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ARTE, DESIGN E VIDA COTIDIANA
Angela Maria dos Santos
Mestranda em Design: Comunicação e Cognição
Linha de Pesquisa: Dinâmicas Estético e Sócio – Cognitivas
Orientadora: Pfa. Dra. Priscila Arantes
Centro Universitário SENAC – SP
Bolsista CAPES
Resumo
Na análise de quatro obras de artistas contemporâneos verifica-se a transversalidade
da arte e do design expressa em temáticas relacionadas à vida cotidiana, como as
questões ecológicas e ambientais e na percepção da natureza enquanto fenômeno
sócio-cultural.
Palavras chave: ecologia, arte, design, transversalidade, vida cotidiana
Abstract
Trough the analyses of four works from contemporary artists we verify the
transversality of art and design expressed on concerns related to everyday life, such as
ecological and environment questions and at the perception of a nature as a socio-
cultural phenomenon.
Key-words: ecology, art, design, transversality, daily life
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Análise de praticas artísticas dos artistas Alan Sonfist, Angela Santos, Jane
Prophet e o coletivo SUPERFLEX
A atuação desses quatro artistas nas obras selecionadas abrange os temas
pesquisados a saber: a relação íntima com a natureza e suas questões ambientais, a
estreita relação com o design (na questão conceitual de elaboração dos projetos, na
realização envolvendo práticas que em sua maioria são atribuídas à designers, no
trabalho interdisciplinar), o caráter social e político, pois muitas dessas ações
decorrem de um olhar crítico quanto a forma como atuamos e vivemos, a busca de
saídas para uma geopolítica de imposição econômico/financeira, e principalmente a
estreita relação com a vida.
Abrangendo um período que parte dos anos 1960 até os dias atuais, traça um
recorte na história da arte contemporânea, apontando mudanças significativas na
atuação artística que apontam para uma atuação mais abrangente quanto ao seu raio
de ação e ao “estar no mundo”. Esses trabalhos atuam em graus diferenciados com
os temas pesquisados, sendo, portanto, um leque relevante para o projeto justamente
pela sua diversidade e transversalidade de atuação.
Alan Sonfist (1946, New York City, NY)
Obra: Time Landscape: 1965/1978 até o presente
LandArt urbana, New York City, New York
Descrição: em um terreno baldio entre as ruas Houston com La Guardia Place, o
artista plantou, no período de 1965 a 1978, uma floresta de plantas nativas,
enriquecendo o solo empobrecido e recriando as formações rochosas preexistentes à
chegada dos primeiros ocidentais. Ele transplantou espécies vivas como faia, carvalho
e ácer e mais de 200 espécies diferentes de plantas nativas de New York
selecionadas por serem do período pré-colonial.
Time Landscape, Greenwich Village, New York, 1965
Cortesia do artista e Paul Rodgers 9W Gallery
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Implantação de Time Landscape,
Lower Manhattan, New York, 1978
Em uma ação considerada Land art, o artista americano Alan Sonfist explica sua
motivação para a realização desse trabalho dizendo da importância de se cultivar
plantas nativas a fim de que a cidade não se esqueça de suas origens. (KASTNER e
WALLIS. 1998:150)
Essa frase indica o tipo de ação que Alan Sonfist tem feito desde os anos 1960
enquanto artista ligado ao movimento artístico LandArt. Diferentemente de outros
artistas do mesmo movimento cujas ações interferem na terra, geralmente em lugares
distantes, a fim de criar sítios artísticos, suas intervenções são, em sua maioria,
urbanas e ocorrem dentro das cidades. Suas ações se propõem a reconstruir ou
apontar problemas ambientais gerados por um desenvolvimento econômico/industrial
predatório; ao fazê-lo, o artista devolve ao publico um espaço de fruição, mas
principalmente de conscientização sobre nossa maneira de estar no mundo.
A motivação para as criações de Sonfist tem sua origem nos anos 1950. O Rio
Bronx, localizado no bairro onde ele vivia, conservava uma área de floresta nativa. Em
entrevista a John Grande ele diz: “A floresta era meu santuário quando criança. A violência
humana não entrava na floresta – era minha catedral mágica. Eu faltava na escola a fim de passar todo o
tempo que eu pudesse nessa floresta e renovar minha energia, minha vida. A floresta tornou-se minha
vida e minha arte”. (Grande, John K. (www.grandescritique.com), trecho de Art Nature
Dialogues:Interviews with Environmental Artists (www.sunypress.edu).
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Time Landscape, New York City, 1965-1978 até o presente
Em Time Landscape o artista trabalhou de maneira colaborativa e democrática
consultando os moradores da vizinhança onde o trabalho foi desenvolvido, e dessa
forma, envolvendo seus usuários. Ao propor a restauração de um terreno abandonado
em pleno espaço urbano da cidade de New York, o artista alia práticas que seriam
esperados de um arquiteto urbanista ou designer paisagista. Seu projeto revela uma
ação de design quanto ao planejamento, logística, implantação e conservação.
O titulo “Paisagem no Tempo” traz em si a idéia de um tempo que busca no
passado sua continuidade no futuro. Desperta nos usuários a memória de tempos
anteriores à chegada dos ocidentais, possibilitando a experiência de paisagens
possivelmente não vivenciadas anteriormente. Propõe também o sentido de
pertencimento e participação, pois enquanto obra viva e em constante mutação,
necessita de atenção e cuidados pertinentes à sua conservação. Ou seja, esse
“tempo” criado por Sonfist é o tempo de existência da obra e do quanto nos
empenhamos na manutenção de sua vida. Essa manutenção provavelmente ocorre
por conta da municipalidade, mas certamente envolve também os cidadãos usuários.
Nesse trabalho artístico a intenção é a de despertar nas pessoas a atenção para com
a natureza, na esperança de que se tornem mais conscientes da sua fragilidade
perante as ameaças ambientais numa relação direta entre arte e vida, memória e vida.
Uma paisagem cultural visto que estreitamente relacionada a Norte America, à forma
como a colonização foi realizada e à maneira como os bens naturais como a flora
foram depredados em função de uma política econômica capitalista cujo objetivo
principal é o lucro em detrimento da história, da memória, do bem estar humano.
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Angela Santos (1954, Jaboticabal, SP)
Obra: Jardins Urbanos, 2001
Instalação interativa realizada nas oficinas do SESC Pompéia, São Paulo, nos finais
de semana de março de 2001.
Descrição: A instalação consiste no envolvimento do publico para a criação de
jardins. Primeiramente, através de breves projetos desenhados e então, a
implementação dos mesmos. Disponibilizou-se para tanto, vasos de plantas de
espécies variadas, bolachas de madeira, seixos de rio e sfagno.
Jardins Urbanos visa à criação de jardins através de duas ações: a primeira mais
conceitual e idealizada, propõe o desenho de um projeto de jardim; a segunda propõe
a realização desses projetos. Para tanto, a artista montou um espaço que consistia em
um tablado de madeira e um painel ao fundo. Em dois grandes bancos de madeira
colocados ao lado desse espaço, a artista colocou à disposição do publico vários
vasos com plantas de diferentes alturas, texturas e cores, algumas com flores, além de
bolachas de madeira, seixos de rio e sfagno (espécie de raízes finas, encontradas em
árvores) e que, quando secas, servem muito bem para forração de vasos e
ornamentação. Em outro canto da instalação, disponibilizou-se uma mesa com cópias
sulfite da planta baixa do espaço (previamente feita pela artista) e vários lápis,
borracha e lápis de cor.
Menino fazendo seu jardim – Jardins Urbanos - SESC Pompéia 2001
Outras duas proposições da artista são a questão do tempo e a questão da
desconstrução e que estão interligadas, pois a efemeridade da criação fica evidente.
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O publico era numeroso e diversificado, tanto social quanto em relação à faixa
etária. Em sua maioria, chegava atraído pelas plantas e muitos acreditavam ser uma
feira das mesmas.
Uma vez explicado o trabalho, eles partiam para o desenho de seus projetos de
jardim. Finalizado, partiam para a realização. Alguns optavam por fazê-lo em
pequenos grupos e outros individualmente. Nesse intervalo entre a finalização do
projeto e a realização, aguardavam, observando a realização ou finalização do jardim
do outro. Ao partirem para a feitura do seu próprio jardim, podiam conservar partes do
anterior ou destruí-lo completamente.
A proposta busca proporcionar um campo para a criatividade através da vivencia
de um jardim enquanto objeto vivo e tridimensional, despertar a relação das pessoas
com a natureza assim como ampliar as questões do meio ambiente urbano; trabalhar
com a memória e os afetos; e a dinâmica de criação de jardins um após o outro, lida
com a desconstrução e o tempo.
Artista realizando seu jardim – Jardins Urbanos, SESC Pompéia, 2001
A resposta a essa ação interativa foi surpreendente pela qualidade do
envolvimento e pelas questões geradas por ela. A criatividade do publico ficou
evidente assim como a atração pela natureza. Uma palavra muito recorrente foi
“terapia”. Foram levantadas também questões sociais, da efemeridade do tempo
contemporâneo, do trabalho colaborativo, do desprendimento e da posse na criação,
de questões espaciais e estéticas, de plantas e do meio ambiente, entre outras. Mas
principalmente foi uma ação marcante para o publico e para a própria artista enquanto
experiência.
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A artista entrevistando uma participante de Jardins Urbanos, SESC Pompéia, 2001
Conceitualmente, esse projeto apresenta vários desdobramentos. O primeiro
está vinculado à relação arte, design e vida. Essa proposta contemporânea de atuação
artística permite ao publico uma relação direta com a vida dessas pessoas e para além
da experiência em si.
O design encontra-se presente em vários momentos: na construção mental de
viabilização da ação; na configuração do espaço; na escolha das plantas e flores e
demais materiais para a implantação dos jardins, decorrentes da atuação da artista
enquanto paisagista em um determinado período de sua vida profissional.
Outro desdobramento traz a questão social por estar trabalhando com pessoas
as mais diversas possíveis em termos de classe social e faixa etária e não diretamente
ligadas ao circuito da arte.
As questões estéticas são trabalhadas com as noções de espaço, composição,
cor, texturas.
Jardins Urbanos trabalha também com o conceito de uma natureza cultural e de
forma sutil, as questões ambientais.
E trabalha ainda com o corpo, pois a realização dos jardins exigia um razoável
deslocamento, movimento e força, utilizando-se de um exercício físico involuntário,
Jane Prophet (1964, Birmingham, UK)
Obra: Decoy ( Engodo) 2001
Descrição: Consiste em uma série de curtas animações digitais apresentadas em
telas de plasma. Cada uma das seqüências mostra uma fotografia de uma paisagem
idílica da Inglaterra que sucumbe a efeitos digitais. Trabalhando de forma colaborativa,
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o software de animação foi especificamente desenvolvido para esse trabalho.
Apresentada em vários museus e galerias, a obra adquire versões variadas segundo o
espaço em que é mostrada.
Mestra em Electronic Graphics, Jane Prophet tem nas estruturas dos objetos o
foco principal de sua pesquisa. Vários de seus trabalhos estão voltados para questões
ambientais e culturais e a artista frequentemente trabalha de forma colaborativa com
outros profissionais.
Especificamente em Decoy, o tema está voltado para a construção
ideologicamente instalada na sociedade inglesa sobre a natureza e a paisagem. Ao
pesquisar fotos de paisagem nos arquivos do National Trust, uma organização sem
fins lucrativos pela conservação do patrimônio histórico que protege edifícios, jardins e
paisagens de interesse especial na Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte, a
artista deparou-se com uma grande quantidade de paisagens extremamente
semelhantes. Para a sociedade inglesa essas paisagens rurais se constituem no que
eles consideram típicas e nativas das terras inglesas.
Entretanto, essas paisagens, provenientes de famosas propriedades rurais
inglesas, foram, em sua maioria, cuidadosamente desenhadas e implementadas por
dois paisagistas: Humphry Repton e Lancelot “Capability” Brown.
Hugo Segawa, referindo-se aos jardins desse período dirá:
Ocorre na Inglaterra no século 17, um avanço das fronteiras agrícolas
onde as “terras incultas” (pastos, charcos e montanhas) são utilizadas
para maior exploração lucrativa da terra, pois a indústria naval
demandava uma administração racional das matas. Da preservação
das florestas ao plantio de árvores foi um passo: a silvicultura
transformava-se numa forma de valorização das propriedades. Ao
mesmo tempo, o cultivo de árvores satisfazia aos interesses
econômicos e atendia aos anseios estéticos da mitificação da vida no
campo (...). Nessa ocupação territorial, convivem o trabalho e o
deleite em margens opostas. A preparação de vistas pressupunha
oferecer ao espectador a distinção entre as paisagens “práticas” – de
caráter técnico, produtivo, racionalizador – das “estéticas” – de feição
contemplativa, mística, do qual se exigia principalmente o
escamoteamento das duras condições do campo mediante o manejo
de um horizonte que suprime as referências produtivas (e
desagradáveis) do olhar dos proprietários da terra. (SEGAWA.
1996:29)
Eminentemente destinada às classes aristocráticas e burguesas em ascensão,
essas imensas propriedades rurais tiveram sua natureza devastada e reconstruída
segundo moldes idealizados de observação e baseados, em sua maioria, nas pinturas
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de paisagem de artistas francesas como Claude Lorrain e Nicolas Poussin.
Diferentemente dos jardins simétricos de Versailles, esses projetos paisagísticos
promoviam a organização de plantas e árvores, montanhas, lagos e pontes que
privilegiassem uma “certa naturalidade” e acima de tudo, a vista a partir da casa.
Jane trabalha então com uma dupla simulação, sobrepondo sobre essas fotos de
paisagem, outras estruturas, como gramados, neblinas e árvores que invadem as
cenas lentamente, como intrusas, reconfigurando, de forma aparente, essas
paisagens.
Na sequência de stills abaixo, as únicas duas árvores deixadas pelo paisagista
“Capability” Brown serviu de guia para a reconstrução da alameda anteriormente
existente à intervenção. As arvores deixadas na paisagem, são como rastros que
permitem recriar o que não existe mais. Como em um vídeo game onde criamos
ambientes existentes em nossa mente, mas guiados por um programa previamente
existente.
Decoy (2001)- alameda de carvalhos criada por animação digital, sobre foto de paisagem do século 17. A
recriação teve como ponte de origem os dois únicos carvalhos deixados na terra pelo paisagista
Capability Brown.
O programa de animação baseia-se na estrutura das arvores e através de regras computacionais, mostra
como elas crescem. (www.janeprophet.com)
A grande questão de Jane Prophet nesse trabalho artístico resume-se na
pergunta: o quão real e natural é a paisagem que vivemos e conhecemos? O próprio
titulo do trabalho indica a questão: decoy significa aquilo que aparenta ser, mas não é.
Esse trabalho exigiu da artista uma grande pesquisa na National Trust,
resultando na descoberta dos principais paisagistas que elaboraram essas paisagens
e na colaboração de software designers para a criação do programa que viesse de
encontro à realização da sua obra.
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Embutida em sua ação, encontramos a questão que Jane deseja colocar ao
publico a fim de provocar a consciência do ambiente em que vivem e o
questionamento de suas crenças em relação a ele.
Decoy foi apresentado em lugares emblemáticos como o Blickling Hall, magnífica
mansão tradicional do século 17, cercada por jardins e paisagens e recentemente
transformada em museu e outras opções de lazer como “a day out – ou desfrutar o dia
junto à natureza”.
Na mostra Life is Beautiful realizada na Galeria The Laing que possui uma
coleção de pinturas dos séculos 18 e 19, Jane coloca as duas telas de plasma ao lado
de paisagens em aquarela da coleção permanente da galeria em uma alusão direta às
fontes de inspiração para a paisagem que os ingleses consideram atualmente como
suas e originais.
Decoy instalado na Galeria The Laing (www.janeprophet.com)
Com esse trabalho Jane Prophet atua na transversalidade que estamos
investigando: na relação arte e design presente na idealização da proposta através da
pesquisa da paisagem e na descoberta de sua criação pelos landscape desingers do
século 17; no trabalho interdisciplinar para o desenvolvimento de softwares de
animação digital especiais para a concretização do trabalho de forma que as
estruturas fiquem aparentes; no planejamento nos espaços das mostras em que a
obra foi apresentada transformando-os em art in situ; pelas questões social e
político/econômica implícitas no tema da paisagem enquanto fenômeno cultural; por
tratar também e predominantemente, da relação entre arte e vida cotidiana.
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SUPERFLEX – coletivo dinamarquês formado por Bjørnstjerne Christiansen (1969,
Copenhagen), Jakob Fenger (1969, Copenhagen) e Rasmus Nielsen (1968,
Copenhagen).
Obra - Superflex Bioga: desde 1996 o coletivo vem desenvolvendo aplicações de uso
para o projeto de duas câmaras de biogás portáteis que convertem dejetos humanos,
esterco e dejetos da agricultura em energia (biogás) e fertilizante (lodo). Esse gás é
então utilizado como fonte de energia por famílias pobres para o cozimento dos
alimentos e para iluminar a casa através de uma lâmpada.
Descrição: Trabalhando em um processo colaborativo com engenheiros africanos e
dinamarqueses, o coletivo Superflex desenvolveu uma unidade portátil de biogás
simples. Esse processo de biogás consiste no depósito de materiais orgânicos em um
tanque lacrado a 20-40º C. Uma digestão anaeróbica acontece e bactérias convertem
o produto orgânico em biogás combustível (metano, dióxido de carbono) e fertilizante
(amônia).
Uma vez desenvolvido, o Superflex testou o projeto pela primeira vez em agosto
de 1997 em uma pequena fazenda na área central da Tanzânia, na África. Em uma
parceria com a organização africana SURUDE (Sustainable Rural Development) o
projeto coletou diariamente o esterco de duas a três vacas produzindo 3m cúbicos de
gás por dia, suficientes para produzir energia para acender uma lâmpada à noite e
garantir gás de cozinha para alimentar diariamente uma família de oito a dez pessoas.
Imagens da implantação do projeto na Tanzânia, África. Site: www.superflex.net
Trabalhando na fronteira estreita entre arte e design, esses artistas vêem
possibilidades de todas as coisas serem utilizadas em níveis diferentes –
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esteticamente, teoricamente e economicamente. Vários desses projetos questionam
criticamente o sistema econômico/capitalista e promovem o desenvolvimento de
projetos sociais e de sustentabilidade.
Em Bioga, criaram um sistema barato, que não depende de nenhuma fonte de
energia para o seu funcionamento a não ser os dejetos orgânicos. O sistema funciona
unicamente através da energia solar. Para a mistura do substrato e o controle do
reator, o sistema pneumático/hidráulico usado é acionado através do nível de pressão
do biogás. A cada 5h o gás é liberado e percorrendo os canos, instala-se no reator.
Quando acionado para o consumo, produz o gás usado diariamente pela família na
Tanzânia. Ecologicamente limpo, cada metro cúbico do biogás corresponde ao uso de
6 litros de combustível diesel. O engenheiro dinamarquês John Mallan, envolvido no
desenvolvimento do projeto de biogás aponta outras vantagens do seu uso:
Sistemas desse tipo contribuem de varias maneiras para a
manutenção do equilíbrio ecológico. Evita-se o
desflorestamento praticado pelo uso da madeira e a poluição
dos cursos de água com dejetos orgânicos. Os substratos
(amônia) gerados pelo sistema de biogás são considerados os
mais adequados fertilizantes para a agricultura. Especialmente
instalados nessas áreas, o árduo trabalho diário de coleta de
madeira em áreas distantes cessará e o padrão de higiene
aumentará consideravelmente uma vez que os dejetos animais
serão rapidamente coletados, reduzindo dessa forma o numero
de moscas e trazendo uma grande limpeza ao local.
(www.superflex.net)
Testes vêem sendo realizados em outros lugares: no Cambodja em colaboração
com a UTA – Universidade de Agricultura Tropical; em The Land, Cheing Mai, na
Tailândia onde estão testando uma nova versão do biogás com o intuito de coletar
mais documentação sobre os benefícios do sistema de biogás. O sistema implantado
no Cambodja utilizou materiais locais e o preço ficou em US$50. Apesar do interesse
considerável de organizações e indivíduos que trabalham em ajuda humanitária,
nenhum canal de vendas puramente comercial foi ainda estabelecido.
Questionados sobre se sua atuação corresponde ao universo da arte eles
afirmam:
“Basicamente é uma questão sobre o que a arte é capaz de
fazer. A arte é capaz de focar em vários tópicos e discursos e
nossa maneira de fazê-la é a de ir além da mera
problematização. Nós queremos que nossa arte tenha uma
relevância social clara e nós assumimos total responsabilidade
pelas conseqüências. Estamos engajados em uma operação
que esperamos ser concretamente relevante para um indivíduo
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ou um grupo de pessoas. O projeto Bioga trata precisamente
disto”. (Superflex. Interview with Asa Nacking//1998 In COLES.
2007:127)
Perguntados por Asa Nacking em que maneira eles se diferenciam de um designer
de produto eles respondem:
“A diferença não é grande. Nós também estamos
interessados no valor estético – algo que raramente está
associado a esse tipo de produto. Seria teoricamente possível
para um designer desenvolver um projeto como esse, mas a
diferença está no fato de que nós podemos e estamos
interessados em colocar questões – coisas que não estão
normalmente associadas com as intenções do designer”.
Ibid., p.130
Em um exemplo de quebra de fronteiras entre arte e design, o trabalho Bioga foi
majoritariamente financiado na sua primeira implantação na Tanzânia pelo Louisiana
Museum of Modern Art, Humlebæk, Denmark e exposto em 1997.
O trabalho foi exposto em museus na Alemanha, Portugal e Estados Unidos.
Analisando, portanto a obra Bioga do coletivo Superflex verificamos a existência
de uma grande ação que permeia vários campos de intersecção: o desenvolvimento
do design de um produto artístico de maneira estritamente colaborativa junto a
engenheiros locais e africanos; o envolvimento de um museu subvencionando a
primeira implantação do projeto na Tanzânia; a participação efetiva da SURUDE
(Desenvolvimento Rural Sustentável) da Tanzânia na sua primeira experiência de
implantação; o objeto de o projeto destinar-se a um publico alvo menos favorecido,
proveniente de áreas subdesenvolvidas e dependente de energias sujas e caras; o
intuito de transformar esse meio energético em uma possibilidade viável e barata para
essas populações além da preocupação sustentável e ecológica com o planeta; a
veiculação da ação através de mostras em museus e no site do coletivo; o fato de a
obra ser um work in progress, sendo levada para outros países, se adaptando às
condições locais e se desenvolvendo no tempo.
Através, portanto da análise das quatro obras apresentadas, verificamos a
transversalidade das ações nelas encontradas. Com o pressuposto comum da
ecologia, natureza e meio ambiente, todas elas, em graus diferenciados, apresentam
um comprometimento com temas decorrentes da vida cotidiana e da nossa forma de
estar no mundo. As quatro obras buscam o olhar, a vivencia, a conscientização do
publico sobre os temas abordados e através delas, as soluções possíveis. A arte em
função da vida.
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Referências Bibliográficas
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Martins Fontes, 2007
COLES, Alex (Ed). Design and Art. London, Whitechapel/Cambridge MIT Press, 2007
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PAPANEK, Victor. Arquitetura e Design- Ecologia e Ética (The Green Imperative –
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ngela Santos – (Jaboticabal, SP). Vive e trabalha em São Paulo ciatura Plena em
ABacharel em Artes Visuais pelo Algonquin College, Canadá; Licen
Artes pela FAAP, São Paulo. Assessora para os projetos internacionais do MIS- SP e
Paço das Artes, SP. Exposições: NORD/SUD, instalação Canadá- 2007, NINHO,
instalação, Bragança Paulista- 2004, DEZEMBRO, vídeo, Galeria Vermelho-2006.