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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO AMBIENTE JOÃO APARECIDO BAZOLLI Os Efeitos dos Vazios Urbanos no Custo de Urbanização da Cidade de Palmas – TO. Palmas - TO 2007

Bazolli - Os Efeitos Dos Vazios Urbanos No Custo de Urbanização Da Cidade de Palmas - To

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Bazolli - Os Efeitos Dos Vazios Urbanos No Custo de Urbanização Da Cidade de Palmas - To

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS DO AMBIENTE

    JOO APARECIDO BAZOLLI

    Os Efeitos dos Vazios Urbanos no Custo de Urbanizao da Cidade de Palmas TO.

    Palmas - TO 2007

  • ii

    JOO APARECIDO BAZOLLI

    Os Efeitos dos Vazios Urbanos no Custo de Urbanizao da Cidade de Palmas TO.

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-graduao Stricto Sensu em Cincias do Ambiente, da Universidade Federal do Tocantins, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Cincias do Ambiente.

    Orientador: Prof. Dr. Waldecy Rodrigues

    Palmas - TO 2007

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    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) Biblioteca da Universidade Federal do Tocantins

    Campus Universitrio de Palmas

    B364e Bazolli, Joo Aparecido Os Efeitos dos vazios urbanos no custo de urbanizao da Cidade de Palmas TO. / Joo Aparecido Bazolli. Palmas, 2007. 154 f.

    Dissertao (Mestrado) Universidade Federal do Tocantins, Ps-Graduao em Cincia do Ambiente, 2007. Orientador: Prof. Dr. Waldecy Rodrigues

    1. Cidade. 2. Urbanizao. 3. Expanso urbana. 4. Densidade urbana. 5. Infra-estrutura. I. Ttulo

    CDU 504

    Bibliotecrio: Paulo Roberto Moreira de Almeida CRB-2 / 1118

    TODOS OS DIREITOS RESERVADOS A reproduo total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio deste documento autorizado desde que citada a fonte. A violao dos direitos do autor (Lei n 9.610/98) crime estabelecido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

  • iv

    JOO APARECIDO BAZOLLI

    Os Efeitos dos Vazios Urbanos no Custo de Urbanizao da Cidade de Palmas TO.

    Essa dissertao foi julgada e aprovada pelos membros da Banca Examinadora no Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Cincias do Ambiente, da Universidade Federal do Tocantins / UFT, em sesso realizada no dia 27 de maro de 2.007, para obteno do grau de Mestre em Cincias do Ambiente. Linha de pesquisa da rea de concentrao de estratgias da Sociedade para Desenvolvimento Sustentvel - Polticas pblicas para Desenvolvimento Sustentvel.

    Coordenadora do programa Prof Dr Paula Benevides de Morais

    Banca Examinadora:

    Prof. Dr. Jos Ramiro Lamadri Marn Prof. Dr. lvio Quirino Pereira

    Orientador Professor Dr. Waldecy Rodrigues

    Palmas - TO 2007

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    AGRADECIMENTOS

    A todos que, diretamente ou indiretamente, contriburam para a realizao deste

    trabalho.

    Ao Professor Waldecy Rodrigues, pela ateno, compreenso e superao no

    trabalho de orientao.

    Aos colegas da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitao

    SEDUH de Palmas, pelo pronto atendimento aos pedidos e solicitaes de dados e

    informaes extremamente teis ao estudo.

    Ao colega Luis Hildebrando, Diretor de Planejamento Territorial da SEDUH por

    entender o esprito do estudo e estar sempre pronto com entusiasmo para colaborar com

    sugestes.

    Aos colegas e professores do mestrado pelo constante incentivo mesmo diante das

    adversidades e dificuldades que foram transpostas no transcorrer do curso.

    Aos colegas do CEULP/ULBRA pelo incentivo e contribuio ao estudo, ao grupo

    dos cursos tecnolgicos que suportaram as tenses resultantes da presso existente no

    decorrer do processo de construo do trabalho, em especial a professora Silvria pela

    competente conduo na reviso do trabalho.

    Aos meus familiares, aos filhos Roberta e Rodrigo, pelo incentivo, em especial a

    minha esposa Rita, que suportou a ausncia e falta de ateno, alm da sua contribuio

    efetiva na conduo do trabalho.

    Aos amigos, aos colegas e as inmeras pessoas annimas que atenderam

    prontamente aos pedidos de informaes e dados dos mais diversos rgos e entidades.

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    SUMRIO TABELA...................................................................................... viii

    GRFICOS.................................................................................. ix FIGURAS..................................................................................... x MAPAS........................................................................................ xi SIGLAS........................................................................................ xii RESUMO..................................................................................... xiii ABSTRACT................................................................................. xiv

    INTRODUO............................................................................

    15 METODOLOGIA......................................................................... 17 CAPITULO I: ABORDAGEM ESTRUTURAL DOS VAZIOS URBANOS...................................................................................

    24 1.1. Conceitos e modelo..................................................... 24 1.2. Mercado de solos......................................................... 26 1.3. Estudo comparativo...................................................... 29 1.4. Evoluo do estudo sobre os vazios urbanos............... 30

    CAPTULO II: A OCUPAO DO SOLO E OS ELEMENTOS DA SUA DINMICA: ESPAO URBANO, PREO E URBANIZAO........................................................

    33 2.1. Espao urbano............................................................. 33 2.2. A dinmica espacial da cidade..................................... 34 2.3. Mercado imobilirio e o valor do solo urbano............. 35 2.4. Espao e periferia........................................................ 42

    CAPTULO III: DESENHO URBANO, DENSIDADE E O CUSTO DE URBANIZAO. ...................................................

    45 3.1. Desenho urbano............................................................ 45 3.2. Densidade urbana......................................................... 47 3.3. Custo de urbanizao................................................... 53

    CAPTULO IV: CIDADES SUSTENTVEIS........................... 60 CAPTULO V: LEGISLAO URBANA E AMBIENTAL BRASILEIRA...............................................................................

    68 5.1. Histrico da Legislao Urbana no Brasil................... 68 5.2. Constituio Federal..................................................... 70 5.3. Lei 10.257, de 2001, O Estatuto da Cidade............ 72 5.4. Plano Diretor................................................................ 76 5.5. Norma Ambiental Urbana............................................ 78

  • vii

    RESULTADOS E DISCUSSES................................................ 82 1. Localizao e contexto histrico de Palmas-TO............. 82 2. A evoluo da ocupao da cidade................................. 86 3. Anlise do Mercado Imobilirio..................................... 97 4. Caracterizao dos Vazios Urbanos em Palmas-TO....... 105 5. Custo de Urbanismo: Uma abordagem comparativa...... 110

    5.1. Capitais brasileiras.................................................. 110 5.2. Densidade urbana de Palmas-TO............................ 118 5.3. Custo de Urbanismo em Palmas-TO....................... 125

    5.4. Custo de Urbanismo e o Plano Plurianual de Palmas-TO.....................................................................

    129 6. Os efeitos dos vazios urbanos no Custo de Urbanizao 132 7. Cenrios: Perspectivas da ocupao de Palmas-TO para

    os prximos 10 anos......................................................

    138 7.1. Projeo de crescimento populacional de Palmas-TO

    em 10 anos.....................................................................

    139 7.2. Cenrio 1: Reduo do atual permetro urbano de

    28.415 hectares para 16.000 hectares, tendncia de reteno da expanso urbana e adensamento da regio central ...........................................................................

    140 7.3. Cenrio 2: Permanncia da condio atual com

    permetro urbano de 28.415 hectares e tendncia de crescimento da regio Palmas -norte........................................................................

    142 CONCLUSO.............................................................................. 143 REFERNCIAS........................................................................... 146 NOTAS......................................................................................... 151 ANEXOS...................................................................................... 153

  • viii

    TABELAS Tabela 1 Participao mdia em porcentagem das diferentes partes nos

    custos totais dos subsistemas urbanos

    56 Tabela 2 Custo mdio das redes urbanas em funo da densidade 58 Tabela 3 Custo por usurio das redes urbanas no nvel urbano para as

    cidades de porte mdio

    59 Tabela 4 Populao urbana e rural no Brasil 79 Tabela 5 Crescimento Demogrfico 1991 a 2000 85 Tabela 6 Lanamento de Loteamento-1991 88 Tabela 7 Ocupaes irregulares em Palmas-TO 95 Tabela 8 Vazios Urbanos de Palmas-TO por quadra 109 Tabela 9 Custo de Urbanismo das capitais brasileiras 111 Tabela 10 reas Urbanizadas da Amaznia legal 113 Tabela 11 Anlise do Custo de Urbanismo 114 Tabela 12 Densidade urbana: Cidades/ reas 116 Tabela 13 Densidade Urbana Quadras de Palmas-TO 119 Tabela 14 Custo de Urbanismo Dados econmicos - Palmas-TO 128 Tabela 15 Quadro de Obras de Infra-estrutura Urbana PPA

    2006/2009

    130 Tabela 16 Obras de Infra-estrutura Urbana PPA 2006/2009

    Pavimentao de Quadras internas

    131 Tabela 17 Custo para implantao de quadra padro em Palmas-TO 133 Tabela 18 Custo mdio das redes urbanas em funo da densidade

    adaptada para Palmas-TO

    135 Tabela 19 reas de Palmas em relao a densidade urbana e Custo

    Urbano

    141

    Tabela 20 Custo de Urbanizao e Urbanismo de Palmas-TO 142

  • ix

    GRFICOS Grfico 1 Ocupaes irregulares percentuais por regio 96 Grfico 2 Valor atribudo pelo Mercado Imobilirio e Planta de Valores

    Genricos Imobilirios PMP - 2000

    98 Grfico 3 Relao entre densidade demogrfica e custo de urbanismo per

    capita em capitais selecionadas em reais (R$) 2005

    117

    Grfico 4 Densidade urbana das capitais brasileiras hab/ha 118 Grfico 5 Custo de urbanismo Incidncia s/ total de despesas - 2005 129 Grfico 6 Incidncia s/ o custo total para implantao de quadra padro

    em Palmas-TO

    134 Grfico 7 Relao do custo da rede com a densidade urbana 136 Grfico 8 Projeo de crescimento populacional de Palmas-TO 139 Grfico 9 Densidade por hectare Projeo 10 anos 140

  • x

    FIGURAS Figura 1 Esquema representativo de formao do sentido dos lugares 46 Figura 2 Jardim Santa Helena Alameda 2 100

  • xi

    MAPAS Mapa 1 Localizao de Palmas-TO 83 Mapa 2 Confrontaes de Palmas-TO 84 Mapa 3 Extenso urbana da cidade de Palmas-TO 87 Mapa 4 Lanamento de Loteamentos de 1991 89 Mapa 5 Expanso Urbana de 1989 a 2006 91 Mapa 6 Loteamento ARSO 31 93 Mapa 7 Extenso da regio norte de Palmas-TO 102 Mapa 8 Localizao do Residencial Polinsia 104 Mapa 9 Vazios Urbanos de Palmas-TO 107 Mapa 10 Localizao da ARSO 51 108 Mapa 11 Quadras escolhidas para estudo da densidade de Palmas-TO 120 Mapa 12 Densidade populacional por quadra cidade de Palmas-TO 121 Mapa 13 Habitaes precrias na regio central da cidade 123 Mapa 14 Locais precrios Regio sul da cidade de Palmas TO 126

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    SIGLAS

    SEDUH-PMP: Secretria do Desenvolvimento Urbano e Habitao da Prefeitura

    Municipal de Palmas

    IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    GIUG: Gerncia de Informaes Urbansticas Georefernciadas da SEDUH-PMP

    PIB-M: Produto Interno Bruto do Municpio

    IDHM: ndice de Desenvolvimento Humano do Municpio

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    RESUMO

    A cidade de Palmas, capital do Estado do Tocantins, destaca-se por, embora ser planejada e ter apenas dezessete anos de fundao, apresentar problemas de vazios urbanos, expanso desordenada e elevado Custo de Urbanizao. Justificou-se o estudo pela observao da vasta rea de vazios urbanos na regio central da cidade, seguida pela sua baixa densidade populacional, em relao ao plano original urbanstico. Esses fatores inicialmente so atribudos expanso desordenada da cidade e considerados preponderantes para a formulao da hiptese de que os vazios urbanos apresentam efeitos econmicos no Custo de Urbanizao da cidade. Objetivou-se com o estudo analisar os efeitos dos vazios urbanos no Custo de Urbanizao da cidade. Buscou-se identificar e quantificar os vazios urbanos existentes na cidade de Palmas; analisar as razes e os fatores que determinam a sua presena e permanncia na regio central da cidade; analisar a expanso urbana e o crescimento desordenado da cidade; analisar a relao dos vazios urbanos com o mercado imobilirio e estudar a densidade urbana. No estudo foi utilizado o mtodo do Custo Mdio das redes urbanas em funo da densidade (MASCAR, 1987) desenvolvido por meio de levantamento de dados secundrios. Foi realizada no contexto metodolgico a anlise dos vazios urbanos, da densidade populacional, da expanso da cidade, do Custo de Urbanismo e de Urbanizao. No estudo se concluiu que os vazios urbanos provocam efeitos no Custo de Urbanizao, pelo espalhamento da cidade, fator da baixa densidade urbana e do elevado custo/ benefcio decorrente da implantao de infra-estrutura. Desta maneira foi proposto no estudo a conteno da expanso da cidade pela reduo do permetro urbano atual de 28.415 hectares para 16.000 hectares e a criao de polticas pblicas voltadas para o adensamento da regio central da cidade, com a ocupao dos vazios urbanos existentes nesta regio, que esto dotados de infra-estrutura.

    Palavras chave: Cidade, Urbanizao, Expanso urbana, Densidade urbana, Infra-estrutura.

  • xiv

    ABSTRACT

    Palmas city, the Tocantins State capital, is distinguished for (even so it is planned and it is only seventeen years old) presenting problems of urban emptiness, expansion disorder and raised Urbanization Cost. The present study is justified for the observation of a vast area of urban emptiness in the city central region, followed for its low population density, in relation to the original urban plan. These factors initially are attributed to the citys disordered expansion and considered preponderant for the hypothesis construction of that the urban emptiness present economic effect in the citys Urbanization Costs. The objective of the present study is to analyze the effect of the urban emptiness in the city Urbanization Cost. One searched to identify and to quantify the existing urban emptiness in Palmas city; to analyze the reasons and the factors that determine its presence and permanence in the central region of the city; to analyze the urban expansion and the city disordered growth; to analyze the relation of the urban emptiness with the real estate market and to study the urban density. It was used in the study the urban nets Average Cost method in function of the density (MASCAR, 1987) developed by means of secondary data-collecting. The analysis of the urban emptiness, of the population density, of the city expansion, of the Urbanism Cost and of Urbanization was carried through in this methodological context. In the study it was concluded that the urban emptiness provoke effects in the Urbanization Cost, for the scattering of the city, factor of the low urban density and the raised cost/benefit resultant of the infrastructure implantation. In this way it is recommended in the study the containment of the city expansion through the reduction of the current urban perimeter from 28.415 hectares to 16.000 hectares and the creation of public politics toward the occupancy of the city downtown, with the occupation of the existing urban emptiness in this region, that are endowed with infrastructure.

    Key-words: City, Urbanization, urban expansion, urban density, infrastructure.

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    INTRODUO Palmas, capital do Estado do Tocantins, embora seja uma cidade planejada e com

    apenas dezessete anos de fundao, apresenta srios problemas urbanos resultantes do crescimento desordenado, como a expanso perifrica decorrente dos vazios urbanos e os seus efeitos no elevado custo para a implantao e da manuteno da infra-estrutura e equipamentos pblicos na cidade.

    O crescimento da cidade foi gerado por programas de incentivo do governo estadual que atraram considerveis fluxos migratrios oriundos das mais diversas regies do pas, estimulados pelas facilidades na aquisio de lotes, muitos deles doados. Por essa razo se verificou considervel crescimento populacional, registrado principalmente nos primeiros dez anos da sua fundao, que foi acompanhado pela implantao de infra-estrutura urbana na regio central da cidade e pelo fomento dos meios produtivos. Essas transformaes levaram a uma expressiva valorizao do mercado imobilirio.

    Este estudo se prope a contribuir com a investigao dos efeitos dos vazios urbanos sobre o custo de urbanizao da cidade de Palmas - TO. Com essa proposta, foi estabelecida a relao entre os vazios urbanos e o custo de urbanizao da cidade, considerando a densidade demogrfica local.

    A investigao no estudo tem a finalidade de responder questo: Quais os efeitos dos vazios urbanos no custo de urbanizao da cidade de Palmas - TO?

    Justifica-se o estudo pela observao da vasta rea de vazios urbanos na regio central da cidade, seguida por sua baixa densidade populacional, em relao ao seu plano original de implantao. Fatores inicialmente atribudos expanso desordenada da cidade e considerados preponderantes para a formulao da hiptese que os vazios urbanos apresentam efeitos econmicos no custo da implantao e da manuteno da infra-estrutura e de equipamentos pblicos na cidade.

    Segundo dados do IBGE, projeo para o ano de 2005, a densidade populacional urbana de Palmas era de 7,3 habitantes por hectare, muito abaixo da mnima suportvel prevista por Mascar (1987o) de 40 pessoas por hectare, e com distncia ainda maior do seu plano original de implantao, que previa a densidade de 300 pessoas por hectare.

    Com relao ao mercado imobilirio da cidade, verifica-se a reteno de terras providas de infra-estrutura na sua regio central, com fins especulativos, considerada indutora do crescimento descontnuo da mancha urbana. Os vazios urbanos gerados nesse processo dificultam e encarecem a urbanizao da cidade, por seu elevado custo, devido a dois fatores.

  • 16

    Primeiro por provocar a extenso de redes para as reas perifricas como: pavimentao de ruas e avenidas; redes de guas; esgoto e de energia eltrica; iluminao pblica; escolas; creches; posto policial; praas e estruturas de lazer. Segundo, pela desnecessidade dessa expanso, afinal a cidade na sua regio central possui reas urbanizadas sem ocupao.

    A dinmica desencadeada pelo mercado imobilirio provocada pela reteno de terra pode ser verificada pela existncia de reas ociosas dentro do permetro urbano, principalmente na sua regio central, sejam lotes ou glebas, que ocasionam a diminuio da oferta de terra urbanizada e resultam na elevao artificial do seu valor. Como conseqncia desse processo, as pessoas menos providas de recursos so empurradas para as reas perifricas da cidade. Esses locais perifricos na maioria das vezes so constitudos por loteamentos clandestinos, descontnuos e longe do aglomerado central, fator que torna a cidade cada vez mais espraiada e refora o avano do urbano sobre o rural, ampliando a degradao do ambiente que, embora no avaliado neste estudo, se d em razo desse avano pela prpria ocupao do espao.

    A proposta da pesquisa decorreu pela preocupao de que a cidade, mesmo com a existncia de vazios urbanos na sua regio central, apresenta de maneira desordenada e contnua uma expanso perifrica. Outros fatores que se agregaram anlise foram a observao das atividades do mercado imobilirio sob a tica da sistemtica da elevao artificial do valor da terra, prtica comum nesse setor, e a constatao da baixa densidade populacional da cidade, inicialmente atribuda ao seu crescimento espraiado.

    Dessa maneira, pretendeu-se possibilitar a formulao de novas propostas de estudos do gnero, principalmente por tratar do espao urbano, do meio ambiente construdo e do custo de urbanizao, com o intuito de estabelecer a sustentabilidade da cidade.

  • 17

    METODOLOGIA

    Este estudo foi realizado a partir de consultas preliminares com subsidio terico multidisciplinar, seguido por levantamento de dados histricos da cidade, bem como, pela identificao e quantificao dos vazios urbanos na cidade, pela anlise da forma de expanso e de ocupao urbana desde a sua implantao, pela anlise do mercado imobilirio, pelo levantamento de indicadores de crescimento, densidade e econmicos, pela anlise cartogrfica para identificao dos espaos na cidade, pela projeo de cenrios com base nos resultados encontrados na pesquisa.

    O parmetro para a anlise foi o permetro urbano de Palmas - TO, estabelecido pela Lei Complementar N 58, de 16 de setembro de 2002, que instituiu o Macrozoneamento Territorial da cidade. De acordo com essa normativa, a Macrozona Urbana corresponde poro do territrio do municpio apropriada predominantemente s funes urbanas, tendo sido definida a partir das reas j urbanizadas e dos vetores de expanso urbana Norte e Sul, com rea de 28.415 hectares e suas confrontaes estabelecidas pela referida lei.

    Foram utilizados no trabalho, para identificao de localidades, dois tipos de mapas: em desenho e ortofotos, com os indicativos das coordenadas geogrficas.

    Os mapas em desenho, integrantes deste estudo foram elaborados a partir da matriz fornecida pela Secretria do Desenvolvimento Urbano e Habitao da Prefeitura Municipal de Palmas. Na elaborao, foram utilizados os Softwares: Corel Draw12 2003, para assinalar as localidades e as informaes indicativas do texto e o Autodesk - AutoCAD 2005, para realizar as anlises e observaes internas das quadras e realizao dos clculos de reas.

    Os mapas utilizados no trabalho, em ortofotos, e as distncias medidas com o uso de georeferenciamento, foram realizadas com o auxlio do Google Earth Image/ DigitalGlobe/2006 e 2007 - (Imagens de Satlite).

    As fotografias, que compem o acervo do trabalho e mostram as imagens identificadas pela localizao dos mapas, foram produzidas pelo autor e organizadas com o auxlio do Software Picasa Verso 2.6.0 (Build 35.97.0) (Google, 2006) MSWin.

    As tabelas e os grficos que compem o estudo foram elaboradas com o auxlio do Software BrOffice.org 2.1- PlanCal (Microsystems, 2006), com a finalidade de mostrar os diversos indicadores pesquisados e inter relacion-los.

  • 18

    Etapas da pesquisa

    A pesquisa foi desenvolvida obedecendo s seguintes etapas:

    Subsdio terico e reviso de literatura A partir de consultas preliminares com subsdio multidisciplinar, foi realizado o

    embasamento terico do estudo, dividido em cinco captulos, assim estruturado: Captulo I: Abordagem estrutural dos vazios urbanos; Captulo II: A ocupao do solo e os elementos da sua dinmica: espao urbano, preo e urbanizao; Captulo III: Desenho urbano, densidade e o custo de urbanizao; Captulo IV: Cidades sustentveis; e Captulo V: Legislao urbana e ambiental brasileira.

    Resultados e Discusses

    1) Localizao e contexto histrico de Palmas TO Por meio de base cartogrfica, foi realizada a localizao de Palmas, no contexto

    regional e local, com as suas confrontaes e o apontamento das suas coordenadas geogrficas, bem como, realizado um levantamento histrico da sua implantao. Os dados coletados junto ao IBGE, outras instituies e do SIMBRASIL1 possibilitaram analisar questes relacionadas ordem econmica local, indicadores como PIB municipal, renda per capita, nvel de pobreza, dficit habitacional, IDHM -ndice de Desenvolvimento Humano Municipal.

    2) A evoluo da ocupao da cidade Com levantamento de dados por meio de mapas, identificao de registro de

    loteamentos no Cartrio de Registro de Imveis, foi analisada a evoluo da ocupao espacial de Palmas no perodo de 1991 a 2006. A anlise da expanso e ocupao da cidade foi realizada com os dados cedidos pela SEDUH, com o levantamento da legislao urbanstica do municpio e de sua base cartogrfica. A utilizao do Google Earth Image/DigitalGlobe/2006 e 2007 (Imagens de Satlite) e os levantamentos cartogrficos do Plano Diretor de Palmas possibilitaram analisar a tendncia da expanso da cidade, com o mesmo critrio, o movimento da sua ocupao espacial, por fim a identificao das reas centrais urbanizadas sem ocupao.

  • 19

    3) Anlise do mercado imobilirio Com a finalidade de identificar os valores de mercado de lotes vazios em relao

    base tributria para cobrana do imposto predial e territorial urbano2, bem como a valorizao dos imveis no deslocamento centro-periferia, foi realizado o levantamento de valores de lotes por metro quadrado, nas quadras que foram selecionadas. A avaliao dos imveis foi realizada pela Cmara de Valores Imobilirios do Estado de Tocantins, em 2007, que mantm um banco de dados comparativos de valores de imveis urbanos. Com os dados levantados, foi possvel analisar o mercado imobilirio no que tange a elevao artificial do valor da terra para comercializao futura. Outro aspecto importante foi a possibilidade de estabelecer o comparativo entre o preo praticado pelo mercado imobilirio e o valor utilizado pela prefeitura municipal como base de clculo para os impostos imobilirios, especificamente o imposto predial territorial urbano, calcado na Planta de Valores Genricos da Prefeitura Municipal de Palmas, aprovada pela Lei N 965/2000. Esse relacionamento permitiu, no estudo, um melhor entendimento da dinmica que acontece entre os valores praticados pelo mercado imobilirio e o baixo valor dos impostos, que esto relacionados propriedade imobiliria e so devidos municipalidade. Condio, que por si s, serve como indutora para a reteno da terra e gera os efeitos indesejados sociedade, pela elevao do custo de urbanizao na cidade.

    4) Caracterizao dos vazios urbanos em Palmas TO Os vazios urbanos da regio central de Palmas - TO foram identificados a partir de

    informaes extradas no banco de dados geogrficos de imagens de satlites, fotos areas e de mapas da cidade, pelo Sistema de Informaes Georeferenciadas - SIGPALMAS3 - (2006). Esta ferramenta a Prefeitura Municipal de Palmas disponibiliza para domnio pblico, em dois formatos. Um deles em arquivo PDF "Portable Document Format" para uso com as ortofotos publicadas e o outro formato em JPG Joint Pictures Group para uso com os mapas em desenho disponibilizados.

    Para a quantificao desses vazios urbanos, foram realizados levantamentos junto Secretria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitao da Prefeitura Municipal de Palmas, por meio da GIUG, com o objetivo de obter a sua rea dentro do permetro urbano de Palmas - TO.

  • 20

    5) Custo de urbanismo Com o intuito de inicialmente estabelecer uma viso macro de Palmas-TO na

    conjuntura nacional, foi realizado o levantamento do custo de urbanismo4 das capitais brasileiras, seguido pelo levantamento contbil do municpio. Foram coletados, analisados, conciliados e atualizados os dados contbeis sobre a rubrica Custo de Urbanismo de Palmas, do perodo de 2002 a 2005. Os referidos dados constam no Balano Patrimonial da Prefeitura Municipal. Para o citado levantamento foram geradas planilhas emitidas pelo Sistema Integrado de Administrao Financeira para Estado e Municpios SIAFEM fornecidas pela Secretria de Administrao Financeira da Prefeitura Municipal de Palmas. Para concluir esta etapa foi realizada anlise do PPA Plano Plurianual do perodo de 2006 a 2009 para estabelecer a relao espacial do oramento, na discusso centro-periferia, com o elevado custo da cidade devido sua expanso desordenada.

    6) Os efeitos dos vazios urbanos no custo de urbanizao Com o intuito de levantar os dados do Custo de Urbanizao com a finalidade de

    aplicar o Mtodo de Custo Mdio das redes em funo da densidade (MASCAR, 1987p), para comprovar os efeitos dos vazios urbanos, nessa relao, foram cumpridas algumas sub-etapas a seguir:

    a) A referncia, fundamentada no estudo, para o clculo do custo de urbanizao foi uma quadra padro de Palmas, com a medida de 700 metros por 700 metros, que totaliza 490 mil metros quadrados, o equivalente a 49 hectares ou 0,49 quilmetros quadrados;

    b) Com base na literatura, foi estabelecido o critrio para o clculo das redes como: tipo de traado da rede de infra-estrutura; a funo bsica do desenho do sistema virio; a topografia e outras especificaes tcnicas detalhadas pelo oramento;

    c) Para atender o foco do estudo, adaptou-se na tabela a proposta de Mascar (1987q), incluindo a construo de equipamentos pblicos como: escola, creche, quadra-poliesportiva, posto policial, posto de sade e praa;

  • 21

    d) Na realizao do clculo e elaborao dos oramentos, foi utilizado o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e ndices da Construo Civil SINAP, do setor de Desenvolvimento Urbano e Habitao da Unidade da Caixa Econmica Federal de Palmas - TO;

    e) Os dados coletados sofreram homogeneizao em clculo estatstico de mediana. Para isso foi considerado o tipo de traado da rede de infra-estrutura, a funo bsica do desenho do sistema virio, a topografia e outras especificaes tcnicas detalhadas no oramento;

    f) Foi acrescido aos dados coletados o percentual de 15% a ttulo de BDI Bnus de Despesas Imprevistas utilizado pelas prefeituras municipais no pas. Esse percentual utilizado foi informado pela Secretaria Municipal de Infra-Estrutura PMP;

    g) Para a estruturao e composio dos dados oramentrios, considerou-se a quantidade de vias pblicas e as medies, com base na quadra padro, com o uso do sistema Google Earth image/DigitalGlobe/2006 e do software Autodesk - AutoCAD 2005;

    h) Foi elaborada, no estudo, a Tabela de Custo de Urbanizao para Palmas e a Tabela de Custo Mdio das redes em funo da densidade, com base no mtodo de Mascar (1987r), adaptada a partir dos valores levantados, considerando o nvel de densidade previsto no projeto original de Palmas, de 300 habitantes por hectare. Na construo da tabela Custo Mdio das redes, em funo da densidade, foram considerados os indicadores da tabela original (Mascar, 1987s), de cinco pessoas por domiclio e a variao do Custo/Hectare das redes em 7,296% de 75 domiclios para 150 domiclios, em 7,09% de 151 domiclios a 300 domiclios e em 9,572% de 301 domiclios a 600 domiclios;

    i) Para a realizao da anlise intra-urbana de densidades e de valor imobilirio dos lotes, foram selecionadas, nos quadrantes do plano original da cidade, conhecido como Palmas-centro, e em reas perifricas da regio sul, dezenove localidades. Os critrios utilizados para escolha destas localidades foram: estarem distribudas em zona residencial nos quadrantes ARNO rea Residencial Norte, ARSO rea Residencial Sudoeste, ARNE rea Residencial Nordeste, ARSE rea Residencial Sudeste e na regio sul integrarem os

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    bairros Aureny(s); terem alta densidade, considerando a realidade de Palmas; estabelecerem uma distncia, em relao ao marco zero da cidade, gradativa na direo centro-periferia; apresentarem valorizao imobiliria na relao linear centro-periferia (vetor norte-sul); possurem rea equivalente ao da quadra padro do plano original da cidade de 49 hectares; que estabeleam a diferena entre as quadras centrais urbanizadas e as quadras distantes do centro, sem ou com a urbanizao precria; que estabeleam a diferena entre as quadras centrais, com habitaes boas, e as quadras perifricas, com habitaes precrias.

    7) Projeo populacional para dez anos em Palmas-TO e a construo de cenrios considerando a expanso urbana em relao a densidade demogrfica

    A partir dos resultados encontrados pelo estudo, foi realizada inicialmente a projeo do crescimento populacional da cidade, em seguida foram construdos dois cenrios provveis: o primeiro considera a proposta do estudo, que sugere a ocupao da regio central da cidade e a reduo do seu permetro urbano; o segundo considera o crescimento urbano dentro do atual permetro com a expanso da cidade para a regio norte.

    Portanto, esta etapa foi realizada de acordo com as sub-etapas:

    a) Para a realizao da projeo do crescimento populacional foi utilizado o Mtodo de Incremento (PUPPI, 1981a), Mdia Aritmtica, onde Pz = Po (1+0,04pz), sendo Pz = Populao prevista, Po = Populao inicial, P = Crescimento mdio anual da populao e z = (tn-to) perodo de previso. Para o estabelecimento do prazo de dez anos estimado no estudo, foi considerado o perodo legal para a reformulao do Plano Diretor. Desta maneira, realizou-se a projeo do crescimento populacional da cidade considerando trs condies: a primeira com crescimento intenso - equivalente a proporo de duas vezes o indicador regional de densidade - de 2,90%, igual a 5,8%; a segunda, com crescimento moderado - uma vez o indicador regional - de 2,90% e finalmente a terceira com crescimento reduzido - considerando o indicador mdio nacional - de 1,64%.

    b) No estudo, para o estabelecimento dos cenrios, optou-se por considerar a condio de um crescimento intenso, devido condio econmica enunciar essa possibilidade, pelo anncio do governo federal por meio do PAC Programa de Acelerao do Crescimento destinar 50,9 bilhes de reais para regio norte, desse valor 11,9 bilhes direcionados para a infra-estrutura social e urbana. Considerando que o programa contempla a

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    implantao da ferrovia norte-sul, trecho da cidade de Araguana a Palmas, sua interligao com as hidrovias do Amazonas e Tocantins-Araguaia, que possibilitar o escoamento da produo com menor custo pelo Estado do Maranho, o que j tem levado empresrios paulistas e mineiros a buscarem o estado do Tocantins com o objetivo de produzir lcool e biodiesel, pode-se concluir que certamente esses fatos produziro reflexos intensos na economia de Palmas.

    c) O primeiro cenrio construdo props para anlise da relao espacial da cidade com a densidade urbana, trs condies: a primeira considera a cidade com o atual permetro urbano de 28.415 hectares; a segunda, caso seja procedido a reduo do permetro urbano, conforme proposto pelo estudo, para 16.000 hectares, por ser possvel; e a terceira caso houvesse a reduo do permetro urbano para 9.369 hectares, rea original do plano da cidade, mas atualmente invivel por implicaes legais. As trs condies mostradas estabelecem a relao do crescimento populacional com a ocupao da rea central da cidade e o reflexo na densidade urbana.

    d) O segundo cenrio criado considera a atual rea urbana da cidade de 28.415 hectares e desloca a expanso urbana em direo regio norte, onde existem alguns loteamentos aprovados, a partir do trecho no urbanizado de 5.700 hectares. Nesse vis, foi realizada a anlise do crescimento, com base nos Custos de Urbanizao apurados pelo estudo e estimados os valores que a municipalidade deveria arcar com a referida expanso, considerando tambm, na anlise, os efeitos dos custos na relao de densidade e nos vazios urbanos da cidade.

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    CAPTULO I: ABORDAGEM ESTRUTURAL DOS VAZIOS URBANOS 1.1. Conceitos e modelo

    Para este estudo, determina-se como ponto de partida para identificao dos vazios urbanos os terrenos vagos encontrados nas cidades, que devem ser considerados como referncia da existncia do fenmeno, no que concerne a sua individualidade. Sabe-se que a somatria dos terrenos vagos resulta na quantificao dos espaos vazios. Assim, os terrenos vagos so uma modalidade de uso do solo, quantificveis e elementos comensurveis da paisagem. Portanto, o caminho bsico para estrutura o estudo identificar o vazio urbano enquanto terreno, lote e gleba sem construo.

    Por outro lado, a abordagem dos vazios urbanos no se restringe aos aspectos quantitativos. Por sua amplitude e complexidade, esto inseridos na dinmica da produo e da reproduo dos espaos na cidade, em dado momento, desse processo emerge a forma de representao dos terrenos vagos na paisagem (ALVAREZ, 1994a).

    O contraste entre a concentrao urbana e os terrenos vagos, estabelece a dimenso estruturada e dialtica da realidade para a compreenso dos processos de constituio do espao urbano. Nos terrenos vagos que podem ser quantificveis e descritveis, em relao a esse contraponto, respeitados os contrastes, encontra-se uma caracterstica comum, a possibilidade da concentrao urbana tambm poder ser quantificada (ALVAREZ, 1994b).

    Embora os terrenos vagos sejam quantificveis, a dinmica da produo de espao, no processo de estruturao da mancha urbana da cidade, no representa dado esttico diante da lgica do mercado de solos. Os terrenos vagos surgem e desaparecem a partir e diante de um processo incessante de produo e consumo, considerando que essa condio indutora da descontinuidade territorial que ocorre devido a duas dimenses contraditrias: a espontnea e a institucional (ALVAREZ, 1994c).

    A concepo da lgica dos vazios urbanos nas cidades no pode ser estruturada em modelo comum. Para o aprofundamento da anlise, faz-se necessrio considerar diversas variveis, entre outras o porte, adensamento e a regio geogrfica onde a cidade est inserida.

    A relao entre terrenos vagos, os vazios urbanos e a urbanizao fica clara a partir da constatao de que os terrenos vagos sugerem uma negao ao processo de adensamento, considerando-se que as cidades se constituem a partir da tendncia de maximizao do adensamento. Nesse vis os terrenos vagos se apresentam como contraponto e contraste, por constiturem-se como meio de investimento financeiro e de valorizao patrimonial.

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    Em estudo realizado, concluiu Alvarez (1994d) que a urbanizao reduz a disponibilidade de terrenos vagos, em contra partida eleva o preo do metro quadrado local, ficando consubstanciado que a reproduo dos vazios urbanos est relacionada expresso territorial que a pobreza assume na cidade.

    No modelo latino americano de ocupao das cidades, considerado perverso e ineficaz, os vazios urbanos se constituem como base fundiria para proprietrio privado ou poder pblico. Este ltimo, modestamente, utiliza esses espaos para implantao de projetos de regenerao de cidades ou periferias. Esses espaos, ao contrrio, poderiam se transformar em oportunidades credveis, fato que depende da integrao de aes a serem desenvolvidas pela administrao pblica municipal e no existe a cultura de iniciativas nesse sentido.

    Embora amplamente constatado os malefcios causados pelos vazios urbanos s cidades, bem como, a sua relao tradicional como expresso do poder da propriedade privada da terra, o fenmeno ainda pouco estudado, especialmente na Amrica Latina. Constata-se tambm que, nos estudos realizados sobre a temtica, existe a tendncia da realizao de anlises superficiais do assunto, so poucos os debates encontrados com um nvel de aprofundamento, principalmente os que tratam sobre os elementos que explicam a relao do fenmeno com os submercados de terra urbana e peri-urbana. So raras abordagens encontradas sobre o grau de prejuzos econmicos e sociais causados pelo fenmeno, poucos estudos relacionam-no com as polticas fiscais imobilirias e da produo e reproduo da cidade, modestos debates sobre a influncia do fenmeno na apropriao do espao urbano (CLICHEVSKY, 1999a).

    Conceitualmente os vazios urbanos esto diretamente relacionados ao seguimento privado ou pblico. Na iniciativa privada, esto relacionados mais especificamente ao mercado imobilirio e ao comportamento dos agentes privados que investem nesse mercado. Na administrao pblica, esto relacionados s polticas pblicas e ao comportamento dos agentes pblicos que conduzem essas polticas, em especial as que tratam das definies territoriais, principalmente de rea urbana.

    A dinmica do crescimento das cidades tem como critrio a converso de solo no urbanizado em urbanizado, por foras centrfugas, evidente que o processo incorre em falhas pela falta de homogeneidade, disso emergem, ento, os vazios urbanos, que devem ser reconhecidos conceitualmente como componentes estruturais da cidade e no simplesmente como resultados dos distrbios ou ms formaes na produo espacial da cidade.

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    Certamente os terrenos vazios coexistem nas cidades, tanto na sua variedade de tipos (com diferentes medidas e modo de uso), como na variedade das regies (reas de periferia, rea central da cidade, rea industrial, rea comercial e outras reas), mas interferem diretamente nas formas de crescimento das cidades, tambm definem a urbanizao, causam, principalmente, quando a expanso urbana avana sobre a rea rural, problemas ambientais. A questo central para a compreenso do fenmeno defini-lo como problema estrutural, que pode ser identificado pela existncia de diferentes pequenos mercados locais segmentados interconectados globalmente e pela forte tendncia do avano urbano sobre o rural, em circunstncia da elevada vantagem decorrente dessa operao (CLICHEVSKY, 1999b).

    1.2. Mercado de solos No vis de abordagem do estudo, destaca-se que o mercado de solo por ser voltil

    sofre alteraes constantes relacionadas s novas demandas mercadolgicas e ofertas urbanas. A incorporao imobiliria, como demanda contempornea, assume um papel importante na condio de interventora no processo de ocupao de solo, quando por meio da transformao de uso se apropria dos lucros que, em condio diferente, seria do proprietrio tradicional da terra. O estado surge, tambm, como detentor de terra a partir da implementao das polticas de reforma estatal, portanto importante interventor no processo de ocupao do solo.

    Enfim, os vazios urbanos, alm de denotar reteno fundiria, so um forte sinal de que existe parcela da populao, que por requisito econmico, no consegue ocupar esses espaos, devido, obviamente, valorizao imobiliria. Em termos scio-espaciais, os vazios urbanos definem a forma da expanso urbana e, por conseguinte, so responsveis pelos problemas originados pelo crescimento desordenado, que resultam nas baixas densidades urbanas em regies centralizadas.

    O avano urbano para reas distantes acarreta excessivas despesas ao errio municipal com a implantao e manuteno de infra-estrutura, equipamentos e servios pblicos, em detrimento ociosidade de infra-estrutura instalada em regies centrais que no so utilizadas. A extenso das redes do transporte coletivo um fator que eleva o custo de manuteno da municipalidade, alm do efeito ambiental direto acarretado por longos percursos dos veculos automotores. Outro aspecto importante relacionado qualidade de vida da populao o tempo despendido em deslocamentos extremamente longos e, na maioria das cidades, realizado pelo meio desconfortvel do transbordo.

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    Denota-se, desse contexto, que no existe racionalidade no processo de ocupao do solo, via segregao, tanto no aspecto econmico pela sua relao custo/benefcio, muito elevada para a municipalidade, como no aspecto social, por resultar em qualidade de vida e convivncia comunitria, abaixo do desejado.

    Na abordagem econmica, no se encontra subsdio conceitual para fundamentar o dispndio oramentrio representado pelos custos pblicos elevados para a implantao e manuteno de infra-estrutura, equipamentos e servios pblicos, em locais distantes da regio central, normalmente fora do permetro urbano, em relao ociosidade desses aparatos nas regies centrais, que permanecem sem ocupao, ou seja, normalmente com baixa densidade e com uma significativa porcentagem de vazios urbanos (CLICHEVSKY, 1999c).

    Embora o estudo no tenha primordialmente como foco o aspecto social, por sua importncia na abordagem do fenmeno, procedeu-se anlise conceitual para fortalecer a relao da dinmica da ocupao dos espaos vazios na cidade.

    Verificou-se, portanto, que embora haja grande quantidade de espaos urbanizados e vazios nas regies centrais das cidades brasileiras de mdio porte, os terrenos vagos so excessivamente valorizados. Parcela significativa dessa valorizao advm da instalao, pela municipalidade, da infra-estrutura e dos servios pblicos. Fato este que torna o solo urbano centralizado inacessvel para grande parte da populao e resulta na segregao espacial. Isso leva a populao sem acesso centralidade, de maneira formal, compra de terrenos a preo mais barato, ou pela via informal, por invases de terra, a ocuparem reas em locais cada vez mais distantes. Esses locais, ocupados na maioria das vezes, so inadequados ambientalmente e normalmente com condies precrias de habitao (CLICHEVSKY, 1999d).

    A previsibilidade de ocupao traduzida em parmetros estabelecidos por normas legais, como ocorre em alguns Planos Diretores, ora direcionando para o aumento de densidade urbana, ora indo ao rumo inverso, no determinante no gerenciamento dos vazios urbanos na cidade (PROJETODESIGN, 2001a).

    O aspecto preponderante nessa relao seria, ao invs do estabelecimento de parmetros legais, muitas vezes com carter unicamente punitivos, o estabelecimento de regras claras do jogo, que contemplem a ocupao do solo. Esse processo possibilitaria uma viso sistmica da dinmica, pelos atores envolvidos, resultando na reduo de conflitos, haja vista a insuficincia do conhecimento dos sistemas urbanos, existente entre os prprios

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    envolvidos na sua formatao, agregada s diversas variveis de difcil deteco e controle (PROJETODESIGN, 2001b).

    O comando dos sistemas urbanos somente assegurado caso os recursos pblicos sejam suficientes, mas isso no ocorre porque esses recursos so escassos e insuficientes. Portanto cabe aos municpios o papel de negociador desses processos integrantes do planejamento urbano e que ainda deve coadunar os interesses coletivos e particulares. (PROJETODESIGN, 2001c).

    A municipalidade com o uso do princpio educativo, no papel de negociador, deveria orientar a iniciativa e o investimento privado para o uso das reas vazias que possuam infra-estrutura, evidentemente com a oferta de garantias para a produo de habitao, como de financiamento e fiscais. Deveria, ento, ser possibilitado aos interessados, na ocupao, a rentabilidade mdia para esse tipo de produo. O processo de negociao somente resultaria em xito se houvesse o atendimento dos interesses das duas partes: iniciativa privada e administrao pblica (PROJETODESIGN, 2001d).

    Com o enfoque do uso do principio educativo, o vazio urbano passaria a ser visto como oportunidade, no mais como algo que por previso legal deva ser ocupado. Relevando, que no campo da negociao sejam respeitados os benefcios e nus resultantes do processo, o procedimento no tem que ser menos transparente, menos requalificador, menos positivo aos interesses coletivos e ao oramento pblico, ou seja, no haja no processo uma desobrigao das responsabilidades tanto da municipalidade como da iniciativa privada (PROJETODESIGN, 2001e).

    Nesse vis, o debate termina por ser remetido economia urbana, quando se constata que o resultado do procedimento da mediao do negcio internaliza as externalidades, as prprias medidas exigidas pelo sucesso que o negcio propem recuperam parte da mais-valia, criadas pelo capital fixo da cidade.

    Na viso do vazio urbano como oportunidade, estudos propem a realizao de mediao para uso desse espao:

    Para os excludos, um lugar onde viver; para os setores mdios, possibilidades de reas verdes, equipamento, recreao etc; para os que investem nas cidades, acesso terra para novos usos emergentes; para o Estado vendedor de terra, possibilidade de obter recursos num momento de ajuste fiscal; para a cidade como um todo, reserva para assegurar sua sustentabilidade e racionalidade do capital social incorporado no utilizado. (CLICHEVSKY, 1999e: p.347).

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    1.3. Estudo comparativo A complexidade do estudo dos vazios urbanos remete a situaes diferentes e

    definies operacionais distintas. As anlises que partem da convergncia na utilizao desses espaos urbanos, por ocasio da busca da individualidade do fenmeno, remetem a dimenses pontuais. Destacam-se estudos realizados na cidade de Lima, capital do Peru (tem cerca de 8,4 milhes de habitantes, o centro econmico e poltico do pas e o crescimento foi produto principalmente do xodo rural e migrao urbana) e na cidade brasileira do Rio de Janeiro, (tem cerca de 6.094.183 habitantes, a segunda maior cidade brasileira em populao). Curiosamente da anlise das situaes paradigmticas, da primeira cidade, resultou em aproveitamento para intervenes da segunda, como a urbanizao de favelas (CLICHEVSKY, 1999f).

    Outros aspectos determinantes apontam caractersticas diferentes na abordagem dos vazios urbanos, que so constatados pela anlise que foi extrada de estudos realizados sobre a temtica, a exemplo da sua conjectura de terras de engorda, realizada em Quito, Equador, (a populao estimada da cidade de 1.865.541, rea de aproximadamente 290 quilmetros quadrados), representadas por extensas reas vazias entremeadas com urbanizadas. Deve-se considerar que as reas desocupadas assumem significativa importncia na explicao sobre o desenvolvimento urbano da cidade e sobre os quais necessrio propor formas de gesto (CLICHEVSKY, 1999g).

    Em San Salvador, capital de El Salvador (2.224.223 milhes de habitantes), estudos mostraram uma dimenso diferente aos vazios urbanos, so caracterizados como "latentes", ou seja, lotes ocupados por numerosas edificaes antigas espera de demolio, em virtude do seu nvel de deteriorao e obsolescncia, no centro urbano (CLICHEVSKY, 1999h).

    Estabelecendo comparativo com as normas reguladoras encontradas em estudos realizados, destaca-se que, em Quito, Equador, existe legislao que prev sanes tributrias aos detentores de terrenos vazios. Por outro lado sua efetiva aplicabilidade fica comprometida pelo rol de excees existente, o tributo que penaliza os abusos, pelo seu baixo valor no obtm o efeito desejado. Portanto no h estmulo coercitivo suficientemente aos proprietrios para edificarem. Na cidade de Lima, Peru, o marco regulatrio sobre as questes do solo urbano extremamente frgil, h inclusive iseno para terras em processo de urbanizao e no existe no procedimento de parcelamento a obrigatoriedade de urbanizar.

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    Em estudo realizado pela Prefeitura Municipal de Campinas, Estado de So Paulo, em 1995, identificou-se a existncia de grandes extenses de reas no ocupadas, seja na forma de lotes urbanizados, mas desocupados, seja na forma de grandes glebas situadas na rea urbanizada. Estima-se que, do total da zona urbana do municpio, exista cerca de 40% de reas consideradas como vazios urbanos, circunscritas pelo permetro urbano, que abrange cerca de 50% da rea total do municpio.

    Esses fatores levam clandestinidade nas ocupaes, no detectada pela base cartogrfica oficial, mas assume um grau de importncia significativa no processo de produo do espao urbano. Define-se como clandestinidade, segundo Gasparini (1985), como um parcelamento, loteamento ou desmembramento a que o Poder Pblico compete examinar e, se for o caso, aprovar seu plano, mas dele no tem qualquer conhecimento oficial.

    1.4. Evoluo do estudo sobre vazios urbanos Clichevsky (1999i) destaca categoricamente que vazios urbanos so um tema que

    no tem despertado interesse nos pesquisadores e tampouco nos organismos de planejamento em nenhum nvel de governo. O pouco material disponvel resulta em dificuldade na coleta de informaes sobre a temtica, afora a falta de registros multifinalitrios atualizados para subsidiar estudos no setor. No Brasil, o fenmeno vazios urbanos tem sua importncia central definida pelas questes de poltica urbana e os seus dados existentes so escassos e frgeis.

    Percebe-se, em anlise aos estudos realizados sobre os vazios urbanos, que h convergncia no entendimento de que os terrenos vazios poderiam servir como abrigo parte da populao que no tem acesso terra urbana e mora em grande parte nas distantes periferias das cidades.

    Nota-se que a deduo pelo uso e ocupao dos terrenos vagos, pela populao menos favorecida, busca lastro na condio de que os vazios urbanos, nas mais diversas localidades, se constituem por uma porcentagem significativa das reas urbanizadas das cidades, estimada pelo Instituo Brasileiro de Geografia e Estatstica, censo 2000, em 50% das reas dos permetros urbanos. Essas propriedades no esto atendendo ao seu uso social, previsto pela Constituio Federal.

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    O trato dos vazios urbanos peculiar forma de crescimento da cidade, sua intensidade no homognea na representao do desenho urbano, sofre influncia na sua dinmica com relao aos tipos de proprietrios, na forma de uso e ocupao, na oscilao da demanda local, nas expectativas produtivas regionais e locais, em especial nas interferncias positivas de acessibilidade, como a construo de novas vias.

    A permanncia dos vazios urbanos no est exclusivamente atrelada s intervenes pblicas, em algumas localidades se identificam espaos desocupados h vrias dcadas, em outras, o fenmeno recente pela sua natureza cclica, medida que as cidades criam reas de expanso urbana, conseqentemente, no atual modelo, possibilitam o surgimento de reas novas de vazios urbanos.

    A expanso urbana sem o planejamento e anlise necessria, alm de permitir o avano do urbano sobre o rural, pode levar a situaes j identificadas em diversos estudos realizados, onde so criados novos espaos vazios, mas com escassas ou nulas condies urbano-ambientais para ocupao, em termos de infra-estrutura bsica, eroso, inundabilidade, risco ssmico e outras condies de acessibilidade.

    Essa situao se torna possvel quando as regras para converter terra rural em urbana so frgeis e permitem que as decises polticas e os interesses econmicos sobreponham os interesses coletivos, condio que depois de concretizada, torna-se difcil reverso, retorno ao status quo ante, pois depender de medidas que impossibilitem a ocupao ou obriguem ao empreendedor a realizao de grandes investimentos para adequar a sustentabilidade ambiental ao antrpica.

    Para aprofundamento do estudo sobre a temtica, cabe identificar os detentores dos vazios urbanos e as razes da reteno. Os agentes imobilirios (produtores da terra urbana), os pequenos proprietrios e posseiros, instituies diversas e o Estado so os detentores dos vazios urbanos. Quanto razo da reteno, ela est calcada na espera pela valorizao, determinante pela dinmica da acessibilidade, ou seja, a implantao da infra-estrutura e dos servios pblicos, com oramento da municipalidade, que valorizam as reas privadas.

    Porm, mesmo depois de os terrenos j se encontrarem em patamar elevado de preo, dentro do status restrito a uma parcela pequena da populao, eles continuam retidos, comportamento que vislumbra que as cidades podero ficar vazias por um horizonte temporal incerto.

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    Esse tipo de comportamento termina por empurrar as decises sobre o tema para o campo de implementaes de polticas pblicas de ordenamento urbano e territorial, as quais obriguem ao detentor dos vazios urbanos a utilizao do imvel, como o uso das ferramentas disponibilizadas pelo Estatuto da Cidade, diploma legal que ser amplamente discutido neste estudo e objeto de ttulo especfico, que o marco jurdico regulatrio do captulo de polticas urbanas da Constituio Federal.

    O fenmeno estudado tem caractersticas especficas e locais, necessrias para a sua descrio, classificao e anlise. Compreender onde esto localizados os vazios urbanos, sua dimenso, quem so os detentores desses espaos e a sua dinmica em relao ao crescimento da cidade essencial para o aprofundamento do debate temtico.

    Desta maneira, a racionalidade na ocupao dos vazios urbanos, pode constituir como oportunidade singular na distribuio do espao urbano de maneira mais eficiente e socialmente justa. O uso do Estatuto da cidade e aprovao dos Planos Diretores, paralelamente implantao de uma poltica habitacional que abarque as classes menos favorecidas e, portanto, redistributiva de renda e benefcios, possibilitar a melhoria da qualidade do ambiente construdo e da qualidade de vida da populao.

    Portanto, o estudo sobre os vazios urbanos serve para confirmar a importncia do seu papel no debate sobre as polticas pblicas urbanas, com abrangncia no seu planejamento e na sua gesto.

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    CAPTULO II: A OCUPAO DO SOLO E OS ELEMENTOS DA SUA DINMICA: ESPAO URBANO, PREO E URBANIZAO.

    2.1. Espao urbano

    Historicamente as cidades tiveram papel significativo nas relaes humanas, mas a sua marca profunda e definitiva emerge na civilizao contempornea. O crescimento urbano justificado principalmente pela migrao rural-urbana (SPOSITO, 2005b).

    Especificamente o fenmeno da diversidade espacial, objeto de demanda urbana e matria antagnica, com o reforo do paradigma de que a cidade para todos, deslocou as discusses para eixos mais amplos. As demandas esto sendo debatidas com o uso de canais participativos, a exemplo do Plano Diretor Participativo, possibilitando, assim, reunir, os construtores e os usurios (SOUZA, 1985).

    A complexidade e a amplitude do debate sobre o espao urbano emergem, tambm, por reflexo da sociedade. Isso possibilita a oportunidade para a realizao do estudo sobre esse tema dentro de uma variedade de linhas terico-metodolgicas, a busca dos processos de transformao da sociedade que ocorrem na cidade, em essncia objeto de qualquer cincia social (ABREU, 1994a).

    Estudos comentados, neste trabalho, com enfoque em cidade de porte mdio, demonstraram que o efeito imediato quando h implantao de polticas pblicas que afetam o mercado de solos, observada na variao da renda da terra urbana, com resultado imediato ou em potencial.

    O efeito da variao da renda da terra urbana se estende ao aumento ou a reduo da capacidade de apropriao privada sobre o lucro imobilirio. Como resultado desse processo, h um caminho natural para as divergncias, conflitos e contradies, pela prpria condio inerente ao Estado, no papel de indutor do crescimento urbano (CARLOS, 1994a).

    O espao urbano rene os interesses dos agentes privados, do poder pblico, dos movimentos sociais, como forma de resistncia contra a segregao do espao residencial, visto na abordagem deste estudo pelo vis do preo da terra e pelo direito cidade (CAVALCANTE, 1972a).

    O espao urbano convertido em lotes retidos para a especulao imobiliria se transforma em imensos vazios em meio regio central das cidades, normalmente dotados de infra-estrutura, sendo detectado na maioria das cidades brasileiras como causadores de efeitos no custo da cidade, conforme debate amplo neste estudo.

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    2.2. A dinmica espacial da cidade Ressalta Abreu (1994b) que o espao inerente existncia humana. O homem

    produz o espao por meio do trabalho. Portanto aprofundar o entendimento dessa relao perpassa pela histria e pelo desenvolvimento da sociedade, das foras produtivas, das relaes de produo e cultura. O espao no autnomo, est inter-relacionado sociedade, portanto concebido como materialidade social, tem no homem o sujeito da sua produo, razo pela qual a discusso deve ser procedida se levando em considerao a sociedade. O espao no simplesmente organizado pela sociedade, mas sim produzido por ela, por meio do trabalho.

    A cidade entendida por meio de um processo de interao espacial urbano e as suas relaes socioeconmicas, que forma um macro-sistema urbano desagregado, com suas atividades socioeconmicas complementares que iro definir os subsistemas urbanos (PALMA; KRAFTA, 2003b).

    A amplitude e diversidade do fenmeno urbano so elementos fundamentais da transformao na maneira de entend-lo e represent-lo. As solues espaciais no so mais definidas em termos da melhor escolha. Alm da busca que cada agente empreende na maximizao do benefcio pelo menor custo, so analisadas situaes mais adequadas quela realidade momentnea e local, considerado o histrico da posio comunitria (PALMA; KRAFTA, 2003c).

    A dinmica espacial que origina as cidades est representada pelo processo contnuo de alocao de formas construdas, espaos adaptados e atividades sociais sobre um determinado lcus. O ajuste espacial decorrente das foras, dos contrastes e dos privilgios, determinantes na diferenciao da maneira de ocupao, coordenadas pelos atores sociais, que agem sobre os elementos urbanos, ora provocando aglomerao de pessoas e concentrao de atividades, ora dispersando as pessoas e descentralizando as atividades, estabelecendo, assim, a cada ao de transformao, um novo mapa de acessibilidade com seu quadro de beneficirios (PALMA; KRAFTA, 2003d).

    Cavalcante (1972b) prope dois elementos de arranjo espacial. O primeiro considera o crescimento da populao no conjunto da periferia com a composio de sua origem, gnero, grau de instruo, atividade e a sua condio socioeconmica e a relao de dependncia com o centro. O segundo arranjo, considera as funes urbanas clssicas como a comercial, militar, industrial, de prestao de servios e administrativas, enquanto definio

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    de atividades e servios existentes no ncleo, que so responsveis pela relao entre o ncleo e as demais reas da cidade.

    No tratamento da dinmica espacial da cidade, sob a tica e perspectiva da economia urbana, os vazios urbanos so decorrentes de fatores estruturais e da apropriao da renda da terra urbana. Aos fatores estruturais se atribu a polarizao espacial inerente ao capital e a apropriao da renda da terra, pela reteno de pores do territrio pelo Estado ou por agentes privados. Essas condies justificam o crescimento da periferia, pela inacessibilidade ao solo urbano, principalmente nas reas centrais, pela prtica imobiliria de preos elevados.

    O contexto apresentado refora o padro centro-periferia, onde h o direcionamento dos recursos municipais, principalmente, para as reas centrais, que so providas dos equipamentos pblicos, o que resulta, por conseguinte, na marginalizao das camadas sociais que vivem na periferia, s margens do processo. Pela prpria natureza da falta de polticas efetivas de controle do solo, as cidades, sob essa perspectiva, crescem em funo dos interesses da maximizao de lucro dos agentes privados e no a partir dos interesses coletivos (ABREU, 1994c).

    O fenmeno espacial urbano perpassa pelo conceito da acessibilidade, como princpio geral, em face de todo ordenamento espacial atuar casualmente nas localizaes mais acessveis. As ocupaes mais intensivas e as atividades mais competitivas constroem gradientes decrescentes centro-periferia (PALMA; KRAFTA, 2003e).

    O crescimento urbano tem como caracterstica a criao das vias de circulao irradiadas a partir de um ncleo central. Nesses traados que so organizadas as redes de transporte que direcionam a expanso urbana. A cidade se amplia nas proximidades das vias destinadas rede de transporte, pela prpria acessibilidade (FAISSOL, 1973).

    2.3. Mercado imobilirio e o valor do solo urbano

    Pelo foco deste estudo, a temtica fundiria e valor imobilirio mereceram abordagem em face da discusso sobre os problemas urbanos convergirem para a contradio decorrente de modificaes imposta pela sociedade e imprimida no espao geogrfico. Essas modificaes esto relacionadas produo e reproduo do espao, que na realidade, ocorrem, pelo fato do espao urbano se vincular a compra ou aluguel do pedao de terra com a finalidade de uso para a moradia (OLIVEIRA, 1978a).

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    A produo e reproduo do espao se vinculam a fatores sociais, habitao e ao prprio pedao de terra, que assumem papel preponderante na reproduo do homem, haja vista, que a sociedade estabelece o abrigo como um smbolo de status e de ascenso social, devido agregar valor de troca. Portanto, a valorizao da terra e a sua interferncia na relao da ocupao espacial, representada pela dinmica da periferizao urbana, d-se essencialmente devido a esse aspecto.

    Nesse vis e considerando que a questo central do debate se estabelece a partir da falta de acesso a terra com infra-estrutura, em virtude do seu elevado preo, no se pode deixar de trazer colao o fato da unidade espao-sociedade reproduzir a desigualdade materializada, pela diviso do trabalho, entre as parcelas do espao e em cada uma delas. Ao analisar o espao como fruto dessa reproduo, considerando o processo de acumulao e a centralizao da propriedade e do poder, detecta-se que a desigualdade se estrutura a partir da relao do domnio econmico (OLIVEIRA, 1978b).

    A produo e reproduo do espao urbano se desenvolvem em meio a constantes conflitos de interesses entre os atores sociais. Se por um lado os proprietrios dos meios de produo, os proprietrios fundirios, os promotores imobilirios e o Estado atuam no sentido da obteno de maior renda das suas propriedades, que resulta na maximizao dos seus lucros, por outro lado os grupos sociais excludos querem seu espao digno no contexto urbano, que lhe negado pela elevada valorizao do espao urbanizado. Dessa maneira os detentores do meio de produo obtm o pice dos seus lucros imobilirios na converso de terra rural em urbana, considerando que o uso do solo urbano mais remunerador e pela considervel valorizao da terra na simples transformao de rural para urbano (CORRA, 1995a).

    Devido a esse contexto e com foco na maximizao dos lucros imobilirios, os proprietrios fundirios com o uso da influncia e do poder pressionam a municipalidade, procurando intervir nas questes locais de uso e ocupao do solo, do zoneamento urbano e outros aspectos primordiais na urbanizao das cidades (CORRA, 1995b).

    A expresso espacial do sistema de produo gerado pelo crescimento da cidade, no modelo latino-americano, denota entre suas contradies as disparidades espaciais, que so vistas como produtos e tidas como condio essencial para o desenvolvimento da cidade.

    De maneira ampla, a questo do uso do solo emerge no limiar dos interesses entre o mercado imobilirio e coletividade. O conflito inerente desse processo se configura pelas relaes sociais que permitem aos detentores do capital, de maneira concreta, a ascenso por

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    meio da propriedade, que lhe d poder e direito ao uso da matria trabalho (OLIVEIRA, 1978c).

    O uso do solo e das suas benfeitorias na economia urbana tem a conotao mercadolgica, portanto no acessvel a todos, haja vista que a atribuio dos valores de uso no imposta pela pura soberania do consumidor, mas vem refletida dos seus hbitos culturais, das suas necessidades sociais, do prprio estilo de vida e de outros aspectos. Assim o debate do uso e ocupao do solo urbano, no sentido estrito, deveria seguir a teoria do valor, que fundamenta especificamente valor de uso e valor de troca (OLIVEIRA, 1978d).

    salutar apontar entre diversos aspectos relevantes, que emergem do debate, aquele que converge diretamente para a proposta deste estudo, consubstanciando pela dinmica do preo praticado pelo mercado imobilirio, que a dialtica representada pela busca do acesso terra urbana com infra-estrutura e na sua contraposio a especulao imobiliria. Ressalta-se, portanto, que agregado a outros fatores, tambm primordiais, este o parmetro para a compreenso da presena de extensas regies vazias encontradas nas cidades, principalmente, as dos pases do bloco latino-americano.

    A amplitude desse processo dialtico desgua no mercado imobilirio, que a ligao determinante para o acesso propriedade privada. A especulao imobiliria o principal aspecto gerador da segregao, principalmente entre as classes de maior e de menor renda. So identificadas condies pontuais nesse processo como: a renda associada ao lugar de moradia (determinada pelo preo da terra); local de moradia associado ao acesso infra-estrutura; e local de moradia associado ao acesso ao trabalho (OLIVEIRA, 1978e).

    O mecanismo desenvolvido para o avano da mancha urbana e a valorizao da terra, por meio da apropriao da renda da terra pelos seus proprietrios, a criao de novas reas, que em alguns casos, embora regulares, no apresentem condies dignas para a habitao, ou seja, em locais sem qualquer infra-estrutura bsica, que resultam em srios problemas sociais. A contrapartida no processo baixo investimento nesses empreendimentos, que obviamente geram elevados lucros imobilirios aos proprietrios das glebas loteadas.

    O processo calcado na reserva de reas para especulao imobiliria origina os vazios urbanos, a ao de reteno praticada tanto pelos loteadores como pelas famlias compradoras desses lotes urbanos, que ficam aguardando a interveno da municipalidade, normalmente resultante da presso dos moradores locais, para a implantao da infra-estrutura bsica e equipamentos pblicos (CARLOS, 1994b).

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    Nessa linha de pensamento, a necessidade de produzir espao vai ao encontro da especulao dos vazios urbanos. Um dos exemplos mais comuns de produo privada de espao urbano o loteamento. A poltica utilizada para a implantao desses empreendimentos claramente favorece a especulao imobiliria e, por conseguinte, origina os vazios urbanos.

    Para melhor entendimento do tema, pontua-se que historicamente o desmembramento do solo foi identificado em 1789, ps-revoluo francesa, em face da venda de grandes propriedades da aristocracia e do clero e pela derrogao dos direitos fundirios da nobreza e dos municpios. Com essa apropriao, o monoplio passa para a propriedade privada, e o terreno adquire status de produto, sua comercializao se torna em pouco tempo objeto de especulao, especialmente pela valorizao decorrente da revoluo industrial (CARLOS, 1994c).

    De maneira geral as vendas de lotes urbanos, que so originalmente realizadas em funo da ideologia da casa prpria para a classe trabalhadora, revelam surpresas, quanto s promessas realizadas, por ocasio da compra. Constata-se na ocasio da posse do lote que as promessas, na maioria das vezes, no so cumpridas. O adquirente percebe que alm da inexistncia da infra-estrutura prometida, se no lutar para a soluo do problema, no ver ele solucionado em curto prazo (CARLOS, 1994d).

    Resultante do processo de presso popular, a infra-estrutura chega a esses loteamentos, regra geral, por implantao pelo Estado, e os benefcios gerados pela valorizao local (mais-valia) ficam para os empreendedores e famlias que adquiriram e retiveram lotes com finalidade especulativa. Dessa maneira, alm de verem os seus lotes valorizados, certamente o procedimento agregar valores indiretos as suas reservas (CARLOS, 1994e).

    Aps o debate sobre os valores que so agregados ao preo da terra, a reteno fundiria e especulao imobiliria, cabe a discutir a formao do preo da terra urbana e por sua relativa complexidade, requer-se delimitar a questo da dinmica espacial na dimenso do mercado imobilirio. Nesse sentido, verifica-se que um lote nico, no possvel reproduzir outro semelhante, mesmo em localizaes iguais, portanto a parcela de terra preserva algum grau de monoplio.

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    A localizao de um lote prope determinado valor pelo uso da terra, que o mercado imobilirio transforma em preo da terra. Dessa maneira, os lotes tm preos diferentes por razo de ter valores diferentes e no devido produo de rendas diferentes (VILLAA, 1998b).

    Nesse sentido, o valor do solo urbano produto da articulao da localizao do lote urbano em relao totalidade da cidade (SANTOS, 2005a). Esclarece Villaa (1998c) que o preo da terra tem dois componentes. O primeiro decorre do seu preo de produo, e o segundo o seu preo de monoplio, traduzido por sua unicidade.

    O debate sobre a formao do preo da terra leva importante reflexo de que o desenvolvimento urbano interfere diretamente na dinmica da diviso espacial. Essa interferncia pode ser detectada no aspecto relacionado manifestao de valores atribuda s parcelas divididas, que replicam os efeitos, por conseguinte, nos processos econmicos, nos aspectos polticos e sociais da localidade (SANTOS, 2005b).

    Destaca-se no debate sobre o preo da terra a relao entre a centralidade e a periferia. No centro, decorrida a estabilizao da cidade, a elevao de preo, em termos proporcionais, menos acentuada do que na periferia, justificada pelo forte apelo expansivo e maior demanda pelo espao urbano, mesmo com a precariedade de infra-estrutura normalmente detectados nestas localidades (ACIOLY; DAVIDSON, 1998a).

    Em estudo que reproduziu os preos de solo urbano, das maiores cidades italianas, no perodo de 1965 a 1975, considerando as faixas urbanas determinadas pelo centro, semi-centro e periferia, detectou-se que os aumentos proporcionalmente dos preos so acentuados na periferia, pelas razes j especificadas. Constatou-se que na zona central e semi-central, embora os valores do solo sejam elevados, apresentam no histrico estabelecido pela relao temporal de 10 anos, proposto pelo estudo, pequena oscilao (ACIOLY; DAVIDSON, 1998b).

    O debate tem merecido sustentao sob diversos pontos de vista, um deles o econmico. Segundo Chapin (1977), o solo urbano pode ser considerado com um bem durvel, pois comercializvel, gera rendas, est sujeito s foras da oferta e demanda e o seu valor de uso determinado pelo mercado imobilirio.

    Tambm, sob o ponto de vista econmico, ao se referir ao mercado de solo urbano, Sposito (2005a), afirma que o fator determinante para o acesso moradia a capacidade de pagar, no se aplicando a esse mercado o conceito econmico da oferta e da procura. O autor incisivo na deduo de que o simples aumento da oferta no determinante para o problema

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    da acessibilidade da terra, haja vista que o salrio da populao em geral no possibilita a compra ou aluguel de imveis.

    No Brasil, especialmente, at pelo dficit habitacional estar instalado na populao de baixa renda, faixa de at trs salrios mnimos, e devido manuteno do atual modelo latino-americano de crescimento das cidades, a populao de baixa renda, independentemente do aumento de oferta, ficar margem, sem a possibilidade do acesso a terra, principalmente a urbanizada.

    Em sentido contrrio a esse entendimento, Diefenbach (1995a) defende que o preo do solo urbano no pode ser visto apenas sob o ponto de vista econmico. Argumenta que a valorizao do solo no depende somente das foras da oferta e demanda, mas est condicionada essencialmente funcionalidade, potencialidade e localidade. Considera no contexto subsidiariamente as externalidades proporcionadas por servios pblicos urbanos, os meios de consumo coletivo e, sobretudo, as aes polticas propostas pela municipalidade.

    Ainda, com o intuito de fortalecer o debate, afirma Martin (1984) que o preo da terra urbana emerge como resultado da sua renda. Para elucidar a questo, afirma que no ciclo econmico so fixados inicialmente os preos das mercadorias produzidas, evidentemente com base no valor nelas contidas, entre eles o custo de produo. No mercado, a funo oferta-demanda e a concorrncia entre os capitalistas que estabelecero o preo, portanto desse processo que emerge a parcela de lucro.

    Entende o autor, em questo, que do estabelecimento do preo da terra urbana emerge o resultado da renda proporcionada ao seu proprietrio, pelo seu possvel uso, recorrente de o fato de o capital adquirir a terra-mercadoria. A questo central a ser debatida que a terra nesse processo que deveria ser considerada como meio de produo, equivale ao capital. O autor conclui que a renda capitalista da terra no nasce da produo, mas da distribuio da mais-valia.

    A renda da terra urbana tem como base o poder monopolista, determinado pela apropriao privada ou pblica de determinadas pores de terra, que so retidas pelos atores sociais com objetivo de aumentar o seu fluxo de renda, tambm pelo controle exclusivo sobre alguns itens relativos a essas pores de terra, direto ou indireto, como a possibilidade futura da comercializao com a apropriao integral da renda resultante do poder monopolista. Na verdade, no h comercializao da terra, do recurso natural ou do local de qualidade singular, mas da mercadoria ou do servio produzido por meio do seu uso (HARVEY, 2005).

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    O debate acerca do valor da terra urbana tem como centralidade questes relacionadas: sua atratividade, pelos diferentes usos do solo; sua titularidade, pela regularizao fundiria; acessibilidade e dotao de infra-estrutura, atributos que interferem, de maneira direta e substancial no valor do solo. Outros fatores especficos do parcelamento, como a sua localizao e as externalidades, so elementos que pela sua dinmica, ao interagirem, provocam efeitos diferenciados sobre a parcela de terra, sobre o seu uso e conseqentemente sobre o seu valor de mercado (DIEFENBACH, 1995b).

    Em relao ao debate sobre a renda da terra urbana no se pode deixar de citar a posio defendida por Carlos (1994f) que estabelece a formao do preo da terra pela determinao da renda fundiria, em relao taxa de lucro que ocorre durante o ciclo econmico. A terra em si no tem valor, mas sim o seu uso, quando a taxa de juro cai, h elevao do preo da terra o que provoca um aumento das expectativas relativas valorizao futura, considerada a origem dos vazios urbanos, pelo estabelecimento de reservas e pelo aumento de expectativas de valorizao. Esse diferencial computado como se fosse uma renda, ou seja, a quarta renda.

    Outro aspecto importante da abordagem do estudo o avano do urbano sobre o rural, que provoca o crescimento da mancha urbana e se d a partir da valorizao e do parcelamento da terra. O processo se d com a eliminao das atividades rurais ao entorno da cidade, que so substitudas por reas loteadas, trazendo as camadas mais pobres da populao para essas regies, influenciando sobremaneira no desenvolvimento urbano, normalmente rarefeito pelas vastas reas vazias dentro da mancha urbana, que so utilizadas como reserva de valor (CARLOS, 1994g).

    A acessibilidade a essas reas loteadas pela populao de baixa renda pode ser verificada em face dos valores praticados na venda dos lotes, sempre abaixo dos praticados nas regies centrais, decorrente do baixo investimento pela falta de implantao de infra-estrutura (embora sempre prometida na ocasio da venda, normalmente no implantada) e pela possibilidade da autoconstruo (pela ineficincia dos rgos fiscalizadores na conteno deste efeito) (CARLOS, 1994h).

    Segundo Carlos (1994i), as incurses nesses locais demonstram esse fenmeno, a paisagem denota algo inacabado, as construes propem a falta de uma condio definitiva, acabada. Embora regulares muitos desses loteamentos no esto inseridos na lei de uso e ocupao do solo e no constam da planta de valores genricos da prefeitura, outros sequer constam na carta municipal oficial.

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    Em se tratando especificamente do mercado de solo urbano, pode-se afirmar que possui oscilaes importantes, principalmente quando comparado com a sua prtica na Europa e nos pases norte-americanos, em relao aos pases latino-americanos. Smolka (2003a) mostra em estudo realizado, que o metro quadrado de terrenos na periferia de cidades norte-americanas tem um intervalo de US$ 28 a US$ 145, nas cidades alems a variao de US$ 61 a US$ 124. Finalmente se verifica que nas cidades latino-americanas, essa variao vai de US$ 32 ao surpreendente US$ 172. Evidente, h de se considerar, ainda, que os rendimentos da populao nas cidades norte-americanas so de sete a dez vezes maiores aos da populao latino-americana.

    Smolka (2003b) afirma que o cidado norte-americano com o salrio mnimo de aproximadamente US$ 950 poderia comprar de sete metros quadrados a trinta e quatro metros quadrados, na periferia de Boston (Estados Unidos da Amrica), enquanto na cidade de Palmas, Estado do Tocantins, poderia comprar apenas de oitenta centmetros quadrados a quatro metros quadrados.

    Considerando o salrio mnimo brasileiro da poca do estudo de US$ 130, concluiu que seriam necessrios de doze a quinze anos de trabalho para uma famlia, com renda mdia de trs salrios mnimos, adquirir um terreno urbanizado padro de duzentos metros quadrados, no Brasil (SMOLKA, 2003c).

    2.4. Espao e periferia

    Embora a segregao espacial assuma um forte carter social, a sua relao com o custo da cidade preponderante, haja vista que o deslocamento para a periferia, tanto da classe favorecida quanto do pobre, repercute substancialmente no oramento do municpio, seno para prover a infra-estrutura no local da ocupao, dever possibilitar o acesso a essas novas localidades.

    De qualquer maneira o debate sobre o mercado de solo urbano remete discusso para a questo da urbanizao perifrica. Embora inicialmente fortemente evidenciada pela segregao da baixa renda, na literatura se apresenta com duas formas de ocupao, especificamente para uso residencial, a urbanizao de status e a urbanizao popular.

    A urbanizao de status caracterizada por terras bem localizadas e valorizadas por amenidades fsicas, naturais ou socialmente produzidas, que se transformam em bairros seletivos, dotados de infra-estrutura, que em parte so levadas pela municipalidade, por meio da presso exercida pelos proprietrios (CORRA, 1995c).

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    A urbanizao popular se caracteriza por serem implantadas em terrenos mal localizados, ou seja, em periferias sem amenidades, com inmeros registros de agresso ao meio ambiente natural, alm de esses loteamentos terem a finalidade de extrair renda da terra, o que resulta em infra-estrutura mnima, em muitos casos, sem nenhuma, mesmo porque

    muitos loteadores no cumprem as leis que regulamentam o uso e parcelamento do solo (CORRA, 1995d).

    Esses empreendimentos so destinados populao de baixa renda sendo a habitao construda ora pelo Estado, ora pelo sistema de autoconstruo. O Estado, ao intervir nesse processo com mecanismos assistencialistas, cria ou ratifica a segregao residencial (CORRA, 1995e).

    A segregao um processo pelo qual h concentrao em pontos geogrficos de classes ou camadas sociais, sendo o mais conhecido tipo de segregao na Amrica Latina a do centro-periferia. Desta maneira, a regio central da cidade dotados de servios urbanos, pblicos e privados, ocupada pelos grupos de alta renda e a periferia ocupada predominantemente pelos excludos, que vivem em locais longnquos sem dotao de infra-estrutura bsica, considerado assim, o espao, como mecanismo de excluso (VILLAA, 1998d).

    A segregao residencial, produto da existncia de classes sociais, remonta sua origem do prprio aparecimento das cidades, na realidade, origina-se do processo de organizao social em reas. Os grupos com renda mais elevada residem em imveis caros, nos locais nobres da cidade, e os de baixa renda, em locais afastados sem infra-estrutura e muitas vezes em condies precrias. O sintoma apontado para a inacessibilidade do grupo de baixa renda aos locais com melhores condies atribudo prpria falta de renda, atribuda grande parte da populao. Mas outros fatores correlatos no podem ser abandonados, haja vista, que eles so tambm inerentes ao processo, como: doenas, subemprego, baixo nvel de escolaridade, desemprego, emprego mal remunerado, entre outros (CORRA, 1995f).

    Na criao da cidade, o Estado pode intervir como agente modelador do espao urbano, por meio do planejamento, com o estabelecimento de ncleos urbanos. A tradio latino-americana remonta o modelo das cidades do sculo XVI, descrito por Hasen (1979), como padro tpico da cidade brasileira, com os pobres na periferia, evidenciando o crescimento centro-periferia.

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    A cidade foi planejada em torno de uma praa central. Os quatros quarteires que a delimitam foram reservados para a catedral, os edifcios dos governos provincial e municipal e a residncia do chefe dos conquistadores. Aos outros espanhis foram cedidos lotes dentro de dois ou trs quarteires, em cada direo. Esta rea espanhola de residncia constitui o centro. A uma distncia maior, na direo do exterior, e deixando espao para a expanso deste centro, foram reservadas reas nas quais os ndios podiam estabelecer-se. Estas reas constituram barrios. medida que a cidade crescia, o centro foi absorvendo os barrios e os ndios foram se mudando para mais alm. medida que estes aumentavam em nmero, a rea que ocupavam ia se tornando maior. Mas o crescimento prosseguiu vagarosamente em harmonia com a estrutura social e cultural estabelecida (HASEN, 1979. p.497)

    O Estado no tem demonstrado imparcialidade ao planejar seus investimentos e cedidos a presses das classes dominantes, escolhe as localidades intra-urbanas onde esto os seguimentos mais abastados, ou podero ser vendidos e ocupados por eles, afinal preciso valorizar as reas, em detrimento aos locais onde esto instaladas as comunidades pobres, mais afastados. Nesse processo so gerados os espaos vazios com fins especulativos, alm de o tecido urbano crescer para a periferia, pela excessiva valorizao das regies mais centralizadas (SPOSITO, 1992).

    As caractersticas que reproduzem essa realidade se retro-reproduzem, alm do seu crescimento sistmico em face do prprio crescimento urbano. Nessa ampliao complexa, encontramos identificaes comuns para problemas como: as cidades so grandes devido especulao, ou vice-versa; h especulao devido aos vazios urbanos, ou vice-versa; h vazios urbanos, porque as cidades so grandes, ou vice-versa. Destaca-se tambm como parte desse processo que o modelo rodovirio urbano fator de crescimento disperso e do espraiamento da cidade (SANTOS, 2005c).

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    CAPTULO III: DESENHO URBANO, DENSIDADE E O CUSTO DE URBANIZAO.

    3.1. Desenho urbano

    A abordagem do desenho urbano, no contexto deste estudo, serve para respaldar o debate sobre a expanso desordenada das cidades. Como evidenciado na seqncia do texto, o tratamento do assunto no tem o carter meramente tcnico. Por sua amplitude e pela proximidade ao debate sobre o planejamento urbano, a discusso assume importante papel para o estabelecimento de uma viso sistmica espacial das cidades.

    Relacionado com a maximizao da qualidade de vida no uso dos espaos pblicos, levando-se em conta tanto o aspecto fsico e o scio-cultural, aparece na dcada de cinqenta o termo desenho urbano. No desmembramento do termo, o urbano retrata a cidade, com abrangncia de todo o seu espao, enquanto o termo desenho retrata efetivamente a produo e organizao dos espaos (CARMONA et al., 2003a).

    Contextualizando, o desenho urbano contemporneo, na busca da criao de espaos urbanos de sucesso, inserido na dinmica da cidade em razo da sua diversidade de atividades, no tem a preocupao com a formulao de espaos somente enquanto entidades estticas, mas tambm se preocupa com a relao comportamental no interior dos espaos criados e com a dimenso da sua interveno na produo dos espaos.

    A noo de desenho urbano pressupe um caminho para cidades mais seguras e humanas, por meio da produo e incluso social dos espaos urbanos de maneira participativa. Existe uma relao estabelecida entre a formulao de idias, conceitos e projetos com as diretrizes de interveno e gesto do espao urbano, contemplados pelos princpios do planejamento participativo, que so normalmente estabelecidos em normas legais.

    nesse vis que acontece a busca da identidade espacial, em que a atitude comportamental do indivduo transcende o sentimento da propriedade privada individualizada e passa a ter um sentimento de comprometimento com o espao em que vive. Enfim, a comunidade se sente responsvel e se orgulha por conviver em determinado espao. Esse sentimento de propriedade adquirido quando existe uma clara delimitao espacial entre os espaos pblicos, semipblicos e privados (ZELINKA; BRENNAN, 2001).

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    O desenho urbano no est atrelado somente esttica, ele tem a amplitude e abraa todo o espao urbano, inclusive abrange os aspectos de gesto e manuteno. Contemporaneamente considerado como um processo de identificao das solues para estabelecer qualidade espacial cidade, tanto no aspecto fsico como no scio-cultural, ou seja, responsvel em fazer lugares para pessoas aproveit-los e us-los (CARMONA et al., 2003b).

    Destarte, desenho urbano uma atividade de planejamento, cujos objetivos se reportam qualidade fsico-ambiental das cidades. Del Rio (1990a) define desenho urbano como o campo disciplinar que trata a dimenso fsico-ambiental da cidade, enquanto conjunto de sistemas fsico-espaciais e sistemas de atividades que interagem com a populao por meio de suas vivncias, percepes e aes cotidianas.

    Figura 1- Esquema representativo de formao do sentido dos lugares, na confluncia das dimenses fsica, comportamental e de percepes, sugerido por David CANTER.

    Fonte: (DEL RIO, 1990. p.70)

    Assim, desenho urbano um processo integrado ao planejamento que tem como meta principal a promoo da qualidade