Cenário acadêmico-institucional dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia do BrasilDissertação. Gabrielle Tanus.2013

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  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIA DA INFORMAO ESCOLA DE CINCIA DA INFORMAO Gabrielle Francinne de Souza Carvalho Tanus CENRIO ACADMICO-INSTITUCIONAL DOS CURSOS DE ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E MUSEOLOGIA DO BRASIL Belo Horizonte 2013

2. Gabrielle Francinne de Souza Carvalho Tanus CENRIO ACADMICO-INSTITUCIONAL DOS CURSOS DE ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E MUSEOLOGIA DO BRASIL Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Cincia da Informao da Escola de Cincia da Informao da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito para obteno do ttulo de Mestre em Cincia da Informao. Linha de Pesquisa: Informao, Cultura e Sociedade rea de concentrao: Produo, Organizao e Utilizao da Informao Orientador: Carlos Alberto vila Arajo Coorientadora: Letcia Julio Belo Horizonte 2013 3. T169c Tanus, Gabrielle Francinne de Souza Carvalho. Cenrio acadmico-institucional dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia do Brasil [manuscrito] / Gabrielle Francinne de Souza Carvalho Tanus. 2013. 242 f. : enc. Orientador: Carlos Alberto vila Arajo. Coorientadora: Letcia Julio. Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Cincia da Informao. Referncias: f. 216-233. Inclui apndice. 1. Cincia da informao Teses. 2. Arquivologia Teses. 3. Biblioteconomia Teses. 4. Museologia Teses. I. Ttulo. II. Arajo, Carlos Alberto vila. III. Julio, Letcia. IV. Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Cincia da Informao. CDU: 02 Ficha catalogrfica: Biblioteca Prof Etelvina Lima, Escola de Cincia da Informao da UFMG 4. Aos homens da minha vida, desta margem, Gustavo Tanus, e da outra margem, Hlio Eduardo. 5. AGRADECIMENTOS Ao professor, orientador e amigo Carlos Alberto (Casal) que acolheu esta pesquisa desde o incio com dedicao, sabedoria, pacincia e respeito s minhas sugestes, possibilitando a concretizao de um sonho. Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES/REUNI) pela concesso da bolsa, que viabilizou a minha dedicao integral. minha tutora, coorientadora e amiga Letcia Julio, pelo desenvolvimento do trabalho como bolsista CAPES/REUNI do curso de Museologia da UFMG, pelas conversas e orientaes sinceras. Ao grupo de pesquisa Observatrio de Museus, pelos encontros e trocas de experincias com todos os integrantes, bolsistas da ps-graduao e da graduao, e, em especial, aos professores: Letcia, Ren Lommez, Luiz Henrique, Paulo Sabino, Verona Campos e Rubens. Aos professores Armando Malheiro, Adalson Nascimento e Letcia Julio, composio da banca de qualificao desta pesquisa. Aos professores que fizeram parte da banca de defesa, Carlos Alberto, Letcia Julio, Adalson Nascimento e Ana Maria Pereira Cardoso, os quais contriburam com valiosos comentrios. professora Marlene Oliveira pela introduo iniciao cientfica. Aos professores e colegas do programa de ps-graduao em Cincia da Informao pelas aulas e conhecimentos compartilhados. Aos servidores das bibliotecas da ECI, FAFICH e da FALE pelo trabalho de desenvolvimento do acervo, que possibilitou o acesso s leituras diversas. Aos funcionrios e professores dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, de todos os pontos cardeais, que contriburam para a realizao desta pesquisa. minha famlia, Maria Jos (me), Hlio Eduardo (pai) e Katlen (irm). E aos tios Antnio, Claudira e Dorinha pelo constante carinho. Aos amigos Isabela Trpia e Joo Pardo pelos abstracts. Ao meu amor, Gustavo Tanus, pelo apoio incondicional, por acreditar em mim, pelas conversas, leituras compartilhadas, pela compreenso de minha ausncia, por tudo! 6. Todo sistema de educao uma maneira poltica de manter ou de modificar a apropriao dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo. (FOUCAULT, 2004, p.44). (...) como qualquer outra atividade social, a cincia no existe no ar, ela uma obra produzida pelos homens que se desenvolve em determinado contexto social, dentro de certo tipo de organizaes e instituies. (DEUS, 1979, p. 15). 7. RESUMO A Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia so campos cientficos que possuem trajetrias de formao e configuraes acadmico-institucionais diferentes. Desta forma, partiu-se do pressuposto de que estes campos, permeados pelas relaes de poder, podem sofrer influncias das localizaes de cada curso, bem como o fato de estarem prximos e/ou afastados uns dos outros, e da ps-graduao em Cincia da Informao. Assim, objetivou-se analisar a influncia acadmico-institucional nos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia do Brasil. Para tanto, utilizou-se como instrumento de coleta de dados o plano de ensino das disciplinas tericas especficas e um questionrio composto de cinco questes abertas que foi enviado aos professores dessas disciplinas. Identificou-se ainda a formao acadmica (graduao, mestrado e doutorado) desses professores a fim de analisar a influncia de suas formaes no ensino daqueles cursos. No primeiro momento, realizou-se a anlise desses planos de ensino por meio do mtodo bibliomtrico, da anlise de citaes das referncias e, no segundo momento, analisou-se o questionrio utilizando a Anlise de Contedo, para categorizao das respostas, e da Anlise do Discurso, para interpretao dos discursos em seus contextos. Para a realizao da pesquisa fez-se necessrio agrupar os cursos em seis categorias, as quais correspondem proximidade entre os cursos em uma mesma instituio de ensino superior. A leitura de Bourdieu e Foucault subsidiou a interpretao dos planos de ensino e questionrios. As referncias foram tabuladas a fim de obter as obras, os autores mais citados, o perfil dessas obras segundo a tipologia, a idade e o idioma referenciado nos planos de ensino e questionrio. Os resultados desta pesquisa apontaram que prevaleceu nas disciplinas a citao de livros, datados da dcada de 2000 e em portugus. A influncia acadmico- institucional advinda da anlise das referncias pode ser percebida em todos os cursos pertencentes s seis categorias. Quanto s outras perguntas do questionrio, detectou-se que os professores consideraram a formao acadmica como o fator que mais influencia nas suas escolhas, seguido da proximidade em relao aos cursos de ps- graduao e, por ltimo, a vinculao acadmico-institucional e a proximidade entre os cursos de graduao. Sobre as relaes entre Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia foi possvel perceber que a maioria dos professores consideraram haver pontos de contatos entre esses campos. Palavras-chaves: Arquivologia; Biblioteconomia; Museologia; Cincia da Informao; Campo cientfico; configurao acadmico-institucional; epistemologia. 8. ABSTRACT The Archival Science, Library Science and Museology are scientific fields that have got different training trajectories and academic-institutional settings. Thus, we started with the assumption that these fields, permeated by power relations, can be influenced by the place where each course is located, as well as the fact that they could be near and / or far from each other and also from the Information Science post-graduation course. The objective was to analyze the academic-institutional influence on Archival Science, Library Science and Museology in Brazil. Therefore, the teaching class planning of specific theoretical subjects and a questionnaire with five open questions that was sent to these teachers were used as an instrument for data collection. It was also identified the degree of each teacher in order to analyze the influence of their training choices in the references cited in their class planning. At first, we carried out the analysis of these educational plans through bibliometric method of citation analysis, after the questionnaire was analyzed using the Content Analysis Method to categorize the responses and then the Discourse Analysis Method to interpret the speeches in their contexts. It was necessary for the research to group the courses into six categories, which correspond to the proximity among them on the same education institution. Reading Bourdieu and Foucault supported the interpretation of the teaching class planning and questionnaire. References were tabulated in order to get the most cited authors, the works and also the profile of these works by type, age and language referenced in the teaching plans and the questionnaire. The results of this research showed that prevails in the disciplines the cited books, dating from the 2000s and in Portuguese. The influence of the academic-institutional analysis comes from the references and it can be seen as belonging to all six categories courses. As for the other questions in the questionnaire, it was found that teachers considered their academic formation as the most influenced factor in their choices, followed by the proximity of the post-graduate courses and lastly, the academic-institutional linking and proximity among the undergraduate courses. Concerning Archival Science, Library Science and Museology it was possible to notice that most teachers have found links among these fields. Keywords: Archival Science; Library Science; Museology; Information Science; Scientific field; Academic-institutional settings; epistemology. 9. LISTA DE ILUSTRAES Grfico 1: Crescimento dos cursos de Arquivologia em funcionamento no Brasil ....... 91 Grfico 2: Distribuio por regio dos cursos de Arquivologia no Brasil ..................... 91 Grfico 3: Categoria administrativa dos cursos de Arquivologia no Brasil................... 91 Grfico 4: Distribuio por regio dos cursos de Biblioteconomia no Brasil.............. 101 Grfico 5: Categoria administrativa dos cursos de Biblioteconomia no Brasil............ 101 Grfico 6: Distribuio por regio dos cursos ps-graduao em C.I no Brasil .......... 102 Grfico 7: Crescimento dos cursos de Biblioteconomia em funcionamento no Brasil 103 Grfico 8: Crescimento dos cursos de ps-graduao em Cincia da Informao em funcionamento no Brasil............................................................................................... 104 Grfico 9: Distribuio por regio dos cursos de Museologia no Brasil...................... 115 Grfico 10: Categoria administrativa dos cursos de Museologia no Brasil ................. 115 Grfico 11: Crescimento dos cursos de Museologia em funcionamento no Brasil...... 115 Grfico 12: Crescimento dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia em funcionamento no Brasil............................................................................................... 118 Figura 1: Localizao das seis categorias nos estados brasileiros................................ 120 10. LISTA DE QUADROS Quadro 1: Ano de criao dos programas de ps-graduao (mestrado e doutorado em funcionamento) em Cincia da Informao no Brasil.................................................. 103 Quadro 2: Localizao das instituies dentro das seis categorias .............................. 119 Quadro 3: Obra mais citada da Arquivologia Categoria A ....................................... 126 Quadro 4: Autor mais citado da Arquivologia Categoria A...................................... 126 Quadro 5: Obra mais citada da Arquivologia Categoria AB..................................... 128 Quadro 6: Autor mais citado da Arquivologia Categoria AB ................................... 130 Quadro 7: Obra mais relevante da Arquivologia Categoria AB................................ 130 Quadro 8: Autor mais relevante da Arquivologia Categoria AB .............................. 131 Quadro 9: Obra mais citada da Biblioteconomia Categoria AB ............................... 132 Quadro 10: Autor mais citado da Biblioteconomia Categoria AB............................ 133 Quadro 11: Obra mais relevante da Biblioteconomia Categoria AB ........................ 134 Quadro 12: Autor mais relevante da Biblioteconomia - Categoria AB........................ 134 Quadro 13: Obra mais citada da Arquivologia Categoria ABM ............................... 135 Quadro 14: Autor mais citado da Arquivologia Categoria ABM.............................. 136 Quadro 15: Obra mais relevante da Arquivologia Categoria ABM.......................... 137 Quadro 16: Autor mais relevante da Arquivologia Categoria ABM......................... 137 Quadro 17: Obra mais citada da Biblioteconomia Categoria ABM.......................... 139 Quadro 18: Autor mais citado da Biblioteconomia Categoria ABM ........................ 140 Quadro 19: Obra mais relevante da Biblioteconomia Categoria ABM..................... 141 Quadro 20: Autor mais relevante da Biblioteconomia Categoria ABM ................... 142 Quadro 21: Obra mais citada da Museologia Categoria ABM.................................. 143 Quadro 22: Autor mais citado da Museologia Categoria ABM................................ 145 Quadro 23: Obra mais relevante da Museologia Categoria ABM ............................ 146 Quadro 24: Autor mais relevante da Museologia Categoria ABM ........................... 146 11. Quadro 25: Obra mais citada da Biblioteconomia Categoria B ................................ 148 Quadro 26: Autor mais citado da Biblioteconomia Categoria B............................... 148 Quadro 27: Obra mais relevante da Biblioteconomia Categoria B ........................... 149 Quadro 28: Autor mais relevante da Biblioteconomia Categoria B.......................... 149 Quadro 29: Obra mais citada da Biblioteconomia Categoria BM............................. 151 Quadro 30: Autor mais citado da Biblioteconomia Categoria BM ........................... 151 Quadro 31: Obra mais relevante da Biblioteconomia Categoria BM........................ 152 Quadro 32: Autor mais relevante da Biblioteconomia Categoria BM ...................... 152 Quadro 33: Obra mais citada da Museologia Categoria BM..................................... 153 Quadro 34: Autor mais citado da Museologia Categoria BM................................... 153 Quadro 35: Obra mais relevante da Museologia Categoria BM ............................... 154 Quadro 36: Autor mais relevante da Museologia Categoria BM .............................. 155 Quadro 37: Obra mais citada da Museologia Categoria M ....................................... 155 Quadro 38: Autor mais citado da Museologia - Categoria M ...................................... 156 Quadro 39: Obra mais relevante da Museologia Categoria M.................................. 157 Quadro 40: Autor mais relevante da Museologia Categoria M................................. 157 Quadro 41: Classificao das obras citadas nos planos de ensino da Arquivologia .... 159 Quadro 42: Classificao das obras citadas como mais relevantes da Arquivologia... 159 Quadro 43: Classificao das obras citadas nos planos de ensino da Biblioteconomia161 Quadro 44: Classificao das obras citadas como mais relevantes da Biblioteconomia ...................................................................................................................................... 161 Quadro 45: Classificao das obras citadas nos planos de ensino da Museologia....... 163 Quadro 46: Classificao das obras citadas como mais relevantes da Museologia ..... 164 Quadro 47: Formao acadmica dos professores da Arquivologia ......................... 166 Categoria A................................................................................................................... 166 Quadro 48: Formao acadmica dos professores da Arquivologia Categoria AB .. 167 Quadro 49: Formao acadmica dos professores de Biblioteconomia Categoria AB ...................................................................................................................................... 168 12. Quadro 50: Formao acadmica dos professores da Arquivologia Categoria ABM169 Quadro 51: Formao acadmica dos professores da Biblioteconomia Categoria ABM ...................................................................................................................................... 171 Quadro 52: Formao acadmica dos professores da Museologia Categoria ABM . 172 Quadro 53: Formao acadmica dos professores da Biblioteconomia -Categoria B . 174 Quadro 54: Formao acadmica dos professores da Biblioteconomia Categoria BM ...................................................................................................................................... 175 Quadro 55: Formao acadmica dos professores da Museologia Categoria BM.... 176 Quadro 56: Formao acadmica dos professores da Museologia Categoria M....... 178 Quadro 57: Anlise da influncia da formao acadmica dos professores dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia ............................................................. 179 Quadro 58: Somatrio da formao acadmica dos cursos de Arquivologia............... 180 Quadro 59: Somatrio da formao acadmica dos cursos de Biblioteconomia ......... 180 Quadro 60: Somatrio da formao acadmica dos cursos de Museologia ................. 180 Quadro 61: Anlise da influncia acadmico-institucional entre os cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia ............................................................. 190 Quadro 62: Anlise da influncia da ps-graduao nos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia..................................................................................... 196 Quadro 63: Relaes entre Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia na viso dos professores.................................................................................................................... 206 13. LISTA DE SIGLAS AAB Associao dos Arquivistas Brasileiros ABEBD Associao Brasileira das Escolas de Biblioteconomia e Documentao ABECIN Associao Brasileira de Educao em Cincia da Informao ABRAINFO Associao Brasileira dos Profissionais da Informao ADI American Documentation Institute ALA American Library Association ANCIB Associao Nacional de Pesquisas e ps-graduao em Cincia da Informao ARIST Annual Review of Information Science and Technology ASIS American Society for Information Science CA Cursos Avulsos CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CBF Curso fundamental de Biblioteconomia CBN Cursos da Biblioteca Nacional CDD Classificao Decimal de Dewey CDU Classificao Decimal Universal CFE Conselho Federal da Educao CIA Conselho Internacional de Arquivos CIDOC - Comit internacional para a Documentao CNE Conselho Nacional da Educao CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico CONARQ Conselho Nacional de Arquivos CSB Curso Superior de Biblioteconomia 14. DASP Departamento Administrativo do Servio Pblico ECI Escola de Cincia da Informao ENANCIB Encontro Nacional de Pesquisa em Cincia da Informao e Biblioteconomia FAECA Faculdade e Colgio Dom Bosco de Monte Aprazvel FAINC Faculdades Integradas Corao de Jesus FATEA Faculdades Integradas Teresa Dvila FESPSP Fundao Escola de Sociologia e Poltica de So Paulo FGV Fundao Getlio Vargas FID Federao Internacional de Documentao FUNLEC Fundao Lowtons de Educao e Cultura FURG Universidade Federal do Rio Grande IBICT Instituto Brasileiro de Cincia e Tecnologia IBRAM Instituto Brasileiro de Museus ICOFOM Comit Internacional de Museologia ICOFOM LAM - Comit Internacional de Museologia para Amrica Latina e Caribe ICOM Conselho Internacional de Museus ICTOP Comit Internacional para Treinamento de Pessoal em Museus IES Instituio de Ensino Superior IFLA Federao Internacional das Associaes e Instituies Bibliotecrias IIB Instituto Internacional de Bibliografia IID Instituto Internacional de Documentao INTEGRAR Congresso Internacional de Arquivos, Bibliotecas, Centros de Documentao e Museus LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao MEC Ministrio da Educao 15. MinC Ministrio da Cultura MINOM Movimento Internacional para uma Nova Museologia OIM Oficina Internacional de Museus PNE Plano Nacional da Educao PUC Pontifcia Universidade Catlica REUNI Plano de Estruturao e Expanso das Universidades Federais Brasileiras TAC Tabela de rea do Conhecimento UDESC Universidade Federal do Estado de Santa Catarina UEL Universidade Estadual de Londrina UEPB Universidade Estadual da Paraba UESPI Universidade Estadual do Piau UFAL Universidade Federal de Alagoas UFAM Universidade Federal do Amazonas UFBA Universidade Federal da Bahia UFC Universidade Federal do Cear UFES Universidade Federal do Espirito Santo UFF Universidade Federal Fluminense UFG Universidade Federal de Gois UFMA Universidade Federal do Maranho UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFMT Universidade Federal de Mato Grosso UFOP Universidade Federal de Ouro Preto UFPA Universidade Federal do Par UFPB Universidade Federal da Paraba UFPE Universidade Federal de Pernambuco 16. UFPEL Universidade Federal de Pelotas UFRB Universidade Federal do Recncavo Baiano UFRGS Universidade Federal do Rio Grande Sul UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFS Universidade Federal de Sergipe UFSC Universidade Federal de Santa Catarina UFSCar Universidade Federal de So Carlos UFSM Universidade Federal de Santa Maria UnB Universidade de Braslia UNESCO Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e Cultura UNESP Universidade Estadual Paulista UNIBAVE Centro Universitrio Barriga Verde UNIFAI Centro Universitrio Assuno UNIFOR Centro Universitrio de Formiga UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro USP Universidade de So Paulo USU Universidade Santa rsula 17. SUMRIO 1. INTRODUO ........................................................................................................ 22 2. OS CAMPOS CIENTFICOS DA ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA, MUSEOLOGIA E SUAS RELAES COM A CINCIA DA INFORMAO. 34 2.1 Campo cientfico da Arquivologia ........................................................................ 34 2.1.1 Campo Cientfico da Cincia da Informao e suas relaes com a Arquivologia43 2.2 Campo cientfico da Biblioteconomia ................................................................... 51 2.2.1 Campo cientfico da Cincia da Informao e suas relaes com a Biblioteconomia ............................................................................................................. 59 2.3 Campo cientfico da Museologia ........................................................................... 67 2.3. 1 Campo cientfico da Cincia da Informao e suas relaes com a Museologia. 76 3. TRAJETRIA DO ENSINO DA ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E MUSEOLOGIA NO BRASIL ..................................................................................... 83 3.1 A trajetria do ensino da Arquivologia no pas................................................... 83 3.1.1 Configuraes acadmico-institucionais da Arquivologia.................................... 90 3.2 A trajetria do ensino da Biblioteconomia no pas.............................................. 93 3.2.1 Configuraes acadmico-institucionais da Biblioteconomia............................. 101 3.3 A trajetria do ensino da Museologia no pas.................................................... 106 3.3.1 Configuraes acadmico-institucionais da Museologia .................................... 114 3.4 Sntese do ensino do ensino da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia 117 4 ANLISE DA INFLUNCIA ACADMICO-INSTITUCIONAL NOS CURSOS DE ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E MUSEOLOGIA .................... 119 4.1 Sistematizao da anlise..................................................................................... 119 4.2 Anlise de citao das referncias....................................................................... 126 18. 4.2.1 Categoria A ........................................................................................................ 126 4.2.2 Categoria AB...................................................................................................... 127 4.2.2.1 Cursos de Arquivologia...................................................................................... 127 4.2.2.2 Curso de Biblioteconomia ................................................................................. 131 4.2.3 Categoria ABM.................................................................................................. 134 4.2.3.1 Cursos de Arquivologia...................................................................................... 134 4.2.3.2 Curso de Biblioteconomia ................................................................................. 138 4.2.3.3 Curso de Museologia......................................................................................... 142 4.2.4 Categoria B......................................................................................................... 147 4.2.5 Categoria BM..................................................................................................... 150 4.2.5.1 Curso de Biblioteconomia ................................................................................. 150 4.2.5.2 Curso de Museologia......................................................................................... 153 4.2.6 Categoria M ....................................................................................................... 155 4.3. Sntese da anlise das citaes............................................................................ 158 4.3.1 Arquivologia........................................................................................................ 158 4.3.2 Biblioteconomia .................................................................................................. 160 4.3.3 Museologia .......................................................................................................... 162 4.4 Anlise de contedo do questionrio .................................................................. 166 4.4.1 Influncia da formao acadmica ...................................................................... 166 4.4.4.1 Sntese da influncia da formao acadmica.................................................. 179 4.4.2 Influncia acadmico-institucional: proximidade e/ou afastamento entre os cursos de graduao................................................................................................................. 181 4.4.2.1 Sntese da influncia acadmico-institucional.................................................. 189 4.4.3 Influncia acadmico-institucional: proximidade e/ou afastamento entre os cursos de graduao com os de ps-graduao ....................................................................... 190 4.4.3.1 Sntese da influncia acadmico-institucional.................................................. 196 19. 4.4.4 Relaes entre Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia na viso dos professores.................................................................................................................... 197 4.4.4.1 Sntese das relaes entre Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia ........ 206 5. CONSIDERAES FINAIS................................................................................. 207 REFERNCIAS ......................................................................................................... 216 APNDICE A: Nome das disciplinas tericas especficas identificadas nos currculos dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia................. 234 APNDICE B: Questionrio enviado aos professores das disciplinas tericas especficas .................................................................................................................... 236 APNDICE C: Configurao acadmico-institucional dos cursos de Arquivologia ...................................................................................................................................... 237 APNDICE D: Configurao acadmico-institucional dos cursos de Biblioteconomia .......................................................................................................... 238 APNDICE E: Configurao acadmico-institucional dos cursos de Museologia ...................................................................................................................................... 240 APNDICE F: Universo da coleta de dados (Plano de ensino e questionrio) ... 241 20. 22 1. INTRODUO A seleo dos quatro campos cientficos: Arquivologia, Biblioteconomia, Museologia e Cincia da Informao1 para composio da temtica desta dissertao no foi uma escolha aleatria, pois se acredita que h entre esses campos certos pontos de contatos que possibilitam tal escolha. Especificamente no caso da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, destacam-se entre elas duas vias de aproximaes, uma de cunho etimolgico (formao das palavras) e outra de cunho histrico (histria do processo de constituio dos campos e das instituies: arquivos, bibliotecas e museus). Em relao Cincia da Informao a aproximao entre esses campos cientficos ocorre por meio da configurao acadmico-institucional desses cursos, os quais podem ser encontrados nos departamentos, escolas, centros, faculdades e institutos de Cincia da Informao, ou ainda prximos dos programas de ps-graduao em Cincia da Informao. Alm disso, possvel encontrar na literatura desses campos uma proximidade terico-epistemolgica que possibilita articular todos esses quatro campos cientficos. Acerca daquele primeiro ponto de contato entre a Arquivologia, a Biblioteconomia e a Museologia, destaca-se a etimologia dessas palavras, as quais carregam consigo uma relao ntima entre a formao de suas palavras com as respectivas instituies dos arquivos, bibliotecas e museus, conforme se pode notar: Arquivologia deriva do latim archivum (arquivo), cuja origem remonta ao grego ta arkheia registros pblicos, de arkheion prefeitura, governo municipal, de arkh comeo, origem; a palavra Biblioteconomia advm do grego biblon livro, suporte da escrita, thke caixa, depsito, as quais formam juntas, a concepo de Biblioteca; e a palavra Museologia, tambm de origem grega, deriva inicialmente de mouseon templo das musas e, posteriormente, em latim museum (museu). O sufixo grego logos, que compe as palavras Arquivologia e Museologia marca a preocupao com a razo, atestando, assim, a existncia de um campo cientfico, enquanto o sufixo nomos regra, lei da palavra Biblioteconomia marcaria uma postura 1 Os usos das palavras Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, assim como, arquivo, biblioteca e museu sero utilizadas ao longo desta pesquisa em ordem alfabtica, sem contudo, configurar uma hierarquia ou preferncia de uma em relao a outra. As palavras Arquivologia, Biblioteconomia, Museologia e Cincia da Informao tero suas iniciais grafadas em maisculas para demonstrar o entendimento de que elas devem ser vistas como campos cientficos e no reduzidas discusso sobre o carter cientfico. 21. 23 associada a tcnica. Entretanto, no Brasil, essa distino entre os sufixos no campo da Biblioteconomia pode ser considerada invlida, devendo ser entendida sob a mesma acepo das outras, tal como fosse nomeada de Bibliotecologia. Segundo Fonseca (2007) essa diferena representa apenas uma questo de nomeclatura, posto que, no Brasil e nos pases hispano-americanos se denomina de Biblioteconomia enquanto na Espanha de Bibliotecologa. No que diz respeito aos termos Librarianship e Library Science and Information Science, do ingls norte-americano, a diferena reside que o primeiro termo traduzido para o portugus equivale ao que se entende por Biblioteconomia, e o segundo termo a associao entre cincia das bibliotecas/Biblioteconomia e Cincia da Informao, uma justaposio, num mesmo nvel entre a arte (prtica) e a cincia (ROBREDO, 2003). Ainda que se considere de viso imediatista e restritiva a associao das respectivas instituies nas constituies das palavras Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, entende-se que essa relao valida, em um primeiro momento, os arquivos, as bibliotecas e os museus como objetos de estudos daqueles campos cientficos. Tendo com o desenvolvimento terico dos trs campos a ampliao de seus objetos de estudos, para alm das instituies fsicas (arquivos, bibliotecas e museus), de modo que as associaes entre os nomes dos campos e as instituies profissionais passaram a ser vistas como interpretaes mais prprias do senso comum. Portanto, conforme revela Gregorov (1980) a Museologia no a cincia dos museus, assim como a Pedagogia no a cincia das escolas e a Medicina no a cincia dos hospitais. Igualmente, considera-se que a Biblioteconomia no mais a cincia das bibliotecas e nem a Arquivologia a cincia dos arquivos. Essa associao entre as instituies e os respectivos campos , ainda, de suma importncia para localizar suas razes. Arajo (2010) aponta que a existncia dos primeiros arquivos, bibliotecas e museus conduziram criao de uma srie de procedimentos e mtodos, em virtude da necessidade de lidar com os acervos dessas instituies. Tais procedimentos de carter eminentemente prtico juntamente com o acmulo das experincias tcnicas utilizadas ao longo do tempo possibilitaram a consolidao das bases das futuras disciplinas cientficas. Portanto, corrobora-se com essa viso de que as prticas e as experincias acumuladas naquelas instituies contriburam para o surgimento da Arquivologia, da Biblioteconomia e da Museologia, marcando, com isso, uma proximidade histrica da constituio dos referidos campos cientficos. 22. 24 Alm dessa proximidade etimolgica e histrica dos campos da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, encontra-se tambm certa proximidade quanto ao momento de criao, na Antiguidade, dos primeiros prottipos de arquivos, bibliotecas e museus. Desde aquele momento da histria, passando pela Idade Mdia, essas instituies compartilharam de um mesmo espao, levando ao entendimento de que no havia uma significativa separao institucional segundo seus acervos, funes e profissionais. Apenas com o advento da Idade Moderna, e suas transformaes 2 , que essas instituies passaram a ser vistas como separadas umas das outras (SMIT, 1999, 2000, 2003; ORTEGA, 2004, 2009; GUARNIERI, 2010; ARAJO, 2011; MURGUIA, 2010). Outra contribuio para a delimitao dos arquivos, bibliotecas e museus, os quais eram utilizados como depsitos de tudo que produzira a mente humana, quer dizer o resultado do labor intelectual e espiritual do ser humano (GOMES, 1967, p. 4) foi a inveno da mquina de escrever, em 1714, por Henry Mill, que permitiu a mudana do processo de escrita manual para o processo mecnico, o que facilitou, ainda mais, a multiplicao dos textos e uma formatao mais regular e homognea dos documentos impressos/datilografados (GOMES, 1967). Alm desses fatores mencionados, os quais contriburam para que as instituies se diferenciassem, somam-se as mudanas na esfera dos saberes e da histria, que foram importantes para a ciso entre arquivos, bibliotecas e museus, a saber: Tendncia desenvolvida na Modernidade e a subvertida pela necessidade iluminista de classificar, de separar ideias e coisas e de buscar a pretensa objetividade cientfica (tanto no plano natural e fsico, como no plano humano e social), pelo aparecimento do Estado- Nao, pelo fomento capitalista e pela complexificao global das sociedades (SILVA, 2002, p. 575). Essa motivao com bases em influncias iluministas possibilitou a cada uma dessas instituies a centralizao de seus acervos, a separao de suas atividades de guarda, a preservao e a conservao dos tesouros da cultura clssica greco-romana, resgatados pelo movimento humanista (SILVA, 2002). Assim, com a delimitao de cada instituio, a histria delas passa a ser marcada de modo diferente pelos rumos e 2 Cita-se a inveno da imprensa, dos tipos mveis e de chumbo, aperfeioados por Gutenberg, em 1455, que levou a um crescimento de documentos impressos e, por conseguinte, o aumento da necessidade da criao dos espaos de guarda, as bibliotecas (BURKE, 2002). Outro fator contributivo para a delimitao institucional foi a expanso martima e das atividades dos colecionadores, que passaram a reunir suas colees nas galerias de aparato, de antiguidades e de curiosidades, estes ltimos compostos, sobretudo de objetos e espcimes trazidos das terras de alm-mar (GIRAUDY; BOULHET, 1990). Os arquivos tambm passaram a constituir espaos separados e voltados, sobretudo, para a guarda e manuteno de documentos gerados pelas atividades administrativas dos governos (SILVA, 1998). 23. 25 acontecimentos no decorrer do tempo, constituindo em uma histria dos arquivos, das bibliotecas e dos museus, e, por conseguinte, em uma histria da Arquivologia, da Biblioteconomia e da Museologia. No que se refere configurao acadmico-institucional brasileira desses cursos, destaca-se que ela pode ser observada de modo mais amplo, a partir dos ltimos anos, em virtude da crescente criao e institucionalizao desses cursos nas diversas instituies de ensino superior do pas. Tal criao foi impulsionada pelo Plano de Apoio a Reestruturao e Expanso das Universidades Federais (REUNI), institudo pelo Decreto n 6.096, de 24 de abril de 2007, o qual integra as aes do Governo Federal, por meio do Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), iniciado em 2003, e vinculado ao Ministrio da Educao (MEC). Desse modo, a justificativa pessoal, para o desenvolvimento desta pesquisa, partiu, particularmente, da observao inicial da conjuntura local, que se estabeleceu na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a partir do ano de 2008. Neste mesmo ano em que a UFMG aderiu ao REUNI, o curso de Biblioteconomia, da Escola de Cincia da Informao (ECI), antiga Escola de Biblioteconomia, sofreu alteraes em sua estrutura curricular para atender a criao de mais dois novos cursos, Arquivologia e Museologia, os quais entraram em funcionamento no ano de 2009 e 2010, respectivamente. Esse curso de Biblioteconomia originou-se de um curso com durao de um ano, destinado a professoras primrias, promovido em Belo Horizonte, em 1950, pela Secretaria da Educao do Estado de Minas Gerais, com a colaborao do Instituto Nacional do Livro. Em 1963, a Universidade de Minas Gerais, atual Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), autorizou a incorporao da Escola de Biblioteconomia, na qualidade de instituio complementar, anexa ao Departamento Cultural da Reitoria. Aps trs anos, em 1966, o Conselho Universitrio concedeu mandato universitrio ao curso de Biblioteconomia, expedindo o diploma de bacharelado. Neste mesmo ano, a Escola de Biblioteconomia foi elevada a categoria de Unidade da UFMG, sob a denominao de Escola de Biblioteconomia, que desde 2000 passou a ser nomeada de Escola de Cincia da Informao (ECI). (KREMER, 1990). Acerca daquelas alteraes curriculares no curso de Biblioteconomia, Cendn et al (2008) esclarece que foi criado um tronco comum, composto de dezessete atividades acadmicas obrigatrias a serem cursadas pelos trs cursos Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia. Os autores esclarecem ainda que: 24. 26 A inteno que os alunos das trs formaes cursem o tronco comum em turmas mescladas e que as atividades especficas j se iniciem no segundo perodo, para que o aluno tenha clareza das especificidades do curso e da profisso por ele escolhidos. Os cursos preveem articulao com outros cursos da Universidade Federal de Minas Gerais, garantindo assim a interdisciplinaridade e flexibilizao curricular (CENDN et al, 2008). Ao extrapolar essa conjuntura local, acrescenta-se que as cinco regies brasileiras tiveram seu cenrio modificado, em razo da adeso das universidades ao plano REUNI, o que levou a institucionalizao de mais seis cursos de Arquivologia, nove cursos de Museologia e dois cursos de Biblioteconomia. Esse crescimento de cursos, sobretudo de Arquivologia e de Museologia, ocasionou uma diversidade de vnculos acadmico-institucionais, posto que estes cursos foram abrigados em diferentes departamentos, escolas, centros, faculdades e institutos, e ainda prximos ou no dos cursos j existentes de Biblioteconomia e Cincia da Informao. No plano terico-epistemolgico, Arajo (2011) aponta que existe uma forte distino expressa na produo cientfica da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, que busca apresentar mais afastamentos do que aproximaes. Esses esforos distintivos concentram-se em contrastar ora uma e outra, ora cada uma delas, de modo separado e a Cincia da Informao, sendo mais raro encontrar discusses em que estejam a Arquivologia, a Biblioteconomia e a Museologia juntas, contrastando-as em relao Cincia da Informao: Quando ela [literatura cientfica] existe, mais relacionada a discusses sobre memria e patrimnio cultural do que Cincia da Informao. Quando se aborda a relao entre a Biblioteconomia com a Cincia da Informao os trabalhos esto mais voltados para a busca de distines do que de aproximaes (ARAJO, 2010, p. 175). Essa escassez da literatura cientfica que contemple as trs reas refora o desejo da construo de uma base de conhecimentos comum a fim de que a produo terica delas possa ser consultada, comparada e referenciada (ARAJO, 2010). Desse modo, acredita-se que esse fator da escassa produo cientfica consistiria um motivo por si s considervel para se empreender uma pesquisa que, de fato, contemplasse os trs campos: Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, e mais a Cincia da Informao. Todavia, as contribuies desta dissertao buscam ir mais alm da justificativa pautada na escassez da literatura, se direcionando para os aspectos epistemolgicos desses campos cientficos. 25. 27 Sobre a importncia de empreender estudos epistemolgicos Rendn Rojas (2008) esclarece que eles so essenciais para o desenvolvimento e consolidao dos campos cientficos, pois possibilitam o autoconhecimento, a autoconstruo e a interdisciplinaridade. Alm dessas contribuies, acredita-se ser este um momento oportuno para tal empreendimento, haja vista a diversidade de vnculos acadmico- institucionais dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia. Tais vnculos os colocam, ora prximos uns dos outros, ora afastados, inclusive com os cursos de ps- graduao stricto sensu em Cincia da Informao, os quais podem, de alguma maneira, ocasionar influncias no ensino e nos discursos desses campos cientficos. Esta questo da influncia sobre os campos cientficos perpassa a dimenso do poder foucaultiano, pois Foucault abandona as vises tradicionais (marxistas e jurdicas) do poder, que assume uma funcionalidade econmica, de distino entre as relaes de produo e de classe, de um poder visto como coisa, em que uns possuem e outros no o possuem, assim como, de um poder da ordem contratual, vista a partir da teoria clssica do poder, que o poder aquele, concreto, que todo indivduo detm e que viria a ceder, total ou parcialmente, para constituir um poder, uma soberania poltica (FOUCAULT, 1999, p. 20). Desse modo, para esse autor o poder no mais visto como sendo da ordem do contrato, da cesso ou alienao, de um poder como posse, o poder visto como algo presente em todas as relaes sociais, o poder existe em ato, transita pelos indivduos, assim, o poder deve ser analisado como uma coisa que circula, ou melhor, como uma coisa que funciona em cadeia (FOUCAULT, 1999, p. 35), acrescenta-se ainda que o poder se exerce em rede e, nessa rede, no s os indivduos circulam, mas esto sempre em posio de serem submetidos a esse poder e tambm de exerc-lo (FOUCAULT, 1999, p. 35). Assim, o poder no pode ser visto como uma espcie de violncia, da ordem da represso, pois o poder consiste em possibilidade de ao entre os dois polos, o poder pensado como relao, e no se divide em um polo passivo, em que o sujeito sofre a ao, e outro polo ativo, em que o sujeito pratica a ao sobre os corpos. O poder deixa ento de ser reconhecido apenas pelos seus efeitos negativos, proibitivo e de excluso, o poder , na verdade, produtivo, o poder produz; ele produz realidade, produz campos de saberes e rituais de verdade. O indivduo e o conhecimento que dele se pode ter se originam igualmente dessa relao produtiva do poder 26. 28 (FOUCAULT, 2011). Logo, a partir dos estudos3 de Foucault o poder passa a ser visto como algo presente em todas as relaes sociais e lugares, coextensivo aos corpos, campos cientficos e instituies. Pensando nisto, a Arquivologia, Biblioteconomia, Museologia e Cincia da Informao so vistas nesta dissertao luz das relaes de poder e de fora, bem como a partir do conceito de campo cientfico, expresso como sistema de relaes objetivas entre posies adquiridas em lutas anteriores o lugar privilegiado e o espao de uma luta concorrencial (BOURDIEU, 2003, p. 112). Assim, cada uma (Arquivologia, Biblioteconomia, Museologia e Cincia da Informao) assume a postura de um campo de foras e um campo de lutas para conservar ou transformar esse campo (BOURDIEU, 2004, p. 22), podendo agir umas sobre as outras, tal qual age o poder, no qual consiste em um conjunto de aes sobre aes, sejam elas eventuais, presentes ou futuras (FOUCAULT, 2010). Ainda para Foucault, o poder e o saber no se opem ou se repelem, eles esto mutuamente interligados, pois toda forma de saber produz poder (FOUCAULT, 2005). Desse modo, no existe relao de poder sem a constituio de um campo correlato de saber, bem como no se pressupem um saber sem uma relao de poder, enfim todo ponto de exerccio do poder , ao mesmo tempo, um lugar de formao do saber (MACHADO, 2006, p. XXI). Nessa direo, esta dissertao tem como objetivo analisar a influncia acadmico-institucional dos campos cientficos da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, permeados pelas relaes de poder-saber, tendo em vista as diferentes vinculaes acadmico-institucionais, bem como a proximidade e/ou afastamento entre esses cursos, e com a Cincia da Informao. Posto isto, elegeu-se para anlise os seguintes elementos, os quais so entendidos como mecanismos de poder: 1) As referncias contidas nos planos de ensino das disciplinas tericas especficas; 2) A formao acadmica (graduao, mestrado e doutorado) dos professores dessa disciplina; e 3) Os discursos desses professores, provenientes dos questionrios, a respeito das influncias de suas formaes no ensino e das influncias acadmico-institucionais, bem como o entendimento deles acerca das relaes entre os campos cientficos. Essa pluralidade dos meios para anlise relaciona- se com o momento recente de constituio da maioria dos cursos de Arquivologia e 3 Foucault no elaborou uma teoria do poder, mas uma analtica de poder, em razo da ausncia de uma construo universal e totalizante do entendimento de poder, pois no existe algo unitrio e global chamado poder, mas unicamente formas dspares, heterogneas, em constante transformao (MACHADO, 2006, p. X). Assim, o poder no um objeto natural, uma coisa; uma prtica social e, como tal, construda historicamente (MACHADO, 2006, p. X), por isso, as reflexes sobre o poder, ligam-se mais as experincias e racionalidades especficas, do que a uma teoria do poder. 27. 29 Museologia, que os coloca em um cenrio fluido e dinmico, exigindo, portanto, uma variedade de possibilidades de apreenso das relaes de poder4 . Para alm da compreenso dos planos de ensino como instrumentos administrativos, considera-se que os mesmos corporificam saberes e poderes, e que no esto margem dos contextos em que se configuram, e, tampouco, independem das condies de seu desenvolvimento (GIMENO SACRISTIN, 2000). A elaborao desse instrumento educacional e institucional se relaciona precisamente com o currculo, com a instituio e com o projeto poltico-pedaggico do curso, isto , com instrumentos de produo e perpetuao do poder. Para Berbel (1994), as referncias ou sugestes bibliogrficas, um dos elementos constitutivos dos planos de ensino so vistos como um meio para atestar a relevncia e o reconhecimento de determinado campo cientfico. Assim, o processo de seleo das referncias revela a importncia de determinadas obras em detrimento de outras e uma marcao epistemolgica do sujeito que as selecionam e, por conseguinte, do ensino que ser ministrado por meio dessas referncias selecionadas. Desta forma, elegeram-se para anlise as referncias sugeridas nos planos de ensino das disciplinas tericas dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia. A incluso da anlise da formao acadmica ocorreu devido centralidade do professor em selecionar os contedos e as referncias dos planos de ensino. Estas atividades de seleo e organizao no so neutras, ingnuas ou isentas de poder, elas so marcadas pelos interesses e posturas ideolgicas, que os professores assumem em determinado momento de suas vidas. Na viso foucaultiana, os indivduos/professores consistem em sujeitos histricos marcados pelos efeitos de poder locais e contingenciais, ou melhor, o sujeito moldado pelas estruturas, instituies, pelos discursos, pelos dispositivos instrumentais, os quais so permeados pelas relaes de poder. Em sntese, o poder est na origem do processo pelo qual nos tornamos sujeitos (FOUCAULT, 2009). Na perspectiva de Bourdieu (2003) as aes dos professores/agentes so tambm marcadas por suas posies e aes interessadas. Pensando nisso, buscar-se- responder para alm da influncia da vinculao acadmico-institucional, proximidade e/ou afastamento entre os cursos e a Cincia da Informao, se formao acadmica (graduao, mestrado e doutorado) dos professores 4 A escolha apenas dos planos de ensino poderia refletir algo no esperado, em razo da estreita relao das obras sugeridas com a avaliao do curso pelo Ministrio da Educao (MEC), de forma que as sugestes poderiam refletir apenas uma formalidade do curso frente biblioteca e ao MEC. 28. 30 das disciplinas tericas especficas influenciam no ensino da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia. No distante das marcas e trajetrias de vida de cada professor, seus discursos so tambm vinculados a efeitos de poder e produes de verdade, em que consistem em um conjunto de procedimentos controlados, regulados, selecionados, aceitos e distribudos em determinadas sociedades e momentos histricos. Os discursos, assim como, qualquer outra prtica social, so regulados por um poder difuso e dinmico, que encontra apoio institucionalmente (FOUCAULT, 2005). De forma que, O discurso no simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominao, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar (FOUCAULT, 2004, p. 11). Definidos e apresentados os porqus desses elementos para anlise, identificou- se o universo dos cursos de graduao em Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia no site do Ministrio da Educao (MEC), e os cursos de ps-graduao em Cincia da Informao no site da Coordenao de Aperfeioamento de pessoal de Nvel Superior (CAPES). Totalizam-se, ento, em funcionamento, 37 cursos de Biblioteconomia; 16 cursos de Arquivologia; 14 cursos de Museologia; e 11 cursos de ps-graduao stricto sensu em Cincia da Informao. Essa quantidade significativa de cursos de graduao, 67 cursos, distribudos em 41 instituies de ensino superior, conduziu esta pesquisa para a definio de sua amostra, que teve como critrio de seleo os cursos cujos professores responderam ao e-mail da pesquisa, o qual foi enviado a todos os cursos identificados, durante os meses de outubro, novembro e dezembro de 2012. Desta forma, obteve-se, assim, o retorno de 15 planos de ensino e 13 questionrios, dos 16 cursos de Arquivologia; 24 planos de ensino e 23 questionrios, dos 37 cursos de Biblioteconomia; e 14 planos de ensino e 11 questionrios, dos 14 cursos de Museologia. Em relao coleta de dados foi necessrio identificar, em primeiro lugar, os nomes exatos das disciplinas tericas especficas nos currculos dos cursos (VER APNDICE A). Denominou-se de disciplinas tericas especficas aquelas disciplinas que tem como objetivo explorar, essencialmente, no plano terico, desde a origem, histria, teorias, paradigmas, conceitos, at as leis de determinados campos, compreendendo, assim, as disciplinas mais prximas das epistemologias dos campos cientficos. Acredita-se ainda que essas disciplinas especficas sejam responsveis em fundamentar o pensamento cientfico, a compreenso do campo e a construo de uma 29. 31 base para que o aluno obtenha um aprofundamento da rea, a fim de seguir com melhor entendimento da sua graduao, seja em Arquivologia, Biblioteconomia ou Museologia. Assim, aps a identificao das disciplinas e dos professores, foi possvel coletar na Plataforma Lattes a formao no nvel da graduao, mestrado e doutorado dos mesmos. Com a identificao de cada professor solicitou-se por e-mail o envio dos planos de ensino e o preenchimento de um questionrio, com base no programa das disciplinas, composto por cinco questes abertas (VER APNDICE B). Salientou-se a esses professores que os dois instrumentos de coleta de dados (plano de ensino e o questionrio) so complementares e indispensveis para o desenvolvimento desta pesquisa, que assume a classificao de pesquisa exploratria, pois visa proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torn-lo mais explcito (GIL, 1999). Os procedimentos tcnicos de coleta de dados desta pesquisa conduziram a outra classificao, a de pesquisa documental, em virtude da natureza das fontes que, vale-se de materiais que no receberam ainda um tratamento analtico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com o objetivo da pesquisa (GIL, 1999, p. 73). Assim, os planos de ensino, os questionrios e o resultado da formao acadmica dos professores podem ser vistos como documentos primrios ou de primeira mo, constituindo-se em documentos dispersos e diversificados. Ainda como desdobramento do problema de pesquisa e dos instrumentos de anlise, esta pesquisa caracteriza-se sob o ponto de vista de duas abordagens: quantitativa e qualitativa. O foco na abordagem quantitativa sobressaiu, em um primeiro momento, em razo do estudo bibliomtrico, cujo mtodo utilizado foi o da anlise de citao das referncias, que identificou a frequncia (contagem do nmero de ocorrncias) das obras citadas, dos autores, da tipologia, do ano e idioma das obras referenciadas nos planos de ensino e na primeira questo do questionrio. No segundo momento, predominou a abordagem qualitativa, em virtude da Anlise de Contedo, que possibilitou a criao de categorias para a interpretao das respostas fornecidas pelos professores atravs do questionrio. Este instrumento de coleta de dados conferiu ao respondente uma maior liberdade de respostas, as quais so expressas por meio de frases e oraes, e no atravs de respostas j pr-estabelecidas, possibilitando tambm ao pesquisador uma maior liberdade de interpretao. Os discursos dos professores foram lidos luz da Anlise do Discurso, pois se considera como um conjunto de enunciados, que trazem marcas das relaes de poder- saber e interesses da comunidade cientfica, bem como do contexto, lugar institucional, 30. 32 onde se realizam as prticas sociais e discursivas. Para tanto, foram definidas seis categorias de anlise: A, AB, ABM, B, BM e M, as quais correspondem proximidade dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia dentro de uma instituio de ensino superior. Desse modo, a categoria A corresponde aos cursos de Arquivologia afastados dos cursos de Biblioteconomia e Museologia; a categoria AB representa os cursos de Arquivologia e Biblioteconomia dentro de uma mesma instituio de ensino superior; a categoria ABM relaciona-se com a existncia dos trs cursos: Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia; a categoria B e M correspondem aos cursos, respectivamente de Biblioteconomia e de Museologia afastados uns dos outros, e da Arquivologia; e, a categoria BM representa os cursos de Biblioteconomia e Museologia localizados em uma mesma instituio de ensino superior. Salienta-se que todo o processo de anlise dos dados, desde a anlise das referncias at a anlise do questionrio, foi realizado com base nos cursos dentro de cada uma dessas seis categorias. Alm da introduo outros quatro captulos compem esta dissertao, so eles: 2. Os campos cientficos da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia e suas relaes com a Cincia da Informao; 3. A trajetria do ensino da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia no Brasil; 4 Anlise da influncia acadmico- institucional nos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia; e, 5. Consideraes finais. Conforme ser possvel perceber os captulos referentes aos campos cientficos seguem a estrutura alfabtica dos campos (Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia), alm disso, salienta-se que o campo da Cincia da Informao foi trabalhado no captulo referente Biblioteconomia, e no em um captulo especfico, pois os dois campos estabeleceram vnculos histricos mais fortes desde a constituio da Cincia da Informao, o que possibilitou essa deciso. Em relao trajetria do ensino da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia, foi mantida a mesma sequncia, em vez da ordem cronolgica de constituio do primeiro curso de cada campo. Nessa parte, sobre as trajetrias do ensino, no se ateve ao processo de ensino da Cincia da Informao de modo particularizado, optando-se, assim, em discorrer sobre essa cincia no tpico da Biblioteconomia, justamente porque os programas de ps-graduao em Cincia da Informao, no pas, foram institucionalizados nos espaos mais prximos da Biblioteconomia. De modo sucinto, no segundo captulo objetivou-se discorrer sobre os campos de maneira individual e a partir de autores que so referncias em seus campos, para, 31. 33 posteriormente, demonstrar alguns entendimentos acerca das relaes estabelecidas entre os campos da Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia com a Cincia da Informao, utilizando, nesse momento, autores mais prprios da Cincia da Informao. No terceiro captulo abordou-se sobre a trajetria do ensino desses campos, com vistas ao delineamento das fases e influncias, apresentando no final de cada captulo os cursos em funcionamento, a configurao acadmico-institucional e a proximidade e/ou afastamento entre os cursos. O quarto captulo desenvolveu-se em torno da anlise e interpretao dos dados advindos dos planos de ensino e dos questionrios respondidos pelos professores, tendo, como base, a insero dos cursos dentro das categorias correspondentes. No quinto captulo foram apresentadas as consideraes finais desta pesquisa, e tambm foram apontadas algumas sugestes para pesquisas futuras. 32. 34 2. OS CAMPOS CIENTFICOS DA ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA, MUSEOLOGIA E SUAS RELAES COM A CINCIA DA INFORMAO 2.1 Campo cientfico da Arquivologia A origem da Arquivologia como campo cientfico remonta ao sculo XIX, todavia, os fenmenos relacionados a esse nascimento no so reconhecidos de modo unnime na literatura da rea, visto que h autores que defendem o princpio da provenincia (principe du respect des fonds), desenvolvido como marco significativo pelo arquivista e historiador francs Natalis de Wailly, em 1841, e outros que abordam a publicao da obra Handleiding loor het Ordenen en Beschrijven van Archieven, conhecido como manual dos holandeses, escrito por Muller, Feith e Fruin, em 1898, como o incio do desenvolvimento terico da Arquivologia. Retrocedendo ainda mais na histria, Silva et al (1998) consideram que alguns pressupostos da moderna cincia Arquivstica advm das prticas exercidas desde os primrdios dos arquivos, os quais tm suas origens associadas s primeiras prticas da escrita, que remontam ao perodo da Antiguidade ou cerca de seis sculos antes de Cristo, na vasta rea do chamado crescente frtil e Mdio Oriente. Dentre as atividades exercidas nos arquivos ou no archeon das sociedades pr- clssicas, esses autores apontam que j existia o respeito pelos aspectos orgnicos da estrutura arquivstica, como se comprovou em Ebla (Sria). Tambm estavam presentes os cuidados com a identidade e autenticidade dos documentos, a existncia da estrutura diplomtica coerente e eficaz das placas sumrias, e as correspondncias e os contratos administrativos incluam, conforme os casos, identidade das partes, o nome das testemunhas ou do escriba, a meno da data, e, at, a estampagem de selos de validao (SILVA et al, 1998). Ainda na Antiguidade, especificamente na Roma Antiga, dada a preocupao dos romanos com a organizao arquivstica, ou melhor, com a organizao dos tabularium (dependncia onde se guardavam as tabulae publicae), surge a imagem do arquivista, conhecido como tabularii, cujas atribuies se davam no mbito da conservao, reproduo e validao de documentos. Portanto, como foi dito anteriormente, para esses autores portugueses, os pressupostos da Arquivstica esto associados s prticas desenvolvidas nos arquivos do perodo Antigo. Em relao ao perodo subsequente, a Idade Mdia, poucos foram os avanos em torno da prtica Arquivstica, os arquivos, cartrios, santurios ou tesouros mantiveram suas portas fechadas, e a profisso manteve seu carter prtico e emprico, sendo 33. 35 apenas, em alguns momentos, regulada por normas de carter oficial (SILVA et al, 1998). Na Idade Moderna, os estudos de ordem filolgica, histrica e teolgica dos sculos XVI e XVII levaram o documento (diploma) a ser submetido a um determinado tipo de crtica, a fim de testar sua falseabilidade e verificar sua veracidade, autenticidade, surgindo da a Diplomtica (BELLOTTO, 2008). O apogeu da Diplomtica e da Paleografia no sculo XVIII, sendo ambas ministradas nas universidades europeias, ocasionou um rebaixamento do arquivo a uma posio instrumental, alm disso, houve um estremecimento na identidade da Arquivstica, que no conseguira obter sua autonomia, considerada, ainda, portanto, uma disciplina auxiliar (SILVA et al, 1998). O sculo XVIII ainda marcado pela poltica de concentrao dos documentos em grandes depsitos, fruto da expanso francesa, sob o controle de Napoleo Bonaparte. Esse acmulo de documentos tornou-se insustentvel com o passar do tempo, o que levou a publicao de uma circular pelo chefe dos arquivos departamentais do Ministrio do Interior, em 24 de abril de 1841. Essa circular de ordem prtica elaborada por Natalis de Wailly previa a organizao dos arquivos segundo o princpio de respeito aos fundos, que se constituiu em um princpio bsico da arquivologia segundo o qual o arquivo produzido por uma entidade coletiva, pessoa ou famlia no deve ser misturado aos de outras entidades produtoras (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.136). A efetiva aplicao dessa circular normativa no ocorreu de modo imediato nos arquivos, pois muitos deles ainda influenciados pela Ilustrao e pelo enciclopedismo classificavam seus documentos segundo os assuntos, utilizando para isso a Classificao Decimal de Dewey, criada, em 1876, especificamente para as bibliotecas, o que conduziu a uma aproximao entre a Arquivstica e a Biblioteconomia (HEREDIA HERRERA, 1989; DOMNGUEZ, 2011). Com a progressiva aplicao do princpio da provenincia nos arquivos se constri imediatamente a noo de fundo, considerado este um elemento de organizao dos documentos, indivisvel, e prprio dos arquivos. Entretanto, a ordem interna dos documentos ficava sujeita a critrios alheios a organicidade, possibilitando a organizao por matrias dentro de cada fundo. Desse modo, Francesco Bonaini defendeu, em 1867, o mtodo histrico ou como conhecido princpio pelo respeito da ordem original, que estabeleceu a preservao dos critrios organizativos em um nvel interno praticados pela entidade produtora, 34. 36 assim, ao lado do princpio da provenincia este princpio inaugura um novo vis terico para a regulamentao dos arquivos (RIBEIRO, 2003; SILVA et al, 1998). Martn-Pozuelo Campillos (1996) acrescenta que este princpio da provenincia no teve origem em um nico lugar, isto , na Frana, ou em um nico momento histrico, no sculo XIX, haja vista que ao longo da Idade Mdia existiram experincias em torno da organizao de arquivos por unidades ou fundos. Em 1819, o tema da organizao e da administrao interna dos arquivos era tratado na Academia de Cincias de Berlim, mas no como princpio terico, e sim como um juzo de valor (MARTN-POZUELO CAMPILLOS, 1996). Retrocedendo ainda mais na histria, pode-se citar a autoria de duas obras que abordavam o sistema de controle e manuteno de documentos, Registratur, de 1571, e, Balthassaris Bonifacil, De Archivis, de 1632, ambas escritas por Jacob Von Ramingen, as quais podem ser vistas com antecessoras dos princpios da Arquivologia. Desse modo, para essa autora, embora baseados em experincias anteriores o respeito da procedncia dos fundos e de sua estrutura original, bem como da ordem natural dos documentos foram esboados teoricamente, pela primeira vez, na circular emitida, em 1841, pelo estado francs e no manual dos arquivistas holandeses de Muller, Feith e Fruin, publicado em 1898. Nessa direo, Lopes (2009, p. 133) salienta que houve manifestaes e produes de textos arquivsticos antes da publicao do manual dos holandeses, mas que essa obra foi a primeira a sistematizar em forma de 100 regras a disciplina, constituindo, assim, em um texto fundador da disciplina arquivstica, que se difundiu por vrios pases e lnguas ao longo dos sculos posteriores. De modo semelhante, Schellenberg (2011) aponta que essa obra pode ser considerada como a mais importante contribuio universal para a Arquivologia, visto que ela teve um amplo alcance por conta de suas tradues para o francs, alemo, ingls, italiano, portugus, chins, entre outras lnguas (FONSECA, 2005). Silva et al (1998, p. 115) acrescentam que esse manual representou uma libertao da Arquivologia de sua posio secundria e de auxiliar da Diplomtica e da Paleografia, podendo, assim, considerar que este manual marca o incio de um novo perodo, em que o predomnio da vertente tcnica se vai afirmar, libertando definitivamente a Arquivstica das disciplinas a que outrora estivera ligada. Todavia, o predomnio no sculo XIX at a segunda metade do sculo XX, do modelo positivista, historicista, patrimonialista, e da consolidao das ideias originrias da Revoluo Francesa colocaram os arquivos como autnticos laboratrios do saber histrico. Os 35. 37 documentos arquivsticos eram vistos como fontes inquestionveis de prova e de pesquisa histrica, conduzindo, portanto, o entendimento da Arquivologia como uma disciplina auxiliar da Histria (RENDN ROJAS; DOMNGUEZ, 2009). Esse aspecto auxiliar atribudo Arquivologia acentua as preocupaes com a sua identidade, o que faz despontar no incio do sculo XX, importantes obras a favor de sua autonomia, como Manual of archive administration, de 1922, do ingls Hilary Jenkinson, e, Archivistica, de 1928, do italiano Eugenio Casanova. A criao do International Council on Archives, (Conselho Internacional de Arquivos CIA), em 1948, suscitou tambm avanos significativos no domnio da cooperao entre os pases e no avano do campo por meio da organizao de congressos e mesas redondas. A publicao especializada do peridico Archivium pode ser vista como mais um importante contributo para o progresso da disciplina (SILVA et al, 1998). As dcadas de 1960 e 1970 foram tambm igualmente marcadas pela produo de obras e manuais arquivsticos, despontando escritores como Aurlio Tanodi, Theodore Schellenberg, Carlo Laroche e Michel Duchein (SILVA et al, 1998). Essas produes revelam a sistematizao do conhecimento, os esforos dos autores em prol da formao e consolidao do pensamento arquivstico, e da libertao do status auxiliar da Arquivologia em relao Histria, bem como, do entendimento dos arquivos como instituies unicamente de carter histricos, o que reverbera em uma Arquivologia descritiva ou em uma Arquivologia dos manuais (LOPES, 2009). Nesse nterim de publicaes diversas, especificamente, no perodo entre as duas grandes guerras, a Arquivologia passou por profundas transformaes. A atribuio do termo exploso documental para caracterizar o crescimento exponencial de documentos produzidos em virtude do aumento das atividades administrativas dos governos, fez despontar questes anteriormente de pouco interesse para os arquivistas, como o descarte de documentos. Para a vertente dominante, conhecida como jenkisoniana, essa atividade era de responsabilidade da administrao, cabendo aos arquivistas a adoo de uma postura passiva diante dos problemas administrativos (MORENO, 2008). Ademais, outras atividades como seleo, avaliao, gesto e as questes relativas movimentao das massas documentais, fruto do regresso dos arquivos aos pases dominados nas guerras mundiais, adquirem destaque no novo cenrio arquivstico, ao lado de uma postura mais ativa do arquivista (SCHELLENBERG, 2011). 36. 38 Em paralelo a esse significativo crescimento dos documentos houve a consequente criao dos arquivos intermedirios, pr-archives ou record centers, e de novos referenciais tericos como a Teoria das trs idades dos arquivos ou Ciclo de vida dos documentos, que se relacionam com as fases estabelecidas de acordo com a vigncia e frequncia de uso dos documentos5 . Segundo Silva et al (1998), os arquivos intermedirios isolaram de vez o arquivo histrico dotados de valor secundrio, dos arquivos correntes dotados de valor primrio, o que conduziu a Arquivologia a uma nova aproximao com outra rea do conhecimento, a Administrao, convertendo-se, novamente, ao entendimento de uma disciplina auxiliar, agora, auxiliar da Administrao (RENDN ROJAS; DOMNGUEZ, 2009). Para Santos (2010) esse crescimento quantitativo dos documentos levou ainda a criao do termo record group, em 1941, pelo National Archives of Washington, este termo consistiu em uma adaptao norte-americana do princpio da provenincia concebido no sculo anterior, na Europa, e que previa a separao dos documentos de acordo com as respectivas entidades produtoras. O surgimento desse conceito e a influncia das trs idades dos arquivos propiciou o surgimento dos managers profissionais interessados nos arquivos correntes e intermedirios, ou seja, na fase de produo e tramitao dos documentos, visando eficcia e eficincia da gesto documental. A expanso dessas atividades logo permitiu a consolidao da Gesto de Documentos como uma nova abordagem, que contrapunha a noo dos arquivistas tradicionais, os quais se ocupavam dos arquivos permanentes ou histricos, e do valor secundrio dos documentos, daqueles que se ocupavam com os arquivos correntes e intermedirios e com os documentos de valor primrio. Instala-se, ento, nesse contexto, a ciso entre os records managements gestores de documentos e os archivist arquivistas tradicionais, conforme se pode notar Tal ciso vai muito alm do que se poderia qualificar como questes corporativas e profissionais, chegando mesmo a estabelecer uma separao entre a Arquivologia e a Gesto de Documentos (FONSECA, 2005, p. 47). 5 1 idade corresponde aos arquivos correntes, onde os documentos so frequentemente consultados pela administrao; 2 idade relaciona com os arquivos intermedirios que armazenam os documentos pouco consultados, e que aguardam uma destinao, como o descarte ou a guarda permanente, e 3 idade envolve os arquivos permanentes, que guardam os documentos com valor histrico e informativo. Soma- se a essa distino dos arquivos a diferena entre os valores dos documentos: documento primrio (valor de uso pela prpria instituio onde se originam os documentos) e secundrio (valor histrico de interesse de outras entidades e utilizadores privados) (SCHELLENGERG, 2011). 37. 39 Greene (2008) apresenta que por conta desse momento houve a instalao de dois paradigmas: o paradigma de sistema de gerenciamento de documentos e o paradigma arquivstico, sendo o primeiro representante do grupo dos gestores de documentos e o segundo do grupo dos arquivistas. Embora, para esse autor, ambos os paradigmas se oponham, eles esto fundados igualmente na noo de documento; o primeiro paradigma assenta-se na questo da evidncia do documento e de suas transaes administrativas, o segundo assenta-se no documento como suporte da memria, da cultura e da herana. Pensando nisso, Greene (2008) prope que o paradigma de gerenciamento de documentos no deve ser visto como um oponente ou excludente do paradigma arquivstico, eles devem ser vistos de forma integrada. Nessa direo os arquivistas canadenses propem uma abordagem integrada da Arquivologia, cujo objetivo seria a gesto integrada da informao orgnica, ocupando- se, ento, simultaneamente dos dois valores (primrio e secundrio) dos documentos e das trs idades dos documentos (ROUSSEAU; COUTURE, 1998). Essa viso integrada da Arquivstica, disseminada a partir dos anos de 1980, coloca-a em um momento peculiar de sua histria, pois passa a ser vista como uma disciplina autnoma e interdisciplinar, e no mais como uma disciplina auxiliar da Histria ou da Administrao. Conforme os autores Rousseau e Couture (1998, p. 72) a arquivstica uma disciplina em si mesma, que tem suas prprias bases tericas, as suas prprias intervenes e os seus prprios mtodos de trabalho, e que estabelece relaes necessrias para a formao e enriquecimento de suas bases tericas com outras disciplinas, como a Informtica, Biblioteconomia e Cincia da Informao. O princpio da provenincia , para esses autores canadenses, a base terica, a lei que rege todas as intervenes arquivsticas, e o princpio que d origem aos fundos de arquivo e ao principal sistema de organizao da informao orgnica. Terry Cook (1998), considerado o pai da Arquivologia ps-moderna (FONSECA, 2005) ou da Arquivologia Funcional (TOGNOLI, 2012) advoga tambm a favor de uma nova abordagem para a Arquivologia, rompendo com a viso clssica da rea expressa nos manuais. Mas, diferente dos outros autores canadenses, Cook (1998, 2007) pe em xeque os conceitos, princpios e vises clssicas da rea. Dentre essas vises cita-se, por exemplo, a falsa dicotomia difundida entre os arquivos institucionais versus arquivos pessoais, no qual os primeiros seriam naturais, inocentes e transparentes e o segundo seriam construes arbitrrias, parciais, antinaturais, onde em ambos os locais os arquivistas assumiriam um postura de neutralidade e imparcialidade (COOK, 1998). 38. 40 Dessa forma, inseridos nas mudanas sociais, tecnolgicas, profissionais e organizacionais, os documentos de arquivos assumem outra identidade, de meros subprodutos das atividades administrativas, transformam-se em elementos/entidades construdos por meio de um contexto sociocultural e ideolgico, podendo extrair a partir deles relaes de poder (TOGNOLI, 2012). Essa viso de que o documento no fruto de um nico tempo e local, de uma nica realidade (administrativa), de um nico significado e de uma nica verdade, mas sim de vrias realidades e contextos sociais, culturais, econmicos e religiosos, caracteriza o que Ketelaar (2007) denominou de narrativas tcitas dos arquivos. Para esse autor, alm dos arquivos serem vistos como depsitos de interpretaes, os documentos igualmente caminham nessa direo, pois eles no falam por si s sendo necessrio interpret-los ou realizar uma genealogia semntica para compreend-los. De modo anlogo, Derrida (2001) desconstri o conceito de arquivo e do documento, vistos anteriormente como estveis, substituindo- os por estruturas sem fins, por conta das vrias interpretaes que ativam o arquivo, e que o projetam para o futuro, e os documentos como elementos construdos e armazenados intencionalmente e influenciados pelos diversos outros contextos externos. O efeito dessas mudanas impacta tambm a postura sobre os arquivistas, que ao invs de serem vistos como agentes passivos ou neutros passam a ser abordados como ativos mediadores e construtores da memria social (FUGUERAS, 2003; COOK, 1998, 2007). Em relao aos conceitos e princpios, Cook (1998) revela que eles no mais atendem as necessidades de uma arquivologia contempornea e ps-moderna, pois tanto o princpio da provenincia quanto o manual dos holandeses no so mais integralmente aplicveis realidade contempornea, visto que quando ambos foram elaborados eles lidavam com estruturas organizacionais mais simples, estveis e mono-hierrquicas, os documentos eram, sobretudo provenientes da Idade Mdia e do incio do sculo da modernidade, os quais formavam sries completas e fechadas (COOK, 1998). Com o atual desenvolvimento das estruturas organizacionais complexas, dos sistemas de armazenamento de informao, dos documentos eletrnicos e dos arquivos eletrnicos, os arquivistas no lidam mais prioritariamente com sries fechadas e antigas, nem como documentos criados naturalmente como fruto das atividades. Pensando nisso, o autor coloca a seguinte questo Podemos certamente acreditar no respeito aos fundos, mas qual o fundo que deveremos respeitar neste novo mundo? (COOK, 1998, p. 20). Para tanto, novas metodologias de organizao so criadas, e, que por sua vez, orientam as recentes correntes tericas da Arquivologia, 39. 41 deslocando o enfoque da teoria arquivstica do registro e do documento fsico para seu contexto ou processo funcional de criao do documento. Portanto, a Arquivologia deve substituir seu paradigma de investigao, de anlise das propriedades caractersticas dos documentos ou das sries dos documentos individuais, para uma anlise das funes, processos e operaes que geram os documentos e as sries (COOK, 2007). Nessa direo de uma Arquivologia funcional, Tomassem (2006) defende que o conceito central na Arquivologia o conceito de arquivo, e que estes so compostos por informaes vinculadas a processos, ou melhor, a Arquivologia est centralmente envolvida com as informaes geradas e estruturadas por processos de trabalho funcionalmente inter-relacionadas. Assim, para esse autor o foco da Arquivologia desloca-se da instituio do arquivo para o contexto das informaes geradas por processos, de modo que o objeto de estudo passa a ser compreendido como as relaes entre o documento, a informao e os contextos de provenincia, organizacional, funcional, administrativo, de uso e contexto scio-poltico, cultural e econmico (THOMASSEM, 2006). Em outra direo, Luciana Duranti, tambm dentro desse contexto das novas abordagens da Arquivologia, seguindo os caminhos abertos pela italiana Paola Carucci, desenvolve e difunde a partir da publicao Diplomatics: new uses for an old Science, a Diplomtica Arquivstica Contempornea, que recupera os princpios e mtodos da Diplomtica Histrica e aplica-os aos documentos eletrnicos. Para essa autora, o objeto de estudo da Arquivstica so os documentos de arquivos, isto , registros documentais ou peas documentais, ao invs da informao orgnica ou processos funcionais de criao dos documentos. Esses registros contemporneos e eletrnicos representam um desafio ao resgate das caractersticas dos documentos consideradas como tradicionais como: imparcialidade, autenticidade, naturalidade, inter-relacionamento e unicidade. Assim, esses documentos centrados nos contextos de produo e operacional resgatam os princpios clssicos da Arquivologia, como o princpio da provenincia e o princpio da ordem original, colocando, ento, essa abordagem dentro de uma nova categoria conhecida como Neo-Jenkinsoniana. Duranti (1994) defende ainda que a instabilidade dos princpios clssicos deriva no deles prprios, at porque os profissionais necessitam mais do que nunca de princpios slidos, permanentes e universais sobre os quais se apoiarem, e de conceitos estabelecidos e claramente definidos [...] (DURANTI, 1994, p. 62), e estes princpios derivam tanto da Arquivologia Tradicional como da Diplomtica Clssica. Assim, a Diplomtica 40. 42 Contempornea passa, ento, a ser uma ferramenta fundamental para o tratamento dos conjuntos documentais, constituindo o mtodo diplomtico, um divisor de guas no conhecimento arquivstico, uma vez que propicia a anlise de diferentes documentos, independente de sua natureza (TOGNOLI; GUIMARES, 2011). Passados por alguns entendimentos sobre a Arquivologia, que de experincia e conhecimento emprico desenvolvido por sculos, da Antiguidade Idade Mdia, at a formulao de princpios e mtodos prprios na Idade Moderna, que marcam de maneira mais clara a sua atuao nos arquivos e no campo das cincias, chegando ainda s novas abordagens (Gesto de Documentos, Integrada, Funcional ou Ps-moderna e Diplomtica Arquivstica) inauguradas no sculo passado, considera-se que, de modo geral, os arquivos refletem essa trajetria da Arquivologia. Desse modo, Silva (2011) apresenta que a histria geral da Arquivologia e dos arquivos podem ser vistos sob trs diferentes perspectivas: viso histrica, viso gerencial e viso informacional. Assim, para esse autor, a primeira viso da Arquivologia, a viso histrica, estabeleceu relaes com o modelo de instituio arquivstica cuja dimenso patrimonial privilegiava os acervos custodiados, voltados para a produo historiogrfica. O segundo momento da Arquivologia, a viso gerencial refere-se ao momento histrico de crescimento dos documentos gerados no contexto do sculo XX, que demandavam das instituies eficincia e eficcia frente aos problemas da exploso documental. A terceira viso, a informacional, difundida no final do sculo XX, advm da necessidade de atualizao das prticas arquivsticas relacionadas aos discursos anteriores. A informao torna-se elemento central, objeto de estudo, e recurso estratgico para as instituies arquivsticas, potencializando a interface da Arquivologia com a Cincia da Informao (SILVA, 2011). Finalmente, a Arquivologia, como disciplina auxiliar da Diplomtica, da Paleografia e da Histria, tendo em vista a nfase nos arquivos histricos e nos documentos como fontes de prova e de pesquisas histricas; e, em seguida, como disciplina auxiliar da Administrao, por conta do valor administrativo e jurdico dos documentos oriundos das atividades administrativas e da preocupao com a gesto de documentos, passa, recentemente, a ser compreendida sob o ngulo mais moderno das novas abordagens. Esses novos entendimentos da Arquivologia ancoram-se ora no discurso de uma cincia ps-moderna em que se faz necessrio reformular antigos pensamentos, ora no reforo de sua autonomia, cujos princpios e mtodos prprios so retomados e reforados, ora como uma cincia auxiliar integrante da Cincia da 41. 43 Informao, cuja base consiste no conceito de informao. Essa aproximao com o campo da Cincia da Informao tem sido colocada em razo, sobretudo, com a preocupao com o mesmo objeto, a informao. Desse modo, busca-se demonstrar na seo seguinte alguns entendimentos sobre as relaes entre a Cincia da Informao e a Arquivologia. 2.1.1 Campo Cientfico da Cincia da Informao e suas relaes com a Arquivologia A Cincia da Informao e a Arquivologia estabelecem relaes de diferentes nveis ou intensidades por conta de diversos motivos, sendo o objeto de estudo a informao , o elemento de ligao mais recorrente na literatura dessas reas. Dentre essas relaes, encontram-se as de carter multidisciplinar, pluridisciplinar, interdisciplinar ou mesmo transdisciplinar. A aceitao da informao como objeto de estudo mais disseminado entre os tericos da Cincia da Informao, j que desde suas primeiras conceituaes a informao encontra-se presente. Por outro lado, a Arquivologia apenas recentemente vem incorporando a informao como objeto de estudo, pois antes dos anos de 1980, os objetos de estudos concentravam-se nos arquivos e nos documentos de arquivos. Atribui-se essa virada da Arquivologia rumo a uma nova abordagem de estudos e de seu objeto aos canadenses Couture, Rosseau e Ducharme responsveis pela constituio da Arquivstica Integrada. Dentre as novas abordagens, surgidas no final no sculo XX, como a Arquivologia Ps-moderna ou Funcional e a Diplomtica Arquivstica, a Arquivstica Integrada a que conduz de modo mais claro uma aproximao com a Cincia da Informao (TOGNOLI; GUIMARES, 2010). Bellotto (2002) sem distanciar-se totalmente da viso clssica, isto , dos documentos e dos arquivos como objetos de estudo, os quais continuam sendo vistos como objetos fsicos de estudo, se refere informao com o objeto intelectual da Arquivologia, mas no de qualquer informao que essa rea se ocupa, mas sim da informao arquivstica, de uma informao orgnica. Alm disso, as instituies com a assimilao do conceito de informao tm acrescentado s suas funes o acesso s informaes registradas nos documentos. Para Jardim e Fonseca (1992) a informao registrada passa tambm ser considerada como objeto de estudo de ambas as disciplinas, Arquivologia e Cincia da Informao, ressalvada as propriedades e particularidades de cada uma. 42. 44 Alm de a informao ser considerada objeto de estudo, outra relao de cunho histrico conecta a Arquivologia e a Cincia da Informao. Desse modo, para Fonseca (2005) a existncia de elementos comuns, como a necessidade poltica de eficcia e eficincia da informao, coloca a Arquivologia e a Cincia da Informao em uma relao de contemporaneidade, onde ambas esto inseridas na episteme da modernidade. Dada essa proximidade histrica e do objeto de estudo, aliado a falta de estudos que contemplem as intersees entre a Arquivologia e Cincia da Informao, Fonseca (2005) busca em sua tese analisar a emergncia de espaos de produo da Arquivologia, e, em particular, nos programas de ps-graduao de Cincia da Informao. Os resultados dessa pesquisa sobre a produo cientfica da Arquivologia apontaram que, dos 53 trabalhos entre teses e dissertaes da rea, defendidos entre os anos de 1992-2001, a maioria, 26 trabalhos, foi desenvolvida nos programas de ps- graduao em Cincia da Informao; seguida do programa de Histria Social, e do programa de Memria Social e Documento. Para Fonseca (2005), os resultados demonstram uma disperso e um movimento receptivo entre os diferentes programas de ps-graduao em Cincia da Informao existentes no Brasil, o que resulta em uma efetiva construo interdisciplinar para alm das estruturas conjunturais. Silva (2012) tambm apontou que a maioria das 97 teses e dissertaes defendidas entre os anos de 1996-2006 sobre a temtica arquivstica foi defendida nos programas de ps-graduao de Cincia da Informao, por outro lado, houve ainda uma disperso das pesquisas em outras 13 reas do conhecimento. Especificamente sobre a expresso informao arquivstica contida nessas produes, o autor apontou que ela est presente em 12% das pesquisas, o que corresponde a uma concentrao de 75% nos programas de ps- graduao em Cincia da Informao. Marques (2007) acrescenta que as relaes entre a Cincia da Informao e a Arquivologia ocorrem, no pas, em pelo menos trs aspectos: 1) os vnculos acadmico- institucionais dos cursos de Arquivologia; 2) a formao dos docentes desses cursos; 3) e a produo cientfica relacionada s questes arquivsticas. Dessa maneira, Marques (2007) considera que h um intenso dilogo interdisciplinar entre as duas disciplinas, desde a constituio das reas, at ao nvel da ps-graduao, que converge para o desenvolvimento de pesquisas com temticas arquivsticas nesses programas. Marques (2007, 2011) salienta tambm que, essa proximidade da Arquivologia com a Cincia da Informao conduz ainda a uma proximidade com outras disciplinas, como a 43. 45 Biblioteconomia e a Museologia, que desempenham igualmente atividades de aquisio/produo, organizao e disponibilizao da informao, seja por meio da gesto da informao, gesto do conhecimento ou gesto documental. Em relao s prticas discursivas dos docentes do curso de Arquivologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Silva (2009) identificou 76 expresses comuns aos dois campos do conhecimento (Arquivologia e Cincia da Informao), as quais foram agrupadas em categorias que indicam e/ou representam os aspectos (propriedades e dimenses) que potencializam a efetivao das zonas interdisciplinares nos trs domnios cientficos: domnio gnosiolgico, domnio pragmtico e domnio contextual (nvel macro) e conjuntural (nvel micro). Ademais, para Silva (2009), essas relaes interdisciplinares podem ocorrer em diversos contextos: contexto epistemolgico, pedaggico e empresarial e tecnolgico. Destarte, para esse autor, Arquivologia e a Cincia da Informao devem ser vistas como dois campos do conhecimento distintos (tendo em vista suas especificidades), que lidam como um objeto em comum, a informao (de acordo com algumas caractersticas e sob o ponto de vista ou ngulos diferentes), e que o alargamento das suas fronteiras permite que se formem zonas interdisciplinares entre esses campos (SILVA, 2009). O fato dessas pesquisas, envolvidas com a temtica arquivstica, e que no se esgotam nesses exemplos, terem sido desenvolvidas nos programas de ps-graduao em Cincia da Informao revela que esta rea constitui um importante espao de acolhimento e de produo de conhecimento arquivstico. Todavia essa proximidade entre a Arquivologia e a Cincia da Informao no se restringe ao espao institucional da ps-graduao, pois essas relaes extrapolam esse nvel ao abarcar tambm a produo publicada nos peridicos. Em relao a esse exemplo, Medeiros, Nodare e Arajo (2010) demonstram com base na anlise temtica dos 21 artigos publicados na revista Arquivo & Administrao, entre 2004 e 2006, a existncia de uma estreita relao do conhecimento produzido na rea da Arquivologia com o conhecimento gerado pela Cincia da Informao, dado o enquadramento da produo nas correntes tericas da Cincia da Informao, e na identificao dos autores citados desse campo, que tambm foram identificados nos fascculos desse peridico analisado. Para alm do mbito da interdisciplinaridade entre a Arquivologia e a Cincia da Informao, que mais comum nas pesquisas brasileiras, pode-se tambm encontrar relaes mais intensas entre essas reas nas produes dos autores portugueses, que tem defendido a viso transdisciplinar da Cincia da Informao como uma grande rea 44. 46 cientfica responsvel por abrigar outras disciplinas aplicadas, entre elas, a Arquivologia. Dessa forma, a Arquivstica vista como uma componente aplicada do campo da Cincia da Informao, sendo ambas inseridas no campo das Cincias Sociais, as quais estabelecem relaes interdisciplinares com outras disciplinas, como: gesto da informao, informtica, comunicao social, organizao e mtodos, cincias da administrao e cincias sociais (SILVA et al, 1998). Ainda nessa direo, os autores Silva et al (1998) declaram que a Cincia da Informao emergiu de uma evoluo natural, e sem rupturas radicais das disciplinas aplicadas, como a Arquivstica, Biblioteconomia e Documentao. Assim, a Cincia da Informao, uma cincia transdisc