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ARTIGO
Lei 13.979/2020 e a dispensa de licitação para Registro de Preços.
J U L I E TA M E N D E S L O P E S VA R E S C H I N I
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Lei 13.979/2020 e a dispensa de licitação para Registro de Preços _
Na continuidade do combate à pandemia do COVID 19 e como forma de
agilizar e simplificar as compras públicas, em 15 de abril de 2020, a Medida
Provisória 951 alterou o art. 4º, da Lei 13.979/2020, ampliando a hipótese
provisória de dispensa de licitação para instituir registro de preços, o que
altera substancialmente a lógica desse procedimento, antes obrigatoriamente
precedido de licitação, nas modalidades concorrência ou pregão (para bens e
serviços comuns) ou à luz dos regimes da Lei das Estatais e do RDC.
Antes de discorrer sobre a recente alteração promovida pela Medida
Provisória 951, cumpre lembrar que a Lei 13.979/2020, dispõe sobre as
medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância
internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019 e,
dentre as medidas, criou hipótese temporária de dispensa de licitação e
simplificou o procedimento do pregão, para aquisição de bens, serviços e
insumos destinados especificamente ao enfrentamento da crise. Conforme
salienta o auditor do Tribunal de Contas da União, Luiz Felipe Bezerra Almeida
Simões:
“Considerando que o art. 4º da Lei 13.979/2020 configura
hipótese de dispensa de licitação fundada na ESPIN, e que
o art. 4º-G trata de licitação na modalidade pregão para
aquisição de objetos necessários ao enfrentamento da
emergência de que trata a nova lei, chega-se à conclusão
de que o conteúdo da Lei 13.979/2020, no que tange às
contratações públicas, deve ser compreendido da seguinte
forma:
I) em relação à contratação direta: como nova hipótese
de dispensa de licitação, adicionada temporariamente
às previstas nas Leis 8.666/1993 e 13.303/2016,
assemelhando-se à hipótese da ‘contratação emergencial’
que elas já contemplam (arts. 24, inciso IV, e 29, inciso
XV, respectivamente), mas com requisitos e objetos
próprios, razão por que deve ser tratada como hipótese
independente; e
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II) quanto à licitação na modalidade pregão (eletrônico ou
presencial): como um pregão simplificado para determinado
tipo de ‘objeto comum’ (indispensável ao enfrentamento
da ESPIN), em que serão adotados procedimentos mais
céleres (nas fases interna e externa) se comparados ao
rito ordinário previsto na Lei 10.520/2002 e nos decretos
regulamentares”1.
Questão que pode surgir é a seguinte: se ambos os procedimentos
(contratação direta e pregão simplificado) visam combater a pandemia, qual
critério deve ser adotado pelo gestor público para escolher entre um ou outro?
Embora a hipótese de dispensa de licitação prevista na Lei 13.979/2020
não se confunda com a disciplinada no art. 24, inciso IV, da Lei 8.666/932, porque
o objeto deve estar voltado especificamente ao enfrentamento da pandemia e
por ter a norma flexibilizado algumas exigências3, não se pode perder de vista
1 Contratações públicas em tempos de coronavírus: visão contextualizada e sistemati-zada da Lei 13.979/2020, com as alterações promovidas pela Medida Provisória 926/2020. Dispo-nível em: https://www.blogjml.com.br/?area=artigo&c=c0fd2c5f6e09bf4c2f8033d80e8b1d6c
2 Consoante bem apontam Luciano Elias Reis e Marcus Vinícius Reis de Alcântara em artigo veiculado no Blog da JML:“A dispensa de licitação prevista na Lei nº 13.979/2020 é a mesma coisa da dispensa por emergên-cia ou calamidade do artigo 24, IV, da Lei nº 8.666/93?” “Não, a dispensa de licitação prevista na Lei nº 13.979/2020 é específica para aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus. Como se verifica, o legis-lador preferiu fazer uma hipótese nova de dispensa de licitação. Logo, é uma dispensa de licita-ção por situação calamitosa, porém com fundamento legal e requisitos distintos da “dispensa por emergência ou calamidade geral” da Lei nº 8.666/93”.
3 Com efeito, com o intuito de conferir maior segurança jurídica ao gestor, na hipótese de dispensa prevista no caput há presunção: da ocorrência de situação de emergência; da ne-cessidade de pronto atendimento da situação de emergência; da existência de risco a segurança de pessoas, obras, prestação de serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares; e da limitação da contratação à parcela necessária ao atendimento da situação de emergência. Ainda, diante da necessidade de atender de forma imediata a demanda, a norma em tela dis-pensou a realização dos estudos preliminares se o objeto for de natureza comum e da gestão de riscos (com exceção da etapa contratual) e permitiu a elaboração de termo de referência ou de projeto básico simplificado, que contenha as seguintes informações: a) declaração do objeto; b) fundamentação simplificada da contratação; c) descrição resumida da solução apresentada; d) requisitos da contratação; e) critérios de medição e pagamento; f) estimativas dos preços; g) adequação orçamentária. E, diferente da hipótese contemplada no art. 24, inciso IV, da Lei 8.666/93, que fica limitada ao prazo de 180 dias, a situação descrita na Lei 13.979//2020 aplica-se enquanto perdurar a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, podendo, desta feita, ultrapassar o referido prazo. Isso não significa, porém, que o contrato possa ter vigência indeterminada, pois o art. 4º-H estabelece que “Os contratos re-gidos por esta Lei terão prazo de duração de até seis meses e poderão ser prorrogados por pe-ríodos sucessivos, enquanto perdurar a necessidade de enfrentamento dos efeitos da situação de emergência de saúde pública”. Sobre o tema, recomendamos outro artigo de nossa autoria, veiculado no Blog da JML: https://www.blogjml.com.br/?area=artigo&c=a878e52a894076b7d-c20783996343f34
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que é espécie de contratação emergencial e, como tal, só pode ser realizada
se (i) for indispensável para atendimento imediato de demanda que (ii) se não
atendida tem o condão de colocar em risco a segurança de pessoas, bens
ou levar a interrupção de serviços essenciais. Portanto, se a demanda, ainda
que voltada ao controle da pandemia, for compatível com o procedimento
simplificado do pregão, a hipótese de dispensa estará afastada.
Mais uma vez, colaciona-se doutrina de Luiz Felipe Bezerra Almeida
Simões:
“Sob pena de tornar letra morta o conteúdo do art. 4º-G da
Lei 13.979/2020, a possibilidade da realização de pregão em
detrimento da dispensa de licitação terá que ser avaliada
à luz do caso concreto, em que, a despeito da situação de
emergência de saúde pública evidenciada, não estarão
presentes dois pressupostos exigidos pelo art. 4ºB da
Lei 13.979/2020 para a contratação direta, quais sejam:
“necessidade de pronto atendimento da situação de
emergência” e “existência de risco a segurança de pessoas,
obras, prestação de serviços, equipamentos e outros bens,
públicos ou particulares”. Em termos práticos, embora se
trate de ‘objeto comum’ indispensável ao enfrentamento
da ESPIN, é possível aguardar, sem prejuízo a esse
enfrentamento, lapso de tempo necessário à realização do
processo licitatório. É o caso, por exemplo, de o quantitativo
em estoque de determinado item (de natureza comum) tido
como essencial ao enfrentamento da ESPIN já ser suficiente
para o pronto atendimento das necessidades do momento,
podendo então sua aquisição ser postergada pelo período
necessário à conclusão do pregão simplificado, sem risco
iminente à segurança de pessoas ou ao próprio patrimônio
público”.
Em suma, todas as medidas descritas na Lei nº 13.979/2020 são
relacionadas a objetos necessários para o enfrentamento da pandemia. Para
outros objetos indispensáveis à continuidade das atividades da Administração,
mas que não relacionados à situação de calamidade, o dever de licitar persiste,
salvo se for possível enquadrar a contratação em outra hipótese de dispensa
ou inexigibilidade, à luz do disposto nos arts. 24 e 25, respectivamente, da Lei
8.666/93 ou, no caso das empresas estatais, nos arts. 28, § 3º, 29 e 30, da Lei
13.303/16.
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Marçal Justen Filho assevera que, mesmo diante da pandemia, a
Administração Pública deve planejar suas contratações, reavaliar suas
prioridades e instaurar certames à luz das normas gerais já existentes, salvo
para emergências insuperáveis:
“1) Ainda o dever de planejamento: a previsão de soluções
adequadas
A relevância das dificuldades enfrentadas e a dimensão dos
riscos de saúde pública exigem providências imediatas,
destinadas a evitar a difusão da doença e a reduzir o ritmo
das contaminações. Isso significa uma pluralidade de
providências relacionadas direta ou indiretamente com a
pandemia. Existem múltiplas outras necessidades estatais
e privadas, que demandam a continuidade da atuação do
Poder Público.
Isso significa que o dever de planejamento exige a
antecipação das soluções a serem adotadas relativamente
a ambos os setores.
2) A escassez de recursos estatais e a sua alocação
adequada
O problema da escassez de recursos públicos adquire
gravidade ainda mais séria em vista do estabelecimento da
pandemia. Por um lado, podem-se estimar gastos públicos
específicos, até então não previstos, para prevenção e
tratamento das moléstias e de outros problemas derivados.
Por outro lado, ocorrerá a redução das receitas públicas,
decorrente da estagnação da atividade econômica em
geral.
Por decorrência, é indispensável que a Administração
organize-se para enfrentar as dificuldades, nas diversas
áreas e setores. As tarefas devem ser organizadas e os
recursos humanos alocados de modo compatível com as
circunstâncias a serem enfrentadas.
Isso envolve uma avaliação de prioridades segundo o
princípio da proporcionalidade.
(...)
O dever de planejamento não se circunscreve às questões
emergenciais. Abrange a avaliação das perspectivas
futuras quanto à generalidade das implicações decorrentes
da crise.
(...)
O enfrentamento à crise exige novas contratações
administrativas, relacionadas aos diversos bens e serviços
pertinentes. Essas contratações subordinar-se-ão aos
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princípios fundamentais aplicáveis genericamente, às
regras gerais já existentes e às disposições específicas
veiculadas a propósito da crise.
Isso significa que a crise não autoriza contratações
informais nem a ausência de observância das regras
pertinentes – exceto em caso de emergência insuperável.
(...)
6.4) Síntese
A Administração tem o dever de antecipar a efetiva
consumação das variáveis acima indicadas, tal como
outras. A avaliação sobre a instauração de novas licitações
ou da manutenção daquelas em curso deve tomar em vista
circunstancias concretas e a ponderação entre os diversos
valores em questão”.4
Traçadas essas premissas, convém adentrar na alteração promovida
pela Medida Provisória 951/2020, que inseriu três parágrafos ao art. 4º, da Lei
13.979/2020:
“Art. 1º. A Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, passa a
vigorar com as seguintes alterações:
“Art....4º ………………………………….........................................
............................................................................................
§ 4º Na hipótese de dispensa de licitação de que trata
o caput, quando se tratar de compra ou contratação por
mais de um órgão ou entidade, o sistema de registro de
preços, de que trata o inciso II do caput do art. 15 da Lei nº
8.666, de 21 de junho de 1993, poderá ser utilizado.
§ 5º Na hipótese de inexistência de regulamento específico,
o ente federativo poderá aplicar o regulamento federal
sobre registro de preços.
§ 6º O órgão ou entidade gerenciador da compra
estabelecerá prazo, contado da data de divulgação da
intenção de registro de preço, entre dois e quatro dias úteis,
para que outros órgãos e entidades manifestem interesse
em participar do sistema de registro de preços nos termos
do disposto no § 4º e no § 5º.” (NR)
4 JUSTEN FILHO, Marçal. Efeitos jurídicos da crise sobre as contratações administra-tivas. Disponível em <https://www.justen.com.br/pdfs/IE157/Mar%c3%a7al%20Justen%20Filho%20EFEITOS%20JUR%c3%8dDICOS%20DA%20CRISE%20SOBRE%20AS%20CONTRA-TA%c3%87%c3%95ES%20ADMINISTRATIVAS%20(2)%20(1).pdf>. Acesso em 16.04.2020.
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Saliente-se que, por estarem os parágrafos vinculados ao caput do
art. 4º, por evidente, a dispensa só se justifica se for para atender demanda
imediata que possa colocar em risco a segurança de pessoas, bens ou levar à
interrupção de serviços essenciais atrelados ao combate do COVID-19. Se tais
pressupostos não estiverem presentes, o dever de licitar para instituir sistema
de registro de preços persiste, sendo a regra a adoção do pregão se o objeto for
bem ou serviço comum.
Infere-se do § 4º, que o sistema de registro de preços poderá ser adotado
quando a contratação envolver mais de um órgão ou entidade, enquadrando-se
a hipótese no inciso III, do art. 3º, do Decreto nº. 7.892/13, ou seja, “quando for
conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento
a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo”. Saliente-se
que não há necessidade de envolvimento de mais de uma entidade, já que o
dispositivo fala em mais de um órgão ou entidade, ou seja, é possível que o
registro de preços seja adotado para suprir a demanda de órgãos integrantes
de uma mesma entidade, conforme defendem Luciano Reis e Marcus Vinícius
Reis de Alcântara:
“4. Caso o ente divulgue a intenção de registro de preços,
seja pelo modelo do Governo Federal (IRP) ou modelo
próprio e não consiga outro órgão ou entidade para
participar do registro, pode avançar e celebrar a ata por
dispensa de licitação?
Embora não entendamos o porquê de tal condição, ela
consta expressamente na lei e não pode ser desprezada.
Sugerimos que antes da divulgação já seja feito contato
com algum órgão ou entidade, para dar celeridade aos
procedimentos e não haver frustração da pretensão
administrativa. Ademais, não se vislumbra impedimento
de existir dispensa para sistema de registro de preços com
vários órgãos do mesmo ente federativo”5.
A hipótese, portanto, restringe-se ao registro de preços instaurado para
atender órgão gerenciador e participantes, cuja manifestação de interesse deve
ser formalizada no prazo (entre dois e quatro dias úteis, conforme § 6º inserido
ao art. 4º, da Lei 13.979/2020) e condições fixadas na Intenção de Registro de
Preços.
5 REIS, Luciano; ALCÂNTARA, Marcus Vinícius. Sistema de registro de preços na CO-VID-19, p. 13.
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Outra alteração que merece destaque está disciplinada no art. 4-G, § 4º,
da referida lei, que prescreve que “As licitações de que trata o caput realizadas
por meio de sistema de registro de preços serão consideradas compras
nacionais, nos termos do disposto no regulamento federal, observado o prazo
estabelecido no § 6º do art. 4º.” E a compra nacional, por seu turno, é definida
no art. 2º, inciso VI, do Decreto 7.892/13 como “compra ou contratação de bens e
serviços, em que o órgão gerenciador conduz os procedimentos para registro de
preços destinado à execução descentralizada de programa ou projeto federal,
mediante prévia indicação da demanda pelos entes federados beneficiados;”.
E o status de compra nacional traz algumas vantagens, a exemplo da
viabilidade de adesões em percentual superior, nos termos do previsto no § 4º
- A, inciso I, do art. 22, do Decreto 7.892/13: “as aquisições ou as contratações
adicionais não excederão, por órgão ou entidade, a cem por cento dos
quantitativos dos itens do instrumento convocatório e registrados na ata de
registro de preços para órgão gerenciador e para os órgãos participantes”. E o
inciso II, do mesmo dispositivo, destaca que o quantitativo total de adesões não
poderá exceder ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado em ata,
independentemente do número de órgãos que aderirem à ata.
Por derradeiro, se formalizada ata de registro de preços com fulcro na
Lei 13.979/2020, a vigência da referida ata, limitada a 12 meses, fica vinculada
ao período de duração da pandemia, sob pena de desvirtuamento da finalidade
da norma.
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