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1 1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.1 - Objetivos dos Direitos Humanos A concepção atual de direitos humanos foi moldada ao longo dos anos a partir de ideias e pensamentos de diferentes povos, desenvolvendo-se através de diversas civilizações, mas que tinham em comum as mesmas necessidades: - Proteção contra o abuso do poder do Estado. - Garantia do respeito à dignidade humana. 1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.2 Primeiros Indícios Os primeiros indícios de reconhecimento de direitos do homem podem ser encontradas nas sociedades do antigo Egito e Mesopotâmia, três milênios antes de Cristo. Já nessa época, havia alguns mecanismos para proteção do indivíduo perante o poder do Estado. 1 - Direitos Humanos 1 –Origens - 1.3 - Código de Hamurábi Mas foi em 1690 a.C. que surgiu uma das primeiras e mais concretas manifestações do reconhecimento dos direitos humanos: Hamurabi, o então rei da Mesopotâmia, compilou um código escrito de leis. O Código de Hamurabi, talhado em pedra, é um dos conjuntos de leis escritas mais antigos já encontrados, e pode ter sido o primeiro a prever direitos comuns a todos os homens, tais como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade, a família e, principalmente, a supremacia das leis em relação aos governantes. Um tanto quanto radical, o Código de Hamurabi não tolerava desculpas ou explicações para erros ou falhas, sendo famoso pela rigorosa reciprocidade entre crimes previstos e penas cominadas (olho por olho, dente por dente). 1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.4 - Influências religiosas Os direitos do homem também sofreram a influência filosófico-religiosa das ideias de Zoroastro (Pérsia, século VII a.C), Confúcio (China, século VI a.C.) e Buda (índia, século V a.C.), sobre a igualdade de todos os homens e as necessidades de tolerância, respeito, generosidade e conduta correta tanto por parte dos indivíduos quanto de seus governantes. 1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.5 – Grécia Na Grécia, a partir do século V a.C., surgiam também vários estudos sobre a necessidade da igualdade e liberdade do homem, da participação política dos

Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

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Page 1: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

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1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.1 - Objetivos dos Direitos Humanos

A concepção atual de direitos humanos foi moldada ao longo dos anos a partir de ideias e

pensamentos de diferentes povos, desenvolvendo-se através de diversas civilizações, mas que tinham em

comum as mesmas necessidades:

- Proteção contra o abuso do poder do Estado.

- Garantia do respeito à dignidade humana.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.2 Primeiros Indícios

Os primeiros indícios de reconhecimento de direitos do homem podem ser encontradas nas

sociedades do antigo Egito e Mesopotâmia, três milênios antes de Cristo. Já nessa época, havia alguns

mecanismos para proteção do indivíduo perante o poder do Estado.

1 - Direitos Humanos 1 –Origens - 1.3 - Código de Hamurábi

Mas foi em 1690 a.C. que surgiu uma das primeiras e mais concretas manifestações do

reconhecimento dos direitos humanos: Hamurabi, o então rei da Mesopotâmia, compilou um código escrito de

leis.

O Código de Hamurabi, talhado em pedra, é um dos conjuntos de leis escritas mais antigos já

encontrados, e pode ter sido o primeiro a prever direitos comuns a todos os homens, tais como a vida, a

propriedade, a honra, a dignidade, a família e, principalmente, a supremacia das leis em relação aos

governantes.

Um tanto quanto radical, o Código de Hamurabi não tolerava desculpas ou explicações para erros ou falhas,

sendo famoso pela rigorosa reciprocidade entre crimes previstos e penas cominadas (olho por olho, dente por

dente).

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.4 - Influências religiosas

Os direitos do homem também sofreram a influência filosófico-religiosa das ideias de Zoroastro

(Pérsia, século VII a.C), Confúcio (China, século VI a.C.) e Buda (índia, século V a.C.), sobre a igualdade de

todos os homens e as necessidades de tolerância, respeito, generosidade e conduta correta tanto por parte

dos indivíduos quanto de seus governantes.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.5 – Grécia

Na Grécia, a partir do século V a.C., surgiam também vários estudos sobre a necessidade da

igualdade e liberdade do homem, da participação política dos cidadãos (república) e a existência de leis

naturais e superiores às leis escritas, válidas para todos os homens em todas as partes do mundo

(jusnaturalismo).

1 - Direitos Humanos 1 – Origens1.6 - Lei das Doze Tábuas

Outro marco para os direitos humanos é o surgimento da Lei das Doze Tábuas (450 a.C.), logo após a

queda da monarquia e o nascimento da república romana, e que pode ser considerada a origem dos textos

consagradores da liberdade, da propriedade e da proteção aos direitos do cidadão.

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A Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecim Tabularum ou simplesmente Duodecim Tabulae, em latim)

formava o cerne da constituição da República Romana e constituía a origem do direito romano. O texto

original das Doze Tábuas perdeu-se quando os gauleses incendiaram Roma em 390 a.C.

Embora seus originais tenham se perdido, historiadores reconstituíram parte de seu conteúdo com

base em fragmentos e citações de outros autores.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.7 - Cristianismo

O Cristianismo, pregado por Jesus Cristo no século I, na região da atual Palestina, foi rápida e

vigorosamente difundido.

Sua popularização também influenciou diretamente a consagração dos direitos humanos, posto que

defendia, entre outras coisas, a igualdade de todos os homens, independente de origem, raça, sexo ou credo,

o que era essencial à dignidade da pessoa humana.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.8 - Idade Média

Durante a Idade Média também ocorreram fatos importantes para o desenvolvimento dos direitos

humanos.

A Idade Média compreende o período que vai da desintegração do Império Romano do Ocidente

ocasionado pelas invasões bárbaras (476 d.C) até o fim do Imperio Romano do Oriente, com a Queda de

Constantinopla em 1453 (alguns historiadores consideram como marco final da Idade Média a descoberta da

América em 1492).

Para realmente compreender o desenrolar dos acontecimentos, é preciso entender como era a vida

naquela época: na Idade Média, caracterizada pelo feudalismo (organização em feudos), os direitos humanos

mais fundamentais eram permanentemente violados; havia uma rígida separação de classes, com a

consequente subordinação dos vassalos (trabalhadores camponeses / servos) para com seus suseranos

(senhores feudais, que tinham o domínio das terras).

Os vassalos, em troca de proteção contra invasões bárbaras e de uma pequena porção de terra para

obter seu sustento através da agricultura de subsistência, tinham de trabalhar as terras do senhor, pagar

impostos ao rei, dízimos à Igreja, além de uma infinidade de taxas em dinheiro ou produtos de suas colheitas

particulares, além de prestar serviços domésticos na casa ou castelo do suserano e lutar nas guerras quando

convocados. Era uma situação análoga à de escravos.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.9 - Magna Carta - 1215

Entretanto, no século XIII, começou na Inglaterra uma transformação. É na Inglaterra que encontramos

alguns dos marcos mais importantes relacionados ao surgimento dos direitos humanos.

Depois que o rei João I da Inglaterra (conhecido como João Sem-Terra, já que não herdou terras

quando da morte de seu pai) violou uma série de antigas leis e costumes através dos quais a Inglaterra tinha

sido governada, os barões ingleses o obrigaram a assinar, em 15 de julho de 1215, a Magna Carta (Magna

Charta Libertatum).

A Magna Carta, que resultou do desentendimento do rei com o papa e os barões ingleses, tinha por

objetivo limitar o poder monárquico, sendo um tratado de direitos, mas também de deveres do rei para com

os seus súditos.

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Entre suas disposições estava o direito da Igreja estar livre do controle governamental e interferências

do mesmo, os direitos de todos os cidadãos serem livres para possuir e herdar bens e serem protegidos de

impostos excessivos e até o direito das viúvas que possuíam propriedade de escolherem não se casar

novamente.

A Magna Carta estabeleceu ainda os princípios do devido ao processo legal e a igualdade de todos

perante a lei. Ela também continha disposições proibindo o suborno e a má conduta oficial.

Considera-se a Magna Carta o primeiro capítulo de um longo processo histórico que levaria ao

surgimento do constitucionalismo.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.10 - Petition of Right - 1628

Quatro séculos depois, novamente em resposta a uma série de violações da lei cometidas pelo rei da

Inglaterra, que desta vez era Carlos I, o Parlamento, em 1628, durante o período que antecedeu a guerra civil

inglesa, elaborou a Petition of Right (Petição de Direitos), uma declaração de liberdades civis, que foi um

marco registrado no desenvolvimento dos direitos humanos.

A Petition of Right foi baseada em estatutos e cartas anteriores e previa expressamente, entre outras

coisas, que:

- nenhum imposto poderia ser cobrado sem o consentimento do Parlamento;

- nenhuma pessoa poderia ser presa sem justa causa apresentada;

- a lei marcial (restritiva de direitos) não poderia ser utilizada em tempo de paz.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.11 - Habeas Corpus Act - 1679

Outro acontecimento ocorrido na Inglaterra e também de grande importância para o desenvolvimento

dos direitos humanos foi o surgimento do Habeas Corpus Act em 1679, que foi uma lei do Parlamento da

Inglaterra criada durante o reinado do Rei Charles II que buscava definir e reforçar o antigo e já existente

instituto do habeas corpus, como garantia da liberdade individual contra a prisão ilegal, abusiva ou arbitrária.

Obs.: O Habeas Corpus Act muitas vezes é erradamente descrito como a origem do recurso de

habeas corpus. Entretanto, o habeas corpus já existia na Inglaterra há pelo menos três séculos antes.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.12 - Bill of Rights - 1689

Dez anos depois, durante a Revolução Gloriosa, o rei da Inglaterra Jaime II foi deposto e o parlamento

ofereceu a coroa a Guilherme de Orange, com a condição de que se comprometesse a respeitar a declaração

de direitos (Bill of Rights) por eles produzida, e que determinava, entre outras coisas, os direitos à liberdade,

à vida e à propriedade privada e o pelo qual o rei ficava impedido de suspender a aplicação de leis, além de

não poder aumentar impostos e recrutar ou manter exércitos em épocas de paz sem sua autorização,

assegurando o poder do Parlamento na Inglaterra.

Apesar dos avanços em termos de declaração de direitos, a Bill of Rights não garantia a liberdade e

igualdade religiosa.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.13 - Act of Settlement - 1701

Também na Inglaterra, mais um documento pode ser citado como um dos antecedentes históricos dos

direitos humanos: o Act of Settlement (Ato de Estabelecimento), de 12 de junho de 1701, que foi criado para

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garantir a sucessão protestante (no sentido religioso) do trono inglês e o poder do parlamento.

Basicamente, reafirmou o princípio da legalidade ao exigir que os governantes também se

submetessem às leis, garantiu a independência e a autonomia dos órgãos jurisdicionais, colocando-os acima

da vontade livre da Coroa, e levantou a possibilidade de responsabilização política dos agentes públicos,

prevendo inclusive a possibilidade do impeachment.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.14 - As declarações norte-americanas

Algumas décadas depois, ainda no século XVIII, encontramos contribuições imprescindíveis ao

desenvolvimento dos direitos humanos no continente norte-americano:

Declaração de Direitos da Virgínia - 12 de junho de 1776 - Previa expressamente direitos humanos

fundamentais, tais como o direito à vida, à liberdade e à propriedade, além dos princípios da legalidade, do

devido processo legal, do juiz natural (segundo o qual deve haver regras objetivas de competência

jurisdicional, garantindo a independência e a imparcialidade do órgão julgador), da liberdade de imprensa e

ainda a liberdade religiosa.

Declaração de Independência dos Estados Unidos - 4 de julho de 1776 - A Declaração da

Independência dos Estados Unidos da América, que teve como principal articulador Thomas Jefferson, foi o

documento com o qual as Treze Colônias na América do Norte, revoltadas com os abusos da metrópole,

declararam sua independência do Reino Unido. A Declaração teve como tônica principal a limitação do poder

estatal.

Emendas à Constituição dos Estados Unidos da América – 1791 - Em 1787, foi discutida e

aprovada a primeira e única Constituição dos Estados Unidos, que prevê um sistema de alterações por meio

de Emendas (ao longo dos anos foram aprovadas apenas 27 emendas).

As 10 primeiras emendas, cujo texto não foi inserido na constituição original por não ter obtido

consenso, entraram em vigor em 1791 e ficaram conhecidas como Bill of Rights(Lista de Direitos), tendo

como aspecto primordial a limitação do poder estatal e o estabelecimento de vários direitos fundamentais.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.15 - Declaração dos Direitos Fundamentais do Homem e do

Cidadão

Mas foi na França que se deu a consagração do reconhecimento dos direitos fundamentais, com

a Declaração dos Direitos Fundamentais do Homem e do Cidadão, em 26/08/1789, que também previa,

em seu art. 16, que a adoção de garantias fundamentais seria um elemento fundamental ao próprio conceito

de constituição, dando um caráter constitucional aos direitos humanos fundamentais e influenciando sua

declaração expressa nas constituições seguintes.

1 - Direitos Humanos 1 - Origens1.16 - Século XIX

No decorrer do século XIX, ocorreu na Europa a efetivação dos direitos fundamentais por meio de

diplomas como:

- a Constituição Espanhola (19/03/1812);

- a Constituição Portuguesa (23/09/1822);

- a Constituição Belga (01/02/1831);

Em 1848, a França, mais uma vez, dá um passo à frente com a Declaração Francesa de 1848, que

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ampliou o rol dos direitos fundamentais, servindo de base para as constituições modernas.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.17 - Século XX

No Século XX, surgiram diplomas comprometidos com as causas sociais. Destacam-se

a Constituição Mexicana (1917), que garantia direitos trabalhistas e também direitos relativos à educação; e

ainda a Constituição de Weimar (1919), que previu direitos e deveres fundamentais dos Alemães, tais como

a inviolabilidade de correspondências, a liberdade de pensamento, a igualdade entre os sexos, a liberdade de

culto , alguns direitos especificamente direcionados à juventude e ainda um sistema de seguridade social.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.17 - Século XX

 Na então União Soviética, surgiram a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado

(1918) e, logo depois, a Lei Fundamental Soviética, que apesar de ter sido considerada retrógrada e

ditatorial em muitos aspectos (principalmente por abolir o direito de propriedade privada, sendo todas as

terras divididas entre os trabalhadores de forma igualitária e em usufruto, já que passaram a ser propriedade

do Estado), proclamou o princípio de igualdade, independente de raça ou nacionalidade.

1 - Direitos Humanos 1 – Origens - 1.17 - Século XX

Mesmo a Itália, que enfrentava um regime ditatorial (fascismo), contribuiu e trouxe um grande avanço

aos direitos humanos com a proclamação da Carta do Trabalho de 1927, que estabelecia direitos sociais

dos trabalhadores.

MARCO CONTEMPORÂNEO DOS DH

As violações generalizadas dos direitos e liberdades humanas na década de 1930, que culminaram

com as atrocidades da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945), marcaram o fim da noção de que os Estados

não tinham o dever de prestar contas a nenhuma outra instância a respeito da maneira como tratavam seus

cidadãos.

A assinatura da Carta das Nações Unidas em junho de 1945 levou os DH para a esfera do direito

internacional.

A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

Instituída em 1948 pela ONU. Tecnicamente, a DUDH é uma recomendação, que a Assembléia Geral

das Nações Unidas faz aos seus membros (Carta das Nações Unidas, artigo 10). H

Há dois Pactos que a implementam e são juridicamente vinculantes: Pacto Internacional sobre Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.

Juntos, estes três instrumentos costumam se chamar de Carta Internacional dos Direitos Humanos.

BRASIL

País-membro da ONU (24 de outubro de 1945).

A Constituição Brasileira de 1988 (Constituição Cidadã) introduz indiscutível avanço na consolidação

legislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteção de setores vulneráveis da sociedade brasileira.

Desde seu preâmbulo a Carta de 1988 projeta a construção de um Estado Democrático de Direito

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“destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem estar, o

desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e

sem preconceitos (…)”. J.J Canotilho.

Gerações de Direitos.

Os direitos de 1ª geração são os direitos e garantias individuais e políticos clássicos (liberdades

públicas: direito à vida, à liberdade, à expressão e à locomoção).

Os direitos de 2ª geração são os direitos sociais, econômicos e culturais (direito ao trabalho, ao

seguro social, à subsistência, amparo à doença, à velhice, entre outros).

Os direitos de 3ª geração, também chamados de solidariedade ou fraternidade, englobam um meio

ambiente ecologicamente equilibrado, a paz, uma qualidade de vida saudável, a autodeterminação dos

povos, além de outros direitos difusos.

Os direitos de 4ª geração, também chamados de direito dos povos, são provenientes da última fase da

estruturação do “Estado Social” (globalização do Estado Neoliberal), englobam o direito à democracia, à

informação, ao pluralismo, entre outros. Há quem entenda ser o direito vinculado a evolução da ciência

(genética, DNA, clonagem, biodireito, biotecnologia, entre outros).

Direitos Humanos: Coisa de Polícia

Treze reflexões sobre polícia e direitos humanos

Durante muitos anos o tema “Direitos Humanos” foi considerado antagônico ao de Segurança

Pública. Produto do autoritarismo vigente no país entre 1964 e 1984 e da manipulação, por ele, dos aparelhos

policiais, esse velho paradigma maniqueísta cindiu sociedade e  polícia, como se a última não fizesse parte

da primeira.

Polícia, então, foi uma atividade caracterizada pelos segmentos progressistas da sociedade, de forma

equivocadamente conceitual, como necessariamente afeta à repressão anti-democrática, à truculência, ao

conservadorismo. “Direitos Humanos” como militância, na outra ponta, passaram a ser vistos como

ideologicamente filiados à esquerda, durante toda a vigência da Guerra Fria (estranhamente, nos países do

“socialismo real”, eram vistos como uma arma retórica e organizacional do capitalismo). No Brasil, em

momento posterior da história, à partir da rearticulação democrática, agregou-se a seus ativistas a pecha de

“defensores de bandidos” e da impunidade.

Evidentemente, ambas visões estão fortemente equivocadas e prejudicadas pelo preconceito.

Estamos há mais de um década construindo uma nova democracia e essa paralisia de paradigmas

das “partes” (uma vez que assim ainda são vistas e assim se consideram), representa um forte impedimento

à parceria para a edificação de uma sociedade mais civilizada.

Aproximar a policia das ONGs que atuam com Di-reitos Humanos, e vice-versa, é tarefa

impostergável para que possamos viver, a médio prazo, em uma nação que respire “cultura de cidadania”.

Para que isso ocorra, é necessário que nós, lideranças do campo dos Direitos Humanos, desarmemos as

“minas ideológicas” das quais nos cercamos, em um primeiro momento, justificável , para nos defendermos

da polícia, e que agora nos impedem de aproximar-nos. O mesmo vale para a polícia.

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Podemos aprender muito uns com os outros, ao atuarmos como agentes defensores da mesma

democracia.

Nesse contexto, à partir de quase uma década de parceria no campo da educação para os direitos

humanos junto à policiais e das coisas que vi e aprendi com a polícia, é que gostaria de tecer as singelas

treze considerações a seguir:

CIDADANIA, DIMENSÃO PRIMEIRA

1ª - O policial é, antes de tudo um cidadão, e na cidadania deve nutrir sua razão de ser. Irmana-se,

assim, a todos os  membros da comunidade em direitos e deveres. Sua condição de cidadania é, portanto,

condição primeira, tornando-se bizarra qualquer reflexão fundada sobre suposta dualidade ou antagonismo

entre uma “sociedade civil” e outra “sociedade policial”. Essa afirmação é plenamente válida mesmo quando

se trata da Polícia Militar, que é um serviço público realizado na perspectiva de uma sociedade única, da qual

todos os segmentos estatais são derivados. Portanto não há, igualmente, uma “sociedade civil” e outra

“sociedade militar”. A “lógica” da Guerra Fria,  aliada aos “anos de chumbo”, no Brasil, é que se encarregou

de solidificar esses equívocos, tentando transformar a polícia, de um serviço à cidadania, em ferramenta para

enfrentamento do “inimigo interno”. Mesmo após o encerramento desses anos de paranóia, seqüelas

ideológicas persistem indevidamente, obstaculizando, em algumas áreas, a elucidação da real função policial.

POLICIAL: CIDADÃO QUALIFICADO

2ª - O agente de Segurança Pública é, contudo, um cidadão qualificado: emblematiza o Estado, em

seu contato mais imediato com a população. Sendo a autoridade mais comumente encontrada tem, portanto,

a missão de ser uma espécie de “porta voz” popular do conjunto de autoridades das diversas áreas do poder.

Além disso, porta a singular permissão para o uso da força e das armas, no âmbito da lei, o que lhe confere

natural e destacada autoridade para a construção social ou para sua devastação. O impacto sobre a vida de

indivíduos e comunidades, exercido por esse cidadão qualificado é, pois, sempre um impacto extremado e

simbolicamente referencial para o bem ou para o mal-estar da sociedade.

POLICIAL: PEDAGOGO DA CIDADANIA

3ª - Há, assim, uma dimensão pedagógica no agir policial que, como em outras profissões de suporte

público, antecede as próprias especificidades  de sua especialidade.

Os paradigmas contemporâneos na área da educação nos obrigam a repensar o agente educacional

de forma mais includente. No passado, esse papel estava reservado únicamente aos pais, professores e

especialistas em educação. Hoje é preciso incluir com primazia no rol pedagógico também outras profissões

irrecusavelmente formadoras de opinião: médicos, advogados, jornalistas e policiais, por exemplo.

O policial, assim, à luz desses paradigmas educacionais mais abrangentes, é um pleno e legitimo

educador. Essa dimensão é inabdicável e reveste de profunda nobreza a função policial, quando

conscientemente explicitada através de comportamentos e atitudes.

A IMPORTÂNCIA DA AUTO-ESTIMA PESSOAL E INSTITUCIONAL

4ª - O reconhecimento dessa “dimensão pedagógi-ca” é, seguramente, o caminho mais rápido e

eficaz para a reconquista da abalada auto-estima policial. Note-se que os vínculos de respeito e solidariedade

só podem constituir-se sobre uma boa base de auto-estima. A experiência primária do “querer-se bem” é

fundamental para possibilitar o conhecimento de como chegar a “querer bem o outro”. Não podemos viver

para fora o que não vivemos para dentro.

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Em nível pessoal, é fundamental que o cidadão policial sinta-se motivado e orgulhoso de sua

profissão. Isso só é alcançável à partir de um patamar de “sentido existen-cial”. Se a função policial for

esvaziada desse sentido, transformando o homem e a mulher que a exercem em meros cumpridores de

ordens sem um significado pessoalmente assumido como ideário, o resultado será uma auto-imagem

denegrida e uma baixa auto-estima.

Resgatar, pois, o pedagogo que há em cada policial, é permitir a ressignificação da importância social

da polícia, com a conseqüente consciência da nobreza e da dignidade dessa missão.

A elevação dos padrões de auto-estima pode ser o caminho mais seguro para uma boa prestação de

serviços.

Só respeita o outro aquele que se dá respeito a si mesmo.

POLÍCIA E ‘SUPEREGO’  SOCIAL

5ª - Essa “dimensão pedagógica”, evidentemente, não se confunde com “dimensão demagógica” e,

portanto, não exime a polícia de sua função técnica de intervir preventivamente no cotidiano e

repressivamente em momentos de crise, uma vez que democracia nenhuma se sustenta sem a contenção do

crime, sempre fundado sobre uma moralidade mal constituída  e hedonista, resultante de uma com-plexidade

causal que vai do social ao psicológico.

Assim como nas famílias é preciso, em “ocasiões extremas”, que o adulto sustente, sem vacilar,

limites que possam balizar moralmente a conduta de crianças e jovens, também em nível macro é necessário

que alguma instituição se encarregue da contenção da sociopatia.

A polícia é, portanto, uma espécie de superego social indispensável em culturas urbanas, complexas

e de interesses conflitantes, contenedora do óbvio caos a que estaríamos expostos na absurda hipótese de

sua inexistência. Possivelmente por isso não se conheça nenhuma sociedade contemporânea que não tenha

assentamento, entre outros, no poder da polícia. Zelar, pois, diligentemente, pela segurança pública, pelo

direito do cidadão de ir e vir, de não ser molestado, de não ser saqueado, de ter respeitada sua integridade

física e moral, é dever da polícia, um compromisso com o rol mais básico dos direitos humanos que devem

ser garantidos à imensa maioria de cidadãos hones-tos e trabalhadores.

Para isso é que a polícia recebe desses mesmos cidadãos a unção para o uso da força, quando

necessário.

RIGOR versus VIOLÊNCIA

6ª - O uso legítimo da força não se confunde, contudo, com truculência.

 A fronteira entre a força e a violência é delimi-tada, no campo formal, pela lei, no campo

racional pela necessidade técnica e, no campo moral, pelo antagonismo que deve reger a metodologia

de policiais e criminosos.

POLICIAL versus CRIMINOSO:

METODOLOGIAS ANTAGÔNICAS

7ª - Dessa forma, mesmo ao reprimir, o policial oferece uma visualização pedagógica, ao antagonizar-

se aos procedimentos do crime.

Em termos de inconsciente coletivo, o policial exerce função educativa arquetípica: deve ser “o

mocinho”, com procedimentos e atitudes coerentes com a “firmeza moralmente reta”, oposta radicalmente

aos desvios perversos do outro arquétipo que se lhe contrapõe: o bandido.

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Ao olhar para uns e outros, é preciso que a sociedade perceba claramente as diferenças

metodológicas ou a “confusão arquetípica” intensificará sua crise de moralidade, incrementando a ciranda da

violência. Isso significa que a violência policial é geradora de mais violência da qual, mui comumente, o

próprio policial torna-se a vítima.

Ao policial, portanto, não cabe ser cruel com os cruéis, vingativo contra os anti-sociais, hediondo com

os hediondos. Apenas estaria com isso, liberando, licenciando a sociedade para fazer o mesmo, à partir de

seu patamar de visibilidade moral. Não se ensina a respeitar desrespeitando, não se pode educar para

preservar a vida matando, não importa quem seja. O policial jamais pode esquecer que também o observa o

inconsciente coletivo.

A ‘VISIBILIDADE MORAL’ DA POLÍCIA: IMPORTÂNCIA DO EXEMPLO

8ª - Essa dimensão “testemunhal”, exemplar, peda-gógica, que o policial carrega irrecusavelmente é,

possivel-mente, mais marcante na vida da população do que a pró-pria intervenção do educador por ofício, o

professor.

Esse fenômeno ocorre devido à gravidade do mo-mento em que normalmente o policial encontra o

cidadão. À polícia recorre-se, como regra, em horas de fragilidade emocional, que deixam os indivíduos ou a

comunidade fortemente “abertos” ao impacto psicológico e moral da ação realizada.

Por essa razão é que uma intervenção incorreta funda marcas traumáticas por anos ou até pela vida

inteira, assim como a ação do “bom policial” será sempre lembrada com satisfação e conforto.

Curiosamente, um significativo número de policiais não consegue perceber com clareza a enorme

importância que têm para a sociedade, talvez por não haverem refletido suficientemente a respeito dessa

peculiaridade do impacto emocional do seu agir sobre a clientela. Justamente aí reside a maior força

pedagógica da polícia, a grande chave para a redescoberta de seu valor e o resgate de sua auto-estima.

É essa mesma “visibilidade moral” da polícia o mais forte argumento para convencê-la de sua

“responsabilidade paternal” (ainda que não paternalista) sobre a comunidade. Zelar pela ordem pública é,

assim, acima de tudo, dar exemplo de conduta fortemente baseada em princípios. Não há exceção quando

tratamos de princípios, mesmo quando está em questão a prisão, guarda e condução de malfeitores. Se o

policial é capaz de transigir nos seus princípios de civilidade, quando no contato com os sociopatas, abona a

violência, contamina-se com o que nega, conspurca a normalidade, confunde o imaginário popular e rebaixa-

se à igualdade de procedimentos com aqueles que combate.

Note-se que a perspectiva, aqui, não é refletir do ponto de vista da “defesa do bandido”, mas da

defesa da dignidade do policial.

A violência desequilibra e desumaniza o sujeito, não importa com que fins seja cometida, e não

restringe-se a áreas isoladas, mas, fatalmente, acaba por dominar-lhe toda a conduta. O violento se dá uma

perigosa permissão de exercício de pulsões negativas, que vazam gravemente sua censura moral e que,

inevitavelmente, vão alastrando-se em todas as direções de sua vida, de maneira incontrolável.

“ÉTICA” CORPORATIVA versus ÉTICA CIDADÃ

9ª - Essa consciência da auto-importância obriga o policial a abdicar de qualquer lógica corporativista.

Ter identidade com a polícia, amar a corporação da qual participa, coisas essas desejáveis, não se

podem confundir, em momento algum, com acobertar práticas abomináveis. Ao contrário, a verdadeira

identidade policial exige do sujeito um permanente zelo pela “limpeza” da instituição da qual participa.

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Um verdadeiro policial, ciente de seu valor social, será o primeiro interessado no “expurgo” dos maus

profissionais, dos corruptos, dos torturadores, dos psicopatas. Sabe que o lugar deles não é polícia, pois,

além do dano social que causam, prejudicam o equilíbrio psicológico de todo o conjunto da corporação e

inundam os meios de co-municação social com um marketing que denigre o esforço heróico de todos aqueles

outros que cumprem corretamente sua espinhosa missão. Por esse motivo, não está disposto a conceder-

lhes qualquer tipo de espaço.

Aqui, se antagoniza a “ética da corporação” (que na verdade é a negação de qualquer possibilidade

ética) com a ética da cidadania (aquela voltada à missão da polícia junto a seu cliente, o cidadão).

O acobertamento de práticas espúrias demonstra, ao contrário do que muitas vezes parece, o mais

absoluto desprezo pelas instituições policiais. Quem acoberta o espúrio permite que ele enxovalhe a imagem

do conjunto da instituição e mostra, dessa forma, não ter qualquer respeito pelo ambiente do qual faz parte.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO, PERMANÊNCIA E ACOMPANHAMENTO

10ª - Essa preocupação deve crescer à medida em que tenhamos clara a preferência da psicopatia

pelas profissões de poder. Política profissional, Forças Armadas, Comunicação Social, Direito, Medicina,

Magistério e Polícia são algumas das profissões de encantada predileção para os psicopatas, sempre em

busca do exercício livre e sem culpas de seu poder sobre outrem.

Profissões magníficas, de grande amplitude social, que agregam heróis e mesmo santos, são as

mesmas que atraem a escória, pelo alcance que têm, pelo poder que representam.

A permissão para o uso da força, das armas, do direito a decidir sobre a vida e a morte, exercem

irresistível atração à perversidade, ao delírio onipotente, à loucura articulada.

Os processos de seleção de policiais devem tornar-se cada vez mais rígidos no bloqueio à entrada

desse tipo de gente. Igualmente, é nefasta a falta de um maior acompanhamento psicológico aos policiais já

na ativa.

A polícia é chamada a cuidar dos piores dramas da população e nisso reside um componente

desequilibrador. Quem cuida da polícia?

Os governos, de maneira geral, estruturam pobremente os serviços de atendimento psicológico aos

policiais e aproveitam muito mal os policiais diplomados nas áreas de saúde mental.

Evidentemente, se os critérios de seleção e permanência devem tornar-se cada vez mais exigentes,

espera-se que o Estado cuide também de retribuir com salários cada vez mais dignos.

De qualquer forma, o zelo pelo respeito e a decência dos quadros policiais não cabe apenas ao

Estado mas aos próprios policiais, os maiores interessados em participarem de instituições livres de vícios,

valorizadas socialmente e detentoras de credibilidade histórica.

DIREITOS HUMANOS DOS POLICIAIS —HUMILHAÇÃO versus HIERARQUIA

11ª - O equilíbrio psicológico, tão indispensável na ação da polícia, passa também pela saúde

emocional da própria instituição. Mesmo que isso não se justifique, sabe-mos que policiais maltratados

internamente tendem a descontar sua agressividade sobre o cidadão.

Evidentemente, polícia não funciona sem hierarquia. Há, contudo, clara distinção entre hierarquia e

humilhação, entre ordem e perversidade.

Em muitas academias de polícia (é claro que não em todas) os policiais parecem ainda ser

“adestrados” para alguma suposta “guerra de guerrilhas”, sendo submetidos a toda ordem de maus-tratos

(beber sangue no pescoço da galinha, ficar em pé sobre formigueiro, ser “afogado” na lama por superior

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hierárquico, comer fezes, são só alguns dos recentes exemplos que tenho colecionado à partir da narrativa

de amigos policiais, em diversas partes do Brasil).

Por uma contaminação da ideologia militar (diga-se de passagem, presente não apenas nas PMs mas

também em muitas polícias civis), os futuros policiais são, muitas vezes, submetidos a violento estresse

psicológico, a fim de atiçar-lhes a raiva contra o “inimigo” (será, nesse caso, o cidadão?).

Essa permissividade na violação interna dos Direitos Humanos dos policiais pode dar guarida à ação

de personalidades sádicas e depravadas, que usam sua autoridade superior como cobertura para o exercício

de suas doenças.

Além disso, como os policiais não vão lutar na extinta guerra do Vietnã, mas atuar nas ruas das

cidades, esse tipo de “formação” (deformadora) representa uma perda de tempo, geradora apenas de

brutalidade, atraso técnico e incompetência.

A verdadeira hierarquia só pode ser exercida com base na lei e na lógica, longe, portanto, do

personalismo e do autoritarismo doentios.

 O respeito aos superiores não pode ser imposto na base da humilhação e do medo. Não pode haver

respeito unilateral, como não pode haver respeito sem admiração. Não podemos respeitar aqueles a quem

odiamos.

A hierarquia é fundamental para o bom funciona-mento da polícia, mas ela só pode ser

verdadeiramente al-cançada através do exercício da liderança dos superiores, o que pressupõe práticas

bilaterais de respeito, competência e seguimento de regras lógicas e suprapessoais.

DIREITOS HUMANOS DOS POLICIAIS —HUMILHAÇÃO versus HIERARQUIA

12ª - No extremo oposto, a debilidade hierárquica é também um mal. Pode passar uma imagem de

descaso e desordem no serviço público, além de enredar na malha confusa da burocracia toda a prática

policial.

A falta de uma Lei Orgânica Nacional para a polícia civil, por exemplo, pode propiciar um desvio

fragmentador dessa instituição, amparando uma tendência de definição de conduta, em alguns casos, pela

mera junção, em “colcha de retalhos”, do conjunto das práticas de suas delegacias.

Enquanto um melhor direcionamento não ocorre em plano nacional, é fundamental que os estados e

instituições da polícia civil  direcionem estrategicamente o processo de maneira a unificar sob regras claras a

conduta do conjunto de seus agentes, transcendendo a mera predisposição dos delegados localmente

responsáveis (e superando, assim, a “ordem” fragmentada, baseada na personificação). Além do conjunto da

sociedade, a própria polícia civil será altamente beneficiada, uma vez que regras objetivas para todos

(incluídas aí as condutas internas) só podem dar maior segurança e credibilidade aos que precisam executar

tão importante e ao mesmo tempo tão intrincado e difícil trabalho.

A FORMAÇÃO DOS POLICIAIS

13ª - A superação desses desvios poderia dar-se, ao menos em parte, pelo estabelecimento de um

“núcleo comum”, de conteúdos e metodologias na formação de ambas as polícias, que privilegiasse a

formação do juízo moral, as ciências humanísticas e a tecnologia como contraponto de eficácia à

incompetência da força bruta.

Aqui, deve-se ressaltar a importância das academias de Polícia Civil, das escolas formativas de

oficiais e soldados e dos institutos superiores de ensino e pesquisa, como bases para a construção da Polícia

Cidadã, seja através de suas intervenções junto aos policiais ingressantes, seja na qualificação daqueles que

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se encontram há mais tempo na ativa. Um bom currículo e professores habilitados não apenas nos

conhecimentos técnicos, mas igualmente nas artes didáticas e no relacionamento interpessoal, são

fundamentais para a geração de policiais que atuem com base na lei e na ordem hierárquica, mas também na

autonomia moral e intelectual. Do policial contem-porâneo, mesmo o de mais simples escalão, se exigirá,

cada vez mais, discernimento de valores éticos e condução rápi-da de processos de raciocínio na tomada de

decisões.

CONCLUSÃO

A polícia, como instituição de serviço à cidadania em uma de suas demandas mais básicas —

Segurança Pública — tem tudo para ser altamente respeitada e valorizada.

Para tanto, precisa resgatar a consciência da importância de seu papel social e, por conseguinte, a

auto-estima.

Esse caminho passa pela superação das seqüelas deixadas pelo período ditatorial: velhos ranços

psicopáticos, às vezes ainda abancados no poder, contaminação anacrônica pela ideologia militar da Guerra

Fria, crença de que a competência se alcança pela truculência e não pela técnica, maus-tratos internos a

policiais de escalões inferiores, corporativismo no acobertamento de práticas incompatíveis com a nobreza da

missão policial.

O processo de modernização democrática já está instaurado e conta com a parceria de organizações

como a Anistia Internacional (que, dentro e fora do Brasil, aliás, mantém um notável quadro de policiais a ela

filiados).

Dessa forma, o velho paradigma antagonista da Segurança Pública e dos Direitos Humanos precisa

ser subs-tituído por um novo, que exige desacomodação de ambos os campos: “Segurança

Pública com Direitos Humanos”.

O policial, pela natural autoridade moral que porta, tem o potencial de ser o mais marcante promotor

dos Direitos Humanos, revertendo o quadro de descrédito social e qualificando-se como um personagem

central da democracia. As organizações não-governamentais que ainda não descobriram a força e a

importância do policial como agente de transformação, devem abrir-se, urgentemente, a isso, sob pena de,

aferradas a velhos paradigmas, perderem o concurso da ação impactante desse ator social.

Direitos Humanos, cada vez mais, também é coisa de polícia!

APLICAÇÃO DO CONHECIMENTO EM DIREITOS HUMANOS PELOS OPERADORES DE

SEGURANÇA PÚBLICA OU ENCARREGADOS DE APLICAÇÃO DA LEI

" Os operadores diretos de Segurança Pública - policiais, bombeiros guardas municipais,

agentes penitenciários - são entes de tal importância para a manutenção de culturas democráticas de

direito, são agentes tão impactantes na consciência e também no inconsciente popular, que deles não

se pode pedir apenas que respeitam os direitos humanos (...) cabe-lhes, muito além, coprotagonizar

a promoção dos direitos humanos, cônscios de que são agentes proponentes de uma cultura moral,

balizadores imprescindíveis das condutas coletivas, contendedores de desvios individuais e grupais

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que atacam os direitos e garantias do conjunto da sociedade e das pessoas dos cidadãos. (...)

Precisamos intensificar esforços no sentido da construção de uma cultura permanente de direitos

humanos, justiça e paz. Não há outra forma de fazê-lo a não ser através da educação."

(Ricardo Balestreri)

Arcabouço jurídico

Direito internacional: conceito, fontes e responsabilidade dos Estados

Conceito

Evolução histórica da proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana é

conquista no sentido de limitar e controlar os abusos cometidos pelo Estado e de suas autoridades

constituídas em favor da pessoa humana. É uma idéia bastante antiga e que nos dias de hoje se

cristalizam em forma de tratados e instrumentos internacionais e mesmo de legislação nacional. É

nesse contexto que se tem usado o direito internacional de modo a aprimorar e fortalecer o grau de

proteção dos direitos consagrados.

A definição clássica de direito internacional, ou de uma maneira mais restrita, o direito

internacional público, consiste no corpo de regras que governam as relações entre os Estados, mas

compreende também nas normas relacionadas ao funcionamento de instituições ou organizações

internacionais, a relação entre elas e a relação delas com o Estado e os indivíduos. Regula muitos

aspectos das relações internacionais e inclui regras sobre os direitos territoriais dos Estados

(relativas a: terra, mar e espaço aéreo), proteção do meio ambiente, comércio internacional, uso de

força pelos Estados, o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito Internacional

Humanitário.

Como ensina MORAES (2000, p. 35), a necessidade primordial de proteção e

efetividade aos direitos humanos possibilitaram, em nível internacional, o surgimento de uma

disciplina autônoma ao direito internacional público, denominada Direito Internacional dos Direitos

Humanos, cuja finalidade precípua consiste na concretização da plena eficácia dos direitos humanos

fundamentais, por meio de normas gerais tuteladoras de bens da vida primordiais (vida, dignidade,

segurança, liberdade, honra, moral, dentre outros) e previsão de instrumentos políticos e jurídicos

de implementação dos mesmos.

É possível concluir que o Direito Internacional dos Direitos Humanos é um ramo do

direito internacional público, criado para proteger a vida, a saúde, e a dignidade dos indivíduos,

que você estudará e compreenderá no decorrer deste curso, bem como entenderá qual sua

relação com a atividade policial.

Fontes do direito internacional

MELO (2002, p. 113) explica que as fontes do direito internacional se constituem dos

modos pelos quais o direito se manifesta, isto é, as maneiras pelas quais surge a norma jurídica.

Atualmente utiliza-se como referência de fonte do direito internacional, o artigo 38, do

Estatuto da Corte Internacional de Justiça, estabelecida pela Carta das Nações Unidas como o

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principal órgão judiciário das Nações Unidas:

( http://www.unicrio.org.br/BibliotecaTextos.php?Texto=ESTATUTO %20DA CORTE.htm )

Artigo 38

A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as controvérsias que

lhe forem submetidas, aplicará:

a. As convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras

expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;

b. O costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o

direito;

c. Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas; e

d. Sob ressalva da disposição do artigo 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos

juristas mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das

regras de direito.

A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex

aeauo et Bono, se as partes com isto concordarem.

"Ex aequo et bono"

É expressão latina, comumente empregada na terminologia do direito para exprimir tudo o

que se faz ou se resolve, "segundo a equidade e o bem". Assim, decidir ou julgar ex aequo et bono,

quer significar decidir ou julgar por equidade.

Verifica-se que o costume e os tratados, para os funcionários encarregados pela

aplicação da lei, são sem dúvida as fontes mais importantes. Apesar disso, é útil mencionar fontes

subsidiárias de direito internacional, sem, contudo, entrar em detalhes sobre elas:

• Princípi

os gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas;

• Decisõ

es judiciais de cortes e tribunais internacionais;

• Ensina

mentos dos publicistas mais altamente qualificados das várias nações; e

• Resolu

ções da Assembléia Geral da ONU.

De acordo com ROVER (2005), a importância legal das resoluções da Assembléia Geral da

ONU é cada vez mais um assunto em debate. No que diz respeito ao funcionamento interno da

ONU, essas resoluções possuem efeito jurídico pleno. A questão que permanece, no entanto, é até

que ponto essas resoluções são legalmente obrigatórias aos Estados Membros, principalmente

àqueles que votaram contra as mesmas. Os critérios importantes para se determinar a

obrigatoriedade subsistem no grau de objetividade que cerca a adoção das resoluções e, até que

ponto, uma resolução pode ser considerada a expressão da consciência legal da humanidade como um

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todo. Esse último aspecto é ainda mais importante do que a maioria dos Estados simplesmente adotar

a resolução. As resoluções emanadas da Assembléia Geral estão recebendo um apoio cada vez maior

por parte de escritores e publicistas como um meio subsidiário para se determinar estados de direito.

Responsabilidade dos Estados

Uma vez que um Estado assume obrigações no âmbito da comunidade internacional, como

por exemplo, assinando e ratificando tratados, convenções e protocolos, isto, muitas vezes, significa

que concordou em cumprir suas obrigações de maneira específica, assegurando que seus

governos, suas constituições e suas leis os possibilita cumprir suas obrigações internacionais.

Frequentemente é esse o caso na área dos direitos humanos, onde os Estados assumiram a

responsabilidade de fazer com que certas condutas - tortura e genocídio - sejam consideradas

crimes, e de puni-las por meio de seus sistemas jurídicos nacionais.

Um Estado não pode alegar disposições em sua Constituição ou legislação nacional como

desculpa para furtar-se a cumprir suas obrigações perante o direito internacional.

No direito internacional, a responsabilidade surge a partir da violação de qualquer

obrigação devida sob ele mesmo. Assim, todo ato ilícito internacional por parte de um Estado

resulta na sua própria responsabilidade internacional. Isso é tido como real quando:

A conduta resultante de uma ação ou omissão é atribuível (imputável) ao Estado perante

o direito internacional; e

A conduta resulta na violação de uma obrigação internacional daquele Estado.

A responsabilidade existe nos casos onde o próprio Estado (Legislativo, Executivo,

Judiciário, Constitucional ou outra autoridade) é o perpetrador e em situações onde a conduta de

uma pessoa ou órgão pode ser imputada ao Estado. O Estado não é responsável perante o direito

internacional pela conduta de uma pessoa ou grupo de pessoas que não age em seu nome.

Quanto aos encarregados pela aplicação da lei, suas ações, quando executadas em

capacidade oficial, são imputáveis ao Estado e, consequentemente, são uma questão de

responsabilidade do mesmo.

É um princípio do direito internacional que qualquer inobservância ou violação de um

compromisso resulta na obrigação de fazer uma reparação.

A reparação deve, tanto quanto possível, eliminar todas as conseqüências do ato ilegal,

e restaurar a situação que teria existido, com toda a probabilidade, não fosse o ato cometido.

Direito Internacional Humanitário

Definição

O Direito Internacional Humanitário (DIH) é parte importante do direito internacional

público. É também conhecido pelo nome de Direito dos Conflitos Armados ou Direito da Guerra. É o

conjunto de normas cuja finalidade, em tempo de conflito armado, é de um lado, proteger as

pessoas que não participam, ou que deixaram de participar nas hostilidades e, por outro, limitar os

meios e métodos de fazer a guerra.

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Existe um conflito armado quando elementos de Forças Armadas adversárias

empreendem, intencionalmente, operações militares contra as Forças Armadas do Estado, atacando

objetivos no território ou em águas territoriais de outro Estado.

O DIH se aplica nas seguintes situações:

Conflito armado internacional: Conflito armado entre Estados, inclusive se não houver

sido declarada guerra formalmente ou mesmo se não há atividades militares;

A totalidade do território de um Estado ou parte dele tenha sido ocupada,

inclusive se não tiver havido resistência armada a essa ocupação;

Quando povos lutem contra a dominação colonial, contra ocupação estrangeira ou

contra regimes racistas, no exercício de seu direito à livre determinação; e

Conflito armado não-internacional: Conflito armado que se desenvolve dentro do

território de um Estado, e se as forças armadas de outro Estado não participam das operações

militares.

O DIH não se aplica às situações de violência menor, tais como supressão de

motins, reuniões violentas, passeatas, manifestações, desordens e atos isolados de violência

análogos. Esses podem ser caracterizados como distúrbios ou tensões internas. Nesses casos se

aplicará a legislação nacional do país em questão.

Por que o policial deve conhecer o Direito Internacional Humanitário (DIH) na

aplicação da lei?

De acordo com ROVER (2005, p. 149), as situações de conflito armado não surgem

espontaneamente. São resultantes da deterioração do estado da lei e da ordem em um país, pelos

quais as organizações de aplicação da lei possuem uma responsabilidade direta. Pela verdadeira

natureza de seus deveres, o envolvimento prático dos encarregados pela aplicação da lei, em casos

de manifestações de violência, distúrbios e tensões, que podem gerar uma guerra civil, requer deles

que sejam cuidadosos e capazes de integrar os princípios de DIH e direitos humanos em suas

operações e treinamento. Por essa razão, para o correto desempenho de sua atividade, certo nível de

conhecimento do Direito Internacional Humanitário (DIH) é indispensável a eles.

Embora a função de aplicação da lei possa ser temporariamente suspensa durante as

situações de conflito armado, a subsequente investigação de (graves) violações do Direito de Guerra,

naturalmente, abrangerá uma responsabilidade pela aplicação da lei. Isso pode ser tomado como uma

razão adicional pela qual os encarregados pela aplicação da lei precisam estar familiarizados com o

DIH.

Princípios básicos do direito humanitário

1. Trato humano e não-discriminação

Toda pessoa deve ser tratada com humanidade e sem discriminação (sexo,

nacionalidade, raça, crença religiosa ou política). Ex: Os que estão fora de combate (combatentes que

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se renderam, feridos, enfermos, náufragos, prisioneiros de guerra), detidos, pessoas civis, pessoal

sanitário e religioso.

2. Necessidade militar

Toda atividade de combate deve justificar-se por motivos militares. Estão proibidas as

atividades que não sejam militarmente necessárias. São aquelas que não são proibidas pelo direito

humanitário e necessárias para derrotar o inimigo. Deve ser analisada, juntamente, com os princípios

de distinção e proporcionalidade.

3. Limitação

As armas e os métodos de guerra que podem ser utilizados são limitados. Estão proibidas

as armas que causem sofrimentos desnecessários ou danos supérfluos. Ex.: Estão proibidas aquelas

que causem ferimentos de impossível tratamento ou que causem morte lenta e cruel.

4. Distinção

Deve-se distinguir entre combatentes e não-combatentes. Deve-se também distinguir entre

objetivos militares (que podem ser atacados) e bens de caráter civil (que não podem ser atacados).

5. Proporcionalidade

Quando são atacados objetivos militares, as pessoas civis e os bens de caráter civil devem

ser preservados o melhor possível de danos colaterais. Não devem ser excessivos os danos

colaterais com respeito à vantagem militar direta e concreta esperada de qualquer ataque contra um

objetivo militar.

6. Boa-fé

Deve prevalecer a boa-fé nas negociações entre as partes beligerantes (que fazem

guerra ou estão em guerra).

A essência do Direito de Guerra:

• Atacar

somente alvos militares;

• Poupa

r pessoas e objetos sujeitos à proteção que não contribuam para o esforço militar; e

• Não

usar mais força do que o necessário para cumprir sua missão militar.

Divisão do Direito Internacional Humanitário

O Direito Internacional Humanitário é dividido basicamente em duas categorias:

Direito de Genebra

Trata da proteção das vítimas de guerra, sejam elas militares ou civis, na água ou em terra.

Protege todas as pessoas fora de combate, isto é, que não participam ou não estão mais participando

nas hostilidades: os feridos, os doentes, os náufragos e os prisioneiros de guerra. As quatro

Convenções de Genebra, de 12 de Agosto de 1949, constituem o conjunto dessas normas de

proteção.

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O Brasil ratificou as quatro convenções em 29 de junho de 1957. As convenções foram

ampliadas e suplementadas pela adoção dos dois Protocolos Adicionais de 10 de junho de 1977. O

Brasil ratificou os dois Protocolos Adicionais em 5 de maio de 1992.

Direito de Haia

Preocupa-se mais com a regulamentação dos métodos e meios de combate, e concentra-

se na condução das operações militares. O Direito de Haia é, portanto, de interesse fundamental ao

comandante militar em terra, mar e ar.

São exemplos atuais do Direito de Haia e suas ratificações pelo Brasil:

• Conve

nção sobre a proibição do desenvolvimento, produção e destruição de armas biológicas e tóxicas

(1972) - Brasil: 27 de fevereiro de 1973;

• Conve

nção sobre proibições e restrições do emprego de certas armas convencionais que causam danos

excessivos (1980) - Brasil: 3 de outubro de 1995; e

• Conve

nção sobre a proibição do emprego, armazenamento, produção e

transferência de minas antipessoal e sua destruição (Tratado de Ottawa - 1997) -

Brasil: 30 de abril de 1999.

As Convenções de Genebra e os Protocolos Adicionais

• A

Primeira Convenção de Genebra visa melhorar a situação dos feridos e doentes das Forças

Armadas em campanha.

• A

Segunda Convenção de Genebra visa melhorar a situação dos feridos, doentes e náufragos das

Forças Armadas no mar.

• A

Terceira Convenção de Genebra é relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra.

• A

Quarta Convenção de Genebra protege a população civil em tempo de guerra.

• O

Protocolo I trata também dos conflitos armados internacionais, incluindo guerras de libertação nacional

e destina-se, particularmente, a assegurar a proteção de civis contra os efeitos das hostilidades.

• O

artigo 3o, comum as quatro convenções de 1949, tem sido chamado de uma «miniconvenção»» por

direito próprio, porque contém regras que são aplicáveis não só a conflitos internacionais, mas também

a conflitos internos. Atualmente, essas regras são consideradas como sendo regras do Direito

Internacional Consuetudinário, isto é, uma coisa à qual os beligerantes (fazem guerra ou estão na

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guerra) estão obrigados, independentemente das obrigações que eles possam ter em relação a

tratados. Elas representam um mínimo que tem de ser observado em todas as circunstâncias.

• O

Protocolo II, adicional às Convenções de Genebra, pode ser considerado como um desenvolvimento

do artigo 3o. Ele contém regras mais detalhadas aplicáveis no caso de um conflito armado interno.

• A

aplicação do DIH em tempo de conflito armado é necessária, pois:

Obriga juridicamente aos Estados e aos indivíduos nos Estados;

As graves violações do DIH são consideradas crimes de guerra que podem ser julgadas

perante tribunais, nacionais ou internacionais; e

Sua aplicação:

• Ressalt

a o profissionalismo dos integrantes das Forças Armadas;

• Reforç

a a moral e a disciplina;

• Tem o

apoio da população civil;

• Permit

e a reciprocidade, principalmente com relação a feridos, doentes e

prisioneiros de guerra;

• Melhor

ará as chances de uma paz sem ressentimentos;

• Logra

concentrar o esforço militar somente na derrota das Forças Armadas

inimigas; e,

• É uma

escolha política sensata.

(Para conhecer mais sobre o Direito Internacional Humanitário: página do Comitê Internacional da

Cruz Vermelha, (http://www.icrc.org/por).

Direito Internacional dos Direitos Humanos

Contexto e definição

De acordo com Rover (2005, p. 72), um direito é um título. É uma reivindicação que uma

pessoa pode fazer para com outra de maneira que, ao exercitar esse direito, não impeça que outrem

possa exercitar o seu. Assim sendo, os direitos humanos são títulos legais que toda pessoa possui

como ser humano. São universais e pertencem a todos, ricos ou pobres, homens ou mulheres.

Atualmente os direitos humanos são direitos legais, isto significa que fazem parte da

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legislação. Estão tanto nos instrumentos internacionais como também são protegidos pelas

constituições e legislações nacionais da maioria dos países do mundo.

Os princípios fundamentais que constituem a legislação moderna dos direitos humanos

têm existido ao longo da história. No entanto, foi somente no século XX que a comunidade

internacional se tornou consciente da necessidade de desenvolver padrões mínimos para o tratamento

de cidadãos pelos governos.

Conforme ensina MORAES (2000, p. 36), a evolução histórica da proteção dos direitos

humanos fundamentais em diplomas internacionais é relativamente recente, iniciando-se com

importantes declarações sem caráter vinculativo, para posteriormente, assumirem a forma de

tratados internacionais, no intuito de obrigarem os países signatários ao cumprimento de suas normas.

Parte do Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH):

“Reconhecimento da dignidade inerente e... direitos iguais e inalienáveis a todos os

membros da família humana constituem o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo... o

desconhecimento e o desprezo dos direitos humanos conduziram a atos de barbárie... é essencial a

proteção dos direitos do homem, através de um estado de direito, para que o homem não seja

compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão...”

Torna-se necessário contextualizar os direitos humanos para que se possa explicar o papel

que os encarregados pela aplicação da lei devem desempenhar para promover e proteger os direitos

humanos.

Os encarregados pela aplicação da lei devem ser levados a compreender como o Direito

Internacional dos Direitos Humanos afeta o desempenho individual de seu serviço. Isso, por sua

vez, requer explicações adicionais sobre as consequências das obrigações de um Estado perante o

direito internacional para a lei e práticas nacionais.

O direito conhecido por Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) consiste num

conjunto de princípios e regras, com base nas quais os indivíduos ou grupos de indivíduos podem

esperar uma certa qualidade de comportamento ou benefícios, da parte das autoridades, somente por

virtude de serem seres humanos.

A Carta Internacional dos Direitos Humanos

A Carta Internacional dos Direitos Humanos é o termo utilizado como uma referência

coletiva a três instrumentos importantes dos direitos do homem, a saber:

Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH) - Ratificada pelo Brasil em 10 de

dezembro de 1948;

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP) - Ratificado pelo Brasil em

24 de janeiro de 1992; e

Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) -

Ratificado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992.

Os seguintes tratados sobre direitos do homem são também importantes:

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Convenção sobre a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio - Ratificada pelo

Brasil em 6 de maio de 1952;

Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação

Racial - Ratificada pelo Brasil em 27 de março de 1968;

Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as

Mulheres - Ratificada pelo Brasil em 1o de fevereiro de 1984;

Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis. Desumanos ou

Degradantes - Ratificada pelo Brasil em 28 de setembro de 1989;

Convenção sobre os Direitos da Criança - Ratificada pelo Brasil em 24 de setembro de

1990;

Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados - Ratificada pelo Brasil em 28 de janeiro

de 1961; e

Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados - Ratificado pelo Brasil em 7 de agosto de

1972.

Para aprofundar os estudos, acessar esses e outros instrumentos internacionais nas

seguintes páginas eletrônicas:

http://www.onu-brasil.org.br/documentos.php

http://www2.camara.gov.br/comissoes/cdhm/instrumentos

http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sumario.htm

http://www.interlegis.gov.br/processo_legislativo/copy of 20020319150524/link.20

06-01-24.8149148319/

http://www.mi.gov.br/main.asp?Team=%7B73F2E3CA

%2D0CF1%2D4375%2DAAA0%2DD 31EDF33B616%7D

http://www2.mre.gov.br/dai/quadros.htm

Vários corpos estabelecidos sob os auspícios da Carta das Nações Unidas ou dos

principais tratados internacionais sobre direitos humanos constituem, no seu conjunto, um sistema

internacional de supervisão dos direitos humanos.

Os funcionários encarregados de aplicar as leis devem estar familiarizados com os

relevantes sistemas de tratados regionais sobre direitos humanos, a saber:

A Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos:

A Convenção Americana dos Direitos Humanos - Ratificada pelo Brasil em 25 de

setembro de 1992;

A Convenção Européia sobre a proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades

Fundamentais

Conclusão

Neste módulo, estudamos o direito internacional, Direito Internacional Humanitário (DIH)

Page 22: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

22

e Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH). O estudo desse conteúdo possibilitou a

compreensão da relação existente, e não excludente, entre direitos humanos e as atividades

realizadas pelos profissionais da área de Segurança Pública.

Premissas básicas na aplicação da lei

Aplicação da lei nos Estados Democráticos

Conceitos

Democracia

O termo "democracia" tem muitos significados e existem várias formas de governos

democráticos.

De acordo com Cees de ROVER (1998, p. 142), é difícil chegar a uma definição

satisfatória de "democracia". A tentativa de definir democracia, provavelmente, levará ao

estabelecimento de características de um regime democrático que possam ser consideradas

denominadores comuns independente do sistema vigente em determinado Estado. Essas

características incluem:

• Um

governo democraticamente eleito que represente o povo e seja responsável perante a ele;

• A

existência do estado de direito e o respeito por ele; e

• O

respeito pelos direitos humanos e liberdades.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 1o, estabelece

que o Estado Brasileiro constitui-se em Estado Democrático de Direito, tendo como fundamentos:

I. A

soberania;

II. A

cidadania;

III. A

dignidade da pessoa humana;

IV. Os

valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e

V. O

pluralismo político.

Acrescenta, ainda, em seu parágrafo único que:

Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou

diretamente, nos termos desta Constituição.

Da mesma forma que explicitado no artigo 21, da Declaração Universal dos Direitos

Page 23: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

23

Humanos (DUDH), que estipula que "a vontade do povo é a base da autoridade do governo..." e

complementa:

3. "(...) esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio

universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto."

1. Toda

pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de

representantes livremente escolhidos.

2. Toda

pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país."

Estado de direito

A existência do estado de direito e o respeito por ele origina uma situação onde os

direitos, liberdades, obrigações e deveres estão incorporados na lei para todos, em plena igualdade,

e com a garantia de que as pessoas serão tratadas, equitativamente, em circunstâncias similares.

(Cees de ROVER 1998, p. 143) Esse aspecto fundamental pode ser encontrado no artigo 26, do Pacto

Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que estipula que "todas as pessoas são iguais perante a

lei e têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei...", bem como no caput do artigo 5o,

da Constituição Federal:

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à

igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes".

Você pode perceber que esses ideais são interdependentes e fundamentais para que os

direitos humanos sejam mais bem protegidos pelo processo democrático e a aplicação da lei.

Democracia e direitos humanos caminham juntos. "Não há democracia sem direitos

humanos e não há direitos humanos sem democracia" (PIOVESAN, 2003). No caso do Brasil, a história

dos direitos humanos está diretamente vinculada com a história das constituições brasileiras.

Aplicação da lei

Na ação global do Estado para a realização da lei, existe um conjunto de instituições

públicas encarregadas com diferentes funções com esse propósito comum, ocupando-se dela, em

particular de tornar realidade o direito no campo da ordem e a Segurança Pública, conforme ensina

Andrés Domingues Vial (1996,36).

Em um Estado Democrático de Direito, o conceito de ordem e Segurança Pública tem sua

origem nos fundamentos da democracia e recebem dos órgãos encarregados pela aplicação da lei, o

conteúdo substantivo de sua missão, o que não implica, por sua vez, que não tenha autonomia

ideológica para defini-la e tampouco lhes corresponde invadir esferas de ação que não são próprias

desses órgãos do Estado.

É importante saber, que os órgãos que aplicam a lei recebem seus poderes dos órgãos

Page 24: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

24

próprios ao Estado Democrático de Direito - Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário - para garantia

da ordem e a Segurança Pública, tal como surgem das bases da institucionalização da democracia,

desenvolvendo as políticas de justiça para a aplicação da lei que é definida por quem representa a

vontade do povo. É requisito essencial, no Estado Democrático de Direito, que os órgãos

encarregados pela aplicação da lei prestem contas de seus serviços prestados à comunidade,

direta ou indiretamente, através de seus representantes.

Conduta ética e legal pela aplicação da lei

Qual a conduta ética e legal a adotar para cumprir nosso papel de encarregados de

aplicação da lei?

O ambiente social global está em constante mutação e exige cada vez mais dos

Estados, suas instituições e seus funcionários. As pessoas não esperam apenas que o Estado

disponibilize os melhores serviços, mas aguardam também que a conduta de suas instituições e seus

funcionários seja ética e responsável.

Não basta fazer as coisas bem, é fundamental fazê-las da forma correta. A forma como

os funcionários efetuam o seu trabalho é tão importante como o trabalho em si. É fundamental que

sua conduta seja íntegra e em conformidade com as leis e os regulamentos que regem as suas

atividades.

Na atividade dos órgãos encarregados pela aplicação da lei essa questão deve ser

tratada com especial distinção, pois, seus Funcionários Encarregados pela Aplicação da Lei

(FEAL) possuem, com exclusividade, as faculdades profissionais para privar uma pessoa de

liberdade ou, até mesmo, usar a força e arma de fogo contra um cidadão.

O emprego desses poderes deve ajustar-se aos princípios de legalidade, necessidade e

proporcionalidade. Porém, esses três conceitos podem ser interpretados subjetivamente, como

por exemplo:

• No

caso da legalidade, não é só importante a lei, mas também saber seu espírito, cabendo ao FEAL

aplicar o poder discricionário.

• Na

hipótese de recorrer à força, o grau a ser empregado (proporcionalidade) em uma determinada

situação depende de uma avaliação subjetiva dessa necessidade.

Essa avaliação subjetiva, por sua vez, não pode depender somente de uma noção pessoal

de ética, mas sim de uma ética profissional. Quando se busca um médico ou um advogado está se

manifestando confiança nessa pessoa. O mesmo acontece quando os cidadãos necessitam da ajuda

de um FEAL. Esperam, dentre outras coisas, que se guarde a confidencialidade da informação e

proteção.

Para auxiliar nessa tarefa é que existem códigos, princípios, guias e manuais que

Page 25: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

25

orientam a conduta desses profissionais. Alguns deles você estudará a seguir.

Código de Conduta das Nações Unidas para os funcionários responsáveis pela

aplicação da lei

As pessoas confiam na existência de uma deontologia profissional e, neste contexto, o

que mais se destaca é o Código de Conduta das Nações Unidas) para os funcionários

responsáveis pela aplicação da lei.

Esse instrumento foi adotado por intermédio da Resolução n° 34/169, de 17 de

dezembro de 1979, da Assembléia Geral das Nações Unidas.

Por meio dessa resolução, o código de conduta foi transmitido aos governos com a

recomendação de que uma consideração favorável fosse dada à sua utilização, dentro da estrutura da

legislação ou prática nacional como um conjunto de princípios a ser observado pelos funcionários

responsáveis pela aplicação da lei. Não é um tratado, mas pertence à categoria dos instrumentos que

proporcionam normas orientadoras aos governos sobre questões relacionadas com direitos humanos

e justiça criminal.

É importante notar que, como foi reconhecido por aqueles que elaboraram o código, esses

padrões de conduta deixam de ter valor prático a não ser que o seu conteúdo e significado, através de

educação, treinamento e acompanhamento, passem a fazer parte da crença de cada indivíduo

encarregado pela aplicação da lei.

O código consiste em oito artigos, acompanhados por seus respectivos

comentários explicativos. Acompanhe-os a partir de agora:

O artigo 1o estipula que "os encarregados pela aplicação da lei devem sempre

cumprir o dever que a lei lhes impõe..."

Nos parágrafos a. e b., dos comentários do artigo 1o, a seguinte definição é fornecida:

a. O termo 'funcionários encarregados pela aplicação da lei' inclui todas as

autoridades legais, tanto nomeadas quanto eleitas, que exercem poderes policiais,

especialmente poderes de prisão e de detenção.

b. Nos países onde os poderes policiais são exercidos por autoridades militares,

quer estejam uniformizadas ou quer não, ou por forças de segurança do Estado, a

definição de funcionários encarregados pela aplicação da lei deve ser considerada

incluindo as autoridades desses tais serviços."

O artigo 2o requer que os encarregados pela aplicação da lei, no cumprimento do dever,

respeitem e protejam a dignidade humana, mantenham e defendam os direitos humanos de

todas as pessoas.

O artigo 3o fornece normas sobre o uso da força, nos seguintes termos: "Os funcionários

encarregados pela aplicação da lei podem fazer uso da força quando estritamente necessário

e até a extensão requerida para o cumprimento de seu dever".

O parágrafo a., dos comentários desse artigo, estabelece que o uso da força policial

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26

deveria ser excepcional e que, enquanto a polícia faz uso de uma tal força dentro do razoavelmente

necessário, para a prevenção do crime, a realização ou para a assistência à detenção legítima de

delinqüentes ou de cidadãos suspeitos, nenhuma outra força além dessa pode ser usada.

O parágrafo b. destaca que a lei nacional, normalmente, restringe o uso da força policial

de acordo com o princípio da proporcionalidade, e afirma que deve ser entendido que tais princípios

nacionais de proporcionalidade devem ser respeitados na interpretação daquele artigo.

O parágrafo c. dá ênfase ao uso de armas de fogo, o qual é considerado como sendo uma

medida extrema e que qualquer esforço deveria ser feito para proibir seu uso, especialmente contra

crianças. Ele estabelece que, em geral, as armas de fogo não deveriam ser usadas, a não ser quando

um cidadão suspeito oferece uma resistência armada ou, ainda, coloca em risco a vida de outras

pessoas, e que medidas menos extremas não são suficientes para detê-lo ou apreendê-lo. O mesmo

parágrafo obriga a rápida apresentação de um relatório às autoridades competentes cada vez que uma

arma de fogo é utilizada pela polícia.

As normas sobre o uso da força pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei,

incorporadas no artigo e no comentário, reiteram a importância dos princípios de proporcionalidade

(a força sendo usada somente até a necessária extensão) e da necessidade (a força sendo usada

somente quando é estritamente necessária).

Parágrafos do artigo 3o:

O primeiro parágrafo do comentário do artigo põe em evidência as razões para as quais

o uso da força é considerado necessário - na prevenção do crime e no exercício dos poderes legais

de apreensão, porém, o termo "razoavelmente necessário", utilizado no parágrafo, parece abrandar

um pouco o termo "estritamente necessário", utilizado no próprio artigo (e, da mesma maneira, o

termo "absolutamente necessário", utilizado no artigo 22, da Convenção Européia sobre os Direitos

Humanos). A diferença é provavelmente atribuída a falta de cuidado na redação do instrumento

legal, pois é claro que a norma se apoia na noção de "estrita" ou "absoluta" necessidade.

O terceiro parágrafo do comentário exclui a utilização das armas de fogo por qualquer

outra razão que não seja a legítima defesa. O significado da exigência, como expressa naquele

parágrafo, pela qual um relatório deve ser apresentado quando uma arma de fogo é disparada por

um policial, é parte do processo para assegurar uma responsabilidade efetiva da polícia para com

seus atos. Não se trata de uma mera formalidade. É de fato um elemento importante na

investigação obrigatória que segue uma morte causada por uma autoridade policial, e pode agir

como uma dissuasão contra o uso ilegítimo de armas de fogo pela polícia.

Como se verifica, o poder do uso da força e o emprego de armas de fogo pelos FEAL têm

implicações de grande alcance e profundidade e, por essa razão, foi elaborado um instrumento

internacional específico que estabelece princípios para seu emprego. Esse documento denominado

Princípios Básicos sobre o uso da Força e Armas de Fogo foi adotado pelo Oitavo Congresso das

Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento de Infratores, em 7 de setembro de 1990.

Page 27: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

27

O artigo 4o estipula que os assuntos de natureza confidencial em poder dos

encarregados pela aplicação da lei devem ser mantidos confidenciais, a não ser que o cumprimento do

dever ou a necessidade de justiça exijam estritamente o contrário.

Em relação a esse artigo, é importante reconhecer o fato de que, devido à natureza das

suas funções, os encarregados pela aplicação da lei se vêem em uma posição na qual podem obter

informações relacionadas à vida particular de outras pessoas, que podem ser prejudiciais aos

interesses ou reputação delas. A divulgação dessas informações só pode ser feita com o fim de suprir

as necessidades da Justiça ou o cumprimento do dever. Fora disso, é imprópria, e os encarregados

pela aplicação da lei devem abster-se de fazê-lo.

O artigo 5o reitera a proibição da tortura ou outro tratamento ou pena cruel, desumano

ou degradante.

O artigo 6o diz respeito ao dever de cuidar e proteger a saúde das pessoas privadas da

sua liberdade.

O artigo 7° proíbe os encarregados pela aplicação da lei de cometer qualquer ato de

corrupção. Também devem opor-se e combater rigorosamente esses atos.

O artigo 8o trata da disposição final aconselhando os encarregados pela aplicação da lei a

respeitar a lei e o código. Os encarregados pela aplicação da lei são incitados a prevenir e se opor a

quaisquer violações da lei e do código. Em casos onde a violação do código é (ou está para ser)

cometida, os encarregados pela aplicação da lei devem comunicar o fato aos seus superiores e, se

necessário, a outras autoridades apropriadas ou organismos com poderes de revisão ou reparação.

Princípios orientadores para a aplicação efetiva do Código de Conduta para os

funcionários responsáveis pela aplicação da lei

Com o objetivo de promover a aplicação do citado código de conduta, o Conselho

Econômico e Social das Nações Unidas, em 24 de maio de 1989, por ocasião de sua 15a sessão

plenária, adotou os Princípios orientadores para a aplicação efetiva do Código de Conduta para os

funcionários responsáveis pela aplicação da lei, que prevê uma série de providências.

Íntegra dos Princípios orientadores para a aplicação efetiva do Código de Conduta para

os FEAL: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/ajus/prev19.htm

Providências

"A. Princípios gerais

1. Os princípios consagrados no código deverão ser incorporados na legislação e práticas

nacionaisf...]

4. Os governos devem adotar as medidas necessárias para que os funcionários responsáveis pela

aplicação da lei recebam instrução, no âmbito da formação de base e de todos os cursos posteriores de

formação e de aperfeiçoamento, sobre disposições da legislação nacional relativas ao código, assim como

outros textos básicos sobre a questão dos direitos do homem [...]

B. Questões específicas

2. Remun

eração e condições de trabalho. Todos funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem ser

satisfatoriamente remunerados e beneficiados de condições de trabalho adequadas[...]

Page 28: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

28

3. Discipli

na e supervisão. Devem ser estabelecidos mecanismos eficazes para assegurar a disciplina interna e o controle

externo, assim como a supervisão dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei [...]

II. Implementação do código

A. A nível nacional

1. O código deve estar à disposição de todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei e

das autoridades competentes na sua própria língua [...]

B. A nível internacional

1. Os governos devem informar o secretário-geral, em intervalos apropriados de, pelo menos, cinco

anos, sobre os progressos na implementação do código ...]"

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha tem contribuído, significativamente, com a difusão dessas

normas, através da capacitação de profissionais de várias forças policiais e de segurança pelo mundo e, mais

recentemente, com o trabalho de integração das Normas Internacionais de Direitos Humanos aplicáveis às Funções

Policiais, nas matrizes curriculares de cursos de formação, na área de treinamento e na área de doutrina policial de

algumas polícias no Brasil e outros paises latino-americanos, com os quais firmou convênio para esse fim.

Conheça o "Guia de Direitos Humanos - Conduta ética. técnica e legal para

instituições policiais militares":

http://www.mi.gov.br/sedh/popc/publicacoes/f_dh_policia.pdf publicação da Secretaria Nacional

dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça.

Conclusão

Foram estudados os aspectos legais, morais e éticos da profissão sob pena de cometer

desvios de conduta e abusos nos poderes que nos foram conferidos para atuação em defesa da

sociedade.

Tivemos oportunidade de verificar que existem normas internacionais e legislação

nacional própria que dizem respeito ao tema e dão uma excelente orientação para a conduta a ser

adotada. Entretanto, não basta somente ter a base legal para que isso se reflita em comportamentos

na linha de frente operacional, é necessário ter sob constante avaliação e treinamento tanto o

conhecimento como as habilidades práticas dos policiais.

Módulo 3 - Responsabilidades básicas da atividade policial1 - Prevenção e detecção do crime

De acordo com Rover (2005), a prevenção e detecção do crime estão entre as áreas de

interesse imediato das organizações de aplicação da lei em todo o mundo.

O crime é inerente à vida cotidiana e as organizações de aplicação da lei fazem o

máximo para erradicar sua ocorrência. Entretanto, o número de crimes solucionados pela polícia é

menor que o número de crimes praticados.

A responsabilidade pela prevenção e detecção do crime é atribuída primariamente às

organizações policiais, mas a efetiva prevenção e detecção do crime também dependem muito dos

níveis existentes e da qualidade da cooperação entre a organização de aplicação da lei e a

comunidade (políticos, membros do judiciário, grupos comunitários, corporações públicas e privadas,

Page 29: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

29

bem como indivíduos) a que essa serve.

Esse ponto é bastante claro na Constituição Brasileira de 1988: Artigo 144. A

Segurança Pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a

preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (...)

É claro que nas suas tarefas de prevenir e detectar crimes, a polícia deve respeitar os

direitos humanos em todas as ocasiões. Por isso, uma prevenção e detecção de crimes devem

basear-se em práticas e tácticas legais e não-arbitrárias.

Dentre os princípios do Direito Internacional de Direitos Humanos que delimitam as

práticas de aplicação da lei, destacam-se os seguintes:

- A presunção da inocência;

- O direito de todas as pessoas a um julgamento justo; e

- O respeito pela dignidade, honra e privacidade.

A presunção da inocência

Esse direito está consagrado em vários instrumentos e normas internacionais das

quais se destacam:

O artigo 11, da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

1. Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido

inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento

público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

O artigo 14 (2), do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos:

2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência

enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.

O artigo 7o (1,b), da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos:

1. Toda pessoa tem direito que a sua causa seja apreciada. Esse direito

compreende:

b) O direito de presunção de inocência, até que a sua culpabilidade seja

estabelecida por um tribunal competente.

O artigo 8o (2), da Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência

enquanto não se comprove legalmente sua culpa.

O artigo 6o (2), da Convenção Européia dos Direitos do Homem:

2. Everyone charged with a criminal offence shall be presumed innocent until

proved guilty according to law. (Qualquer pessoa acusada de um crime deve presumir-se

inocente até que seja legalmente considerada culpada.)

A Constituição Brasileira também faz essa previsão em seu artigo 5 o . LVII:

LVII - Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal

condenatória.

Page 30: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

30

Como é possível verificar o direito fundamental da presunção da inocência está contido

em vários instrumentos e normas internacionais e nacionais, do que é possível entender:

• A culpabilidade ou a inocência só pode ser determinada por um tribunal regularmente

constituído, com base em um processo regular no âmbito do qual tenham sido concedidas ao

acusado todas as garantias necessárias para a sua defesa;

e

• O direito à presunção de inocência, até prova em contrário, é essencial para garantir

um julgamento justo.

Rover (2005) reforça esse entendimento enfatizando que uma das tarefas primárias na

aplicação da lei é a de trazer os infratores à Justiça e não compete aos encarregados da aplicação

da lei decidir sobre a culpa ou inocência de uma pessoa capturada por um delito. Sua

responsabilidade é registrar, de forma correta e objetiva, todos os fatos relacionados a um crime

cometido. Os encarregados da aplicação da lei são responsáveis pela busca de fatos, ao passo que o

Judiciário é o responsável pela apuração da verdade, analisando esses fatos com o propósito de

determinar a culpa ou inocência da(s) pessoa(s) acusada(s).

O direito de todas as pessoas a um julgamento justo

Em relação ao direito a um julgamento justo tem-se que ter em mente que essa garantia

se aplica tanto aos processos civis como aos criminais e administrativos. É imprescindível oferecer as

partes do processo o direito à ampla defesa e ao contraditório, ou seja, dar às partes a chance de

contra-argumentar e expor os argumentos de sua defesa.

Esse direito está consagrado no artigo 10, da Declaração Universal dos Direitos do

Homem: Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por

parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do

fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, em seu artigo 14,

estabelece disposições e uma série de garantias mínimas consideradas necessárias para

assegurar o direito a um processo justo. Essas garantias mínimas foram incorporadas na legislação

da maioria dos países do mundo.

Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos

Artigo 14 (...)

1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa

terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente,

independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal

formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o

público poderão ser excluídos de parte ou da totalidade de um julgamento, que por motivo de moral

pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o

interesse da vida privada das partes o exija, quer na medida em que isso seja estritamente necessário

Page 31: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

31

na opinião da justiça, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os

interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença proferida em matéria penal ou civil deverá tornar-

se pública, a menos que o interesse de menores exija procedimento oposto, ou o processo diga

respeito à controvérsia matrimoniais ou à tutela de menores.

2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência

enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.

3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, a, pelo menos, as

seguintes garantias:

a) De ser informado, sem demora, numa língua que compreenda e de forma minuciosa,

da natureza e dos motivos da acusação contra ela formulada;

b) De dispor do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa e a

comunicar-se com defensor de sua escolha;

c) De ser julgado sem dilações (demora) indevidas;

d) De estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por intermédio de

defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo

e, sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado "ex offício",

gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo;

e) De interrogar ou fazer interrogar as testemunhas da acusação e de obter o

comparecimento e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições de que

dispõem as de acusação.

f) De ser assistida gratuitamente por um intérprete, caso não compreenda ou não fale a

língua empregada durante o julgamento;

g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada.

4. O processo aplicável a jovens que não sejam maiores nos termos da legislação penal

levará em conta a idade dos menores e a importância de promover sua reintegração social;

5. Toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de recorrer da sentença

condenatória e da pena a uma instância, em conformidade com a lei;

6. Se uma sentença condenatória passada em julgado for posteriormente anulada ou se

indulto for concedido, pela ocorrência ou descoberta de fatos novos que provem cabalmente a

existência de erro judicial, a pessoa que sofreu a pena decorrente dessa condenação deverá ser

indenizada, de acordo com a lei, a menos que fique provado que se lhe pode imputar, total ou

parcialmente, não-revelação dos fatos desconhecidos em tempo útil; e

7. Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou

condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os procedimentos penais

de cada país.

Page 32: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

32

O respeito pela dignidade, honra e privacidade

De acordo com Rover (2005), as ações e investigações conduzidas por policiais na

prevenção ou detecção do crime conduzirão a situações em que muitas das ações tomadas

resultarão na invasão da vida privada de indivíduos.

É preciso levar em conta que todos os países têm um código do processo penal ou

orientações que definirão os poderes de investigação e as competências dos policiais e seu alcance

prático.

Abaixo alguns dispositivos internacionais que prevêem a proteção da privacidade, a honra

e a reputação dos indivíduos.

Declaração Universal dos Direitos do Homem:

Artigo 12. Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, em sua família, em

seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem

direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

Artigo 11. Proteção da honra e da dignidade

1. Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade;

2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua

família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou

reputação; e

3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.

Como se percebe, todas essas normas têm repercussões óbvias sobre as ações e

investigações policiais. Como exemplo, é possível citar as revistas e buscas de pessoas, instalações,

veículos e outros bens, bem como a interceptação de correspondência, mensagens telefônicas e

outras comunicações. Todas essas ações deverão respeitar a lei e ser, absolutamente, necessárias

para fins legítimos de aplicação da lei.

Outro instrumento internacional que já estudamos é o Código de Conduta para os

Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, onde a proteção da intimidade é reforçada pelas

disposições do artigo 4o que estabelece:

As informações de natureza confidencial em poder dos funcionários responsáveis pela

aplicação da lei devem ser mantidas em segredo, a não ser que o cumprimento do dever ou as

necessidades da justiça estritamente exijam outro comportamento.

Comentário

Devido à natureza dos seus deveres, os funcionários responsáveis pela aplicação da lei

obtêm informações que podem relacionar-se com a vida particular de outras pessoas ou ser

potencialmente prejudiciais aos seus interesses e, especialmente, à sua reputação. Deve-se ter a

máxima cautela na salvaguarda e utilização dessas informações as quais só devem ser divulgadas no

desempenho do dever ou no interesse. Qualquer divulgação dessas informações para outros fins é

Page 33: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

33

totalmente abusiva.

As responsabilidades dos policiais e suas práticas de aplicação da lei nessa área

requerem supervisão estrita, tanto internamente na organização (superiores hierárquicos e

corregedoria) como um controle externo (ouvidorias de polícia, Ministério Público, dentre outros). O

registro e o controle das ações são fundamentais, pois permitirão que um juízo justo e imparcial seja

feito a respeito de sua legitimidade e não-arbitrariedade, quando um caso em particular vier a

julgamento.

Rover (2005) ressalta que a prevenção e detecção do crime são áreas da aplicação da lei

que exigem padrões altos de moralidade e ética dos policiais, pois é justamente na condução

de investigações que se verificam grande parte das violações dos direitos e liberdades

individuais das pessoas capturadas e/ou detidas. Ele cita como exemplos: o preconceito por

parte dos encarregados das investigações, o uso de provas obtidas por meio de práticas ilícitas, a

pressão sutil sobre a pessoa acusada para obter testemunho.

O modo como nós todos desempenhamos nossa atividade profissional é que darão a

exata noção do que significa a presunção da inocência, um julgamento justo e o respeito pela

dignidade da pessoa humana. O modo profissional de se trabalhar resultará na contribuição

individual para os resultados coletivos e a imagem da sua corporação como um todo.

É possível concluir que a polícia e outros profissionais encarregados pela

aplicação da lei são, muitas vezes, a primeira linha de defesa dos direitos fundamentais da

pessoa humana e, agindo assim, reforçam a noção de Estado Democrático de Direito.

A manutenção da ordem pública

A ordem pública

De ROVER (2005) explica que a paz, a estabilidade e a segurança de um país

dependem, em larga escala, da capacidade de suas organizações de aplicação da lei em fazer cumprir

a legislação nacional e manter a ordem pública de forma eficaz. Ressalta que policiar ocorrências de

vulto, inclusive reuniões e manifestações, requer mais do que a compreensão das responsabilidades

legais dos participantes de tais eventos. Requer, também, a compreensão simultânea dos direitos,

obrigações e liberdades perante a lei daquelas pessoas que deles não participam. Conclui o autor

afirmando que uma das descrições da essência da manutenção da ordem pública é permitir a reunião

de um grupo de pessoas, que esteja exercitando seus direitos e liberdades legais sem infringir os

direitos de outros, enquanto, ao mesmo tempo, assegurar a observância da lei por todas as partes.

Lazzarini (2001) escreve que o homem é o cidadão que vive em uma determinada

sociedade, certo que o fato de ser cidadão propicia a cidadania, ou seja, condição jurídica que pode

ostentar as pessoas físicas e morais, que, por expressar o vínculo entre o Estado e seus membros,

implica, de um lado, submissão à autoridade e, de outro, o exercício de direito, porque o cidadão é

membro ativo de uma sociedade política independente.

O vínculo entre o Estado e seus cidadãos, com submissão desses à autoridade do Estado,

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34

há de estar disciplinada por princípios jurídicos que informam, em especial, as atividades

administrativas, inclusive as desenvolvidas no Poder Legislativo, no Poder Judiciário e as do Poder

Executivo.

No conjunto do ordenamento jurídico de um Estado, é muito comum falar-se em leis de

ordem pública. As leis são os preceitos escritos, formulados pelas autoridades constituídas com poder

de legislar. As leis de ordem pública são as que vão estabelecer princípios indispensáveis à vida e

manutenção e preservação do próprio Estado. Ao contrário, as leis de ordem privada dizem respeito,

principalmente, aos interesses de ordem particular, regulando as relações dos indivíduos entre si ou

deles com o Estado.

As idéias que surgem do conceito de ordem pública são as de vida em paz, bem-estar

social, cooperação dos membros de uma sociedade para o convívio harmonioso e que todos possam

desenvolver plenamente suas potencialidades, exercerem seus direitos, ter a garantia de que podem

invocar a proteção de um órgão superior do Estado, no caso de violações dos mesmos.

"Es el estado de paz y armonía de una sociedad cuando se somete al respeto de Ias normas

establecidas por el estado, entre Ias Ubertades y derechos individuales y el interés general y cuya

ruptura haría imposible Ia convivência y el cumplimento de los fines del estado y de sus

instituciones" (RAMIREZ, p. 12)

É a situação e o estado de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas

precípuas atribuições, os cidadãos estão em harmonia, respeitando as regras formais de coexistência.

A ordem pública não se confunde com a ordem jurídica, embora tenha a sua existência dela

derivada. (KLINGER, 1983)

Ordem pública

Conjunto de regras formais, que emanam do ordenamento jurídico da nação, tendo por

escopo regular as relações sociais de todos os níveis, do interesse público, estabelecendo um clima de

convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e constituindo uma situação ou

condição que conduza ao bem comum. (R-200).

Entretanto, existem situações em que pessoas ou coletividades não se submetem ou não

querem submeter-se à autoridade estatal podendo ocorrer dessa forma, uma ruptura no cumprimento

e na obediência das normas legais e sociais. Nesse momento, o Estado tem a incumbência de

manter e preservar essa ordem social, em favor da coletividade. Um dos meios mais comumente

utilizados para restaurar a ordem violada na administração pública é a polícia e, em casos extremos

onde a instituição policial é deficitária ou insuficiente, essas funções são atribuídas às forças

militares (Forças Armadas).

Nesse caso, as forças militares desempenham funções na comunidade civil que,

habitualmente, é uma incumbência dos funcionários responsáveis pelo cumprimento da lei (polícia).

As forças militares devem aplicar as normas legais que regem a atuação dos funcionários

Page 35: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

35

responsáveis pelo cumprimento da lei, especialmente com relação ao uso da força e das armas de

fogo.

Deve-se prestar especial atenção à instrução dos militares antes de empreender uma

operação de segurança interna. Pois, apesar de realizarem tarefas relacionadas para fazer cumprir a

lei, perdura a essencialidade da força militar. Os membros das Forças Armadas não são policiais

quando realizam uma operação de segurança interna, eles apenas ajudam a polícia a manter a ordem

pública.

As forças militares que participam de operações de segurança interna não necessitam

receber instruções a respeito de toda a gama de capacidades e poderes relacionados com a polícia, tal

como a investigação do delito. Mas, devem receber instrução efetiva sobre os poderes fundamentais

relacionados com o fato de cumprir a lei: uso da força, prisão e detenção.

Surge, assim, a necessidade da intervenção do Estado para realizar a manutenção da ordem

pública violada e assegurar o estado de legalidade impedindo a ruptura dessa mesma ordem, velando

para que as leis e normas decorrentes sejam observadas.

A manutenção é ação; manutenção da ordem pública é ação inerente a órgão policial no

campo da Segurança Pública.

Verifica-se que o tema da manutenção da ordem pública é abordado em vários

manuais policiais como sinônimo de controle da ordem pública e operações de controle de

distúrbios civis. Já em manuais militares aparece como sinônimo de operações de segurança

interna [operaciones de seguridad interna I Internai securíty operations], operações de garantia da

lei e da ordem, low intensity operations [operações de baixa intensidade], operations other than

war [operações - militares - distintas da guerra], military operations other than war (MOOTW)

[outras operações militares que não sejam a guerra] - muito utilizada pelas fontes norte-americanas,

dentre outras.

Não existe uma definição padrão para as operações de segurança interna. Utilize a

seguinte:

Operações que impliquem o emprego de forças armadas em apoio às autoridades civis

com a finalidade principal e manter e restabelecer a ordem. (ROBERTS, 2002)

Manutenção da ordem pública

É o exercício dinâmico do poder de polícia, no campo da Segurança Pública,

manifestado por atuações predominantemente ostensivas, visando prevenir, dissuadir, coibir ou

reprimir eventos que violem a ordem pública.

Perturbação da ordem

Abrange todos os tipos de ação, inclusive as decorrentes de calamidade pública que, por

sua natureza, origem, amplitude e potencial possam vir a comprometer na esfera estadual, o exercício

dos poderes constituídos, o cumprimento das leis e a manutenção da ordem pública, ameaçando a

população e propriedades públicas e privadas. (R-200)

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36

No conceito de Lazzarini (2001), o ramo do direito que deve instrumentalizar tudo

isso em termos de administração pública é o direito administrativo. Esse como principal ramo do

direito público, infraconstitucional, se relaciona, à evidência, com os denominados "direitos humanos

fundamentais", considerados por Alexandre de Morais (2000) como sendo:

O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por

finalidade básica o respeito à sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder

estatal e o estabelecimento de condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade

humana.

Poderes da Administração Pública

Como poderes instrumentais da administração pública estão os poderes: vinculado,

discricionário, hierárquico, disciplinar, regulamentar e o de polícia, não se podendo considerar

como poder o arbítrio, porque arbítrio significa extrapolar os limites da legalidade na manifestação

da vontade do órgão administrativo, no que se diferencia do discricionário que, nos critérios de

conveniência e oportunidade, se sujeita aos princípios da legalidade, da realidade e da

razoabilidade.

Embora não se possa dizer da prevalência de um sobre outro poder instrumental, é

forçoso reconhecer que o poder de polícia, do qual decorre o poder da polícia e a própria razão da

existência da polícia, como força pública do Estado. É um dos mais importantes desses poderes

administrativos, como se examinará em especial na realização plena dos direitos de cidadania, que

envolve o exercício efetivo e amplo dos direitos humanos, nacional e internacionalmente

assegurados. É o poder que exerce a administração pública sobre todas as atividades e bens que

afetam ou possam afetar a coletividade.

O Estado, por intermédio de suas polícias, deve zelar e velar pelo bem-estar coletivo e

dos cidadãos em particular, cabendo-lhe, como conseqüência, o direito-dever ou, até mesmo, o

dever-poder de tudo fazer na defesa desses direitos. (MAGALHÃES, 1987, p. 61)

O poder de polícia

Poder de polícia é a competência institucional que a administração pública tem para

impor restrições a certas atividades privadas e obrigar ou proibir determinadas formas de

utilização das coisas, tendo em vista o bem comum.

Consiste numa limitação do exercício da liberdade e da propriedade dos indivíduos para

que, no uso delas, os membros da coletividade se mantenham ajustados a padrões compatíveis

com os objetivos sociais. O Estado cumpre sua missão de defensor e propagador dos interesses

gerais, coibindo os excessos e prevenindo as perturbações à ordem jurídico-social. (MEIRELLES 1997,

p. 115)

MARQUES (2001) explica que o poder de polícia é a denominação de um dos poderes

concedidos ao Estado para atuar, no uso de sua função social, em benefício da ordem jurídica e

socioeconômica vigente. Usando esse poder, a administração estabelece medidas, mesmo que

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restritivas aos direitos individuais, que se tornam necessárias para a manutenção e segurança da

ordem, da moralidade social e da saúde pública, visando, em última instância, assegurar a própria

liberdade individual, a propriedade pública e privada e o bem-estar coletivo.

Na visão de HELY LOPES MEIRELES (1997), "poder de polícia é a faculdade de que dispõe

a administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos

individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado". Para o autor, ele é o

mecanismo de frenagem de que dispõe a administração pública para conter os abusos do direito

individual. O Estado detém a atividade dos particulares que se revela contrária, nociva ou

inconveniente ao bem-estar social, ao desenvolvimento e à segurança nacional.

Atributos do poder de polícia

MEIRELLES (1997, p. 120) e MARQUES (2001) apontam como sendo três os atributos ou

características do poder de polícia:

- Discricionaríedade;

- Autoexecutoríedade; e

- Coercibilidade.

O que consiste cada um dos atributos:

Discricionaríedade

Discricionaríedade traduz-se na livre escolha e conveniência de a administração

exercer o poder de polícia, bem como aplicar as sanções e empregar os meios para atingir o fim

pretendido, que é a proteção de algum interesse público. Ela é legítima desde que o ato da polícia

administrativa se contenha nos limites legais e a autoridade se mantenha na faixa de opção que lhe é

atribuída.11 Na maioria dos Estados, os encarregados de aplicação da lei (...) têm poderes

discricionários de captura, detenção e do uso da força e de armas de fogo, e podem exercê-los em

qualquer situação de aplicação da lei." (DE ROVER, 2005)

Esse poder pode se tornar um problema se o policial não for bem preparado. BEATO critica

esse poder ao afirmar que um dos aspectos mais difíceis no gerenciamento das atividades policiais é o

grau de discricionariedade dos policiais nas ruas. O autor alega que esse problema adquire

contornos dramáticos quando se trata de avaliar a necessidade ou não do uso de força letal pelos

policiais. No dia-a-dia da atividade policial, esses extremos não são tão freqüentes. As decisões dos

policiais sobre quando se deve ou não acionar as leis para a manutenção da ordem determinam os

próprios limites da implementação da lei. Policiais detêm uma larga margem de decisão sobre esse

ato. A visibilidade dessas decisões é, freqüentemente, baixa e, raramente, são sujeitas a mecanismos

de supervisão por parte de superiores.

MEIRELLES (1997, p. 120), ao tratar do assunto, afirma que "discricionariedade não se

confunde com arbitrariedade. Discricionariedade é liberdade de agir dentro dos limites legais,

arbitrariedade é ação fora ou excedente da lei, com abuso ou desvio de poder". O ato arbitrário é

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sempre ilegítimo e inválido, portanto nulo.

Autoexecutoriedade

Autoexecutoriedade é a faculdade da administração em decidir e executar

diretamente sua decisão por seus próprios meios, sem intervenção do Judiciário.

A administração impõe diretamente as medidas ou sanções de polícia administrativa

necessárias à contenção da atividade antissocial que visa impedir. Esse princípio autoriza a prática

do ato de polícia administrativa pela própria administração, independentemente de mandato judicial.

Para MARQUES, a executoriedade permite à administração executar diretamente a sua

decisão pelo uso da força. E, em decorrência desse atributo, que a administração impõe aos seus

administrados atos decorrentes do poder de polícia e os pratique, imediata e diretamente, sem a

interveniência do Poder Judiciário, embora tenha que, posteriormente, sujeitar-se ao controle de

legalidade.

Coercibilidade

Coercibilidade é a imposição coativa das medidas adotadas pela administração. Todo ato

de polícia é imperativo, obrigatório para seu destinatário, admitindo até o emprego da força pública

para seu cumprimento, quando resistido pelo administrado. Segundo MEIRELLES (1997, p. 122),

"não há ato de polícia facultativo para o particular, pois todos eles admitem a coerção estatal para

torná-los efetivos, e essa coerção também independe de autorização judicial". É a própria

administração que determina e faz executar as medidas de força que se tornarem necessárias para

a execução do ato ou aplicação da penalidade administrativa resultante do exercício do poder de

polícia.

Para MARQUES, "a coercibilidade [...] é indissociável da autoexecutoriedade. O ato de

polícia só é autoexecutório porque é dotado de força coercitiva. É a necessidade de se ver as medidas

adotadas pela administração através dos meios de coerção".

Sobre o atributo da coercibilidade, MEIRELLES (1997, p. 120) diz que: O atributo da

coercibilidade do ato de polícia justifica o emprego da força física quando houver oposição do

infrator, mas não legaliza a violência desnecessária ou desproporcional à resistência, que em tal caso

pode caracterizar o excesso de poder e abuso de autoridade nulificadores do ato praticado e

ensejadores das ações civis e criminais para reparação do dano e punição dos culpados.

MOREIRA NETO (1987, p.11) afirma em sua obra que o poder de polícia, com seus

instrumentos, a discricionariedade e a executoriedade são o tripé do direito administrativo da

Segurança Pública.

O poder de polícia e a segurança pública

Confundida, de um lado, com a ordem jurídica e, de outro, com a ordem nas ruas, o

conceito de ordem pública mereceu exaustivos debates. Embora toda violação à ordem jurídica

possa caracterizar-se como uma violação à ordem pública, a recíproca não é verdadeira, o que

demonstra que esse conceito tem matizes meta-jurídicos que se referem às vigências sociais

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essenciais à convivência harmoniosa e pacífica, como a moral e os costumes.

Para MOREIRA NETO (1987, p.13), "ordem pública, objeto da Segurança Pública, é a

situação de convivência pacífica e harmoniosa da população, fundada nos princípios éticos vigentes na

sociedade".

Sobre Segurança Pública, MOREIRA NETO (1987, p.19) diz que o Estado atua

juridicamente na sua vertente normativa, estabelecendo as leis que a disciplinarão, e na sua vertente

jurisdicional, aplicando a lei aos casos contenciosos e, em especial, impondo a pena criminal. Na

vertente administrativa, o Estado atua aplicando a lei para restabelecer a ordem violada, de forma

discricionária e executória. É nessa atuação que se denomina a atividade de polícia de Segurança

Pública, exercendo o Estado o poder de polícia administrativa.

Na Segurança Pública, o Estado atua pelo poder de polícia, exercitado em suas quatro

modalidades de ação (AGU):

A ordem de polícia

Geralmente um comando negativo, se contém num preceito, que, necessariamente, nasce

da lei, pois se trata de uma reserva legal (artigo 5o, II, Constituição Federal 1988), e pode ser

enriquecido discricionariamente, de acordo com as circunstâncias, pela administração;

O consentimento de polícia

Subordina certas atividades a um controle prévio. Quando couber, será a anuência,

vinculada ou discricionária do Estado com a atividade submetida ao preceito vedativo relativo, sempre

que satisfeitos os condicionamentos exigidos;

A fiscalização de polícia

É uma forma ordinária e inafastável de atuação administrativa que se dá para verificar o

cumprimento das ordens ou observar as condições do consentimento. No caso específico da atuação

da polícia de preservação da ordem pública, é que toma o nome de policiamento;

A sanção de polícia

É a atuação administrativa autoexecutoria que se destina reprimir a infração. No caso da

infração à ordem pública, a atividade administrativa, autoexecutoria, no exercício do poder de

polícia, se esgota no constrangimento pessoal, direto e imediato, na justa medida para restabelecê-

la, ou seja, o direito, o costume e a moral.

Nos países democráticos e onde impera o estado de direito, uma conseqüência lógica dessa

democracia e liberdade é o direito que as pessoas têm de saírem às ruas pacificamente em passeatas

ou manifestações para expressar suas opiniões e sentimentos publicamente, sobre qualquer tema

que considerem importante.

Os instrumentos e normas internacionais prevêem certo número de direitos e

liberdades, que se aplicam às reuniões, manifestações, passeatas e eventos similares. Como

exemplo, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) que prevê:

• O direito de ter opiniões próprias sem interferência (PIDCP, artigo 19.1);

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• O direito à liberdade de expressão (PIDCP, artigo 19.2);

• O direito à reunião pacífica (PIDCP, artigo 21); e

• O direito à liberdade de associação (PIDCP, artigo 22.1).

Nenhum direito pode ser exercido sem limites. Ao exercício desses direitos podem ser

impostas restrições, desde que legítimas e necessárias para que se respeite o direito à reputação de

outrem, para a proteção da segurança nacional ou da ordem pública, ou da saúde pública e moral.

Veja o mesmo PIDCP nos artigos 19.3, 21 e 22.2. Além dos citados, a Segurança Pública pode ser

uma razão legítima para restrição do direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de

associação.

O mesmo pode ser observado na leitura atenta do artigo 29 (1 e 2), da Declaração

Universal dos Direitos Humanos (DUDH):

1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno

desenvolvimento de sua personalidade é possível.

2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às

limitações_determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido

reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da

moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. (...)

O equilíbrio está justamente no fato de que cada direito corresponde a uma obrigação

que, neste caso, estão nos deveres da pessoa humana para com a comunidade na qual está

inserida. Lembrando sempre que as limitações devem ser legais e não-arbitrárias.

A violência

Em toda sociedade podem surgir situações especiais e excepcionais que podem colocar

em perigo a ordem pública, a segurança das pessoas e, em última instância, do próprio Estado. São

circunstâncias provocadas por conflitos armados, distúrbios civis ou desastres naturais, que requerem

do Estado uma atuação especial para restaurar a ordem e a normalidade.

A ruptura da condição normal da ordem pública associa-se, muitas vezes, a idéia de

violência que ultrapassa aquela dos tempos "normais". De acordo com (CAPUTO, 1996), [por

violência "normal" entenda-se, por exemplo, a delinquência comum de todos os dias, ou em

outro plano, as medidas da repressão corrente que desempenha o aparelhamento policial nos

limites do consentimento legal].

As Nações Unidas (2001) classificam e definem uma hipotética hierarquia da violência em

pelo menos cinco níveis sucessivos:

Nível 1 Situação normal;

Nível 2 Tensões internas, distúrbios internos, tumultos, atos de

violência isolados e esporádicos;

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Nível 3 Estado de exceção proclamado no segmento de tensões

internas e de violências esporádicas que ameaçam a existência da

nação;Nível 4 Conflito armado não-intemacional (guerra civil); e

Nível 5 Conflito armado internacional.

É importante considerar que as fronteiras entre os diferentes níveis de violência não são

sempre claras, entretanto, de maneira didática é possível considerar que cada situação requer a

aplicação das seguintes categorias de normas:

Nível 1: Todos os direitos humanos, sem qualquer derrogação (abolição);

Nível 2: Todos os direitos humanos, sem qualquer derrogação, sob reserva única das

restrições autorizadas pela lei com o único fim de garantir plenamente o reconhecimento e respeito

pelos direitos e liberdades de terceiros, bem como as justas exigências da moral, ordem pública e

bem-estar geral numa sociedade democrática.

Nível 3: Todos os direitos humanos, salvo algumas exceções limitadas, as quais permitem

derrogações (anulações) não-discriminatórias, nos estritos limites necessários pelas exigências da

situação. Não é autorizada qualquer derrogação no que diz respeito ao direito à vida, à proibição de

tortura, da escravidão ou de sujeitar uma pessoa à prisão por incapacidade de execução de uma

obrigação contratual.

Nível 4: O artigo 3o, comum as quatro Convenções de Genebra de 1949, e o Protocolo

Adicional II às Convenções de 1977, bem como as restantes disposições de direitos humanos, incluindo

a proteção dos direitos que não são derrogáveis.

Nível 5: As quatro Convenções de Genebra e o Protocolo Adicional I às Convenções de 1977,

bem como as outras disposições relativas aos direitos humanos, incluindo a proteção dos direitos que

não são derrogáveis.

Distúrbios e tensões internas

A doutrina vigente não atribuiu uma definição objetiva e precisa sobre distúrbios e

tensões internas, e nenhum instrumento internacional correu o risco de fazê-lo. Entretanto, para os

efeitos deste curso, e com intuito de padronizar e esclarecer seu significado, adotaram-se os conceitos

constantes do "Diccionarío de Derecho Internacional de los Conflictos Armados - Pietro Verri

(1998)".

Diccionario de Derecho Internacional de los Conflictos Armados - Pietro Verri (1998)

Distúrbios internos: Según definición dada por ei CICR en 1971, esta expresión cubre Ias

situaciones en Ias que, sin que haya un conflicto armado propiamente dicho, existe, no obstante en

ei plano interno, un enfrentamiento que presenta cierto caracter de gravedad o de duración y que

implica actos de violência. Estos últimos pueden revestir formas variables que pueden ir desde Ia

generación espontânea de actos aislados de revuelta hasta Ia lucha entre grupos más o menos

organizados y Ias autoridades en el poder. En esas situaciones, que no degeneran necesariamente

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luchas abiertas, Ias autoridades en ei poder recurren a vastas fuerzas de policia, incluso Ias fuerzas

armadas, a fin de restablecer el orden interior.

Tensiones internas: Según una definición dada por ei CICR en 1971 (con motivo de uma

consulta de expertos gubernamentales), se trata de situaciones que pueden caracterizarse por:

Gran número de detenciones;

Gran número de detenidos políticos o de seguridad;

Probables maios tratos inflingidos a los detenidos;

Promulgación deo estado de emergência; y

Alegaciones de desapariciones.

Al contrario de las situaciones de distúrbios interiores - en Ias que rebeldes están

suficientemente organizados y son identificables - en el caso de tensiones internas, Ia oposición

está rara vez organizada de manera visible.

Estado de emergência: Situación jurídica similar ai estado de sitio, pero que produce

efectos menos severos que este último. En general, se declara a causa de un peligro del momento o

inminente, resultante de una catástrofe, de una perturbación grave dei orden público, de uma crisis

internacional o de un conflicto armado.

Estado de sitio: La situación de peligro en Ia que se encuentra una localidad sitiada

impone, en general, medidas que limitan o suspenden los derechos y Ias libertades fundamentales. De

ahí Ia expresión "estado de sitio" que, por extensión indica Ia proclamación de una situación de

gravedad particular, en el interior de un Estado, causada por el estado de guerra o por otras

circunstancias excepcionales, así como Ias medidas consiguientes adoptadas para garantizar o

restablecer ei orden público. Estas medidas pueden hasta Ia delegación de los poderes civiles a Ia

autoridad militar.

Tanto CAPUTO (1996-1997) como DE ROVER (2005) compartilham do entendimento

que nenhum dos instrumentos do direito internacional oferece uma definição adequada do que se

entende pelos termos distúrbios interiores e tensões internas. Indicam-nos que, para tentar dar uma

definição, devemos confrontá-los com uma categoria mais ampla, que é o conflito armado não-

internacional (guerra civil). Remetem-nos ao artigo 1o, parágrafo 2o, do Segundo Protocolo Adicional

às Convenções de Genebra de 1949 que estabelece:

Artigo 1.2 O presente Protocolo não se aplica às situações de tensão e perturbação

internas, tais como motins atos de violência isolados e esporádicos e outros atos análogos, que não

são considerados conflitos armados.

O diploma legal não oferece uma definição, ou melhor, nos indica uma definição

"negativa", isto é, por exclusão. Assim sendo, "situações de tensão e perturbação internas" não

podem ser caracterizadas como conflitos armados (guerra). Portanto, o Protocolo II não se aplica a

elas.

CAPUTO (1996-1997) afirma que o direito internacional distingue três categorias de

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conflito armado não-internacional:

a) A guerra civil no sentido clássico do direito internacional;

b) Conflito armado não-internacional no sentido dado pelo artigo 3 o comum as quatro

Convenções de Genebra de 1949; e

b) Conflito armado não-internacional no sentido do P.A. II de 1977.

A classificação de um conflito, segundo essa categoria juridicamente reconhecida, é difícil

dada a complexidade dos vários conflitos existentes e da freqüente divergência doutrinária, mas é

certo dizer que a aplicação de uma norma jurídica em detrimento de outra a um caso concreto ou

evento específico depende de sua qualificação, isto é, deve-se sempre perguntar que tipo de conflito

está sendo tratado.

DE ROVER (2005) menciona que nem sempre fica claro quando incidentes separados, como

reuniões, passeatas, manifestações, desordens e atos isolados de violência tornam-se relacionados

e que, vistos conjuntamente, adquirem um padrão consistente descrito como distúrbios e tensões.

Todos os esforços devem ser focalizados na eficaz aplicação da lei, na prevenção e

detecção do crime e no restabelecimento da Segurança Pública. Quando esses esforços falham, um

senso de ilegalidade aliado à impunidade pode crescer dentro de uma sociedade, intensificando ainda

mais os níveis de tensão existentes.

Distúrbios e tensões podem levar a situações que ameacem a existência da nação e deixar

o governo tentado a declarar o estado de emergência.

Dificuldade de conceituação

DE ROVER (2005) verificou que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) tentou

definir distúrbios e tensões. Entende que, embora a fórmula do CICV não seja plenamente

reconhecida como tal, proporciona uma descrição completa, que serve aos propósitos de

aprofundamento dos estudos. Em um documento do CICV oferece a seguinte descrição de

distúrbios interiores:

Envolvem situações em que inexiste um conflito armado não-internacional como tal, mas

consistem numa confrontação dentro do país, que é caracterizada por certa gravidade ou duração e

que envolve atos de violência. Esses últimos podem assumir várias formas, desde a geração

espontânea de atos de revolta à luta entre grupos mais ou menos organizados e as autoridades no

poder. Nessas situações, que não necessariamente degeneram em confronto aberto, as autoridades no

poder utilizam-se de forças policiais em grande número, ou mesmo das Forças Armadas, para

restaurar a ordem interna. O alto número de vítimas tornou necessária a aplicação de um mínimo de

regras humanitárias, (grifei)

Com relação a tensões internas, indica que o termo geralmente refere-se a:

• Situações de grave tensão (política, religiosa, racial, social, econômica, etc); ou

• Sequelas de um conflito armado ou distúrbios interiores.

• Direito/legislação aplicável

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DEYRA (2001), assim como DE ROVER (2005) e CAPUTO (1996-1997), verifica que o artigo

1.2, do II PA (Protocolo Adicional II), exclui de sua proteção as situações de tensões e distúrbios

interiores, como os motins, os atos isolados e esporádicos de violência e outros atos análogos não

considerados como conflitos armados.

Entende que se trata, por isso, de uma situação extraconvencional, na qual a proteção

conferida às vítimas não pode ter por base o Direito Internacional Humanitário (DIH). Conclui que os

critérios para a qualificação dos conflitos armados não-internacionais enunciados no artigo 1.1, do II

Protocolo Adicional, são suficientes para excluir as tensões e distúrbios interiores do campo de

aplicação do DIH.

Nas situações de distúrbios interiores, as regras do DIH somente podem ser

invocadas por analogia. Por outro lado, os Estados devem respeitar certos princípios humanitários

universalmente reconhecidos e os instrumentos de direitos humanos dos quais fazem parte. Devem

respeitar, em particular, aqueles direitos que não admitem derrogação (abolição), mesmo quando a

vida da nação estiver ameaçada por um perigo público de caráter excepcional. Isso remete aos

princípios basilares de toda operação de segurança interna: primazia do poder civil, uso mínimo da

força e legitimidade.

Primazia do poder civil se deve ao fato das Forças Armadas normalmente serem

empregadas para manter e restaurar a ordem em nome das autoridades civis, baseando-se nas

normas de direito contidas no direito penal e no civil do Estado em questão.

Uso mínimo da força entende-se a mínima necessária para levar a cabo uma missão lícita

que pode ir desde a defesa própria até o emprego de técnicas tradicionais de guerra.

Legitimidade diz respeito às operações que devem ter como objetivo a proteção do

estado de direito. Deve-se velar para que as forças militares sejam parte da solução e que não se

convertam em parte do problema. A legitimidade existe quando se considera que a missão militar e

seu desempenho são justos. Quanto mais alta a legitimidade, maior é a probabilidade de êxito. É

fundamental que as Forças Armadas atuem respeitando o direito interno e o direito internacional.

São instrumentos internacionais básicos de direitos humanos que devem ser do

conhecimento dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei quando atuarem na manutenção da

ordem pública:

Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)

Pacto Internacional de Direitos Civis e Politicos (PIDCP):

Pacto Internacional de Direitos Econômicos. Sociais e Culturais (PIDESC):

Convenção contra a Tortura e outros tratos ou penas cruéis, desumanas ou

degradantes:

Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela aplicação da Lei:

Princípios Básicos sobre o emprego da Forca e Armas de Fogo pelos Funcionários

Encarregados pela aplicação da Lei:

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45

Princípios relativos a uma eficaz prevenção e investigação das execuções

extralegais. arbitrárias ou sumárias:

Conjunto de Princípios para a Proteção de todas as pessoas submetidas a

qualquer forma de detenção ou prisão.

Um dos instrumentos mais importantes do Direito Internacional dos Direitos Humanos é

o "Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos" (PIDCP), de 1966. Ele prevê, em seu artigo 4o,

as situações de emergências públicas que uma nação pode confrontar.

O artigo 4 o . do PIDCP, indica de maneira imperiosa a proibição da derrogação de certos

direitos fundamentais à pessoa humana quando submetida a essas circunstâncias.

Artigo 4o

1. Quando situações excepcionais ameacem a existência da nação e sejam proclamadas

oficialmente, os Estados Partes do presente Pacto podem adotar, na estrita medida exigida pela

situação, medidas que suspendam as obrigações decorrentes do presente Pacto, desde que tais

medidas não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhes sejam impostas pelo direito

internacional e não acarretem discriminação alguma apenas por motivo de raça, cor, sexo, língua,

religião ou origem social.

2. A disposição precedente não autoriza qualquer suspensão dos artigos 6°, 7°, 8° (§S1

° e 2o), 11,15, 16 e 18.

3. Os Estados Partes do presente pacto que fizerem uso do direito de suspensão devem

comunicar imediatamente aos outros Estados Partes do presente Pacto, por intermédio do secretário-

geral das Nações Unidas, as disposições que tenham suspenso, bem como os motivos de tal

suspensão. Os Estados Partes deverão fazer uma nova comunicação, igualmente por intermédio do

secretário-geral da Organização das Nações Unidas, na data em que terminar tal suspensão.

As Nações Unidas se preocuparam em comentar e interpretar o artigo 4o do pacto.

Comentam que se permite a um Estado Parte revogar de maneira unilateral e temporária, algumas

obrigações previstas no pacto, mas, por outro lado, o artigo 4o sujeita tanto as medidas de

derrogação como suas conseqüências materiais a um regime especifico de salvaguardas.

As medidas derrogatorias do conteúdo do pacto devem ser excepcionais e temporárias.

Antes mesmo de o Estado invocar o artigo 4o, duas condições fundamentais devem ser

preenchidas:

a) A situação deve ser uma emergência pública que ameace a vida da nação; e

b) O Estado Parte deve proclamar oficialmente o estado de emergência, o que é

essencial para a manutenção dos princípios de legalidade e império da lei nas situações em que

são mais necessárias.

O artigo 4o (2) dispõe que não autoriza derrogação dos seguintes artigos, que

contemplam os seguintes direitos inalienáveis:

• Artigo 6o, direito à vida;

Page 46: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

46

• Artigo 7o, proibição da tortura, penas ou tratamentos cruéis ou degradantes;

• Artigo 8o, proibição da escravidão e servidão;

• Artigo 11, proibição de prisão por falta de cumprimento de obrigação

contratual;

• Artigo 15, princípio da anterioridade da lei penal;

• Artigo 16, reconhecimento da personalidade jurídica da pessoa; e

• Artigo 18, direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião.

Já o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, no mesmo sentido, possui a

Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), Pacto de San José, de 22 de novembro de 1969 ,

que tem a seguinte disposição no artigo 27 .

Artigo 27

Suspensão de garantias

1. Em caso de guerra, de perigo público ou de outra emergência que ameace a

independência ou segurança do Estado Parte, este poderá adotar disposições que, na medida e pelo

tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as obrigações contraídas em

virtude desta Convenção, desde que tais disposições não sejam incompatíveis com as demais

obrigações que lhe impõem o direito internacional e não encerrem discriminação alguma fundada em

motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião ou origem social.

2. A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos determinados nos

seguintes artigos: 3 (Direito ao Reconhecimento da Personalidade Jurídica), 4 (Direito à Vida), 5

(Direito à Integridade Pessoal), 6 (Proibição da Escravidão e Servidão), 9 (Princípio da Legalidade e

da Retroatividade), 12 (Liberdade de Consciência e de Religião), 17 (Proteção da Família), 18

(Direito ao Nome), 19 (Direitos da Criança), 20 (Direito à Nacionalidade) e 23 (Direitos Políticos),

nem das garantias indispensáveis para a proteção de tais direitos.

3. Todo Estado Parte que fizer uso do direito de suspensão deverá informar,

imediatamente, aos outros Estados Partes na presente Convenção, por intermédio do secretário-geral

da Organização dos Estados Americanos, das disposições, cuja aplicação haja suspendido, dos motivos

determinantes da suspensão e da data em que haja dado por terminada tal suspensão.

O uso da força e armas de fogo em manifestações

Apesar de ser objeto de estudo específico na aula sobre uso da força e armas de fogo,

o tema merece aqui uma consideração mais específica. A questão do emprego da força e armas de

fogo é, muitas vezes, uma questão de doutrina da instituição ou corporação policial colocando-se

sempre em evidência a questão do serviço e do interesse público. Entretanto, atualmente, se

enfatiza que os policiais e outros funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem ter

conhecimento teórico e prático sobre o uso progressivo da força.

O uso progressivo da força é a possibilidade da seleção adequada de opções de

força em resposta ao nível de acatamento/submissão do indivíduo a ser controlado. O policial

Page 47: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

47

deve perceber o grau de risco oferecido quando se depara com pessoas que deve abordar. Sua

percepção desse risco é que vai permitir ao policial escolher pelo aumento ou diminuição do grau

de força a ser empregado em cada situação específica. Isso requer muito treinamento e experiência

profissional.

O exercício do poder para usar da força e armas de fogo não é uma questão individual,

mas sim uma questão funcional. Qualquer uso que não esteja dentro da legalidade estará sujeito a

uma crítica por excesso, desvio, abuso de autoridade ou poder.

Relembre o artigo 3 o , do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela

Aplicação da Lei (CCEAL):

Artigo 3o: Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem empregar a força

quando tal se afigure estritamente necessário e na medida exigida para o cumprimento do seu

dever. Comentários:

a) Essa disposição salienta que o emprego da força por parte dos funcionários

responsáveis pela aplicação da lei deve ser excepcional. Embora admita que esses funcionários

possam estar autorizados a utilizar a força na medida em que tal seja razoavelmente considerada

como necessária, tendo em conta as circunstâncias, para a prevenção de um crime ou para deter ou

ajudar à detenção legal de delinqüentes ou de suspeitos, qualquer uso da força fora desse contexto

não é permitido.

b) A lei nacional restringe, normalmente, o emprego da força pelos funcionários

responsáveis pela aplicação da lei, de acordo com o princípio da proporcionalidade. Deve-se entender

que tais princípios nacionais de proporcionalidade devem ser respeitados na interpretação dessa

disposição. A presente disposição não deve ser, em nenhum caso, interpretada no sentido da

autorização do emprego da força em desproporção com o legítimo objetivo a atingir.

c) O emprego de armas de fogo é considerado uma medida extrema. Devem fazer-se

todos os esforços no sentido de excluir a utilização de armas de fogo, especialmente contra as

crianças. Em geral, não deverão utilizar-se armas de fogo, exceto quando um suspeito ofereça

resistência armada, ou quando, de qualquer forma coloque em perigo vidas alheias e não haja

suficientes medidas menos extremas para o dominar ou deter. Cada vez que uma arma de fogo for

disparada deverá informar-se prontamente as autoridades competentes.

d) Recorde-se que as disposições que se referem ao uso da força e de armas de fogo se

baseiam sempre em três princípios:

Legalidade: A ação a ser praticada é legal? Tem previsão na lei? Necessidade: A ação a

ser praticada é necessária para preservar ou restabelecer a ordem pública e proteger a vida humana

(própria ou de terceiros)? Proporcionalidade: Os meios a serem empregados são moderados e

estão em proporção à gravidade do delito cometido e ao objetivo legítimo a ser alcançado?

Os Princípios Básicos sobre o uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei (PBUFAF) se configuram com instrumento internacional que faz

Page 48: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

48

referência ao uso da força e armas de fogo.

Os dispositivos desses princípios devem ser lidos e interpretados integralmente. De

particular importância para o policiamento de reuniões e manifestações estão os princípios básicos

12 . 13 e 14: Policiamento de reuniões ilegais.

Os princípios básicos 12 , 13 e 14: Policiamento de reuniões ilegais.

12.Como todos têm o direito de participar de reuniões legítimas e pacíficas, de acordo com os

princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no Pacto Internacional de Direitos Civis e

Políticos, os governos, entidades e os responsáveis pela aplicação da lei deverão reconhecer que a força e as

armas de fogo só podem ser usadas nos termos dos princípios 13 e 14.

13.Ao dispersar grupos ilegais, mas não-violentos, os responsáveis pela aplicação da lei deverão

evitar o uso da força, ou quando tal não for possível, deverão restringir tal força ao mínimo necessário.

14.Ao dispersar grupos violentos, os responsáveis pela aplicação da lei só poderão fazer uso de

armas de fogo quando não for possível usar outros meios menos perigosos e apenas nos termos minimamente

necessários. Os responsáveis pela aplicação da lei não deverão fazer uso de armas de fogo em tais casos, a não

ser nas condições previstas no princípio 9.

Ao estudar o princípio básico 14, a conclusão inicial poderia ser de que ele apresenta uma

circunstância adicional para o uso legal de armas de fogo. Isso, porém, não é verdade, pois apenas

reitera que somente as condições mencionadas no PB 9: uma ameaça iminente de morte ou lesão

grave é que justificam o uso de armas de fogo.

Os riscos acrescentados por uma reunião violenta - grandes multidões, confusão e

desorganização - fazem com que seja questionável a conveniência ou praticabilidade do uso de armas

de fogo nessas situações, tendo em vista as consequências em potencial para as pessoas que estejam

presentes, porém não envolvidas.

O princípio básico 14 não permite o disparo indiscriminado contra uma multidão violenta

como uma tática aceitável para dispersar aquela multidão.

Conclusão

Estudamos a responsabilidade das organizações policiais relacionadas, principalmente, à

prevenção e à manutenção da ordem pública. Também abordamos o poder de polícia do qual

decorre o poder da polícia e a própria razão da existência dela, como força pública do Estado.

Verificamos os atributos do poder de polícia e as quatro modalidades de ação do Estado na

atuação desse poder: a ordem da polícia, consentimento da polícia, a fiscalização da polícia e a

sanção da polícia.

Acompanhamos a discussão sobre a definição de distúrbios e tensões internas e os

princípios que regem o uso da força e da arma de fogo na ação da polícia nessas situações.

Módulo 4 - Poderes básicos na aplicação da lei

Page 49: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

49

Definições

Nos Estados Democráticos de Direito todos têm direito à vida, liberdade de

segurança (PIDCP- 9.1), porém, frente à violação da lei, a privação de liberdade pessoal é um dos

meios legítimos para o Estado exercer sua atividade soberana.

Privação da liberdade é a definição mais ampla da violação da liberdade de ir e vir. Essa

inclui a retenção de menores, de pessoas mentalmente doentes, de viciados em drogas ou em álcool e

de desocupados. A privação se estende a situações em que esta é causada tanto por pessoas comuns

quanto por agentes públicos.

As definições na próxima página foram extraídas do Conjunto de Princípios para a

Proteção de todas as pessoas sob qualquer forma de detenção ou prisão, aqui designado de

Conjunto de Princípios.

Captura designa o ato de reter uma pessoa sob suspeita da prática de um delito ou pela

ação de uma autoridade.

Detenção é a condição de manter qualquer pessoa privada de sua liberdade, exceto no

caso de condenação por um delito.

Prisão significa a condição de manter qualquer pessoa privada de sua liberdade como

resultado da condenação por um delito.

Autoridade judicial ou outra autoridade perante a lei cujo status e mandato

assegurem as mais sólidas garantias de competência, imparcialidade e independência.

Para saber mais: Conjunto de Princípios.

http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/legislacao-pfdc/docs sistem-prisional/coni princípios. pdf

Captura - Definição

Esclarecimento inicial

Utiliza-se o termo "captura" como tradução da palavra "arrest", em inglês, para

padronizar este curso aos instrumentos internacionais aqui referidos, e também para marcar a

distinção entre a captura da pessoa sob suspeita e a prisão da pessoa sentenciada.

O artigo 9, item 1, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) prescreve:

Ninguém será privado de [sua] liberdade exceto com base em e de acordo com os

procedimentos estabelecidos por lei. (PIDCP, artigo 9o, item 1)

Para que alguém seja capturado ou detido é necessário que os motivos estejam

claramente estabelecidos na legislação nacional ou não sejam contrários a ela.

O Conjunto de Princípios declara que captura, detenção ou prisão somente deverão ser

efetuados em estrita conformidade com os dispositivos legais e por encarregados

competentes (qualidade e a experiência) ou pessoas autorizadas para aquele propósito (Princípio 2).

Direitos no ato da captura

Sempre que uma pessoa for capturada, a razão deve ser pela suspeita da prática de um

delito ou por ação de uma autoridade (Conjunto de Princípios, Princípio 36.2).

Page 50: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

50

Toda pessoa capturada deverá ser informada, no momento de sua captura, das razões

da captura, devendo ser prontamente informada de qualquer acusação contra ela. (PIDCP, artigo

9.2, Conjunto de Princípios, Princípio 10)

A pessoa capturada deverá ser levada a um local de custódia, devendo ser

conduzida prontamente perante um juiz ou outra autoridade habilitada por lei a exercer poder

judicial, que decidirá sobre a legalidade e a necessidade da captura. (PIDCP, artigo 9.3, Conjunto de

Princípios, Princípios 11 e 37)

Não há uma definição clara do que se entende por prontamente. Em muitos Estados, o

período máximo permitido, antes que uma pessoa capturada seja trazida perante um juiz ou

autoridade similar é limitado a 48 horas. Há Estados em que esse período é limitado a 24 horas. Esse

período, de 48 ou 24 horas, é mais comumente chamado de custódia policial. O período que o segue é

chamado de prisão preventiva.

As autoridades responsáveis pela captura devem, no momento da captura, ou pouco

depois, prestar-lhe informação e explicação sobre os direitos e sobre o modo de os exercer.

(Conjunto de Princípios, Princípio 13)

Para proteger a situação especial das mulheres e das crianças e adolescentes existem

disposições adicionais a respeito de sua captura, detenção e prisão.

Aula 3 – Detenção

Esclarecimento inicial

Nos vários instrumentos de direitos humanos relativos à detenção, é feita uma distinção

entre aquelas pessoas que aguardam julgamento e aquelas que foram condenadas por um delito. O

primeiro grupo é chamado de detidos, e o segundo de presos. No entanto, essa distinção não é

aplicada uniformemente em todos os instrumentos. As Regras Mínimas para o Tratamento de Presos

(RMTP), embora aplicáveis a ambas as categorias, somente usam o termo presos e,

subsequentemente, os divide em presos não-condenados e condenados.

Independente da terminologia usada, a distinção entre pessoas condenadas e não-

condenadas é importante, pois os direitos que os indivíduos de cada um dos grupos tem não são

exatamente os mesmos, tampouco as normas para o tratamento de cada categoria.

É também importante observar que, como regra geral, os encarregados da aplicação da lei

policial somente serão responsáveis por (e exercer autoridade sobre) pessoas que ainda não foram

condenadas por um delito e que ficam um tempo curto em locais de detenção policial.

Instituições penais

Conforme exposto, a maioria dos Estados desenvolveu um sistema no qual os

encarregados da aplicação da lei policial não têm responsabilidade pelos presos condenados ou não

exercem autoridade sobre eles. Essa responsabilidade e autoridade são deixadas aos

encarregados da aplicação da lei, agentes penitenciários, que tenham recebido instrução e

treinamento especiais para o desempenho de suas funções.

Page 51: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

51

O treinamento dos policiais, geralmente, não os qualifica como pessoal competente para

exercer funções em instituições penais ou correcionais. Caso recebam essas funções, ao menos

treinamento e instruções adicionais serão necessários.

Como já visto, o instrumento básico que estabelece a boa prática no tratamento de presos

e na gestão de instituições penais é denominado Regras Mínimas para o Tratamento de Presos

(RMTP). Ele é dividido em duas partes:

1a parte - Normas de aplicação geral

2a parte - Normas aplicáveis a categorias especiais

1a parte: Normas de aplicação geral

A 1a parte é aplicável a todas as categorias de presos - homens ou mulheres,

menores ou adultos, criminais ou civis, julgados ou sem julgamento. Ela contém dispositivos a

respeito de uma série de matérias, incluindo:

Separação de categorias (Regra 8);

• Acomodação (Regras 9 a 14);

• Higiene pessoal (Regras 15 e 16);

• Vestimenta e roupas de cama (Regras 17 a 19);

• Comida (Regra 20);

• Exercício e esporte (Regra 21);

• Serviços médicos (Regras 22 a 26);

• Disciplina e punição (Regras 27 a 32);

• Instrumentos restritivos (Regras 33 e 34);

• Informações ao presos e queixas destes (Regras 35 e 36);

• Contato com o mundo externo (Regras 37 a 39);

• Livros (Regra 40);

• Religião (Regras 41 e 42);

• Retenção da propriedade dos presos (Regra 43);

• Notificação de morte, doença, transferência, etc. (Regra 44);

• Remoção de presos (Regra 45);

• Pessoal institucional (Regras 46 a 54); e

• Inspeção (Regra 55).

2a parte: Normas aplicáveis a categorias especiais

A 2a parte das RMTP identifica cinco categorias diferentes de presos:

A - Presos condenados;

B - Presos que sofrem de insanidade e doenças mentais;

C - Presos detidos ou aguardando julgamento;

D - Presos condenados a prisão civil; e

Page 52: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

52

E - Pessoas detidas ou presas sem acusação.

Saiba mais: Íntegra do texto das RMTP, também conhecido como Regras Mínimas para

Tratamento de Prisioneiros/Reclusos. ( http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/legislacao-pfdc/docs sistem-

prisional/regras minimas.pdf)

Uso da força e arma de fogo

Esse "poder" é de fundamental importância para o desempenho das atividades dos

encarregados pela aplicação da lei, por essa razão o Sistema de Educação ao Alcance de Todos

(SENAT) - SENASP desenvolveu um curso de EAD específico para os interessados em se aprofundar

no tema. Portanto, esta aula fará apenas a necessária abordagem para que você compreenda a

responsabilidade e extensão do uso da força e arma de fogo na atividade de Segurança Pública.

Uso da força

Como estudado, o artigo 3o, do CCEAL, fornece normas sobre o uso da força, nos

seguintes termos:

"Os funcionários encarregados pela aplicação da lei podem fazer uso da força quando

estritamente necessário e até a extensão requerida para o cumprimento de seu dever".

O parágrafo o., dos comentários, estabelece que o uso da força policial deveria ser

excepcional e que, enquanto a polícia faz uso de uma tal força dentro do razoavelmente

necessário, para a prevenção do crime, realização ou para a assistência à detenção legítima de

delinqüentes ou de cidadãos suspeitos, nenhuma outra força além dessa pode ser usada.

O parágrafo b. destaca que a lei nacional, normalmente, restringe o uso da força policial

de acordo com o princípio da proporcionalidade, e afirma que deve ser entendido que esses

princípios nacionais de proporcionalidade devem ser respeitados na interpretação daquele artigo.

O parágrafo c. dá ênfase ao uso de armas de fogo, que é o próximo tema a ser

estudado.

Uso da arma de fogo

O parágrafo c. indica que o uso de armas de fogo é considerado uma medida

extrema. Ele estabelece que, em geral, as armas de fogo não deveriam ser usadas, a não ser quando

um cidadão suspeito oferece uma resistência armada ou, ainda, coloca em risco a vida de outras

pessoas, e que medidas menos extremas não são suficientes para detê-lo ou apreendê-lo. O

mesmo parágrafo obriga a rápida apresentação de um relatório às autoridades competentes cada vez

que uma arma de fogo é utilizada pela polícia.

O terceiro parágrafo dos comentários exclui a utilização das armas de fogo por qualquer

outra razão que não seja a legítima defesa. O significado da exigência, como expressa naquele

parágrafo, pela qual um relatório deve ser apresentado quando uma arma de fogo é disparada por

um policial, é parte do processo para assegurar uma responsabilidade efetiva da polícia para com

seus atos. Não se trata de uma mera formalidade. É de fato um elemento importante na

Page 53: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

53

investigação obrigatória que segue uma morte causada por uma autoridade policial, e pode agir como

uma dissuasão contra o uso ilegítimo de armas de fogo pela polícia.

Como se verifica, o poder do uso da força e o emprego de armas de fogo pelos FEAL têm

implicações de grande alcance e profundidade e, por essa razão, foi elaborado um instrumento

internacional específico que estabelece princípios para seu emprego. Esse documento denominado

Princípios Básicos sobre o uso da Força e Armas de Fogo foi adotado pelo VIII Congresso das Nações

Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento de Infratores, em 7 de setembro de 1990. Saiba

mais...

Conclusão

Neste módulo, foram estudados os poderes de captura, detenção e o poder de uso da

força e arma de fogo.

Captura designa o ato de deter uma pessoa sob suspeita da prática de um delito ou pela

ação de uma autoridade.

Detenção é a condição de manter qualquer pessoa privada de sua liberdade, exceto no

caso de condenação por um delito.

O Conjunto de Princípios declara que captura, detenção ou prisão somente deverão ser

efetuados em estrita conformidade com os dispositivos legais e por encarregados competentes

(qualidade e a experiência) ou pessoas autorizadas para aquele propósito (Princípio 2).

O artigo 3o, do CCEAL, fornece normas sobre o uso da força, nos seguintes termos: Os

funcionários encarregados pela aplicação da lei podem fazer uso da força quando estritamente

necessário e até a extensão requerida para o cumprimento de seu dever.

Módulo 5 - Comando, gestão e investigação de violações de direitos humanos

Procedimentos de supervisão e revisão

Responsabilidades dos órgãos encarregados da aplicação da lei

A função de aplicação da lei compreende uma larga gama de serviços.

No desempenho de seu serviço público, os funcionários encarregados pela aplicação da lei

têm um alto grau de responsabilidade individual, pois devem tomar decisões difíceis, inclusive sobre

questões de vida ou morte, na maioria das vezes por sua própria conta.

Em situações reais, suas decisões imediatas não são orientadas por um superior

hierárquico que lhes dá a ordem e, sim, orientadas por seu próprio juízo e pelos princípios de

legalidade, necessidade e proporcionalidade.

Princípios, como a aplicação de meios pacíficos antes do uso da força e emprego de níveis

mínimos de força em qualquer circunstância, são fundamentais para o policiamento. Considerando

esses princípios e a concentração da força, explícita ou implícita, para o policiamento; considerando

a natureza do policiamento com suas incertezas e seus perigos; e considerando a importância do

Page 54: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

54

policiamento na sociedade, é claro que o poder do uso da força só poderia ser atribuído àquelas

pessoas qualificadas para exercê-la convenientemente. Isso implica uma seleção extremamente

rigorosa e processos de treinamento, um comando efetivo, um controle e uma supervisão dos

policiais pelos seus superiores, e uma estrita responsabilidade da polícia frente à lei quando há abuso

de poder. (VIANNA, 2000)

Os órgãos encarregados pela aplicação da lei e aqueles em função de comando devem

dar ênfase especial aos aspectos: Contratação e seleção e Educação e a formação.

Contratação e seleção

É necessário que se estabeleçam os perfis físicos e psicológicos mínimos para seleção e

contratação dos funcionários encarregados pela aplicação da lei, em conformidade com as funções

que devem desempenhar.

Educação e a formação

É necessário garantir uma grande qualidade e velar para que estejam em consonância com

as normas internacionais de direitos humanos. Além do que, deve-se continuamente examinar os

procedimentos de aplicação da lei, lembrando que o artigo 2o, do Código de Conduta dos Funcionários

Encarregados pela aplicação da lei, estabelece que:

• Os funcionários encarregados pela aplicação da lei têm o dever de respeitar e

proteger a dignidade humana e manter e defender os direitos humanos de todas as pessoas.

• Também é de fundamental importância que cada funcionário encarregado pela

aplicação da lei passe por exames e avaliações periódicas, para que se verifiquem suas condições

físicas e psíquicas adequadas para o desempenho de suas funções.

Prestação de contas

Os cidadãos têm direito de pedir aos órgãos encarregados pela aplicação da lei que

prestem contas de seus trabalhos e do desempenho de suas funções. Portanto, esses órgãos devem

registrar, analisar e avaliar seus próprios desempenhos e dar conhecimento das conclusões aos

cidadãos.

Cabe distinguir três níveis de prestação de contas dos órgãos encarregados pela

aplicação da lei e seus membros:

1. Prestação de contas no plano Internacional aplicável aos governos dos países;

2. Prestação de contas a um órgão externo pelas práticas dos órgãos encarregados pela

aplicação da lei; e

3. Prestação de contas no plano interno dos órgãos encarregados pela aplicação da lei.

Os três níveis de prestação de contas têm a finalidade de assegurar que a prática de

aplicação da lei está em conformidade como os princípios de legalidade, necessidade e

proporcionalidade.

1. Prestação de contas no plano internacional aplicável aos governos dos países

Trata de situações que dentro de um território de um Estado revelem um quadro

Page 55: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

55

persistente de violações graves constantes de direitos humanos.

Ainda que essas violações sejam cometidas por agentes individuais de ordem pública, a

comunidade internacional considera responsável o Estado. Mas, a ação de um funcionário encarregado

pela aplicação da lei pode ter repercussões internacionais.

2. Prestação de contas a um órgão externo pelas práticas dos órgãos encarregados

pela aplicação da lei

Em uma sociedade, os órgãos encarregados pela aplicação da lei fazem parte de um

sistema maior que compreendem a comunidade, as autoridades locais e o poder judicial.

De uma maneira ou de outra, os órgãos encarregados pela aplicação da lei devem prestar

contas a esses outros interlocutores. A prestação de conta pode ser direta ou indireta.

As instituições que enviam recursos de apoio aos órgãos encarregados pela aplicação da lei

têm direito a opinar sobre a forma que se utilizam os recursos, as demais autoridades locais

participam nas políticas de aplicação da lei.

Outra pressão evidente são as queixas derivadas da comunidade. Na prática, as queixas

oficiais sobre a atuação desses funcionários podem influenciar de maneira determinante nas

estratégias e planos de aplicação da lei.

No processo de prestação de contas deve-se ter em conta todos os interessados que

formam o entorno da aplicação da lei.

Os governos e os órgãos encarregados da aplicação da lei deverão estabelecer

procedimentos eficazes de comunicação e revisão aplicáveis a todos os incidentes em que morte ou

ferimento for causado pelo uso da força e armas de fogo pelos encarregados da aplicação da lei; os

encarregados da aplicação da lei fizerem uso de armas de fogo no desempenho de suas funções.

(Rover, 2005)

Para os incidentes registrados de acordo com esses procedimentos, os governos e os

órgãos encarregados da aplicação da lei deverão assegurar que:

• Haja um processo eficaz de revisão disponível;

• Autoridades administrativas ou de promotoria independentes tenham condições de

exercer jurisdição nas circunstâncias apropriadas;

• Nos casos de morte, ferimento grave ou outras conseqüências sérias, um relatório

pormenorizado seja prontamente enviado às autoridades competentes responsáveis pelo controle e

avaliação administrativa e judicial (PB 22);

• As pessoas afetadas pelo uso da força e armas de fogo ou seus representantes legais

tenham acesso a um processo independente, incluindo um processo judicial; e

• Em caso de morte desses indivíduos, essa disposição aplica-se a seus dependentes (PB

23).

3. Prestação de contas no plano interno dos órgãos encarregados pela aplicação da lei

Diz respeito à responsabilidade individual de cada integrante desses órgãos relativa às

Page 56: Apostila Completa Direito Humanos CFS 2011

56

suas ações lícitas ou arbitrárias, com relação ao desempenho de suas funções. Inclusive quando

cumprem ordens de seus superiores, os funcionários encarregados de aplicação da lei são

responsáveis pelos seus atos.

Caso um funcionário encarregado pela aplicação da lei constate que uma ordem é ilegal e

tem a possibilidade razoável, por mínima que seja de negar-se a acatá-la, não está obrigado a

cumpri-la.

Em qualquer caso, os superiores que dão a determinação são plenamente responsáveis

se sabem (deveriam saber), que os agentes sob seu comando recorrem a práticas ilícitas ou arbitrárias.

Em tais casos, os superiores têm a obrigação de tomar todas as medidas à sua

disposição para impedir, eliminar ou denunciar essas práticas.

Responsabilidade dos encarregados da aplicação da lei

Os governos e os órgãos encarregados da aplicação da lei deverão assegurar que os oficiais

superiores sejam responsabilizados, caso:

Fique provado ou presumido, terem tido conhecimento de que encarregados sob o seu

comando estão, ou tenham estado, recorrendo ao uso ilegítimo de força e armas de fogo, e não

tenham tomado todas as providências a seu alcance a fim de impedir, reprimir ou comunicar tal

uso. (Princípios Básicos PB - 24)

Os governos e os órgãos de aplicação da lei deverão assegurar que não seja imposta

qualquer sanção criminal ou disciplinar aos encarregados da aplicação da lei que, de acordo com o

Código de Conduta para os encarregados pela aplicação da lei e esses princípios:

• Se recusarem a cumprir uma ordem [ilegal] para usar força ou armas de fogo; ou

• Comuniquem tal uso [ilegal] realizado por outros encarregados. (PB25)

Obediência a ordens superiores não será nenhuma justificativa quando os policiais:

• Tenham conhecimento de que uma ordem para usar força e armas de fogo que tenha

resultado em morte ou ferimento grave de alguém foi manifestamente ilegítima; e

• Tiveram oportunidade razoável para se recusar a cumpri-la.

Nessas situações, a responsabilidade caberá também ao superior que tenha dado as

ordens ilegítimas.

O que é deixado claro pelos Princípios Básicos sobre o uso da Força e de Armas de Fogo

para os Funcionários Encarregados pela Aplicação da Lei é que a responsabilidade cabe tanto

aos encarregados envolvidos em um incidente particular com o uso da força e armas de fogo,

como a seus superiores. Esses princípios afirmam que os chefes têm o dever de zelo sem que

isso retire a responsabilidade individual dos encarregados por suas ações.

O relacionamento existente entre essas disposições e as disposições sobre o uso

indevido de força e armas de fogo (PB 7 e 8) deve ser compreendido pelos encarregados pela

aplicação da lei.

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Mecanismos de queixa

Os cidadãos que consideram que foram vítimas de procedimentos arbitrários ou abusivos

por parte de um funcionário encarregado pela aplicação da lei, devem ter a possibilidade de

apresentar uma queixa.

O artigo 9, item 5, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, estabelece que

as vítimas têm direito de reparação.

Muitos países possuem mecanismos e recursos para tratar das queixas de seus cidadãos.

Esses recursos vão desde as comissões internas de remissão até serviços especiais. Sejam quais forem

os mecanismos existentes em um país, as queixas sobre o trabalho dos funcionários encarregados

pela aplicação da lei são sempre um assunto delicado. Para um agente não é fácil encarar críticas

de um cidadão, que é considerado como uma pessoa de fora. A resistência coletiva por parte dos

agentes de uma determinada organização encarregada pela aplicação da lei em receber queixas

oriundas dos cidadãos é muito comum e, às vezes, vêem essas reclamações de modo muito

questionável. Por essa razão, os superiores e função de comando devem levar em conta todas as

queixas e investigá-las de maneira pronta, completa e imparcialmente. Além disso, deve orientar a

seus subordinados de que todos os cidadãos têm direito de apresentar queixas.

Como já estudado, em sistema democrático os órgãos encarregados pela aplicação da

lei devem prestar contas sobre suas atividades.

Ao final desse tema, caberá estudar os Princípios Orientadores para a aplicação efetiva

do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (24/5/1989)

adotados por ocasião da 15a sessão plenária, do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas,

que prevê várias providências, dentre as quais se destacam:

B. Questões específicas

1. Seleção, educação e formação. Deve ser dada uma importância primordial à seleção,

educação e formação dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei. Os governos devem,

igualmente, promover a educação e a formação através da frutuosa troca de idéias em nível regional e

inter-regional.

2. Remuneração e condições de trabalho. Todos os funcionários responsáveis pela

aplicação da lei devem ser satisfatoriamente remunerados e beneficiados de condições de trabalho

adequadas.

3. Disciplina e supervisão. Devem ser estabelecidos mecanismos eficazes para assegurar

a disciplina interna e o controle externo, assim como a supervisão dos funcionários responsáveis pela

aplicação da lei.

4. Queixas de particulares. Devem ser adotadas disposições especiais, no âmbito dos

mecanismos previstos pelo parágrafo 3, para o recebimento e tramitação de queixas

formuladas por particulares contra os funcionários responsáveis pela aplicação da lei,

e a existência dessas disposições será dada a conhecer ao público.

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Investigação de violações de direitos humanos

Violações de direitos humanos

As violações aos direitos humanos são violações das normas pertinentes do direito penal

(âmbito nacional) e/ou do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Num sentido legal restrito, os direitos humanos podem ser violados somente quando

o ato ou omissão é imputável ao Estado.

Como funcionário encarregado pela aplicação da lei, você deve oferecer proteção e

assistência a todas as vitimas de delitos. Entretanto, isso não se limita a situações em que cidadãos

são vítimas de outros cidadãos. Contraditoriamente, os funcionários encarregados pela aplicação da

lei, em virtude de suas atividades profissionais são sujeitos ao abuso de poder e, em consequência

disso, cometem graves violações de direitos humanos.

As vítimas de violações de direitos humanos merecem atenção especial já que a

responsabilidade de seus atos recai sobre o Estado. Vale dizer que as violações cometidas por um

funcionário público comprometem a relação entre o Estado e a comunidade. Até os eventos isolados

podem comprometer a imagem dos órgãos encarregados pela aplicação da lei. É necessário considerar

que se os cidadãos não confiam na polícia, não irão prestar seu apoio e assistência aos funcionários

encarregados pela aplicação da lei. Portanto, a prevenção desses incidentes é de grande

importância.

Quando se constatam violações de direitos humanos, os superiores em função de comando

têm a obrigação de dar uma atenção especial às vítimas e assegurar para que haja uma investigação

completa, pronta e imparcial.

Recursos da jurisdição nacional

Os Estados Partes que assinaram a Convenção de Genebra têm obrigação de garantir que

toda pessoa, cujos direitos tenham sido violados, possa interpor recurso efetivo, principalmente,

quando tal violação tenha sido cometida por pessoas que atuavam em exercício de suas funções

oficiais.

Os Estados Partes têm a obrigação de submeter tais atos ou omissões a um controle

judicial, assim como de proteger as vítimas dos mesmos. Se essas violações de direitos humanos já

estiverem previstas na legislação penal nacional, as medidas devem ser tomadas em âmbito da

jurisdição nacional.

Alguns países adotam mecanismos de controle externo para captação de queixas através

de um defensor do povo, também conhecido como "ombudsman" ou "ouvidor", que recebem as

reclamações individuais, atuam como mediador imparcial e propõem medidas às organizações

encarregadas da aplicação da lei.

Alguns Estados Partes também têm um acompanhamento e controle sobre as violações

de direitos humanos feitas através do Poder Legislativo, onde se instalam comissões sobre o tema.

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Recursos da jurisdição internacional

No plano internacional, os Estados Partes podem ter que responder pelas suas

práticas no campo dos direitos humanos, através de uma larga variedade de mecanismos

jurídicos, quase-jurídicos e políticos, incluindo processos de queixas individuais estabelecidas

amparadas em alguns tratados sobre direitos humanos.

As queixas individuais dirigidas a um dos corpos que controlam os tratados podem

ser processadas somente quando o Estado, em questão, tenha aceitado a competência desse

corpo para receber e considerar essas comunicações. Todos os recursos possíveis em nível

nacional devem estar já esgotados.

Como você já estudou, os recursos nacionais compreendem procedimentos

legais, quer se trate de procedimentos penais ou civis, arbitragem ou mecanismos de

conciliação, um intermediário nacional ou uma comissão de direitos humanos.

Mecanismos de queixa internacional oferecem uma plataforma internacional e

estão lastreados em instrumentos de direitos humanos que contêm disposições relativas às

comunicações interestatais, tais como:

• Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP);

• Convenção Contra a Tortura (CCT); e

• Convenção Internacional sobre todas as Formas de Discriminações Raciais

(CEDR).

Entretanto, só podem receber comunicações dos Estados aqueles que reconhecem

a competência do:

• Comitê de Direitos Humanos;

• Comitê Contra a Tortura; e

• Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial.

Esses comitês têm a função de mediação e conciliação. O que se pretende é que os

governos prestem conta em matéria internacional de direitos humanos.

Os órgãos de aplicação das leis têm um dever, baseado no direito nacional e nas

obrigações dos Estados, em face das leis internacionais, de investigar prontamente as violações dos

direitos humanos rapidamente, completamente e imparcialmente.

O estabelecimento de procedimentos de controle e de revisão é indispensável para

garantir que os funcionários que aplicam as leis possam prestar contas individualmente.

A importância de assegurar o fim dos abusos de poder no uso da força precisa ser

enfatizada. A violência policial, no entanto, pode resultar em sérias violações do direito à vida. Além

disso, ela exacerba as dificuldades e os perigos do policiamento, já bastante difícil e perigoso em si

mesmo, por causa das reações imediatas e de longa duração que provoca. A violência policial

ilegítima pode levar a uma séria desordem pública, à qual a polícia tem, então, que responder,

podendo assim expô-la a situações perigosas e desnecessárias, fazendo com que ela se torne mais

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vulnerável aos contra-ataques, conduzindo a uma falta de confiança na própria polícia por parte da

comunidade - o que se torna prejudicial a um policiamento efetivo. (Vianna, 2000)

É muito aconselhável que seja visitado o site da Secretaria Especial de Direitos

Humanos ( http://www.sedh.gov.br/ ) conhecendo os recursos e instrumentos disponíveis para a

investigação das violações de direitos humanos.

Conclusão

Neste módulo verificamos as responsabilidades dos encarregados e dos órgãos

encarregados pela aplicação da lei.

Os funcionários que aplicam a lei têm o dever de respeitar e proteger a dignidade humana

e manter e defender os direitos humanos de todas as pessoas. Cabe aos órgãos investirem em

procedimentos que auxiliem para que a atuação dos seus servidores ocorra dentro dos limites legais,

éticos e técnicos.

As violações dos direitos humanos são violações das normas pertinentes do direito penal

(âmbito nacional) e/ou do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Num sentido legal restrito, os

direitos humanos podem ser violados somente quando o ato ou omissão é imputável ao Estado.

Quando se constatam violações de direitos humanos, os superiores em função de comando

têm a obrigação de dar uma atenção especial às vítimas e assegurar para que haja uma investigação

completa, pronta e imparcial.

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