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1 Aspectos da tolerância à corrupção no Brasil Rodrigo Alonso Vásquez Introdução: A democracia moderna do ponto de vista teórico exige que os atores políticos se comportem e ajam tendo como referência um conjunto de normas e procedimentos democráticos. A cultura, as instituições, as normas e as leis cumprem um papel fundamental no sentido de orientar as ações dos indivíduos e de concretizar os princípios básicos do regime democrático, sobretudo, os de garantir a participação política dos cidadãos considerados aptos no processo de tomada de decisões e o de controlar as ações dos governantes pelos governados. Evidentemente, a questão da participação envolve outros pontos importantes como o sufrágio universal, que permite a igualdade política de participação dos cidadãos, e também, principalmente a existência efetiva dos direitos civis e políticos que consenti aos cidadãos manifestarem, contestarem e expressarem suas idéias políticas, participarem das questões públicas, se organizarem e competirem de forma pacífica pelo poder político. Por sua vez, a questão do controle remete a outros pontos também importantes como a qualidade e efetividade das leis, mecanismos de controle - accountability vertical e horizontal – e de transparência das ações dos governantes, e a existência de instituições que garantam a distribuição de poder político e atendam as demandas dos cidadãos, transformando-as em políticas públicas (Bobbio, 1986; Dahl, 1997; Diamond e Morlino, 2004; Moises, 2005). Portanto, diferentemente de outros regimes políticos, a democracia moderna se centra também na responsavidade e na transparência dos atos dos governos e dos políticos. Neste sentido, o fenômeno da corrupção política e a sua tolerância, sem dúvida se tornam um grave problema para os regimes democráticos, pois rompem diretamente com seus princípios mais básicos. A má administração pública ou a ineficiência dos governos e das instituições políticas, em razão da corrupção, provocam por parte dos cidadãos o sentimento de desconfiança e de descrédito com relação a elas. Por sua vez, a falta de confiança no governo e em suas instituições políticas facilitaria a corrupção (Della Porta,

Aspectos da tolerância à corrupção no Brasil Rodrigo ... · Nos dias de hoje, a corrupção deixou de ser uma preocupação exclusiva dos economistas e passou a ser também, objeto

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1

Aspectos da tolerância à corrupção no Brasil

Rodrigo Alonso Vásquez

Introdução:

A democracia moderna do ponto de vista teórico exige que os atores políticos se

comportem e ajam tendo como referência um conjunto de normas e procedimentos

democráticos. A cultura, as instituições, as normas e as leis cumprem um papel

fundamental no sentido de orientar as ações dos indivíduos e de concretizar os princípios

básicos do regime democrático, sobretudo, os de garantir a participação política dos

cidadãos considerados aptos no processo de tomada de decisões e o de controlar as ações

dos governantes pelos governados.

Evidentemente, a questão da participação envolve outros pontos importantes como o

sufrágio universal, que permite a igualdade política de participação dos cidadãos, e

também, principalmente a existência efetiva dos direitos civis e políticos que consenti aos

cidadãos manifestarem, contestarem e expressarem suas idéias políticas, participarem das

questões públicas, se organizarem e competirem de forma pacífica pelo poder político. Por

sua vez, a questão do controle remete a outros pontos também importantes como a

qualidade e efetividade das leis, mecanismos de controle - accountability vertical e

horizontal – e de transparência das ações dos governantes, e a existência de instituições que

garantam a distribuição de poder político e atendam as demandas dos cidadãos,

transformando-as em políticas públicas (Bobbio, 1986; Dahl, 1997; Diamond e Morlino,

2004; Moises, 2005). Portanto, diferentemente de outros regimes políticos, a democracia

moderna se centra também na responsavidade e na transparência dos atos dos governos e

dos políticos.

Neste sentido, o fenômeno da corrupção política e a sua tolerância, sem dúvida se

tornam um grave problema para os regimes democráticos, pois rompem diretamente com

seus princípios mais básicos. A má administração pública ou a ineficiência dos governos e

das instituições políticas, em razão da corrupção, provocam por parte dos cidadãos o

sentimento de desconfiança e de descrédito com relação a elas. Por sua vez, a falta de

confiança no governo e em suas instituições políticas facilitaria a corrupção (Della Porta,

2

2000). Assim, tendo em vista os recentes estudos sobre o tema e fundamentado nos dados

provenientes do Survey ‘A desconfiança dos cidadãos nas instituições democráticas’1, o

presente texto irá analisar se fatores políticos como a confiança nas instituições, confiança

interpessoal, desempenho do Governo e o respeito ao primado da lei, por parte dos cidadãos

são relevantes para a tolerância a determinadas atividades de corrupção. Juntamente com

esta análise, também busco analisar se os fatores socioeconômicos como renda, grau de

instrução, faixa etária e sexo estão ou não também relacionados com a questão da tolerância

dos cidadãos brasileiros às atividades de corrupção.

As dificuldades do estudo sobre Corrupção:

Embora seja um fenômeno antigo e presente em muitos textos históricos, a

corrupção e a sua tolerância pelos cidadãos só se tornaram efetivamente objeto de estudo da

Ciência Política nos últimos 30 anos. Atualmente, a preocupação com a corrupção ganhou

espaço nas agendas políticas dos governos e instituições internacionais. Discute-se como

diminuir a incidência do problema, as suas conseqüências e os custos sociais, econômicos e

políticos, e, quais são os fatores relacionados à sua ocorrência. Ainda que o debate tenha

aumentado, como se pode notar através da quantidade de notícias e comentários feitos por

jornalistas, acadêmicos e políticos, seu estudo empírico e qualitativo não aumentou na

mesma proporção e continua sendo uma tarefa difícil.

O estudo da corrupção é difícil, pois a sua mensuração e seus efeitos não são claros

nem evidentes. Várias tentativas foram feitas no intuito de quantificar o fenômeno, com

destaque para três: (1) o número de denúncias divulgadas pela mídia; (2) o número de

prisões e punições contabilizadas pelos órgãos judiciários; e (3) os dados obtidos através as

pesquisas de opinião publica a cerca do tema. Evidentemente, todas estas tentativas

apresentam problemas, no entanto, o uso destas três formas, sobretudo, da terceira se

revelou como bom indicador de corrupção. Os problemas em relação à primeira tentativa se

devem principalmente ao fato de que as denúncias estão mais presentes nos jornais escritos

1 O Survey ‘A desconfiança dos cidadãos nas instituições democráticas’ foi desenvolvido pelo projeto temático com o mesmo nome e contou com o financiamento da Fapesp (processo 04/07952-8). O Survey foi realizado ao nível nacional em Junho de 2006 e ao todo foram feitas 2004 entrevistas.

3

e televisivos, e estes dependem da linha editorial e do grau de liberdade da imprensa do

país. Já o segundo indicador apresenta como problemas o fato que os seus dados se baseiam

unicamente nos registros oficiais que são fornecidos pelas instituições de investigação e de

punição, como a Polícia, o Ministério Público e os Tribunais de Justiça. No entanto, a

corrupção é uma atividade ilegal que necessariamente requer investigação, e muitas vezes,

o número de investigações não condiz com o número real de denúncias. Apenas se toma

conhecimento destas quando alguém as faz – o que nem sempre ocorre - assim, o que

ocorre é que muitas vezes o número de registros dos casos não são reais, ou porque não se

investigaram ou porque não houve denúncias, independentemente da corrupção realmente

existir ou não. As críticas ao terceiro indicador são poucas e se dirigem à dificuldade em

definir e trabalhar com os dados obtidos, e à metodologia utilizada na própria pesquisa

(Speck, 2000; Seligson 2002).

Contudo, ao longo dos anos, os esforços em desenvolver técnicas de pesquisas

eficientes para o estudo e a mensuração do fenômeno, como os Surveys que conseguem

trabalhar com dados individuais, têm apresentado resultados significativos. As pesquisas de

opinião pública sobre o tema da corrupção têm trabalhando com as percepções e as

experiências individuais dos cidadãos em diversos países, principalmente nos democráticos.

Elas demonstraram ser mais eficientes e seguras que os demais indicadores e por isso seu

uso tem crescido nos últimos anos – por isto também ela é utilizada neste presente estudo.

Outros indicadores trabalhados na tentativa de mensuração do fenômeno da

corrupção são os índices CPI (Corruption Perceptions Index) e WBI (World Bank Institute)

desenvolvidos respectivamente pela ONG Transparência Internacional e pelo Banco

Mundial. Embora de maneira geral apresentem diferenças metodológicas, ambos

indicadores trabalham com a percepção da corrupção e são produzidos por empresas de

consultoria que avaliam os países como um todo, e trabalham, com dados referentes à

corrupção de maneira geral e não com aspectos específicos desta. Todavia, as amostras não

são nacionais e se restringem a determinados setores profissionais da sociedade, como

empresários, jornalistas e funcionários públicos. Contudo, o intuito de ambos é desenvolver

um indicador capaz de mensurar a corrupção em diferentes países de forma comparativa e

longitudinal (Speck, 2000; Seligson, 2002; Power e Gonzáles, 2003). Entretanto, as críticas

a estes indicadores são atribuídas a valorização que estes dão à subjetividade da percepção

4

e ao curto alcance das amostras, limitadas a percepção de alguns setores profissionais da

sociedade.

Todavia, a dificuldade do estudo não se está apenas no campo técnico da pesquisa,

mas também no teórico, principalmente com o problema da definição do conceito de

corrupção. Em grande medida, o número de estudos empíricos sobre o tema é reduzido e

recente, mesmo a definição do conceito não é consensual embora a maioria dos estudiosos

aceite a corrupção como o uso de bens públicos para fins privados (Speck, 2000; Seligson,

2001 e 2002; Warren, 2004). Os primeiros estudos políticos realizados demonstraram que

há diferenças entre a norma escrita da lei e a sua inserção e compreensão na realidade

social, nem sempre a norma é reconhecida pelos cidadãos e desta forma, não é obedecida;

outras vezes, o significado do conceito pode vir a variar conforme a época e a cultura do

país sendo amenizado ou agravado (Speck, 2000; Power e Gonzáles, 2003; Warren, 2004).

O impacto da corrupção para a democracia:

Inicialmente o estudo da corrupção se limitou ao enfoque unicamente econômico do

fenômeno. A preocupação consistia em analisar os custos que a corrupção trazia para a

economia do país como um todo, procurava-se compreender como tal fenômeno poderia

influenciar no número de investimentos e de negócios, no crescimento econômico, no

aumento dos custos e na piora de qualidade dos serviços. Nos dias de hoje, a corrupção

deixou de ser uma preocupação exclusiva dos economistas e passou a ser também, objeto

de estudo da Ciência Política (Speck, 2000; Seligson, 2001; Power e Gonzáles, 2003).

Os principais estudos políticos sobre a corrupção podem ser divididos em duas

vertentes teóricas muito distintas. A primeira ficou conhecida como a escola funcionalista,

pois para esta a corrupção cumpria uma função política específica na sociedade. A segunda

vertente conhecida como realista compreendia o fenômeno de uma forma não funcional e

estudava seus efeitos políticos. A diferença fundamental destas duas concepções está na

compreensão que fazem da corrupção, para a primeira tal fenômeno tem um papel positivo

e se restringe aos países subdesenvolvidos, principalmente os com regimes autoritários. Os

aspectos positivos ressaltados - cujo autor eminente foi Samuel Huntington - são que a

5

corrupção em regimes autoritários ou recentemente democráticos, traz benefícios concretos

a grupos marginalizados da sociedade, uma vez que favorece a sua integração e garante a

estes o acesso a recursos públicos até então distantes, e, todavia, estabelece vínculos entre

corruptor e corrupto, ou entre as elites e os demais cidadãos frente às ações do Estado

autoritário (Seligson, 2001 e 2002; Power e Gonzáles, 2003).

Já para a escola realista, a corrupção não tem nenhum aspecto positivo, muito pelo

contrário, e a universaliza a todos os países, independentemente do tipo de regime político e

do desenvolvimento econômico. Além dos problemas econômicos acima apontados,

reconhece que a corrupção exerce influência à baixa legitimidade, à baixa satisfação e à

baixa confiança política e interpessoal dos cidadãos em relação ao sistema político como

um todo. Para Donnatella della Porta e Alberto Vannucci (1999) a corrupção seria a causa e

conseqüência da baixa performance e legitimidade2 do governo, reduzindo desta forma, a

confiança dos cidadãos nas instituições3, no governo e na capacidade deste em atender e a

solucionar as demandas e os problemas do país. A incapacidade em atender e solucionar

estas demandas poderia levar aos cidadãos buscarem outros meios, não convencionais e

democráticos, de realizar seus interesses. Além disto, a corrupção também teria um efeito

negativo na capacidade associativa e participativa dos cidadãos, pois minaria a confiança

destes nos meios democráticos de tomada de decisões coletivas e entre os próprios

indivíduos. Neste cenário, a corrupção política favoreceria a desconfiança nas instituições

políticas pelos cidadãos, e esta por sua vez, alimentaria a corrupção. A desconfiança dos

cidadãos levaria a uma baixa expectativa em relação à eficiência e imparcialidade das ações

do governo e dos políticos, o que favoreceria a ocorrência de corrupção (Della Porta, 2000).

Para Seligson (2002) estes efeitos políticos negativos não são tão evidentes e

somente através de estudos empíricos baseados em Surveys, que consigam trabalhar o

2 Segundo alguns autores, a legitimidade de um sistema democrático esta intimamente relacionada com a capacidade dos governos democráticos de se mostrarem aptos a responderem as principais necessidades e anseios do povo que representa (Norris, 1999; Moisés 2005; Power e Jamison, 2005). 3 No regime democrático moderno as instituições são orientadas segundo um viés ético e normativo de funcionamento. As instituições deveriam demonstrar, de maneira transparente, o universalismo, a imparcialidade, a justeza e a probidade de suas ações, assegurando que os interesses dos diferentes atores sejam levados em conta. A

desconfiança às instituições pode significar uma atitude crítica dos cidadãos perante a ineficiência, a corrupção, a fraude ou qualquer outra forma de

comportamento contrário ao ideal para a qual estas foram elaboradas (Dalton, 1999; Norris, 1999; Della Porta e Vannucci, 1999; Speck, 2000; Seligson, 2002;

Warren, 2004; Moises, 2005). O fenômeno da desconfiança política com relação às instituições é um fenômeno relacional e multidimensional entre cidadãos e instituições, é uma forma de comportamento, de percepção dos primeiros, fruto de suas experiências e orientações subjetivas em relação às instituições.

6

aspecto individual dos cidadãos, pode-se comprová-los. O estudo realizado pelo autor na

Nicarágua, Bolívia, Guatemala e El Salvador, comprovou a hipótese de que a experiência

da corrupção realmente interfere na legitimidade do regime político e na confiança

interpessoal. Altos índices de corrupção estão relacionados com baixos índices de

legitimidade do sistema político e de confiança interpessoal.

Todavia, segundo Mark Warren (2004) a corrupção causa inúmeros problemas à

democracia, pois ela rompe com o pressuposto fundamental do regime democrático da

participação, exatamente por restringi-lo e torná-lo excludente. A corrupção precisamente

reduz a influência da população no processo de tomada de decisões, seja por fraudes nos

processos decisórios, como nas eleições, seja pela desconfiança e suspeita que ela gera

entre os próprios cidadãos – reduzindo a capacidade associativa dos mesmos - e com

relação ao governo e as instituições democráticas. A corrupção reduz também a força da

publicidade e da transparência das ações dos governantes e do governo, uma vez que reduz

os órgãos públicos em instrumentos de ganho privado. Ela também gera ineficiência nos

serviços públicos, pois modifica o sentido dos mesmos a um meio de obter ganhos, os

direitos se tornam favores e privilégios daqueles cidadãos que podem pagar o ‘custo’.

Em outras palavras, a ineficiência ou a indiferença, por parte das instituições, com

relação às demandas sociais e as percepções, por parte dos cidadãos, de corrupção, de

fraudes ou de desrespeito de direitos, geram nestes, sentimentos de suspeição,

desconfiança, descrédito e desesperança em relação às instituições e as demais estruturas

que organizam e regulam a vida social (Moises, 2005; Norris, 1999). Portanto, a corrupção

alimenta formas de agir e de comportamento muito distintas ao conjunto de normas e

procedimentos democráticos, minando desta forma a cultura democrática (Della Porta,

2000; Seligon, 2002; Warren 2004).

Frente a estes dados que tornam evidentes as conseqüências negativas da corrupção

para o regime democrático, o estudo da corrupção no caso da democracia brasileira se torna

muito relevante já que é um problema sempre presente. O regime democrático brasileiro

desfruta de certo período de estabilidade e de fortalecimento de suas instituições. As

instituições políticas brasileiras têm funcionado com uma relativa harmonia e normalidade

dando claro indício de consolidação e de força. As eleições são livres e periódicas e há uma

significativa participação eleitoral por parte dos cidadãos como nunca fora visto

7

anteriormente. E mesmo quando passando por momentos de crise e por constantes

escândalos de corrupção, ações arbitrárias e autoritárias, comuns a outros períodos da

história política brasileira por parte de alguns atores políticos, não se efetivaram no

presente. Um dos aspectos importantes, que contribuiu para o atual quadro do regime

político brasileiro, é que desde 1985 a maioria quase absoluta dos atores políticos se

comporta tendo como referência o conjunto de normas e procedimentos democráticos

(Kinzo, 2004; Moises, 2005; Power e Jamison, 2005). No entanto, de maneira geral, a

democracia brasileira é marcada por um sentimento de insatisfação, descrédito e

desconfiança, por parte dos cidadãos, às instituições políticas e ao Governo (Moisés, 1995 e

2005, Power e Jamison, 2005).

Os constantes escândalos de corrupção envolvendo o Congresso Nacional, partidos

políticos e políticos, e as crises provocadas pelas investigações e pela paralisia que estas

provocam no Congresso através das CPIs, podem comprometer a confiança por parte dos

cidadãos com relação às instituições, sobretudo a aquelas instituições envolvidas. É valido

ressaltar que este cenário compromete o desempenho geral das instituições, pois desvia o

enfoque e recursos humanos e econômicos destas para outras atividades para as quais não

são originalmente designadas a fazer (Moisés, 2005; Power e Jamison, 2005).

Tendo este cenário como pano de fundo, o presente texto busca comprovar

empiricamente, a partir dos dados do Survey ‘A desconfiança dos cidadãos nas instituições

democráticas’, se os fatores socioeconômicos, como baixo grau de escolaridade e baixo

nível de renda, e se fatores políticos como a confiança nas instituições e interpessoal, o

respeito ao primado da lei e o desempenho do governo influenciam e são relevantes para se

compreender a tolerância a determinadas atividades de corrupção.

Análise dos resultados:

As questões do Survey A desconfiança dos cidadãos nas instituições democráticas

escolhidas para serem tratadas neste artigo podem ser divididas em dois grupos: o primeiro

são questões socioeconômicas como sexo, grau de escolaridade, faixa de renda mensal

familiar e faixa etária; e o segundo são questões políticas, sobre confiança institucional e

8

interpessoal, desempenho do governo e primazia da lei. Ambos conjuntos de questões são

trabalhados como variáveis independentes, que procurarão explicar a variável dependente

da tolerância à corrupção, que também é trabalhada no mesmo Survey. Esta última consiste

na percepção que o cidadão brasileiro faz de si mesmo numa situação hipotética de ocupar

um cargo político. Ela aborda o aspecto da tolerância a três específicas práticas de

corrupção4, por isto ela é utilizada como a variável dependente em todos os testes.

Inicialmente, através da análise da freqüência simples, esta questão já traz dados

relevantes. Na primeira situação colocada na questão, mudar de partido em troca de

dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas conhecidas (Tabela 1,0), há uma

porcentagem significativa de respostas ‘sempre’ (5,1%), ‘algumas vezes’ (8,1%), e ‘só se

não tivesse outro jeito’ (22,5%). Somadas as duas primeiras porcentagens se chega a

13,2%, se somarmos as três teremos 35,7%, sem dúvida nenhuma, uma porcentagem muito

significativa - se levarmos em conta que o Survey trata de uma situação hipotética e

relativamente distante da maioria dos cidadãos – e muito preocupante! Todavia, se

considerarmos unicamente a resposta ‘Não faria de jeito nenhum’, a rejeição completa,

teríamos 63,1%, ou seja, mais de um terço dos entrevistados são propícios a cometerem

práticas de corrupção. Todos estes valores acima são próximos aos valores das demais

situações apresentadas na questão, ‘Superfaturar obras públicas e desviar dinheiro para o

patrimônio pessoal/ familiar do político’ (Tabela 1.1) e ‘Usar ‘Caixa 2’ em campanhas

eleitorais’ (Tabela 1.2), sobretudo com esta última. A segunda situação que envolve a

superfaturação e desvio de dinheiro é que apresenta porcentagens mais altas de rejeição,

porém ainda são valores altos.

Tabela 1.0

Freqüência: Mudaria de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas conhecidas (percepção sobre si mesmo)

4 “E se o(a) sr(a) estivesse no lugar de um político, o(a) sr(a) faria isso sempre que tivesse oportunidade, faria algumas vezes outras não, faria só se não tivesse outro jeito, ou não faria de jeito nenhum? (A) Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas conhecidas. (B) Superfaturar obras públicas e desviar dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar do político. (C) Usar ‘Caixa 2’ em campanhas eleitorais.”

9

Tabela 1.1

Freqüência: Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar do político (percepção sobre si mesmo)

Tabela 1.2

Freqüência: Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e confiança nas instituições (percepção sobre si mesmo)

Ao realizar os primeiros testes de correlação entre as variáveis socioeconômicas

(independentes) e a tolerância a corrupção (dependente), foram utilizados dois tipos de

testes conforme a natureza da variável. Com relação à variável nominal independente

102 5,1 5,2 5,2

163 8,1 8,2 13,4

451 22,5 22,8 36,2

1264 63,1 63,8 100,0

1980 98,8 100,0

24 1,2

2004 100,0

Sempre

Algumas vezes

Só se não tivesse outrojeito

Não faria de jeito nenhum

Total

Valid

SystemMissing

Total

Frequency Percent Valid PercentCumulative

Percent

62 3,1 3,1 3,1

110 5,5 5,6 8,7

309 15,4 15,6 24,3

1500 74,9 75,7 100,0

1981 98,9 100,0

23 1,1

2004 100,0

Sempre

Algumas vezes

Só se não tivesse outrojeito

Não faria de jeito nenhum

Total

Valid

SystemMissing

Total

Frequency Percent Valid PercentCumulative

Percent

81 4,0 4,1 4,1

127 6,3 6,5 10,6

388 19,4 19,7 30,3

1371 68,4 69,7 100,0

1967 98,2 100,0

37 1,8

2004 100,0

Sempre

Algumas vezes

Só se não tivesse outrojeito

Não faria de jeito nenhum

Total

Valid

SystemMissing

Total

Frequency Percent Valid PercentCumulative

Percent

10

‘sexo’ foi feito o teste de Coeficiente de Contingência5, nas demais variáveis por se

tratarem de variáveis ordinais se utilizou os testes Gamma e Kendall’s tau-b.

A variável ‘sexo’ apresentou significância nos três casos como se pode ver na

Tabela 2.0 - os valores se mostraram menores que o valor de significância de 0,05. Porém,

a correlação entre as variáveis se mostrou fraca, os valores foram respectivamente 0,078,

0,071 e 0,113. Isto significa que a variável testada tem uma correlação muito fraca com a

tolerância à corrupção da questão, ou seja, que ela é pouco explicativa para o que se propôs.

Tabela 2.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘sexo’

Situação Coeficiente de

Contigência

Approx. Sig

1) Mudaria de partido em troca de dinheiro ou cargo/

emprego para familiares/ pessoas conhecidas

0,078 0,007

2) Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o

patrimônio pessoal/ familiar do político

0,071 0,019

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais 0,113 0,000

Com relação às demais variáveis socioeconômicas, que são ordinais, fizeram-se um

procedimento estatístico parecido, desta vez o teste empreendido foi o Gamma6 e Kendall’s

tau-b7. A variável independente ‘grau de instrução’ quando testada com a questão da

tolerância à corrupção, mostrou-se em duas situações, destacadas em cinza, (Tabela 3.0) ser

significante. No entanto, a correlação mais uma vez foi fraca os valores foram

respectivamente Gamma – 0,087 e – 0,083; Kendall’s tau-b -0,058 e -0,052 (o sinal

negativo indica que as variáveis têm uma relação indireta, quanto maior uma menor será a

5 Este teste tem como objetivo testar a correlação da variável independente com a variável dependente, sua escala vai de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de um melhor a correlação. Seu uso é recomendado quando se tem pelo menos uma variável nominal. Para o caso das ciências sociais, valores superiores a 0,15 indicam uma correlação regular e valores entre 0,2 e 0,3 indicam uma correlação forte. 6 A escala deste teste vai de –1 a +1, quanto mais perto dos extremos mais forte é a correlação entre as variáveis, quanto mais próximo de zero mais fraca é a mesma. Porém, no caso das ciências sociais, valores superiores a 0,15 indicam uma correlação regular e valores entre 0,2 e 0,3 indicam uma correlação forte. 7 Os valores deste teste são os mesmos do que do teste Gamma.

11

outra, no caso quanto maior a escolaridade menor a tolerância a corrupção). Na segunda

situação as variáveis nem sequer apresentaram valor de significância, o que significa não

haver nenhuma correlação entre as variáveis. De maneira geral, pode-se afirmar que a

variável ‘grau de instrução’ apresenta uma baixíssima relação com a tolerância à

corrupção, mesmo quando apresenta valor de significância.

Tabela 3.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘grau de instrução’

Situação Gamma Kendall’s tau-b Approx. Sig

1)Mudaria de partido em troca de dinheiro

ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas

conhecidas

-0,087 -0,058 0,001

2) Superfaturar obras públicas e desviar o

dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar

do político

-0,045 -0,027 0,141

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais -0,083 -0,052 0,004

Por sua vez, a variável independente ‘faixa de renda mensal familiar’, obteve

resultados ainda menos expressivos. Em nenhuma das situações os testes indicaram valor

de significância entre as variáveis (Tabela 4.0), deixando claro que as variáveis não tem

relação nenhuma.

Tabela 4.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘faixa de renda mensal

familiar’

Situação Gamma Kendall’s tau-b Approx. Sig

1)Mudaria de partido em troca de dinheiro

ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas

conhecidas

0,017 0,011 0,589

12

2) Superfaturar obras públicas e desviar o

dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar

do político

0,043 0,024 0,231

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais -0,007 -0,004 0,840

Por fim, a última variável socioeconômica testada foi a da ‘faixa etária’, esta em

todas as situações apresentou significância e diferentemente das demais variáveis

socioeconômicas, apresentou também uma correlação forte na primeira situação, e regular

nas demais, respectivamente os valores de Gamma foram 0,212, 0,161 e 0,178 (Tabela 5.0).

Isto significa que as duas variáveis testadas estão associadas e que a ‘faixa etária’ apresenta

uma significativa relação com a questão da tolerância à corrupção. Em comparação com as

demais variáveis socioeconômicas, somente entre aquelas que apresentaram significância,

há uma considerável diferença entre os valores Gamma - os valores com o teste Kendall’s

tau-b também foram mais altos em comparação aos valores das demais variáveis

socioeconômicas, embora, sempre mais baixos comparativamente com os valores Gamma.

Desta forma, pode-se afirmar que a única variável socioeconômica com uma correlação de

regular para forte (estatisticamente relevante) foi a ‘faixa etária’.

Tabela 5.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘faixa etária’

Situação Gamma Kendall’s tau-b Approx. Sig

1)Mudaria de partido em troca de dinheiro

ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas

conhecidas

0,212 0,137 0,000

2) Superfaturar obras públicas e desviar o

dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar

do político

0,161 0,090 0,000

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais 0,178 0,108 0,000

Através dos testes de correlação, vistos acima, e da análise das freqüências das

tabelas de cruzamentos abaixo (tabelas 6.0, 6.1 e 6.2), pode-se afirmar de maneira geral,

13

que os indivíduos das duas faixas mais velhas, ‘de 45 a 59 anos’ e ‘de 60 ou mais’ são os

indivíduos mais intolerantes às ações sugeridas no enunciado da questão. Respectivamente,

olhando para a porcentagem dentro da Faixa Etária, são as faixas que menos responderam

‘sempre’, ‘algumas vezes’, ‘só senão tivesse outro jeito’ e os que mais responderam ‘não

faria de jeito nenhum’. Em todas as três tabelas, fica claro também, que entre estas duas

faixas a mais velha é a mais intolerante. Com relação às demais faixas etárias as mais novas

não são necessariamente as mais tolerantes à questão da tolerância da corrupção. Conforme

a situação (Tabelas 6.1 e 6.2), as faixas etárias intermediárias são mais tolerantes que a

faixa mais nova, ‘de 16 a 24 anos’, a porcentagem de resposta ‘Não faria de jeito nenhum’

é maior entre a faixa etária mais nova do que na faixa ‘de 25 a 34 anos’. Nas três situações

a porcentagem de resposta ‘sempre’ é menor na faixa etária mais nova do que na faixa ‘de

25 a 34 anos’.

Tabela 6.0

Cruzamento: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas por ‘faixa etária’

23 38 22 13 6 102

22,5% 37,3% 21,6% 12,7% 5,9% 100,0%

5,7% 7,9% 5,4% 3,1% 2,3% 5,2%

1,2% 1,9% 1,1% ,7% ,3% 5,2%

46 42 36 34 5 163

28,2% 25,8% 22,1% 20,9% 3,1% 100,0%

11,4% 8,7% 8,9% 8,0% 1,9% 8,2%

2,3% 2,1% 1,8% 1,7% ,3% 8,2%

114 112 94 98 33 451

25,3% 24,8% 20,8% 21,7% 7,3% 100,0%

28,1% 23,3% 23,2% 23,2% 12,5% 22,8%

5,8% 5,7% 4,7% 4,9% 1,7% 22,8%

222 289 254 278 221 1264

17,6% 22,9% 20,1% 22,0% 17,5% 100,0%

54,8% 60,1% 62,6% 65,7% 83,4% 63,8%

11,2% 14,6% 12,8% 14,0% 11,2% 63,8%

405 481 406 423 265 1980

20,5% 24,3% 20,5% 21,4% 13,4% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

20,5% 24,3% 20,5% 21,4% 13,4% 100,0%

Count

% within P5IIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Sempre

Algumasvezes

Só se nãotivesse outrojeito

Não faria dejeito nenhum

Total

De 16 a24 anos

De 25 a34 anos

De 35 a44 anos

De 45 a59 anos

De 60 anosou mais

FAIXA ETÁRIA

Total

14

Tabela 6.1

Cruzamento: Superfaturar obras públicas e desviar dinheiro para patrimônio pessoal/

familiar do político por ‘faixa etária’

11 21 16 11 3 62

17,7% 33,9% 25,8% 17,7% 4,8% 100,0%

2,7% 4,4% 4,0% 2,6% 1,1% 3,1%

,6% 1,1% ,8% ,6% ,2% 3,1%

29 35 25 16 5 110

26,4% 31,8% 22,7% 14,5% 4,5% 100,0%

7,1% 7,3% 6,2% 3,8% 1,9% 5,6%

1,5% 1,8% 1,3% ,8% ,3% 5,6%

71 78 73 61 26 309

23,0% 25,2% 23,6% 19,7% 8,4% 100,0%

17,5% 16,2% 18,1% 14,5% 9,7% 15,6%

3,6% 3,9% 3,7% 3,1% 1,3% 15,6%

295 348 290 334 233 1500

19,7% 23,2% 19,3% 22,3% 15,5% 100,0%

72,7% 72,2% 71,8% 79,1% 87,3% 75,7%

14,9% 17,6% 14,6% 16,9% 11,8% 75,7%

406 482 404 422 267 1981

20,5% 24,3% 20,4% 21,3% 13,5% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

20,5% 24,3% 20,4% 21,3% 13,5% 100,0%

Count

% within P5XIIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5XIIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5XIIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5XIIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5XIIC

% within F. ETÁRIA

% of Total

Sempre

Algumasvezes

Só se nãotivesse outrojeito

Não faria dejeito nenhum

Total

De 16 a24 anos

De 25 a34 anos

De 35 a44 anos

De 45 a59 anos

De 60 anosou mais

FAIXA ETÁRIA

Total

15

Tabela 6.2

Cruzamento: Usar caixa 2 em campanhas eleitorais por ‘faixa etária’

Os testes que se seguem abaixo são entre a mesma variável dependente, já utilizada

acima de tolerância à corrupção, com as questões políticas sobre confiança institucional e

interpessoal, desempenho do governo e primazia da lei. Com relação à variável ‘confiança

institucional’ 8 (Tabela 7.0), pode-se afirmar de maneira geral que mesmo as respostas com

significância estatística (destacadas em cinza) possuem uma correlação fraca com a

variável da tolerância da corrupção, mesmo no teste Gamma. As respostas que apresentam

uma maior correlação são as variáveis ‘Poder Judiciário’ (-0,143), ‘Congresso Nacional’ (-

0,130) e ‘Leis do País’ (-0,131). Isto significa que a confiança nestas instituições, que

apresentaram valor de significância, estão relacionadas, ainda que de uma maneira fraca,

8“Vou citar alguns órgãos públicos e particulares e gostaria de saber qual é o grau de confiança que o Sr(a) tem em cada um deles: na igreja; nas forças armadas; no poder judiciário; na polícia; no congresso nacional; nos partidos políticos; na televisão; nos sindicatos; nos empresários; no governo; no presidente; nos bombeiros; nas leis do país.”

14 29 18 15 5 81

17,3% 35,8% 22,2% 18,5% 6,2% 100,0%

3,5% 6,1% 4,4% 3,6% 1,9% 4,1%

,7% 1,5% ,9% ,8% ,3% 4,1%

36 39 29 16 7 127

28,3% 30,7% 22,8% 12,6% 5,5% 100,0%

9,0% 8,2% 7,2% 3,8% 2,7% 6,5%

1,8% 2,0% 1,5% ,8% ,4% 6,5%

90 104 85 74 35 388

23,2% 26,8% 21,9% 19,1% 9,0% 100,0%

22,4% 21,8% 21,0% 17,5% 13,5% 19,7%

4,6% 5,3% 4,3% 3,8% 1,8% 19,7%

262 306 273 317 213 1371

19,1% 22,3% 19,9% 23,1% 15,5% 100,0%

65,2% 64,0% 67,4% 75,1% 81,9% 69,7%

13,3% 15,6% 13,9% 16,1% 10,8% 69,7%

402 478 405 422 260 1967

20,4% 24,3% 20,6% 21,5% 13,2% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

20,4% 24,3% 20,6% 21,5% 13,2% 100,0%

Count

% within P5IXC.

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IXC.

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IXC.

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IXC.

% within F. ETÁRIA

% of Total

Count

% within P5IXC.

% within F. ETÁRIA

% of Total

Sempre

Algumasvezes

Só se nãotivesse outrojeito

Não faria dejeito nenhum

Total

De 16 a24 anos

De 25 a34 anos

De 35 a44 anos

De 45 a59 anos

De 60 anosou mais

FAIXA ETÁRIA

Total

16

com a tolerância à corrupção, os indivíduos que mais confiam nestas são mais intolerantes à

situação de corrupção da questão. No caso da tabela 7.1, o cenário é ainda pior, a única

variável com uma correlação regular foi a variável ‘Leis do País’ (-0,133). Já a análise da

tabela 7.2, apresentou um maior número de variáveis com correlações, e com correlações

mais fortes em relação às duas tabelas anteriores. As variáveis ‘Congresso Nacional’ (-

0,157) e ‘Leis do País’ (-0,158) apresentaram uma correlação regular com a variável de

tolerância de corrupção. Embora a questão da confiança nas instituições apresente

significâncias com a questão da tolerância às situações de corrupção descritas no enunciado

da questão, estas são entre fracas e regulares, o que pouco ajuda a explicar o fenômeno

estudado. Em outras palavras, isto sugere que o fato de confiar ou não nas instituições tem

pouca relação com a tolerância à corrupção. Contudo, um dado que vale a pena ser

ressaltado, ainda que de forma breve, é que em todas as três situações da questão da

tolerância, a Igreja, o Poder Judiciário, o Congresso Nacional e as Leis no País

apresentaram valores de significância; Governo, Partidos Políticos e Policia apresentaram

duas vezes, com exceção destas última instituição e da Igreja as demais estão intimamente

relacionadas com a política.

Tabela 7.0

Correlação: Mudaria de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas e confiança nas instituições

Symetric Measures – Teste de correlação Gamma e Kendall’s tau-b

Instituição Value Gamma Value Kendall’s tau-b Approx. Sig.

Igreja -0,113 -0,068 0,001

Forças Armadas -0,023 -0,014 0,480

Poder Judiciário -0,143 -0,086 0,000

Polícia -0,107 -0,065 0,000

Congresso Nacional -0,130 -0,077 0,000

Partidos Políticos -0,120 -0,070 0,001

Televisão -0,022 -0,013 0,521

Sindicatos -0,028 -0,017 0,426

Empresários -0,034 -0,020 0,334

17

Governo -0,116 -0,070 0,001

Presidente -0,110 -0,068 0,001

Bombeiros -0,015 -0,090 0,682

Leis do País -0,131 -0,079 0,000

Tabela 7.1

Correlação: Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio pessoal/

familiar do político e confiança nas instituições

Symemtric Measures

Instituição Value Value Kendall’s tau-b Approx. Sig.

Igreja -0,092 -0,048 0,021

Forças Armadas 0,019 -0,010 0,624

Poder Judiciário -0,090 -0,047 0,023

Polícia -0,070 -0,037 0,076

Congresso Nacional -0,092 -0,047 0,022

Partidos Políticos -0,080 -0,040 0,053

Televisão 0,010 -0,005 0,798

Sindicatos -0,002 -0,010 0,960

Empresários -0,065 -0,033 0,114

Governo -0,065 -0,035 0,104

Presidente -0,013 -0,070 0,740

Bombeiros 0,027 0,013 0,533

Leis do País -0,133 0,070 0,001

Tabela 7.2

Correlação: Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e confiança nas instituições

Symemtric Measures

Instituição Value Value Kendall’s tau-b Approx. Sig.

Igreja -0,116 -0,066 0,001

Forças Armadas -0,020 -0,011 0,578

Poder Judiciário -0,137 -0,078 0,000

18

Polícia -0,132 -0,075 0,000

Congresso Nacional -0,157 -0,088 0,000

Partidos Políticos -0,126 -0,069 0,001

Televisão -0,019 -0,010 0,616

Sindicatos -0,037 -0,021 0,333

Empresários -0,097 -0,054 0,009

Governo -0,086 -0,049 0,017

Presidente -0,048 -0,028 0,172

Bombeiros 0,020 -0,010 0,621

Leis do País -0,158 -0,091 0,000

O teste com relação à variável ‘confiança interpessoal’9, nas três situações, não

apresentou nenhuma relação com a questão da tolerância, ou seja, não houve nenhum valor

de significância. Praticamente o mesmo ocorreu com a variável política da ‘desempenho do

governo’10, com exceção da terceira situação de ‘Usar caixa 2 em campanhas eleitorais’

(Tabela 9.0) os testes não indicaram nenhuma relação, valor de significância, entre as 2

variáveis. Todavia, apresentou valores muito baixos tanto no teste Gamma (0,072) quanto

no Kendall’s tau-b (0,041).

Tabela 8.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘desempenho do

Governo Lula’

Situação Gamma Kendall’s tau-b Approx. Sig

1)Mudaria de partido em troca de dinheiro

ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas

conhecidas

-0,020 -0,013 0,0530

9 “Você acha que se pode confiar na maioria das pessoas ou, pelo contrário, que todo cuidado é pouco no trato com os outros?” 10 “Na sua opinião, o presidente Lula está fazendo um governo: muito bom, bom, ruim, muito ruim?”

19

2) Superfaturar obras públicas e desviar o

dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar

do político

0,050 0,026 0,187

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais 0,072 0,041 0,038

A última bateria de testes que este trabalho se propõe a fazer é com a variável do

‘primado da lei’11. As questões aqui usadas são novamente a da tolerância à corrupção, e a

questão referente ao quão respeitadas devem ser as leis. Em todas as três situações as

variáveis apresentaram significância e uma correlação regular nos casos da primeira e

terceira situação, respectivamente -0,157 e –0,160 (teste Gamma) e uma correlação fraca

para o caso da segunda tabela (-0,101). Isto significa que as duas variáveis testadas estão

associadas, embora não seja uma associação forte, sugerindo que a forma como os cidadãos

encaram o primado da lei influencia na tolerância às ações do enunciado da questão, quanto

mais concordam com afirmação da questão mais intolerantes são a tolerância à corrupção.

Tabela 9.0

Correlação: Mudar de partido em troca de dinheiro ou cargo/ emprego para familiares/

pessoas conhecidas; Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

pessoal/ familiar do político; Usar caixa 2 em campanhas eleitorais e ‘primado da lei’

Situação Gamma Kendall’s tau-b Approx. Sig

1)Mudaria de partido em troca de dinheiro

ou cargo/ emprego para familiares/ pessoas

conhecidas

-0,157 -0,079 0,000

2) Superfaturar obras públicas e desviar o

dinheiro para o patrimônio pessoal/ familiar

do político

-0,101 -0,044 0,046

3) Usar caixa 2 em campanhas eleitorais -0,160 -0,076 0,001

11 “Por favor, diga se o Sr(a) concorda ou discorda da seguinte afirmação: a lei deve ser obedecida sempre, qualquer que seja a circunstância.”.

20

Conclusão:

Através do estudo empírico ficou claro que muitas das variáveis socioeconômicas

pré-concebidas pelo senso-comum como explicativas do fenômeno da corrupção tem peso

explicativo muito fraco. Idéias como que os indivíduos menos escolarizados e de menor

renda são os mais propensos a tolerarem certas atividades corruptas não se comprovaram.

Outro estudo com resultados próximos, porém com objeto de estudo diferente foi o de

Speck (2003) sobre o fenômeno da compra de votos. Como foi visto, com a exceção da

variável ‘faixa etária’, este conjunto de variáveis socioeconômicas não apresentaram uma

correlação significativa com a variável da tolerância as ações corruptas, levantadas pelas

perguntas do Survey. Isto indica que há uma diferença entre as gerações com relação à

tolerância destes comportamentos corruptos, e que a renda, sexo e escolaridade, de maneira

geral, não influenciam para o fenômeno como o fator idade. Vale lembrar que os indivíduos

mais velhos tiveram a experiência de dois regimes políticos distintos, o regime autoritário

dos militares e a Nova República, pós-1985, e em ambos houve problemas com a

corrupção, talvez a diferença esteja na transparência e nas possibilidades de investigação do

regime atual em relação ao anterior.

Todavia, outras variáveis políticas importantes nos estudos sobre o tema como a

confiança nas instituições e interpessoal, o desempenho do Governo Lula (atual) e o

respeito às leis por parte dos cidadãos, não mostraram ter o mesmo impacto que em outros

estudos. Ambas variáveis, com exceção da confiança interpessoal, se mostraram de alguma

maneira correlacionadas com a tolerância a determinadas ações de corrupção, no entanto,

apresentam um grau de correlação ora fraco, ora regular. Isto pode sugerir que tal

comportamento esteja mais correlacionado a outros aspectos culturais, além destes

aspectos. Porém, antes de qualquer afirmação precipitada são necessários novos estudos e

maiores explorações de outras questões do Survey, que este texto inicial não se propôs a

realizar.

21

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