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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE SAÚDE COLETIVA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA DENISE PESTANA DE CASTRO ANALISE DE IMPLANTAÇÃO DO COMPONENTE MUNICIPAL DO SISTEMA NACIONAL DE AUDITORIA DO SUS: PROPOSTA DE UM INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO SALVADOR - 2004

ANALISE DE IMPLANTAÇÃO DO COMPONENTE MUNICIPAL … · 8689/93 e regulamentado pelo Decreto 1651/95, estabelece a estruturação e funcionamento geral do sistema, a ser implementado

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE SADE COLETIVA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SADE COLETIVA MESTRADO EM SADE COLETIVA

    DENISE PESTANA DE CASTRO

    ANALISE DE IMPLANTAO DO COMPONENTE

    MUNICIPAL DO SISTEMA NACIONAL DE

    AUDITORIA DO SUS: PROPOSTA DE UM

    INSTRUMENTO DE AVALIAO

    SALVADOR - 2004

  • DENISE PESTANA DE CASTRO

    ANALISE DE IMPLANTAO DO COMPONENTE MUNICIPAL

    DO SISTEMA NACIONAL DE AUDITORIA DO SUS: PROPOSTA

    DE UM INSTRUMENTO DE AVALIAO

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps- Graduao do Instituto de Sade Coletiva da Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obteno do Ttulo de Mestre em Sade Coletiva.

    Orientadora: Prof Dra Carmen Fontes Teixeira

    SALVADOR - 2004

  • AGRADECIMENTOS

    A minha querida orientadora Carmen Teixeira por ter-me acolhido na minha mudana

    de rea e projeto, pela confiana depositada em mim, pelos seus ensinamentos e sua orientao na construo deste trabalho.

    Prof Maria Isabel Viana, que foi inicialmente minha orientadora, por todo seu

    apoio, amizade e estmulo na mudana do meu projeto (orientadora do corao). Secretaria de Sade do Estado da Bahia, em especial, a Dr Lcia Freire, por seu

    entendimento sobre a importncia da capacitao, por sua compreenso e por ter me concedido o afastamento das minhas atividades na fase final de entrega da dissertao.

    Prof Lgia Maria Vieira da Silva, por sua colaborao de grande importncia na

    minha qualificao e por toda ateno, delicadeza e orientao no primeiro consenso. Ao Prof. Lus Eugnio de Souza, por sua colaborao na qualificao do projeto e no

    primeiro consenso e, ainda, por ter tido a generosidade de dispor de seu tempo e ter visto a matriz.em sua fase bem inicial e ter-me estimulado a seguir em frente.

    A todos os professores do Instituto de Sade Coletiva, em especial, ao Prof. Jairnilson

    Paim: por sempre nos mostrar a importncia dos sujeitos, por nos dar o exemplo de que preciso acreditar e tambm se indignar, por ser esse homem comum e ser um mestre. Ao mestre, com carinho, o meu obrigado especial.

    A minha turma de mestrado: Roberval, Rafael, Leila, Monique, Renato, Marcos,

    Nedja, Simone, Silvana, Simone, Sheila, Suzana, Rosana, meu agradecimento especial e, com muito carinho, companheira Edleusa, a Ieda e Lenira amigas mais presentes nos momentos de angstias e conquistas.

    A todos os funcionrios do Instituto de Sade Coletiva, em especial, s meninas da

    biblioteca Creuza, Beatriz e Rose a Na, Anunciao, Clinger e Moiss. Prof e amiga Eliane Souza que, com seu exemplo e palavras, sempre me estimulou

    a buscar novos caminhos, novas capacitaes e meu crescimento e tem muita culpa por eu estar aqui.

    Rosana Bezerra Batista Neves, meu agradecimento especial por sua amizade, por

    sua importante colaborao na construo dos dois consensos e por nossas conversas e reflexes sobre a Auditoria no SUS, muitas das quais esto inseridas de alguma forma no contedo deste trabalho.

    Aos amigos e colegas auditores Gustavo, Jos Raimundo, Neuza, Regina, Vanda e

    Vera, pela importante colaborao e altssima pacincia de participarem da construo do consenso da matriz de avaliao. Adoro vocs.

    Ao Dr. Paulo Srgio Nunes, diretor do DENASUS, por sua contribuio na construo

    do primeiro consenso;

  • 58

    Dra Eliane Noya que, na poca do meu ingresso no mestrado, era diretora da

    Auditoria da SESAB e foi uma incentivadora do meu aperfeioamento. Aos colegas da Auditoria, pela compreenso da minha presena ausente. No

    poderia deixar de lembrar especialmente de Cludia, Cleonice, Ftima Valverde, Ftima Gomes, Antnio Querino e Pimenta.

    turma de Planificao e Administrao de 2003: Mara, Alfredo, Marlia, Cartacho,

    Carlos, Daniela e Marcelo pelos ricos momentos compartilhados nas disciplinas de Planificao e Administrao. Meu agradecimento especial a Claudina, pela sua amizade e por me ouvir nas horas de angstias.

    Ao Prof. Henrique pelo abstract. Gerluce por suas sugestes no modelo lgico. Olvia, por ajudar na agilizao da minha licena para concluso deste trabalho. A todos os funcionrios da Auditoria por toda ajuda que sempre disponibilizaram nos

    meus momentos de correria, principalmente Denise, Naide, Lina e Carla. SMS de Vitria da Conquista, em especial a Dra Rita Atade e toda sua equipe. SMS de Camaari, em especial, a Dra Zulmira e Dr Ariosvaldo. minha famlia: meus pais Orlando e Terezinha, irmos, cunhadas e sobrinho (a)s

    pelas horas de relaxamento nos almoos da famlia. Aos meus filhos, Filipe e Vincius pelo amor e alegria de todos os dias. Mario Cezar, com amor, pelo apoio, incentivo, companheirismo e cumplicidade de todas as horas; E, por fim, quero agradecer ao Universo e sua Fora Motriz, por toda luz a mim

    concedida, por todas essas pessoas, por essa oportunidade de crescimento, de realizao e de finalizao de uma etapa.

  • 59

    Somos todos anjos com uma asa s e s podemos voar quando abraados uns aos outros (Luciano de Crescenzo)

  • 60

    RESUMO

    O Sistema Nacional de Auditoria do Sistema nico de Sade (SNA/SUS), institudo pela Lei

    8689/93 e regulamentado pelo Decreto 1651/95, estabelece a estruturao e funcionamento

    geral do sistema, a ser implementado nos trs nveis federal, estadual e municipal de

    gesto do SUS. O componente municipal do SNA vem sendo implantado nos municpios que

    se habilitaram gesto plena do sistema em todo o pas. Faz-se necessrio, portanto, o

    desenvolvimento de um processo de avaliao da implantao desse componente visando

    identificar lacunas e propor melhorias em sua organizao e operacionalizao. At o

    momento, no se conta com um instrumento de avaliao que possa ser aplicado a distintos

    municpios em distintos contextos. O presente trabalho tem por objetivo a elaborao de um

    instrumento que possa vir a ser utilizado em processos de avaliao da implantao desse

    componente municipal. O marco terico contemplou reviso dos conceitos de regulao,

    controle, avaliao, distinguindo-os da concepo de auditoria, a partir do que se caracterizou

    a concepo do SNA do SUS. A elaborao do instrumento implicou a construo de uma

    matriz da imagem-objetivo do componente municipal do SNA, composta por nveis,

    dimenses e critrios, considerados como objeto de avaliao da sua estrutura e

    funcionamento, gerando uma graduao que indica o grau de implantao do sistema. O

    instrumento elaborado foi validado com a utilizao da tcnica de consenso e testado em um

    municpio do Estado da Bahia, selecionado em funo do nvel de desenvolvimento do

    componente municipal do SNA.

    Palavras chaves: Auditoria; Sistema Nacional de Auditoria; Componente Municipal do SNA;

    Avaliao em Sade; Anlise de Implantao; Regulao, Controle e Avaliao.

  • 61

    ABSTRACT

    The National Health Auditing System (SNA) of the Brazilian Unified Healthcare System

    (SUS), created by the Law 8689/93 and further regulated by the Decree 1651/95, determines

    the system's structure and general functioning to be carried into effect at the federal, state and

    municipal levels of the SUS management. The SNA's municipal component has been set up in

    those municipalities that have applied for the system's full management nationwide. The

    development of a procedure to assess such setup is therefore imperative if the gaps are to be

    identified and improvements are to be proposed regarding organization and

    operationalization. However, no assessment tool has been created that may be applied to

    different municipalities in specific contexts. This paper aims at devising a tool that may be

    used in the process of assessing the setup of the municipal component. The concepts of

    regulation, control and assessment as distinct from that of auditing were revised in the

    literature in order to characterize the conception of the SNA in the SUS context. An "image-

    aim" matrix of SNA's municipal component was devised encompassing levels, dimensions

    and criteria to assess its structure and functioning, thus generating a scale that indicates to

    which extent the system has been set up. This assessment tool was then validated by means of

    the consensus technique and tested in a municipality in the State of Bahia (Northern Brazil),

    which was selected by virtue of the SNA's municipal component development.

    Key Words: Auditing, National Auditing System, SNA's Municipal Component, Health

    Assessment, Setup Analysis, Regulation, Control and Assessment

  • 62

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Modelo Lgico

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Matriz de Avaliao do Componente municipal do Sistema Nacional de Auditoria do SUS

  • 63

    LISTA DE SIGLAS

    AIH Autorizao de Internao Hospitalar

    CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CIB Comisso intergestores Bipartite

    CIT Comisso Intergestores Tripartite

    CMA/SUS Componente Municipal de Auditoria do SUS

    CNS Conselho Nacional de Sade

    CONASEMS Conselho Nacional de Secretrios Municipais de Sade

    CONASS Conselho Nacional de Secretrios Estaduais de Sade

    DCAA Departamento de Controle, Avaliao e Auditoria do Ministrio da Sade

    DENASUS Departamento Nacional de Auditoria do SUS

    DF Distrito Federal

    FNS Fundo Nacional de Sade

    INAMPS Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social

    I-O Imagem Objetivo

    GPSM Gesto Plena do Sistema Municipal

    MS Ministrio da Sade

    NOAS Norma Operacional da Assistncia Sade

    NOB Norma Operacional Bsica

    PPI Programao Pactuada e Integrada

    SESAB Secretaria de Sade do Estado da Bahia

    SAI Sistema de Informaes Ambulatoriais do SUS

    SAS Secretaria de Ateno a Sade

    SIH Sistema de Informaes Hospitalares

    SNA Sistema Nacional de Auditoria

    SUDS Sistema unificado e Descentralizado de Sade

    SUS Sistema nico de Sade

    TCU Tribunal de Contas da Unio

    TCE - Tribunais de Contas do Estado

  • 64

    SUMRIO

    1 INTRODUO 11

    2 MARCO DE REFERNCIA 23

    2.1 REGULAO 23

    2.2 CONTROLE 30

    2.3 AVALIAO 35

    2.4 CONTROLE E AVALIAO NO SUS 40

    2.5 AUDITORIA 43

    3 METODOLOGIA 57

    3.1 MODELO LGICO 59

    3.2 ELABORAO E VALIDAO DO INSTRUMENTO 61

    3.3 APLICAO DO INSTRUMENTO DE AVALIAO: PR-TESTE 70

    4 RESULTADOS 76

    4.1 VERSO FINAL DA MATRIZ 76

    5 CONSIDERAES FINAIS 90

    REFERNCIAS 94

    ANEXOS 101

  • 65

    1 INTRODUO

    O Movimento de Reforma Sanitria, na dcada de 80 do sculo passado, contemplou a

    elaborao de uma crtica ao modelo mdico-hospitalar prevalecente no sistema de sade

    brasileiro, principalmente quanto inefetividade da prestao da assistncia mdica de carter

    curativo provida pelo antigo Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social

    (INAMPS), e, tambm, a ineficincia expressa no pagamento por produo de servios que

    consumia uma parte crescente de recursos e permitia o desperdcio atravs das fraudes

    aplicadas no setor (INOJOSA, 1996).

    A partir de 1986, com a VIII Conferncia Nacional de Sade, teve incio um processo

    de mudanas: uma, com a implantao do Sistema Unificado e Descentralizado de Sade

    SUDS, e a outra, a elaborao de uma nova Constituio Federal. Com o SUDS, iniciou-se o

    processo de descentralizao de servios para os Estados, persistindo, ainda, as mesmas

    prticas de gesto e controle do antigo INAMPS (INOJOSA, 1996).

    Com a aprovao da Sade como um direito social, na Constituio de 1988, e a

    criao do Sistema nico de Sade SUS, atravs das Leis Orgnicas de Sade 8.080/90

    (BRASIL, 1990a) e 8.142/90 (BRASIL, 1990b), a implantao desse sistema tornou-se um

    processo legal e legtimo, consolidando alguns princpios nascidos do movimento da Reforma

    Sanitria. Desse modo, o SUS um sistema integrado de sade garantido pelo Estado

    Brasileiro, organizado de acordo com as diretrizes da descentralizao, do atendimento

    integral e da participao da comunidade, conforme artigo 198 da Constituio Federal

    (BRASIL, 1998).

    Com base na legislao referida e atravs da implantao de Normas Operacionais

    Bsicas, inicialmente com as NOB 911 , NOB 922, NOB 933 e NOB 964 e, posteriormente,

    1 Norma operacional Bsica NOB -SUS 01/ 91. Resoluo INAMPS n 258, de 07/01/1991 2 Norma Operacional Bsica NOB SUS 01/92. Portaria SNAS 234, de 07/02/92.

  • 66

    com as Normas de Assistncia Sade, NOAS 20015 e NOAS 20026, o Ministrio da Sade

    vem conduzindo o processo de construo do SUS, tendo como eixo central a

    descentralizao da gesto do sistema, transferindo s Secretarias Estaduais de Sade e s

    Secretarias Municipais de Sade, as responsabilidades pelas aes e servios de sade. Os

    mecanismos para que essa transferncia ocorra de forma satisfatria, fundamentam-se em um

    sistema de planejamento, controle, regulao, avaliao e auditoria integrados tanto entre os

    trs nveis de governo quanto em cada um dos nveis (BRASIL, 2002)7.

    A Lei 8.080/90 (BRASIL, 1990a) define como competncia comum das trs esferas de

    governo a definio das instncias e mecanismos de controle, avaliao e de fiscalizao das

    aes e servios de sade no SUS e institui, como competncia da Direo Nacional do SUS,

    estabelecer o Sistema Nacional de Auditoria e coordenar a avaliao tcnica e financeira do

    SUS, em todo o territrio nacional (artigo 16, inciso XIX).

    A lei ainda estabelece que o MS acompanhar atravs de seu sistema de auditoria a

    conformidade programao dos recursos repassados a estados e municpios; constatada a

    malversao, desvio ou no aplicao dos recursos, caber ao Ministrio da Sade aplicar a s

    medidas previstas em lei (pargrafo 4 do artigo 33).

    Entre as responsabilidades estabelecidas no processo de descentralizao das aes e

    servios de sade, esto inseridas a contratao, o controle, a avaliao e auditoria dos

    servios, incluindo a operacionalizao e estruturao do componente estadual ou municipal

    do Sistema Nacional de Auditoria, de acordo com as responsabilidades e requisitos previstos

    nas condies de gesto das Normas Operacionais de Sade do SUS.

    Na NOB 01/91 (BRASIL, 1991), considerando a necessidade de controle e

    acompanhamento dos repasses efetuados, foi estabelecida como competncia do Ministrio da

    3 Norma Operacional Bsica NOB SUS 01/93. Portaria MS n 545, de 20/05/1993. 4 Norma Operacional Bsica NOB SUS 01/96. Portaria MS n 2.203, de 06/11/1996. 5 Norma de Assistncia Sade NOAS SUS 01/2001. Portaria GM/MS n 95, de 26/01/2001. 6 Norma de Assistncia Sade NOAS SUS 01/2002. Portaria SAS n 373, de 27/02/2002.

  • 67

    Sade e do INAMPS, a avaliao tcnica e financeira do SUS em todo o territrio nacional,

    cabendo ao Ministrio da Sade acompanhar, atravs de seu Sistema de Auditoria, a

    conformidade da programao aprovada para utilizao de recursos repassados a Estados e

    Municpios, cabendo-lhe aplicar as medidas previstas em lei quando constatadas a

    malversao, o desvio ou o emprego inadequado dos recursos. Entretanto, a persistncia dos

    mecanismos de pagamento por produo de servios colidia com as diretrizes do SUS

    estabelecidas nas Leis Orgnicas de Sade.

    A NOB-SUS 01/92 (BRASIL, 1992) centralizou a Auditoria no Ministrio da Sade

    atravs do Sistema de Auditoria Federal. Este rgo tinha como competncia auditar a

    aplicao dos recursos repassados pelo nvel federal aos Estados e Municpios, verificando se

    estavam de acordo com as disposies planejadas, cabendo-lhe a aplicao de medidas

    previstas, caso fossem constatados malversaes, desvios ou emprego indevido dos recursos.

    A Norma Operacional Bsica NOB-SUS 01/93 (BRASIL, 1993), tendo como

    princpio bsico o processo de descentralizao das responsabilidades de gesto da esfera

    federal para os municpios, introduziu algumas medidas como o aperfeioamento dos

    Sistemas de Informao Ambulatorial (SIA) e Hospitalar (SIH), constando entre as

    responsabilidades e os requisitos das condies de gesto, o controle e avaliao dos servios

    de sade. interessante anotar que, ao contrrio da NOB anterior, no h referncia ao

    Sistema Nacional de Auditoria.

    Atravs da Lei 8.689/938 (BRASIL, 1993), ficou institudo, no mbito do Ministrio

    da Sade, o Sistema Nacional de Auditoria (SNA), ao qual compete a avaliao tcnico-

    cientfica, contbil, financeira e patrimonial do SUS, a ser realizada de forma descentralizada,

    7 Portaria SAS n 423 de 26/06/2002. 8 Lei 8.689, de 27/07/1993, trata da extino do INAMPS (Instituto Nacional de Assistncia Mdica da

    Previdncia Social) e institui no artigo 6, o Sistema Nacional de Auditoria do SUS.

  • 68

    atravs dos rgos estaduais e municipais, cabendo a coordenao central ao Departamento de

    Controle, Avaliao e Auditoria DCAA do MS.

    Nessa proposta, a descentralizao do SNA feita atravs dos rgos estaduais e

    municipais e de representao do Ministrio da Sade, em cada estado da federao e no

    Distrito Federal, estando sob a superviso da direo nacional do SUS.

    O SNA foi regulamentado, primeiramente, pelo Decreto n 1.105, de 6 de abril de

    1994 (BRASIL,1994), que foi mais tarde revogado, o que foi atribudo ao seu carter

    centralizador. Nesse mesmo ano, o Decreto n 1.226 (Brasil, 1994), de 17 de agosto, transferiu

    253 cargos do INAMPS (em extino) para o Ministrio da Sade, assim como, os Escritrios

    de Representao do INAMPS passam a integrar a Estrutura organizacional do Ministrio da

    Sade.

    Com a revogao do Decreto n 1.105/94 e a edio do Decreto n 1.651, de 28 de

    setembro de 1995 (BRASIL, 1995), fica regulamentado o Sistema Nacional de Auditoria do

    SUS (institudo pela Lei 8.80/90 e Lei 8.689/93) e o sistema passa a ter uma configurao

    mais adequada realidade do SUS e passa a exercer, sobre as aes e servios desenvolvidos

    no mbito do SUS, conforme o artigo 2, as atividades de:

    I controle da execuo, para verificar a sua conformidade com os padres estabelecidos ou detectar situaes que exijam maior aprofundamento; II avaliao da estrutura, dos processos aplicados e dos resultados alcanados, para aferir sua adequao aos critrios e parmetros exigidos de eficincia, eficcia e efetividade; III auditoria da regularidade dos procedimentos praticados por pessoas naturais e jurdicas, mediante exame analtico pericial.

    Ainda nesse mesmo artigo, pargrafo nico, fica estabelecido que sem embargo das

    medidas corretivas, as concluses obtidas com o exerccio das atividades definidas nesse

    artigo sero consideradas na formulao de planejamento e na execuo das aes e servios

    de sade.

  • 69

    O artigo 4 do mesmo decreto estabelece que o SNA compreende os rgos que forem

    institudos em cada nvel de governo, sob a superviso da respectiva direo do SUS, e que a

    estrutura e o funcionamento observados no Plano Federal so indicativos da organizao a ser

    observada por Estados, Distrito Federal e Municpios para a consecuo dos mesmos

    objetivos no mbito de suas respectivas atuaes.

    Cabe registrar tambm o entendimento, por parte do MS, de que esse sistema se

    reveste das atividades de Auditoria, suplementando outras instncias de controle, subsidiando

    o processo de planejamento das aes de sade, sua execuo, gerncia tcnica e avaliao

    qualitativa dos resultados obtidos ( BRASIL, 1998).

    Tanto a Lei 8.689/93 (BRASIL, 1993) que instituiu o SNA no mbito do SUS, quanto

    o Decreto 1.651/95 (BRASIL, 1995) que o regulamentou, definiram o Departamento de

    Controle, Avaliao e Auditoria (DCAA) como rgo central do SNA, responsvel pelas

    atividades de auditoria do SUS, subordinado Secretaria de Assistncia Sade do

    Ministrio da Sade.

    Assim, quando a NOB SUS 01/96 apresenta, em um dos seus itens, o Controle, a

    Avaliao e a Auditoria, como aes necessrias ao exerccio da gesto no SUS e define que

    as aes de auditoria constituem responsabilidades das trs esferas de governo, exigindo a

    estruturao do rgo de controle, avaliao e auditoria, reproduz-se uma denominao da

    estrutura do Ministrio e do seu rgo central DCAA.

    A Norma Operacional acrescenta ainda que se fazem necessrias, em todos os nveis

    de governo, uma articulao permanente das aes de programao, controle, avaliao e

    auditoria e a integrao operacional das unidades organizacionais, que desempenham estas

    atividades, no mbito de cada rgo gestor do Sistema. Entretanto, no esto explicitadas as

    aes desses instrumentos da gesto, como a Auditoria e o Controle e Avaliao.

  • 70

    A NOB-SUS 96 aponta para uma reordenao do modelo de ateno sade, na

    medida em que se redefine, entre outras questes, a prtica de acompanhamento, controle e

    avaliao no SUS, superando os mecanismos tradicionais, centrados no faturamento de

    servios produzidos e valorizando os resultados de programaes com critrios

    epidemiolgicos e desempenho com qualidade (CONASS, 1997)9. A Norma exige, como um

    dos requisitos para os municpios se habilitarem na gesto plena do sistema municipal

    (GPSM), a comprovao da estruturao do componente municipal do SNA. Da mesma

    forma, requisito comum s duas condies de gesto do Estado10 comprovar a estruturao

    do componente estadual do SNA.

    Ainda no que diz respeito s Normas Operacionais, a NOAS SUS 01/2001 prope o

    fortalecimento das capacidades gestoras do SUS, que compreende um conjunto de estratgias

    para consolidar o carter pblico da gesto do SUS, instrumentalizando os gestores para o

    desenvolvimento das funes de planejamento, controle, regulao e avaliao.

    Assim como a NOB/96, a NOAS/2001 mantm como um dos requisitos para

    habilitao nas condies de gesto plena do sistema municipal, gesto avanada do sistema

    estadual e plena do sistema estadual, a estruturao dos componentes municipais e estaduais

    do SNA, respectivamente.

    Do ponto de vista operacional, em 1999, com a Portaria GM/MS 1.069, de 19 de

    agosto (BRASIL, 1999), surge uma proposta de reorganizao das atividades de controle e

    avaliao e auditoria no mbito do MS, com redefinio de atribuies, responsabilidades e

    autoridade. Com essa redefinio, o Ministrio da Sade adota medidas para reorganizao do

    sistema de avaliao e controle no mbito do MS, da interface do sistema de Controle e

    Avaliao da SAS e do Sistema Nacional de Auditoria com as atividades do Fundo Nacional

    de Sade (FNS) e definio dos recursos patrimoniais e humanos necessrios ao cumprimento

    9 Conselho Nacional de Secretrios Estaduais de Sade

  • 71

    das competncias e atividades de Auditoria e de Controle e Avaliao. Entretanto, apesar

    dessa proposta de reorganizao, essas atividades continuavam inseridas na Secretaria de

    Assistncia Sade do Ministrio da Sade.

    Percebe-se que, nesse momento, o Ministrio tenta destacar as diretrizes de cada

    instncia estabelecendo que tanto a Auditoria quanto o Controle e Avaliao so instrumentos

    de gesto que devem estar definidos em cada esfera de governo, pretendendo homogeneizar o

    entendimento das responsabilidades, atribuies e autoridades no exerccio das atividades de

    controle e avaliao e de auditoria, embora, ao que parece, tal empenho nem sempre tenha

    resultado no xito pretendido entre os gestores do SUS.

    S a partir do Decreto n 3.496, de 1 de junho de 2000 ( Brasil, 2000), que aprovou a

    Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargo em Comisso e das Funes

    Gratificadas do MS, o Ministrio redefine o seu Quadro. O SNA, atravs do seu rgo

    central DENASUS passa a fazer parte, dentro da Estrutura Regimental do Ministrio da

    Sade, dos rgos de assistncia direta e imediata ao Ministro de Estado, desligando-se da

    SAS, que, por sua vez, passa a integrar os rgos especficos singulares do MS, estando,

    assim, inserido na SAS, o Departamento de Controle e Avaliao de Sistemas.

    Esse decreto foi revogado pelo Decreto Federal 3.774 de 15 de maro de 200111, que

    tambm estabeleceu que as atividades de controle, avaliao e auditoria do SUS, no mbito

    do Ministrio da Sade ficariam organizadas na forma que se segue:

    I O Departamento Nacional de Auditoria do SUS atuar no acompanhamento da programao aprovada de aplicao dos recursos repassados a Estados, aos Municpios e Distrito Federal e na verificao da regularidade dos procedimentos praticados por pessoas fsicas e jurdicas, mediante exame analtico, verificao in loco e pericial II O Departamento de Controle e Avaliao de Sistemas atuar na implementao das atividades de controle e avaliao, mediante acompanhamento e monitoramento contnuo das aes e servios

    10 Pela NOB SUS 01/96, so estabelecidas no processo de habilitao dos Estados duas condies de gesto: gesto avanada do sistema estadual e gesto plena do sistema estadual. 11 Revogado pelo Decreto n 4.194, de 11 de abril de 2002, entretanto esto mantidas as mesmas estruturas e competncias do decreto anterior para o DENASUS e o Departamento de Controle e Avaliao de Sistemas da SAS.

  • 72

    desenvolvidos no mbito do SUS, sem prejuzo das atividades de controle e avaliao pertinentes a cada rgo.

    No artigo 16 desse Decreto, fica estabelecido que compete ao Departamento de

    Controle e Avaliao de Sistemas da SAS, entre outras atividades: acompanhar e avaliar a

    prestao de servios assistenciais de sade, no mbito do SUS, em seus aspectos

    qualitativos e quantitativos e a transferncia de recursos financeiros do Ministrio da Sade a

    Estados, Municpios e Distrito Federal; realizar estudos para o aperfeioamento dos

    instrumentos de controle e avaliao dos servios de assistncia sade; definir, dentro de sua

    rea de atuao, formas de cooperao tcnica com os Estados, DF e Municpios para o

    aperfeioamento da capacidade gerencial e operacional dos servios de assistncia sade.

    Conforme exposto, percebe-se que as atividades de auditoria e de controle e avaliao

    que inicialmente estavam organizadas num nico departamento, muitas vezes sem a clara

    definio dos seus conceitos e de seus papis, avanaram na sua organizao e se encontram,

    no momento atual, com as atividades e competncias definidas no nvel federal em dois

    departamentos, quais sejam, o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS) e o

    Departamento de Controle Avaliao de Sistemas da SAS.

    A existncia desta indefinio conceitual e operacional tem sido, inclusive, analisada

    por alguns autores, a exemplo de Teixeira (2001, p.9) que aponta:

    Este um problema que tem uma dimenso conceitual e outra poltico-institucional, na medida em que suas bases doutrinrias, isto , seus fundamentos conceituais e metodolgicos so distintos e sua expresso na estrutura de poder das diversas instituies pblicas de sade, seja o Ministrio sejam as Secretarias Estaduais de Sade, evidenciam o peso poltico distinto que tais atividades tiveram e vem tendo no mbito de um sistema (SUS) que resulta da unificao (reformas administrativas) de estruturas e culturas organizacionais diferentes. Esse problema demanda que os dirigentes e tcnicos envolvidos com sua implementao estejam permanentemente refletindo sobre o desenho organizacional do sistema e o papel ou a misso de cada um dos seus componentes.

    De fato, o debate atual na rea revela que, apesar de existir por um preceito legal e

    embora integrante do SUS, o Sistema Nacional de Auditoria no dispe, ainda, de uma

  • 73

    estrutura organizacional definida. O Ministrio da Sade vem demonstrando empenhando

    {...} no sentido de assegurar uma ao voltada no somente para o objeto da atuao do

    SNA no SUS, como tambm, buscando formas de tornar sua atuao mais eficiente e eficaz,

    mediante a introduo de metodologias modernas de avaliao, permeadas pela gesto da

    qualidade dentro de um processo de melhoria contnua (CONASS, 1997, p.53).

    Dada a importncia estratgica do SNA para o SUS, em razo de ser um componente

    dinmico de ajuste e aprimoramento, um instrumento indutor de responsabilidade e de

    transparncia das aes e servios de sade no mbito do SUS, faz-se necessrio o

    conhecimento da organizao e da operacionalizao dos seus componentes nos diversos

    Estados e Municpios. De fato, apesar de a legislao definir as atribuies e competncias de

    cada nvel do SNA, no estabelece como deve ser a organizao do Sistema em cada nvel de

    gesto do SUS.

    importante ressaltar que ao Sistema incumbem no apenas a verificao da

    regularidade das contas, mas tambm a avaliao de resultados. um mecanismo importante

    para o acompanhamento da atuao dos agentes pblicos, em favor das atividades da

    Administrao Pblica, sendo necessria, portanto, a sua organizao e sistematizao dentro

    do SUS (SANTOS, 1996).

    Nesse sentido, consideramos necessrio que se investigue como est sendo implantado

    o SNA, de que maneira este sistema vem sendo organizado, quais as aes adotadas nos

    diversos nveis (federal, estadual e municipal), quais as dificuldades enfrentadas no processo

    de implantao e quais os resultados alcanados. A resposta a essas questes demanda a

    realizao de uma ou vrias pesquisas abrangentes, que dem conta do processo de

    implantao do SNA em todo o territrio nacional.

    Entretanto, uma reviso bibliogrfica inicial revelou que, apesar da importncia do

    tema, no esto sendo realizados estudos e pesquisas nessa linha. Tendo como referncia o

  • 74

    trabalho de Ayres (2000), foi realizado um levantamento das dissertaes e teses publicadas

    pela CAPES12 no perodo de 1993 a 1998, revelando-se a inexistncia de trabalhos relativos

    Auditoria no SUS.

    Encontram-se referncias a estudos e pesquisas na rea de avaliao de polticas,

    programas e servios de sade, porm so escassos os trabalhos que tratam, especificamente

    da implantao do Sistema de Auditoria13. Os trabalhos limitam-se, na maioria das vezes,

    descrio dos tipos especficos de auditoria (mdica, odontolgica, contbil, governamental),

    de experincias de um Estado ou como tema inserido em conferncias, a exemplo do

    CONASS e CONASEMS.

    Apesar da inexistncia de trabalhos especficos sobre auditoria do SUS, no mbito

    acadmico vem crescendo o interesse pelo desenvolvimento de estudos de avaliao (HARTZ

    et al., 1997; HARTZ, 1998; 1999a, SILVA; FORMIGLI, 1994; SILVA, 1999; SILVA et al.,

    2002) de servios e aes de sade. Nesses estudos, a avaliao considerada uma atividade

    de natureza institucional que tem por vocao se integrar gesto pblica e ao funcionamento

    do sistema, tendo por finalidade fazer um julgamento de valor e melhorar a operacionalizao

    de uma poltica ou o funcionamento de um servio, podendo cobrir uma interveno na sua

    totalidade ou qualquer um de seus componentes (HARTZ, 1999b). Na prtica dos servios de

    sade do Brasil, entretanto, a avaliao no est incorporada na rotina, sendo at rara a sua

    prtica na funo pblica (SILVA; FORMIGLI, 1994; HARTZ, 1999a).

    Talvez a primeira tentativa de institucionalizar a avaliao no setor sade no Brasil

    seja a implantao do SNA, exatamente como um esforo dos gestores do Sistema nico de

    Sade em avaliar e controlar o sistema de sade em seus diferentes nveis (municipal, estadual

    e federal).

    12 No site da CAPES, foi realizado um levantamento de 1999 a 2003, no sendo encontrados trabalhos que tratassem do tema Auditoria no Sistema nico de Sade. 13 No levantamento realizado no LILACS, no foram constatados estudos sobre a organizao e funcionamento do Sistema Nacional de Auditoria, principalmente no que se refere, sua esfera municipal.

  • 75

    Levando em conta a relativa autonomia dos Estados, possvel que cada Secretaria

    Estadual de Sade esteja organizando o seu componente de acordo com suas prprias

    concepes e possibilidades, configurando-se uma situao heterognea com relao

    implantao do SNA. No mbito dos municpios, por sua vez, possvel que tambm esteja

    de desenvolvendo um processo heterogneo de implantao do componente municipal,

    principalmente nos municpios que ingressaram na Gesto Plena do Sistema. Nesse contexto,

    percebe-se a necessidade de se desenvolver um processo de avaliao da implantao desses

    Sistemas Municipais de Auditorias do SUS. Entretanto, pelo prprio fato de no se ter

    definido completamente a estrutura e as funes do componente municipal do Sistema

    Nacional de Auditoria, no se conta com um instrumento de avaliao que possa ser aplicado

    a distintos municpios em distintos contextos.

    A reviso dos instrumentos normativos e a experincia acumulada no mbito dos

    servios, em estados e municpios que avanaram nesse processo, podem ser o ponto de

    partida para a elaborao de um instrumento de avaliao que retrate como esto sendo

    implantados os componentes municipais para que realmente possam contribuir para o

    aperfeioamento do Sistema Nacional de Auditoria do SUS.

    As questes centrais do estudo, portanto, dizem respeito ao processo de implantao

    do componente municipal do SNA e podem ser expressas da seguinte forma:

    Os Sistemas de Auditoria do SUS nas Secretarias Municipais de Sade esto implantados

    de forma satisfatria?

    As caractersticas contextuais podem influenciar o nvel da implantao dos Sistemas de

    Auditoria do SUS nas Secretarias Municipais de Sade?

    Em vista disso, nos propomos a desenvolver uma reflexo sobre o Componente

    Municipal do Sistema de Auditoria do SUS, tratando de elaborar um instrumento que possa

    vir a ser utilizado para o desenvolvimento de estudos que dem conta do grau de implantao

  • 76

    desse sistema ou que busquem uma resposta a uma questo central, qual seja: Como est

    sendo implantado o componente municipal do Sistema Nacional de Auditoria do SUS?

    A partir desses questionamentos e da possibilidade de se levantar reflexes conceituais

    e operacionais relativas ao Sistema Nacional de Auditoria do SUS, o presente estudo foi

    pautado nos seguintes objetivos:

    Elaborar uma matriz da imagem-objetivo do componente municipal do Sistema

    Nacional de Auditoria do SUS, definida atravs da seleo de dimenses,

    subdimenses e critrios, para descrio do grau de implantao;

    Validar o instrumento de avaliao (matriz) atravs da realizao de tcnica de

    consenso;

    Realizar o teste do instrumento de avaliao (pr-teste) atravs da sua aplicao no

    componente municipal de Auditoria de um municpio selecionado, habilitado na

    gesto plena do sistema, no Estado da Bahia.

  • 77

    2 MARCO DE REFERNCIA

    Este captulo traz o resultado de uma reviso da literatura onde, em primeiro lugar,

    discorremos brevemente sobre a regulao como funo do Estado e mais especificamente, a

    regulao no setor sade e o seu complexo sistema regulatrio. Em segundo lugar,

    procuramos sistematizar os conceitos de controle e de avaliao, buscando diferenciar seus

    significados tericos e implicaes prticas. No que se refere avaliao em sade revisamos

    a contribuio de Donabedian e a literatura referente pesquisa avaliativa em sade, da qual

    recuperamos a proposta de anlise de implantao de programas e projetos. Em seguida,

    tratamos de apresentar a concepo acerca do controle e avaliao tal como incorporada no

    mbito do Sistema nico de Sade. Posto isso, tratamos de apresentar o resultado da reviso

    efetuada sobre Auditoria, partindo de uma aproximao preliminar ao conceito para, em

    seguida, caracterizar o Sistema Nacional de Auditoria do SUS e seus nveis de organizao,

    tendo como referncia uma breve reviso sobre a teoria dos sistemas.

    2.1 REGULAO

    O termo regulao, segundo Santos (1997), aparece originalmente relacionado s

    fontes de Direito14, isto , s regras e s medidas que estabelecem padres de comportamento,

    fixam os fins e os critrios materiais de atuao dos poderes pblicos e determinam o modo

    de deciso de litgios jurdicos, independentemente da forma externa de revelao

    (CANOTILHO apud SANTOS, 1997).

    J Ferreira (2003) considera que este termo se origina do campo da Economia, com

    uma forte interface com o Direito, tendo o Estado como agente coordenador sobre os agentes

    privados. O primeiro autor esclarece que os termos regulao, regular, poder regulador,

  • 78

    regulamentao, regulamentar, normatizar indicam uma possibilidade de atuao normativa

    do Poder Pblico (Legislativo e Executivo) na salvaguarda dos interesses coletivos e, para

    isso, impondo condicionamentos administrativos atividade individual ou de um setor isolado

    da sociedade.

    Mais recentemente, no mbito da literatura sobre a reforma do Estado empreendida nos

    pases capitalistas no contexto da globalizao, este conceito tem sido definido como {...} um

    conjunto de polticas formuladas para obter resultados superiores do ponto de vista social nas

    relaes internas s estruturas de governo e em sua relao com agentes do mercado

    (RIBEIRO, 2001, p.409). Nesse sentido, a regulao se refere ao poltica governamental de

    carter nacional que trata de estabelecer as regras de relao entre agentes pblicos e privados.

    Ao se trazer o conceito de regulao para o campo da sade, cabe a observao de

    Ferreira (2003, p.2) sobre a dificuldade de se empregar conceitos econmicos que abarquem a

    especificidade do bem sade: {...}os mecanismos de mercado, calcados na concorrncia e

    na eficincia, so adequados para maximizar a produo de diversos bens, mas no

    necessariamente para a proviso de ateno sade. O mercado produz diferenas, o que

    incompatvel com a concepo de sade como direito de cidadania.

    Nesse sentido, essa afirmao ganha reforo no artigo 197 da Constituio Federal,

    onde est previsto que so de relevncia pblica as aes e servios de sade. Desse modo,

    a regulao nesse campo no pode ferir esse principio e deve sempre se dar a favor da sade e

    no a favor dos interesses de mercado ou outros quaisquer. A Constituio, quando prev a

    relevncia pblica das aes e servios de sade, reafirma seu carter pblico e a

    responsabilidade estatal sobre elas, cabendo ao Poder Pblico dispor sobre sua

    regulamentao, fiscalizao e controle.

    14 Fazem parte das Fontes de Direito: a fonte formal do direito, que corresponde ao procedimento legislativo, e a fonte material do direito, que corresponde ao contedo da norma. (CANOTILHO apud Santos, 1997).

  • 79

    A regulao da Sade pode ser entendida como composta por duas vertentes: a) a da

    regulamentao normativa, obrigatria, coercitiva, que deve incidir no processo de

    incorporao de tecnologias mdicas, na qualidade dos servios, nas funes de produo, nas

    rotinas de atendimento e outras; b) e aquela na qual prevalece o processo de pactuao, de

    acordo, de negociao, que j dispe de normas legais e constitucionais para a fixao dessas

    negociaes. Nesta modalidade, devem participar ativamente os usurios dos servios de

    sade, os gestores do SUS e a iniciativa privada para negociar, definir prioridades de polticas

    de sade e responsabilidades com vistas ao sistema de sade (CONASS, 1998).

    Considerando a primeira vertente, incorporamos a abordagem de Santos (1997), que

    estabelece uma relao entre a regulao estatal e o poder de polcia do Estado15 e a traz para o

    campo da sade. A autora ressalta que esse poder de polcia apresenta duplo sentido, ou seja,

    um relacionado ao poder regulador do Estado, o outro, sobre o poder de polcia sanitria16 da

    Administrao, consistindo ambos no dever-poder do Estado de condicionar a atuao do

    particular em nome do interesse coletivo. A autora explicita:

    Na rea da sade, o poder de polcia no seu mais amplo sentido funes legislativas e funes administrativas engloba todas as atividades que possam, de alguma forma, colocar em risco a sade coletiva e individual, ficando o Estado com o dever-poder de impor condicionamentos e limites liberdade e propriedade seja atravs de mtodos persuasivos, educativos, indutivos, orientadores, coercitivos em nome da garantia do direito vida e sade (SANTOS, 1997, p.249).

    O poder de polcia que a Administrao Pblica exerce sobre todas as atividades e

    bens que afetam ou possam afetar a coletividade, competncia exclusiva e concorrente das

    trs esferas de governo, conforme a descentralizao poltico-administrativa do nosso

    15 O poder de polcia em sentido estrito, que consiste num instrumento da Administrao no exerccio de sua funo administrativa de disciplinar a vida dos participantes para a manuteno da ordem pblica, est vinculado ao princpio da legalidade: {...} a administrao s pode agir em acatamento norma (SANTOS, 1997). 16 O campo de atuao da polcia sanitria amplo e envolve a adoo de normas e medidas especficas, requeridas por situaes de perigo presente e futuro que lesem ou ameacem lesar a sade e a segurana dos indivduos e da comunidade (sade e meio ambiente) (SANTOS, 1997).

  • 80

    sistema federativo. Nesse sentido, cabe trazer a observao de Santos (1997) de que o poder

    de polcia administrativa um simples ato administrativo e, como todo ato administrativo,

    subordina-se ao ordenamento jurdico que rege as demais atividades da Administrao,

    sujeitando-se, inclusive, ao controle da legalidade pelo Poder Judicirio.

    Segundo Ribeiro (2001), a regulao no setor sade envolve tanto estruturas

    tradicionais, como inovaes recentes17 e tem como foco as relaes entre as trs esferas de

    governo; as relaes entre governo, prestadores privados e semipblicos; e as relaes entre

    governo e agentes no mercado. Para esse autor, as estruturas tradicionais so mltiplas e

    misturam-se com uma ampla burocracia que perpassa todas as instituies pblicas.

    Consistem de diversos organismos que se confundem com a prpria burocracia pblica e

    que, apesar do carter normativo e burocratizado que possam ter, influenciam a configurao

    final das funes regulatrias do Estado, tais como os Tribunais de Contas do Estado e da

    Unio, o Sistema Nacional de Auditoria, o Ministrio Pblico e as Secretarias de Controle

    Interno dos Ministrios. Estas instncias tomam decises que afetam a formulao e a

    implementao da poltica de sade.

    Alm disso, as Comisses Intergestores18 e os Conselhos de Sade19, organizados

    atravs de representantes de vrias entidades, se conformam na qualidade de organismos

    formuladores e reguladores, assim como tm desempenhado um papel importante as entidades

    de defesa do consumidor20 . Dessa forma constri-se um quadro complexo de articulao das

    17 Dentre essas inovaes, merece destaque o modelo de regulao por agncias. 18 As comisses intergestores so colegiados compostos por gestores municipais e estaduais a exemplo da Comisso Intergestores Bipartite (CIB); a comisso formada por representantes do Ministrio da Sade, do Conselho Nacional dos Secretrios Municipais de Sade (CONASEMS) e do Conselho Nacional de Secretrios Estaduais de Sade (CONASS), em nvel nacional, a Comisso Intergestora Tripartite (CIT). 19 Conselho de Sade: rgo colegiado composto por representantes do governo, prestadores de servios, profissionais de sade e usurios do SUS - Lei 8142/90 (BRASIL, 1990). 20 O rgo de defesa do consumidor no aplicvel s relaes do cidado com as aes e os servios pblicos de sade (SUS), em razo de esse rgo proteger a relao de compra e venda, ou seja, atividade fornecida no mercado de consumo mediante remunerao (SANTOS, 1997). No caso do SUS, existem instncias que assistem o direito dos usurios, tais como o Departamento de Ouvidoria Nacional do SUS, atravs do Sistema de Atendimento Demanda Espontnea (SADE), o Sistema Nacional de Auditoria, atravs de apurao de denncias e os Conselhos de Sade.

  • 81

    atividades regulatrias estatais com organismos da sociedade civil e o prprio mercado

    (SANTOS, 1997; RIBEIRO, 2001).

    No caso do Brasil, cujo sistema de sade configura-se como segmentado21, as polticas

    regulatrias se fazem necessrias enquanto instrumento de viabilizao de um modelo

    assistencial coerente com os princpios da integralidade da assistncia, universalidade de

    acesso e equidade do atendimento, com vistas ao alcance de aes e servios de sade

    eficientes e eficazes (SOUZA; BOLDSTEIN, 2002). Esses princpios e diretrizes constituem a

    imagem-objetivo do SUS, e por isso, de toda a sua ao reguladora (CONASS, 1998). Na

    perspectiva apresentada por Ribeiro (2001), essa conformao e articulao entre os sistemas

    diversificam a poltica regulatria em trs campos principais22:

    1. relacionado ao foco da regulao: no sistema pblico, sobre as transferncias entre governos e compra de servios aos prestadores privados; no setor privado, sobre a regulao do mercado de planos de sade; 2. relacionado ao desenho organizacional: controle burocrtico universal (Tribunal de Contas, Ministrio Pblico, Sistema Nacional de Auditoria); agncias regulatrias especializadas; ou por conselhos pluripartites; 3. relacionado ao instrumento: contratos de gesto; programas de incentivos; guias de deciso mdica.

    Ribeiro (2001) entende que, no contexto do Sistema nico de Sade, no que diz

    respeito, ao foco da regulao, as relaes entre os trs nveis de governo e entre estes e os

    prestadores privados esto reguladas por diferentes legislaes, organismos e departamentos

    especficos atravs de um modelo estatal normativo, sendo que trs instncias regulatrias se

    apresentam como as mais relevantes e demonstram modelos diferenciados de controle sobre

    21 Os sistemas de servios de sade esto conformados em sistemas segmentados ou em sistemas pblicos universais. Os primeiros podem ser definidos como aqueles que segregam diferentes clientelas em nichos institucionais singulares, existindo uma integrao vertical em cada segmento e uma segregao horizontal entre eles, onde cada segmento, pblico ou privado, exercita as funes de financiamento, regulao e prestao de servios para sua clientela. (MENDES, 2001). 22 Ribeiro (2001) tambm define que a regulao setorial varia quanto ao modelo (auto-regulao versus regulao governamental) ou objeto (mdicos e /ou organizaes privadas e pblicas).

  • 82

    as aes e servios de sade, a saber: o Sistema Nacional de Auditoria (SNA), as Comisses

    Intergestoras e os Conselhos de Sade.

    O autor define o SNA como um organismo regulador federal, detentor de autoridade

    pblica, que atua nos trs nveis de governo e tem como modelo regulatrio o carter

    universalista e burocrtico caracterstico das instituies pblicas, embora o escalonamento

    nas punies vise aprimorar a qualidade dos servios. Considera que o sistema realiza a

    regulao tradicional das contas e de produo de servios, entretanto tambm pontua que ele

    procura associar as funes tpicas de auditagem, com avaliao da qualidade da gesto

    mediante a utilizao de parmetros, indicadores e utilizao de informaes especficas dos

    sistemas de informaes nacionais.

    No processo de definies das transferncias de recursos interinstncias de governo e

    de modalidades de pagamentos dos servios de sade, as Normas Operacionais Bsicas

    tambm atuam como instrumentos de regulamentao do sistema pblico, alm de que

    instruem o processo de descentralizao e de construo de uma rede de servios capaz de

    operar com racionalidade sistmica (VIANA et al, 2002).

    No h nenhuma garantia intrnseca autonomia dos governos locais que os torne

    responsveis, comprometidos com as necessidades dos cidados e determinados a administrar

    com eficincia. A autonomia local para a gesto de polticas cria oportunidades institucionais

    para que os governantes implementem decises de acordo com suas prprias preferncias, no

    necessariamente compatveis com o interesse pblico (ARRETCHE, 2003). Nestas condies,

    sistemas de avaliao, controle, auditagem e monitoramento do desempenho dos agentes

    assumem relevncia estratgica (Hurley et al., 1995 apud ARRETCHE, 2003), pois {...} so

    as regras institucionais de uma poltica pblica isto , regras do processo decisrio,

    mecanismos de controle e punio, arenas institucionalizadas de representao de interesses,

  • 83

    etc que propiciam os incentivos ao comportamento dos governos locais (ARRETCHE,

    2003, p.335).

    Na perspectiva da regulao no setor sade, Ribeiro (2001) tambm aborda a

    microrregulao, considerando que dois aspectos no Brasil se destacam e apresentam

    convergncia com a experincia internacional: um est relacionado s inovaes introduzidas

    no setor pblico, especialmente uma maior contratualizao das aes desenvolvidas, que

    se expressa nos contratos de gesto23 estabelecidos para definir compromissos de

    organizaes, como os hospitais pblicos e contratados nos SUS e nos programas de

    qualidade que definem incentivos aos profissionais. O outro aspecto referente

    microrregulao praticada no setor privado pelas empresas que absorvem estratgias de

    controle de custos e estruturao da oferta baseada no modelo americano o managed care24.

    Nas duas situaes, a regulao implica desdobramento de processos de trabalhos

    profissionais, de modo geral mdicos, ou de organizaes, em geral hospitalares, em unidades

    mensurveis, capazes de possibilitar o controle dos custos, influenciados por decises

    individuais ou organizacionais, e orientar programas de incentivos ou cumprimento de metas.

    Magalhes (apud SOLLA; SANTOS, 2002) aborda a regulao no setor sade atravs

    de duas perspectivas: a macrorregulao e a microrregulao do setor sade. O autor chama

    de macrorregulao aos mecanismos mais estratgicos de gesto, quais sejam, o

    estabelecimento de planos estratgicos, de projetos prioritrios, de relao com o controle

    23 Os contratos de gesto so usualmente aplicados para definir relaes entre governos e empresas pblicas ou privadas e residem no estabelecimento de objetivos gerais da empresa ou organizao, de indicadores de acompanhamento de desempenho e de progressividade no cumprimento de metas. O governo, por sua vez, concede autonomia empresa pblica ou funes ou servios a serem explorados pela empresa privada. Os contratos de gesto envolvem pactuao e regulao, geralmente, desenvolvida por agncias ou departamentos especializados na administrao pblica (RIBEIRO, 2001). 24 Managed care ou assistncia mdica gerenciada consiste numa reatualizao dos planos de sade de pr-pagamento que se propem a fornecer assistncia mdica a grupos especficos atravs da negociao prvia de pagamentos e de pacotes assistenciais (ALMEIDA, 1996). Segundo Ribeiro (2001), uma tcnica regulatria que possibilita o controle sobre processos especficos e decises individuais de profissionais (mdicos) ou organizaes (hospitais). Este sistema prev uma agenda regulatria do sistema privado, com um maior controle sobre os mdicos atravs da auditagem, padronizao de decises que conflituam com a autonomia tcnica e podem comprometer a qualidade dos servios.

  • 84

    social, as definies oramentrias maiores, a relao com as outras polticas sociais que

    interferem com a produo ou no de sade nas populaes, a poltica de recursos humanos e

    o estabelecimento de regras para as relaes com o setor privado. Esta macrorregulao pode

    estabelecer-se com bases sociais pblicas, em bases polticas menores, em bases corporativas

    ou tecnocrticas, e/ou baseada nos interesses dos mercados privados. Os autores ressaltam que

    {...} no existe sistema sem regulao: a diferena se estabelece pelas bases que predominam

    na orientao da regulao existente. A clareza deste ponto fundamental para a reflexo de

    todos que esto na gesto pblica de sade, onde a disputa permanente.

    A microrregulao, por sua vez, est definida como microrregulao assistencial ou

    regulao assistencial. Trata-se da traduo, em nvel operacional, das regras gerais

    estabelecidas na macrorregulao e implica a articulao e a conjugao das respostas

    potenciais do sistema para o conjunto dinmico das demandas populacionais, bem como a

    gerncia e a avaliao do que foi planejado nos vrios recortes da assistncia, dotando a

    gesto de uma inteligncia reguladora operacional.

    Diante do exposto, constata-se a existncia de um quadro regulatrio nacional

    complexo25, na medida em que existem instrumentos diversificados de regulao do sistema,

    com uma articulao das atividades regulatrias estatais com organismos societrios e o

    prprio mercado. Neste contexto poltico-institucional que se insere o Sistema Nacional de

    Auditoria do SUS SNA.

    2.2 CONTROLE

    Governar uma atividade complexa que envolve, no mnimo, quatro

    componentes: dirigir, planejar, organizar e controlar (MARTINS, 1989). Controlar

    significa conferir, verificar. Segundo a escola francesa, o controle primitivamente um 25 Vrios exemplos evidenciam a existncia de superposio de funes de agncia com os procedimentos cotidianos de departamentos de diversos ministrios no governo federal, desencadeando superposio nas

  • 85

    segundo registro, mantido parte para verificao do primeiro. De onde, por extenso,

    assegura-se que uma assero exata ou de que um trabalho foi executado como deveria

    ser. Quando a palavra controle usada num contexto filosfico, deve ser verificado se

    ela entendida no sentido francs ou no sentido ingls, pois, no sentido ingls, no

    somente controlar, mas mandar, dirigir, ter o domnio, conter, reprimir, dominar

    (LALANDE, 1999).

    Na lngua portuguesa, a palavra controle entendida como fiscalizao exercida sobre

    as atividades de pessoas, rgos, etc, para que no se desviem das normas preestabelecidas.

    A idia de controle vem, comumente, associada a cerceamento, restrio, coero,

    freio, entretanto garantir a concretizao de expectativas constitui aspecto essencial do

    processo de controle. Neste sentido, enfatiza Martins (1989, p.8):

    O controle um aspecto fundamental da vida do Estado e da Sociedade. Onde quer que haja objetivos a serem alcanados, padres a serem respeitados, regras a serem obedecidas, condies a serem satisfeitas; {...} onde quer, enfim, que haja interao civilizada, existe a necessidade de um fluxo permanente e sistemtico de operaes de controle.

    No campo da Teoria Administrativa, Chiavenato (1987) define controle como uma

    funo administrativa, entendendo-o como o segmento do processo administrativo que mede

    e avalia o desempenho e toma a ao corretiva quando necessria, sendo, assim, um processo

    essencialmente regulatrio. Deste modo, a essncia do controle reside em verificar se a

    atividade controlada est ou no alcanando os resultados desejados.

    Ainda no campo da Administrao, Fayol26 (apud Martins, 1989, p.10) traz a definio

    clssica, em que controle {...} consiste em verificar se tudo est correndo de conformidade

    com o plano adotado, as instrues emitidas e os princpios estabelecidos. Seu objetivo

    apontar as faltas e os erros para que se possa retific-los e evitar a sua reincidncia. Aplica-se

    a tudo; coisas, pessoas e atos. O autor ressalta que faz parte integrante do processo de

    atividades de avaliao, fiscalizao, penalizao, defesa de direitos e inmeras prticas passveis de enquadramento em uma poltica governamental de regulao setorial (RIBEIRO, 2001). 26 FAYOL, H. Administrao industrial e geral. So Paulo. Atlas,.p.143

  • 86

    controle tomar as medidas corretivas27, pois se as noconformidades no forem

    eliminadas, os responsveis pela funo de controle estaro apenas acompanhando. No basta

    apenas acompanhar e avaliar, o controle envolve tambm a retificao dos desvios

    observados.

    Campos (1989, p.45) aborda a questo das medidas corretivas recomendadas por quem

    exerce o controle e do cumprimento do recomendado por quem controlado, ressaltando que

    {...}no h dvida de que a eficcia de qualquer controle requer a autonomia do controlador

    diante do controlado. Controlar verificar a aderncia das aes ou dos resultados ao padro

    definido e prevenir ou corrigir desvios desse padro.

    Segundo Inojosa (1996), o controle est freqentemente subordinado a outro poder o

    regulador ou normatizador das relaes sociais ou organizacionais. A autora enfatiza que so

    os atores sociais que detm poder legal e/ou legtimo para estabelecer critrios a serem

    obedecidos ou padres de ao ou de resultados que devem ser alcanados ou mantidos e que

    as normas e padres na sociedade mudam num ritmo mais lento que a avaliao das

    situaes28.

    Martins (1989) aponta quatro grandes categorias para as principais relaes de

    controle existentes na vida social, a partir da dicotomia Estado-sociedade: controles

    exercidos pela sociedade (sobre si e sobre o Estado) e pelo Estado (sobre a sociedade e

    sobre si). No que tange ao controle da sociedade sobre o Estado, o autor explicita que as

    instituies foram criadas justamente para estabelecer limites e colocar disposio do

    povo instrumentos adequados ao controle do poder poltico. Observa que a lista dessas

    instituies longa e variada e inclui os rgos que compem o Poder Judicirio, alm

    27 Martins (1989) chama a ateno para o fato de que essas medidas corretivas de que fala no se referem a nica e exclusivamente aos acontecimentos desviantes e que, muitas vezes, a ao corretiva apropriada pode ser a reviso e reformulao dos padres estabelecidos para ajust-los s reais possibilidades das pessoas e recursos disponveis. 28 A autora explica que isso ocorre por dois fatores: a) as avaliaes dos diversos sujeitos sociais no alcanam rapidamente um consenso, de modo a requisitar uma mudana de norma, e b) quem detm o poder regulador na sociedade ou em uma organizao tem, naturalmente, a perspectiva conservadora do grupo dominante.

  • 87

    do Congresso Nacional, das assemblias estaduais e das cmaras municipais, da

    imprensa livre, dos partidos polticos, tribunais de contas e do ombudsman29 .

    Vrias dessas instncias so portadoras ou sinalizadoras do interesse pblico e

    que podem cumprir a funo de indutores de responsabilidade governamental ou

    accountability30, entendida como a qualidade dos governos de estar altura da confiana

    e expectativa dos cidados, garantindo fidelidade governamental aos interesses pblico

    (SANTOS, CARVALHO, 1992; CARVALHO, 1997). Frederich Mosher (apud

    CAMPOS, 1990, p.33) apresenta accountability como:

    {...} sinnimo de responsabilidade objetiva ou obrigao de responder por algo {...} acarreta a responsabilidade de uma pessoa ou organizao perante uma outra pessoa, fora de si mesma, por alguma coisa ou por algum tipo de desempenho {...} quem falha no cumprimento de diretrizes legtimas considerado irresponsvel e est sujeito a penalidades.

    Carvalho (1997) chama a ateno de que nem todas instncias so instrumentos diretos

    de accountability e que, para uma instncia ou rgo funcionar como um instrumento direto,

    ele deve dispor de mecanismos de punies de modo a fazer valer suas determinaes.

    Segundo exemplifica o autor, os Conselhos de Sade no so instrumentos diretos, mas

    devem ser vistos como potentes instrumentos de estmulo a accountability e instrumentos

    auxiliares de induo de responsiveness31.

    O controle do Estado sobre si mesmo de importncia decisiva para a sobrevivncia

    das repblicas democrticas afirma Martins (1989, p.17). Segundo o autor, os controles

    internos do aparelho estatal no so importantes apenas em si mesmos, mas tambm pelo

    papel que desempenham nas relaes Estado-sociedade. Tais controles fazem parte do

    conjunto dos meios institudos para viabilizar tanto o controle da sociedade sobre o Estado,

    quanto o controle do Estado sobre a sociedade.

    29 A figura do ombudsman nasceu na Sucia e vem sendo adotada em todo o mundo, significando fiscal do povo, ouvidor, corregedor administrativo, inspetor geral etc. um instrumento de controle e fiscalizao das atividades de um organismo pblico ou privado (SANTOS, CARVALHO, 1992). 30 Almeida (1996) define accountability como a prestao de contas do governo ao cidado 31 Carvalho (1997) traz o conceito de Przeworsky (1996) pelo qual responsiveness est relacionado com a capacidade, inclusive tcnica, de saber o que melhor para a sociedade.

  • 88

    Para Campos, embora necessrios, a simples criao de mecanismos de controle

    burocrtico no se mostra suficiente para garantir que o servio pblico sirva a sua clientela

    de acordo com os padres normativos do governo democrtico. E acrescenta:

    {...} o verdadeiro controle do governo em qualquer de suas divises: Executivo, Legislativo e Judicirio s vai ocorrer efetivamente se as aes do governo forem fiscalizadas pelos cidados. Somente a partir da organizao de cidados vigilantes e conscientes de seus direitos haver condio para a accountability (CAMPOS, 1989, p.40).

    Na rea da sade, especificamente, o controle definido por Silva et al (1996) como o

    processo atravs do qual {...} as atividades e servios de sade, prestados pelas unidades

    pblicas e privadas so analisadas em relao aos planos, programas, metas e normas

    estabelecidas, bem como os bens e servios produzidos, sinalizando as mudanas a serem

    efetuadas, quer no contedo da ao implementada, quer nos instrumentos de gesto

    empregados. Segundo Inojosa (1996), todos os envolvidos na produo, financiamento,

    consumo ou observao de um ato tm o poder de avaliar, mas apenas parte desses

    avaliadores detm o poder de controle.

    Do ponto de vista jurdico-normativo, cabe ao Poder Pblico a regulamentao,

    fiscalizao e controle das aes e servios de sade, como estabelece o Art 197 da

    Constituio Federal (BRASIL, 1988), o que significa dizer que, {...} sobre tais aes

    tem ele integral poder de dominao, que o sentido do termo controle, mormente

    quando aparece ao lado da palavra fiscalizao, alm do que, o conceito de relevncia

    pblica deve permear a atuao do Estado no exerccio de sua funo de poder de

    polcia administrativa (SANTOS, 1997).

    No Manual de Normas de Auditoria do SUS (BRASIL, 1998), controle est definido

    como {...} o monitoramento dos processos (normas e eventos), com o objetivo de verificar a

    conformidade dos padres estabelecidos e de detectar situaes de alarme que requeiram uma

    ao avaliativa detalhada e profunda; fiscalizao, no entanto, {...} consiste em se submeter

    atenta vigilncia, a execuo de atos e disposies contidas em legislao, atravs do ofcio

  • 89

    de fiscal 32. Nesse sentido, a fiscalizao implica em realizar um julgamento pautado na

    legislao, como tambm, a existncia de uma autoridade pblica instituda legalmente para

    emitir orientaes, recomendaes e, at adoo de medidas corretivas, caso seja evidenciado

    a existncia de no conformidades.

    2.3 AVALIAO

    No Brasil, e em outros pases da Amrica do Sul, a prtica da avaliao na funo

    pblica rara, embora se observe que ela ocupa um espao crescente nos textos legais,

    tcnicos e cientficos. A deciso de institucionalizar a avaliao em nvel governamental tem

    o carter de integr-la em um sistema organizacional no qual seja capaz de influenciar o seu

    comportamento, ou seja, que possa influenciar na gesto e na tomada de deciso (HARTZ,

    1999a; 1999b).

    Em torno do tema de avaliao de polticas e programas, existe consenso no contexto

    internacional sobre a necessidade de se conhecer os efeitos das intervenes implantadas,

    contudo os modelos de sua institucionalizao variam de um pas para outro (HARTZ 1999b).

    Com base em ampla reviso sobre o tema, a autora ressalta que o carter institucional da

    avaliao supe o controle de sua qualidade e o favorecimento de uma cultura organizacional.

    A esse carter institucional da avaliao, deve ser integrado um modelo orientado para a

    gesto, ligando atividades de investigao s de gesto, alm de uma formulao da poltica

    de avaliao para a avaliao de polticas pblicas.

    As diversas definies sobre o significado da avaliao tm gerado uma polissemia

    conceitual e metodolgica sobre o tema, tanto no que diz respeito s possveis abordagens

    quanto aos seus atributos ou componentes (CONTANDRIOPOULOS et al., 1997; SILVA,

    FORMIGLI, 1994; SILVA, 2003).

    Avaliao pode ser entendida como

    32 No Dicionrio Aurlio, fiscal significa pessoa incumbida de fiscalizar certos atos ou executar certas

  • 90

    {...} um processo que tenta determinar o mais sistematicamente e objetivamente possvel relevncia, efetividade e impacto das atividades, tendo em vista seus objetivos. uma ferramenta orientada para a ao e aprendizagem. um processo organizativo que visa tanto melhorar as atividades em andamento quanto planejar o futuro e orientar a tomada de decises (Administrative Committee on Coordination, 1984 apud SILVER, 1982, p.198)33.

    Entretanto, avaliar, conforme enuncia Contandriopoulos et al. (1997, p.31) de forma

    mais objetiva, {...} consiste fundamentalmente em fazer um julgamento de valor a respeito

    de uma interveno ou sobre qualquer um de seus componentes, com o objetivo de ajudar na

    tomada de decises. Este julgamento pode ser resultado da aplicao de critrios e de normas

    (avaliao normativa) ou de um procedimento cientfico (pesquisa avaliativa).

    A avaliao normativa a atividade que consiste em fazer um julgamento sobre uma

    interveno, comparando os recursos empregados e sua organizao (estrutura), os servios

    ou os bens produzidos (processo), e os resultados obtidos, com critrios e normas34. J a

    pesquisa avaliativa corresponde ao julgamento ex-post sobre uma interveno utilizando-se

    metodologias cientficas (CONTANDRIOPOULOS et al. 1997).

    Das diversas metodologias propostas para avaliao, a proposta da abordagem de

    Donabedian (1980,1992) para a avaliao em sade, sistematizada na trade estrutura-

    processo-resultados, considerada clssica. Com base no enfoque sistmico e com o

    objetivo da avaliao do cuidado mdico, as categorias bsicas trabalhadas (estrutura-

    processo-resultados) esto inter-relacionadas, embora o prprio autor ressalve que, com

    freqncia, as relaes entre essas categorias no esto bem estabelecidas. Para Donabedian,

    estrutura corresponde s condies (recursos materiais, humanos e organizacionais) obtidas

    ou disponveis para o desenvolvimento das atividades previstas; processo diz respeito ao

    disposies. 33 Em 1984, o Comit Administrativo de Coordenao do Grupo de trabalho para o desenvolvimento rural das Naes Unidas sistematizou a terminologia utilizada em nvel internacional, a qual foi incorporada por diversas agncias da Organizao das Naes Unidas. 34 Os critrios e normas nos quais se apiam as avaliaes normativas constituem os chamados resumos do verdadeiro e resumos do bem. Eles podem ser provenientes dos resultados da pesquisa avaliativa ou de outros

  • 91

    conjunto de atividades desenvolvidas na relao entre profissionais e pacientes e pode ser

    associado estrutura disponvel, e os resultados so concebidos como mudanas verificadas

    na situao problema o estado de sade dos pacientes que pudessem ser atribudas a um

    cuidado prvio. Tambm podem ser consideradas como resultados as mudanas relacionadas

    com conhecimentos, comportamentos e satisfao do usurio.

    A abordagem de avaliao em sade proposta por Donabedian apresenta limitaes

    relacionadas, principalmente a abrangncia dessa classificao e a reduo que ela pode

    operar do real (SILVA; FORMIGLI, 1994). No entanto, embora limitado, o que pode ser

    percebido fundamentalmente no modelo a complementaridade das categorias: {...}a

    aferio dos resultados do cuidado, em ltima anlise, reflete a qualidade das estruturas e dos

    processos, tornando difcil ignorar a importncia dos dois primeiros em relao ao ltimo

    (STILES; MICK, 1994 apud MALIK, 1996, p.20).

    Em relao ao campo da pesquisa avaliativa, Denis e Champagne (1997), com base em

    uma reviso das crticas de vrios autores, criticam os estudos em que a avaliao se apoiava

    unicamente nos efeitos trazidos por uma interveno, o que os autores denominam de

    modelo da caixa-preta (black box experiment). Segundo esse modelo, a interveno

    tratada como uma varivel dicotmica (ausncia ou presena de interveno), onde no esto

    consideradas s influncias das caractersticas contextuais na qual a interveno introduzida.

    Nesse sentido, o reconhecimento dos limites do modelo da caixa-preta suscitou um

    interesse pelos problemas ligados implantao35 das intervenes. Assim sendo, a anlise

    de implantao um dos tipos de anlise que compem a pesquisa avaliativa, a qual

    consiste em explicar, aps a introduo de uma interveno, os conjuntos de fatores que

    influenciam os seus resultados (DENIS; CHAMPAGNE,1997). Interveno aqui entendida

    tipos de pesquisa, ou fundamentados no julgamento de pessoas bem-informadas ou expertos na rea (RIVELINE, 1991 apud CONTANDRIOPOULOS, 1997). 35 Implantao refere-se extenso da operacionalizao adequada de uma interveno (DENIS; CHAMPAGNE, 1997).

  • 92

    como {...} um conjunto de meios (fsicos, humanos, financeiros, simblicos) organizados em

    um contexto especfico, em um dado momento, para produzir bens ou servios com o objetivo

    de modificar uma situao problemtica (CONTANDRIOPOULOS et al. , 1997, p.31).

    Um dos componentes da anlise de implantao refere-se anlise dos determinantes

    contextuais do grau de implantao da interveno, que consiste em explicar o grau de

    implantao de uma interveno em relao s caractersticas contextuais do meio de

    implantao, ou melhor, explicar os fatores que influenciam uma maior ou menor

    operacionalizao desta interveno. Este tipo de anlise apropriada em uma grande

    quantidade de intervenes (DENIS; CHAMPAGNE, 1997).

    Segundo esses autores, na realizao da medio do grau de implantao, certas

    diretrizes so necessrias, tais como especificar os componentes da interveno, identificar as

    prticas requeridas para a implantao da interveno, descrever as prticas correntes em

    nvel das reas envolvidas teoricamente pela interveno e analisar a variao na implantao

    em virtude da variao das caractersticas contextuais.

    Na anlise dos fatores contextuais que podem facilitar ou obstaculizar a implantao

    de uma interveno, Denis e Champagne (1997) apresentam um quadro conceitual

    denominado modelo poltico contingente, com base na perspectiva de que a organizao

    uma arena poltica e os seus atores perseguem estratgias diferentes. Segundo este modelo,

    {...} o processo de implantao de uma interveno deve, antes de tudo, ser abordado

    segundo uma perspectiva poltica. Ele sofre, todavia, as presses de carter estrutural, isto ,

    as caractersticas estruturais de uma organizao que funcionam em sinergia ou em

    antagonismo na atualizao das estratgias dos atores (DENIS; CHAMPAGNE, 1997, p. 67).

  • 93

    A pesquisa avaliativa sempre deve ser orientada por um modelo terico36 que procure

    explicitar como o programa37 supostamente funciona (DENIS; CHAMPAGNE, 1997). Esta

    construo lgica pode derivar de vrias fontes como os resultados de pesquisas prvias,

    teorias das cincias sociais, experincias de gestores e avaliadores. Para sua construo,

    implica as especificaes seguintes: o problema, a populaoalvo e as condies do

    contexto; o contedo do programa ou atributos necessrios e suficientes para produzirem os

    efeitos esperados (REYNOLDS, 1998 apud HARTZ, 1999a).

    O modelo terico deve conduzir a uma apreciao sistemtica de todos os diferentes

    componentes no interior de um sistema emprico e expor as relaes entre esses componentes

    (CONTANDRIOPOULOS et al., 1994). Segundo enuncia Hennessy (apud HARTZ, 1999a), o

    modelo terico to importante que os avaliadores s deveriam avaliar polticas e programas

    se tivessem explicitado sua teoria e as medidas ou indicadores correspondentes.

    Na perspectiva desse modelo, entendese que o programa tratado em sua pluralidade

    e tambm na sua singularidade de seus sub-programas ou projetos, onde nunca se encontra

    {...} apenas um efeito desejado para os participantes, mas um conjunto de efeitos lgica e

    hierarquicamente articulados em uma srie de relaes se-ento associando recursos,

    atividades produzidas e resultados de curto e longo prazo (PLANTZ et al., 1997 apud

    HARTZ, 1999a, p.343).

    36 A Teoria pode ser definida como um conjunto de pressupostos, princpios ou proposies que explicam ou guiam a ao social. Distinguese em teorias causais ou descritivas, que teriam como objetivo explicar as relaes entre a interveno, a implementao e os resultados daquelas normativas ou prescritivas, que estariam voltadas para definir a imagem-objetivo, ou seja, como devem ser as intervenes, o processo de implementao do programa e os resultados (SILVA, 2003 apud Chen, 1990).Os modelos tericos so conhecidos popularmente no Canad como modelos lgicos. Constituem uma exigncia governamental para a avaliao de intervenes federais, desde o incio dos anos 80, e so considerados extremamente prticos pelos avaliadores, ajudando-os a estabelecer e testar a razo do programa bem como a conceber um instrumento de avaliao adequado (MONTAGUE, 1997 apud HARTZ, 1999). 37 Programas so compreendidos como o conjunto de aes visando a favorecer comportamentos adaptativos requeridos pelas diferentes reas ou atividades humanas relacionadas com a vida comunitria, escola, trabalho, sade e bem-estar. Sua avaliao demanda procedimentos de investigao para a coleta sistemtica de informao voltada para a tomada de deciso e melhoria das intervenes ( SCHALOCK, 1995 apud HARTZ, 1999).

  • 94

    2.4 CONTROLE E AVALIAO NO SUS

    O Controle e Avaliao, entendido como espao de poder exercido pela organizao

    gerenciadora do sistema de sade tem sua origem no antigo INAMPS. Naquele contexto, a

    lgica presente implicava que o controle emanava principalmente do grupo de atores sociais

    que detinha o poder regulador e que no estava permevel demanda de outros sujeitos da

    avaliao38. Neste caso, a avaliao considerada era apenas a do prprio grupo detentor de

    controle e talvez por isso que tenha havido a inverso, passando a avaliao a ser apenas uma

    funo de controle (INOJOSA, 1996).

    A atividade de Controle e Avaliao no chegou a ser estadualizada na maioria dos

    Estados, no mbito do processo de descentralizao desencadeado pelo Sistema Unificado e

    Descentralizado de Sade (SUDS), na segunda metade dos anos 80 (SANTOS, 1998). As

    Secretarias de Estado de Sade comearam a incorporar, a partir de 1987, alguns

    procedimentos do INAMPS em relao ao controle da compra de servios do setor privado,

    copiando para o interior da secretarias as prticas de controle e avaliao da cultura

    inampsiana. Alm disso, a presena de atividades de controle exclusivamente no que se

    refere aos servios complementares comprados da rede privada, ajudava em perpetuar a

    dicotomia entre as atividades de prestao de assistncia mdica e as atividades de vigilncia

    sade (INOJOSA, 1996).

    Com a criao do SUS, a Lei 8.080/90 estabelece que o Controle e a Avaliao39 do

    SUS so competncias comuns das trs esferas de governo e, portanto, deve envolver diversas

    instncias do SUS, tais como os Conselhos de Sade, Comisses Intergestores, Sistema

    38 A autora pontua que um servio pblico de sade tem potencialmente muitos juzes, tais como o cliente, os cidados que financiam os servios, os prestadores diretos, os gerentes, os dirigentes, os concorrentes, os demais grupos de poder interessados no setor, a imprensa, os segmentos da sociedade civil... 39 Inojosa (1996) chama a ateno em relao aos termos controle e avaliao que deveriam estar invertidos, pois, primeiro, estaria a avaliao como determinao do valor ou qualidade de alguma coisa que desencadeia o exerccio do controle. preciso que algum avalie, isto , selecione um conjunto de propriedades ou atributos

  • 95

    Nacional de Auditoria, entre outros. Inojosa (1996) aponta para o fato de que o SUS traz uma

    perspectiva nova para a avaliao e para o controle, medida que envolve a ampliao do seu

    objeto e a incorporao, no processo de avaliao, de novos atores sociais.

    Conforme descrito por Inojosa (1996), na Lei Orgnica de Sade, a atividade de

    avaliao e controle pode ser identificada em quatro itens: 1) acompanhamento, avaliao e

    divulgao do nvel de sade da populao e das condies ambientais; 2) formulao e

    avaliao de polticas; 3) avaliao, regulao e fiscalizao de aes e servios de sade; 4)

    controle de prestadores privados contratados e conveniados. Os trs primeiros itens se referem

    avaliao das condies de sade da populao, que permite identificar as polticas

    formuladas e, da, cabem a regulao, a avaliao e o controle das aes dela decorrentes. O

    quarto item representa a importncia desses prestadores contratados e conveniados na oferta

    de servios. Outro autor, Silver (1992), acrescenta que as atividades de controle e de avaliao

    do Sistema nico de Sade tero como objeto medir no somente a qualidade dos servios,

    mas tambm o grau de cumprimento da equidade, promessa contida na Constituio.

    Diante do exposto, percebe-se que, no mbito do SUS, o Controle e Avaliao podem

    ser entendidos dentro de duas dimenses: uma primeira relacionada a uma perspectiva de

    macroprticas de trabalho, envolvendo diversos rgos, setores ou instncias, subordinadas ao

    poder regulador, o qual pode ser exercido por atores sociais e organizacionais que detm

    poder legal e/ou legtimo para estabelecer critrios a serem obedecidos ou padres de ao ou

    de resultados que devem ser alcanados ou mantidos. A segunda dimenso entende o Controle

    e Avaliao como um instrumento ou funo de gesto do SUS, relacionado a microprticas

    de trabalho, como contratar, licitar, comprar, acompanhar, ou seja, atividades de controle e

    avaliao assistencial, conforme concebido nos respectivos documentos legais/oficiais40 .

    considerados adequados ou desejveis para um ato ou servio. Esta avaliao desencadeia controle que, por sua vez, tem uma dimenso coercitiva e demanda um poder correspondente. 40Regimento Interno do Ministrio da Sade (Ato Portaria n 1970/2002), NOAS SUS 01/2001, Portaria Ministerial (PT SAS n 423/2002): O Controle e Avaliao assistencial, a serem exercidos pelos gestores do

  • 96

    A implementao dessas funes nos diversos nveis de gesto do SUS vemse dando

    de forma heterognea. No que se refere aos Estados, a transferncia da a funo de controle e

    avaliao carregou na sua estrutura

    {...} um grau bastante elevado de burocratizao, com a consolidao de todo um modus operandi que, ao penetrar as estruturas estaduais, conservou, em grande parte a forma de funcionamento (do antigo Inamps), no se chegando construo de uma cultura estadual de controle e avaliao. Na maior parte dos Estados permaneceu funcionando no escritrio de representao do INAMPS ou como um setor completamente separado da estrutura das Secretarias Estaduais (SANTOS, F., 1998, p.32).

    A acelerao do processo de municipalizao desencadeou, principalmente por parte

    dos municpios de mdio e grande porte, uma preocupao com a funo de controle e

    avaliao, a partir da constatao da forte presena do setor privado contratado na prestao

    da assistncia sade e, conseqentemente, do comprometimento da totalidade dos recursos

    financeiros com este setor.

    O estudo de Carboni et al (1996), entretanto, revela que os municpios no efetuam o

    controle e avaliao que a eles competem, faltando conscientizao dos gestores da

    necessidade de estruturao dos mesmos, sendo que, na sua maioria, os mtodos

    desenvolvidos e repassados aos gestores municipais pelo nvel federal esto voltados para os

    servios assistenciais e pouco enfocam a rede de servios e as aes como um todo. Estes

    achados coincidem com a avaliao realizada pelo MS, tal como expressa em uma portaria da

    Secretaria de Ateno Sade (SAS) que observa que a descentralizao das funes de

    execuo e, portanto, de controle, regulao e avaliao {...} impe aos gestores a superao

    de mtodos que se referenciam principalmente ao controle de faturas (reviso) e instrumentos

    de avaliao com enfoque estrutural (vistorias) e do processo (procedimentos mdicos);

    SUS, compreendem o conhecimento global dos estabelecimentos de sade localizados em seu territrio, o cadastramento de servios, a conduo de processos de compra e contratualizao de servios de acordo com as necessidades identificadas e legislao especfica, o acompanhamento do faturamento, quantidade e qualidade dos servios prestados, entre outras atribuies.

  • 97

    supervalorizados em detrimento do enfoque da avaliao dos resultados e da satisfao dos

    usurios.

    Diante desse contexto, ainda persiste uma gesto dominada pela burocracia, com a

    perpetuao de uma situao de descontrole, na medida em que os prestadores de servios

    trabalham na mesma lgica de manuteno de seus prprios interesses (SANTOS, F., 1998;

    CALEMAN, 1998). Para reverter essa lgica e assumir esse novo papel de controlar e avaliar

    toda a rede de prestadores de servios de sade, o principal desafio colocado aos gestores

    municipais o de buscar essa transformao, sem contar com qualquer experincia anterior

    ou modelo a ser copiado e, ainda, sem interromper a prestao de servios assistenciais de

    sade (SANTOS, F., 1998).

    2.5 AUDITORIA

    2.5.1 Antecedentes e Aproximaes Conceituais

    A palavra auditoria tem sua origem no latim Audire que significa ouvir. Na lngua

    portuguesa, a palavra Auditoria entendida como cargo de auditor; local onde o auditor

    exerce suas funes; exame minucioso que segue o desenvolvimento de operaes contbeis;

    auditagem. No que se refere palavra auditor, o seu significado referente a magistrado que

    se encarrega de informar uma repartio civil acerca da aplicao das leis; juiz adjunto a

    tribunais militares.

    Na histria da auditoria, difcil de precisar quando esta realmente comeou, pois o

    que se sabe que toda pessoa que possua a funo de verificar a legitimidade dos fatos

    econmico-financeiros, prestando contas a um superior, poderia ser considerado como auditor

    (CORREIA, 2003). A auditoria parece ter su