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ASSUNTOS

- Peça de 10 minutos-

CAMILA APPEL

* todos os direitos reservados. texto registrado no Escritório

de Direitos Autorais da Fundação Biblioteca Nacional*

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Dois casais numa mesa de restaurante. O casal 1 é formado por Eliane e Waldo. O casal 2 é formado por Rubens e Carla. O casal 2 é mais bem sucedido do que o 1. Eliane gostaria de ser Carla, ter as conquistas profissionais que ela tem. E acredita que o marido se daria bem se ficasse amigo de Rubens. Para Eliane, a amizade é benéfica. É o primeiro encontro dos casais. Eliane tenta puxar assuntos, está ansiosa. Carla e Rubens não demonstram empolgação, respondem mecanicamente, esperando o jantar terminar. Estão entediados. Waldo um pouco envergonhado com a mulher que parece uma palhaça tentando animar a mesa, sem sucesso. Eliane: aí, ele vai adotando várias identidades e é por isso que a polícia não consegue descobrir aonde ele ta. Só que no final, ele já se tornou tantas pessoas diferentes, que ele se esquece de quem ele realmente é. Rubens (sem empolgação): Ah... Carla: vamos alugar esse filme sim, obrigada pela dica. Eliane: lá na locadora você vê cada coisa.... uma vez a gente foi assaltado, em pleno natal. Rubens: Nossa... Carla: você não falou que foram assaltados no réveillon? Eliane: no réveillon também, do ano seguinte. É uma época terrível. Rubens: é verdade. Eliane: ter uma locadora é como ser recepcionista de hotel. Você testemunha a vida como ela é. Carla: deve ser interessante mesmo. Eliane cutuca o marido. Waldo: Ah, a Eliane adora contar as histórias que ela vê lá. Eliane: O Waldo até colocou a locadora dentro do livro dele. O Waldo escreve super bem. A gente podia mandar o manuscrito para o Rubens, né amor?

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Waldo: tem que ver se ele tem tempo para ler essas coisas, amor... Eliane: O Rubens deve conhecer várias editoras... Rubens: Claro, manda sim. E... vocês vão querer mais alguma coisa? Eliane: Ah, vocês viram quem se separou? A Miriam e o Tito. Carla: ah, é? Rubens: nossa... Waldo: eles nem conhecem a Miriam e o Tito... Carla: na verdade a gente conhece sim. Rubens: separações são tristes. Vocês vão querer café? Waldo: eu quero um expresso por favor. Carla: eu to bem. Eliane: ta bom. Um capuchino pequeno. Rubens: então são três cafés e a conta... é que a gente tem compromisso. Silêncio desconfortável. Elaine: saiu uma máquina nova de café incrível. Café expresso, rápido de fazer e vem a opção com leite e sem leite. Dá para escolher até leite desnatado. Um dia vocês vão lá em casa, a gente cozinha para vocês e eu te mostro. Vale a pena. Carla: ah, claro... Silêncio desconfortável. Carla: Eliane, quantos anos tem o filho de vocês? Eliane: cinco. É um menino lindo e muito inteligente. A mesma cara do Waldo quando tinha essa idade. Carla (desempolgada): haha. Eliane: e ele também é paranormal.

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Os três: hã? Eliane: ah, meu amor, você sabe... como você era paranormal quando criança. Waldo dá uma risada nervosa. Rubens: como assim paranormal? Waldo: amor... Eliane: O Waldo previa o futuro. Carla: uau. Carla e Rubens começam a ficar intrigados. Waldo: não é nada disso. Eliane: claro que é. Rubens: que futuro que ele previu? Eliane: Uma noite, o Waldo sonhou com uma coisa que aconteceu logo em seguida... chamam isso de premonição. Waldo: amor... eu não quero... Eliane: eles querem escutar... Rubens: sonhou com o que? Eliane: ele sonhou com... Hum, olha aquele bolo, vamos pedir sobremesa? Carla: vamos. Rubens: ta, eu divido aquela ali com você. Carla: ele sonhou com o que? Eliane: ele sonhou com a morte de alguém. Carla: nossa, e esse alguém morreu logo depois do sonho? Eliane: no dia seguinte. Rubens: uau. Carla: como foi o sonho?

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Eliane: ela tava com um vestido longo, lindo, e toda maquiada, parecia um anjo produzido. Aí ela vinha até ele e dizia: eu tenho que ir, mas tenho certeza de que nos encontramos um dia. Saiba que eu sempre vou te amar. E aí ela colocava ele no colo, e o Waldo-criança chorava e pedia para ela ficar. Carla: Ela quem? Rubens: Calma amor, deixa ela contar. Waldo está cada vez mais desconfortável. Eliane: E ela flutuava sob a água até entrar num barco enorme e sair velejando. Ele criança no porto olhando a mãe ir embora. Carla: a mãe dele? Rubens: a mãe que... Eliane: a mãe dele morreu no dia seguinte. Carla: uau, ele deve ter sofrido muito. Eliane: ele viu. Rubens: Ele viu?! Eliane: ele tava lá quando.... quando ela se foi. Carla: como é que ela morreu? Eliane: ah... vejamos... eles estavam indo para o casamento de uma tia-prima, no interior. O Waldo tinha uns oito anos para falar a verdade. E o Waldo tava nervoso por causa do sonho. Ele contou do sonho para a mãe, mas a mãe abraçou ele e disse que era normal criança ter medo da morte da mãe. É normal ter medo de ficar sozinho. Carla: Ah, é normal. Rubens: Eu já sonhei com a morte da minha. Eliane: então, no caso do Waldo foi uma premonição. Carla: uau. Eliane: porque no caminho... quer contar amor?

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Waldo não responde. Eliane: bom, porque... no caminho, o carro passou por cima de uma pedra, ou alguma coisa assim, e o pneu furou, e o pai do Waldo se descontrolou e o carro saiu da pista e caiu no rio. O vidro tava um pouco aberto. A mãe do Waldo conseguiu empurrar o filho pelo vidro, mesmo com toda água entrando, dizem que foi um milagre na verdade. Mas ela não conseguiu sair. Empurrou o filho para fora, e afundou com o carro. Carla: meu deus. E o pai do Waldo? Eliane: o pai morreu também... mas ele não tava no sonho. Rubens: Ah. Carla: nossa, tadinho do Waldo. Rubens: uau, que história. Vou pedir um vinho. Eliane olha toda orgulhosa por ter conseguido a atenção do casal. Waldo está de lado para a mesa, cabisbaixo, arrasado. Ele acende um isqueiro e coloca fogo no guardanapo. Black-out.