo) e o
desenvolvimento de plataformas de
Crowdsourcing para suportar os desafios
socias e compartilhamento das melhores
práticas para a melhoria da mobilidade
social.
Gestão dos indicadores de
impactos na mobilidade
social
A mobilização social será acompanhada
pelas organizações sociais, através de
indicadores de desempenho, gerados
pelas ferramentas das TICs e de acordo
com as metas estabelecidas para
transformação social desejada (visão
estabelecida).
Quadro 4.2.1. Fatores que influenciam nos níveis de maturidade. Fonte:
Adapatado pelo autor do Modelo do Gartner IT Score.
4.3 As gerações e ondas de inclusão digital: Uma análise da
maturidade, através das iniciativas de inclusão digital da Fundação
Bradesco
As gerações de inclusão digital serão analisadas através do
framework de maturidade proposto para as iniciativas de inclusão digital, tendo
como pano de fundo e contexto a implantação dos centros de Inclusão Digital
(CIDs) pela Fundação Bradesco, para validação do framework, bem como o
nível de engajamento dos membros das comunidades, na realização dos
76
projetos, em busca da melhoria da mobilidade social e inclusão social. As
ondas serão retratadas através do nível de parcerias dos CIDs com instituições
ensino e empresas, com a finalidade de retratar o desenvolvimento de
competências dos membros das comunidades e o nível de apoio dessas
instituições, na aplicação da tecnologia social e desenvolvimento das
condições para sustentabilidade das iniciativas para apoio à inclusão social.
A primeira geração de inclusão digital pode ser caracterizada pela
implantação dos centros de inclusão digital da Fundação Bradesco, com a
finalidade de propiciar o acesso às tecnologias da informação e comunicação
pelas comunidades carentes, distribuídas nos 26 estados e DF, onde a
Fundação Bradesco mantém escolas de educação básica e profissional. A
concepção dos centros de inclusão digital começou com a reflexão sobre a
importância da Fundação Bradesco em estender a sua ação educacional além
dos muros da escola, devido a sua limitação de atendimento de alunos e a
necessidade de promover a melhoria da mobilidade social no entorno das
escolas.
A segunda geração pode ser representada pelo início do
desenvolvimento de projetos com universidades e centros de pesquisas, como
as parcerias com o MIT (Cidade que a Gente Quer e D-Lab) e USP (Poli
Cidadã) e outras universidades públicas, localizadas nas regiões onde as
escolas da Fundação estavam localizadas. Os projetos tinham a finalidade de
desenvolver a capacidade de articular as comunidades através da educação
sociocomunitária em busca de soluções para os problemas locais, mais
impactantes e demandantes de soluções urgentes.
A Terceira geração é representada por uma rede de inclusão social,
com a possibilidade de criação de um “Crowdsourcing Social”, para permitir
que as organizações tenham uma maior autonomia para a sustentabilidade das
suas ações, em busca da transformação social, principalmente da melhoria da
mobilidade social.
As gerações de inclusão digital na Fundação Bradesco tiveram início
no final da década de 90, com as primeiras iniciativas de apoio as escolas
77
públicas de educação básica, localizadas no entorno das escolas da Fundação,
através do treinamento de professores e a formação de alunos monitores dos
laboratórios de informática. Nessa época fui um protagonista desse movimento,
pois tive a oportunidade de coordenar na Fundação Bradesco discussões sobre
a necessidade de implantação de centros de inclusão digital, que
possibilitassem o acesso da tecnologia da informação pelas comunidades
carentes no seu entorno, nos padrões de qualidade das escolas da Fundação
Bradesco.
As escolas da Fundação Bradesco representam importante
referência educacional e sociocultural nas comunidades onde estão inseridas.
A educação de qualidade oferecida para crianças e adolescentes, em regiões
normalmente carentes desse tipo de serviço, elas acabam por gerar demandas
comunitárias e despertando o interesse de participação também dos pais,
mães e demais pessoas que habitam o entorno das escolas. As demandas
pelas escolas da Fundação Bradesco ultrapassavam 300 mil pessoas em 2004,
cadastradas e esperando por uma oportunidade para estudar e participar das
suas atividades educacionais. Na época significava o dobro da capacidade de
atendimento da rede de escolas localizadas nos 26 estados e DF, que em 2014
atenderam 105.177 alunos, nas 40 escolas e com investimento de mais de R$
500 milhões.
Um grupo de representantes e formadores de opinião foi criado pela
Fundação Bradesco, com a finalidade de identificar oportunidades para a
disseminação das suas melhores práticas pedagógicas e de tecnologia
educacional nas comunidades e escolas públicas do seu entorno. Esse grupo
era formado pelo Gilberto Dimenstein, jornalista da Folha de SP e engajado em
projetos de educação, representantes de empresas provedoras de tecnologia
da informação, como Microsoft, Intel, Cisco e membros das escolas públicas
de cidades como Osasco e Marília, ambas localizadas no Estado de SP.
Depois de muitas reuniões, ouvindo as demandas das comunidades,
escolas públicas que poderiam ser atendidas, analisando os recursos
financeiros disponíveis, as melhores práticas da Fundação Bradesco, que
78
poderiam ser compartilhadas e os projetos que as empresas poderiam apoiar
foi criado em 2004 o projeto de implantação dos centros de inclusão digital,
chamados de CIDs. Portanto, nessa época surgia o primeiro movimento de
inclusão digital apoiado pela Fundação Bradesco, o qual sintetiza o quadro 4.3:
Geração Ondas Período Principais
atores
Estratégia de
ação
Primeira –
Inclusão
Digital
Primeira:
Implantação
pela Fundação
Bradesco e
oferta de cursos
pela escola
virtual.
2004 -
atual
Fundação
Bradesco,
escolas
públicas,
centros
comunitários.
Implantação de
centros para
acesso à
tecnologia da
informação e
comunicação.
Segunda:
Parceria com
empresas
provedoras de
tecnologia.
2004 -
2009
Microsoft,
Cisco, Intel,
centros
comunitários.
Parceria para
implantação de
CIDs com
empresas, como
Microsoft, Cisco,
Intel.
Terceira:
Implantação do
Computer
Clubhouse.
2004 -
atual
Fundação
Bradesco,
Media Lab
MIT, Intel,
Microsoft e
centros
comunitários.
Parceria com a
Intel para
implantação do
Computer
Clubhouse no
Jd. Conceição,
Osasco, SP.
Segunda –
Rede de
inclusão
Primeira:
Parceria para a
2004 –
atual
ATN-
Associação de
Telecentros de
Desenvolvimento
da
sustentabilidade
79
social (RIS) sustentabilidade Negócios dos centros
comunitários
Segunda:
Parceria com as
comunidades
indígenas.
2004-
2010
Comunidades
Indígenas
Microsoft, BT,
Intel
Desenvolvimento
da
sustentabilidade
nas
comunidades
indígenas.
Terceira –
Rede de
Tecnologia
Social
Primeira:
Projeto “A
cidade que a
gente quer.”
2007-
2010
MIT Media
Lab
Desenvolvimento
e implantação da
tecnologia social,
para a melhoria
da inclusão
social.
Segunda:
Parceria com o
MIT D-Lab e
USP/Poli
Cidadã
2007-
2010
MIT D-Lab,
EPUSP
Desenvolvimento
e implantação da
tecnologia social,
para a melhoria
da inclusão
social.
Quadro 4.3: As gerações e as ondas de inclusão digital. Fonte: Autor
(2014)
4.3.1 A Primeira Geração de Inclusão Digital:
A primeira geração de Centros de Inclusão Digital (CIDs) iniciada em
2004 e que permanence até a data de elaboração deste trabalho (2014) é
caracterizada pela implantação de centros de inclusão digital em espaços
80
comunitários, no entorno das escolas da Fundação Bradesco, ou em áreas de
influência de suas escolas. Os espaços para implantação dos CIDs
compreendiam desde centros comunitários e sociais, igrejas, orgãos públicos e
escolas públicas.
Os objetivos primários da primeira geração de centros de inclusão
digital eram de proporcionar a melhoria da empregabilidade e da equidade
social das comunidades, através da oferta dos cursos de informática para
membros da comunidade, que não tinham a oportunidade de estudar na
Fundação Bradesco, devido ao limite de atendimento anual (espaço físico), em
torno de 2.000 alunos em cada escola.
Figura 4.3. Locais de implantação dos CIDs na primeira onda. Fonte:
Departamento de Tecnologia da Informação, Fundação Bradesco, 2006.
Os objetivos secundários consideravam principalmente a visão da
Fundação Bradesco em expandir o atendimento além das suas escolas e
integrar as iniciativas e projetos curriculares dos alunos com as demandas
sociais das comunidades no seu entorno. Os projetos curriculares em sala de
81
aula eram transformados em atividades extracurriculares, que tivessem
significado e aplicação nas comunidades. As iniciativas compreendiam:
Expandir o atendimento às comunidades onde estão inseridas as
escolas da Fundação Bradesco;
Aproximar as escolas da Fundação Bradesco e a comunidade
local, promovendo a participação e a responsabilidade social;
Proporcionar às comunidades carentes o acesso às tecnologias
digitais, como o computador e a Internet;
Dar autonomia para a comunidade assumir a formação de
cidadãos com o uso da tecnologia, aproveitando seu próprio
espaço;
Oferecer um espaço para discussão das questões sociais,
contextualizadas às necessidades cotidianas da comunidade,
possibilitando o exercício da cidadania;
Criar uma rede de comunicação, informação e ativismo social
entre as escolas da Fundação Bradesco, comunidades do
entorno, escolas públicas e entidades privadas e sem fins
lucrativos, interessadas em utilizar a tecnologia como meio para a
transformação social.
4.3.1.1 A primeira onda de centros de inclusão digital
A primeira onda de centros de inclusão digital é caracterizada pela
implantação de espaços de inclusão digital, chamados de centros de inclusão
digital (CIDs) pela Fundação Bradesco e também, por oferta de cursos a
distância via internet pela escola virtual. Os CIDs são laboratórios de tecnologia
da informação, na época de implantação equipados com 10 micromputadores,
scanner, impressora, softwares como MS Office, Adobre Photoshop, Premiere
e outros, impressoras e acesso à Internet através de links de radio, satélite, Wi-
Max e Wi-Fi (conectados as escolas da Fundação Bradesco). Incialmente os
CIDs promoviam o uso contextualizado da tecnologia da informação e
comunicação servindo como base para a oferta dos diferentes cursos, a
82
pessoas de diferentes idades e formações e ainda como suporte à integração
profissional em diversas áreas. À medida que os indivíduos se apropriavam dos
conteúdos tecnológicos e a comunidade começa a descobrir os seus
potenciais, eles se transformam em espaços para articulação, mobilização e
debate das necessidades e interesses locais.
A arquitetura de conectividade contemplava a interligação a internet
com escolas públicas, CIDs e empresas parceiras do projeto, com o objetivo de
permitir o compartilhamento de projetos e inciativas, através de um portal de
colaboração (www.cid.org.br), desenvolvido na época como plataforma para
integração de projetos de educação formal, não formal e educação social
conforme figura 4.3.1.
Figura 4.3.1. Arquitetura de interconectividade do projeto dos CIDS. Fonte:
Departamento de Tecnologia Educacional, Fundação Bradesco, 2004.
A seleção dos locais para implantação dos CIDs de primeira geração
compreendia os seguintes critérios:
- Localização no entorno (localização e influência) das escolas da
Fundação Bradesco (raio de até 50 Km).
- Instituições juridicamente constituídas, públicas ou sem fins
lucrativos, como ONGs, Institutos, OCIPs e Fundações.
- Liderança social estabelecida, com capacidade de desenvolver o
voluntariado e articular iniciativas para o pleno uso do espaço,
bem como para a conservação do mesmo.
83
Os espaços selecionados eram reformados e configurados (lay-out,
elétrica, iluminação e móveis), para permitir a plena utilização dos recursos das
TICs, com investimento da própria comunidade ou suportados pela Fundação
Bardesco. O investimento médio realizado para implantação dos CIDs era de
R$ 30.000,00 (2004-2010), que compreendia a compra ou reforma de
computadores e periféricos e a preparação das instalações físicas. A figura
4.3.2 mostra alguns exemplos de CIDs implantados em Cacoal/RO e
Caucaia/CE.
Figura 4.3.2. Centros de Inclusão Digital nas cidades de Cacoal/RO e
Caucaia/CE. Fonte: Departamento de Tecnologia da Informação da Fundação
Bradesco.
Os primeiros passos para a navegação na Internet eram ensinados por
professores voluntários e alunos da Fundação Bradesco, além de voluntários
da própria comunidade treinados naqueles cursos. Nos CIDs, a Fundação
Bradesco colocava à disposição vários cursos para desenvolvimento das
habilidades básicas para melhoria da empregabilidade, na modalidade de
educação à distância ou e-learning (Escola Virtual). Os membros das
comunidades podiam acessar um catálogo de mais de 200 cursos (em 2005) e
84
obter uma nova especialização ou requalificação para o trabalho, com
certificado de aproveitamento emitido pela Fundação Bradesco. O principal
objetivo da Escola Virtual era de estender o atendimento da Fundação a
comunidades com carência socioeconômica em todo o Brasil, por meio da
educação à distância e projetos de educação não formal.
O portal de e-Learning Escola Virtual (www.ev.org.br) é uma
arquitetura de e-learning criada em 2001 pela Fundação Bradesco, para
oferecer cursos à distância e semipresenciais via Internet, sem custo e com um
catálogo (até Outubro de 2014), de 235 cursos e atendimento acumulado de
mais de 3 milhões de pessoas (até 2013). Os cursos compreendem desde o
desenvolvimento de habilidades para acesso ao mercado de trabalho, como a
qualificação e especialização profissional nas áreas de negócios, informática,
redes de computadores e educação, conforme o quadro 4.3.2:
Comunicação
Escrita
Fundamentos de
Rede de
Computadores
Contabilidade
Empresarial e
Análise de
Balanço
Postura e Imagem
Profissional
Matemática
Financeira
Introdução à
Informática
Ms Office Básico
e Avançado
Gerenciamento
de Projetos
Análise de
Balanços
Desenvolvimento
de Sistemas
Orientado a
Objetos
Contabilidade
Empresarial
Fotografia Digital
Certificação de
Redes de
Computadores
Formação de
Professores em
Tecnologia
Governança da
TI
Intel Aprender
85
Cisco CCNA e
CCNP
Educacional
Quadro 4.3.2. Relação de cursos oferecidos nos CIDs, através da Escola
Virtual. Fonte: Departamento de Tecnologia Educacional da Fundação
Bradesco (2001).
A integração da Escola Virtual à rede dos CIDs foi o principal movimento
de sustentação da primeira onda de centros de inclusão digital, permitindo à
Fundação Bradesco estender o seu atendimento além das suas escolas e com
iniciativas de educação não formal e projetos sociocomunitários. Várias
empresas provedoras de tecnologia e que também desenvolviam projetos de
educação não formal participaram do movimento, como a Aban e NIIT,
empresas indianas que na época (2005) eram líderes respectivamente, na
oferta de conteúdos de ciências, matemática e cursos de informática. A
Microsoft, Cisco Systems e Intel, além de oferecer cursos para certificação de
TI e para formação de voluntários para ensino de informática (Intel)
participaram mais efetivamente do movimento dos CIDs, pois integraram os
seus projetos de educação não formal com os CIDs, para complementar a
oferta de tecnologia da informação que levassem a geração de tecnologias
sociais. Nesse momento surgia a segunda onda de inclução digital, da primeira
geração, que será detalhada mais adiante e que foi caracterizada pelo apoio
das empresas provedoras de tecnologia da informação para inclusão digital de
comunidades com carência socioeconômica.
A integração da escola virtual nos projetos dos CIDs permitiu que os
membros das comunidades, na sua grande maioria jovens e adultos
desempregados, que não tinham acesso às TICs pudessem realizar cursos e
desenvolver as suas habilidades para a melhoria da empregabilidade.
86
Figura 4.3.3. Portal Escola Virtual. Acesso de www.ev.org.br em 10/10/2014.
Os Centros de Inclusão Digital (CIDs) destacam-se inicialmente
como espaços de aprendizagem não formal, com ofertas de cursos de
informática, como MS Windows, MS Office e cursos de introdução de redes
para a melhoria da empregabilidade dos membros da comunidade,
notadamente jovens na faixa de 15 a 23 anos. Essa primeira onda de inclusão
digital permanence até a data de elaboração deste trabalho (Outubro de 2014),
mas atingiu o ápice, com os melhores resultados (pontos de presença x
atendimento) no período de 2004 a 2010, com implantação de 183 Centros de
Inclusão Social (CIDs) por todo o País, no entorno (presença e influência) das
40 escolas da Fundação Bradesco. Os CIDs que eram implantados e
suportados inicialmente pelas escolas da Fundação Bradesco e empresas
apoiadoras (empresas com projetos sociais) operavam com a proposta de
desenvolver o conceito da autosustentabilidade, ou seja, desenvolver parcerias
com empresas locais, orgãos públicos, universidades e ONGs em busca de
87
geração de receita através de prestação de serviços e vendas de produtos
locais (artesanato).
O primeiro CID inaugurado pela Fundação Bradesco, foi na cidade
de Cacoal/RO em 17/02/2014, próximo a escola da Fundação Bradesco de
Cacoal, em parceria com a SEMAST – Secretaria Municipal de Ação Social e
Trabalho.
Figura 4.3.4 CID de Cacoal/RO. Fonte: Departamento de Tecnologia da
Informação, Fundação Bradesco, 2004.
Em Araçatuba/SP, 2005, em parceria com a Secretaria de
Desenvolvimento Econômico do município, instalou-se um CID para atender
micro e pequenos empreendedores. Além do aprendizado de informática, os
participantes recebem assessoria na abertura de empresas, consultoria nas
áreas administrativa, financeira, marketing e comércio exterior.
Uma parceria relevante na primeira geração de CIDs foi com a
Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares (Unipalmares) em 2006, para
a implantação de duas unidades e a oferta de cursos de informática para os
alunos e membros da comunidade de afro descendentes carentes da cidade de
São Paulo.
88
Figura 4.3.5 CID da Universidade dos Palmares. Fonte: Revista “Afirmativa”,
Unipalmares, 2006.
A parceria entre a Fundação Bradesco e a Unipalmares, para
implantação de um CID foi de extrema importância na época, pois possibilitou o
atendimento de comunidades quilombolas através da Unipalmares, conforme
resumiu o Prof. José Vicente, Reitor da Unipalmares, no dia da inauguração
(23/11/2006): “Trata-se de um grande passo, dentro da meta de inclusão
através da educação, pois será mais uma ferramenta para atendimento de toda
população carente de afro-descententes, uma referência para promoção da
igualdade de oportunidades”. A Figura 4.3.5 mostra o laboratório no dia da
inauguração.
4.3.1.2 A segunda onda dos centros de inclusão digital
A segunda onda de implantação dos centros de inclusão digital,
ainda da primeira geração compreendeu o desenvolvimento de parcerias com
empresas provedoras e centros de pesquisa de tecnologia, para a implantação
e oferta de cursos nos CIDs, com o objetivo de oferecer cursos técnicos de
informática, que preparassem para a certificação profissional. A melhoria da
89
empregabilidade e o desenvolvimento das competências em busca de soluções
para os problemas sociais locais eram as prioridades dessa onda. As empresas
que participaram dessa iniciativa na época (2004-2009) foram a Microsoft, Intel,
Cisco, BT (British Telecom), Aban, NIIT, além de centros de pesquisa com o
MIT Medial Lab.
Um fato relevante, que possibilitou o desenvolvimento da segunda
onda de inclusão digital foi a implantação do Bradesco Instituto de Tecnologia
(BIT) em 2004, na cidade de Campinas/SP. O centro de pesquisa aplicada de
tecnologia da informação, comunicação e tecnologia social foi concebido
adaptando os princípios para inovação do MIT Media Lab, um parceiro da
Fundação Bradesco desde 1999 no desenvolvimento de tecnologia social. Os
princípios correlacionados entre os centros são mostrados no quadro 4.3.3.
MIT Media BIT
A prática sobre a teoria
Projetos e iniciativas de transformação
social (construcionismo na educação
formal e informal)
O risco sobre segurança
Busca da mudança constante ao
status-quo social
A resiliência sobre a força
Resiliência na busca de soluções para
e melhoria da educação e mobilidade
social
As bússolas e mapas
Projetos que conduzam e orientem a
busca da melhoria da mobilidade
social
Encostar e empurrar
Proporcionar condições para a adoção
gradativa de novas tecnologias e
avaliar os resultados da adoção
90
A desobediência sobre o cumprimento
Desenvolver a visão sistêmica e fora
da caixa e do status-quo
Aprender sobre a educação
A melhoria contínua dos processos de
ensino e aprendizagem (formal ou
não)
Aprender sobre sistemas dos objetos
Compreender as necessidades de
aprendizagem
Emergência sobre a autoridade
Entender as necessidades
emergentes, de aprendizagem e social
e as formas de atendimento.
Quadro 4.3.3. Comparação dos princípios para inovação entre MIT Media Lab
e BIT. Adptado dos princípios de constituição do Media Lab MIT (1985) e do
BIT (2004).
O BIT era organizado em células de tecnologia, com espaços
dedicados aos parceiros provedores de tecnologia como Microsoft, Cisco, Intel
e Lego, com a finalidade de integrar as diversas tecnologias no
desenvolvimento de projetos, que suportassem os princípios norteadores do
BIT, informados anteriormente. As ações do BIT estavam direcionadas para
atender a estratégia principal, ou seja, de suportar a melhoria contínua do
processo de aprendizagem nas escolas da Fundação Bradesco, nas escolas
Públicas e no desenvolvimento do ativismo e mobilização das comunidades,
em busca da melhoria contínua da mobilidade social.
As células de tecnologia eram apoiadas pelas empresas parceiras,
através da integração com os seus respectivos centros de inovação (R&D
Centers), o que proporcionava o acesso a projetos e tecnologias, que
possibilitavam o desenvolvimento de pesquisa aplicada a educação e inclusão
social, de acordo com as necessidades locais (Brasil). Os pesquisadores e
91
especialistas do BIT eram das áreas de educação e de tecnologia da
informação e comunicação, em sua grande maioria contratados CLT da
Fundação Bradesco, com o suporte de consultores renomados de tecnologia
educacional, como o Prof. Eduardo Chaves, Prof. Marcos Telles e o Prof.
Renato Soffner.
Algumas iniciativas como “Intel Aprender e Ensinar”, “Microsoft
Ensinando para o Futuro” e “Cisco Network Academy” permitiram o
atendimento de mais de 30.000 alunos e professores no período de 2004-2010,
diretamente pelas escolas da Fundação Bradesco e CIDs. O atendimento
chegou a 350.000 alunos e professores, quando a Fundação Bradesco e
empresas parceiras firmaram acordo com secretarias estaduais e municipais
de educação, para a formação de multiplicadores dos projetos nas escolas
públicas e centros de inclusão digital. O treinamento para os multiplicadores
era oferecido no BIT, nas instalações do Microsoft STIC (School Tecnhology
Innovation Center), na Sala de Aula do Futuro da Intel e na no Cisco Network
Academy Center.
As iniciativas de pesquisa aplicada e desenvolvimento de projetos no
BIT, para a melhoria da aprendizagem e da mobilidade social estavam
fundamentadas em diretrizes e pressupostos de comum acordo, entre a
Fundação Bradesco e empresas parceiras. O quadro 4.3.4 mostra as iniciativas
planejadas e executadas no período de 2004 a 2010.
92
Estratégia
Mapeamento
das
tecnologias e
inovação
(Hype Cycle)
para apoiar a
melhoria do
processo de
aprendiza-
gem e a
mobilidade
social
Desenvolvimen
to de projetos
integrados da
educação
formal com a
não formal.
Difusão de
tecnologias
educacionais
e sociais
Treinamento
de
educadores e
da liderança
social
Produtos Processos de
uso das
tecnologias
educacionais e
sociais
Como usar as
tecnologias
nas escolas e
comunidades
com carência
socioeconô-
mica
Apoio e
suporte aos
usuários das
soluções
Quadro 4.3.4. Quadro de iniciativas norteadoras para a pesquisa aplicada e
desenvolvimento de projetos. Autores: Prof. Marcos Telles e Nivaldo T.
Marcusso (2004).
93
O treinamento de educadores e da liderança social foi uma das
principais iniciativas do BIT, pois efetivamente permitiu que tecnologia
educacional, representada pela aplicação das TICs no processo de ensino e
aprendizagem e a tecnologia social, representada pelas iniciativas de
articulação e mobilização social em busca da transformação social das
comunidades pudessem chegar em todo o Brasil. O educadores e líderes
sociais formados no BIT foram os grandes responsáveis em transformar as
escolas, CIDs e comunidades carentes em polos irradiadores das melhores
práticas de tecnologia educacional e tecnologia social.
A formação dos educadores e líderes sociais compreendia as
seguintes fases:
I- Treinamento em técnicas de comunicação dialógica em
ambientes presenciais e virtuais de aprendizagem: atividade
desenvolvida e implementada em parceria com Gilly Salmon
(Universidade de Leicester/Inglaterra), criadora do “5 Steps
Model”.
II- Treinamento em fundamentos teóricos da aprendizagem
integrada e redes de construção de conhecimento: atividade
desenvolvida e implementada em parceria com a Universidade de
Pádua, com a participação de Paula de Waal, criadora do
framework para projetos educacionais em rede dirigidos a
multiplicadores “Comunitá de Produzione”.
III- Treinamento de habilidades para formação de líderes sociais:
ampliar a capacidade de articulação, engajamento, voluntariado,
identificação e priorização das demandas sociais e gerenciamento
de projetos.
IV- Formação de uma comunidade de especialistas em tecnologia
eduacional e social: permitir a troca de experiências e melhores
práticas em tecnologia educacional e tecnologia social.
94
As iniciativas do BIT seguiam o framework de inovação tecnológica,
com ênfase no e-learning e no processo de ensino e aprendizagem de Gilly
Salmon (2005), que considera como a aprendizagem pode ocorrer com alunos
do presente e futuro, em relação as tecnologias atuais e futuras, para a busca
da melhoria contínua do processo de ensino e aprendizagem. No período de
2004 a 2010 o portfólio de projetos contemplava as seguintes iniciativas, de
acordo com o quadro 4.3.5.
Projetos Alunos
Atuais Futuros
Tecnologias
Atuais
Promover a adoção em
larga escala da melhor
tecnologia disponível.
-P11: Um computador por
aluno
-P12: Robótica
-P13: Utilização de PDAs
-P14: Utilização da Lousa
digital
-P15: Tecnologia social
nos CIDs
Não abandonar o que existe
de bom, em função de simples
modismos.
-P21: Movimento FOSS (“free
and open source software”).
95
Futuras
Preparar o aluno para
adotar modelos mentais,
compatíveis com a
mudança contínua e o
desenvolvimento de
competências para a
integração com a
tecnologia social (ativismo
social).
- P31: Complexidade e
sistemas
- P32: Mapas mentais
- P33: Mentes
questionadoras (Inquiring
Minds da Microsoft e
FutureLab)
Acompanhar as tendências de
evolução do perfil do aluno,
das competências desejadas,
características das novas
tecnologias e preparar-se para
trabalhar com o futuro.
- P41: Projetos no STIC
(Centro de Inovação da
Microsoft – School Tecnology
Innovation Center)
- P42: Sala de aula do futuro
(parceria com a Intel)
- P43: Ambientes virtuais de
aprendizagem
- P44: Parcerias com centros
avançados de tecnologia
educacional
Quadro 4.3.5. Portfólio de Inovação em tecnologia educacional. Adaptação do
Modelo de Gilly Salmon. Fonte: Prof. Marcos Telles, Prof. Renato Soffner e
Nivaldo T. Marcusso (2005).
Um fato relevante durante a implantação do BIT foi a criação em
2008 do STIC (School Tecnology Center) pela Microsoft, em substituição ao IT
Academy, que era mais direcionado ao treinamento e certificação em TI. Esse
espaço foi o primeiro centro de pesquisa para inovação em tecnologias
educacionais para educação básica no país, localizado nas instalações do
Bradesco Instituto de Tecnologia (BIT) em Campinas/SP. A figura mostra o lay-
out do STIC implantado em 2008.
96
Figura 4.3.6. Lay-out do STIC – BIT. Fonte: Microsoft Research (2008)
O objetivo desta parceria foi de favorecer, por meio da pesquisa, a
implementação de espaços de aprendizagem baseado em práticas relevantes,
atendendo às demandas da educação básica brasileira e as necessidades das
comunidades locais. Para isso, foi construído um espaço inovador com funções
específicas, favorecendo a atuação do STIC em suas três vertentes principais:
pesquisa & desenvolvimento, showroom de referência para soluções aplicadas
à educação e a oferta de capacitações em novas tecnologias. O ciclo de
inovação em tecnologia educacional seguia o Hype Cycle do Gartner conforme
a figura 4.3.7, onde as soluções a serem desenvolvidas consideravam as
tecnologias emergentes (baixa maturidade) e as tecnologias já disponíveis no
mercado (alta maturidade).
97
Figura 4.3.7. Hype Cycle de Inovação do STIC. Fonte: Microsoft Research
(2009)
A parceria da Microsoft e Fundação Bradesco ainda contou com a
colaboração da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade
Estadual Paulista (Unesp), a Universidade de São Paulo (USP) e o MIT Media
Lab (Massachusetts Institute of Technology) na pesquisa de soluções de
tecnologia para ampliar o alcance das Tecnologias da Informação e da
Comunicação, para ensino-aprendizagem e programas de formação de
educadores e líderes sociais, visando auxiliar na melhoria da educação básica
e da mobilidade social em todo o Brasil. No período de 2008 – 2010 foram
treinados mais 700 educadores e líderes sociais, que transformaram-se em
multiplicadores em suas respectivas regiões, como mostra a figura 4.3.8.
A educação não formal foi beneficiada pelo STIC através da
formação de líderes e multiplicadores dos centros sociais e comunitários, que
faziam parte da rede dos CIDs. O conhecimento da aplicação das TICs no
processo de ensino e aprendizagem e na articulação de projetos que
beneficiam e atendessem as demandas sociais, foram a base para a segunda
geração de inclusão digital.
98
Figura 4.3.8. Treinamento de Professores e Líderes Sociais. Fonte:
Departamento de Tecnologia da Informação da Fundação Bradesco, 2009.
A Microsoft, além do apoio à criação do BIT, possibilitou a
implantação em 2004 de quinze centros de inclusão digital (CIDs) em
diferentes cidades brasileiras. A empresa doou US$ 150 mil em dinheiro e
licenças de software para a montagem dos laboratórios, de acordo com o
programa Unlimited Potential da Microsoft no Brasil, iniciativa mundial da
Microsoft para reduzir a exclusão digital.
A estratégia de escolha dos locais para instalação dos CIDs
considerou as entidades comunitárias já estabelecidas no entorno das escolas
da Fundação Bradesco, com o objetivo de formação de um hub de
multiplicação das melhores práticas de desenvolvimento social, através de
projetos baseados em tecnologias da informação, como instrumento de
tecnologia social. Os CIDs foram implantados nas cidades de Itajubá (MG),
Jaboatão (PE), Manaus (AM), Campinas (SP), Caucaia (CE), Conceição do
Araguaia (PA), Cuiabá (MT), João Pessoa (PA), Natal (RN), Paragominas (PA),
Pinheiro (MA), Propriá (SE), Rosário do Sul (RS), Salvador (BA) e São Luís
(MA).
99
Outra parceria relevante para o sucesso na implantação dos CIDs foi
com a UNICEF e a British Telecom (BT), o que possibilitou a implantação da
infraestrutura de telecomunicações, com acesso a Internet via satélite e rádio
em 10 centros comunitários no estado de São Paulo, 10 no Rio de Janeiro e 10
na Amazônia, indicados pela UNICEF. Um marco importante dessa parceria foi
a implantação do 100° Centro de Inclusão Digital, localizado na instituição
Associação de Apoio a Meninas e Meninos da Região da Sé, cidade de São
Paulo/SP.
A parceria desenvolvida entre a Fundação Bradesco com a Cisco
em 2001 teve o objetivo de oferecer treinamento em rede de computadores,
através do Programa Networking Academy para membros de comunidades
carentes, para o desenvolvimento da empregabilidade e o desenvolvimento do
protagonismo e voluntariado dos jovens dessas comunidades. Os CIDs foram
integrados a rede de academias e os alunos das escolas da Fundação
Bradesco passaram a ser instrutores vonluntários para oferta de cursos de
certificação IT “Essencials”, CCNA e CCNP. Os cursos são semipresenciais
com módulos a distância pela “Escola Virtual” portal de e-learning da Fundação
Bradesco e aulas presenciais práticas através do laboratório virtual (V-Lab) da
Cisco.
Em 2011 a Fundação Bradesco tinha 113 academias,
predominantemente localizada nos CIDs, em regiões carentes nos 26 estados
brasileiros e distrito federal, com atendimento de mais de 14.000 pessoas.
Entre as academias, duas se destacaram em relação às demais, pois estavam
localizadas em comunidades indígenas: A academia de Bodoquena no CID da
Associação de Pais e Mestres da Escola Municipal Indígena Pólo João
Figueiredo, inaugurado em 2009 na comunidade dos Terenas (MS) e a outra
no CID da cidade de São Gabriel da Cachoeira, localizado a 800 km de
Manaus/AM, inaugurado em 2010 e formado por mais 400 comunidades
indígenas, de 23 grupos diferentes e que falam 19 línguas, além do português.
100
4.3.1.3 A terceira onda de centros de inclusão digital
A Terceira onda de inclusão digital, da primeira geração foi
caracterizada pela implantação do segundo Computer Clubhouse (CCH) no
Brasil, uma rede formada por espaços comunitários com recursos avançados
de tecnologia e metodologia pedagógica desenvolvida pelo MIT Media Lab,
Prof. Michael Resnick e o Museu de Ciências de Boston. A parceria permitiu
que a Fundação Bradesco evoluísse de um modelo baseado essencialmente
no acesso a tecnologia, para um modelo baseado no desenvolvimento de
competências de tecnologia social, para possibilitar a intervenção dos membros
das comunidades na busca de solução para os poblemas e demandas sociais
locais.
O primeiro CCH foi implantado na escola Dom Bosco em São Paulo
e o segundo foi instalado no Jd. Conceição, um bairro localizado na zona sul da
cidade de Osasco. O JD. Conceição é uma região periférica de Osasco, com
aproximadamente 10 mil habitantes, que foi formada por duas ocupações
denominadas Vila da Conquista (1987) e Jd. dos Trabalhadores (1989). Quatro
assentamentos também contribuíram para a formação do Bairro, devido a
remanejamentos executados pela Prefeitura de Osasco: Vila da Justiça (1992),
Cortiço do Hospital Santa Izabel (2001), Favela do Braço Morto do Tiête (2001)
e a área de desapropriação do Rodoanel Km 21 (2002).
101
Figura 4.3.9. Bairro do Jd. Conceição na época da implantação do CCH. Fonte:
Relatório de atividades do CCH do Jd. Conceição de 2004.
Na época de instalação do Computer Clubhouse, a cidade de
Osasco, que integra a Região Metropolitana de São Paulo, possuía, em 2000,
652.224 habitantes. Uma análise das condições de vida de seus habitantes, de
acordo com Índice Paulista de Vulnerabilidade Social – IPVS de 2000 mostrava
que os responsáveis pelos domicílios auferiam em média, R$ 816, sendo que
46,3% ganhavam no máximo três salários mínimos. Esses responsáveis
tinham, em média, 6,7 anos de estudo, 43,5% deles completaram o ensino
fundamental, e 7,1% eram analfabetos. Em relação aos indicadores
demográficos, a idade média dos chefes de domicílios era de 43 anos e
aqueles com menos de 30 anos representavam 17,5% do total. As mulheres
responsáveis pelo domicílio correspondiam a 26,3% e a parcela de crianças
com menos de cinco anos equivalia a 9,1% do total da população.
As situações de maior ou menor vulnerabilidade às quais a
população se encontrava na época estão resumidas nos seis grupos do IPVS,
gráfico 4.3, a partir de uma gradiente das condições socioeconômicas e do
perfil demográfico.
102
Distribuição da População, segundo Grupos do Índice Paulista de
Vulnerabilidade Social – IPVS 2000.
Estado de São Paulo e Município de Osasco
Gráfico 4.3. Índice Paulista de Vulnerabilidade Social – IPVS 2000. Fonte:
Relatório de atividades do CCH do Jd. Conceição, 2004.
O Jd. Conceição considerado na época o bairro com maior
vulnerabilidade da cidade de Osasco encontrava-se no grupo 6 (muito alta),
com rendimento nominal médio dos responsáveis pelo domicílio de R$ 330 e
75,5% deles auferiam renda de até três salários mínimos. Em termos de
escolaridade, os chefes de domicílios apresentavam em média, 4,4 anos de
estudo, 83,1% deles eram alfabetizados e 19,6% completaram o ensino
fundamental. Com relação aos indicadores demográficos, a idade média dos
responsáveis pelos domicílios era de 38 anos e aqueles com menos de 30
anos representavam 26,4%. As mulheres chefes de domicílios correspondiam a
29,1% e a parcela de crianças de 0 a 4 anos equivalia a 12,9% do total da
população desse grupo.
103
Figura 4.4. Mapa do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social – IPVS 2000.
Fonte: Relatório de atividades do CCH do Jd. Conceição, 2004. Fonte: IBGE –
Censo Demográfico de 2000. Fundação SEADE.
A metodologia operacional e pedagógica do Computer Clubhouse é
baseada nos princípios desenvolvidos no MIT Media Lab, pelo Prof. Mitchel
Resnick, em parceria com o Museu de Ciências de Boston. O Prof. Mitchel
Resnick, do MIT Media Lab no seu artigo “The Computer Clubhouse:
Technological Fluency in the Inner City” (MIT Press, 1998) enfatiza que
somente o acesso aos recursos da tecnologia da informação não são
suficientes para desenvolver as competências pessoais e a melhoria da
empregabilidade. Desde que o computador pessoal foi desenvolvido no final da
década de 70, surgiram preocupações sobre as desigualdades no acesso a
essa nova tecnologia. O Prof. Resnick informava que várias iniciativas, desde
então, foram tomadas para reduzir o “Digital Divide”, que aqui chamo de
exclusão digital, para a redução dessas desigualdades, como a aquisição de
computadores para escolas e a abertura de centros comunitários de acesso,
104
reconhecendo que as escolas não são a única ou o melhor local, para que a
aprendizagem desejada ocorra de forma significativa.
Nesses centros comunitários de acesso, chamado de centros de
inclusão digital (CIDs na Fundação Bradesco) ou telecentros, os membros das
comunidades urbanas (jovens e adultos) podem utilizar os computadores sem
custo e a qualquer momento, sem necessidade de agendamento prévio. A
iniciativa “Computer Clubhouse” (organizada e articulada pelo Museu de
Ciências de Boston em colaboração com o Media Lab - Laboratório de Mídia do
MIT) foi criada de forma diferente das inciativas mencionadas anteriomente,
como os CIDs. Na maioria dos centros de inclusão digital, o principal objetivo
era ensinar as técnicas básicas de informática (habilidades de digitação, mouse
e recursos multimídia) e aplicações básicas de informática (planilhas e
processadores de texto), para que jovens desenvolvessem a suas habilidades,
em busca de uma melhor empregabilidade.
A abordagem de aprendizagem do Clubhouse foi desenvolvida com a
finalidade de capacitar os jovens de todas as origens sociais, para tornarem-se
alunos mais capazes, criativos e confiantes. O modelo de aprendizagem é
baseado em pesquisas nas áreas da educação, psicologia social, ciência
cognitiva e desenvolvimento da juventude. Baseia-se em pesquisas sobre o
papel do afeto e motivação no processo de aprendizagem, a importância do
contexto social e da interação entre o desenvolvimento individual e comunitário.
As novas tecnologias são utilizadas para suportar os novos tipos de
experiências de aprendizagem e envolver os jovens, que possivelmente
ficaram alienados da necessidade de desenvolvimento das competências
esssenciais para a vida, por abordagens educativas tradicionais, principalmente
nas escolas formais.
No Clubhouse, conforme informa Resnick (2002), “....o computador é
visto com uma mentalidade diferente”. A questão principal não é de ministrar
algumas aulas para desenvolver determinadas habilidades e sim, que os
participantes aprendam a expressar-se fluentemente com a tecnologia. A
fluência tecnológica significa muito mais do que a capacidade de utilizar as
105
ferramentas tecnológicas, ou seja, dar significado e contexto para as coisas,
com essas ferramentas. Uma pessoa tecnologicamente fluente deve ser capaz
de ir ao centro de uma idéia intuitiva, para possibilitar a implementação de um
projeto tecnológico (Papert e Resnick, 1995). Cada vez mais, a fluência
tecnológica está se tornando um pré-requisito, para conseguir emprego e
participar de forma significativa no exercício da cidadania na sociedade.
Quando as pessoas pensam sobre aprendizagem e educação, na
maioria das vezes pensam em uma pessoa que transmite informações de um
para os outros. Cada vez mais, os educadores estão reconhecendo que esta
"abordagem de transmissão" não funciona tão bem. De acordo com Resnick
(Rethinking Learning in the Digital Age, 2002) ” ...as pessoas aprendem melhor
quando eles não estão somente passivamente recebendo informação, mas sim
quando estão ativamente engajadas em explorar, experimentar e expressar-se.
Mais e mais escolas estão se concentrando em aprender-fazendo, envolvendo
os estudantes em atividades práticas”. Os Computers Clubhouses seguem uma
estratégia semelhante, mas com um passo a frente: os membros simplesmente
não colocam somente as mãos em computadores, mas usam os computadores
para projetar, criar e inventar coisas, ou seja, não aprendem somente pela
prática e também pelo design.
O significado de tecnologicamente fluente envolve não apenas saber
como usar as ferramentas tecnológicas, mas também saber como construir
coisas que tenham significado com essas coisas, ou seja:
I. Capacidade de usar o computador:
a. Utilização das funções básicas do sistema operacional
b. Utilizar os programas padrões de aplicativos (processador
de texto, ferramentas de desenho)
c. Busca / localização / avaliação de informações na Internet
II. Habilidade de aprender novas formas de utilizar o
computador:
a. Aprender novos recursos de um programa conforme
necessário
106
b. Aprender novas ferramentas e programas
c. Sentir-se confortável e confiante sobre a aprendizagem de
novas funcionalidades / programas
d. Usar várias ferramentas / programas em um projeto
e. Parametrizar programas conforme as necessidades
III. Habilidade para criar coisas com o computador:
a. Criação de imagens, animações, músicas, vídeos e
construções com robôs.
b. Revisando as criações.
c. Depuração das criações, quando houver algum problema.
d. Compreender as possibilidades de criações com uma
determinada ferramenta.
e. Interativamente modificar e estender as suas criações (e
suas ideias).
f. Desenvolver programas de computador para suportar a
criação de projetos mais expressivos e significativos.
g. Ao longo do tempo, possibilitar a criação de artefatos com
mais recursos e mais interações.
IV. Habilidade de criar coisas com base em suas próprias
idéias:
a. Geração de idéias para os objetivos de criação desejados.
b. Desenvolver um projeto a partir de uma inspiração inicial
até o produto final.
c. Escolher ferramentas e programas de acordo com as
necessidades de criação.
d. Incorporar mais sentimentos / ideias nas criações no
decorrer do tempo do projeto.
V. Capacidade de usar a tecnologia para contribuir com os
stakeholdes da comunidade:
a. Compartilhar ideias e projetos com os membros que
mantém relacionamentos nas comunidades.
b. Colaborar nos projetos com outros membros da
comunidade.
107
c. Modificar e estender projetos elaborados por membros da
comunidade.
d. Ajudar os outros a aprender novos recursos, programas e
geração de idéias.
e. Criação de coisas que sejam significativas para a
comunidade em seu entorno.
VI. Compreender conceitos relacionados às atividades
tecnológicas:
a. Enterder as várias perspectivas quando da criação de
imagens.
b. Entendimento sobre detecção e feedback de parâmetros,
em projeto de robótica.
c. Entender a matemática para coordenar objetos em projetos
de animação.
d. Compreender conceitos de programação: variáveis,
condicionais etc.
e. Utilizar uma abordagem sistemática e científica para
projetos e resolução de problemas.
Algumas pesquisas, de acordo com Resnick (“Rethinking Learning in
the Digital Age”, 2002), mostram que as pessoas aprendem melhor quando
estão ativamente empenhadas em explorar, experimentar e expressar-se, não
apenas passivamente recebendo informações, mas participando efetivamente
do processo de aprendizagem. Hoje muitas escolas estão se concentrando no
aprender fazendo, envolvendo os alunos em atividades práticas, baseadas na
teoria do Construtivismo (Piaget, 1896-1980). O Computer Clubhouse segue
uma estratégia semelhante, mas com um passo a fente: os membros não
utilizam os computadores como fim e sim para projetar, criar e inventar coisas.
A aprendizagem é no aprender pelo design e não somente no aprender
fazendo.
108
Os membros do Clubhouse desenvolvem suas próprias illustrações,
animações, construções robóticas (Lego) e composições de música, além de
desenvolverem habilidades para a aprendizagem do processo de ideação e
invenção: como conceber um projeto, como fazer uso dos materiais
disponíveis, como insistir e persistir na busca de solução dos problemas, além
da visão sistêmica e no posicionamento como observador. O Computer
Clubhouse (CCH) foi concebido para ajudar os jovens das comunidades
carentes, a desenvolver esse tipo de fluência tecnológica. Os jovens carentes
tem acesso às novas tecnologias da informação e comunicação, mas
principalmente na possibilidade da articulação de idéias, sobre o processo de
aprendizagem e a busca de contribuições para a melhoria da qualidade de vida
dessas pessoas. O CCH representa um novo tipo de aprendizagem na
comunidade, onde os jovens e mentores (adultos) trabalham juntos em
projetos, utilizando as novas tecnologias para explorar e experimentar novas
formas de expressão digital.
Os participantes inicialmente são atraídos pela divulgação boca-a-
boca, sem a necessidade de inscrição prévia, ou seja, as portas sempre estão
abertas para receberem os jovens a qualquer momento, durante o horário de
funcionamento. No Clubhouse os jovens tornam-se designers e criadores, e
não apenas os consumidores de produtos baseados em computador. Os
participantes usam software de ponta para criar a sua própria arte, animações,
simulações, apresentações multimídia, mundos virtuais, criações musicais,
sites e até maquetes e construções robóticas, baseadas na Lego. O Clubhouse
considera não apenas as novas tecnologias, mas também novas formas de
interação social, novos tipos de atividades, novas áreas de conhecimento e
novas atitudes em relação à aprendizagem. Os quatro princípios ou dimensões
fundamentais que nortearam o desenvolvimento do Clubhouse são:
Aprendizagem pelo designing, seguindo os seus próprios interesses,
construção de comunidades de aprendizagem e criar um ambiente de respeito
e confiança. Na criação de novos ambientes de aprendizagem, essas
dimensões são fundamentais para o desenvolvivento das competências
109
necessárias para intervenção nas comunidades, através das tecnologias
sociais.
- Princípio 1: Aprendizagem pelo Designing
A aprendizagem significativa para os jovens considera o apoio a
aprendizagem por meio de projetos e experiências com grande diversidade,
desde construir e controlar robôs da LEGO, como orquestrar dançarinos
virtuais, através de ferramentas de animação. As atividades são diversificadas,
mas estão baseados em uma estrutura comum: engajar os jovens no
aprendizado através do design. Na última década um crescente número de
pesquisadores e educadores tem argumentado que projetos de design
oferecem as mais ricas oportunidades de aprendizagem (Papert, 1993). Há
muitas razões para o interesse em aprendizagem, baseada em design:
- Envolvimento dos jovens como participantes ativos, dando-lhes um
maior senso de controle (e responsabilidade) sobre o processo de
aprendizagem, em contraste com as atividades escolares tradicionais, em que
os professores pretendem "transmitir" novas informações para os alunos.
- Incentivar a solução criativa de problemas, evitando-se o simples
certo e errado predominante na maioria das atividades de matemática e de
ciências nas escolas, permitindo múltiplas estratégias em busca de soluções.
- Facilitar as relações pessoais para o conhecimento, uma vez que
os designers muitas vezes desenvolvem um sentido especial de propriedade
dos produtos (ideias).
- Os projetos são baseados em aitividades muitas vezes
interdisciplinares, reunindo conceitos de várias disciplinas como artes,
matemática e ciências.
- Promover uma percepção de cliente do projeto ou ideia
desenvolvida, incentivando os jovens a se colocar no lugar de quem irá receber
os projetos criados por eles.
110
- Fornecem um contexto de reflexão e discussão, permitindo que
os jovens adquiram uma compreensão mais profunda das ideias decorrentes
da experiência prática.
A ênfase em atividades de design focada na prática é a fundamental
de uma “teoria” educacional mais ampla, conhecida como construcionismo
(Papert, 1993). O Construcionismo propõe que a aprendizagem é um processo
ativo, no qual as pessoas constroem ativamente o conhecimento a partir de
suas experiências no mundo. As pessoas não tem idéias e sim as fazem (Esta
idéia é baseada nas teorias construtivistas de Jean Piaget). Para isso, o
Construtivismo acrescenta a idéia de que as pessoas constroem novos
conhecimentos com eficácia, quando estão empenhados na construção de
produtos com significado pessoal. Eles podem estar construindo desde
castelos de areia, como máquinas com LEGO ou programas de computador. O
que é importante é que eles estão ativamente empenhados em criar algo que
seja significativo para si, ou para os outros ao seu redor.
No Computer Clubhouse a construção assume muitas formas, ou
seja, ao invés de jogar jogos de computador, os participantes criam os seus
próprios jogos de computador, com a ferramenta Scratch e ao invés de apenas
"surfar" na Internet, os participantes criam as próprias páginas Web, tais como
as galerias de arte do Clubhouse. Para apoiar estas atividades, o Clubhouse
oferece uma variedade de ferramentas de design, a partir de programas
básicos de pintura como KidPix ou ferramentas de animação de alta qualidade,
como Photoshop ou o Adobe Director. Outras ferramentas de software
utilizadas são: gravação digital de música, edição e ferramentas de vídeo e
áudio; ferramentas de editoração eletrônica; ferramentas de programação
(como Scratch); ferramentas de 3D para o desenvolvimento de modelos
tridimensionais na tela do computador; e kits de construção e controle de
máquinas e maquetes através da robótica (como LEGO Mind Storm e outros
com Control Lab).
O Clubhouse também serve como um teste para novas tecnologias
em desenvolvimento nas universidades e empresas. Por exemplo, o Clubhouse
111
foi o local de teste inicial para o “Programmable Brick”, um controlador portátil
construído através de uma peça (tijolo) LEGO, desenvolvido no MIT Media Lab,
pela equipe do professor Mitchel Resnick. Os jovens aprendem não somente a
utilizar essas ferramentas, mas a expressar-se através delas, transformando-as
em agentes de proposta de mudança, a serviço da tecnologia social. Eles
aprendem não apenas os detalhes técnicos, mas as formas práticas
(experiência) de ser um bom designer: como conceituar um projeto, como fazer
uso dos materiais disponíveis, como persistir e encontrar alternativas quando
as coisas dão errado, e como ver um projeto através dos olhos de outros. Em
suma, eles aprendem as técnicas básicas de gerenciamento de projetos de
média e alta compexidades.
De acordo com Resnick (2002) a criação do Clubhouse não teve
somente como objetivo as atividades de design, mas principalmente as
atividades de projeto baseados em computador, pois considera que os
computadores são agora uma parte importante da cultura infantil. Como
resultado, as atividades baseadas em computador são possíveis de se
conectar com os desejos, imaginação e interesse das crianças. Outra questão
a considerar segundo Resnick é que os computadores têm o potencial de
envolver os jovens em novos tipos de pensamento matemático e científico, não
para ensinar ideias matemáticas e científicas, mas para envolver os jovens no
pensamento matemático ou científico, como uma parte natural, integrante da
própria atividade no computador. Por exemplo, como os jovens pensam sobre
as diferenças entre animais e máquinas, comparando sensores com os
sentidos dos animais e desenvolvendo o conceito de feedback, um conceito
científico explorado no ensino superior.
- Princípio 2: Seguindo os seus próprios interesses
O segundo princípio considera que, quando as pessoas estão
comprometidas com o trabalho, a tendência é que a disposição seja maior para
enfrentar mais desafios e com maiores níveis de complexidade. Os Clubhouses
proporcionam aos membros uma quantidade ampla de escolha, de modo que
os membros possam encontrar projetos e atividades que sejam de interesse
112
pessoal ou coletivo daquela comunidade. Os membros podem escolher o
horário de frequencia e com quem trabalhar, mas a execução de um Clubhouse
não é simplesmente uma questão de deixar os jovens fazerem o que querem e
sim ajudar os jovens a identificar seus interesses, transformá-los em projetos
significativos, e aprender com a experiência. A estrutura do Clubhouse
possibilita muitas formas de desenvolvimento de projetos, desde a seleção de
software, a disposição dos móveis, a escolha de projetos de referência, dos
materiais de apoio, da equipe e mentores de apoio. O segredo é possibilitar
que os membros tenham liberdade de escolha e para os seus desejos, com
apoio suficiente para transformar esses desejos em realidade, através das
atividades práticas.
Na escola tradicional (formal) o foco é geralmente sobre os métodos
de ensino, e não nas motivações para a aprendizagem. Muitas escolas
enfatizam o que e como os professores devem ensinar, mas raramente a
examinar por que os seus alunos podem e querem aprender. Quando a
questão da motivação é conduzida a ênfase dada é muitas vezes em
motivadores e incentivos baseados em notas e prêmios, como base e
avaliação do desempenho. No entanto fora da escola, podem-se observar
muitos exemplos de pessoas que aprendem de verdade, sem necessariamente
com as recompensas mencionadas anteriormente. Os jovens que parecem ter
falta de atenção na escola muitas vezes exibem grande concentração em
projetos que estão verdadeiramente interessados. Eles podem passar horas
aprendendo a tocar guitarra ou jogar basquete. Claramente, os interesses da
juventude são um grande recurso inexplorado. De acordo com Roger Schank:
"O interesse é uma coisa terrível a desperdiçar" (Schank, 1994). Ao invés de
ser "empurrado" para aprender, o trabalho com jovens deve ser de incentivar a
buscar idéias e conselhos por iniciativa própria.
O desafio da educação é encontrar maneiras de ajudar os jovens a
fazer essas conexões e desenvolvê-los mais plenamente. Por exemplo, um
interesse em andar de bicicleta pode levar a investigações de engrenagens, a
física do equilíbrio, a evolução dos veículos ao longo do tempo, ou os efeitos
ambientais dos diferentes modos de transporte. O Clubhouse é projetado para
113
suportar os jovens no desenvolvimento de seus interesses. Enquanto os jovens
de famílias de classe média geralmente têm muitas oportunidades para
construir de acordo com seus interesses (aulas de música, campos de
especialidade, e assim por diante), o público-alvo do Clubhouse tem algumas
dessas oportunidades. Para a maioria dos participantes do clube, não há outras
opções construtivas após o horário escolar. E muitos nem sequer têm uma
noção clara de seus interesses, e muito menos como construir sobre eles.
No Clubhouse os participantes são incentivados a fazer suas
próprias escolhas. Apenas vindo ao Clubhouse já envolve uma escolha: todos
os jovens no Clubhouse escolheram para estar lá e podem entrar e sair quando
bem entenderem. Uma vez dentro do Clubhouse, os participantes enfrentam
continuamente escolhas sobre o que fazer e como fazê-lo, e com quem
trabalhar. O Clubhouse ajuda estes jovens a ganhar experiência com
autoaprendizagem, ajudando-os a reconhecer, a confiança, desenvolver e
aprofundar os seus próprios interesses e talentos. Ajudar os jovens a
desenvolverem os seus interesses não é apenas uma questão de deixá-los
fazer o que eles querem. Os jovens devem ter a liberdade de seguir as suas
fantasias, mas também o apoio para fazer essas fantasias ganharem vida e
significado.
Nas paredes, prateleiras e discos rígidos do clube, há uma grande
coleção de amostras de projetos, concebidos para proporcionar aos
participantes uma noção do possível e com múltiplos pontos de entrada para o
início. Em um canto do Clubhouse está uma biblioteca de livros, revistas e
manuais preenchidos com mais idéias do projeto (e um sofá para tornar a
leitura mais confortável). Muitos jovens começam imitando um projeto de
exemplo, em seguida, trabalhar em variações sobre o tema, e em breve
desenvolver o seu próprio caminho pessoal, decorrente de seus interesses
pessoais. Esta abordagem só funciona se o ambiente suportar uma grande
diversidade de possíveis projetos e caminhos. O computador tem um papel
fundamental aqui. O computador é um tipo de "máquina universal", apoiando
projetos de design em muitos domínios diferentes: música, arte, ciência e
matemática. A qualquer momento, um par de jovens pode estar usando um
114
computador para criar uma animação gráfica, ao lado do computador outro
participante pode estar usando um computador semelhante ao controle de uma
construção robótica.
Naturalmente, a tecnologia em si não assegura a diversidade. Nas
escolas, muitos professores estão incluindo as experiências de projeto em suas
atividades de sala de aula. Mas, em muitos casos, essas atividades de projeto
são muito restritivas. Os alunos fazem pouco mais do que seguir "receita". Por
exemplo, um professor pode instruir cada aluno a construir exatamente o
mesmo carro LEGO, usando os mesmos tijolos, as mesmas engrenagens,
rodas e o mesmo programa de computador para controlá-lo. O Clubhouse tem
uma abordagem diferente, pois cria a perspectiva de uma oficina invenção. Ao
trabalhar com LEGO / Scratch, os jovens experimentam uma grande variedade
de projetos, desde o controle de temperatura de uma sala até o controle do
trânsito de uma cidade. Os materiais da LEGO e os recursos da informática
permitem essa diversidade, que é apoiada e incentivada pela comunidade do
Clubhouse.
- Princípio 3: Construção da comunidade de aprendizagem
Quando as pessoas refletem sobre pensamento, muitas vezes
imaginam sobre a famosa escultura “O Pensador” de Rodin: uma figura
solitária, sentada sozinha, com a cabeça apoiada na mão, conforme Resnick
(1998). Mas na última década, os educadores têm focado mais na importância
das interações sociais, nas formas de pensar e de aprender. Os Clubhouses
são projetados para promover a ampliação da comunidade de aprendizagem,
em que jovens de diferentes idades compartilham idéias e trabalham juntos em
projetos, com o apoio de uma equipe de mentores. Ninguém é designado para
trabalhar em uma equipe epecífica, ou seja, as comunidades surgem ao longo
do processo de aprendizagem. As equipes de projeto são formadas
informalmente, de acordo com os interesses comuns de aprendizagem. Essas
comunidades são dinâmicas e flexíveis, evoluindo para atender as
necessidades do projeto, e os interesses dos participantes, através das
interações e colaborações com uma comunidade diversificada de membros do
115
espaço, como funcionários, mentores e participantes da comunidade. Os
objetivos se convergem, para o desenvolvimento de novas perspectivas, de
pensar sobre a realidade no entorno e nas novas formas de compreender a si
mesmos e suas necessidades.
- Princípio 4: Criar um ambiente de respeito e confiança
Quando os visitantes entram em Clubhouse são na maioria das
vezes surpreendidos tanto com a qualidade das criações artísticas e as
habilidades técnicas dos participantes, como pela maneira como os jovens
interagem uns com os outros. Na verdade, a abordagem do Clubhouse prioriza
o desenvolvimento de uma cultura de respeito e confiança. Estes valores do
Clubhouse não só tornam um local convidativo para passar o tempo, mas são
essenciais para permitir os jovens a experimentar novas ideias, correr riscos,
seguir os seus interesses e desenvolver a fluência com as novas tecnologias.
Existem muitas dimensões de "respeito" no Clubhouse: respeito pelas pessoas,
o respeito pelas idéias, respeito às ferramentas e equipamentos. Os mentores
e funcionários dão o tom ao tratar os jovens do Clubhouse com respeito.
Desde o início, os participantes têm acesso a equipamentos caros e
são incentivados a desenvolver suas próprias idéias. "Quer dizer que eu posso
usar isso?" Essa é uma pergunta comum para os jovens que visitam o
Clubhouse e querem saber quais recursos e opções estão disponíveis para
eles. Mesmo com todas essas opções, os jovens não irão aproveitar as
oportunidades, a menos que eles se sentem "seguros" para experimentar
novas idéias. Em muitos locais, os jovens são relutantes em fazê-lo, por medo
de ser julgado ou até mesmo ser ridicularizado. No Clubhouse o objetivo é
fazer com que os participantes se sintam seguros para experimentar e explorar.
Ninguém é criticado por erros ou idéias "bobas".
Os jovens tem um tempo necessário para desempenhar as suas
ideias; entende-se que as idéias (e pessoas) precisam de tempo para se
desenvolver. Um novo participante no Clubhouse passou semanas
manipulando algumas imagens, mas então, como uma criança que está
aprendendo a conversar, que começa a falar sentenças completas, de repente
116
o jovem começa a usar essas imagens para criar animações gráficas de
excelente qualidade. No Clubhouse os jovens tem muita liberdade de escolha,
como um dos participantes do CCH do Jd. Conceição confidenciou: "Não há
ninguém respirando no seu pescoço aqui". O pessoal Clubhouse e mentores
não distribuem simplesmente elogios para melhorar a "autoestima" dos jovens.
Eles tratam os jovens mais como colegas, dando-lhes feedback, e conduzindo-
os a considerar novas possibilidades. Eles estão sempre perguntando: O que
você poderia fazer em seguida? Que outras idéias você tem? Muitos jovens do
Clubhouse estão aprendendo não só as competências como os computadores
novos, mas novos estilos de interação. Os jovens do Clubhouse são tratados
com respeito e confiança e espera-se que eles tratem os outros da mesma
forma.
O critério para seleção do local para implantação do Computer
Clubouse no Brasil foi definido pela Intel e pela Fundação Bradesco. A Intel
patrocinou 100 Computer Clubhouses entre 2000-2014, com investimento de
mais de US$ 35 milhões. No Brasil, o Colégio Dom Bosco de SP e a Fundação
Bradesco foram selecionados para implantar respectivamente o primeiro e
segundo Computer Clubhouses, com doação de recursos financeiros pela Intel,
mas com a responsabilidade de operar e desenvolver projetos para a
sustentabilidade. Tanto a Fundação Bradesco, como o Colégio Dom Bosco
tinham a responsabilidade de desenvover projetos de tecnologia da informação
para suportar o desenvolvimento da tecnologia social, ou seja, a melhoria
contínua da transformação social através da melhoria da mobilidade social.
A implantação do CCH pela Fundação Bradesco e Intel em 15 de
setembro de 2004 foi precedida por um relacionamento em projetos nas área
de educação, como o Projeto Educação para o Futuro, que desde 1999
possibilitava a formação a professores em tecnologia educacional. O instituto
“Projeto Aprendiz” do Jornalista Gilberto Dimenstein também participou da
implantação do CCH até 2006, com a finalidade de suprir a falta de experiência
da Fundação Bradesco em projetos de educação não formal, além do limite
das suas escolas.
117
O CCH foi implantado no projeto de implantação no Centro Social
Nossa Senhora das Graças com a coordenação do Padre Tião e da Gilma
Maria Ramos da Silva Rossafa, que também coordenava uma ONG chamada
Associação Camila em defesa e valorização da vida, nome este dado em
homenagem à filha de Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa, vítima da
violência na região do Jd. Conceição. Na época da implantação, o
organograma funcional do CCH do Jd. Conceição era formado de acordo com
a figura 4.5.
Figura 4.5. Organograma de operação do Computer Clubhouse durante a fase
de implantação. Fonte: Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e
Yeda Karla Martins Machado em 16/07/2014.
Na época de implantação (2004) a minha função era de coordenar a
iniciativa na Fundação Bradesco e a parceria com a Intel e MIT Media Lab. A
Fundação Bradesco tinha uma coordenadora do projeto CCH, Fabiana Valente,
118
que também coordenava o projeto dos CIDs. A operação do CCH era
composta por pessoas de coordenação e operação, conforme o quadro 4.3.6:
Nome Posição Responsabilidade
Gilma
Maria
Ramos
da Silva
Rossafa
Responsável pela
Associação Camila em
Defesa e Valorização
da Vida
Responsável pela articulação com a Fundação
Bradesco e a Intel. Administra a Associação
Camila em Defesa e Valorização da Vida
Yeda
Karla
Martins
Machado
Coordenadora do CCH
Jardim Conceição
- Seguir as premissas originárias do ICC;
- Emitir relatórios de atividades para os parceiros
mantenedores;
- Divulgar os conhecimentos obtidos nos encontros
anuais da rede ICC;
- Apoiar os outros ICCs do mundo;
- Divulgar constantemente o empreendimento para a
comunidade e para possíveis colaboradores;
- Auxiliar os membros no desenvolvimento de suas
habilidades através de projetos utilizando as TICs;
- Recrutar, treinar e dar suporte a mentores
voluntários;
- Auxiliar os membros na elaboração de seus planos
de futuro, tanto acadêmicos como profissionais;
- Manter o sistema básico de informática funcionando,
desde o gerenciamento de arquivos, problemas com
Hardwares e Softwares e suporte técnico para
membros e mentores;
119
- Manter o espaço do empreendimento organizado,
assim como os arquivos dos membros;
- Auxiliar a instituição mantenedora a divulgar a
filosofia do empreendimento para o público externo
.
Thiago
Henrique
Rossafa
Co-coordenador do ICC
Jardim Conceição
Assume as responsabilidades de coordenador na
ausência da coordenadora.
Sonia Diretora da Fundação
Bradesco de Osasco
Contato da Fundação Bradesco com o CCH.
Quadro 4.3.6. Estrutura organizacional do CCH. Fonte: Entrevista com Gilma
Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em 16/07/2014.
O CCH do Jd. Conceição prioriza o atendimento da faixa etária dos
14 a 18 anos e oferece 30 horas semanais de segunda a sábado, exclusivas
para membros. Nos demais horários o empreendimento abre as portas para a
utilização da comunidade em geral. Por exemplo, duas vezes por semana,
duas horas por dia é aberto para 40 pessoas da comunidade do Jardim
Conceição, para a utilização dos recursos e equipamentos para atividades
gerais, como acesso à Internet, criação de textos e preparação de currículos.
As crianças do Brincando e Aprendendo, projeto do Centro Social Nossa
Senhora das Graças, utilizam o local três vezes por semana, em horário
específico para elaboração de projetos baseados nos kits da Lego, baseados
em temas de interesse local. As sextas-feiras à tarde são reservadas para
bandas de músicas da comunidade do Jd. Conceição, para a produção de
CDs, que procuram retratar a realizadade socioeconômica da comunidade.
O CCH do Jd. Conceição atendeu 49.267 pessoas no período de
2004-2013, composto por membros da comunidade, convidados e mentores,
de acordo com o quadro 4.3.7.
120
Público
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Membros,
convidados
mentores e
atividades
extras (*)
240 1.750 1.876 2.510 7.901 9.084 6.377 6.143 7.466 .5920
(*) Atividades Extras, reuniões da comunidade, oficina de Inglês, gravação no
estúdio de músicas.
Quadro 4.3.7. Quadro de atendimento do CCH de 2004 a 2013. Fonte:
Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins
Machado em 16/07/2014.
O perfil de atendimento durante o período de 2004-2013 foi de
jovens na maioria entre 16 a 18 anos, residentes no entorno do Jd. Conceição
e a maioria estudavam em escolas públicas, conforme gráfico 4.4.
121
Gráfico 4.4. Perfil de atendimento durante o período de 2004 -2013. Fonte:
Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins
Machado em 16/07/2014.
As iniciativas do Computer Clubhouse do Jd. Conceição buscam o
desenvolvimento de uma cidadania crítica, exercida coletivamente, que
estimule as pessoas a conhecer melhor a sua realidade e encontrar caminhos
para transformação da comunidade. Uma cidadania que valoriza a capacidade
empreendedora dos indivíduos, as ações construídas em conjunto e a
expressão individual do compromisso social. Uma cidadania, que faz de todo
ser humano um protagonista da história. Nesse cenário, a tecnologia figura
como um instrumento, um trampolim para que as comunidades expressem seu
potencial e conquistem direitos essenciais.
As atividades que são desenvolvidas pelos membros compreendem
o design gráfico, invenção e criação de projetos, de acordo com seus próprios
122
interesses, como a robótica educacional (Scratch, boardscratch, Lego We do,
Mindstorms RCX e NXT) em um ambiente de confiança e respeito. Os jogos de
tabuleiros também são utilizados, bem como são realizadas oficinas de
bijuterias, dinâmicas em grupo, discussões com temas da atualidade, para
conhecer e saber os interesses dos jovens sobre a proposta para soluções dos
problemas comunitários locais.
A orientação de cursos de formação profissional é realizada em
parceria com o Instituto Criar de TV, Cinema e Novas Mídias, com a oferta de
11 cursos na área de mídia. Outros cursos são oferecidos pela Escola Virtual
da Fundação Bradesco, além da divulgação das inscrições dos principais
vestibulares, ENEM, PROUNI e a parceria com a empresa a IT Mídia, nas
áreas de tecnologia e saúde para oferecimento de bolsas dos cursos de
graduação e pós-graduação para os membros que se destacam nas atividades
do centro.
Figura 4.6. Atividades no Computer Clubhouse em Osasco. Fonte:
Relatório de atividades de 2011 do CCH, Osasco.
Os níveis de utilização da tecnologia no Clubhouse são
gradativamente alcançados, com graus específicos de utilização, por parte dos
membros, de acordo com os desafios estabelecidos. Em alguns casos os
membros utilizam a tecnologia de forma passiva, ou seja, ouvindo CDs ou
assistindo a filmes, acessando e-mails etc. Porém, a maioria dos membros tem
se interessado por conhecer novas ferramentas e desenvolver projetos.
Algumas estratégias foram criadas para envolver mais os membros na
123
utilização criativa da tecnologia. O conhecimento em Tecnologia da Informação
foi dividido em três níveis de utilização. O uso ativo, que compreende os
membros que fazem uso das ferramentas de criação, design, fotografia, vídeo,
música etc. Uso Passivo (ouvir música, assisitir filmes, jogar) e o uso
específico, como produção de trabalhos escolares, pesquisas na internet e
busca de propostas para os problemas sociais locais.
Gráfico 4.5. Tipo de utilização dos recursos das TICs no CCH. Fonte:
Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins
Machado em 16/07/2014.
O acesso a internet era caracterizado pela utilização dos mecanismos de
busca, envio de email, pesquisa escolar e sites de jornais e revistas.
124
Gráfico 4.6. Utilização da Internet no CCH. Fonte: Entrevista com Gilma Maria
Ramos da Silva Rossafa e Yeda Karla Martins Machado em 16/07/2014.
A preparação para o mercado de trabalho foi uma das prioridades do
espaço nos dois primeiros anos de implantação (2004-2005), através do
desenvolvimento de habilidades, como a questão da linguagem, da
autoconfiança e da expressividade. Através de dialogos e entrevistas sabia-se
que muitos deles perdiam oportunidades de colocação no mercado de trabalho
por não saberem expresser-se e nem escrever de forma adequada. Uma das
principais atividades do primeiro ano foi o incentivo à leitura, à escrita e no
desenvolvimento da oralidade qualificada e nas oportunidades de
conhecimento de novos ambientes e realidades fora do espaço da comunidade
que eles estavam acostumados a conviver, conforme Gilma Maria Ramos da
Silva (2014).
O Computer Clubhouse expressa plenamente uma iniciativa de
inclusão digital, através da educação não formal pode transformar vidas e
desenvolver a capacidade de mobilização de uma comunidade em busca da
melhoria da mobilidade social. Durante o período de 2004 a 2010 foram
atendidos 389.741 pessoas das comunidades no entorno do CCH, como
mostra o quadro 4.3.8.
125
Quadro 4.3.8. Total de atendimento da primeira geração de Centros de
Inclusão Digital – Fonte: Entrevista com Gilma Maria Ramos da Silva Rossafa e
Yeda Karla Martins Machado em 16/07/2014.
4.3.1.4 Identificação do nível de maturidade da primeira geração de
centros de inclusão digital.
A primeira geração de centros de inclusão digital implantada pela
Fundação Bradesco teve a finalidade de possibilitar às comunidades com
carência socioeconômica, o acesso às tecnologias da informação e comunicação.
Os cursos oferecidos procuravam atender as demandas de empregabilidade das
Ano Atendimento
(Membros da comunidade)
2004 8.000
2005 16.295
2006 25.000
2007 92.025
2008 109.072
2009 105.029
2010 134.320
TOTAL 389.741
126
comunidades, com algumas iniciativas de projetos que tratavam de forma isolada
as questões sociais das comunidades, principalmente no Computer Cluhouse.
A Fundação Bradesco ainda não estava preparada para o
desenvolvimento de projetos sociocomunitários além das suas escolas, ou fora
do curriculo escolar formal. O desenvolvimento da parceria com o Instituto Cidade
Aprendiz para a implantação do Computer Cluhouse do Jd. Conceição indicou a
falta de experiência em projetos extra-muros (fora da escola), mas o desejo da
Instituição de expandir o atendimento além da sua rede de 40 escolas.
Considerando as iniciativas realizadas no período 2004-2010, classifico a
primeira geração de centros de Inclusão Digital (CIDs) no nível 2, de acordo com
o framework de maturidade de centros de inclusão digital, ou seja, com iniciativas
emergentes e considerando a implantação do Computer Clubhouse como início
do movimento em busca do nível 3 (integração inicial).
O nível 2 de maturidade da primeira geração de inclusão digital,
representado pelos CIDs é justificado por:
- Oferta de cursos de informática para a melhoria da
empregabilidade, principalmente de informática e redes de
computadores (Escola Virtual e Network Academy,
respectivamente).
- Utilização dos CIDs para discussão e reflexão dos problemas
sociais locais (CID do Jd, Conceição).
- Desenvolvimento da liderança social, através do programa Intel
Aprender e cursos oferecidos no BIT e no espaço Microsoft STIC.
127
Figura 4.7. Nível de maturidade da primeira geração de inclusão digital.
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
4.3.2 Segunda Geração de Centros de Inclusão Digital: Rede de
Inclusão Social (RIS)
A segunda geração de CIDs, que chamo de Rede de inclusão social
(RIS) começou as ser desenvolvida em 2007 através da integração dos CIDs
com a rede de Telecentos de Negócios (ATN), uma OCIP criada a partir das
iniciativas de inclusão digital do MDIC – Ministério do Desenvolvimento e
Indústria e Comércio.
128
4.3.2.1 A primeira onda: Desenvolvimento da sustentabilidade
dos CIDs
A primeira onda da segunda geração de centros de inclusão digital,
buscava o desenvolvimento da sustentabilidade dos CIDs, através da
prestação de serviços, que permitissem a geração de receita financeira. A
operação e manutenção dos CIDs sempre foi um problema para as
comunidades, pois a Fundação Bradesco somente implantava os CIDs e
oferecia os cursos através da escola virtual, cabendo a essas comunidades o
custeio das despesas. A parceria com a ATN foi a primeira iniciativa em busca
da geração de sustentabilidade financeira para os CIDs, bem como a expansão
do atendimento em localidades onde a rede dos CIDs não estava presente.
A ATN é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
(OSCIP), entidade sem fins lucrativos, criada em março de 2006. Dedica-se a
apoiar o desenvolvimento e a sustentabilidade de telecentros, buscando
oferecer melhores condições sociais e econômicas através da inclusão digital.
Atua na implantação de telecentros, oferta de cursos de capacitação para micro
e pequenas empresas e para a sociedade de forma geral, aliada a parceiros, e
disponibiliza diversos serviços que contribuem para o desenvolvimento das
pessoas e das comunidades, possibilitando a inserção no mercado de trabalho
de parcelas significativas da população. Atualmente (Outubro de 2014) são
2.090 telecentros apoiados pela ATN em todo o território nacional.
Os objetivos que suportam a missão da ATN compreendem:
- A participação na implantação e apoio à sustentabilidade de
telecentros.
- Oferecer cursos de alfabetização digital e de empreendedorismo
para os empresários e empregados das micro e pequenas empresas.
- Ampliar a participação das microempresas e empresas de pequeno
porte no comercio eletrônico.
129
- Estimular a participação das microempresas e empresas de
pequeno porte no comércio internacional (exportação) e nos processos
de licitação para compras governamentais.
- Incentivar a utilização das TICs para o desenvolvimento das
microempresas e empresas de pequeno porte.
A ATN oferece através de sua rede de parcerias serviços de
implantação de gestão de telecentros, alfabetização digital, cursos de formação
profissional, curso de graduação e pós-graduação à distância, serviços
financeiros através de correspondentes bancários, intercâmbios com
universidades, apoio aos programas de inclusão digital e social e apoio a
políticas públicas de desenvolvimento. A experiência com o desenvolvimento
de parcerias permitiu o desenvolvimento de um ecossistema, para que as
empresas possam ofertar os seus produtos e serviços e os telecentros serem
remunerados, de acordo com a oportunidade gerada, contribuindo assim para a
geração de sustentabilidade. A rede ATN era organizada funcionalmente em 9
anéis, interligados e com a finalidade de suportar a operação e a geração de
valor e oportunidades para as instituições da rede, conforme a figura 4.8.
Figura 4.8. Organização da Rede ATN. Fonte: MDIC, 2006, adaptado por
Liliam, M. A. de Resende em Telecentros de informação e Negócio, como
130
veículo de educação corporativa nas microempresas e empresas de pequeno
porte.
O modelo de negócios da ATN é focado na geração de parcerias que
promovam a sustentabilidade dos telecentros e da própria ATN. Os serviços
das empresas prestados na rede de telecentros geram uma receita que é
dividida entre a empresa, o telecentro que presta o serviço e a ATN que
gerencia a parceria, de acordo com a figura 4.9.
Figura 4.9. Organização da Rede ATN. Fonte: Adaptado por Liliam, M.
A. de Resende do MDIC, 2006.
A sustentabilidade dos telecentros está baseada na
sustentabilidade financeira e na sustentabilidade social. A sustentabilidade
financeria está baseada na geração de receitas através da prestação de
serviços, permitindo o custeio do acesso a Internet, da energia elétrica e das
despesas de pessoal. A sustentabilidade social pode ser medida pelo grau de
desenvolvimento social das comunidades, ou da mobilidade social. Outras
131
dimensões podem ser consideradas para a sustentabilidade, como a política,
organizacional de capital humano e de infraestrutura. A figura 4.9.1 mostra o
esquema de geração de sustentabilidade para a rede de telecentros.
Figura 4.9.1. Framework de sustentabilidade da ATN. Fonte: Adaptado
por Liliam, M. A. de Resende do MDIC, 2006.
A proposta da implantação da Rede de Inclusão Social (RIS) tinha a
finalidade de conectar os CIDs com a rede de Tecentros de Negócios da ATN,
para que houvesse a troca de experiências e das melhores práticas, além da
integração de iniciativas que fossem complementares. Além da intergação das
redes, a Fundação Bradesco doou à ATN 340 computadores e periféricos para
implantação de 34 Telecentros distribídos em todo o Brasil, entre 2007 e 2008.
Nesse mesmo período a ATN passou a oferecer os cursos da Escola Virtual,
permitindo a expansão do atendimento e o treinamento dos CIDs para o
desenvolvimento da capacidade de sustentabilidade, através da prestação de
132
serviços e geração de renda nas comunidades. Uma característica importante
dessa parceria foi a integração das iniciativas de mobilização social dos CIDs,
em busca de soluções para as necessidades comunitárias, com uma liderança
estruturada e empreendedora da rede ATN, conforme o quadro 4.3.9.
Competências dos
CIDs
Competências da ATN Sinergia gerada pela
parceria
Desenvolvimento de
uma liderança
comunitária, para
discussão da
problemática social e
articulação em busca de
soluções.
Desenvolvimento de
uma liderança
consciente da
necessidade da busca
da autonomia e
sustentabilidade
financeira dos centros
comunitários.
Desenvolvimento da
capacidade
empreendedora nos
centros comunitários,
tanto na discussão e
busca de soluções para
a problemática social,
como na geração de
receita para suportar a
manutenção dos centros
e projetos locais
(empresa social).
Oferta de cursos
autalizados via escola
Virtual (e-Learning).
Oferta de serviços para
geração da
sustentabilidade
financeira.
Geração de receita com
cursos preparatórios
para a certificação
(Microsoft, Cisco, CA e
Intel) e prestação de
serviços
(correspondente
bancário, correio).
Atração da comunidade
para discussão da
Atração dos líderes
comunitários para o
Identificação de
oportunidades para
133
problemática social local
e proposta de soluções.
desenvolvimento de
competências para
identificação e geração
de oportunidades para
geração da
sustentabilidade
financeira.
geração de receita para
a manutenção dos
centros de inclusão
digital e melhoria da
mobilidade social.
Certificação dos cursos
de educação não formal,
através de um selo
reconhecido pelo
mercado (Fundação
Bradesco).
Capacidade de
desenvolvimento de
parcerias com prefeitura
e orgão públicos em
mais de 4.000
municípios em todo o
Brasil.
Expansão da oferta de
cursos de educação não
formal, com o selo da
fundação Bradesco e
apoio de prefeituras em
todo o Brasil.
Quadro 4.3.9. Sinergia entre as ações desenvolvidas pelos CIDs e a rede ATN.
Fonte: o Autor (2014)
No período de 2007-2009 foram doados dez computadores, uma
impressora e um hub (para conexão dos computadores em uma rede local e a
internet), para cada um dos seguintes Telecentros de Negócios:
3ª Companhia Interativa Comunitária (3ª CICOM), Manaus, AM.
Associação dos Barraqueiros de Coco de Recife – ABCR / Recife,
PE.
Prefeitura Municipal de Aparecida de Goiânia, Goiânia, GO.
Associação das Pequenas e Microempresas de Salvador –
APEMISA / Salvador, BA.
CEIFA - Centro de Reintegração e Capacitação "Fabiana Maria
Lobo da Silva", Pombal, PB.
Associação dos Pequenos Produtores Rurais, Apicultores,
Moradores da Fazenda Tomboril, Condeúba, BA.
134
Associação de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável de
Parauapebas – I, Parauapebas, PA.
Cooperativa dos Fornecedores de Materiais de Construção de
Floriano – XVII , Floriano, PI.
Prefeitura Municipal de Natividade, Natividade, TO.
Prefeitura Municipal de Santa Rita do Sapucaí, Santa Rita do
Sapucaí, MG.
Associação da Pessoa com Deficiência de Guaíra (Michele
Patrícia Queli Tomé), Guaíra, SP.
Prefeitura Municipal de Ariranha, Ariranha, SP.
Associação Comercial e Industrial de Araçatuba, Araçatuba, SP.
Prefeitura Municipal de Capão Bonito Terra Roxa, Terra Roxa,
SP.
Associação Beneficente Gunnar Vingren, Franca, SP.
Comunidade Virtual de APIAÍ (CVAP), Apiaí, SP.
Prefeitura Municipal de Cruzeiro, Cruzeiro, SP.
SACRA - Sociedade de Amparo à Criança, São José dos
Campos, SP.
Prefeitura Municipal de Indaiatuba / Fundação Pró-Memória,
Indaiatuba, SP.
PROCEDES - Associação de Promoção para o Crescimento e
Desenvolvimento Social, Osasco, SP.
Paróquia Nossa Senhora de Guadalupe, Marília, SP.
Associação da Criança e o Adolescente de Mundaú, Trairí, CE.
SAMUCA - Serviço de Atendimento à Mulher, à Criança e ao
Adolescente, Pedreira, SP.
Educandário Santo Antonio de Bebedouro, Bebedouro, SP.
DESEAD - Departamento Social e Educacional de Lea, Itapira,
SP.
AMDE - Agência Municipal de Desenvolvimento Empresarial,
Osvaldo Cruz, SP.
Prefeitura Municipal de Mococa, Mococa, SP.
135
Rotary Club de Franca Novas Gerações, Franca, SP.
Agência de Desenvolvimento da Região de Franca, Franca, SP.
Prefeitura Municipal de Capão Bonito, Capão Bonito, SP.
Fundação Educacional São Carlos, São Carlos, SP.
Centro Recreativo e Esportivo Dragons, Itapecerica da Serra, SP.
Agência de Desenvolvimento de São João da Boa Vista, SP.
AMR - Associação dos Moradores do C.D.H.U. e Recanto das
Rosas, SP.
Além dessas instituições, o Ministério das Minas e Energia, parceira
da ATN no projeto de Telecentros recebeu em abril de 2008 mais 270
computadores, 27 impressoras e 27 hubs para atualização dos Telecentros de
Negócios que já estavam em operação. Ainda nesse ano a Fundação Bradesco
doou 1.360 computadores, 136 impressoras e 136 hubs para entidades
localizadas nos seguintes estados, de acordo com o quadro 4.3.9.1.
Estado Computadores Impressoras Hubs
Tocantins 220 22 22
Pernambuco 320 32 32
Amazonas 50 5 5
Bahia 770 77 77
Total 1360 136 136
Quadro 4.3.9.1. Doação e distribuição de computadores para a ATN.
Fonte: Fundação Bradesco e ATN (2008).
A implantação dos processos de sustentabilidade nos CIDs da
Fundação Bradesco, através da parceria com a rede ATN ocorreu no período
de 2007-2009 com a impantação em 48 CIDs de uma rede de 183 CIDs ativos.
136
As dificuldades para a oferta de serviços, de acordo com os critérios de
sustentabilidade da ATNs compreendiam:
- A localização do CIDs, que não favoreciam a oferta de
determinados serviços (correspondentes bancários e polos de
cursos de graduação e pós-graduação a distância).
- A documentação irregular dos CIDs (registro no CNPJ, registro do
imóvel, habite-se).
- Falta de infraestrutura adequada (transporte, saneamento,
energia elétrica).
- Falta de uma liderança em tempo integral para coordenar a
operação e o atendimento dos frequentadores.
Um exemplo de implantação da parceria da rede de CIDs e
Telecentro de Negócios foi no bairro de Santa Felícia, São Carlos, SP,
conforme figura 4.9.2, em parceria com a Fundação Educacional São Carlos
(FESC), para o oferecimento de cursos de Informática Básica para o Trabalho
(Windows, Internet, Word, Excel e PowerPoint), com três turmas cada e um
total de 60 vagas. A inauguração ocorreu em 03 de março de 2008 e o espaço
tinha como objetivo ir além da inclusão digital, conforme explicou Elisabeth
Martucci, que era diretora presidente da FESC, na solenidade de inauguração:
“Os telecentros têm prioridade na inclusão digital da população de baixa renda,
mas também oferecem serviços e oportunidades de negócios, visando o
fortalecimento da microempresa e da empresa de pequeno porte”.
137
Figura 4.9.2. Telecentro de Informação e Negócios – Centro de Inclusão Digital,
Bairro de Santa Felícia, São Carlos, SP. Fonte: ATN, 2008.
A parceria com a ATN compreendeu o atendimento de mais de
80.000 pessoas no período de 2007-2009 nos 34 CIDs/Telecentros
implantados e mais 250.000 pessoas através dos Telecentros implantados ou
atualizados, através da doação de computadores pela Fundação Bradesco.
Uma iniciativa da primeira onda que não concretizou-se como
esperado foi a parceria com a rede de centros de inclusão digital CDI – Comitê
Democrático para Informatica, comandada por Rodrigo Baggio, um
empreendedor social, que na época da proposta de parceria (2007) contava
com 642 Escolas de Informática e Cidadania, em vários estados do Brasil e
198 no exterior, com uma rede de 8.025 computadores doados, em geral, da
iniciativa privada.
O CDI surgiu em 1993 de uma iniciativa do Rodrigo Baggio na
época empresário e professor de informática em escolas particulares do Rio de
Janeiro. Rodrigo Baggio idealizou o uso do computador como um canal de
comunicação entre jovens de diferentes grupos sociais, que dialogariam entre
si através da Internet. Essa idéia deu origem a um BBS (Bulletin Board System)
chamado Jovemlink e constituiu o primeiro passo para o uso das tecnologias
da informação e comunicação como ponte digital, promotora de integração
social. A proposta era de que o BBS ajudasse a promover o diálogo entre os
138
moradores da favela e os do asfalto, no Rio de Janeiro. O serviço chegou a ter
centenas de usuários, mas logo surgiu uma preocupação: quase a totalidade
dos conectados era composta por jovens das classes média e média alta. O
desafio seria, portanto, garantir o acesso das comunidades de baixa renda a
essa tecnologia.
As Escolas de Informática e Cidadania – EIC surgiram dessa
percepção, com uma visão totalmente inovadora: aliar tecnologia à promoção
da cidadania, por meio de reflexões e debates dos alunos sobre a realidade de
suas comunidades. A primeira destas EICs foi no morro Santa Marta, no Rio de
Janeiro, e os resultados foram muito bem avaliados por empresas e por
voluntários participantes, consolidando na criação em 1995 do Comitê para
Democratização da Informática – CDI, um trabalho pioneiro de promover a
inclusão social utilizando a tecnologia da informação. A instituição desenvolve
projetos que atendem a comunidades de baixa renda, públicos com
necessidades especiais, portadores de transtornos psiquiátricos, jovens em
situação de rua, populações indígenas e comunidades carcerárias, entre
outros.
A proposta de parceria com a Fundação Bradesco compreendia a
integração dos CIDs com a rede do CDI, a oferta de cursos através da escola
virtual e o desenvolvimento de tecnologia sociais, no Bradesco Instituto de
Tecnologia – BIT e em parceria com o MIT Media Lab. A figura 4.9.3 ilustra a
proposta de formação da rede.
139
Figura 4.9.3. Proposta de Rede de Colaboração Social – CDI e Fundação
Bradesco. Fonte: CDI, 2007
A Rede Nacional de Inovação Tecnológica para a inclusão social (RENAITIS),
nome dado para a parceria seria composta pelos seguintes pilares:
1. Plataforma virtual de serviços para as escolas físicas oferecer aos
seus educandos e demais usuários: A plataforma para
oferecimento de uma série de serviços que fomentam educação,
diversão, oportunidades de desenvolvimento pessoal (Inclusão
digital, cursos on-line, e-gov etc.).
2. Acompanhamento e monitoramento contínuo do trabalho feito na
rede:
Via virtual: Monitoramento da plataforma virtual (número de
alunos que acessam, cursos realizados etc.) e
moderadores da comunidade de usuários
Via física: Alavancar a capiliaridade da rede do CDI (26
estados do Brasil), através de monitores que realizam
acompanhamento dos cursos e atividades.
3. Comunidade colaborativa entre os gestores das escolas:
- Troca de experiências.
140
- Gestão de conhecimento - melhores práticas.
- Incrementar o senso de pertencimento e de “autonomia” na
rede.
- Conselhos regionais.
4. Comunidade colaborativa de usuários - promover a troca entre
os usuários, com temas de interesse, com assuntos relacionados a educação,
procura de emprego e outros.
A parceria não foi concretizada devido o interesse do CDI, de
assumir a operação dos CIDs da Fundação Bradesco e receber doações do
banco Bradesco para operação do CDI. A proposta do CDI não contemplava a
formação de uma rede e sim da incorporação da rede dos CIDs da Fundação
Bradesco à rede e princípios do CDI.
4.3.2.2 Segunda onda: Parceria com as Comunidades Indígenas
Uma outra iniciativa que teve um impacto significativo nas
comunidades com carência socioeconômica foi o projeto de implantação dos
CIDs em comunidades indígenas, no entorno das escolas da Fundação
Bradesco, que atendem alunos índios e outros que se reconhecem com raízes
indígenas. É o caso da escola de Canuanã (TO), a poucos quilômetros da
reserva dos Javaés, onde a Fundação Bradesco instalou em 2005 um Centro
de Inclusão Digital (CID).
A implantação dos CIDs nas comunidades indígenas teve como
objetivo permitir o acesso as tecnologias da informação e comunicação,
garantindo o acesso aos membros das comunidades, que não tiveram a
oportunidade de estudar nas escolas da Fundação Bradesco, bem como a
disseminação e valorização da cultura entre as comunidades:
idioma/linguagem, os mitos, os rituais, os manejos florestais e ambientais, a
alimentação, as brincadeiras, os jogos e a música. Outro fato relevante
considerado para a implantação dos CIDs foi elevar a autoestima e
141
empoderamento das comunidades indígenas, que naquela época estava
abalada em função de problemas com a bebida, drogas e invasões às reservas
indígenas.
No período de 2004-2010 foram implantados 16 CIDs em
comunidades indígenas, possibilitando o desenvolvimento de vários projetos
com as TICs, para possibilitar intervenções em parceria com as escolas da
Fundação Bradesco, tais como a melhoria da qualidade de vida das aldeias e
da auto-estima dos seus membros. Os projetos tratavam questões como a
cultura, língua, mitos, rituais, manejos florestais e ambientais, alimentação,
brincadeiras, jogos e música. Para divulgar esse trabalho, a Fundação
Bradesco criou um portal na Internet, chamado de “Conhecendo as
Comunidades Indígenas através da Fundação Bradesco”, que permitia às
comunidades a publicação dos projetos e comunicação através de recursos
colaborativos como chat, fórum e videoconferência. Um portal na Internet foi
desenvolvido para publicação de informações sobre as comunidades e
atividades executadas na rede (figura 4.9.4).
142
Figura 4.9.4. Portal da Comunidade Indígena. Fonte: Departamento de
Tecnologia da Informação, Fundação Bradesco, 2006.
A valorização da cultura indígena pela Fundação Bradesco
contribuiu para aproximar a escola das aldeias locais, fortalecendo laços e
reforçando a importância de uma relação de igualdade entre alunos índios e
não índios, uma vez que cada um é incentivado a conhecer, a valorizar e a
respeitar as diferenças culturais do outro.
As comunidades indígenas atendidas compreendiam desde a
comunidade dos Terenas, comunidade dos Lalimas em Bodoquena/MS, dos
Javaés em Canuanã/TO, dos Kaigang em Lomba do Pinheiro (RS), e dos
Tapebas, de origem Tupi-Guarani em Caucaia/CE. Além de acesso à internet
eram oferecidos cursos de digitação e informática básica através da Escola
Virtual, portal de e-learning da Fundação Bradesco criado em 1999 e a
formação de mediadores de aprendizagem em informática, por meio do
programa Intel Aprender. Um dos acontecimentos mais importantes desse
projeto foi a primeira videoconferência realizada entre as comunidades
indígenas apoiadas pela Fundação Bradesco, entre as aldeias de Canuanã/TO
e Lalima/MS, onde tiveram oportunidade de conhecer as respectivas culturas e
discutir os principais problemas de cada comunidade. A comunidade do
Lalimas constratava com as dos Javaés em Canuanã, por já estarem incluídos
em relação à cultura e aos costumes urbanos, além de estarem localizados nas
proximidades das cidades de Miranda/MS e Bodoquena/MS. A comunidade
dos Javaés ficava na Ilha do Bananal, considerada a maior ilha fluvial do
mundo, com cerca de vinte mil quilômetros quadrados de extensão (1.916.225
hectares), cercada pelos rios Araguaia e Javaés e localizada a mais de 250 Km
da cidade de municípios de Formoso do Araguaia/TO. Portanto o nível de
influência da zona urbana era menor, possibilitando a conservação da cultura,
idioma e costumes.
143
Figura 4.9.5. CID da comunidade dos Javaés, Ilha do Bananal, Canuanã,
Formoso do Araguaia/TO. Fonte: Departamento de Tecnologia da Informação,
Fundação Bradesco, 2006.
O CID implantado na cidade de São Gabriel da Cachoeira/AM, em
2010, a 800 km de Manaus/AM, em parceria com a Cisco do Brasil, British
Telecom e Microsoft teve como objetivo possibilitar a inclusão digital da
população local, composta por cerca de 95% de indígenas, onde as línguas
predominantes, além do português, são o Tukano, Baniwa e Nheengatú. Ao
todo, são 23 etnias e 16 idiomas falados na região.
A localização da cidade de São Gabriel da Cachoeira no mapa do
Brasil não é difícil. O município é o 3º maior do país com uma área equivalente
a duas vezes e meia o estado do Rio de Janeiro. Cravado no extremo noroeste
do estado do Amazonas, seus limites desenham quase com perfeição a cabeça
de um cachorro de perfil, na região de fronteira do Brasil com a Colômbia e a
Venezuela. O acesso e a locomoção na região, no entanto, são mais
complicados. Não há estradas para Manaus e a principal alternativa são barcos
que levam em média três dias para subir o rio Negro da capital amazonense
até lá e através de aviões, com um aeroporto localizado em uma base militar.
De São Gabriel para regiões como a cabeceira do rio Içana, a viagem podia
durar mais de 20 dias, dependendo do nível dos rios.
144
A inclusão digital para a população de São Gabriel da Cachoeira
não significava deixar arco e flecha ou hábitos milenares para se aventurar com
mouse e teclado. Na época da inauguração a maioria dos jovens gabrielenses
que concluía o ensino médio, buscava o ingresso em faculdades, cursos
técnicos e também trabalhava em órgãos públicos da cidade ou no comércio
local. Um exemplo era a instrutora do Centro de Inclusão Digital (CID), Maria
de Loreta Alencar, indígena tukano, que faz a faculdade de Análise e
Desenvolvimento de Sistemas na Universidade do Estado do Amazonas (UEA)
à distância. "Entrei tarde na faculdade, com 23 anos", diz Maria.
O prefeito de São Gabriel da Cachoeira em 2010, Pedro Garcia, da
etnia tariano, era mais enfático em relação a questão indígena "Nós sabemos
mais do que vocês. Falamos a sua língua e conhecemos sua história...". A
afirmação não é agressiva, considerando-se o contexto: o primeiro prefeito
indígena do Brasil conta que até a naturalidade com que os indígenas se
identificam hoje pela etnia é resultado de mudanças que começaram no fim dos
anos 80. "Naquele tempo, as pessoas preferiam dizer que eram caboclos, do
que dizer que eram dessa ou daquela etnia", diz. "Não entendiam que a
diferença era que os não indígenas apenas se especializavam mais. Por muito
tempo, o ensino escolar indígena era limitado", lamentava. Pedro Garcia
lembrava que nos primeiros anos de militância do movimento indígena, houve
muita resistência interna. Algumas pessoas acreditavam que essa valorização
da identidade levaria a região a um retrocesso, com fechamento do comércio e
das escolas para a retomada do modo de vida antigo. "Quanto mais
conhecimento tivermos, o mundo fica menor e cabe na nossa mão. O diálogo
aumenta o compartilhar de conhecimento", afirma, explicando o motivo do
convite oficial à Fundação Bradesco para a instalação do CID no município.
"Tínhamos outras opções de projetos para oferecer acesso à internet para a
comunidade, mas consideramos a ação da Fundação Bradesco mais completa
por oferecer capacitações."
O Centro de Inclusão Digital, desde a sua inauguração funciona em
três períodos e está adequado de acordo com as necessidades da
comunidade, tendo disponibilidade também para os alunos da escola Dom
145
Miguel Alagna, onde está localizado o CID e de outras unidades de ensino de
São Gabriel da Cachoeira. Além de fornecer os equipamentos (20
computadores, impressora, scanner e no-break), a Fundação Bradesco será
responsável por manter o CID na sua rede de centros de inclusão digital e pelo
oferecimento de cursos através da escola virtual, cabendo à Prefeitura manter
seu funcionamento de forma a atender democraticamente toda a comunidade.
A British Telecom (BT) foi a responsável na época da implantação pela
conexão à Internet, tendo um link dedicado e o monitoramento constante. A
Microsoft, outra empresa parceira foi a responsável pelo licenciamento dos
softwares.
Uma frequentadora que caracterizava o perfil de atendimento no CID
no primeiro ano de funcionamento era Sileusa Menezes Monteiro, que deixou a
comunidade de Taracuá para viver com a família na cidade de São Gabriel da
Cachoeira, a dois dias de barco de sua terra natal e 850 quilômetros de
Manaus. Seus pais são de etnias diferentes: o pai é dessano e a mãe, tukano -
exemplo da diversidade cultural da região do Alto Rio Negro no extremo
noroeste do Amazonas, onde convivem 23 grupos indígenas, que falam 19
línguas. O município de São Gabriel da Cachoeira abriga mais de 400
comunidades indígenas. A cidade é o polo político, comercial e logístico para
cerca de 40 mil habitantes, sendo 96% deles indígenas.
As distâncias amazônicas são um desafio constante para o
município de São Gabriel da Cachoeira. A logística para abastecer com
merenda as escolas do interior, por exemplo, lembra uma operação de guerra.
A nutricionista Amanda de Paula Pereira que em 2010 servia como tenente do
Exército em São Gabriel e há mais de dois anos trabalhava na Secretaria
Municipal de Educação e Cultura. Segundo ela, foi preciso elaborar um
cardápio diferente para as comunidades mais distantes. Apenas quatro, das
220 escolas municipais, ficam na cidade. "Substituímos frios e congelados por
produtos enlatados. Então precisamos compensar as perdas nutricionais." Uma
das formas de equilibrar a dieta dos estudantes são os produtos locais.
146
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece
que 30% da merenda seja regional. Produtos como açaí, farinha, peixe
moqueado (defumado artesanalmente) e beiju são comprados de associações
e pequenas cooperativas. "Pode servir bolacha, leite, o que for. O que as
crianças mais gostam é do açaí e do xibé", diz Maria Suely de Andrade
Ambrósio, pedagoga. Embora a oferta de alguns produtos regionais sofra com
a sazonalidade, a maior dor de cabeça é com os industrializados que vêm, em
sua maioria, de Manaus. "Precisamos ficar sempre cobrando os fornecedores,
para evitar atrasos e desabastecimento", conta Amanda.
O primeiro computador da família de Sileusa foi comprado em 2008,
quando sua irmã entrou na faculdade. Este ano, Sileusa foi aprovada no
vestibular para economia, oferecido via satélite a partir de Manaus. Motivada
pela vontade de "conhecer mais do mundo lá fora e crescer na vida
profissional", ela foi uma das 20 pessoas a se matricular no primeiro curso
oferecido pela Fundação Bradesco no Centro de Inclusão Digital - o que faz
cada vez mais sentido para os povos da região, tão acostumados a superar
distâncias.
O espaço físico do CID foi cedido pela prefeitura em uma escola
pública, onde a Fundação realizou em 2010 600 atendimentos. Desde então
(até Outubro de 2004) estavam disponíveis para a comunidade 310 cursos,
desenvolvidos pela instituição e por parceiros nacionais e internacionais, como
o Bradesco, MIT, Microsoft e Cisco Systems, em áreas variadas, como
informática, rede de computadores, língua inglesa (parceria com a Global
English) e investimento no mercado de ações (Bradesco). Para acessar o
conteúdo da escola virtual via internet, o CID conta com um link via satélite de
1.5 Mbps instalado pela British Telecom. A velocidade pode parecer
convencional, mas equivale a 25% da banda total que o maior provedor de
acesso da cidade distribui para mais de 100 clientes. "Poucas pessoas podem
ter internet em casa. É muito caro. Mas aqui podemos conhecer mais do
mundo e crescer profissionalmente", comemora Sileusa, que tinha acesso à
internet somente no trabalho.
147
Os computadores do CID foram doados pela Fundação Bardesco,
após a substituição de um lote de 70 mil PCs pelo banco. Antes de chegarem
ao Amazonas, os equipamentos foram reformados pela Planac Informática,
empresa parceira do projeto. A maioria dos cursos é oferecida sem tutoria, e
podem ser acessados pelos usuários do CID no laboratório de informática ou
de outro local, e escolhidos de acordo com o interesse de cada um. As
capacitações são programadas pela Fundação Bradesco, que prepara os
instrutores locais e oferece acompanhamento às turmas por telefone e internet.
Figura 4.9.6. Centro de Inclusão Digital – Escola Municipal Dom Miguel Alagna,
São Gabriel da Cachoeira, AM, 2010. Fonte: Autor.
Um frequentador do espaço em 2010 foi Melvino Fontes Olimpio, da
etnia baniwa, que trabalhava como assistente administrativo em um órgão
público. Antes de matricular-se no CID ele havia feito cursos básicos de
informática e usava o computador no trabalho. Melvino acreditava que o curso
iria abrir novas oportunidades de trabalho. "O reconhecimento internacional é
importante, porque torna possível uma experiência profissional em Manaus ou
até fora do Estado", diz. Outro frequentador do espaço Leonardo Augusto
Soares, de Manaus, cursou quatro módulos da Cisco Academy na Fundação
Bradesco e obteve na primeira tentativa a certificação Cisco Certified Network
Associated (CCNA). Trabalhou por três anos como analista de infraestrutura de
rede em uma multinacional e hoje divide seu tempo entre o cargo de analista
de sistemas do Tribunal de Justiça do Amazonas e consultorias a empresas
que prestam serviços de rede na Zona Franca de Manaus. "No CID, eu aprendi
na prática muita coisa que na faculdade só via na teoria", conta Leonardo. "Se
148
eu falo no Japão que sou certificado com CCNA, as pessoas sabem o que é e
me valorizam", ressaltava na época.
Uma inciativa complementar da Fundação Bradesco à implantação
do CID em São Gabriel da Cachoeira foi o desenvolvimento em 2011 de um
software (driver) para o teclado dos computadores tratarem os caracteres
especiais dos idiomas falados na região, para a escrita em baniwa, tukano e
nheengatu, que representam os principais troncos linguísticos dos povos da
região, onde se falam ao todo 19 línguas diferentes. Outra iniciativa importante
foi a oferta do curso básico de informática, Windows, Word e Excel nas três
línguas indígenas oficiais.
Com relação ao idioma falado na região de São Gabriel da Cachoeira,
nas escolas a escolha é da família dos alunos e na maioria das vezes o
português fica como segundo idioma. Na cidade, as escolas estaduais ensinam
tukano, mas algumas têm optado pelo espanhol, enquanto as municipais
ensinam o nheengatu. O nheengatu, ou língua geral, falada pelo povo Baré,
predomina nas comunidades às margens do Rio Negro. A língua, no entanto, é
artificial. Foi criada pelos jesuítas e portugueses no século XVII, baseada na
pronúncia e no vocabulário dos tupinambás e emprestando, do português e do
espanhol, a estrutura gramatical e conceitos desconhecidos aos indígenas. O
nheengatu chegou a ser o idioma predominante no território brasileiro até o
declínio das missões jesuítas. Na Amazônia, a língua continuou a ser usada na
comunicação entre indígenas, brancos e etnias diferentes. Povos como os
Barés, que perderam sua língua original, adotaram o nheengatu, que passou a
ser também um importante elemento de afirmação cultural. No Alto Rio Negro é
o português que cumpre a função de língua para brancos e indígenas. Na
opinião de Melvino Baniwa, que fala nheengatu, a informática vai permitir novas
formas de interação entre as línguas.
149
4.3.2.3 Identificação do nível de maturidade da Segunda Geração de
Centros de Inclusão digital.
A segunda geração de centros de inclusão digital teve como objetivo a
formação de uma rede de inclusão digital que permitisse tanto a geração de
sustentabilidade financeira, como o compartilhamento de projetos e iniciativas de
interesse comum das comunidades. As duas ondas dessa geração foram
caracterizadas, respectivamente, pela parceria com Associação dos Telecentros
dos Negócios (ATN), para a geração de sustentabilidade financeira, e pela
formação da rede de comunidades indígenas, para permitir a troca de
experiências comunitárias e disseminação das culturas entre as comunidades.
A Fundação Bradesco teve um papel fundamental na articulação da
parceria com a ATN para a oferta de cursos e expansão do atendimento às
comunidades carentes, mas a geração de sustentabilidade financeira para os
CIDs foi parcial, devido a falta de condições mínimas para a busca de
sustentabilidade, conforme o já mencionado framework de sustentabilidade da
ATN. A oferta de serviços foi limitada devido a falta de infraestrutura adequada,
localização dos CIDs (area não comercial e sem segurança), falta de uma
liderança para a formação de uma empresa prestadora de serviços e a
documentação irregular e incompleta da maioria dos CIDs. No período de 2007-
2009, somente 48 CIDs, de uma rede de 183, fizeram parte da rede dos
Telecentros de Negócios da ATN e nenhum deles conseguiu, efetivamente,
prestar serviços para a geração da autonomia, ou seja, da redução da
dependência da Fundação Bradesco e para a sustentabildde financeira.
A parceria com a ATN, que apresentava um potencial de sinergia
muito grande, trouxe resultados colaterais como a ampliação da rede da ATN e
a atualização do parque tecnológico dos Telecentros que já estavam em
operação.
Com relação à segunda onda, a rede das comunidades indígenas
implantada no período de 2004-2010 apresentou resultados significativos em
relação a utlização das TICs e ao treinamento dos membros das comunidades;
150
contudo, ficou claro que sua continuidade e permanência do projeto exigiriam a
definição de novas estratégias por parte da Fundação Bradesco. O desejo
inicial de formação da rede de comunidades indígenas era ir além da chamada
inclusão digital, criando a autonomia, a busca das melhores práticas de outras
comunidades e a geração de renda, através da venda de produtos locais ou do
entorno dessas comunidades. Duas delas, contudos, conseguiram ira além da
inclusão digital - as comunidades dos Javaés/TO e dos Terenas/MS, graças ao
acompanhamento sistemático das escolas da Fundação Bradesco e ao apoio
de Universidades parceiras, como será relatado na descrição na análise da 3a
geração de inclusão digital.
Considerando as iniciativas realizadas e os resultados obtidos, o autor
classifica a segunda geração de inclusão digital no nível 3, Integração Inicial, de
acordo com o framework de maturidade de inclusão digital (Figura 4.9.7):
Colegiado de lideranças sociais promovendo o engajamento da
comunidade: tanto os CIDs em parceria com a ATN, como a
rede das comunidades indígenas tiveram iniciativas com a
participação efetiva dos membros das comunidades, tanto nos
treinamentos oferecidos pela Escola Virtual, como na discussão
da problemática social de cada comunidade. A integração com a
rede da ATN e as comunidades são os resultados na segunda
geração período 2004-2010, classifico a primeira geração de
centros de Inclusão Digital (CIDs) no nível 2, de acordo com o
framework de maturidade de centros de inclusão digital, ou seja,
com iniciativas emergentes e considerando a implantação do
Computer Clubhouse como início do movimento em busca do
nível 3 (integração inicial).
Mapeamento e priorização das demandas sociais: as demandas
socias puderam ser mapeadas parcialmente.
Ausência de Plataformas colaborativas e de comunicação.
Articulação coletiva de projetos para atendimento das demandas
sociais.
151
Figura 4.9.7. Nível de maturidade da segunda geração de inclusão digital.
Fonte: Elaborado pelo autor, de acordo com o framework de inclusão digital.
4.3.3 Terceira Geração: Rede de Tecnologia Social
4.3.3.1 Terceira Geração de Inclusão Digital, primeira onda: Projeto “A
cidade que a gente quer”.
A Fundação Bardesco, no período 1999 a 2002, participou de vários
encontros e reuniões realizadas no Media Lab – Massachusetts Institute of
152
Technology (MIT), com o objetivo de conhecer projetos inovadores, entre os
quais aqueles relacionados ao consórcio Digital Nations. Na época, o consórcio
era formado por um grupo de pesquisadores dedicados ao desenvolvimento de
aplicações da tecnologia social, em busca da melhoria da inclusão social, em
países em desenvolvimento. Em 2002, a Fundação Bradesco tornou-se
membro do consórcio Digital Nations, implantando um de seus projetos,
denominado “A Cidade que a Gente Quer”.
O projeto era coordenado pelo pesquisador David Cavallo,
especialista na interação entre tecnologia e aprendizagem, e envolvia a
participação dos membros do grupo de pesquisas liderado por ele e Seymour
Papert (denominado “Future of Learning Group”). O grupo era composto por
alunos de mestrado e doutorado, visando a reforma de ambientes de
aprendizagem e sistemas educacionais, bem como o estudo de como a
tecnologia pode auxiliar no processo de ensino e aprendizagem e a
transformação social do entorno onde as escolas estavam localizadas.
A Fundação Bradesco implantou em 28 das suas 40 escolas, o
projeto “A Cidade que a Gente Quer”, no período de 2002 a 2004, coordenado
pelo próprio David Cavallo e pelo autor do presente trabalho que, na época, era
o Gerente de Tecnologia Educacional da Fundação Bradesco.
A proposta inicial do Projeto “A Cidade que a Gente Quer” era o
desenvolvimento de competências nos alunos da educação básica, membros
dos centros comunitários e dos centros de inclusão digital, para a busca de
soluções para as demandas sociais básicas e melhoria da inclusão social. Os
projetos compreendiam iniciativas nas áreas de segurança, saúde, higiene,
infraestrutura sanitária, mobilidade urbana e utilização otimizada dos recursos
naturais, combinados com os conceitos da sustentabilidade socioambiental.
A metodologia de implantação compreendeu a formação dos
professores, alunos multiplicadores e membros das comunidades no entorno
das escolas da Fundação Bradesco, bem como de professores das escolas
públicas pertencentes a essas comunidades. As oficinas foram oferecidas pelo
153
pesquisador David Cavallo e seus alunos do MIT nas escolas de
Bodoquena/MS, Campinas/SP, Osasco/SP, Salvador/BAJ e Manaus/AM.
Durante a realização das oficinas, os participantes diagnosticaram
os problemas e potenciais soluções para suas respectivas cidades, planejaram
e desenvolveram modelos tecnológicos, documentaram todas as etapas do
projeto e apresentaram os resultados, tendo como referência o princípio da
cidade ecologicamente sustentável. Para esse fim, os participantes
mobilizaram, de forma associada, os conhecimentos de várias disciplinas,
ampliaram o uso de computadores para a realização de pesquisas e criaram
linguagens para expressar coisas, idéias complexas e dinâmicas, tendo sempre
como referência os problemas do seu cotidiano. Em síntese, através da análise
dos problemas de seu bairro e de sua cidade, os participantes desenvolviam
idéias, buscavam argumentos coerentes e dados científicos para a proposição
de soluções para aqueles problemas.
A praxis pedagógica do projeto “A Cidade que a Gente Quer” foi
baseada no contrucionismo, derivada da teoria Piagetiana do construtivismo. O
projeto tinha por objetivo criar um ambiente de aprendizagem enriquecedor, de
interesse dos participantes, em que uma diversidade de materiais e
tecnologias, tanto tradicionais com novas, seriam utilizadas para a expressão
das idéias. Para tanto, os participantes precisariam aprender e pôr em prática
ideias de todas as áreas do currículo (CAVALLO, 2002). Dessa forma, os
professors, alunos e demais participantes tinham a oportunidade de identificar
a problemática social da comunidade local e se apropriar dos recursos
tecnológicos, para criar adaptações e aplicações visando à resolução de
problemas. Os principais objetivos do projeto “A Cidade que a Gente Quer”,
podem ser sumarizados em:
• Possibilitar aos alunos e demais participantes aprender a
aprender, utilizando diversos materiais e tecnologias (novos e
tradicionais) para expressar suas idéias;
• Permitir a reflexão quanto à busca de propostas voltadas à
resolução de problemas relacionados à comunidade local;
154
• Possibilitar aos alunos construir, criar, simular, modelar, refletir,
estudar e apresentar soluções para as situações-problema;
• Possibilitar o exercício da responsabilidade e da cidadania por
meio do desenvolvimento de projetos embasados em
problemáticas locais;
• Criar uma rede que envolvesse as relações entre professor x
professor, professor x aluno e aluno x aluno;
• Criar um ambiente de aprendizagem que promovesse a inovação
e a criatividade;
• Aprofundar os estudos sobre as teorias de aprendizagem que
subsidiavam o projeto;
• Incentivar o compartilhamento das soluções encontradas pelos
alunos com a comunidade escolar e local, entre outras ações.
A proposta do projeto estava embasada na abordagem teórica do
design emergente, ou seja, voltada à investigação de como a escolha da
metodologia de design contribui para o sucesso ou não das reformas
educacionais. Desenvolve-se, assim, uma prática de antropologia
epistemológica aplicada que consiste no levantamento de habilidades e
conhecimentos existentes em uma dada comunidade e a sua utilização, como
ponte para novos conteúdos (CAVALLO, 2003). De acordo com essa proposta,
os alunos constroem modelos computacionais com o objetivo de demonstrar
como pensam em melhorar a cidade em que vivem. Nesse sentido, podem
trabalhar com problemáticas da comunidade local ou, se preferirem, com ideias
desejadas, viáveis ou não naquele momento, como criar espaços públicos
interativos e de entretenimento, transporte de baixo custo, dinâmico e limpo,
parquinhos etc. (CAVALLO, 2002).
O grupo multiplicador formado nas oficinas oferecidas pelo David
Cavallo e equipe era responsável pela disseminação da metodologia em suas
respectivas escolas, centros comunitários e escolas públicas próximas das
escolas da Fundação Bradesco.
155
As TICs exerciam um papel fundamental no desenvolvimento do
projeto “A Cidade que a Gente Quer”, como também, na elaboração do Diário
de Bordo, que possibilitava aos alunos o registro de cada passo do
aprendizado. Os produtos eram criados para expressar idéias e/ou soluções
para os problemas levantados, e resultavam de reflexões sobre o processo, o
que levava à construção/reconstrução de conhecimentos, bem como à
depuração dos erros e redução de sua recorrência. De modo análogo, o
professor, com base no Diário de Bordo criado pelo aluno, podia entender o
processo de construção do conhecimento, seus equívocos e avanços,
retomando os objetivos, replanejando as ações, reorientando os caminhos etc.
Durante o desenvolvimento do projeto, os alunos eram instigados a
diagnosticar os problemas relacionados ao entorno da escola (cidade, bairro,
rua, escola etc.), a pensar em como resolvê-los e a apresentar suas idéias,
sempre utilizando tecnologias de informação e comunicação - TIC.
As ferramentas utilizadas eram baseadas nos Kits da Lego
Mindstorm (RCX - Robotic Command Explorer), desenvolvidos pelo Prof.
Mitchel Resnick no MIT Media Lab em 1998, e pelo Kit de soluções baseadas
da Placa GOGO desenvolvidas, em 2001, pelo Prof. David Cavallo e seus
alunos na época de mestrado Arnan Roger Sipitakiat e Paulo Blikstein, este
brasileiro e atualmente (Outubro de 2014) Professor da Universidade de
Stanford, Diretor do Centro Lemann de Estudos Brasileiros de Stanford e
considerado um dos maiores especialistas mundiais em tecnologia
educacional.
A placa GoGo (figura 4.9.8) era uma interface de I/O
(Entrada/Saída) de baixo custo, conectada a computadores, que permitia o
monitoramento de sensores (contato, luz, temperatura etc.) e o acionamento de
motores, relés, Leds e outros dispositivos. As aplicações possíveis com essa
interface incluiam o monitoramento ambiental, automação residencial, design
de games, escultura e arte interativa. O Logo Cricket era um software utilizado
para armazenar os comandos na memória do controlador, sem a necessidade
de estar conectado a um computador.
156
Figura 4.9.8. Placa GOGO. Fonte: Roger Sipitakiat, Ggrupo Learning Hub, MIT
Media Lab (2002).
O Lego Mindstorm (figura 4.9.9) era um controlador programável que
permitia às crianças e jovens interagir com o mundo físico através de sensores
e motores e também construir e programar seus próprios robôs e outros
aparelhos computadorizados.
157
Figura 4.9.9. Lego Mindstorm. Fonte: Mitchel Resnick, MIT Media Lab (2.000)
O projeto “A Cidade que a Gente Quer” foi implantado inicialmente
em 2002, com 5 unidades escolares da Fundação Bradesco, localizadas em
Campinas/SP, Osasco/SP, Manaus/AM, Bodoquena/MS e Salvador/BA. No
período de 2003 e 2004, ele foi estendido para mais 23 escolas, com destaque
para os seguintes projetos:
Escolas Projetos Participantes Comunidades
impactadas
Canuanã/TO 1. Redução do
desperdício de
água.
2. Destinação do
Alunos do ensino
fundamental,
ensino médio,
membros do CID
Escola da
Fundação
Bradesco, Aldeia
dos Javaés e
158
lixo.
3. Circulação do ar
nos alojamentos
dos alunos.
4. Segurança no
trânsito –
Rodovia TO-
238.
e das
comunidades no
entorno.
comunidade de
pequenos
agricultores.
Manaus/AM 5. Cerca de
controle contra
a emissão de
lixo nos
igarapés.
6. Geração de
emprego
através da
coleta seletiva
de resíduos
sólidos.
Alunos do ensino
fundamental,
ensino médio,
membros do CID
e das
comunidades no
entorno.
Comunidades e
moradores no
entorno da
escola.
Rio de
Janeiro/RJ
7. Transporte
coletivo com
acessibilidade
8. Conscientização
sobre o lixo na
comunidade.
9. Filtro de água
com material
reciclado.
Alunos do ensino
fundamental,
ensino médio,
membros do CID
e das
comunidades no
entorno.
Comunidades e
moradores no
entorno da
escola.
Gravataí/RS 10. Lixeira
Eletrônica
11. Controlador
eletrônico de
Alunos do ensino
fundamental,
ensino médio,
educação
Comunidades e
moradores no
entorno da
escola.
159
água profissional,
membros do CID
e das
comunidades no
entorno.
Quadro 4.3.9.2: Relação de Projetos da Cidade que a Gente Quer. Fonte:
Escolas da Fundação Bradesco (relatório de atividades).
Um projeto a destacar, da Escola de Manaus e da Comunidade da
Sapolândia, foi a “Cerca de controle contra a emissão de lixo nos igarapés”,
chamado de “Cerquinha”, que foi premiado, em 2002, na Feira da FUCAPI
(Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica) e CNPQ, na
categoria de Tecnologia, Revelação e Criatividade. Outro premio obtido foi, em
2004, na Feira Brasileira de Tecnologia 2004 (FEBRACE), com o prêmio
“Criatividade e Inovação” com o Lego Dacta.
O projeto foi desenvolvido pelas 8as séries e em parceria com a
comunidade de Sapolândia, bairro carente no entorno da escola, com
acompanhamento dos professores de geografia, arte e
tecnologia/informática, no período de março a agosto de 2002. A proposta
do projeto surgiu através da análise da situação das pessoas que moravam
nas margens e sobre os igarapés de Manaus, principalmente dos que
moram no igarapé “Sapolândia”, que fica nas proximidades da Escola
Fundação Bradesco.
O tema do projeto estava relacionado aos estudos que estavam
sendo realizados pela escola para compreender a situação de pobreza e os
problemas causados pelo lixo àquela população. A situação do lixo na
cidade de Manaus apresentava diversos problemas, desde o assoreamento
do curso d’água, até a produção de gases prejudiciais a saúde das
pessoas, além da proliferação de bactérias e fungos, causadores de
doenças respiratórias. O problema ambiental e a vida dos moradores que
160
habitavam o igarapé “Sapolândia” foram a fonte de origem do Projeto
Cerquinha, uma das soluções para o problema da geração de lixo. Este
projeto tinha relevância social e, ao mesmo tempo, ambiental, apresentando
uma alternativa possível não só aos moradores das proximidades da
Escola, mas também a toda cidade de Manaus, podendo ser estendido a
outras cidades ou Estados. A importância científica do projeto estava na
criatividade de resolução de problemas de cunho sociais e ambientais,
possibilitando aos moradores uma forma de aquisição de recursos
financeiros com o aproveitamento do lixo, pelo processo de reciclagem.
Assim sendo, o Projeto Cerquinha procurava soluções viáveis no sentido da
melhoria da qualidade de vida das pessoas, principalmente daquelas que
moravam e viviam sobre o igarapé Sapolândia.
O processo de elaboração do projeto foi dividido em duas etapas,
sendo que, na primeira, os alunos fizeram uma pesquisa de campo para
observar a questão do lixo e poluição do igarapé da Sapolândia, onde
entrevistaram alguns moradores da área. Toda as informações coletadas
durante a pesquisa foram inseridas em um relatório. Na segunda etapa, os
alunos, com base nas informações obtidas através da pesquisa de campo,
começaram a criar soluções para resolver a questão do lixo e poluição do
Igarapé da Sapolândia (figura 4.9.9.1), utilizando Lego Dacta para desenvolver
mecanismos tecnológicos capazes de promover a limpeza do igarapé e
melhorar a qualidade de vida dos moradores da área. A solução foi implantada
da seguinte forma: cada morador era responsável por uma respectiva área,
onde a cerca seria implantada contendo um sensor detector de materiais não
biodegradáveis. Essas cercas eram padronizadas de forma a não impedir o
fluxo normal das águas.
A presença de materiais não biodegradáveis nas águas acionava um
sensor e um alerta sonoro era emitido para indicar a presença de lixo na área
delimitada pela cerca. No final de cada semana, o lixo selecionado era coletado
e vendido para uma empresa e os lucros revertidos em benefícios para a
própria comunidade. O critério de avaliação utilizado durante as duas etapas do
trabalho foi baseado na observação do professor no interesse e participação
161
dos alunos em todo o processo de construção, bem como na verificação da
capacidade de mobilização dos alunos, para garantir melhores condições de
vida para a população da Sapolândia, em conjunto com os frequentadores do
centro comunitário.
Um dos resultados mais importantes obtido com esse projeto foi o
despertar do interesse da comunidade local em preservar o Igarapé da
Sapolândia, reduzindo o descarte de lixo em suas margens e promovendo,
assim, uma melhor qualidade de vida dos “ribeirinhos”. Os alunos tiveram uma
experiência significativa de como a tecnologia pode melhorar a qualidade de
vida das pessoas, além da valorização do meio ambiente e da importância da
integração e mobilização da comunidade em busca de soluções que sejam de
interesse comum.
Figura 4.9.9.1. Poluição dos Igarapés na comunidade de Sapolândia,
Manaus/AM. Fonte: Fundação Bradesco, Escoal de Manaus, 2002.
162
Figura 4.9.9.2. Workshop de desenvolvimento do Projeto Cerquinha, com o
Prof. David Cavallo. Fonte: Escola Fundação Bradesco Manaus, 2002.
163
4.3.3.2 Terceira geração de Inclusão Digital, segunda onda: Parceria
com o MIT D-Lab e USP/Poli Cidadã
4.3.3.2.1 Parceria com o MIT D-LAB – Development Laboratory
O D-Lab é uma iniciativa do MIT para o desenvolvimento de projetos
sociocomunitários para países em desenvolvimento, em conjunto com o MIT
Centro de Edgerton, MIT Centro de Serviço Público e MIT Media Lab. O D-Lab
é composto por uma série de cursos e trabalhos de campo para estudantes de
graduação e pós-graduação e tem como objetivo criar oportunidades de como
aprender sobre o desenvolvimento de tecnologias apropriadas para regiões
carentes, de como ser capaz de colaborar com organizações que trabalham
diretamente com as comunidades carentes e, também, de como fazer as
conexões entre o conhecimento adquirido no MIT e os desafios sociais,
culturais e econômicos encontrados na prática.
O D-Lab: Desenvolvimento é parte de uma série de cursos e viagens
de campo que preparam os alunos para responder às necessidades básicas
das famílias de baixa renda e comunidades em países em desenvolvimento,
com soluções tecnológicas que são baratas, ecologicamente sustentáveis e
capazes de serem implantadas no contexto de cada localidade. Os cursos
apresentam várias noções de desenvolvimento e exploram várias inovações
tecnológicas que melhoram a qualidade de vida dessas comunidades. O curso
também prepara os alunos para se concentrarem em questões específicas,
como a necessidade de água potável, equipamentos de processamento
agrícola de baixo custo, saneamento básico e energia a preços acessíveis,
especialmente nas comunidades onde os alunos irão viajar durante o IAP
(período de atividades de campo do MIT). Os projetos são desenvolvidos com
parceiros locais, como universidades, escolas, ONGs e empresas, com a
finalidade de possibilitar que as viagens de campo possam criar oportunidades
de aprendizagem e o desenvolvimento de uma rede social internacional para
testar a viabilidade das soluções tecnológicas.
164
O desenvolvimento dos projetos começa com uma compreensão
histórica de porque os esforços de desenvolvimento convencionais não têm
melhorado a qualidade de vida das famílias e das comunidades de baixa renda.
Isto é seguido por uma série de workshops práticos em que os alunos
aprendem abordagens práticas para tratar essas questões. Estes workshops
são intercalados com debates e estudos de caso, liderados pelos membros da
equipe do curso e convidados que já desenvolveram e implementaram
soluções tecnológicas em áreas temáticas específicas, tais como: energia,
sistemas de iluminação, tecnologias agrícolas, habitações de baixo custo,
água, saneamento, microempresas e saúde.
A discussão dos estudos de caso, também oferece aos alunos a
oportunidade de selecionar as áreas problemáticas que serão tratadas nas
viagems de campo, chamada de IAP. A terceira parte do curso é focado na
preparação para a viagem de campo, sensibilizando os alunos para as
realidades do trabalho de campo em ambientes desconhecidos e discutindo
como construir relações duradouras com as comunidades, para prosseguir com
o processo de colaboração no futuro. Os alunos trabalham em pequenos
grupos que estudam a história, cultura, língua, economia e política das
comunidades que pretendem visitar durante a IAP (países como Gana, Brasil,
Honduras e Índia), para entender o contexto em que as suas inovações
tecnológicas poderiam ser aplicadas nas comunidades com carência
socioeconômica.
165
Figura 4.9.9.3. Site do MIT D-Development – Fonte: Acessado em 22 de
Outubro de 2014.
O processo de design utilizado nas iniciativas do D-Lab é uma arte e
uma ciência e está presente em diversas disciplinas. A maneira fundamental de
olhar para um projeto de engenharia é a iniciativa de criação de uma solução
para um determinado problema, conforme informa Amy Smith, professora e
idealizadora do curso. As opções de engenharia chamadas de "força bruta",
onde os recursos são, basicamente, ilimitados, muitas vezes atendem aos
critérios para solução de problemas, mas em algum lugar haverá uma solução
completa, que, além de simples, é de baixo custo e de fácil aplicação. Pode-se
levar muito tempo para chegar a essa solução, mas a busca contínua para
encontrá-la pode valer todo o esforço alocado ao projeto. O processo de
criação de soluções é, geralmente, considerado como sendo uma combinação
166
das seguintes fases, de acordo com Leo Burd, pesquisador brasileiro do D-Lab
e responsável em trazer o D-Lab para o Brasil:
• Coleta de informações
• Enquadramento do problema
• Definição dos requisitos de design
• Ideias geradoras
• Análise e experimentação
• Avaliação do conceito
• Projeto detalhado
• Fabricação
• Testes e avaliação
O processo de design não é um processo linear, conforme informava
Leo Burd, pesquisador do D-Lab e pode ser idealizado como um círculo ou
como uma espiral: é necessário percorrer muitas vezes o ciclo de criação para
obter uma boa solução. A experiência tem mostrado que quanto mais tempo é
gasto nas etapas iniciais do projeto, as fases posteriores ficam mais fáceis de
serem completadas, no prazo e custo inicialmente previstos. O percurso
completo é realizado várias vezes de modo a obter feedbacks contínuos para a
melhoria do processo, o que leva, geralmente, a um melhor produto ou
solução. A velocidade de completar o círculo de design dependerá da
experiência do desenvolvedor que pode obter feedback e resultados mais
rápidos.
167
Figura 4.9.9.4. Ciclo de Design do D-Lab. Fonte: MIT D-Lab – Leo Burd , 2004
O D-Lab começou a operar no Brasil em 2004, com o
desenvolvimento de projetos junto às favelas no Rio de Janeiro e, em 2005,
com as comunidades indígenas próximas à Canuanã, em Tocantins, esta
última em parceria com a Fundação Bradesco. A preocupação inicial de trazer
o projeto ao Brasil, segundo Leo Burd, era aquela de formar boas parcerias
com instituições que pudessem apoiar as inciativas do D-Lab e dar
continuidade aos projetos após a volta dos alunos para o MIT, bem como
identificar novos desafios técnicos que pudessem ser tratados pelos alunos.
A Fundação Bradesco, que já tinha desenvolvido com o MIT Media
Lab o projeto “A Cidade que a Gente Quer”, identificou na iniciativa do D-Lab
uma oportunidade de desenvolver a tecnologia social, com soluções
inovadoras e de baixo custo, nas comunidades carentes onde as suas escolas
e CIDs estavam localizados, onde se poderia articular a participação e o
engajamento dos membros das comunidades, em busca da solução de
problemas sociais e da melhoria da mobilidade social.
A parceria da Fundação Bradesco com o D-Lab ocorreu no período
de 2004 a 2009, tendo a coordenação do departamento de tecnologia da
Informação da Fundação Bradesco e contando com a participação de outras
instituições parceiras, como a USP através do programa Poli Cidadã. A
168
estratégia da Fundação Bradesco foi criar um centro de competências em
tecnologia social, chamado de rede de inclusão social (RIS) ou rede de
tecnologia social, nas suas escolas, CIDs e centros comunitários, que fosse
apoiado por instituições de ensino superior locais. A instituições locais teriam a
função de se transformarem em curadores do conhecimento adquirido e dar
suporte para a continuidade dos projetos, após o retorno dos alunos ao MIT.
Os projetos relacionados na tabela 4.3.9.2 mostram que as iniciativas
procuraram atender as necessidades sociais de cada comunidade, através da
aplicação de tecnologias simples, mas eficientes e baratas. Os alunos da
Fundação Bradesco e os membros dos CIDs aplicavam os conhecimentos
adquiridos em sala de aula e nas discussões com os alunos do MIT e aqueles
das universidades parceiras para propor projetos e aplicações de tecnologias
para solucionar problemas que eles vivencidos diariamente nas comunidades.
O D-Lab trouxe para as comunidades a emergência pela necessidade de
discussão e geração de propostas para os problemas sociais locais,
desenvolvendo a autonomia, pensamento crítico e ativismo social dos
membros da comunidade, principalmente dos alunos da Fundação Bradesco e
participantes dos CIDs. As tecnologias sociais passaram a ser aplicadas de
forma coordenada e direcionadas para a solução de problemas específicos,
com mostra o quadro 4.3.9.3.
Período Parceiros Projetos com a Fundação
Bradesco
2003-2004 Xingó - Universidade
Solidária
Rio de Janeiro -
CIESPI/PUC-RJ
2004-2005 Canuanã - Fundação
Bradesco
Rio de Janeiro -
Melhoria da produção de
leite, com relação a higiene e
armazenagem.
169
CIESPI/PUC-RJ Testes para melhoria da
qualidade da água dos
poços.
Construção de chaminés com
produtos reciclados.
2005-2006 Canuanã - Fundação
Bradesco e Poli/USP
Rio de Janeiro -
CIESPI/PUC-RJ
Melhoria da produção de
leite, com relação a higiene e
armazenagem.
Testes para melhoria da
qualidade da água dos
poços.
Construção de chaminés com
produtos reciclados.
2006-2007 Canuanã - Fundação
Bradesco e Poli/USP
São Paulo (JD.
Conceição) - Fundação
Bradesco e Poli/USP
Rio de Janeiro -
CIESPI/PUC-RJ
Melhoria da produção de
leite, com relação a higiene e
armazenagem.
Testes para melhoria da
qualidade da água dos
poços.
Construção de chaminés com
produtos reciclados.
Desenvolvimento de
Cooperativas (Jd.
Conceição).
Construção de uma praça
(Jd. Conceição).
Despoluição do córrego do
170
Jd. Conceição.
2007-2008 Bodoquena - Fundação
Bradesco e Poli/USP
Rio de Janeiro -
Soltec/UFRJ e POLI/USP
Latrinas sustentáveis.
Captação e purificação da
água captada das chuvas.
Melhoria da produção de mel
(redução do desperdício).
2008-2009 Canuanã - Fundação
Bradesco e Poli/USP
Macaé - Soltec/UFRJ
Criação de cooperativas para
os produtos produzidos na
aldeia
Testes para melhoria da
qualidade da água dos
poços.
Construção de chaminés com
produtos reciclados.
Melhoria do processo de
psicultura (produção em
cativeiro e armazenagem).
Decarte sustentável de
resíduos sólidos (pilhas).
Quadro 4.3.9.3. Parcerias do D-Lab no Brasile projetos com a Fundação
Bradesco. Fonte: Leo Burd, Coordenador do D-Lab Brasil, 2010.
No primeiro semestre de 2004, os alunos do MIT D-Lab foram
colocados em contato os alunos do ensino médio da escola da Fundação
Bradesco de Canuanã e membros do CID da comunidade dos Javaés,
apoiados pelos Professores da Fundação. O contato, através de ferramentas
colaborativas via internet, possibilitou aos alunos do MIT D-Lab entenderem o
contexto social das comunidades que eles iriam visitar e preparar um conjunto
171
de ferramentas e soluções que pudessem apoiar o desenvolvimento dos
projetos, como mecanismos de prototipagem (Kits), armazenagem e
purificação de água, formas alternativas de irrigação, mecanismos de
refrigeração de alimentos que não exigissem eletricidade e, também, a
programação de atividades educacionais participativas que envolvessem as
crianças e adultos, em questões de higiene e nutrição, bem como possibilitar o
mapeamento detalhado das necessidades sociais locais.
Figura 4.9.9.5. Atividades do D-Lab na Aldeia dos Javaés e Assentamentos de
Canuanã/TO. Fonte: Leo Burd -Coordenador do D-Lab no Brasil, 2004.
As equipes do D-lab que atuaram no Brasil no período de 2004-2009
eram compostos por alunos representantes de diversas áreas do
conhecimento, que cursaram a disciplina Development Laboratory (D-Lab) e
tinham interesse de colocar os respectivos conhecimentos em busca da
melhoria da inclusão social, através da aplicação de tecnologia social. Por
172
exemplo, a equipe que participou da iniciativa em 2005, na comunidade de
Canuanã, era formada por:
Leo Burd ([email protected]) - Coordenador da equipe.
Na época era estudante de doutorado do MIT Media Lab, com
foco da pesquisa na criação de tecnologias e abordagens
educacionais, que incentivem o desenvolvimento social
participativo como a “Young Activists Network” (YAN --
http://www.youngactivists.net/), uma iniciativa que ajudava jovens
de comunidades de baixa-renda a usar tecnologia para fazer a
diferença nos bairros onde vivessem. Coordenou em 2003 e
2004 uma equipe de 11 estudantes do D-Lab, que passaram três
semanas trabalhando em comunidades carentes no sertão do
nordeste brasileiro, com resultados importantes quanto ao
engajamento de instituições brasileiras (ONGs) na busca de
soluções para os problemas sociais dessas regiões.
Stephanie Dalquist ([email protected]). Na época, estudante de
pós-graduação no programa de Tecnologia e Política do MIT, com
formação em engenharia e interesse pelos aspectos sociais e
políticos decorrentes do uso da tecnologia aplicada à solução de
problemas sociais.
Prachi Jain ([email protected]). Na época, estudante de último ano
em Engenharia Química e também de Engenharia Biomédica.
Participou da ONG Desing That Matters (DtM) e desenvolveu, em
2004, um projeto para criação de brinquedos e modelos
educativos para crianças brasileiras, construídos a partir de
materias locais. O objetivo era usar a construção de parquinhos
como pretexto para os jovens de regiões carentes desenvolverem
sua autoestima e serem reconhecidos como membros ativos em
suas comunidades.
173
Yerrie Kim ([email protected]). Na época, estudante de Economia
e Engenharia Civil no MIT. Antes de entrar no MIT, morou na
Inglaterra, Coréia e Hungria e seu tema central de interesse era o
desenvolvimento econômico e planejamento urbano. No MIT, era
uma das principais organizadoras da Competição MIT $50K
Entrepreneurship, dedicada a criação de negócios inovadores e
que envolvia cerca de 500 participantes a cada ano.
Tejus Kothari ([email protected]). Na época, estudante de 3o
ano dos cursos de Engenharia Civil e Planejamento Urbano do
MIT. Seu interesse de pesquisa eram as questões relacionadas à
sustentabilidade, crescimento com foco no ambiente e
desenvolvimento internacional. O interesse do estudo de campo
no Brasil incluia a educação, desenvolvimento econômico e
fontes alternativas de energia – cada uma destas três áreas com
grande potencial de gerar mudanças significativas e de longa
duração.
Um exemplo de um projeto realizado em Canuanã no período de
2008-2009 foi o programa de conscientização das comunidades dos Javaés e
assentamentos rurais na região de Canuanã, quanto a necessidade do
descarte correto de resíduos sólidos, com ênfase no recolhimento e descarte
correto de pilhas e baterias.
O programa de recolhimento de pilhas e baterias foi mais uma etapa
para o desenvolvimento do saneamento básico nas áreas dos assentamentos
rurais e aldeia dos Javaés, na região de Canuanã, um tema que era tratado
pelo Grupo de Saúde Rural (GSR) da escola de Canuanã. Muitas pessoas
dessas comunidades tinham uma grande carência em sistemas de higiene
básica, incluindo o descarte de lixo. O lixo de material inorgânico era,
literalmente, disposto ao redor das casas dos membros das comunidades, sem
nenhuma preocupação com a coleta, separação de material ou das
consequências provocadas pelo acúmulo de lixo em áreas residenciais. Alguns
moradores queimam o lixo de forma indiscriminada, com a emissão de
174
materiais tóxicos e poluentes, que poderiam afetar a saúde dos membros
daquelas comunidades.
O Grupo de Saúde Rural (GSR), formado por alunos do ensino
fundamental e médio da escola Fundação Bradesco de Canuanã, em parceria
com os estudantes do MIT D-Lab do MIT e da Poli/USP, desenvolveram um
programa para a coleta seletiva de pilhas e baterias. O programa tinha como
finalidade reduzir a poluição ambiental e despertar a conscientização das
comunidades quanto ao descarte correto de resíduos sólidos. Os
levantamentos iniciais indicavam a utilização de uma grande quantidade de
pilhas e baterias que eram consumidas mensalmente, na ordem de 4 a 15
baterias, dependendo do tamanho da família. A chegada da energia elétrica
nessas comunidades não impactou de imediato a redução do consumo de
pilhas e, portanto, o problema permanecia e gerava risco à saúde dos
membros das comunidades.
Os membros do projeto distribuíram panfletos educativos sobre
hábitos de consumo, durante a coleta de informações, que descreviam, com
imagens e de forma lúdica, como as pilhas poderiam afetar a saúde humana;
esse momento era, igualmente, aproveitado para o recolhimento das pilhas e
baterias que estavam sendo descartadas em locais inapropriados [figura
4.9.9.6]. O componente educacional de orientação e prevenção foi a etapa
mais importante, especialmente na Aldeia dos Javaés e nos Assentamentos,
para despertar o interesse e a mobilização dos moradores pela causa e
relevância do tema. Outra iniciativa foi a criação de uma pequena peça de
teatro para ser apresentada na feira comunitária que acontecia, todos os
meses, em frente à escola da Fundação Bradesco.
O programa de recolhimento de pilhas e baterias foi sugerido pelo
médico da escola da Fundação Bradesco, Dr. Cícero Ramos, e por alguns
alunos da Fundação Bradesco, pertencentes ao grupo GSR. A participação dos
alunos do MIT e da USP voltou-se ao desenvolvimento de um programa de
conscientização na comunidade, quanto à coleta seletiva de resíduos sólidos e
à criação de um método de coleta de pilhas e baterias que fosse de baixo custo
175
e que não apresentasse risco à saúde dos participantes da iniciaitiva. No início,
alguns problemas impediram a implantação plena da iniciativa em toda
comunidade, como a falta de recursos financeiros para produção do material
impresso de orientação e para preparação dos galões para o descarte seletivo
das pilhas e baterias. Outra questão foi como transformar o conhecimento
recebido pelos membros das comunidades em ações transformadoras na
comunidade, ou seja, que a coleta seletiva de residuos sólidos fosse
incorporada como um hábito diário de higiene e saúde na comunidade.
Figura 4.9.9.6. Orientação sobre a necessidade do descarte correto de pilhas e
baterias. Fonte: Fundação Bradesco de Canuanã, 2004.
A solução de tecnologia social desenvolvida previa que, inicialmente,
o recolhimento fosse mantido pelos alunos do Grupo de Saúde Rural da
Fundação Bradesco e pelos membros do CID da Aldeia dos Javaés. Uma caixa
de armazenamento de pilhas ficava no Centro de Inclusão Digital (CID) da
aldeia e, regularmente, os membros do GSR e do CID armazenavam o material
em galões que, quando cheios, eram levados à cidade de Formoso do
Araguaia/TO para o descarte seletivo e correto do material.
A Fundação Bradesco apoiou financeiramente o projeto desde o
início, garantindo o sucesso na fase inicial, mas a falta de uma mobilização da
176
comunidade em busca de apoio com orgão públicos (municipais ou estaduais)
impediram a sequência do projeto, que ficou totalmente dependente da
Fundação Bradesco. Após três anos de implantação o projeto de coleta seletiva
de pilhas e bateriais não evoluiu como esperado, pois a dependência em
relação a Fundação Bradesco continuava e a comunidade ainda não tinha
assumida a responsabilidade principal, de agente da mudança, tanto quanto a
emissão de resíduos sólidos em local inapropriado, bem como a coleta seletiva
de materiais sólidos.
As iniciativas do D-Lab no Brasil tiveram um sucesso relativo, devido
ao apoio dado pela Fundação Bradesco, na forma de recursos financeiros e
voluntariado, através das suas escolas e pela mobilização das comunidades
que frequentavam os CIDs. A continuidade dos projetos nas comunidades teve
uma ruptura, devido as universidades não darem as condições necessárias
para seus alunos atuarem nas comunidades e a Fundação Bradesco de não
priorizar os projetos extracurriculares, principalmente aqueles realizados fora
das suas escolas. A parceria com o D-Lab foi interrompida em 2011 devido as
mudanças organizacionais, que aconteceram na Fundação Bradesco e a
prioridade dada a educação básica, com relação a ficar nas melhores posições
do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). As iniciativas extra-curriculares
para desenvolvimento de competências sociais e profissionais foram
canceladas ou mantidas em operação mínima e anos de resultados e
desenvolvimento de parcerias foram relegados a segundo plano.
A questão principal é se a Fundação Bradesco irá conseguir chegar
nas primeiras posições do ENEM, com um foco exclusivamente conteudista.
Até a finalização deste trabalho (Outubro de 2014) a Fundação Bradesco não
apresentou nenhuma evolução significativa dos resultados e praticamente
manteve-se na mesma posição do ranking dos últimos três anos.
177
4.3.3.2.2 Parceria com o Programa Poli Cidadã da Escola
Politécnica da USP
O Programa Poli Cidadã da Universidade de São Paulo, Escola
Politécnica, surgiu a partir de uma proposta de que os alunos, aplicando seus
conhecimentos de engenharia para a solução de problemas sociais, através da
Tecnologia Social, estariam contribuindo para a sociedade enquanto
complementariam a sua formação profissional. A Poli Cidadã foi formalizada
em 2003 e era composta por professores, funcionários e alunos da escola que
estavam alinhados aos objetivos estratégicos da Poli, conforme mapa
estratégico da Poli 2015 mostrado na figura 4.9.9.7. Como pode ser observado
ali, o programa Poli Cidadã alinhava-se ao planejamento nas três áreas de
atuação da Escola Politécnica:
No ensino, integrando “alunos a projetos, estágios e atividades
extracurriculares”;
Na pesquisa, promovendo a realização de “projetos de pesquisa
sobre temas socialmente relevantes” e
Na extensão, realizando “projetos de extensão sobre temas
socialmente relevantes”, sempre com o foco de que seja
“reconhecida na sua rede de Relacionamento e pela Sociedade
por sua Contribuição”.
O programa Poli Cidadã concentrou-se, inicialmente, em propor
temas voltados às necessidades sociais para projetos de conclusão de curso
(TCC). Esses projetos são desenvolvidos no último ano do curso de graduação
constituindo-se, assim, em uma atividade de caráter extensivo. Ao longo do
tempo, observou-se o crescimento da demanda por trabalhos de temática
social e o programa passou a agregar outros projetos de graduação que
abordassem a questão de responsabilidade socioambiental, não se restringindo
apenas a projetos de conclusão de curso. Dentro desse contexto, pode-se
destacar a disciplina “Práticas de Eletricidade e Eletrônica II”, ministrada para
alunos de Engenharia Elétrica. Trata-se de uma disciplina que passou a utilizar
178
a temática social para a proposição e desenvolvimento de soluções nas quais
os alunos elaborassem projetos e construíssem protótipos, aplicando
conhecimentos iniciais de eletrônica, conforme informações de Maria Inês Piffer
em “Disciplina com Foco Social: Uma proposta para Ensino de Engenharia.
Escola Politécnica da USP, 2008”.
Figura 4.9.9.7. Planejamento Estratégico da Poli 2015. Fonte: Maria Inês Piffer,
Disciplina com Foco Social: Uma proposta para o ensino de Engenharia,
Escola Politécnica da USP, 2008.
Outra modalidade incorporada ao programa foram as atividades
intensivas, cujo propósito é a promoção do contato e interação de alunos com
realidades diferentes da sua, promovendo, assim, a ampliação de sua
dimensão social. Essas atividades são realizadas em comunidades carentes,
179
nos períodos de férias escolares, quando os alunos, com a orientação de
professores, atuam na busca conjunta de soluções de engenharia adequadas
para aquelas localidades.
O programa Poli Cidadã, desde 2004, também incentiva o
desenvolvimento de projetos de iniciação científica e de extensão universitária
com temática social. Uma das principais atividades extensivas do Poli Cidadã é
incentivar a realização de projetos de formatura que atendam às necessidades
encontradas junto a organismos representativos da sociedade, como hospitais,
organizações não governamentais, escolas e prefeituras. Uma das formas
dessa relação acontecer é através do site do Poli Cidadã, onde as instituições
cadastram suas necessidades, o que servirá de fonte de temas para a
realização dos projetos de conclusão de curso. No final do ano, o Programa
realiza um seminário no qual os projetos são apresentados às instituições
demandantes.
O programa já desenvovleu mais de 70 projetos, desde 2004, como a
mesa portátil para exame de colo de útero (2005), a partir de uma necessidade
levantada pelo Hospital do Câncer de Barretos. A mesa era utilizada por
enfermeiros que visitavam comunidades carentes e realizavam exames
ginecológicos preventivos. O hospital tinha uma mesa desmontável
confeccionada em ferro, composta por várias partes que necessitavam de
ferramentas para a sua montagem. O aluno Enio Atsushi Kobara desenvolveu
um novo modelo utilizando alumínio, de fácil montagem e sem o auxílio de
qualquer ferramenta, como mostrado na figura 4.9.9.8.
180
Projeto Desenvolvido Mesa Existente
Figura 4.9.9.8. Desenvolvimento de mesa portátil para exame de câncer de
colo. Fonte: Poli Cidadã – Escola Politécnica da USP, 2008.
Outro exemplo de atividade extensiva são os projetos com temática
social realizados através da disciplina “Práticas de Eletricidade e Eletrônica II”
na qual, em 2006, foi desenvolvido um protótipo que auxilia deficientes visuais
a identificarem cores. Esse identificador de cores foi projetado e construído por
alunos do segundo ano de engenharia elétrica que, durante a execução do
aparelho, entraram em contato com uma instituição que trabalha com
deficientes visuais (Instituto Laramara), que os ajudou a compreender as
necessidades especiais dos usuários finais e vislumbrar melhores soluções
para o seu protótipo.
Através dos relatos de alunos que participaram do Programa Poli
Cidadã, de acordo com Maria Inês Piffer em “Disciplina com Foco Social: Uma
proposta para Ensino de Engenharia. Escola Politécnica da USP, 2008”, nota-
se que a realização de projetos voltados a necessidades reais cria novos
desafios que, ao serem superados, levam a um aprendizado mais amplo, além
da satisfação pessoal que geram. Tem-se, então, uma motivação maior pelo
estudo da engenharia, não sendo raros os casos em que os alunos participam
de mais de uma atividade extensiva.
181
As atividades intensivas eram realizadas pelos alunos no período de
férias escolares, com a característica principal de permitir a imersão dos alunos
na realidade de comunidades carentes. No período de 2004 a 2010, foram
realizados três tipos de atividades intensivas no Programa Poli Cidadã:
O tipo 1 corresponde às atividades em parceria com o MIT -
Massachusetts Institute of Technology e a Fundação
Bradesco.
O tipo 2 é constituído pelas atividades em parceria com a
Faculdade de Medicina da USP.
O tipo 3 são as atividades com alunos da EPUSP em parceria
com a Fundação Bradesco.
A Fundação Bradesco, em 2004, tomou a iniciativa de procurar os
organizadores do programa Poli Cidadã com a proposta de integrar as
iniciativas desenvolvidas no programa com os projetos que estavam ocorrendo
nos Centros de Inclusão Digital (CIDs) e do MIT D-Lab. O objetivo principal era
formar uma rede de aplicação da tecnologia social em comunidades carentes,
chamada de Rede de Inclusão Social (RIS), no entorno das escolas da
Fundação Bradesco e nos Centros de Inclusão Digital (CIDs). A tecnologia
social a ser desenvolvida por essa rede possibilitaria a solução de problemas
sociais das comunidades e a aquisição de conhecimento e habilidades para
melhoria da mobilidade social. No início de 2005, um docente e dois alunos de
graduação da Escola Politécnica da USP tiveram a oportunidade de
acompanhar, como observadores, as atividades desenvolvidas pelo grupo do
MIT D-Lab, com os alunos da Fundação Bradesco, junto à comunidade de
Canuanã, no Estado do Tocantins, o que seria o marco incial da parceria.
As atividades realizadas em Canuanã compreenderam viagens para
áreas rurais, nas quais os participantes ficaram alojados na escola da
Fundação Bradesco de Canuanã (escola internato). A partir de um
levantamento dos problemas locais, algumas tecnologias foram identificadas,
modificadas e testadas, com o objetivo de atender as necessidades sociais de
182
cada comunidade no entorno da escola. Em cada visita, os alunos levavam
tecnologias desenvolvidas nos anos anteriores, que eram apresentadas à
comunidade. No final, eram realizadas palestras, oficinas e exposições dos
protótipos e soluções desenvolvidas para os moradores locais. A equipe era
formada por alunos de graduação do MIT e da EPUSP, em colaboração com
uma equipe de alunos do ensino médio da escola da Fundação Bradesco e
representantes do CID de Canuanã.
Nesse tipo de atividade intensiva, os alunos, além de abordar
problemas técnicos, entravam em contato com culturas diferentes, já que,
normalmente, a comunidade visitada era uma aldeia indígena ou um
assentamento de colonos. Outro aprendizado importante para os alunos da Poli
Cidadã, Fundação Bradesco e membros do CID local foi o contato com alunos
estrangeiros, cuja barreira do idioma exigia esforços adicionais no debate e
reflexão sobre as ideias dos projetos.
As iniciativas da Poli Cidadã, que foram desenvolvidas em parceria
com a Fundação Bradesco e o MIT D-Lab, no período de 2004 a 2009,
compreenderam várias atividades realizadas nas seguintes comunidades:
Canuanã/TO (Aldeia dos Javaés e Assentamentos), em Janeiro de 2006 e
2007; Comunidade do Jd. Conceição/Osasco/SP, em Julho de 2006, Janeiro
de 2007 e 2008; Bodoquena/MS (Aldeia dos Lalimas), em Janeiro de 2008. O
quadro 4.3.9.4 mostra as iniciativas intensivas desenvolvidas pela Poli Cidadã,
bem como os locais, equipes envolvidas e os tipos de iniciativas, de acordo
com a tipologia definida pelo pograma Poli Cidadã.
183
Quadro 4.3.9.4 - Atividades Intensivas Realizadas pela Poli Cidadã até 2008.
Fonte: Maria Inês Piffer, Disciplina com Foco Social: Uma proposta para o
ensino de Engenharia, Escola Politécnica da USP, 2008.
Observando as iniciativas do quadro 4.3.9.3, pode-se propor um
modelo de influência do Poli Cidadã, representado na Figura 4.9.9.9, conforme
Maria Ines Piffer (2007). A partir de uma vontade pessoal (1), o programa foi
criado e incentivou o desenvolvimento de projetos de conclusão de curso com
enfoque social (2). Esta ação divulgou o programa no seu primeiro ano,
culminando em um número maior de projetos no segundo ano. Realizaram-se
exposições itinerantes nos prédios da Escola Politécnica, fomentando a
agregação de outras atividades, como as intensivas. Com isso o programa
ganhou vulto, tornando-se sustentável ao longo do tempo (3). Ao mesmo
tempo, outras atividades passaram a ser desenvolvidas, incentivadas pelo Poli
Cidadã (4), tais como participação em congressos e eventos no exterior.
184
Também pela situação favorável, criou-se o Formando Cidadão, cuja grande
motivação surgiu das discussões do 3° Seminário de Engenharia e
Responsabilidade Social, POLI CIDADÃ (2008), evento no qual foram
apresentados os resultados obtidos com o desenvolvimento das atividades do
Programa.
Figura 4.9.9.9: Ciclo de Influência. Fonte: Maria Inês Piffer, Disciplina com Foco
Social: Uma proposta para o ensino de Engenharia, Escola Politécnica da USP,
2008.
Os resultados apresentados pelo Poli Cidadã no período de 2004 a
2008, mencionados anteriormente, indicam tratar-se de um instrumento
bastante eficaz de motivação e propagação de iniciativas de caráter social,
contribuindo para a formação cidadã dos futuros Engenheiros. Os bons
resultados apresentados pelo programa permitiram a criação, em 2009, de
duas novas disciplinas optativas na Escola Politécnica, chamadas de
Tecnologia e Desenvolvimento Social I e II, com enfoque na tecnologia social,
ou seja, processos e produtos aplicados à solução de problemas sociais.
185
A tecnologia social deve ser um processo desenvolvido
conjuntamente com os atores que irão utilizá-la, de acordo com Maria Inês
Piffer (2008). Por isso faz-se necessário o contato dos estudantes com as
realidades das comunidades para entender a problemática social e as
possíveis soluções através da aplicação da tecnologia. Até 2009, os alunos
participavam de forma voluntária no programa, devido ao interesse pela
temática social. Já com a implantação da disciplina de Tecnologia e
Desenvolvimento Social, em 2010, o contato com a temática social passava a
ser mais efetivo, com atividades de longa duração e com a possibilidade de os
projetos desenvolvidos nas comunidades serem acompanhados por equipes de
forma contínua e planejada.
Como informado, a proposta aceita pela congregação da USP foi a
criação de duas disciplinas optativas na escola Politécnica, chamadas de
Tecnologia e Desenvolvimento Social I e Tecnologia e Desenvolvimento Social
II, com duração de 90h cada/semestre e ministradas pelo Prof. Antonio Luis de
Campos Mariani (Coordenador do Poli Cidadã) e Douglas Lauria.
A disciplina de Tecnologia e Desenvolvimento Social I aborda os
conceitos de responsabilidade social para que os alunos entendam o seu papel
na sociedade, compreendendo:
Apresentar e analisar parâmetros e indicadores sobre a
realidade brasileira e mundial, considerando o ponto de vista
da contribuição da tecnologia em diferentes contextos.
Desenvolver e discutir conceitos e metodologia para realizar
projetos que atendam a determinadas demandas sociais
identificadas.
Estabelecer procedimentos e desenvolver ferramentas
tecnológicas para atuar em projetos, que serão realizados
durante o período da disciplina, como os estudos de caso.
O objetivo primário dessa disciplina foi preparar o aluno para visitar
uma localidade e ser capaz de perceber, de forma objetiva, seus problemas.
186
Após a conclusão dessa disciplina, ocorre a primeira atividade intensiva, com o
foco em coleta de dados, realizada através de entrevistas e questionários
elaborados com a supervisão dos professores. A atividade intensiva não
precisa ser realizada, exclusivamente, em comunidades carentes. Pode-se aliar
o contato com as instituições proponentes de temas para o Poli Cidadã e
desenvolver atividades intensivas, promovendo o contato com o dia-a-dia
dessas organizações de forma intensa e colaborativa. Quando essa fase é
concluída, os alunos voltam à sala de aula, em busca de soluções para atender
as necessidades da comunidade.
A segunda disciplina, “Tecnologia e Desenvolvimento Social II”, trata
de como é possível desenvolver aplicações para os problemas sociais
encontrados nas comunidades ou de acordo com as propostas das instituções
parceiras, considerando:
Aplicar conceitos e metodologia discutidos, testando-os na
realização de projetos que atendam as demandas sociais
identificadas.
Desenvolver estudos de caso através de projetos que adotaram
temas a partir de problemas selecionados.
Estabelecer e aplicar processo de avaliação para os projetos
desenvolvidos, considerando interação com a comunidade e/ou
instituição envolvida.
Ao final da segunda disciplina, é realizada uma segunda atividade
intensiva, quando os alunos retornam às comunidades estudadas durante a
primeira visita, para implantar e avaliar os resultados iniciais dos projetos.
Esses resultados são apresentados às comunidades, completando-se, assim, o
ciclo. As tecnologias desenvolvidas pelos alunos ficam armazenadas em banco
de dados e disponíveis para acesso das próximas turmas, de forma que o
conhecimento sobre as localidades e as propostas de soluções sejam
aprimoradas a cada ano. Finalmente, os estudantes apresentam os resultados
187
para os professores, colegas e, também, para as lideranças locais e são
avaliados pela qualidade técnica e aplicabilidade das soluções propostas.
A interação com as comunidades faz com que as soluções sejam
criadas de forma conjunta, com a participação dos interessados, estimulando-
se a transferência das tecnologias e conhecimento para a sociedade. Pelo fato
de permanecerem na Escola após a realização do trabalho de conclusão de
curso, depois de cursada a disciplina, os alunos têm a chance de acompanhar
os resultados da aplicação do projeto podendo, inclusive, aprimorar as
soluções propostas inicialmente. Além disso, há a possibilidade de transmissão
do conhecimento adquirido para os demais colegas, o que facilita a
continuidade das atividades. Outro benefício é o reconhecimento de que as
atividades sociais não devem ser tratadas apenas como um hobby, como
lembra Maria Inês Piffer (2008), mas como uma atividade que deve fazer parte
da preocupação constante dos profissionais no exercício de suas funções.
Assim, a criação destas disciplinas reuniu os benefícios produzidos
pelas atividades extensivas e intensivas do programa; a possibilidade de
continuidade dos alunos nas atividades, a transferência de conhecimento e o
reconhecimento dos alunos e professores envolvidos, enriquecem muito a
formação social do engenheiro que participa dessas experiências.
A parceria da Fundação Bradesco e CIDs, com a USP e o MIT
permitiu a formação da Rede de Inclusão Social (RIS) ou de Tecnologia Social,
uma evolução do projeto dos CIDs, com a finalidade de desenvolver
competências sociais nas comunidades carentes, em busca de soluções para
as demandas sociais, através da aplicação da tecnologia social. A figura 4.9.10
mostra a evolução do modelo dos CIDs e o estágio da RIS, no período de 2009
a 2010 e nas comunidades no entorno das escolas de Canuanã/TO,
Bodoquena/MS e Jardim Conceição/SP.
188
Figura 4.9.10 Representação do ciclo de evolução dos CIDs. Fonte: Elaborado
pelo autor em 2010.
A formação da rede de inclusão social ou de tecnologia social, pelas
três escolas e universidades parceiras (MIT e USP), representava uma
iniciativa típica e eficaz de educação sociocomunitária, conforme a definição de
educação sociocomunitária proposta por Paulo de Tarso em “Educação
Sociocomunitária: delimitações e perspectivas” (2008), e a definição de
aplicação de Tecnologia Social proposta por Renato Soffner em “Tecnologias
Sociais e a Educação para a Praxis Sociocomunitária” (2014). A participação
das instituições na rede de inclusão social pode ser caracterizada a partir
daquilo que o autor chama de princípios norteadores da educação
sociocomunitária e da aplicação da tecnologia social, conforme quadro 4.3.9.5.
189
Princípios Educação
Sociocomunitária
Tecnologia Social
Desenvolvimento das
competências sociais
nas comunidades.
Desenvolver
conhecimentos e
habilidades para a
identificação, priorização
e execução de projetos
para melhoria da
mobilidade social.
Identificar oportunidades
de aplicação das
tecnologias sociais.
Entender as
necessidades e
demandas sociais das
comunidades.
Mobilização das
comunidades para
discussão e identificação
das demandas sociais.
Avaliar as oportunidades
de aplicação de
tecnologias sociais para
melhoria da mobilidade
social.
Desenvolver uma rede
de colaboração e
engajamento social.
Integrar e mobilizar as
comunidades em busca
de parcerias para
soluções das demandas
sociais.
Buscar as melhores
soluções de tecnologias
sociais disponíveis nas
instituições do terceiro
setor, universidades e
centros de pesquisa.
Desenvolver aplicações
tecnológicas
contextualizadas às
demandas sociais.
Mapear e priorizar as
demandas sociais mais
urgentes.
Aplicar tecnologias
sociais para solução das
demandas sociais mais
urgentes.
Desenvolver uma rede
de sustentabilidade dos
projetos sociais.
Mobilizar a comunidade
na busca da
sustentabilidade
financeira para os
projetos sociais.
Indentificar casos de
sucesso de aplicação de
tecnologias sociais.
190
Registar e comunicar as
conquistas sociais.
Alinhar todos os
membros das
comunidades, através de
um plano de
comunicação das
conquistas sociais
obtidas pela
comunidade.
Valorizar a adoção das
tecnologias sociais
através da
disseminação do
conhecimento.
Quadro 4.3.9.5 Princípios Norteadores da Educação Sociocoumunitária e
Tecnologia Social, através das experiências da Fundação Bradesco, MIT D-
LAB e USP Poli Cidadã. Fonte: Autor (2014).
A participação das escolas da Fundação Bradesco de Canuanã,
Bodoquena e Jardim Conceição na chamada rede de tecnologia social
proporcionou aos alunos da educação básica e profissional e aos membros dos
CIDs a aquisição de competências essenciais para a vida, ligadas ao mercado
de trabalho, que o autor chama de competências profissionais. A troca de
experiências e a aprendizagem com universitários de realidade distintas
proporcionou aos membros daquela comunidade o desenvolvimento da
autoconfiança, da autonomia e do protagonismo para a aplicação da tecnologia
social como solução aos problemas sociais locais.
Os projetos relizados pelos alunos da Fundação Bradesco, MIT e
USP nas escolas de Canuanã, Bodoquena e Jardim Conceição
compreenderam as seguintes atividades:
Comunidades de Canuanã/TO:
Grupo 1: Resíduos sólidos e esgotos
Projeto 1: Banheiro seco
Projeto 2: Lixo: recolhimento de pilhas
Grupo 2: Cultura e Comunicações
191
Projeto 3: Documentação colaborativa
Projeto 4: Teclado idioma indígena
Projeto 5: Rádio comunitária
Grupo 3: Qualidade da água
Projeto 6: Testes e avaliação da água
Projeto 7: Desinfecção solar
Projeto 8: Cobertura de poços
Projeto 9: Filtro lento
Grupo 4: Tecnologia aplicada a Cozinhas
Projeto 10: Carvão de folha de palmeira
Projeto 11: Chaminé de latas de óleo
Projeto 12: Secador de frutas
Projeto 13: Geração de renda com produção de alimentos
Projeto Extra:
Projeto 14: Prontuário Médico Eletrônico.
As equipes que desenvolveram os projetos em canuanã, Bodoquena e Jd.
Conceição eram formadas por:
- Bodoquena, Mirando/MS:
Período: 08 a 23 de janeiro de 2008
USP Poli:
Equipe alunos:
Gustavo Eidji camarinha Fujiwara
Leonardo Alexandre Ferreira Leite
Mariana Pires Gentil Negrão
Marina Beatriz Simões Leal
Rafael de Barros Carrilho
Coordenação: Fernando de Oliveira Gil e
Maria Inês Piffer
192
MIT D-Lab:
Equipe alunos:
Stephanie Chiang
Valery Brobbey
Yi Wang
Chris Varenhorst
Coordenação: Ana Luísa Santos e Marcelo
Coelho
Fundação Bradesco:
Equipe alunos:
Geovane da Fonseca de Barros
Mayana dantas de Queirós
Naely Ferreria Maidana
Rudclaúdio Cáceres da Silva
Atividades realizadas: As atividades foram realizadas
na Escola de Bodoquena da Fundação Bradesco,
divididas em três fases:
Prospecção de dados;
Desenvolvimento de projetos;
Avaliação.
Durante a prospecção foram definidas cinco tarefas a serem
realizadas: o levantamento de coordenadas através de GPS, fotografia, coleta
de água e dados sobre fumaça, entrevista com moradores e observação.
Também foi realizada uma entrevista inicial com os líderes da comunidade em
que foi possível ter uma visão ampla da situação e obter respostas às questões
gerais de relevância para os projetos. A fase de desenvolvimento compreendeu
desde a análise dos dados coletados na prospecção, seleção de projetos,
implementação e apresentação à comunidade. Esta fase foi a mais complexa,
devido a necessidade de manter o foco nas reais necessidades da comunidade
da aldeia e selecionar projetos viáveis, em pouco tempo e com limitação de
recursos. A última fase das atividades foi a avaliação. Esta fase foi focada em
193
avaliar a atividade como um todo e também avaliar a possibilidade de
continuidade, ao longo do ano, de algumas das atividades propostas.
Os projetos desenvolvidos foram:
Projeto 1: Lalima na internet (Wikipédia)
Projeto 2: Mapeamento da Aldeia Lalima
Projeto 3: Filme: Nossa Experiência sobre Lalima
Projeto 4: Tratamento Solar da Água
Projeto 5: Reciclagem de Plástico
Projeto 6: Ferramentas Educacionais para Professores
Projeto 7: Coletor de Água da Chuva
Projeto 8: "Casinha" Seca (Banheiro Seco)
Projeto 9: Guia de Abordagem para Entrevistas em
Comunidades Carentes
Projeto 10: Venda de Artesanato no Centro de Cultura Terena
de Miranda
Projeto 11: Oficina de Fotos, Pintura a Dedo e Brincadeiras
- Jardim Conceição, Osasco/SP:
Período: 21 a 25 de janeiro de 2008
USP Poli:
Equipe de alunos:
Filipe Bertoletti Mesquita
Gustavo Massaki Karuka
Rafael Yuzo Kumagai
Rodrigo Eiji Iwagata Diana
Coordenação: Octavio Ferreira Affonso
Fundação Bradesco:
Equipe de alunos:
Amanda Silva de Ameida
Jucielton José dos Santos
194
Fabricio Jacobrip Da Flora
Miguel G. da Hora
Mônica de Queiroz Fatel
Vanessa Alves de Queiróz
Coordenação: Yeda Karla M. de Machado
Atividades realizadas: Elaboração de um mapeamento do
bairro Jardim Conceição, do município de Osasco, para
possibilitar o levantamento do perfil da comunidade e
identificar as principais demandas sociais. Com base nessas
informações foram sugeridas alternativas de solução,
baseadas em projetos de engenharia que poderiam ser
executadas em futuros projetos extensivos. Os projetos
propostos foram:
Programa de capacitação e treinamento da comunidade
Casa Modelo
Oficinas Temáticas
Plano de negócio para o tratamento sustentável de lixo
e entulho
Triturador de entulho
Cooperativas
Área de Lazer
Produção de adubo orgânico
Base de Dados com Iniciativas de Cooperativas
Biodigestor comunitário
Programa de conscientização sobre o lixo
Horta comunitária
4.3.3.3 Identificação do nível de Maturidade da Terceira Geração de
Centros de Inclusão digital
A terceira geração de centros de inclusão digital teve como objetivo a
formação de uma rede de inclusão social (RIS), também chamada de Rede de
195
Tecnologia Social, que permitisse a colaboração entre os centros geradores de
conhecimento e soluções de tecnologia social para as comunidades que
apresentassem carência socioeconomica e demandas por projetos para a
melhoria da mobilidade social.
O desenvolvimento da rede de parcerias com o MIT e a USP permitiu
à Fundação Bradesco acelerar a aquisição de conhecimentos na implantação de
tecnologias sociais, bem como o acesso a uma ampla rede de projetos sociais
no Brasil e no Exterior. As duas ondas dessa geração foram caracterizadas pela
implantação da tecnologia social, a primeira pela implantação do “Projeto a
Cidade que a Gente Quer” em 28 escolas da Fundação Bradesco e CIDs, em
parceria com o MIT Media Lab, e a segunda onda pela implantação do projeto D-
Lab e da Poli Cidadã, em três escolas e CIDs da Fundação Bradesco.
A primeira onda, a implantação do projeto “ A Cidade que a Gente
Quer” foi caracterizada pelo desenvolvimento de competências para design social
nos alunos da Fundação Bradesco e participantes dos CIDs. Esse projeto
buscava integrar os conhecimentos adquiridos em sala de aula com as
demandas sociais no entorno das escolas e CIDs, através da aplicação da teoria
construcionista, neste caso sob a froma da criação de artefatos baseados em
tecnologia, como uma proposta para solução dos problemas e demandas sociais.
Esse projeto pode ser caracterizado como uma atividade extra-curricular das
escolas da Fundação Bradesco, com extensão aos CIDs, para o desenvolvimento
de competências pessoais e profissionais e também para despertar do ativismo e
protagonismo social dos alunos e membros da comunidade. A tecnologia
utilizada para o desenvolvimento dos projetos, baseada no Lego Mindstorm e nas
Placas GOGO, permitiu a significação e associação dos conteúdos adquiridos em
sala de aula com as temáticas sociais.
A segunda onda, a parceria da Fundação Bradesco com o MIT D-Lab
e a USP Poli Cidadã, proporcionou a formação de uma rede de ativismo social,
conectando centros de excelência em pesquisa e aplicação de tecnologia com
comunidades que apresentavam várias demandas sociais em busca da inclusão
social.
196
A terceira geração de inclusão digital pode ser classificada no nível 4,
ou seja Colaboração Efetiva, de acordo com o framework de maturidade de
inclusão digital da figura 4.9.11 e detalhado a seguir:
Figura 4.9.11. Nível de maturidade de terceira geração de inclusão digital.
Fonte: Autor
Plataformas sociais modulares, como Lego Sociais: A Fundação
Bradesco teve um papel fundamental na formação do hub
(conectador) da plataforma social para a aplicação da tecnologia
social, como proposta de soluções para as demandas sociais das
comunidades. A plataforma social era formada pelas ações e
entregas dos membros da rede, cada um contribuindo de forma
complementar com suas respectivas competências e papéis
assumidos, como mostra a figura 4.9.12.
197
Fundação Bradesco: Hub integrador da plataforma e nó
central da rede de ativismo social. As escolas, com seus
alunos e professores, funcionavam como mediadores e
facilitadores para implantação das tecnologias sociais
desenvolvidas pela USP e o MIT nas comunidades do seu
entorno. O apoio ocorria na forma de suporte financeiro e
atração de empresas para suportar os projetos.
USP Poli e do MIT D-Lab: Geradores de conhecimento e
soluções de tecnologia social., através das respectativas
redes de pesquisadores e especialistas. Os alunos dessas
universidades tinham um papel fundamental no
desenvolvimento de soluções e treinamento das equipes da
Fundação Bradesco e das comunidades na implantação e
no monitoramento das soluções de tecnologia social.
Comunidades e CIDs: Membros dos CIDs, dos centros
comunitários e residentes dessas comunidades que
ajudavam no mapeamento das necessidades e eram
responsáveis pela implantação das tecnologias sociais.
Escolas Públicas: Os alunos e professores dessas escolas
apoiavam os membros das comunidades e CIDs no
mapeamento das necessidades e implantação das
tecnologias sociais.
Universidades: O papel das universidades locais era de
multiplicar as tecnologias sociais desenvolvidas pelo MIT e
USP em outras comunidades da região, bem como
oferecer suporte técnico local para a continuidade dos
projetos.
Emergência dos centros de competências para a mobilidade
social: A colaboração entre as escolas da Fundação Bradesco,
Escolas Públicas, CIDs e Universidades locais possibilitaram a
criação do ativismo social, através da aquisição de competências
dos membros das comunidades, para a aplicação de tecnologias
198
sociais em busca da inclusão social e melhoria da mobilidade
social.
Educação Sociocomunitária como canal das ações comunitárias:
A Educação Sociocomunitária como um canal catalizador das
demandas sociais e para articulação das iniciativas das
comunidades em busca de soluções para os problemas sociais e
o pleno exercício da cidadania.
Escolas de educação básica, como propagadores contínuos do
conhecimento: As escolas da Fundação Bradesco e escolas Públicas
do entorno assumiram um papel fundamental na disseminação do
conhecimento associado as demandas sociais locais e estabelecendo
conexões entre a teoria e a prática adquirida.
Figura 4.9.12. Plataforma baseada no conceito dos legos Sociais. Fonte: Autor
(2014).
199
4.4 Uma proposta para a quarta geração de Centros de inclusão digital,
chamada de Crowdsourcing Social, para avaliação do nível de maturidade.
O filósofo Pierre Lévy é um pioneiro no estudo do impacto da Internet
no conhecimento e na cultura humana. Em “Collective Intelligence. Mankind’s
Emerging World in Cyberspace” (1999), ele descreve um tipo de inteligência
coletiva que se estende por toda parte e é constantemente avaliada e
coordenada em tempo real, uma inteligência coletiva humana, acentuada por
novas tecnologias da informação e pela Internet.
De acordo com Levy (1999), a primeira coisa a entender é que a
inteligência coletiva já existe. Não é algo que tem de ser construído. A
inteligência coletiva existente ao nível das sociedades de origem animal: ela
existe em todas as sociedades animais, especialmente nas sociedades de
insetos e sociedades de mamíferos e, claro, a espécie humana é um
excelente exemplo da inteligência coletiva. Além dos meios de comunicação
utilizados pelos animais, os seres humanos também usam linguagem,
tecnologia, instituições sociais complexas e assim por diante, o que, em
conjunto, leva à criação da cultura. As abelhas têm inteligência coletiva, mas
sem a dimensão cultural. Além disso, os seres humanos têm inteligência
pessoal reflexiva que aumenta a capacidade da inteligência coletiva global.
A principal maneira de aumentar a inteligência coletiva humana, de
acordo com Levy (2014), é através das mídias e sistemas simbólicos.
Inteligência coletiva humana é baseada na linguagem, na tecnologia e
podemos agir sobre estes a fim de buscar o aprimoramento contínuo. O
primeiro salto de evolução da inteligência coletiva humana foi a invenção da
escrita. A partir daí, nós inventamos mídias mais complexas e eficientes
como o papel, o alfabeto e os sistemas de posicionamento para representar
números, usando dez algarismos e o zero. Todas essas iniciativas levaram a
um aumento considerável da inteligência coletiva. Em seguida, houve a
invenção da imprensa e da mídia eletrônica. Agora, no século XXI, estamos
em uma nova fase do aumento da inteligência coletiva humana: a digital ou,
como chama Levy, de uma fase algorítmica.
200
A democratização do conhecimento já está acontecendo com a
comunicação onipresente, permitindo o acesso a qualquer tipo de
informação, quase de graça, como no caso da Wikipedia, além dos blogs,
mídias sociais e do crescente movimento do “open source”. Quando se tem
acesso a todas essas informações, quando se pode participar de redes
sociais que apóiam a aprendizagem colaborativa e quando algorítmos para
tratamento das informações ou de física social estão disponíveis, ocorre um
verdadeiro aumento da inteligência coletiva humana, que implica na
democratização do conhecimento, de acordo Levy (2014). A democratização
significa uma gestão de conhecimento aberta, de baixo para cima,
aproveitando o potencial do Crowdsourcing ou da produção coletiva do
conhecimento em rede.
Figura 4.9.13. Modelo de Inteligência Coletiva no Serviço de
Desenvolvimento Humano. Fonte: A Esfera Semântica, Pierre Levy, 2011.
A definição de inteligência coletiva por Thomas Malone (2006) fala
da possibilidade de um grupo de indivíduos fazer coisas em conjunto que
podem ser inteligentes. Partindo dessa definição, a inteligência coletiva já
S= Sinal, B=Ser ,
T=Coisa
201
existe há muito tempo, com famílias, empresas e países formados por grupos
de indvíduos fazendo coisas que parecem ser inteligentes. As colmeias e as
colônias de formigas são exemplos de grupos de insetos que fazem coisas,
como encontrar comida, parecerem inteligentes. O próprio cérebro humano,
como uma coleção de neurônios individuais ou partes do cérebro, que
coletivamente através das conexões agem de forma integrada e inteligente.
A inteligência coletiva é o insumo essencial das iniciativas de
Crowdsourcing, a geração coletiva do conhecimento através da multidão
conectada em rede com a finalidade de proporcionar a colaboração e o
engajamento para solução de problemas, geração de ideias e propagação do
conhecimento. De acordo com Jeff Howe (2006), o Crowdsourcing pode
assumir várias formas, como as quatro descritas a seguir:
A inteligência coletiva, às vezes chamado de "sabedoria das
multidões", refere-se a mecanismos de aproximação e
agregação, para possibilitar que a multidão possa compreender
um problema ou identificar uma potencial solução. Um exemplo
de Crowdsourcing é a empresa Innocentive, que conecta
empresas com determinados problemas com possíveis
solucionadores que estão conectados na Internet.
O conteúdo criativo, em que muitas pessoas podem contribuir,
individualmente ou em colaboração, para uma determinada
demanda ou projeto. Um exemplo disso é a Wikipedia, uma
enciclopédia que qualquer um pode editar e colaborar.
A votação pela multidão, colocando questões abertamente e
coletando respostas através de mecanismos como pesquisas ou
eleições.
O financiamento pela multidão (Crowdfuding), através das
interações entre projetos e candidatos a doadores ou
apoiadores. Um exemplo é a empresa Amplify que arrecada
doações via Internet e mobiliza a participação voluntária em
projetos sociais.
202
O modelo FLIRT de participação de projetos de Crowdsourcing foi
desenvolvido, em 2006, por Sami Viitamäki, professor da Helsinki School of
Economics, com a finalidade de entender como um especialista de marketing
pode engajar e mobilizar os clientes, de forma colaborativa, nos esforços de
comunicação e desenvolvimentode de campanhas na Internet. O FLIRT é
formado por quatro atores chamados de Criadores, Críticos, Conectores e
Multidão, com as seguintes responsabilidades:
- Criadores: Organizadores das comunidades de Crowdsourcing e
responsáveis pela criação das competições, geração de conteúdos, ideias e
recombinação de informações, através de recursos de gamificação.
Normalmente, são os criadores das plataformas e portais de Crowdsourcing.
- Críticos: Avaliam as soluções, de acordo com a especialidade,
através de conversações com os participantes dos desafios e identificam as
melhores propostas de soluções.
- Conectadores: Evangelizam, envolvem e mobilizam as insittuições
a colocarem os seus desafios no portal e identificam, engajam e mobilizam
possíveis solucionadores para esses desafios.
- Multidão: Participantes dos desafios, através de recursos de
revisões, comentários, votação, ranqueamento, recomendações e geração de
soluções.
O modelo FLIRT, conforme figura 4.9.14, é constituído por cinco
elementos chamados de Focus (Foco), Language (Linguagem), Incentives
(Incentivos), Rules (Regras) e Tools (Ferramentas) que precisam ser
considerados em um projeto de Crowdsourcing, tanto para identificar e
responsabilizar o nível de participação dos quatro atores, como para definir
as etapas que devem ser seguidas na implantação de um projeto baseado
nas melhores práticas de inteligência coletiva. O Foco é caracterizado por
objetivos estratégicos (negócios), escala de atividades, áreas das atividades,
capacidades organizacionais, complexidade das atividades e tipos de
participantes. A Linguagem é constituída pelos objetos sociais, interação
social, presença organizacional, capacidades organizacionais e
203
complexidade das atividades. Os Incentivos são os objetivos dos negócios,
as áreas de atividades e os respectivos entregáveis. As ferramentas são
formadas por soluções responsáveis pelas ações e monitoramento das
atividades, suporte a criação e compartilhamento do conhecimento, pela
plataforma colaborativa, pelos participantes e clientes, além do suporte à
complexidade de realização das atividades.
Figura 4.9.14. Modelo FLIRT de Crowdsourcing. Fonte: Sami Viitamäki (2006).
A primeira etapa de um projeto de Crowdsourcing é a identificação
dos objetivos estratégicos e metas (foco), seguido das considerações táticas,
como linguagem, incentivos, regras e finalmente das operacionais e técnicas,
como a plataforma e tecnologia das soluções de Crowdsourcing.
As aplicações de Crowdsourcing permitem a geração de modelos de
negócios com e sem fins lucrativos, compreendendo as áreas de:
Inovação, avaliação e teste de produtos, ideias, conteúdos e
funcionalidades;
Desenvolvimento e design de produtos;
Produção (produtos físicos e digitais, conteúdos e informação);
Marketing (bens, serviços) e pesquisa de mercado e
204
Distribuição, logística e outros.
As iniciativas de Crowdsourcing podem ser classificadas, de acordo
com Thomas Malone (2004) em:
- Criatividade em Crowd: Valorização do poder da multidão para
desenvolvimento de projetos criativos.
- Conhecimento distribuído: Coleção e organização do
conhecimento.
- Inovação Aberta: A utilização do Crowd para desenvolver e
testar novas idéais.
- Trabalho em Cloud: Acessar uma força de trabalho por demanda
- Crowdfunding: Utilização do crowd para captação de capital
O atual ecossistema de empresas de inovação através de
Crowdsourcing é formatada em torno de tipos específicos de problemas: a
InnoCentive para a ciência, a Kaggle para desafios baseados em dados, a
TopCoder para a programação de computador e assim por diante. No entanto,
ao olhar para as formas como as empresas estão desenvolvendo novos
produtos e serviços e a dinâmica do próprio mercado de Crowdsourcing, pode-
se esperar pelo menos quatro alterações nos próximos anos (2015 a 2016):
- Mais provedores de serviços de nicho, graças à maior
modularização da plataforma: Com a tendência contínua em modularização de
produtos, serviços e processos de negócio, agora é possível decompor os
problemas de design ou de inovação mais difíceis em sub-problemas digeríveis
pela multidão. Isso faz com que as iniciativas de Crowdsourcing sejam menos
arriscadas do ponto de vista da propriedade intectual (PI). As multidões em
diferentes plataformas tendem a ser diferentes, de acordo com os seus
interesses e qualificações. A fim de responder às novas disparidades entre as
habilidades necessárias e as capacidades das comunidades existentes,
surgirão novas plataformas para solução de problemas específicos.
205
- Novos modelos de negócios em torno da idéia de agregação: O
operador de plataforma de Crowdsourcing pode desenvolver estratégias de
monetização com base em publicidade ou comissão recebida quando um
desafio é resolvido por membros da comunidade. As empresas com produtos
ou serviços tradicionais de B2B ou B2C estarão cada vez mais interessadas na
agregação de serviços de Crowdsourcing. Como exemplo, uma plataforma de
Crowdsourcing dedicado a desenvolvedores de produtos, poderá compartilhar
os projetos de produtos com vários desenvolvedores conectados na rede,
como também participar de desafios de Crowdsourcing dedicados ao
desenvolvimento de modelos ou protóticos de produtos baseados em
impressoras 3D.
- A emergência de integradores de Crowdsourcing: Quando as
empresas procuram decompor um problema em vários sub-problemas, o uso
de Crowdsourcing pode facilitar a solução do problema principal de forma
coletiva. Há uma necessidade de novas entidades assumirem o papel de
integrador: a ideia de um novo produto é enviada para um integrador que a
decompõe em vários sub-temas como logotipo, site, conceito de design e
fabricação de sub-problemas. Depois, cada sub-tema é oferecido para um
serviço de Crowdsourcing e o integrador recebe as soluções parciais e entrega
uma solução única e integrada. Modelos como este já estão surgindo e
algumas plataformas de Crowdsourcing estão oferecendo esse tipo de serviço,
como a da empresa Envato (market.envato.com).
- Adoção crescente de aplicações de mobile, por parte dos atuais
fornecedores de Crowdsourcing. Algumas plataformas Crowdsourcing já
oferecem a versão mobile, mas o uso de aplicativos móveis e tablets continua
limitado a serviços de Crowdsourcing mais gerais, como da empresa
Placemeter (placemeter.com). No entanto, uma percentagem significativa de
usuários de Internet já está usando seus celulares para navegar na web ou no
trabalho, colocando uma grande pressão sobre os prestadores de serviços
para estar presente no espaço mobile.
206
4.4.1 O Crowdsourcing e o terceiro setor
O terceiro setor e a sociedade civil são normalmente influenciadas
ou condicionadas pelas condições de descentralização e independência. Cada
fundação ou organização sem fins lucrativos é uma instituição autônoma,
responsável pela execução da sua missão através de projetos em
comunidades de sua influência. A fragmentação das iniciativas, em relação às
comunidades atendidas e à diversidade das demandas sociais tratadas,
dificulta a colaboração e o compartilhamento dos resultados obtidos pelas
instituições.
A disputa por recursos de financiadores particulares e públicos
também pode levar as instituições sem fins lucrativos para uma arena de
competição, dificultando as iniciativas de formação de uma rede de
colaboração para projetos sociais. Os grupos financiadores podem ajudar a
mediar esse problema de forma significativa, na medida em que podem reunir
diversos financiadores e expô-los a diversas demandas sociais, além da
criação de um espaço seguro para a aprendizagem e discussão crítica dos
problemas. Por outro lado, os grupos financiadores podem exercer o poder de
direcionar as propostas em função das necessidades dos seus negócios, de
políticas ou em atendimento a certas tendências que são de interesse de um
determinado grupo econômico. Uma forma de reduzir essas interferências é
desenvolver uma plataforma de Crowdsourcing com regras bem definidas e
mecanismos de avaliação das propostas baseados em critérios técnicos e
científicos, previamente estabelecidos pelos organizadores do desafio social.
A participação nos desafios sociais de Crowdsourcing deve ser
oferecida a uma ampla diversidade de pessoas contribuintes, para evitar uma
possível redução da independência e diversidade de contribuições. Outra
questão a destacar, de acordo com Jeff Howe (2002), é o compromisso coletivo
com o processo de Crowdsourcing ou o cultivo de comunidade robusta de
colaboradores que participam não somente pela recompensa financeira, mas,
principalmente, pela contribuição e engajamento na comunidade.
207
Um estudo do banco mundial de 2013, realizado pelo infoDEV
(Crowdfunding´s Potential for the Developing World), observou que as
plataformas online de crowdfunding estão se tornando uma indústria bilionária:
apenas o Kickstarter, considerada a maior plataforma do mundo, já
movimentou mais de 815 milhões de dólares. Segundo o estudo, são mais 343
sites similares nos Estados Unidos, 87 no Reino Unido, 53 na França e 21 no
Brasil. As plataformas online não são obrigatórias para uma campanha bem
sucedida, mas facilitam muito a obtenção do valor desejado, graças a vários
benefícios que vão além da intermediação com os possíveis financiadores. Os
principais benefícios, de acordo com o estudo são:
Reduzem os riscos de fracasso da campanha;
Criam um meio para engajar o público;
Ajudam com a contabilidade;
Criam um sistema de organização e integração dos recursos,
agindo como “orquestradores” das iniciativas.
As plataformas de Crowdfunding, uma das principais aplicações de
Crowdsourcing, apresentam baixo custo de operação se comparados com os
benefícios que o financiamento coletivo proporciona para as pessoas e
instituições. As plataformas mais utilizadas em 2014, de acordo com Eduardo
Portal Chaves dos Reis, são:
Benfeitoria: Uma plataforma desenvolvida no Brasil, que não
cobra nenhum tipo de comissão ou taxa. A operação e evolução
da plataforma é mantida por doações de pessoas e empresas que
se identificam com o tema.
Catarse.me: Primeira plataforma criada no Brasil em 2011 e, hoje,
a primeira plataforma do Brasil que possibilita o financiamento de
projetos criativos. Criada em 2011 por brasileiros, tornou-se a
maior plataforma de crowdfunding do Brasil.
Idea.me: Foi desenvolvida na Argentina e atualmente está
presente em 6 países latinos e nos Estados Unidos.
208
Eusocio.com: Plataforma voltada para o financiamento de micro e
pequenas empresas. É uma opção para empreendedores
captarem dinheiro e viabilizarem o plano de negócios da startup.
When You Wish: Startup americana de crowdfunding criada em
2011 com o conceito de capitalismo independente ou “indie”, onde
os participantes contam uns com os outros ao invés de
dependerem de bancos ou do governo. A When You Wish permite
que indivíduos ou organizações conectem-se a potenciais
doadores disponíveis para ativar suas ideias. Qualquer causa ou
projeto que precisar de um valor para ser concretizado pode
utilizar a ferramenta para buscar a verba necessária.
Microryza: Plataforma que se dedica exclusivamente a arrecadar
dinheiro para pesquisas. O diferencial da plataforma em relação
às demais é que ela não oferece uma recompensa concreta
(como dar uma cópia de um livro ou um arquivo em CD, por
exemplo), mas apenas compartilha os resultados de suas
pesquisas no site.
Kiva.org: Plataforma para captação de financiamento coletivo para
ajudar ONGs do mundo inteiro que atuam no combate à pobreza
de famílias em situação de vulnerabilidade.
Kickstarter.com: Plaforma criada em 2009, pioneira em
Crowdfunding nos EUA e considerada a maior operadora de
desafios criativos.
Crowdcube: plataforma britânica que permite que o público
compre participações em pequenas empresas.
GoFundMe: direcionada para ajudar no financiamento de
campanhas pessoais como a mensalidade de uma universidade
Razoo: ajuda instituições de caridade e sem fins lucrativos a
arrecadar recursos.
O Crowdfunding pode ser utilizado como modelo de negócios para
capitalizar a inteligência coletiva e permitir doações com fins lucrativos, ou seja,
209
geração de receita que será compartilhada para a oferta de um valor. Outra
aplicação seria a doação virtual sem fins lucrativos, ou seja, com finalidade de
suportar iniciativas sem fins lucrativos ou para solução de problemas sociais,
através da inteligência coletiva.
O crowdfunding para iniciativas sem fins lucrativos ou para a
caridade tem como objetivo conseguir dinheiro para uma causa de caridade
ou social, como doações pessoais (remédio para tratamentos de doenças),
para atendimento de necessidades coletivas (construção de uma vila para os
desabrigados das chuvas) e para suporte a uma atividade comunitária (oferta
de cursos de profissionalização). Os tipos de Crowdfunding de causas
sociais podem ser caracterizados como:
- Doações: Campanhas para arrecadação de doações (dinheiro)
para atender projetos sociais, sem nenhuma retribuição ao
doador.
- Engajamento para causas sociais: Mobilização para arrecadação
de bens e serviços para causas sociais, baseados em desafios e
etapas. A recompensa é baseada no reconhecimento das
comunidades em relação a contribuição e agregação de valor
para a causa social.
4.4.2 Uma proposta de Crowdsourcing para a 4ª Geração de Centros
de Inclusão Digital
Um cenário interessante seria aquele na qual a plataforma de
Crowdsourcing para causas sociais dos CIDs teria o Computer Clubhouse
como o organizador da plataforma, conectador com as comunidades para
identificar as demandas sociais e identificação de apoiadores para financiar e
apoiar os desafios sociais. A plataforma seria baseada em Crowdfunding,
com doações e contribuições que seriam administrados pelo Computer
Clubhouse e por membros das comunidades atendidas. O financiamento
coletivo poderia proporcionar uma geração de receita recorrente e uma
210
sustentabilidade a longo prazo para execução dos projetos para melhoria da
mobilidade social das comunidades participantes da rede de colaboração
social.
A priorização das demandas sociais seria obtida através de um
mecanismo de votação na plataforma de Crowdfunding e os desafios sociais
seriam oferecidos a dois públicos distintos:
- Fundações e Institutos: Seriam os patrocinadores dos desafios
sociais, com a finalidade de apoiar financeiramente os projetos
sociais, mediante recompensa de visibilidade e imagem de
empresa cidadã, através de um selo de reconhecimento a ser
comunicado ao mercado. A melhor oferta seria a vencedora e a
instituição teria uma pontuação para figurar no ranking das
empresas que mais contribuem para as causas sociais.
- Empresas, instituições e pessoas contribuidoras das soluções
dos desafios: Seriam os participantes responsáveis em oferecer
soluções para os desafios sociais lançados no portal e seriam
remunerados de acordo com o valor do desafio publicado.
A arquitetura do portal de Crowdsourcing social atenderia os
requisitos descritos na figura 4.9.15, de acordo com a seguinte configuração:
211
Figura 4.9.15 Requisitos para um Portal de Crowdsourcing: Adaptado de
Crowdsourcing: Why the Power of the Crowd Is Driving the Future of
Business, Jeff Howe, 2009.
- Objetivos: Desafios sociais em busca de soluções para problemas
sociais de comunidades carentes.
- Pessoas: Os participantes seriam as Fundações, Institutos e
empresas como finaciadores dos desafios e empresas, pessoas e
instituições que possam solucionar os problema sociais lançados,
como desafios sociais.
- Estrutura / Processos: O Computer Clubhouse seria o organizador
da rede e as funcionalidades do portal seriam de votação para
escolha dos desafios, seleção da instituição (Fundação, Instituto ou
empresa) que irá financiar o desafio e a seleção da melhor proposta
que será a vencedora do desafio.
- Incentivos: As Fundações e Institutos seriam reconhecidos através
de um selo de empresa cidadã, além de figurarem em um ranking
nacional de contribuidores de projetos sociais. As empresas,
pessoas e instituições vencedoras dos desafios seriam
remuneradas de acordo com o valor do desafio e o Computer
Clubhouse, como organizador, receberia 30% de cada valor
lançado nos desafios.
O Computer Clubhouse teria uma coleção de propostas para soluções
dos desafios apresentados que, mesmo sem serem vencedores, poderiam gerar
conhecimentos e possível geração de receita, através de mecanismos de
monetização a serem desenvolvidos futuramente.
4.4.3 Identificação do nível de Maturidade desejado para a Quarta
Geração de Centros de Inclusão digital
212
A quarta geração de centros de inclusão digital pode ser uma proposta
de continuidade para o projeto de centros de inclusão digital da Fundação
Bradesco, com o objetivo de desenvolver mecanismos de sustentabilidades para
as instituições participantes da rede e a geração de autonomia em relação ao
apoio financeiro da Fundação Bradesco. O Computer Clubhouse assumiria a
coordenação da geração de sustentabilidade da rede através da organização do
portal de Crowdsourcing Social.
A rede de tecnologia social seria formada por um nó central, o
Computer Clubhouse, e pelos centros de inclusão digital, que seriam os nós
representando os pontos de vulnerabilidade social em todo o Brasil. A
importância dessa rede poderia ser comparada ao portal “Reclame Aqui”, onde
as demandas sociais prioritárias seriam cadastradas pelos CIDs em busca de
financiamento dos desafios sociais e da solução por parte dos participantes dos
desafios. As fundações, institutos e empresas financiadoras dos desafios sociais
seriam percebidos pelo mercado como agentes atuantes no suporte da melhoria
da mobilidade social das comunidades carentes, com um portfólio de realizações
que seriam comunicados através das redes sociais.
O Computer Clubhouse assumiria um papel de disseminador das
melhores práticas de engajamento social por parte das comunidades carentes,
além da propagação do conhecimento adquirido em relação as milhares de
propostas de soluções aos desafios sociais. Uma possibilidade de geração de
receita no futuro, para a rede, seria a monetização do conhecimento gerado pela
oferta de soluções para os desafios sociais.
A arquitetura a ser desenvolvida poderia utilizar as soluções open
source de Crowdsourcing, como a da empresa Noosfero, que permite uma
parametrização das funcionalidades de acordo com os papeis de organizador,
conectador, críticos e participação da multidão, característicos de uma solução
de Crowdsourcing.
A Fundação Bradesco permaneceria no apoio da articulação de
implantação dos CIDs e também na participação dos desafios sociais, fornecendo
credibilidade para a rede e favorecendo a participação de outros institutos,
213
fundações e empresas patrocinadoras dos desafios sociais. A coordenação da
rede pelo Computer Clubhouse evitaria disputas entre os financiadores dos
desafios sociais, uma característica comum das entidades do terceiro setor.
A proposta para a quarta geração de inclusão digital baseada em
inteligência coletiva e Crowdsourcing social pode ser caracterizada de acordo
com o framewok de mautridade como sendo do nível 5, da inovação efetiva, pois
a inteligência coletiva e o Crowdsourcing Social serão os principais elementos em
busca da sustentabilidade dos centros de inclusão digital, bem como da
disseminação do conhecimento e a aplicação da tecnologia social, em busca das
soluções dos problemas sociais, de forma coletiva e integrada em uma
plataforma de rede social. No caso a Fundação Bradesco, em continuidade a
implantação dos centros de inclusão digital seria a responsável pela formação de
uma rede de Crowdsourcing Social, conforme as funcionalidades do nível 5 de
maturidade mostradas mostrado na figura 4.9.16.
214
Figura 4.9.16. Nível de maturidade proposto para a quarta geração de
inclusão digital. Fonte: Autor.
215
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho realizado seguiu a trilha da pesquisa qualitativa, com base
no estudo do caso do projeto de inclusão digital da Fundação Bradesco através
do desenvolvimento e aplicação de um “framework de maturidade de inclusão
digital” que inclui as melhores práticas contemporâneas adotadas nas soluções
de Tecnologia da Informação.
A perspectiva particular das iniciativas de inclusão digital adotada
decorre da participação efetiva do autor na iniciativa analisada, seja como
colaborador da Fundação Bradesco, seja como um dos principais responsáveis
pela implantação da tecnologia educacional e social nos projetos desenvolvidos
durante o período de 2001 a 2010.
A aplicação do framework desenvolvido permitiu a identificação das
gerações e das ondas de inclusão digital dessa iniciativa da Fundação Bradesco
e a análise de seu impacto nas comunidades carentes em que se inseriam e
portanto houve uma validação em um caso prático.
O impacto foi dimensionado pelo nível de contribuição para a melhoria
da mobilidade social, com um dos fatores preponderantes da inclusão social. A
tecnologia social e a educação sociocomunitária foram abordadas como fatores
essencias e críticos para o atingimento dos níveis mais altos de inclusão digital,
ou seja do nível reativo (1) para o nível de inovação efetiva (5), de acordo como o
framework proposto.
A aplicação do framework facilitou sobremodo a compreensão da
evolução representada pela passagem de um modelo baseado essencialmente
no acesso à tecnologia da informação, para um modelo de aplicação de
tecnologia social e geração de sustentabilidade, sempre com vistas ao
aperfeiçoamento do processo de inclusão social.
O quadro 5.1 mostra as características das gerações e das ondas de
inclusão digital das iniciativas coordenadas pela Fundação Bradesco, bem como
216
seus períodos de duração, principais atores e participantes do movimento e a
respectiva estratégia de ação.
Geração Ondas Período Principais
atores
Estratégia de
ação
Primeira –
Inclusão
Digital
Primeira:
Implantação
pela Fundação
Bradesco e
oferta de cursos
pela escola
virtual.
2004 -
atual
Fundação
Bradesco,
escolas
públicas,
centros
comunitários.
Implantação de
centros para
acesso à
tecnologia da
informação e
comunicação.
Segunda:
Parceria com
empresas
provedoras de
tecnologia.
2004 -
2009
Microsoft,
Cisco, Intel,
centros
comunitários.
Parceria para
implantação de
CIDs com
empresas, como
Microsoft, Cisco,
Intel.
Terceira:
Implantação do
Computer
Clubhouse.
2004 -
atual
Fundação
Bradesco,
Media Lab MIT,
Intel, Microsoft e
centros
comunitários.
Parceria com a
Intel para
implantação do
Computer
Clubhouse no Jd.
Conceição,
Osasco, SP.
Segunda –
Rede de
inclusão social
(RIS)
Primeira:
Parceria para a
sustentabilidade.
2004 –
atual
ATN-
Associação de
Tecentros de
Negócios.
Desenvolvimento
da
sustentabilidade
dos centros
comunitários.
Segunda:
Parceria com as
Comunidades
indígenas.
2004-2010 Comunidades
Indígenas
Microsoft, BT,
Intel
Desenvolvimento
da
sustentabilidade
nas comunidades
indígenas.
Terceira –
Rede de
Primeira: Projeto
a cidade que a
2007-2010 MIT Media Lab Desenvolvimento
e implantação da
217
Tecnologia
Social
gente quer. tecnologia social
para a melhoria
da inclusão
social.
Segunda:
Parceria com o
MIT D-Lab e
USP/Poli Cidadã
2007-2010 MIT D-Lab,
EPUSP
Desenvolvimento
e implantação da
tecnologia social
para a melhoria
da inclusão
social.
Quadro 5.1 – As gerações e ondas de inclusão digital – 2004 a 2010 da
Fundação Bradesco. Fonte: Autor (2014).
A principal contribuição proporcionada por este trabalho, realizado e
tendo como pano de fundo as ações de implantação de uma das maiores redes
de inclusão digital no Brasil, foi a proposta de um framework para projeto e
acompanhamento de iniciativas de inclusão digital que, na visão do autor, pode
ser utilizado numa ampla gama de de projetos de tecnologia social e iniciativas de
educação sociocomunitária. Nota-se que nenhum framework equivalente foi
identificado pelo autor, na pesquisa que realizou para a elaboração deste trabalho
(fevereiro de 2014 a março de 2015).
O framework desenvolvido pelo autor, conforme a figura 5.1 considera
que a melhoria da mobilidade social, da inclusão social e da mobilização das
comunidades carentes são os fatores preponderantes para a evolução dos níveis
de maturidade, do nível 1 reativo (menor) para o nível 5 de inovação efetiva
(maior).
218
Figura 5.1 Modelo de Maturidade de inclusão digital, Fonte: Adaptado pelo
autor do Modelo IT Score do Gartner
Um resultado importante do uso desta metodologia, foi a possibilidade
de se criar pela aplicação do framework, um possível cenário de continuidade dos
projetos de inclusão digital da Fundação Bradesco, através do atingimento do
nível 5 de maturidade, que o autor chama de 4a geração de inclusão digital. A
utilização da inteligência coletiva e a aplicação do Crowdsourcing Social podem
ter um papel significativo na busca da sustentabilidade e propagação do
conhecimento na rede de inclusão social. Nesse quadro, o Computer Clubhouse,
a iniciativa de inclusão digital e de aplicação da tecnologia social coordenada pela
Fundação Bradesco no Brasil, aparece como a iniciativa com as melhores
condições para exercer o papel de nó central da rede de tecnologia social, na
estruturação de um movimento de Crowdsourcing Social.
219
Além disso, este trabalho evidencia o potencial das contribuições que
os centros de inclusão digital podem trazer para a educação sociocomunitária e
a tecnologia social e apresenta a análise da maturidade dos centros como
ferramenta para por em prática essa possibilidade. São exemplos disso os
resultados obtidos pelo Computer Clubhouse (CCH) e as iniciativas
desenvolvidas em parceria com o MIT Media Lab, MIT D-LAB (“Development
Laboratory”) e a USP Poli Cidadã. O projeto Computer Clubhouse atingiu um
nível de maturidade nível 4 e pode ser o hub central de um Crowdsourcing
Social, como mostrado no capítulo 4.
O autor entende que o framework, desenvolvido segundo uma
perspectiva qualitativa, poderá ser aprimorado pela inclusão de indicadores
quantitativos, em uma etapa futura da evolução deste trabalho, que representem
a assertividade dos níveis de maturidade em cada nível, de acordo com a
classificação adotada.
Finalmente, uma proposta complementar para a continuidade deste
trabalho, além da já apresentada seria o aprimoramento do framework de
maturidade para análise de uma iniciativa de inclusão digital ou projeto de
educação sociocomunitária, através da análise de gaps explicitados em gráfico
tipo radar em relação a um projeto de referência, para evidenciar os principais
parâmetros ou características a serem melhorados e, para atingimento dos níveis
superiores da maturidade. O gap seria levantado em função de um referencial de
melhores práticas de projetos de inclusão digital ou de educação
sociocomunitária, que também poderia ser levantado na continuidade deste
trabalho.
220
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