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Universidade de Aveiro 2005
Departamento de Cincias da Educao
Alexandre Brito Ribeiro Furtado
Administrao e Gesto da Educao na Guin-Bissau: Incoerncias e Descontinuidades.
Universidade de Aveiro
2005 Departamento de Cincias da Educao
Alexandre Brito Ribeiro Furtado
Administrao e Gesto da Educao na Guin-Bissau: Incoerncias e Descontinuidades.
Dissertao apresentada Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de Doutor em Cincias da Educao, realizada sob a orientao cientfica do Prof. Doutor Jorge Adelino Rodrigues da Costa, Professor Associado da Universidade de Aveiro.
Apoio financeiro da FCT e do FSE no mbito do III Quadro Comunitrio de Apoio.
Dedico este trabalho aos meus filhos Melquades e Anaximandro e minha filha Crislida, companheira nesta aventura no mundo das Cincias da Educao, pela solidariedade e apoio incondicional com que pude contar sempre ao longo da sua preparao.
o jri
presidente: Prof. Doutor Joaquim Jos Borges Gouveia professor catedrtico da Universidade de Aveiro
vogais: Prof. Doutor Jorge Carvalho Arroteia professor catedrtico da Universidade de Aveiro
Prof. Doutor Lus Antnio Pardal professor associado da Universidade de Aveiro
Prof. Doutor Jorge Adelino Rodrigues da Costa professor associado da Universidade de Aveiro
Prof. Doutor Eugnio Adolfo Alves da Silva professor auxiliar da Universidade do Minho
Prof. Doutora Maria Irene de Melo Loureno Fonseca Figueiredo professora adjunta da Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico do Porto
agradecimentos
Embora longo o percurso de uma investigao desta natureza, pode no ser enfadonho se for encarado como uma caminhada acompanhada, com etapas definidas ao longo das quais se permitem pausas, conversas informais amenas, troca de opinies, anlises crticas, orientaes cientficas firmes, esclarecidas, esclarecedoras e encorajadoras. Assim me senti durante estes anos sob a orientao do Professor Jorge Adelino Costa em quem encontrei sempre a mesma disponibilidade e apoio pessoal. Por tudo isso, os meus sinceros agradecimentos. Estendo os agradecimentos a todos os Professores do Departamento de Cincias da Educao que sempre se interessaram pelo bom andamento desta investigao, dispensando-me toda ateno e apoio e Patrcia Castanheira pela sua pacincia e precioso contributo na leitura do trabalho; Aos meus amigos e conterrneos estudantes nesta grande Universidade de Aveiro pela ateno e carinho dispensados; Fundao para a Cincia e Tecnologia pelo apoio financeiro.
palavras-chave
Administrao Educacional; Educao na Guin-Bissau; Sistemas Educativos, Poltica Educativa.
resumo
Este estudo sobre a Administrao e Gesto da Educao na Guin-Bissau pretende no s oferecer uma viso global e histrica sobre as medidas, em matria de poltica e administrao da educao, adoptadas e implementadas no pas, ao longo de vrias dcadas, mas tambm proceder a um inventrio crtico das suas consequncias, identificar os principais pontos de estrangulamento com que se debate hoje a poltica, o sistema e a administrao da educao e apontar algumas pistas que possam levar a ultrapass-los, na perspectiva de uma viso global e integrada. As principais concluses a que chegamos levam-nos a referir que, ao longo das ltimas dcadas, a poltica e a administrao da educao na Guin-Bissau estiveram dependentes de constrangimentos e instabilidades institucionais e scio-polticas internas, bem como de orientaes, condicionalismos e exigncias impostas do exterior.
keywords
Educational Administration; Education in Guinea-Bissau; Educational Systems; Educational Policy.
abstract
This research on the Administration and Management of Education in Guinea-Bissau intends not only to offer a global and historical view of the measures regarding the educational policy and administration which were adopted and enforced in the country throughout decades, but also to proceed with a critical inventory of its consequences, to identify the main obstacles that the policy, the system and the educational administration face today and to point out some clues that can help overcoming them, in the perspective of a global and integrated view. The main conclusions that we have come across lead us to mention that, throughout the last decades, the educational policy and administration in Guinea-Bissau have been dependant on internal constraints and social-political institutional instabilities, as well as on externally imposed orientations, conditional issues and demands.
SIGLRIO
AIF-PALOP Associao Internacional para a Formao em frica Pases de Africamos de Lngua Oficial Portuguesa
ALTERNAG Associao Guineense para Estudos e Alternativas ASDI Ajuda Sueca para o Desenvolvimento Internacional BAD Banco Africano para o Desenvolvimento CCA Country, Common Assessment CDEAO Comunidade Econmica dos Estados da frica Ocidental CEEN Comissariado de Estado da Educao Nacional CEENC Comissariado de Estado da Educao Nacional e Cultura CEFC/EU Centro Experimental de Formao Comunitria/Unio Europeia CENFA Centro de Formao Administrativa CESO-CECI Consultores Internacionais, CRL COFORPALOP Cooperao para a Formao de Formadores em Planificao da Educao para os Pases de Lngua Oficial Portuguesa. DANIDA Agncia Dinamarquesa para Desenvolvimento Internacional DENARP Documento de Estratgia Nacional de Alvio e Reduo da Pobreza DRE Direco Regional de Educao EB Ensino Bsico EBE Ensino Bsico Elementar EBC Ensino Bsico Complementar FCFA Franco da Comunidade Financeira Africana FNUAP Fundo das Naes Unidas para a Populao GEP Gabinete de Estatstica e Planeamento (Ministrio da Educao Nacional) HIPIC Iniciativa para os Pases Pobres Altamente Endividados ILAP Inqurito Ligeiro para Avaliao da Pobreza INDE Instituto Nacional para o Desenvolvimento da Educao
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa IRI/PALOP Educao Interactiva pela Rdio para os Pases de Lngua Oficial Portuguesa JICA Agncia Japonesa para a Cooperao Internacional MEN Ministrio da Educao Nacional MPO Plano Quadro das Operaes PAE Programa de Ajustamento Estrutural PRODEC Projecto de Desenvolvimento do Ensino Comunitrio PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento SNV Servio Holands para a Cooperao e Desenvolvimento UEMOA Unio Econmica e Monetria Oeste UMOA Unio Monetria Oeste Africana UNHCR Alto Comissrio das Naes Unidas para os Refugiados SAID Agncia dos Estado Unidos para Desenvolvimento Internacional VSO Servios dos Voluntrios Britnicos
NDICE GERAL
INTRODUO 1
1.Contextualizao 1
2.Objecto e objectivos do estudo 6
3. Metodologia 11
3.1. Instrumento enquadrador de anlise 18
3.2. Apresentao do quadro conceptual 18
4. Organizao da tese 29
I PARTE EDUCAO, POLTICA EDUCATIVA, SISTEMAS EDUCATIVOS, ADMINISTRAO DA EDUCAO
CAPTULO I EDUCAO, POLTICA EDUCATIVA E SISTEMA EDUCATIVO 33
1. Educao Hoje 33
1.1. Educao em frica 37
1.2. Programas de ajustamento estrutural 40
1.3. Os principais problemas da educao em frica 41
1.4. As instituies educativas 48
1.4.1. A famlia 49
1.4.2. Escola como instituio educativa 54
1.5. Instituies educativas no formais 58
2. Polticas Educativas nos nossos dias 61
2.1. Conceito da poltica e poltica educativa 61
2.2. Contedos da poltica educativa 64
2.3. Agentes da educao e poltica educativa 65
3. Sistema educativo 68
3.1. Sistema educativo e a teoria geral dos sistemas 69
3.2. Caractersticas essenciais de um sistema e de uma organizao 69
3.3 Sistema educativo e organizao escolar 72
3.4. O funcionamento do sistema educativo e seus componentes 73
3.5. Organizao e orientao dos sistemas educativos 79
3.5.1. O direito educao 80
3.5.2. Respeito pelas diversidades 83
3.5.3. Participao social no sistema educativo 85
3.6. Tipologia dos sistemas educativos 94
CAPTULO II ADMINISTRAO GERAL E ADMINISTRAO DA EDUCAO 99
1. Administrao geral 99
1.1 Conceito e caracterizao geral da administrao 99
1.2 Evoluo da administrao geral 101
1.2.1. Administrao luz das exigncias contemporneas 105
2. Administrao da Educao 107
2.1 Evoluo da administrao educativa como organizao 109
2.2 Administrao como processo: funes da administrao 115
2.3 Nveis de administrao da educao 120
2.3.1. Nvel Estado/Nao 120
2.3.2. Nvel Governo/Poder Executivo 120
2.3.3. Nvel Regional/Local 124
2.3.4. Os estabelecimentos de ensino 124
3. Problemas e perspectivas da Administrao da Educao 127
3.1 Problemas actuais 127
3.1.1. Centralizao e descentralizao da administrao da educao 129
3.1.2. Algumas prioridades em matria de descentralizao da educao 135
3.1.3. Regulao da educao 137
3.2. Adequao e modernizao da administrao da educao 138
CAPTULO III DOMNIOS DA ADMINISTRAO DA EDUCAO 145
1. Planeamento da educao 146
1.1. Conceito 146
1.2. Objectivos do planeamento 147
1.3. Evoluo do planeamento da educao 148
1.4. O processo de planeamento 152
1.5. Mtodos tradicionais de planeamento 159
1.6. Novas vises no planeamento da educao 164
1.7. Novos mtodos de planeamento 165
2. Recursos Humanos 169
2.1. Tratamento administrativo dos recursos humanos 171
2.2. Funes e processos da administrao dos recursos humanos 172
2.2.1. Previso dos recursos humanos 172
2.2.2. Seleco e recrutamento dos recursos humanos 174
2.2.3. Desenvolvimento dos recursos humanos 175
3. Gesto dos recursos financeiros 180
3.1. Afectao dos recursos pblicos 180
3.2. Fontes de financiamento 182
4. Gesto dos recursos fsicos 186
4.1. Espaos para construo escolar 187
4.2. Edifcio escolares 188
4.3. Equipamento escolar 191
5. Organizao e Administrao Escolar 193
5.1. Evoluo, conceito e funes 193
5.2. rgo de administrao das escolas 197
5.3. Documentos de uma escola 202
6. Inspeco e superviso do sistema de educao 204
7. Legislao educativa 208
II PARTE ANLISE DA SITUAO DA ADMINISTRAO DA EDUCAO NA GUIN-BISSAU CAPTULO IV CARACTERIZAO GERAL DO PAS 213
1. Factores geogrficos 213
2. Populao 214
3. Situao scio-cultural 218
4. Organizao administrativa do pas 220
5. Contexto histrico e poltico 222
6. Contexto econmico 232
6.1. As potencialidades econmicas do pas 232
6.2. Evoluo do sector da economia 236
CAPTULO V EDUCAO NA PROVNCIA DA GUIN DURANTE O PERODO DE 1940-1974 247
1.Caracterizao do ensino colonial 247
1.1 Organizao da instruo pblica na Guin 247
1.1.1. Ensino indgena nas Provncias Ultramarinas de Angola, Guin e Moambique 255
1.1.2. Ensino rudimentar para indgenas 257
1.1.3. Ensino de adaptao 266
1.2 Ensino secundrio 267
2. Reformas dos anos sessenta e setenta 271
2.1. Contexto poltico na Provncia da Guin nos anos sessenta 273
2.2 As reformas no sector do ensino 272
2.3. Reorientao do ensino ensino agrcola 274
3. Situao do ensino nas vsperas da independncia 280
3.1. Educao no quadro da poltica Por uma Guin Melhor 280
3.2. Principais reformas educativas 283
4. Organizao do sistema de ensino colonial nos anos setenta 289
4.1. Seco Infantil 289
4.2. Ensino primrio elementar 289
4.3. Ciclo preparatrio do ensino secundrio 293
4.4. Ensino secundrio 293
4.5. Ensino superior 298
5. Gesto e administrao escolar 399
6. Educao nas reas libertadas entre 1965 e 1974 314
6.1. Tipologia das escolas das zonas libertadas 315
6.2 Coordenao geral da educao 321
6.3. Programas e contedos do ensino 322
6.4. Um sistema escolar coerente e dinmico 323
CAPTULO VI AS TMIDAS TENTATIVAS DE REFORMA DE 1974-1980 325
1. Contexto poltico, econmico e social 325
1.1. Contexto econmico 327
1.2. As heranas no sector da educao 328
1.2.1. O projecto educativo colonial herdado 329
1.2.2. O sistema escolar das Zonas Libertadas 331
2. Nova concepo do desenvolvimento 332
2.1 A primeira opo no mbito da poltica educativa 334
2.2. Confrontao entre sistemas educativas 336
2.3. Principais medidas polticas 341
2.3.1. Democratizao/ massificao do ensino/exploso escolar 341
2.3.2. O retorno s medidas restritivas e discriminao 345
2.3.3. Campanha nacional de alfabetizao 350
3. Reformas globais ao nvel do sistema educativo 355
3.1. Elementos para uma nova poltica educativa 355
3.2. Reformas efectivas 360
3.2.1. Reformas ao nvel do ensino bsico 360
3.2.2. Reformas ao nvel do ensino secundrio 363
3.2.3. Reformas curriculares 367
3.2.4. Organizao, formao e enquadramento do pessoal docente 370
3.2.5. Desenvolvimento das aces de formao 377
3.2.6. Outras aces de formao de recursos educativos 390
3.3. Avaliao do Sistema 391
4. Organizao da Administrao da Educao 393
5. Principais limitaes na definio e implementao das polticas adoptadas durante o
perodo 400
CAPTULO VII PERODO 1981 A 1987 PROJECTOS DE REFORMA GLOBAL DO SISTEMA EDUCATIVO 419
1. Contexto poltico, econmico e social 415
2. Poltica educativa e seu contexto 420
3. Os trs grandes projectos de reforma global do sistema educativo 422
3.1. Sistema Nacional de Educao e Formao (SNEF) 422
3.2. Caracterizao geral do sistema educativo vigente 423
3.3.Bases do Sistema Nacional de Educao e Formao (SNEF) 427
3.3.1.Estrutura do SNEF 428
3.3.2. Formao de professores e pessoal doente 431
3.3.3. Instituies do SNEF 432
3.3.4. As limitaes do SNEF 433
4. A primeira anlise do sector da educao 435
4.1. Os principais estrangulamentos do sistema educativo 435
4.2. As prioridades e estratgias para o sector numa perspectiva de mdio prazo 439
5. Principais aces para a melhoria do ensino 441
5.1. Contrato de Crdito de Desenvolvimento 441
5.2. Estratgia para o Desenvolvimento da Educao na Guin-Bissau 449
5.2.1. Implementao da Estratgia: o Plano de Mdio Prazo 455
5.2.2.Quantificao do Plano de Mdio Prazo 462
5.2.3. As principais limitaes da Estratgia para o Desenvolvimento da Educao
e do Plano de Mdio Prazo 465
6. Plano Quadro Nacional: Educao para o Desenvolvimento Humano na Guin-Bissau 471
6.1. Estrutura do Plano Quadro 472
6.1.1. Planificao e implementao do Plano Quadro 473
6.1.2. Metas 474
6.1.3. Superviso e seguimento 475
6.1.4. Condies prvias 476
6.1.5 Custos 477
6.2. Potencialidades e limitaes do Plano Quadro Nacional 478
CAPTULO VIII A EDUCAO DE 1998 AOS DIAS DE HOJE 483
1. Contexto poltico e econmico 483
1.1. Economia 484
1.2. Administrao 485
2. Sector da educao 486
2.1 Programa do Governo de Coligao PRS/RGB de Base Alargada
e do Governo PRS de Consenso Nacional 490
2.2. Declarao Poltica Educativa e Plano de Aco e Orientaes Gerais 492
2.3 A gratuitidade do ensino bsico 494
3. A dualidade na administrao dos projectos educativos:
Unidade de Coordenao de Projectos/ Projecto PAEB/Firkidja 497
3.1. O Banco Mundial e o Projecto de Apoio Educao Bsica Firkidja 499
3.1.1. Programas de formao em exerccio: da estratgia global formao condensada 500
3.1.2. Programa da Unificao do Ensino Bsico (EBU) 524
3.1.3. Programa de Parceria 542
4. O Plano Nacional de Educao para Todos 548
CAPTULO IX SITUAO ACTUAL DO SISTEMA E DA ADMINISTRAO EDUCATIVA 551 1.Sistema educativo no contexto educativo actual 551
1.1. Estrutura actual do sistema educativo 556
1.1.1. A educao pr-escolar 556
1.1.2. Educao Escolar 566
1.1.3. A Educao extra-escolar 581
1.2. Sector privado 582
1.2.1. As escolas privadas 583
1.2.2. Escolas madrassas 586
1.2.3. Escolas comunitrias 586
1.2.4. Escolas populares 595
1.2.5. As Escolas em autogesto 598
2. Administrao do sistema educativo 603
2.1 Nvel central 603
2.2. Nvel Regional 609
2.2.1. Direces Regionais de Educao 609
2.2.2. Situao actual das Direces Regionais de Educao 613
2.2.3. Principais problemas estrangulamentos ao nvel das Direces Regionais da Educao 625
3. Administrao e gesto escolar 627
3.1. Infraestruturas escolares 630
3.2. Condies de aprendizagem dos alunos 640
3.3. A Condio dos docentes 641
3.4. Estatsticas 645
3.5. Legislao 650
3.6. Inspeco do sistema educativo 651
3.7. Investigao em educao 652
3.8. Administrao e Gesto dos Recursos Financeiros 655
CONCLUSO 661
1. Comentrio preliminar 661
2. Poltica educativa 666
3. Sistema educativo 674
BIBLIOGRAFIA 681
INTRODUO
1. Contextualizao
As minhas experincias na educao foram iniciadas ainda antes da independncia
nacional, celebrada em 1974, como primeiro professor e director guineense da Escola
Preparatria de Bafat, hoje Liceu Regional de Bafat. Depois da independncia exerci as
funes de tcnico e Director do GEOP (Gabinete de Estudos e Orientao Pedaggica) do
ento Comissariado da Educao Nacional; no incio dos anos 90 tive o privilgio de ser
nomeado Ministro da Educao e, no final da dcada noventa, aps ter abandonado
voluntariamente o cargo de ministro, por graves indefinies no processo de transio para
a democracia pluripartidria, assumi o cargo de Consultor da UNICEF e, depois, de
Administrador do primeiro Programa de Educao UNICEF Governo da Guin-Bissau.
O exerccio dessas funes criou-me oportunidades mpares, em diversos momentos e a
partir de diferentes ngulos, para lidar de perto com as questes relacionadas com a
Organizao e Administrao da Educao na Guin-Bissau. Neste sentido, observei e
segui a evoluo das polticas desenvolvidas com vista a construir e implantar um novo
sistema educativo, num jovem pas, emergente de uma longa luta contra a presena
colonial que teve como consequncias imediatas uma complexa situao social, econmica
e poltica.
Durante os vrios sculos de presena e dcadas de dominao colonial, a grande
maioria dos guineenses, os indgenas, encontrava-se fora do sistema educativo (e sem
direito a ele). Uns poucos eram entregues educao missionria e apenas uma minoria, os
civilizados, tinha o privilgio de aceder instruo. Aps a independncia, em 1974, o pas
encontrou-se, de repente, perante um gigantesco dilema: i) construir um novo sistema
educativo para um novo contexto social, orientado para objectivos genunos, decorrentes
dos novos ideais poltico-ideolgicos forjados durante a luta da libertao nacional,
enfrentando limitaes em termos de experincia, de recursos humanos qualificados, de
infra-estruturas, de meios financeiros, embora contando com a manifesta solidariedade da
comunidade internacional, dos pases e organizaes amigas ou; ii) prosseguir com um
sistema educativo herdado, estranho, construdo na ptica da dominao colonial,
1
altamente discriminatrio e selectivo, introduzindo nele modificaes pontuais para fazer
face inevitvel exploso escolar, enquanto se construa paralelamente o novo sistema.
Perante a precariedade da situao e as fortes presses polticas e sociais (prprias
dos legtimos sentimentos alimentados pela euforia da independncia), os dirigentes
polticos/governantes, inexperientes, mas fortemente motivados e decididos do ponto de
vista poltico, enveredaram por medidas polticas que favoreceram a manuteno do velho
sistema, mas com um forte compromisso poltico de introduzir, gradualmente, algumas
reformas pontuais para no paralisar as escolas e de preparar, quanto antes, um novo
projecto educativo. Porm, essas decises no foram baseadas num profundo
conhecimento da complexa situao herdada, na sequncia das polticas populistas
coloniais dos ltimos momentos de governao, nem foram enquadradas numa perspectiva
de reformas mais vastas visando o desenvolvimento da nova educao.
Ao longo dos anos, as tentativas de reforma passaram por vrias fases sem que
nenhuma tivesse sido concluda e avaliada, como se ver mais adiante. Houve mudanas
polticas significativas com a passagem da situao de um partido nico para o pluralismo
poltico, implantou-se um Estado de Direito, ocorreu uma maior reivindicao por parte da
sociedade civil representada por organizaes polticas, sociais e culturais ao direito de
participao nas discusses e nas tomadas de deciso sobre todos os assuntos da vida
nacional, porm, o sector da educao manteve-se indiferente perante tudo isto.
Em consequncia, a precariedade da situao herdada foi-se agravando com as
deficincias que se foram acumulando e que se transformaram em obstculos estruturais.
Vrios factores contriburam para esta situao: i) as profundas crises econmicas,
impostas por factores internos e pela conjuntura internacional; ii) as constantes convulses
e instabilidade polticas que atingiram o nvel de confrontaes e de conflitos armados; iii)
a fuga para o exterior dos melhores quadros e o consequente dficit em termos de recursos
humanos qualificados, tanto para a docncia como para a administrao; iv) a degradao
das infraestruturas educativas sob o enorme peso da procura social da educao e a rigidez
das medidas de estabilizao econmica; v) as fracas medidas de expanso da rede e do
sistema; vi) e, como corolrio, o divrcio do sistema educativo face s realidades sociais e
s necessidades de desenvolvimento do pas.
2
Apesar das fortes crticas endereadas ao sistema colonial, a poltica educativa e a
poltica geral do pas no conseguiram criar as condies favorveis construo do novo
sistema nacional de ensino, nem alterar a lgica colonial global do sistema educativo
herdado. No foi possvel adoptar outra atitude nas reflexes sobre o novo sistema
educativo que ultrapassasse o quadro das crticas ao modelo colonial e originasse novos
conceitos e sobretudo novas formas de operacionalizao. O ensino mantm-se selectivo,
sendo privilgio das grandes cidades, principalmente da capital; o ensino liceal continua
constituindo, como outrora, a via nica de escolarizao; e a formao tcnica e
profissional cada vez menos relevante do ponto de vista social e econmico.
A situao, em matria de educao e formao pode ser assim resumida: a) uma
poltica educativa desajustada em relao s dimenses social, poltica, econmica e
cultural do pas; b) um sistema educativo estranho realidade e aos anseios do pas, com
fortes resqucios do passado; c) uma escola ainda mal compreendida e com dificuldades de
integrao na comunidade; d) uma administrao educativa centralizada, altamente
burocrtica, inadequada e obsoleta.
Sem desculpabilizar as autoridades e as contingncias conjunturais de ento, no
seria exagero afirmar que parte da situao hoje vivida na educao pode ser atribuda a
especialistas dos mais diferentes quadrantes, que intervieram no pas na primeira dcada
aps a independncia, em misses geralmente curtas e limitadas apenas capital.
Desconhecedores da realidade guineense, trouxeram para o pas esquemas no testados
para a soluo dos problemas com que se confrontavam os sistemas educativos dos seus
prprios pases de origem.
Mas, apesar de tudo isso, a sociedade guineense (e as mltiplas iniciativas
comprovam-no) sempre se esforou (e continua a faz-lo) por assimilar e incorporar as
novas tecnologias e os avanos cientficos nas suas iniciativas de desenvolvimento, embora
na maioria dos casos de uma forma pouco coerente e descontnua; o Estado guineense no
deixou de ser parte integrante da comunidade das naes, da sociedade moderna, em plena
expanso; no perdeu o direito de aspirar a uma administrao eficaz e racional, capaz de
lhe permitir enfrentar a complexidade das tarefas que lhe so hoje impostas, de promover
mudanas e de desempenhar um papel determinante na economia, pois, indiscutvel que
hoje, citando Gmez e Jimnez uma das caractersticas mais importantes de um Estado
3
moderno possuir uma administrao pblica, estruturada, formalizada, eficaz, capaz de
contribuir para o cumprimento dos seus objectivos, para a satisfao das necessidades e
expectativas sociais (1992: 17).
Reverter esta situao uma tarefa que dever reunir um consenso nacional e a
conscincia generalizada de se tratar de uma tarefa rdua, um percurso difcil e longo que
exigir muitos meios, muita persistncia e estabilidade, para ultrapassar de forma gradual
uma srie de obstculos que entretanto se foram agigantando sob o peso do enorme fardo
da dvida externa, da instabilidade poltica, do elevado ndice de pobreza, da carncia de
recursos humanos especializados e de infra-estruturas.
Porm, o que tem faltado a convico forte de que ainda possvel encarar e
tratar de forma realista, adequada e programada esses obstculos que impedem o
desenvolvimento global do pas, em especial do sector educativo; que existem vias para
proporcionar o acesso a uma educao de qualidade a todos os guineenses (segundo a
Constituio), desde que as futuras medidas, construdas como resultado de reflexes e
alargados consensos nacionais, contem com um clima de estabilidade poltica e de paz e se
fundem num conhecimento profundo das realidades sociais, culturais, polticas e
econmicas guineenses, nas suas prioridades e na dinmica da globalizao.
Sendo a Administrao da Educao parte efectiva da administrao pblica e porta
de entrada para qualquer inovao que se pretenda introduzir no sistema educativo
(Combs, 1968), evidente que sem uma estruturao a esse nvel, sem a adequao da
administrao geral s reais necessidades e anseios da sociedade guineense, os projectos
educativos correro o risco de permanecerem socialmente irrelevantes, isolados,
descontextualizados e de continuarem a ser os maiores consumidores dos fracos recursos
disponveis.
Se a educao e a formao so na actualidade ferramentas indispensveis para a
sobrevivncia e desenvolvimento das naes, torna-se ento urgente reunir foras e
competncias para definir e fazer funcionar uma administrao compatvel que contribua
eficazmente para o pleno alcance dos objectivos educacionais.
4
no contexto acabado de traar que se deve entender e interpretar a minha
preferncia pelo tema Administrao da Educao na Guin-Bissau, enquanto subsistema
da administrao geral do pas.
5
2. Objecto e objectivos do estudo
Partindo do estudo dos principais momentos da evoluo da Administrao da
Educao na Guin-Bissau, de 1940 ao ano 2000, o objecto principal deste trabalho
consiste em identificar a desarticulao e as incoerncias das medidas administrativas
adoptadas ao longo desses anos de modo a se poderem encontrar algumas estratgias de
adaptao e revitalizao da Administrao da Educao, tomada no seu sentido lato.
Concordando com alguns autores, designadamente com Garcia Hoz (1986), para a
definio do conceito Administrao da Educao no contexto deste trabalho, parti de uma
viso macro e instrumental da organizao da educao que inclui um sistema de
elementos e factores reais (pessoas, grupos, estruturas, poltica, procedimentos, mtodos)
que viabilizam a aco educativa num pas. Esta viso ampla incluir a Poltica Educativa,
o Sistema Educativo e a Administrao da Educao e os seus respectivos componentes.
Nessa linha de orientao, a Administrao da Educao dever ser entendida como
um servio pblico, um subsistema da administrao geral do pas ao servio da poltica
educativa que funcionar em estreita relao com outros subsistemas, responsvel pelas
aces ao nvel da macroestrutura da organizao da educao. A Administrao da
Educao visar, nomeadamente, i) a previso das necessidades educativas; ii) a
distribuio racional de recursos disponveis e da oferta educativa; iii) a concretizao das
linhas polticas educativas; iv) a coordenao e controlo das aces pblicas e privadas; v)
a planificao dos graus, contedos e nveis de ensino; vi) a promoo de aces que
contribuam para a melhoria do ensino e do sistema educativo. O conceito abranger
tambm os subsistemas da Organizao e Administrao Escolar, responsveis pelas
intervenes de carcter tcnico-pedaggico e organizativo de nvel interno, bem como
pelas relaes externas da escola com o seu meio ambiente.
A evoluo da Administrao da Educao ser abordada, nesta perspectiva, do
ponto de vista das polticas educativas que representou e representa (incluindo as reformas)
e dos modos de organizao do sistema educativo que lhe serviram de suporte.
6
Assim, o trabalho ser desenvolvido a partir de trs eixos fundamentais: A Poltica
Educativa, o Sistema Educativo e a Administrao Educativa e seus principais domnios
(instrumentos): Planificao da Educao; Recursos Humanos; Recursos Fsicos; Recursos
Financeiros; Administrao Escolar; Superviso do Sistema Educativo; Legislao.
Para o desenvolvimento geral desta investigao parte-se de algumas hipteses
explicativas construdas a partir de elementos internos e externos administrao.
Factores internos
Na Guin-Bissau, as carncias que se fazem sentir na rea da educao, e no s,
foram geradas pela fragilidade, inadequao e ineficcia dos modos de organizao e das
estruturas adoptadas que se foram deteriorando ao longo dos anos com medidas
incoerentes tomadas de forma isolada e descontextualizada das realidades social,
econmica, poltica e cultural. Essas carncias foram tambm em muitos momentos
originadas pela ausncia de medidas ou pela sua tomada tardia.
O desconhecimento da real dimenso dos problemas educativos herdados e a falta
de perspectivas de aco constituem uma das causas bsicas da actual ineficcia da
organizao da educao, do sistema educativo e das estruturas de administrao do
sistema educativo e da Administrao da Educao.
Verifica-se a ausncia de uma administrao assente na realidade educacional
nacional, capaz de fazer uma anlise correcta da situao, de preparar alternativas polticas
realistas e exequveis, de tomar decises correctas e oportunas, de planificar as aces
educativas, de coordenar a sua execuo, de avaliar os seus resultados e de garantir a
continuidade e a coerncia das aces, com a constante mobilizao, actualizao e reforo
dos recursos necessrios.
As reformas educativas ensaiadas nunca tiveram sucessos por terem sido adoptadas
medidas polticas sem o mnimo de garantias, fundadas apenas em simples intenes
polticas ou em presses polticas internas ou externas, exercidas por instituies
financiadoras que hoje se afirmam como actores influentes capazes de modificar as
polticas internas de muitos pases, sobretudo pobres.
7
Na grande maioria dos casos, as decises polticas, em matria de educao, foram
tomadas e implementadas sem informar, ouvir ou proporcionar a participao dos
principais actores do processo ensino-aprendizagem (alunos, pais e professores); sem
projectar as necessidades em recursos humanos, materiais e financeiros; sem avaliar a
capacidade de administrao e gesto do sistema educativo e sem ponderar as suas
consequncias, a mdio e longo prazo. Muitas decises foram tomadas de forma isolada
sem a contribuio ou colaborao de tcnicos, uma atitude que inibiu muitas iniciativas
dos poucos tcnicos que passaram pelo sector da educao e alimentou um clima
imprprio para a educao que, enquanto projecto social, devia, pelo contrrio, mobilizar
todas as capacidades.
Este cenrio, que ainda se repete (e com muita frequncia) e que tem acarretado
graves consequncias para a educao, exige hoje mudanas de atitudes e a criao de
condies para que as decises possam ser preparadas e tomadas num clima de
colaborao efectiva entre os polticos, os administradores e os principais actores da
educao, para que a sua execuo posterior tenha partida a legitimidade e a garantia
necessrias.
Uma nova atitude, aberta colaborao entre instituies, poderia evitar que erros
polticos, visveis s a mdio e longo prazo, acarretem consequncias de natureza social,
econmica, poltica, material e financeira irreparveis. Pode, por outro lado, contribuir para
uma preparao mais consciente de solues realistas para os problemas que impedem o
desenvolvimento dos sistemas educativos e que tenham em conta as reais possibilidades e
potencialidades do pas, designadamente em termos de recursos humanos e financeiros.
evidente que na preparao das solues sempre possvel integrar elementos vlidos de
outras realidades e experincias exteriores, mas o que deve ser evitado a importao e
adopo mecnica de solues de outros contextos, apenas porque tiveram sucesso nesses
mesmos contextos.
8
Factores externos
Com a criao do Estado da Guin-Bissau em 1973 e com a independncia
conquistada em 1974 impunha-se a obrigao de construir e implantar um novo sistema de
educao e formao para o conjunto do territrio nacional. Por outro lado, os
compromissos assumidos tanto ao nvel regional e sub regional, quanto ao nvel
internacional, tornaram essa obrigao ainda mais premente.
A fragilidade das instituies nacionais, a falta de quadros especializados e as
dificuldades econmicas favoreceram o desenvolvimento de uma cega confiana nas
propostas de solues, por vezes discordantes com a realidade do pas, impostas por
tcnicos estrangeiros oriundos dos mais diversos pases. Como resultado das inmeras
misses, existe uma abundante variedade de documentos produzidos, ao longo de todos
esses anos, sobre a educao na Guin-Bissau, nos quais se vislumbram conceitos, teorias e
modelos que visam a melhoria, a racionalidade e a eficcia da administrao educativa.
So decalcados, por vezes, de outras realidades que - no obstante serem por si s
incapazes de produzirem as verdadeiras mudanas desejadas no contexto de um pas onde
se punha e se pe o problema da criao de alicerces para um novo sistema - contm
alguns elementos aproveitveis. Representam, na sua generalidade, estudos, reflexes,
projectos, elementos isolados da poltica educativa, da administrao escolar e educativa,
que, todavia, nem sempre foram conhecidos e divulgados no pas.
A hegemonia de um partido nico e o sistema Partido/Estado, que governou o pas
durante mais de vinte anos, colocaram as questes educativas nas mos dos polticos e
minaram a confiana dos tcnicos que, desmotivados e mal enquadrados, se viram
obrigados a procurar outros pases, outras profisses menos absorventes e mais rentveis.
A instabilidade poltica, as confrontaes, os conflitos armados e um quase
permanente clima de desconfiana geraram, ao longo dos anos, as mais adversas condies
para a construo e monitorizao de um sistema educativo que s podia vingar em
situao de um projecto nacional, de um servio pblico a longo prazo.
No menos desfavorveis foram e continuam a ser as elevadas taxas de
analfabetismo, principalmente ao nvel rural e no respeitante s mulheres; as crnicas
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carncias em recursos humanos e materiais, factores que arrastaram consigo, durante
dcadas, as baixas taxas de escolarizao e as elevadas taxas de abandono e insucesso
escolar e a pobreza que entretanto se foi alastrando pelo pas, afectando uma percentagem
cada vez maior da populao do pas.
Objectivos do estudo
Qualquer investigao cientfica visa descobrir, compreender, explicar e, em
ltimo caso, transformar a realidade. Nessa linha de pensamento, pretende-se com este
trabalho:
a. Produzir informaes que permitam compreender o contexto educativo guineense e
identificar a desarticulao e incoerncias das medidas administrativas adoptadas
ao longo dos anos e propor estratgias visando adaptar e revitalizar a administrao
da educao;
b. Organizar um corpo de conhecimentos sobre a administrao da educao e
contribuir, deste modo, para a percepo de uma administrao educativa que
funcione como um instrumento integrador, catalisador, dotado de uma viso global
dos objectivos da educao, capaz de planificar, organizar, coordenar, dirigir e
controlar todos os elementos que a integram e de orientar as suas actividades para o
cumprimento desses mesmos objectivos;
c. Abrir horizontes para novas investigaes, de modo especial aquelas que se situem
na anlise da educao na Guin-Bissau e que possam contribuir para a sua
melhoria sustentada.
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3. Metodologia
A natureza do objecto de investigao e as questes que dela decorrem
condicionam a opo metodolgica. O conceito metodologia1, carregado de significados e,
portanto, sujeito a interpretaes ambguas, utilizado aqui como a forma de realizar a
investigao, o modo de abordar os problemas e de procurar as respostas, os pressupostos e
princpios que regem uma investigao (Arnal, Rincn e Latorre, 1992: 17).
Mais do que construir um corpo organizado de conhecimentos tericos e explicar os
fenmenos educativos, a investigao educativa chamada hoje a analisar questes
concretas e a contribuir para a soluo dos problemas que emergem do contexto
educacional. A educao tornou-se um fenmeno complexo, dinmico e interactivo, com
dimenses morais, ticas e polticas e influenciado por uma multiplicidade de factores.
Como tal, a sua investigao levanta problemas de grande complexidade, por vezes difceis
de resolver.
Um destes problemas de natureza epistemolgica, por no dispor de instrumentos
especficos para o seu estudo e por ser difcil estabelecer uma separao entre o
investigador e o seu objecto de investigao a educao do qual faz parte. Depois de
muitas discusses, em termos de paradigmas de investigao a utilizar na educao, parece
ter-se chegado a trs paradigmas2 definidos e adoptados por vrios autores entre eles
Bredo e Feinberg (1982), Koetting (1984), Guba (1985), Morin (1985), De Miguel (1988),
citados por Arnal, Rincn e Latore (1992: 41) como referncias gerais, ultrapassando a
tradicional dicotomia quantitativo e qualitativo: o paradigma positivista, interpretativo e
scio-crtico.
1 O termo metodologia pode ainda, na lgica do processo de investigao e de acordo com Goyette (1984) significar um conjunto de operaes conscientes, sistematizadas, inscritas no tempo, visando alcanar os objectivos fixados. Na lgica de mtodos, pode, no seu sentido restrito, significar o estudo, descrio e justificao de mtodos (Asti Vera, 1972). 2 O paradigma um esquema terico, ou uma via de percepo e compreenso do mundo, adoptado por um grupo de cientistas. Cada comunidade cientfica participa de um mesmo paradigma, constituindo assim uma comunidade intelectual cujos membros tm em comum uma linguagem, valores, metas, normas e crenas (Fernndez Das: 1985), implicando uma metodologia determinada.
11
1) Para os defensores do paradigma positivista, de entre eles os clssicos, Comte e
Durkheim, o objectivo da investigao na educao descobrir as leis que regem o
fenmeno educativo.
2) luz do paradigma interpretativo (tambm denominado qualitativo,
fenomenolgico, naturalista, humanista ou etnogrfico), defendido por Erickson
(1986) o acento posto no estudo dos significados das aces humanas e da vida
social, nas noes de compreenso, significado e aco. A tnica colocada mais
na descrio e compreenso daquilo que particular no sujeito e no no que
generalizvel. A realidade educativa compreendida e interpretada a partir do
significado das pessoas implicadas nos contextos educativos e das suas crenas,
intenes, motivaes e de outras caractersticas no observveis, nem
experimentveis na educao.
3) O paradigma scio-crtico, defendido por Foster (1980), resulta da reaco ao
reducionismo dos positivistas e ao conservadorismo dos interpretacionistas,
admitindo uma cincia social que no seja puramente emprica ou apenas
interpretativa. Do ponto de vista ideolgico, visa a transformao da estrutura das
relaes sociais e dar respostas a determinados problemas. Baseia-se em princpios
como: i) conhecer e compreender a realidade como praxis; ii) procurar a unidade
teoria e prtica, conhecimentos, aces e valores; iii) orientar o conhecimento para
emancipar e libertar o homem e iv) implicar o docente a partir da auto-reflexo
(Popkewitz, 1997).
Um outro problema est relacionado com a multiplicidade de formas de
classificao da investigao em educao, j que ela pode ser classificada segundo vrios
critrios relacionados, designadamente, com a sua finalidade, alcance temporal, enfoque,
concepo sobre a educao e orientao.
As limitaes da investigao em educao constituem uma terceira categoria de
problemas. Essas limitaes so impostas pela complexidade e pelas mudanas constantes
do fenmeno educativo influencivel por vrios factores que podem ser de natureza
ambiental; impostos pelas condies scio-polticas, culturais e econmicas; de ordem
tcnica (dada a dificuldade de observar e quantificar os fenmenos educativos e de ter
12
instrumentos precisos para a recolha de dados estatsticos); de ordem moral (pois tratando-
se de fenmenos que implicam pessoas, o processo de investigao pode ter uma
repercusso negativa sobre a sua personalidade e chocar com os seus direitos); de ordem
do prprio objecto de investigao cuja dimenso e complexidade torna difcil a sua
preciso, colocando o investigador perante opes difceis: realidade observvel e
quantificvel e/ou no observvel, incluindo, significados, intenes, crenas, tradies e
outras dimenses (Arnal, Rincn e Latore, 1992: 42- 49).
Apesar de todas estas dificuldades e limitaes, a investigao vivel desde que o
investigador tenha conscincia delas, seja motivado e tenha uma grande capacidade de
observao, reflexo e anlise. Essa possibilidade to certa quanto necessria, pois para
alm dos resultados j alcanados (o que prova a sua viabilidade), ser necessrio avanar
com novos dados e novos conhecimentos. A funo da investigao descobrir,
compreender, explicar e transformar a realidade e desenvolver teorias, iniciando,
reformando, desviando e clarificado as teorias existentes (idem).
neste quadro que se orienta a presente investigao, em cujo processo foram
utilizados mtodos, tcnicas e procedimentos que passo a apresentar. A natureza e
amplitude dos fenmenos a abordar aconselharam-me a privilegiar certos mtodos e
tcnicas. Os mtodos so, no fundo, um plano orientador da pesquisa, um conjunto de
operaes, a vrios nveis, visando o alcance de objectivos previamente fixados. Como tal,
permitem a seleco e articulao de tcnicas que mais no so do que instrumentos que
permitem e facilitam a realizao dos mtodos (Pardal, 1995: 12).
Estando em causa o estudo da Administrao da Educao na Guin-Bissau um
caso de caso de tipo macro que implica a descrio e anlise detalhada de situaes numa
perspectiva histrica; um diagnstico para fins de correco e renovao das perspectivas
existentes; a produo de informaes para compreenso do contexto educativo; a anlise
das polticas e prticas educativas desenvolvidas ao longo de anos; a organizao de um
corpo de conhecimentos sobre a administrao da educao, com uma viso mais vasta e
integrada dos problemas da administrao da educao; a busca de respostas aos mais
variados problemas e abertura de novos horizontes o estudo de caso institucional, numa
perspectiva histrica (Aranal, Rincn e Latorre, 1992: 208); Bogdan, 1994: 89), associado
a outros mtodos e tcnicas pareceu-me ser a via mais indicada.
13
Quanto aos mtodos
Se bem que utilizado com muita frequncia ao nvel micro (eventos, instituies,
grupos, famlia, comunidade) e numa perspectiva qualitativa, nada impede que o estudo de
caso seja utilizado numa dimenso maior, ao nvel de um caso macro, de estudo do caso de
um pas, nem que a nfase seja posta simultaneamente nas vertentes qualitativa e
quantitativa, desde que essa dimenso no afecte as virtualidades do mtodo.
O estudo de caso permite uma anlise detalhada de um contexto ou de um caso
especfico e a identificao dos diferentes processos interactivos que o conformam. um
modelo de anlise intensiva de uma situao particular um caso. Viabilizando o recurso a
mtodos qualitativos e quantitativos e sendo flexvel utilizao de uma gama larga de
tcnicas, o estudo de caso permite a recolha de uma vasta e diversificada informao sobre
uma situao, proporcionando o seu conhecimento e caracterizao (Pardal, 1995: 23).
Segundo Merriam (1988), o estudo de caso apresenta quatro caractersticas essenciais:
particular (porque se concentra numa situao particular, evento, programa ou fenmeno);
descritivo (porque permite a realizao de uma descrio detalhada do fenmeno
estudado); heurstico (porque leva o investigador a compreenso do caso); e indutivo
(porque permite generalizaes, conceitos ou hipteses a partir dos dados).
O estudo de caso por vezes criticado por serem muito limitadas as possibilidades
de generalizao dos seus resultados, por no se socorrer de quadros tericos, pelo carcter
prtico e utilitrio de muitos deles e por se concentrar num nico caso. Segundo Bell
(2002:22), esta todavia, uma grande vantagem, porque permite ao investigador
concentrar-se sobre um caso especfico ou situao e identificar os diversos processos
interactivos em cursos, processos que podem no ser to evidentes em estudos com outras
dimenses. Durante o estudo, o investigador observa, questiona, selecciona a rea a estudar
e decide o contedo do seu relatrio final. Mas, o facto de se concentrar num nico caso
no lhe retira a qualidade cientfica, porque tal como acontece em qualquer investigao, o
estudo planeado metodicamente, os dados so recolhidos de forma sistematizada e a
relao entre as variveis estudada. Um estudo de caso incide mais na interaco dos
factores e acontecimentos e sobre essa interaco pode-se ter uma ideia completa, mesmo
quando se toma em considerao apenas um caso (Nisbet e Watt, 1980). Bassey (citado por
Bell, 2002: 24) defende que mais importante poder relatar um estudo do que a
14
possibilidade de ser generalizado. Os mesmos autores acrescentam que se um estudo de
caso for realizado de forma sistemtica e criticamente, se for orientado para a melhoria de
educao e se as suas concluses permitirem alargar os horizontes dos conhecimentos
existentes, ento pode ser considerado uma pesquisa educacional.
Com a escolha deste mtodo, pretendo, segundo os objectivos desta investigao,
descrever e analisar a situao da educao na Guin-Bissau, diagnosticar problemas e
identificar objectivos, confirmar hipteses e gerar outras abrindo caminho para novas,
investigaes.
Tcnicas
O termo tcnica hoje utilizado na sua ligao aos procedimentos concretos e
particulares associados s diferentes etapas do mtodo cientfico. As tcnicas tm um
carcter mais prtico, comparativamente aos mtodos. As tcnicas mais utilizadas nesta
investigao foram: a recolha e anlise de documentao, a entrevista no estruturada, as
conversas informais e a observao directa.
Recolha e anlise de documentao. A recolha e anlise de documentos
constituram a tcnica central deste trabalho. Definida a estrutura provisria do trabalho e
os seus objectivos, elaborei uma listagem provisria dos temas a abordar cujas linhas
foram sendo melhor definidas ao longo das vrias etapas de recolha de documentao. As
fontes alistadas foram fundamentalmente as primrias, tanto deliberadas como e,
sobretudo, inadvertidas, produzidas localmente: legislao, relatrios, estatsticas, estudos,
publicaes sobre a educao (editadas antes e depois da independncia).
A recolha propriamente dita foi programada em duas etapas: a primeira na Guin-
Bissau e a segunda em Portugal e em Paris. A primeira fase, realizada na Guin-Bissau,
revelou-se de difcil concretizao, por trs razes fundamentais: i) o pas no dispe de
uma biblioteca nacional especializada em educao; ii) os arquivos centrais do Ministrio
da Educao encontravam-se numa situao to catica e degradante que tornava invivel
qualquer consulta da natureza da pretendida; iii) a instabilidade institucional e as mudanas
constantes de ministros, quadros dirigentes e de designao dos departamentos geravam
15
sempre mudanas de espaos e movimentao de pessoas, tornado difcil a localizao dos
documentos. Durante toda a investigao documental conhecemos cinco Ministros da
Educao que se sucederam em intervalos mdios de pouco mais de nove meses. Foi,
contudo, possvel elaborar uma lista dos principais documentos que poderiam interessar
investigao e proceder a uma anlise crtica das suas caractersticas. Uma dessas
caractersticas a existncia de um nmero considervel de documentos sem identificao
do autor, sem data precisa, no assinados, no divulgados, no discutidos ou inditos.
A segunda fase de recolha de documentos foi concretizada em Portugal, na
Biblioteca e Mediateca da Universidade de Aveiro, na Biblioteca Nacional e no Arquivo
Histrico Ultramarino, em Lisboa e em Paris no Instituto Internacional de Planificao da
Educao (IIPE). Curiosamente, os documentos de maior interesse para o presente
trabalho, desconhecidos na sua maioria na Guin-Bissau, foram encontrados na Biblioteca
Nacional, em Lisboa e no IIPE, em Paris.
A fase de recolha de documentao foi desenvolvida de forma intensiva durante o
primeiro ano de investigao (2001), perodo em que procedi primeira seleco das
principais fontes que foram sendo complementadas ao longo de todo o percurso da
investigao.
A Entrevista no-estruturada. As entrevistas feitas sobre a anlise das situaes das
Direces Regionais da Educao foram organizadas na base de perguntas abertas, de tipo
opinativo, para permitir a recolha de maior quantidade de informaes. O guio foi
preparado com base no Regulamento de Funcionamento dessas estruturas regionais da
administrao da educao. A entrevista visava identificar os problemas resultantes da
aplicao do Regulamento, as inovaes introduzidas tendo em conta a sua reconhecida
desactualizao e a situao concreta das Direces Regionais de Educao.
Seguindo a diviso educativa do pas, que coincide em grande parte com a diviso
administrativa, foram escolhidas duas regies do Norte do Pas (Biombo e Oio), duas do
Leste (Bafat e Gab) e uma no centro (Sector Autnomo de Bissau). Porm, como no
foram recebidas as respostas do Sector Autnomo de Bissau, ficou-se pelas quatro regies,
num total possvel de nove regies. A caracterizao mais pormenorizada da entrevista
ser apresentada frente, no captulo IX.
16
A conversa informal. As conversas informais foram mantidas com os elementos da
administrao da educao, quer ao nvel das estruturas centrais do Ministrio da
Educao, quer ao nvel das Direces Regionais de Educao, com professores, alunos e
alguns pais de alunos. A tcnica pareceu-me adequada ao contexto educacional vigente na
Guin-Bissau marcado por profundas insuficincias e instabilidades e onde, por paradoxal
que possa parecer, existem vrios instrumentos da poltica educativa elaborados ao longo
de anos que permaneceram letra morta. A conversa informal ajudou a compreender as
intenes, as motivaes e as dificuldades dos entrevistados, por vezes detentores de
funes centrais na administrao da educao. Encontros e conversas informais foram
mantidos em todas as etapas da investigao, com pessoas de vrios nveis de
responsabilidade e em vrias circunstncias.
Observao. Todo o trabalho cientfico implica a existncia de um observador. A
tcnica de observao a mais antiga na recolha de dados, mas, apesar de ser hoje
reforada por muitas outras tcnicas de investigao, conserva ainda a sua importncia na
investigao social, sobretudo quando sistematizada (Pardal, 1995: 50). No decurso desta
investigao houve muitas vezes a necessidade do recurso tcnica de observao no
estruturada, principalmente para a recolha de informaes e dados sobre as crianas, pais,
comunidades, habitaes, espaos de lazer, rituais. Devo sublinhar que dentro de um certo
limite, as comunidades aceitam bem os investigadores e podem proporcionar momentos de
ralaes muito prximas, por vezes at mais ntimas, desde que conhecidas e observadas as
regras fundamentais que regem as sociedades e que as intenes sejam bem claras e
entendidas por parte dos observados.
Por outro lado, mesmo ao nvel da administrao houve necessidade de se recorrer
a esta tcnica porque havia uma certa distoro nas informaes facultadas. Foi o caso, na
maioria das situaes, do funcionamento efectivo dos servios de administrao educativa,
quer ao nvel central, quer regional, comparativamente s suas atribuies.
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3.1. Instrumento enquadrador de anlise
Para analisar a situao da educao na Guin-Bissau, para alm de outras vias
utilizadas, socorri-me do modelo conceptual de Wadi D. Haddad e Terri Demky (1995),
para anlise e formulao de polticas da educao.
Um modelo uma construo terica, uma via para a percepo e compreenso do
mundo, dos fenmenos, adoptado por um cientista ou grupo de cientistas. O modelo em
causa parte da anlise do passado e evolui no sentido da formulao de polticas realistas e
funcionais, da sua execuo, avaliao, correco ou mesmo reformulao; reala a
importncia das decises polticas tomadas no contexto de uma franca colaborao entre a
Poltica e a Administrao.
Como na Guin-Bissau os maiores entraves ao desenvolvimento da educao, como
se ver, so, fundamentalmente, a fraca capacidade de preparao da tomada de decises,
de formulao de polticas e de planificao da sua implementao, considerou-se que o
modelo poderia constituir um importante instrumento para analisar a situao da educao
na Guin-Bissau, uma vez que oferece um quadro conceptual organizado que permite a
compreenso dos problemas e o alcance do nvel de avaliao que se pretende.
3.2. Apresentao do quadro conceptual
O modelo conceptual de Haddad e Demky (1975) desenvolve-se em torno de sete
elementos fundamentais:
a. A anlise do ponto de partida, que inclui as caractersticas gerais do pas, o
contexto poltico, o contexto econmico, a anlise do sector da educao e das
dinmicas das mudanas.
b. A formulao de opes polticas, em resposta a diferentes situaes.
c. A avaliao da pertinncia e da oportunidade dessas opes.
d. A tomada de deciso e anlise da sua consistncia.
e. A planificao da execuo da poltica, garantidos os elementos bsicos: calendrio
realista, recursos humanos, materiais e financeiros ajustados, uma administrao
adequada e a mobilizao permanente de decisores e dos principais parceiros do
processo ensino-aprendizagem (pais, alunos, professores e a comunidade).
18
f. A avaliao do impacto da poltica.
g. A continuidade e a sustentabilidade das aces (reformas)
Componentes do modelo
1) Anlise do ponto de partida
De acordo com os autores citados, uma poltica educativa, como resposta a um
conjunto de problemas, deve partir sempre de uma avaliao do sector educativo e do seu
contexto. Essa avaliao deve incidir sobre vrios aspectos: situao geogrfica do pas,
populao, cultura, estrutura social, grupos existentes no pas os quais podem ter atitudes
diferentes face educao, isto porque as diferenas de acesso educao podem
representar diferenas de acesso ao poder, tendo em conta que a educao tambm um
importante meio de acesso aos poderes econmico e poltico. A anlise do ponto de partida
pode incidir sobre vrios aspectos, designadamente, sobre o ambiente poltico e econmico
da educao e sobre o sector da educao propriamente dito. Os autores indicam os
seguintes pontos de anlise:
O contexto poltico. A anlise permite compreender o processo de tomada de deciso,
o valor da educao e o seu papel no processo scio-poltico, o tipo de relao que existe
entre a poltica da educao e a de desenvolvimento. Esta anlise pode permitir ainda
avaliar os desajustes causados pelo tratamento isolado destes dois sectores complementares
do desenvolvimento de um pas.
Contexto econmico. A sua avaliao facilita a compreenso da situao
macroeconmica do pas, em especial dos seus recursos, das tendncias dos diferentes
sectores e o nvel de recursos financeiros do pas. Estes elementos permitem, por sua vez,
prever, por um lado, o que a educao pode esperar deles, em especial da economia, em
matria de infra-estruturas e recursos financeiros e, por outro, o que a economia pode
esperar da educao. Segundo os autores, essa anlise fundamental porque as variveis,
demografia, urbanizao e migrao, e o crescimento dos diferentes sectores da economia,
tm um forte impacto sobre a estrutura do mercado de trabalho e, consequentemente, sobre
as necessidades de formao e qualificao da mo-de-obra. Alm disso, o nvel de
desenvolvimento econmico de um pas define a capacidade do seu sistema educativo em
19
termos de construo, manuteno e crescimento das infraestruturas e meios educativos e
determina o nvel futuro dos seus recursos humanos.
Sector da educao. A anlise do sector da educao procura identificar,
compreender e comparar com outros sistemas os principais problemas do sector. Esta
anlise, incidindo sobre a finalidade geral da educao, pode esclarecer a importncia e a
contribuio da educao na promoo da sociedade, no desenvolvimento integral da
criana (seu bem-estar intelectual, esttico, moral e fsico), na procura e divulgao de
conhecimento. Esclarece igualmente o tipo de ideologia subjacente, os consensos nacionais
em torno dessas finalidades, bem como o nvel de participao nacional na sua discusso.
Essa anlise pode ser feita a partir de vrios prismas:
a. Quando focalizada sobre a estrutura do sistema educativo, essa anlise permite
conhecer os tipos de educao (pr-escolar, escolar, extra-escolar), os nveis e
ciclos de escolaridade (ensino bsico e seus ciclos; ensino secundrio e as suas
opes e o ensino superior e seus ciclos e ofertas). Permite igualmente analisar o
fluxo dos alunos no sistema e apreciar as taxas de sucesso, insucesso e de reteno,
em suma, avaliar o rendimento do sistema educativo, do ponto de vista da sua
eficcia interna e externa.
b. A apreciao do acesso educao pode pr em evidncia muitos aspectos da
poltica educativa, designadamente, em matria de acesso educao pr-escolar,
de polticas de universalidade, gratuitidade e obrigatoriedade do ensino bsico, de
acesso ao nvel secundrio seus currculos e opes, de acesso ao nvel superior
(universidades, instituies alternativas, ps-graduao). Permite ainda revelar o
fluxo de alunos em cada um dos nveis de escolaridade, os tipos de certificados e
diplomas que so conferidos e elucida sobre a importncia das actividades
extracurriculares, como extenso ou complemento dos contedos da educao ou
ainda como actividades que concorrem para o alcance dos objectivos educacionais
escolares.
c. Como uma pea fundamental da poltica educativa, a avaliao do currculo pode
esclarecer sobre o sentido da sua orientao, revelando se o currculo baseado em
conhecimentos restritos ou gerais na sociedade ou ainda se centrado nas
20
necessidades dos indivduos ou nas preocupaes econmicas. Permite igualmente
conhecer o processo e os autores implicados na elaborao dos currculos.
d. Uma anlise ao nvel da habilitao dos professores d-nos conta permite do perfil
nacional dos professores e as instituies que os formam e situa a competncia e a
responsabilidade na definio das polticas de formao de professores e dos
respectivos programas. Permite, por outro lado, conhecer as idades de recrutamento
dos candidatos formao, os pr-requisitos bsicos para acesso aos cursos, a
forma como so organizados os contedos de formao (disciplinas cientficas,
cincias sociais, disciplinas profissionalizantes, prtica pedaggica), a proporo e
a sequncia desses contedos, a forma como feita a avaliao durante o curso e o
modo como os candidatos obtm a qualificao para o exerccio da docncia, as
condies de progresso na carreira e a poltica salarial.
e. A avaliao da Poltica e da administrao educativa permite conhecer os nveis de
organizao da administrao da educao (central, regional, sectorial e local); o
nvel em que so formuladas, adoptadas e implementadas as questes fundamentais
da poltica educativa (controlo, financiamento, estrutura escolar, currculos,
habilitao de docentes); o nvel e as fontes do financiamento da educao
(impostos especiais ou gerais) e sua comparao com outros sectores.
A anlise da poltica e da administrao da educao fornece informaes sobre a
distribuio interna das verbas, por nveis de administrao, por nveis de ensino, o
sistema de prestao e verificao de contas, as medidas institucionais para gesto
da educao, a justeza na distribuio dos servios educativos e a pertinncia da
legislao face s finalidades gerais da educao.
Informaes sobre poltica e administrao da educao podem tambm revelar a
linha de evoluo dos problemas da educao ao longo dos anos e verificar se
solues adoptadas, designadamente de expanso do sistema e da rede escolar, no
engendraram novos problemas ao nvel, designadamente, da docncia, da gesto
escolar, dos meios de ensino e de outras componentes. Podem, ainda, indicar se os
objectivos polticos visados eram compatveis com os meios disponveis e permitir
a caracterizao do ritmo de implementao das polticas educativas.
21
f. A avaliao do sector pode ser enriquecida e complementada com o diagnstico
das possibilidades de sucesso ou insucesso das polticas e das estratgias a adoptar
e com a avaliao das foras favorveis e contra. Na impossibilidade dessa anlise
abranger todos os grupos implicados ela deve ser limitada, pelo menos, aos mais
influentes, como sejam: i) os professores, que contribuem para a concretizao do
processo de ensino-aprendizagem, por serem geralmente bem organizados e muito
influentes, com capacidade para bloquear ou facilitar a implementao das medidas
polticas, consoante se elas sejam ou no favorveis aos seus estatutos e interesses;
ii) os alunos e pais, beneficirios, em princpio, dos servios educativos ou seus
utilizadores. Segundo os autores, os pais so geralmente um grupo heterogneo,
com diferentes nveis e tipos de formaes e experincia, pertencem a vrios
grupos profissionais, culturais e socio-econmicos. Porm, quando organizados
podem exercer uma influncia desproporcional sobre a poltica educativa. A mesma
fora podem ter os alunos quando organizados em associaes e quando
desencadeiam manifestaes que podem influenciar a opinio pblica a seu favor;
iii) o pessoal da administrao da educao tem tambm seus interesses
especficos. So, geralmente, defensores de expanses moderadas, valorizam o
sistema vigente e resistem s mudanas do status quo.
fundamental para a poltica e prticas educativas, identificar os grupos de
interesse; determinar o seu grau de organizao; avaliar o peso do seu poder na
sociedade e a sua capacidade efectiva de o exercer e conhecer o seu grau de
abertura ou de oposio. Estes conhecimentos podem ajudar a melhorar as opes
polticas e as estratgias da sua implementao.
2) Formulao de opes polticas, em resposta a diferentes situaes
Os autores consideram este segundo momento como o que levanta, geralmente,
dificuldades que podem pr em causa toda a poltica. Em princpio, as novas polticas
visam encontrar sadas adequadas s modificaes ocorridas no sector da educao e no
seu contexto, modificaes causadas por uma complexidade de factores: problemas,
decises polticas, necessidade de reformas (globais ou parciais).
22
A formulao dessas respostas, segundo os autores, pode revestir-se de formas e
dimenses variadas: pode ser de forma sistmica, progressiva, ad hoc e mesmo importada.
Estas formas de respostas podem ser combinadas entre si para se fazer face a uma
determinada situao. Tudo depende do grau e da amplitude das modificaes em
confrontao.
a. A resposta sistmica , sem dvida, a mais complexa e exigente, pois, afecta todo
sistema, mesmo quando incide apenas sobre uma das suas componentes. Na ptica
dos autores deste modelo, este tipo de resposta pode ser formulado de trs
maneiras: i) com banco de dados criados a partir da anlise sectorial ou de dados
existentes (estudos, pesquisas, indicadores comparados, fontes tradicionais e
outras); ii) formulando opes e hierarquizando-as segundo prioridades; iii) com
reformulao e ajuste de opes. Em termos prticos, para formular as opes, no
quadro de uma resposta sistmica, pode-se partir das informaes disponveis,
atravs da induo, construir opes, tentando projectar os resultados das polticas,
com base na anlise de todas as eventualidades. As opes podem tambm ser
hierarquizadas, atribuindo-lhes um certo peso, face importncia dos problemas do
sector educativo, ao poder relativo dos grupos de interesse e s possveis
combinaes. Certas opes podem ser submetidas a anlises mais finas, atravs de
um processo de identificao de problemas, de formulao, verificao,
modificao ou manuteno das polticas. Trata-se aqui de combinar, na medida do
possvel, a induo intelectual com a interaco sequencial. A experimentao e/ou
os estudos piloto podem enriquecer a base de dados e facilitar a ponderao das
diferentes opes.
b. A resposta progressiva leva a melhoramentos progressivos, graduais e permite
manter a legitimidade do sistema educativo.
c. A resposta ad hoc uma resposta a questes pontuais eventualmente at de foro
externo ao sistema educativo que podem exigir ajustes ou mudana no sistema
educativo.
d. Por influncias de inovaes nos sistemas educativos de outros contextos, por
influncias de especialistas estrangeiros, dos consultores internacionais e agncias
de financiamento, podem incitar a importao de respostas. Porm, isso s deve
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ocorrer quando essas respostas correspondem s necessidades dos diferentes grupos
da sociedade (Hadda e Demky, 1995: 34-35).
3) A avaliao da pertinncia e da oportunidade dessas opes
A pertinncia das opes deve ser avaliada atravs de cenrios alternativos que
permitam estimar as suas provveis implicaes. Estes cenrios so avaliados sob trs
pontos de vista importantes: a) da sua pertinncia e oportunidade (ser desejvel?); b) dos
recursos necessrios sua concretizao (os recursos esto disponveis?); c) da sua
exequibilidade (pode ser executado?).
Quanto pertinncia e oportunidade das opes, h trs questes fundamentais a ter
em conta.
a. Em primeiro lugar, o impacto da opo sobre os diferentes grupos de interesses ou
parceiros implicados no processo. A partir deste ngulo, pem-se algumas questes
relacionadas, designadamente, com os que sero beneficiados ou ameaados e
mesmo prejudicados; com as formas de compensao dos eventuais prejudicados e
com a forma ou formas de conciliar a opo com os interesses de todos os
implicados no processo.
b. Em segundo lugar, a compatibilidade da opo com a ideologia dominante e com
os objectivos de crescimento econmico definidos no plano nacional de
desenvolvimento econmico.
c. Em terceiro lugar, o impacto da opo ou opes sobre a evoluo poltica de
desenvolvimento nacional e sobre a estabilidade do pas.
Em relao aos recursos necessrios sua concretizao, fundamental avaliar no
s os custos financeiros das mudanas, como tambm os seus custos sociais e polticos.
De acordo com os autores, a previso dos custos nem sempre fcil, devido
dificuldade de prever as tendncias futuras, incluindo mesmo as de crescimento
econmico. Mas, ela essencial no sector da educao onde os resultados s aparecem a
mdio e longo prazo e tambm por ser um sector cujas despesas so mais vulnerveis face
aos objectivos econmicos e polticos. Por outro lado, torna-se tambm importante estimar
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os custos ao nvel privado, em especial, das camadas mais pobres; avaliar os custos da
oportunidade, isto , da pertinncia dessa opo em relao a outras que poderiam tambm
beneficiar o sistema mas que foram proteladas em favor desta; avaliar os custos polticos,
isto , se a opo tomada favorece uma determinada formao poltica em detrimento das
outras e que custos polticos acarretar para o Governo e de que forma o Governo os
encarar.
Do ponto de vista da exequibilidade da opo, so determinantes os recursos
humanos. A este nvel, as avaliaes so difceis e, em certos contextos, quase impossveis.
difcil prever, por exemplo, o nvel de formao dos professores e a quantidade
necessrias para execuo de uma opo poltica. Por outro lado, a falta de pessoal
qualificado no pas, pode suscitar outras opes: i) recrutamento de tcnicos do exterior; ii)
a formao dos recursos no pas; iii) a formao dos recursos no exterior.
A exequibilidade da opo est tambm relacionada com a existncia de certas condies
ao nvel da instituio responsvel pela sua adopo e implementao, designadamente, em
termos de normas, procedimentos e clima favorveis atraco, reteno e utilizao
racional e eficaz do pessoal formado para transformar as polticas em planos e em
programas de execuo e assegurar a sua implementao. Est tambm relacionada com a
necessidade de estimar o tempo para a execuo com realismo, tendo em conta a durao
das iniciativas educativas do ponto de vista poltico, material e financeiro para poderem
apresentar resultados, e se a opo ou opes so consentneas com a poltica global e se
so coerentes e pertinentes face aos objectivos nacionais.
4) A tomada de deciso e anlise da sua consistncia
As decises polticas nem sempre so tomadas como consequncia racional de um
processo em que so reunidas, organizadas e analisadas as informaes necessrias. Os
diferentes interesses em jogo podem fazer com que surjam decises polticas como
resultado de um compromisso ou de um processo negocial. Por outro lado, o processo de
tomada de decises polticas pode ser influenciado por presses polticas, insuficincias na
avaliao ou por uma simples urgncia. Pode tambm ocorrer uma deciso individual de
um poltico (um Ministro, por exemplo) sem respeitar as etapas precedentes.
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As decises podem ser avaliadas, questionando sobre a forma como foram
tomadas (respeitando todas as etapas ou de forma individual e isolada), estabelecendo a
diferena entre elas e a poltica vigente, avaliando o seu grau de compatibilidade com as
polticas de outros sectores, analisando a sua abrangncia e possibilidade de avaliao e
questionando sobre o seu grau de exequibilidade e operacionalidade.
5) Planificao da execuo da poltica
Tomadas e avaliadas as decises, segue-se a planificao da sua execuo. uma
etapa que exige elementos muito mais concretos comparativamente s etapas precedentes.
A planificao pode contribuir para clarificar os elementos que se apresentarem vagos.
Para planificar com segurana necessrio: i) um calendrio pormenorizado e claro de
deslocao de pessoas, materiais e recursos financeiros, de modo a no existirem dvidas
sobre quem faz o qu, quando, como e onde; ii) a garantia e a disponibilidade dos recursos
materiais e financeiros necessrios; iii) a presena efectiva e o envolvimento de todo o
pessoal necessrio, livre de outros compromissos, afecto ao plano de execuo, munido
dos conhecimentos necessrios e dos meios especficos e pronto para trabalhar; iv) todos
os intervenientes devidamente informados e com conhecimentos e domnio de tcnicas
especficas, segundo o seu nvel de interveno; v) uma administrao devidamente
estruturada, com competncias claras e capacidade para assumir a orientao das aces;
vi) a mobilizado atempada e contnua de polticos, alunos e seus familiares, das
comunidades, depois de devidamente informadas sobre os objectivos visados e suas
vantagens; vii) programas para os professores, pessoal da administrao da educao e
seus representantes, atempadamente elaborados e distribudos; viii) importante tambm
que a maioria dos professores reconhea as vantagens da nova poltica para que seja
possvel isolar os que eventualmente se oponham; ix) um programa de mobilizao poltica
constante visando assegurar a disponibilidade dos materiais, dos meios financeiros e a
flexibilidade ao nvel da administrao central; x) uma estratgia de execuo capaz de
implicar todos os grupos interessados no processo de execuo.
Seguindo a execuo de forma atenta, torna-se possvel melhorar a adequao de vrios
aspectos da planificao e da formulao de polticas. As necessidades de adequao
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durante a fase de execuo podem tambm ser assinaladas por reaces dos diferentes
parceiros.
Os desajustes podem ocorrer como consequncia de subvalorizao dos problemas na
etapa da planificao ou como impreciso na definio de certos elementos do plano de
execuo. Durante a execuo pode-se tomar conscincia da falta de realismo na definio
do calendrio, do grau de ambio dos programas ou de outras insuficincias. Estes
aspectos podem suscitar reaces por parte dos actores implicados, que podem tentar
bloquear a execuo. A situao pode ser corrigida ou pode exigir a reavaliao dos planos
de execuo ou mesmo da prpria deciso poltica.
6) Avaliao do impacto da poltica
A avaliao do impacto de uma poltica feita depois do tempo minimamente
necessrio para que ela produza resultados avaliveis. Uma avaliao precoce pode induzir
a falsas concluses. Na educao, recomendvel avaliar no final de alguns ciclos de
ensino para se poder ter elementos reais de forma a distinguir os resultados de uma poltica
e do entusiasmo de novas iniciativas. Durante o processo de implementao de uma
poltica pode-se fazer uma avaliao contnua.
Uma avaliao que revele a ausncia dos efeitos esperados deve ser seguida de
uma investigao para determinar se o facto se deve inadequao da poltica ou se houve
falhas na execuo. As falhas na execuo podem ser originadas, designadamente, por
insuficincia de recursos humanos, materiais e financeiros ou sua disponibilizao
extempornea. Porm, se for assegurada uma boa execuo e se, todavia, os resultados se
situarem aqum dos nveis esperados, torna-se necessrio, nestes casos, rever a deciso,
determinar os ajustes a introduzir, preparar novas decises e polticas em substituio das
iniciais e retomar todas as fases do processo.
Independentemente de quaisquer causas e de excepcionais condies de execuo,
existe sempre uma necessidade de constantes reajustes imposta pelas mudanas rpidas
que ocorrem na sociedade e que se repercutem no sistema educativo e noutros subsistemas
sociais, devido estreita ligao entre eles.
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O impacto da poltica pode ser avaliado, no decurso da sua implementao ou no
final de um perodo determinado, verificando, designadamente, i) os resultados reais da
poltica em questo; ii) o grau de satisfao dos impactos conseguidos em relao aos
desejados e comparativamente s mudanas esperadas; iii) se foram conseguidos e
disponibilizados os recursos que eram necessrios para as mudanas que se pretendiam, iv)
se os custos dificultaram a execuo; v) se os desvios aos padres iniciais teriam impedido
uma execuo mais prolongada ou mais extensiva; vi) se a poltica adoptada foi social e
politicamente aceite; vii) se os efeitos esperados so realistas e realizveis e se foram
atingidos na totalidade; viii) se seriam necessrios esforos suplementares para conseguir
esses resultados noutras circunstncias.
7) Continuidade e a sustentabilidade das aces (reformas)
Segundo defendem os autores do modelo em anlise, a execuo correcta de uma
poltica deve, em princpio, desenvolver uma certa dinmica nos processos de concepo,
planificao, execuo, avaliao e reviso da poltica e conduzir a resultados de nveis
superiores se for garantida a continuidade de aces. Porm, nem sempre as polticas
partem dos resultados das avaliaes. Esses resultados so muitas vezes tomados como
trmino de um processo quando, na realidade, so elementos para o lanamento de nova
programao, a um nvel superior de evoluo. Quando ocorrem mudanas polticas, a
tendncia ainda, em certos contextos, de ignorar as avaliaes e partir sempre da estaca
zero, quebrando a continuidade e o ciclo evolutivo que devia, a todo o custo, ser mantido.
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4. Organizao da tese
A tese ser constituda por duas partes fundamentais:
Na primeira parte, designadamente, no Captulo I, desenvolverei um quadro terico
so abordados alguns conceitos bsicos relacionados com a educao, a poltica educativa
e o sistema educativo, como pressupostos necessrios ao entendimento da Administrao
Educativa e procura-se esclarecer algumas questes centrais e actuais. No Captulo II,
apresentarei uma abordagem sucinta da evoluo da administrao em geral, nos ltimos
sculos, com o intuito de fornecer mais informaes que possam ajudar a situar melhor a
Administrao da Educao que ser abordada no Captulo III. Neste mesmo captulo d-
se conta das principais componentes da Administrao Educativa (Planificao da
Educao; Recursos Humanos; Recursos Fsicos; Recursos Financeiros; Administrao
Escolar; Superviso do Sistema Educativo; Legislao). Nesta primeira parte sero ainda
apresentadas as principais dificuldades com que se confronta a Administrao Educativa,
entre as quais figurar a problemtica descentralizao da educao. Esta primeira parte
ser fechada com uma proposta para anlise da Educao que possa contribuir para
caracterizar o sistema educativo da Guin-Bissau. A escassez de obras actuais, orientadas
para uma perspectiva macro da administrao da educao obrigou, ao recurso constante a
um nmero muito limitado de fontes. A preocupao tambm de tornar mais claras
muitas questes bsicas conhecidas noutros contextos, mas pouco familiares ou talvez
pouco valorizadas pelos que, na Guin-Bissau, tm que pensar e decidir sobre os
objectivos, as linhas polticas e as estratgias para a educao.
A segunda parte ser dedicada anlise da evoluo da Administrao Educativa
na Guin-Bissau. Iniciar com a caracterizao do pas, no Captulo IV.
Para facilitar a anlise da evoluo da administrao educativa na Guin-Bissau e
com base nos acontecimentos educativos e polticos mais marcantes, admiti, com base
nesses critrios, a existncia de quatro perodos principais:
a) De 1940 a Abril de 1974. Depois de dcadas de uma educao indefinida e
estagnada, o ano de 1940 marca o incio de uma educao entregue s Misses
Catlicas, baseada em duas classes distintas (civilizados e indgenas), fundadas no
regime do indigenato, que rapidamente se viu obrigada a orientar-se de forma
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intensa para uma educao africanizada, sob a presso da Luta da Libertao
Nacional, conduzida pelo PAIGC, cujos efeitos se traduziram numa presso da
comunidade internacional sobre a administrao colonial.
b) De 1974 a 1980. O perodo marcado por dois acontecimentos importantes: i) o
incio de uma reforma global da educao conduzida por um Partido/Governo; ii) o
incio dos processos de abolio do partido nico e da implantao do liberalismo
econmico e poltico e a criao do Ministrio da Educao Nacional. Termina
com o golpe de Estado de 14 de Novembro que leva Nino Vieira ao poder.
c) De 1981 a Junho de 1998. Durante este perodo concentram-se as principais
iniciativas de reforma educativa, consolidam-se os partidos polticos e os processos
de democracia. A educao aberta ao sector privado.
d) De 1998 a 2004. O perodo marcado por reformas educativas num contexto de
uma permanente instabilidade poltico-institucional, em que visvel a retraco do
Estado e a proliferao catica de iniciativas privadas. Com os acontecimentos de 7
de Junho de 1998, que conduziram a mais um levantamento poltico-militar e que
culminaram com o terceiro golpe de Estado, o pas foi lanado numa onda de
instabilidades sem precedentes e com efeitos bastante negativos sobre a educao e
sobre todos os sectores da vida nacional.
Esses quatro perodos sero tratados, respectivamente, nos captulos, V, VI, VII e
VIII. No captulo IX apresentarei a situao actual do sistema educativo guineense e sua
administrao e termina-se com as Concluses e algumas contribuies para a
modernizao da Administrao da Educao na Guin-Bissau.
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I PARTE
EDUCAO, POLTICA EDUCATIVA, SISTEMAS EDUCATIVOS,
ADMINISTRAO DA EDUCAO
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32
CAPTULO I
EDUCAO, POLTICA EDUCATIVA E SISTEMA EDUCATIVO
Antes de entrar numa abordagem mais precisa do tema Administrao Educativa
que ser objecto da nossa ateno no II e III captulos um conceito relativamente novo,
to complexo quanto polmico, que ainda no rene consensos nos seus mais variados
aspectos, achei conveniente esclarecer primeiramente trs aspe