Upload
vophuc
View
220
Download
1
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE VETERINÁRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA – CLÍNICA E REPRODUÇÃO ANIMAL
GUILHERME MARQUES SOARES
AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES
NITERÓI 2010
II
GUILHERME MARQUES SOARES
AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor. Área de Concentração: Clínica e Reprodução Animal.
Orientadores: Profª. Dra. RITA LEAL PAIXÃO Prof. Dr. JOÃO TELHADO PEREIRA
NITERÓI 2010
III
S676 Soares, Guilherme Marques
Avaliação de fatores de influência na
manifestação da agressividade em cães/ Guilherme
Marques Soares; orientadora Rita Leal Paixão. —
2010.
96 f.
Tese (Doutorado em Clínica e Reprodução Animal)-
Universidade Federal Fluminense, 2010.
Orientadora: Rita Leal Paixão
1.Comportamento animal. 2. Cão. 3.Comportamento
agressivo. 4. Bem-estar do animal. I. Título.
CDD 156
III
GUILHERME MARQUES SOARES
AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor. Área de Concentração: Clínica e Reprodução Animal.
Apresentada em 04 de novembro de 2010.
BANCA EXAMINADORA
PROFª. DRA. NORMA VOLLMER LABARTHE – UFF / FIOCRUZ
PROF. DR. JOSÉ MÁRIO D’ALMEIDA - UFF
PROF. DR. PROF RICARDO TADEU SANTORI – UERJ
PROF. DR. MAURO LANTZMAN – PUC-SP
PROFª. DRA. RITA LEAL PAIXÃO – UFF
NITERÓI 2010
IV
Patrícia, Lia e Ana, dedico a vocês não só esta tese, mas toda a minha vida. Amo vocês.
V
AGRADECIMENTOS
Aos meus orientadores, pessoas íntegras, éticas e de uma inteligência impar, por me ensinarem a cada dia o que é ser pesquisador.
À minha família, alicerce da minha vida, por todo apoio e incentivo que sempre me deram, desde o jardim da infância até hoje.
À minha esposa, pelo companheirismo, amor e paciência que tem comigo.
Às minhas filhas que, sem a menor noção disso, me incentivam a melhorar e me aprimorar como ser humano, como pai e como profissional.
Ao professor James Serpell e à Escola de Medicina Veterinária da Universidade da Pensilvânia, por nos ter permitido o uso do C-BARQ em nossa pesquisa.
A todos os criadores que permitiram a realização dos testes em seus canis.
Aos alunos da Faculdade de Medicina Veterinária da UFF que contribuíram aplicando os questionários.
A todos aqueles que muito generosamente responderam os questionários e testes psicológicos.
A Profª. Dra. Vilma Aparecida da Silva que tornou possível a realização dos testes psicológicos dos proprietários dos cães.
E principalmente a Deus que, com seu imenso amor, colocou toda essa gente bacana no meu caminho.
VI
"Um misantropo sentimental engendrou este aforismo que muitas vezes se repete maquinalmente: quanto mais conheço os homens, mais gosto do meu cão. Eu afirmo a inversa: quem conhece verdadeiramente os animais, inclusive os animais superiores, os que nos são mais próximos, e possui uma certa compreensão da evolução filogenética, é por isso mesmo capaz de compreender plenamente o caráter único dos homens." (Konrad Lorenz)
VII
“Vós sois o sal da terra. Se o sal perde o sabor, com que lhe será restituído o sabor? Para nada mais serve senão para ser lançado fora e calcado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre uma montanha nem se acende uma luz para colocá-la debaixo do alqueire, mas sim para colocá-la sobre o candeeiro, a fim de que brilhe a todos os que estão em casa. Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus”. (Mt 5, 13-16)
VIII
RESUMO
A agressividade canina é um tema importante, pois, além de ser um problema de saúde pública, interfere na qualidade de vida de cães, proprietários e profissionais que lidam com esses cães. No capítulo I desta tese, objetivou-se estimar o impacto do problema nas unidades de atendimento clínico do Brasil. Para tal, foi feito um inquérito com médicos veterinários, através de um questionário enviado a todas as escolas de veterinária que possuíam unidades de atendimento no país. As agressões foram a segunda queixa comportamental mais frequente e a primeira indicação para abandono ou eutanásia. Mas, o que leva um cão a manifestar a agressividade? Para responder essa pergunta, outros quatro estudos foram realizados. No capitulo II, foi feita uma revisão sistemática de literatura para ver o que há publicado sobre a associação entre raça e agressividade. Com os trabalhos publicados de 1997 a março de 2009 não foi possível confirmar tal associação. No capítulo III, filhotes de seis a oito semanas, de cinco raças (Bull Terrier, Cocker Spaniel Inglês, Retriever do Labrador, Pit Bull e Rottweiler), foram submetidos ao Teste de Campbell, a fim de avaliar seus padrões de dominância e compará-los entre as raças. Concluiu-se que os cães das raças Rottweiler e Bull Terrier tiveram escores mais compatíveis com independência. No capítulo IV, os perfis dos compradores dos filhotes testados no capítulo III foram traçados com o auxílio de dois testes psicológicos, o Questionário de Agressividade e o Inventário Multifásico de Personalidade Minessota. Concluiu-se que as pessoas que compraram cães das raças Labrador e Cocker Spaniel Inglês apresentaram maiores pontuações na escala para Hostilidade do Questionário de Agressividade, comparados àqueles que compraram Rottweiler e Bull Terrier. No quinto capítulo foram correlacionados perfis de agressividade de proprietários e itens de manejo com padrões de agressividade dos cães. As comparações foram feitas usando o mesmo Questionário de Agressividade do capítulo IV para os proprietários e um questionário validado para identificação dos problemas de agressividade e medo dos cães. Concluiu-se que a agressividade física do proprietário tem uma correlação inversa com a agressividade canina direcionada a cães familiares e também que o fato de o proprietário permitir que o cão o guie se correlacionou com maior agressividade contra o proprietário. Os resultados encontrados nos cinco capítulos desta tese reforçam a ideia de que a manifestação da agressividade canina tem múltiplas causas que vão desde a raça até a personalidade do proprietário e de como este conduz a criação, a socialização e a educação de seu cão. Palavras-Chave: agressividade, comportamento canino, cães, bem-estar animal.
IX
ABSTRACT
The Dog’s Aggression is an important issue because, besides being a public health problem, interfering with quality of life of dogs, owners, and professionals dealing with these dogs. In Chapter I of this thesis aimed to estimate the impact of the problem in veterinary care units in Brazil. To this end, a survey was done with veterinarians, through a questionnaire sent to all schools of veterinary medicine that had the clinics in the country. The aggressions were the second most common behavioral complaint, and the first indication for abandonment or euthanasia. But, what takes a dog to be aggressive? To answer that question, four other studies were conducted. In Chapter II, there was a systematic literature review to see what is published on the association between breed and aggression. With articles published from 1997 to March 2009 was not possible to confirm this association. In Chapter III, pups from six to eight weeks, five breeds (Bull Terrier, English Cocker Spaniel, Labrador Retriever, Pit Bull and Rottweiler), underwent the Campbell test, to assess their patterns of dominance and compare them between breeds. It was concluded that the Rottweilers and Bull Terriers scored more compatible with independence. In chapter IV, the profiles of buyers of pups tested in chapter III were traced with the help of two psychological tests, the Aggression Questionnaire and the Minnesota Multiphasic Personality Inventory. It was concluded that people who bought Labradors and English Cocker Spaniels had higher scores on a hostility scale, compared to those who bought Rottweiler and Bull Terrier. In the fifth chapter, the aggression profiles of owners and management items were correlated with patterns of aggression in dogs. Comparisons were made using the same Aggression Questionnaire for the owners and a validated questionnaire to identify the problems of aggression and fear of dogs. It was concluded that the owner’s physical aggressiveness has an inverse correlation with canine aggression directed to family dogs and also the fact that the owner let the dog guide was correlated with increased aggressiveness against the owner. The results in the five chapters of this thesis reinforce the idea that the expression of canine aggression has numerous causes ranging from the breed until the owner's personality and how this leads to creation, socialization and education of your dog. Key words: aggressiveness, canine behavior, dog, animal welfare.
0
SUMÁRIO Resumo, p. VIII
Abstract, p. IX
1- Introdução, p. 1
2- Fundamentação Teórica, p. 3
2.1- Fatores que influenciam na manifestação da agressividade em cães, p. 5
2.1.1- Sexo, p. 5
2.1.2- Ambiente social e manejo, p. 6
2.1.3- Agressões por dominância, p. 9
2.1.4- Doenças, p. 11
2.2- Medidas preventivas, p. 12
3- Justificativas e objetivos, p. 15
3.1- Justificativas, p. 15
3.2- Objetivo geral, p. 15
3.3- Objetivos específicos, p. 15
3.4- Metas, p. 16
4- Desenvolvimento, p. 17
4.1- Capítulo I – Epidemiologia de problemas comportamentais em cães no Brasil: inquérito
com médicos veterinários, p. 17
4.1.1- Introdução, p. 17
4.1.2- Material e métodos, p. 18
4.1.3- Resultados, p. 19
4.1.4- Discussão, p. 22
4.1.5- Conclusão, p. 24
4.2- Capítulo II – Associação entre raça e agressividade em cães: revisão sistemática, p. 25
4.2.1 – Introdução, p. 25
4.2.1.1- Associação entre genética e comportamento, p. 25
4.2.2- Material e métodos, p. 28
4.2.3- Resultados, p. 29
4.2.3.1- Quanto ao desenho metodológico dos artigos, p. 29
4.2.3.2- Quanto às raças mais agressivas, p. 30
4.2.4- Discussão, p. 31
4.2.5- Conclusão, p. 32
4.3 - Capítulo III – Comparação do comportamento dominante de filhotes de cães de cinco
raças, p. 36
4.3.1 – Introdução, p. 36
4.3.2 – Material e métodos, p. 36
4.3.3 – Resultados, p. 39
4.3.4 – Discussão, p. 41
4.3.5 – Conclusão, p. 43
1
4.4 - Capítulo IV – Perfil dos compradores de filhotes de quatro raças, p. 44
4.4.1 – Introdução, p. 44
4.4.2 – Material e métodos, p. 45
4.4.3 – Resultados, p. 47
4.4.4 – Discussão, p. 50
4.4.5 – Conclusão, p. 53
4.5 - Capítulo V – Avaliação da influência da agressividade do proprietário na manifestação
da agressividade do cão, p. 54
4.5.1 – Introdução, p. 54
4.5.2 – Material e métodos, p. 54
4.5.2.1- Questionário para avaliação e pesquisa comportamental de cães, p. 56
4.5.3 – Resultados, p. 56
4.5.3.1 – Correlação entre características do proprietário e agressividade do cão, p. 57
4.5.3.2 – Correlação entre agressividade do proprietário e agressividade do cão, p. 58
4.5.3.3 – Correlação entre características dos cães e de manejo e agressividade do cão, p. 59
4.5.4 – Discussão, p. 61
4.5.5 – Conclusão, p. 65
5- Considerações Finais, p. 66
6- Bibliografia, p. 69
Glossário, p. 82
Apêndice, p. 84
Domesticação e formação das raças, p. 84
Classificação zoológica, p. 85
Histórico das raças caninas estudadas nos capítulos III e IV, p. 85
Retirever do Labrador, p. 85
Rottweiler, p. 86
Cocker Spaniel Inglês, p. 86
Bull Terrier, p. 87
Pit Bull, p. 87
Anexo 1, p. 89
Anexo 2, p. 91
1- INTRODUÇÃO
A convivência do cão com o ser humano é dinâmica ao longo dos, pelo
menos, quinze mil anos de história comum entre essas duas espécies. No início da
domesticação, o cão agia como um lixeiro, passando a colaborador, parceiro e hoje
tem uma relação com o ser humano que beira a dependência mútua, principalmente
nos grandes centros urbanos. Relação na qual o cão depende integralmente do
abrigo e do alimento fornecidos pelo homem e o homem pode se beneficiar do
equilíbrio emocional proporcionado pelo cão.
O equilíbrio dessa relação é seriamente ameaçado cada vez que o cão, que é
um predador/carniceiro por natureza, apresenta comportamentos agressivos contra
esse humano, muitas vezes sem preparo emocional para encarar essa agressão
sem considerá-la uma forma de traição. A agressão de cães contra seres humanos é
a principal queixa que leva proprietários a procurarem serviços de etologia clínica no
mundo inteiro. Os cães são os animais que mais causam acidentes por ataques
contra seres humanos, principalmente nos ambientes urbanos. As principais vítimas
desses cães são pessoas de convívio próximo a eles (proprietários, familiares e
vizinhos). Considerando esses fatos, a mordedura de cães passa a ser um problema
de saúde pública, já que milhares de pessoas são mordidas por cães em todo o
mundo por ano, o que gera um ônus pecuniário aos sistemas públicos de saúde,
além do impacto na qualidade de vida dos indivíduos atacados devido a suas
consequências físicas e psicológicas.
Há uma infinidade de causas possíveis e teorias defendidas sobre as causas
dessa agressividade, porém há poucos estudos na área. Sabe-se que cães menos
socializados têm maior dificuldade de convívio, que algumas raças são mais
predispostas a ataques em certos contextos que outras e também que os machos
2
têm maior tendência à agressividade interespecífica, porém onde está a chave dessa
problemática ainda é uma incógnita.
Ante a necessidade de elucidar pontos obscuros nas motivações para a
agressividade dos cães, na presente tese, testamos a seguinte hipótese: “A
manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,
manejo e a personalidade do proprietário”, porém sem a pretensão de esgotar o
assunto.
Antes de investigar os fatores relacionados com a manifestação da
agressividade canina, no capítulo I buscamos verificar se o problema é relevante no
cotidiano do clínico de pequenos animais no Brasil, através de um inquérito
epidemiológico com médicos veterinários.
No capítulo II, buscamos investigar, a partir da literatura, a associação entre
raça e agressividade. No capítulo III, baseado na associação que existe entre
agressividade canina contra seres humanos e dominância, investigamos a
dominância em filhotes de cinco raças, Pit Bull, Bull Terrier, Rottweiler, Retriever do
Labrador e Cocker Spaniel Inglês.
No capítulo IV buscamos relacionar aspectos psicológicos do proprietário que
influenciam na aquisição dos filhotes, a fim de responder à pergunta: existe algum
padrão psicológico que leve a pessoa a escolher essa ou aquela raça? Já no
capítulo V, o objetivo é relacionar a agressividade do proprietário, assim como
aspectos de manejo, com a agressividade canina.
3
2- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A agressividade canina é um tema frequentemente abordado quando o
assunto é a interação entre o homem e o cão. Governos legislam sobre raças
agressivas (RIO DE JANEIRO, 1999; SÃO PAULO, 2003; ROSADO et al., 2007;
MATO GROSSO DO SUL, 2008), condomínios impõem regras de convivência para
evitar acidentes envolvendo ataques e várias pessoas temem os cães devido a
traumas sofridos ou transmitidos em decorrência de respostas agressivas de cães.
A agressividade é definida como a conduta do agressivo, como instinto de
combate do animal (LORENZ, 2001). A agressão se refere ao comportamento
ameaçador ou perigoso e abrange uma ampla variedade de comportamentos, desde
posturas corporais sutis e expressões faciais até os ataques propriamente ditos
(LANDSBERG et al., 2004). A palavra agressão traz como significado à mente
humana: maldade, sordidez ou vingança, mas não é o que acontece com os cães.
As agressões fazem parte do repertório comportamental dessa espécie (FOGLE,
1992). A agressividade no reino animal, longe de ser um princípio diabólico,
destruidor, como a psicanálise nos quer levar a crer, é indubitavelmente uma parte
essencial da organização dos instintos em vista da proteção da vida (LORENZ,
2001). No caso do cão, os comportamentos agressivos são subdivididos em três
etapas: ameaça, ataque e apaziguamento (BEAVER, 2001). A ameaça é
caracterizada por posturas intimidadoras, rosnados, latidos, exibição de dentes,
piloereção cervical ou manutenção de contato visual, podendo se compor de um ou
vários desses sinais. O ataque é a agressão propriamente dita, caracterizado pela
mordida ou sua tentativa. A fase de apaziguamento é caracterizada por um
comportamento relativamente não agressivo, mas que reforça a postura agressiva
do cão pós-ataque. O cão pode lamber a região mordida, montar no agredido ou
apenas por sua pata sobre ele (OVERALL, 1997).
4
A agressividade pode ser manifestada em vários contextos e é essa
contextualização que vai direcionar uma possível abordagem terapêutica para cada
caso. As vítimas nesses contextos podem ser de qualquer espécie, principalmente
humanos e caninos. Os contextos podem ser divididos didaticamente em ativos ou
passivos. Nos casos da agressividade ativa, os cães atacam sem qualquer ameaça
direta à sua integridade física. Portanto se pode caracterizar como ativos os
episódios de agressão ocorridos nos seguintes contextos:
• Predação - o cão ataca com todo um gestual de caça. É comum ocorrer
contra pessoas correndo (frequentemente crianças), rodas e pneus (carros, motos,
bicicletas, patins ou skates). Também com animais de outras espécies (FOGLE,
1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001).
• Proteção Territorial – os ataques são direcionados a indivíduos que não
fazem parte do grupo social do cão e invadem seu espaço territorial. Este território
pode se estender além dos limites territoriais estabelecidos pelos seres humanos,
como muros ou cercas. Neste contexto também, o cão pode reagir agressivamente
durante passeios com algum membro humano de seu grupo social, quando
indivíduos (humanos ou caninos) se aproximam, invadindo um perímetro territorial
que o cão reconhece como seu. (FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; LANDSBERG,
2004).
• Proteção Maternal – os ataques são efetuados por fêmeas comumente em
período de amamentação. Pode ocorrer também com algumas cadelas em
pseudociese. Esta categoria de agressividade assume características semelhantes
às de proteção territorial, porém dentro do contexto da fêmea protegendo sua prole
(FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001).
• Disputa Hierárquica – Também é chamada de Agressão por Dominância.
Uma das principais características deste tipo de agressão é o fato de, na maioria das
vezes, ser direcionada a algum membro da família (CAMERON, 1997; PALÁCIO et
al., 2005). É o tipo de agressão mais difícil de ser contextualizada, pois normalmente
envolve situações que não encontram justificativas, considerando-se valores
humanos.
A agressividade caracterizada como passiva envolve situações onde o cão
simplesmente reage a estímulos que ameacem sua integridade física. São essas
situações:
5
• Por Medo - um cão acuado se defende daquilo que o ameaça de forma
agressiva (MILLS e ZULCH, 2010). Este tipo de agressão foi o mais observado em
um estudo belga com cães militares, mesmo com a rejeição de cães medrosos no
momento da seleção para o trabalho designado, o que pode estar relacionado com a
técnica de adestramento usada com tal grupo de cães (HAVERBEKE et al., 2009). É
um tipo de agressão normalmente perigoso, pois o cão não reprime o ataque, visto
que se sente ameaçado. É como se dissesse: “é ele ou eu”.
• Por Dor - o cão ataca aquele que está ou que já lhe tenha causado dor
(FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001). Portanto, é um contexto comum
nas clínicas veterinárias ou a cães que estejam sofrendo ou que já tenham sofrido
processos dolorosos como dores crônicas ou reações inflamatórias agudas.
Todas as situações listadas envolvem contextos normais de agressividade,
porém ainda ocorrem agressões que não são possíveis de serem contextualizadas,
chamadas idiopáticas. Existem também aquelas com causas clínicas
(endocrionopatias ou neuropatias), e ainda há casos com ambivalências que
mesclam classificações. Um exemplo desses casos que mesclam classificações são
casos de agressão normalmente caracterizada como hierárquica por causa do
contexto geral da agressão, porém traz, em inúmeros casos, linguagem corporal
incompatível com o conflito hierárquico, não há a postura do líder se impondo ao seu
subordinado. Tal linguagem corporal, com misto de ofensiva e defensiva (ativa e
passiva), caracteriza uma situação que mescla a dominância e o medo motivando a
agressão (LUESCHER & REISNER, 2008).
É relevante ressaltar que a agressão canina direcionada a seres humanos
muitas vezes é desejada pelo proprietário, como no caso dos cães de guarda.
Porém, ainda assim é necessário que se preveja e trabalhe tal agressividade a fim
de evitar acidentes que ocorrem pela falta de discernimento dos cães para o certo e
o errado.
2.1- FATORES QUE INFLUENCIAM NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES
2.1.1- Sexo
Nos casos de agressões a seres humanos, há uma predominância de cães
machos não castrados (WRIGHT, 1991; FATJÓ et al., 2005; PALÁCIO et al., 2005;
PALESTRINI et al., 2005; ROSADO et al., 2009; VOITH, 2009). Machos também se
6
mostram mais frequentemente envolvidos em ataques no contexto de agressão
territorial (PÉREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009). Entretanto, as agressões
podem ocorrer numa variedade de circunstâncias, que dependem mais da motivação
para a agressão do que do sexo do agressor (MERTENS, 2006).
As cadelas apresentam com mais frequência comportamentos agressivos
contra outros cães, quando essa frequência é comparada à frequencia que os
machos demonstram comportamentos agressivos entre si . Essas agressões de
fêmeas tendem a ser mais frequentes ainda no período de estro (MERTENS, 2006).
Em estudo realizado no Canadá, as cadelas apresentaram probabilidade maior de
respostas agressivas do que os machos e quanto menor o peso da fêmea, maior a
probabilidade de ter sido envolvida em um ataque a ser humano (GUY et al., 2001b).
Quanto a gonadectomia, os machos castrados mostram menor tendência a
comportamentos agressivos comparados aos machos não castrados (OVERALL e
LOVE, 2001). Porém, há um experimento que foi realizado com cadelas da mesma
raça, em uma faixa estreita de idade, criadas sob as mesmas condições e divididas
em dois grupos. Nesse estudo, as cadelas do grupo experimental foram ovario-
histerectomizadas e apresentaram reações agressivas com maior frequência num
período de quatro a cinco meses após a cirurgia, quando comparadas a fêmeas e
que não foram castradas (KIM et al., 2006).
2.1.2- Ambiente Social e Manejo
O ambiente social, desde a ninhada, pode influenciar o comportamento
agressivo do adulto. Em estudo retrospectivo realizado no Chile com cães da raça
Rottweiler e mestiços de Rottweiler, observou-se que animais oriundos de ninhadas
pequenas apresentaram menor agressividade que os de ninhadas grandes. Tal fato
pode estar relacionado à disponibilidade de alimento e/ou atenção da mãe
(BUSTOS, 2003).
No Reino Unido, a agressividade de cães da raça Cocker Spaniel Inglês foi
avaliada através de uma escala de cinco pontos (1- sem agressão e 5 – muito
agressivo). A partir desses resultados os autores selecionaram o primeiro quartil
como o grupo de “menor agressividade” e o quarto quartil como o grupo de “maior
agressividade”. O grupo de “menor agressividade” relacionou-se com frequência
significativamente maior ao grupo de donos acima de 65 anos e a maior frequência
de escovação e passeios. O grupo de “maior agressividade” apresentou correlação
7
com o grupo proprietários com idade compreendida entre 25 e 34 anos. O mesmo
grupo teve correlação com histórico de doença do cão nas suas primeiras 16
semanas de vida e com frequências de passeios menores que o outro grupo. Este
grupo mostrou maior frequência em puxar a guia, assim como uma maior resistência
para obedecer comandos. Os proprietários de cães deste grupo, de “maior
agressividade”, demonstraram menor vínculo afetivo com seus cães (PODBERSCEK
e SERPELL, 1997).
Em um estudo canadense, a presença de adolescentes convivendo com o
cão e o fato deste dormir na cama dos proprietários nos primeiros dois meses em
que estavam na casa, foram estatisticamente relacionados com o grupo de cães
envolvidos em agressões direcionados a indivíduos da família humana que os
acolheu desde filhotes (GUY et al., 2001b).
Cães militares levados para a casa de seus responsáveis e que praticam
esportes com eles, ou seja, que tiveram um grau de interatividade constante,
demonstraram menos agressividade, mais sociabilidade e mais obediência, quando
comparados àqueles que só tiveram contato com seus responsáveis no canil militar
(LEFEBVRE et al., 2007).
Em um estudo feito na Austrália com questionários respondidos por
proprietários, se demonstrou que o risco de agressão relacionada à comida foi maior
em: cães mestiços; cães que foram adquiridos com mais idade; residências onde
tinham mais cadelas; residências com maior número de cães; e cães que recebiam
petiscos à mesa, durante as refeições das pessoas. O risco para esse tipo de
agressão diminuiu em cães que caminham com seus donos diariamente e que
recebiam petiscos durante o treinamento (MCGREEVY e MASTERS, 2007).
Alguns fatores mostraram aumentar a probabilidade da ocorrência de
agressões territoriais, são eles: a finalidade da aquisição do cão (para guarda
patrimonial); nível de escolaridade do proprietário (com nível universitário); e punição
dos cães com castigos físicos (PÉREZ-GUISADO et al., 2008).
Um estudo sugere que cães adquiridos para companhia, com acesso a
visitantes em casa e com menores restrições de movimentos (que ficam mais soltos)
tiveram maior risco de ataques a pessoas. Esse estudo foi feito com cães de duas
cidades em países diferentes e teve resultados diferentes em relação à
agressividade para os mesmos hábitos teoricamente predisponentes. Por exemplo, o
fato de o cão dormir na cama de algum membro da família teve correlação com a
8
agressividade entre os cães de uma cidade, mas sem a mesma correlação entre os
animais da outra. O que sugere que diferenças culturais podem interferir na
predisposição a ataques de cães a seres humanos em contextos diferentes
(MESSAM et al., 2008).
Pesquisadores identificaram que fatores como o fato de a pessoa ser
responsável por um cão pela primeira vez e como esta pessoa educa esse cão têm
maior influência no desenvolvimento de agressões por dominância do que fatores
intrínsecos ao cão como: sexo, raça, idade, tamanho ou cor da pelagem (PEREZ-
GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009).
Um estudo que avaliou cães agressores e cães agredidos revelou que os
cães agressivos eram predominantemente adquiridos em canis, enquanto os cães
oriundos de abrigos ou de amigos ou parentes expressavam maioria numérica no
grupo dos agredidos (ROLL e UNSHELM, 1997). O mesmo estudo revelou que os
cães agressores já exibiam uma tendência a agredirem outros cães. Essa tendência
foi relatada por tentativas de agressão em episódios anteriores da agressão
propriamente dita. A maioria dos cães envolvidos nas brigas avaliadas no estudo
caminhava na rua sem estarem devidamente contidos com guia. Os dois grupos
apresentaram uma história comum de falha na socialização primária com outros
cães. Observou-se predominância de machos dentre os cães envolvidos nas brigas.
Cães de propriedade de mulheres encontraram-se mais no grupo dos agredidos, do
que no grupo dos agressores. Cães que passeavam com toda a família foram os
mais encontrados no grupo das vítimas.
O ambiente social tem um papel muito importante no contexto de agressões
motivadas por conflitos hierárquicos (OVERALL, 1997), sendo este o contexto de
agressão que mais leva proprietários aos serviços de etologia clínica por todo o
mundo (GUY et al., 2001c; DENEMBERG et al., 2005; FATJÓ et al., 2005; FATJÓ et
al., 2007).
A agressividade faz parte do repertório comportamental do cão, assim como
de outras tantas espécies de animais sociais ou não. Dentro das matilhas, apesar de
ser um comportamento normal, existe uma variedade de rituais de apaziguamento.
Esses rituais de apaziguamento são fundamentais no processo evolutivo das
espécies, pois visam manter a coesão de grupos de animais gregários (LORENZ,
2001). Grupos de animais que ficam brigando entre si tornam-se mais fracos e mais
vulneráveis a predadores, por exemplo. Portanto, as agressões ocorridas dentro do
9
mesmo grupo social não são desejáveis no contexto humano nem no canino.
Segundo os argumentos de Lorenz (2001) pode-se supor que tais agressões dentro
dos grupos sociais ocorram devido a uma ruptura na harmonia de seu
comportamento natural por ambiguidades nas atividades do grupo social em questão
ou a um não entendimento dos rituais naturais desses cães. Em relação às
agressões caninas direcionadas aos seres humanos do mesmo grupo social do
agressor, essas seriam provocadas pela ruptura na harmonia social do grupo ou
pelo não entendimento dos rituais de apaziguamento. Nesse caso a explicação é
corroborada pelos argumentos de Turner (1997), que diz que as causas não
orgânicas de problemas comportamentais podem ser classificadas em: desrespeito
(por falta de conhecimento) às características biológicas normais dos animais; falsas
expectativas criadas pelos proprietários em relação a seus animais; e interação
incorreta com o animal.
2.1.3- Agressões por Dominância
A dominância é um traço individual de conduta, comum a indivíduos de várias
espécies, é inato e tem forte importância evolutiva para espécies sociais
(CAMERON, 1997). Essa característica faz com que o cão assuma postos mais altos
em sua hierarquia social, com o conceito oposto à submissão (FOGLE, 1992;
BEAVER, 2001). Tal característica é manifestada nos cães de diversas maneiras,
sempre com o objetivo de obter o controle dos recursos, que no ambiente doméstico
são: alimento, abrigo, brinquedos e o local de dormir. Nesse contexto, a atenção e o
carinho das pessoas também pode ser incluído na relação de recursos controlado
pelo cão. O cão dominante pode exercer essa dominância de forma pacífica ou
agressiva em relação a pessoas ou cães. Na abordagem agressiva, o cão se
comporta inicialmente com intimidações posturais ou sonoras e posteriormente com
ataques direcionados àquele que ameace sua superioridade hierárquica ou a ordem
natural da matilha (OVERALL, 1997).
Na maioria das vezes, estrutura social canina normalmente se apresenta
organizada de forma linear na qual A domina B que domina C e assim
sucessivamente (OVERALL, 1997; BEAVER, 2001; LANDSBERG et al., 2004). Essa
hierarquia já começa a ser estabelecida desde a ninhada, quando os filhotes
definem quem terá acesso prioritário aos recursos (comida, água, sombra,
brinquedos ou abrigo) através de brincadeiras. A relação de dominância e
10
submissão é exibida e reforçada durante as brincadeiras, nas quais os dominantes
mostram-se mais ativos e os submissos mais responsivos às iniciativas dos
dominantes (BAUER e SMUTS, 2007). Essas brincadeiras agonísticas começam em
torno de cinco semanas e aumentam até o estabelecimento da hierarquia,
decrescendo a partir de oito a dez semanas (PAL, 2008). Comportamentos
dominantes frequentemente observados em filhotes são: estabelecer o controle do
alimento; rolar o outro indivíduo sobre seu dorso expondo o ventre, abocanhar o
pescoço do outro, abocanhar a boca do outro e montar no outro simulando
comportamento de cópula (BEAVER, 2001). A aceitação ou não dessas iniciativas
acaba por organizar socialmente esses filhotes.
Essa estruturação social dos cães é parte do que Askew (2003) chama de
Pack Theory, ou Teoria da Matilha, que não é essencialmente uma teoria (WRIGHT,
2004), mas uma idéia aceita e difundida no meio da etologia clínica (FOGLE, 1992;
CAMERON, 1997; OVERALL, 1999; BEAVER, 2001; ASKEW, 2003; LANDSBERG
et al., 2004). Tal teoria se baseia em dois princípios. O primeiro diz que os padrões
comportamentais de cães e lobos são essencialmente os mesmos (SCOTT e
FULLER, 1965). O segundo diz que quando socializados com pessoas, cães e lobos
transferem para os seres humanos os relacionamentos sociais que normalmente se
desenvolvem com indivíduos da mesma espécie o quanto lhes são permitidos pelo
seu grupo social humano. Cães não adquirem comportamento humano com essa
associação, mas continuam a mostrar o padrão comportamental comum a todos os
canídeos (SCOTT e FULLER, 1965). Ou seja, é a ideia de que o cão quando
inserido no contexto social humano, o que inclui residências com outros animais, se
comporta como se comportaria dentro de um grupo de cães em liberdade, desta
forma, assumindo a posição hierárquica que lhe for permitida ou indicada dentro do
grupo (FOGLE, 1992; OVERALL, 1999; BEAVER, 2001; ASKEW, 2003). Há autores
que a questionam (VAN KERKHOVE, 2004; BRADSHAW et al., 2009), alegando que
sua base em uma estimativa do comportamento canino a partir do comportamento
de lobos se torne falha no momento em que já há estudos demonstrando diferenças
cognitivas significativas entre esses canídeos tanto no comportamento intra como
interespecífico (HARE et al, 2002). Enfim, a Teoria da Matilha é uma ideia sujeita a
modificações e adaptações a partir de novos estudos que avaliem a relação do cão
com o ser humano e como não é o foco direto da presente tese não haverá um
maior aprofundamento nem uma maior discussão a respeito.
11
Uma das principais características da agressão por dominância é o fato de,
na maioria das vezes, ser direcionada a algum membro da família (CAMERON,
1997; PALÁCIO et al., 2005).
Há situações que motivam os ataques caninos e são típicas de reações
agressivas por dominância: incomodar o cão enquanto dorme; puxar a guia para
corrigir o cão; puxar a cabeça do cão para pôr-lhe a guia; escovar o cão; encarar o
cão; portar uma focinheira; conduzir o cão em exercícios restritivos; usar punição
física (OVERALL, 1999). Além dessas situações, podem ocorrer reações agressivas
quando pessoas tentam deixar o cômodo em que se encontram assim como
comportamentos não agressivos fazendo parte do contexto como: monta indevida,
marcação territorial, roubo de comida ou pular nas pessoas (LANDSBERG, 1990). O
último item sugere a necessidade do cão dominante em estar sempre “por cima”. A
agressão relacionada à comida pode fazer parte do contexto da agressão por
dominância. Neste caso, o cão demonstra reações agressivas com a proximidade de
algum indivíduo (humano o canino) de sua comida, podendo se estender a outros
recursos como abrigo (camas, sofás, casinhas, etc) ou pertences que o cão
considere como dele (brinquedos, panos ou objetos “furtados” do proprietário), o que
é chamado de agressão possessiva (LUESCHER e REISNER, 2008).
2.1.4- Doenças
Para o diagnóstico de distúrbios de comportamento relacionados à
agressividade, é importante descartar causas clínicas como: neoplasias, infecções,
distúrbios hormonais ou doenças neurológicas (OVERALL, 1999).
Em um estudo comparando uma população de cães que apresentaram
quaisquer problemas de comportamento e sua função tireoideana revelou-se que
61% desses cães apresentavam atividade tireoidiana deficiente, mas ainda
subclínica, havendo uma correlação significativa entre disfunção tireoideana e
agressão direcionada a pessoas (ARONSON e DODDS, 2005).
Caldwell e Little (1980) relataram que, de oito animais com histórico de
agressividade, três apresentaram lesões em exames histopatológicos, como
necrose, gliose e microvaculação em áreas do sistema límbico.
Cães com histórico de tratamento para doença de pele apresentaram maior
probabilidade de ter mordido familiares humanos, o que pode estar relacionada com
a medicação usada para o tratamento (corticóides e/ou anti-histamínicos) ou com o
12
potencial aumento da irritabilidade secundário ao prurido ou à privação do sono
(GUY et al., 2001b).
2.2- MEDIDAS PREVENTIVAS
Alguns autores concordam (OVERALL, 1997; BEAVER, 2001; LANDSBERG
et al., 2004) que a correta orientação dos proprietários quanto a aspectos inerentes
ao comportamento canino (estabelecimento de hierarquia, princípios de
comunicação e aprendizado) e a socialização primária (SEKSEL, 1997) seriam as
melhores maneiras de prevenir comportamentos agressivos de cães a seres
humanos.
Alguns governos tentam controlar os ataques com leis proibitivas de certas
raças (RIO DE JANEIRO, 1999; SÃO PAULO, 2003; ROSADO et al., 2007; MATO
GROSSO DO SUL, 2008). Na Espanha, no período de 2000 a 2004, tais leis não se
mostram eficientes no controle epidemiológico de ataques de cães a seres humanos
(ROSADO et al., 2007).
Socialização é o processo de aprendizado do comportamento social
apropriado com indivíduos da mesma espécie ou de espécies diferentes (SEKSEL,
1997). Lorenz (2001) diz que ritos provenientes de movimentos agressivos
reorientados não são incorporados no patrimônio hereditário dos animais, mas são
transmitidos pela tradição e cada indivíduo tem que aprendê-los. Diz também: “nos
animais, uma experiência individualmente adquirida se transmite igualmente por
ensino e aprendizagem, dos indivíduos mais velhos aos mais novos”. No processo
de domesticação, o cão é inserido no convívio humano, por isso, é extremamente
necessário que seja socializado no contexto humano, para que essa interação
interespecífica ocorra de uma forma coerente e socialmente aceita pela sociedade
humana. Um cão socializado no contexto humano passa a ter uma relação mais
harmônica com sua família humana, o que traz benefícios sociais à família e ao cão
(SEKSEL, 1997). Considerando que a maioria dos ataques acontece em contextos
familiares e comumente são direcionados a pessoas conhecidas da família, como
vizinhos, parentes e amigos (OVERALL e LOVE, 2001), a socialização torna-se uma
necessidade mais significativa. Porque, no aprendizado dentro do processo de
socialização, o cão passa a reconhecer pessoas ou atividades como parte da sua
vida e não como ameaça, fazendo que um cão não ataque uma criança conhecida
13
quando esta invade o seu território por não identificá-la nem como ameaça nem
como presa.
A fase da vida que vai de oito a dezesseis semanas é considerada um ponto
crítico no desenvolvimento social dos cães e é chamada de fase de socialização
primária (SCOTT e FULLER, 1965). Nesta fase o cão aprende com muito mais
facilidade e de uma forma mais intensa e duradoura o que é seguro ou não para ele.
Cães que até as 16 semanas não tiveram contato com pessoas passaram a
comportarem-se como selvagens1 , temendo qualquer pessoa que se aproxime,
tornando-os incapazes de aprender comandos simples de adestramento (SCOTT e
FULLER, 1965). Por outro lado, cães criados em famílias humanas tiveram maior
rendimento em testes cognitivos (SCOTT e FULLER, 1965) e menos reações
agressivas quando comparados com os que ficaram instalados permanentemente
em canis (LEFEBVRE et al., 2007).
No processo de socialização durante a fase de socialização primária,
apresenta-se ao cão, de forma positiva, todos os fatores que farão parte da vida do
cão com este cão ainda filhote (8-16 semanas). Esses fatores devem ser controlados
para garantir que a experiência seja positiva, por exemplo: pessoas de diferentes
idades, diferentes etnias, brinquedos ou objetos (SEKSEL, 1997). Um exemplo de
como pode ser feita esta prevenção está em uma pesquisa feita recentemente no
Brasil, na qual a pesquisadora desenvolveu uma técnica de socialização primária
com filhotes de cães. Nessa pesquisa, os cães e seus proprietários participavam de
aulas de socialização e eram orientados sobre cuidados básicos (escovação de
dentes e controle de ectoparasitas, por exemplo) assim como sobre como interagir
de maneira correta com seus cães. Esses cães, que eram filhotes, eram avaliados
durante as interações para a identificação precoce de possíveis problemas de
comportamento. Tal estudo teve como resultado um alto índice de satisfação dos
proprietários e uma melhora na qualidade da interação destes com cães e vice-versa
(SERRA, 2005).
Outra medida para prevenir problemas de comportamento, inclusive os
relacionados à agressividade, é selecionar o cão para atender às demandas da
família de maneira adequada considerando a realidade dessa família (LANTZMAN,
2004). Com o objetivo de selecionar cães para atenderem às demandas de
1 Nota do autor – O cão nas condições descritas comporta-se como um animal que ainda não foi domesticado,
que ainda vive sem o contato humano.
14
diferentes famílias ou atividades, Netto e Planta (1997) desenvolveram um teste para
essa seleção e descreveram que cães que reagiram agressivamente durante os
testes, tiveram maior probabilidade de agredirem depois de inseridos em suas
atividades ou famílias.
15
3- JUSTIFICATIVAS E OBJETIVOS
3.1- JUSTIFICATIVAS
A relação cada vez mais próxima do cão com o ser humano, a importância
dos ataques de cães como aspecto de saúde pública, a agressão canina como
principal causa de abandono ou eutanásia de cães pelo mundo e os problemas
relacionados à agressividade canina como principais queixas clínicas
comportamentais em todo o mundo justificam a presente tese.
3.2- OBJETIVO GERAL
Investigar fatores que exercem influência na manifestação da agressividade
em cães, visando sua prevenção.
3.3- OBJETIVOS ESPECÍFICOS
a) Avaliar a importância do problema para o médico veterinário brasileiro que
trabalha com atendimento clínico a cães no Brasil;
b) Investigar na literatura a relação entre agressividade e raça canina;
c) Comparar o grau de dominância em filhotes das diferentes raças
pesquisadas;
d) Identificar se há influência de algum padrão de personalidade do
proprietário na seleção da raça, no período da aquisição do cão;
e) Correlacionar a agressividade do proprietário com a manifestação da
agressividade por parte dos cães;
f) Identificar itens de ambiente social e manejo que possam estar
relacionados aos comportamentos agressivos por parte dos cães;
g) Verificar se há associação entre a agressividade e outros padrões
comportamentais como medo ou ansiedade.
16
3.4- METAS
a) Contribuir para melhorar a relação do cão com o ser humano, a partir do
entendimento das motivações para a agressividade dos cães;
b) Contribuir para reduzir o número de acidentes causados por ataques de
cães, agindo de forma preventiva a partir do entendimento das motivações para a
agressividade dos cães.
17
4- DESENVOLVIMENTO
Para que houvesse uma sequência no raciocínio do leitor em relação às
metodologias empregadas a fim de confirmar ou não à hipótese inicial que é: “A
manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,
manejo e a personalidade do proprietário”, a presente tese foi dividida em cinco
capítulos.
4.1- CAPÍTULO I – EPIDEMIOLOGIA DE PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS EM CÃES NO BRASIL:
INQUÉRITO COM MÉDICOS VETERINÁRIOS
“O conceito de normal é um dos mais difíceis de definir em toda a biologia, mas ao mesmo
tempo é tão indispensável como o conceito oposto de patológico.” (LORENZ, 2001)
4.1.1- Introdução
A ocorrência de problemas de comportamento em cães tem implicações
importantes no bem-estar desses animais e em sua relação com seus proprietários.
Acidentes por ataques de cães são considerados um problema de saúde pública
(OVERALL e LOVE, 2001; O´SULIVAN et al., 2008a). Nos Estados Unidos da
América (EUA), o custo anual do sistema público de saúde com tratamento de
vítimas de ataques de cães excede 100.000.000 de dólares (OVERALL e LOVE,
2001).
A agressividade canina é o problema que mais leva proprietários a procurar
os serviços especializados em etologia clínica na Espanha (FATJÓ et al., 2005;
FATJÓ et al., 2007). Convém destacar que após acidentes com ataques de cães,
sinais da síndrome de Estresse Pós-traumático foram observados em 12 de 22
crianças belgas em um estudo desenvolvido naquele país, sendo que cinco dessas
18
crianças desenvolveram o quadro completo da síndrome (PETERS et al., 2004;
KEUSTER et al., 2006). Tal problema, por vezes, requer que a vítima e seus
parentes próximos sejam encaminhados a serviços de acompanhamento psicológico
(VOITH, 2009). Em estudo recente realizado em Niterói, no Estado do Rio de
Janeiro, 27,6% dos proprietários de cães que residiam em apartamento
entrevistados descreveram a agressividade como um comportamento incômodo ou
problemático exibido por seus cães (SOARES, 2007). No mesmo município, 87,4%
dos proprietários de cães que residiam apartamento relataram que seus cães
rosnavam ou tentavam morder em pelo menos uma situação cotidiana. A situação
que desencadeava tais respostas com maior frequência foi quando o cão era
contrariado, em 30,1% dos casos (SOARES et al., 2007).
Cerca de vinte milhões de animais de estimação a cada ano são
abandonados em abrigos nos EUA e pelo menos a metade desses são mortos por
causa de problemas de comportamento (SEKSEL, 1997).
No Brasil, até o presente momento, não há publicada uma casuística nacional
dos problemas de comportamento dos cães domésticos nem de como os casos
existentes são conduzidos. O presente estudo objetivou relatar os problemas de
comportamento mais frequentemente atendidos por médicos veterinários brasileiros,
assim como suas condutas clínicas e algumas consequências de tais problemas
para o bem-estar e vínculo homem-animal, sob a visão desses clínicos.
4.1.2- Material e Métodos
Para obtenção dos dados sobre problemas de comportamento foi utilizado o
questionário de Fajtó et al. (2006) modificado (ANEXO 1), composto de perguntas
sobre cães e gatos (os resultados referentes aos felinos foram publicados no
International Journal of Applied Research in Veterinary Medicine, v. 7, p. 130-137,
2009.). Após a elaboração dos questionários, os mesmos foram enviados por
correio, através de sistema de carta-resposta, para as 108 faculdades de medicina
veterinária distribuídas em todo o território nacional, que possuíam unidades de
atendimento clínico a cães e gatos (consultórios, clínicas ou hospitais), dentre 137
instituições cadastradas no Conselho Federal de Medicina Veterinária até a data do
envio dos questionários (maio de 2008). Um novo envio foi realizado seis meses
depois àquelas faculdades que não haviam respondido. Também foram enviados
por correio eletrônico para promover uma maior agilidade no envio das respostas.
19
Todas as correspondências (inclusive o correio eletrônico) tiveram como
destinatários os coordenadores de curso de Medicina Veterinária e os responsáveis
pelas unidades de atendimento. As perguntas abrangeram os problemas de
comportamento mais frequentes na rotina clínica de animais de companhia, a atitude
dos veterinários e dos proprietários perante estes problemas e as formas de
tratamento escolhidas.
Os questionários foram respondidos por médicos veterinários, professores ou
não, que prestassem atendimento nas unidades clínicas para pequenos animais.
Podendo um ou mais profissionais responder em cada unidade. Foram consideradas
as respostas daqueles que afirmaram ser consultados sobre problemas de
comportamento. Todos os respondentes assinaram um Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido aprovado, assim como o projeto em sua íntegra, pelo Comitê de
Ética em Pesquisa (CNM/HUAP # 096/07) da Universidade Federal Fluminense.
Os dados obtidos foram armazenados em um banco de dados do aplicativo
Microsoft Office Access 2003 e analisados utilizando-se o programa estatístico
Bioestat 5.0®. Além da estatística descritiva das respostas das questões 1, 2 e 3, foi
utilizado o teste de Kruskal-Wallis para observar se havia diferenças significativas
entre as posições de classificação das respostas das questões 4, 5, 6, 7 e 8 do
questionário. O teste de comparações Student-Newman-Keuls foi usado de forma
complementar para a comparação entre os pares de respostas, para avaliar se
tiveram ou não diferenças significativas (ARANGO, 2005).
4.1.3- Resultados
Das 108 faculdades de veterinária com atendimento a pequenos animais do
país, obteve-se reposta de 46 (42,6%), totalizando 101 questionários respondidos.
As regiões do Brasil foram representadas da seguinte forma: região Sul - 13
questionários (12,9%), correspondendo a sete faculdades das 25 com atendimento a
pequenos animais da região; região Sudeste - 65 questionários (64,4%), totalizando
27 universidades dentre as 58 com atendimento médico veterinário da região; região
Centro-oeste - quatro questionários (4,0%), correspondendo a quatro instituições
dentre 12; região Nordeste - 16 questionários (15,8%), totalizando seis dentre 10
instituições; e região Norte - três questionários (3,0%), uma universidade dentre as
três faculdades existentes com unidade de atendimento. Dos 101 questionários
respondidos, 91,1% dos médicos veterinários disseram ser consultados sobre
20
problemas de comportamento. Quanto à espécie mais consultada, 83 (90,2%)
médicos veterinários afirmaram ser mais consultados sobre distúrbios de
comportamento em cães do que em gatos (5,4%) e quatro respondentes (4,3%) não
identificaram a espécie com maior frequência para esse tipo de queixa.
Em relação às condutas dos médicos veterinários, 57,6% disseram que
tentam resolver alguns casos e outros são encaminhados para um veterinário
especializado em comportamento animal; 21,7% disseram tentar resolver alguns
casos e outros são encaminhados para um adestrador; e 17,4% tentam resolver
sozinhos qualquer caso. Apenas 3,3% afirmaram encaminhar todos os casos para
veterinários especializados e 1,1% afirmou que Etologia não é um campo da
Medicina Veterinária. Nenhum clínico disse encaminhar todos os casos para
adestradores.
Quanto à morte induzida consequente a problemas de comportamento, 82
(89,1%) afirmaram que, em cada 10 procedimentos realizados, nenhum ocorre por
queixas comportamentais e oito (8,7%) afirmaram que, em cada 10, um é devido a
queixas comportamentais. Houve duas respostas (2,2%) de que duas eutanásias
são decorrentes de problemas comportamentais em cada 10. Na questão que
solicitava que o médico veterinário indicasse qual o comportamento que mais
motivaria o proprietário a abandonar ou solicitar a eutanásia do seu cão, 54 (58,7%)
respostas caracterizaram a agressão como muito frequente (notas 10, 9 ou 8), e 38
(41,3%) indicaram os comportamentos destrutivos como muito frequentes. A
agressão, portanto, foi incriminada como a causa mais frequente de abandono ou
eutanásia devido a problemas comportamentais tendo diferenças significativas em
relação aos demais problemas listados (P<0,02). A destrutividade teve diferença
significativa em relação a defecações inapropriadas (P=0,01), falta de controle nos
passeios (P<0,01), hiperatividade (P=0,02) medo de pessoas (P<0,01) e de barulhos
(P<0,01).
Os médicos veterinários responderam que comportamentos destrutivos eram
as queixas mais frequentes, seguidas pelas agressões. Os comportamentos com
queixas menos frequentes foram: defecações em locais inapropriados; medo de
pessoas e falta de controle durante os passeios (Gráfico 1). Os resultados do teste
de Kruskal-Wallis no grupo de respostas a essa pergunta apresentaram diferenças
significativas (P<0,01). Na comparação entre os pares, agressões e
comportamentos destrutivos não apresentaram diferença significativa entre si
21
(P=0,8). Ambos mostraram-se significativamente mais frequentes do que:
defecações e micções inapropriadas, falta de controle nos passeios, medo de
pessoas e de barulhos (P<0,05). Além dessas, os comportamentos destrutivos foram
significativamente mais frequentes do que vocalização excessiva (P=0,03).
Comportamentos compulsivos foram significativamente mais frequentes do que
medo de pessoas e falta de controle nos passeios (P<0,01). Esta teve diferenças
significativas também em relação a: hiperatividade, medo de barulhos e vocalizações
excessivas (P<0,05). Hiperatividade foi significativamente diferente de medo de
pessoas (P=0,01) e nenhum dos demais pares apresentou diferenças significativas.
Os alvos mais frequentes das agressões caninas foram outros cães (30,4%),
seguidos de pessoas da família (23,9%) assim como pessoas desconhecidas
(23,9%). O resultado do teste de Kruskal-Wallis no grupo de respostas a essa
pergunta não indicou diferença significativa (P=0,2).
O tratamento mais recomendado para as agressões caninas foi a terapia
comportamental, significativamente mais frequente do que a castração e o uso de
medicamentos (P<0,01). O mesmo ocorreu em relação ao tratamento para as
eliminações inapropriadas com urina, a terapia comportamental foi a principal
recomendação, significativamente mais frequente do que castração (P<0,01) e uso
de medicamentos (P=0,01).
22
4.1.4- Discussão
Baseado na taxa de retorno dos questionários de 42,6% e na distribuição
equilibrada das respostas por todo território nacional, a amostra foi considerada
representativa em relação à experiência e à conduta dos clínicos veterinários quanto
aos problemas de comportamento de cães no Brasil.
A decisão de realizar esta pesquisa com médicos veterinários de hospitais e
unidades de atendimento veterinário de faculdades de Medicina Veterinária, ao invés
de clínicas privadas, e o duplo envio das cartas-respostas, podem ter contribuído
para uma maior taxa de retorno, quando comparada a trabalhos envolvendo
questionários como o de Fatjó e colaboradores (2006) que obtiveram taxa de
resposta de 15%. Pode-se presumir que os veterinários envolvidos no ambiente de
ensino tenham maior predisposição a contribuir com uma pesquisa científica. Além
disso, o envio adicional do questionário por correio eletrônico, contornou a possível
deficiência na distribuição dos questionários não só pelos correios como também
pelos setores de comunicação de algumas instituições, o que pode ter levado ao
extravio de algumas correspondências. Outra razão para a escolha das faculdades
como alvo da pesquisa era obter uma distribuição nacional mais homogênea,
evitando concentrar o perfil dos resultados em uma só região.
Em concordância com a literatura internacional, a maioria dos participantes
afirmou ser consultada por problemas de comportamento (OVERALL, 1997; FRID,
2004; FATJÓ et al., 2006), ficando evidente que questões relacionadas ao
comportamento animal fazem parte da rotina de médicos veterinários em todo o
país.
A maioria dos médicos veterinários participantes se declarou predisposta a
indicar casos a especialistas e adestradores. Apenas cerca de um quinto afirmou
tentar resolver todos os casos sozinhos. Em estudos que levantaram essa questão
em outros países, uma maior parcela dos profissionais se mostra relutante a indicar
casos para outros veterinários, ou por falta de comunicação apropriada com os
colegas, ou simplesmente por temer perder a clientela, fatores que podem estar
presentes no Brasil (FATJÓ et al., 2006). Todavia, não se pode descartar a
possibilidade que de muitos médicos veterinários não reconheçam ou não valorizem
os problemas relacionados ao comportamento animal, negligenciando-os. Também o
pequeno número de profissionais que trabalham com comportamento animal,
especificamente na área clínica, pode dificultar a indicação do paciente (FATJÓ et
23
al., 2006). Outra hipótese para um número tão alto de possíveis indicações a
especialistas seria a resposta que os respondentes supunham ser a mais adequada,
visto que o número de profissionais com esse perfil ainda é muito reduzido no país.
Então a resposta pode refletir o ideal e não o que acontece no dia a dia.
A partir das respostas de 89,1% dos médicos veterinários brasileiros que
citaram não realizar eutanásia de animais por causa de problemas comportamentais,
pode-se levantar a hipótese de que no Brasil haja uma cultura de não matar o cão
devido a tais problemas. Principalmente comparando esses resultados ao do estudo
de Fatjó e colaboradores (2006) que encontraram apenas cerca de 25,0% de
profissionais dizendo não submeter animais domésticos à eutanásia por problemas
de comportamento. Diante dessa realidade, é possível interpretar o resultado da
pergunta sobre os motivos de eutanásia ou abandono como motivos para abandono
apenas. Tal resultado mostra-se coerente com o que tem sido publicado
(GORODETSKY, 1997; RUGBJERG et al., 2003; FATJÓ et al., 2005; FATJÓ et al.,
2007; O´SULLIVAN et al., 2008a), mostrando a agressão como principal motivador
de abandono. Esse fato aumenta a responsabilidade dos médicos veterinários em
orientar os proprietários de cães em relação à socialização e à educação de seus
animais visando o seu bem-estar, como também dos proprietários e da sociedade
(SEKSEL, 1997; SERRA, 2005). Entretanto a discrepância desse resultado do
presente estudo com os índices de morte induzida devido a problemas
comportamentais que são citados na literatura internacional (OVERALL, 1997;
SEKSEL, 1997; FATJÓ, et al.,2006) pode sugerir também que os respondentes
tenham optado pela resposta que lhes pareceu mais indicada, ou pela resposta que
eles supunham que o entrevistador considerasse correta, ou ainda pode ser uma
característica da amostra, visto que em instituições de ensino pode-se realmente
não haver eutanásia por queixas comportamentais.
Os problemas mais frequentemente relatados foram idênticos aos de Fatjó e
colaboradores (2006), já quanto aos menos frequentes só houve coincidência na
falta de controle durante os passeios. As agressões aparecem em segundo lugar
como queixa mais frequente, porém foi o mais incriminado como causa de
abandono, o que concorda com o fato de que as agressões são os comportamentos
que mais levam os proprietários a buscar atendimentos especializados em etologia
clínica em todo o mundo (RUGBJERG et al., 2003; DENENBERG at al., 2005;
BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ et al., 2007).
24
Alguns estudos apresentam os próprios familiares como principais alvos das
agressões caninas (FATJÓ et al., 2005; BAMBERGER e HOUPT, 2006). O presente
estudo mostra outros cães como principais alvos dessas agressões, o que está de
acordo com um estudo de Rugbjerg e colaboradores (2003), na Dinamarca, e com
Fatjó e colaboradores (2006), na Espanha.
O tratamento mais recomendado para os dois problemas propostos no
questionário foi terapia comportamental, o que está de acordo com o estudo
espanhol (FATJÓ et al., 2006). Considerando que a Etologia Clínica ainda é uma
área pouco difundida no Brasil e que o questionário apresenta a questão de maneira
genérica, citando mudanças ambientais e enriquecimento ambiental sem categorizar
que tipo de terapia seria proposta, a realização de novos estudos faz-se necessária.
Estudos relevantes visando identificar qual tipo de terapia comportamental tem sido
recomendado para os problemas propostos, até porque a maioria dos respondentes
afirmou tentar resolver alguns casos sozinhos.
O clínico geral que atende animais de companhia é normalmente o primeiro
profissional consultado sobre problemas comportamentais. Fato que aumenta a
importância de se intensificar a formação em etologia clínica nas faculdades de
Medicina Veterinária brasileiras, a fim de: (1) reduzir o número de animais mortos ou
abandonados em decorrência de tais problemas, (2) melhorar o bem-estar dos
animais de companhia e (3) favorecer o vínculo do ser humano com seu animal de
estimação.
4.1.5- Conclusão
Conclui-se com este capítulo que a agressão canina é um importante aspecto
na rotina das clínicas veterinárias do Brasil, já que é um dos problemas mais
relatados pelos proprietários. Também é relevante para o bem-estar dos cães de
companhia, visto que é a principal causa de abandono desses animais, segundo a
opinião dos respondentes.
25
4.2- CAPÍTULO II – ASSOCIAÇÃO ENTRE RAÇA E AGRESSIVIDADE EM CÃES: REVISÃO
SISTEMÁTICA
“Um dos caracteres mais distintos das nossas raças domésticas é que notamos entre elas
adaptações que não contribuem em nada para o bem-estar do animal ou planta, mas simplesmente
para o proveito e capricho do homem.” (DARWIN, 1859)
4.2.1 –Introdução
A agressividade canina é o problema de comportamento que mais leva cães
aos serviços de etologia clínica em vários paises do mundo (OVERALL e LOVE,
2001; BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ et al., 2007) e é também um problema
de saúde pública, visto que o número de pessoas atacadas por cães gira em torno
de 2% da população dos EUA (OVERALL e LOVE, 2001). Por conta disso, há uma
preocupação em se prevenir o problema dos ataques de cães a seres humanos. Por
exemplo, no Estado do Rio de Janeiro, em abril de 1999, redigiu-se uma lei (nº.
3205), que ganhou nova redação em setembro de 2005 (nº. 4597) para controlar
populações de cães de certas raças tidas como agressivas e caracterizadas como
cães ferozes. Essa lei impõe a castração de cães da raça Pit Bull, proíbe sua criação
e obriga que cães das raças Pit Bull, Rottweiler, Fila e Doberman transitem apenas
em logradouros públicos de pouco movimento usando guia, enforcador e focinheira.
No ano de 2003, o governo do Estado de São Paulo também promulgou uma lei que
obriga o uso de guia e coleira em cães das raças Pit Bull, Rottweiler e Mastim
Napolitano para condução desses cães em locais públicos. Tais dispositivos legais
foram propostos, supostamente, para atender a uma necessidade expressa pela
população desses estados. Porém, há um preconceito que envolve certas raças e
seus proprietários, como acontece no caso do Pit Bull (TWINING et al., 2000), mas
uma pergunta é relevante: existem realmente raças agressivas por si próprias?
A presente revisão de literatura objetiva pesquisar a relação entre raças
caninas e seu envolvimento em ataques a seres humanos nos artigos publicados
sobre agressões de cães a seres humanos.
4.2.1.1- Associação entre Genética e Comportamento
Todos os criadores de cães trabalham com a seleção dos animais a partir de
características morfológicas como: porte, pelagem, inserção de orelhas e cauda e
26
aprumos. Alguns excluem de seus plantéis animais com temperamento inapropriado
àquela raça. Então se faz a pergunta: é possível que uma característica
comportamental, como a agressividade, seja transmitida para a geração seguinte?
Em 1965, os pesquisadores John Scott e John Fuller, publicaram um livro que
descreve os resultados de suas experiências com hereditariedade de características
comportamentais em cães (SCOTT e FULLER, 1965). Os experimentos foram
realizados com cães de cinco raças: Cocker Spaniel Americano, Basenji Africano,
Fox Terrier pelo de arame, Pastor de Shetland e Beagle. Dentre os experimentos
realizados, esses pesquisadores relatam diferenças raciais significativas no
comportamento agressivo de filhotes de 13 a 15 semanas, sendo os filhotes da raça
Fox Terrier os mais agressivos e os de Cocker Spaniel Americano os menos
(SCOTT e FULLER, 1965). Porém, esse estudo considerou comportamentos
agressivos durante interações lúdicas com os filhotes, o que pode não estar
diretamente associado ao comportamento agressivo desses cães quando adultos.
Da mesma forma que características morfológicas podem ser herdadas de
gerações passadas, é possível que características neurofisiológicas ou
comportamentais também o sejam. Portanto, a predisposição genética para diversos
problemas comportamentais pode justificar uma possível associação entre a
agressividade e a raça do cão. Tal relação pode ser justificada com diferenças nos
níveis de neurotransmissores ou a eficiência de seus receptores no Sistema Nervoso
Central (SNC), favorecendo, ou não, o surgimento de problemas como agressividade
ou ansiedade (TAKEUCHI e HOUPT, 2003). Outros artigos associam alterações
estruturais nos cérebros de cães agressivos e não agressivos. Há um aumento do
numero de receptores para andrógenos na amígdala baso-lateral em machos
agressivos comparados a não agressivos (JACOBS et al., 2006). Há um aumento no
número de receptores serotoninérgicos por todo encéfalo (BADINO et al., 2004;
JACOBS et al., 2007) e uma diminuição no número de receptores adrenérgicos
córtex frontal, hipocampo e tálamo (BADINO et al., 2004) dos cães agressivos
comparados aos não agressivos.
Há alterações metabólicas associadas à agressividade. Cães agressivos da
raça Pastor Alemão tiveram menores concentrações de bilirrubina e colesterol total
comparados a cães não agressivos da mesma raça, idade, porte e sexo. A
composição sérica dos ácidos graxos também diferiu, o grupo agressivo apresentou
menores concentrações de Acido Docosahexaenóico (DHA) e uma razão maior de
27
Ácidos graxos omega6/omega3 (RE et al., 2008). Porém, tal estudo merece uma
avaliação no eixo causa-efeito, pois tais alterações podem ter relação com o
estresse. O que fica evidente na pesquisa de Verrier e colaboradores (1987), na qual
os cães induzidos a ataques de fúria tiveram alterações cardíacas, provavelmente
mediadas por catecolaminas.
Há um setor identificado no genoma canino que interfere na captação da
dopamina no cérebro, o que pode estar relacionado com a agressividade de certas
raças (ITO et al., 2004).
Mesmo com todas as possibilidades supracitadas, em um estudo realizado
com cães das raças Pastor Alemão e Rottweiler (SAETRE et al., 2006), os autores
identificaram uma correlação genética em alguns traços de personalidade, mas não
nos traços relacionados à agressividade. Em outro estudo (STRANDBERG et al.,
2005), os autores misturaram ninhadas de Pastor Alemão e realizaram testes de
comportamento com os filhotes e suas mães, obtendo como resultado uma maior
semelhança comportamental nos filhotes em relação às cadelas que os tinham
amamentado e não em relação às mães biológicas, concluindo com isso que o efeito
do ambiente da ninhada tem maior influência no comportamento que a genética
materna. Há ainda outro estudo retrospectivo com proprietários de cães (PÉREZ-
GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009), no qual foi relatada uma associação
significativa entre fatores ambientais, sociais e de manejo no desenvolvimento de
agressões por dominância, o que não foi observado em relação a fatores intrínsecos
aos cães (raça, porte e cor de pelagem).
Aspectos relatados nos parágrafos anteriores poderiam alicerçar os
argumentos favoráveis à associação entre raça e agressividade, porém ainda não é
possível responder à pergunta se há uma associação direta entre agressividade e
raça. Até porque, dentro de uma mesma raça há linhagens diferentes que dependem
das características “da moda”, fato que pode ser regionalizado. A formação dessas
linhagens depende também da seleção dos machos padreadores ou raçadores, que
acontece sempre que um macho se destaca nas exposições e passa a ser muito
procurado para transmitir a suas características morfológicas (GRANDJEAN, 2001,
p.10), o que pode causar um viés dentro dessa raça em relação a características
morfológicas ou comportamentais originadas desse indivíduo.
28
4.2.2- Material e Métodos
O presente estudo teve como bases para a coleta de dados o CAB
(Commonwealth Agricultural Bureaux) abstracts, o MEDLINE® via BVS (Biblioteca
Virtual em Saúde) e o SCIELO (Scientific Eletronic Library on Line). Foram usadas
para a consulta as seguintes palavras chave: “dog” & “aggression”; “dog bites”; e
“canine aggression” em todos os bancos de dados e selecionados trabalhos
publicados de 01 de janeiro de 1997 até 16 de março de 2009. Ao todo, 303
referências foram rastreadas com as palavras-chave (56 do MEDLINE®, 2 do
SCIELO e 245 do CAB - abstract), já excluindo as referências em duplicata. Em um
primeiro momento, os artigos foram triados a partir do título, do resumo e do veículo
de publicação. Os critérios de exclusão foram: (1) artigos escritos em idioma
diferente de inglês, português ou espanhol; (2) trabalhos sobre Raiva (vírus rábico);
(3) cuidados com as lesões causadas pelas mordeduras dos cães; (4) pesquisas
comparativas com outras espécies; (5) trabalhos que relacionavam cães como
coterapeutas (Terapias assistidas por animais, por exemplo); (6) trabalhos que
descreviam ou pesquisavam os tratamentos para distúrbios relacionados à
agressividade; (7) resumos de Congressos, Simpósios, encontros e afins; (8)
capítulos de livros; (9) trabalhos que relatam distúrbios físicos ou doenças
relacionadas à agressividade; (10) trabalhos que relatavam outros comportamentos
que poderiam apenas envolver agressividade no seu contexto (por exemplo, medo);
(11) casos clínicos; (12) trabalhos exclusivamente direcionados a agressões entre
cães.
A segunda fase da seleção iniciou-se com um total de 119 títulos de artigos.
Nessa etapa, a triagem foi feita a partir da leitura do artigo e teve como critérios de
inclusão: (1) inquéritos epidemiológicos de ataques de cães a seres humanos; e (2)
artigos que descrevessem fatores predisponentes ou relacionados à agressividade.
Foram usados como critérios de exclusão desta segunda fase da seleção: (1)
trabalhos que envolviam uma só raça canina; (2) artigos que falavam genericamente
sobre um contexto de agressão (por exemplo, agressão predatória); (3) trabalhos
publicados em periódicos não disponíveis na rede mundial de computadores e não
encontrados no CCN (Catálogo Coletivo Nacional) por não ter acesso possível em
bibliotecas do Brasil.
29
4.2.3- Resultados
Um total de 28 artigos compôs a base de informações da presente revisão e
estão relacionados na tabela 1 que sumariza os aspectos gerais desses trabalhos.
4.2.3.1- Quanto ao desenho metodológico dos artigos
Dos 28, seis são artigos de revisão e descrevem os aspectos relacionados à
agressividade canina. Somente dois artigos de revisão relacionam raças à
ocorrência de agressões contra seres humanos. Overall e Love (2001) fizeram uma
grande busca na literatura a respeito do tema e descreveram que as raças
semelhantes ao American Pit Bull (Pit Bull Type) estiveram envolvidas nos casos
onde as agressões geraram mais lesões e lesões mais graves em suas vítimas,
porém não há relatos de maior casuística de ataques efetuados por tal padrão racial.
O outro artigo de revisão que cita raças agressivas é o de Houpt (2007), no qual a
autora buscou na literatura os casos envolvendo ataques de cães e citou as diversas
raças relacionadas nos trabalhos que compõe sua revisão, porém não há uma
conclusão que permita fazer a associação entre raça e agressividade.
Há dezessete pesquisas retrospectivas, todas elas relatando a epidemiologia
dos ataques com fontes de informação diferentes. Há onze trabalhos que usaram a
informação dos serviços públicos de saúde e citaram raças agressivas (KEUSTER et
al., 2006; ROSADO et al., 2007; SHULER et al., 2008; O'SULLIVAN et al., 2008a) e
outros seis com o mesmo tipo de fonte de dados não citaram (TAN et al., 2004;
FORTES et al., 2007; GEORGES e ADESIYUN, 2008; O'SULLIVAN et al., 2008b;
VUCINIC et al., 2008). Outros três trabalhos (BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ
et al., 2007; YALCN e BATMAZ, 2007) usaram informação de serviços
especializados em etologia clínica, porém Yalcn e Batmaz (2007) não citaram raças
agressivas. Também há alguns com dados coletados em clínicas veterinárias (GUY
et al., 2001a; GUY et al., 2001b; TAKEUCHI e MORI, 2006; O'SULLIVAN et al.,
2008a) e três pesquisas buscaram diretamente dados na população de proprietários
de cães (BRADSHAW e GOODWIN, 1998; DUFFY et al., 2008; MCGREEVY e
MASTERS, 2008).
Três estudos usaram um desenho prospectivo (NETTO e PLANTA, 1997;
SVARTBERG e FORKMAN, 2002; SVARTBERG, 2006) e tinham em comum o fato
de avaliar testes para seleção de cães ou determinar traços de personalidade.
30
4.2.3.2- Quanto às raças mais agressivas
Dos 28 artigos, 15 citaram raças mais envolvidas em casos de agressões ou
com maior potencial para agressividade, sendo os mestiços citados em seis artigos
(GUY et al., 2001a; GUY et al., 2001b; BAMBERGER e HOUPT, 2006; ROSADO et
al., 2007; MCGREEVY e MASTERS, 2008; SHULER et al., 2008). Nas mesmas
condições, a raça Pastor Alemão apareceu citada em três artigos (BAMBERGER e
HOUPT, 2006; KEUSTER et al., 2006; ROSADO et al., 2007), assim como raças
afins ao Pit Bull (ALLEN, 2001; OVERALL e LOVE, 2001; SVARTBERG, 2006),
sendo que uma dessas referências é uma nota editorial, baseada na experiência do
autor (ALLEN, 2001). A raça Retriever de Labrador também apareceu citada em três
artigos (GUY et al., 2001a; GUY et al., 2001b; BAMBERGER e HOUPT, 2006), a
raça Springer Spaniel apareceu citada em dois artigos (GUY et al., 2001a;
BAMBERGER e HOUPT, 2006). Shuler e colaboradores (2008) não se ativeram à
raça especificamente, mas ao grupo racial de acordo com a FCI (Federation
Cynologique Internationale), a conclusão foi que os Terriers e os cães de trabalho
tiveram os maiores índices de mordidas, expressos nesse estudo em número de
ataques registrados no Serviço Público de Controle de Animais em relação a cada
1000 cães licenciados na cidade de Multnomah (Oregon – EUA).
Duffy e colaboradores (2008) fizeram uma avaliação em cães de 30 raças
através de um questionário respondido pelos proprietários dos cães destinado ao
diagnóstico de problemas comportamentais (C-BARQ - Canine Behavioral
Assessment & Research Questionnaire) e encontraram com maiores escores para
agressividade os Dachshunds, Chihuahuas e Jack Russell Terriers. Já no inquérito
realizado por Takeuchi e Mori (2006) com médicos veterinários japoneses, cães da
raça Miniatura Pincher ficaram classificados nas primeiras posições nos critérios de
avaliação de agressividade.
A raça Colie foi citada por O'Sullivan e colaboradores (2008a) e Cocker
Spaniel Inglês e Pastor Catalão foram citados por Fatjó e colaboradores (2007)
como sendo as raças mais frequentemente envolvidas em casos de agressões a
seres humanos em seus estudos na Irlanda e Espanha respectivamente.
31
4.2.4- Discussão
Os artigos pesquisados não apresentaram uma unanimidade em relação a
uma raça mais agressiva. Os mestiços foram os mais citados, porque são
normalmente os mais frequentes em todas as populações caninas, o que aumenta a
probabilidade de ataques por cães sem padrão racial definido. Esses artigos não
explicitaram o tipo de mestiços, se são misturas de duas ou mais raças conhecidas,
ou se são cães sem raça definida. Ressaltando que quando se fala em mestiços é
importante saber que raças compõem a mistura, principalmente quando se procura a
associação entre raça e agressividade.
O artigo de Takeuchi e Mori (2006) foi baseado na experiência e na opinião
dos veterinários japoneses a respeito das 56 raças questionadas. Por não ser
baseada em opiniões, é possível que a classificação das raças tenha sido fruto de
preconceito sobre certas características que passam de profissional para
profissional, tornando-se cultural.
Overall e Love (2001), em seu artigo de revisão, citaram uma série de outras
raças envolvidas em episódios de agressão, além daquelas do tipo Pit Bull. Porém,
os próprios autores comentam que alguns padrões raciais recebem maior ênfase na
mídia, o que pode resultar em exageros da real participação de certas raças nas
estatísticas referentes a ataques de cães. É possível que tal fato gere o seguinte
paradigma: “Todo cão que morde é Pit Bull”. Outro aspecto a ser discutido sobre o
Pit Bull é que nenhum dos trabalhos (ALLEN, 2001; OVERALL e LOVE, 2001;
SVARTBERG, 2006) que citaram este padrão racial como o mais agressivo é
baseado em casuística.
O artigo de Rosado e colaboradores (2007) é o que mais embasa a crítica ao
preconceito contra certas raças. Os autores provaram com dados epidemiológicos a
ineficiência da lei de controle de cães ferozes na Espanha quando compararam
dados de cinco anos anteriores à promulgação da lei com cinco anos sob a vigência
da mesma. Os autores constataram que não houve evidências de diminuição na
casuística de ataques de cães. O que reforça a necessidade de encarar este o
problema promovendo instrução para os proprietários e uma lei de posse
responsável que não discrimine raças.
A genética pode exercer alguma influência na agressividade, porém pode não
haver uma relação direta com a raça e sim com as linhagens dentro das mesmas.
Tal hipótese traz a necessidade de pesquisas específicas dentro das diversas raças,
32
semelhantes à de Saetre e colaboradores (2006), que buscaram associações entre
genética e comportamento em cães das raças Rottweiler e Pastor Alemão, não
encontrando associação entre genética e agressividade.
A dificuldade em encontrar coincidências sobre as raças mais agressivas com
a metodologia utilizada no presente estudo pode ter algumas explicações.
Primeiramente, os estudos foram feitos em países diferentes e isso requer uma
avaliação das linhagens de cada raça em cada país, fato que tem relação com os
padreadores mais usados em cada região (GRANDJEAN, 2001, p.10). Outra
explicação, ainda considerando a distribuição geográfica dos artigos envolvidos
neste estudo, é a hipótese levantada no artigo de Messam e colaboradores (2008)
de que características culturais humanas diferentes possam interferir na
predisposição para ataques dos cães em contextos semelhantes. Além dessas
características geográficas, a diversidade da origem dos dados usados nos artigos
envolvidos e a falta dos dados da população canina em cada região onde foram as
pesquisas realizadas podem ter contribuído para os resultados do presente estudo.
É possível suspeitar que as raças mais envolvidas em ataques sejam
provavelmente as raças mais populares nos locais onde foram realizadas as
pesquisas. Embora a raça possa não apresentar uma relação direta com a
agressividade, não se pode descartar que o potencial em causar danos às vítimas
dos ataques de certas raças. Visto que, raças maiores, mais ágeis e mais fortes
podem provocar lesões mais graves nos indivíduos atacados.
4.2.5- Conclusão
A partir da revisão dos artigos publicados de 1997 a março de 2009 não é
possível afirmar que a haja uma associação clara entre agressividade e a raça dos
cães.
33
34
35
36
4.3 - CAPÍTULO III – COMPARAÇÃO DO COMPORTAMENTO DOMINANTE DE FILHOTES DE
CÃES DE CINCO RAÇAS
“A agressão por dominância é um traço normal, natural, evolutivo, selecionado em várias espécies,
inclusive em caninos.” (Cameron, 1997)
4.3.1 – Introdução
A necessidade de selecionar cães para diversas atividades ou famílias com
aspectos distintos fez com que William Campbell desenvolvesse e publicasse um
teste para seleção de filhotes (CAMPBELL, 1972). Esse teste, que se tornou
conhecido como Teste de Campbell, tem por objetivo avaliar o grau de dominância
do filhote a fim de enquadrar o filhote testado no melhor perfil de família que o está
adquirindo ou facilitar a escolha da atividade mais adequada para esse filhote. Em
teoria, a dominância faz com que os cães assumam postos mais altos em sua
hierarquia social, sendo o conceito oposto à submissão (BEAVER, 2001). Essa
característica se manifesta nos cães com o objetivo de obter o controle dos recursos,
que no ambiente doméstico são: alimento, abrigo, brinquedos, atenção e carinho das
pessoas. O exercício do controle dos recursos pelo cão dominante pode ocorrer em
abordagens pacíficas ou agressivas. A agressão por dominância é o principal
problema de comportamento em cães diagnosticado em serviços de etologia clínica
por todo o mundo (LANDSBERG, 1990).
A questão racial dos cães é polêmica e gera diversos preconceitos sociais
(TWINING et al., 2000) e leis proibindo o trânsito ou a reprodução de algumas raças
(RIO DE JANEIRO, 1999; RIO DE JANEIRO, 2005; ROSADO et al., 2007). Mas a
pergunta que este estudo se propõe a responder é se há realmente diferenças de
tendência à dominância apresentada pelos filhotes das cinco diferentes raças, a fim
de munir os profissionais que trabalham com cães (médicos veterinários,
adestradores e criadores) de informações para prevenir problemas relacionados à
agressividade por dominância.
4.3.2 – Material e Métodos
Foram selecionadas cinco raças, duas do grupo discriminado pela lei nº. 4597
do Estado do Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2005), Rottweiler e Pit Bull. A raça
Bull Terrier foi inserida no estudo por sua semelhança fenotípica com o Pit Bull, por
37
ser citada pela literatura internacional como envolvida em ataques contra seres
humanos (OVERALL & LOVE, 2001) e por ser discriminado pela lei nº 3.489 do
estado do Mato Grosso do Sul (MATO GROSSO DO SUL, 2008). Além dessas três,
foram inseridas na amostragem duas raças tidas como cães de companhia,
populares no Brasil, mas que aparecem em estudos internacionais como
frequentemente envolvidas em ataques contra seres humanos, o Retriever do
Labrador (GUY et al., 2001a) e o Cocker Spaniel Inglês (FATJÓ et al., 2007).
Foram contatados canis dessas cinco raças. Todos ou foram indicados por
duas entidades Cinófilas do Estado do Rio de Janeiro, Kennel Clube Fluminense e
Brasil Kennel Clube, ambas associadas à Confederação Brasileira de Cinofilia ou
pelos próprios criadores que indicavam novos canis para a realização da pesquisa.
Ao todo, 21 canis (3 Bull Terrier; 3 Cocker Spaniel Inglês; 2 Pit Bull; 6 Retriever do
Labrador; 7 Rottweiler) participaram do estudo.
Para a identificação da dominância dos filhotes foi selecionado o teste
Comportamental para seleção de Filhotes de Campbell (1972). Os testes foram
realizados nos canis de origem e todos os filhotes foram testados pela mesma
pessoa. O examinador foi um médico veterinário com experiência na área de
etologia clínica, que não tivera contato anterior com os filhotes e que evitou exibir
qualquer emoção durante os testes.
Nenhum filhote foi caudectomizado anteriormente aos testes e nenhum filhote
de Cocker Spaniel Inglês era de cor sólida.
O teste de Campbell é dividido em cinco etapas, cada uma delas corresponde
a uma manipulação feita com o filhote, na qual sua resposta é avaliada e
classificada como: muito dominante (dd), dominante (d), submisso (s), muito
submisso (ss) e independente/medroso (i). As etapas do teste são:
(A) Atração social: em uma área de no mínimo 3 m2, o examinador posiciona o
filhote de frente para uma parede, se afasta cerca de um metro, se agacha e chama
o filhote batendo palmas sem fazer muito barulho, observa se o filhote atende ou
não esse chamado e como ele o faz. As respostas possíveis incluem: (dd) o filhote
vem prontamente, de cauda erguida, buscando contato com o examinador; (d) o
filhote vem prontamente, de cauda erguida e não faz contato com o examinador; (s)
o filhote vem prontamente, de cauda abaixada; (ss) o filhote vem hesitante, de cauda
abaixada; (i) o filhote ou não vem ou foge.
38
(B) A seguir: na mesma área da etapa anterior, o examinador posiciona o filhote
encostado na parede, mas virado para si, tendo certeza que tem a atenção do filhote
e começa a andar para o centro da área, observando se o filhote o segue e como o
faz. As possíveis respostas incluem: (dd) o filhote segue prontamente o examinador
de pé, cauda erguida, tentando brincar; (d) o filhote segue prontamente o
examinador de pé, cauda erguida; (s) o filhote segue prontamente o examinador
com a cauda abaixada; (ss) o filhote segue hesitante; (i) o filhote não segue
examinador ou foge dele.
(C) Contenção: o examinador posiciona o filhote em decúbito dorsal, o contém
nesta posição por aproximadamente 30 segundos e observa sua reação. Respostas
possíveis incluem: (dd) o filhote se debate vigorosamente mordendo ou rosnando,
com a cauda balançando; (d) o filhote se debate vigorosamente, com a cauda
balançando, sem morder ou rosnar; (s) o filhote se debate e depois se acalma; (ss) o
filhote não se debate e pode lamber a mão do examinador.
(D) Dominância social: o examinador posiciona o filhote em decúbito ventral, em
posição de esfinge, com uma mão o contém na nuca, com a outra afaga seu dorso
por aproximadamente 30 segundos e observa a reação do filhote. Respostas
possíveis: (dd) o filhote se agita, rosna ou tenta morder; (d) o filhote se agita, mas
não exibe comportamento agressivo; (s) o filhote se agita por um curto período de
tempo; (ss) o filhote assume o decúbito dorsal; (i) o filhote foge e não volta.
(E) Dominância Elevada: o examinador contém o filhote com as mãos em torno
do tórax do animal e o levanta do solo aproximadamente 20 cm e observa a reação
do filhote. Respostas possíveis: (dd) o filhote se debate vigorosamente rosnando ou
tentando morder; (d) o filhote se debate, mas não exibe comportamento agressivo;
(s) o filhote se debate depois se acalma e/ou lambe as mãos do examinador; (ss) o
filhote não se debate e pode lamber as mãos do examinador.
Os escores nas diferentes etapas do teste indicam: (dd) dominância
excessiva (5 pontos); (d) dominância (4 pontos); (s) submissão equilibrada (3
pontos); (ss) submissão excessiva (2 pontos); (i) independência ou medo (1 ponto).
A partir da análise dos resultados foram identificados os cães com maiores graus de
dominância, estabelecendo-se uma classificação entre os filhotes de forma
decrescente.
Ao todo, 265 filhotes foram submetidos ao Teste de Campbell (1972), 138
cães da raça Retriever do Labrador (77 machos e 61 fêmeas), 71 cães da raça
39
Rottweiler (35 fêmeas e 36 machos), 31 da raça Bull Terrier (15 fêmeas e 16
machos), 13 Cocker Spaniel Inglês (nove fêmeas e quatro machos) e 12 da raça
American Pit Bull (sete fêmeas e cinco machos). Todos os cães tinham idade
compreendida entre seis e oito semanas, foram oriundos de canis especializados em
suas raças no estado do Rio de Janeiro e nasceram no período de março de 2008 a
junho de 2009.
As pontuações foram tabuladas e comparadas estatisticamente pelo teste de
Kruskal-Wallis e a comparação entre os pares pelo teste de Mann-Whitney através
do programa BioEstat® 5.0, com nível de significância de 5% (α=0,05). O mesmo
programa foi usado para realizar a estatística descritiva.
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética para uso de animais em
pesquisa da Universidade Federal Fluminense (protocolo # 0020/2008)
4.3.3 – Resultados
A comparação entre os resultados totais entre os sexos através do teste de
Kruskal-Wallis não teve diferença significativa (P=0,78). Assim como não houve
diferença significativa entre o tamanho das ninhadas (P=0,12)
Na avaliação global (Tabela 2), os filhotes de Labrador obtiveram pontuação
significativamente superior aos de Rottweiler (P=0,02) e Bull Terrier (P=0,02).
Tabela 2 – Comparação das medianas dos resultados dos Testes de Campbell aplicados a filhotes de cinco raças. Niterói – RJ, UFF, 2010. Retriever do
Labrador Rottweiler Bull Terrier Cocker
Spaniel Inglês Pit Bull
Nº. Filhotes 138 71 31 13 12 Número de Ninhadas 20 11 5 3 2 Etapas do teste Medianas
Atração Social 4a 3a 3b 2 4,5b A Seguir 4e 1cdef 3d 4f 3c Contenção 2g 2 2 3g 2 Dominância Social 2h 3i 1hijk 2j 3k Dominância Elevada 2 2 2 2 2 Avaliação Global 13lm 12l 12m 13 14,5 Resultados das comparações a partir do teste de Mann-Whitney- a,b,c,d,f,l,m – P<0,05; e,k – P<0,001; g,j- P<0,01; h,i –P<0,0001
Os resultados do teste de Kruskal-Wallis na pontuação para a etapa de
“Atração Social” (Tabela 2) apresentaram diferença significativa entre os resultados
(P=0,03). Na comparação entre os pares, os filhotes de Labrador apresentaram
pontuação significativamente maior do que os de Rottweiler (P=0,04). Os filhotes de
40
Pit Bull apresentaram pontuação significativamente maior que os de Bull Terrier
(P=0,04). Nenhum dos demais pares apresentou diferença significativa.
Na segunda etapa do teste (“A Seguir”), os resultados apresentaram diferença
significativa entre as respostas (P<0,01). Na comparação entre os pares (Tabela 2),
os filhotes de Rottweiler apresentaram pontuação significativamente menor do que
os todos os outros filhotes (P<0,05). Poucos filhotes de Rottweiler demonstraram
posturas características de medo durante os testes. Esses filhotes simplesmente não
seguiam o examinador na segunda etapa do teste. Os filhotes, em sua maioria, o
acompanhavam com o olhar permanecendo atentos, porém sem se deslocarem ou
então começavam a cheirar o chão e se deslocavam em outra direção,
demonstrando independência.
Na etapa de “Contenção” (Tabela 2) houve diferença significativa entre as
respostas (P=0,04). Na comparação entre os pares, os filhotes de Cocker Spaniel
Inglês tiveram pontuação significativamente maior que os de Labrador (P<0,01). Os
filhotes de Cocker Spaniel Inglês se debateram sem exibir reações agressivas com
muito mais frequência que os filhotes de Labrador, que em sua maioria aceitaram a
contenção em decúbito dorsal sem reações, o que justifica a maior pontuação dos
primeiros. Nenhum dos demais pares teve diferença significativa.
Na quarta etapa do teste (“Dominância Social”), os resultados do teste de
Kruskal-Wallis (Tabela 2) apresentaram diferença significativa entre os resultados
(P<0,01). Na comparação entre os pares, os filhotes de Bull Terrier tiveram
pontuação significativamente menor do que os de Labrador (P<0,0001), de
Rottweiler (P<0,0001), de Cocker (P<0,01) e de Pit Bull (P<0,001). Nessa etapa,
ocorreu com os filhotes de Bull Terrier o mesmo fenômeno da segunda etapa entre
os filhotes de Rottweiler e os demais. Os filhotes de Bull Terrier se comportaram de
forma muito semelhante na quarta etapa do teste (“Dominância Social”) e saíam da
posição de esfinge se deslocando para longe do examinador sem exibição de sinais
de medo.
Na quinta etapa (“Dominância elevada”) poucos filhotes reagiram à
manipulação, permanecendo praticamente inertes quando suspensos. Houve
diferença significativa (Tabela 2) entre as respostas (P=0,02) a partir do teste de
Kruskal-Wallis, mas nenhum dos pares apresentou tal diferença de forma
significativa.
41
Nas etapas de “Contenção”, “Dominância Social” e “Dominância Elevada”,
cinco cães exibiram comportamentos agressivos em alguma dessas fases, e tal
reação foi independente de raça, ou seja, representantes de todas as raças reagiram
agressivamente em algum desses testes.
4.3.4 – Discussão
A proporção do número de filhotes testados no presente estudo obedeceu à
proporção de filhotes nascidos no período dos testes, e registrados pelo Kennel
Clube Fluiminense (Labrador, 66; Rottweiler, 52; Cocker Spaniel Inglês, 16; Bull
Terrier, 15, Pit Bull, 7).
O teste de Campbell é uma avaliação subjetiva e foi idealizado para a seleção
de filhotes pelo futuro proprietário. O instrumento é sujeito a variáveis que foram
minimizadas no presente estudo pelo fato de que todos os testes foram realizados
pela mesma pessoa e em ambiente não hostil aos filhotes, todos com idades entre
seis e oitos semanas. Mesmo com as limitações, o teste não perde sua validade na
comparação entre filhotes, por isso o teste tem sido aplicado em pesquisas
científicas para avaliar dominância em filhotes (PÉREZ-GUISADO et al, 2006).
Os resultados da avaliação global do teste mostram os filhotes de Pit Bull com
maiores pontuações em relação às demais raças, porém a diferença não foi
significativa após os testes estatísticos. Tal fato pode ser decorrente do tamanho da
amostra de filhotes de Pit Bull (n=12), porém mostra um resultado sugestivo de
maior dominância nesses filhotes, o que parece concordar com a imagem de cão
feroz que a população tem da raça, considerando a falsa associação popularmente
feita entre agressividade e dominância (ASKEW, 2003). Esse resultado também
pode explicar em parte os resultados obtidos em um estudo italiano (CAPRA et al.,
2009) onde os Pit Bulls, submetidos a outros testes de comportamento diferentes do
de Campbell, obtiveram pontuações significativamente maiores para agressividade
contra outros cães, comparados aos controles, porém sem diferença na
manifestação de agressividade contra pessoas desconhecidas.
Na comparação entre os filhotes de Labrador com os de Rottweiler, na
interpretação do Teste de Campbell, a maior pontuação dos primeiros aponta uma
maior tendência à dominância. Contudo, ao analisar os resultados de cada etapa,
observa-se que tal diferença numérica pode ser consequente de maior
independência dos filhotes de Rottweiler, sugerida pela maior frequência de cães
42
com um ponto na etapa “A Seguir”. O mesmo ocorreu com a maioria dos filhotes de
Bull Terrier. Eles se comportaram de forma muito semelhante na quarta etapa do
teste (“Dominância Social”) e simplesmente saíam da posição de esfinge se
deslocando para longe do examinador sem exibição de sinais de medo. Um ponto
significa ao mesmo tempo independência ou medo do filhote, características
diametralmente opostas. Essa independência segundo o autor do teste
(CAMPBELL, 1972) deixa dúvidas quanto à dominância, mas na opinião dos autores
da presente pesquisa, tal independência pode ser um indicativo de dominância e a
certeza da necessidade de um trabalho diferenciado para a socialização desses
filhotes. Esta contradição nos resultados poderia ser resolvida com uma
reformulação do teste de Campbell, na relação de comportamentos esperados,
separando respostas características de medo e independência, nas etapas de “A
Seguir” e “Dominância Social”, assim como na etapa “Atração Social”.
O teste de Campbell tem como principal fator de restrição o fato de listar
somente quatro ou cinco possibilidades de reação do filhote a cada manipulação
proposta. Tal fato obriga a quem realiza o teste ter conhecimentos em etologia
canina para enquadrar certos comportamentos apresentados ao mais próximo
listado no teste. Por exemplo, na avaliação de “Dominância Social”, houve filhotes
que não se agitaram, não assumiram decúbito dorsal nem tentaram fugir,
simplesmente permaneceram na mesma posição aceitando passivamente a
manipulação.
O presente estudo não encontrou diferenças nos padrões de dominância
entre os sexos, diferente do que foi encontrado por Pérez-Guizado e colaboradores
(2006) que também usaram o Teste de Campbell para comparar padrões
comportamentais de filhotes de Cocker Spaniel Inglês. Os pesquisadores espanhóis
encontraram maiores indícios de dominância em machos do que em fêmeas da raça
avaliada.
O temperamento das mães e as diferenças de manejo (por exemplo,
alimentação dos filhotes, alimentação das mães e a personalidade dos tratadores)
de um criador para outro não foram considerados no presente estudo.
Slabbert e Odendaal (1999) conseguiram prever em filhotes com oito
semanas eficiência para treinamento de busca e com nove meses eficiência para
prever agressividade. Apesar disso, os testes com filhotes de oito semanas parecem
não ser eficientes em prever o comportamento dos animais quando adultos, de uma
43
forma mais ampla, como no estudo realizado por Wilsson e Sundgren (1998). Isso
ocorre, provavelmente, porque o resultado imediato do teste não prevê a reação do
filhote à forma com que será criado até a vida adulta nem a sua relação com o
proprietário, ideia já sugerida por Campbell (1972) ao divulgar o teste
comportamental para seleção de filhotes. Corroborando esta ideia, foi relatado em
um estudo realizado na Espanha (PÉREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009)
no qual se identificou alguns fatores associados aos casos de agressão por
dominância como: o fato do cão ter alimento a vontade; cães que caminham ou
interagem pouco com seus proprietários; cães sem um processo de educação
básica; e proprietários que tem um cão pela primeira vez. Todos esses detalhes
devem ser considerados na seleção dos filhotes, associado ao teste, para assim
prevenir problemas de agressividade por dominância nos cães, principalmente raças
envolvidas no presente estudo por serem populares no Brasil.
4.3.5 – Conclusão
Há diferença significativa em relação ao padrão de dominância nos filhotes
das raças envolvidas no presente estudo. Fato este que pode influenciar na
manifestação da agressividade dessas raças na vida adulta desses cães. Porém
houve um destaque maior para a independência das raças Rottweiler e Bull Terrier
do que para o padrão dominante das demais. Essa diferença pode evidenciar a
necessidade de trabalhos específicos de socialização das diferentes raças a fim de
evitar manifestações agressivas desses cães quando adultos.
44
4.4 - CAPÍTULO IV – PERFIL DOS COMPRADORES DE FILHOTES DE QUATRO RAÇAS
“Um aspecto central do comportamento dos animais domésticos é, obviamente, a interação entre o
animal e o humano.” (Ladewig, 2005)
4.4.1 – Introdução
Analisar razões para comportamentos de cães domésticos sem olhar para os
seres humanos que convivem com esses cães é uma tarefa inútil, visto que a
relação inadequada entre seres humanos e cães pode até não ser a única causa
dos diversos distúrbios comportamentais descritos, mas certamente, agrava,
predispõe e complica tais distúrbios (O´FARRELL, 1997; BÉNÉZECH, 2003;
LADEWIG, 2005). A ansiedade do proprietário pode levar o cão a desenvolver
distúrbios de ansiedade (O´FARRELL, 1997), assim como o humor do condutor pode
alterar o nível de estresse do cão, o que já foi comprovado avaliando níveis séricos
de cortisol de cães vencedores e perdedores em provas de agility (JONES e
JOSEPHS, 2006).
Há uma tendência, estudada na psicologia, de que as pessoas escolhem
seus animais baseando-se na busca por semelhanças entre si e seu animal de
estimação, projetando no animal seus próprios sentimentos e atribuindo a eles
sentimentos como amor, afeição, obediência e lealdade (ALGER e ALGER, 1997).
Para avaliar personalidade de seres humanos, diversos testes psicológicos
foram desenvolvidos ao longo dos anos, a fim de tornar objetivos aspectos
subjetivos da psicologia. Como exemplo, se pode citar o MMPI - Inventário
Multifásico de Personalidade Minesota (DAHLSTROM et al, 1972) e o questionário
de agressividade (GALLARDO-PUJOL et al., 2006).
Ante a realidade de que a personalidade ou o humor do proprietário possa
afetar o comportamento do cão, no presente estudo buscou-se correlacionar itens da
personalidade do proprietário com seleção da raça a fim de encontrar pistas para
responder a perguntas como: “Quem procura um cão para guarda tem personalidade
diferente de quem procura um cão para companhia?”
45
4.4.2 – Material e Métodos
Pessoas que compraram os filhotes avaliados no capítulo III foram contatadas
e convidadas a participar da pesquisa. Os contatos foram feitos via correio
eletrônico, mesma via por onde foram enviados os questionários.
Cada voluntário foi submetido a dois testes psicológicos. O primeiro foi o
MMPI (DAHLSTROM et al, 1972), validado para uso no Brasil pelo CEPA (Centro
Editor de Psicologia Aplicada). Teste que é baseado em 366 afirmativas, as quais o
respondente classifica como certas ou erradas de acordo com uma autoavaliação de
sua personalidade. As respostas foram tabuladas e encaminhadas à Médica
Psiquiatra responsável pela avaliação dos testes. O MMPI, em sua versão resumida
(utilizada no presente estudo), possui três escalas de validação: Escala de Dúvida,
Escala de Mentira e Escala de Erro. A Escala de Dúvida é relacionada às afirmativas
não respondidas. A Escala de Mentira visa informar até que ponto a pessoa desejou
insinuar melhor aparência do que sua realidade psicológica, ou seja, a pessoa que
desejou apresentar-se mais socialmente favorável. A Escala de Erro visa verificar se
o examinado compreendeu os itens, se cooperou apropriadamente ou não, ou se
ocorreram erros no preenchimento do cartão de respostas. Esta última condição foi
minimizada pelo fato de o conjunto de afirmativas ter sido enviado por correio
eletrônico e a pessoa responder no próprio arquivo. Foram excluídos os dados de
qualquer respondente que tenha sido acusado por qualquer uma dessas escalas.
A versão resumida do MMPI gera nove escalas clínicas: Hipocondria (Hs),
Depressão (D), Histeria (Hy), Desvio Psicopático (Pd), Masculinidade-Feminilidade
(MF), Paranóia (Pa), Psicastenia (Pt), Esquizofrenia (Sc) e Hipomania (Ma). No
presente estudo, optou-se por não utilizar a escala MF dado que sua precisão refere-
se mais ao gênero masculino. A Escala D mede a profundidade do sintoma clínico
ou do complexo de sintomas conhecido como Depressão, que pode ser a principal
incapacidade do indivíduo ou vir acompanhada de outros problemas de
personalidade (como causa ou consequência). A escala Hy mede em que grau o
indivíduo se assemelha aos pacientes que tenham desenvolvido sintomas de
psiconeurose do tipo histeria de conversão. A escala Pd mede a semelhança do
indivíduo com um grupo de pessoas, cuja principal dificuldade se encontra na
ausência de respostas emocionais profundas, na inabilidade de participar
psicologicamente das experiências a que está sendo submetido e no desrespeito de
costumes sociais. A escala Pa derivou do contraste entre pessoas normais e um
46
grupo de pacientes clínicos que se caracterizavam pela desconfiança,
hipersensibilidade e delírios de perseguição. A escala Pt mede a semelhança do
respondente com pacientes psiquiátricos perturbados por fobias ou comportamentos
compulsivos (Transtorno Obsessivo Compulsivo). A escala Ma mede o fator de
personalidade característico das pessoas que apresentam superatividade no
pensamento e na ação, ou seja, excitamento emocional e fuga de ideias. A escala
Hs indica tendência à preocupação extrema com doenças e a escala Sc mede a
tendência a esquizofrenia, distúrbio psiquiátrico caracterizado pelo fato da pessoa
ter alucinações e encará-las como se fossem reais (HATHAWAY e MCKINLEY,
1972) Considerou-se a pontuação de 60 como ponto de corte (SILVA et al., 2001)
em qualquer das escalas para considera-las como “positivas”, apesar de ser
necessária uma abordagem clínica individualizada para fechar o diagnóstico do
respondente.
O outro teste foi o Questionário de Agressividade (QA) adaptado para o
português de Gallardo-Pujol e colaboradores (2006). Este teste é baseado em 12
afirmativas para as quais o respondente classifica como: (1) “nunca”, (2)
“raramente”, (3) “às vezes”, (4) “quase sempre” e (5) “sempre”. A essas respostas se
atribuem notas de um a cinco na ordem apresentada. O teste gera quatro escalas:
Agressividade Verbal, Agressividade Física, Hostilidade e Raiva. As duas primeiras
compõem as partes instrumental e motora do comportamento, respectivamente. A
escala de Hostilidade representa o componente cognitivo do comportamento e a
escala de Raiva representa o componente emocional e afetivo do comportamento.
A adaptação da versão em espanhol do QA foi feita no presente estudo
usando o método de tradução reversa (back translation), o qual é um procedimento
para investigar a equivalência conceitual entre a versão original e a versão traduzida
para o português. Para isso, um tradutor bilingue brasileiro traduziu a versão em
espanhol para o português, em seguida um tradutor bilingue mexicano traduziu a
versão em português para o espanhol. Finalmente, a versão original e a com
tradução reversa foram comparadas em busca de significados não equivalentes e
nenhuma discrepância foi observada.
Além dos dois questionários, a seguinte pergunta foi proposta: “Com que
finalidade escolhi este cão? Por quê?” A fim de entender as motivações dos
proprietários por cada raça. O respondente também foi caracterizado em relação a:
sexo, idade, número de filhos e grau de escolaridade.
47
Para possibilitar inferências estatísticas mais confiáveis, as pessoas foram
agrupadas em: Grupo A - proprietários de cães de companhia (Cocker e Labrador); e
Grupo B - proprietários de cães de guarda ou briga (Rottweiler e Bull Terrier).
Os dados foram tabulados dividindo os proprietários em quatro subgrupos, de
acordo com a raça adquirida e foram avaliados estatisticamente com testes não
paramétricos de Kruskal-Wallis e a comparação entre os pares pelo teste de
Student-Newman-Keuls. Após o agrupamento, os grupos foram comparados através
do teste de Mann-Whitney e também foi feito o teste de correlação de Spearman
para comparar a influência das variáveis entre si. Todos os testes foram realizados
através do programa BioEstat® 5.0, com nível de significância de 5% (α=0,05).
Para o cálculo do coeficiente de Spearman foram feitas duas abordagens,
uma incluindo os respondentes do MMPI e outra os excluindo. Os cálculos foram
feitos a partir da divisão dos resultados em variáveis binárias com o seguinte critério:
Sexo (Mulheres=1 e Homens=2); Idade (valores iguais ou inferiores à mediana=1;
valores superiores à mediana=2); Raça escolhida (Guarda ou Briga=1 e de
Companhia=2); Avaliação do MMPI (positivo para qualquer escala=1 e negativo em
todas as escalas=2) e as avaliações do questionário de agressividade para todas as
escalas foram as mesmas (valores iguais ou inferiores à mediana=1; valores
superiores à mediana =2).
Houve a necessidade de o respondente ser maior de idade e assinar um
termo de consentimento livre e esclarecido aprovado junto com o projeto pelo
Comitê de Ética Institucional da Universidade Federal Fluminense (protocolo #
017/08).
4.4.3 – Resultados
Dos 265 filhotes testados no capítulo III, fez-se contato com 127 proprietários,
e desses, 52 responderam ao Questionário de Agressividade (20 homens) e 37 ao
MMPI (15 homens).
Na tabela 3 encontra-se a distribuição dos contatados e respondentes de
acordo com a raça do cão escolhido. Com o detalhe de que uma respondente tinha
dois cães da mesma raça, por isso foi contada apenas como uma unidade para
todas as análises a seguir. Uma única pessoa (proprietária de Labrador) respondeu
ao MMPI e não respondeu ao QA, todos os demais responderam ao QA.
48
Tabela 3: Número pessoas que responderam aos questionários aplicados a proprietários de filhotes de cães de cinco raças, Niterói – RJ, UFF, 2010.
Raça Filhotes – Nº Contatados – Nº (%) QA* - Nº (%) MMPI# - Nº (%)
BT 31 21 (67,7) 12 (57,1) 9 (42,8)
CSI 13 9 (69,2) 4 (44,4) 4 (44,4)
RL 138 63 (45,6) 25 (39,7) 16 (25,4)
PB 12 5 (41,7) 0 0
Rot 71 29 (40,8) 10 (34,5) 7 (24,1)
Obs.: * Questionário de agressividade (GALLARDO-PUJOL et al., 2006) # Inventário Multifásico de Personalidade Minesota (DAHLSTROM et al, 1972) BT= Bull Terrier ; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; PB = Pit Bull; Rot = Rottweiler
Na tabela 4 encontra-se a distribuição dos respondentes ao QA de acordo
com a raça do cão escolhido, número de filhos, média de idade e grau de instrução.
Agrupando por raça e comparando através do teste t de Student a idade dos
proprietários, os de Bull Terrier foram mais jovens do que os de Labrador (P=0,03).
Nenhuma outra combinação de pares de grupos apresentou diferença significativa.
Tabela 4: Frequência absoluta dos compradores de filhotes no período de março de 2008 a junho de 2009, segundo a raça do cão, grau de instrução, número de filhos e média etária dos respondentes do Questionário de Agressividade traduzido de Gallardo-Pujol et al. (2006). Niterói – RJ, UFF, 2010.
Grau de Instrução Número de Filhos Média etária (anos)
Raça Médio Superior Pós-graduação Nenhum 1-2 3-4 (media± desvio padrão)
BT 3* 8 - 7 4 1 29,1± 7,7
CSI 1 2 1 1 3 - 32,5± 7,6
RL 4 11 10 9 13 3 36,3 ± 7,2
Rot
3 3 4 3 7 - 36,2±9,3
Obs.: * Um respondente não informou seu grau de escolaridade BT= Bull Terrier; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; Rot = Rottweiler
Em relação à pergunta proposta aos novos proprietários, foram extraídos os
núcleos significativos das respostas e os dados foram agrupados de maneira a
comparar as motivações por categoria de respostas. Os resultados dessa
comparação encontram-se na tabela 5. Ressaltando que em algumas respostas foi
possível extrair dois núcleos significativos. Dois proprietários de Labrador tiveram
como finalidade “Guarda” e “Companhia”, assim como três proprietários de
49
Rottweiler. Um outro proprietário de Rottweiler alegou razões estéticas associadas à
guarda.
Tabela 5: Frequência relativa, por raça, dos núcleos significativos das respostas de compradores de filhotes de cães à pergunta: “Com que finalidade escolhi este cão?”, Niterói – RJ, UFF, 2010.
Núcleo Significativo (%) Raça (nº) Guarda Criação Companhia Estética Indefinido BT (12) 8,3 25,0 50,0 16,7 - CSI (4) - 25,0 75,0 - - RL (22) 9,1 - 86,4 9,1 4,5 Rot (10) 70,0 30,0 30,0 10,0 - OBS. Em algumas respostas houve mais de um núcleo significativo, por isso algumas linhas não fecham 100% BT= Bull Terrier; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; Rot = Rottweiler
Três proprietários de Labrador deixaram alguma das questões do QA em
branco, por isso foram excluídos da amostra. A frequência de categorias de
respostas ao QA encontra-se na tabela 6. Na aplicação do teste de Mann-Whitney,
grupo de proprietários de cães de companhia teve valores significativamente
maiores que o outro grupo na subscala Hostilidade (P<0,01), que foi a única
subescala de apresentou diferenças significativas.
Tomando como base o MMPI, não houve diferença significativa entre os
grupos através do teste de Mann-Whitney (P>0,05). Os resultados foram tabulados e
estão expressos na tabela 7.
Comparando as variáveis através do teste de correlação de Spearman,
observou-se uma correlação positiva entre a subescala de Hostilidade com a
subescala de Agressão Verbal (P=0,01) e com a subescala de Raiva (P<0,01).
Confirmou-se a correlação positiva entre as pessoas do grupo racial de companhia e
50
a subescala de Hostilidade (P<0,01). Nenhuma outra combinação apresentou
correlação positiva.
Tabela 7: Frequência absoluta por grupos raciais dos resultados da aplicação do Inventário
Multifásico de Personalidade Minesota em proprietários de filhotes de cães, Niterói – RJ, UFF,
2010.
D Hy Pa Pd Pt Ma Hs Sc
Grupo (nº) ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60
A* (16) 10 3 14 2 14 2 15 1 15 1 16 0 13 3 15 1
B# (20) 15 5 17 3 18 2 17 3 19 1 19 1 16 4 19 1
* Proprietários de cães das raças Rottweiler e Bull Terrier # Proprietários de cães das raças Retriever do Labrador e Cocker Spaniel Inglês
D = Depressão Hy = Histeria Pa= Paranóia Pd = Desvio Psicopático
Pt = Psicastenia Ma = Hipomania Hs = Hipocondria Sc= Esquizofrenia
Analisando os resultados do MMPI quanto ao traço dominante entre as
escalas clínicas, observa-se que as pessoas do grupo dos cães de guarda ou briga
tiveram com mais frequência perfis dominantes para Histeria (37,5%), seguidos por
Depressão (31,3%). Já no grupo dos cães de companhia, houve a predominância de
duas escalas em valores iguais, Depressão e Hipocondria (20,0%).
4.4.4 – Discussão
A dificuldade de recrutar voluntários se deu pela dificuldade e obter
informações dos novos proprietários dos filhotes com os criadores e pela recusa de
muitos convidados. O fato de que alguns criadores não repassaram os dados dos
compradores ficou claro na diferença de 137 (51,7% dos novos proprietários)
indivíduos com os quais o contato não foi possível. Outra dificuldade foi conseguir
que os contatados concordassem em responder aos questionários, apenas 41,4%
responderam ao questionário de agressividade. O número de respostas ao MMPI foi
ainda menor, provavelmente, pelo tamanho do questionário (366 afirmativas), mas
este foi mantido no estudo em virtude da qualidade e da segurança da informação
gerada por ele.
É provável que a dificuldade em se conseguir respostas dos proprietários de
Pit Bull, assim como o acesso aos criadores, se deva à Lei nº. 4597 do Estado do
Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2005), a qual proíbe a reprodução dos cães
dessa raça no Estado. Essas pessoas podem ter se sentido amedrontadas em
51
divulgar seus dados para uma pesquisa realizada por uma instituição federal de
ensino, apesar do compromisso firmado pelo termo de consentimento de não
divulgação desses dados. Um novo estudo focando pessoas que compram filhotes
de Pit Bull é necessário para avaliar se há diferenças nos perfis psicológicos dessas
pessoas que as levem a temer participar da pesquisa, por exemplo.
Proporcionalmente os proprietários de Bull Terrier foram os que mais
colaboraram, contrastando com os de Pit Bull que não responderam um questionário
sequer. Apesar da superioridade numérica, apenas 23,4% dos proprietários de
Labrador convidados responderam ao MMPI. Essa diferença na colaboração pode
ser um indício de diferença entre os proprietários das raças pesquisadas. Os
proprietários de cães de menor estatura (Cocker e Bull Terrier) mostraram-se mais
colaboradores que os de maior estatura (Labrador e Rottweiler).
A amostra do presente estudo foi constituída por pessoas que compraram
filhotes em canis registrados em entidades cinófilas, ou seja, filhotes relativamente
caros para o poder aquisitivo da maioria da população brasileira e isso se evidencia
no grau de instrução dos respondentes. Não houve qualquer respondente com nível
escolar fundamental e 76,7% dos respondentes tinham nível superior. A
escolaridade dos respondentes também pode ter relação com a forma de contato
(correio eletrônico) que pode ter excluído pessoas de menor instrução ou sem
acesso a um computador pessoal. A diferença proporcional de escolaridade dos
proprietários de Bull Terrier para os demais, acompanha a média etária, portanto, é
provável que a juventude dos proprietários de Bull Terrier, traduza sua escolaridade
proporcionalmente inferior a dos outros grupos, principalmente em relação aos
proprietários de Labrador. É possível também que a menor faixa etária dos
proprietários de Bull Terrier respondentes traduza sua maior participação
proporcional no estudo, o que também se reflete no proporcional menor número de
filhos em relação aos outros grupos, principalmente dos proprietários de Labrador e
Rottweiler. O pequeno número de filhotes de Cocker Spaniel Inglês submetido ao
teste no Capítulo III dificulta qualquer abordagem de comparação com as outras
raças.
O índice de rejeição ao convite para participar da pesquisa pode estar
relacionado com o tema, com a abordagem psicológica ou ainda com a forma de
contato via correio eletrônico.
52
Em relação à finalidade da escolha do filhote, pode-se perceber que vários
proprietários (14,6%) escolheram o cão por razões cinotécnicas, para serem
reprodutores em seus canis. Tal fato se deve á característica da amostra de que
todos os filhotes foram oriundos de canis registrados em entidades cinófilas.
Também ficou evidente a diferença de motivação para a escolha dos Rottweiler e
dos Labradores. Os primeiros tiveram 70% das respostas como “Guarda” contra o
segundo que teve mais de 86% das respostas como “Companhia”.
A escala de Hostilidade dos proprietários de cães de companhia teve valores
maiores do que os proprietários de cães de guarda ou briga. As raças com maior
percentual de escolhas para companhia obtiveram maior pontuação na escala de
hostilidade comparada às demais. Aparentemente, o que se esperaria era o inverso,
porém faz-se necessário uma análise psicológica mais profunda para compreender o
porquê dessa diferença, pois este resultado abre mais perguntas do que responde.
Tal resultado pode encontrar explicações na psicologia. Uma hipótese seria o fato de
pessoas mais hostis ou que apresentem dificuldades em se relacionar com outras
pessoas buscarem cães de companhia para suprir essa carência. Outra hipótese
seria sustentada pelo conceito psicanalítico de Projeção (LAPLANCHE, 1998) que é
a operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro (pessoa ou coisa)
qualidades, sentimentos ou desejos que desconhece ou recusa em si próprio. Essa
segunda hipótese, então, diz que aqueles com menores valores na escala de
hostilidade assim aparecem por projetar sua hostilidade em um cão que intimide, e
não reconhece esse traço de sua personalidade, portanto não identifica como suas
as opções que o teste apresenta. Ainda há uma terceira hipótese, em que as
pessoas que procurem cães com aspecto intimidador o fazem para lidar com a sua
baixa hostilidade, ou seja, por se sentirem desprotegidas devido a sua
personalidade, buscam segurança no aspecto intimidador do cão. Em uma pesquisa
norteamericana, as autoras (WOODWARDS e BAUER, 2007) relataram maior
hostilidade em pessoas que preferiram gatos a cães, comparados com o grupo com
a escolha inversa. Os autores do estudo norteamericano justificam a escolha dos
gatos por pessoas com maior hostilidade em virtude de personalidade
aparentemente mais hostil e desapegada dos felinos, como uma forma de
reciprocidade. Porém, juntando os dois resultados, pode-se formular uma hipótese
de que quanto maior a hostilidade do indivíduo, maior a sua tendência em escolher
um animal de aspecto geral menos intimidador.
53
A diferença na escala de hostilidade entre os grupos é um indício forte de
diferenças na busca por um ou outro estereotipo racial canino. Tal busca é, muitas
vezes, baseada em conceitos pré-estabelecidos para uma raça ou outra (WRIGHT et
al, 2007). Este resultado é uma evidência de que a personalidade do proprietário
pode interferir na escolha da raça.
A comparação entre variáveis através do teste de correlação de Spearman
mostrou que idade e sexo do proprietário ou o fato de ter ou não indícios de
distúrbios psiquiátricos não influenciaram no aumento dos valores da subescala de
hostilidade. O que reforça a escolha pelo grupo racial como o diferencial entre os
respondentes.
O fato de não haver diferenças significativas entre os proprietários com
relação aos resultados do MMPI pode ter sido decorrente do tamanho da amostra,
fazendo-se necessário repetir o estudo com uma amostra maior para que se chegue
a uma conclusão definitiva, até mesmo para confirmar a manutenção da diferença
entre os traços dominantes das pessoas dos dois grupos. Porém, apesar de o teste
ser completo e confiável, este mede escalas clínicas de problemas psiquiátricos que
podem realmente não apresentar um padrão para a escolha de uma determinada
raça ou outra, devido à grande variedade de fatores envolvidos com tais problemas
psiquiátricos.
4.4.5 – Conclusões
Pessoas que escolhem a raça Retriever do Labrador, o fazem em busca de
companhia e pessoas que escolhem a raça Rottweiler procuram mais um animal
para Guarda. Aqueles que escolheram cães das raças Retriever do Labrador ou
Cocker Spaniel Inglês apresentaram escalas maiores para hostilidade comparados
aos que escolheram cães das raças Rottweiler ou Bull Terrier.
54
4.5 - CAPÍTULO V – AVALIAÇÃO DA INFLUÊNCIA DA AGRESSIVIDADE DO PROPRIETÁRIO NA
MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE DO CÃO
“A palavra agressão traz como significado à mente humana: maldade, sordidez ou vingança,
mas não é o que acontece na mente dos cães.” (FOGLE, 1992)
4.5.1 – Introdução
Neste capítulo, buscou-se testar a correlação entre a agressividade do
proprietário e itens de manejo com a manifestação da agressividade do cão,
seguindo a mesma lógica do capítulo anterior, onde se relacionou a personalidade
do proprietário à escolha da raça. Também se buscou a associação entre perfil do
proprietário e o manejo com o medo do cão, visto que há uma associação entre
medo e agressividade (DUFFY et al., 2008; MILLS e ZULCH, 2010).
4.5.2 – Material e Métodos
Para esta fase da pesquisa, foi utilizado um questionário (ANEXO 2)
constituído de cinco partes: (1) termo de consentimento livre e esclarecido (aprovado
junto com o projeto pelo Comitê de Ética Institucional da Universidade Federal
Fluminense - protocolo # 017/08); (2) identificação do respondente; (3) QA -
questionário de agressividade (o mesmo do capítulo IV); (4) identificação do animal e
do manejo; (5) as seções de agressividade e medo do Questionário para Avaliação e
Pesquisa Comportamental de Cães (Canine Behavioral Assessment & Research
Questionnaire – CBARQ), desenvolvido e validado por Hsu e Serpell (2003).
Este questionário foi aplicado inicialmente a oito respondentes para avaliar o
tempo gasto com o preenchimento e se a terminologia estava clara. A amplitude do
tempo de resposta variou de 15 a 25 minutos e nenhum respondente teve
dificuldades com a terminologia empregada.
Alunos do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense
foram recrutados para ajudar na distribuição dos questionários entre seus amigos,
parentes e clientes das clínicas se fizessem estágio em clínicas particulares. O
recrutamento aconteceu durante aulas das disciplinas de Genética e Melhoramento,
Fisiologia Veterinária II, Clínica Médica de Pequenos Animais I e II. Os alunos foram
treinados para orientar no preenchimento do questionário. Foram distribuídos 300
questionários aos alunos, cinco para cada, para que fossem aplicados. Aos
55
respondentes foi solicitado que respondessem sobre apenas um cão, caso
convivessem com mais de um, independente do número de cães que convivesse
com o cão escolhido. Para ser incluído na amostra, o questionário deveria: (1) ser
referente a cães com idade inferior a sete anos, para evitar contaminar a amostra
com possíveis problemas de agressividade comuns a idosos decorrentes de
alterações características do envelhecimento (maior frequência de artrites e
periodontites, por exemplo); (2) ser referente a cães com mais de dois anos de
idade, em virtude dos problemas de mordedura comuns aos filhotes e da possível
imaturidade social desses cães; (3) ser preenchido por pessoa maior de 18 anos que
tenha assinado o termo de consentimento; e (4) ter o QA totalmente preenchido.
Para atender aos dois primeiros critérios de inclusão, os questionários preenchidos
sem a data de nascimento dos cães foram excluídos.
Os dados foram tabulados e avaliados estatisticamente com o teste de
correlação de Spearman para comparar a influência das variáveis entre si. Todos os
testes foram realizados através do programa BioEstat® 5.0, com nível de
significância de 5% (α=0,05).
Para o cálculo do coeficiente de Spearman, as variáveis foram caracterizadas
da seguinte forma: Sexo (Mulheres=1 e Homens=2); Idade do proprietário (valores
iguais ou inferiores à mediana=1; valores superiores à mediana =2); Grau de
Instrução (Fundamental=1, Médio=2, Superior=3); Teve ou não filhos (se não teve
filhos=1 e se teve algum filho=2); Finalidade da Escolha do cão (Companhia=1, Não
Escolheu=2, Guarda=3); e o que o cão representa na vida do respondente (filho=1,
amigo=2, alguém para cuidar=3; outros =4). As variáveis relacionadas às
características dos cães a ao manejo foram caracterizadas da seguinte forma: Sexo
do cão (Machos não castrados=1, machos castrados=2, Fêmeas castradas=3,
fêmeas não castradas=4); o hábito de pelo menos 30 minutos diários de passeio
(sim=1, não=2); anda na frente ou puxando o proprietário (sim=1, não =2); mastiga
objetos (sim=1, não=2); passou por adestramento (sim=1, não=2); o número de
comandos que obedece (quantidade absoluta de comandos); o proprietário retira
comida se o cão não comer (sim=1, não=2); o cão come antes da família (sim=1,
não=2); por último onde o cão dorme (não tem acesso ao interior da casa=0, tem
acesso e dorme fora do quarto do proprietário=1, dorme no quarto do proprietário
fora da cama do proprietário=2, dorme na cama do proprietário=3).
56
4.5.2.1- Questionário para Avaliação e Pesquisa Comportamental de Cães
O C-BARQ foi desenvolvido por Hsu e Serpell (2003) como uma forma de
quantificar os problemas de comportamento. A partir dele, são gerados coeficientes
numéricos para aspectos do comportamento daquele cão. O instrumento foi validado
a partir da comparação de seus resultados com os diagnósticos obtidos através das
anamneses e entrevistas por etologistas clínicos da Escola de Medicina Veterinária
da Universidade da Pensilvânia (HSU e SERPELL, 2003).
As seções de agressividade e medo do questionário se baseiam em
respostas marcadas em uma escala gradual crescente de 0 a 4 (0= nunca e 4 =
sempre) e geram os seguintes coeficientes:
• Agressão a estranhos – tendência em responder agressivamente a
estranhos que invadam ou se aproximem do espaço individual do cão ou do
proprietário.
• Agressão direcionada ao proprietário - tendência em responder
agressivamente ao proprietário ou a outros membros da família quando desafiado,
manipulado, encarado ou quando as pessoas se aproximam enquanto o cão está de
posse de objetos ou comida.
• Agressão ou medo de outro cão desconhecido - tendência em responder
agressivamente ou com medo quando abordado diretamente por um cão
desconhecido.
• Agressão direcionada a cão familiar – tendência em responder
agressivamente quando abordado diretamente por um cão que conviva no mesmo
domicílio.
• Medo de pessoas estranhas - tendência em responder com medo a
aproximação direta de pessoas desconhecidas.
• Medo de estímulos novos - tendência em responder com medo a sons altos
ou súbitos, assim como a objetos ou situações não familiares.
4.5.3 – Resultados
Ao todo, 193 questionários (64,3%) foram devolvidos, sendo que desses 14
questionários foram devolvidos em branco. Os demais 107 questionários não foram
57
devolvidos pelos alunos. Dos 179 questionários preenchidos, 61 foram excluídos da
amostra por não atenderem aos critérios de inclusão, restando 118 questionários
válidos que resultaram na presente amostra.
4.5.3.1 – Correlação entre características do proprietário e agressividade do cão
Em relação aos 118 questionários, a média etária dos respondentes foi de
30,5 anos (desvio padrão=12,0; amplitude= 18-63) e a maioria foi respondida por
mulheres (69,5%). Quanto ao grau de instrução desses respondentes, três (2,5%)
não informaram, quatro (3,4%) tinham ensino fundamental, 44 (37,3%) tinham
ensino médio, 53 (44,9%) tinham ensino superior e 14 (11,9%) tinham pós-
graduação. Em relação ao número de filhos, 87 (73,7%) não tinham filhos, oito
(6,8%) tinham um filho, 15 (12,7%) tinham dois filhos, seis (5,0%) tinham três filhos e
dois (1,7%) tinham quatro filhos. Quanto à finalidade da escolha do cão, 72 (61,0%)
afirmaram escolher o cão somente para companhia, sete (5,9%) para guarda e
companhia, nove (7,6%) para guarda, 27 (22,9%) afirmaram que não escolheram o
cão e três (2,5%) disseram escolher para criação. Quanto ao quê o cão representa
na vida da pessoa, seis (5,1%) afirmaram que seu cão é “alguém para cuidar”, 61
(51,7%) que o cão representa um “amigo”, 50 (43,7%) que o cão representa um
“filho” e um respondente assinalou que seu cão é um animal que desempenha um
papel de trabalho em sua casa.
Os resultados da comparação das características individuais do proprietário
com a agressividade ou medo do cão através do coeficiente de correlação de
Spearman estão expressos na tabela 8. Três correlações foram significativas. Uma
entre ter ou não filhos e agressão a cães estranhos, na qual cães de pessoas sem
filhos apresentaram maiores coeficientes de agressão a cães estranhos (P=0,04). A
outra correlação foi entre a finalidade da escolha e o medo do cão a pessoas
desconhecidas (P=0,04), na qual os cães de proprietários que os escolheram para
companhia apresentaram coeficientes maiores para medo de pessoas
desconhecidas. A terceira correlação significativa foi entre o número de convivas e o
coeficiente de agressão direcionada ao proprietário (P<0,01), na qual quanto mais
gente convivia com o cão, maiores os coeficientes de agressão ao proprietário.
Ao comparar todas as variáveis entre si, as mulheres afirmaram com maior
frequência do que os homens que seus cães representam uma figura de maior
afeição, como filho ou amigo (rs=0,231, P=0,01). Também as pessoas com maior
58
grau de instrução afirmaram com maior frequência que a finalidade da escolha do
cão foi companhia (rs=-0,278, P<0,01). Outra correlação foi observada entre idade
do proprietário e grau de instrução (rs=0,194, P=0,03). Nenhuma das demais
comparações de dados apresentou correlação significativa.
Tabela 8: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre características dos proprietários e agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010. Agressão a
pessoas desconhecidas
Agressão ao proprietário
Agressão a cão estranho
Agressão a cão familiar
Medo de Estranhos
Medo de Estímulos novos
Sexo -0,129 0,0531 0,0931 0,199 -0,110 -0,0415
Idade -0,136 -0,040 -0,173 -0,182 0,0141 -0,0707
Grau de Instrução 0,136 -0,0122 0,132 0,0867 0,191 0,0267
Filhos -0,0440 0,0529 -0,216a -0,167 -0,167 -0,0822
Finalidade da Escolha 0,174 0,122 0,134 -0,148 -0,200a 0,102
O cão representa 0,0243 0,0442 0,00516 -0,00656 0,0209 -0,0423
Nº de convivas humanos
-0,0349 0,313b 0,148 -0,0398 -0,0927 0,0378
a- P<0,05; b – P<0,01
Comparando os dados relativos aos coeficientes do C-BARQ, houve
correlação entre os dois coeficientes de medo (rs=0,352, P<0,001), caracterizando
que quanto maior o coeficiente para medo de pessoas estranhas, maior também foi
o coeficiente para medo de estímulos novos. Assim como todos os coeficientes de
agressão canina apresentaram correlação positiva significativa (P<0,05). O
coeficiente de agressão contra pessoas desconhecidas apresentou correlação
positiva com medo de pessoas desconhecidas (rs=0,281, P<0,01) e medo de
estímulos novos (rs=0,324, P<0,01). Também o coeficiente de agressão a cães
desconhecidos teve correlação positiva com medo de estímulos novos (rs=0,314,
P<0,01).
4.5.3.2 – Correlação entre Agressividade do proprietário e agressividade do cão
Os resultados da comparação da agressividade do proprietário com a
agressividade ou medo do cão estão expressos na tabela 9. Duas correlações foram
significativas. Quanto maior o coeficiente de agressão física do proprietário menor o
59
coeficiente canino de agressão contra cão familiar (P=0,01). Outra correlação que se
observou foi entre o coeficiente de hostilidade do proprietário com o medo de
pessoas desconhecidas por parte do cão, quanto maior um maior o outro (P=0,03).
Tabela 9: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre agressividade dos proprietários e
agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010
Agressão a
pessoas
desconhecidas
Agressão ao
proprietário
Agressão a
cão
estranho
Agressão a
cão familiar
Medo de
Estranhos
Medo de
Estímulos
novos
Agressão
Física -0,0605 -0,191 -0,131 -0,298a 0,0594 -0,0332
Agressão
Verbal 0,0900 -0,144 0,0454 -0,210 0,110 0,0570
Hostilidade 0,0719 0,0341 -0,0833 -0,0700 0,215b 0,164
Raiva 0,0668 -0,0412 -0,0538 0,0633 0,161 0,0633
a- P=0,01;b – P=0,03
Comparando-se os dados referentes aos coeficientes gerados pelo QA houve
correlações entre todos os pares (P<0,01), com exceção entre o coeficiente de
agressão física e o coeficiente de hostilidade (P=0,08).
4.5.3.3 – Correlação entre características dos cães e de manejo e agressividade do
cão
Dos 118 cães, 59 (50,0%) eram machos e 16 desses machos (13,5%) eram
castrados. Entre as 59 fêmeas, 16 (13,5%) eram castradas. A média de idade dos
cães foi de 4,4 anos (desvio padrão= 1,5; amplitude= 2,0 – 6,9). Cães de diversas
raças participaram da amostra e estão distribuídos da seguinte maneira: 34 – sem
raça definida; 16 poodle; 8 Cocker Spaniel Inglês; 8 – Retriever do Labrador; 7-
Pastor Alemão; 7 – Yorkshire Terrier; 6 – Pit Bull; 6- Pincher; 4 – Rottweiler; 3 –
Boxer; 3- Teckel; 3- Terrier Brasileiro; 2 – Maltês; 2-Shi Tzu; 2- Golden Retriever; 1 –
Beagle; 1- Buldogue americano; 1- Chiuaua; 1-Dálmata; 1- Fila Brasileiro; 1- Jack
Russel Terrier e 1- Lhasa Apso. Ressaltando que as raças foram declaradas pelos
respondentes.
Os resultados da comparação de características dos cães e de itens de
manejo com a agressividade ou medo do cão estão expressos na tabela 10. Uma
60
das correlações significativas observadas foi entre “guiar” o proprietário e agressão
ao mesmo (P=0,04), caracterizando que os cães que andam na frente ou puxando a
guia de seus proprietários apresentaram maiores coeficientes para agressão ao
proprietário. Outra correlação observada foi que cães que têm o seu alimento
retirado pelo proprietário, quando não comem tudo, apresentaram maiores
coeficientes para agressão contra cão da mesma família (P=0,03). Cães que
dormem mais próximos de seus proprietários apresentaram correlação positiva em
relação a medo de pessoas estranhas (P<0,01).
Tabela 10: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre características dos cães e
agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010
Agressão a
pessoas
desconhecidas
Agressão
ao
proprietário
Agressão a
cão
estranho
Agressão a
cão
familiar
Medo de
Estranhos
Medo de
Estímulos
novos
Sexo do cão 0,106 -0,0259 -0,0247 -0,0993 0,0809 -0,0614
Idade do cão 0,108 -0,122 0,213 -0,116 -0,0843 -0,0266
Passeia? -0,178 -0,00620 -0,207 -0,0914 -0,0265 0,0738
Guia o
proprietário? -0,0983 -0,224a -0,0248 0,0462 0,0278 -0,0783
Mastiga
objetos? 0,157 0,0604 -0,0221 0,160 -0,110 -0,119
Passou por
adestramento? -0,0468 0,0790 0,0443 0,0669 -0,00118 0,0286
Quantos
comandos? -0,0303 -0,141 -0,00572 0,0642 -0,0619 -0,0418
O proprietário
retira a
comida?
0,0893 0,0449 -0,0373 -0,253a 0,0367 0,0983
Pula nas
visitas? 0,108 -0,194 0,0858 0,0850 0,157 0,0160
Pula nas
pessoas da
casa?
-0,0325 0,0394 0,104 0,0331 -0,162 -0,150
Onde dorme 0,0367 -0,0177 -0,145 -0,0996 0,277b 0,0499
a- P<0,05; b – P<0,01
61
Comparando os dados referentes a características do cão e manejo entre si,
observou-se correlação entre o hábito de passear ou não e a idade do cão (rs= -
0,337, P<0,01), caracterizando que cães mais novos passeiam com maior
frequência do que os mais velhos. Outra correlação observada foi que cães que
passaram por processo de adestramento atendem mais comandos (rs= -0,270;
P<0,01). Cães que passeiam diariamente pulam menos nas visitas (rs= -0,227;
P=0,02) e cães que dormem mais próximos de seus proprietários têm hábito de
mastigar objetos não alimentares com maior frequência (rs= -0,182; P=0,04).
Nenhuma das demais combinações entre dados apresentou correlação significativa.
4.5.4 – Discussão
Vários resultados deste estudo são inéditos e não podem ser comparados
com outras pesquisas. Por exemplo, o fato de cães de pessoas sem filhos
apresentarem maiores coeficientes de agressão a cães estranhos. Analisando os
dados mais minuciosamente observa-se que na amostra há um número considerável
de pessoas abaixo dos 35 anos (68,6%), sendo que nenhuma dessas pessoas tinha
filhos.
Não houve correlação entre ter ou não filhos e o quê o cão representa na vida
da pessoa, os cães de pessoas sem filhos poderiam representar um filho com maior
frequência nesse grupo, fato que não foi observado. Como já descrito, no presente
estudo a idade do proprietário não teve correlação significativa com agressão ou
medo do cão, o que diverge de um estudo norteamericano (PODBERCEK e
SERPELL, 1997) no qual tal associação é relatada, o grupo de cães mais agressivos
é associado com maior frequência a proprietários com idade entre 25 e 34 anos.
Dois resultados que se mostram coerentes com os resultados do capítulo IV
são relacionados à escolha do cão e ao coeficiente de hostilidade do proprietário. No
capítulo IV observou-se que as pessoas que escolheram raças de cães para
companhia tiveram maiores coeficientes de hostilidade no QA. Neste capítulo,
embora essas duas variáveis não tivessem correlação direta, observou-se que
ambas se correlacionaram com o coeficiente de medo de pessoas desconhecidas
por parte do cão. Quanto maior a hostilidade do proprietário, maior o medo do cão
de pessoas desconhecidas. Assim como cães escolhidos para companhia também
apresentaram maiores coeficientes de medo de pessoas estranhas. Levanta-se
outra hipótese de que a percepção do proprietário mais hostil em relação ao medo
62
de estranhos seja diferente, e isso apareça no teste de personalidade. Outra
possível hipótese é que proprietários de cães de companhia permitam com mais
facilidade que seu cão tema estranhos, o que na concepção do proprietário poderia
ser inaceitável para um cão de guarda. Neste estudo, portanto, não houve uma
associação direta entre a finalidade da escolha do cão (companhia ou guarda) com
sua agressividade, diferente do que sugerem Pérez-Guisado e seus colaboradores
(2008), que relataram que cães escolhidos para guarda patrimonial apresentam
maior chance de estar envolvido em ataques contra seres humanos.
Outro item que apresentou correlação com medo de pessoas estranhas foi o
fato de o cão dormir mais próximo de seu proprietário, quanto mais próximos, maior
o coeficiente de medo. Outro resultado que leva a levantar hipótese: o medo de
pessoas desconhecidas pode ser justificado pelo fato desses cães que dormem com
seus proprietários serem mais mimados. Também por serem mais mimados, podem
ter o processo de educação deficiente no sentido de mastigar objetos não
alimentares, outro resultado deste capítulo. Esse mimo pode ser enquadrado no que
vários artigos citam como spoiling. O verbo spoil significa estragar no inglês e pode
ser traduzido como mimar para o português. Ser mimado ou tratado como um ser
humano é incriminado por alguns autores (VOITH et al., 1992; O’FARREL, 1997;
PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009) como causa de agressão em
contextos de dominância. Porém, a proximidade do proprietário no momento de
dormir não apresentou correlação significativa com agressão contra o proprietário no
presente estudo.
Quanto maior o coeficiente de agressão física do proprietário, menor o
coeficiente canino de agressão contra cão familiar. Uma hipótese para explicar tal
fato pode ser que o cão seja capaz de enxergar na tendência à agressão física do
proprietário uma forma de imposição hierárquica, o que coibiria a tentativa de disputa
hierárquica com outros cães da mesma família, razão mais frequente para agressão
entre cães (RUGBJERG et al, 2003). Outro resultado que reforça a o conhecimento
de demonstrações de dominância e submissão foi que cães que andam na frente ou
puxando a guia de seus proprietários apresentaram maiores coeficientes para
agressão ao proprietário. A correlação entre guiar o proprietário e a agressão a ele
direcionada pode ter relação com a imposição de limites claros ao cão. Cuidando
para não cair em uma ideia antropomórfica ou em um senso comum, talvez seja
necessário analisar a estrutura social canina de uma forma mais complexa do que
63
forma linear sugerida na “Teoria da matilha”. Com isso, pode-se levantar outra
hipótese: um cão sem limites claros pode reagir de forma agressiva contra seus
proprietários, assim como uma criança sem limites pode reagir agressivamente
contra seus educadores (ZAGURY, 2000), independente do formato de organização
hierárquica que se estabeleça na família. Esse mesmo resultado é coerente com a
recomendação que se faz em casos de agressão por dominância (OVERALL, 1997;
ASKEW, 2003; LANDSBERG et al., 2004), na qual o cão deve deixar de guiar o
proprietário, ser ensinado a andar atrás ou do lado deste e este não deve ser
deixado ultrapassar pelo cão quando for passar por portas ou portões.
Ainda no contexto do passeio, o fato de guiar o proprietário (andar na frente
ou puxando a guia) teve correlação significativa com agressão ao proprietário, ou
seja, o fato de passear ou não passear não teve correlação com agressão, mas a
qualidade desse passeio sim. Tal fato está de acordo com um artigo americano
(PODBERSCEK e SERPELL, 1997), no qual os autores observaram que cães da
raça Cocker Spaniel Inglês que puxavam a guia passeavam menos e eram mais
agressivos. Uma menor frequência de passeios é descrita como associada à maior
agressividade relacionada à comida (MCGREEVY e MASTERS, 2007).
A correlação direta entre o número de convivas humanos e o coeficiente de
agressão ao proprietário pode estar, por hipótese, relacionada com a dificuldade de
o cão identificar uma hierarquia em residências onde há muitos convivas humanos, o
que pode ser o motivador da agressão ao proprietário. Outra hipótese para explicar
esse resultado é que em ambientes sociais com muita gente, o cão encontre
reações diferentes das pessoas para os mesmos comportamentos e esse fato gerar
ansiedade e medo (O’FARREL, 1997), aumentando a probabilidade dos ataques por
medo.
O sexo dos cães não apresentou correlação com qualquer padrão de
agressividade, contrariando diversos autores (WRIGHT, 1991; FATJÓ et al., 2005;
PALÁCIO et al., 2005; PALESTRINI et al., 2005; ROSADO et al., 2009; VOITH,
2009). Tal resultado mostra que tanto machos quanto fêmeas tiveram a mesma
probabilidade de manifestar qualquer um dos padrões de agressividade avaliados no
presente estudo. O que pode excluir o preconceito em relação ao sexo e aumentar o
cuidado que as pessoas que trabalham com cães devem tomar para evitar acidentes
com mordidas. É possível que este resultado se deva à característica da amostra,
com diferentes raças e formas de manejo. Porém, esse resultado é coerente com o
64
resultado do capítulo III, no qual não houve diferença entre fêmeas e machos na
tendência à dominância através do Teste de Campbell.
O controle do alimento é outro ponto ressaltado na modificação
comportamental sugerida em casos de agressão por dominância (OVERALL, 1997;
ASKEW, 2003; LANDSBERG et al., 2004), porém no presente estudo não houve
relação entre retirar o alimento se o cão não come tudo com agressão ao
proprietário. Houve relação com agressão contra cão da mesma família, fato que
pode estar relacionado à competição por outros recursos, já que o alimento é
controlado.
Alguns resultados destacam a importância de processos de educação e
socialização bem feitas. O desagradável ato de pular nas visitas foi observado com
menor frequência nos cães que tinham hábito de passear pelo menos 30 minutos
diários. Esse hábito de passear se mostrou mais frequente em cães mais jovens.
Pode-se supor que cães idosos passeiem menos, em virtude de problemas
articulares. Entretanto, cães com mais de sete anos foram excluídos da amostra.
Propõe-se a hipótese de que tal diminuição se justifique pela perda da novidade. Os
cães mais novos ainda contam com o “efeito novidade”, mas depois de alguns anos
de convívio, podem ser deixados de lado e, com isso, terem menos atenção do
proprietário. Outra hipótese mais otimista é que o volume de informações a respeito
de comportamento canino que vem sendo divulgado na mídia esteja influenciando
os novos proprietários dos novos cães a melhorarem a qualidade da interação com
esses animais.
Um resultado óbvio desse capítulo é de que cães que passaram por processo
de adestramento atendam mais comandos, o que mostra coerência nos resultados
dos cálculos estatísticos. Porém, ter passado por processo de adestramento não
apresentou correlação significativa com qualquer das escalas de agressividade. Este
resultado está de acordo com Voith e colaboradores (1992), mas diferente do que foi
encontrado por outros autores (JAGOE e SERPELL, 1996; O’SULLIVAN et al., 2008;
PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009).
Os autores de um artigo espanhol (PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO,
2009) relatam itens associados à agressão por dominância, como: cães do sexo
masculino; cães com idade entre cinco e sete anos; cães quem têm mulheres como
proprietárias; cães que têm proprietários inexperientes, ou seja, pessoas que nunca
tiveram experiências anteriores como proprietárias de cães; cães sem adestramento;
65
cães de proprietários com curso superior; cães destinados à companhia; cães com
comida à vontade e cães que passeiam pouco. O único desses itens que teve
correlação significativa foi o cão ser escolhido para companhia, mas essa correlação
existiu com o medo de pessoas desconhecidas e não com agressão ao proprietário,
que seria um forte indício de agressão por dominância. Outros estudos
(PODBERSCEK e SERPELL, 1997; MESSAM et al., 2008) também associam a
condição de cão de companhia à maior agressividade.
A correlação encontrada no presente estudo entre agressão e medo é
coerente com os resultados de outras pesquisas (DUFFY et al., 2008; MILLS e
ZULCH, 2010). Esta vem sendo discutida no meio científico e fica bem evidente no
artigo de LUESCHER e REISNER (2008), no qual os autores questionam o
diagnóstico de agressão por dominância em situações nas quais cães atacam em
contextos de controle de recursos, mas com postura de medo.
4.5.5 – Conclusão
A partir dos resultados do presente estudo, sugere-se que sejam feitas novas
pesquisas para explicar as razões para cada correlação encontrada. Mas, é possível
concluir que a manifestação da agressividade canina é multifatorial, dependendo de
fatores que vão do manejo à personalidade do proprietário.
66
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao avaliar a agressão canina na visão do clínico brasileiro, a presente tese
atinge seu primeiro objetivo específico, mostrando a importância do problema em
virtude de alta frequência de queixas que os médicos veterinários recebem sobre
agressividade canina. Assim como pelo fato de os clínicos considerarem as
agressões como causa mais frequente de abandono ou eutanásia de cães por parte
dos proprietários.
Ao buscar na literatura a associação entre a raça e a agressividade canina
não se pode chegar a qualquer relação direta entre elas. O que sugere que a raça
do cão não seja o principal fator responsável pela manifestação de sua
agressividade, principalmente considerando-se frequência de ataques. Porém, não
se pode deixar de considerar que a raça exerça influência no potencial lesivo dos
ataques. Um cão de uma raça com um padrão de peso maior, como um Rottweiler
terá maior poder de lesionar sua vitima comparado a um cão de uma raça menor,
como um Cocker Spaniel Inglês.
Ao realizar o Teste de Campbell filhotes das raças Retriever do Labrador,
Rottweiler, Bull Terrier e Cocker Spaniel Inglês, concluiu-se que há uma diferença
entre seus padrões de dominância. Diferença esta mais marcada pela
independência dos filhotes de Rottweiler e Bull Terrier em fases do teste, do que
pela observação das avaliações globais de todos. Fato que é muito relevante às
conclusões gerais da tese, visto que se esses cães têm padrões diferentes de
interação com o ser humano, também merecem esforços diferentes na sua
socialização, a fim de evitar problemas futuros de comportamento relacionados com
agressividade (SEKSEL, 1997; SEKSEL et al., 1999; SERRA, 2005). Além disso,
essas duas raças em destaque, são cães muito fortes, com grande poder de lesão
de suas vitimas. Portanto, o capítulo III evidencia que a raça pode indiretamente
67
influenciar na manifestação da agressividade do cão, já que deve considerar a
maneira que esses cães sejam socializados.
Quando os perfis dos proprietários que recém adquiriram filhotes das cinco
raças supracitadas foram comparados, concluiu-se que os proprietários de Bull
Terrier são mais jovens e com menor escolaridade. Que os proprietários de Retriever
do Labrador procuram cães de companhia e os de Rottweiler para guarda, também
que os proprietários de Retriever do Labrador ou Cocker Spaniel Inglês tiveram
maiores pontuações na escala de hostilidade do Questionário de Agressividade. Tais
resultados evidenciam que há diferenças sociais e psicológicas entre os proprietários
que selecionam determinadas raças. Tais aspectos do proprietário devem ser
incluídos na análise da associação entre raça e agressividade, o que torna a
avaliação dos fatores responsáveis pela manifestação de agressividade mais
complexa. Na presente tese, o resultado entre a hostilidade do proprietário e a raça
escolhida deixa dúvidas no eixo causa-efeito. A diferença da personalidade do
proprietário faz com que busquem cães supostamente mais intimidadores ou esses
cães foram selecionados artificialmente com aspecto intimidador por causa da
personalidade de seus criadores?
No capítulo V, traços da agressividade do proprietário aparecem
correlacionados com perfis de medo e agressividade do cão. Observou-se que medo
e agressividade se correlacionaram significativamente. Também que vários outros
fatores apresentaram correlações com a díade medo/agressividade. Fatores
relacionados à finalidade da escolha do cão, ao fato de o proprietário ter ou não
filhos e a itens de manejo.
A presente tese cumpriu seu objetivo geral, de investigar fatores relacionados
com a manifestação da agressividade canina confirmando a hipótese inicial “A
manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,
manejo e a personalidade do proprietário”. Os resultados desta investigação abrem
mais perguntas do que as respondem. Mas, mostram que a agressão canina não
deve ser olhada de forma simplista. Não é apenas uma questão de manejo, de
adestramento ou de hierarquia. Ou ainda de descriminar essa ou aquela raça. A
agressividade canina se deve a um complexo de fatores, que envolve desde manejo
à personalidade do ser humano responsável pelo cão. Esse complexo de fatores
somado à grande frequência de queixas sobre comportamento animal nas clínicas
brasileiras ressaltam a importância da formação dos médicos veterinários em
68
relação: ao comportamento animal, à importância de educar as pessoas
responsáveis pelos cães e ao correto processo de socialização entre as espécies
humana e canina.
69
6- BIBLIOGRAFIA
ALGER, J.M.; ALGER, S.F. Beyond Mead: Interactions between humans and felines,
Society and Animals, v. 5, n. 1, p. 65-81, 1997.
ALLEN, D. L. Believes aggression is more common in some dog breeds, Journal of
the American Veterinary Medical Association, v. 218, n. 2, p.193, 2001.
ARANGO, G. H. Bioestatística: teórica e computacional. 2ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2005, 423p.
ARONSON, L. P.; DODDS, W. J. The Effect of Hypothyroid Function on Canine
Behavior, in: MILLS, D. et al. Current Issues and Research in Veterinary Behavioral
Medicine: Papers Presented at the 5th International Veterinary Behavior Meeting,
Indiana: Purdue University Press, 2005, 300p., p.131-138.
ASKEW, H. R. Treatment of Behavior Problems in Dogs and Cats, Viena: Blackwell
Publishing, 2003, 391p.
BADINO, P.; ODORE, R.; OSELLA, M. C.; BERGAMASCO, L.; FRANCONE, P.;
GIRARDI, C.; RE, G. Modifications of serotonergic and adrenergic receptor
concentrations in the brain of aggressive Canis familiaris, Comparative Biochemistry
and Physiology, Part A 139, p. 343– 350, 2004.
BAMBERGER, M.; HOUPT, K. A. Signalment factors, comorbidity, and trends in
behavior diagnoses in dogs: 1,644 cases (1991-2001), Journal of the American
Veterinary Medical Association, v. 229, n. 10, p. 1591-1601, 2006.
BAUER, E. B.; SMUTS, B. B. Cooperation and competition during dyadic play in
domestic dogs, Canis familiaris, Animal Behaviour, n. 73, p. 489-499, 2007.
70
BEAVER, B. V. Comportamento Canino: um guia para veterinários. São Paulo: Roca,
2001. 431p.
BÉNÉZECH, M. L’homme et le chien domestique: une pathologie neuropsychiatrique
commune?, Annales Médico Psychologique, v. 161, p. 569–578, 2003.
BRADSHAW, J. W. S. ; GOODWIN, D. Determination of behavioural traits of pure
bred dogs using factor analysis and cluster analysis; a comparison of studies in the
USA and UK, Research in Veterinary Science, v. 66, n. 1, p. 73-76, 1998.
BRADSHAW, J. W. S.; BLACKEWELL, E. J.; CASEY, R. A. Dominance in domestic
dogs – useful construct or bad habit?. Journal of Veterinary Behavior, v. 4, p. 135-
144, 2009.
BUSTOS, P. V. A. Influencia de la educación del cachorro como factor de riesgo en
la presentación de comportamientos agresivos en perros domésticos (Canis
familiaris) de raza Rottweiler y mestizos adultos en la comuna de Talcahuano, octava
región, Chile. Temuco, 2003. 133f. Trabalho de Conclusão de curso (Graduação em
Medicina Veterinária) – Escuela de Medicina Veterinária - Facultad de Acuicultura y
Ciencias Veterinarias, Universidad Catolica de Temuco, Temuco, 2003.
CALDWELL, D. S.; LITTLE, P. B. Aggression in Dogs and Associated
Neuropathology, Canadian Veterinary Journal, v. 21, p. 152-154, 1980.
CAMERON, D. B. Canine dominance-associated aggression: concepts, incidence,
and treatment in a private behavior practice, Applied Animal Behaviour Science, v.
52, p. 265-274, 1997.
CAMPBELL, W. E. A behavior test for puppy selection. Modern Veterinary Practice.,
v. 53, n. 12, p. 29-33, 1972.
CAPRA, A.; MARAZZINI, L.; ALBERTINI, M. Are Pit Bulls different? Behavioral
evaluation within a rehabilitation program of ex-fighting dogs. Journal of Veterinary
Behavior, v. 4, n. 2, p. 76, 2009.
DAHLSTROM, W. G; WELSH, G. S.; DAHLSTROM, L. E. An MMPI Handbook .
Clinical interpretation. v. I. Minneapolis: University of Minnesota Press. 1972. 507p.
71
DARWIN, C. A origem das espécies. São Paulo: Hemus, 1859. 471p.
DENENBERG, S.; LANDSBERG, G. M.; HORWITZ, D.; SEKSEL, K. A Comparison
of Cases Referred to Behaviorists in Three Different Countries, in: MILLS, D. et al.
Current Issues and Research in Veterinary Behavioral Medicine: Papers Presented
at the 5th International Veterinary Behavior Meeting, Indiana: Purdue University
Press, 2005, 300p., p.56-62.
DENIS, B. De lobo al perro : diversidad fenotípica en las razas de perros. Veterinary
Focus, v. 17, n. 2, p. 45-48, 2007.
DUFFY, D. L. ; HSU, Y. Y. ; SERPELL, J. A. Breed differences in canine aggression,
Applied Animal Behaviour Science, v. 114, n. 3/4, p. 441-460, 2008.
FATJÓ, J.; AMAT, M.; MARIOTTI, V.; RUIZ-DE-LA-TORRE, J. L.; MANTECA, X.1
Aggression in Dogs: Analysis of 761 Cases, in: MILLS, D. et al. Current Issues and
Research in Veterinary Behavioral Medicine: Papers Presented at the 5th
International Veterinary Behavior Meeting, Indiana: Purdue University Press, 2005,
300p., p. 251-254.
FATJÓ, J; RUIZ-DE-LA-TORRE, J. L.; MANTECA, X. The epidemiology of
behavioural problems in dogs and cats a survey of veterinary practitioners. Animal
Welfare, v. 15, p. 179-185, 2006.
FATJO, J.; AMAT, M.; MARIOTTI, V. M.; RUIZ-DE-LA-TORRE, J. L.; MANTECA, X.
Analysis of 1040 cases of canine aggression in a referral practice in Spain, Journal of
Veterinary Behavior: Clinical Applications and Research, v. 2, n. 5, p.158-165, 2007.
FERREIRA, A. B. H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro: Editora
Nova Fronteira, 1975. 1516p.
FOGLE, B. The Dog’s Mind. London: Pelham Books, 1992. 201 p.
FORTES, F. S.; WOUK, A. F. P. F.; BIONDO, A. W.; BARROS, C. C. Acidentes por
mordeduras de caes e gatos no municipio de Pinhais, Brasil de 2002 a 2005,
Archives of Veterinary Science, v.12, n. 2, p. 18-23, 2007.
72
FRID, M. H. Etología Clínica en perros y gatos. México: Universidad Nacional
Autónoma de México, 2004. 102p.
GALLARDO-PUJOL, D.; KRMAP, U.; GARCIA-FORERO, C.; PÉREZ-RAMIREZ, M.;
ANDRÉS-PUEYO, A. Assessing aggressiveness quickly and efficiently: the Spanish
adaptation of Aggression Questionnaire-Refined version. European Psychiatry, v. 21,
p. 487-494, 2006.
GEORGES, K. ; ADESIYUN, A. An investigation into the prevalence of dog bites to
primary school children in Trinidad, BMC Public Health, v. 8, n. 85, 2009; Disponível
em: <http://www.biomedcentral.com/1471-2458/8/85>. Acessado em: 20 Mar. 2009
GORODETSKY, E. Epidemiology of dog and cat euthanasia across Canadian prairie
provinces, Canadian Veterinary Journal, v. 38, p. 649-652, 1997.
GRANDJEAN, D. Enciclopédia do Cão Royal Canin, Paris: Anima Publishing, 2001,
635p.
GUY, N. C.; LUESCHER, U. A.; DOHOO, S. E.; SPANGLER, E.; MILLER, J. B.;
DOHOO, L. R.; BATE, L. A. Demographic and aggressive characteristics of dogs in a
general veterinary caseload, Applied Animal Behaviour Science, v. 74, p. 15-28,
2001a.
GUY, N. C.; LUESCHER, U. A.; DOHOO, S. E.; SPANGLER, E.; MILLER, J. B.;
DOHOO, L. R.; BATE, L. A. Risk factors for dog bites to owners in a general
veterinary caseload, Applied Animal Behaviour Science, v. 74, p. 29-42, 2001b.
GUY, N. C.; LUESCHER, U. A.; DOHOO, S. E.; SPANGLER, E.; MILLER, J. B.;
DOHOO, L. R.; BATE, L. A. A case series of biting dogs: characteristics of the dogs,
their behaviour, and their victims, Applied Animal Behaviour Science, v. 74, p. 43-57,
2001c.
HARE, B.; BROWN, M.; WILLIAMSON, C.; TOMASELLO, M. The domestication of
social cognition in dogs. Science, v. 298, p. 1634-1636, 2002.
73
HART, B. L.; HART, L. A. Selecting, raising, and caring for dogs to avoid problem
aggression, Journal of the American Veterinary Medical Association, v. 210, n. 8, p.
1129-1134, 1997.
HATHAWAY, S. R.; MCKINLEY, J. C. Inventário Multifásico Minesota de
Personalidade, Rio de Janeiro: Centro Editos de Psicologia Aplicada, 1972, 60p.
HAUG, L. I., Canine aggression toward unfamiliar people and dogs, Veterinary
Clinics of North America, Small Animal Practice, v. 38, n. 5, p.1023-1041, 2008.
HAVERBEKE, A. ; SMET, A. D. ; DEPIEREUX , E. ; GIFFROY, J. M. ; DIEDERICH,
C. Assessing undesired aggression in military working dogs, Applied Animal
Behaviour Science, v. 117, p. 55–62, 2009.
HOUPT, K. A. Genetics of canine behaviour, Acta Veterinaria Brno, v. 76, n. 3, p.
431-444, 2007.
HSU, Y.; SERPELL, J. A. Development and Validation of a questionnaire for
measuring behavior and temperament traits in pet dogs. Journal of American
Veterinary Medical Association, v. 223, n. 9, p. 1293-1300, 2003.
ITO, H.; NARA, H.; INOUE-MURAYAMA, M.; SHIMADA, M. K.; KOSHIMURA, A.;
UEDA, Y.; KITAGAWA, H.; TAKEUCHI, Y.; MORI, Y.; MURAYAMA,Y.; MORITA, M.;
IWASAKI, T.; OTA, K.; TANABE,Y.; ITO, S. Allele frequency distribution of the canine
dopamine receptor D4 gene exon III and I in 23 breeds, Journal of Veterinary Medical
Science, v. 66, n.7, p. 815-820, 2004.
JACOBS, C.; VAN DEN BROECK, W.; SIMOENS, P. Increased Number of Neurons
Expressing Androgen Receptor in the Basolateral Amygdala of Pathologically
Aggressive Dogs, Journal of Veterinary Medicine Series A, v. 53, n. 7, p. 334-339,
2006.
JACOBS, C. ; VAN DEN BROECK, W. ; SIMOENS, P. Neurons expressing
serotonin-1B receptor in the basolateral nuclear group of the amygdala in normally
behaving and aggressive dogs, Brain Research, v. 1136, p. 102 – 109, 2007.
74
JONES, A. C.; JOSEPHS, R. A. Interspecies hormonal interactions between man
and the domestic dog (Canis familiaris), Hormones and Behavior, n. 50, p.393–400,
2006.
KEUSTER, T. D.; LAMOUREUX, J.; KAHN, A. Epidemiology of dog bites: A Belgian
experience of canine behaviour and public health concerns, The Veterinary Journal,
v. 172, p. 482–487, 2006.
KIM, H. H.; YEON, S. C.;HOUPT, K. A.; LEE, H. C.; CHANG, H. H.; LEE, H. J.
Effects of ovariohysterecomy on reactivity in German Sehpherd dogs, The Veterinary
Journal, v. 172, p. 154-159, 2006.
LADEWIG, J. Of mice and men: Improved welfare through clinical ethology, Applied
Animal Behaviour Science, v. 92, p. 183–192, 2005.
LANDSBERG, G. Diagnosing dominance aggression, Canadian Veterinary Journal,
v. 31, p. 45-46, 1990
LANDSBERG, G.; HUNTHAUSEN, W.; ACKERMAN, L. Problemas
Comportamentais do Cão e do Gato. 2 ed., São Paulo: Roca, 2004. 492p.
LANTZMAN, M. O Cão e sua Família: Temas de Amor e Agressividade, São Paulo,
2004. 251f. Tese (Doutorado em Psicologia Clínica), Faculdade de Psicologia,
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2004.
LAPLANCHE, J. Vocabulário da Psicanálise Laplanche e Pontalis, São Paulo:
Martins Fontes, 1998. 552 p.
LEFEBVRE, D.; DIEDERICH, C.; DELCOURT, M.; GIFFROY, J. M. The quality of the
relation between handler and military dogs influences efficiency and welfare of dogs,
Applied Animal Behaviour Science, v. 104, p. 49–60, 2007.
LORENZ, K. L. A Agressão – Uma história natural do mal, Lisboa: Relógio D’água,
2001. 327p.
LUESCHER, A. U.; REISNER, I. R. Canine aggression toward familiar people: a new
look at an old problem, Veterinary Clinics of North America, Small Animal Practice, v.
38, n. 5, p.1107-1130, 2008.
75
MATO GROSSO DO SUL (Estado). Lei nº 3.489, de 13 de fevereiro de 2008. Dispõe
sobre a criação das Raças de Cães que especifica e sua condução em vias pública.
Diário Oficial do Estado do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, n. 7152, p. 1, 14
fev. 2008. pt.1. Disponível em: <
http://aacpdappls.net.ms.gov.br/appls/legislacao/secoge/govato.nsf/448b683bce4ca8
4704256c0b00651e9d/df3c40fae421c0af042573ef0049b1c4?OpenDocument>.
Acesso em: 10 abr. 2009.
MCGREEVY, P. D. ; MASTERS, A. M. Risk factors for separation related distress
and feed related aggression in dogs: additional findings from a survey of Australian
dog owners ,Applied Animal Behaviour Science, v. 109, n. 2/4, p. 320-328, 2008.
MERTENS, P. A. Reproductive and sexual behavioral problems in dogs,
Theriogenology, v. 66, p. 606-609, 2006.
MESSAM, L. L. M. ; KASS, P. H.; CHOMEL, B. B.; HART, L. A. The human-canine
environment: A risk factor for non-play bites?, The Veterinary Journal, v. 17, n.2, p.
205-215, 2008.
MILLS, D.; ZULCH, H. Papel del miedo y de la ansiedad en el comportamiento
agresivo de los perros. Veterinary Focus, v. 20, n. 1, p. 44-49, 2010.
MOFFAT, K. Addressing canine and feline aggression in the veterinary clinic,
Veterinary clinics of North America: small animal practice, v. 38, n. 5, p. 983-1003,
2008.
NETTO, W. J.; PLANTA, D. J. U. Behavioural testing for aggression in the domestic
dog, Applied Animal Behaviour Science, v. 52, n. 3/4, p. 243-263, 1997.
O'SULLIVAN, E. N.; JONES, B. R.; O'SULLIVAN, K.; HANLON, A. J. The
management and behavioural history of 100 dogs reported for biting a person,
Applied Animal Behaviour Science, v. 114, n. 1/2, p. 149-158, 2008a.
O'SULLIVAN, E. N.; JONES, B. R.; O'SULLIVAN, K.; HANLON, A. J. Characteristics
of 234 dog bite incidents in Ireland during 2004 and 2005, Veterinary Record, v. 163,
n. 2, p. 37-42, 2008b.
76
O´FARRELL, V. Owner attitudes and dog behaviour problems, Applied Animal
Behaviour Science, v. 52, p. 205-213, 1997.
OVERALL, K. L. ; LOVE, M. Dog bites to humans demography, epidemiology,
injury, and risk, Journal of the American Veterinary Medical Association, v. 218, n.
12, p. 1923-1934, 2001.
OVERALL, K. L. Clinical behavioral medicine for small animals, St. Louis – Missouri:
Mosby – Year Book, 1997. 544p.
OVERALL, K. L. Understanding and treating canine dominance aggression: An
overview, Veterinary Medicine, v. 94, n.11, p. 975-978, 1999.
PAL, S. K. Maturation and development of social behaviour during early ontogeny in
free-ranging dog puppies in West Bengal, India, Applied Animal Behaviour Science,
v. 111, n. 1-2, p. 95-107, 2008.
PALÁCIO, J.; LEÓN, M.; GARCÍA-BELENGUER, S. Aspectos epidemiológicos de
las mordeduras caninas, Gaceta Sanitaria, v. 19, n. 1, p. 50-58, 2005.
PALESTRINI, C.; MICHELAZZI, M.; CANNAS, S.; VERGA, M. Canine Aggression: A
Survey in Northern Italy in: MILLS, D. et al. J. Current Issues and Research in
Veterinary Behavioral Medicine: Papers Presented at the 5th International Veterinary
Behavior Meeting, Indiana: Purdue University Press, 2005, 300p., p.52-55.
PÉREZ-GUISADO, J.; LOPEZ-RODRÍGUEZ, R.; MUÑOZ-SERRANO, A. Heritability
of dominant–aggressive behaviour in English Cocker Spaniels, Applied Animal
Behaviour Science, n. 100, p. 219–227, 2006.
PÉREZ-GUISADO, J.; MUÑOZ-SERRANO, A. Factors Linked to Dominance
Aggression in Dogs, Journal of Animal and Veterinary Advances, v. 8, n. 2, p. 336-
342, 2009.
PÉREZ-GUISADO, J.; MUÑOZ-SERRANO, A.; LOPEZ-RODRÍGUEZ, R. La
agresividad territorial: factores dependientes del dueño, RECVET, v. 3, n. 1, 2008.
Disponível em <http://www.veterinaria.org/revistas/recvet/n020208/020804.pdf>.
Acesso em: 24 abr. 2009.
77
PETERS, V.; SOTTIAUX, M.; APPELBOOM, J.; KAHN, A. Posttraumatic Stress
Disorder After Dog Bites In Children, The Journal of Pediatrics, v. 144, p. 121-122,
2004.
PODBERSCEK , A. L.; SERPELL, J. A. Environmental influences on the expression
of aggressive behaviour in English Cocker Spaniels, Applied Animal Behaviour
Science, n. 52, p. 215-227, 1997.
RE, S.; ZANOLETTI, M.; EMANUELE, E. Aggressive dogs are characterized by low
omega-3 polyunsaturated fatty acid status, Veterinary Research Communications, v.
32, n. 3, p. 225-230, 2008 .
REISNER, I. R. Differential diagnosis and management of human-directed
aggression in dog, Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice, v. 33,
p. 303-320, 2003.
ROLL, A.; UNSHELM, J. Aggressive conflicts amongst dogs and factors affecting
them, Applied Animal Behaviour Science, v. 52, p. 229-242, 1997.
RIO DE JANEIRO (Estado). Lei nº 3.205, de 09 de abril de 1999. Dispõe sobre a
importação, comercialização, criação e porte de cães da raça pit-bull, e dá outras
providências.. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, Niterói, p. 1, 12 abr. 1999.
pt.1. Disponível em: <http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 10 abr. 2009.
RIO DE JANEIRO (Estado). Lei nº 4.597, de 16 de setembro de 2005. Altera
dispositivos da lei nº 3.205, de 09 de abril de 1999, e revoga a lei nº 3.207, de 12 de
abril de 1999. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, Niterói, p. 4, 19 set. 2005.
pt.1. Disponível em: <http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 10 abr. 2009
ROSADO, B.; GARCIA-BELENGUER, S.; LEON, M.; PALACIO, J. Spanish
dangerous animals act: effect on the epidemiology of dog bites, Journal of Veterinary
Behavior: Clinical Applications and Research, v. 2, n. 5, p. 166-174, 2007.
ROSADO, B.; GARCÍA-BELENGUER, S.; LEÓN, M.; PALÁCIO, J. A comprehensive
study of dog bites in Spain, 1995–2004, The Veterinary Journal, v. 179, p. 383–391,
2009.
78
RUGBJERG, H.; PROSCHOWSKY, H. F.; ERSBOLL, A. K.; LUND, J. D. Risk factors
associated with interdog aggression and shooting phobias among purebred dogs in
Denmark, Preventive Veterinary Medicine, n.58, p.85-100, 2003.
SAETRE, P ; STRANDBERG, E. ; SUNDGREN, P. E. ; PETTERSSON, U. ; JAZIN,
E. ; BERGSTRO, T. F. The genetic contribution to canine personality, Genes, Brain
and Behavior, v. 5, p. 240–248, 2006.
SAMPAIO, I. B. M. Estatística aplicada à experimentação animal. Belo Horizonte :
Fundação de Ensino e Pesquisa em Medicina Veterinária e Zootecnia, 1998, 221 p.
SÃO PAULO (Estado). Lei nº 11.531, de 11 de novembro de 2003. Estabelece
regras de segurança para posse e condução responsável de cães. Diário Oficial do
Estado de São Paulo, São Paulo, v.113, n.115, p. 1, 12 nov. 2003. pt.1. Disponível
em:<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2003/lei%20n.11.531,%20de%
2011.11.2003.htm>. Acesso em: 04 mar. 2010.
SCANZINI, P. Cães: raças do mundo inteiro, Rio de Janeiro: Rio Gráfica Editora,
1983, 342p.
SCOTT, J. P. ; FULLER, J. L. Dog Behavior the genetic basis. Chicago : University of
Chicago Press, 1965. 468p.
SEKSEL, K. Puppy Socialization Classes, Veterinary Clinics of North America: Small
Animal Practice, v. 27, n. 3, p. 465-475, 1997.
SEKSEL, K.; MAZURSKI, E.J.; TAYLOR, A. Puppy socialization programs: short and
long term behavioural effects. Applied Animal Behaviour Science, v. 62, p. 335-349,
1999.
SERRA, C. M. Avaliação de um método para socialização primária de filhotes de
cães domésticos e seus efeitos nos participantes, Seropedica, 2005. 87f.
Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária), Instituto de Veterinária,
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2005.
79
SHULER, C. M.; DEBESS, E. E.; LAPIDUS, J. A.; HEDBERG, K. Canine and human
factors related to dog bite injuries, Journal of the American Veterinary Medical
Association, v. 232, n. 4, p. 542-546, 2008.
SILVA, V. A.; AGUIAR, A. S.; ALMEIDA, K. D.; NOGUEIRA, L.S. Um estudo do perfil
psicológico de trabalhadores rurais em assentamento do Estado do Rio de Janeiro.
Mundo & Vida, v. 2, p. 33-39, 2001.
SLABBERT, J. M.; ODENDAAL, J. S. J. Early prediction of adult police dog
efficiency—a longitudinal study, Applied Animal Behaviour Science, v. 64, p. 269–
288, 1999.
SOARES, G. M. Levantamento da presença de sinais de Ansiedade de Separação
em cães de apartamento em Niterói-RJ, Niterói, 2007. 80f. Dissertação (Mestrado
em Medicina Veterinária) – Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal
Fluminense, Niterói, 2007.
SOARES, G. M.; TELHADO, J.; PAIXÃO, R. L. Agressividade em cães de
apartamento no município de Niterói-RJ, Revista da Universidade Rural Série
Ciências da Vida, v. 27, p. 323-325, 2007.
STRANDBERG, E.; JACOBSSON, J.; SAETRE, P. Direct genetic, maternal and litter
effects on behaviour in German shepherd dogs in Sweden. Livestock Production
Science, v. 93, p. 33-42, 2005.
SVARTBERG, K. Breed typical behaviour in dogs historical remnants or recent
constructs?, Applied Animal Behaviour Science, v. 96, n. 3/4, p. 293-313, 2006.
SVARTBERG, K.; FORKMAN, B. Personality traits in the domestic dog (Canis
familiaris), Applied Animal Behaviour Science, v. 79, n. 2, p.133-155, 2002.
TAKEUCHI, Y.; HOUPT, K. A. Behavior Genetics, Veterinary Clinics of North
America: Small Animal Practice, v. 2, n. 33, p. 345-363, 2003.
TAKEUCHI, Y.; MORI, Y. A comparison of the behavioral profiles of purebred dogs in
Japan to profiles of those in the United States and the United Kingdom, Journal of
Veterinary Medical Science, v. 68, n. 8, p. 789-796, 2006.
80
TAN, R. L.; POWELL, K. E.; LINDEMER, K. M.; CLAY, M. M.; DAVIDSON, S. C.
Sensitivities of three county health department surveillance systems for child related
dog bites: 261 cases (2000), Journal of the American Veterinary Medical
Association, v. 225, n. 11, p. 1680-1683, 2004.
TURNER, D. C. Treating canine and feline behaviour problems and advising clients,
Applied Animal Behaviour Science, n. 52, p. 199-204, 1997.
TWINING, H.; ARLUKE, A.; PATRONEK, G. Managing the stigma of outlaw breeds:
a case study of Pit Bull owners, Society and Animals, v. 8, n. 1, p. 25-52, 2000.
VAN KERKHOVE, W. A Fresh Look at the Wolf-Pack Theory of Companion-Animal
Dog Social Behavior, Journal of Applied Animal Welfare Science, v. 7, n. 4, p. 279–
285, 2004.
VERRIER, R. L. ; HAGESTAD, E. L. ; LOWN, B. Delayed myocardial ischemia
induced by anger, Circulation, v. 75, n. 1, p. 249-254, 1987.
VILÁ, C.; SAVOLAINEN, P.; MALDONADO, J. E.; AMORIM, I. R.; RICE, J. ;
HONEYCUTT, R. L.;CRANDALL, K. A.; LUNDEMBERG, J.; WAYNE, R. K. Multiple
and ancient origins of domestic dog. Sience, v. 276, p. 1687-1689, 1997.
VOITH, V. L. WRIGHT, J. C.; DANNEMAN, P. J. Is there a relationship between
canine behaviour problems and spoiling activities, antropomorphism and obedience
training? Applied animal behavoiur science, v. 34, p. 263-272, 1992.
VOITH, V. L. The Impact of Companion Animal Problems on Society and the Role of
Veterinarians, Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice, v. 39, n. 2,
p. 327-345, 2009.
VUCINIC, M.; OREVIC, M.; RADENKOVIC-DAMNJANOVIC, B.; JANKOVIC, L.;
MIRILOVIC, M. Bites to humans caused by stray and owned dogs in Belgrade, Acta
Veterinaria Beograd, v. 58, n. 5/6, p. 563-571, 2008.
WILSSON, E.; SUNDGREN, P. E. Behaviour test for eight-week old puppies—
heritabilities of tested behaviour traits and its correspondence to later behaviour,
Applied Animal Behaviour Science, n. 58, p. 151–162, 1998.
81
WRIGTH, J. C. Canine Aggression Toward People, Veterinary Clinics of North
America: Small Animal Practice, v. 21, n. 2; p. 299-314, 1991.
WRIGHT, J. C. Comment on van Kerkhove’s “Wolf-Pack Theory”, Journal of Applied
Animal Welfare Science, v. 7, n. 4, p. 295–298, 2004.
WRIGHT, J. C.; SMITH, A.; DANIEL, K.; ADKINS, K. Dog breed stereotype and
exposure to negative behavior: effects on perceptions of adoptability, Journal of
Applied Animal Welfare Science, v. 10, n. 3, p. 255-265, 2007.
WOODWARD, L. E.; BAUER, A. L. People and their pets: A relational perspective on
interpersonal complementarity and attachment in companion animal owners. Society
and animals, v. 15, p. 169-189, 2007.
YALCN, E.; BATMAZ, H. Signalment factors, comorbidity in behaviour diagnoses in
dogs in Bursa Region, Turkey (2000-2004), Acta Veterinaria Brno, v. 76, n. 3, p. 445-
450, 2007.
ZAGURY, T. Limite sem trauma, 83 ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 2000. 174p.
82
GLOSSÁRIO
Animais Gregários Animais que, em condições naturais, vivem em
grupos, ou seja, se agregam.
Agressão Agressão é melhor definida em um dado contexto como uma ameaça adequada ou inadequada ou desafio que é finalmente resolvido por combate ou defesa. (OVERALL, 1997)
Agressividade
A agressividade é a conduta de quem pratica a agressão.
Brincadeiras Agonísticas Brincar é, dentre outras definições, um ato de entretenimento no qual é possível simular a vivência de uma determinada situação. O termo agonístico se refere a lutas. Portanto, brincadeiras agonísticas são aquelas que envolvem lutas. Na etologia, se refere às brincadeiras com manifestações de agressividade, sejam intimidações ou ataques propriamente ditos.
Comportamentos Compulsivos
São definidos como movimentos repetidos intensamente e fora de contexto, atribuídos a uma “busca” na redução de um estado da ansiedade (FOGLE, 1992).
Etologia Clinica
Especialidade da Medicina Veterinária que se dedica ao estudo e tratamento de problemas de comportamento. Também é denominada como Medicina do comportamento ou Zoopsiquiatria.
Hiperatividade O termo pode ter duplo uso, a hiperatividade verdadeira ou primária e a hiperatividade adquirida ou secundária. Cães verdadeiramente hiperativos podem exibir maior agitação, pequena duração na atenção, ausência de treinabilidade, exibições agressivas e falha para se acalmar em ambientes neutros e apresentam efeito paradoxal quando submetidos a tratamento com anfetaminas. As anfetaminas em cães não hiperativos causam agitação, nos hiperativos há o efeito contrário (LANDSBERG, et. al, 2004). A hiperatividade adquirida ou secundária é um comportamento aprendido a partir da interação do cão com o meio. Está relacionada com cães muito agitados, rebeldes ou difíceis de controlar.
83
Problema de Comportamento
Considera-se problema de comportamento, qualquer comportamento do animal normal ou anormal que se traduza em problema na relação com seu grupo social humano ou animal. Todos os distrúrbios de comportamento, mesmo que não gerem problemas diretos na relação social do animal, ou comportamentos do animal que não sejam considerados normais para a espécie também são incluídos nesta definição. A micção em local inapropriado é um exemplo de problema de comportamento. Urinar para marcar território, é um comportamento natural da espécie canina, porém quando o cão marca com frequência um objeto pessoal do proprietário ou um móvel de sua residência gera problemas da qualidade da relação com esse proprietário e tal ato pode ser considerado um problema de comportamento. Outros exemplos podem seguir a mesma linha de raciocínio como: defecações em locais inapropriados, vocalizações excessivas e agressões. Como distúrbios de comportamento pode-se citar como exemplo os comportamentos compulsivos e a depressão.
Socialização
A socialização é o processo pelo qual o indivíduo se integra em um grupo social e aprende as regras sociais deste grupo.
Socialização Primária
Fase do desenvolvimento do cão, que se inicia na 8ª semana e se estende até a 16ª semana de vida do animal (SEKSEL, 1997). Está compreendida didaticamente entre o período de transição e o período juvenil. Nesta fase de sua vida, o filhote aprende a discriminar entre estímulos ambientais benignos (olfativos, sonoros, visuais e táteis) e ameaçadores. Por meio destes processos de aprendizagem, de interação social, comportamento lúdico e reconhecimento ambiental, o cão adquire habilidades comunicativas e de organização social, as quais irão determinar sua capacidade de adaptação, de ajuste ao ambiente, de interação com o grupo ao qual pertence ou irá pertencer, influenciando os futuros relacionamentos sociais da vida adulta (LANTZMAN, 2004).
84
APÊNDICE:
DOMESTICAÇÃO E FORMAÇÃO DAS RAÇAS
Ao longo da história, os cães vêm sendo submetidos tanto aos efeitos da
seleção natural, os quais possibilitaram a sua adaptação ao meio ambiente em que
vivem, como aos efeitos da seleção artificial, provocada pelos seres humanos de
diversos modos objetivando uma ampla variedade de aplicações para esses cães
(DENIS, 2007). No início da domesticação, os seres humanos conservaram aqueles
animais menos agressivos e menos arredios, provavelmente selecionando aqueles
com características morfológicas que diferiam dos exemplares selvagens, fato que
pode ter possibilitado a grande variedade morfológica encontrada nos cães
domésticos hoje em dia (DENIS, 2007). Contrariando a teoria de Darwin (1859), de
que os diferentes tipos morfológicos de cães teriam origem em diferentes espécies
de canídeos, através de análise genética de RNA mitocondrial, concluiu-se que a
origem do cão doméstico tem o lobo como ancestral mais provável (VILÁ et al,
1997). Exemplares dessa espécie foram, ao longo do tempo, sendo selecionado
para diversas aptidões, sendo hoje um animal com um potencial maior de cognição
social do que os lobos selvagens, destacando-se até de grandes primatas em certas
tarefas que dependem da leitura de sinais corporais humanos (HARE et al, 2002).
As primeiras associações entre homens e canídeos foram encontradas na
China e remontam há 150.000 anos (GRANDJEAN, 2001, p.3). Há cerca de 10.000
anos, ao deixar de ser nômade e caçador para ser produtor e criador do seu
alimento, o homem precisou domesticar o canídeo ancestral do cão para auxiliá-lo
na caça e posteriormente no cuidado do gado (GRANDJEAN, 2001, p.4). A fixação
dos padrões raciais só apareceu a partir do século XVI para os cães de caça e
prosseguiu ao longo dos séculos posteriores. A cinofilia progrediu até que no século
XIX (Londres – 1861 e Paris – 1863) se registraram as primeiras exposições caninas
(GRANDJEAN, 2001, p.7).
As raças, como são conhecidas hoje, são fruto de seleção natural, seleção
artificial e do cruzamento entre animais de padrões diferentes. O reconhecimento
das raças depende da organização das pessoas que criam os cães em associações
ou clubes, nos quais esses indivíduos estabelecem (ou reconhecem) padrões
morfológicos e comportamentais para as raças. Essas associações ou clubes de
cinofilia têm hoje uma entidade internacional de reconhecimento e classificação das
85
raças chamada de FCI (Federação Cinológica Internacional). Portanto, do Husky
Siberiano ao Cão Pelado Mexicano, do Pequinês ao Dogue Alemão, todas as cerca
de 400 raças homologadas pela FCI, a despeito de sua diversidade morfológica,
pertencem à espécie Canis familiaris (GRANDJEAN, 2001, p.6).
CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICA
Filo=> Chordata Classe => Mamália Ordem =>Carnívora Família => Canidae Gênero =>Canis Espécie => Canis familiaris
HISTÓRICO DAS RAÇAS CANINAS ESTUDADAS NOS CAPÍTULOS III E IV
RETIREVER DO LABRADOR
Havia, no século XVIII, na ilha de Terra Nova, no Canadá, um cão muito
apreciado como apanhador na caça ao pato selvagem, chamado St. John Water
Dog, em geral negro e com as dimensões de um Pointer. Exemplares desse cão
foram levados para a Inglaterra, em 1830, pelo terceiro duque de Malmesbury,
mesma pessoa responsável pelo nome Retriever do Labrador como foi registrado no
Kennel Club Inglês em 1903 (SCANZINI, 1983, p.278; GRANDJEAN, 2001, p.289).
Atualmente a raça é classificada pela FCI como cão de caça e é muito valorizada
para companhia e para trabalhos como guia de cegos e localizadores de drogas ou
pessoas soterradas.
86
ROTTWEILER
Existem duas origens possíveis para essa raça na Alemanha, uma é que
descenderia do Boiadeiro Bávaro e outra dos Molossos romanos. Já na idade média,
na cidade de Rottweil, em Würtemberg, este cão forte e robusto guardava rebanhos
e defendia os vendedores de gado contra os bandidos. Na época, a corporação dos
açougueiros adotou-o, o que justifica um dos nomes pelo qual é conhecido, “cão de
açougueiro”. O primeiro clube de criadores da raça surgiu em 1907. Durante a
primeira guerra mundial foi usado pelo exército alemão. (SCANZINI, 1983, p.189;
GRANDJEAN, 2001, p.101). Atualmente é classificado pela FCI como cão de tração,
de guarda e boiadeiro.
COCKER SPANIEL INGLÊS
Na Grã Bretanha, no século XIV, já existia um Spaniel, que era utilizado para
caça de pássaros com rede (“l’espainholz”). Esses cães localizavam e expulsavam
as aves de seus esconderijos para que os caçadores as pegassem. No século XVII,
87
esses cães se especializaram para caçar galinhola (“cocking”). Desse especialista
surgiu a raça Cocker Spaniel Inglês, que foi reconhecida em 1883 (GRANDJEAN,
2001, p.297). Atualmente é classificado pela FCI como levantador de caça e é muito
usado como cão de companhia.
BULL TERRIER
A raça é proveniente do cruzamento de Buldogues e de Terriers com a
finalidade de criar um “gladiador das raças caninas”, um cão forte como um
Buldogue com a agilidade de um Terrier, sendo primeiramente usado em combates
contra touros e depois contra outros cães. Em 1835, esses duelos foram proibidos
na Inglaterra. Por volta de 1860, Sir James Hinks, selecionou uma variedade
totalmente branca, que deu origem à raça atual. Foram admitidos outros padrões de
pelagem, em virtude da debilidade dos animais decorrente da seleção dos brancos
(SCANZINI, 1983, p. 225; GRANDJEAN, 2001, p.140). Atualmente é classificado
pela FCI como cão de caça e não é mais usado em brigas.
PIT BULL
88
No final do século XIX e início do XX, em Staffordshire (terra da cerâmica
inglesa), conservara-se uma variedade de buldogue da época em que se realizavam
combates, isto é, um tipo sólido, ágil, lutador e obstinado. Veio a ser reconhecido em
1935, com o nome de Staffordshire Bull Terrier. Esses cães, nos Estados Unidos da
América foram selecionados para criar uma raça maior e mais poderosa para os
combates entre cães, os quais aconteciam em fossas (pit=fossa), por isso passou a
ser conhecido com Pit Bull (SCANZINI, 1983, p.225; GRANDJEAN, 2001, p.139). O
Pit Bull é uma raça distinta dos Bull terrier de Staffordshire e não é reconhecida pela
FCI, mas, no Brasil, é reconhecida e classificada pela CBKC como cão de guarda e
companhia. Atualmente a raça participa de campeonatos de obediência, faro, agility,
proteção e tração.
89
ANEXO 1:
90
91
ANEXO 2:
92
93
94
95
96