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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS ALINE CRISTINA GONÇALVES DOSAGEM DE CLORETO E SÓDIO NA SALIVA PELA TÉCNICA DO ELETRODO ÍON SELETIVO DIRETO UMA POSSIBILIDADE PARA O DIAGNÓSTICO DA FIBROSE CÍSTICA CAMPINAS 2017

ALINE CRISTINA GONÇALVES - Repositorio da Producao Cientifica e Intelectual da ... · 2018-09-02 · sobre dignidade, respeito, lealdade, ... À Comissão Julgadora do exame de Defesa

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE CINCIAS MDICAS

ALINE CRISTINA GONALVES

DOSAGEM DE CLORETO E SDIO NA SALIVA PELA TCNICA DO ELETRODO

ON SELETIVO DIRETO UMA POSSIBILIDADE PARA O DIAGNSTICO DA

FIBROSE CSTICA

CAMPINAS

2017

ALINE CRISTINA GONALVES

DOSAGEM DE CLORETO E SDIO NA SALIVA PELA TCNICA DO ELETRODO ON

SELETIVO DIRETO UMA POSSIBILIDADE PARA O DIAGNSTICO DA FIBROSE

CSTICA

Tese apresentada Faculdade de Cincias Mdicas da Universidade

Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a

obteno do ttulo de Doutora em Cincias, na rea de concentrao

Sade da Criana e do Adolescente.

ORIENTADOR: CARLOS EMLIO LEVY

COORIENTADOR: ANTONIO FERNANDO RIBEIRO

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE VERSO

FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA

ALINE CRISTINA GONALVES, ORIENTADA PELO

PROF. DR. CARLOS EMLIO LEVY E COORIENTADA

PELO PROF. DR. ANTONIO FERNANDO RIBEIRO.

CAMPINAS

2017

BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

ALINE CRISTINA GONALVES

ORIENTADOR: CARLOS EMLIO LEVY

COORIENTADOR: ANTONIO FERNANDO RIBEIRO

MEMBROS:

1. PROF. DR.CARLOS EMLIO LEVY

2. PROF. DR. EDSON ANTUNES

3. PROFa. DRa. FERNANDA LOUREIRO ANTUNES ORSI

4. PROFa. DRa. GIESELA FLEISCHER FERRARI

5. PROF. DR. JOS ESPIN NETO

Programa de Ps-Graduao em Sade da criana e do adolescente da Faculdade de

Cincias Mdicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora

encontra-se no processo de vida acadmica do aluno.

Data: DATA DA DEFESA [31/07/2017]

minha famlia e amigos.

AGRADECIMENTOS

Aos meus amados pais Maria Elena e Luiz Carlos, obrigado por terem me ensinado

sobre dignidade, respeito, lealdade, honestidade, perseverana e amor. Agradeo

tambm pela dedicao, compreenso, apoio e incentivo. A vocs minha profunda

gratido, admirao e respeito.

Aos meus amados irmos Lus Eduardo e Lus Guilherme, muito obrigada pelo

apoio, incentivo e compreenso.

Ao meu querido e amado tio Antonio Carlos, obrigada pela confiana, apoio em

todas as minhas escolhas.

Aos colegas e amigos da ps-graduao: Ktia A. Aguiar, Fernando Marson, Tas

Hortncio, Renata Guirau, Higor, Simone Mesquita, Talita, Renan Mauch, Carla

Gomes, Adriana Vinagre e Arthur Kmint pelos momentos de descontrao e pelas

trocas de conhecimento;

minhas amigas irms Mariana Zorrn Mei Hsia Pu e Mayara Hidalgo Magri, muito

obrigada pela amizade, apoio, incentivo e compreenso.

CAPES e FAPESP pelo financiamento deste projeto e concesso de bolsa.

Ao meu orientador Prof. Dr. Carlos Emlio Levy, muito obrigada.

Ao meu coorientador, Prof. Dr. Antonio Fernando Ribeiro pela confiana, apoio,

incentivo, ensinamentos, pacincia e orientaes constantes. Minha gratido e

respeito.

Ao Prof. Dr. Andr Moreno Morcillo, agradeo pela anlise estatstica e pela

pacincia em ensinar.

Ao Prof. Dr. Jos Dirceu Ribeiro muito obrigada pelo incentivo e apoio.

Ao Prof. Dr. Edgard Ferro Collares, agradeo a pacincia e disposio em ensinar.

Profa. Dra. Elizete Ap. Lomazi por ter permitido a realizao da pesquisa no

laboratrio de Gastropedediatria do HC-Unicamp, pelo apoio e amizade.

Dra. Maura F. Goto muito obrigada pela disposio em ensinar, incentivo e

amizade.

Ao Prof. Dr. Gabriel Hessel muito obrigada pelas contribuies.

Dra. Regina M. Holanda Mendona; obrigada pelas contribuies, apoio e

amizade.

Profa. Dra. Ilma Ap. Paschoal, muito obrigada por compartilhar conosco sua ideia

de usar o equipamento de gasometria para quantificar os ons da saliva.

Aos biomdicos do Laboratrio de Gastropediatria do HC-Unicamp Jos da Silva

Nogueira Jnior e Jaqueline Shimizo Mores. Agradeo especialmente ao Jnior pela

pacincia, amizade, disponibilidade em contribuir com coletas de suor, me ensinar e

ajudar na dosagem de elastase.

Profa. Dra. Carmen Bertuzzo, Dra. Luciana Bonadia e Dr. Fernando Augusto de

Lima Marson, muito obrigada pela amizade e por contribuirem com o estudo

gentico dos pacientes com FC.

Profa. Dra Lilia Souza Li, muito obrigada pelo apoio e importantes orientaes na

minha transio do mestrado para o doutorado.

Comisso Julgadora do exame de qualificao e de defesa, Prof. Dr. Edson

Antunes e Profa. Dra. Fernanda Loureiro Orsi, agradeo as contribuies e por

aceitarem nosso convite.

Comisso Julgadora do exame de Defesa da Tese, Prof. Dr. Jos Espin Neto e

Profa. Dra. Giesela Fleischer Ferrari, pelo aceite em compor a banca e pelas

importantes contribuies.

Aos queridos pacientes do ambulatrio de fibrose cstica da pediatria e seus

responsveis, que apesar de uma rotina intensa de exames, consultas e internaes

aceitaram participar desse estudo. MUITO OBRIGADA.

Ao Servio de Odontologia do Hospital de Clnicas da Unicamp, muito obrigada pela

acolhida e colaborao constante.

Eliane Cristina, Marielza e Cristina do Laboratrio de Gasometria da Diviso de

Patologia Clnica HC Unicamp pela disponibilidade e pacincia;

Paulo Henrique de Oliveira e Bruna de Almeida Bianchini da Secretaria do

Departamento de Patologia Clnica da FCM-Unicamp, ao Gilson Alves Duarte,

secretrio da enfermaria de pediatria do HC-Unicamp, Marcia da Secretaria de

Ps-graduao da Sade da Criana e do Adolescente. Obrigada.

Agradeo a todos os funcionrios da FCM e do HC-Unicamp que de alguma forma

contriburam com a realizao desse estudo.

RESUMO

Doenas sistmicas, como a fibrose cstica (FC), influenciar tanto na

quantidade de saliva produzida quanto na qualidade deste fludo, uma vez que

pode afetar os constituintes qumicos e as propriedades fsicas da mesma.

Vrios estudos confirmam o valor diagnstico da saliva. A FC caracteriza-se

por um defeito no transporte inico atravs da membrana celular nas clulas

epiteliais das vias areas, pncreas, glndulas salivares, sudorparas, intestino

e aparelho reprodutor. H evidncias cientficas de que as concentraes de

cloreto e sdio na saliva de pacientes com FC so significativamente maiores

quando comparadas com as concentraes desses ons em indivduos no-FC.

Esse fato nos estimulou a investigar a viabilidade da dosagem de cloreto na

saliva como mtodo diagnstico alternativo ao teste de suor, sendo que o teste

da saliva de baixo custo e fcil acesso ao equipamento no ao sistema pblico

de sade. Objetivo: Avaliar a dosagem do cloreto da saliva, pela tcnica de

eletrodo on seletivo direto como possibilidade de mtodo para diagnstico da

fibrose. Casustica e mtodos: Estudo transversal, prospectivo, com um grupo

de pacientes com fibrose cstica selecionados no CERFC Unicamp e um grupo

controle com indivduos sem evidncias de doena. As concentraes de

cloreto e sdio da saliva foram analisadas pela tcnica de eletrodo on seletivo

direto e os mesmos ons do suor foram dosados respectivamente por

titulometria e por fotometria de chama. Ambos os grupos (FC e Controle) foram

compostos por 125 participantes a partir de 2 meses de idade, independente de

gnero ou etnia. Resultados: As concentraes de cloreto e sdio na saliva

foram estatisticamente maiores nos pacientes com FC quando comparados

com o grupo controle. Com aplicao da curva ROC determinamos o cut-off de

14,5 mmol/L para o cloreto na saliva 1 (Sensibilidade=80,6%; especificidade=

68,1%; valor preditivo positivo=71,6%; preditivo negativo=77,8%). Concluses:

Nossos resultados sugerem uma concordncia nas concentraes de cloreto e

sdio na saliva e no suor, ou seja, ambos fluidos tem comportamento

fisiologicamente semelhante, evidenciando a possibilidade do uso da dosagem

de cloreto e sdio na saliva pela tcnica de eletrodo on seletivo direto como

um teste de triagem e/ ou complementao diagnstica.

Palavras-chave: Saliva. Cloreto. Fibrose cstica-diagnstico.

ABSTRACT

Background: Systemic diseases, such as cystic fibrosis (CF), influence both the

amount of saliva produced and the quality of this fluid, as the chemical constituents

and the physical properties. Several studies confirm the diagnostic value of saliva.

CF is characterized by a defect in ionic transport through the cell membrane in

epithelial cells of the airways, pancreas, salivary glands, sweat glands, intestine and

reproductive system. There is scientific evidence that chloride and sodium

concentrations in the saliva of CF patients are significantly higher when compared to

the concentrations of these ions in non-CF subjects. This fact stimulated us to

investigate the feasibility of chloride dosage in saliva as an alternative diagnostic

method to the sweat test, because the saliva test is low cost and the equipment has

easy access in the public health system. Objective: To evaluate the possibility use of

saliva chloride dosage by the direct selective ion electrode technique as an

alternative diagnostic method for cystic fibrosis. Patients and methods: A cross-

sectional, prospective study with a group of patients with cystic fibrosis selected at

CERFC Unicamp and a control group of individuals with no evidence of disease. The

chloride and sodium concentrations of the saliva were analyzed by the direct

selective ion electrode technique and the same sweat ions were measured

respectively by titration and by flame photometry. Both groups (FC and Control) were

composed of 125 participants since 2 months of age, regardless of gender or

ethnicity. Results: The chloride and sodium concentrations in saliva were statistically

higher in the CF patients when compared to the control group. With the application of

the ROC curve we determined the cut-off of 14.5 mmol / L for chloride in saliva 1

(Sensitivity = 80.6%, specificity = 68.1%, positive predictive value = 71.6%, negative

predictive value = 77.8%). Conclusions: Our results suggest a concordance of

chloride and sodium concentrations in saliva and sweat, that means that both fluids

have a physiologically similar behavior, evidencing the possibility of the use of the

chloride and sodium dosage in the saliva by direct ion selective electrode technique

as a screening and / or diagnostic complementary test.

Keywords: Saliva. Chloride. Diagnosis-cystic fibrosis.

LISTA DE ILUSTRAES

Fluxograma 1. Passo a passo para a confirmao do diagnstico da FC......22

Figura 1. Glndulas salivares maiores.............................................................24

Fluxograma 2. Conduta aps coleta do TIR no Servio de Triagem Neonatal

da Unicamp........................................................................................................30

Figura 2. Salivette..........................................................................................31

Figura 3. Equipamento de gasometria.............................................................32

Figura 4. Estimulao e coleta de suor............................................................34

Figura 5. Acondicionamento e dosagem de EL-1............................................37

Figura 6. Estgios no processo de validao do ensaio diagnstico...............39

Fluxograma 3. Distribuio do pacientes para cada amostra coletada...........41

Box plots1 e 2. Comparao do comportamento fisiolgico dos ons cloreto e

sdio na saliva e suor entre os grupos.............................................................51

Figura 7. Definio dos pontos de corte para o nvel de cloreto da na saliva 1 e

2 , aps Curva Roc............................................................................................52

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Classes das variantes do gene CFTR e seu efeito na protena CFTR.................................................................................................................17

Tabela 2. Manifestaes clnicas da fibrose cstica de acordo com a faixa etria..................................................................................................................19

Quadro 1. Principais componentes orgnicos e inorgnicos da saliva.............25

Tabela 3. Doenas com teste do suor com valores superiores a 60 mEq/L.....28

Tabela 4. Caractersticas clnicas e laboratoriais de pacientes com fibrose

cstica.................................................................................................................42

Tabela 5. Variantes do gene CFTR identificadas no grupo FC.........................43

Tabela 6. Caracterizao dos pacientes do grupo FC de acordo com a classe

das variantes......................................................................................................44

Tabela 7. Caractersticas clnicas e laboratoriais de pacientes com fibrose

cstica com somente doena gastrointestinal, somente com acometimento

pulmonar e os que possuem ambas, doena gastrointestinal e pulmonar........45

Tabela 8. Anlise comparativa da concentrao de cloreto e sdio no suor com

os mesmos ons na saliva, coletada durante 1 minuto (saliva 1) e durante 3

minutos (saliva 2), para o grupo fibrose cstica (GFC) e grupo controle(GC)....46

Tabela 9. Anlise comparativa, pareada por idade das concentraes de

cloreto e sdio no suor com os mesmos ons da saliva 1 e saliva 2, para o

grupo fibrose cstica e grupo controle...............................................................47

Tabela 10. Anlise comparativa da concentrao de cloreto no suor com

cloreto da saliva 1 e saliva 2, para homozigotos e heterozigotos para variante

F508del..............................................................................................................48

Tabela 11. Anlise descritiva das concentraes de cloreto em suor e saliva 1

e 2 de acordo com as classes de variantes.......................................................40

Tabela 12. Anlise comparativa de pacientes com fibrose cstica com

insuficincia pancretica e suficientes pancreticos.........................................50

Tabela 13. Propriedades do teste de forma resumida......................................53

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AMP-cclico adenosina monofosfato cclico

CERFC- Unicamp Centro Especializado de Referncia em Fibrose Cstica da Unicamp

Cl- Cloreto

CFTR Cystic Fibrosis Transmembrane Regulator

CIPED Centro de Investigao em Pediatria

CV Coeficiente de variao

DNA Deoxyribonucleic acid

DRFC Diabetes relacionado a fibrose cstica

EL-1 Elastase fecal -1

ENAc Canal de sdio

FC Fibrose Cstica

FCM Faculdade de Cincias Mdicas

GFC Grupo Fibrose Cstica

GC Grupo controle

HC Hospital de Clnicas

IC Intervalo de confiana

LAFIP Laboratrio de Fisiologia Pulmonar

mEq/ L Mili equivalente por litro

mmol/L Mili mol por litro

Na+ Sdio

PCR Polymerase chain reaction [Reao em cadeia polimerase]

RNAm Ribonucleic Acid [cido ribonucleico (ARN) mensageiro]

Rpm Rotaes por minuto

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TIR Tripsinognio imunorreativo

TNN Triagem Neonatal

TS Teste do Suor

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

VEF1 Volume expiratrio forado no primeiro segundo

VFC Capacidade vital forada

http://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles-portugues/chainhttp://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles-portugues/reaction

SUMRIO

1. INTRODUO ............................................................................................15

2. OBJETIVO...................................................................................................26

3. CASUSTICA E METODOLOGIA ..................................................................27

3.1. Desenho do estudo ................................................................................ 27

3.2. Populao do estudo .............................................................................. 27

3.3. Mtodos...................................................................................................29

3.3.2. Coleta e anlise das amostras.............................................................29

3.4. Dados clnicos e laboratoriais...................................................................34

3.5. Anlise estatstica.....................................................................................38

4. RESULTADOS............................................................................................41

5. DISCUSSO...............................................................................................54

6. CONCLUSO.............................................................................................60

7. REFERENCIAS............................................................................................61

8. APNDICES................................................................................................73

Apndice I.......................................................................................................73

Apndice II......................................................................................................74

Apndice III.....................................................................................................75

Apndice IV.....................................................................................................77

Apndice VI.....................................................................................................80

15

1. INTRODUO

Fibrose cstica (FC) uma doena gentica autossmica recessiva,

hereditria e multissistmica, que apresenta ampla gama de variantes genticas e

clnica1,2.

Na Europa, desde o sculo XVIII, observou-se que as crianas com suor

salgado morriam precocemente. Em 1905, Landsteiner descreveu o leo meconial

relacionando-o com insuficincia pancretica excrina. Fanconi3 descreveu

pacientes com caractersticas clnicas da doena celaca, porm com insuficincia

pancretica excrina e doena pulmonar associada.

Dorothy Hansine Andersen4 foi a primeira a descrever a FC caracterstica

do pncreas e correlacionar com a doena pulmonar e doena intestinal; tambm foi

ela a primeira a realizar a suplementao de enzima pancretica para o tratamento

de crianas com FC.

Di SantAgnese e seus colaboradores5 foram os primeiros a analisar e

descrever cientificamente as concentraes de cloreto e sdio no suor de indivduos

com e sem FC e observaram que esses ons eram maiores em pacientes com FC,

dessa forma corroborando com a sabedoria popular que, desde a Idade Mdia,

atribua a baixa expectativa de vida a crianas que tinham suor salgado.

O gene da FC, denominado CFTR (Cystic Fibrosis Transmembrane

Regulator), foi localizado, clonado e sequenciado por Riordan et al 6. O CFTR que

est presente nos elementos do complexo de Golgi 7,8, localiza-se no brao longo do

cromossomo 7, e tem como funo codificar um RNAm de 6,5 quilobases que

transcreve uma protena transmembrana reguladora de transporte inico (CFTR),

composta de 1480 aminocidos9, 10

A FC, tambm conhecida como mucovicidose11 uma das doenas

autossmicas letais mais comuns, afetando cerca de 70.000 indivduos na

populao mundial e no Brasil temos 3511 pessoas com FC, sendo que desses, 956

nasceram no estado de So Paulo12,13,14,15.

Estudos sobre o mecanismo dessa doena e suas causas de variao

fenotpica, bem como o desenvolvimento de tratamentos, demonstram que a

16

gentica e fisiopatologia desempenham importante papel na investigao da fibrose

cstica16.

De acordo com Cystic fibrosis mutation database17 mais de 2000

variantes da doena foram encontradas no gene CFTR. Nessa base de dados

constam 322 variantes estudadas, das quais 281 comprovadamente causam FC; 21

causam diferentes consequncias clnicas; 12 no causam FC e 8 possuem

significncia desconhecida. Essas mutaes so distribudas em seis classes (ver

tabela 1) de acordo com a ausncia da protena CFTR e/ou alteraes qualitativas e

quantitativas na protena18, que funciona como um canal de cloreto (Cl-) localizado

na membrana apical das clulas epiteliais, regulando o movimento transepitelial de

gua e ons 6,14,19 .

17

Tabela 1. Classes das variantes do gene CFTR e seu efeito na protena CFTR.

Adaptado de: Culling e Ogle. Genetic Counselling Issues in Cystic Fibrosis. Paediatric

Respiratory Reiews 2010; 11: 7579. CFTR Cystic Fibrosis Transmembrane Regulator. Amaral

MD. Novel personalized therapies for cystic fibrosis: treating the basic defect in all patients. Jornal of

internal medicine 2015; 277: 155-166....

A classe da variante herdada, bem como a heterogeneidade allica,

associada ao de genes modificadores e fatores ambientais pode levar a uma

expresso fenotpica variada, com quadro clnico polimorfo e multissistmico 20,21

(ver Tabela 2).

As manifestaes clnicas da FC so: (i) infeco pulmonar crnica com

excessiva inflamao, levando deteriorao progressiva da funo do pulmo

(95%dos pacientes), (ii) azoospermia (mais de 90% dos homens afetados), (iii)

insuficincia pancretica (80% dos casos), (iv) diabetes mellitus associada doena

pancretica (20% dos adultos), (v) leo meconial em recm-nascidos (17%) e (vi)

doena obstrutiva do trato biliar (15% a 20% dos pacientes) 22, 24. A deteriorao da

Classe da variante Efeito na protena CFTR Exemplo de variantes

I Defeito na sntese proteica

1717-1G->A

G542X

W1282X

II Defeito no trfego at a membrana ou

processamento anormal

F508del

N1303K

A561E

III Defeito na regulao proteica

G551D

R560T

G1349D

IV Reduo na condutncia

R117H

R334W

G85E

V Reduo na sntese A455E

3849+10kb C>T

VI Reduo da estabilidade proteica c.120del23

rF508del

18

funo pulmonar a principal causa de morte em pacientes com FC. Atualmente,

pessoas com FC tm expectativa de vida de aproximadamente 40 anos de idade,

graas a triagem neonatal (TNN), ao reconhecimento das formas leve da doena e a

teraputica agressiva15.

Tambm h m digesto e m absoro de gorduras, protenas e em

menor proporo de hidrato de carbono. As fezes so esteatorricas, volumosas,

plidas e de odor ftido. O tratamento clssico inclui reposio enzimtica,

fisioterapia respiratria, mucolticos e antibioticoterapia agressiva. Uma proporo de

pacientes com graves sintomas pulmonares requer transplante e com menor

frequncia transplante de fgado 22, 25 .

19

Tabela 2. Manifestaes clnicas da fibrose cstica de acordo com a faixa etria

FAIXA ETRIA RGO MANIFESTAES CLNICAS

Recm-nascidos

Pulmonar Atalectasia e hiperinsuflao

Gastrointestinal

leo meconial, peritonite meconial, retardo na eliminao do mecnio, obstruo intestinal, desidratao hiponatrmica

Outros

Distrbios de coagulao por fatores K-dependentes

Ictercia prolongada

Lactentes

Pulmonar Sndrome do lactente chiador, pneumonias de repetio, atalectasia e/ou hiperinsuflao pulmonar

Gastrointestinal Esteatorria, prolapso retal

Nutricional Desnutrio, baixo ganho ponderal

Pr escolares

e

escolares

Pulmonar

Pneumonia de repetio, tosse crnica, sinusopatia crnica, atelecasia ou hiperinsuflao pulmonar, bronquiectasia hemoptise, hipertenso pulmonar, cor pulmonale

Gastrointestinal

Obstruo intestinal, esteatorria, prolapso retal, insuficincia pancretica, hipertenso portal, cirrose heptica

Nutricional Desnutrio, baixo ganho ponderal, hipovitaminose A, D ou E

Outras Baqueteamento digital

Adolescente

e

adultos

Pulmonar

Pneumonias de repetio, tosse crnica, sinusopatia crnica, bronquiectasias, atalectasia, hiperinsuflao pulmonar, hipertenso pulmonar, cor pulmonale

Gastrointestinal

Esteatorria, hipertenso portal, prolapso retal, insuficincia pancretica, pancreatite, cirrose heptica

Nutricional Desnutrio, baixo ganho ponderal, hipovitaminose A, D ou E

Outras Diabetes mellitus, osteopenia, infertilidade

Fonte: Adaptada de Ribeiro JD, Ribeiro MAGO, Ribeiro AF. Controversies in cystic

fibrosis from pediatrician to specialist. J Pediatr 2002; 78 (Supl.2): S171-S18.

Basicamente, a FC caracterizada pelo defeito no transporte inico

atravs da membrana celular nas clulas epiteliais das vias areas, pncreas,

glndulas salivares e sudorparas, intestino e aparelho reprodutor 24, resultando em

secrees mucosas espessas e viscosas, que causam obstruo ao nvel de ductos

e canalculos glandulares 1,26. O grau em que o transporte de ons alterado em um

20

indivduo com fibrose cstica determinado pelo efeito na quantidade e funo CFTR

de cada variante causadora da doena 27.

O mecanismo de produo de saliva tem semelhanas com a produo

de suor 26,28,29. As glndulas salivares so compostas de clulas acinares (serosa,

mucosas e seromucosa), ductais (intercalar, estriados e excretores) e clulas

mioepiteliais (localizado entre as clulas da membrana basal e acinares); sendo sua

estrutura semelhante a das glndulas sudorparas 30.

Tanto nas glndulas salivares como nas sudorparas, a secreo

glandular primria na regio dos cinos tem composio inica muito semelhante ao

fluido intersticial. Quando essa secreo hipertnica passa pelos ductos glandulares,

os ons cloreto e sdio so absorvidos respectivamente pelos canais de cloreto

(CFTR) e canal de sdio (ENaC). Em pessoas com FC, os canais de cloreto

estimulados por monofosfato cclico de adenosina (AMPc) no funcionam, somente

os canais estimulados pelo clcio (Ca++) ionoforo so abertos, causando uma

diminuio na permeabilidade para os ons cloreto, resultando num fluido hipertnico

26, 31, 32, 33.

Determinadas doenas sistmicas, como a FC, podem comprometer o

funcionamento das glndulas salivares, influenciando tanto na quantidade de saliva

produzida quanto na qualidade deste fludo, uma vez que pode afetar os

constituintes qumicos e as propriedades fsicas da mesma34. Baseando-se na

fisiologia28,29 e nos estudos de Ctalan et al.26, Jimenez-Reyes e Sanchez-Aguirrre35

e Gonalves et al.36, observam-se semelhanas do funcionamento das glndulas

salivares com as glndulas sudorparas.

H cerca de 3 a 4 milhes de glndulas sudorparas no corpo humano

que liberam transpirao ou suor. As glndulas sudorparas so divididas em

mercrinas (crinas) e as apcrinas. O suor produzido por essas glndulas

(aproximadamente 600 mL/dia) composto por gua, ons (sendo que o cloreto e o

sdio esto em maior quantidade), aminocidos, uria, cido rico, glicose e cido

lctico. A principal funo das glndulas sudorparas mercinas a termorregulao

atravs da evaporao37.

O teste padro ouro para o diagnstico da FC a determinao dos

eletrlitos no suor (Teste do Suor), sendo esta anlise j utilizada h mais de 50

21

anos. A iontoforese realizada pela anlise inica quantitativa do suor estimulado

pela pilocarpina38,39, sua interpretao deve ser correlacionada com o contexto

clnico, sendo necessria a realizao de no mnimo 2 testes do suor positivos,

preferencialmente com intervalo de semanas entre um teste e outro40.

Concentraes de cloreto no suor 60 mmol/L indicam diagnstico de FC,

concentraes inferiores a 30 mmol/L indicam que o diagnstico de FC improvvel,

no entanto no descarta o diagnstico. Valores intermedirios (30-59 mmol/L) de

cloreto no suor so indicativos de testes adicionais (diferena de potencial nasal,

biopsia retal) ou da anlise gentica para confirmao diagnstica (Fluxograma 1).

Casos de FC atpica podem apresentar difculdade ao diagnstico, devido

a ampla variabilidade clnica e gentica, sendo que essa ltima pode causar

diferentes efeitos na proteina CFTR que tem um importante papel na modulao da

expresso clnica da doena e consequentes concentraes de cloreto no suor com

valores intermedirios.

Alm do teste do suor, recomenda-se a pesquisa de variante gentica,

na presena de um contexto clnico ou histria familiar41,42, todavia, considerando-se

que o custo do sequenciamento gentico alto, a pesquisa gentica fica restrita, em

geral, somente para as mutaes mais frequentes, de forma que nem sempre

possvel identificar as variantes envolvidas17.

22

Fluxograma 1. Passo a passo para a confirmao do diagnstico da FC.

Na FC, alm do aumento da viscoelasticidade da saliva existem eletrlitos

e protenas em diferentes concentraes, quando comparado com a saliva de

ndivduos sem a doena 43, 44. Os eletrlitos em maior concentrao na saliva so

cloreto, sdio, potssio e bicarbonato. Esses eletrlitos se originam do soro, a partir

do qual so transportados para os cinos e ductos salivares 36, 45.

Cataln et al.26, observaram em camundongos homozigotos para a

variante F508del, pouca ou ausncia da proteina CFTR e como consequncia os

nveis de Na+ e Cl na saliva foram significativamente elevados. A disfuno da

protena CFTR, diminui a permeabilidade da membrana celular para o cloreto,

causando dificuldades de transporte inico. Consequentemente, a concentrao de

Cl na membrana apical das clulas epiteliais aumenta 46.

Gonalves et al 36 em estudo com o uso indito do equipamento de

gasometria (tcnica eletrodo on seletivo direto) para dosagem de ons na saliva

mostram que a concentrao de cloreto e sdio da saliva de indivduos com fibrose

cstica maior quando comparado com os ons de indivduos sem FC, sugerindo a

23

possibilidade de um novo mtodo para diagnstico da fibrose cstica. A coleta de

saliva segura, no invasiva e relativamente simples, de baixo custo, no necessita

de punes e pode ser coletada repetidamente 43.

A saliva possui componentes orgnicos e inorgnicos, sendo as

concentraes de potssio e bicarbonato tipicamente mais elevadas na saliva

quando comparado com fluido intersticial 47. A composio do fluido salivar pode

variar de acordo com o mtodo de coleta, diretamente do ducto gandular (partida,

submandibular, sublingual, glndula salivar menor) ou diretamente da cavidade oral

48, assim como a saliva produzida a partir de diferentes glndulas varia ligeiramente

com um ou mais constituintes. preconizado o uso da saliva total para fins de

diagnsticos 30, 49, 50, 51, 52. A coleta de saliva deve ser realizada de forma

padronizada53.

H trs pares de glndulas salivares maiores (Figura 1) onde: as

partidas produzem 25% da saliva total ou mista, as glndulas submandibulares

65% e sublinguais que compem apenas 4% da saliva total50, 51, 54. Alm das

glndulas salivares maiores, existem numerosas glndulas salivares menores (8%

da saliva total) presentes por toda cavidade oral e orofaringe, podendo tambm ser

encontradas na laringe, traquia e nasofaringe26. A saliva possui 2 tipos de secreo

de protenas:

Secreo serosa - contm ptialina, tambm conhecida como amilase.

Secreo mucosa - contm mucinas que tem a funo de lubrificar e

proteger a mucosa oral.

As partidas produzem apenas secreo serosa, enquanto que as

glndulas submandibulares e sublinguais secretam saliva serosa e mucosa, j as

glndulas salivares menores produzem apenas secreo mucosa 54.

Na cavidade oral, a saliva uma mistura de secrees das glndulas

salivares e de substncias provenientes do fluido crevicular (pequena quantidade de

lquido encontrado no sulco gengival, contendo protenas plasmticas que melhoram

a aderncia da ligao epitelial, com propriedades antimicrobianas exercendo a

atividade do anticorpo), secrees brnquicas ou nasais, clulas epiteliais, restos de

alimentos, microrganismos e seus produtos metablicos 48, e leuccitos orais 55, 56.

Tem amplo espectro de protenas, peptdeos, cidos nucleicos, eletrlitos e

hormnios. Embora essa secreo reflita a sade e bem-estar corporal, sua

24

utilizao como fluido diagnstico no bem estabelecida, principalmente devido a

falta de compreenso das biomolculas presentes na saliva e sua relevncia para a

etiologia da doena, combinada com a falta de sistemas de deteco de alta

sensibilidade como meio de diagnstico 52. Contudo, estudos confirmam o valor

diagnstico da saliva 57, 58, 59.

Pesquisas sobre o uso da saliva como fluido diagnstico tem-se

intensificado, dessa forma apontando para um futuro promissor de diagnsticos para

aplicaes personalizadas, incluindo decises clnicas e previses de resultados

ps-tratamento 52, 60.

Figura 1. Glndulas salivares maiores.1- Glndula partida; 2- Glndula

submandibular; 3- Glndula sublingual.

A produo diria de saliva varia de 0,5 a 1 litro. Noventa e nove porcento

de saliva composta por gua e menos de 1% dos componentes salivares so

elementos slidos, principalmente protenas e eletrlitos e o pH salivar varia entre 6

e 7, para facilitar o efeito digestivo da ptialina47.

O sistema nervoso parassimptico dominante e contnuo, com a

estimulao desse sistema temos a produo de uma saliva serosa rica em

enzimas, j um estmulo ao sistema simptico produz uma saliva mucosa com

volume menor, sendo a saliva uma secreo cem porcento controlada pelo sistema

nervoso 61. A composio desse fluido sofre muitas alteraes devido a vrios

fatores fisiolgicos e no fisiolgicos, como: ritmo circadiano, natureza e durao do

1

2

3

25

estmulo, condies da higiene bucal, tipo de dieta alimentar, uso de medicamentos,

etc 62.

Quadro 1. Principais componentes orgnicos e inorgnicos da saliva 63,64.

COMPONENTES ORGNICOS COMPONENTES INORGNICOS

Protenas Cloreto

Imunoglobulinas Bicarbonato

Enzimas Sdio

Glicoprotenas Potssio

Glicose Clcio

Hidrognio

Fluoreto

Tiocianato

Fosfato

Se demonstrada confiabilidade da dosagem do cloreto e sdio da saliva

pelo equipamento de gasometria, teremos um novo mtodo diagnstico da FC, com

vantagens: de a coleta no ser invasiva, de minimizar o estresse do paciente e de

oferecer poucos riscos para o mesmo, alm de ser um mtodo com custo acessvel,

indolor, de rpida coleta e anlise, quando comparado ao teste do suor, atualmente,

padro ouro para diagnstico da fibrose cstica.

26

2. OBJETIVOS

2.1. OBJETIVO GERAL

Avaliar a dosagem do cloreto da saliva, pela tcnica de eletrodo on

seletivo direto (equipamento de gasometria) como possibilidade de mtodo

diagnstico da fibrose cstica.

2.1.1. OBJETIVOS ESPECFICOS

A- Comparar as concentraes de cloreto e sdio do suor dosadas pelas

tcnicas de fotometria de chama / titulometria com os ons na saliva pela tcnica de

eletrodo on seletivo direto, no grupo de pacientes com fibrose cstica e no grupo de

indivduos sem a doena;

B- Verificar a utilidade diagnstica da dosagem de cloreto na saliva pela

tcnica de eletrodo on seletivo direto;

C- Comparar os nveis de cloreto na saliva e suor de acordo com as

variantes genticas para o gene CFTR do grupo FC;

D- Verificar se a saliva coletada no primeiro minuto menos estvel que a

coletadada nos 3 minutos subsequente;

E- Comparar as concentraes de cloreto na saliva e no suor entre

suficientes e insuficientes pancreticos do GFC.

27

3. CASUSTICA E METODOS

3.1. Desenho do estudo

Transversal prospectivo

3.2. Populao do estudo

Fizeram parte desse estudo:

- Crianas e adolescentes encaminhados ao Laboratrio de

Gastropediatria do HC-Unicamp para realizao do teste do suor;

- Indivduos com diagnstico de FC confirmado em acompanhamento no

Centro Especializado de Referncia em Fibrose Cstica da Unicamp

(CERFCUnicamp);

- Estudantes da FCM-Unicamp, funcionrios do HC e FCM- Unicamp e

parentes desses;

- Todos oriundos da mesma regio geogrfica.

Grupo caso (GFC)

Critrios de incluso: Indivduos com idade superior a dois 02 meses

independente de gnero ou etnia, com dois testes do suor com cloreto acima de 60

mEq/L e/ou com duas 2 variantes do gene CFTR identificadas, que concordaram

em participar do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE).

Critrios de no incluso: Pacientes cujos pais ou responsveis se

recusaram a assinar o TCLE (Apndice I); crianas com menos de 2 meses de

idade.

Critrios de excluso: Pacientes que no conseguiram coletar volume de

suor ( 80mg) e/ou saliva (< 600 microlitros) suficientes.

28

Grupo controle (GC)

- Critrios de incluso: Participantes a partir de 02 meses de idade

independente de gnero ou etnia, sem evidncias de doena aparente, que no

fizessem uso contnuo de qualquer medicamento, que concordaram em participar do

projeto e assinaram o TCLE (Apndice II).

Critrios de no incluso: Pessoas com doenas crnicas ou agudas, ou

com qualquer doena relacionada a alterao de eletrlitos no suor (ver Tabela 3).

Critrios de excluso: Indivduos que no conseguiram coletar volume de

suor (80mg) e/ou saliva (< 600 microlitros) suficientes.

Tabela 3. Doenas com teste do suor com valores superiores a 60 mEq/L65.

Reversvel Irreversvel

Insuficincia adrenal Displasia ectodrmica

Anorexia nervosa Sindrome de Klinefelter

Dermatite atpica Disfuno autonmica

Doena celaca Colestase familiar

Hipoparatiroidismo familial

Disfuno autonmica

Hipotiroidismo Sndrome de Mauriac

Desnutrio Hipogamaglobulinemia

Pseudohipoaldosterismo Mucopolissaridose tipo I

Doena de armazenamento de glicognio tipo

I (Doena de Von Gierke)

3.2.1.Tamanho da amostra

O clculo do tamanho da amostra foi baseado na correlao de Sperman.

Dessa maneira, admitindo que o coeficiente de correlao, no mnimo 0,30; =0,05

e =0,10 e poder da amostra de 90% 66, foram necessrios 226 indivduos [grupo

controle (n=113) e grupo caso (n=113)].

29

3.2.3. Aspectos ticos

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa

(CEP) da Faculdade de Cincias Mdicas (FCM) da UNICAMP, registrado sob o

nmero 157/2010. Foram respeitadas as condies ticas pertinentes ao protocolo e

seguidos rigorosamente os princpios enunciados na Declarao de Helsink II de

20/08/1947 e da Resoluo 196/96 do Comit Nacional de tica em Pesquisa

(CONEP).

Os sujeitos foram includos somente aps leitura e assinatura do Termo

de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE Apndice I e II) por um dos pais ou

responsvel legal, ou pelo prprio paciente, mantendo-se o anonimato dos mesmos

bem como dos dados coletados.

3.3. Mtodos

3.3.1. Local de coleta do suor e saliva

As amostras de suor foram coletadas na rotina do Laboratrio de

Gastropediatria do HC-UNICAMP por dois biomdicos habilitados e com tempo de

experincia superior a trs anos e a saliva coletada pela pesquisadora responsvel

pelo projeto, no mesmo local da coleta do suor.

3.3.2. Coleta e anlise das amostras

De acordo com o Programa de triagem neonatal para fibrose cstica do

Estado de So Paulo69 todo nascido vivo com primeira coleta do teste do pezinho

(amostra de sangue total seco em papel filtro) realizada idealmente entre o 3 e o 7

dia de vida que apresente TIR maior ou igual a 80ng/ml convocado para uma

segunda coleta entre o 16 e o 30 dia de vida. Quando TIR maior ou igual a 80ng/ml

nessa segunda amostra a criana convocada para realizar o teste do suor.

Anteriormente, desde a implantao da triagem neonatal em 2010, crianas com

valores de TIR maior ou igual a 70 ng/ml 68 eram convocadas, sendo que o ponto de

corte foi modificado em 03/08/2015.

30

Fluxograma 2. Conduta aps coleta do TIR no Servio de Triagem Neonatal da

Unicamp. IRT: Tripsinognio imunorreativo; CERFC: centro Especializado de

referencia em Fibrose cstica. Fonte: Goto, MF. Triagem Neonatal para Fibrose Cstica

Unicamp.

A respeito da coleta de saliva, foram coletadas duas amostras, sendo a

saliva 1 coletada durante 1 minuto e a saliva 2 coletada nos trs minutos

subsequentes a primeira coleta. Para crianas com menos de 2 anos de idade foi

coletada apenas a saliva 2 e a amostra de suor, para participantes a partir de 02

anos de idade, duas amostras de saliva (saliva 1 e saliva 2) foram coletas no

mesmo momento que a amostra de suor.

3.3.2.1. Padronizao da coleta e anlise das concentraes de cloreto e

sdio nasaliva

Foram coletadas duas amostras de saliva sendo a saliva 1 coletada

durante 1 minuto e a saliva 2 coletada nos trs minutos imediatamente

subsequentes primeira amostra. Para crianas com menos de 2 anos de idade foi

coletada apenas a saliva 2, ou seja, uma amostra nica coletada em trs minutos.

Antes de iniciar a coleta das amostras do estudo foi realizada a anlise de

uma mistura de saliva (10 ml) de vrios voluntrios para o teste de repetitividade e

de reprodutitbilidade. Para o teste de repetitividade: 400 microlitros de saliva foram

31

dispensados em cada um dos 17 tubetes graduados, os quais foram enumerados e

dosados no mesmo dia por duas bilogas distintas do Laboratrio de Gasometria do

HC-Unicamp.

Para o teste de reprodutibilidade: 400 microlitros de saliva foram

colocados em cada um dos 17 tubetes graduados, os quais foram enumerados e

dosados em dias e horrios diferentes pelas duas bilogas do Laboratrio de

Gasometria do HC-Unicamp para dosagem de cloreto e de sdio na saliva pela

tcnica do eletrodo on seletivo direto.

importante enfatizar que as amostras foram dosadas pelas bilogas de

forma cega, sem conhecimento de que se tratasse da mesma amostra. Com o

objetivo de verificar a confiabilidade da dosagem de cloreto e sdio da saliva

utilizando o equipamento de gasometria (tcnica eletrodo on seletivo direto), foi

aplicado o teste de repetitividade que consiste em repetir a dosagem de uma mesma

amostra no mesmo dia e laboratrio, para ento calcular o coeficiente de variao.

Para a coleta de saliva foi previamente solicitado aos participantes que

uma hora antes da coleta no escovassem os dentes, no fizessem uso de

enxaguatrio bucal e jejum durante o mesmo perodo.

Em ambos os grupos, a coleta de saliva foi realizada com o Salivette

(Sarstedt-Germany - http://www.sarstedt.com) (Figura 2.). Para indivduos a partir de

02 anos de idade, aps a retirada da tampa do tubete do tipo eppendorf, o rolete de

algodo foi inserido na boca do paciente. A saliva produzida no primeiro minuto foi

coletada em tubete. Em seguida o indivduo permaneceu com outro rolete de

algodo na boca durante trs minutos. Aps esse tempo, o rolete de algodo foi

colocado em novo tubete e tampado.

Figura 2. Salivette. Fonte:http://www.sarstedt.com

http://www.sarstedt.com/http://www.sarstedt.com/

32

Aps a coleta da amostra, o Salivette foi identificado pelo nmero de

identificao da ficha clnica (apndice III) do paciente. Os Salivettes foram mantidos

em refrigerao a 3C por um perdo mximo de 05 dias, antes da centrifugao.

Aps a centrifugao por 15 minutos em 1500 rotaes por minuto (rpm), as

amostras foram quantificadas em volume e uma amostra de 400 microlitros foi

acondicionado num tubete graduado estril e identificado. Amostras com menos de

600 microlitros foram desprezadas.

O equipamento ABL (modelo 835, Radiometer, Dinamarca) (Figura 2.)

analisa lactato, pH, glicose, eletrlitos e gazes do sangue, ar expirado, plasma e

soro pela tcnica eletrodo on seletivo direto.

Figura 3. Equipamento de gasometria. (A).Viso frontal interna e (B). Seo de medio. Fonte: Manual doUtilizador do ABL835.

Para a dosagem de cloreto e sdio da saliva pela tcnica do eletrodo on

seletivo direto fizemos as seguintes etapas: No display do equipamento de

gasometria (ABL, modelo 835, Radiometer, Dinamarca) selecionamos outros

fluidos, correo para outros fluidos, microamostras (35 a 400 microlitros), modo

capilar, os parmetros a serem avaliados e pressionamos a tecla ENTER.

3.3.2.2. Teste do Suor padro ouro para diagnstic da FC

Realizado no Laboratrio de Gastropediatria do HC da UNICAMP, o Teste

do Suor (TS) feito pelo mtodo clssico de Gibson e Cooke38, ou seja, pela anlise

A

[

A

B

[

A

33

inica quantitativa do suor (iontoforese) por meio da estimulao da pele pela

pilocarpina (Figura 3).

Aps a limpeza da pele com gaze e gua deionizada, a regio foi seca

com gaze. Em seguida, dois eletrodos de cobre (2,5 x 2,5 cm) so colocados sobre a

pele usando gaze embebida com 0,8% de soluo de nitrato de pilocarpina (eletrodo

positivo) e outra gaze com cido sulfrico 0,002% (eletrodo negativo). Aplicou-se

uma corrente de 2,5 miliampers durante 10 minutos. Depois da iontoforese, os

eletrodos so removidos e a pele limpa novamente com gua destilada e seca com

gaze. Ento, coloca-se o papel de filtro (WhatmanTM), previamente pesado (em

balana de preciso) sobre a rea estimulada com pilocarpina, cobre-se com um

plstico e veda-se com fita adesiva. Aps 30 minutos, o papel de filtro com o suor

coletado foi removido, retornado para pesa filtro e foi novamente pesado.

Considerou-se o peso mnimo da amostra de suor de 80 mg para a realizao das

dosagens de cloreto e de sdio.

O suor eludo do papel de filtro com 10 ml de gua destilada. A

concentrao de cloreto aferida pela tcnica de titulometria e a de sdio pela

fotometria de chama.

Formula para calcular dosagem de cloreto no suor:

O resultado positivo quando a concentrao de cloreto maior do que

60 mmol/L. Quando o valor menor que 30 mmol/L considerado improvvel o

diagnstico de FC. Os valores indeterminados entre 30 60 mmol/L so

considerados indicativos para que o teste seja repetido41, 70.

B

Cl- (mEq/L)= quantidade de nitrato de prata titulado X 100 / peso suor (g)

B

34

Figura 4. Estimulao e coleta de suor. (A) Iontoforese com pilocarpina e

(B) colocao do papel filtro para coleta do suor.

3.4. Dados Clnicos e Laboratoriais

Todos os participantes desse estudo foram submetidos ao exame

antropomtrico e teste do suor.

Os indivduos do GFC foram classificados de acordo com os seguintes

parmetros clnicos e laboratoriais:

Doena gastrointestinal - usamos exame de esteatcrito, endoscopia,

ultrasson de abdmen total, antecedente de leo meconial ou de sndrome

de obstruo do intestino distal, reposio enzimtica e idade de incio da

mesma, uso de cido ursodesoxiclico e/ou inibidores de bomba de

prtons.Os dados foram coletados de pronturios.

Funo pancretica excrina dosamos a elastase fecal-1

Doena pulmonar consultamos no pronturio a porcentagem predita

de VEF1 e VFC da espirometria (a partir de 6 anos de idade), tomografia

de trax (a partir de 6 anos de idade), radiografia de trax,

ecocardiograma (hipertenso pulmonar), cultura de escarro e/ou secreo

A

B

35

de orofaringe, sintomas clnicos (tosse, sibilos, estertores), sinusopatias e

plipos nasais.

Classes das variantes do gene CFTR variantes do gene CFTR

identificadas foram consultadas no pronturio e banco de dados do

Laboratrio de Gentica da FCM, caso o paciente no tivesse realizado o

estudo gentico, o mesmo foi solicitado.

Diabetes Relacionada a FC informao de TTOG e de uso de

insulina obtidos por consulta ao pronturio

Idade ao diagnstico e/ou primeiras manifestaes clnicas.

Os dados coletados foram anotados numa ficha clnica (Apndice III) e

posteriormente transcritos na forma de arquivo em banco de dados em Excel.

3.4.1. Exame Antropomtrico

Todos os participantes desse estudo foram submetidos ao exame

antropomtrico.

A aferio dos dados antropomtricos (peso e estatura) foi realizada no

Laboratrio de Gastropediatria pela pesquisadora responsvel.

Foram obtidas as medidas de peso e altura segundo as recomendaes

de Lohman et al 67.

Estudo gentico

A presena de mutaes do gene CFTR foi determinada no Laboratrio

de Gentica Molecular da FCM-Unicamp, de acordo com a rotina por

sequenciamento ou multiplex ligation-dependent probe amplification. Foi usado, o

mtodo do fenol/clorotofrmio para a extrao do DNA, e, em todas as anlises

genticas, a concentrao do DNA foi de 50 ng/mL, determinada por um

espectrofotmetro (NanoVueT; GE Healthcare Biosciences, Pittsburgh, PA, EUA). A

36

presena da mutao F508del e de mutaes frequentes na populao brasileira foi

determinada por PCR (reao em cadeia polimerase) 71, 72.

Avaliao da funo pancretica excrina e doena gastrointestinal

na Fibrose cstica

Elastase fecal - 1

A funo pancretica excrina foi avaliada no Laboratrio de

Gastropediatria do HC-Unicamp pela pesquisadora responsvel, sob superviso do

biomdico do laboratrio. A dosagem de elastase fecal-1(EL-1) foi realizada pelo

mtodo imunoenzimtico (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay ELISA) ScheBo

Pancreatic Elastase 1 Stool Test, como preconiza o fabricante (Figura 5.).

O perodo de armazenamento das amostras foi por um perodo mximo

de 6 meses a uma temperatura mdia de -22C. Esse exame usa dois anticorpos

monoclonais contra elastase humana no reage contra elastase suna, presente nas

enzimas pancreticas humana, tem uma correlao significativa com a elastase

duodenal e concentraes de amilase, tripsina e bicarbonato, no sofrendo

influncia da terapia de reposio enzimtica, dessa forma no necessria a

interrupo da reposio enzimtica para realizar esse exame. A dosagem da EL-1

possui sensibilidade de 96% e especificidade de 100%. Sua desvantagem o alto

custo 13, 73, 74.

A identificao precoce e precisa da insuficincia pancretica (PI) melhora

a eficcia da terapia de substituio de enzimas pancreticas e do estado nutricional

75.

EL-1 uma enzima excretada pelo pncreas e no degradada no trato

gastrointestinal 76. A dosagem dessa enzima no confivel durante as primeiras 2

semanas aps o nascimento, porque nesse perodo os nveis de EL-1 so baixos,

tanto em crianas prematuras como em crianas a termo, por esse fato no

indicado para a triagem neonatal 77, 78, 79.

37

So considerados com insuficincia pancretica excrina, pacientes com

valores de EL-1 abaixo de 200 g/g 73, 77, 80, 81, 82.

Figura 5. Acondicionamento e dosagem de EL-1. (A) Acondicionamento e

(B) pesagem das amostras de fezes, (C) preparo para dosagem, (D, E, F) dosagem

de EL-1.

Esteatcrito

Esse um mtodo semi-quantitativo simples para avaliar a absoro de

gordura. Phuapradit et al 83 props este mtodo para medir a gordura fecal em

recm-nascidos. Foi realizado no Laboratrio de Gastropediatria do HC- Unicamp

pelos biomdicos do setor, de acordo com a rotina do servio.

Os pacientes que trouxeram amostras de fezes para dosagem de EL-1,

da mesma amostra foi reservada uma alquota para a dosagem do esteatcrito.

Balano de gordura (Dosagem da gordura fecal Van de Kemer)

O Balano de gordura fecal foi realizado no Laboratrio de

Gastroenterologia Gastrocentro/Unicamp, conforme a rotina do servio.

A quantificao de gordura nas fezes de 72 horas, pelo mtodo de Van de

Kramer, um dos testes mais utilizados para o diagnstico de m absoro de

gordura. Em crianas a excreo fecal de gordura superior a 3,5 g considerada

esteatorria. Quando se utiliza este mtodo, o paciente deve receber uma

A

D E

B

C

38

quantidade estvel de gordura durante a coleta de fezes, a qual deve ser recolhida e

armazenada em sua totalidade.

Doena pulmonar na Fibrose cstica

Para avaliar a presena de doena pulmonar foram considerados os

seguintes parmetros: cultura de secreo brnquica, tomografia, presena de

sinusopatia, presena de plipos nasais, uso de medicamentos para o trato

respiratrio (i.e. antibiticos, corticoides, alfa dornase).

Para crianas acima de 6 anos foi avaliada a espirometria e considerados

os parmetros volume expiratrio forado no primeiro segundo (VEF1) e capacidade

vital forada (VFC).

A espirometria considerada foi a realizada no ltimo ano pelo Laboratrio

de Fisiologia Pulmonar (LAFIP) do Centro de Investigaes Peditricas (CIPED) da

UNICAMP, sob as normas da American Thoracic Society and European Respiratory

Society (ATS-ERS), sendo o VEF1 avaliado em porcentagem do valor predito

(Rodrigues et al., 2002), (onde) e classificado em: Normal (80%), leve (60-79%),

moderado (41 a 59%) e grave ( 40%).

3.5. Anlise estatstica

Os dados foram processados com Software Statistical Package for Social

Sciences (SPSS)84for Windows verso 16. O nvel de significncia do estudo de

5% foi submetido anlise descritiva para obteno das frequncias absoluta e

correlao das variveis analisadas. As comparaes das mdias das variveis

entre o grupo caso e o controle foram realizadas pelo teste de Mann-Whitney e o

teste de Wilcoxon foi usado para avaliao e comparao de duas amostras

pareadas.

A dosagem de ons da saliva pelo equipamento de gasometria no

validada, dessa forma fizemos os testes de reprodutividade e repetitividade das

amostras.

Aps aplicao da curva ROC foi calculada a sensibilidade diagnstica,

que segundo o National Committee for Clinical Laboratory Standard 85, a proporo

39

das amostras conhecidas de doentes com resultado positivo pela tcnica proposta e

a especificidade diagnstica, que a proporo das amostras conhecidas de no

doentes com resultado negativo num ensaio.

A acurcia de um teste a proporo de acertos, ou seja, o total de

verdadeiramente positivos e os verdadeiramente negativos em relao amostra

estudada e reflete a sua sensibilidade e especificidade, respectivamente 86. Alm da

acurcia calculamos o valor preditivo positivo o valor preditivo negativo.

A validao da dosagem de cloreto na saliva para diagnstico da FC foi

realizada seguindo os estgios recomendados86,87, 88 (Figura 6).

Figura 6. Estgios no processo de validao do ensaio diagnstico86, 87.

Estgio 1- Viabilidade; Estgio 2 - desenvolvimento e padronizao; Estgio 3- caracterizao da

performance do ensaio; Estgio 4- monitoramento do desempenho do teste pela validade; Estgio 5-

monitoramento da extenso dos critrios de validao.

De acordo com Hulley e Cummings66 e WHO89 para determinar a validade

de um teste diagnstico deve-se: certificar-se da necessidade do teste (vantagens

do novo teste em relao ao existente; benefcios para os pacientes, com a

introduo do novo teste; custos do teste proposto em nvel individual e em sade

pblica); estabelecer o critrio de amostragem (definir a populao de referncia e a

40

populao de estudo, calcular o tamanho da amostra (estipular o nmero mnimo e

suficiente de participantes para se estimar a sensibilidade e especificidade do teste

com intervalo de confiana (IC) de 95%), esclarecer as questes ticas (riscos da

aplicao do teste e benefcio da deteco de indivduos positivos, ateno mdica

aos indivduos positivos, confidencialidade dos resultados), esclarecer a fonte de

seleo dos participantes, (informar sobre a incluso de casos graves, moderados e

leves); descrever o teste proposto e o padro ouro; descrever os procedimentos para

a aplicao do novo teste e do padro ouro e analisar os dados (apresentar os

resultados em termos de sensibilidade, especificidade e valores preditivos com

respectivos IC95%).

Como nossos dados no possuem distribuio normal, aplicamos testes

estatsticos no-paramtricos, sendo recomendado que os dados incluam: a mdia e

desvio padro ou curva ROC para determinao do ponto de corte; a tabela 2x2

para estimativas de sensibilidade e especificidade. Medidas de disperso

comumente utilizadas em avaliao de testes diagnsticos so varincia, desvio-

padro e coeficiente de variao (CV). Essas medidas so concordantemente

recomendadas na avaliao da impreciso do teste, sendo o desvio padro mais

usado que a varincia. Em uma comparao de dois grupos de dados, o grupo com

menor desvio-padro tem as observaes mais homogneas; o grupo com maior

desvio padro exibe maior variabilidade. Como o desvio-padro tem unidade de

medida, no tem sentido comparar desvios-padro para duas quantidades no

relacionadas. A variabilidade entre dois ou mais conjuntos de dados que

representam quantidades variadas com diferentes unidades de medida, pode ser

comparada utilizando o coeficiente de variao90.

Comparamos diferentes fluidos (suor e saliva) dosados por diferentes

tcnicas (titulometria e fotometria de chama, versus eletrodo on seletivo direto) e

com isso obtivemos grandezas diferentes, no sendo possvel aplicar o Mtodo de

Bland e Altman. De acordo com Bland e Altman91 e Altman e Bland92, o coeficiente

de correlao uma medida de associao no sendo apropriada para avaliar

concordncia entre 2 mtodos.

41

4. RESULTADOS

Os grupos foram pareados por idade, sendo que a idade mdia em anos

foi de 10,28, com mediana de 9, desvio padro de 10,14, sendo a idade mnima

0,16 e a mxima de 45, o range foi de 44,92.

O GFC foi composto por 67 pacientes do gnero feminino (mdia de

idade=11,2 anos) e 58 do masculino (mdia de idade=9,2 anos). A idade (anos) ao

diagnstico dos pacientes com FC foi: mdia=4,35; desvio padro=7,47; range=38).

Do GC fizeram parte 67 (pessoas) indivduos do gnero feminino (mdia

de idade=10,9 anos) e 58 do mascullnino (mdia de idade= 9,5 anos). A

caracterizao (mais) detalhada do grupo de participantes com diagnstico de

fibrose cstica (GFC) pode ser observada nas tabelas 4 e 5, e o nmero de amostras

coletadas de suor, e saliva 1 e 2, bem como os integrantes de cada grupo consta no

fluxograma 3.

Fluxograma 3. Distribuio do pacientes para cada amostra coletada.

42

Tabela 4. Caractersticas clnicas e laboratoriais de pacientes com fibrose cstica

(n=125 pronturios vistos).

*Pacientes acima de 06 anos de idade; **Pacientes com 03 ou mais culturas de escarro ou

secreo de orofaringe consecutivas, positivas para microrganismos patognicos para indivduos

com fibrose cstica93

; F: feminino; M: masculino; ***08 pacientes no dosaram a elastase

pancretica

43

Tabela 5. Variantes do gene CFTR identificadas no grupo FC.

NI: no identificado

No GFC (n=125), 100 (F=57 e M=43) tem doena pulmonar, sendo 56

heterozigotos para F508del e 26 homozigotos para a F508del, 19 pacientes tiveram

leo meconial e 64 pacientes so insuficientes pancreticos, sendo que 8 no tem

dosagem de EL-1.

Dezesseis pacientes com FC (F=8, M=8; F508del / no identificada=6,

F508del / F508del=6), apresentam apenas doena gastrointestinal. Os que

44

apresentam somente a doena pulmonar so 14 (F=11, M=3; F508del / outras de

Classe 3,4,5= 3; F508del / no identificada= 6, Classe I / Classe II=1,Classe I /

Classe IV= 2, Classe II / Classe IV= 2) (Tabela 7).

Oitenta e cinco dos 125 pacientes com FC apresentam doena pulmonar

e gastrointestinal, sendo 45 do gnero feminino e 40 do gnero masculino. A

mutao mais frequente foi a F508del em heterozigose (F508del / no

identificada=27 e F508del/ outras variantes=14).

Tabela 6. Caracterizao dos pacientes do grupo FC de acordo com a classe das

variantes.

Na tabela 7, observamos que a mdia da concentrao de cloreto no

suor, Saliva 1 e Saliva 2 foi maior no subgrupo de pacientes com doena

gastrointestinal, assim como no de doena gastrointestinal + doena pulmonar,

quando comparada ao subgrupo que tem apenas doena pulmonar.

45

Tabela 7. Caractersticas clnicas e laboratoriais de pacientes com fibrose cstica com

somente doena gastrointestinal (n=16), somente com acometimento pulmonar (n=14) e os

que possuem ambas, doena gastrointestinal e pulmonar (n=85).

PARMETROS Subgrupos Mdia Mediana DP Mnimo Mximo

Idade Doena Gastrointestinal 4,32 1,5 6,03 0,16 41

(anos) Doena Pulmonar 19,23 16,5 14,54 0,25 45

D. Gastro +D. Pulmonar 10,03 10 9,27 0,16 41

Idade Diagnstico Doena Gastrointestinal 1,87 0,29 3,30 0,16 41

(anos) Doena Pulmonar 12,98 7,5 12,69 0,16 38

D. Gastro +D. Pulmonar 3,30 0,75 6,02 0,16 31

Cl- Suor Doena Gastrointestinal 124,48 121,78 31,08 82,78 182,23

(mEq/L) Doena Pulmonar 107,44 119,21 32,92 37,5 147,45

D. Gastro +D. Pulmonar 124,25 125,8 27,17 31,12 205,53

Cl- Saliva 1 Doena Gastrointestinal 29 22 16,67 6 18

(mmol/L) Doena Pulmonar 16,8 16 5,95 8 28

D. Gastro +D. Pulmonar 26,87 23 14,48 6 77

Cl- Saliva 2 Doena Gastrointestinal 23,06 21,5 11,59 51 58

(mmol/L) Doena Pulmonar 15,81 17 6,44 8 25

D. Gastro +D. Pulmonar 25,25 21 16,77 6 88

Para o teste de repetitividade e reprodutibilidade da concentrao de

cloreto na saliva o coeficiente de variao foi 3,2% e 6,01%, respectivamente. Para o

on sdio os coeficientes de variao de repetitividade e reprodutibilidade foram 0%.

A mdia da quantidade de saliva coletada foi: saliva 1= 83 l no grupo FC

e 89 l no grupo controle, com p valor de 0,089. Na saliva 2 houve diferena

estatisticamente significante entre os grupos (GFC=1 ml GC= 1,08 ml), o p= 0,0045.

Com relao ao gnero, no houve diferena estatstica significante para as

concentraes de cloreto (suor: p= 0,480; saliva 1 p=0,612; saliva 2 p= 0,539).

Numa anlise comparativa das concentraes de cloreto no suor com as

concentraes do mesmo on da saliva dosado pela tcnica do eletrodo on seletivo

direto, vimos que o comportamento fisiolgico dos ons cloreto e sdio na saliva e

suor dos grupos (FC e Controle) semelhante (Tabela 7,8 e Box plots 1 e 2),

embora a saliva seja menos concentrada que o suor (Tabela 8, 9 e 10).

46

Tabela 8. Anlise comparativa da concentrao de cloreto e sdio no suor com os

mesmos ons da saliva, coletada durante 1 minuto (saliva 1) e durante 3 minutos (saliva

2), para o grupo fibrose cstica (GFC) e grupo controle(GC).

*Probabilidade do Teste de Wilcoxon, comparando as concentraes de cloreto e sdio (Fibrose Cstica X Caso).

*

47

Tabela 9. Anlise comparativa, pareada por idade das concentraes de cloreto e sdio no

suor com os mesmos ons da saliva 1 e saliva 2, para o grupo fibrose cstica (GFC) e grupo

controle(GC).

*Probabilidade do teste de Wilcoxon, comparando as concentraes de cloreto e sdio (Fibrose Cstica X

Caso).

48

Tabela 10. Anlise comparativa da concentrao de cloreto no suor com cloreto da

saliva 1 e saliva 2, para homozigotos e heterozigotos para variante F508del.

* Teste de Mann-Whitney:Homozigotos versus Heterozigotos

Na Tabela 10 notamos que embora sem diferena estatstica significante

a concentrao de cloreto tanto no suor como na saliva 1 maior para os

homozigotos [mdia de idade= 9,58 anos (mn.=0,16; mx.=41)] quando comparada

com a mesma concentrao de heterozigotos [mdia de idade= 10,11 anos

(mn.=0,16; mx.=45)], os quais demostraram ter valores de cloreto maior na saliva

2, tambm no estatisticamente significante.

A concentrao de cloreto na saliva 2 de pacientes menores de 3 anos de

idade, quando comparamos homozigotos (n=9) e heterozigotos (n=21) para a

variante F508del, vimos que: para a saliva 2 p=0,667 e para o suor p=0,154.

Assim como no suor, na saliva 1 a mediana e o valor mnimo foram

menores no subgrupo com 1 variante de classe II e a outra no identificada (Tabela

11).

49

Tabela 11. Anlise descritiva das concentraes de cloreto em suor e saliva 1 e 2 de

acordo com as classes de variantes.

* 0: variante no identificada

Foram dosadas 117 amostras de EL-1, sendo que dessas 03 pacientes

foram excludos da nossa casustica (02 pacientes no compareceram para a coleta

da amostra de saliva e suor, e 01 a quantidade de suor coletada foi inferior a 80mg

nas 02 tentativas). Nos insuficientes pancreticos (n=33) a concentrao de cloreto

no suor foi maior (p

50

Tabela 12. Anlise comparativa de pacientes com fibrose cstica com insuficincia pancretica

(n=78) e suficientes pancreticos (n=33).

*Teste de Mann-Whitney: Suficientes pancreticos versus Insuficientes pancreticos [Idade: p=0,044; Idade ao

diagnstico: p=0,003; Estatura: p=0,190; Peso: p=0,069; Suor cloreto: p

51

CFControl

250

200

150

100

50

0

168

75

107

73

68

60

112

201

56

73

SALIVA 2 CHLORIDE (GASOMETRICANALYSIS) [mmol/L]

SALIVA 1 CHLORIDE(GASOMETRIC ANALYSIS) [mmol/L]

SWEAT CHLORIDE (mEq/L)

CFControl

200

150

100

50

0

SALIVA 2 SODIUM (GASOMETRICANALYSIS) [mmol/L]

SALIVA 1 SODIUM (GASOMETRICANALYSIS) [mmol/L]

SWEAT SODIUM (mEq/L)

Box plots1 e 2. Comparao do comportamento fisiolgico dos ons cloreto e sdio

na saliva e suor entre os grupos.

52

Cloreto Saliva 1

Cloreto Saliva 2

Figura 7. Definio dos pontos de corte para o nvel de cloreto da na saliva 1 e 2 , aps

Curva Roc.

Para as amostras de saliva 1 [GFC(n=79) e GC (n=82)] os pacientes com

diagnstico de FC que foram identificados tambm pela saliva foram 67 pacientes

(verdadeiro positivo foi 84%) (Tabela 8) e dos GC 53 pessoas sem FC foram

detectadas pela saliva (verdadeiro negativo= 64,63%) (Tabela 13). Sendo assim o

Sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo, valor preditivo negativo do cloreto na saliva1, usando ponto de corte 14,5 mmol / L

Estimativa IC95%

Sensibilidade 80,6 % 70,2 a 88,5

Especificidade 68,1 % 56,7 a 78,0

Valor Preditivo Positivo 71,6 % 61,1 a 80,6

Valor Preditivo Negativo 77,8 % 66,3 a 86,8

Sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo, valor preditivo negativo do cloreto na saliva2, usando ponto de corte 13,5 mmol / L.

Estimativa IC95%

Sensibilidade 78,9 % 70,8 85,7

Especificidade 60,5 % 51,3 69,2

Valor Preditivo Positivo 66,7 % 58,4 74,2

Valor Preditivo Negativo 74,2 % 64,6 82,3

53

grau de concordncia do teste da saliva com o padro ouro foi de 84,8% e a

acurcia do teste da saliva 1 foi de 74,5%.

Tabela 13. Propriedades do teste da saliva 1 de forma resumida.

54

5. DISCUSSO

Gonalves e colaboradores36 usando a tcnica de eletrodo on seletivo

direto (ABL Radiometer) observaram que os nveis inicos de cloreto e sdio na

saliva de pacientes com fibrose cstica so significativamente maiores quando

comparado aos mesmos ons salivares de indivduos saudveis, resultado esses

concordantes com pesquisas anteriores35, 94, 95, 96. Isso nos permitiu aventar a

hiptese de que a dosagem de cloreto na saliva pelo equipamento de gasometria

poderia ser um mtodo tambm til para triagem e/ou diagnstico da fibrose cstica.

A dosagem quantitativa de eletrlitos no suor, obtida pelo mtodo da

iontoforese com pilocarpina, descrito originalmente por Gibson e Cooke38 um

mtodo aceito para o diagnstico de FC97. No entanto, esse mtodo maior tempo,

cuidados para prevenir a evaporao da amostra, balana de preciso e habilidade

para dosar a composio eletroltica de amostras diludas35. J para a anlise da

concentrao de cloreto na saliva precisamos apenas do Salivete (Sardest-

Germany - http://www.sarstedt.com), centrifuga e equipamento de gasometria.

importante destacar que a coleta de saliva segura, no invasiva e relativamente

simples, de baixo custo, no necessita de punes e pode ser coletada

repetidamente sem desconforto para o paciente43, 98.

Entre as limitaes do teste do suor tambm h a dificuldade obter o

volume de suor suficiente, em crianas com menos de 03 meses de idade99. Alm

da idade outros fatores influenciam a obteno do volume adequado do suor:

gnero, peso, etnia, hidratao e o sistema de coleta usado100.

A anlise do cloreto no suor deve ser realizada no mesmo dia da coleta,

pois embora o suor seja coletado com papel filtro o qual pesado novamente aps a

coleta e armazenado em recipiente tampado hermeticamente, a amostra permanece

estvel por at 72 horas a 4 C 99. O tempo de armazenamento do suor coletado

pelo sistema Macroduct ainda no foi estabelecido22. Com o teste de

reprodutibilidade, observamos que as amostras de saliva podem ser armazenadas

por uma semana, sem alteraes nas concentraes de cloreto e sdio, quando

mantidas a uma temperatura de 3 C.

55

Baseando-se na fisiologia28, 29 e nos estudos 26, 36, notamos semelhanas

do funcionamento das glndulas salivares com as glndulas sudorparas.

Massie e seus colaboradores101 fizeram um estudo comparativo dos

nveis de cloreto no suor em 43 crianas heterozigotas para F508del, com 6

semanas de idade e mais uma vez com a idade de 6 a 12 meses de idade,

encontraram aumentos e diminuies nos valores de cloreto entre os perodos. A

qualidade e quantidade de funcionamento do CFTR (canal de cloreto) influenciam na

concentrao de cloreto no suor102, porm em nossos resultados embora a

concentrao de cloreto no suor e na saliva 1 de homozigotos seja maior quando

comparada com heterozigotos para a variante F508del, no houve diferena

estatisticamente significativa.

No existem dados longitudinais sobre a concentrao de cloreto no suor

de indivduos com duas semanas ou mais de vida. Para um pequeno nmero de

pessoas submetidas ao teste de suor, os valores de cloreto permanecem no

intervalo de dvida diagnstica por meses ou mesmo anos41. Em um estudo

realizado no Canad, trs e meio por cento dos pacientes com FC tinham a

concentrao de cloreto no suor inferior a 60 mmol / L e apenas 1,2% tinham o valor

do cloreto inferior a 40 mmol / L17.

As variantes nas quais a AMPc tem reduo na condutncia (classe IV)

foram associadas a uma dimminuio significativa, resultando em concentraes de

cloreto no suor com valores intermedirios. No entanto, pacientes com mutaes

que causam sntese reduzida ou processamento parcialmente defeituoso da

protena CFTR (classe V) apresentaram concentraes de cloreto no suor

semelhantes s das classes I, II e III 9,16, 17,18.

A variao no gene CFTR a causa predominante da variedade das

concentraes de cloreto no suor. Pacientes com FC com mutaes CFTR Classe I-

III, a funo do canal CFTR ausente ou mnima e resulta em insuficincia

pancretica excrina e concentrao elevada de cloreto no suor. A funo CFTR

residual em pacientes com FC com mutaes de Classe IV-VI est associada

suficincia pancretica excrina e nveis de cloreto no suor acima ou abaixo de 60

mmol/ L 102,116.

O custo para a pesquisa de mutaes menos frequentes elevado, por

isso no realizado na rotina. Na literatura constam evidncias cientficas de a idade

56

em que o teste realizado uma considerao importante ao interpretar o valor de

cloreto no suor, que eletrlitos no suor de recm-nascidos saudveis diminuem

gradualmente ao longo das primeiras semanas de vida97, 103,104, 105, que alguns

indivduos sem FC podem ter concentraes de cloreto no suor entre 60 e 80

mmol/L106. Em nosso estudo participaram crianas a partir de 2 meses de idade e

nossa anlise foi pareada por idade.

Ademais, Servidoni et al107 num estudo realizado em 14 centros (9

pblicos e 5 privados) do estado de So Paulo, observaram que no h

uniformidade nas etapas executadas na realizao do teste do suor e nem

seguimento das diretrizes internacionalmente estabelecidas para esse exame. As

principais condies inadequadas encontradas nesses centros foram: coleta de

quantidade insuficiente de suor, a falta de equipamentos para estimulao ou

anlise clnica, ausncia de POP (Procedimento Operacional Padro) e o uso de

equipamentos de medio no certificados e obsoletos.

Na FC a condutncia de sdio tambm alterada, ou seja, a

concentrao de sdio no suor elevada, porque a atividade do ENaC (canal de

Na+) em parte dependente da atividade da CFTR108. Os guidelines no

recomendam o uso de concentrao de sdio do suor para diagnstico de FC. No

entanto, alguns laboratrios usam este valor para fins de controle de qualidade

109,110. Tambm dosamos o sdio e fizemos nosso controle de qualidade.

Apesar do teste do suor ter alta sensibilidade e especificidade, h casos

de em que o esse exame no define o diagnstico, sendo necessrios recursos de

auxlio diagnstico, incluindo a anlise de DNA e exames complementares (i.e.

medida da diferena de potencial nasal, avaliao da funo CFTR em bipsias

retais e evaporimetria)111, 112, 113. Talvez seja essa a categoria que o teste da saliva

poderia ser includo, pois com a sensibilidade de 80,6% e especificidade de 68,1%

no podemos sugerir a dosagem de cloreto na saliva para diagnstico da FC, mas

como mtodo de triagem ou auxlio diagnstico. A ideia do uso da saliva como matriz

biolgica para mtodos de diagnstico existe h muito tempo, e a possibilidade de

novo mtodo usando esse fluido pode ser pertinente e vivel devido facilidade de

coleta da saliva e quantidade de informaes determinantes em seus constituintes 62,

102, 114.

57

Notamos que a saliva coletada no primeiro minuto mais adequada para

a dosagem de cloretos quando comparada saliva 2, devido menor variabilidade.

Recm-nascidos com tripsinognio imunoreativo (TIR) positivo devem ter

o diagnstico confirmado pelo teste do suor. Embora o TIR no seja um teste

diagnstico para a FC, pode conduzir a testes que permitam excluir ou confirmar o

diagnstico9. Crianas com leo meconial podem ter os valores do TIR normal. Tem

sido relatadas dificuldades de coleta de quantidade suficiente de suor em lactentes39,

99.

Eng et al.100, realizaram uma pesquisa envolvendo 103 crianas com FC e

notaram que o valor mdio de cloreto no suor no perodo de 3 a 7 dias de idade era

menor, quando comparado com testes realizados de 8 a 14 dias de idade, em

seguida observou-se que o valor do cloreto no suor foi menor com 6 semanas de

idade, quando comparado com os dois perodos anteriores. Este declnio gradual

nos valores de cloreto no suor sugere que os resultados do teste do suor so mais

confiveis aps 2 semanas de idade.

Os pacientes com FC tambm tm pobre condutncia de sdio, e, assim,

elevada concentrao de sdio no suor, porque a atividade do ENaC (canal de Na+)

em parte dependente da atividade da CFTR 108.

Alm disso, alguns estudos sugerem que a proporo de cloreto e sdio

muitas vezes diferente em pacientes com FC104,115 e, portanto, poderia fornecer

informaes adicionais ao analisar os testes de suor com concentraes de cloreto

com valores intermedirios.

A variao no gene CFTR a causa predominante da variao do cloreto

no suor. Indicam tambm que o teste do suor tem uma importante variabilidade

dentro no mesmo laboratrio de anlise e que as concentraes de cloreto no suor

de um mesmo indivduo, dosadas no mesmo dia variaram em mdia 7,1 mmol / L.

Esse valor semelhante a outras estimativas relatadas (8,5 mmol / L em indivduos

com FC que tiveram pelo menos uma mutao G551D em CFTR) 116. Esta variao

provavelmente no exclusiva dos indivduos com FC, pois os estudos de todos os

pacientes que se submeteram ao teste do suor encontraram variabilidade das

concentraes de cloreto do mesmo indivduo variando entre 8,3 e 20,2%

(coeficiente de variao mdio)102.

58

Traeger et al.117 demonstram que o cloreto do suor diminui em relao ao

primeiro ano de vida e depois, lentamente aumenta com a idade. Por esse motivo,

eles sugerem que o intervalo de referncia do cloreto do suor para diagnstico da

FC deve ser subdividido em grupos.

Mais de 5 dcadas aps o desenvolvimento do teste do suor ainda h

lacunas no nosso conhecimento, incluindo intervalos de referncia para alguns

grupos etrios e estabilidade de amostras de suor. Alm disso, os mtodos

modernos de quantificao da concentrao de cloreto precisam ser explorados

como alternativas aos mtodos analticos originais para a medio de eletrlito no

suor 95.

Crossley118 demonstrou o aumento do tripsinognio imunorreativo, no

sangue, dessa forma contribuindo para a criao de um protocolo para a Triagem

Neonatal para FC, a qual continua se expandindo em todo mundo e a idade ao

diagnstico diminuindo. A dosagem do TIR um teste de triagem e requer um teste

confirmatrio, o Teste do suor. Contudo os valores de referncia estabelecidos como

normais para o TIR no so bem estabelecidos 70, 119.

No estudo de Hammond et al.120 observaram que o cut-off de 70 ng/ml

confere ao teste a sensibilidade em torno de 90% e uma especificidade de 98%. J

na coorte realizada no Brasil121 verificou-se um alto nmero de falso-positivos

primeira dosagem da TIR, o qual reduzido significativamente aps a segunda

dosagem e, mais ainda, aps o teste de suor. No Brasil no h um consenso de qual

o melhor valor a ser estabelecido como cut-off e os valores de sensibilidade,

especificidade, valores preditivos positivo e negativo do teste no podem ser

obtidos, pois no conhecido o nmero de crianas com FC que no foram

identificadas pelo protocolo de triagem.

De acordo com o National Screening Committee122 as caractersticas

necessrias de um programa de triagem so: ser clinicamente, socialmente e

eticamente aceitvel; ser de fcil acesso a todas as classes econmicas; ter baixo

custo e possuir estrutura de suporte que garanta o controle de qualidade.

Caractersticas essas notadas na dosagem de cloreto na saliva pela tcnica do

eletrodo on seletivo direto, contudo novos estudos com casustica maior de anlise

comparativa entre o mtodo da triagem atual e a anlise de saliva, para que

59

possamos verificar a viabilidade da implantao da dosagem do cloreto pela tcnica

do eletrodo on seletivo direto. Como qualquer mtodo de triagem, a TNN acaba

tambm por colocar sob suspeita crianas que, na realidade, so saudveis (falsos-

positivos) 123.

O protocolo atual de TNN para a fibrose cstica prev que 02 dosagens

alteradas de TIR e 02 testes do suor alterados (acima de 60 mEq / L), so

necessrios para a confirmao do diagnstico de Fibrose Cstica. O rastreamento

neonatal para FC tem sido um assunto de discusso e um dilema na comunidade

cientfica dos ltimos 10 anos. O ndice de falsos-positivos pela dosagem de TIR tem

variado 5 a 10%. Resultados falsos-negativos podem estar associados presena

de leo meconial, idade gestacional do recm-nascido, visto que os valores de TIR

tendem a diminuir aps a terceira semana de vida124,125, resultando no diagnstico

de FC em apenas 1 a 2% dos casos 126, 127.

Com o uso da dosagem do cloreto e sdio da saliva pelo equipamento de

gasometria, teremos um novo mtodo de auxlio diagnstico para a FC, com

vantagens de ser de baixo custo (Salivette=R$1,00; Gasometria= R$15,65),

indolor, coleta e anlise em 25 minutos, no invasivo, facilidade de coleta em

qualquer idade, mltiplas amostras podem ser obtidas facilmente, dispensa a

presena do paciente no laboratrio, riscos mnimos de contaminao cruzada,

transporte e armazenagem da amostra, requer menos manipulao durante os

procedimentos de diagnstico em comparao com o teste do suor 50,128,129 que o

tempo de estimulao e coleta duram no mnimo 40 minutos e seu custo de

aproximadamente R$150,00, para paciente at 2 anos de idade38, 130, 131, 132. Se

compararmos a dosagem do tripsinognio imunorreativo (TIR) com a dosagem de

cloreto na saliva pelo equipamento de gasometria, esse ltimo tambm vantajoso

com relao ao tempo de coleta e anlise e o custo do exame, mas necessrio

que se faa um estudo comparando os mtodos.

60

6. CONCLUSO

Os resultados obtidos nesse estudo com as metodologias utilizadas

sugerem uma concordncia nas concentraes de cloreto e sdio da saliva e suor,

ou seja, ambos fluidos tem comportamento fisiologicamente semelhante, sendo

significativamente maiores em pacientes com fibrose cstica em relao aos

controles. Evidenciando a possibilidade do uso da dosagem de cloreto e sdio na

saliva pela tcnica de eletrodo on seletivo direto (equipamento de gasometria) como

um teste de triagem e auxlio diagnstico para a fibrose cstica.

A saliva coletada no primeiro minuto demonstrou menor variabilidade,

quando comparada com a amostra de saliva coletada nos 3 minutos subsequentes.

Comparando os nveis de cloreto na saliva 1 e no suor de homozigotos

e heterozigotos para a variante F508del observamos que a concentrao desse on

maior em homozigotos.

Quando fizemos a anlise de acordo com as classes das variantes

genticas vimos que o subgrupo com uma variante de classe 1 e outra no

identificada a concentrao de cloreto no suor e na saliva 1 e 2 foi maior, seguido do

subgrupo com duas variantes de classe 2.

A concentrao de cloreto na saliva e suor de insuficientes

pancreticos foi maior (sem diferena estatstica significante) do que a concentrao

do mesmo on nos suficientes pancreticos.

61

7.REFERNCIAS

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