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brigadas internacionais

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BRENO TADEU P.T. BARROSO

AS BRIGADAS INTERNACIONAIS

O verão de 1936 entrou para a história como o ponto inicial de um sangrento conflito que acabaria por matar mais da metade da população espanhola nos seus três anos de duração. Enfrentavam-se de maneira extrema e violenta duas propostas antagônicas para o controle da Espanha. De um lado, os republicanos, membros da esquerda formada por socialistas e anarquistas, defensores dos trabalhadores, da reforma agrária, laicos e iconoclastas e do outro, os fascistas, auto proclamados representantes da tradição, da “raça” espanhola, católicos ferrenhos, latifundiários e de certa forma, retrógrados agindo de forma reacionária às ações do governo “esquerdista” vigente desde o fim do reinado de Afonso XIII.

Este embate tão marcadamente ideológico logo atraiu as atenções do mundo, a Espanha se tornara a última fronteira contra a expansão do fascismo tão vigente à época. Por se tratar de uma guerra civil, nenhum país decidiu por intervir com o envio de tropas militares oficiais, nem mesmo a comunista União Soviética, que por ideologia era inimiga máxima dos regimes fascistas. A decisão de não intervenção por parte da comunidade internacional não evitou que homens e mulheres vindos de várias partes do mundo reforçassem as fileiras republicanas em sua batalha contra o fascismo.

Na União Soviética, o Comintern observava os acontecimentos em território espanhol e estudava a melhor maneira de ajudar o Partido Comunista Espanhol em sua luta, porém a posição não intervencionista adotada por Stálin não foi derrubada. Como os soviéticos não poderiam apoiar seus camaradas espanhóis de forma oficial, com tropas militares do país, coube ao Comintern organizar o recrutamento internacional entre os membros dos diversos partidos comunistas do mundo e todos aqueles que anseavam em freiar os impulsos fascistas. Assim seriam formadas as Brigadas Internacionais, um grupo voluntário espontâneo de democratas e antifascistas. O principal centro de recrutamento e reunião dos homens dispostos a lutar na Espanha escolhido para as Brigadas Internacionais seria Paris, onde o Partido Comunista local era forte e contava com a importante figura de André Marty, membro de destaque do Comintern.

Na cidade luz chegavam todos os dias jovens vindos de todos os locais da Europa, carregando algumas poucas mudas de roupa, mantimentos e muita esperança e coragem em seus corações. Nas estações de trens era possível vê-los se aglomerar com todas as suas trouxas de pertences e algumas espingardas velhas e enferrujadas enroladas em papel jornal. Embora haja uma memória muito romantizada que constrói uma imagem idealizada dos brigadistas, que supostamente seriam membros intelectuais da classe média internacional, uma análise mais profunda revela que estes na realidade eram

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poucos e a construção deste mito se deve ao fato de serem pessoas bem articuladas, além de bons escritores que conseguiram chegar às editoras. A maioria dos membros da brigada eram na realidade proletários, trabalhadores braçais ou desempregados que enxergaram no conflito uma oportunidade de melhorar sua condição de vida. Também haviam aqueles que fugiam das ditaduras do leste europeu e que já vinham combatendo o fascismo a mais tempo.

Entravam em território espanhol através da fronteira norte, onde eram vistos com desconfiança pelos guardas anarquistas, receosos de que por trás deste apoio viesse um golpe que colocasse no poder os comunistas e os interesses soviéticos. Apesar deste tipo de recepção nas fronteiras, quando entravam nas cidades eram tratados como heróis vindos para libertar o país, uma última esperança. Este tipo de tratamento dado pela população aos brigadistas ajudava a construir o discurso sobre a importância de seus atos. Uma vez que a maioria ali não tinha muita ciência sobre o que era de fato as ideologias em conflito, era de vital importância inflar-lhes o ego e o caráter de sua missão.

É importante ter em mente também que a grande maioria destes homens não possuia qualquer tipo de treinamento ou experiência militar, com raras exceções de ex-combatentes da primeira guerra mundial. Este despreparo era nítido nos campos de treinamento das Brigadas, sendo o principal deles o de Albacete, um local que não possuia boas condições, principalmente higiênicas, para acomodar tantas pessoas. A acelerada preparação necessária para os tornarem soldados pouco os ensinou além de organizarem-se em filas e obedecerem ordens. Faltavam perícias técnicas, pontaria, destreza e estratégia, por mais que houvesse uma tentativa do Comintern de controlar esta última. Os homens também não contavam com um grande arsenal, em sua maioria eram armas velhas e emperradas, faltava munição e a inexperiência de muitos fazia com que balas de calibre diferente fossem colocadas em armas erradas, o que só piorava a situação. Não havia padronização das fardas, em sua maioria velhas e surradas, botas apertadas ou rasgadas; somente as patentes mais altas conseguiam demonstrar uma uniformidade na vestimenta.

Em um grupo tão grande, o idioma e outras diferenças culturais também se tornaram problemas para a manutenção da ordem. Observadores russos narram com espanto a falta de disciplina de alguns companheiros de fileiras, como estes consumiam álcool desenfreadamente e frequentavam bórdeis, pegando todo os tipos de doenças venéreas. Também afligia estes homens a falta de uma alimentação eficaz para mantê-los em pés para as batalhas, o que facilitava em muito a disseminação de doenças entre os brigadistas.

Estipula-se que durante os três anos da Guerra Civil Espanhola algo entre 32 mil e 35 mil homens de 53 países diferentes serviram nas fileiras das Brigadas Internacionais. Frente a tamanho despreparo, parecia impossível que realmente pudessem vencer as tropas fascistas apenas por seu heroísmo,

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coragem ou ideologia. A derrota das Brigadas Internacionais e dos republicanos extrapola a dimensão do conflito civil espanhol, representa um grande baque ao mundo livre na grande batalha ideológica do século XX.