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CADERNO DE GLP Agenda necessária para garantir os excepcionais níveis de serviço de
GLP no Brasil, atraindo capital privado para a infraestrutura do setor
de Distribuição
Rio de Janeiro, setembro de 2016
MINUTA PARA COMENTÁRIOS
Data: 06/09/2016
SOBRE O SINDIGÁS
O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás) foi criado em
1974 com a finalidade de estudar, coordenar, proteger e representar a categoria diante da sociedade
brasileira e nas diversas esferas dos governos federal, estadual e municipal.
Desde a sua criação, a entidade promoveu uma série de ações com o objetivo de modernizar o mercado
e oferecer ao consumidor brasileiro produtos e serviços com mais segurança e qualidade.
Hoje, o Sindigás conta com seis empresas associadas (Amazongás, Fogás, Nacional Gás, Liquigás,
Supergasbras e Ultragaz), que atuam em todas as regiões do País, em 100% dos municípios. Juntas, elas
representam quase 90% do mercado total de Gás Liquefeito de Petróleo (GPL) brasileiro. São empresas
que oferecem ao consumidor uma larga tradição de confiabilidade de suas marcas e que têm a
responsabilidade de assegurar, há quase 80 anos, o abastecimento da população brasileira em todos os
pontos do território nacional.
SOBRE A ACCENTURE
A Accenture é uma empresa global de consultoria de gestão, serviços de tecnologia e outsourcing, com
mais de 375.000 profissionais, em 120 países.
A companhia apresenta experiência e conhecimento profundo em todos os setores econômicos e de
negócio. A Accenture colabora com seus clientes, por meio de pesquisas junto às mais bem-sucedidas
organizações do mundo, para ajudá-los a alcançar altos níveis de performance. Para mais informações
acesse: www.accenture.com.br.
Apresentação
A Petrobras - única provedora de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) no Brasil e detentora majoritária da
infraestrutura de produção, transporte e armazenamento do produto - enfrenta dificuldades financeiras
que colocam em risco os elevados níveis de serviço prestados no setor.
O Sindigás, em parceria com a Accenture, elaborou um diagnóstico dos principais entraves ao
desenvolvimento das atividades do setor de GLP no País. Para elaboração desse diagnóstico foram
realizados workshops e entrevistas com especialistas do setor, que visaram propiciar a interação entre
seus múltiplos atores além de identificar as melhorias necessárias para atrair a participação de novos
agentes.
O Sindigás e a Accenture agradecem a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a elaboração
e viabilização deste caderno. Esperamos que este debate evolua de modo que os desafios sejam
superados e novos caminhos possam ser trilhados no setor.
O cenário mudou. Agora, mais do que nunca, é
preciso agir
Pode-se dizer que a história da indústria do Petróleo no Brasil teve seu início em 1936, com a perfuração
de um primeiro poço exploratório no Recôncavo Baiano. No ano seguinte, foi criado o Conselho Nacional
do Petróleo, a primeira tentativa de regulamentação do setor. A partir da década de 50, uma onda de
nacionalismo marcou todo o planeta e o Brasil fez a escolha pela criação de uma empresa nacional
monopolista para realizar todas as atividades de exploração, produção, refino de Petróleo e
processamento de Gás Natural. Assim foi criada a Petrobras que, nas quatro décadas seguintes, cumpriu
com sua função e garantiu o abastecimento nacional de todos os derivados do petróleo, desenvolvendo
uma significativa produção, sobretudo na Bacia de Campos (RJ).
Com a abertura do mercado e o fim do monopólio iniciado em 1997, o setor de óleo e gás no Brasil sofreu
uma revolução com a chegada de diversas multinacionais do petróleo em nosso País. Os sucessivos
leilões de áreas para exploração sob o regime de concessão, a partir de 1999, permitiram a entrada
destes novos agentes e dinamizaram o setor que, hoje, conta com diversos operadores e fornecedores.
Abertura do mercado e as sucessivas rodadas de licitação da ANP
Fonte: ANP; Análise Accenture
No setor de refino, no entanto, a mudança não foi tão expressiva. No abastecimento de GLP, mais
especificamente, a Petrobras continua sendo a única fornecedora do produto no País, contando com a
quase totalidade das unidades produtoras em solo nacional. Enquanto que em outros setores do
abastecimento, a importação de derivados por outros agentes já é uma realidade, no setor de GLP essa
transição ainda não aconteceu – conforme será evidenciado ao longo deste caderno. Desse modo, a
estatal é responsável pela importação do déficit de produto no País, que revende às distribuidoras como
forma de complementar a produção nacional de suas refinarias e UPGNs (Unidades de processamento
de gás natural)
Como consequência, a hegemonia da Petrobras é sentida em toda a infraestrutura de movimentação e
estocagem de GLP. Ao utilizar a Transpetro como operadora logística de seus ativos, a companhia detém
a posse de quase todos os terminais marítimos do Brasil, que além de essenciais para a garantia do fluxo
necessário entre os polos de distribuição, abrigam boa parte da tancagem existente no País. Completam
a lista de ativos essenciais para a movimentação do produto1, os navios chamados “gaseiros” e os dutos
de movimentação, ambos sob detenção e operação da Transpetro.
Foi desta maneira, portanto, que o abastecimento nacional de GLP foi assegurado durante os últimos 60
anos. Dado ao seu caráter social, o Governo sempre demonstrou especial preocupação com a
disponibilidade do produto a baixos custos. A existência de um único fornecedor sob seu controle era um
instrumento eficaz para garantir seus objetivos. Para a Petrobras, o modelo historicamente instituído
também era confortável já que, como única fornecedora do produto, sempre teve a liberdade (salvo
eventual interferência do Governo) de definir seus preços como lhe conviesse. Para as distribuidoras, em
contrapartida, apesar de estarem sujeitas às regras estabelecidas por um fornecedor monopolista, o
modelo existente garantia uma isonomia no fornecimento de GLP. Por mais que este modelo limitasse a
capacidade de desenvolvimento de estratégias de suprimento – que pudessem imprimir a elas maior
capacidade competitiva –, esta dinâmica assegurava o oferecimento do produto com benefícios atípicos
de um mercado livre. Além de fornecer o produto a preços não voláteis e, portanto, reduzir o risco das
distribuidoras, a Petrobras sempre realizou toda a redistribuição interna do produto via cabotagem. Isso
permitia às empresas evitarem investimentos neste tipo de infraestrutura de movimentação em larga
escala e limitava sua responsabilidade na garantia do suprimento.
Em 2006, a descoberta do pré-sal mudou o panorama da indústria de óleo e gás nacional, e fortaleceu o
papel da Petrobras. Os planos de investimento e de produção da estatal se tornaram agressivos e
megaprojetos foram anunciados, tanto na exploração e produção quanto no refino de petróleo e
processamento de gás natural. Assim, as projeções que, até pouco tempo, se divulgavam eram de um
País autossuficiente em GLP já em 20202.
Este cenário otimista mudou. A partir de 2014, a queda nos preços do petróleo e a mudança da
conjuntura econômica interna fizeram a Petrobras rever seu posicionamento diante das dificuldades
financeiras enfrentadas. Seus planos de produção e investimentos foram revistos, fatores que
transformaram o panorama nacional, desencadearam uma série de consequências em toda a cadeia e
fizeram parte da grave crise econômica que o País atravessa hoje. Além do freio nos investimentos, a
companhia se viu obrigada a criar caixa de maneira urgente, traduzido em um arrojado plano de
desinvestimento de ativos.
1 Trata-se aqui apenas da movimentação primária, antes de chegar às distribuidoras.
2 Plano Decenal de Expansão de Energia 2024, EPE
Estamos diante de um quadro, portanto, aonde as incertezas não podem mais ser ignoradas e a atuação
imediata dos diversos agentes do setor é essencial. Dadas as suas restrições de caixa, a Petrobras já
anunciou que não irá realizar investimentos adicionais em sua infraestrutura produtiva (refinarias e
UPGNs, salvo conclusão dos projetos em andamento). Adicionalmente, não estão previstos nenhum
investimento ou melhorias na já saturada infraestrutura logística de importação e movimentação interna
do produto.
Esta infraestrutura, hoje, suporta a demanda do País, apesar de próximo do limite. No entanto, é
interessante notar que, nos últimos quinze anos, a demanda por GLP foi atenuada – inicialmente, pela
introdução do gás natural no mercado brasileiro residencial; e, mais recentemente, pela recessão
econômica que o País atravessa. Em uma eventual retomada do crescimento, este conjunto de ativos
pode rapidamente se tornar insuficiente para suprir um aumento nos níveis de movimentação do produto.
O complexo quadro que se apresenta é resultado de décadas de construção do setor em torno de um
agente dominante, que desencadeou uma série de assimetrias de mercado e, historicamente,
restringiram uma maior participação do setor privado. Hoje, em um momento no qual a Petrobras não
poderá mais continuar a realizar os investimentos necessários em infraestrutura de produção e
movimentação de GLP do País, existe a necessidade de discutir como todos os agentes do setor devem
se posicionar para eliminar essas barreiras e permitir a participação efetiva do capital privado em elos
hoje exclusivos à Estatal.
São esses os debates que propomos levantar neste caderno para fomentar uma nova dinâmica no setor
de distribuição de GLP no Brasil, a partir da atuação de outros personagens, que dividam com a Petrobras
oportunidades e responsabilidades.
Agradecimentos
É com enorme satisfação que faço parte da equipe que constrói este material que tem a difícil missão de debater uma cadeia segura de abastecimento do GLP.
Desde os primeiros indícios de um cenário de carência de investimentos em infraestrutura logística de importação e abastecimento águas acima das distribuidoras de GLP, conjugado aos anúncios de dificuldades da Petrobras, em especial a queda acentuada do preço do petróleo no mercado internacional, e somado aos entraves de conhecimento público, os membros do Conselho Consultivo do Sindigás sentenciaram: “É preciso um plano de auxílio a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, a Petrobras e a sociedade brasileira para garantia do alto padrão de serviço logístico no abastecimento do GLP no Brasil”.
Estava lançado o desafio, antes de anúncios oficiais ou especulações de que a Petrobras poderia recuar de suas obrigações sobre o abastecimento nacional deste energético essencial para o brasileiro. A partir daí, a equipe, formada por colaboradores de alto nível de nossas associadas se debruçou sobre dados, cenários, projeções, fatos que trouxeram, além de respostas, dúvidas e incertezas.
Muitas horas foram dedicadas a este trabalho, uma ampla troca de experiências e informações, além de entrevistas com dezenas de especialistas, dentro e fora das empresas, como Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários, o Ministério da Fazenda, o Ministério de Minas e Energia, a Empresa de Pesquisa Energética, a Petrobras, a Transpetro, o Congresso Nacional e outros organismos e empresas de setores afins. Tentou-se assim construir os mais variados cenários e desenhar as melhores respostas para cada qual.
O sistema de abastecimento analisado é complexo e estruturado para ser realizado por uma única empresa. Em um cenário assim, nos deparamos com infraestrutura, normas, leis, sistemas de contingenciamento, sistemas emergenciais, tudo construído para um único provedor, que prestou um grande serviço à nação, mas que, agora, vai focar suas atividades em áreas prioritárias e anuncia que o abastecimento de combustíveis será compartilhado com privados. O simples anúncio, mesmo que importante, não é suficiente.
O presente trabalho enfrenta os desafios que se apresentam e traça soluções possíveis e coerentes. O principal é o de como atrair capital privado para um setor de infraestrutura historicamente dominado por um competente agente hegemônico, ou monopólico. Que pontos precisam ser revistos e modificados?
Os proveitos resultantes da viabilização do investimento privado são inúmeros. E a nossa proposta foi desenhar alternativas que tragam benefícios para a sociedade e maior disponibilidade de produto no mercado nacional.
Proporcionar às distribuidoras a prerrogativa de adquirir o produto em fornecedores além da Petrobras exigirá contratos mais flexíveis e necessidade de modernizar a infraestrutura, principalmente transporte e armazenamento de GLP (portuária e terrestre), requerendo, em contrapartida, renúncia por parte do Governo de intervenções sobre a Petrobras e uma maior clareza na precificação do GLP, praticada pelo produtor/importador monopolista.
O trabalho também deixa claro que não basta dizer ao investidor que a Petrobras abre passagem, deve-se garantir que esta passagem não seja mais tarde fechada para quem optar por fazer investimentos de retorno de longo prazo. Estamos prontos para um novo paradigma para o setor de GLP?
Como nação, precisamos ainda definir quais custos devem ser assumidos, e quem os pagará. As práticas atuais da Petrobras são motivadas por objetivos não só de competitividade do GLP, mas também sociais. Ao longo dos tempos esses custos recaíram sobre a estatal, sobre a qual não se pode afirmar ter perdido dinheiro, mas deixou de realizar o potencial máximo da remuneração de mercado. Com a atração do capital privado, a conta será movida para a sociedade, e devemos ter claro que o Governo, no longo prazo, tem o “capital político” para suportar esta mudança, com picos e baixas no preço do GLP.
A quebra do monopólio de direito da Petrobras não a retirou do papel de monopolista no downstream. Normas, marcos legais, simplificações de processos, sistemas integrados de informação, redefinição de papéis no sistema de abastecimento, clareza na formação de preços e existência de um sistema de real competitividade – esses pontos ainda não ocorreram na prática desde a “abertura” do mercado em 1997.
A atração do capital necessário se dará quando colocarmos nossas propensões em ordem e optarmos pelos caminhos para manter os altos níveis de satisfação do consumidor final; garantir o abastecimento nacional e competitividade; dar transparência à formação dos preços; diminuir o papel hegemônico da Petrobras; certificar que os mercados de produção e importação podem ser ocupados por privados; e eliminar artificialismos que impedem usos deste excepcional energético, dando ao consumidor final o direito de escolha, sem protecionismos.
Os desafios a serem enfrentados não pretendem tirar vantagens sobre a Petrobras, mas sim assegurar que os espaços criados aos privados gerem áreas de real competitividade, inclusive com a atual monopolista. Ganha quem tem melhor prestação de serviço e não a prática de artificialismos que afugentaram investidores.
Nós do Sindigás acreditamos que a Petrobras pode e deve ser parceira estratégica dos novos investidores, mas revisitar as normas, regras e arranjos comerciais e logísticos águas acima do negócio das distribuidoras faz-se fundamental.
O desafio foi lançado, e o enfrentaremos na plenitude. Previsibilidade e regras igualitárias serão a chave do sucesso.
Conteúdo
1 O papel fundamental do GLP para a sociedade
brasileira
5 Como chegamos até aqui: A lógica da construção
do setor de GLP no brasil
9 Os desafios da Petrobras e uma nova lógica para o
abastecimento nacional
17 A lacuna de investimentos que ameaça todo um
setor
31 Barreiras estruturais para o desenvolvimento do
setor de GLP
47 Debates necessários e potenciais caminhos para a
solução
59 Investimento em infraestrutura: uma discussão
regional
63 As alternativas para a manutenção dos níveis de
serviço
1
O papel fundamental do GLP para a sociedade
brasileira
O Gás Liquefeito de Petróleo – Gás LP, GLP ou, como é popularmente conhecido, gás de cozinha – é
produto resultante tanto do refino de petróleo quanto do processamento de gás natural. Formado por
uma mistura entre moléculas de propano (C3H8) e butano (C4H1), o GLP é transportado e armazenado em
forma de líquido sob pressão em tanques e botijões. Quando submetido à pressão atmosférica, o produto
se transforma em gás rapidamente.
Origem do GLP
Fonte: Análise Accenture
2
Os principais países produtores são os Estados Unidos e a Arábia Saudita. Eles respondem juntos por
cerca de 35% da produção global, dentro do total de 282 milhões de toneladas3. Enquanto o primeiro é,
além de grande produtor, importante consumidor; o segundo, exporta a maior parte da sua produção
para diversos países dentro de uma complexa rede de fluxos internacionais de GLP. Essas negociações
são, apesar de existirem diversos outros índices, norteadas por dois preços principais de referência: Mont
Belvieu, ponto de entrega do produto nos Estados Unidos; e ARA (Amsterdam-Roterdã-Antuérpia),
principais portos da Europa continental.
Produção e consumo de GLP no mundo
Fonte: WLPGA; Análise Accenture
Entre os consumidores do produto, o Brasil ocupa a 9a posição e, no País, o GLP é utilizado
principalmente na cocção de alimentos. Os números do setor são impressionantes: com cerca de 7,3
milhões de toneladas vendidas ao ano, o produto é mais abrangente que a própria eletricidade, atende
todos os 5.570 municípios e está presente em mais de 95% dos domicílios brasileiros4.
3 Argus LPG Report, 2015 4 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
3
Esta enorme capilaridade, associada a uma desenvolta rede de distribuição e elevada confiabilidade, faz
do Brasil uma referência na indústria de GLP mundial. De acordo com pesquisa realizada pela consultoria
Copernicus5, o serviço de distribuição do produto possui alto índice de satisfação – acima, por exemplo,
da distribuição de água e energia elétrica.
Apesar disso, o Brasil ainda apresenta um baixo aproveitamento do GLP como fonte energética em outros
setores. Enquanto o consumo residencial no País representa 79%6, no restante do mundo, o GLP é
largamente utilizado em diversas outras aplicações – 66%7 -, por se tratar de um energético limpo,
eficiente, seguro e de grande portabilidade.
O GLP no mundo e suas utilizações
Fonte: ANP; WLPGA; Análise Accenture
5 Estudo Estratégico Copernicus, 2014 6 Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, 2015 7 WLPGA, 2015
4
Como chegamos até aqui: a lógica da construção do
setor de GLP no Brasil
O setor de GLP no Brasil, assim como dos demais combustíveis derivados do Petróleo e do Gás Natural,
sempre foi marcado por uma presença majoritária da Petrobras. Criada em 1953, com o objetivo de
desenvolver a indústria de petróleo em prol da União, a estatal deteve por mais de 40 anos o monopólio
de todas as atividades de exploração, produção, refino e transporte do petróleo e gás no Brasil. Além
disso, cumpriu um importante papel social de garantia do abastecimento doméstico.
Em 1997, a Lei do Petróleo8 estabeleceu o fim do monopólio estatal nestas atividades. O setor de GLP,
no entanto, continuou enxergando na Petrobras seu único fornecedor do produto no mercado nacional
(exceto uma ínfima parcela produzida em refinarias privadas), seja a partir da produção doméstica ou da
importação do mercado internacional.
Durante o longo período de monopólio vivido no País, o abastecimento nacional foi garantido aliado aos
altos níveis de serviço. De fato, mesmo após a abertura do setor, a qualidade da distribuição do produto
se manteve, como evidenciado pelo recente estudo da consultoria em logística ILOS, segundo o qual a
flexibilidade existente na malha logística permite às distribuidoras garantirem o suprimento, mesmo com
variabilidade no fornecimento de GLP9.
Essa dinâmica monopolista, entretanto, se reflete em uma série de desafios no contexto atual da
indústria, a começar pela forte concentração da infraestrutura de produção e movimentação de GLP nas
mãos da Petrobras. Outra característica marcante do setor é a forte presença do Governo nas decisões
que influenciam a sua dinâmica de mercado, justificado pelo cunho social do produto. Finalmente, em
decorrência dos dois pontos anteriores, temos aqui um setor que desenvolveu uma regulamentação
8 Lei 9.478 de 1997 9 Cadeias Logísticas de GLP, ILOS, 2015. Disponível em link para o arquivo no site do Sindigás.
“Todo o setor de combustíveis no Brasil foi construído em torno de um regime monopolista da
Petrobras, que era a única autorizada a produzir, mover, importar, etc.”
-Executivo do setor de abastecimento
5
considerando a participação de um único agente dominante e dificultou a entrada de novos atores ao
lado da Petrobras.
Com exceção da Refinaria Rio Grandense, que representa menos de 1% da oferta nacional, e de
pequenos e pontuais carregamentos de petroquímicas, toda a infraestrutura existente para produção de
derivados está nas mãos da Petrobras e totaliza um parque de 13 refinarias e 8 UPGNS, espalhadas por
diversas regiões do Brasil. Além disso e em consonância com seu antigo papel monopolista, a estatal
continua exercendo a atividade de importação de GLP e garante quase a totalidade do suprimento da
demanda brasileira.
Ainda, por meio de sua subsidiária de operação logística, a Transpetro, a estatal é responsável por grande
parte da movimentação de GLP entre os polos do País. Com isso, utiliza sua frota própria de navios de
cabotagem dedicados a esta operação, além de operar a maior parte dos terminais e dutos do Brasil.
Participação da Petrobras na cadeia de GLP do Brasil
Fonte: ANP; Análise Accenture
6
O segundo ponto que chama atenção no abastecimento de GLP é que o término do monopólio da
Petrobras não significou o fim do interesse do Governo no setor. Por ser um produto essencial e de grande
impacto na vida dos brasileiros, sempre houve especial preocupação em garantir seu amplo acesso às
camadas sociais mais necessitadas.
Assim, ao longo dos últimos anos, sucessivos governos exerceram sua influência para impulsionar a
Petrobras rumo à prática de uma política de preços artificial e os mantendo abaixo dos níveis
internacionais. Em um cenário externo de altos preços do petróleo e em um ambiente macroeconômico
favorável, a Petrobras foi capaz de suportar, durante anos, prejuízos bilionários gerados por tal política.
No entanto, esta prática continuada carregou perdas, que contribuíram para a situação financeira
enfrentada pela companhia atualmente.
Outra evidência clara da interferência do Governo no setor é a existência de restrições para o uso do GLP
em algumas aplicações. Em 1991, durante a Guerra do Golfo, existia um cenário de instabilidade
internacional combinada à uma limitada capacidade de produção doméstica. Para garantir a
disponibilidade de GLP no mercado interno, o Governo brasileiro estipulou a restrição do seu uso em
diversas aplicações – a partir da Lei 8.176 de 1991 –, ou seja, em caldeiras, veículos automotores e no
aquecimento de piscinas e saunas. Tais restrições são, hoje, fonte de questionamento. O País é
responsável pela produção de cerca de 75% de toda sua demanda e o cenário internacional é de sobre-
oferta, impulsionada, sobretudo, pela exploração do shale gas nos EUA.
Por último, como ficará claro ao longo deste documento, a regulamentação do setor foi construída sob o
conceito da presença de um único agente dominante. Uma série de assimetrias passam a existir,
promovem incertezas e criam barreiras contra uma maior presença do capital privado. Desta forma, o
gigantismo da Petrobras dificulta outros agentes exercerem funções ao seu lado, por se tornarem sujeitas
ao seu domínio econômico.
7
8
Os desafios da Petrobras e uma nova lógica para o
abastecimento nacional
Após um longo período de boas perspectivas e diversos fatores externos – como a queda do preço do
petróleo –, e internos – sobretudo, em relação à situação macroeconômica brasileira –, a saúde
financeira da empresa foi comprometida. Hoje, a Petrobras se vê pressionada a cumprir os investimentos
necessários para o desenvolvimento do pré-sal, o principal alvo da estatal. Os recursos previstos nas
demais atividades, especialmente no midstream e downstream, foram cancelados10, reduzidos ou
postergados. Em paralelo, um plano de desinvestimento em ativos está em execução e tem o objetivo de
criar caixa imediato para aliviar as contas da empresa.
A partir da descoberta do pré-sal, os planos de investimento e metas de produção da Petrobras se
tornaram cada vez mais agressivos. Em 2010, com o novo marco regulatório do pré-sal, a Petrobras se
tornou a única operadora do recurso, que – por conta das características colossais do projeto – exigiam
enormes investimentos e, consequentemente, uma forte geração de caixa para sustentá-los.
Em contrapartida, para controlar de forma artificial a inflação, o Governo brasileiro passou a praticar
preços dos combustíveis em níveis abaixo do mercado internacional. Esta ação colaborou para o
10 Plano de Negócios e gestão 2015-2019, Petrobras. Disponível em Link para o plano de negócios no site Sindigás
“A Petrobras é vítima de suas próprias políticas. ”
- Executivo do setor de GLP
“A Petrobras não pretende investir no midstream e downstream. Isto já está refletido no plano (Plano de
Negócios e Gestão) desde 2012. ”
- Executivo do sistema Petrobras
9
enfraquecimento financeiro da companhia, que se viu obrigada a aumentar seus índices de
endividamento para buscar metas de produção e investimento previstas.
Perdas da Petrobras com venda de derivados – gasolina e diesel
Fonte: Folha de São Paulo
A partir de 2014, com a acentuada queda no preço internacional do petróleo, a indústria de óleo e gás
mundial passou a sofrer uma das maiores crises já vividas em sua história. Em apenas seis meses, o
principal benchmark da indústria, o Brent, caiu de cerca de US$110 para menos de US$50, e obrigou as
petroleiras a revisarem seus planos de investimento. Este fato refletiu a desaceleração em toda a cadeia
de atividades exploratórias. Em 2016, o investimento global da indústria deve atingir o valor mais baixo
em seis anos, US$ 552 bilhões. Isso significa uma queda de 22%, diante do total de US$ 595 bilhões,
em 201511. Mais ainda, a situação enfrentada pelas petroleiras as obrigam a revisar seu portfólio. A
gigante Shell, que recentemente concretizou a compra da BG por US$ 53 bilhões, anunciou a venda de
US$ 30 bilhões em ativos no mar do Norte entre 2016 e 201812. No midstream, outra importante
companhia do setor, a Total, também planeja se desfazer de cerca de US$ 900 milhões na mesma
região13.
11 “Big oil to cut investment again in 2016”, Bloomberg, Janeiro de 2016 12 “Shell CEO says may sell some North Sea assets to improve portfolio”, Reuters, Abril de 2016 13 “UK: Total sells North Sea midstream assets for £ 585 million”, Total, Agosto de 2015
10
No cenário doméstico, a situação macroeconômica do País também foi marcada por uma rápida
deterioração. O Real sofreu forte desvalorização, ao passo que os juros nacionais se mantiveram em
patamares elevados, contribuindo para o agravamento da situação financeira da companhia. Somam-se
ainda dificuldades criadas por recentes escândalos de corrupção, com frequentes reestruturações de sua
liderança, que comprometeram a capacidade da companhia de reagir de forma ágil e no momento
necessário.
A confluência desses fatores fez a dívida da petroleira do Brasil crescer e encarecer rapidamente. Hoje, o
endividamento líquido da Petrobras já alcança cerca cinco vezes seu EBITDA.
11
Evolução da dívida da Petrobras
Fonte: Petrobras; Análise Accenture
Como consequência, desde 2012, sucessivas reduções foram anunciadas em seu plano de
investimentos e atingiu US$ 98,4 bilhões14 entre 2015 e 2019. Além disso, manteve, sobretudo, o
investimento necessário para o desenvolvimento do pré-sal. A drástica redução do montante previsto
nas demais áreas tem oferecido consequências para todo o setor.
14 Petrobras – Plano de Negócios e Gestão 2015-2019, disponível em (link Sindigás)
12
Evolução dos Planos de Negócio e Gestão (PNG) da Petrobras
Fonte: Petrobras; Análise Accenture
Em paralelo, para cobrir a lacuna de necessidade de caixa, a Petrobras iniciou um agressivo plano de
venda de ativos. Porém, até o momento, a companhia obteve pouco sucesso. Apenas a Petrobras
Argentina e Petrobras Chile Distribuición tiveram suas vendas concretizadas, fato que evidenciou a
dificuldade da companhia em materializar o seu plano. Como será discutido adiante, este obstáculo se
deve, em grande parte, à existência de ambiente incerto e uma regulamentação desfavorável para a
iniciativa privada – em especial, por conta da dependência de todo um setor à uma única empresa.
Entre outros diversos ativos já especulados para venda, destacam-se a Braskem, petroquímica na qual a
Petrobras tem expressiva participação no capital; a TAG transportadora de gás natural; e a BR
Distribuidora de combustíveis e de ativos no upstream, tanto onshore quanto offshore.
13
Outros negócios estão em avançada fase de negociação, como a Liquigás, subsidiária distribuidora de
GLP – que conta com diversos interessados em sua aquisição –, e a Gaspetro, distribuidora de Gás
Natural, na qual a venda havia sido concretizada pelo grupo Mitsui, mas que se encontra travada por
decisão judicial.
Vale lembrar ainda da Transpetro, que é de fundamental relevância para o setor, por operar virtualmente
toda a infraestrutura de transporte e armazenamento de GLP do País. Hoje, discute-se a reestruturação
da subsidiária em duas empresas. Porém, o modelo de desinvestimento ainda não parece definido. Por
fim, outros ativos do refino e processamento de gás potencialmente serão colocados à venda – com
menor probabilidade de ocorrência.
O momento enfrentado pela companhia a obriga a rever seu posicionamento na indústria. A partir de seu
PNG15, declarações na mídia e entrevistas realizadas com seus representantes, a Petrobras deixou claro
que há pouco ou nenhum investimento no midstream e downstream previsto para os próximos anos.
Neste cenário de recuo ou permanência debilitada da companhia, restam as seguintes perguntas:
Quais as consequências deste movimento na cadeia de suprimento de GLP? Quais são os entraves para
sua evolução? Como devem se posicionar os agentes para assegurar, em uma nova dinâmica de
mercado, o eficiente abastecimento do mercado nacional?
Qualquer que seja a solução para essas questões, é necessário sempre lembrar que, em um ambiente
competitivo, o monopólio econômico de um único ator dificulta a entrada de agentes menores. Para
viabilizar o investimento privado, é importante promover a quebra da posição hegemônica no controle de
infraestrutura da Petrobras – mesmo que apenas em determinados polos. Isso permite, aos demais
agentes, a escala necessária para assumir esta responsabilidade.
15 Plano de Negócios e Gestão
“A Transpetro deve se posicionar como operador logístico. Ela busca oportunidades em parcerias
para arrendar ativos, tanto da Petrobras quanto da iniciativa privada. Deve oferecer um serviço a
preços competitivos e entregas a tempo. ”
- Executivo do sistema Petrobras
14
“A Petrobras continuará com interesse em garantir a disponibilidade de GLP no mercado nacional,
porém com abertura para a atuação de outros players. ”
- Executivo do sistema Petrobras
15
A lacuna de investimentos que ameaça todo um
setor
Diante deste cenário em que a Petrobras, principal figura do setor, não deverá realizar investimentos
adicionais na produção e movimentação de GLP, duas questões centrais precisam ser respondidas para
mitigar o risco de desabastecimento nacional e evitar um significativo incremento nos custos logísticos
do setor.
O primeiro e principal desafio se refere à capacidade da Petrobras de abastecer o mercado nacional.
Dentro do cenário de aumento da demanda por GLP, como suprir o mercado com o volume necessário?
Mais ainda, dado que as refinarias da estatal não serão capazes de satisfazer a demanda no futuro, ela
continuará assumindo a tarefa de importar para preencher a lacuna entre a demanda e produção
doméstica?
A segunda importante consequência para o setor é o esgotamento da infraestrutura logística existente.
Hoje, apesar de ineficiente, ela atende a movimentação necessária para os níveis de demanda do
momento. No entanto, um eventual aumento na movimentação de produtos, aliada à retomada do
crescimento da economia do País, poderia comprometer a cadeia – por conta da falta de investimentos
provenientes da principal detentora de ativos-chave.
O aumento da demanda e a necessidade de importação
Apesar de divergirem em intensidade, todas as perspectivas para o setor preveem um incremento na
demanda para os próximos 10 anos, em maior ou menor escala. Este fato deverá depender de fatores
como a retomada do crescimento do PIB e o fim da restrição do uso de GLP em determinadas aplicações.
Um primeiro cenário de demanda leva em conta o crescimento populacional projetado pelo IBGE e o PIB
esperado pelo mercado até 2020 – além disso, o centro da meta do Governo dali em diante também é
“Qualquer recuo da Petrobras se dará de forma muito lenta. ”
- Representante de órgão regulador / governamental
16
levado em consideração. Esses números funcionam como direcionadores da demanda por botijões de
até 13kg (consumo doméstico) e outros tipos de envase/granel. Assim, a demanda estimada em 2025
deverá alcançar 8,2 milhões de toneladas.
Um segundo cenário de demanda considerado neste estudo é o desenvolvido pela EPE (Empresa de
Pesquisa Energética)16, em seu mais recente plano decenal de energia. Na projeção, que considera
condições macroeconômicas mais favoráveis e o fim das restrições de uso, a demanda chegaria a 10,8
milhões de toneladas em 2025.
16 Inserir link para estudo EPE no site do Sindigás
“A partir do momento em que o PIB voltar a crescer, a infraestrutura existente para movimentar GLP
não será suficiente. ”
- Executivo do sistema Petrobras
17
Projeção da demanda de GLP no Brasil
Fonte: ANP; EPE; IBGE; Banco Central; Análise Accenture
18
Do lado da oferta, vale destacar a significativa mudança nas projeções sofridas recentemente. Com a
perspectiva de crescimento acelerado da produção do pré-sal em um cenário internacional de altos
preços, o final da década passada e início desta vivenciaram o maior boom da indústria de óleo e gás já
vivido no País. Mesmo com o crescimento da demanda, a projeção era de um Brasil autossuficiente em
GLP no final desta década e considerando a entrada de gigantescos projetos no downstream.
Porém, os efeitos da mudança sofrida pelo setor nos últimos dois anos foram rapidamente sentidos. Dois
grandes megaprojetos programados para os próximos anos foram cancelados – Refinarias Premium I
(MA) e Premium II (CE). Além disso, o segundo trem de refino da Refinaria Abreu e Lima (RNEST – PE) está
atrasado; e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), associado à rota 3 de escoamento do
pré-sal, não tem previsão para iniciar a operação. Por este motivo, o cenário de oferta projetado pela EPE
no qual o Brasil seria autossuficiente em GLP não está contemplado neste estudo.
O primeiro contexto de oferta considera a entrada, em 2017, do trem 1 da RNEST – 100% operacional.
Hoje, apesar de estar em funcionamento, restrições em sua operação fazem com que sua produção ainda
esteja limitada. Quanto ao Comperj, este primeiro cenário contempla sua entrada em operação parcial
em 2023. Além disso, considera o aumento do gás natural processado nas UPGNs já existentes, segundo
previsões de aumento da produção de GN.
19
Projeção da oferta de GLP no Brasil
Fonte: Petrobras; ANP; Análise Accenture
20
Em adição ao já contemplado em um primeiro cenário, uma segunda projeção, mais otimista, considera
uma operação parcial da UPGN do Comperj já em 2018. A entrada completa deveria acontecer em 2021.
Mais além, considera a finalização do segundo trem da RNEST em 2021.
Situação dos projetos Petrobras no downstream
Fonte: Petrobras; Press clipping; Análise Accenture
Assim, o cenário que se desenha é de continuidade das importações por um longo período. A depender
da demanda projetada e concretização dos projetos da Petrobras, o País precisará importar entre 1,1 e
2,7 milhões de toneladas em 2025.
A lacuna entre a produção e demanda doméstica, no entanto, não se dará de maneira geograficamente
uniforme. O quadro a seguir ilustra as lacunas regionais esperadas em cada um dos cenários aqui
considerados.
21
Balanço regional de GLP
Fonte: ANP; EPE; Análise Accenture
Enquanto no Sudeste (que também serve o Centro-Oeste brasileiro), a crescente produção do pré-sal
deve contribuir para o atendimento da demanda; no Nordeste, o atraso e cancelamento dos projetos
mencionados implicará em grande necessidade de importação na região, que corroboram a importância
no recebimento do produto externo.
22
Com a certeza de que o setor seguirá importando, resta uma pergunta acerca da atividade. A Petrobras
continuará sua atuação seguindo os moldes atuais e manterá sob sua responsabilidade a importação de
GLP do País ou será necessária a atuação de outros agentes para complementar/assumir esta atividade?
Esgotamento da infraestrutura logística no Brasil
País de dimensões continentais, o Brasil sofre historicamente de uma infraestrutura logística pobre, que
limita as alternativas de distribuição de todo tipo de produto e, eventualmente, repassa ao consumidor
final a ineficiência da cadeia. O País ocupa a 50ª posição no ranking do Banco Mundial em performance
logística17 e perde apenas para países como Quênia, Polônia, Índia e Tailândia.
No caso específico do GLP, a situação é agravada pela capilaridade de sua distribuição, que atende,
atualmente, todos os munícipios brasileiros. Ofertado em poucos pontos concentrados no País, milhões
de toneladas precisam ser movimentados via três principais modais: aquaviário, dutoviário e rodoviário.
No entanto, a primeira barreira para a eficiência na movimentação do GLP se dá antes mesmo de iniciar
sua jornada em território nacional. A tancagem existente no País limita a recepção de grandes navios
importadores em apenas dois portos, ambos com restrições e ineficiências operacionais: Santos e
Suape.
17 Banco Mundial
23
Suape é a principal porta de entrada de GLP no Nordeste e único porto no País capaz de receber produto
do exterior (navios de 44 mil toneladas). Possui também limitada capacidade de armazenamento e
depende da existência de um navio cisterna permanente para estocar a carga recebida, fato que onera a
operação.
Por outro lado, apesar de possuir a tancagem necessária para receber a carga do exterior, Santos tem
sua operação restringida pelo calado do porto, que limita o porte das embarcações que podem atracar.
Assim, a Petrobras é forçada a descarregar parte do produto importado no porto de Suape antes de seguir
para Santos, que sofre ainda com elevados períodos de espera para atracação das embarcações de GLP
e demora na nacionalização da carga, por conta da ineficiente atuação da Receita Federal. Ainda no porto
de Santos, a movimentação de GLP compete com outros combustíveis, como o Diesel, fato que deve se
acentuar ao longo dos próximos anos e agravará a situação do abastecimento do produto no Sudeste.
Como os portos de importação, alguns pontos de cabotagem apresentam movimentações de GLP
limitadas, por conta da baixa modernização, restrições de calado, tancagem insuficiente e concorrência
com outras cargas que compartilham o mesmo berço. Neste cenário, destaca-se os portos de Paranaguá,
Mucuripe e Tergasul.
O terminal de Paranaguá, responsável pelo abastecimento de boa parte do estado do Paraná – além do
escoamento via dutos para Santa Catarina –, possui apenas três esferas de cerca de 1.500 toneladas
cada, capacidade muito inferior ao necessário para o pleno abastecimento da região. Seu berço tem
baixa disponibilidade para GLP, algo que limita o giro do produto no local. Estes fatores combinados
fazem com que este seja um dos pontos de maior ineficiência logística da cadeia: a oferta da região tem
que ser complementada por carretas, que encarecem o produto ofertado ao consumidor.
24
Fluxos logísticos de GLP no Brasil
Fonte: ILOS; MDIC; Análise Accenture
25
Já o porto de Mucuripe, próximo ao centro urbano de Fortaleza, utiliza a tancagem da Lubnor, refinaria
da Petrobras localizada junto ao cais. No entanto, apenas uma das três esferas construídas no local está
em funcionamento e restringe a capacidade de estoque do polo. Além disso, a área não possui espaço
para expansão e existe forte pressão para a saída da operação de GLP – e outros derivados do terminal
– com sua transferência para Pecém. Hoje, esta alternativa se encontra em dúvida por conta da
indefinição sobre o futuro do novo terminal.
Por último, a operação no Tergasul também é dificultada pela natureza de sua localização. Situado no
final da Lagoa dos Patos, apenas navios menores (de cerca de 2.000 toneladas) são capazes de atracar
no porto. Isso faz com que uma operação de transbordo no porto de Rio Grande seja necessária – mais
uma vez, encarecendo a logística de GLP no Brasil. Encalhamento de navios não são raros na região,
gerando um risco adicional à operação.
Uma vez recebido o GLP nos terminais, é necessário que sua transferência seja feita a partir dos polos de
distribuição, afastados de um terminal aquaviário – seja a partir do uso ferrovias, dutos ou transporte
rodoviário.
A opção ferroviária não é uma realidade no País. Durante alguns anos, uma pequena operação no Sul foi
mantida. Porém, devido à malha ferroviária brasileira e as características do transporte de GLP, esta não
tem sido uma opção econômica favorável e existe pouco interesse das operadoras deste modal em
transportar o produto.
A utilização dos poucos dutos existentes enfrenta, como principal dificuldade, a competição com outros
derivados. O OSBRA18, duto que liga o polo de suprimento de Paulínia ao Centro-Oeste Brasileiro, há
anos não é utilizado para transporte de GLP – apesar de possuir capacidade de tancagem ao longo de
seu percurso. No terminal de Santos, a movimentação de GLP no OSSP19, que escoa os derivados do
litoral para a capital do Estado, vem cada vez mais perdendo espaço para combustíveis claros. Em
Paranaguá, a situação é ainda mais crítica. Os dutos OLAPA20 e o OPASC21, que conectam o porto à
REPAR e, em seguida, ao terminal terrestre de Itajaí, em Santa Catarina, se encontram próximos do limite
operacional e já não conseguem mais escoar o GLP. Situação que cria uma dificuldade adicional em um
terminal já próximo do limite.
Resta ao País a cara e ineficiente distribuição rodoviária. Diariamente, centenas de carretas são
despachadas por todo o território a fim de atender a demanda dos centros mais afastados do litoral. As
18 Oleoduto São Paulo - Brasília 19 Oleoduto Santos – São Paulo 20 Oleoduto Araucária - Paraná 21 Oleoduto Paraná – Santa Catarina
26
consequências e dificuldades deste modal são claras, como elevados custos logísticos, maiores tempos
de entrega do produto e condições precárias das vias.
No entanto, vale ressaltar que, apesar de possuir um custo de frete por tonelada mais elevado, esta última
opção possui uma vantagem essencial para o bom funcionamento do sistema: sua flexibilidade. Como
veremos mais adiante, nem sempre o ponto de oferta de um produto é previsível, e a grande quantidade
de carretas destinadas ao transporte de GLP, distribuídas por todo o País, é fundamental na garantia do
abastecimento em todas as bases nacionais.
Ao levar em consideração esses fatores, se torna claro que o incremento dos investimentos para a
ampliação e modernização da infraestrutura existente são essenciais. Tanto para assegurar o
abastecimento nacional e viabilizar a movimentação eficiente de GLP quanto para garantir os níveis de
serviço atuais. Todavia, a falta de previsibilidade acerca de práticas do mercado e as lacunas nas
regulamentações são reais barreiras ao investimento privado.
Desse modo, pode-se concluir que a necessidade de importação – decorrente de um aumento da
demanda e redução de investimentos em refinarias – atrelada à falta de visibilidade sobre o
posicionamento da Petrobras nesta atividade e às lacunas de infraestrutura na movimentação de GLP
poderão levar a um risco de desabastecimento nacional.
27
Barreiras estruturais para desenvolvimento do setor
de GLP
Apesar do interesse de outros agentes no setor ser evidente e sua participação necessária, a
concretização dos investimentos em infraestrutura esbarra em entraves associados, sobretudo, à
existência de um único fornecedor. Em um contexto de baixa visibilidade sobre a formação e revisão dos
preços praticados e inexistindo regras claras que limitem o modelo a ser seguido, a possibilidade de
decisões da Petrobras – que não sigam uma lógica de mercado - oferece incertezas e inviabiliza a tomada
de decisão de investimento por outros atores.
Mais ainda, a presença dominante da estatal nos terminais aquaviários inibe a atuação parcial de outros
agentes, receosos de ficarem sujeitos a ela, além de não atingirem a escala necessária para
eventualmente assumirem as atividades de importação. Finalmente, a nova Lei dos Portos, associada à
ineficiência alfandegária brasileira, dificultam ainda mais a participação do capital privado em novos
investimentos.
28
Barreiras estruturais para o desenvolvimento do setor de GLP
Fonte: Análise Accenture
Falta de clareza sobre o modelo de precificação de GLP
A definição do preço de venda de GLP às distribuidoras foi historicamente prerrogativa da Petrobras. Por
ser o único fornecedor do produto em um mercado livre, a companhia não está sujeita às forças de
mercado que, em um ambiente competitivo, fariam o preço da commodity se alinhar com o cenário
externo. Este fator limita a previsibilidade dos movimentos da companhia e compromete o planejamento
de outros agentes e, consequentemente, limita o interesse do capital privado em ampliar seus
investimentos.
29
Formação de preço no Brasil e no mundo
Fonte: Análise Accenture
Recentemente, o setor passou por distintas regulamentações sobre o tema. Em linhas gerais, por conta
de uma resolução do CNPE, afirmando o papel da ANP em assegurar a proteção do interesse do
consumidor no que se refere à qualidade e preço do GLP22, a Agência permitiu a comercialização do GLP
envasado em recipientes de até 13kg à preços inferiores aos praticados na venda de recipientes de outras
capacidades23. Essa normativa, apesar de não se traduzir em uma obrigação, foi argumento suficiente
22 Resolução n0 04/2005 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE)
23 Resolução n0 17/2006 da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)
“Não haverá nenhuma mudança no setor se não houver “previsibilidade” na forma de precificação;
são necessárias regras claras, escritas no papel, e articuladas não só com órgão regulador, mas
também com a sociedade”
- Executivo do setor de abastecimento
30
para que a estatal mantivesse preços distintos de acordo com o perfil de vendas24 das empresas por tipo
de embalagem.
Nota-se na evolução dos preços praticados pela companhia nos últimos 14 anos duas características
marcantes: a crescente diferenciação entre os preços praticados e a manutenção, durante 12 anos, de
um preço fixo para o produto destinado ao consumo residencial, sem os picos e vales típicos de um
mercado livre.
24 Percentual das vendas feitas através de botijões de 13kg em relação ao volume total vendido
“Nenhuma Distribuidora fará importação, ainda menos em conjunto, se não acabar a diferenciação
de preços entre o gás vendido em recipientes de até 13kg e outros envases”
- Executivo do setor de GLP
31
Perfil de vendas por empresa e preço médio resultante – Exemplo Utingás
Fonte: ANP; Análise Accenture
32
Evolução dos preços Petrobras – Exemplo Utingás
Fonte: ANP; Sindigás; Análise Accenture
Esta prática de precificação diferenciada, desenvolvida para garantir à população menos favorecida o
acesso ao GLP, apresenta, no entanto, uma distorção fundamental em sua função social: o modelo
adotado permite o acesso de famílias de alto poder aquisitivo aos preços reduzidos e estimula a
utilização do gás envasado em botijões de até 13kg para outras finalidades (como exemplo, comerciais
ou industriais). Recentemente, o Tribunal de Contas da União em acórdão de no 1409/2016 determinou
33
a realização de estudos para avaliar o benefício ao consumidor final com a atual política de preços
praticada pela Petrobras, ilustrando o momento de questionamento de tais políticas.
Por fim, e em adição à diferenciação de preços, a estatal praticou, historicamente, preços médios no
mercado nacional abaixo da paridade internacional, acarretando em perdas bilionárias para a
companhia. Em simulação realizada neste estudo, estimou-se que, entre 2006 e 2015, a empresa tenha
incorrido em uma perda real de cerca de U$ 12 bilhões, por vender no mercado doméstico o produto
abaixo do seu custo de aquisição internacional, além de um custo de oportunidade de U$ 51 bilhões ao
optar por abastecer o mercado interno em detrimento da exportação.
34
Perdas da Petrobras no abastecimento de GLP
Fonte: ANP; Sindigás; Análise Accenture
35
Limitada flexibilidade associada ao modelo de suprimento da Petrobras
Outros desafios são encontrados pelo setor além da precificação. O modelo de suprimento praticado pela
Petrobras assegura a disponibilidade de produto a todos os players com altos níveis de serviço, mas
também contém características que servem de desestímulo ao investimento de outros agentes, além de
introduzir uma necessidade de flexibilidade logística que onera o preço do GLP vendido ao consumidor.
O primeiro aspecto deste sistema se dá no modelo de rateio praticado pela estatal. A cada mês, as
distribuidoras informam o quanto pretendem retirar em cada polo. No entanto, pela limitada
disponibilidade de produto, normalmente é aplicado um rateio de acordo com o histórico de volume
retirado naquele polo ou em proporção ao volume vendas da Distribuidora nos municípios na chamada
zona relevante - definida pela ANP - daquele polo. Logo, a interrupção durante um período de tempo da
retirada em um determinado polo dificultaria o retorno de uma distribuidora, por “perder” seu histórico.
“Não existe mais espaço para que a Petrobras continue com sua política de preços abaixo do
mercado; a nova Presidência já deixou isso bem claro”
- Executivo do sistema Petrobras
36
O corolário deste ponto é a limitação do desenvolvimento de estratégias competitivas de suprimento
pelas Distribuidoras, visto que, além de ter um único provedor de GLP, as empresas possuem volumes
limitados para aquisição: um desestímulo ao investimento em capacidade de armazenamento ou
formação de estoques médios. Segundo o estudo ILOS25 mencionado anteriormente, a ocupação média
dos tanques das distribuidoras no pico (representado pelo percentil 90) alcançou apenas 64% em 2014,
o equivalente a 225 tanques vazios, evidenciando a dificuldade das distribuidoras na formação de
estoque mesmo com tancagem disponível.
Outro traço que chama a atenção no modelo de suprimento de GLP no Brasil é a incerteza quanto ao
ponto de oferta do produto. Apesar dos volumes a ser entregues em cada polo serem, a princípio,
definidos em reuniões de abastecimento periódicas, a prática revela que mudanças de última hora não
são raras. Quando um determinado polo não pode entregar o produto combinado naquele mês, a estatal
equilibra o balanço fornecendo o produto em outro ponto do País, frequentemente de maneira não-
programada, exigindo do sistema uma permanente flexibilidade e capacidade de adaptação que, mais
uma vez, onera o preço final do GLP prejudicando o consumidor. Apesar disso, a flexibilidade da cadeia
logística rodoviária permite a manutenção dos elevados níveis de serviço do sistema26.
Vale notar que, se o modelo adotado pela Petrobras até então introduz ineficiências na cadeia, este
mesmo modelo assegurou o suprimento do País por décadas. A mudança é necessária para permitir
maior envolvimento dos demais agentes do mercado na cadeia, mas deve-se ter em mente que tais
25 Cadeias Logísticas de GLP, ILOS, 2015. Disponível em link para o arquivo no site do Sindigás.
26 Cadeias Logísticas de GLP, ILOS, 2015. Disponível em link para o arquivo no site do Sindigás.
37
movimentos também implicam, junto com as oportunidades, maiores responsabilidades no
abastecimento nacional.
Concentração da infraestrutura e livre acesso
Com objetivo de estimular a concorrência para benefício do consumidor final, a ANP desenvolveu, a partir
do ano 2000, a regulamentação de Livre Acesso em dutos e terminais marítimos27. A legislação
contempla contratos de remuneração ao titular das instalações, acesso à capacidade ociosa e o direito
de preferência do proprietário. A execução prática de tal medida, no entanto, não se verificou: até hoje
não ocorreu de maneira significativa o exercício do livre acesso.
A principal dificuldade na efetiva utilização do livre acesso está, novamente, relacionada a concentração
da infraestrutura com um único agente, a Petrobras. Por não estabelecer de forma clara e objetiva os
limites da detentora dos ativos em estipular as tarifas e condições de acesso, a regulamentação atual
tem pouco efeito em um ambiente em que apenas um agente controla a totalidade dos ativos.
27 Portarias ANP 115/2000, 251/2000 e 255/2000. Criar link no site Sindigás
“A Lei de Livre Acesso existe, mas no atual contexto não é aplicada – quando não se alega que não
há capacidade disponível, são cobrados preços altíssimos”
- Executivo do setor de GLP
38
Mais ainda, por atuar ao mesmo tempo no fornecimento e na movimentação do GLP, o poder exercido
pela companhia torna inócua qualquer tentativa de garantir o livre acesso. Mesmo que as tarifas e
condições de utilização fossem definidas pelos órgãos reguladores, ela poderia limitar o fornecimento
do produto, subjugando no fim os outros agentes ao seu poder. Além disso, a presença massiva da
Petrobras em todos os polos impede a participação parcial de outros agentes, que não desejam investir
em pequena parte da capacidade pois seus ativos se tornariam reféns das práticas da Petrobras naquele
terminal.
A atuação da ANP nesses casos deve ser aperfeiçoada, como fiscalizadora de práticas abusivas,
mediadora nas negociações e árbitra célere. Quando necessária a atuação, precisa ser reforçada para
que a regulamentação se torne efetiva e novos players passem a propiciar a competitividade tanto
almejada pelos agentes reguladores.
Terminais aquaviários: a nova Lei dos Portos e a ineficiência alfandegária do País
A infraestrutura portuária no Brasil sofre, historicamente, com problemas de falta de modernização e
otimização dos processos, o que acarreta altos custos logísticos e imprevisibilidade de suas atividades.
Assim, com o objetivo de modernizar e ampliar o setor por meio de investimentos privados, promovendo
estímulo à concorrência intra e entre portos, surge em 2013 a Nova Lei dos Portos28.
Um dos principais aspectos da Lei parte do princípio de que seriam concedidas áreas nos portos públicos
à operadores portuários que deveriam, entre outras atribuições, substituir parte dos afazeres e
obrigações da autoridade portuária. Além disso precificar suas ofertas pelas áreas com base nos ganhos
28 Lei 12.815/2013, de 5 de junho de 2013. Link para a lei dos portos no site do Sindigás
39
auferidos na movimentação de cargas – sempre tendo em vista o conceito de buscar máxima
movimentação e mínima tarifa para buscar o melhor operador.
No entanto, a Lei dos Portos apresenta características que provocam incertezas sobre a participação de
novos atores nas atividades portuárias. Desenvolvido tendo em vista operadores logísticos, cuja função
é exclusivamente a movimentação do produto no terminal oferecendo a menor tarifa possível, o modelo
não é adaptado a operadores industriais ou semi-industriais como as distribuidoras de GLP.
O resultado deste novo marco regulatório é inegável: desde sua promulgação em 05/06/2013, o volume
de leilões foi baixíssimo, tornando evidente que a tentativa de manejar por meio do par tarifa mínima-
movimentação máxima se mostrou inapropriada.
Um outro ponto notável do sistema portuário brasileiro é a ineficiência de seu processo alfandegário.
Independentemente da carga transportada, o trâmite Brasileiro de desembaraço da carga é complexo,
anacrônico e envolve múltiplos agentes. Como consequência, a obtenção, preparação e apresentação
dos documentos associados às atividades de importação acarreta em um tempo (209 horas) ~5% maior
que a média de outros países na América Latina e em custos (1077 USD) ~25% maiores em relação aos
países vizinhos29.
29 Banco Mundial – Doing Business, 2016
“É preciso assegurar nos editais de privatização da Lei dos Portos que o GLP tenha garantia de espaço
em áreas consideradas críticas”
- Representante de órgão regulador / governamental
40
Custos alfandegários no Brasil - USD
Fonte: Doing Business 2016, World Bank
Apesar de marcar presença em todas as atividades de importação e exportação do Brasil, o setor de GLP
enfrenta alguns desafios adicionais: a forma como o produto é medido nos principais hubs exportadores
do mundo (volume) é diferente do praticado pela Receita Federal (massa). Essa divergência implica na
necessidade de um processo de conversão que torna o procedimento mais complexo, por necessitar de
testes e certificações específicas. Ainda, existe a necessidade de homologação por parte da ANP de
certificados de qualidade internacionais, aumentando ainda mais o tempo necessário.
41
No entanto, apesar de introduzir ineficiências no sistema e resultar no aumento do custo final do produto,
o processo alfandegário Brasileiro não pode ser visto como um impedimento para a viabilização da
importação de GLP por outros agentes além da Petrobras.
42
Debates necessários e potenciais caminhos para a
solução
O aumento da demanda do GLP previsto nos próximos anos se traduz, portanto, em necessidade urgente
de investimento em uma já saturada infraestrutura de movimentação de forma a mitigar o risco de
desabastecimento do País. Com a situação enfrentada pela Petrobras, a solução que resta ao setor
passa, necessariamente, por um maior envolvimento de outros atores – internos ou externos ao mercado
de GLP -, dividindo com a estatal o ônus e bônus de ocupar elos hoje exclusivos a ela.
Agentes privados já demonstraram disposição de investir e assumir maior responsabilidade no papel de
garantir a disponibilidade de GLP no mercado nacional. Contribuindo, para além do necessário capital
para investimento em infraestrutura, diversos benefícios ao sistema.
Para a sociedade, a opção pelo aumento da participação de outros agentes criaria um ambiente mais
competitivo na operação logística da infraestrutura, com benefícios como ganhos de eficiência e
melhoria na qualidade dos serviços. Para a Petrobras, poderia significar um alívio de caixa para
concentrar os investimentos no pré-sal. Já para as distribuidoras, permitiria maior flexibilidade na
contratação e operação dos serviços contando, eventualmente, com maior possibilidade de elaboração
de estratégias de suprimento.
43
Benefícios decorrentes da viabilização do investimento privado
Sociedade
Ganho de eficiência e redução de custos com potencial repasse para os
consumidores
Criação de ambiente mais competitivo
Maior disponibilidade de produto no mercado nacional, reduzindo riscos de
eventuais desabastecimentos
Petrobras
Oportunidade de concentrar esforços em atividades core para a Companhia, como
a exploração do pré-sal
Compartilhamento com outros agentes da responsabilidade sobre o suprimento do
produto no mercado nacional
Alívio de caixa, principalmente em momentos de preços internacionais de GLP
elevados
Distribuidoras
Oportunidade para aquisição do produto de outras fontes além da Petrobras
Maior flexibilidade nos contratos de suprimentos
Possibilidade de utilização da infraestrutura existente como forma de otimizar
custos
Oportunidade de modernização da infraestrutura do país, principalmente associada
ao transporte e armazenamento de GLP (portuária e terrestre)
Maior clareza nas práticas de precificação
Fonte: Entrevistas com especialistas do setor; Análise Accenture
A atração deste capital depende, no entanto, de uma série de mudanças na dinâmica de mercado atual,
das quais quatro merecem destaque especial e serão discutidas com mais detalhe nesta seção: o fim da
diferenciação de preços com convergência à paridade internacional, a mudança no método de cálculo
44
do perfil de vendas, a reconstrução da política social para o GLP de uso residencial e a discussão sobre
o acesso a infraestrutura hoje concentrada pela Petrobras
Debates necessários e objetivos almejados
Fonte: Análise Accenture
Fim da diferenciação de preços e convergência à paridade internacional
O domínio econômico exercido pela Petrobras confere à empresa o poder de definição unilateral dos
preços a serem praticados. Em um ambiente livre como o do Brasil, a presença de diversos atores no
suprimento de GLP contribuiria para o equilíbrio do setor, que naturalmente, convergiria para a paridade
de importação, com flutuações típicas de um mercado livre.
No entanto, dada a falta de previsibilidade característica da empresa e a sensação de uma frequente
interferência governamental em suas políticas, cabe às agências regulatórias a missão de garantir, por
meio de diretrizes específicas, limites e modelos para a precificação do produto a partir do agente
dominante, estabelecendo referências máximas e mínimas, de forma a permitir o gradual incremento na
participação de outros fornecedores.
A partir de entrevistas com diversos agentes do setor, alguns pontos se mostram importantes para maior
participação da iniciativa privada, sendo o principal deles o fim da prática de preços diferenciados para
uma mesma molécula. O modelo atual praticado pela Petrobras provoca distorções em que cada
empresa distribuidora possui um preço médio de compra diferente para um mesmo produto, em uma
mesma localidade.
45
As assimetrias produzidas impedem o desenvolvimento de parcerias para, por exemplo, investimento
conjunto em infraestrutura – a formação de pools - potencial solução para que as distribuidoras de GLP
alcancem a escala necessária para importar produtos. Hoje, se por um lado o capital privado é cético em
investir em uma pequena parcela da tancagem em um terminal portuário e ficar sujeito a Petrobras, que
controlaria o resto, por outro, o investimento necessário e a dimensão da tancagem seria muito grande
para uma única companhia arcar sozinha, pois excederia em muito sua necessidade de estoque.
Em complemento, a convergência dos preços praticados pela companhia à paridade de importação
permitiria ainda às distribuidoras desenvolverem suas próprias competências de importação, passando
no futuro a dividir a responsabilidade de abastecimento com a Petrobras, sob gestão e acompanhamento
próximo e atento da ANP.
A transição para um tal modelo livre, no entanto, deve ser realizada de forma gradual. Nesse sentido,
caberia às agências reguladoras o estabelecimento de diretrizes que permitam a parametrização dos
preços praticados, se não de forma a fixá-los, ao menos criando limites para evitar a total
discricionariedade da Petrobras, produzindo visibilidade a longo prazo.
Adicionalmente, para garantir a livre concorrência de forma benéfica para a sociedade, é necessária a
atuação conjunta entre CADE e ANP em duas frentes principais. Primeiro, na elaboração de regras claras
“A formação de pools de importação no setor privado pode viabilizar preços reduzidos de GLP para a
dona de casa”
- Executivo do setor de GLP
“A formação de pools é benéfica para todos, dá escala e dilui risco para as Distribuidoras levando a
menores preços para o consumidor final”
- Executivo do setor de abastecimento
“Olhando no retrovisor, nenhum agente privado tomará decisões de investir se não houver
comprometimentos da Petrobras quanto às regras de precificação”
- Executivo do setor de GLP
46
antidumping que impeçam a Petrobras de, no futuro, exercer seu poder econômico prejudicando os
demais agentes. Em segundo lugar, também é vital seu posicionamento quanto à formação de pools,
definindo claramente os limites da parceria entre as empresas de forma a evitar práticas que
comprometam a livre concorrência, mas que permitam às distribuidoras a escala necessária para realizar
a operação de forma eficiente no caso de importação.
Mudança no método de cálculo do perfil de venda: uma solução parcial
O fim da diferenciação de preços foi até aqui discutido como condição essencial para viabilização do
investimento em infraestrutura por parte das distribuidoras, e de fato o é. No entanto, existe uma solução
intermediária que pode servir de transição para este modelo.
Como forma de evitar o prejuízo das distribuidoras ao comprar fora do sistema Petrobras – ou seja,
importarem – propõe-se que este volume seja abatido da cota de “outros”, isto é, que as distribuidoras
continuem comprado a mesma quantidade de volumes a preço diferenciado para envases de até 13kg,
conforme ilustrado na figura a seguir. Isso evitaria que o perfil de vendas de cada empresa implicasse em
diferentes janelas de importação: para a importação ser vantajosa, bastaria o preço internacional estar
abaixo do preço “outros”, permitindo a atuação conjunta das distribuidoras, de forma a alcançar a escala
necessária para realizar esta operação. Mais ainda, o modelo garantiria a atuação social da Petrobras ao
“A ANP é uma entidade isenta, que deve atuar como reguladora para garantir o abastecimento
nacional, e não a Petrobras”
- Executivo do sistema Petrobras
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assegurar que 100% do volume das empresas vendido em recipientes de até 13kg estivessem de fato
cobertas pelo preço diferenciado.
Modelo proposto para viabilizar importação
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Fonte: Petrobras; Análise Accenture
Política social ao GLP por meio de mecanismos de Governo
O fim da diferenciação de preços praticados pela Petrobras teria como consequência imediata o término
da política social de garantia de acesso ao Gás LP. Mais ainda, com adoção da paridade internacional, o
retorno a patamares de preços externos elevados pode causar enorme impacto nas classes sociais mais
baixas. Por isso, é comum em países em desenvolvimento a implementação de mecanismos que
assegurem o acesso desta parte da população ao GLP. Assim, caso o Governo Federal avalie a
necessidade de sua manutenção, poderiam ser desenvolvidos mecanismos diretos, de responsabilidade
do próprio Governo.
Exemplos de modelos bem-sucedidos de incentivo social existem em diversos países, dos quais
destacamos aqui Argentina, Colômbia e Índia. Todos eles apresentam um modelo destinado apenas às
classes sociais mais baixas e limitam o volume mensal que pode ser adquirido por cada família, evitando
o desvirtuamento do benefício. O modelo de aplicação do subsídio, no entanto, varia entre cada um
deles, exemplificando a gama de possibilidades que o Brasil poderia adotar.
O primeiro modelo, praticado pela Argentina, se utiliza de um programa de benefícios sociais mais amplo,
nos moldes do Bolsa Família. Ele não garante o direcionamento de benefício à aquisição do Gás, pois o
valor referente ao subsídio do gás é depositado em um cartão que pode ser utilizado indistintamente pelo
usuário. De fato, o próprio programa brasileiro hoje conta em teoria com uma parcela do valor herdada
do programa Vale-gás, mas a possibilidade de se utilizar o valor em quaisquer gastos elimina a percepção
do benefício.
A Colômbia pratica um modelo em que o consumidor recebe o desconto no momento da compra,
verificado por meio de aplicativo celular e o revendedor é restituído em seguida. Assim, o benefício é
utilizado somente para a compra do gás e para famílias cadastradas na base de dados do governo. Este
mecanismo tem a vantagem de não representar para o consumidor em momento algum um custo mesmo
que temporário, não sendo necessário o seu reembolso. No entanto, a complexidade tecnológica de
verificação no momento da compra pode ser um desafio no Brasil, onde o produto é vendido em
localidades de difícil acesso e com precária infraestrutura de telecomunicações.
Um último mecanismo a se analisar é o da Índia, onde o governo restitui diretamente o consumidor por
meio de depósito em conta bancária. Também neste país o benefício é verificado no momento da compra,
por meio do número de identificação pessoal do usuário, mas, neste caso, não é necessário um sistema
tecnológico tão desenvolvido quanto o anterior. Por outro lado, pode representar um problema para o
consumidor de baixa renda que talvez seja incapaz de arcar com os custos até o momento do reembolso.
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Exemplos de mecanismos de incentivo social de GLP
Fonte: Programa Hogar; World Bank Group; Olade; Ministério de Energia de Argentina; ANP; Análise Accenture;
Adicionalmente, a adoção de um gatilho que possa facilmente ativar/ desativar este mecanismo
contribuiria para sua flexibilidade e utilização apenas em momentos de necessidade. Qualquer que seja
o modelo desenvolvido para o Brasil, caso o Governo assim deseje, não deve, no entanto, envolver a
Petrobras.
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O benefício, quando introduzido por meio da diferenciação de preços de GLP do fornecedor às
distribuidoras, produz distorções que dificultam tanto à atuação das empresas, como já discutido,
quanto o controle sobre a destinação do benefício, que é gozado por todas as famílias
independentemente da classe social.
Recuo na infraestrutura e aperfeiçoamento do Livre Acesso
Para que as distribuidoras aumentem sua parcela de responsabilidade no abastecimento nacional,
conforme anteriormente mencionado, elas devem assegurar a movimentação do produto.
Hoje, existe a necessidade de investimento adicional em terminais aquaviários, que a Petrobras não tem
interesse em realizar, insistindo que as distribuidoras assumam esta expansão, ficando ela responsável
pelo que já opera atualmente, além das operações de cabotagem e importação.
O domínio econômico da Petrobras como único fornecedor e principal operador logístico, no entanto, não
fornece aos agentes privados as condições necessárias para este desenvolvimento. As decisões da
petroleira, frequentemente sem seguir nenhuma lógica de mercado, fazem com que as incertezas sobre
o retorno deste investimento sejam muito altas, afugentando o capital privado.
A solução para a viabilização passa, portanto, também por uma desconcentração desta infraestrutura
mesmo que regionalmente. Assim, atores privados poderiam se organizar para assumir parte desta
operação, mas é necessário o recuo suficiente da estatal para que estes novos agentes não se tornem
refém de suas políticas.
Como parte de uma solução potencial, a infraestrutura hoje pertencente à Transpetro, associada à
movimentação e ao armazenamento de GLP, poderia ser utilizada pelas Distribuidoras mediante
pagamento de serviços – por meio da regulamentação de Livre Acesso.
Para isso, é necessária a definição de regras mais claras e específicas, como no prazo de validade do
direito de preferência da infraestrutura, assim como limites para definição de tarifas e condições de uso,
além de levar em conta previsões futuras de utilização para fins de cálculo da capacidade disponível.
“Hoje em dia existem barreiras enormes para o aumento da participação do setor privado no setor de
GLP, p.ex. acesso a portos; é necessário que a ANP defina critérios claros para uso de terminais
(preços, etc.) ”
- Executivo do setor de GLP
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O direito de preferência das instalações – aquele que garante ao investidor acesso preferencial à
infraestrutura que detém - garantirá que os investimentos feitos pela Transpetro ou por futuros atores não
sejam prejudicados. Adicionalmente, as revisões propostas nesse caderno permitirão uma melhor
utilização dos ativos de maneira justa e benéfica à sociedade.
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Investimento em infraestrutura: uma discussão
regional
Discutimos até aqui que medidas deveriam ser perseguidas, de forma a eliminar as barreiras atuais e
viabilizar o maior envolvimento de agentes privados. De maneira pragmática, a primeira e mais imediata
entrada desses atores se daria provavelmente em uma maior participação na tancagem dos terminais de
movimentação utilizados atualmente. Dentro do estudo realizado para elaboração deste caderno,
diversos cenários de importação em diferentes pontos do País foram analisados, de forma a entender a
dinâmica esperada de movimentação de GLP no futuro. Assim, abordaremos nesta seção, de maneira
breve, em que pontos a entrada de novos atores poderia se dar de maneira mais eficiente e que modelo
poderia ser utilizado. A abordagem de “lacunas” regionais utilizada se baseia na análise feita no capítulo
4, quando da discussão do balanço futuro entre oferta e demanda.
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Potenciais pontos de entrada de agentes privados na infraestrutura de tancagem
Fonte: Análise Accenture
A operação de importação pela Bolívia para suprir parte do Centro-Oeste, que é discutida atualmente
beneficia, em todos os casos, o sistema logístico de GLP no Brasil. Ao se trazer o produto diretamente
para a região, alivia-se a pressão sobre o Sudeste, que hoje precisa receber o produto externo e de outras
regiões. Assim, reduz-se a movimentação no terminal de Santos, diminuindo os custos de redistribuição
interna.
A criação de um entreposto na fronteira com a Bolívia, portanto, não requer grande investimento em
tancagem, já que a transferência é feita por carretas. Um parque típico de tanques pressurizados, que foi
considerado neste estudo, já seria suficiente para atender o volume movimentado, podendo ser
desenvolvido conjuntamente pelas distribuidoras ou pela própria Petrobras.
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Passamos em seguida para o Nordeste, importante ponto de entrada de GLP no Brasil e região de maior
lacuna entre a oferta e demanda local. Hoje, existe a opção de arrendamento do navio cisterna ancorado
no porto de Suape, que atenderia os níveis atuais de movimentação. No futuro, com o aumento da
demanda na região, pode ser necessária a construção de esferas no local para complementar o navio
cisterna. Além disso, ao estabelecer condições para o investimento privado, o investimento em tancagem
terrestre no local para receber o produto importado representaria mais eficiência para realizar a
operação.
Uma outra opção no Nordeste para melhorar a distribuição da oferta na região é o desenvolvimento de
um polo de importação no porto de Itaqui, no Maranhão. As esferas lá existentes, de propriedade da
Petrobras, poderiam ser temporariamente arrendadas ou adquiridas em conjunto pelas distribuidoras,
que em seguida se organizariam para desenvolver um projeto de tancagem que pudesse acomodar um
navio de importação, criando ali um novo hub de recebimento de produto no País.
Ainda na região Nordeste, o desenvolvimento do porto do Pecém pode também representar um
importante passo na evolução do setor. O estado do Ceará recebe hoje o Gás LP pelo porto de Mucuripe,
que já está esgotado, sendo necessário o complemento da oferta via transporte rodoviário. A
transferência deste polo para Pecém permitiria o alívio da região e, potencialmente, o desenvolvimento
de um novo polo.
O Sudeste, principal polo de oferta e demanda de GLP no Brasil, continuará sendo uma importante região
para recebimento do produto externo. Mesmo em cenários otimistas de oferta, a região ainda precisa
receber produto adicional para suprir a oferta do Centro-Oeste. Assim, por já possuir expressiva
tancagem, o porto de Santos continuará essencial para recebimento de GLP – qualquer alternativa que
utilize um outro terminal em substituição a este necessita de vultosos volumes de investimento em
tancagem adicional. Uma possível solução para maior investimento privado na região poderia ser o
arrendamento de toda ou parte da capacidade existente às distribuidoras de forma conjunta ou a um
operador logístico dedicado à operação desta infraestrutura.
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As alternativas para a manutenção dos níveis de
serviço
As propostas discutidas neste caderno tiveram sempre como guia a busca pela manutenção dos níveis
de serviço atuais, procurando atrair o capital privado por meio de medidas que tornassem atrativa a sua
maior participação na cadeia de abastecimento de GLP no Brasil.
A manutenção deste status-quo pode rapidamente levar o setor ao colapso. De um lado, a Petrobras
insiste que os distribuidores realizem apenas o investimento adicional necessário, sem fornecer o mínimo
de condições de mercado. Do outro, as distribuidoras, receosas de se sujeitar à hegemonia de um único
agente dominante, resistem em tomar quaisquer decisões de investimento. O impasse trava o setor,
sendo necessária a rápida ação dos diferentes agentes para afastar o risco de desabastecimento.
De forma a resumir as possibilidades para a dinâmica de mercado do GLP na próxima década e as
consequências para os objetivos aqui propostos, a Accenture identifica três possíveis cenários para o
futuro da indústria do GLP, que mantêm os níveis de serviço e minimizam o risco de desabastecimento:
1. Cenário otimista - Reestruturação do setor baseada em uma ação coordenada e proativa
dos atores-chave (Governo, ANP, Petrobras, Distribuidoras), estimulando o investimento
privado em importação e tancagem.
2. Cenário pragmático - Balanceamento do setor, com evoluções marginais da regulação
compensadas por uma atuação proativa das Distribuidoras compartilhando
responsabilidades de infraestrutura com a Petrobras, estimulando o investimento
privado (ou arrendamento) em tancagem.
3. Cenário Petrobras – Revisão da premissa inicial deste estudo: o recuo e não
investimento da Petrobras. Nesta alternativa, a petroleira retoma o investimento
necessário em infraestrutura.
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Resumo dos principais cenários para o setor de GLP no Brasil
Fonte: Análise Accenture
Assim, em um primeiro cenário em que as medidas propostas aqui são majoritariamente colocadas em
prática, os objetivos de atração do capital privado e garantia do abastecimento nacional seriam
cumpridos em sua totalidade, com maior dinamicidade e eficiência no setor.
Uma segunda possibilidade se atém ao fato de que, por pressões políticas e/ou decisões próprias, os
pontos aqui sugeridos possam não ser acatados em sua totalidade, mas que ocorra um pequeno
aumento da participação das distribuidoras de GLP nos terminais da Petrobras, especificamente em
tancagem. Este caminho intermediário requer um mínimo de garantias ao capital privado, como por
exemplo a definição de limites por parte da ANP às tarifas praticadas pela Petrobras para acesso à sua
infraestrutura. Além disso, este avanço parcial das distribuidoras pode se dar regionalmente com a
entrada das distribuidoras apenas em alguns polos de movimentação.
A última alternativa identificada aqui para manutenção dos níveis de serviço, mas que não cumpriria o
objetivo de atração do capital privado, é a forte retomada de investimentos por parte da Petrobras,
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reafirmando seu papel hegemônico em toda a cadeia e seu controle sobre a dinâmica de mercado. O
desafio neste caso está na própria capacidade e interesse da Petrobras em seguir por esta via, dadas
suas restrições de caixa e priorização do desenvolvimento do pré-sal.
O desafio chave para atingir as melhorias propostas está na articulação entre todos os agentes do setor:
ANP, Governo Federal, Petrobras e distribuidoras. A Agência, para cumprir seu papel de fomento da
atividade e monitoramento do setor, além da garantia do abastecimento nacional, deve buscar
mecanismos alternativos que não utilizem a Petrobras como garantia de suprimento, buscando incentivar
a diversificação do mercado. Também o Governo, caso deseje manter o incentivo social ao uso do botijão
igual ou menor a 13 kg, deve procurar formas diretas para aplicar tal benefício. Para a Petrobras, a
evolução em direção a um setor mais livre e plural pode significar um alívio de caixa em um momento
crucial, mantendo seus interesses estratégicos como companhia intactos e agindo em prol dos interesses
de seus investidores e do País. Por fim, é imprescindível ainda a evolução do papel das distribuidoras
que, durante muito tempo se mantiveram na confortável posição - mesmo que de maneira forçada - de
ter seu suprimento garantido pela petroleira, sem precisar desenvolver estratégias de suprimento
próprias. É fundamental que elas, uma vez fornecidos os incentivos necessários, compreendam que a
ampliação da participação na cadeia trará maior complexidade e desafios em seu modelo de negócios,
mas que este movimento é fundamental para a manutenção de uma cadeia de abastecimento segura e
eficiente no Brasil.