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156 Scientia Medica, Porto Alegre, v. 17, n. 3, p. 156-167, jul./set. 2007 ARTIGO DE REVISÃO Determinação da pressão arterial em recém-nascidos Determination of blood pressure in newborns MANOEL ANTONIO DA SILVA RIBEIRO 1 PEDRO CELINY RAMOS GARCIA 2 RENATO MACHADO FIORI 3 1 Neonatologista do Hospital São Lucas da PUCRS. Mestrando do Curso de Pós-Graduação em Medicina/Pediatria e Saúde da Criança da PUCRS. 2 Doutor em Pediatria pela USP. Médico do Serviço de Pediatria do Hospital São Lucas da PUCRS. 3 Professor Titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da PUCRS. Chefe do Serviço de Neonatologia o Hospital São Lucas da PUCRS. RESUMO Objetivo: descrever as recomendações para a determinação da pressão arterial em recém-nascidos, os métodos e instrumentos utilizados. Fonte de dados: revisão de artigos médicos so- bre pressão arterial em recém-nascidos publicados nos últimos vinte anos (base de dados: MEDLINE, PubMed) e artigos originais sobre o método do “flush”. Síntese de dados: vários fatores dificultam as medidas e interpretação da pressão arterial em neonatos, como tamanho variável do braço, difi- culdade de obtenção em recém-nascidos chorosos e variação na pressão arterial quanto à idade gestacional e peso. A medida da pressão arterial deve ser rea- lizada preferencialmente no braço direito, com a largura do manguito correspondendo a 40% da circunferência do braço e que envolva 80% a 100% da respectiva extremidade. Atualmente, os métodos de monitorização não-invasiva da pressão arterial estão bem difundidos, especialmente o uso da oscilometria automática. Além disso, o antigo método do “flush” e a técnica da oximetria de pulso têm sido citados na li- teratura. Como limitação mais importante encontra-se a ausência de validação dos equipamentos em neona- tologia, especialmente dos monitores oscilométricos. ABSTRACT Objective: To describe the recommendations for the determination of the blood pressure in newborn, the methods and the devices. Sources of data: Review of medical articles about blood pressure in newborn published in the last twenty years (database: Medline, PubMed) and original articles about the flush method. Summary of the findings: Several factors complicate the measures and interpretation of the blood pressure in newborns, like variable size of the upper arm, difficulty in tearful newborn and variation in the blood pressure regarding the weight and gestational age. The measure of the blood pressure should be performed preferentially in the right upper arm, with cuff size corresponding to 40% of the circumference of the upper arm and that involves 80% to 100% of the respective extremity. Nowadays, noninvasive measurements methods of the blood pressure feel well spread, especially the use of oscillometric automatic. Moreover, the antique flush method and pulse oximetry techniques have been being cited in the literature. Like more important limitation to meets itself the validation absence of the devices in neonatology, especially in the oscillometrics devices. Conclusions: Two important elements for obtainment of exact blood pressures are a calm baby and a adequate cuff

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Determinação da pressão arterial em recem nascidos

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156 Scientia Medica, Porto Alegre, v. 17, n. 3, p. 156-167, jul./set. 2007

Determinação da pressão arterial ... Ribeiro MAS, Garcia PCR, Fiori RMARTIGO DE REVISÃO

Determinação da pressão arterialem recém-nascidosDetermination of blood pressure innewborns

MANOEL ANTONIO DA SILVA RIBEIRO1

PEDRO CELINY RAMOS GARCIA2

RENATO MACHADO FIORI3

1 Neonatologista do Hospital São Lucas da PUCRS. Mestrando do Curso de Pós-Graduação em Medicina/Pediatria e Saúde da Criançada PUCRS.

2 Doutor em Pediatria pela USP. Médico do Serviço de Pediatria do Hospital São Lucas da PUCRS.3 Professor Titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da PUCRS. Chefe do Serviço de Neonatologia o Hospital

São Lucas da PUCRS.

RESUMO

Objetivo: descrever as recomendações para adeterminação da pressão arterial em recém-nascidos,os métodos e instrumentos utilizados.

Fonte de dados: revisão de artigos médicos so-bre pressão arterial em recém-nascidos publicadosnos últimos vinte anos (base de dados: MEDLINE,PubMed) e artigos originais sobre o método do“flush”.

Síntese de dados: vários fatores dificultam asmedidas e interpretação da pressão arterial emneonatos, como tamanho variável do braço, difi-culdade de obtenção em recém-nascidos chorosos evariação na pressão arterial quanto à idade gestacionale peso. A medida da pressão arterial deve ser rea-lizada preferencialmente no braço direito, com alargura do manguito correspondendo a 40% dacircunferência do braço e que envolva 80% a 100% darespectiva extremidade. Atualmente, os métodos demonitorização não-invasiva da pressão arterial estãobem difundidos, especialmente o uso da oscilometriaautomática. Além disso, o antigo método do “flush” ea técnica da oximetria de pulso têm sido citados na li-teratura. Como limitação mais importante encontra-sea ausência de validação dos equipamentos em neona-tologia, especialmente dos monitores oscilométricos.

ABSTRACT

Objective: To describe the recommendations for thedetermination of the blood pressure in newborn, the methodsand the devices.

Sources of data: Review of medical articles about bloodpressure in newborn published in the last twenty years(database: Medline, PubMed) and original articles aboutthe flush method.

Summary of the findings: Several factors complicatethe measures and interpretation of the blood pressure innewborns, like variable size of the upper arm, difficultyin tearful newborn and variation in the blood pressureregarding the weight and gestational age. The measure ofthe blood pressure should be performed preferentially in theright upper arm, with cuff size corresponding to 40%of the circumference of the upper arm and that involves80% to 100% of the respective extremity. Nowadays,noninvasive measurements methods of the blood pressurefeel well spread, especially the use of oscillometric automatic.Moreover, the antique flush method and pulse oximetrytechniques have been being cited in the literature. Like moreimportant limitation to meets itself the validation absenceof the devices in neonatology, especially in the oscillometricsdevices.

Conclusions: Two important elements for obtainment ofexact blood pressures are a calm baby and a adequate cuff

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Conclusões: dois elementos importantes paraobtenção de pressões arteriais exatas são um bebêcalmo e um manguito de tamanho adequado. Todosos métodos descritos são adequados para a men-suração da pressão arterial em recém-nascidos.

DESCRITORES: DETERMINAÇÃO DA PRESSÃO ARTE-RIAL/métodos; DETERMINAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL/instrumentos; HIPOTENSÃO; HIPERTENSÃO; RECÉM-NAS-CIDO; PREMATURO.

size and all described methods are adequate for measurementof the blood pressure.

KEY WORDS: BLOOD PRESSURE DETERMINATION/methods; BLOOD PRESSURE DETERMINATION/instrumentation;INFANT, NEWBORN; HYPOTENSION; HYPERTENSION INFANTNEWBORN; PREMATURE.

INTRODUÇÃO

Os cuidados intensivos neonatais melhora-ram as chances de sobrevivência de recém-nascidos internados em Unidades de TratamentoIntensivo (UTI) Neonatais, mesmo os extrema-mente prematuros. Neste contexto, a monito-rização cuidadosa dos sinais vitais é essencialpara otimizar o manejo desses bebês e reduzir orisco de problemas.1 Poucos aspectos do manejode recém-nascidos em UTI têm gerado tantascontrovérsias quanto a avaliação da pressãoarterial e a necessidade de tratamento das anor-malidades observadas destas variáveis fisioló-gicas.2 Isto levou ao desenvolvimento de umavariedade de técnicas para a sua mensuração nosúltimos anos.1,3 As medidas de pressão arterialem recém-nascidos devem ser obtidas e regis-tradas durante todo o curso de seus cuidadoscontínuos. Observações consistentes e signifi-cantes da pressão arterial são estabelecidas pormedidas repetidas e seriadas, ao contrário demedicações únicas e isoladas.4

Atualmente, há um aumento no reconheci-mento da hipertensão arterial em recém-nascidosprovenientes de UTI Neonatal, particularmenteaqueles com displasia bronco-pulmonar ounaqueles em que foi inserido um cateter arterialumbilical. A incidência de hipertensão relacio-nada ao uso de catéter arterial umbilical é es-timada em 3%, e a incidência de hipertensãocausada por trombose de artéria renal é de umpara cada 1000 recém-nascidos vivos.5

Por outro lado, a hipotensão acompanhamuitas patologias graves do neonato, e o seureconhecimento e tratamento são particular-mente importantes, para evitar a lesão cerebralisquêmica.3,5 O tratamento da hipotensão éfreqüentemente baseado na pressão arterialmédia, e sua correta medida é essencial paraevitar uso desnecessário de infusão de volumeou drogas inotrópicas. Valores falsamente baixos

da pressão arterial média estimulariam a admi-nistração de volume ou de drogas inotrópicas,enquanto que leituras superestimadas poderiamatrasar o diagnóstico e o tratamento do choque.6Isto faz com que os equipamentos que medema pressão arterial necessitem ser confiáveis eprecisos.5 O objetivo deste estudo é descrever opadrão recomendado para a determinação dapressão arterial em recém-nascidos, os méto-dos e instrumentos utilizados, suas vantagens elimitações.

FISIOLOGIA DA PRESSÃO ARTERIAL

A pressão arterial é determinada por doisfatores: a propulsão do sangue pelo coração e aresistência dos vasos sangüíneos ao fluxo; emoutras palavras, o fluxo sangüíneo correspondeà divisão da variação de pressão pela resistência.7Como não há como medir rotineiramente o fluxoe a resistência, a determinação da pressão arterialé utilizada como importante indicador da funçãocardiovascular.1,2

Sendo o coração uma bomba pulsátil, osangue entra nas artérias de forma intermitente,produzindo pulsos de pressão no sistema arterial,com um pico, denominado pressão sistólica, e seuponto mais baixo, denominado pressão diastó-lica. A pressão arterial média representa a mé-dia da pressão durante todo o ciclo do pulso depressão que tende a empurrar o sangue atravésda circulação sistêmica. Este ciclo é graficamenterepresentado por uma onda, na qual a pressãoarterial média integra a área sobre a curva, quepode ser calculada pela seguinte equação:7

Pressão (P. sistólica + P. diastólica)Arterial = P. diastólica +Média 3

A pressão arterial média é o valor que melhordetermina a pressão de perfusão, podendoprover uma importante indicação das mudanças

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na pressão arterial. Uma única medida na pressãoarterial média pode mostrar uma tendência e sermais fácil de interpretar do que mudanças napressões sistólica e diastólica, as quais muitasvezes movem-se em diferentes direções.2,8 Apesarda maioria dos monitores de pressão arterialregistrarem o valor da pressão arterial média,existem diferentes fórmulas para calculá-la, masa opinião sobre sua utilização em neonatos écontroversa.9

Outra variável a ser considerada é a pressãode pulso, a qual corresponde à diferença entre aspressões sistólica e diastólica, freqüentementenão medido por um equipamento não-invasivo.A pressão de pulso pode ter uma significativacorrelação positiva entre os recém-nascidos quenasceram com peso entre 610 e 4220 gramas e nãoparece sofrer tantas modificações com o aumentodo peso de nascimento quanto as pressões sis-tólica, diastólica e pressão arterial média.10

Também existe uma relação básica entrepressão arterial, débito cardíaco (Q) e resistênciavascular periférica (RVP), que pode ser expressapela seguinte equação:7,11

Pressão arterial = Q × RVP

Logo, uma pressão arterial baixa pode ocorrerpor baixo débito cardíaco ou baixa resistênciavascular periférica ou ambos. Da mesma forma,uma pressão normal pode ocorrer com débitocardíaco baixo se a resistência vascular periféricafor alta.

Por sua vez, o débito cardíaco é o produto dafreqüência cardíaca e do volume de ejeção.2,12 Jáo volume de ejeção é dependente de três fatores:a pré-carga (comprimento da fibra miocárdica aofinal da diástole) ou o volume de enchimentoventricular, a contratilidade miocárdica e após-carga (tensão da parede ventricular durantea sístole) ou a resistência ao esvaziamento doventrículo.2,12 Por isso, várias razões podemdeterminar um débito cardíaco baixo: volumeintravascular inadequado, pré-carga excessiva,contratilidade alterada, restrição miocárdica,disfunção valvular e arritmias.7 Em razão dalimitada habilidade em aumentar o volume deejeção, o débito cardíaco neonatal é mais de-pendente da freqüência cardíaca, podendo, porconseqüência, tornar-se comprometido na pre-sença de taquicardia ou bradicardia prolon-gadas.12

Em recém-nascidos prematuros, freqüente-mente utiliza-se expansão volumétrica comsoluções cristalóides ou colóides para corrigir

uma presumível hipotensão.13 A tentativa deaumentar a pressão arterial nestes recém-nas-cidos através da infusão de volume pode levar aconseqüências adversas, porque o volume dolíquido extracelular encontra-se mais elevado nosrecém-nascidos prematuros (correspondendo a60% na 20ª semana, comparando-se com 40% emrecém-nascidos de termo e 20% nos adultos).12,14

Atualmente, acredita-se que a hipovolemia é umacausa incomum de hipotensão em recém-nas-cidos doentes e prematuros15 e têm-se propostoque a hipotensão possa ser secundária a inade-quada regulação vascular periférica, com ou semdisfunção miocárdica, ao invés de depleçãovolumétrica. Além disso, a pressão arterial não éum indicador confiável de hipovolemia emrecém-nascidos prematuros, que podem respon-der ao baixo volume sangüíneo por uma vaso-constrição suficiente para manter a pressãoarterial sistólica.2 Em face disso, os valores dapressão arterial não devem ser os únicos critériosque determinam o momento do tratamento,devendo ser considerados outros marcadores deperfusão sistêmica, como acidose metabólica,tempo de enchimento capilar, diurese e tempe-ratura das extremidades.15

LIMITAÇÕES DA MONITORIZAÇÃO DAPRESSÃO ARTERIAL EM RECÉM-NASCIDOS

Vários fatores dificultam as medidas e inter-pretação da pressão arterial em crianças, espe-cialmente em neonatos:4

a) tamanho variável do braço, o qual requera avaliação e seleção de um manguito detamanho apropriado;

b) leituras de difícil interpretação, especial-mente em recém-nascidos chorosos;

c) os valores de pressão arterial são dife-rentes quanto à idade gestacional e peso;

d) os sons de Korotkoff são relativamenteinaudíveis por causa da baixa freqüênciae amplitude do pulso.

Os relatórios norte-americanos elaboradospelo National Heart, Lung and Blood Institute e pelaAcademia Americana de Pediatria, conhecidospor Relatórios da Força Tarefa (Task Force), sãoas referências mais freqüentemente adotadas naprática clínica. As normas mais recentes forampublicadas em 2004,16 as quais consistem naatualização das recomendações das ForçasTarefas de 1987 e de 1996.4,5 De acordo com estasnormas, a técnica de medida da pressão arterial

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deve ser realizada preferencialmente no braçodireito, com a bolsa de borracha do manguitopossuindo uma largura que corresponda a 40%da circunferência do braço e seu comprimento sercapaz de envolver 80% a 100% da respectivaextremidade,5 conforme mostrado na Figura 1.

O estabelecimento de valores normais para apressão arterial em recém-nascidos tem sidoobjeto de estudos por vários autores.10,17-22 Namaioria desses estudos, os valores da pressãoarterial aumentam com o aumento do peso aonascimento10,20,23 e com o aumento da idade pós-natal, especialmente nos primeiros cinco diasde vida.17,18,20,22,23 Entretanto, valores normativosnão estão bem estabelecidos, especialmenteem recém-nascidos de muito baixo peso. Issoocorre porque os estudos envolvem, geralmente,pequeno número de pacientes e utilizam dife-rentes métodos de aferição.1,15

Versmold et al.10 mediram a pressão aórticaatravés do cateterismo arterial umbilical nas pri-meiras doze horas de vida em 16 recém-nascidosestáveis, com o peso de nascimento variandoentre 610 e 980 gramas, sendo oito deles pe-quenos para a idade gestacional. A partir desteestudo, no qual demonstrou-se que a pressãoarterial média variou entre 24 e 44mmHg paraum intervalo de confiança de 95%, adotou-se ovalor de 30mmHg como o menor valor para aindicação de tratamento.2 Posteriormente, Lee etal.17 obtiveram valores menores na pressãoarterial média obtida por medida direta em61 recém-nascidos de muito baixo peso. Estes

autores observaram que, para um intervalo deconfiança de 95%, a pressão arterial média varioude 20 a 23mmHg nos recém-nascidos de 500 a800 gramas, valores inferiores aqueles demons-trados por Versmold.10

Portanto, ainda é difícil definir valores nor-mais nesta população, que usualmente necessitaassistência respiratória nos primeiros dias devida e que pode ter complicações como ductusarteriosus patente, hemorragia intraventricular ouinstabilidade hemodinâmica.1 Empiricamente, aidade gestacional em semanas tem sido usadacomo o valor inferior da pressão arterial médiapara definir hipotensão arterial em recém-nascidos nas primeiras 48 horas de vida.15,24 Apartir desta idade, considera-se hipotensãoquando a pressão arterial média for menor ouigual a 30mmHg, independente da idade gesta-cional. A incidência de hipotensão arterial érelativamente alta, especialmente em recém-nascidos menores de 1000 gramas. Neste grupode recém-nascidos tem sido relatada incidênciade 20 a 45%. Outras causas de hipotensão neo-natal são hipovolemia por perda sangüínea,choque cardiogênico, septicemia e choque sép-tico.12,15 A hipotensão em recém-nascidos tam-bém tem sido definida quando a pressão arterialmédia for menor do que o décimo percentil dopeso de nascimento e idade pós-natal. Para isto,tem-se utilizado os valores do estudo de Watkinset al.,15,25 que mediu a pressão arterial pelamonitorização direta horária em 131 recém-nascidos de muito baixo peso (Tabela 1).

1)

Acrômio

Olécrano

2)

Acrômio

Olécrano

Medida da circunferência no ponto médio do braço

Fonte: Update on the 1987 Task Force Report on High Blood Pressure in Children and Adolescents: a working group report from the National HighBlood Pressure Education Program. National High Blood Pressure Education Program Working Group on Hypertension Control in Children andAdolescents. Pediatrics. 1996;98(4 Pt 1):649-58.

Figura 1. Determinação do tamanho do manguito. a) A largura deve ser aproximadamente 40% da circunferência do braço,medida no ponto médio entre o olécrano e o acrômio. b) O comprimento do manguito deverá recobrir 80% a 100% dacircunferência do braço.

(a) (b)

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A hipertensão neonatal é definida como umaelevação sustentada da pressão arterial sistólicaem valores acima do percentil 95.4,12,26 Na pri-meira semana de vida, o percentil 95 para apressão sistólica encontra-se entre 95 e 96mmHg,e da segunda até a sexta semana este valor variaentre 104 e 113mmHg.11,26 Sua incidência é re-latada em até 3% da população neonatal.12,26,27

Algumas das causas mais comuns são displasiabronco-pulmonar, estenose de artéria renal, coar-tação da aorta, policitemia, ductus arteriosus paten-te, hemorragia intraventricular e uso pós-natal decorticosteróides.12,26,27 Aproximadamente 10% dosrecém-nascidos submetidos a cateterismo arterialumbilical desenvolvem hipertensão arterial.12,27

TÉCNICAS E INSTRUMENTOS PARA AAFERIÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL EMRECÉM-NASCIDOS

Classicamente, as técnicas de mensuração dapressão arterial no neonato são divididas emduas categorias: direta ou invasiva e indireta ounão-invasiva.1,2 As principais técnicas de moni-torização não-invasiva são: oscilometria automá-tica, método Doppler ou ultra-sônico e métododo “flush”.1,2,5,28-30 Recentemente, foi descrita atécnica da oximetria de pulso.31

A monitorização direta era o método con-siderado padrão ouro, porém envolvia a uti-lização de cateterismo arterial umbilical ouarterial periférico, conferindo grandes riscos aoprocedimento.1,5,29,30 A pressão arterial médiamedida por cateterismo arterial umbilical pode

ser mais confiável que as pressões sistólica ediastólica, pois é menos propensa a erro causadopor apagamento de onda.8 Deve-se ter o cuidadode calibrar regularmente o transdutor e observara presença de bolhas de ar ou coágulos san-güíneos nos cateteres e na cúpula do transdutor,o que pode resultar em queda da onda de pulsoe em medições falsamente baixas da pressãoarterial sistólica.32 Outra limitação deste métodoé que, como anteriormente citado, cerca de 10%dos recém-nascidos submetidos a cateteris-mo arterial umbilical desenvolvem hipertensãoarterial.12,27

A pressão arterial medida por métodos in-diretos pode ser confiável e consistente se regis-trada sob condições padronizadas com um ma-nômetro em bom funcionamento.4 Uma dasmaiores desvantagens dos métodos não-invasi-vos é que não permitem a monitorização con-tínua da pressão arterial.1

Oscilometria automáticaA oscilometria automática é um método não-

invasivo que mostra digitalmente as pressõessistólica, diastólica e média, através das flu-tuações na pressão detectadas pelo fechamentodo manguito. Estes equipamentos medem a pres-são sistólica e a pressão arterial média, calculan-do-se a pressão diastólica a partir destes valo-res.1,5,29,30 A primeira descrição de sua utilizaçãoem neonatologia foi feita por Kafka em 1967.33

Apesar da maioria dos monitores oscilomé-tricos utilizarem os mesmos princípios básicos,as pressões sistólica e diastólica são calculadas

TABELA 1 – Pressão arterial média. Média e 10° percentil por peso de nascimento e idade pós natal.

PN: peso de nascimentoFonte: Watkins AMC, West CR, Cooke RWI: Blood pressure and cerebral haemorrhage and ischaemia in very low birthweight infants. Early Hum Dev19:103-110, 1989.

Idade pós-natal (Horas) PN (g)

3 12 24 36 48 60 72 84 96

500 35/23 36/24 37/25 38/26 39/28 41/29 42/30 43/31 44/33

600 35/24 36/25 37/26 39/27 40/28 41/29 42/31 44/32 45/33

700 36/24 37/25 38/26 39/28 42/29 42/30 43/31 44/32 45/34

800 36/25 37/26 39/27 40/28 41/29 42/31 44/32 45/33 46/34

900 37/25 38/26 39/27 40/29 42/30 43/31 44/32 45/34 47/35

1000 38/26 39/27 40/28 41/29 42/31 43/32 45/33 46/34 47/35

1100 38/27 39/27 40/29 42/30 43/31 44/32 45/34 46/35 48/36

1200 39/27 40/28 41/29 42/30 43/32 45/33 46/34 47/35 48/37

1300 39/28 40/29 41/30 43/31 44/32 45/33 46/35 48/36 49/37

1400 40/28 41/29 42/30 43/32 44133 46/34 47/35 48/36 49/38

1500 40/29 42/30 43/31 44/32 45/33 46/35 48/36 49/37 50/38

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de acordo com um algoritmo empiricamentederivado, os quais são propriedades exclusivasdos fabricantes desses equipamentos. A integra-ção de um algoritmo de mensuração da pressãoarterial não-invasiva pode diferir substancial-mente entre os fabricantes e, em algumas vezes,até entre os instrumentos de um mesmo fabri-cante. Além disso, uma determinação acurada dapressão arterial e da operação de cada equipa-mento difere entre os fabricantes.30 Em face disso,a “American Association for Advancement of MedicalInstrumentation” (AAMI) e a “British HypertensionSociety” (BHS) publicaram, separadamente, umprotocolo de validação para avaliar a acuráciados equipamentos de mensuração da pressãoarterial não-invasiva, os quais, posteriormente,foram reunidos em um único critério e seraplicado nos estudos de validação.34

Segundo o protocolo da BHS (onde o grau Adenota maior concordância e o grau D a menorconcordância, quando comparado a um monô-metro de mercúrio-padrão), o equipamento de-verá atingir o grau A ou B. Pelo critério da AAMI,o monitor em teste para ser aprovado não deveráapresentar uma diferença média nas pressõessistólica e diastólica maior que 5mmHg ou umdesvio-padrão acima de 8mmHg quando com-parado ao manômetro de mercúrio. Com basenestes protocolos, os seguintes resultados podemser obtidos por um monitor:

1. recomendado: completa totalmente os cri-térios da AAMI para a pressão sistólicaou diastólica e recebe grau A ou B peloprotocolo da BHS;

2. não recomendado: não atingiu os critériosda AAMI para a pressão sistólica ou dias-tólica e recebeu grau C ou D pelo BHS;

3. recomendação questionável: ocorre quan-do há dúvidas na sua evidência, ou seja,quando completa um protocolo e é repro-vado em outro.34

Uma das vantagens desta técnica é a medidasimultânea do pulso, permitindo testar sua con-fiabilidade quando comparada com os dadosregistrados pelo monitor de freqüência cardíaca.Apesar da taxa de pulso determinada pela osci-lometria ser um indicador válido para a fre-qüência cardíaca, ele pode diferir da freqüênciacardíaca derivada da onda do ECG. Isto podeacontecer porque os monitores oscilométricosmedem o pulso periférico real, não detectandoos sinais elétricos ou as contrações cardíacas, quepodem não produzir um pulso periférico. Asleituras da pressão arterial e do pulso também

podem ser erráticas na presença de uma perfusãoperiférica ruim ou na significativa variação daamplitude do pulso a cada batimento, como, porexemplo, fibrilação arterial, e ventilação artificialcom ciclos rápidos. Para estes casos indica-se ouso de medidas alternativas para a confirmação.8

O método oscilométrico pode apresentarerros devidos a artefatos por movimentos intrín-secos, ou seja, aqueles causados pelo paciente,como o choro ou movimentos do recém-nascido,tremores ou convulsões, ou por artefatos extrín-secos, os quais são causados pelo examinador,como o movimento do próprio leito ou do contatodo assistente com o aparelho. Nas situações comníveis extremamente altos de artefatos, a oscilo-metria não é uma técnica de medida de pressãoarterial eficaz. Com o objetivo de melhorar estassituações, o monitor oscilométrico utiliza algo-ritmos específicos. Outras medidas que podemmelhorar a validade da pressão arterial não-invasiva por esta técnica incluem verificar apressão arterial somente em recém-nascidosquietos ou tranqüilos, evitando-se aqueles agita-dos e chorosos, e obter a média de duas ou trêsmedidas, especialmente nos recém-nascidos criti-camente doentes ou recém-nascidos de muitobaixo peso ou com suspeita de coartação daaorta.1 Apesar destas medidas serem capazesde diminuir a presença de artefatos, um cenáriototalmente livre deles pode ser difícil de se en-contrar em recém-nascidos.8

A acurácia e a confiabilidade de diversosequipamentos oscilométricos têm sido estudadoshá muitos anos e, em geral, suas medidas sãocomparáveis às da pressão arterial invasiva.1,2

Porém, resultados conflitantes têm sido descritos,especialmente em recém-nascidos hipotensos.Em virtude disso, a determinação da pressãoarterial pela oscilometria deve ser interpretadajudiciosamente e conjuntamente com outrosparâmetros fisiológicos.2 Em razão de que osrecém-nascidos menores de 1500 gramas apresen-tam pressão arterial média entre 25 a 35 mmHg,os monitores oscilométricos não são confiáveisnestes pacientes porque tendem a superestimara pressão arterial. Do mesmo modo, nos recém-nascidos criticamente doentes e com risco dehipotensão, o uso de monitorização invasiva dapressão arterial deve ser considerado.1,2

O uso de aparelhos automáticos para medir apressão arterial na infância está amplamentedifundido, sendo os aparelhos oscilométricos osequipamentos mais comumente utilizados.5 Suautilidade como método de triagem é limitada,

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porque apresentam variações, de momento paramomento em cada paciente. Por outro lado, aoscilometria automática detecta a tendência dealterações na pressão arterial de um mesmopaciente, sendo adequada para a monitorizaçãohospitalar.35 Em recém-nascidos, o uso dessasunidades é aceitável porque os métodos aus-cultatórios são difíceis e a medida da pressãoarterial é uma necessidade freqüente. Entretanto,a confiabilidade desses instrumentos no usoclínico é incerta, em razão da necessidade defreqüente calibração e da ausência de padrões dereferência.5 Além disso, alguns dos aparelhosautomáticos mais comumente utilizados naprática clínica nunca foram submetidos àcertificação pela Association for the Advancementof Medical Instrumentation (AAMI), grupo detrabalho ligada ao Food and Drug Administration,e nem pela British Hypertension Society.30

Conforme o relatório da segunda força-tarefa,somente uma unidade oscilométrica Dinamap®

demonstrou um registro confiável na pressãoarterial entre os aparelhos oscilométricos estu-dados.4 Por outro lado, Diprose et al.3 observaramque o monitor oscilométrico Dinamap® 847 su-perestimou tanto a pressão sistólica como adiastólica na vigência de hipotensão em recém-nascidos menores que 1500 gramas e em menoresdo que 30 semanas de idade gestacional, cir-cunstâncias estas que poderiam atrasar o reco-nhecimento e o tratamento de um quadro clínicoimportante de choque. Esta tendência diminuiuquando a pressão encontrava-se dentro dos li-mites considerados normais para estes recém-nascidos de muito baixo peso.

Método DopplerÉ um método não-invasivo que mede a

pressão sistólica detectando o fluxo sangüíneo ouo movimento da parede vascular à medida emque ocorre a liberação gradativa do manguito.Neste método, a pressão diastólica não é medidacom exatidão.1,5,29,30 Por esta razão, não é apro-priado para detectar casos de hipotensão, li-mitando-se ao reconhecimento da hipertensãoarterial.

Esta técnica requer um manômetro de mer-cúrio ou um manômetro aneróide para verificara pressão arterial. O manômetro de mercúrio éum manômetro de amplo uso, confiável, queapresenta boa acurácia, boa exatidão e não requerreajuste na sua calibração. Seu reservatório deveestar plenamente cheio de mercúrio, o orifício deabertura encontrar-se limpo e a coluna de vidro

encontrar-se livre de poeira ou partículasoxidadas.4 Utilizado há mais de cem anos porclínicos e pesquisadores, é considerado comopadrão-ouro quando comparado com outrosequipamentos para a medida de pressão ar-terial.30,36 Já o manômetro aneróide opera pormeio de um registro de metal, tem menor ta-manho e exige ser calibrado pelo menos uma vezao ano.4

Mion e Pierim37 examinaram 320 manômetrosde mercúrio e 204 manômetros aneróides uti-lizados em hospitais e consultórios médicos.A precisão foi averiguada principalmente atra-vés dos aspectos físicos dos equipamentos e aacurácia foi determinada nos manômetros demercúrio quando o menisco da coluna atingia amarca zero no repouso e nos manômetrosaneróides quando estes apresentavam diferençasde medidas de até 3mmHg de um manômetro demercúrio calibrado. Esses autores observaramque 21% dos esfigmomanômetros de mercúrionão eram acurados e 64% foram imprecisos e 58%dos esfigmomanômetros aneróides não eramacurados e 70% foram imprecisos.

O’Brien et al.38 revisaram na literatura osesfigmomanômetros testados conforme os crité-rios da AAMI e BHS. De quatro manômetrosmanuais testados, um manômetro de mercúrio etrês aneróides, apenas primeiro foi recomendado,provavelmente porque é um equipamento comestrutura básica simples com componentes pa-dronizados. De cinco monitores automáticos parauso hospitalar, dois são recomendados e apenasum destes, Dinamap® modelo 8010, pode serutilizado em recém-nascidos. Neste estudo,foram revisados dados de outros 24 modelos,mas nenhum teve recomendado seu uso emrecém-nascidos. É interessante observar que oestudo que validou a recomendação do uso doDinamap® 8100 em neonatologia foi efetuado empessoas adultas, tendo os seus autores sugeridoa realização de estudos de validação do referidomonitor na população pediátrica.39 Por sua vez,Myung et al.40 compararam a medida de pressãoarterial pelo Dinamap® 8100 com o métodoDoppler em 7208 crianças de 5 a 17 anos edemonstraram uma diferença clinicamente im-portante na medida da pressão arterial porDinamap® 8100. Para cada faixa etária, a pressãosistólica obtida pelo Dinamap® foi consisten-temente maior. A diferença média observa-da pela oscilometria na pressão sistólica foi de10,2mmHg (IC95%= -3,5 a 24mmHg), e para apressão diastólica foi de 4,7mmHg (IC95% = -13,5

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a 22.9mmHg) para todas as faixas etáriascombinadas. Os achados deste estudo contra-indicam a leitura intercambiável entre os doismétodos.

Dos três tipos de instrumentos utilizados paraa medição da pressão arterial, o manômetro demercúrio e o manômetro aneróide são depen-dentes de um observador treinado. Quandocomparados com as técnicas de medidas intra-arteriais, as técnicas auscultatórias que utilizamos sons de Korotkoff tendem a ter valores sis-tólicos levemente menores e valores diastólicosmaiores.30

A seleção de um equipamento para determi-nar a pressão arterial é influenciada por muitosfatores, porém a exigência fundamental é queeste aparelho deva demonstrar medidas acu-radas. Muito freqüentemente a acurácia temsido sacrificada pela ingenuidade tecnológica esomente uma fração dos monitores disponíveistem sido validada independentemente. A acurá-cia para equipamentos automáticos deve serprioridade em áreas hospitalares especializadas,especialmente em unidade de cuidados inten-sivos.38

Método do “flush”Descrito por Goldring e Wohltmann41 e por

Cappe e Pallin,42 é uma técnica visual de men-suração da pressão arterial de recém-nascidos defácil aplicação clínica, caracterizada pelo retornovisual da circulação sanguínea na extremidadedistal durante o esvaziamento do manguito doesfigmomanômetro, é facilmente aplicável a umbebê ativo e necessita apenas de um esfigmo-manômetro.28 A técnica de Goldring e Wohlt-mann consiste na colocação de um manguito com2,5cm largura no punho ou do tornozelo, seguidada oclusão da extremidade distal corresponden-te com uma fita de borracha, com a posteriorinsuflação do manguito e retirada da referida fita.Inicia-se então, a desinflação numa velocidadenão maior que 6 a 7 mmHg por segundo, obser-vando-se a re-entrada do sangue na mão ou nopé. Estes autores não descrevem qual manômetrofoi utilizado.41 A técnica de Cappe e Pallinconsiste na colocação do manguito no braço ena oclusão manual da mão do recém-nascido.Ordenadamente, realiza-se a insuflação do man-guito aproximadamente até 120 mmHg, liberan-do a mão da criança e iniciando o esvaziamentodo manguito numa velocidade de 2 mmHg acada segundo42 (Figura 2). Não há estudos quetenham utilizado esta técnica.

Figura 2. Método do “flush”: (a) oclusão manual da mão dorecém-nascido; (b) liberação da mão após a insuflação domanguito, observando-se uma discreta palidez. (c) obser-vação da mão durante desinflação lenta do manguito;(d) momento da reentrada do sangue (pressão do “flush”).

(a)

(b)

(c)

(d)

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Moss et al.43 demonstraram a praticidade euma boa correlação da técnica do método “flush”com o método auscultatório e com a pressãointra-arterial em recém-nascidos. Além disso,estes autores observaram que a pressão obtidapelo método do “flush” representou a pressãoarterial média e esta foi significativamente maiornos membros superiores do que nos membrosinferiores, não se alterando com tamanhos dife-rentes de manguitos. Em outro estudo, Moss eAdams44 observaram que a pressão determi-nada pelo método do “flush” possuía um valormédio muito próximo ao da pressão arterialmédia obtida por cateterismo arterial umbili-cal, e que os manguitos mais largos tendiama apresentar leituras menores do que os maisestreitos, enquanto que os manguitos com lar-gura entre 5 e 9 cm mostravam diferenças deleitura muito pequenas, provavelmente sem im-portância clínica. Nesse estudo, o reconheci-mento visual da pressão do “flush” mostrou umadiferença média de 0,3 mmHg e um coeficientede correlação de 0,98 quando comparado comregistro eletrônico por célula fotoelétrica da re-entrada de sangue na extremidade.

A confiabilidade do método do “flush” foidemonstrada por Virnig et al.45 em 23 recém-nascidos com idade gestacional entre 30 e 40 se-manas. Neste estudo, os autores observaram quea pressão medida pela técnica do “flush”correlacionou-se de forma significativa com osvalores da pressão aórtica obtidos por catete-rismo umbilical, especialmente quando realizadano membro superior direito. Porém, todas asextremidades mostraram-se adequadas pararealização deste método. As limitações obser-vadas por estes autores foram a presença deanemia severa, edema de extremidades, hipoter-mia acentuada e pressão inferior a 20 mmHg.

Os valores normativos do método “flush” parao primeiro ano de vida nas quatro extremidadestambém foram demonstrados. Observou-se que osvalores da pressão do “flush” aumentaram deforma significativa ao longo da primeira semanade vida e foram mais altos nos membros superioresaté o nono mês de vida, quando a relação inver-teu-se. Excluindo-se a primeira semana de vida,a amplitude da pressão do “flush” variou de 51 a93 mmHg para os membros superiores e de 44 a92mmHg para os membros inferiores.22

Método da oximetria de pulsoA primeira descrição da determinação da

pressão arterial pela técnica da oximetria de

pulso foi feita por Wallace et al. em 1987.31 Estesautores observaram que a perda do sinal deáudio e do visual na tela do oxímetro de pulsodurante o enchimento do manguito correlacio-nava-se com a pressão sistólica obtida peloDoppler na mesma extremidade.

A primeira utilização desta técnica em neo-natologia foi feita por Langbaum e Eyal29 em50 recém-nascidos doentes, com peso médio de1711 gramas e idade gestacional média de 31semanas. Consistia no enchimento do manguitonuma velocidade de 2 a 5 mmHg até o desapa-recimento do sinal na tela do oxímetro de pulso,quando então era feito um rápido acréscimo deaproximadamente 20 mmHg. Após, era iniciadauma diminuição gradual de 2 a 5 mmHg até seobservar o retorno da onda na tela do monitor.A pressão pela oximetria foi calculada pela médiaentre a pressão de desaparecimento e a pressãode retorno da onda na tela do oxímetro. Aocompararem este método e a oscilometria com apressão arterial invasiva, estes autores observa-ram que o método da oximetria de pulso era defácil execução e sua correlação com a pressãoarterial invasiva era significativamente melhordo que a oscilometria.

Em outro estudo, Movius et al.46 demons-traram que a pressão arterial determinada pelaoximetria de pulso em crianças submetidas acirurgia cardíaca foi mais acurada que a técnicaoscilométrica, especialmente nas crianças compeso menor que 6kg, as quais tendem a ter pres-sões arteriais menores. Uma das limitações destatécnica é que somente a pressão sistólica é deter-minada. Porém, segundo a British HypertensionSociety, a medida da pressão sistólica é preferívelà diastólica, por apresentar maior acurácia econsistência.36

Outras limitações da técnica de medida dapressão arterial pela oximetria de pulso são:1) erros inerentes às medições, pois são baseadasem variações de 2 a 5mmHg no enchimento domanguito; 2) sujeita-se à subjetividade do obser-vador; 3) influência do local das medidas (medidasrealizadas nos membros superiores são diferentesdaquelas tomadas nos membros inferiores.46

Dez passos para medir corretamente apressão arterial8

1° – Escolha da extremidade: preferente-mente utilizam-se medidas no membro superior.

2° – Avaliação da extremidade: evitam-se asextremidades com catéter ou acesso venoso, com

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circulação comprometida, ou que apresentemlesões na pele.

3° – Seleção do manguito apropriado: deno-mina-se manguito a parte de borracha inflável,recoberta pela braçadeira, que é a peça de panoque se ajusta no braço. Mede-se a circunferênciabraquial no ponto médio do braço, entre oolécrano e o acrômio (Figura 1). A largura domanguito deve corresponder a 40% desta medidae o comprimento deve recobrir 80 a 100% dacircunferência braquial. Um manguito pequenopode resultar em erros proporcionalmente maio-res, conduzindo a leituras maiores na pressão. Aocontrário, a utilização de um manguito maiorcausa uma diminuição menor na acurácia. Éimportante registrar que alguns manguitosapresentam vários tamanhos diferentes para amesma circunferência braquial. Neste caso,escolhe-se o manguito de maior comprimento,desde que o mesmo não se estenda sob ou alémda articulação.

4° – Aplicação adequada do manguito: re-tira-se todo o ar do manguito antes de suacolocação. Identifica-se a presença da marcaarterial no manguito. Esta marca, geralmente emforma de uma seta, está presente na maioria dosmanguitos neonatais e encontra-se impressa nasuperfície que ficará exposta e próxima aosconectores. A função da marca arterial é guiar oposicionamento correto do manguito. Após fazera identificação da marca arterial, palpa-se aartéria braquial e busca-se alinhá-las durante acolocação do manguito. Deve-se aplicá-lo na loca-lização mais proximal possível, a fim de evitar acompreensão do nervo ulnar localizado no coto-velo. Envolve-se o manguito no braço firmemen-te, sem, no entanto, apertá-lo, permitindo o re-torno venoso entre as medidas da pressão arte-rial. Um manguito muito apertado poderá causarcongestão venosa e descoloração da extremidade,e um manguito muito frouxo poderá determinarleituras inadequadas ou ausentes.

5° – Conectar o manguito ao instrumentoescolhido para medir a pressão arterial: con-firmar se a conexão está firme, desobstruída e nãoenroscada.

6° – Inflar o manguito, conforme a técnicaescolhida, e realizar a mensuração da pressãoarterial.

7° – Remover o manguito e reavaliar a extre-midade, procurando potenciais problemas comoavulsão de pele, síndrome compartimental,isquemia ou neuropatia.

8° – Avaliar a pressão arterial: considerar oestado fisiológico atual do recém-nascido e asmedidas prévias de sua pressão arterial.

9° – Criticar sistematicamente a técnica demensuração da pressão arterial e realizar novasmedidas sempre que necessário.

10° – Registrar claramente as pressões sistó-lica, diastólica e arterial média e calcular apressão de pulso.

CONCLUSÕESA pressão arterial em recém-nascidos é um

ótimo indicador da função cardiovascular, sen-do importante sua correta mensuração. Foramdesenvolvidos vários métodos e aparelhos pararealização deste procedimento. Dois elementosimportantes para obtenção de pressões arteriaisexatas são um bebê calmo e um manguito detamanho adequado.

A oscilometria automática, ainda que forneçaas pressões diastólica e sistólica, requer equi-pamento eletrônico e um paciente menos agitado.Também é importante que todos os equipa-mentos sejam validados em protocolos já de-senvolvidos quanto a sua acurácia e precisão.Além disso, muitos locais têm dificuldade emutilizar as técnicas modernas descritas para afe-rição da pressão arterial neonatal, não só pelaspróprias dificuldades técnicas inerentes aosmétodos, mas, principalmente, pelos altos custosde aquisição e manutenção de uma aparelhagemque muitas vezes é importada. Disso tudo resultaque, apesar da grande importância do controlerotineiro da pressão arterial no período neonatal,especialmente nos neonatos doentes ou prema-turos, a pressão arterial poderá não ser verificada,alegando-se falta de equipamento adequado.

O método do “flush”, por isso, pode ser aúnica técnica capaz de ser utilizada em recém-nascidos em qualquer hospital, em postos desaúde, consultórios médicos privados, ou mesmoem qualquer unidade de transporte neonatal, porapresentar um custo muito baixo e poder seraprendida rapidamente, sendo sua precisãoindependente do grau de experiência do exa-minador.

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