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Introdução
A pancreatite crônica é um distúrbio ocasionado pela inflamação persistente do pâncreas, que resulta em edema e pontos necrosados no órgão levando à diminuição da secreção enzimática. Os sintomas da pancreatite são a má absorção de gordura, principalmente, dor abdominal e, comumente, intolerância à glicose. Estão também entre os sinais da doença anorexia, náuseas, vômitos e indigestão.
A principal causa da pancreatite é o consumo exagerado de álcool, no entanto trauma e bloqueio do ducto pancreático também podem levar a doença.
O cuidado nutricional para pacientes com pancreatite crônica ainda é um desafio devido ao hipercatabolismo, as disfunções endócrinas e exócrinas, que envolvem esteatorreia, azotorreia, disfunções na absorção de nutrientes e diabetes mellitus, e subnutrição (SILVA, 2009).
A pancreatite crônica não tem cura, porém os sintomas podem ser minimizados e controlados.
Caso Clínico
Paciente do sexo feminino com 56 anos. Internada há 2 dias. Possui ensino médio incompleto, é cabeleireira, casada, alcoolista.
Dados clínicos
Queixa principal: Dor na barriga, diarreia aquosa, enjôo e vômitos após se alimentar.
História da doença atual: paciente apresenta dor abdominal de forte intensidade, distensão, diarréia aquosa e emagrecimento. Apresenta úlcera gástrica e pangastrite endoscópica severa (diagnosticada pela EDA), apresenta pancreatite crônica diagnosticada há 2 anos.
Observação: Pangastrite refere-se à inflamação de todo o estômago.
História da doença pregressa: Diabetes Melitus (DM), pancreatite aguda.
História Familiar: HAS e DM
Diagnóstico clínico: Pancreatite Crônica, Diabetes Melitus
Exame físico
Abdome – doloroso à palpaçãoEdema – ausenteCavidade Oral – sem alterações
Sintomas gastrointestinais
Náuseas – após as refeições Vômitos – 2x/diaFlatulência – comumDiarréia com esteatorreia – presente
Avaliação antropométrica
Peso atual: 53 kgPeso usual: 59 kg% de perda de peso/mês: 10,16% Estatura: 1,48 mCB: 31cmCMB: 24cmDCT: 21mmCC: 91cm (circunferência da cintura)
Avaliação do consumo alimentar
Ingestão energética e protéica recente: 1650 kcal/dia; 58 g prot/dia.
Avaliação laboratorial
Hemoglobina (Hgb): 13,1 g/dl Hematócrito (Ht): 35,7 %Albumina: 2,9 g/ml Glicemia de jejum: 180mg/dL Colesterol Total: 195 mg/dLLDL-colesterol: 115 mg/dLHDL-colesterol: 33 mg/dL TG (triglicerídios): 236 mg/dL Amilase pancreática: 80 U/LLípase pancreática: 190 U/L
Sinais vitais
Pressão Arterial: 120 x 80 mmHgTemperatura 37ºC
Medicamentos em uso: pancrelipase, cimetidina e insulina.
Diagnóstico Nutricional
IMChabitual = 59
(1,48 )2 = 26,9 kg/m² pré-obesa (OMS, 1997)
IMCatual = 53
(1,48) ² = 24,2 kg/m² eutrófica
% perda de peso = 10,16% = 5,38 kg/mês
CB = 31 cm P50 = 30,9 cm
% adequação CB = 31.100
30,9 = 100,32% eutrófica
CMB = 24 cm P50 = 22,5 cm
% adequação CMB = 24 . 100
22,5 = 106,66% eutrófica
DCT = 21 mm P50 = 26,0 cm
% adequação DCT = 21.100
26 = 80,76% desnutrida leve
CC = 91 cm adiposidade central, risco elevado de complicações metabólicas
A paciente é eutrófica segundo os parâmetros IMCatual, CB e CMB, porém apresenta perda de peso significativa recente segundo o % de perda de peso (10,16%) e DCT (perda de gordura) que, se não sofrer intervenção, pode agravar o estado geral da paciente ocasionando uma desnutrição. O consumo alimentar não se apresentou muito baixo, representando 88,9% das necessidades calóricas da paciente, porém a ingestão protéica está reduzida (58g PTN/dia).
Objetivos Dietoterápicos
Manutenção do peso atual; Redução dos sintomas causados pela pancreatite crônica, pela úlcera gástrica e
pela pangastrite endoscópica severa; Monitoramento das vitaminas lipossolúveis e B12; Controle da hiperglicemia; Educação nutricional da paciente.
Prescrição Dietoterápica
a) Características químicas:
VET = 35 kcal/kg/dia . 53 kg = 1855 kcal/dia (obs.: utilizou-se o peso atual pelo motivo do IMCatual e os outros dados antropométricos terem ficado na faixa da eutrofia)
Macronutrientes: PTN = 17% = 318 kcal = 79,5gCHO = 58% = 1060 kcal = 265gLIP = 25% = 477 kcal = 53g, sendo 20g de TCM
Relação calorias não protéicas por grama de nitrogênio (kcal/gN):
1) Conteúdo nitrogenado da dieta = 79,5g 6,25 = 12,72g2) Calorias não protéicas = 1855 – 318 = 1537 kcal3) Kcal:gN = 1537 12,72 = 120,8 kcal/gN hiperprotéica
Fibras: 25g/dia (com maior proporção de fibras solúveis)
Quota hídrica: seguindo 1 mL/kcal = 1855 mL (administrada antes ou após as refeições)
b) Características físicas da alimentação:
Consistência: de geral à branda, dependendo da aceitação da paciente.
Volume: reduzido, de acordo com a tolerância da paciente.
Fracionamento: 6 refeições/dia
Temperatura: temperaturas amenas, variando com a tolerância da paciente.
Horários: 6:00h; 9:00h; 12:00h; 15:00h; 18:00h; 21:00h.
c) Vias de administração: inicialmente oral; caso a paciente apresente complicações introduzir enteral, que pode ser via sonda nasoentérica.
Conduta Nutricional
Dieta normocalórica, mas que dará o aporte calórico adequado em função do hipercatabolismo resultante da inflamação pancreática e gástrica.
Hiperprotéica para recuperar as lesões da úlcera gástrica, evitar a possível perda de massa magra em função do intenso catabolismo, compensar a má digestão causada pela deficiência das enzimas pancreáticas e manter o balanço nitrogenado positivo.
Normoglicídica, dando preferência aos carboidratos complexos, diminuindo o consumo de carboidratos simples, para controle da glicemia.
Normolipídica, com uso de TCM para aumentar o aporte calórico proveniente das gorduras e não agravar o quadro de esteatorreia.
Ingestão controlada de fibras, dar preferência às fibras solúveis para minimizar os episódios diarréicos e redução das fibras insolúveis para evitar a ocorrência de distensão e consequente dor abdominal.
Suplementação, se constatada redução nos níveis séricos, de vitaminas lipossolúveis e B12, cálcio e magnésio. Observar também os níveis séricos de ferro em função da administração da cimetidina.
Interação Fármaco-nutriente
Pancrelipase: não apresenta interação negativa com nutrientes por ser um suplemento de enzimas pancreáticas.
Insulina: suprime diretamente a produção endógena de glicose é usada para controlar o diabetes mellitus tipo 1; não apresenta interações prejudiciais.
Cimetidina: antiulceroso; inibe a secreção de ácido gástrico, bem como a liberação de pepsina e gastrinas, pode ocorrer uma relação negativa com a absorção de ferro devido a diminuição da secreção ácida gástrica; também apresenta função de inibidor enzimático.
Recomendações Dietéticas Gerais
Reduzir o consumo de álcool até eliminar o hábito;
Aumentar o fracionamento (6 refeições por dia) para reduzir o volume das refeições;
Evitar alimentos industrializados, refeições rápidas, frituras (coxinha, pastel), pois são muito gordurosos;
Procurar não ingerir líquidos durante as refeições para não ocorrer distensão abdominal e sensação de plenitude precoce;
Aumentar o consumo de vegetais, pois são fontes de fibras solúveis e insolúveis que são responsáveis por um bom funcionamento intestinal;
Reduzir ao mínimo a ingestão de alimentos como pães brancos, arroz branco, biscoitos recheados, tortas e bolos, pois são ricos em carboidratos simples e gorduras.
Consumir leguminosas, como feijão, soja e lentilha, pois são boas fontes de proteína vegetal e também de fibras solúveis e não liberam irritantes gástricos (como a purina);
Procurar realizar as refeições com as temperaturas mais amenas para diminuir sintomas como vômitos e náuseas;
Evitar os alimentos que tragam desconforto gastrointestinais;
Procurar modificar a qualidade de vida praticando exercícios físicos e melhorando os hábitos alimentares.
Parecer Nutricional Registrado em Prontuário
Paciente internada com forte dor abdominal, distensão, diarréia aquosa com estatorreia e emagrecimento, apresentando enjôo e vômitos após as refeições, a flatulência é comum. Diagnosticada a dois anos com pancreatite crônica.
Exames físicos referem abdômen doloroso à palpação, sem edema e sem alterações na cavidade oral.
Avaliação antropométrica sem alterações, exceto pela DCT que refere uma perda de gordura.
Perda significativa de peso (10,16% em 1 mês e meio). Peso atual = 53Kg / Altura = 1,72m. Diagnóstico nutricional: eutrófica, apesar da perda de peso recente.
Avaliação laboratorial refere depleção leve da albumina e concentração elevada de triglicerídeos.
Dieta oral, de consistência geral à branda, com temperaturas amenas, normocalórica, normoglicídica, hiperprotéica, normolipídica com TCM, controlada em fibras.
Fracionamento de 6 pequenas refeições ao dia.
Paciente continua internada, acompanhar a evolução do quadro.
Referências
CUPPARI, L. Guia de Nutrição: nutrição clínica no adulto. 2.ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2005.
MAHAN L. K., ESCOTT-STUMP, S. Krause alimentos, nutrição & dietoterapia. 9.ed. São Paulo: Roca, 2002.
SILVA, C. S., FRANGELLA, V. S. Cuidados nutricionais na pancreatite crônica: uma atualização. O Mundo da Saúde São Paulo: 2009; 33(1): 73-79.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
DEPARTAMENTO DE NUTRIÇÃO
DIETOTERAPIA
ESTUDO DE CASO
Pancreatite crônica
Aline de Oliveira Rocha
Glaucia Ferreira de Lima
Recife
2009