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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA - CCT MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA - MAG Área de Concentração: Análise Geoambiental e Ordenação do Território nas Regiões Semi-Áridas e Litorâneas Linha de Pesquisa: Análise Geoambiental Integrada e Dinâmica das Paisagens Semi-Áridas e Litorâneas A DINÂMICA AMBIENTAL DO ESTUÁRIO DO RIO CURU - CE: SUBSÍDIOS PARA O MONITORAMENTO E GERENCIAMENTO DA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL Autora: Tatiana Oliveira Falcão Quintela Orientador: Dr. Jáder Onofre de Morais Fortaleza - CE 2008

Área de Concentração - uece.br · Hidrodinâmica. I. Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências e Tecnologia. CDD: 551.4609. ... Ambiental do Estuário do Rio Curu até

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEAR

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA CENTRO DE CINCIAS E TECNOLOGIA - CCT

    MESTRADO ACADMICO EM GEOGRAFIA - MAG

    rea de Concentrao:

    Anlise Geoambiental e Ordenao do Territrio nas Regies Semi-ridas e Litorneas

    Linha de Pesquisa:

    Anlise Geoambiental Integrada e Dinmica das Paisagens Semi-ridas e Litorneas

    A DINMICA AMBIENTAL DO ESTURIO DO RIO CURU - CE: SUBSDIOS PARA O MONITORAMENTO E GERENCIAMENTO

    DA REA DE PROTEO AMBIENTAL

    Autora: Tatiana Oliveira Falco Quintela

    Orientador: Dr. Jder Onofre de Morais

    Fortaleza - CE 2008

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEAR

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    CENTRO DE CINCIAS E TECNOLOGIA - CCT

    MESTRADO ACADMICO EM GEOGRAFIA - MAG

    TATIANA OLIVEIRA FALCO QUINTELA

    A DINMICA AMBIENTAL DO ESTURIO DO RIO

    CURU-CE: SUBSDIOS PARA O MONITORAMENTO E

    GERENCIAMENTO DA REA DE PROTEO AMBIENTAL

    FORTALEZA - CE 2008

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    TATIANA OLIVEIRA FALCO QUINTELA

    A DINMICA AMBIENTAL DO ESTURIO DO RIO

    CURU-CE: SUBSDIOS PARA O MONITORAMENTO E

    GERENCIAMENTO DA REA DE PROTEO AMBIENTAL

    Dissertao submetida ao Curso de Mestrado Acadmico em Geografia do Centro de Cincias e Tecnologia da Universidade Estadual do Cear, como requisito parcial para obteno do grau de mestre em Geografia. rea de Concentrao: A Anlise Geoambiental e Ordenao do Territrio nas Regies Semi-ridas e Litorneas.

    Orientador: Prof. Dr. Jder Onofre de Morais

    FORTALEZA CE 2008

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Q7d Quintela, Tatiana Oliveira Falco

    A dinmica ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: subsdios para o monitoramento e gerenciamento da rea de Proteo Ambiental/Tatiana Oliveira Falco Quintela. ____ Fortaleza, UECE. 140 p. Orientador: Prof. Dr. Jder Onofre de Morais Dissertao (Mestrado Acadmico em Geografia) Universidade Estadual do Cear, Centro de Cincias e Tecnologia. 1. Esturio. 2. Morfodinmica. 3. Hidrologia. 4. Hidrodinmica. I. Universidade Estadual do Cear, Centro de Cincias e Tecnologia.

    CDD: 551.4609

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    TATIANA OLIVEIRA FALCO QUINTELA

    A DINMICA AMBIENTAL DO ESTURIO DO RIO

    CURU-CE: SUBSDIOS PARA O MONITORAMENTO E

    GERENCIAMENTO DA REA DE PROTEO AMBIENTAL

    Dissertao submetida ao Curso de Mestrado Acadmico em Geografia do Centro de Cincias e Tecnologia da Universidade Estadual do Cear, como requisito parcial para obteno do grau de mestre em Geografia.

    Defesa em: ____/____/_____

    Nota obtida: _____________ Conceito obtido: _____________

    BANCA EXAMINADORA:

    ________________________________ Prof. Dr. Jder Onofre de Morais (Orientador)

    Universidade Estadual do Cear

    ________________________________

    Profa. Dra. Lidriana de Souza Pinheiro

    Universidade Estadual do Cear

    ________________________________ Prof. Dr. Luis Parente Maia

    Universidade Federal do Cear

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Aceleramos o passo sempre que buscamos

    algo importante para nossa existncia.

    Quem ama no se cansa facilmente nem se deixa

    vencer pelo desnimo. Ao contrrio, enfrenta qualquer

    obstculo para conseguir seu objetivo.

    NILO LUZA

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Dedico essa dissertao a Deus pela minha

    existncia e sade, aos meus pais (Antonio Luiz

    e Maria de Fatima) pelo carinho e apoio no decorrer

    da minha vida. Aos meus irmos (Luiz Fabiano e

    Thiago) pelos momentos de alegria e amizade, ao

    meu grande av (Joo Falco), ao meu esposo

    Davi pela compreenso e companheirismo.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    AGRADECIMENTOS

    Ao Professor Dr. Jder Onofre de Morais pela grande oportunidade, incentivo e

    confiana no desenvolvimento desta dissertao, muito obrigada!

    A Fundao Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

    (FUNCAP), pela concesso da bolsa de mestrado.

    Ao Laboratrio de Geologia e Geomorfologia Costeira e Ocenica (LGCO) da

    Universidade Estadual do Cear pela concesso do barco e de equipamentos, alm

    da anlise e processamento de amostras.

    Professora Dra. Lidriana de Souza Pinheiro pela sua ateno durante o decorrer

    do mestrado e pela ajuda na organizao das atividades de campos.

    Ao Professor Dr. Flvio Rodrigues do Nascimento, pela ajuda e esclarecimentos em

    determinados assuntos da geografia e da rea de estudo. Obrigada!

    Meus sinceros agradecimentos equipe do Laboratrio de Geologia e

    Geomorfologia Costeira e Ocenica (Paulo, La, Irion, Diego, Laldiane, Glacianne,

    Glairton, Marisa, Mariana, Miguel, Davis, Raquel, Judria, Andr, Joo Paulo,

    Eluziane, Alex, Lilian e Silvio) pelos momentos de alegria e de aprendizagem.

    Aos meus grandes amigos Aluzio dos Santos Arajo, Carolina Braga Dias e Paulo

    Henrique Gomes de Oliveira Sousa (PH) pelo respeito, sinceridade e ateno. No

    sei o que seria sem ajuda de vocs!

    Aos meus amigos de graduao Llian Soares, Llian Sorele, Renata Carvalho,

    Luciana Freire, Santiago, Helder Gadelha, Lidiane e PH (voc novamente!), pelos

    bons momentos.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    A todos os alunos da turma de 2006 do Mestrado Acadmico em Geografia (Cintia,

    Juscelino, La, Glairton, Eder, Mrcia, Feliciano, Tlio, Ronny, Iandra, Nayara,

    Aridnio, Cisne e Nicolai) pelos bons momentos vividos e pela unio.

    Aos professores do Mestrado Acadmico em Geografia da Universidade Estadual do

    Cear (Marcos Jos Nogueira de Souza, Fbio Perdigo Vasconcelos, Maria Lcia

    Brito da Cruz, Daniel R. de Carvalho Pinheiro, Luzia Neide M. T. Coriolano, Lidriana

    de Souza Pinheiro, Zenilde Baima Amora, Sandra Maia Farias Vasconcelos, Jder

    Onofre de Morais, Lcia Maria Silveira Mendes e Flvio Rodrigues do Nascimento)

    pela aprendizagem e pelo convvio estimulante durante o curso.

    Aos professores do Curso de Ps-Graduao em Engenharia Civil (Francisco

    Suetnio Bastos Mota e Sandra Tdde Santaella) da Universidade Federal do Cear

    pelos bons momentos de aprendizagem.

    Aos funcionrios do Mestrado Acadmico em Geografia, em especial, a Sra. Jlia.

    Aos motoristas Lucinaldo e Francisco que acompanharam e ajudaram no decorrer

    das atividades de campo.

    Em fim, a todos que de alguma forma contriburam para o desenvolvimento deste

    trabalho. Obrigada!

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    RESUMO

    A rea de estudo localiza-se na divisa dos municpios de Paraipaba e Paracuru, na poro noroeste do Estado do Cear, Nordeste do Brasil. Abrange uma rea corresponde a 1.607,39 hectares, sendo que 881,94 hectares (54,86%) pertencem rea de Proteo Ambiental (APA) do Esturio do Rio Curu. O objetivo principal do trabalho consiste em avaliar a interao dos processos costeiros e continentais, com o propsito de gerar informaes teis ao monitoramento e gesto ambiental da APA. A metodologia encontra-se dividida em trs etapas: reconhecimento da rea de estudo, atividades de campo e anlises laboratoriais. A rea de estudo est inserida em terrenos pertencentes aos depsitos sedimentares Cenozicos distribudos em trs unidades geomorfolgicas (plancie litornea, tabuleiro pr-litorneo e plancie fluvial). A morfodinmica atual da desembocadura do rio est subordinada, principalmente, ao regime sazonal da vazo de gua e ao transporte de sedimentos pela deriva litornea. Em 2001, o spit arenoso situado na margem direita do rio apresentava uma extenso de 453,23 m, e em 2007, o comprimento quase que triplicou (1.114,80 m). O Esturio do Rio Curu raso com profundidade mdia de 1,00 m, com valores variando entre 0,10 m a 2,00 m na cota de baixamar. A largura mdia do canal de 242, 28 m, com valores mximos de 1.646,19 m e mnimos de 28,53 m. As mars so do tipo semi-diurnas, com amplitude de sizgia correspondente a 1,70 m. O assoreamento e a presena de um extenso cordo arenoso na desembocadura do rio tm ocasionado um atraso de 02 horas e 37 minutos na baixa-mar. A influncia mxima da mar salina e dinmica foi evidenciada a 7,3 km de distncia da foz. Na poca de chuva, a Zona de Mar do Rio (ZR) foi diagnosticada at 4,8 km de distncia da foz, enquanto na estiagem foi verificada a 7,3 km. Portanto, o esturio tem maior capacidade de diluio durante a quadra chuvosa, pois, a Zona de Mistura encontra-se mais prximo desembocadura. Conforme a classificao CONAMA n 357, de 17 de maro de 2005, as guas foram classificadas como salinas (estiagem) e salobras (chuvoso). O esturio do tipo verticalmente bem misturado e parcialmente misturado durante a estiagem e a chuva, respectivamente. As temperaturas na coluna dgua apresentam uma homogeneidade maior no perodo de estiagem do que de chuva. Atravs do balano do material em suspenso, constatou-se que no perodo de chuva o rio exporta 53,67 t/dia, enquanto na estiagem importa 17,21 t/dia. Considerando os estudos morfodinmicos e hidrodinmicos, constatou-se que o esturio um sistema estuarino-lagunar dominados por ondas. A partir dos dados obtidos e analisados fica como sugesto uma nova delimitao da rea de Proteo Ambiental do Esturio do Rio Curu at a barragem localizada a 7,3 km de distncia da foz, cuja referencia geogrfica em UTM corresponde longitude de 487851 e latitude de 9221088.

    Palavras-chave: Esturio, morfodinmica, hidrologia e hidrodinmica.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    ABSTRACT

    The study site is localized at the limit of Paraipaba and Paracuru municipalities, in the northwest of the Cear State, Northeast of Brazil. It encloses an area of 1,607.39 ha, and 881.94 ha (54.86%) of this area belongs to the Environmental Protection Area (EPA) of Curu River Estuary. The work aims to evaluate the interaction between the oceanic and continental processes, purposing to generate useful information for the monitoring and environmental management of the EPA. The methods are divided in three steps: recognizing of the study site, field works and laboratorial analyses. The research site is inserted in terrains belonging to Sedimentar Cenozoic deposits distributed on several Geomorphologic Units (Coastal Plain, Pre-coastal Board e Fluvial Plain). The current morphodynamic is s subordinated, mainly, to the seasonal regime of the water flow and the sediment transport for the coastal drift. In 2001, the spit located on the right beach of the river presented an extension of 453.23 m, and in 2007, the width was tripled (1,114.80 m). The Curu River Estuary is shallow with average depth of 1 m, with values varying from 0.10 m to 2.00 m in the low tide. The average width of the channel is of 242. 28 m, with highest values of 1.646,19 m and lowest of 28.53 m. The regimen is semi-day tides with sizigy variation of 1.70 m. The loss of depth and the migration of the channel at the mouth have caused a delay of 2 hours and 37 minutes in the low tide. The maximum influence of the saline and dynamic tide was evidenced along 7,3 km of distance far from the mouth. In the rainy season, the River Tide Zone (TZ) was verified up tp 4.8 km of distance far from the mouth, while in the dry season was verified 7.3 km far from the mouth. Therefore, the estuary has larger dilution capacity during the rainy block, because, the Area of Mixture is closer to the outlet. In the rainy period, the salinity of the estuarine system was classified of the type (mixed) mesohalina and in the dry season as eurihalina. According to the CONAMAa resolution n 357, of March 17, 2005, the waters were classified as salt beds (drought) and salty (rainy). The estuary is of vertically well mixed and partially mixed during the dry season and the rainy season, respectively. The temperatures in the water column present a larger homogeneity in the dry season period than in rainy. Through the evaluation of the material in suspension, was verified that in the rainy period the river exports 53.67 tons/day, while in the drought it imports 17.21 tons/day. Considering the morphodynamic and hydrodynamic studies, was verified that the estuary is an estuarine-lagoon system dominated by waves. Starting from the obtained and analyzed data, consider as a suggestion a new delimitation of the Environmental Protection Area (EPA) of Curu River up to the dam located far 7.3 km from the mouth, whose geographical reference in UTM corresponds to the longitude of 487851 and the latitude of 9221088. Key-words: Estuary, Morphodynamic, Hydrology and Hydrodynamic.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS...................................................................................... 01

    LISTA DE TABELAS...................................................................................... 05

    LISTA DE QUADROS.................................................................................... 06

    LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS......................................................... 07 1. Introduo................................................................................................ 10 2. Referencial Terico.................................................................................. 15

    2.1. Zona Costeira e Orla Martima................................................................ 15 2.2. Bacia Hidrogrfica................................................................................... 18 2.3. Esturios................................................................................................. 19 2.3.1. Aspectos Conceituais.......................................................................... 19

    2.3.2. Gnese dos Esturios.......................................................................... 22 2.3.3. Aspectos Hidrolgicos e Hidrodinmicos............................................ 23 2.3.4. Classificao Geomorfolgica e Aspectos Sedimentolgicos............. 24 2.3.5. Classificao do Esturio por Estratificao de Salinidade................. 27

    2.4. rea de Proteo Ambiental e Gesto Ambiental.................................. 29

    3. Metodologia............................................................................................. 31 3.1. Reconhecimento da rea....................................................................... 32 3.1.1. Levantamento Bibliogrfico e Cartogrfico.......................................... 32 3.1.2. Geoprocessamento e Confeco de Material Cartogrfico............... 32

    3.2. Atividades de Campo.............................................................................. 34

    3.2.1. Processos Hidrodinmicos e Hidrolgicos........................................... 36 3.2.2. Contexto Morfodinmico e Sedimentolgico....................................... 44 3.3. Tcnicas Laboratoriais. ......................................................................... 46 3.3.1. Material em suspenso....................................................................... 46

    3.3.2. Anlise Granulomtrica....................................................................... 48 4. Caracterizao da rea de Estudo ........................................................ 51 4.1. Recursos Hdricos .................................................................................. 51

    4.2. Caractersticas Geomorfolgicas e Geolgicas .................................... 55

    4.3. Aspectos Climticos Regionais e Locais................................................ 66

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    4.4. Parmetros Oceanogrficos................................................................... 71

    4.4.1. Ventos............................................................................................... 71

    4.4.2. Ondas e Mars.................................................................................... 73

    5. Caractersticas Hidrolgicas e Hidrodinmicas do Ambiente Estuarino...................................................................................................... 77

    5.1. Salinidade Horizontal e Vertical.............................................................. 77 5.2. Temperatura Horizontal e Vertical.......................................................... 85 5.3. Comportamento das Correntes............................................................... 89

    6. O Sistema Estuarino e a Evoluo Morfodinmica da

    Desembocadura ....................................................................................... 93 6.1. Morfologia do Esturio............................................................................ 93 6.2. Quantificao Sazonal do Material em Suspenso e Taxa de

    Transporte................................................................................................... 98

    6.3. Morfodinmica da Desembocadura e Processos Atuantes na Faixa

    de Praia Emersa............................................................................................ 110 7. Concluses............................................................................................... 122 8. Referncias Bibliogrficas...................................................................... 128

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 01: Mapa de localizao da rea de estudo.................................... 14 Figura 02: Disposio das zonas de mar do rio (ZR), de mistura (ZM) e

    costeira (ZC) no sistema estuarino.............................................................. 21

    Figura 03: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo altamente

    estratificado ou cunha salina (tipo A)........................................................... 28

    Figura 04: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo

    moderadamente ou parcialmente misturado (tipo B)................................... 28

    Figura 05: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo verticalmente

    bem misturado, mas com ligeira estratificao lateral (tipos C e D)............ 29

    Figura 06: Fluxograma metodolgico......................................................... 31 Figura 07: Mapa de localizao das clulas, estaes, perfis e sees

    monitorados no Esturio do Rio Curu.......................................................... 37

    Figura 08: Mini-correntmetro porttil da Sensordata a.s. modelo SD-

    6000/30........................................................................................................ 38

    Figura 09: Sonda oceanogrfica da Sensordata a. c. (STD/CTD) de

    modelo 204.................................................................................................. 39

    Figura 10: Disco de Secchi......................................................................... 42 Figura 11: (a) Estao climatolgica modelo WIZARD III. (b) Termo-

    anemmetro digital modelo TAD-500 porttil.............................................. 43

    Figura 12: GPS GARMIN de modelo GPSmap 60CS................................ 45 Figura 13: Sistema de filtrao acoplado a uma bomba de vcuo............. 47 Figura 14: (a) Dessecador. (b) Balana analtica....................................... 48 Figura 15: (a) Balana analtica. (b) Peneiramento mido......................... 49 Figura 16: (a) Conjunto de peneiras. (b) Peneiramento mecnico............ 50 Figura 17: Distribuio das bacias hidrogrficas no territrio do Estado

    do Cear...................................................................................................... 52 Figura 18: Diviso Hidrogrfica Nacional.................................................... 53 Figura 19: Mapa geomorfolgico e geolgico da rea de estudo............... 56 Figura 20: Sedimentos arenosos de colorao avermelhada..................... 57 Figura 21: Perfis transversais na rea de estudo de Paracuru a

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Paraipaba obtidos atravs do Global Mapper da Imagem SRTM................ 58 Figura 22: Presena de metais pesados na faixa de praia......................... 60 Figura 23 Migrao do campo de dunas em direo a rea de coqueiros

    e a exumao de rochas paralela a linha de costa..................................... 62 Figura 24: Presena de rochas prxima a desembocadura do rio............. 63 Figura 25: (a) vegetao de mdio a alto porte localizado prximo a

    desembocadura do Rio Curu na margem leste (Paracuru). (b) vegetao

    de pequeno a mdio porte situado na margem oeste

    (Paraipaba).................................................................................................. 64

    Figura 26: Exumao de troncos e razes de mangues na margem oeste

    do rio............................................................................................................ 65

    Figura 27: Mdia pluviomtrica do posto da FUNCEME localizado no

    municpio de Paracuru................................................................................. 67

    Figura 28: Precipitao nos municpios de Paracuru e Paraipaba no

    perodo de monitoramento........................................................................... 67

    Figura 29: Distribuio mdia de temperatura mxima, mdia e mnima

    da estao de Fortaleza (1961 - 1990)........................................................ 69

    Figura 30: Variao da temperatura durante o monitoramento realizado

    em 20 de maro e 24 de novembro de 2007 no Esturio do Rio Curu........ 70

    Figura 31: Direo dos ventos na estao de Fortaleza (1987 -1995)....... 71 Figura 32: Velocidade mdia dos ventos na estao de Fortaleza (1987 -

    1995)............................................................................................................ 72

    Figura 33: Histograma de Hmx referente Pecm (CE) durante maro/

    1997 a outubro/2005.................................................................................... 74

    Figura 34: Variao da mar de sizgia em 20 de maro de 2007 na

    desembocadura do Esturio do Rio Curu.................................................... 76

    Figura 35: Distribuio horizontal da salinidade mdia da coluna dgua

    no Esturio do Rio Curu durante a vazante e a enchente em mar de

    sizgia nos perodos de chuva e de estiagem de 2007................................ 79

    Figura 36: Estagnao dgua na estao 01 devido ao banco de areia

    que fica emerso durante a vazante e a baixamar........................................ 80

    Figura 37: Distribuio vertical da salinidade na coluna dgua do

    esturio do Rio Curu durante as fases de enchente e vazante em mar

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    sizgia nos perodos de chuva e de estiagem de 2007................................ 83

    Figura 38: Barragem construda para captao de gua para os viveiros

    de camares................................................................................................. 84

    Figura 39: Distribuio horizontal da temperatura mdia da coluna

    dgua no Esturio do Rio Curu durante a vazante e a enchente em mar

    de sizgia nos perodos de chuva e de estiagem de 2007........................... 86

    Figura 40: Distribuio vertical da temperatura (C) da coluna dgua do

    esturio do Rio Curu durante as fases de enchente e vazante em mar

    sizgia no perodo de chuva e de estiagem de 2007................................... 88

    Figura 41: Direo e intensidade das correntes na fase de vazante e

    enchente de mar de sizgia referente ao perodo de chuva e de estiagem

    de 2007........................................................................................ 92

    Figura 42: Batimetria do sistema estuarino do Rio Curu realizado em

    maro de 2007 em mar de sizgia.............................................................. 94

    Figura 43: Perfis batimtricos das sees transversais do Esturio do Rio

    Curu....................................................................................................... 96

    Figura 44: Extenso banco arenoso localizado nas proximidades da

    desembocadura........................................................................................... 97

    Figura 45: Distribuio horizontal mdia de material em suspenso na

    coluna dgua no Esturio do Rio Curu durante a vazante e enchente em

    mar de sizgia nos perodos de chuva e de estiagem de 2007.................. 100

    Figura 46: Formao de um extenso banco de sedimentos que contribui

    na fixao de mangue.................................................................................. 101

    Figura 47: Pouca cobertura vegetal na margem oeste do rio expe o solo

    eroso durante a vazante.................................................................. 102

    Figura 48: Canais localizados na margem oeste do esturio do Rio Curu

    para liberao de efluentes dos viveiros de carcinicultura.......................... 103

    Figura 49: Pouca vegetao proporciona a intensificao da eroso e

    redistribuio de MES na massa dgua durante a enchente de mar....... 104

    Figura 50: Descargas Slidas em Suspenso no sistema estuarino do

    Rio Curu durante a vazante e a enchente referente ao perodo de chuva

    de 2007........................................................................................................ 106

    Figura 51: Descarga de Slidos em Suspenso no sistema estuarino do

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Rio Curu durante a vazante e a enchente referente ao perodo de

    estiagem de 2007........................................................................................

    107

    Figura 52: Balano entre as descargas de vazante e enchente do

    Esturio do Rio Curu durante os perodos de chuva e de estiagem de

    2007............................................................................................................. 108

    Figura 53: Presena de extensos cordes arenosos oriundos da deriva

    litornea....................................................................................................... 109

    Figura 54: Perfil morfolgico longitudinal do Esturio do Rio Curu com

    destaque para rea com maior reteno de sedimentos............................. 109

    Figura 55: Variaes morfolgicas da desembocadura do Esturio do Rio

    Curu nos anos de 2001 e 2004............................................................. 110

    Figura 56: Comportamento morfodinmica da desembocadura do

    Esturio do Rio Curu nos meses de janeiro, maro, maio, julho, setembro

    e novembro de 2007.................................................................................... 112

    Figura 57: Reduo da largura e da extenso do spit arenoso situado na

    margem direita do Esturio do Rio Curu devido aos processos costeiros e

    continentais............................................................................................... 113

    Figura 58: (a) formao de laguna durante a baixa-mar na margem

    esquerda do Rio Curu. (b) fixao da vegetao no ms de maio.............. 114

    Figura 59: Reduo da laguna situada na margem oeste do Rio Curu...... 115 Figura 60: Na margem leste do rio ocorre fixao de mangue montante

    da barra........................................................................................................ 115

    Figura 61: Perfis topogrficos da faixa de praia adjacente a

    desembocadura do Esturio do Rio Curu.................................................... 118

    Figura 62: Volume sedimentar dos perfis monitorados nos meses de

    janeiro, maro, maio, julho, setembro e novembro de 2007 em mar de

    sizgia........................................................................................................... 119 Figura 63: Balano sedimentar dos perfis monitorados nos meses de

    janeiro, maro, maio, julho, setembro e novembro de 2007 em mar de

    sizgia............................................................................................................ 120

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    LISTA DE TABELA

    TABELA 01: Bacias hidrogrficas do Estado do Cear com suas

    respectivas reas, capacidade de armazenamento e nmero de audes... 52

    TABELA 02: Audes monitorados na Bacia do Curu, com suas

    respectivas localizaes e capacidade de armazenamento........................ 54

    TABELA 03: Variao sazonal da concentrao mdia de material slido

    em suspenso (mg/L) na coluna dgua no Esturio do Rio Curu.............. 99

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    LISTA DE QUADRO

    QUADRO 01: Coordenadas das estaes monitoradas em UTM.............. 36 QUADRO 02: Classificao das guas segundo suas classes e seus

    usos preponderantes................................................................................... 40

    QUADRO 03: Classificao de guas salobras segundo do Symposium

    of Brackish Waters...................................................................................... 42

    QUADRO 04: Cotas referentes a cada perfil topogrfico............................ 45 QUADRO 06: reas mdias das sees transversais do Esturio do Rio Curu............................................................................................................. 97

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    LISTA SIGLAS E ABREVIATURAS

    ABNT - Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ANA - Agncia Nacional de guas

    AS - rea da Seo

    APA - rea de Proteo Ambiental

    APP - rea de Preservao Permanente BH - Bacia Hidrogrfica

    CBH - Comit de Bacia Hidrogrfica CE - Cear CIRM - Comisso Interministerial para os Recursos do Mar CLC - Camada Limite Costeira

    CNRH - Conselho Nacional de Recursos Hdricos.

    COGERH - Companhia de Gesto dos Recursos Hdricos

    CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente CPRM - Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais

    CMES - Concentrao de Material em Suspenso

    DGPS - Sistema de Posicionamento Global Diferencial

    DHN - Diretoria de Hidrografia e Navegao

    DNOCS - Departamento Nacional de Obras Contra as Secas

    ENE - Leste-nordeste

    ESE - Leste-sudeste

    Ev - Evaporao

    FUNCAP - Fundao Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e

    Tecnolgico

    FUNCEME - Fundao Cearense de Meteorologia e Recursos Hdricos

    GPS - Sistema de Posicionamento Global

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    IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

    IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    INMET - Instituto Nacional de Meteorologia

    INPE - Instituto Brasileiro de Pesquisas Espaciais

    INPH - Instituto de Pesquisas Hidrovirias

    LABOMAR - Instituto de Cincias do Mar

    LAGEMAR - Laboratrio de Geologia Marinha

    LGCO - Laboratrio de Geologia e Geomorfologia Costeira e Ocenica

    MES - Material em Suspenso

    NE - Nordeste

    P - Precipitao

    P(F) - Peso do filtro sem slidos

    P(F + S) - Peso do filtro com slidos

    PNGC - Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro

    PNGC II - Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro II

    QF - Descarga Fluvial

    QMES - Descarga de Material em Suspenso

    QSB - Descarga de Sedimentos Transportada em Suspenso Proveniente da Bacia

    Hidrogrfica

    QSF - Descarga de Sedimentos Transportados por Arrasto de Fundo

    QSS - Descarga de Sedimentos Transportada Provenientes do Fundo, Transportada

    em Suspenso

    QST - Descarga Total de Sedimentos

    SAD69 - South America Datum 1969 SAG - Sistema de Anlise Granulomtrica

    SE - Sudeste

    SEMACE - Superintendncia Estadual do Meio Ambiente

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    SIG - Sistema de Informao Geogrfica

    SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservao SRH- Secretria dos Recursos Hdricos

    U - Velocidade Mdia da Corrente

    UC - Unidade de Conservao

    UECE - Universidade Estadual do Cear

    UFC - Universidade Federal do Cear

    UFF - Universidade Federal Fluminense

    UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro

    UTM - Universal Transversal de Mercator

    VOL - Volume

    ZC - Zona Costeira

    ZCIT - Zona de Convergncia Intertropical

    ZM - Zona de Mistura

    ZR - Zona de Mar do Rio

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    1. INTRODUO

    Os esturios so ambientes costeiros de carter transitrio entre o

    continente e o oceano. Encontram-se sujeitos a ao combinada de foras oriundas

    da atrao gravitacional (terra, sol e lua), centrfuga e a descarga fluvial que ao diluir

    a gua salgada ocasiona movimentos devido diferena de densidade.

    Apesar de instveis so ambientes que desempenham papis ecolgicos

    importantes, servindo de reproduo e de berrio para diversas espcies animais.

    Miranda, Castro e Kjerfve (2002), ressaltam que as guas estuarinas so

    biologicamente mais produtivas do que as do rio e do oceano adjacente, devido s

    caractersticas hidrodinmicas da circulao que, aprisionando nutrientes, algas e

    outras plantas, estimulam a produtividade primria desses corpos de gua.

    As regies estuarinas constituem reas de alta produtividade e

    diversidade biolgica. Juntamente com as zonas de ressurgncia e baas, as reas

    costeiras estuarinas, embora correspondam a apenas 10% da superfcie marinha,

    produzem mais de 95% do alimento que o homem captura no mar (CIRM, 1981).

    Ao longo de aproximadamente 8.500 km do litoral brasileiro, existem

    diversos esturios e lagunas costeiras que contriburam para o desenvolvimento de

    cidades, tendo como conseqncia, modificaes nos processos de sedimentao e

    de eroso e nas caractersticas, tais como: geometria, corrente de mar, descarga

    de gua doce e qualidade da gua, que foram alteradas por processos naturais e

    antrpicos, no decorrer dos sculos (MIRANDA, CASTRO e KJERFVE, 2002).

    De um modo geral, esses ambientes tm sofrido diversos impactos

    ambientais relacionados tanto as atividades exercidas no interior da bacia

    hidrogrfica quanto aos processos costeiros. Portanto, o turismo, a expanso

    urbana, o desmatamento, a agricultura, a aqicultura, as indstrias, a instalao de

    portos e a construo de barragens ocasionam modificaes que na maioria das

    vezes, torna-se irreversvel.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    A construo de represas mais prximas s reas estuarinas, alm de

    reduzir a descarga fluvial e o aporte de sedimentos para a zona costeira, aumenta a

    intruso da mar e modificao nos processos hidrodinmicos jusante (DIAS,

    2005).

    Apesar de necessrias a construo de barragens para abastecimento de

    gua, gerao de energia eltrica, piscicultura, irrigao, navegao, e at mesmo,

    lazer uma prtica bastante comum e justificvel nas regies semi-ridas. Sabendo

    que, o seu funcionamento ocasiona mudanas significativas jusante da barragem,

    alm de romper o equilbrio natural do rio.

    No Estado do Cear, s irregularidades da quadra chuvosa (janeiro a

    junho) e a regularizao da vazo associada s variveis oceanogrficas (ondas,

    mars e correntes) e ao elica so responsveis por processos morfodinmicos

    acelerados. Isto refletido no deslocamento ou fechamento das desembocaduras de

    rios, ocasionando mudanas nos parmetros hidrolgicos, hidrodinmicos e

    sedimentolgicos do sistema.

    Em razo do exposto, optamos compreender o funcionamento do sistema

    estuarino do Rio Curu. Neste caso, utilizamos a rea de estudo como um laboratrio,

    procurando interpretar e relacionar as informaes coletadas com os tipos de uso e

    ocupao, sempre que possvel. Tais resultados foram analisados com base nos

    conhecimentos tericos e semi-empricos.

    Em essncia, a proposta de pesquisa A dinmica ambiental do esturio

    do Rio Curu - CE: subsdios para o monitoramento e gerenciamento da rea de

    Proteo Ambiental tm como objetivo principal avaliar a interao dos processos

    costeiros e continentais no Esturio do Rio Curu para gerar informaes teis ao

    monitoramento e gesto ambiental da rea de Proteo Ambiental.

    Dessa forma, foram estabelecidos os seguintes objetivos especficos:

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Caracterizar a rea de estudo tomando como base a climatologia, geologia,

    geomorfologia e hidrologia;

    Avaliar e caracterizar as variaes sazonais da hidrologia e da hidrodinmica;

    Traar perfis e batimetria atual do esturio;

    Quantificar as alteraes sazonais no aporte de gua doce e material em

    suspenso para o sistema estuarino;

    Identificar os principais processos responsveis pela morfodinmica atual na

    desembocadura do rio;

    Contribuir com informaes teis sobre esturios costeiros tropicais.

    De um modo geral, a rea de estudo est inserida na Bacia Hidrogrfica

    do Rio Curu localizado na poro Noroeste do Estado do Cear, Nordeste do Brasil.

    O rio homnimo nasce na Serra do Machado, recebe influncia de tributrios da

    Serra de Uruburetama e da Serra de Baturit, percorrendo 195 km para desaguar no

    Oceano Atlntico, dando origem a um complexo sistema estuarino colonizado por

    mangue de pequeno a alto porte.

    O Esturio do Rio Curu localiza-se na divisa dos municpios de Paraipaba e Paracuru, a 85 km da cidade de Fortaleza (figura 01). A rea de estudo abrange

    1.607,39 hectares, sendo que 881,94 hectares (54,86%) pertencem rea de

    Proteo Ambiental (APA) do Esturio do Rio Curu que foi criada por meio do

    DECRETO de N 25.416, de 29 de maro de 1999.

    O acesso rodovirio da capital do Estado do Cear at a Sede Municipal

    de Paracuru feito pela Rodovia CE-085 e a seguir pela Rodovia CE-341.

    Posteriormente, o deslocamento at a rea de estudo se d por via pavimentada

    (asfalto e calamento) e no pavimentada (barro vermelho).

    Em sntese, a dissertao encontra-se dividido em sete captulos, a saber:

    o primeiro corresponde parte introdutria onde destacamos conceitos, informaes

    e alguns tipos de atividades que ocasionam modificaes no esturio, alm disso,

    exposto justificativa e os objetivos.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    No captulo posterior, retratado o referencial terico desta pesquisa,

    tomando como base os conceitos, delimitaes e/ou classificaes de zona costeira,

    bacia hidrogrfica, esturio, rea de Proteo Ambiental e gesto ambiental.

    O terceiro captulo relata de forma detalhada os procedimentos

    metodolgicos adotados para delimitao da rea de estudo, estabelecimento de

    locais de monitoramento e procedimentos adotados para coleta, anlise e integrao

    dos dados.

    No captulo subseqente, foi feita uma caracterizao geral, identificando

    os aspectos climticos (regional e local) atuantes. Alm disso, foi realizada uma

    abordagem sobre a geomorfologia, a geologia e a hidrologia.

    O quinto captulo sintetiza o comportamento das variaes longitudinais e

    verticais dos parmetros de salinidade e temperatura ao longo do esturio,

    procurando sempre que possvel relacionar tais resultados com os tipos de usos e

    ocupaes. Alm disso, relatado o processo de mistura e circulao do esturio.

    J no sexto captulo so retratadas as caractersticas morfolgicas, a

    quantificao de material em suspenso, a vazo de gua e a descarga de

    sedimentos em suspenso no sistema estuarino. A partir da, so apontados os

    principais processos atuantes na morfodinmica atual da desembocadura do rio.

    E finalmente, o stimo captulo que sintetiza de forma clara as concluses

    gerais obtidas na rea de estudo, elenca algumas informaes sobre esturios, e

    por fim, sugere nova delimitao para rea de Proteo Ambiental do Esturio do

    Rio Curu tomando como base os resultados obtidos durante o monitoramento

    realizado no ano de 2007.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Figura 01: Mapa de localizao da rea de estudo

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    2. REFERENCIAL TERICO

    2.1. Zona Costeira e Orla Martima

    A Lei Federal de n 7.661, de 16 de maio de 1998 institui o Plano

    Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC) que no seu art.2 pargrafo nico

    define a zona costeira como sendo espao geogrfico de interao do ar, do mar e

    da terra, incluindo seus recursos renovveis ou no, abrangendo uma faixa martima

    e outra terrestre.

    Na Resoluo n 005, de 03 de dezembro de 1997 que aprova o II Plano

    Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC II), alm de apresentar a mesma

    definio de zona costeira do PNGC, delimita e estabelece a rea de abrangncia

    em duas faixas (martima e terrestre).

    A faixa martima se estende mar a fora distando 12 milhas martimas

    (22,224 km) da linha de base1 estabelecidas de acordo com a Conveno das

    Naes Unidas sobre o Direito do Mar. E a faixa terrestre, sendo formada por

    municpios que sofrem influncia dos fenmenos ocorrentes na zona costeira.

    Portanto, o estabelecimento de municpios pertencentes zona costeira

    segue tais critrios abaixo:

    Os municpios defrontantes com o mar, assim considerado em listagem

    desta classe, estabelecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    (IBGE);

    Os municpios no defrontantes com o mar que se localizem nas regies

    metropolitanas litorneas;

    Os municpios contguos s grandes cidades e s capitais estaduais

    litorneas, que apresentam processo de conurbao;

    1 Linha de base no geral, corresponde a linha de baixa-mar do litoral brasileiro, conforme indicada nas cartas nuticas de grande escala. Alm disso, utilizado o mtodo de linhas de base retas estabelecidos pelo Decreto n 1.290 de 21de outubro de 1994.

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    Os municpios prximos ao litoral, at 50 km da linha de costa, que

    aloquem, em seu territrio atividades ou infra-estruturas de grande impacto

    ambiental sobre a zona costeira, ou ecossistemas costeiros de alta

    relevncia;

    Os municpios estuarinos-lagunares, mesmo que no diretamente

    defrontantes com o mar, dada a relevncia destes ambientes para a dinmica

    martimo-litornea; e

    Os municpios que, mesmo no defrontantes com o mar, tenham todos os

    seus limites estabelecidos com os municpios referidos nas alneas anteriores.

    Conforme o Diagnstico para a Gesto Integrada do Estado do Cear

    (2003), a zona costeira pode ser definida atravs do ponto de vista espacial e da

    gesto. O primeiro corresponde a uma estreita faixa de transio entre o continente

    e o oceano. E o segundo, consiste num palco onde se acentuam os conflitos de uso,

    se aceleram as perdas de recursos e se verificam os maiores impactos ambientais

    devido grande concentrao demogrfica e aos crescentes interesses econmicos

    e presses antrpicas

    Moraes (1999, p.19) diz que:

    A zona costeira, em relao ao conjunto de terras emersas, circunscreve um espao dotado de especificidades vantagens locacionais, um espao finito e relativamente escasso. Em outros termos, do ponto de vista global, os terrenos beira-mar constituem pequena frao dos estoques territoriais disponveis, e abrigam amplo conjunto de funes especializadas e quase exclusivas... A conjuno de tais caractersticas qualifica o espao litorneo como raro, e a localizao litornea como privilegiada, dotando a zona costeira de qualidades geogrficas particulares (MORAES, 1999, p.19).

    Considerando o contexto acima, principalmente, a Lei Federal de n

    7.661, de 16 de maio de 1998 e a Resoluo de n 005, de 03 de dezembro de

    1997, a definio da zona costeira vai alm da rea de contato entre o oceano e o

    continente, pois, apresenta uma importncia significativa no que se refere aos

    aspectos ambientais, econmicos e socioculturais.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    De acordo, com o Projeto ORLA (2002, p.25) a orla martima definida

    como unidade geogrfica inclusa na zona costeira, delimitada pela faixa de interface

    entre a terra firme e do mar. Sendo que os seus limites encontram-se delimitados

    em zona marinha e rea terrestre.

    A zona marinha corresponde a isbata de 10,00 metros (assinalada nas

    cartas nuticas) de profundidade na qual a ao das ondas passa a sofrer influncia

    da morfologia do fundo marinho, proporcionando o transporte de sedimentos.

    importante destacar que esse limite pode sofrer alteraes.

    A rea terrestre foi estabelecida em 50,00 metros para reas urbanas e

    200,00 m para reas no urbanizadas, demarcados na direo do continente a partir

    da linha de preamar ou do limite final dos ecossistemas. Alm disso, foram criados

    outros tipos de critrios para serem aplicados no litoral brasileiro:

    Nas falsias sedimentares, contar 50 metros a partir da borda da falsia;

    Nas lagunas e lagoas costeiras, contar 50 metros a partir da praia ou do

    limite superior da margem;

    Nas falsias e costes em rocha dura, o limite dever ser definido segundo

    o plano diretor do municpio, estabelecendo uma faixa de segurana de pelo

    menos 1 metro de altura acima da linha mxima de ao das ondas de

    tempestade;

    Nas reas inundveis, o limite ser definido pela cota de pelo menos 1

    metro de altura acima do limite da rea alcanada pela preamar de sizgia;

    Nas reas sujeitas eroso, com substratos sedimentares (como cordes

    litorneos, ilhas-barreira ou pontais, com larguras inferiores a 150 metros),

    bem como em reas prximas a desembocaduras fluviais, que correspondem

    a reas de alta instabilidade, deve ser executado um levantamento de

    eventos erosivos pretritos para a definio da extenso da faixa emersa da

    orla martima;

    Nos esturios, tomar o limite de 50 metros contados a partir do fim da praia

    ou da borda superior em ambas as margens e ao longo das mesmas, at

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    onde a penetrao da gua do mar seja identificada pela presena de

    salinidade mnima de 0,5.

    Tomando como base a contextualizao da orla martima, e sabendo que,

    a rea de estudo engloba diversas feies morfolgicas da plancie litornea, temos

    que: o limite da zona marinha estendeu-se at a isbata de -3,22 m de profundidade,

    e a rea terrestre (influncia salina no esturio) at 5,4 km (em linha reta) e 7,3 km

    (percurso do rio) demarcados em direo ao continente a partir da linha de preamar.

    importante destacar que devido necessidade de quantificar o que

    entra no sistema estuarino do Rio Curu, a rea de estudo teve como limite final a

    barragem localizada a 8,0 km (linha reta) e 11,5 km (percurso do rio) de distncia da

    foz. No captulo da metodologia do trabalho, tambm ser elencado os critrios para

    delimitao da rea de estudo.

    2.2. Bacia Hidrogrfica

    As bacias hidrogrficas correspondem a uma rea de captao natural da

    gua da precipitao que faz convergir os escoamentos para um nico ponto de

    sada, seu exutrio (SILVEIRA, 2004). Alm disso, o autor informa que:

    A bacia hidrogrfica pode ser considerada como um sistema fsico onde a entrada de gua precipitado e a sada o volume de gua escoado pelo exutrio, considerando-se como perdas intermedirias os volumes evaporados e transpirados e tambm os infiltrados profundamente (SILVEIRA, 2004, p.41).

    Alm disso, considerada como uma rea da superfcie terrestre que

    drena gua, sedimentos e materiais dissolvidos para uma sada comum (NETTO,

    1994, p. 97; CUNHA e GUERRA, 2006).

    Conforme Christofoletti (1974), a bacia hidrogrfica (BH) pode ser

    classificada de acordo com o escoamento global, a saber:

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Exorreicas - quando o escoamento das guas da bacia desemboca

    diretamente no mar ou no oceano;

    Endorreicas - quando as drenagens so internas e no possuem

    escoamento at o mar, desembocam em lagos ou dissipando-se nas areias

    do deserto, ou perdendo-se nas depresses crsicas;

    Arreicas - quando no h nenhuma estruturao em bacias hidrogrficas,

    como nas reas desrticas devido quase total ausncia de precipitao e

    constante formao de dunas;

    Criptorreicas - quando as bacias so subterrneas, como nas reas

    crsicas.

    A rigor, as bacias hidrogrficas integram uma viso conjunta do

    comportamento das condies naturais e das atividades humanas nelas

    desenvolvidas... (CUNHA e GUERRA, 2006, p.353).

    Sendo que, na maioria das vezes, as ocupaes inadequadas ocorridas

    no interior da bacia hidrogrfica (alto, mdio e/ou baixo curso) acarretam mudanas

    significativas nas caractersticas morfodinmicas, sedimentolgicas, hidrodinmicas

    e hidrolgicas dos rios. Tais mudanas, tambm podem afetar os esturios

    localizados no baixo curso do rio.

    2.3. Esturios

    2.3.1. Aspectos Conceituais

    Os oceangrafos, engenheiros, gegrafos e ecologistas, utilizam o termo

    esturio para indicar a regio interior de um ambiente costeiro, onde ocorre o

    encontro das guas fluviais com a do mar transportada pelas correntes de mar,

    estendendo-se rio acima at o limite da influncia da mar (MIRANDA, CASTRO e

    KJERFVE, 2002). Portanto, a palavra esturio pode ser definida de vrias formas,

    conforme o ponto de vista de cada rea de pesquisa e/ou de interesse.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Conforme Schmiegelow (2004, p.166):

    Os esturios podem ser definidos geograficamente, como uma regio costeira parcialmente fechada, onde a gua doce de um rio e a gua do mar encontram-se e se misturam. Tais regies esto normalmente sujeitas forte influncia da bacia de drenagem do rio e possuem, em regies equatoriais e tropicais, um tipo caracterstico de vegetao denominada manguezal (SCHMIEGELOW, 2004, p.166).

    Considerando o contexto acima, o Esturio do Rio Curu s enquadra-se

    nesse conceito apenas no perodo de chuva, cuja descarga de gua doce oriundo do

    continente contribui na diluio da gua salgada proveniente do oceano.

    Segundo Schmiegelow op.cit., o territrio brasileiro podemos encontrar as

    mais importantes espcies de vegetao, a saber: o mangue vermelho (Rhizophora

    mangle), a siriba (Avicennia schaueriana) e o mangue branco (Laguncularia

    racemosa).

    Da, o sistema estuarino assumir importncia bastante significativa no

    que se refere sedimentao. Dalrymple et al. (1992 apud MIRANDA, CASTRO e

    KJERFVE, 2002, p. 37) redefine o conceito:

    Esturio a parte voltada para o mar de um sistema de vales inundados, os quais recebem sedimentos de fontes fluviais e marinhas, contendo fcies influenciadas pela mar, onda e processos fluviais. Considera-se que o esturio se estende desde o limite interno das fcies de mar, at o limite ocenico das fcies costeiras na entrada (DALRYMPLE et al., 1992 apud MIRANDA, CASTRO e KJERFVE, 2002, p. 37).

    Dentre as importantes contribuies sobre o contexto mencionado,

    destacamos uma das definies considerada clssica de esturio proposta por

    Pritchard (1955) e Cameron & Pritchard (1963), onde:

    Esturio um corpo de gua costeira semifechado, com uma livre conexo com o oceano aberto, no interior a gua do mar mensuravelmente diluda pela gua doce oriunda da drenagem continental (PRITCHARD, 1955; CAMERON & PRITCHARD, 1963)

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    Neste caso, o balano de gua que chega ao sistema estuarino atravs

    da precipitao (P) e da descarga fluvial (Qf) devem ser maiores do que o volume de

    gua transferida para atmosfera por evaporao (E).

    Considerando tanto gnese geolgica quanto os processos regionais,

    Kjerfve (1987) definiu esturios como sendo: um ambiente costeiro que apresenta

    conexo restrita com o oceano adjacente. Tal conexo permanece aberta pelo

    menos intermitentemente. Na definio de Kjerfve op. cit., o ambiente estuarino foi

    subdividido em trs zonas distintas (figura 02):

    FIGURA 02: Disposio das zonas de mar do rio (ZR), de mistura (ZM) e costeira

    (ZC) no sistema estuarino.

    Fonte: Miranda, Castro e Kjerfve (2002, p.39) adaptada de Simpson (1997).

    Dessa forma, temos:

    Zona de Mar do Rio (ZR) - corresponde a parte fluvial com salinidade

    praticamente igual a zero, mas sujeita influncia marinha.

    Zona de Mistura (ZM) - corresponde regio onde ocorre a mistura da gua

    doce da drenagem continental com a gua do mar.

    Zona Costeira (ZC) - corresponde regio costeira adjacente que se estende

    at a frente da pluma estuarina que delimita a Camada Limite Costeira (CLC).

    importante destacar que o termo zona estuarina no utilizado apenas

    para indicar a definio de esturio, mas indicar todos os ambientes costeiros de

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    transio, com maior ou menor influncia da descarga fluvial e da mar

    (GEOPHYSICS STUDY COMMITTEE, 1997).

    2.3.2. Gnese dos Esturios

    Conforme Silva et al. (2004, p. 202) os:

    Esturios so encontrados ao redor do globo em qualquer condio de clima de mar, sendo mais bem desenvolvidos nas plancies costeiras das mdias latitudes, ao largo de plataformas continentais extensas que sofreram submerso em funo da elevao relativa do nvel do mar. A ltima transgresso marinha do Holoceno provocou a inundao dos vales fluviais, vales glaciais, fjordes, baas protegidas por barreiras arenosas, ou baas derivadas por eventos de subsidncia tectnica, dando origem maioria dos esturios atuais (SILVA et al., 2004, p. 202).

    A elevao relativa do nvel do mar esta associada s variaes do

    volume de gua nos oceanos (eustasia) e s mudanas do nvel dos continentes

    (isostasia e processos tectnicos). De fato, os esturios podem ser considerados

    como evidncia de submerso rpida ou de elevao do nvel do mar, de cujo efeito

    ainda no se recuperam at os dias atuais (SUGUIO, 2003, p. 261).

    As discusses sobre o perodo e a profundidade referente s variaes

    relativas do nvel do mar, apresentam estimativas variadas entre os autores

    estudados. Conforme Tessler e Mahiques (2003, p. 270):

    O ltimo evento glacial com alcance global teve seu mximo h cerca de 18.000 anos e que o aprisionamento de guas nas calotas levou o abaixamento do nvel do mar em at 160 metros. Isto significa que, durante o ltimo mximo glacial, quase todas as reas que formam as plataformas continentais atuais encontravam-se emersas, ou seja, submetidas a condies ambientais completamente diferentes das atuais (TESSLER E MAHIQUES, 2003, p. 270).

    No entanto, Miranda, Castro e Kjerfve (2002) dizem que o avano mximo

    ocorreu h cerca de 15.000 a 16.000 anos, quando o nvel encontrava-se

    aproximadamente 130 m abaixo do nvel atual.

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    Posteriormente, Miranda, Castro e Kjerfve op. cit. relatam que o

    aquecimento global ocasionou o degelo das calotas polares elevando o nvel do mar.

    Alm disso, os autores ressaltam que as plancies costeiras e vales dos rios foram

    gradativamente inundados, dando origem aos esturios, enseadas, baas e lagunas

    costeiras. Tal processo se deu na ltima transgresso marinha, conhecida tambm

    como transgresso Flandriana.

    Para Morais (2000, p.141):

    Os esturios e outras feies costeiras foram condicionados e tiveram seu controle sedimentar efetuado pelos processos hidrodinmico-sedimentares que ocorreram ao longo da transgresso holocnica ou transgresso flandriana que aconteceu por volta de 12 mil anos atrs (MORAIS, 2000, p. 141).

    Mesmo considerando essa abordagem sobre as oscilaes do nvel do

    mar, importante destacar que: uma vez atingindo o nvel do mar atual, suas

    variaes com escalas de tempo de segundos (ondas geradas pelo vento), horas

    (ondas geradas pela mar astronmica), dias (ondas geradas por influncia

    meteorolgicas), meses (meandros e vrtices das correntes ocenicas), anual

    (variaes sazonais nos processos de interao oceano-atmosfera, nvel esfrico do

    mar, ondas geradas pela mar astronmica), interanual (alteraes climticas

    geradas por processos globais do tipo El Nio) passaram a exercer influncia com

    diferentes intensidades sobre o comportamento hidrodinmico dos esturios

    (MIRANDA, CASTRO E KJERFVE, 2002).

    2.3.3. Aspectos Hidrolgicos e Hidrodinmicos

    Segundo Santos et al. (2001), levando em considerao o ponto de vista

    fsico, as variveis mais importantes no controle da gua nos esturios so as

    quantidades de mistura entre gua doce e salgada e a taxa na qual a mistura ocorre.

    Essas variveis esto diretamente relacionadas com a descarga fluvial, precipitao,

    evaporao, ao elica, amplitude das mars, topografia e o grau de turbulncia.

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    Considerando a definio clssica de Cameron & Pritchard (1963), o

    esturio pode ser classificado conforme o balano de gua que chega ao sistema

    estuarino. Portanto, a soma da precipitao (P) mais a contribuio da descarga

    fluvial (Qf) oriundo da bacia hidrogrfica devem ser maiores do que o volume de

    gua transferida para atmosfera por evaporao (E). Dessa forma, deve prevalecer

    a seguinte situao:

    P + Qf > E

    Os sistemas estuarinos que satisfazem essa equao so classificados

    como esturios positivos, porm, em alguns ambientes pertencentes s regies

    tropicais, comum encontrar a seguinte condio:

    P + Qf < E

    Sob essa condio, o sistema classificado como esturio negativo.

    Conforme Miranda, Castro e Kjerfve (2002), essa equao no estaria condizente

    com a de definio de Pritchard (1955) e Cameron & Pritchard (1963). Portanto, o

    esturio denominado de neutro quando a condio de transio entre os dois

    sistemas dada por:

    P + Qf = E

    Dessa forma, Miranda, Castro e Kjerfve op. cit. informa que a quantidade

    de gua recebida pela bacia hidrogrfica vai depender das condies climticas, das

    caractersticas do solo, da cobertura vegetal, da ocupao urbana, agrcola e

    industrial e da evapotranspirao na regio de captao e de suas interaes com

    outros fatores. Alm disso, os autores ressaltam que a ocupao das regies

    adjacentes aos esturios ocasionou alteraes drsticas na geometria e nas

    condies de drenagem dos rios devido construo de represas, barragens e

    canais, desmatamento, pavimentao e construo de estradas.

    De acordo com Suguio (2003, p. 262):

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    O ambiente estuarino caracteristicamente submetido influncia das mars. Quando as guas do mar (salgadas penetram) nos esturios tm-se a chamada de mar de salinidade, que se distingue da mar dinmica formada pela propagao de ondas de mar rio acima, sem invaso da gua salgada (SUGUIO, 2003, p. 262).

    Segundo Fidelman (1999), a existncia de barragens implica na

    passagem de um regime fluvial para uma zona de mar dinmica, modificando a

    passagem de um escoamento permanente a um movimento alternativo com

    perodos de imobilidade.

    2.3.4. Classificao Geomorfolgica e Aspectos Sedimentolgicos

    Conforme o tipo de geomorfologia, os esturios podem ser classificados

    em: plancie costeira, construdo por barra, fiorde e esturios formados por falhas

    tectnicas, erupes vulcnicas, tremores e deslizamentos de terra (PRITCHARD,

    1925 apud MIRANDA, CASTRO E KJERFVE et al., 2002). importante destacar

    que essa classificao apresenta restries de uso para rea de estudo, porm,

    algumas adaptaes foram feitas tomando como base as diferentes classificaes

    existentes na literatura referente geomorfologia de esturios.

    Alm disso, os esturios tambm podem ser classificados como

    dominados por rios, ondas ou mars de acordo com a influncia destes fatores

    sobre a distribuio e deposio de sedimentos de origem diferenciada (SILVA et al.,

    2004, p.204). Dessa forma, podemos dizer que os processos costeiros e

    continentais atuam de forma contnua na variao morfolgica da desembocadura

    do rio.

    Segundo Dias (2005), os ambientes estuarinos representam o principal

    meio atravs dos quais os sedimentos so transportados do continente para a

    plataforma continental e exercem influncia direta sobre a dinmica costeira.

    Portanto, Dyer et al. (1992) afirma que quantificar as trocas de gua e materiais

    atravs das desembocaduras fluviais constitui-se numa tarefa difcil, mas de

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    fundamental importncia para a compreenso do funcionamento tanto dos esturios

    como da zona costeira.

    Cerca de 70% a 90% dos sedimentos e outros materiais em suspenso

    so transportados pelos cursos dgua, em perodos de fortes precipitaes

    (CARVALHO, 1994 apud PINHEIRO, 2003). No caso do Estado do Cear, 100% do

    material transportado em suspenso ocorrem praticamente em trs meses (maro,

    abril, maio), devido s limitaes climticas nos outros meses do ano quando os rios

    no tm poder de escoamento prprio (PINHEIRO, 2003).

    A quantidade de sedimentos transportados pelos rios de fundamental

    importncia para o planejamento e aproveitamento dos recursos hdricos de uma

    regio, uma vez que os danos causados pelos sedimentos dependem da quantidade

    e da sua natureza, as quais por sua vez dependem dos processos de eroso,

    transporte e deposio (PAIVA, 2003).

    Sabendo que o transporte de sedimentos em cursos dgua se d atravs

    de duas formas: em suspenso e por fundo (salto, rolamento ou deslizamento).

    Temos que a quantidade total de sedimentos transportados por um curso dgua

    pode ser expressa como (PAIVA, op. cit.):

    = + +

    Onde, (Qst) a descarga total de sedimentos; (Qsf) a descarga de sedimentos transportados por arrasto de fundo; (Qss) descarga de sedimentos provenientes do fundo, transportada em suspenso e (Qsb) descarga de sedimento

    transportada em suspenso proveniente da bacia hidrogrfica.

    Considerando que a maior carga dos sedimentos transportados sempre

    em suspenso, representando cerca de 90% do total anual (CARVALHO, 2001 apud

    PINHEIRO, 2003). Portanto, ser considerado para esta pesquisa apenas o

    transporte de sedimentos em suspenso.

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    Para determinar a descarga de material em suspenso, depende apenas

    de duas grandezas para o seu clculo: concentrao mdia de sedimentos e vazo

    lquida.

    = ( )

    Onde, (QMES) a descarga de material em suspenso (mg/s); (U)

    velocidade mdia da corrente (m/s); (As) rea da seo (m2) e (CMES) concentrao

    de material em suspenso (mg/L).

    2.3.5. Classificao do Esturio por Estratificao de Salinidade

    Levando em considerao que um dos objetivos deste trabalho consiste

    em avaliar e caracterizar as variaes sazonais da hidrologia e da hidrodinmica ao

    longo da plancie estuarina, foi utilizada a classificao proposta por Pritchard (1955

    apud MIRANDA, CASTRO E KJERFVE et al., 2002).

    Tal mtodo permite estabelecer qualitativamente as principais

    caractersticas de circulao da zona de mistura. Dessa forma, temos os seguintes

    tipos de esturios: altamente estratificado ou cunha salina (tipo A); moderadamente

    ou parcialmente misturado (tipo B) e verticalmente bem misturado (tipos C e D).

    Os esturios altamente estratificados ou cunha salina (tipo A) so

    dominados pela descarga fluvial e pelo processo de entranhamento, apresentando

    duas camadas distintas devido salinidade das guas de superfcie ser menor que a

    salinidade das guas de fundo (figura 03). A mistura por difuso turbulenta

    considerada desprezvel neste tipo de esturio.

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    FIGURA 03: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo altamente estratificado

    ou cunha salina (tipo A).

    Fonte: Miranda, Castro e Kjerfve et al. (2002)

    No esturio moderadamente ou parcialmente misturado (tipo B) ocorre

    uma troca eficiente entre as guas do rio e a do oceano devido ao processo de

    difuso turbulenta. Apresentam estratificao vertical moderada de salinidade,

    normalmente sujeitos a ao dos ventos e mars moderadamente intensas (Figura

    04).

    FIGURA 04: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo moderadamente ou

    parcialmente misturado (tipo B).

    Fonte: Miranda, Castro e Kjerfve (2002).

    E por fim, os esturios do tipo verticalmente bem misturado (tipos C e D)

    que apresentam um perfil vertical homogneo, ou seja, a salinidade das guas

    superficiais no apresenta valores diferenciados e/ou significativos em relao

    30

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    salinidade das guas de fundo (figura 05). Mas ocorrem variaes quando

    analisamos o sistema estuarino lateralmente, sendo a salinidade mais alta na regio

    prxima ao oceano.

    FIGURA 05: Diagrama esquemtico de um esturio do tipo verticalmente bem

    misturado, mas com ligeira estratificao lateral (tipos C e D).

    Fonte: Miranda, Castro e Kjerfve (2002).

    A classificao de um esturio varia na direo longitudinal e tambm

    com o tempo (MIRANDA, CASTRO e KJERFVE, 2002, p.104). Alm disso, a autora

    ressalta que as diferenas topogrficas relacionadas com a largura, profundidade e

    tipo de fundo so tambm importantes para ocasionar mudanas na intensidade da

    circulao e dos processos de mistura.

    2.4. rea de Proteo Ambiental e Gesto Ambiental

    De acordo Cabral e Souza (2005, p. 46), a rea de Proteo Ambiental

    (APA) uma das categorias de unidades de conservao existentes no conjunto

    brasileiro de reas protegidas. Alm disso, as autoras ressaltam que as reas esto

    inseridas em grupo de uso sustentvel.

    A Lei n 9.985, de 18 de julho de 2000, dispe no captulo III art. 15 que a

    APA:

    uma rea em geral extensa, com um certo grau de ocupao humana, dotada de atributos abiticos, biticos, estticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar

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    das populaes humanas, e tem como objetivos bsicos proteger a diversidade biolgica, disciplinar o processo de ocupao e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (Lei n 9.985, de 18 de julho de 2000).

    Conforme Crte (1997) apud Cabral e Souza (2005, p. 46), a criao da

    APA no territrio nacional brasileiro tem sido utilizada com um instrumento de

    correo e conteno da degradao ambiental. Portanto, o fato de transformar uma

    rea em APA no suficiente para controlar o processo de degradao j iniciado,

    necessitando exercer sobre espao um conjunto de aes de planejamento e gesto

    ambiental.

    Dessa forma, a gesto ambiental pode ser entendida como o conjunto de

    aes encaminhadas para obter uma mxima racionalidade no processo de deciso

    relativo conservao, defesa, proteo e melhoria do meio ambiente (FOGLIATTI

    et al., 2004, p. 4).

    A Resoluo CONAMA n 306, de 5 de julho de 2002 no anexo I, define

    gesto ambiental como: conduo, direo e controle do uso dos recursos naturais,

    dos riscos ambientais e das emisses para o meio ambiente, por intermdio da

    implementao do sistema de gesto ambiental. Portanto, a gesto ambiental tem

    um importante papel no manejo e gerenciamento de reas de Proteo Ambiental.

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    3. METODOLOGIA

    O fluxograma metodolgico abaixo sintetiza os procedimentos adotados

    para o desenvolvimento e concretizao dos estudos na rea estuarina do Curu

    (figura 08). Para obteno de dados e concretizao dos resultados a metodologia

    encontra-se dividida em trs etapas: reconhecimento da rea de estudo; atividades

    de campo e anlises laboratoriais

    FIGURA 06: Fluxograma metodolgico

    Reconhecimento da

    rea de Estudo

    ESTURIO DO RIO CURU

    1

    Atividades de

    Campo

    2

    Anlises Laboratoriais

    3

    Levantamento bibliogrfico e cartogrfico Analise de imagens de satlites

    Analise de imagens areas Tcnicas de geoprocessamento

    Confeco de material cartogrfico Delimitao da rea de estudo

    Estabelecimento das estaes de monitoramento Estabelecimento de perfis de monitoramento

    Aspectos Hidrodinmicos

    Aspectos Sedimentolgicos

    Aspectos Morfodinmicos

    Medies de correntes Amplitude de mar Direo da onda Anemometria Medio de vazo

    Salinidade Densidade Temperatura Turbidez Transparncia da gua

    Georeferenciamento da foz Levantamento topogrfico Declividade da praia Perfil de praia Batimetria

    Coleta de gua na coluna dgua Coleta de sedimentos na faixa de praia

    Aspectos Hidrolgicos

    Gerao de informaes teis

    ao monitoramento e gesto ambiental da

    rea de Proteo Ambiental do

    Esturio do Rio Curu

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    3.1. Reconhecimento da rea de Estudo

    3.1.1. Levantamento Bibliogrfico e Cartogrfico

    Para a realizao desta pesquisa foram realizados os levantamentos

    bibliogrficos e cartogrficos nas seguintes instituies: Universidade Federal do

    Cear (UFC); Universidade Estadual do Cear (UECE); Programa de Ps-

    Graduao em Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio de Janeiro; Instituto

    de Cincias do Mar da UFC; Secretaria de Recursos Hdricos do Governo Estadual

    do Cear (SRH); Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS);

    Fundao Cearense de Meteorologia e Recursos Hdricos (FUNCEME);

    Superintendncia Estadual do Meio Ambiente (SEMACE); Instituto Brasileiro do

    Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA); Companhia de

    Gesto dos Recursos Hdricos (COGERH); Companhia de Pesquisa de Recursos

    Minerais (CPRM); Instituto Nacional de Pesquisas Hidrovirias (INPH) e Instituto

    Brasileiro de Pesquisas Espaciais (INPE).

    3.1.2. Geoprocessamento e Confeco de Material Cartogrfico

    Conforme o Instituto Brasileiro de Pesquisas Espaciais (INPE), o

    geoprocessamento consiste em um conjunto de tecnologias voltadas coleta e

    tratamento de informaes espaciais para um objetivo especfico.

    Portanto, as aplicaes das tcnicas de geoprocessamento

    possibilitaram, primeiramente, no conhecimento do arranjamento espacial da rea

    de estudo, e posteriormente, favoreceu na identificao e delimitao das principais

    feies morfolgicas georeferenciadas em escala de 1:25.000. Tais informaes

    foram dispostas na carta geolgica e geomorfolgica.

    importante ressaltar que a carta elaborada foi analisada e comparada

    com o material cartogrfico do Plano de Manejo da rea de Proteo Ambiental do

    Esturio do Rio Curu, e constatadas em campo.

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    Alm disso, foi feito uma base cartogrfica georreferenciada em escala de

    1:8.000 com o intuito de analisar o comportamento morfodinmico da

    desembocadura do rio Curu nos meses de janeiro, maro, maio, julho, setembro e

    novembro de 2007, e correlacion-lo com o principal processo atuante.

    Para elaborao do material cartogrfico foram utilizados os seguintes

    mapas, cartas e imagens:

    Mapas de levantamento de recursos naturais de escala 1:250.000 datadas de

    1981 (geolgico, geomorfolgico, exploratrio de solos, fitogeogrfico,

    capacidade de uso dos recursos naturais renovveis e potencial dos recursos

    hdricos);

    Carta So Luiz do Curu de escala 1:100.000 datada de 1969 com inclinao

    de 2047W que cresce 5 anual;

    Cartas (sistemas ambientais, vegetao e uso/ocupao da terra, unidades

    de interveno e ecodinmica da paisagem e zoneamento da unidade de

    conservao e do seu entorno) do Plano de Manejo da rea de Proteo

    Ambiental (APA) do Esturio do Rio Curu em escala de 1:30.000 de 2004;

    Composio colorida da imagem orbital fornecida pelo satlite Landsat 5 TM

    datada de 2001;

    Carta Batimtrica da Diretoria de Hidrografia e Navegao da Marinha do

    Brasil datada 2001;

    Imagem Landsat ETM WRS 217_062, datada agosto de 2002;

    Imagem SRTM_90 do Estado do Cear;

    Imagem orbital de resoluo 70 cm do tipo Quick Bird datada de setembro de

    2004.

    Foram elaborados overlays temticos a partir das imagens trabalhadas

    em meio digital com auxlio dos softwares ARCGIS 8 (estrutura de dados vetorial),

    Global Mapper 5 (estrutura de dados raster) e Surfer 8 (estrutura de dados vetorial).

    As informaes obtidas a partir da aplicao do geoprocessamento foram

    comparadas com os materiais cartogrficos citados acima e ratificados durante os

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    campos experimentais. importante destacar que os dados foram operados em

    Sistema de Informaes Geogrficas (SIG).

    Dessa forma, a rea de estudo dessa dissertao, compreende:

    A rea de Proteo Ambiental do Esturio do Rio Curu estabelecida atravs

    do Decreto N25.416, de 29 de maro de 1999 no seu Art. 1. Considerando

    apenas os pontos cardeais leste (municpio de Paracuru) e oeste (municpio

    de Paraipaba);

    Ao norte, a rea de estudo estendeu-se at a cota de -3,22 metros de

    profundidade (ao das ondas);

    Ao sul, o limite de monitoramento estendeu at a barragem de vertedouro

    localizada a 11,5 km da foz, de coordenadas geogrficas 487851 Longitude e

    9221088 Latitude. Tal critrio foi estabelecido por causa do local no

    apresentar nem influncia salina e nem mar dinmica. Dessa forma, ficou

    mais fcil de coletar e analisar os dados para obter informaes do que entra

    no sistema estuarino.

    Considerando as informaes acima, o local de estudo abriga certa

    diversidade de unidades geomorfolgicas em uma rea total de 1.607,39 hectares

    com permetro de 21.459,74 m.

    3.2. Atividades de Campo

    A obteno de dados em campo e a interpretao de informaes so de

    fundamental importncia para o conhecimento cientfico, pois trabalhar a teoria

    juntamente com a prtica consiste em compreender melhor como se d o

    funcionamento desse sistema estuarino, possibilitando um manejo adequado e uma

    delimitao correta do ecossistema.

    Sabendo que os esturios so ambientes de transio entre o continente

    e o oceano, onde rios encontram o mar, resultando da diluio mensurvel da gua

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    salgada (MIRANDA, CASTRO e KJERFVE, 2002, p.15). E que a ao das mars,

    ventos, ondas e a introduo de gua doce dos rios, produzem gradientes de

    densidade que determinam os processos de circulao estuarina. Alm disso, a

    circulao no interior do esturio tambm influenciada pelo tamanho e forma da

    bacia (SILVA et. al., 2004, p.201). Desta forma, esta pesquisa tambm se

    fundamenta em trabalhos experimentais.

    Considerando o comportamento climtico, a variao sazonal e a

    amplitude de mars (do tipo meso-mar) do Estado do Cear, optou-se realizar as

    atividades de campo levando em considerao as seguintes condies:

    Mars de sizgia (lua nova ou cheia);

    Fases: vazante e enchente;

    Perodo Chuvoso (janeiro a junho de 2007) e

    Perodo de Estiagem (julho a novembro de 2007).

    Dessa forma, ficou mais fcil de observar o funcionamento e o

    comportamento do sistema estuarino tanto no perodo chuvoso quanto de estiagem,

    correlacionando s informaes obtidas com os tipos de uso e ocupao do solo que

    ocorrem na rea de estudo.

    Todos os equipamentos utilizados durante as atividades experimentais

    foram disponibilizados pelo Laboratrio de Geologia e Geomorfologia Costeira e

    Ocenica (LGCO) da Universidade Estadual do Cear (UECE).

    Para melhor compreender os procedimentos realizados nesta etapa, as

    atividades de campo encontram-se subdividida em: processos hidrodinmicos e

    hidrolgicos, e por contexto morfodinmico e sedimentolgico.

    3.2.1. Processos Hidrodinmicos e Hidrolgicos

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Com o intuito de tornar representativos os estudos hidrodinmicos e

    hidrolgicos no esturio do rio Curu foram estabelecidas 11 estaes (quadro 01) e

    06 sees de monitoramento em uma extenso de aproximadamente 11,5 km (figura

    07). Na seo 6, onde no ocorre influncia da mar foram realizadas medies

    de descarga de gua doce, com o intuito de quantificar o que entra no sistema

    estuarino.

    Estaes Longitude (X) Latitude (Y) 01* 493659 9622804 02* 493175 9622984 03* 492272 9622776 04* 492294 9622876 05* 492313 9622999 06* 490755 9623338 07* 489704 9622603 08* 487999 9621895 09** 486339 9619580 10** 486322 9619572 11** 486311 9619566

    QUADRO 01: Coordenadas das estaes monitoradas em UTM. * Perodo monitorado nos meses de maro e novembro de 2007 em mar de sizgia.

    ** Perodo monitorado nos meses de janeiro, maro, maio, julho, setembro, novembro de

    2007 em mar de sizgia.

    A primeira atividade experimental no esturio foi realizada entre os dias

    19 e 21 de maro de 2007, e a segunda, foi entre os dias 23 a 25 de novembro de

    2007. Todas as sondagens ocorreram durante o ciclo de mar.

    Para o estabelecimento da distribuio espacial das estaes e das

    sees, foram levados em consideraes os seguintes critrios: largura e

    profundidade do canal; presena de bancos arenosos; rea de confluncia de

    drenagem; formato e margens do canal; influncia da mar e os locais que

    desenvolvem as atividades de carcinicultura.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    FIGURA 07: Mapa de localizao das clulas, estaes, perfis e sees monitorados no esturio do Rio Curu.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    As medies dos parmetros hidrodinmicos (direo e velocidade da

    corrente) foram realizadas em dois nveis de profundidade (superfcie e fundo)

    sempre que possvel. Os dados foram obtidos atravs do mini-correntmetro porttil

    da Sensordata a.s. modelo SD-6000/30 (figura 08). As direes utilizadas no

    presente trabalho foram relativas ao norte verdadeiro (geogrfico), com declinao

    magntica de 23,57 W conforme as informaes fornecidas atravs da Carta de

    So Luiz do Curu datada de 1969.

    FIGURA 08: Mini-correntmetro porttil da Sensordata a.s. modelo SD-6000/30.

    A partir da, foi possvel observar o comportamento das correntes no

    sistema estuarino durante as fases de enchente e vazante, tanto no perodo de

    chuva quanto de estiagem. Alm disso, foi determinada a vazo de cada seo a

    partir do produto entre a rea e a velocidade nas fases de mar.

    As oscilaes das mars na rea estuarina foram determinadas atravs

    da fixao de uma rgua durante as atividades experimentais. As leituras foram

    realizadas a cada quinze minutos durante o ciclo completo de mar. Desse modo,

    conseguimos determinar o retardo da mar em relao s estimativas feitas para o

    Terminal Porturio do Pecm e obter informaes mais seguras para correo da

    malha batimtrica.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    No que se refere ao perodo, altura e direo da onda nas proximidades

    da desembocadura do rio Curu, foram estabelecidas duas clulas para coleta de tais

    dados (figura 07). Sabendo que o perodo da onda corresponde ao tempo de

    passagem de duas cristas ou de duas cavas num determinado ponto em um

    intervalo de tempo fixo (Silva et al., 2004, p.183). Tais dados foram obtidos atravs

    da leitura do tempo de onze ondas consecutivas, medindo-se dez perodos com

    auxlio de um cronmetro.

    Para obteno da altura (distncia entre a crista e a cava da onda)

    utilizamos uma mira topogrfica posicionada na zona de espraiamento. J a direo

    da onda foi obtida atravs da bssola e da estao total.

    Para segurana e concretizao dos dados obtidos em campo efetuamos

    as analises das sries histricas das amplitudes de mars e das medies de ondas

    do Terminal Porturio do Pecm para fins de classificao regional.

    Os parmetros hidrolgicos (temperatura, densidade e salinidade) foram

    coletados atravs de uma perfilagem vertical da coluna dgua com o auxlio de uma

    sonda oceanogrfica da Sensordata a. c. (STD/CTD) de modelo 204 (figura 09).

    FIGURA 09: Sonda oceanogrfica da Sensordata a. c. (STD/CTD) de modelo 204.

  • QUINTELA, T. O. F. A Dinmica Ambiental do Esturio do Rio Curu - CE: Subsdios para o Monitoramento e Gerenciamento da rea de Proteo Ambiental.

    Atravs dos parmetros de salinidade, foi possvel classificar as guas

    em: doces (salinidade igual ou inferior a 0,5), salobras (salinidade superior a 0,5 e

    inferior a 30) e salinas (salinidade igual ou superior a 30). Alm de determinar as

    classes e os usos preponderantes do corpo de gua conforme os limites fornecidos

    pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente atravs da Resoluo CONAMA n. 357,

    de 17 de maro de 2005 (Quadro 02).

    QUADRO 02: Classificao das guas segundo suas classes e seus usos

    preponderantes.

    CLASSIFICAO CLASSE USOS PREPONDERANTES

    GUAS DOCES ( 0,5)

    Especial

    a) ao abastecimento para consumo humano, com desinfeco; b) preservao do equilbrio natural das comunidades aquticas; e, c) preservao dos ambientes aquticos em unidades de conservao de proteo integral.

    1

    a) ao abastecimento para consumo humano, aps tratamento simplificado; b) proteo das comunidades aquticas; c) recreao de contato primrio, tais como natao, esqui aqutico e mergulho, conforme Resoluo CONAMA n 274, de 2000; d) irrigao de hortalias que so consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoo de pelcula; e