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4 NOÇÕES DE ANATOMIA DA MADEIRA 1. INTRODUÇÃO A madeira é um organismo heterogêneo for- mado por um conjunto de células com propriedades especificas para desempenhar as seguintes fun- ções: condução da água; armazenamento e transformação de substâncias nutritivas; crescimento; suporte da árvore. A anatomia da madeira é o estudo dos diver sos tipos de células que compõem o lenho (xilema secundário), suas funções, organização e peculiari- dades estruturais com o objetivo de: conhecer a madeira visando um emprego correto; identificar espécies; predizer utilizações adequadas de acordo com as características da madeira; prever e compreender o comportamento da madei- ra no que diz respeito a sua utilização. Principais características da madeira: faz parte diariamente de nossas vidas seja sólida, compensados, mdf, painéis, fósforos, etc; é uma estrutura celular, possuindo condutores ± ci- líndricos a base de celulose e adesivo natural (lig- nina); é ortotrópica: apresenta 3 direções com proprieda- des distintas entre si; é higroscópica: adquire e perde umidade em fun- ção das variações de temperatura e umidade rela- tiva do ar; é heterogênea e variável, por ser biológica, apre- sentar condições de crescimento variáveis, possuir nós, apresentar alburno e cerne; é biodegradável; é combustível; é durável na ausência de xilófagos; é um bom isolante térmico, mal condutora de calor. O tijolo conduz 6 vezes mais, o concreto 15, o aço 390, o alumínio 1700 vezes; é um excepcional material de construção: fácil de trabalhar com ferramentas simples, para massa igual é mais resistente que o aço na flexão (2,6:1), mais resistente ao impacto, absorve 9 vezes mais vibrações. Preferível ao aço e concreto nas cons- truções à prova de terremotos. 2. GRUPOS VEGETAIS QUE PRODUZEM MADEIRA Duas grandes divisões são de interesse da anatomia da madeira por produzirem xilema secun- dário. Apresentando marcantes diferenças estrutu- rais, as gimnospermas e as angiospermas estão bo- tanicamente separadas em grupos distintos. 2.1. Divisão Gimnospermae Vulgarmente as gimnospermas são conheci- das como coníferas (softwood), porém constituem apenas um grupo dentro dessa divisão. Apresentam folhas geralmente com formato de escamas ou agu- lhas, geralmente perenes e resistentes aos invernos rigorosos. Possuem estróbilos unissexuais (cones). As sementes nuas, não são incluídas em ovários. Classe Ordem Família Cycadopsida Cycadales Cycadaceae Ginkgoales Ginkgoaceae Taxopsida Taxales Taxaceae Chlamydospermae Gnetales Welwitschiaceae Ephedraceae Gnetaceae Coniferopsida Coniferae Pinaceae Taxodiaceae Cupressaceae Podorcapaceae Araucariaceae São de clima frio de zonas temperadas e fri- as, porém existem espécies tropicais. Exemplos: Pinho - Pinus spp Cipreste - Cupressus spp Sequoia - Sequoia washingtoriana Pinheiro do Paraná - Araucaria angustifolia Pinheiro bravo - Podocarpus lambertii Pinheiro bravo - Podocarpus sellowii 2.2. Divisão Angiospermae Classe Dicotyledoneae São conhecidas como folhosas (hardwood). Apresentam flores comuns e sementes dentro de frutos, além de folhas comuns, largas, geralmente caducas. De sementes protegidas por carpelos, ao germinarem apresentam duas folhas ou cotilédones. Das milhares de espécies existentes, temos como exemplo a aroeira, pau d’arco, sucupira, cedro, mogno, pau Brasil, casuarina, brauna, freijó, etc. Além das diferenças botânicas assinaladas, a estrutura anatômica de suas madeiras é comple- tamente distinta. 3. ESTRUTURA MACROSCÓPICA DO TRONCO Com exceção do câmbio e a maioria dos raios, em um corte transversal de um tronco as seguintes estruturas se destacam (Figura 01): 3.1. Córtex (L: cortex = casca) Porção mais externa do caule ou da raiz. É composta por uma camada exterior morta ou inativa (ritidoma) cuja espessura varia com a espécie e a idade, e, por uma camada interior viva (floema). Têm importância na identificação de espécies vivas e protege o tronco contra agentes do meio (varia- ções climáticas, ataque de fungos, fogo, resseca- mento e injúrias mecânicas). As cascas de algumas espécies são exploradas comercialmente, tais como

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4NOÇÕES DE ANATOMIA DA MADEIRA

1. INTRODUÇÃO

A madeira é um organismo heterogêneo for- mado por um conjunto de células com propriedades especificas para desempenhar as seguintes fun- ções: ⋅ condução da água; ⋅ armazenamento e transformação de substâncias nutritivas; ⋅ crescimento; ⋅ suporte da árvore.

A anatomia da madeira é o estudo dos diver sos tipos de células que compõem o lenho (xilema secundário), suas funções, organização e peculiari- dades estruturais com o objetivo de: ⋅ conhecer a madeira visando um emprego correto; ⋅ identificar espécies; ⋅ predizer utilizações adequadas de acordo com as características da madeira; ⋅ prever e compreender o comportamento da madei- ra no que diz respeito a sua utilização.

Principais características da madeira: ⋅ faz parte diariamente de nossas vidas seja sólida, compensados, mdf, painéis, fósforos, etc; ⋅ é uma estrutura celular, possuindo condutores ± ci- líndricos a base de celulose e adesivo natural (lig- nina); ⋅ é ortotrópica: apresenta 3 direções com proprieda- des distintas entre si; ⋅ é higroscópica: adquire e perde umidade em fun- ção das variações de temperatura e umidade rela- tiva do ar; ⋅ é heterogênea e variável, por ser biológica, apre- sentar condições de crescimento variáveis, possuir nós, apresentar alburno e cerne; ⋅ é biodegradável; ⋅ é combustível; ⋅ é durável na ausência de xilófagos; ⋅ é um bom isolante térmico, mal condutora de calor. O tijolo conduz 6 vezes mais, o concreto 15, o aço 390, o alumínio 1700 vezes; ⋅ é um excepcional material de construção: fácil de trabalhar com ferramentas simples, para massa igual é mais resistente que o aço na flexão (2,6:1), mais resistente ao impacto, absorve 9 vezes mais vibrações. Preferível ao aço e concreto nas cons- truções à prova de terremotos. 2. GRUPOS VEGETAIS QUE PRODUZEM MADEIRA

Duas grandes divisões são de interesse da anatomia da madeira por produzirem xilema secun- dário. Apresentando marcantes diferenças estrutu- rais, as gimnospermas e as angiospermas estão bo- tanicamente separadas em grupos distintos.

2.1. Divisão Gimnospermae Vulgarmente as gimnospermas são conheci- das como coníferas (softwood), porém constituem

apenas um grupo dentro dessa divisão. Apresentam folhas geralmente com formato de escamas ou agu- lhas, geralmente perenes e resistentes aos invernos rigorosos. Possuem estróbilos unissexuais (cones). As sementes nuas, não são incluídas em ovários.

Classe Ordem Família Cycadopsida Cycadales Cycadaceae Ginkgoales Ginkgoaceae Taxopsida Taxales Taxaceae Chlamydospermae Gnetales Welwitschiaceae Ephedraceae Gnetaceae Coniferopsida Coniferae Pinaceae Taxodiaceae Cupressaceae Podorcapaceae Araucariaceae São de clima frio de zonas temperadas e fri- as, porém existem espécies tropicais. Exemplos: Pinho - Pinus spp Cipreste - Cupressus spp Sequoia - Sequoia washingtoriana Pinheiro do Paraná - Araucaria angustifolia Pinheiro bravo - Podocarpus lambertii Pinheiro bravo - Podocarpus sellowii 2.2. Divisão Angiospermae Classe Dicotyledoneae São conhecidas como folhosas (hardwood). Apresentam flores comuns e sementes dentro de frutos, além de folhas comuns, largas, geralmente caducas. De sementes protegidas por carpelos, ao germinarem apresentam duas folhas ou cotilédones. Das milhares de espécies existentes, temos como exemplo a aroeira, pau d’arco, sucupira, cedro, mogno, pau Brasil, casuarina, brauna, freijó, etc. Além das diferenças botânicas assinaladas, a estrutura anatômica de suas madeiras é comple- tamente distinta. 3. ESTRUTURA MACROSCÓPICA DO TRONCO

Com exceção do câmbio e a maioria dos raios, em um corte transversal de um tronco as seguintes estruturas se destacam (Figura 01):

3.1. Córtex (L: cortex = casca) Porção mais externa do caule ou da raiz. É composta por uma camada exterior morta ou inativa (ritidoma) cuja espessura varia com a espécie e a idade, e, por uma camada interior viva (floema). Têm importância na identificação de espécies vivas e protege o tronco contra agentes do meio (varia- ções climáticas, ataque de fungos, fogo, resseca- mento e injúrias mecânicas). As cascas de algumas espécies são exploradas comercialmente, tais como

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Figura 01. Seção transversal típica de um tronco. a do carvalho na fabricação de cortiça (Fig. 02), acácia negra, barbatimão, angico vermelho, angico preto, angico branco, etc., na produção de taninos. Enfim, em inúmeras outras utilizações, como alimen to para gado, extensores para colas, fármacos, perfumaria, etc. 3.2. Raios Originários das iniciais radiais do câmbio, tendo número e aspecto constante num mesmo gênero de árvores. Varia de uma a quinze células

de largura e de algumas células a vários centíme- tros de altura. Porção de parênquima que percorre as linhas radiais cuja função é armazenar e transpor tar horizontalmente substâncias nutritivas. Suas célu las como as demais células parenquimáticas, pos- suem uma longevidade maior que a dos outros elementos anatômicos. Apresentam uma grande riqueza de detalhes quando observados nos cortes radial e tangencial, constituindo elementos importan tes na identificação de espécies.

Figura 02. Árvore de Carvalho, produtora de cortiça. 3.3. Alburno (Latin alburnu = branco) Porção externa, funcional do xilema, geral- mente clara (Fig. 03). Possui células vivas e mortas. Tem como função principal a condução ascendente de água ou seiva bruta nas camadas externas próxi- mas ao câmbio; também armazena água e substân cias de reserva tais como amido, açucares, óleos e proteínas, e produz tecidos ou compostos defensi- vos em resposta as injúrias. Sua permeabilidade é facilitada pela presença de pontuações funcionais não incrustadas. Sua largura varia entre espécies e dentro da espécie devido a idade e fatores genéti-

cos e ambientais. Há uma forte relação positiva en- tre a quantidade de alburno e a quantidade de fo- lhas na árvore. Possui mecanismos de defesa ativo e passivo contra os xilófagos: o ativo é induzido por ataque ou ferimento e o passivo é produzido antes da infecção. Contêm poucos extrativos tóxicos e geralmente é susceptível ao apodrecimento. Aceita bem tratamentos com preservativos e para melho rar suas características tecnológicas. A “zona de transição” entre alburno e cerne – não aparente em todas as espécies – é uma cama da estreita de coloração pálida, circundando regiões

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6de cerne e injuriadas. Frequentemente possui célu- las vivas, é destituída de amido, é impermeável a líquidos, com umidade mais baixa que o alburno e algumas vezes também a do cerne.

Figura 03. Diferentes tipos e proporções de alburno e cerne na madeira. 3.4. Cerne É a camada interna e mais antiga do lenho, desprovida de células vivas e materiais de reserva. Em algumas espécies difere do alburno pela cor mais escura, baixa permeabilidade e aumento da durabilidade natural. Há apenas mecanismo de defe sa passiva contra os xilófagos, proveniente do arma zenamento de extrativos. Fornece suporte estrutu- ral, otimiza o volume do alburno e mantém o ambien te. O volume do cerne é cumulativo, o de alburno não. Ou seja, a proporção de cerne aumenta com a idade.

As células de suporte e condução morrem após alguns dias de formadas. As camadas internas perdem gradativamente sua atividade fisiológica e a atividade parenquimática gradualmente declina ao afastar-se do câmbio. Toxinas – subprodutos do metabolismo – podem provocar a morte das células parenquimáticas. Este evento – a morte completa do parênquima – marca o início do processo de transformação de alburno para cerne, denominado cernificação. Ao morrerem as células parenquimá- ticas, as substâncias de reserva são em parte removidas ou polimerizam formando resinas, coran- tes, óleos, compostos fenólicos, taninos, gorduras e outros químicos, que impregnam pontuações e paredes ou deposita-se nos lumens das células proporcionando ao lenho durabilidade e coloração. O resultado da alteração do alburno nesse processo recebe o nome de cerne. O início da cernificação varia entre as espé- cies. No eucalipto inicia-se aos 5 anos, nos pinus entre 14 e 20 anos e há espécies iniciando após os 80 anos ou mais. A velocidade do processo de cernificação também varia com a espécie.

A resistência da madeira não é essencial- mente afetada pela cernificação, pois nenhuma célu

la é adicionada, retirada ou sofre modificação ana- tômica no processo.

Considerando o tronco um cilindro, ocorrem elevadas tensões de compressão e tração nas ca-madas externas, donde se conclui que o cerne é menos importante que o alburno no suporte estrutu- ral. De fato, troncos ocos de árvores antigas persis- tem por vários anos. No entanto o alburno é insufici- ente na sustentação dessas árvores e o cerne provi- dencia a necessária resistência a compressão: árvo- res ocas tombam quando a camada externa de ma- deira é inferior a 1/3 do raio total. No entanto, evidên- cias demonstram que o cerne possui pouca ou míni- ma contribuição mecânica em espécies com alburno relativamente espesso.

Variação de cerne numa espécie ocorre devi do a idade da árvore, tratos silviculturais, vigor da árvore, estrutura anatômica, geadas, doenças, polui ção, taxa de crescimento, site, controle genético, etc.

A cernificação não é inteiramente conheci-da, embora alguns eventos sejam evidentes (morte do parênquima e formação de extrativos) e outros, efêmeros. Entre as alterações observadas na cernifi cação da madeira, algumas não respondem suficien temente a variação dos modelos de formação do cerne. As modificações são as seguintes: · morte do parênquima · formação de extrativos · alteração no teor de umidade; ressecamento · degeneração dos núcleos dos parênquimas · decréscimo de substâncias nitrogenadas · produção e acúmulo de gases (etileno e CO2) · obstrução da pontuação · remoção ou acúmulo de nutrientes (K, Mg, Ca, etc) · redução dos compostos armazenados · atividade enzimática

A cernificação é acompanhada de um au- mento no conteúdo e no acúmulo abrupto ou gradu- al de extrativos. Os extrativos formam-se na “zona de transição” ou no limite alburno/cerne a partir da disponibilidade de compostos locais e outros deloca dos desde o floema e alburno. Compostos fenólicos são produzidos e armazenados na “zona de transi- ção” ou seus precursores são acumulados no albur- no e depois transformados na “zona de transição”. Os extrativos podem impregnar a parede celular, ini- ciando na lamela média e, posteriormente, na pare- de secundária. Os extrativos estão localizados majo ritariamente nos raios. Há evidências de íntimas associações químicas entre extrativos e componen-tes estruturais da parede, porém a formação dos compostos do cerne difere do processo de lignifica- ção.

A quantidade de extrativos no cerne aumen- ta em direção ao alburno, consequentemente a ida- de da árvore influencia no conteúdo de extrativos. O baixo padrão quali e ou quantitativo de extrativos próximos a medula reflete a degradação dos mes- mos com o tempo ou no incremento da deposição com a idade. O exterior do cerne é mais durável na base da árvore e está associado com o decréscimo de extrativos em direção a medula e altura da copa. Madeira de reação possui quantidades mais baixas de extrativos em comparação à normal.

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7A presença de extrativos no cerne pode:

· reduzir a permeabilidade: torna-o lento durante a secagem e dificulta a impregnação com preservan tes químicos; · aumentar a estabilidade dimensional em condições de umidade variável; · aumentar ligeiramente o peso; · ser tóxico aos organismos xilófagos, aumentando a durabilidade da madeira; · consumir mais químicos no branqueamento da pol- pa de celulose; · corroer metais (taninos); · interferir na aplicação de tintas, vernizes e colas · apresentar coloração agradável.

Em algumas folhosas, associada a for- mação do cerne, observa-se a ocorrência de tiloses, obstrução dos lumens dos vasos por tilos (Fig. 04). Tilos são expansões de células parenquimáticas que penetram nos vasos adjacentes através das pontuações, podendo obstruir os lumens total ou parcialmente, além do fechamento das pontuações; formam-se quando a pressão no lúmen do parên- quima projeta sua parede para o interior da cavida- de do vaso. Os tilos possuem paredes finas ou espessas, pontuadas ou não e conter ou não amido, cristais ou gomo-resinas. Tilos esclerosados apre- sentam parede espessa, laminada e lignificada, com pontuações simples coalescentes.

As tiloses integram a estratégia de defesa da árvore ao reduzir a quantidade de ar e umidade,

dificultar o movimento de xilófagos pelos vasos e permitir o acúmulo de extrativos, evitando serem diluídos pelo fluxo da transpiração.

Ferimentos externos podem estimular a formação de tilos visando bloquear a penetração de ar na coluna ascendente de líquidos, como também a degradação das membranas das pontuações por fungos. Excepcionalmente, tilos podem ser observa- dos em fibras com pontuações grandes (algumas lauráceas e Magnoliáceas).

Nas folhosas, o fator determinante da perme abilidade da madeira é a presença ou não de tilo- ses. Os tilos são importantes na identificação e prin- cipalmente na utilização da madeira, por aumen- tarem a densidade dentro de certos limites e dificul- tarem a secagem, a impregnação com preser- vantes ou estabilizantes químicos e a infiltração de licores na polpação pois obstruem os caminhos naturais da circulação de líquidos. Tilos são também encontrados em coníferas: ocorrem nos traqueóides axiais de espécies que apresentam pontuações do campo de cruzamento fenestriforme, resultado de injúrias mecânicas, infecções ou estímulo químico.

É comum encontrar no cerne das coníferas, canais resiníferos obstruídos pela dilatação das células epiteliais que o circundam, fenômeno conhe- cido por tilosóide. Em conseqüência, a resina é expelida dos mesmos, impregnando os tecidos adjacentes.

Figura 04. Lúmen de um vaso invadido por tilos: (X) - Seção transversal; (T) – seção axial tangencial. Pontuações areoladas são conexões entre células condutoras do xilema. Nas coníferas e em algumas folhosas o centro da membrana da pontua- ção possui um espessamento denominado torus (Fig. 05 e 06). Torus vem a ser o engrossamento da parede primária no centro da circulação, formando uma espécie de pastilha achatada que funciona co- mo válvula, regulando o fluxo de líquidos através da pontuação. Quando o torus torna-se mais ou me- nos inativo move-se para um dos lados da pontu- ação, esta é dita aspirada e, o torus muitas vezes encontra-se irreversivelmente aderido por extrativos (Fig. 07). Esta posição bloqueia a passagem e a circulação de líquidos. A aspiração aumenta em dire ção ao cerne.

Figura 05. Pontuação areolada: a – funcional, permite a passagem de líquidos (seta); b – aspirada, to- rus obstrui a circulação de fluidos; c – Vista frontal do torus no centro do margo.

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Figura 06. Pontuações intervasculares com torus.

Figura 07. Pontuações areoladas funcional e aspirada.

Embora ocorra no cerne, pontuações aspi radas podem acontecer no alburno, constituindo um recurso da árvore para impedir a penetração de ar na coluna ascendente de líquidos em caso de ferimento.

Independente da aspiração, pontuações também são incrustadas por extrativos, obstruindo-as. Pontuações aspiradas e ou incrustadas, caracte ristica do cerne, reduz o movimento de fungos e a umidade na madeira, presumidamente criando con- dições menos propícias à degradação.; Quando o cerne não se destaca do alburno pela coloração mais intensa, pode existir fisiologica- mente. Neste caso, é chamado de cerne fisiológico. Existem espécies com ausência absoluta de cerne.

3.5. Medula Parênquima que ocupa a parte central do tronco. Tem a função de armazenar substâncias nu- tritivas. Seu papel é especialmente importante nas plantas jovens, onde pode participar também da con dução ascendente de líquidos. A coloração, forma e tamanho, principalmente nas folhosas, são variá- veis. É susceptível ao ataque de xilófagos. 3.6. Anéis de crescimento Nas seções transversais do caule, as cama- das resultantes da atividade cambial aparecem em forma de anéis. Em zonas de clima temperado os anéis representam os incrementos anuais das árvores (Fig. 08). Permitem: ⋅ estimar a idade da árvore; ⋅ saber se a árvore possui incremento rápido (anéis bem espaçados) ou lento (pequeno espaço entre anéis) e, ⋅ saber quais anos foram favoráveis (espaços maio- res), quais os desfavoráveis (espaços menores). As folhosas tropicais apresentam mais de um período de crescimento por ano (representam os períodos de seca e de chuva) e não há demarcação indicando o início ou o fim das sucessivas camadas, não mostrando anéis bem definidos. Inversamente, folhosas de regiões secas, como por exemplo o semi-árido nordestino, em virtude de seca prolonga- da podem produzir uma única camada de crescimen to em vários anos.

O anel de crescimento é constituído por dois tipos de lenho (Fig. 08 e 09): ⋅ Lenho inicial - apresenta elementos anatômicos menores, paredes celulares finas, lumens grandes, numerosas pontuações grandes, madeira macia, de menor densidade e resistência, mais acessível à água e mais clara. ⋅ Lenho tardio - elementos anatômicos maiores, pare des celulares espessas, lumens pequenos, poucas pontuações pequenas, madeira dura, de maior densidade e resistência, menos permeável e mais escura.

Possuem vários graus de nitidez que depen- dem da espécie e das condições de crescimento da planta, devido a diferença entre o lenho produzido no início e aquele produzido no fim do período de crescimento.

Figura 08. Anéis de crescimento de uma conífera.

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Figura 09. Traqueóides axiais. À esquerda, do lenho inicial; à direita, do lenho tardio.

A largura dos anéis de crescimento varia de

espécie para espécie, na mesma espécie e a diferentes alturas da árvore.

As proporções entre os lenhos inicial e tardio não são necessariamente as mesmas para anéis de larguras idênticas. As duas zonas variam independentemente. ⋅ % máxima de lenho inicial na altura da copa, dimi- nuindo em direção a base; ⋅ % máxima de lenho tardio na base do caule.

Em madeiras de folhosas, os anéis de cresci

mento podem destacar-se por determinadas caracte rísticas anatômicas (Fig. 10), explicadas adiante. ⋅ A) Presença de uma faixa de células parenquimá- ticas nos limites dos anéis de crescimento (parênqui ma marginal), que aparece macroscopicamente co- mo uma linha tênue de tecido mais claro. Ex. Liriodendron tulipifera e Swietenia macrophylla. ⋅ A) Alargamento dos raios nos limites dos anéis de crescimento. Ex. Liriodendron tulipifera e Balforodendron riedelianum. ⋅ B) Concentração ou maior dimensão dos poros no início do período vegetativo (porosidade em anel). Ex. Cedrella fissilis. ⋅ C) Espessamento diferencial das paredes das fi- bras de forma análoga ao que ocorre nas coníferas. Ex. Mimosa scabrella. ⋅ D) Alteração no espaçamento das faixas tangen- ciais de um parênquima axial (reticulado ou escalari- forme). Este fenômeno vem acompanhado adicional mente por um menor número ou ausência de poros no lenho tardio. Ex. Cariniana decandra.

Por qualquer razão, deficiências locais de auxinas, nutrição, secas ou chuvas intermitentes, geadas, ataque de pragas, etc., certas anomalias podem ocorrer no desenvolvimento normal do xile- ma, afetando o câmbio e, conseqüentemente, os

anéis de crescimento. Nesses casos, há formação dos falsos anéis de crescimento. São eles: ⋅ Anel descontínuo - o câmbio permanece dormente em uma ou mais regiões, não produzindo células. Em outras regiões ele continua em atividade, for- mando uma nova camada de crescimento que pare- ce encontrar-se com o lenho tardio do anel prece- dente, não havendo, nesse caso, a formação de um anel completo. Essa descontinuidade pode ser resul tante de deficiências locais de auxina e ou nutrição ou ambas. Árvores antigas de copa assimétrica apresentam essa descontinuidade. ⋅ Falsos anéis anuais - levam a superestimação da idade da árvore. São inteiramente inclusos nos limi- tes dos verdadeiros anéis e resultam de uma parada súbita no desenvolvimento normal do xilema, segui- da por uma reativação do crescimento, no mesmo período. Diferem dos anéis verdadeiros pela mar- gem externa menos definida do falso lenho tardio. ⋅ Anéis anuais múltiplos - comuns nas árvores tro- picais e subtropicais que apresentam crescimento intermitente, sendo que, para cada novo fluxo de crescimento, há formação de um novo anel. ⋅ Anéis de geada - geadas fortes depois de iniciado um período de crescimento prejudica a atividade cambial, formando anéis anormais. Compõe-se de uma parte interna com células mortas, devido aos efeitos da geada e, uma parte externa constituída de células irregulares, produzidas depois da geada.

Figura 10. Características anatômicas que destacam os

anéis de crescimento em folhosas.

Devido a importância do estudo dos anéis de crescimento, várias técnicas para torná-los mais nítidos e avaliá-los foram desenvolvidas, embora nem sempre apresentem bons resultados: aplicação de corantes, imersão em ácido, exposição à chama

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10do bico de Bunsen, medição da intensidade lumino- sa, aparelhos tateadores e exposição a raio x. O estudo dos anéis de crescimento pode nos fornecer, além da estimativa da idade da árvore, um registro histórico do passado climático da região, que é preservado nessas estruturas. 3.7. Câmbio É um tecido meristemático, isto é, apto a gerar novas células, constituído por uma camada de células entre o xilema e o floema. Permanece ativo durante toda a vida da árvore. A atividade cambial é bastante sensível às condições climáticas.

Figura 11. Câmbio. 4. FISIOLOGIA DA ÁRVORE 4.1. Condução de água nas árvores – a solução diluída de sais minerais – a seiva bruta – retirada do solo através das raízes e radículas, ascende pelos capilares na camada mais externa do alburno até as folhas (Fig. 12). Os traqueóides axiais nas coníferas e os vasos nas folhosas assumem após a morte, a condução ascendente de líquidos. A seiva bruta nas folhas é transformada – juntamente com o gás car- bônico do ar sob ação da clorofila e da luz solar – em seiva elaborada (substâncias nutritivas como açucares, amidos, etc.) e descem pela parte interna da casca, designada de floema, até as raízes e radículas, promovendo a alimentação das células do câmbio, permitindo assim o crescimento e multipli- cação das mesmas. 4.2. Crescimento - Entre o córtex e o xilema há o câmbio, tecido meristemático constituído de células-mãe ou iniciais, vivas, que originam os elementos anatômicos que formam o lenho e a casca, provocando o incremento em diâmetro do tronco. O câmbio é constituído por uma camada com dois ti- pos de células-mãe (Fig. 13): ⋅ iniciais fusiformes – originam os elementos celula- res axiais do lenho e ⋅ iniciais radiais – isodiamétricas na sua forma, pro- duzem os elementos celulares transversais do lenho.

Ocorrem dois tipos de divisão nas células cambiais (Fig. 14 e 15): ⋅ Divisão periclinal - uma célula permanece inicial en quanto a outra é destinada ao xilema ou floema. Formam-se 2 a 6 células xilemáticas para cada flo- emática.

Figura 12. Condução de água no lenho.

⋅ Divisão anticlinal – a célula mãe fusiforme divide- se em duas e permanecem no câmbio acompa- nhando o incremento em circunferência do tronco. Divisões anticlinais verdadeiras resultam em célu- las de mesmo comprimento que as iniciais, apre- sentando madeiras com estrutura estratificada

Normalmente as iniciais radiais não pos- suem divisão anticlinal. No entanto, as árvores man- têm taxas uniformes entre iniciais fusiformes e radi- ais, de forma que o crescimento em diâmetro adicio- na novas iniciais radiais, mantendo a relação existe- nte. 4.3. Suporte – Realizada pelas células alongadas (Fig. 13) que constituem a maior parte do lenho: ⋅ Folhosas – fibras (20 a 80 % da madeira). ⋅ Coníferas – traqueóides axiais (até 95 % da made- ira). 4.4. Armazenamento de substâncias nutritivas - a transformação de seiva bruta em seiva elaborada ocorre nos órgãos clorofilados através do processo da fotossíntese. As substâncias não utilizadas pelas células como alimento são lentamente armazenadas no lenho pelos tecidos parenquimáticos: medula, raios e parênquima axial (Fig. 16). As fibras septadas, vivas, “comportam-se” como parênquima e armazenam amido.

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Figura 13. Diferentes tipos de células da madeira, derivadas das iniciais cambiais.

Figura 14. Esquema de divisão periclinal do câmbio para o crescimento em diâmetro do tronco.

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Figura 15. Esquema de divisão anticlinal do câmbio para o crescimento em circunferência do tronco: A – Divisão que origina uma estrutura normal; B e C – Divisão que origina uma uma estrutura es- tratificada.

Figura 16. Parênquima com grãos de amido.

5. PLANOS ANATÔMICOS DE CORTE As propriedades físicas e mecânicas e a aparência da madeira se alteram conforme o senti- do em que é aplicada uma carga ou é observada, em conseqüência dos elementos anatômicos do lenho se encontrar diferentemente orientados e orga nizados segundo as direções dos planos de corte (Fig. 17): ⋅ Transversal (X) – perpendicular ao eixo da árvo- re. ⋅ Longitudinal radial (R) – acompanhando a dire- ção dos raios ou perpendicular aos anéis de crescimento. ⋅ Longitudinal tangencial (T) – tangenciando as ca madas de crescimento ou perpendicular aos ra- ios. 6. PROPRIEDADES ORGANOLÉPTICAS DA MADEIRA São as características da madeira capazes de impressionar os sentidos. São as seguintes: 6.1. Cor Varia do quase branco ao negro, sendo de grande importância do ponto de vista decorativo. A coloração é resultante da deposição de corantes no interior da célula e na parede celular, tais como tani- nos, resinas, gomo-resinas, etc., depositados princi- palmente no cerne. Algumas são tóxicas aos fun- gos, insetos e brocas marinhas e, em geral, madei- ras escuras apresentam grande durabilidade, prin- cipalmente aquelas com elevado teor de taninos.

Figura 17. Direções e planos anatômicos de corte.

Do ponto de vista da identificação de madei- ras a cor possui valor secundário, pois se altera com o teor de umidade e usualmente escurece quando exposta ao ar, em razão da oxidação dos componen tes químicos, provocada pela ação da luz e da temperatura.

Geralmente madeiras leves e macias são mais claras que as pesadas e duras. Substâncias corantes, quando presentes em elevadas concentrações, podem ser extraídas co- mercialmente e aplicadas na tintura de tecidos, cou- ros, etc., como p.ex., pau brasil, taiúva, pau campe- che, etc.

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136.2. Odor Decorrente de substâncias voláteis deposi- tadas principalmente no cerne. Refere-se a madeira seca, pois diminui gradativamente mediante exposi- ção, mas pode ser realçado raspando, cortando ou umedecendo a madeira seca. Na confecção de em- balagens para chá e produtos alimentícios, a madei- ra deve ser inodora. No caso específico de charu- tos, o sabor melhora quando estes são acondiciona- dos em caixas de madeira de cedro. Como exem- plos de madeira que apresentam odor característico têm o sassafrás, cedro rosa, pau rosa, cedro, sânda lo, pau d’alho, amescla de cheiro, etc. O odor deve ser classificado em perceptível (característico, agra- dável e desagradável) e imperceptível. 6.3. Gosto Evidente principalmente em madeiras ver- des ou recém-abatidas. O gosto e o cheiro são pro- priedades intimamente relacionadas por se origina- rem das mesmas substâncias. Madeiras com eleva- do teor de taninos possui sabor amargo. O gosto pode excluir a utilização da madeira para determinados fins, como embalagens para alimento, palitos de dente, de picolé e pirulitos, brinquedos para bebês, utensílios de cozinha, etc. Não se deve verificar o gosto de madeira, pois pode provocar reações alérgicas graves. 6.4. Grã Refere-se ao arranjo e direção dos elemen- tos anatômicos em relação ao eixo da árvore ou das peças de madeira. São eles: ⋅ Grã reta ou direita - os elementos anatômicos se dispõem mais ou menos paralelos ao eixo da árvore ou peça de madeira. facilita a serragem contribui para a resistência da madeira reduz o desperdício não produz figuras ornamentais especiais ⋅ Grã irregular - todos os elementos do lenho apre- sentam variações de inclinação em relação ao eixo da tora ou peça de madeira, afetando a resistência quando excessivo. Pode ser:

⋅ Grã espiral - os elementos anatômicos se- guem uma direção espiral ao longo do tronco (Fig. 18). A inclinação pode ser tanto para o lado direito como para o esquerdo e variar a diferentes alturas. Uma volta completa em torno do eixo da árvore em menos de 10 metros, a madeira apresenta limita- ções industriais, sobretudo como material de construção. As peças de madeira retiradas de um tronco espiralado apresentam grã oblíqua. reduz a resistência da madeira dificulta a trabalhabilidade apresenta sérias deformações na secagem

⋅ Grã entrecruzada - os elementos anatômi- cos são inclinados alternadamente para o lado direito e esquerdo. É uma forma modificada da grã espiral. As sucessivas camadas de crescimento são inclinadas em direções opostas (Fig. 19). apresenta deformações na secagem dificulta a trabalhabilidade produz figuras atraentes afeta a elasticidade e flexão estática

Figura 18. Grã espiral no tronco e em peças individuais de madeira.

Figura 19. Madeira com grã entrecruzada: Acima – super- fície quebrada; abaixo – superfície serrada.

⋅ Grã ondulada - os elementos anatômicos

axiais freqüentemente mudam de direção, apresen- tando-se como linhas onduladas regulares (Fig. 20). As superfícies axiais apresentam faixas claras e escuras alternadas entre si, de belo efeito decora- tivo. Apresenta superfície radial corrugada e efeito decorativo quando ocorre com grã entrecruzada, como p.ex., em imbuia.

Figura 20. Peças de madeira apresentando grã ondulada.

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14⋅ Grã inclinada, diagonal ou oblíqua - desvio

angular dos elementos axiais em relação ao eixo axial da peça. Proveniente de árvores com troncos excessivamente cônicos, espiralado, crescimento excêntrico, etc. afeta a resistência mecânica ocorrência de deformações na secagem 6.5. Textura Refere-se a impressão visual produzida pelas dimensões, distribuição e percentagem dos elementos constituintes do lenho. A textura pode ser: Folhosas: ⋅ Grossa ou grosseira - madeiras com: poros gran- des e visíveis a olho nu (diâmetro tangencial > 300 μm); raios muito largos e parênquima axial muito abundante. Não recebe bom acabamento. Ex: carvalho, louro faia, acapu, etc. ⋅ Média - diâmetro tangencial dos poros de 100 a 300 μm e parênquima axial visível ou invisível a olho nu. ⋅ Fina - poros de pequenas dimensões (diâmetro tangencial < 100 μm) e parênquima axial invisível a olho nu e ou escasso. Ex: pau marfim, pau amarelo, etc. Coníferas: refere-se a nitidez, espessura e regularidade das zonas de lenhos inicial e tardio dos anéis de crescimento. Pode ser: ⋅ Grossa - contraste bem marcante entre as duas zonas, apresentando anéis largos, com aspecto heterogêneo. Ex. Pinus elliottii. ⋅ Média - anéis de crescimento distintos e estreitos. ⋅ Fina - contraste pouco evidente ou indistinto, a- presentando aspecto homogêneo. Ex: Podocarpus sp. 6.6. Brilho Refere-se a capacidade das paredes celula- res refletirem a luz incidente. A face radial é mais reluzente pelo efeito das faixas horizontais dos raios. A importância do brilho é de ordem estética, podendo ser acentuado artificialmente com polimen- tos e acabamentos superficiais. A madeira deve ser classificada como sem brilho e com brilho (acentua- do e moderado). 6.7. Figura Descreve a aparência natural das faces da madeira resultado das várias características macros cópicas: cerne, alburno, cor, grã, anéis de cresci- mento, raios, além do plano de corte em si. É qual- quer característica inerente à madeira que se sobressai na superfície plana de uma peça, tirando sua uniformidade. Desenhos atraentes têm origem em certas anomalias como: grã irregular, galhos, troncos afor- quilhados, nós, crescimento excêntrico, deposições irregulares de corantes, etc.

O conjunto de desenhos e alterações deco- rativas que a madeira apresenta, pode torná-la facil- mente distinta das demais.

7. ESTRUTURA ANATÔMICA DA MADEIRA 7.1. Parede celular A parede celular é um compartimento dinâ- mico que se modifica ao longo da vida da célula, constituindo uma rígida armação fibrilar com determi nadas funções no elemento anatômico: ⋅ Resistência estrutural ⋅ Determinar e manter a forma ⋅ Controlar a expansão ⋅ proporcionar estabilidade ⋅ Regular o transporte ⋅ Proteger contra xilófagos ⋅ Armazenar alimento ⋅ Atuar no crescimento e divisão ⋅ Equilibrar a pressão osmótica ⋅ Evitar perda de água.

A compreensão das propriedades da parede celular inclui sua estrutura química e física, tais como: ⋅ importância e estrutura da matrix de polissacarí- deos. ⋅ importância e significado da lignina e glicoproteí- nas. ⋅ conhecimento de substâncias incrustantes como oligo e polissacarídeos de baixo peso molecular, enzimas e lipídeos. 7.1.1. Formação

No processo de divisão cambial, a primeira camada de separação que surge entre as novas células adjacentes é a lamela média, constituída principalmente de pectinas, cuja função é unir as células umas às outras (Fig. 21). É a camada mais externa da célula. A esta camada, deposita-se, pos- teriormente para o interior da célula, microfibrilas de celulose em diversas orientações ao longo do eixo, constituindo a parede primária. Muito elástica, a pa- rede primária expande durante o crescimento da cé- lula até seu tamanho definitivo. Em seguida, deposi-ta-se junto à parede primária microfibrilas de celulo- se, obedecendo orientações que distingue três ca- madas distintas. Essas camadas, designadas S1, S2 e S3 na seqüência cronológica de formação, consti- tui a parede secundária. Essa progressiva deposi- ção de novas camadas engrossa a parede celular provocando a diminuição do diâmetro do lúmen. A característica mais notável da parede secundária é a perda da elasticidade da célula. Nas camadas secundárias, as microfibrilas apresentam orientação quase paralela ao eixo principal da célula (S2) e quase perpendicular ao mesmo eixo (S1 e S3). Paralelamente à formação da parede secundária, inicia-se do exterior para o interior o processo de lignificação, que é muito intenso na lamela média e parede primária, finalizando com a completa forma- ção da parede celular. Por outro lado, estudos indi- cam que a lignificação raramente ocorre na camada S3. Freqüentemente ao término do espessamento da parede, a célula morre.

A estrutura da parede primária é a mesma para quase todos os tipos de células e espécies,

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Figura 21. Estrutura simplificada da parede celular com as diversas camadas e orientação das microfibrilas de celulose. ML - lamela média; P – parede primária; S1, S2 e S3 – camadas da parede secundá- ria. À esquerda, plano axial; à direita, plano transversal. enquanto a parede secundária apresenta diferenças quanto ao tipo de célula e espécie.

A estrutura da parede celular assemelha-se ao concreto reforçado: a armação interna de microfi- brilas de celulose – análogas às barras de aço – é embebida em uma substância amorfa, a matrix, constituída de lignina e hemiceluloses – equivalente ao cimento + areia.

A combinação da celulose, hemiceluloses e lignina na construção da parede celular não está inteiramente esclarecida. Um resumo das teorias envolve: ⋅ Cadeias paralelas de celulose unidas por pontes de hidrogênio formam microfibrilas. ⋅ As microfibrilas estão ligadas à lignina através das hemiceluloses. ⋅ A matriz de microfibrilas e adesivo (lignina + hemi- celuloses) formam progressivas camadas sobre a parede celular.

Resumindo, a gênese da parede celular é caracterizada pelas etapas a seguir (Fig. 14 e 22): 1) Expansão – parede primária delgada, maleável, altamente deformável e baixa dureza, acompanha o aumento em tamanho (> 100 vezes) e eventual- mente em diâmetro. 2) Espessamento – a deposição de microfibrilas na parede secundária altera a forma, espessura, ar- quitetura e composição química. 3) Lignificação – adição de lignina confere rigidez à

parede e une as células umas as outras. 4) Morte – células de condução e suporte morrem após formadas (dias em algumas madeiras), en- quanto as parenquimáticas vivem vários anos – em algumas espécies, 15 anos.

Figura 22. Etapas da gênese da parede celular. Adaptado de Thibaut et al (2001) e Hertzberg et al (2001). 7.1.2. Estrutura química

A tabela abaixo apresenta os componentes químicos da parede celular.

Parede Celulose Lignina Hemiceluloses Pectinas Proteínas (%) Primária 9 - 25 25 - 50 10 - 35 10 Secundária 40 - 80 5 - 36 10 - 40

⋅ Celulose – É o mais abundante composto orgânico da natureza e principal constituinte estrutural da pa- rede celular. É um polissacarídeo que se apresenta como um polímero composto de cadeias lineares de

unidades de glucose unidas covalentemente, seme- lhantes às contas de um colar (Fig. 23). Muito está- vel quimicamente e extremamente insolúvel. As pontes de hidrogênio são tão fortes entre as cadeias

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16que a celulose não derrete, gaseifica; parte do gás queima, outra parte re-polimeriza como carvão. Possui elevada resistência à tração. Constitui uma

armação tal qual uma concha envolvendo a célula, formando tanto o esqueleto da célula como da árvore.

Figura 23. Celulose. À esquerda, estrutura química. À direita, unidade básica (molécula). ⋅ Lignina – É o mais abundante antioxidante da natu- reza. Formada a partir da glucose através de intrin- cados trajetos químicos. Extremamente complexa, é constituída por unidades de fenilpropano. É um polí- mero aromático formando um sistema heterogêneo e ramificado sem nenhuma unidade repetidora. O sistema é isotrópico, amorfo, hidrofóbico e termo- plástico, isto é, amolece a altas temperaturas e en- durece quando esfria. A lignina presente na árvore, a protolignina, difere da lignina isolada da madeira por quaisquer procedimentos. As ligninas extraídas de folhosas, coníferas e monocotiledôneas diferem na proporção e ligações. Todas as ligações são co- valentes, constituindo uma rede molecular tridimen- sional, semelhante a uma rede de futebol. Portanto, a quebra e reconstituição de fracas ligações entre moléculas como no complexo celulose-hemicelulo- ses não ocorre neste caso. Conseqüentemente, a lignina constitui um sistema totalmente estável, ou seja, as ligações são irreversíveis, sendo impossível a expansão da parede – e o crescimento da célula. Porém, Isto constitui uma desvantagem por tornar a parede celular inelástica e impossibilitar o isolamen- to da lignina com as técnicas atuais. Há forte evidência de que a lignina é orienta da na parede celular, obedecendo um arranjo em camada ± tangencial (Fig. 24). Ou seja, a lignina é isotrópica para o material extraído da parede.

Figura 24. Possível arranjo da lignina na direção tangencial. Adaptado de Salmén (2004).

A lignina confere resistência e dureza a parede celular, impermeabiliza as células conduto ras e, torna as paredes resistentes a degradação. Pode substituir as pectinas.

⋅ Hemiceluloses – Grupo de polissacarídeos ramifi cados, amorfos, muito hidrofílicos, altamente hidrata dos e formam géis. Abundante na parede primária. As hemiceluloses realizam ligações por pontes de hidrogênio com a celulose e através de pontes de éster e éter com a lignina. É quimicamente similar a celulose e morfologicamente similar a lignina. Algu- mas são solúveis em água. Sua função na árvore não está inteiramente esclarecida: há possibilidade de influenciar no teor de umidade da planta viva. ⋅ Pectinas – Grupo de compostos pécticos, desde os muitos solúveis até os solúveis em água quente. Presente apenas nos estágios iniciais do desenvolvi mento celular. Muito hidrofílica, possui ~75 % de água. São os mais solúveis polissacarídeos da parede celular. É um composto semelhante a goma que age como “adesivo” e adiciona flexibilidade a parede. Podem formar (não todas) sais e pontes de sais com cálcio e magnésio tornando-se insolúvel e duro. É o maior componente da lamela média e ocu- pa até 35 % da parede primária. Com propriedades gelificantes, espessantes e estabilizantes, as pecti- nas retiradas das frutas é um aditivo essencial na produção de geléias, iogurtes, doces, confeitaria, fármacos, etc.

As camadas da parede celular são: ⋅ Lamela média – “Cimenta” as células umas as outras contribuindo no suporte estrutural. É for-mada principalmente de pectinas e uma quantidade menor de proteínas. Entretanto pode ser lignificada. ⋅ Parede primária – Consiste em uma armação de microfibrilas de celulose embebida em uma matrix, semelhante a gel (Fig. 25). Inicialmente a matrix é uma massa hidratada amorfa de hemiceluloses, pec tinas, proteínas e água (confere fluidez – endurece ao secar, reduzindo a expansão da célula). Forma- da após a lamela média, a parede primária ao ceder às forças expansivas geradas pela pressão de tur- gor da célula, rapidamente aumenta a área superfi- cial. Esse crescimento da parede provoca altera- ções em sua massa, forma e composição ao incor- porar novas substâncias.

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Figura 25. Modelo de parede primária.

As microfibrilas de celulose formam a arma- ção da parede enquanto as hemiceluloses as conec tam aos polímeros não celulósicos (Fig. 25 e 26). As pectinas providenciam ligações e suportes estrutu- rais, previne a agregação de microfibrilas e incre- menta a porosidade, enquanto as proteínas funcio- nam tanto estrutural (extensinas) como enzimati- camente.

Figura 26. Provável distribuição dos componentes químicos na parede primária.

Tabela 02. Componentes químicos da parede celular completa.

Camadas Celulose Lignina Hemiceluloses Ângulo das microfibrilas

(%) (graus) Lamela média 0 100 0 Parede primária 10 70 20 S1 25 35 45 50 - 70 S2 50 20 30 10 - 30 S3 45 20 35 60 - 90

⋅ Parede secundária – Formada após a completa expansão da célula, é extremamente rígida e adicio- na resistência a compressão. É constituída de celulo se, hemiceluloses e lignina (Fig. 27). A adição de lignina acrescenta rigidez a matrix, cuja porosidade é nula (Fig. 28). Células de paredes espessas e duras são freqüentemente ricas em extensinas. Outras proteínas atuam no espessamento, modifica- ção e lignificação durante o desenvolvimento secun- dário. A maioria das paredes secundárias é menos hidratada do que a parede primaria. A celulose e as hemiceluloses são estruturalmente mais organiza- das na parede secundária do que na primária resul- tando em uma estrutura mais compacta e rígida. A distribuição geral dos polímeros da parede celular completa encontra-se na tabela 02. Freqüentemente espessa, nem sempre a parede secundária está presente na célula.

Células meristemáticas e a maioria das pa- renquimáticas não são lignificadas e, portanto, não possuem parede secundária.

Existem quatro redes ou armações na pare- de celular: ⋅ A armação estável de microfibrilas de celulose uni- da lateralmente as hemiceluloses. ⋅ A armação de pectinas se restaura independente-

Figura 27. Modelos de parede secundária e seus componentes químicos.

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Figura 28. Matrix de lignina. Fonte: Webb, (2002). mente, torna a parede celular aparentemente intac ta quando removida. As pectinas preenchem espa- ços entre as microfibrilas e as células e pode unir- se as outras armações. ⋅ A armação de proteínas/glicoproteínas cujo maior componente é a extensina, semelhante a um fio de lã muito pequeno e duro. Sua função é pouco co- nhecida, além da que endurece e estabiliza a pa- rede celular. ⋅ A armação de lignina cessa a mobilidade da pare- de celular e torna-a mais hidrofóbica e rígida. 7.1.3. Estrutura física

Unidades básicas de celulose unem-se cova lentemente em cadeias lineares, sem ramificações. Com elevado grau de polimerização, as cadeias de celulose possuem de 2000 a 6000 unidades na parede primária e de 10000 a 16000 na parede secundária. As cadeias unem-se lateralmente por pontes de hidrogênio, constituindo regiões crista- linas (~70 %) com inúmeras cadeias alinhadas, interligadas, ordenadas e fortemente coesas e, regiões amorfas (~30 %) com cadeias distribuídas desordenadamente. Essas regiões constituem as microfibrilas de celulose (Fig 29). As microfibrilas são um agregado de polissacarídeos na parede celular. As inúmeras pontes de hidrogênio inter e intramolecular tornam a estrutura global da celulose muito estável, sendo responsáveis pelo seu compor-tamento físico, químico e mecânico, incluindo sua solubilidade (Fig. 30). As microfibrilas lembram uma resma de papel: as folhas individuais são as cadeias de celulose (Fig. 31).

Figura 29. Modelos de microfibrilas de celulose. As linhas retas representam regiões cristalinas; as irre- gulares, regiões amorfas.

Figura 30. Pontes de hidrogênio intra e inter cadeias de celulose.

Figura 31. Cadeias de celulose alinhadas, formando camadas.

O ângulo das microfibrilas de celulose na ca mada S2 dos traqueóides axiais é um indicador das propriedades da madeira, a exemplo do módulo de elasticidade e contração. As investigações realiza- das informam que: ⋅ O ângulo das microfibrilas é maior próximo a medu la, diminuindo em direção a casca. ⋅ O ângulo varia entre árvores e diminui em direção a copa. ⋅ Nos anéis de crescimento, o ângulo diminui do le- nho inicial para o tardio. ⋅ O ângulo é inversamente proporcional ao tamanho dos traqueóides axiais: células grandes apresen- tam ângulos pequenos; células pequenas e largas possuem ângulos maiores. ⋅ A taxa de crescimento influencia na medida que o crescimento rápido apresenta ângulos maiores, forma anéis estreitos com traqueóides axiais de ângulo maior.

Cadeias de celulose constituem microfibrilas

e estas, as camadas da parede celular que formam a célula, que somada a outras formam a madeira tal como a encontramos na natureza (Fig. 32).

A espessura das camadas S1 e S3 é “inalte-rável” nas fibras e traqueóides axiais. A espessura de S2 é fina no lenho inicial e espessa no lenho tar- dio, enquanto a espessura de S1 e S3 é similar nos dois lenhos. Em outras palavras, a camada S2 determina a espessura da parede celular.

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19A espessura da parede secundária varia

consideravelmente entre as espécies e entre as diferentes células. A camada S2 tem de 5 a 100 vezes a espessura das outras camadas.

Tecidos constituídos apenas de parede pri- mária são macios e a rigidez é mantida pela pres- são de turgor. As paredes celulares dos parênquimas e dos elementos vasculares (especialmente poros largos) normalmente não correspondem ao modelo

descrito anteriormente para traqueóides axiais e fibras. Portanto, as propriedades das madeiras com elevada proporção de parênquima e poros largos diferem daquelas com pouco parênquima e vasos estreitos.

Atualmente a maioria das informações sobre a parede celular advém de pesquisas com os traqueóides axiais das coníferas, pois apresentam uma estrutura mais uniforme do que a das fibras das folhosas.

Figura 32. Composição da parede celular até a formação da madeira. 7.1.4. Pontuações

O comportamento e as propriedades da ma- deira também dependem das características macro e microscópicas. As pontuações são umas das ca- racterísticas microscópicas mais importantes. As células do xilema são interconectadas através de pontuações. Pontuação é uma descontinuidade na parede secundária. Após as divisões cambiais, as células apresentam apenas parede primária, deposi- tando-se em seguida a secundária. As áreas em que a parede secundária não é depositada são as pontuações, semelhantes a orifícios. A descontinui- dade da parede secundária forma os pares constan- tes na Fig. 33. A região da parede primária não coberta pela secundária é a membrana de pontua- ção. As pontuações intervasculares apresentam membranas modificadas compostas de microfibrilas de celulose fortemente entrelaçadas em uma matriz de hemiceluloses e pectinas.

Há dois tipos de pontuações: as simples e as areoladas. Nas pontuações areoladas a membra- na é formada pelo margo + torus; na maioria das pontuações intervasculares não ocorre essa diferen- ciação. O torus é encontrado em muitas coníferas, mas não todas. A presença de torus em algumas folhosas de porosidade em anel, particularmente no lenho tardio, caracteriza pontuações intervasculares com pequenas aberturas redondas a elípticas, canal ausente ou indistinto muito curto e, espessamento espiralado presente.

Normalmente, à pontuação de uma célula corresponde a de outra célula adjacente, formando um par de pontuações. Quando isto não ocorre, a pontuação é dita cega.

Algumas folhosas apresentam projeções da parede secundária revestindo total ou parcialmente as cavidades das pontuações intervasculares, deno- minadas guarnições e, a pontuação é dita guarne-

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20cida (Fig. 34). Ocorrem em madeiras de várias legu- minosas e determinadas rubiáceas, dando um as- pecto pontuado ao orifício da pontuação, sendo de grande valor diagnóstico. Situa-se no limite de reso-lução do microscópio ótico. Torus e guarnições po- dem ocorrer simultaneamente na mesma pontuação em reduzidíssimas famílias.

O número de pontuações, forma, tama-nho, distribuição, profundidade, guarnições e deta- hes variam de célula para célula assim como as ca- racterísticas das membranas, sendo importantes na identificação. Essas variações afetam profundamen-te a permeabilidade da madeira, influenciando a secagem, preservação e polpação química.

Figura 33. Pontuações simples, areoladas e pares de pontuações.

Figura 34. Pontuações intervasculares guarnecidas de Polygonaceae. Adaptado de Carlquist (2003).

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217.1.5. Espessamentos especiais Na camada S3 de certas células podem ocorrer espessamentos especiais como (Fig. 35): ⋅ Crassulae ou barras de Sanio

⋅ Identuras ⋅ Espiralado ⋅ Calitrisóide

Crassulae Identuras

Espiralado Calitrisóide Figura 35. Espessamentos especiais da parede celular.

Uma estrutura confundida com espes- samento da parede é a trabécula, isto é, barra cilíndrica de ocorrência esporádica que se esten- de através do lúmen, de uma parede tangencial à outra. Ocorre tanto nas coníferas como nas folho- sas. Trata-se de um acidente anatômico de ori- gem desconhecida (Fig. 36).

Figura 36. Trabécula.

Quadro comparativo resumido das paredes primária e secundária.

Parede primária Parede secundária Expande no crescimento das células Não expande Espessura reversível Espessura irreversível, definitiva Campos primários de pontuações Pontuações verdadeiras Parede contínua através do campo da pontuação Parede interrompida através da pontuação

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227.2. Coníferas Os elementos estruturais das coníferas apre sentam identificação mais difícil por possuírem uma histologia mais simples com menos caracteres diagnósticos. Os elementos anatômicos são os seguintes: 7.2.1. Traqueóides axiais São células grandes e estreitas, com extre-midades mais ou menos pontiagudas, imperfura-

das, ocupando até 95 % da massa lenhosa e, por isso, dando uma aparência uniforme as madeiras de coníferas (Fig. 37). Possui de 3 a 8 mm de compri- mento, podendo atingir valores extremos de 11 mm no gênero Araucaria e, 10 a 80 μm de diâmetro. O comprimento também varia com a idade da árvore e a localização no tronco. São 100 vezes mais compri dos do que largos.

Traqueóides axiais vizinhos se comunicam através das pontuações areoladas (Fig. 33). A elas-

Figura 37. Traqueóides axiais. a e c – células do lenho inicial e b célula do lenho tardio; d – ilustração da circulação de água através das pontuações areoladas dos traqueóides axiais.

ticidade do margo permite a circulação de líquidos de uma célula a outra (Fig. 37) e atua juntamente com o torus, como uma válvula típica. A abertura da pontuação é circular nos gêneros mais primitivos e mais ou menos orbicular nos menos evoluidos.

O estudo dessas pontuações e sua disposi- ção têm grande importância na identificação e utiliza

ção da madeira (secagem, preservação, difusão de substâncias químicas na fabricação de papel, etc.). Regra geral as pontuações areoladas localizam-se na face radial dos traqueóides axiais e, menos fre- qüentemente, na tangencial. Portanto, devem ser observadas no corte radial (Fig. 38).

A B B C Figura 38. Disposição das pontuações areoladas nas paredes radiais dos traqueóides axiais. A – uniseriadas. Multiseriadas: B – opostas, C – alternas.

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23Os traqueóides axiais possuem dupla fun-

ção, ou seja, realizam a condução da seiva bruta e sustentação da árvore. Diferenças entre traqueóides axiais das dife- rentes espécies são sutis – em geral a aparência é semelhante. As diferenças são principalmente nas medições, isto é, no comprimento, no diâmetro tan- gencial, na espessura da parede e, características como a descrição precisa das pontuações de campo de cruzamento. As medições dos traqueóides dos lenhos inicial e tardio devem ser feitas separada- mente. Normalmente os traqueóides axiais do lenho tardio são maiores do que os do lenho inicial.

7.2.2. Raios São células parenquimáticas de largura vari-

ável que se estendem transversalmente no lenho, em sentido perpendicular aos traqueóides axiais (Fig. 39). Tem a função de armazenar e transportar horizontalmente substâncias nutritivas. Estão vivos no alburno e mortos no cerne. Células parenquimá- ticas caracterizam-se por apresentar paredes finas, pontuações simples e em sua maioria, não lignifica- das. Produzem extrativos e “substâncias químicas de defesa” antes da formação do cerne ou após o ferimento de uma árvore.

Podem ser constituídos apenas de células

Figura 39. Tipos de raios nas coníferas. parenquimáticas: raios homogêneos, como p.ex., Podocarpus spp e Araucaria angustifolia; ou apre- sentarem traqueóides radiais em suas margens: raios heterogêneos, p. ex., Cedrus spp, Cupressus spp, Pinus spp e Picea spp.

Geralmente são unisseriados (uma única fi- leira de células). Algumas vezes são multisseriados, normalmente quando incluem um canal resinífero em seu interior e, nesse caso, são chamados de raios fusiformes (Pinus, Pseudotsuga Picea e Larix). A proporção de unisseriado para fusiforme é de 40:1 a 60:1. É grande a importância na identificação de coníferas os diferentes tipos de pontuações que surgem nas zonas de contato entre os raios e os traqueóides axiais, denominadas pontuações do campo de cruzamento. A forma, tamanho e número de pontuações por campo variam entre as diversas espécies (Fig. 40). São observadas no lenho inicial e refere-se ao contato de um único traqueóide axial e um único raio. Em que pese as diversas variações as pontuações por campo de cruzamento podem ser: ⋅ Fenestriforme – de 1 a 2 (ou 3) pontuações retan- gulares e quadradas, simples ou quase, ocupando quase todo o campo; ⋅ Pinóide – de 1 a 6 pontuações relativamente gran- des, simples ou com aréolas estreitas; irregular e variável na forma e tamanho; ⋅ Piceóide – pontuações com fendas estreitas que se estendem além da aréola;

⋅ Cupressóide – pontuações com aberturas elípticas dentro da aréola. ⋅ Taxodióide – pontuações com grandes aberturas dentro das aréolas, ovais (tendendo para arredon- dadas).

Ocorrem no alburno e nas áreas adjacentes aos canais resiníferos, raios com grãos de amido se melhantes a inclusões brilhantes. No cerne podem aparecer alguns raios com compostos coloridos for- mando manchas escuras (Fig. 41). 7.2.3. Parênquimas axiais

São células tipicamente prismáticas, de pare des finas, dotadas de pontuações simples, seção ± retangular no corte transversal e pode apresentar conteúdos escuros (Fig. 13). Vivas, tem a função de transportar e armazenar substâncias nutritivas. Nem todas as coníferas apresentam parênquima axial e, quando possui, esse é escasso. Está presente em Podocarpus e Pinus e ausente em Araucaria. Quan- to a posição no anel de crescimento podem ser (Fig. 41): ⋅Marginal – apresenta-se no limite dos anéis. ⋅Metatraqueal – pequenos grupos difusos ou faixas tangenciais no interior dos anéis. ⋅Difuso – isolados e irregularmente distribuídos.

Quando associado aos canais resiníferos, distingue-se dos traqueóides em séries verticais pelas pontuações simples.

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Fenestriforme Pinóide

Cupressóide Taxodióide Figura 40. Pontuações do campo de cruzamento. Corte radial.

Figura 41. À esquerda, raios com grãos de amido. À direita, raio com compostos coloridos.

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Figura 42. Parênquimas axiais. a – marginal; b – metatraqueal; c – difuso.

7.2.4. Traqueóides radiais São células bem menores e da mesma natu reza que os traqueóides axiais, de forma paralelepi- pédica, que se encontram associados aos raios, for- mando normalmente suas margens superior e inferior e, raramente, o seu interior ou independente destes (Fig. 43). Tem a função de condução horizon tal de nutrientes e suporte. Para alguns pesquisado- res, não está clara a sua utilidade na árvore viva.

De acordo com a posição que ocupam nos raios, podem ser: ⋅ Marginais – nas margens dos raios; ⋅ Dispersos – disseminados no interior do raio.

A sua presença ou ausência é importante na identificação. Estão presentes em Pinus e Picea e ausentes em Araucaria. Podem ser: ⋅ Traqueóides radiais de paredes lisas ou ⋅ Traqueóides radiais com identuras – suas paredes internas apresentam espessamentos denteados ou identuras.

Figura 43. Raios com traqueóides radiais. À esquerda, com paredes lisas; À direita, com identuras.

Quanto à morfologia, as identuras classifi- cam-se em: ⋅ obtusas – marcantes e largas; ⋅ agudas – marcantes e ponta afiada; ⋅ concrescentes – envolvidas por espessamentos até a altura do dente; ⋅ reticuladas – unidas as da parede oposta.

O comprimento das identuras nos traqueói- des radiais possui grande valor diagnóstico, estabe- lecendo-se um valor de 2,5 μm para dentes de pe- quenas dimensões. Em algumas espécies de pinus, o comprimento ocupa a totalidade do lúmen da célu- la enquanto que em outras espécies chega a meta- de do diâmetro celular. 7.2.5. Canais resiníferos São espaços intercelulares limitados por células epiteliais, que neles vertem a resina, produto de sua segregação (Fig. 44). Os canais resiníferos possuem origem pós-cambial, isto é, não se formam diretamente das iniciais cambiais: desenvolvem-se fora do câmbio. Possuem até 1,0 m de comprimen- to, embora a maioria seja curta, entre 10 e 20 cm. Podem ser normais ou fisiológicos e traumáticos ou patológicos. ⋅ Normais – ocorrem naturalmente no lenho. Podem ser: ⋅ Axiais ou longitudinais - ocorrem isolados e difu- sos no lenho, ⋅ Radiais - ocorrem dentro do raio fusiforme, ⋅ Traumáticos - surgem de traumatismos às árvores (geada, fogo ou dano mecânico) ou em madeiras onde são normalmente ausentes. Ex. Tsuga e Abies. Podem ser: ⋅ axiais – estão agrupados em faixas tangenciais, resultado da injúria sofrida, com diâmetro maior que os canais normais. ⋅ Radiais – ocorrem dentro do raio fusiforme.

Algumas espécies apresentam espessamen

to espiralado. Em algum ponto da árvore os canais resinífe

ros axiais e radiais entram em contato, fundindo-se. Não está claro como um ou outro, independentemen te, responde aos ferimentos. 7.2.6. Células epiteliais São células de parênquima axial, especiali- zadas na secreção e armazenamento de resina, que circundam os canais resiníferos (Fig. 44). Distingue- se dos parênquimas axiais por serem mais curtas e hexagonais e possuirem núcleo grande e denso cito plasma quando vivas. Podem apresentar paredes espessas e lignificadas como em Picea, Larix

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26Cathaya, Pseudotsuga e Keteleeria ou paredes finas não lignificadas como em Pinus.

As células epiteliais no alburno atuam como uma barreira semelhante à cortiça, impedindo que a resina escoe para os traqueóides axiais vizinhos. En quanto um grande mecanismo de defesa, a resina pode prejudicar a condução de água caso escoe para os lumens dos traqueóides axiais vizinhos.

7.2.7. Traqueóides em séries verticais Ocasionalmente se observa em algumas espécies, um tipo especial de traqueóide mais curto

e de extremidades retas, semelhanes ao parên- quima axial, do qual se diferencia pela presença de pontuações areoladas e parede relativamente espessa e lignificada (Fig. 13). Possuem a função de condução e suporte. Provavelmente são vestí- gios da evolução no reino vegetal e são células de transição entre o traqueóide axial e o parênquima axial. Ocorrem no lenho em séries verticais asso- ciados aos canais resiníferos, junto aos parênqui- mas axiais.

Figura 44. A – Canal resinífero axial. B – raio fusiforme; C – canais resiníferos axiais traumáticos.

Figura 45. Representações tridimensionais da madeira de conífera. 7.3. Folhosas A estrutura anatômica das folhosas é bem mais especializada e complexa, oferecendo uma grande variedade de aspectos e caracteres que faci- litam sua identificação. Os elementos anatômicos são os que seguem.

7.3.1. Vasos (poros) São os principais elementos anatômicos de distinção entre folhosas e coníferas. O vaso é uma série vertical de células coalescentes formando uma estrutura tubiforme de comprimento indeterminado (Fig. 46). Cada célula que compõe o vaso é desig- nada de elemento vascular.

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Figura 46. Vaso no corte longitudinal tangencial Constituem de 7 a 55 % da massa lenhosa

e realizam a condução ascendente da seiva bruta (Fig. 47).

Para permitir a passagem da água, as célu- las possuem extremidades perfuradas denominadas placas de perfuração, formadas pelos restos da pa- rede celular de cada elemento vascular correspon- dente (Fig. 48). Podem ser: . simples – abertura única, larga e contorno arredon- dado

Figura 47. Condução ascendente da água nos vasos

. múltiplas: . escalariforme – aberturas alongadas e paralelas . reticulada – aberturas crivosas ou em rede . efedróide – pequeno grupo de aberturas areola- das arredondadas.

Figura 48. Placas de perfuração. a, simples; Múltiplas: b – escalariformes; c – reticulada; d – efedróide.

O tipo de placa de perfuração e os aspectos dos elementos vasculares são características relaci- onadas à adaptação e evolução da planta ao ambi- ente (Fig. 49).

Os vasos apresentam pontuações em suas paredes para comunicação com as células vizinhas, cuja disposição, aspecto, tamanho e forma são im- portantes na identificação. As pontuações podem

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28

Figura 49. Tipos de elementos vasculares.

ser intervasculares (vaso para vaso) ou geral- mente areoladas (com traqueóides e fibras); sim- ples ou areoladas com parênquimas, tais como pa- rênquimo-vasculares (vaso para parênquima axial) e raio-vasculares (vaso para raio).

Quanto à disposição, as pontuações inter-vasculares são multisseriadas (Fig. 50): ⋅ alternas – alinhamento inclinado em relação ao ei- xo do elemento vascular. Quando não são abundan tes as aréolas são arredondadas e ovais; muito abundantes e juntas são poligonais, normalmente hexagonais; ⋅ opostas – dispostas em fileiras horizontais aos pa- res ou em maior número. Quando numerosas e mui to juntas a aréola tende a ser retangular; ⋅ escalariformes – alongadas, dispõem-se em séries formando ‘degraus’ nas paredes dos elementos vasculares.

Figura 50. Tipos de pontuações intervasculares quanto à disposição. As pontuações variam na forma (arredonda- das, poligonais, quadrangulares e ovaladas) e as- pecto. As aberturas das pontuações podem apre- sentar-se dentro das aréolas (inclusas), encostando nas aréolas (tocantes) ou se estender para fora destas (exclusas). Quando aberturas exclusas de duas ou mais pontuações se tocam, temos as cha- madas pontuações intervasculares coalescentes, de aspecto escalariforme. As pontuações parênquimo-vasculares são descritas em tamanho, forma, número e posição no elemento; usualmente são descritas comparando-as as intervasculares. As raio-vasculares são descritas como alongada biconvexa horizontal ou axial. reni- forrme, arredondada ou oval em relação à posição

(nas margens ou ao longo do raio) ou semelhantes às intervasculares.

Quando observados na seção transversal os vasos são designados de poros. O agrupamento, distribuição, abundância e tamanho dos poros são características importantes na identificação de espé- cies e propriedades tecnológicas.

Quanto ao agrupamento, os poros podem ser (Fig. 51): ⋅ solitários ⋅ geminados ⋅ múltiplos: radiais, tangenciais e racemiformes ou cachos.

Solitários Geminados Radiais Tangenciais Racemiformes Figura 51. Poros quanto ao agrupamento. Seção transversal.

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29Quanto a distribuição e diâmetro dos poros

dentro dos anéis de crescimento, a porosidade da madeira pode ser (Fig. 52): ⋅ difusa – diâmetros dos poros similares nos lenhos inicial e tardio. Pode ser uniforme e não uniforme. Comum nas madeiras tropicais.

⋅ semidifusa – diâmetros dos poros decrescem pro gressivamente do lenho inicial para o tardio. ⋅ em anel – diâmetros dos poros do lenho inicial mar cadamente maior do que no tardio.

Difusa uniforme

Difusa não uniforme

semidifusa Em anel

Figura 52. Tipos de porosidade da madeira.

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30Algumas espécies se destacam por apresen

tarem um padrão todo especial no arranjo de seus poros, diferente dos tipos comuns citados anterior- mente (Fig. 53): ⋅ Tangencial – os poros são distribuídos em faixas mais ou menos paralelas aos anéis de crescimen- to, normalmente onduladas; ⋅ Diagonal e ou radial – poros em arranjo radial ou intermediário entre radial e tangencial aos anéis de crescimento;

⋅ Dendrítico ou em chamas – poros em arranjo ra- mificado no sentido radial e tangencial.

Além dos aspectos que foram vistos, a abun dância de poros (poros/mm2), seção (arredondada, ovalada, quadrangular e angular), a espessura de suas paredes, a presença de tilos e conteúdos (go- mas, oleoresinas, etc), comprimento dos elementos vasculares e apêndices, constituem detalhes impor- tantes na identificação de madeiras.

Tangencial Diagonal

Dendrítico

Figura 53. Disposições especiais dos poros. 7.3.2. Parênquima axial Bem mais abundante nas folhosas do que nas coníferas e raramente ausente ou muito raro. Suas células apresentam paredes finas não lignifica das, pontuações simples e forma retangular e/ou fusiforme nos planos longitudinais. Quando observa-

dos na seção transversal, apresentam dois tipos de distribuição (Fig. 54 e 55): ⋅ Parênquima axial paratraqueal – quando ocorre as- sociado aos poros. ⋅ Parênquima axial apotraqueal – quando não ocorre associado aos poros.

Page 28: Anatomia Da Madeira

31 Podem ocorrer combinações as mais diver- sas entre esses dois tipos.

A extrema abundância de parênquima (axial e radial) confere às madeiras extraordinária leveza,

baixa resistência mecânica e baixa durabilidade natural.

Figura 54. Tipos de parênquima axial paratraqueal na seção transversal.

Figura 55. Tipos de parênquima apotraqueal na seção transversal.

Page 29: Anatomia Da Madeira

327.3.3. Fibras São células longas e estreitas, de paredes espessas, com extremidades afiladas, que ocorrem unicamente em folhosas, constituindo geralmente a maior parte do lenho (20 a 80 %) e comprimento de 0,5 a 2,5 mm, com média de 1,0 mm.

Quando ocorre comunicação entre fibras por pontuações areoladas “distintas” (diâmetro da pontu ação > 3 μm), estas são denominadas fibrotraqueói- des; quando ocorre por pontuações simples, são de-

nominadas fibras libriformes, muitas vezes aparen tando não possuir pontuações ou estas são muito poucas e pequenas com aparência de fendas (Fig. 56). Madeiras com fibras intermediárias ou duvido- sas, adota-se como fibrotraqueóides. Espécies po- dem apresentar apenas fibrotraqueóides, outras ape nas libriformes e outras, ambas.

Em algumas espécies, os lumens das fibras são divididos em pequenas câmaras por finas pare-des transversais (septos), denominando-se fibras

a b c d Figura 56. Fibras. a, libriforme; b, fibrotraqueóide; c, fibras septadas; d, fibras de paredes espessas. septadas e se “comportam” como parênquima (es- tão vivas no alburno e armazenam amido). Há espé-cies que possuem apenas fibras septadas e, outras, septadas e não septadas. Caso a madeira apresen- te ambas, as septadas ocorrem adjacentes aos vasos. As fibras desempenham a função de supor- te; sua porção no volume total e a espessura de suas paredes influem diretamente na densidade e

na movimentação higroscópica e, indiretamente, nas propriedades mecânicas da madeira. 7.3.4. Raios Os raios juntamente com o parênquima axial constituem os mais eficazes elementos de distinção entre madeiras de folhosas. Possuem a função de armazenar e transportar horizontalmente substân-cias de reserva (Fig. 57).

Figura 57. Células parenquimáticas constituintes dos raios e os tipos básicos de raios.

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33As células parenquimáticas mais comuns

nos raios são observadas na seção radial: ⋅ Procumbentes (deitada ou horizontal) – o compri- mento da célula é maior radialmente; ⋅ Eretas – o comprimento da célula é maior longitudi- nalmente; dentro destas incluem-se as quadradas, células de tamanho axial e horizontal similares.

Os raios recebem muitas classificações de

acordo com seus diferentes aspectos. Kribs desen- voveu uma bastante elaborada, utilizada em algu- mas descrições de madeiras (Fig. 58).

Segundo Kribs os raios podem ser:

⋅ Homogêneos – formados apenas por células pro cumbentes. ⋅ Heterogêneos – incluem células de mais de um for- mato (procumbentes e eretas) nas mais diferentes combinações.

Os raios homogêneos e heterogêneos po-dem ser tanto unisseriados (uma fileira de células) como multisseriados (3 ou mais fileiras de células).

Kribs classificou-os em: ⋅ Homogêneos: inclui raios constituídos unicamente de células procumbentes; as células das margens são comumente mais altas do que as células do centro (várias espécies de leguminosas).

Figura 58. Classificação dos raios segundo Kribs. ⋅ Heterogêneos: Tipo I - Raios unisseriados compostos de células uni camente eretas; os multisseriados com uma parte central multisseriada de células pro- cumbentes e, margens unisseriadas maio- res, de células eretas. Tipo II - Raios unisseriados inclui células eretas e procumbentes, ocupando umas e outras posi ções nas margens ou disseminadas; multis- seriados com uma parte unisseriada muito curta de células eretas e outra parte maior, multiseriada, de procumbentes. Tipo III - Raios uniseriados de dois tipos: um apenas de células procumbentes, outro apenas de eretas; multiseriados normalmente com uma fileira marginal de células eretas muito gran- e, no interior, quadradas.

Os raios heterogêneos são mais primitivos. Os homogêneos são de ocorrência geológica mais recente.

Devido a riqueza de variação, há implica ções fisiológicas nos raios. Há indícios de que em alguns raios as pontuações raio-vasculares locali- zam-se nas margens, liberando o açúcar armazena- do para os vasos, enquanto apenas as células inter-nas realizam o transporte radial. A freqüência de pontuações raio-vasculares influi na permeabilidade, na facilidade com que os raios perdem água, ou no desmembramento durante a polpação química. Além dos tipos citados, os raios podem apresentar outros aspectos especiais (Fig. 59).

Outro tipo especial de raio é o que possui células em forma de ladrilhos (azulejos), com apa- rência vazia de células eretas (raramente quadrada) que ocorrem em séries intermediárias horizontais entre as células procumbentes (Fig. 60). Ocorrem no grupo das malvales, que inclui o pau de balsa e o cacau.

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Figura 59. Tipos especiais de raios. a – raio fusionado; b – raio com canal secretor; c – raio com células envolventes d – raios em agregados.

Figura 60. Raio com células de “ladrilho” (fileira central mais clara). 7.3.5. Traqueóides vasculares e vasicêntricos São de ocorrência limitada nas folhosas co-mo vestígios da evolução no reino vegetal. Possu- em função suplementar de condução, extremidades imperfuradas e muitas pontuações areoladas. São mais curtos do que as fibras. Diferem dos traqueói- des axiais das coníferas por serem curtos com pon- tuações pequenas e usualmente alternas.

Traqueóides vasculares são semelhantes aos elementos vasculares (comprimento, forma, pontuações e outros sinais na parede), com extremi- dades imperfuradas (Fig. 61). Estão organizados em séries verticais e, na seção transversal, confunde-se com os poros estreitos. Usualmente ocorre associa- dos aos vasos racemiformes do lenho tardio, entre os elementos vasculares.

Traqueóides vasicêntricos são mais lon- gos e irregulares que os vasculares, de extremida- des arredondadas e não formam séries axiais (Fig. 61). Usualmente apresenta forma irregular. Ocorrem associados aos poros, aos quais se assemelham transversalmente e muitas vezes, também associa- dos aos parênquimas axiais. Encontrados em madei ras de poros solitários dos gêneros Quercus e Eucalyptus. Abundantes nas madeiras com porosi-dade em anel, próximos aos poros do lenho inicial.

Figura 61. Acima, Traqueóide vascular. Abaixo, vasicêntrico.

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357.4. Caracteres anatômicos especiais Podem ser encontrados ainda em algumas madeiras elementos especiais que constituem impor tantes aspectos sob o ponto de vista diagnóstico e tecnológico. 7.4.1. Canais celulares e intercelulares São canais que contêm substâncias diver- sas como gomas, bálsamos, taninos, látex, etc. Podem ser axiais ou horizontais (ocorrem dentro dos raios). Deve-se citar ocorrência e localização. ⋅ Canais celulares - conjunto tubiforme de células parenquimáticas, possuindo paredes próprias. São axiais e radiais. ⋅ Canais intercelulares – são espaços tubulares de comprimento indeterminado, sem paredes próprias, circundados por células epiteliais. São axiais e radiais. Podem ter origem traumática, de ocorrência esporádica. Não ocorrem simultaneamente canais radi- ais e axiais em uma mesma espécie, com uma ou duas exceções. 7.4.2. Células oleíferas e mucilaginosas São células parenquimáticas que contêm óleo, mucilagem ou resina, facilmente distintas das demais por suas grandes dimensões (Fig. 62). Normalmente ocorrem associadas aos parênquimas axial e radial. Mencionar presença, localização e abundância.

Figura 62. Células oleíferas. a – seção longitudinal radial; b – seção longitudinal tangencial. 7.4.3. Inclusões Apesar de não serem elementos anatômi- cos, sua presença é importante para a anatomia, identificação e utilização da madeira.

Podem ser: ⋅ Sílica – material cuja fórmula química e grau de du-reza assemelha-se ao do diamante (Fig. 63). Pode ocorrer no interior dos raios ou parênquima axial em forma de partículas ou grãos e, raramente infiltra-se nas paredes das fibras e vasos. Pode ocorrer tam- bém na forma de blocos compactos nos lumens de vasos e fibras e, raramente, nos parênquimas. Des- crever a forma, localização e o número por célula. ⋅ Cristais – são depósitos intra ou extracelular, em sua grande maioria de oxalato de cálcio (síntese do ácido oxálico e cálcio do ambiente), que ocorre no lúmen ou associados à parede celular, em diversos tipos de células, principalmente as parequimáticas. A biomineralização nas plantas é um processo fisio- lógico normal, notadamente nos órgãos vegetativos, reprodutivos, de armazenamento e desenvolvimen- to, além de tecidos fotossintéticos ou não. Uma com

Figura 63. Sílica. binação de fatores genéticos e ambientais define a quantidade, forma, função e tamanho dos cristais. Os cristais possuem a função de desintoxicação (p.ex. metais pesados), regulação de cálcio, meca- nismo de defesa, etc. São abundantes nas folhosas e coníferas.

A forma e distribuição dos cristais é cons- tante nas espécies e evidencia o controle genético da deposição dos mesmos, favorecendo seu uso taxonômico. Portanto, é preciso descrever a forma, localização e o número de cristais por célula.

Os cristais apresentam diversas formas, sen do as mais comuns abaixo (Fig. 64).

Figura 64. Alguns cristais presentes na madeira. A e B – drusas; C – romboédricos em câmara; D – ráfides; E – estilóide.

⋅ Drusas – agrupamentos globulares multifacetados ⋅ Rombóides – monocristais prismáticos; ⋅ Ráfides – centenas ou milhares de cristais seme- lhantes a acículas, freqüentemente com ranhuras, formando feixes compactos; ⋅ Estilóides – grandes cristais alongados retângula- res; ⋅ Cistólitos – concreções de carbonato de cálcio; ⋅ Areia de cristal. – massa de pequenos cristais an- gulares A deposição de cristais em qualquer cama- da da parede celular é comum na maioria das célu- las, particularmente nas coníferas. Cristais romboé- dricos são encontrados na parede celular, enquanto os presentes no lúmen podem ser de qualquer um outro tipo.

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367.4.4. Floema incluso O câmbio pode formar eventualmente célu- las de floema para o interior do tronco em alguns gêneros e famílias. Pode ser: ⋅ Concêntrico (circumedular) – forma faixas concên- tricas no lenho. ⋅ Foraminoso – feixes axiais espalhados pelo lenho. ⋅ Difuso – disperso pelo lenho. 7.4.5. Estrutura estratificada Nas espécies mais evoluídas, os elemen- tos axiais podem estar organizados formando faixas horizontais regulares ou estratos (Fig. 65). Este fenô meno é mais evidenciado no corte longitudinal tan- gencial e pode se limitar a algumas células (estratifi- cação parcial), p.ex., só aos raios, ou estender-se a todas (estratificação total). É uma característica im- portante para a identificação de madeiras. Pode ser regular ou irregular. Citar qual tecido está estratifi-cado.

Figura 65. Estrutura estratificada.

7.4.6. Conteúdos vasculares Embora não sejam elementos anatômicos, a presença de conteúdos dentro dos vasos, designa- dos gomo-resinas, tem importância para a anato- mia, identificação e propriedades da madeira. A cor, consistência, abundância, etc., constituem detalhes de grande valor diagnóstico. 7.4.7. Espessamento espiralado São relevos helicoidais ao longo da célula. Pode ocorrer em vasos e fibras (Fig. 66). É raro nos vasos das folhosas tropicais, comuns nas tempera- das e muito freqüentes nas áridas.

Figura 66. Espiralamento em vasos e fibras 7.4.8. Máculas medulares São porções de tecidos anômalos, normal- mente de origem traumática, provocados por feri- mentos, picadas e ou galerias de insetos na região cambial. São constituídas de tecido parenqui- matoso cicatricial na forma de pequenas manchas claras e irregulares no corte transversal, visíveis às vezes a olho nu (Fig. 67).

Figura 67. Mácula medular.

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Figura 68. Representações tridimensionais de madeiras de folhosa. 8. ANATOMIA FUNCIONAL E ECOLÓGICA DO XILEMA A anatomia funcional descreve a estrutura do xilema, em particular a relacionada com o trans-porte de água, como também, o fenômeno da cavita ção dentro dos lumens dos condutores (traqueóides axiais e vasos).

Os capilares são estruturas condutoras mor- tas, esqueletos de parede celulares, lignificados, de paredes secundárias espessas (resistência e rigidez são necessárias para suportar a elevada compres- são exercida pela pressão de sucção), responsáveis pelo fluxo ascendente da água.

Os condutores estão interligados formando um complexo contínuo desde as radículas até as folhas. O diâmetro dos capilares varia de menos de 5 µm em coníferas a mais de 500 µm em lianas tropicais. O comprimento varia de poucos milímetros em traqueóides axiais a mais de 10 metros em vasos de videiras e folhosas com porosidade em anel. A madeira é um tecido multifuncional, pois realiza: ⋅ a condução ascendente da água, ⋅ a sustentação mecânica e, ⋅ o armazenamento de carboidratos, óleos, sais e água. O melhor resultado de uma função pode ser conflitante com o de outra. Situação extrema é a ma deira apresentar células de paredes finas e diâme-tros largos, muito eficientes na condução da água, porém mecanicamente frágil a ponto de não supor-tar o próprio peso. A estrutura xilemática admite trocas, permi- tindo a realização simultânea das funções, com vári- os graus de sucesso.

Atualmente, o conhecimento acumulado so-bre a importância funcional das variações estrutu-rais relacionadas à condução da água e suporte é maior do que o relacionado ao armazenamento de carboidratos.

8.1. Eficiência condutiva Mais de 90 % da água se perde por transpi- ração nas folhas, ocasionando uma pressão de suc- ção. Essa pressão, negativa, é determinada pelo diâmetro do lúmen e não pelo tamanho do capilar. Teoricamente, um lúmen de 5 µm de diâmetro pode gerar 58 Kpa de sucção, enquanto outro de 20 nm pode gerar 14 MPa de sucção.

A união de capilares estreitos e largos permite aliar a combinação da elevada pressão dos primeiros com a eficiência condutiva dos segundos. Nas folhosas, a condutividade (taxa de fluxo de água através do tronco) é proporcional a soma dos diâmetros dos poros a quarta potência. Ou seja, quando o número de poros por unidade de área duplica a fluxo dobra, porém se o diâmetro do poro dobra, a condutividade aumenta 16 vezes. Isto significa que um poro de 200 μm de diâmetro tem uma capacidade condutiva equivalen- te a 256 vasos de 50 μm de diâmetro. A Fig. 69 mostra que duas madeiras com a mesma grandeza, a mais eficiente na condução da água é a de poros mais largos.

Figura 69. Diâmetros dos poros relacionados à eficiência condutiva.

Page 35: Anatomia Da Madeira

38Madeira com porosidade em anel (Fig. 70) é

uma adaptação especial ao clima temperado. Os vasos do lenho inicial funcionam apenas em uma única estação de crescimento, porém são muito eficientes no período. P. ex., no Olmo americano mais de 95 % da água ascende até a copa através dos vasos do lenho inicial mais externo do alburno. Se esse lenho é danificado ou infectado por fungo, a condução perde-se, pois a infestação “sangra” os vasos do lenho inicial e interfere na circulação da água.

Em um dano eventual nos condutores (ani- mais, remoção de partes, tempestades, etc.) o ar é arrastado para o interior dos lumens e a água escoa pelo ferimento devido à ação do fluxo provocado pela transpiração. A passagem de ar para os condu- tores intactos adjacentes é minimizada pelas pontua ções que, ao funcionar como válvulas restabelecem uma barreira capilar ao afastar a interface ar-água. Essas válvulas funcionam de duas maneiras para impedir a entrada de ar: ⋅ Nas folhosas, por capilaridade através de peque- quenos orifícios (< 0,1 - 0,2 µm de diâmetro) nas membranas das pontuações; ⋅ Nas coníferas, pela aspiração do torus na abertura da pontuação estabelecendo um bloqueio relativo (orifícios << 10 nm de diâmetro). Os orifícios do margo são grandes (~ 0,3 µm) e insuficientes para impedir eficazmente a passagem de ar.

Figura 70. Madeira com porosidade em anel.

O Quadro a seguir mostra a correlação

positiva entre a velocidade de fluxo da seiva e o diâmetro dos poros de algumas espécies européias.

Velocidade Diâmetro dos vasos (m/h) (μm) Folhosas com porosidade em anel White oak 43.60 200-300* Ash 25,70 120-350*

Hickory 19,20 180-300*

Folhosas com porosidade difusa Willow 3,00 80-120 Tulip poplar 2,62 50-120 Birch 1,60 30-130 Coníferas Diâmetro dos traqueóides Eastern White pine 1,70 ≤ 45 Spruce 1,20 ≤ 45 * Diâmetro dos vasos no lenho inicial. Fonte: Wheeler, 2001. Os capilares possuem membranas de pontuações que agem como um finíssimo filtro po- roso, permitindo a passagem de água e nutientes,

ao mesmo tempo que limita a passagem de ar e xilófagos de célula para célula no alburno (Fig. 71).

Pontuações intervasculares Pontuação areolada Figura 71. Membranas das pontuações nas células condutoras.

Page 36: Anatomia Da Madeira

39Durante a condução ascendente até a eva-

poração nas folhas, a coluna de água deve ser contí nua: uma bolha de ar penetrando em um vaso ou traqueóide axial, pode se expandir e obstruir o lúmen, interrompendo a condução caso passe de um capilar a outro. ⋅ Nas folhosas, as membranas das pontuações intervasculares não apresentam aberturas visíveis – semelhante a textura de um filtro de papel – e não há possibilidade de uma bolha de ar passar de um vaso a outro enquanto a mesma estiver úmida e intacta (Fig. 72). ⋅ Nas coníferas, quando uma bolha de ar penetra no condutor, as colunas de água quebram sob tensão, as membranas das pontuações aspiram e o torus “veda” a abertura da pontuação (Fig. 07 e 73). A aspiração pode ocorrer para um lado ou outro da parede da pontuação.

Portanto, as membranas das pontuações areoladas têm uma construção diferente das mem- branas das pontuações intervasculares.

Figura 72. membrana de uma pontuação intervascular

Figura 73. Pontuações areoladas. Acima, funcionais. Abaixo, aspiradas.

Nas coníferas as pontuações areoladas no cerne estão aspiradas, tornando-o menos permeá- vel que o alburno. A aspiração também ocorre devi do a deposição de extrativos nas membranas, aderindo-as as paredes das pontuações.

Normalmente as membranas das pontua-ções no cerne são mais espessas devido a camada de extrativos (Fig. 74).

As membranas das pontuações parên-quimo-vasculares são espessas, tornando os parên- quimas relativamente impermeáveis (Fig. 75). Quan- do viva, a célula parenquimática possui no seu lado da pontuação uma “camada protetora” contra a elevada pressão da condução ascendente do vaso. Durante a secagem as últimas células a perderem

água são as parenquimáticas, às vezes estando associadas ao colapso da madeira.

Figura 74. Pontuação intervascular no cerne.

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Figura 75. Pontuação parênquimo-vascular. 8.2. Cavitação É a formação de bolhas de vapor d’água ou gás na coluna ascendente de líquidos no capilar. A rápida expansão das bolhas rompe a coluna e provo ca embolia – obstrução do vaso ou traqueóide axial pelo ar. (Fig. 76).

Figura 76. Capilares com caviitação. Adaptado de Taiz & Zeiger (2002).

Quando um grande esforço é aplicado a

uma tira elástica, ela rompe. O mesmo ocorre a uma coluna de água submetida a uma elevada pressão: ultrapassado seu limite de resistência, quebra, origi- nando uma bolha de vapor d’água no capilar.

Embora a pressão de sucção seja de 14 MPa, mais de 90 % (13,90 MPa) dessa pressão está indisponível como sub-vapor (tal qual uma garrafa de água mineral com gás), a não ser que a planta evite a nucleação para vapor (cavitação). O resultado imediato da cavitação conduz a um capilar saturado de vapor d’água que imediatamente satu-

ra-se de ar (embolia), semelhante a gases difusos no lúmem. A conseqüência fisiológica da cavitação é a drástica redução ou a completa paralisação da condutividade. Há evidências de que em alguns ca-sos a cavitação pode ser revertida e o capilar reas- sume sua função condutora.

Células parenquimáticas são capazes de absorver bolhas de ar.

A cavitação ocorre de duas maneiras: ⋅ Ciclos de congelamento-descongelamento da sei- va bruta e ⋅ Estresse hídrico (seca). 8.2.1. cavitação provocada por congelamento Ocorre nas regiões temperadas e frias ou sujeitas a geadas fortes. A interrupção do fluxo as- cendente da água por cavitação conduz a desidra- tação e morte.

Quando a seiva bruta congela, gases dissol- vidos emanam da solução e formam bolhas. Essas bolhas nucleiam a cavitação quando o gelo derrete e a água do xilema está sob pressão negativa (Fig. 77). A bolha expande e o condutor fica completa- mente cavitado. Caso a pressão seja positiva (> pressão atmosférica) a bolha de ar pode dissolver.

Fig. 77. Mecanismo de cavitação por congelamento (parte superior) e por estresse hídrico (parte inferior) em folhosas. Por congelamento, bolhas expandem lcom o derretimento do gelo e a água está sob ten são de transpiração. Por estresse hídrico, o ar é aspirado através da abertura da pontuação para o interior do vaso saturado de água. Adaptado de Hacke & Sperry (2001).

A cavitação por congelamento depende do diâmetro do capilar: ⋅ > 40 µm provoca completa embolia. ⋅ < 30 µm pouca ou nenhuma embolia.

Portanto, poros largos são mais propensos a cavitação do que os poros estreitos ou traqueói- des. Coníferas e folhosas com capilares estreitos são mais resistentes à cavitação.

O fato das coníferas serem perenes nas re- giões geladas indica alguma condutividade da seiva: não há significativa cavitação no xilema dos galhos que possuem traqueóides axiais estreitos. Entretan- to, ocorre cavitação nos galhos por estresse hídrico:

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41o suprimento de água é interrompido pela baixa temperatura e a pressão no xilema diminui conside- ravelmente.

Folhosas com porosidade em anel possuem galhos com poros largos (≥ 100 µm) e uma curta

estação de crescimento em comparação com as de porosidade difusa.

Poros estreitos do lenho tardio (e também traqueóides) providenciam engenhosamente uma condução mínima quando os poros largos apresen- tam cavitação (Fig. 78).

Figura78. Poros largos do lenho inicial e poros estreitos do lenho tardio. As setas indicam o local das pontuações inter- vasculares no limite entre os dois lenhos. As escalas são 100 e 25 µm, respectivamente. Adaptado de Kitin et ali (2004).

Vasos estreitos com pontuações intervascu- lares com torus constitui um sistema auxiliar conduti vo de baixa eficiência, porém oferece grande resis- tência a cavitação. A natureza homoplástica do to- rus nas folhosas é provavelmente provocada por adaptações funcionais, de significado ecológico e fi- siológico não inteiramente conhecido. 8.2..2 Cavitação provocada por estresse hídrico A cavitação ocorre quando a diferença de pressão entre a água do xilema e o ar circunvizinho excede as forças capilares na interface ar-água. Sob essas condições o ar é aspirado para dentro do lúmen e as bolhas de ar formadas nucleiam a mudança para vapor. A água no xilema encontra-se sob uma pressão negativa muito elevada. Portanto, quando a disponibilidade de água no solo não é suficiente, a coluna ascendente de água rompe e os capilares ficam vazios.

A maior quantidade de orifícios na parede celular localiza-se nas membranas das pontuações, sendo esses os possíveis locais de admissão de ar. O tamanho dos orifícios da membrana da pontuação que provoca a entrada de ar está relacionado às propriedades mecânicas da membrana (resistência e elasticidade, além da sua anatomia interna). Ou seja, o estado das membranas das pontuações, esticada ou “relaxada” influi no tamanho dos orifí- cios dessas membranas. Os orifícios de uma mem- brana “repousada” são consideravelmente menores do que os de uma outra estirada pelo ingresso de ar.

Espécies de regiões mais quentes, com poros grandes, quando atingidas por geadas sofrem completa cavitação e morrem devido a total perda de condutividade. Nos traqueóides axiais os orifícios do mar- go, grandes, são incapazes de impedir a cavitação, tarefa realizada pelo torus aspirado. A entrada de ar ocorre quando o torus deixa a posição aspirada. A cavitação nas coníferas depende da diferença de pressão através do margo e das propriedades mecâ nicas da membrana.

Os elementos condutores necessitam de paredes reforçadas para evitar o risco de implosão devido a elevada pressão de sucção. Grandes tensões de flexão surgem na parede dupla (t) entre o condutor saturado de água e o embolizado (Fig. 79). As paredes devem ser robustas o suficiente para resistir a tais esforços. Quanto mais espessa a parede dupla em relação a distância máxima da abertura do lúmen (b), mais reforçada estará contra a flexão, mantendo sua integridade estrutural. As coníferas possuem um fator de segurança contra implosão maior do que as folhosas devido a dupla função dos traqueóides axiais.

Um denso conjunto de fibras auxilia os vasos no transporte de água, protegendo-os contra o colapso. Uma densa matrix de fibras compensa áreas de considerável fragilidade devido a presença de poros largos ou abundância de poros racemiformes.

Madeira densa resiste melhor a pressão negativa nos condutores. Elevada densidade repre- senta alto custo de construção, reduzida taxa de

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Fig. 80. A) Tensões na parede do condutor por pressão negativa (Pi) em um lúmen saturado de água (sombreado). Tensão de flexão (bending stress) ocorre na parede comum entre um capilar satura- do e outro cavitado. Tensões de flexão estão re- lacionadas a espessura da parede dupla (t), a abertura máxima do lúmem (b) e a diferença de pressão (Pi – Po). B) Corte longitudinal da parede dupla entre um capilar saturado (sombreado) e outro cavitado. Adaptado de Hacke et al., (2001). crescimento e baixa capacidade de armazenamen- to. Não há relação entre o diâmetro dos capilares e a densidade nas folhosas e pouca nas coníferas.

Ao contrário da provocada por congelamen- to, a cavitação pela seca apresenta fraca relação com os diâmetros dos capilares das coníferas e nenhuma com os das folhosas, onde depende das características da membrana da pontuação.

A aparente simplicidade estrutural da madei- ra de coníferas ajusta-se a estratégia de crescimen- to a longo prazo, como também a cavitação por congelamento e o sucesso em ambientes frios. A baixa eficiência condutiva dos traqueóides axiais e as respectivas baixas capacidades de troca gasosa e fotossintética das coníferas representa vantagem sobre as folhosas, contribuindo para que possuam árvores altas (sequóias) e antigas (Pinus longaeva com 4.900 anos, Fig. 80).

Figura 80. Pinus longaeva, árvore mais antiga.

Nas folhosas, os diferentes tipos de célu- las adjacentes a um vaso formam uma matrix condu tora com a devida importância funcional no transpor- te de água. Um conjunto de vasos apresenta uma maior eficiência condutiva do que um único vaso, alcançando longas distâncias. Entretanto, essa ca- racterística oferece pouca resistência à cavitação. Traqueóides saturados adjacentes aos vasos, atuam como escudo, protegendo-os contra a entrada de ar. Os vasos estão embebidos em uma matrix de fibras mortas e ou vivas, ou adjacentes aos raios ou as “células de contato” (trocam solu- ções salinas com os vasos). Há evidências de que as células de contato apresentam elevada atividade enzimática na liberação de açúcar na seiva bruta ge rando pressões positivas nas madeiras de algumas árvores e ativo papel na reversão da cavitação. As árvores apresentam uma diminuição da condutividade da água do tronco em direção aos galhos secundários e as folhas. Segundo a “hipóte- se da segmentação” este declínio é uma adaptação na qual a cavitação fica restrita aos órgãos “inferio- res” distantes, sacrificados durante uma seca. Essa perda planejada de folhas e pequenos galhos alivi- am a pressão na base da árvore, contribuindo para sua sobrevivência durante o período de seca. A cavitação varia não só entre galhos, mas também entre raízes e galhos. As raízes, principal- mente as pequenas, são mais susceptiveis que os galhos.

Há uma correlação positiva entre o tamanho e o diâmetro dos vasos. Nas árvores com porosida- de em anel, os poros do lenho inicial e os das videi- ras possuem vários metros; nas com porosidade difusa e arbustos, são muito estreitos e abaixo de 1 metro. Comportamento semelhante ocorre nas grandes raízes. O dilema eficiência-segurança também fixa o limite máximo para o tamanho dos vasos. Admitin- do-se que a membrana da pontuação é o principal componente da eficiência condutiva, a evolução dos vasos conduz a longos tubos que ofereçam baixa resistência condutiva. A estrutura das pontuações é vital na susce- ptibilidade a cavitação por estresse hídrico: ⋅ Orifícios grandes nas membranas das pontuações facilitam a condutividade. Entretanto, no caso das folhosas, permitem a propagação da embolia. ⋅ Relação eficiência condutiva x resistência da pare- de celular. Maiores e mais freqüentes menbranas de pontuações facilitam o transporte, porém requer uma parede secundária espessa. Grandes abertu- ras das pontuações aumentam a condutividade, porém aumentam o risco de implosão devido a pressão de sucção da água. ⋅ Há evidências de que microcanais nas membranas das pontuações alteram-se quando as pectinas in- cham e desincham, pois atuam como hidrogéis. ⋅ A forma e dimensões da câmara e da abertura da pontuação determinam o limite máximo no qual a membrana deforma sob pressão. ⋅ As finíssimas membranas das pontuações inter- vasculares permitem a passagem de água enquanto previnem a entrada de bolhas de ar e xilófagos.

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43⋅ Quando localizada dentro da câmara, as guarni- ções limitam o deslocamento da membrana, reduzin do a susceptibilidade da pontuação intervascular a entrada de ar através das membranas. ⋅ Em determinadas espécies pontuações guarneci- das estão presentes no lenho tardio e ausentes no lenho inicial. 8.3. Tendências ecológicas e evolutivas das caracte rísticas anatômicas ⋅ Porosidade em anel comum nas folhosas tempera- das e raras nas tropicais. ⋅ Diâmetro estreito dos poros associados a ambien- tes mais secos. ⋅ Abundância de parênquima axial decresce com au- mento da latitude. ⋅ Vasos e traqueóides vasculares estreitos com es- pessamento espiralado ocorrem frequentemente em áreas secas ou frias. ⋅ Pontuações intervasculares com torus ocorrem em madeira com porosidade em anel, vasos estreitos (diâmetro < 20 μm) e climas temperados frios. ⋅ Pontuações intervasculares guarnecidas tem ele- vada incidência em ambientes com altas taxas de transpiração ou altas tensões no xilema, como p. ex. florestas tropicais, sazonais e desérticas, suge- rindo que as guarnições reduzem a aspiração ou ruptura da membrana ao apoiá-la contra grandes pressões, podendo ainda, auxiliar na dissolução da embolia e na funcionalidade dos vasos. ⋅ Ambientes frios ou montanhosos: ⋅ Incremento na freqüência de vasos e espessa- mentos helicoidais ⋅ Decréscimo no diâmetro e tamanho do elemento vascular. ⋅ Planícies tropicais: ⋅ Incremento no diâmetro dos poros e nas placas de perfuração simples ⋅ Decréscimo na freqüência de vasos e nas placas de perfuração escalariforme e número de barras. ⋅ Ambientes secos: ⋅ Incremento em diâmetro e tamanho do elemento

vascular, no espessamento da parede celular, nas placas de perfuração simples, nos vasos agrupados e dimorfismo nos vasos. ⋅ Decréscimo no diâmetro e tamanho do elemento vascular e nas placas de perfuração escalarifor- me e números de barras. ⋅ Ambientes tropicais mésicos: ⋅ Alta incidência de placas de perfuração escalari- forme com muitas barras em vasos de paredes fi- finas, longos, estreitos e angulares.

Geograficamente, o diâmetro dos poros aumenta em direção aos trópicos. Poros largos (> 200 µm) e poucos poros estreitos são encontrados na Amazônia. Entretanto, mesmo nos trópicos há um limite máximo para o diâmetro útil do vaso, pois se o poro perde a função, a condutividade diminui com o aumento do tamanho do vaso. ⋅ nas regiões quentes prevalecem madeiras de co- res variadas e mais escuras que as de clima frio, onde predominam as “madeiras brancas”. 9. VARIABILIDADE DA MADEIRA

Ocorre variação na estrutura e nas proprie- dades da madeira de espécie para espécie, na mesma espécie e na própria árvore. As causas des- sas variações são: · genéticas, · ambientais e · cambiais (idade do câmbio ao produzir lenho juve- nil ou maduro). 9.1 Madeira juvenil

Madeira juvenil é aquela produzida pelo câmbio jovem; ocupa o centro de todas as árvores. Árvores jovens seriam totalmente de madeira juve- nil; árvores antigas possuem lenho maduro com o centro de lenho juvenil (Fig. 81). A transição de madeira juvenil para madura é gradual, ocorrendo o mesmo com relação às propriedades. É difícil de ser detectada com um simples exame.

Figura 81. Lenhos juvenil, maduro e de compressão de uma conífera.

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44Na zona do lenho juvenil, características

celulares (p.ex., dimensões e ângulo das microfibri- las da camada S2) mudam relativamente rápido. No lenho maduro essas características são relativamen te estáveis.

A duração do período de formação da made ira juvenil varia de espécie para espécie, em média de 5 a 25 anos em algumas e até 1800 anos em outras.

A madeira juvenil das coníferas apresenta: · qualidade inferior, · células mais curtas, · maior ângulo das microfibrilas da camada S2, · maior contração longitudinal), · baixa proporção de lenho tardio, · baixa densidade e resistência, · alto teor de lignina.

Em folhosas americanas, a diferença entre lenho juvenil e maduro não é tão evidente como nas coníferas.

A madeira juvenil das folhosas também apre senta células mais curtas com maior ângulo de S2. Normalmente ao afastar-se da medula, o diâmetro do poro aumenta e o número de poros por unidade de área diminui. 9.2. Taxa de crescimento

Árvores de crescimento rápido apresentam anéis de crescimento largos e escassos por unidade de área; árvores de crescimento lento possuem anéis estreitos e numerosos por unidade de área (Fig. 82).

Figura 82. Anéis de crescimento. À esquerda, crescimento rápido; à direita, crescimento lento.

Influência da taxa de crescimento: · Nas coníferas um leve ou acentuado efeito na den- sidade depende de alteração da relação lenho inicial/tardio. · Nas folhosas com porosidade difusa nenhum efeito significativo ocorre com a densidade, ao contrário daquelas com porosidade em anel, onde a propor- ção de lenho inicial permanece constante e o le- nho tardio aumenta. Assim, dentro de certos limites de crescimento, anéis mais largos apresentam maior percentagem de lenho tardio e, conseqüente mente, maior densidade. 9.3. Galhos

Anatomicamente diferentes, apresentam células axiais mais curtas e de pequeno diâmetro, anéis de crescimento estreitos e densidade geral- mente mais alta. · Nas folhosas possui maior volume de vasos e raios

e menor de fibras. · Nas coníferas possui alto volume de raios e nume- rosos canais resiníferos pequenos. Em que pese a baixa qualidade para deter- minados fins, normalmente os galhos das folhosas apresentam melhor aproveitamento. 9.4. Raízes

Normalmente as raízes apresentam células de maior diâmetro, paredes mais finas, baixa densi- dade e resistência, alto teor de lignina e baixo de celulose.

Nas folhosas possuem mais vasos e parên- quimas e poucas fibras de maior comprimento; os vasos mudam de porosidade: normalmente em anel no tronco e difusa nas raízes. Nas coníferas possuem traqueóides axiais de comprimento variável, menos canais resiníferos, mais lenho de compressão e grã espiral, maior ângulo das microfibrilas e maior volume de resina. As raízes podem ser utilizadas para folhea- dos decorativos e, principalmente, químicos. 10. RELAÇÃO ENTRE A ESTRUTURA ANATÔMI- CA DA MADEIRA COM SUAS PROPRIEDA- DES E COMPORTAMENTO TECNOLÓGICO 10.1. Densidade e resistência mecânica ⋅ A densidade é talvez a característica tecnológica mais importante da madeira, pois dela dependem outras propriedades como resistência, grau de alte- ração dimensional, etc. ⋅ O grau de resistência que se pode deduzir da den- sidade é, no entanto altamente modificado pela es- trutura histológica (comprimento das células, espes- suras das paredes, quantidade de pontuações, etc). ⋅ As fibras constituem os elementos mais importan- tes na resistência mecânica da madeira de folhosas. Há uma estreita relação entre volume de fibras, den- sidade e resistência mecânica. ⋅ Os vasos constituem pontos fracos, sendo que sua abundância e distribuição reduzem consideravel mente a resistência mecânica da madeira. O lenho com porosidade em anel apresenta uma resistência menor a determinados esforços do que o de porosi- dade difusa. ⋅ O parênquima axial é um tecido frágil, cuja abun- dância (20 a 100 % na madeira de folhosas) e distri- buição (principalmente em amplas faixas contínuas), reduz consideravelmente a resistência da madeira. ⋅ Normalmente o lenho com maior volume de raios contém um grande volume de fibras com paredes espessas, possuindo elevada densidade. ⋅ Nas coníferas, o lenho tardio é geralmente mais resistente devido ao maior volume de material lenho so nas paredes de suas células. A percentagem de lenho tardio e a regularidade na espessura dos anéis de crescimento afetam a densidade e a resis- tência mecânica da madeira. 10.2. Durabilidade natural Resistência ou durabilidade natural é o grau de susceptibilidade da madeira ao ataque de agen-

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45tes destruidores como fungos, insetos e brocas marinhas. ⋅ As madeiras de alta densidade são mais resis tentes aos xilófagos, pois apresenta uma estrutura mais fechada e freqüentemente elevado teor de substâncias especiais nas paredes das células. Tais substâncias (sílica, alcalóides, taninos), em parti- cular no cerne, aumenta a durabilidade natural da madeira devido ao efeito tóxico sobre os xilófagos. À sílica atribui-se a maior durabilidade das madeiras em contato com a água do mar. ⋅ A grande abundância de tecido parenquimático confere baixa durabilidade natural, pois é um tecido macio, de fácil penetração e possui conteúdos nutri- tivos armazenados em suas células (amidos, açúca- res, proteínas, etc.). O Parênquima axial paratraque al favorece o desenvolvimento de certos xilófagos que depositam seus ovos nas cavidades dos vasos e, ao eclodirem, as larvas alcançam facilmente os nutrientes. ⋅ Os vasos grandes e livres de conteúdos e tilos favorecem a penetração de fungos e insetos. ⋅ O cerne apresenta maior durabilidade natural, porém depende da qualidade preservativa dos extrativos presentes, das condições de exposição e do tipo de fungo. ⋅ As madeiras escuras são em geral mais duráveis. ⋅ A madeira constantemente seca pode durar indefi- nidamente. A madeira submersa não se deteriora significativamente: bactérias e certos fungos de podridão mole podem atacar madeira submersa, mas a deterioração resultante é muito lenta. 10.3. Permeabilidade Refere-se ao grau de facilidade de circula- ção de fluidos através de uma substância porosa sob ação de um gradiente de pressão. É uma carac- terística importante sob o aspecto da secagem e preservação de madeiras. ⋅ Em geral, madeiras de elevada densidade são mais difíceis de serem secadas e impregnadas com soluções preservantes. ⋅ A maior entrada ou saída de líquidos se dá através dos capilares: os vasos nas folhosas e os traqueói- des axiais nas coníferas. ⋅ O tamanho, abundância, distribuição dos poros e a presença ou não de substâncias obstrutoras influem no grau de permeabilidade das folhosas. ⋅ O parênquima axial é mais permeável que as fibras. ⋅ O lenho inicial é mais permeável que o lenho tardio. ⋅ Na madeira a permeabilidade é maior no sentido axial do que no transversal ⋅ O estado das pontuações areoladas das paredes dos traqueóides axiais (aspiradas ou não) é de grande importância no grau de permeabilidade da madeira de coníferas. ⋅ A presença de substâncias especiais (gomas, resinas, látex, etc), canais celulares e intercelu-lares, pode afetar a penetração de preservativos e a secagem de madeiras por se liquefazerem, obstruin- do a passagem de fluidos.

10.4. Trabalhabilidade Refere-se a facilidade de se processar a madeira com ferramentas. Varia diretamente com a densidade: quanto mais baixa a densidade mais fácil de cortar a madeira. ⋅ A obtenção de uma superfície lisa depende da densidade, grã irregular, depósitos minerais duros e madeira de tração. ⋅ Madeiras com grã reta facilitam a obtenção de um bom acabamento superficial, ao contrário daquelas com grã irregular, que apresentam acabamentos ásperos. ⋅ Madeiras excessivamente mole (baixa densidade) apresentam dificuldade de acabamento, resultando em uma superfície lanosa. ⋅ Espécies de elevada densidade são difíceis de serem trabalhadas por desgastarem as ferramentas. ⋅ A presença de substâncias especiais pode causar dificuldades nas operações de desdobro, por aderirem-se as serras ou facas dos equipamentos. ⋅ A presença de carbonato de cálcio e sílica em abundância é capaz de tornar antieconômico o aproveitamento da madeira, pelos danos que produz nos equipamentos. 10.5. Alteração dimensional Por ser higroscópica, a madeira apresenta os fenômenos de contração e inchamento pela perda ou adsorção de água. ⋅ A entrada de água entre as moléculas de celulose da parede celular provoca o afastamento das mes- mas e, como conseqüência, o inchamento. O proces so inverso produz a aproximação das moléculas de celulose, resultando na contração da madeira. ⋅ Já que o inchamento e a contração ocorrem pelo ganho ou perda de água nas paredes celulares, madeiras que possuem em abundância células de paredes espessas (alta densidade) apresentam esses fenômenos em grau mais acentuado. 10.6. Colagem e revestimentos superficiais A textura da madeira tem grande impor-tância sob esse aspecto. Madeira com textura grossa absorve grande quantidade as substâncias que lhe é aplicada. ⋅ No caso de pinturas, são necessárias várias demãos para se obter um bom acabamento. Na colagem, a excessiva absorção do adesivo pela superfície porosa pode causar uma má aderência, além do perigo de ultrapassagem da cola até a outra face do compensado, prejudicando a sua aparência. ⋅ Madeira de estrutura muito fechada e superfície lisa apresentará deficiência de penetração do adesi- vo, reduzindo a área de colagem e ocasionando uma linha de cola fraca. ⋅ A presença de substâncias especiais (canais secretores, células oleíferas, conteúdos nos vasos) pode dificultar o processo de colagem e a aplicação de revestimentos superficiais como pinturas, verni- zes, etc., pois impedem a aderência do adesivo ou agem como inibidores do processo químico de adesão (cura da cola).

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4610.7. Polpa e papel ⋅ Madeira com grande volume de células de compri- mento longo é comumente preferida na fabricação de polpa e papel em função das propriedades de resistência ligadas a esta característica. Para isso, deve apresentar elevada proporção de fibras nas folhosas ou de traqueóides axiais nas coníferas e pouco tecido parenquimático (formado de células curtas). ⋅ Madeiras de densidade elevada possuem grande proporção de células com paredes espessas e rijas, mantendo sua forma tubular após o desfibramento, apresentando pouca área de contato entre elas, o que implica na redução da resistência mecânica. Origina papéis volumosos, grosseiros, porosos, com alta absorção e elevada elasticidade. Além disso, não há uma boa flutuação da pasta, há risco de afundamento, como também maior consumo de energia e desgaste dos equipamentos na operação de desfibramento. Ao contrário, as células provenien tes de madeiras de menor densidade se amoldam melhor, apresenta maior área de contato e conse- qüentemente maior resistência: produz um papel mais compacto, menos opaco e poroso, de superfí- cie homogênea e de maior resistência ao estouro (Fig.83).

Figura 83. Comportamento das células madeiras de alta e baixa densidade. A – células de madeira de elevada densidade: pouca área de contato; B – células de madeira de densidade mais baixa: maior área de contato entre elas por se achata- rem e se amoldarem melhor. ⋅ A faixa ideal de densidade para a produção de papel situa-se entre 0,4 e 0,6 g/cm3. ⋅ Nas coníferas, a proporção de lenho inicial e tardio constitui, talvez, o fator mais importante a influenciar as características do papel, tais como resistência, porosidade, capacidade de absorção, opacidade, cor, etc. ⋅ A eficiência de penetração e difusão de substân- cias químicas nos traqueóides axiais depende do lúmen e do sistema de pontuações e a sua organiza ção; nos vasos depende da desobstrução, diâmetro e distribuição no lenho. ⋅ A presença de canais secretores e conteúdos espe ciais como gomas, resinas, látex, etc., é indesejável por serem estranhas ao processo, causando proble- mas na operação de cozimento e por se deposita- rem nas peneiras, superfícies metálicas e filtros. ⋅ Madeiras escuras comprometem a aparência do produto final ou aumentam o custo no processo de branqueamento. 10.8. Combustibilidade Determinada pela densidade e o teor de umidade. Madeiras de elevada densidade queimam melhor, uma vez que apresenta uma maior quanti- dade de matéria lenhosa por volume. A combusti-

bilidade e o poder calorífico são altamente influen- ciados pelo teor de lignina e extrativos inflamáveis como óleos, resinas, ceras, etc. A presença de extra tivos é responsável pelo odor exalado durante a combustão. Madeiras que apresentam substâncias espe ciais não devem ser empregadas para o cozimento ou defumação de alimentos, uma vez que o cheiro exalado pode alterar o sabor. Em alguns casos, entretanto, podem conferir um gosto e aroma pecu- liar e desejado ao produto. 11. DEFEITOS DA MADEIRA

Defeitos são irregularidades, descontinuida- des ou anomalias estruturais, alteração químicas ou colorações normais que se apresentam no interior ou exterior da madeira e podem desvalorizar, preju- dicar, limitar ou impedir o seu uso. Depende do pon- to de vista do usuário, pois são inerentes a particu- laridades próprias da árvore.

Podem ser:

11.1. Defeitos de secagem Ocorrem pela retirada natural ou artificial da

água da madeira, dificultando seu reaproveitamento em uma fase posterior (Fig. 84).

Figura 84. Contrações e deformações característi- cas de peças de madeira de acordo com a forma e localização no tronco.

Durante a secagem normal a superfície da

madeira seca primeiro e estando abaixo do psf con- trai, enquanto o interior está úmido, acima do psf. Isto provoca tração na superfície e compressão no interior (Fig. 85). Se o esforço exceder a tração per- pendicular das células, haverá rachaduras superfici- ais. Se a compressão exceder a das células do interior, haverá colapso. Então, a contração ocorre antes da peça inteira estar a um teor de umidade uniforme abaixo do psf: a perda de umidade ocorre primeiro na superfície. Com a superfície seca, a umi dade movimenta-se do interior para o exterior. Há duas maneiras de deslocamento da água: fluxo de água livre nos lumens das células e difusão de molé culas tanto da água higroscópica como do vapor d’água nos lumens das células. A difusão ocorre apenas abaixo do psf. Continuando a secagem, o in

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Figura 85. Distribuição da água na madeira.

terior perde umidade enquanto a superfície perma nece “imóvel”, invertendo as tensões: a superfície fi- ca sob ação de compressão, enquanto o interior sob ação de tração, contrai. Essa distribuição de ten- sões pode ocasionar o aparecimento de rachaduras tipo favos de mel.

O deslocamento da umidade é 12 a 15 vezes maior axial do que transversalmente.

Os principais defeitos durante o processo de secagem são os empenos, as rachaduras, o colap-so e o endurecimento superficial (Fig. 86). 11.1.1 Empeno – é toda alteração sofrida pela madeira em relação ao seu plano original, ou seja, é a deformação que pode sofrer uma peça de madeira pela curvatura dos seus eixos longitudinal, transver- sal ou ambos. Os diversos tipos de empenos podem ocorrer por diferenças de contrações entre os anéis de crescimento, madeira juvenil e adulta, cerne e alburno, desvios da grã e presença de madeira de reação. São cinco os tipos de empenos:

Figura 86. Principais defeitos de secagem. ⋅ Encanoamento – ocorre devido a secagem mais rápida de uma face ou quando uma face se contrai mais que a outra mesmo com secagem uniforme, em função do plano em que foi feito o corte da peça de madeira (radial ou tangencial); ⋅ Torcimento - as causas podem ser as anteriores ou pela combinação de contrações diferentes e desvios da grã (espiralada, diagonal, entrecruzada, ondula- da);

⋅ Arqueamento - ocorre pela diferença de contração axial entre laterais da mesma peça de madeira; ⋅ Encurvamento (abaulamento) - ocorre devido às diferenças de retração nas faces de uma peça de madeira quando uma delas seca mais que a outra, além de irregularidades da grã e tensões desenvolvi das durante o crescimento da árvore; ⋅ Diamante – ocorre em peças de seção quadrada, resultado da diferença entre as contrações tangen-

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48cial e radial, quando os anéis de crescimento vão, diagonalmente, de um canto a outro da seção. 11.1.2. Rachaduras - aparecem como conseqüência da diferença de retração nas direções radial e tan- gencial da madeira e de diferenças de umidade entre regiões contíguas de uma peça. Essas diferen ças levam ao aparecimento de tensões que, tornan- do-se superiores à resistência dos tecidos lenhosos, provocam a ruptura da madeira. As rachaduras, for- madas no início e acentuadas durante a secagem, são comuns nas madeiras de densidade mais alta, nas menos permeáveis e em peças mais espessas,. Podem ser evitadas mediante a secagem lenta e uniforme da madeira. Os tipos de rachaduras são: ⋅ Rachaduras de topo (fendas) - aparecem nas extre midades das peças, causadas pela secagem mais rápida dessas regiões em relação ao resto da peça. Nesse caso, os extremos começam a contrair rapidamente e, como o resto da peça não acompa- nha, ocorrem as rachaduras, que em casos mais sérios pode transformar-se em verdadeiras fendas; ⋅ Rachaduras superficiais - normalmente ocorrem no período inicial de secagem, principalmente quando a umidade relativa do ar atinge valor muito baixo (< 50%) gerando, assim, uma rápida evaporação da superfície. Essas rachaduras podem aparecer quan- do as condições de secagem são muito severas, isto é, baixas umidades relativas, provocando a rápi- da secagem das camadas superficiais até valores inferiores ao psf, enquanto as camadas internas es- tão acima do psf. Como as camadas internas impe- dem as superficiais de se retraírem, aparecem ten- sões que, excedendo a resistência à tração perpen- dicular às fibras, provocam o rompimento dos teci- dos lenhosos. ⋅ Rachaduras internas ou em favos de mel - resultam de rachaduras superficiais que se fecha- ram ou de rupturas por tração no interior da peça; aparecem principalmente em madeiras mais densas quando secam a altas temperaturas e cuja resistên- cia à tração transversal é inferior as tensões de se- cagem. Podem também estar associada ao colapso e ao endurecimento superficial. Em muitos casos, este tipo de defeito não é visível na superfície e no topo da peça e, somente após o processamento (corte), poderá ser observado. Uma vez desenvolvi- das, as rachaduras internas não podem ser elimina- das e, na grande maioria dos casos, a madeira será inutilizada. 11.1.3. Colapso - é caracterizado por ondulações nas superfícies das peças, que se apresentam bas- tante distorcidas (Fig. 87). A principal causa do colapso é a tensão capilar, que se manifesta na fase inicial de secagem quando a umidade da madeira está acima do psf. Os fatores que influenciam o co- lapso são pequeno diâmetro dos capilares e das pontuações, altas temperaturas no início da seca- gem, baixa densidade e alta tensão superficial do líquido que é removido da madeira. O desenvolvi- mento do colapso requer considerável número de células completamente saturadas, não havendo

espaço para o ar, além de baixa permeabilidade. A intensidade de colapso aumenta com a temperatura; para diminuí-la deve-se reduzir a temperatura de secagem até a madeira atingir o psf. A temperatura no início não deve ultrapassar 50oC.

Figura 87. Colapso. 11.1.4. Endurecimento superficial - é causado pelos esforços de tração e compressão que ocorrem na madeira durante o processo de secagem. Este defeito é devido a secagem muito rápida e desuniforme. Essa situação permanece mesmo depois da madeira atingir um teor uniforme de umidade. O processo de endurecimento superficial pode originar rachaduras internas tipo favos de mel. Pode ser reduzido ou eliminado se ao final da secagem a madeira for submetida a um tratamento com vapor (condicionamento), deixando-a exposta por determinados períodos de tempo a elevadas umidades relativas. 11.2. Defeitos na estrutura anatômica 11.2.1. Nós

Nó é uma porção do ramo de uma árvore incorporada à peça de madeira, com propriedades diferentes da madeira circundante (Fig. 88).

Os nós podem ser: ⋅ Nó firme ou vivo - fica firmemente retido na madeira seca em condições normais. Corresponde a época em que o ramo esteve fisiologicamente ativo na árvore, havendo uma perfeita continuidade de seus tecidos com os do tronco. ⋅ Nó morto ou solto - não fica firmemente retido na madeira seca. Corresponde a um galho que morreu e deixou de participar do desenvolvimento do tron- co. Não há continuidade estrutural e a sua fixação depende da compressão exercida pelo cresci- mento diametral do fuste.

Os nós são mais densos, escuros e lignifica- dos do que a madeira circundante e por isso mesmo mais duros e quebradiços. Dificultam a trabalhabili- dade e apresenta deformação desigual da madeira normal.

Reduz acentuadamente as propriedades da madeira, principalmente à tração e flexão. Pode apresentar efeito decorativo.

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Figura 88. Os diferentes tipos de nós na madeira. 11.2.2. Lenho de reação O esforço assimétrico a que está submetido um tronco ou galho produz células diferentes das normais, com o objetivo de reagir ao esforço que provoca essa assimetria para retornar a sua posição normal. É o mecanismo adotado pela árvore para manter ereto o tronco inclinado ou ângulos dos ga- lhos em resposta à gravidade e distribuição de hor- mônios (auxinas). Comum nas árvores com tronco curvo, em encostas acentuadas ou na base dos ramos. Pode estar presente em árvores que apre- sentam troncos cilíndricos e retos. O lenho de reação diferencia-se física, ana- tômica, química e mecanicamente do lenho normal. Coníferas e folhosas apresentam comportamento completamente distintos na formação do lenho de reação. As coníferas formam lenho de compressão e as folhosas, de tração (Fig. 89). 11.2.2.1. Lenho de compressão Forma-se no lado inferior da inclinação dos troncos ou ramos de coníferas, portanto no lado su-jeito ao esforço de compressão. Apresenta cresci-mento excêntrico, lenhos inicial e tardio indistintos (transição gradual), traqueóides axiais mais curtos, poucas e pequenas pontuações, os do lenho tardio possuem paredes mais espessas (até duas vezes), madeira sem brilho e mais escura que a normal. Os traqueóides axiais apresentam seção transversal arredondada formando espaços intercelulares entre eles e rachaduras oblíquas em suas paredes, afe- tando consideravelmente a resistência da madeira (Fig. 90).

Figura 89. Lenho de reação em coníferas e folhosas.

Possui propriedades e características bem

distintas da madeira normal: ⋅ extrema dureza ⋅ maior densidade ⋅ ausência da camada S3 da parede celular ⋅ sulcos (fibrilas) espiralados e aumento do ângulo das microfibrilas em S2

⋅ camada S1 mais espessa que o normal ⋅ alta resistência à compressão e baixa à tração ⋅ incremento na contração axial devido ao aumento do ângulo das microfibrilas em S2 ⋅ comportamento desigual e quebradiço ⋅ baixa trabalhabilidade com superfície sedosa.

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50⋅ coloração depreciativa e ⋅ anormalmente alto teor de lignina e baixo teor de celulose, afetando a polpação química.

A madeira oposta a de compressão apre-

senta:

⋅ propriedades diferentes da normal ⋅ maior ângulo das microfibrilas ⋅ menos lignina do que o lenho de compressão ⋅ mais celulose de elevada cristalinidade ⋅ regiões cristalinas maiores

a b c d Figura 90. a) Seção do tronco. b) e d) Traqueóides axiais de seção arredondada, espaços intercelulares entre eles e rachaduras nas paredes; c) e d) paredes com sulcos espiralados. 11.2.2.2. Lenho de tração Situa-se no lado superior da inclinação dos troncos ou ramos de folhosas, sujeitos aos esforços

de tração (Fig. 89 e 91). Difícil de ser constatado quando seco.

Apresenta crescimento excêntrico, colora-

Figura 91. À esquerda, localização do lenho de tração. Ao centro e a direita, fibras gelatinosas. ção distinta, mais clara, brilhante e superfície felpu- da (Fig. 92). Vasos mais curtos e menos numero- sos. Fibras com lumens pequenos e espessa cama- da gelatinosa nas paredes (denominadas fibras gelatinosas), caracterizando e conferindo à madeira um brilho especial. A camada gelatinosa é celulose quase pura, apenas levemente lignificada.

Possui propriedades e características bem distintas da madeira normal: ⋅ elevada densidade ⋅ fraca adesão entre as paredes primária e a secun- dária ⋅ camada S1 mais fina que o normal ⋅ microfibrilas da camada gelatinosa quase aproxima damente paralelas ao eixo principal ⋅ Alta resistência à tração e baixa à compressão e a flexão ⋅ quase ausência de lignina e elevado teor de celulo- se

⋅ elevada instabilidade dimensional (principalmente axial)

Figura 92. Madeira de tração apresentando superfície felpuda após serragem.

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51 ⋅ difícil trabalhabilidade, apresentando superfície ás- pera e lanosa ⋅ compensados empenados, corrugados e rachados ⋅ coloração anormal e depreciativa e ⋅ polpação difícil e baixa qualidade do papel. 11.3. Danos causados por esforços mecânicos 11.3.1. Tensões de crescimento Os troncos e ramos das árvores encon-tram-se normalmente sob forte tensões de cresci- mento. As células produzidas pelo câmbio, durante o curto período de amadurecimento, apresentam mudança drástica de comportamento mecânico na parede celular – de baixa rigidez e elevada elastici- dade para elevada dureza e baixa deformação – expandindo transversalmente e contraindo axialmen te. No entanto, a forte adesão da célula jovem à ma- deira formada anteriormente impede a contração axi al, provoca tração axial e compressão tangencial na parede e desenvolve um estado de tensões como mostra a Fig. 93. Na direção radial as tensões são quase ilimitadas. A soma das tensões de sustenta ção e amadurecimento é denominada de tensões de

crescimento. O retorno do tronco a sua posição normal e estável origina tensões de crescimento.

Há dois tipos de tensões de crescimento: ⋅ Tensões axiais – Nas camadas externas do tronco ocorrem tensões de tração; para compensar, no in-terior do fuste ocorrem tensões de compressão. Esforços de flexão provocados p.ex., pelo vento, representam um perigo especialmente às regiões da árvore opostas ao esforço, onde a madeira sofre tensão de compressão. ⋅ Tensões transversais – Comportam-se de maneira inversa, de forma que o interior apresenta tensões de tração e mais externamente, de compressão.

Quando a árvore está em pé, há uma com- pensação entre as tensões internas e externas do tronco, ou seja, ocorre equilíbrio. Porém o abate, seccionamento ou desdobro pode liberá-las, ocasio- nando fendas e deformações muitas vezes exage- radas (Fig. 94). Árvores com tensões de crescimento eleva- das possuem maior comprimento de fibras, de va- sos, de espessura da parede celular, de contração volumetrica e de módulo de elasticidade, e menor proporção de lignina do que aquelas com tensões inferiores.

Figura 93. Distribuição das tensões de crescimento. À esquerda, no tronco. À direita, na parede celular.

As tensões axiais são 10 vezes superiores as transversais e, dentre essas, as tangenciais são maiores que as radiais.

As tensões aumentam com o crescimento da árvore, com o desvio do centro de gravidade e com a reorientação freqüente do tronco.

Os efeitos das tensões de crescimento variam segundo a posição que ocupa o pranchão ou tábua no tronco (Fig. 94).

Peças de madeira serrada de espessura variável é conseqüência de movimentos produzidos pelo tronco enquanto ocorre o desdobro.

11.3.2. Falhas de compressão É o rompimento interno do lenho, as vezes perceptível apenas ao microscópio, que surge na madeira serrada como linhas quebradas claras, dispostas perpendicularmente à grã. Observam-se também como manchas escuras envolvendo o tecido afetado, em conseqüência do afluxo anormal de goma ou resina.

Esse defeito resulta de micro-rupturas e de- formações nas paredes celulares, provenientes da compressão acima do limite elástico, ocasionada por traumatismo produzido pelo vento, peso de ne- ve, queda de árvore sobre outra ou esforço que pro-

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Figura 94. Deformações provocadas pelas tensões de crescimento antes e após o desdobro. voque acentuada curvatura do tronco sem quebrar.

As falhas de compressão constituem um gra ve defeito, pois afetam profundamente as proprieda- des mecânicas da madeira, fazendo com que esta quebre inesperadamente. Bastante comum em madeiras de guapuru- vu e Angelim-pedra. 11.3.3. Aceboladura Fenda circular que ocorre no interior do tron- co. Corresponde a uma zona frágil em decorrência de um espaçamento brusco e exagerado entre anéis de crescimento (Fig. 95). Danos mecânicos externos ou tensões de crescimento provocam este defeito, podendo inutilizar completamente a madeira. 11.3.4. Bolsas de resina ou de goma Quando a cavidade do defeito anterior é preenchida com resina ou goma têm-se as chama- das bolsas de resina ou goma (Fig. 96). Resultam de fendas tangenciais no câmbio praticadas por esforços mecânicos. Afeta as propriedades de resis- tência e a aparência da madeira, além de prejudicá-la para folheados e compensados.

Apresentam zonas de lenho translúcido ou manchas que podem liquefazer quando aquecidas no processo industrial.

Figura 95. Aceboladura. 11.4. Outros defeitos 11.4.1. Esmoada (quina morta)

É o canto arredondado, formado pela curva-tura natural do tronco (Fig. 97). Caracteriza elevada proporção de alburno. Defeito ocasionado no desdo- bro, pois o pranchão e posteriormente a tábua, apresentam vestígios de casca, mostrando clara- mente a seção circular do tronco.

Figura 96. Bolsas de resina

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Figura 97. Esmoada. 12. BIBLIOGRAFIA CORADIN, V.T.R. & CAMARGOS, J.A.A. Noções sobre anatomia da madeira e identificação anatômica. Brasília, IBAMA, 2001. 43 p. WHEELER, E. A. Wood anatomy. Raleigh, NCSU, 2001. np. CLOUTIER, A. Anatomie et structure du bois. Université Laval, 2002. np. RICHTER, H.G. & BURGER, L.M. Anatomia da madeira. São Paulo, Nobel, 1991. 154 p. CORADIN, V.T.R. et al. Normas e procedimentos em estudos de anatomia de madeira: I. Angiospermae II. Gimnospermae. Brasília, IBAMA, 1991. 19 p. GOMES, A.V. & RICHTER, H.G. Microtécnica e fotomicrografia. Curitiba, UFPR. Apostila. np. ROWELL, R.M. Handbook of wood chemistry and wood composites. Boca Raton, CRC Press, 2005. 504p. DINWOODIE, J.M. Timber: Its nature and behaviour. 2 ed. Taylor & Francis, 2000. KOLLMANN, F.F.P. Tecnologia de la madera y sus aplicaciones. Madrid, Instituto Forestal de Investiga- ciones y Experiencias, 1959. 675 p. KRAMER, P. J. & KOZLOWSKI, T. T. Fisiologia das árvores. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1972. 745 p. GROSSER, D. Defeitos da Madeira. Curitiba, Fupef, 1980. 62 p. IBAMA. Madeiras da amazônia: Características e utilização. Brasília, IBAMA, 1997. 141 p. BARREAL, J.A.R. Patologia de la madera. Madrid, Fundación Conde del Valle de Salazar e Ediciones Mundi-Prensa, 1998. 349 p. PEÑA, S.V. & PERIS, F.J.J. Tecnología de la Madera. Madrid, Ministerio de Agricultura, Pesca y Alimentación e Ediciones Mundi-Prensa, sd. 653 p. 2ª ed. MAINIERI, C. Manual de identificação das principais madeiras comerciais brasileiras. São Paulo, IPT, 1983. 241 p. FAHN, A. Anatomia vegetal. Madrid, H. Blume Ediciones, 1976. 643 p. IPT. Manual de preservação da madeira. São Paulo, IPT, Vol. I, 1986. 342p.