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Abordagens foucaultianas para uma metodologia dos estudos
da WEB segundo o conceito de dispositivo
Ana Claudia da Cruz Melo
Carmen Lúcia Souza da Silva
UFPA
Palavras-chave: Dispositivo. Midiatização. WEB. Conversação. Embates.
RESUMO EXPANDIDO
Para definir o conceito de dispositivo em Foucault, antes é preciso conhecer suas
ideias. Compreendê-lo dentro de uma longa trajetória de estudos. Talvez a começar
quando sugeriu, com o lançamento de As Palavras e as Coisas (1966), que ao invés de
estrutura há de se considerar a épistémè ligada à linguagem e que as ciências humanas
não passariam de resultados de mutações de formações discursivas que se seguem uma
às outras no tempo, sem qualquer sequência pré-ordenada ou necessária. Depois, passa a
definir a épistémè como o dispositivo discursivo, diferentemente do dispositivo (grifos
nossos) em seu conceito mais amplo, que englobaria tanto o discursivo como o não
discursivo, com perfil heterogêneo. Esta trajetória de construção conceitual é detalhada
em entrevista concedida a Alain Grosrichard, publicada em Microfísica do Poder (1979).
Após ser questionado por Grosrichard sobre por que em As Palavras e as Coisas e A
Arqueologia do Saber falava em épistémè como formações discursivas e depois passou a
falar mais em dispositivos, disciplinas; e se isso representaria que estes conceitos
substituem os precedentes, Foucault esclarece:
Em As Palavras e as Coisas, querendo fazer uma história da epistémè,
permanecia em um impasse. Agora, gostaria de mostrar que o que chamo de
dispositivo é algo muito mais geral que compreende a épistémè. Ou melhor,
que a épistémè é um dispositivo especificamente discursivo, diferentemente do
dispositivo, que é discursivo e não discursivo, seus elementos sendo muito
mais heterogêneos. (FOUCAULT, 1979, p. 246)
Em a Microfísica do Poder, Foucault (1979) prossegue não apenas apresentando
o sentido, mas a função metodológica do termo dispositivo. Afirma que através deste
termo tenta demarcar, decididamente, um conjunto heterogêneo que engloba discursos,
instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas
administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas.
2
“Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que
se pode estabelecer entre estes elementos” (FOUCAULT, 1979, p. 244).
Foucault também demarca a natureza da relação que pode existir entre esses
elementos heterogêneos situando a forma como o discurso pode aparecer: por meio de
um programa institucional ou, ao contrário, para justificar e mascarar uma prática que
permanece muda; ou como reinterpretação desta prática, permitindo a emergência de
outro campo de racionalidade. A questão a considerar, segundo ele, é que entre os
elementos (discursivos ou não) existe certo jogo que resulta em mudanças de posição ou
modificações de funções.
O terceiro aspecto que Foucault coloca é que o dispositivo também pode ser
entendido como uma formação que, em um determinado momento, teve como principal
função responder a uma urgência. É nesse sentido que se poderia situar, inclusive, o
dispositivo como tendo uma função estratégica dominante, que possui uma estrutura de
elementos heterogêneos, e também é constituído por um certo tipo de gênese. Esta gênese
é apresentada como tendo dois momentos essenciais. O primeiro momento é o da
predominância de um objetivo estratégico. Em seguida, o dispositivo se constitui e
continua sendo dispositivo na medida em que engloba um duplo processo:
Por um lado, processo de sobredeterminação funcional, pois cada efeito,
positivo ou negativo, desejado ou não, estabelece uma relação de ressonância
ou de contradição com os outros, e exige uma rearticulação, um reajustamento
dos elementos heterogêneos que surgem dispersamente; por outro lado, o
processo de perpétuo preenchimento estratégico (FOUCAULT, 1979, p. 245).
Com base nisso, Foucault traz a prisão como um dispositivo que fez com que em
determinado momento da história fosse tida como um meio eficaz de combate à
criminalidade. Entretanto, esse dispositivo teve um efeito não esperado que foi a
constituição de um “meio delinquente”. Para defender a ideia de que o dispositivo está
sempre inscrito num jogo de poder (ligado a uma ou a configurações de poder), é que
Foucault propõe dispositivo como algo mais heterogêneo, que transborda a sua concepção
primeira de epistémè tratada em As Palavras e as Coisas e Arqueologia do Saber.
Dreyfus e Rabinow (1995) ajudam a compreender o pensamento de Foucault
acerca do dispositivo detalhando que o dispositivo também pode ser considerado como
uma grade de análise construída, atuando como uma ferramenta ou aparelho, constituindo
3
sujeitos e os organizando e, ao mesmo tempo, pode ser visto como uma tentativa de
nomear ou, no mínimo, apontar o problema.
Segundo esses autores, um exemplo de como Foucault lança mão do termo
dispositivo está no caso dos estudos da clínica de Jean-Martin Charcot, que desenvolvia
experimentos médicos em “mulheres histéricas”. A essas mulheres era dado nitrito de
amilo para provocar a excitação e depois levá-las aos internos da clínica para falarem
livremente de suas fantasias. Charcot, Freud e Foucault verão esses experimentos de
modos diferentes. Charcot pesquisava as causas objetivas da ação, enquanto Freud
observava as intenções escondidas nos comportamentos dos atores e as interpretava para
tentar explicar o que estava acontecendo. Foucault, segundo Dreyfus e Rabinow, dá um
passo a mais nesse processo porque considera, primeiramente, “o dispositivo de
sexualidade” um dado essencial, o ponto de partida obrigatório para toda a discussão do
problema. Nas palavras de Foucault: “Eu o examino [o dispositivo de sexualidade]
atentamente, e o tomo ao pé da letra; não me coloco fora dele, pois isto não é possível e,
assim procedendo, sou levado a outras coisas” (FOUCAULT apud DREYFUS;
RABINOW, 1995, p. 135).
Essas “outras coisas” a que Foucault se refere, explicam Dreyfus e Rabinow, não
são causas objetivas de neuroses sexuais, nem as intenções escondidas das “mulheres
histéricas”, mas a organização, a coerência e a inteligibilidade de todas as práticas que
apareceram nas representações da clínica de Charcot.
Sob esta perspectiva do dispositivo - como algo mais heterogêneo e complexo -,
é que compreendemos que as acepções foucaultianas sobre o dispositivo, no campo da
Comunicação, se distanciam de compreensões que o trazem como suporte, técnica,
aparelho ou os meios usados para dar uma impressão de realidade (BAUDRY, 1978).
Ferreira (2007) traz, por exemplo, o conceito de midiatização articulado a partir de três
polos em relação de mútua determinação, formando o que denomina de "matriz da
midiatização", onde o conceito de dispositivo é estratégico porque se articula aos
processos sociais e aos de Comunicação, afetando-os e sendo delineados por esses. Ao
explicar o que compreende como dispositivos midiáticos, Ferreira destaca, inclusive, a
complexidade do conceito de dispositivo, pois afirma que, em sendo heterogêneo, “são
constituídos por diversas outras intersecções ativadas nas relações entre semiose, sistemas
de inteligibilidade e sistemas tecnológicos” (FERREIRA, 2016, p. 148).
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A partir destas considerações acerca do conceito dispositivo, passamos a
apresentar dois exemplos de estudos, que se propõem a exemplificar elementos que
permeiam a existência das relações vivenciadas na WEB (avaliação cega). Demonstram
que as interações vivenciadas na atualidade podem ser compreendidas como inseridas em
um complexo dispositivo que permitiu o surgimento de uma rede de computadores que
inicialmente tinha uma determinada finalidade (avaliação cega). Mas essa rede
transbordou a finalidade idealizada e se tornou um espaço, voltado às vivências de afetos
e afecções (SPINOZA, 2014), de conversação (TARDE, 2005) e também em um lugar de
embates entre campos e atores sociais (avaliação cega). O dispositivo, portanto, não é o
meio e, sim, tudo aquilo que permitiu que um espaço passasse a existir, ou seja, é um
conjunto heterogêneo que envolve como propõe Foucault não apenas os discursos ou as
instituições, mas também uma gama de outros elementos que estão relação, dinamizam o
processo e provocam afetações mútuas.
REFERÊNCIAS
BAUDRY, Jean Louis. L’effet Cinéma. Paris: Albatros, 1978.
DREYFUS, Hubert; RABINOW, Paul. Michel Foucault: uma trajetória filosófica: para
além do estruturalismo e da hermenêutica. 1. ed. Brasileira. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1995.
FERREIRA, Jairo. Midiatização: dispositivos, processos sociais e de comunicação.
Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação –
E-Compós. v. 10, 2007. Disponível em: <http://www.compos.org.br/seer/index.php/e-
compos/article/viewFile/196/197>. Acesso: set. 2016.
______. Adaptação, disrupção e regulação em dispositivos midiáticos. Matrizes, São
Paulo, n. 2, v. 10, p. 135-153, maio/ago. 2016.
FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. 1ª edição. Petrópolis: Vozes, 1972.
________. As Palavras e Coisas; uma arqueologia das ciências humanas. 6ª edição. São
Paulo: Martins Fontes, 1992.
________. Microfísica do poder. 11ª edição. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.
5
LATOUR, Bruno. Reagregando o Social. Bauru, SP: EDUSC - Salvador, BA: EDUFBA,
2012.
SPINOZA, Benedictus de. Ética. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.
TARDE, Gabriel. A Opinião e as Massas. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
REFERÊNCIAS sobre as pesquisas apresentadas (avaliação cega).
6
Para aquém das bordas: contribuições da perspectiva da
autopoiésis para análise da circulação.
Carlos Alberto Gusmão
Palavras-chave: circulação, autopoiésis, , transmissão, intencionalidade-efeitos
RESUMO EXPANDIDO
Utilizamos aqui, junto à referência à borda, constante de um texto de Fausto
Neto1, o termo aquém, buscando reforçar – ao modo da proposta de ruptura
epistemológica concernente ao nosso patamar de observação da questão, a perspectiva
autopoiética - a fundamental proveniência da questão aqui denominada de circulação.
Diríamos de forma mais aclaradora: a problemática aqui apontada – cujo cerne repousa
numa aparente insuficiência teórica em conceituar o espaço que distingue e identifica
os polos da produção e recepção – apesar de sua aparente proveniência teórica nesses
termos colocados funda-se num modo de ver teórico cuja vigência ultrapassa as teorias
particulares (“transversaliza-se”) e se legitima epistemologicamente. Nossa hipótese: é
necessário explorar esse modo de ver em termos de um questionamento epistemológico
de forma a compreendermos o que significa a circulação como parte do processo da
comunicação.
Andemos pois. Mesmo para uma perspectiva empirista relativizadora que
reconheça que tais polos sejam referencias lógicas organizadas a partir de uma
perspectiva instrumental que forneça origem e destino à noção de transmissão na
observação teórica dos processos comunicacionais, considerando-se que esse movimento
tenha origem e fundamentos em certas intencionalidades que devem – para que toda essa
arquitetura teórica tenha sentido – produzir efeitos, tais efeitos, fundados certamente na
intencionalidade, teria obrigatoriamente que passar (nessa arquitetura) por esse espaço
não conceituável, seja no âmbito de uma comunicação ou de comunicações recursivas a
ela. Esse espaço – ou espaço tempo – distinguiria e identificaria os polos em
comunicação.
Na pratica teórica, por assim dizer quando nos referimos aos diversos modos de
entender esse espaço em função de suas hipóteses de relação entre midia e sociedade, os
polos são identificados como distintos, de forma que é possível “explorar” teoricamente
7
esse espaço de diferenciação, em função do preenchimento de sentidos, assim
processados. Embora teoricamente a arquitetura aqui tratada tenha referências lógica-
empiricas – há sempre uma instancia empenhada em comunicar-se com outra, de toda
forma observáveis, tanto em função das informações processadas, dos atos de
comunicação e da compreensão verificada quando o “outro lado”, a recepção, emite uma
outra comunicação, recursiva àquela inicial.
Tambem ai, não poderíamos deixar de observar a existência de intencionalidades,
certamente. Mas corremos o risco da perda das referências lógico-empíricas fornecidas
por nosso modelo, nossa arquitetura teórica. Isso porque a ideia de intencionalidade está
condicionada à ideia de efeitos, e dada a falta de provas empíricas de sua existência
comunicacional se torna necessário – se pensarmos numa diferenciação básica que
envolva intencionalidade e efeitos – que a teoria recorra de outros processos não
comunicacionais para dar sustentação ao modelo. Nas teorias designadas como
“administrativas” recorre-se da ideia de uma sociedade fundada em certa lógica que
justifica a natureza da intencionalidade e o estudo dos efeitos ou, por outro lado, numa
teoria que deve recorrer à crítica de tal sociedade para operar teoricamente, por seu lado,
a dimensão intencionalidade-efeitos daquela arquitetura teórica.
Em ambos o caso, o conceito de comunicação recorre a um processo “não
comunicacional” para sustentar a relação intencionalidade-efeito, de forma que o aparato
teórico fundado numa identificação-distinção de polos escapa ileso, daí sua invariância e
o subjacente instrumental vigente. Uma mesma noção instrumental perpetua-se, portanto,
invariavelmente em modos distintos de conceber aa relação de determinação (ou
interdeterminação) entre midia e sociedade. Num modo de maior complexidade, a noção
de Inter determinações entre os polos opera da mesma forma, mas o conceito de dupla
expectativa (Luhmann), que atende de forma interessante tal complexidade recusa
imediatamente as noções de intencionalidade e efeito como “parte” do conceito de
comunicação.
De toda forma, a impropriedade do uso no conceito de comunicação das
dimensões intencionalidade-efeitos - fundada no fato trazido pelas provas empíricas de
que esses são elementos variáveis nas operações comunicacionais, não sendo nada mais
que um plus a mais a ser agregado ao conceito deixa aberto um certo sentido de
circulação, como algo articulado ao processo numa perspectiva do modelo de
transmissão. A comunicação não circularia assim no sentido de uma transmissão ponto-
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a-ponto, na forma de intenções que transmitem efeitos e liga – de forma mais ou menos
complexa- os polos, quaisquer que sejam, da comunicação.
Se os indícios da circulação nos processos comunicacionais forem postos a
serviço do modelo até agora analisado, certamente deve, ou deixar de tentar ocupar
conceitualmente o espaço delineado pela identificação/distinção polar do processo,
reconhecendo que tal impossibilidade é condição da comunicação, ou recorrer de uma
outra ideia de sentido, (oposta a de preenchimento, continuidade) para preenche-lo.
9
Corporificação do grande Outro Henio Segura Urtado
Faculdade Cásper Líbero
OBJETIVOS
O artigo visa investigar o fenômeno da ciber-socialidade. Para tanto o conceito lacaniano
de grande Outro, atualizado por Slavoj Zizek, será empreendido em conjunto com uma
análise sob o viés do materialismo histórico e dialético. Com isso o objeto será exposto
em dois níveis de funcionamento: simbólico e estrutural.
Palavras-chave: ciber-socialidade; grande Outro; materialismo histórico e dialético;
Slavoj Zizek.
RESUMO EXPANDIDO
1. Resumo
O conceito de grande Outro se justifica por elucidar como opera um ethos
específico da rede que acaba por condicionar as interações. Modo de ser constituído por
um duplo que se confunde: imperativos categóricos decorrentes da própria forma
estruturante da rede. Por exemplo: a arquitetura da informação, no caso do Facebook,
induz conexões, mas os perfis requerem uma especificidade simbólica. Os critérios dessa
filtragem passam pelo registro do grande Outro que, por sua vez, é refletido pelos signos
dos usuários. Para além da tentativa de mera representação do sujeito, eles se configuram
como uma projeção. Não só como uma persona, mas como integrante de um universo
simbólico específico. Portanto, esses signos são da mesma ordem das aparências pela qual
o grande Outro é o legislador responsável. São condição primária para conferir
legitimidade ao horizonte de significações do sujeito.
Entretanto, a base do processo, reconhecimento de si e do outro, é anterior ao
evento das redes sociais. O que se coloca em questão é justamente a forma da ciber-
socialidade, reconhecendo-a, inclusive, como nova forma predominante. Uma de suas
características é a de um ritmo peculiar que acompanha o da identificação e da tecnologia.
Um lampejo de familiaridade já basta tanto quanto um clique. São relações constituídas
a partir da própria ignição e não, exclusivamente, do desenvolvimento. São levados em
conta quais são os signos em comum, priorizados aqueles de maior apelo estético. Embora
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a conexão seja tênue, ata com a mesma facilidade que desata, nem por isso é mais ou
menos falso.
É sobretudo produto do paradigma perceptivo da hipermodernidade. A síntese do
ser pelos traços mais identificáveis e impactantes. Uma estética alinhada aos modos de
produção. Não por menos, a nossa capacidade de codificação e decodificação é
compatível com a velocidade da rede. Mas tudo isso tem uma origem localizável no
processo histórico conhecido como modernidade. O ritmo veloz da produção material em
larga escala foi internalizado pela percepção humana. É, como denominado por Ben
Singer, o hiperestímulo. O que se torna inclusive uma questão semiótica: o ser humano
assimila um parâmetro sobre-humano e o normatiza; o que é percebido no ambiente
externo logo é incorporado e traduzido em técnica. Esse aparente caos digno de uma
megalópole é justamente o seu oposto. Mesmo o que nasce da técnica e dela escapa,
acaba sendo recapturado por ela.
“A cibercultura é a socialidade como prática da tecnologia”1. Assim a ciber-
socialidade, fruto da hipermodernidade, é uma socialização tecnizada. Sua produção em
larga escala só não é massiva porque é on demand. Signos de si especialmente elaborados
para corresponderem às coordenadas do desejo de um grande Outro. Por isso é conferida
a estética uma função para além do sublime. Os signos dos sujeitos precisam se sobressair
em um movimento compensatório da multiplicidade. Lógica, não por acaso, de cunho
similar ao mercadológico. Várias marcas disputam entre si pela atenção do consumidor e
ganha aquela com uma identidade própria mais bem composta.
“O que se estrutura do sujeito passa sempre pela intermediação do mecanismo que
faz com que seu desejo já seja, como tal, moldado pelas condições da demanda”2. No
caso da cibercultura, sobre tais condições vigora o próprio regimento da rede. Assim
como sua mecânica se estabelece por conexões, as relações intra-subjetivas correspondem
a mesma inclinação. O que é requerido a nível simbólico se engendra primeiro na lógica
de funcionamento interno da rede. Portanto, a velocidade das operações dos algoritmos,
por exemplo, tem seu par simbólico no engajamento pela familiaridade. Pois, nada gera
uma identificação mais imediata do que o recorrente. É isso que Maffesoli conceitua
12 (LEMOS, 2004, p. 89)
( LACAN, 1999, p.282)
11
como “tribalismo” na rede. Em termos de midiatização, é esperado que a cibersocialidade
seja a forma imperativa nos relacionamentos “dentro e fora” da rede. Embora, seja
importante enfatizar, que a separação entre “mundo virtual” e “mundo real”, como é
chamado vulgarmente, já se encontra obsoleta.
Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. 1. ed. Lisboa: Relógio d’Água
Editores Lda, 1991.
BENJAMIM, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. 1. ed.
Porto Alegre: L&PM, 2013.
CHARNEY, Leo; SCHWARTZ, Vanessa. O cinema e a invenção da vida moderna.
1. ed. São Paulo: Cosac & Naif, 2001. Artigo: SINGER, Ben.
Modernidade, hiperestímulo e o início do sensacionalismo popular.
HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. 7 .ed. São Paulo: Editora Vozes LTDA, 2012.
KAUFAMNN, Pierre. Dicionário enciclopédico de psicanálise: O legado de Freud e
Lacan. 1.ed . Rio de Janeiro: Zahar, 1996.
LACAN, Jacques. As formações do inconsciente. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1999.
LEMOS, André. Arte eletrônica e Cibercultura. Revista FAMECOS, Porto Alegre, n°6,
junho. 1997.
LEMOS, André. Tecnologia e vida social na cultura contemporânea. 2. ed. Sulina:
Porto Alegre, 2004.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2000.
12
LIPOVETSKY, Gilles e SERROY, Jean. A cultura-mundo: Resposta a uma sociedade
desorientada. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
SANTAELLA, Lúcia. Corpo e comunicação: Sintoma da cultura. 1. ed. São Paulo:
Paulus, 2004.
SANTAELLA, Lúcia. Navegar no ciberespaço: O perfil cognitivo do leitor imersivo. 1.
ed.
São Paulo: ComunicAção, 2004.
ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.
ŽIŽEK, Slavoj. A Realidade do Virtual. 2004. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=M4HdqlwVDpk. Último acesso em 03/10/2016.
ŽIŽEK, Slavoj. The Big Other and the Event of Subjectivity. 2012. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=7aYDwHNlmb4. Último acesso em 03/10/2016.
13
Midiatização do Jornalismo na Perspectiva da
Ecologia da Mídia
Luciana Menezes Carvalho
Eugenia Maria Mariano da Rocha Barichello
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM
Palavras-chave: midiatização, Ecologia da Mídia, Teoria Ator-Rede, jornalismo
digital.
RESUMO EXPANDIDO
O trabalho tem por objetivo apontar as principais transformações do jornalismo
no cenário da midiatização, em que os meios se relacionam em um ecossistema marcado
por rupturas e adaptações. Para tal, é apresentada a perspectiva teórica da Media Ecology,
com destaque para a definição de meio em MCLuhan. A ideia de que os meios produzem
alterações importantes na sociedade, através de agenciamentos sociotécnicos, é discutida
em uma aproximação conceitual entre a Ecologia da Mídia e a Teoria Ator-Rede.
Para compreensão do ecossistema de meios que se configura no cenário digital, é
desenvolvida uma reflexão sobre o processo de midiatização decorrente das gramáticas e
protocolos culturais de alguns meios na interação com seus usos e apropriações sociais.
Mais que uma metáfora da Biologia aplicada ao estudo da Mídia, a Media Ecology
propõe um quadro teórico-epistemológico amplo para a pesquisa na área, podendo ser
renovada na atualidade com novas categorias que surgem das transformações no sistema
midiático digital. Scolari (2010, 2015) resume os pressupostos desse paradigma em duas
ideias centrais: os meios de comunicação constituem um entorno (o medium como
ambiência) que modifica a percepção e a cognição; e os meios são as espécies que vivem
em um ecossistema e estabelecem relações entre si e com os sujeitos que nele interagem.
O termo ecossistema (do grego, oikos) refere-se ao ambiente no qual se vive. Foi
utilizado inicialmente pelo botânico inglês Arthur Tansley, em 1935, tornando-se
conceito central nos estudos biológicos com foco na perspectiva ecológica. Com o tempo,
foi adotado pelas áreas da educação, administração e informática (GHEDIN e ZANOTTI,
2014). No jornalismo, a expressão foi utilizada por Alsina (2010) para se referir ao
processo sistêmico de construção dos acontecimentos.
14
Na comunicação midiática e no jornalismo, uma série de autores tem utilizado a
expressão ecossistema midiático para se referir às reconfigurações no ambiente dos meios
de comunicação promovidas pela internet e as tecnologias digitais (LASICA, 2003;
BOWMAN & WILLIS, 2005; DEUZE, 2006; NAUGHTON, 2006; HERMIDA, 2010;
CANAVILHAS, 2010, 2011, 2013; DREYER, CORRÊA, 2013; CARVALHO,
RUBLESCKI, BARICHELLO, 2014).
A noção de ecossistema aplicada à mídia relaciona-se diretamente com a
concepção biológica, pela qual as modificações em cada meio ou no ambiente interferem
no conjunto e impactam também nas partes que o constituem. A noção é central para se
compreender as transformações que os meios digitais operaram sobre a sociedade e, no
caso específico desta pesquisa, sobre o jornalismo.
A ideia de que os meios criam ambiências ou entornos e constituem gramáticas
próprias está presente em alguns sentidos dados por McLuhan ao conceito de médium,
pelo qual o autor canadense estaria chamando atenção para a importância dos efeitos que
os meios podem produzir nos indivíduos e na sociedade, transformando a cultura. Na
época, o autor enfatizava a necessidade de os estudos sobre os efeitos dos meios
eletrônicos superarem a limitação aos conteúdos das mensagens e darem destaque
também aos efeitos causados pelos aspectos significantes dos meios em si, que deveriam
ser observados como uma nova linguagem que transforma a cultura.
A ideia de que os objetos, dentre eles as tecnologias de comunicação (os meios),
também atuam nas interações, configurando-as e interferindo no modo como os sujeitos
são construídos socialmente, encontra eco nos pressupostos da Teoria Ator-Rede (TAR),
ANT em inglês. A TAR surgiu nos anos 1980, com a proposta do estudo das associações
entre aspectos heterogêneos – tecnológicos, legais, organizacionais, políticos e
científicos.
Na TAR, os objetos, assim, nem sempre podem ser tomados como meros
intermediários neutros nas associações com os humanos, como as primeiras teorias da
comunicação chegaram a caracterizar o canal ou suporte. Quando interferem na ação,
como atores, os objetos tornam-se mediadores. Da mesma forma, para a TAR, as
instituições são resultado de associações sociotécnicas, “[...] são papéis, ordenados mais
ou menos precariamente segundo certos padrões, desempenhados por pessoas, máquinas,
textos, prédios [...]. Assim, quando a teoria ator-rede explora o caráter de uma
15
organização, ela o trata como um efeito ou uma consequência – o efeito da interação entre
materiais e estratégias da organização.” (LAW, 1992, p. 5-9).
Desta forma, uma organização jornalística está sempre em transformação,
sofrendo a influência dos actantes humanos e materiais de seus processos de
agenciamento sociotécnico. A mudança em um dos elementos de sua atuação, como uma
tecnologia, altera o processo todo, em uma perspectiva alinhada com a TAR.
Ao pensar os meios como extensões humanas, McLuhan estava atribuindo às
tecnologias o seu caráter humano, social (STRATE, 2008), em uma perspectiva que pode
muito bem ser aproximada dos pressupostos básicos da TAR, como já tentado por Stalder
(1997).
A aproximação entre as duas perspectivas teóricas, no entanto, não é consensual.
André Lemos (2012) defende que a TAR pode ser considerada herdeira da teoria
ecológica de McLuhan, mas ressalva que a teoria das associações vai além, em função do
papel atribuído aos atores não humanos nos agenciamentos entre sujeitos e tecnologias.
A novidade da TAR em relação à noção mcluhaniana de extensões estaria na ênfase dada
à equidade entre actantes humanos e não humanos.
Segundo Lemos (2012), a ideia de extensão coloca os meios como objetos
exteriores aos sujeitos, enquanto em Latour (2008) não existe relação hierárquica entre
eles: todos são híbridos. O autor ressalva, ainda, que a ideia de extensão seria insuficiente
para explicar a hibridização que ocorre entre humanos e tecnologias na constituição do
social.
Ainda que seja pertinente a ressalva dada por Lemos em sua leitura da TAR, pode-
se defender que McLuhan não foi, assim, tão impreciso ao utilizar a metáfora da extensão
e, por isso, pode-se partir de sua ideia de medium para compreender as associações que
ocorrem, na atualidade, entre as organizações jornalísticas e as denominadas mídias
sociais digitais.
A ideia de extensão, em McLuhan, não diz respeito a um entendimento de meio
como canal neutro utilizado para difusão das mensagens, mas a um mediador que, ao
intermediar, interfere nos processos comunicacionais, junto com a ação dos atores
humanos. Na perspectiva da ecologia dos meios, as tecnologias também só adquirem o
caráter de meios/mídias a partir das associações entre suas potencialidades tomadas como
16
produtos sociotécnicos e os usos dados pelos usuários em determinados contextos. Nem
sujeitos humanos nem objetos técnicos são neutros ou predeterminados; tudo depende do
contexto em que eles se encontram e se associam.
A ideia de que os actantes humanos e não humanos são híbridos, defendida pela
TAR, está subentendida em McLuhan quando afirma que o conteúdo de um meio é
sempre outro meio e seus usuários – ou seja, este conteúdo manifesta-se no agenciamento
entre actantes humanos e não humanos, gerando gramáticas e lógicas próprias, resultados
dessas associações.
A noção de gramática aproxima-se da ideia de protocolo cultural proposta pela
historiadora da mídia Lisa Gitelman (2006). Em sua definição, os meios são compostos
por estruturas com suas formas tecnológicas e seus protocolos associados, por meio dos
quais a comunicação é uma prática cultural. Assim, protocolos expressam relações
sociais, econômicas e materiais que se relacionam a um meio.
Algumas tecnologias de comunicação, no entanto, atuam apenas na distribuição
ou armazenamento de conteúdos, como uma antiga fita K7 ou um player de VHS, ou
mesmo um pendrive. Essas tecnologias, ainda que associadas à comunicação, podendo
ser atuantes em uma associação sociotécnica, interferindo nas relações, em geral não
chegam a constituir-se em meios, no sentido mcluhaniano, por não contarem com
protocolos culturais mais complexos.
Por envolver protocolos culturais de uso social, os meios possuem maior
importância histórica, chegando a representar rupturas na sociedade, como foi com a
imprensa (considerada a máquina que criou a modernidade), o telégrafo (ao qual se atribui
a invenção do lead do jornalismo), o cinema, a fotografia, rádio e a televisão
(responsáveis pela constituição de uma sociedade de consumo massivo), e atualmente
com a internet e as tecnologias digitais (que vem reconfigurando a sociedade em diversos
aspectos).
17
Trajetórias da Sublimação sob a Midiatização e o
Neoliberalismo
Matheus Cornely Sayão Faculdade Cásper Líbero
RESUMO EXPANDIDO
OBJETIVOS
A proposta do artigo é discutir o conceito de sublimação, tal como proposto em Sigmund
Freud e Jacques Lacan, dentro de um contexto de avanço dos processos de midiatização
e avanço do capitalismo cultural neoliberal. Partindo de autores como Louis Althusser,
Gilles Lipovetsky, Jurgen Habermas e Jean Baudrillard, a investigação se focará em ver
os caminhos ou descaminhos da sublimação nos sujeitos sob a midiatização.
Palavras-chave: sublimação; Lacan; Baudrillard; midiatização; neoliberalismo;
capitalismo; McLuhan; Althusser
1. Introdução
Na metade do século 20, o avanço do neoliberalismo propulsiona uma nova forma
de relacionamento com o mercado (uma produção não mais pensada para as massas, mas
para os diversos nichos). Essa nova relação, por sua vez, é sina do avanço de um certo
modelo de capitalismo - o cultural, e tem, sem dúvidas, suas primeiras teorizações
lançadas na Escola de Frankfurt por Theodor Adorno e por Walter Benjamin.
O caminho do rádio, à TV e à Internet marca o avanço de uma midiatização parcial
para uma midiatização quase total ou totalizante dos modos de viver, podendo explicar
desde a perda da aura em A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica, de Benjamin
ao momento histórico de Simulacros e simulação, de Jean Baudrillard, com sua teoria do
mundo substituído pelo signo do mundo, de uma hiperrealidade que denuncia um
processo de semiologização do mundo. Aliás, a midiatização como processo totalizante
trata-se exatamente dessa capacidade de semiologizar identidades, vozes, performances,
modos de encadeamento dos significantes e as próprias relações sociais.
Dentro desse contexto - e com a aceleração da lógica da hiperrealidade por conta
da ascensão da internet -, olhando para as dificuldades na construção de um objeto
18
sublime do século XXI, adentramos a necessidade de se olhar mais a fundo para os
obstáculos de um processo de sublimação entre o neoliberalismo e a midiatização da
hipermodernidade.
2. Percurso
Como primeiro passo para desenvolver esse trabalho, foi necessário pensar nos
vários conceitos de midiatização mais interessantes dentro do meio acadêmico, buscando
um que possibilitasse uma ponte para explicar uma relação entre midiatização e
inconsciente. No caso, recorri sobre as várias definições de midiatização no livro
Mediação & midiatização, de Maria Ângela Mattos, Jeder Janotti Junior e Nilda Jacks -
um estudo “compilatório” e também de proposição teórica sobre o assunto.
De lá, pude partir, então, para Marshall McLuhan, Walter Benjamin e o projeto
de pesquisa “Mundos Midiatizados” da Universidade do Bremen, Alemanha. Essas três
concepções de midiatização tinham, ao meu ver, uma ponte de semelhança em suas
afirmações: a de que a midiatização altera o habitus dos sujeitos conforme sua linguagem
- não de uma forma hipodérmica, é claro.
A partir disso, era necessária uma teoria sólida para entender o porquê dessa
colonização imaginária das performances, da linguagem, da estética etc; ou seja, a busca
por uma teoria da ideologia que não se privasse apenas no olhar da ideologia enquanto
um conjunto de ideias. O livro Aparelhos Ideológicos de Estado, de Louis Althusser,
tinha, nesse sentido, um caminho: propor a ideologia como algo que tem uma origem
material, usando, para isso, a teoria do Estágio do Espelho, desenvolvida por Jacques
Lacan em sua tese de Doutorado.
Althusser afirma que “a ideologia é uma representação da relação imaginária dos
indivíduos com suas condições reais de existência” (1985, p.85) e, com essa adição do
imaginário, ou seja, do estágio do espelho, torna possível pensar a práxis enquanto
também capaz de exprimir a ideologia. Essa formulação destrói a cisão entre práxis e
ideia, que era a base das primeiras teorias da ideologia, em que a ideologia era “pura
ilusão, puro sonho, ou seja, nada” (1985, p. 83). Em outras palavras, que a ideologia era
apenas uma ideia que escondia uma realidade obscena, escondendo-a dos olhos de todos.
19
Enfim, depois de definir um conceito de midiatização para ser a base dos estudos,
depois de definir uma teoria da ideologia que fosse capaz de associar a midiatização com
uma certa práxis e um certo modo de pensar, o momento é o de pensar no conceito de
sublimação, em Freud e em Lacan, aplicado sobre o sujeito midiatizado. De forma
resumida, a sublimação se trataria da satisfação parcial de um desejo recalcado a partir de
um rearranjo do mesmo que o possibilita ser saciado e inserido na civilização (ou no
grande Outro). Ela é a proposta maior do tratamento psicanalítico e, também, o motor da
arte, das rupturas sociais.
Dentro desses limites colocados, o que falta no artigo é a sua conclusão: um estudo
detalhado dos caminhos e descaminhos do processo de sublimação nesse contexto de
reificação da própria linguagem e de um controle totalizante das próprias formas de
saciação e produção dos desejos. Em outras palavras, há espaço para a sublimação?
REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor W. Indústria cultural e sociedade. Paz e Terra, 2007.
ALTHUSSER, Louis. Aparelho ideológico do Estado. Rio de janeiro: Graal, 1983.
BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulação, trad. Maria João da Costa Pereira.
Lisboa, Relógio D’agua, 1991
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica [1935]. In. _.
Magia e técnica, arte e política, 1985.
CRUXÊN, Orlando Soeiro. A sublimação. Zahar, 2004.
FREUD, S. 1996). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Obras completas, v. 7,
1905.
FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos - parte I e II. São Paulo: Ed. Escala, 2011
FREUD, Sigmund. Esboço de psicanálise. Imago, 1998.
FREUD, Sigmund. O Ego e o Id. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago. 2006.
Originalmente publicado em 1923
20
FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Obras Completas, Ed. Standard
Brasileira, vol. XXI, Rio de Janeiro, Imago, 1980.
LACAN, Jacques. O Seminário, livro 6 – o desejo e sua interpretação. Rio de Janeiro:
Ed. Zahar. 2016.
LACAN, Jacques. O Seminário, livro cinco – As formações do inconsciente. Rio de
Janeiro: Ed. Zahar, 1999
LACAN, Jacques. Seminário, livro 7 – a ética da psicanálise. Rio de Janeiro: Ed. Zahar,
1998
MATTOS, Maria Ângela; JANOTTI JUNIOR, Jeder; JACKS, Nilda. Mediação &
midiatização. 2012.
MCLUHAN, Herbert Marshall. The medium is the massage. 1967. 1996.
MCLUHAN, Marshall. Understanding media: The extensions of man. MIT press, 1994.
ZIZEK, Slavoj. Como ler Lacan. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2010
21
Método fenomenológico: conceitos e abordagens na pesquisa
em comunicação
Patrícia Ruas Dias
Paola Marcon
Carlos Roberto Gaspar Teixeira
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
RESUMO EXPANDIDO
O presente artigo tem por objetivo compreender como a abordagem fenomenológica pode
ser utilizada como método de pesquisa científica na área da comunicação. Através de
revisão bibliográfica e documental reunimos diferentes linhas de pensamento sobre a
fenomenologia, como os autores Husserl, Heidegger e Merleau-Ponty. Por suas origens
filosóficas, este método proporciona liberdade para diferentes aplicações, que podem
variar muito a cada pesquisa. A abordagem fenomenológica e a técnica comparativa
foram combinadas e aplicadas para dar rigor científico a uma pesquisa que pretende
compreender como ocorre a participação do público no Jornal Hoje, e no Jornal da
Cultura.
Palavras-chave: Fenomenologia; método fenomenológico; pesquisa científica;
comunicação.
INTRODUÇÃO
Os estudos metodológicos são importantes por serem a espinha dorsal de um
trabalho acadêmico. A metodologia escolhida organiza e sistematiza da melhor maneira
como determinada pesquisa científica deve ser conduzida, auxiliando o pesquisador a
chegar aos resultados e analisar de forma adequada o seu objeto. Este trabalho, através de
revisão bibliográfica e documental, compreendendo a necessidade de melhores
esclarecimentos sobre a fenomenologia, objetiva organizar de forma esclarecedora as
teorias Transcendental, Hermenêutica e Existencial, de acordo com os autores Husserl,
Heidegger e Merleau-Ponty, além de explicitar aplicações e alguns aspectos positivos e
negativos sobre o uso desta metodologia.
O método fenomenológico desvela as diretrizes para que os fenômenos ou objetos
sejam explicados de forma essencial e intrínseca. Para que isso ocorra é necessário que o
pesquisador una diferentes técnicas, de acordo com o que está sendo estudado, para dar
22
suporte à investigação. Por isso é preciso compreender as diferentes linhas da
fenomenologia, para perceber a dimensão do ser empregada em cada uma.
LINHAS TEÓRICAS
Husserl, com a teoria transcendental, critica o tratamento dado à fenomenologia
como se fosse um objeto físico, confundindo as causas dele com a própria natureza. As
matemáticas ou a lógica, que não precisam de análise, de experiências, não podem ser
aplicadas às ciências empíricas, que não tem resultado perfeito e igual. Ele concebe essa
ciência como pensar de acordo com a sua natureza e com suas características. O princípio
da teoria é que o fenômeno está penetrado no pensamento, e esse pensamento só é exposto
através do fenômeno.
A questão de Heidegger, com a teoria existencial e hermenêutica, não é outra se
não o ser, e se, este ser homem é descrito e analisado, isso se deve somente ao fato de que
no homem se situa o lugar e consequentemente, onde o ser se revela (DARTIGUES,
1973). A fenomenologia como ciência do ser, busca estudar e se aprofundar na essência,
sentido e relações deste ser. Esta investigação está fundamentada na interpretação, na
medida em que se desvendam os sentidos e estruturas do ser, abre-se um horizonte de
possibilidades, que Heidegger define como “hermenêutica da pre-sença” (HEIDEGGER,
1989).
O ser e o mundo estão diretamente ligados na Fenomenologia da percepção de
Merleau-Ponty (1945). Para o filósofo francês Maurice Merleau-Ponty (2006, p. 1), a
fenomenologia pode ser compreendida como “um relato do espaço, do tempo, do mundo
‘vividos’”, ou ainda como o estudo de duas essências: a essência da percepção e a essência
consciência. Tudo que é percebido pela consciência pode ser considerado um fenômeno
passível de ser observado: “mas a fenomenologia é também uma filosofia que repõe as
essências na existência, e não pensa que possa compreender o homem e o mundo de outra
maneira senão a partir de sua ‘facticidade’” (2006, p. 1).
APLICAÇÃO DO MÉTODO FENOMENOLÓGICO
Este trabalho dedicou-se a explorar fenômenos resultantes de avanços
tecnológicos recentes. Isso inclui as redes sociais na internet e os usos sociais por
23
dispositivos eletrônicos digitais, como celulares e computadores. Paralelamente foram
explorados os formatos dos telejornais brasileiros para que possamos questionar, em
primeiro lugar, se existe algum impacto sendo exercido entre tais mídias motivadas por
mudanças no comportamento de seus públicos. Em segundo lugar, para que possamos
identificar no contexto contemporâneo que impactos poderiam ser estes. Para formatar tal
trabalho em uma obra de rigor científico delimitamos para análise dois telejornais: O
Jornal Hoje, e o Jornal da Cultura, os sites oficiais e contas mantidas no Facebook e no
Twitter por ambos os telejornais.
Estas delimitações de objetos de estudo deram início à formatação do trabalho em
uma estrutura que possibilitasse as investigações com objetivo de construir conhecimento
científico, ou seja, possibilitando análises sistematizadas por métodos empíricos. Para
isso, foi selecionado um método e técnicas para conduzir a pesquisa. Como base lógica
para as investigações propostas neste trabalho, considerando os usos das redes sociais e
o telejornalismo como fenômenos que possibilitam sua observação, categorização e
análise, foi selecionado o método fenomenológico como método de abordagem. A
escolha deste método se justifica, primeiramente pelo fato do presente trabalho não
intencionar a explicação de nenhum fenômeno através de leis pré-delimitadas. Além
disso, não se pretende fazer nenhuma dedução baseada em princípios estabelecidos,
considerando apenas o que é visto, ou seja, o que é transmitido pelos telejornais e o que
pode ser acompanhado através de publicações dos usuários nas redes selecionadas,
exatamente como sintetizam os autores: “A fenomenologia não se preocupa, pois, com
algo desconhecido que se encontre atrás do fenômeno; só visa o dado, sem querer decidir
se esse dado é uma realidade ou uma aparência” (PRODANOV; FREITAS, p. 35).
A metodologia de procedimentos técnicos utilizada para realizar a pesquisa é
classificada como método comparativo, por este possibilitar a análise de fenômenos
concretos “com vistas a ressaltar as diferenças e as similaridades entre eles”
(PRONADOV; FREITAS, 2013, p. 38). Baseado neste método foi traçado um plano com
as seguintes fases para a condução e execução da pesquisa: pré-análise para definição de
objetos e redes; construção do referencial teórico com pesquisa bibliográfica e
documental; coleta/tabelamento, cruzamento e análise de dados e considerações finais. A
necessidade de cruzamento de dados também justifica o método comparativo:
Centrado em estudar semelhanças e diferenças, esse método realiza
comparações com o objetivo de verificar semelhanças e explicar divergências.
O método comparativo, ao ocupar-se das explicações de fenômenos, permite
24
analisar o dado concreto, deduzindo elementos constantes, abstratos ou gerais
nele presentes. (Prodanov e Freitas, 2013, p. 38).
Para a coleta de dados acompanhamos separadamente as transmissões dos dois
telejornais, de segunda a sábado, entre os dias 31 de maio e 06 de junho de 2014. No
mesmo período também observamos as atividades nos sites redes sociais nas páginas
oficiais no facebook e twitter (antes, durante e depois das transmissões dos telejornais).
As interações ou ausência delas constituíram os dados propriamente ditos, que
foram organizados em tabelas e classificados a partir do referencial elaborado com a
função de prover embasamento teórico referente aos temas e fenômenos analisados. Os
fenômenos registrados foram relacionados com os seguintes conceitos, discutidos no
referencial teórico: interação mútua e reativa; práticas de gatekeeping e gatewatching;
narrativas transmedia e crossmedia.
CONSIDERAÇÕES
Este método apresenta algumas vantagens e desvantagens em relação à sua
aplicação. Como vantagens pode-se destacar a flexibilidade, por ele desvelar as essências
dos fenômenos. O pesquisador, ao optar por uma abordagem fenomenológica, deve se
apropriar e compreender as essências da fenomenologia. Sendo assim, ele é livre para
escolher e utilizar técnicas metodológicas que complementem sua investigação. Como
principal desvantagem, pode-se sublinhar a questão de cunho filosófico que se baseia este
método, fazendo com que ele seja pouco explorado, talvez por não ser de conhecimento
geral determinadas teorias.
Assim, pode-se considerar que o método fenomenológico pode ser bastante
adequado a alguns estudos científicos da área de comunicação, por levantar detalhes
essenciais de fatos que levam a fenômenos importantes para o campo. Detalhar e
aprofundar estudos, de modo a saber quais os elementos íntimos, pode gerar uma melhor
compreensão, tanto do fato como do ser.
A aplicação da abordagem fenomenológica com a técnica comparativa conduziu
a análise dos telejornais, realizada a partir de uma correlação entre os fenômenos
registrados e os conceitos reunidos previamente no referencial teórico. O cruzamento dos
dados coletados possibilita compreender se e como os fenômenos se estabelecem na
25
prática dos telejornais. A última fase do trabalho foi a conclusão que, resultando da
análise dos dados coletados, tenta compreender como ocorre a participação do público no
telejornalismo através da internet.
REFERÊNCIAS
DARTIGUES, A. O que é a fenomenologia? São Paulo: Ed Moraes, 1973.
____. ____. São Paulo: Centauro, 2005.
HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução de Márcia Sá Cavalcante Schuback. 3.
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1989.
HUSSERL, E. (2002). A crise da humanidade européia e a filosofia. Introdução e
tradução Urbano Zilles. – (2 ed.) Porto Alegre:ECUPUCRS.
____. Meditações Cartesianas. São Paulo: Abril Cultural, 1980.
GIL, Antônio Carlos. Metodos e tecnicas de pesquisa social. 6. ed. Sao Paulo: Atlas,
2008.
____. O projeto na pesquisa fenomenológica. Anais IV SIPEQ, 2010. Disponível em:
http://www.sepq.org.br/IVsipeq/anais/artigos/44.pdf.
MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. Trad. Carlos Alberto R. de
Moura. 3. ed. São Paulo:Martins Fontes, 2006
PRONADOV, C, C; FREITAS, C, F. Metodologia do trabalho científico [recurso
eletrônico] : métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo
Hamburgo: Feevale, 2013. Disponível em:
http://docente.ifrn.edu.br/valcinetemacedo/disciplinas/metodologia-do-trabalho-
cientifico/e-book-mtc.
26
Midiatização, um conceito plurívoco
Pedro Gilberto Gomes
Evelin de Oliveira Haslinger
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
RESUMO EXPANDIDO
RESUMO: A proposta do presente texto resulta da experiência de pesquisa intitulada
“Plurivocidade do conceito de midiatização”, realizada âmbito do Programa de Pós-
Graduação em Comunicação da Unisinos e financiada pelo CNPq, no período de
2013/2016. O projeto objetivou trabalhar a compreensão do conceito de midiatização,
fazendo um diretório de suas diversas conceituações, tanto no Brasil como na América
Latina, América do Norte e Europa. Parte do princípio de que este conceito não é unívoco
e um primeiro passo para delimitá-lo é fazer um levantamento das diversas significações.
A midiatização tornou-se cada vez mais um conceito-chave, fundamental, essencial para
descrever o presente e a história dos meios e a mudança comunicativa que está ocorrendo.
Desse modo, se se tornaram parte do todo, não se pode vê-los como uma esfera separada.
É necessário desenvolver uma compreensão de como a crescente expansão dos meios de
comunicação muda nossa construção da cultura, da sociedade e das diferentes práticas
sociais. Nessa perspectiva, a midiatização é usada como um conceito para descrever o
processo de expansão dos diferentes meios técnicos e considerar as interrelações entre a
mudança comunicativa dos meios e a mudança sociocultural. A questão da midiatização,
consequentemente, foi se afirmando na sociedade, tanto no âmbito nacional como
internacional, como um objeto fundamental para o trabalho dos pesquisadores que atuam
na área da comunicação. Pesquisadores de muitas escolas e das mais variadas regiões
geográficas, por caminhos diversos e com pontos de partida distintos, arribaram à praia
da midiatização como um conceito fundante para a compreensão do que está acontecendo
hoje na sociedade. Até agora, contudo, os estudos sobre midiatização ocuparam-se com
as transformações sociais e culturais nas culturas e sociedades ocidentais. Entretanto, o
processo de midiatização também se manifesta (torna-se visível) noutras partes do
mundo, exibindo diferentes dinâmicas e possuindo outras consequências em diferentes
contextos sociais e culturais. Será que a midiatização constitui um processo global de
mudança? Em caso afirmativo, pergunta-se: onde estão localizadas as desigualdades e as
dissemelhanças desse processo? Como a midiatização não se apresenta da mesma forma
27
para todos e em todos os lugares, podem existir diferenças e semelhanças entre as culturas
e nações em processo de midiatização. Por isso, ela participa da comparação entre os
meios e as pesquisas sobre comunicação, não somente no momento atual, mas também
numa perspectiva histórica. É fundamental que se pense que diferenças transcultural e
transnacional existem e como compará-las entre si. Aqui há o desafio de realizar um
trabalho comparativo para separar os diferentes aspectos da midiatização. Neste trabalho,
vamos utilizar o conceito de “midiatização” como um paradigma para analisar e
compreender a realidade contemporânea. Há um processo novo, por meio da proliferação
das mídias sociais, potencializadas pela cultura digital, que resiste às abordagens setoriais,
até agora levadas a cabo pela academia. Impera a necessidade de um conceito que,
abrangente, consiga dar conta do que está acontecendo e possibilite uma abordagem
sistêmica para além dos meios particulares. Na nossa formulação, um paradigma que
torne possível uma reflexão metamidiática. Para tentar dar conta do comedido, realizamos
uma análise da realidade que abrange a explicitação da gênese do conceito. Após,
examinamos a realidade pensada antes da tematização desse conceito. Para isso,
retrocedemos aos anos de 1940, deixando-nos impregnar pelas reflexões do jesuíta
francês Pierre Teilhard de Chardin até os nossos dias. Finalizaremos com tentativa de
formular uma opinião preliminar para ser discutida nos diversos níveis da academia.
Pretende-se, em especial neste artigo, apresentar o conceito de midiatização e suas
múltiplas vozes, a partir da cartografia do conceito, bem como resultados encontrados ao
final da pesquisa.
Palavras-chave: Comunicação – Midiatização – Mapa sistêmico.
Referências
BASTOS, Marcos Toledo. Medium, media, mediação e midiatização. A perspectiva
germânica. In: MATTOS, Maria Ângela; JANOTTI JUNIOR, Jeder; JACKS, Nilda
(Orgs.). Mediação & Midiatização. Salvador: EDUFBA; Brasília: Compós, p. 53-78,
2012.
CHARDIN, Pierre Teilhard de. El Porvenir del Hombre. Madrid: Taurus, 1962.
Communication Research Trends. Theological and Religious Perspectives on
28
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FAUSTO NETO, Antônio (Org.). Midiatização e Processos Sociais – aspectos
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HJARDARD, Stig. The Mediatization of Culture and Society. London & New York:
Routledge, 2013. Tradução brasileira pela Editora da Unisinos, São Leopoldo, 2014.
HERMES - Une revue de l’Institut des sciences de la communication du CNRS (ISCC)
n.25 – Le dispositif – entre usage et concept (Numéro coordonné par Geneviève
JACQUINOT-DELAUNAY et Laurence MONNOYER), 1999.
MARCONDES FILHO, Ciro. Prefácio à edição brasileira. In: LUHMANN, Niklas. A
realidade dos meios de comunicação. São Paulo: Paulus, 2005.
MARTIN BARBERO, Jesus. Dos meios às Mediações. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ,
1997.
MATTOS, Maria Ângela; JANOTTI JUNIOR, Jeder; JACKS, Nilda (Orgs). Mediação
&Midiatização. Salvador: EDUFBA; Brasília: Compós, 2012.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São
Paulo: Cultrix, 1996.
REIS, Abel. Problematizando o conceito de bios midiático. In: Sessões do
Imaginário, ano 11, n. 15, 2006.
SODRÉ, Muniz. Antropológica do Espelho. Petrópolis: Vozes, 2010.
WOLF, Tom. Introdução. In: MCLUHAN, Marshall. McLuhnan por McLuhan. Rio de
Janeiro: Ediouro, 2005.
29
A construção do conhecimento no campo da comunicação: em
busca de conceitos e percepções na produção de conhecimento
na área de midiatização Rafael Francisco Hiller
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Palavras- chave: Midiatização, Epistemologia, Metodologia.
RESUMO EXPANDIDO
Este Trabalho procura realizar reflexões, bem como estimular discussões a nível
empírico e teórico no que concerne a produção de conhecimento na área da comunicação,
com foco nas pesquisas que envolvem o “processo de midiatização”.
A área de pesquisa em comunicação, assim como as demais áreas de pesquisa,
organiza os conhecimentos pesquisados por características temáticas. Sendo assim,
podemos dizer que a nossa pesquisa se desenvolve a partir de um eixo de reflexão
epistemológica. O termo epistemologia utilizado neste trabalho, não corresponde àquilo
que se entende por pesquisas epistemológicas no âmbito filosófico. Nesta perspectiva
filosófica, nossas perguntas seriam: o que é conhecimento? É possível conhecer? Quais
os limites do conhecimento?
Acionamos o conceito de epistemologia apenas para afirmar a intenção deste
trabalho de compreender como está ocorrendo a produção de conhecimento em pesquisas
realizadas na comunicação. Limitamo-nos neste trabalho a trazer proposições teóricas que
procuram desenvolver o conhecimento comunicacional - especialmente na área da
midiatização - assim como alguns acionamentos de tais proposições a serviço de
pesquisas empíricas.
Nesta pesquisa, nos propomos a refletir e fomentar discussões a nível empírico e
teórico no âmbito de pesquisas desenvolvidas na comunicação, com foco no “processo de
midiatização”, através de tensionamentos teóricos suscitados pelas dissertações que serão
selecionadas como materiais de análise desta pesquisa.
Nossa pesquisa se desenvolve dentro de um eixo de reflexão epistemológica, que
tem como questão de horizonte a seguinte pergunta:
Como o campo acadêmico da comunicação desenvolve percepções e elabora conceitos e
percepções em seu trabalho de produção de conhecimento na área de Midiatização?
30
Para respondermos ao problema de pesquisa proposto, necessitamos, além do
aporte teórico, de uma metodologia de trabalho no que tange a apreensão do objeto de
estudo. A metodologia desta pesquisa empírica, de formal geral, é fundamentada em
análises de dissertaçõesde acadêmicos das ciências comunicacionais compondo um
corpus específico. A pesquisa se propõe a analisar dissertações que acionam aspectos da
problemática dos processos de Midiatização.
Este trabalho parte de uma análise das construções conceituais elaboradas por
pesquisadores durante a construção de suas pesquisas. A análise empírica se dará através
da realização de uma leitura focal sobre as estruturas argumentativas que estão sendo
utilizadas durante o processo de construção teórica dos trabalhos. Pois é nas estruturas
argumentativas dos artigos e teses que buscaremos indícios no que diz respeito a
identificação de como o campo acadêmico da comunicação, mais especificamente à área
da midiatização, vem elaborando conceitos e percepções em seu trabalho de produção de
conhecimento.
Especificamente, nossa investigação, é um estudo de caso de determinadas
produções, na linha de Pesquisa “Midiatização e Processos Sociais, do PPG em Ciências
da Comunicação da Unisinos. Procuramos investigar uma pequena parte da produção
teórica do campo da comunicação. Analisamos a produção teórica de quatro docentes;
observando ainda (e apenas) quatro dissertações que acionam alguns dos conceitos
propostos por estes docentes. A pesquisa não se propõe a investigar a produção teórica
completa dos quatro docentes, mas apenas um conjunto restrito, selecionado, de alguns
conceitos.
A partir da nossa questão de horizonte:Como o campo acadêmico da comunicação
desenvolve percepções e elabora conceitos e percepções em seu trabalho de produção de
conhecimento na área de Midiatização?Podemos elencar algumas perguntas específicas
de investigação, isto é, aquilo que desejamos descobrir/perceber no nosso conjunto
específico de textos. Abaixo seguem as perguntas específicas propostas:
1) Como as proposições são “testadas” pelos acionamentos feitos nas
dissertações examinadas?
2) Que processo é esse de produzir conhecimento pelo debate?
31
Os dados empíricos analisados foram de fundamental importância, na produção
de considerações para a tentativa de respostas para o problema proposto pela nossa
pesquisa. Ao confrontarmos os aportes teóricos selecionados para a realização desta
pesquisa com os dados observados, é de se esperar que surjam descobertas em nível de
acréscimos conceituais para a área que até então não tenham sido explicitados. Tais
configurações devem, antes de tudo, vir a somar no que tange ao surgimento de novas
matrizes conceituais relativas ao fenômeno da midiatização, bem como o entendimento
da produção de conhecimento nas pesquisas que assumem aspectos da problemática dos
processos de midiatização.
O corpus empírico selecionado apresentou excelentes questões de ordem reflexiva
relativas à indagação proposta por esta pesquisa. Tais materiais foram escolhidos em
função de acionarem conceitos do campo de estudo da midiatização social. Esta
especificidade gera um conjunto de observáveis empíricos com grande potencialidade
para suscitar reflexões e propostas para o nosso problema de pesquisa, e como um
possível gerador de encaminhamentos para o mesmo.
Torna-se necessário tecer alguns comentários a respeito do percurso metodológico
solicitado pelo problema de pesquisa que guiou a produção desta dissertação.
Nosso método procurou articular reflexões teóricas desenvolvidas por
pesquisadores da área de midiatização com descobertas realizadas na análise de
dissertações de discentes. Primeiramente, desenvolvemos um trabalho de descrição das
pesquisas desenvolvidas no campo da midiatização até o presente momento dando ênfase
maior para as elaborações conceituais desenvolvidas na linha IV de pesquisa. Em segundo
momento nos propusemos a efetuar sínteses e inferências a respeito das elaborações
conceituais desenvolvidas nas pesquisas em midiatização. O terceiro momento se
caracteriza pela análise de quatro dissertações de discentes do PPG em Comunicação-
Unisinos, discentes que acionam as elaborações conceituais desenvolvidas por
pesquisadores da comunicação, em especial dos docentes do referido programa. O quarto
e último movimento do nosso método foi analisar o movimento de passagem das
elaborações conceituais realizadas pelos pesquisadores da área até o acionamento dos
mesmos nas dissertações analisadas.
Utilizando deste método de abordagem creio que logramos êxito em responder a
questão de horizonte proposta neste trabalho. Analisando o movimento de passagem
32
conceitual referido acima conseguimos ter um bom panorama de como o campo da
comunicação, mais especificamente a área de midiatização, vem construindo o seu
conhecimento, e ao diagnosticarmos os movimentos conceituais que estão sendo
utilizados na produção de conhecimento podemos realizar problematizações de tais
movimentos, bem como sugerir respostas aos supostos problemas encontrados nos
mesmos.
33
Comunicação, nova engenharia social
Notas sobre a desrealização do tempo como espaço de
alteridade do campo comunicacional
Tiago Quiroga Universidade de Brasília
RESUMO EXPANDIDO
A midiatização como nova dimensão organizativa da comunicação, fundada no
hibridismo comunicação-informação, não apenas realça os interesses em torno de sua
constituição como um campo específico de conhecimento, como acaba por inviabilizar
qualquer possibilidade de sua compreensão segundo os pressupostos da autonomia dos
campos sociais. A questão advém do duplo acontecimento introduzido pela sociedade do
conhecimento que, por um lado, instaura e reconhece, na mencionada dimensão
organizativa, um saber decisivo ao funcionamento social, e, por outro ‒ quando a integra
aos regimes da informação, em especial aos fluxos da velocidade ‒, parece lhe retirar
qualquer ontologia de maior envergadura. Inicialmente restrita ao fenômeno da
comunicação em si, a questão se estende às teorias, que acabam por ter subsumidas de
suas atividades qualquer duração de tempo que lhes permita algum recuo diante da
velocidade intermitente de um presente sempre acessível, bem como destituído de
qualquer destino. Pretende-se investigar em que medida, como desdobramento direto
dessa nova subjetividade maquínica, em que o sujeito encontra-se virado para fora e o
conhecimento atrelado ao fluxo ininterrupto do tempo real, não seria a própria imanência
do tempo, como espaço de constituição do princípio de autodeterminação humana,
fundamental às ciências sociais, decisivo ao preceito de autonomia dos campos, que
estaria propriamente desaparecendo. Por isso o estudo da desrealização do tempo como
espaço de alteridade das ciências da comunicação.
Autonomia; Tempo; Velocidade; Emancipação; Alteridade.