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EXTINÇÃO DAS SOCIEDADES: a dissolução e liquidação das sociedades comerciais, interacções com o código de insolvência e recuperação de empresas, com o código de processo civil.
A REVISÃO E CERTIFICAÇÃO LEGAL DAS CONTAS.
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I. IntroduçãoAs alterações ao Código das Sociedades Comerciais (CSC), a
introdução do Regime Jurídico dos Procedimentos Administrativos
de Dissolução e de Liquidação de Entidades Comerciais (RJPADL),
pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março e a sua respectiva
articulação com as regras constantes do Código de Insolvência e
Recuperação de Empresas (CIRE) e com o Código de Processo Civil
(CPC), nomeadamente no Capítulo XV – Da Liquidação de
Patrimónios, tornam relevante tecer algumas considerações para
clarificar o que acontece às sociedades comerciais e às sociedades
civis sob a forma comercial, designadas em conjunto por sociedades,
nesse ínterim.
As sociedades adquirem personalidade jurídica e existência como
tal, a partir data do registo definitivo do contrato pelo que se
constituem, sem prejuízo do disposto quanto à constituição de
sociedades por fusão, cisão ou transformação de outras (artigo 5.º
do CSC).
Após constituírem-se são várias as vicissitudes que as podem afectar
até à respectiva extinção: mera alteração do contrato pelo qual se
regem, entrada e saída de sócios, aumento e redução do capital
social, cisão, fusão, transformação, dissolução e liquidação.
As sociedades só deixam de gozar de personalidade jurídica e de
existirem como tal, após o registo do encerramento da liquidação
(artigo 160, n.º 2 do CSC), sendo a dissolução uma fase necessária
e prévia à liquidação.
II. Dissolução das sociedadesAs sociedades podem dissolver-se nos casos previstos no contrato
ou pacto social e ainda:
a) pelo decurso do prazo fixado no contrato;
b) por deliberação dos sócios, neste caso independentemente de
causa, sendo efeito da mera vontade dos sócios;
c) pela realização completa do objecto contratual;
d) pela ilicitude superveniente do objecto contratual;
e) pela declaração de insolvência da sociedade (artigo 141.º, n.º 1 do
CSC), casos que se designam de “dissolução imediata”. Neste caso
a sociedade considerar-se-á dissolvida após o trânsito em julgado
da sentença que declare a sociedade insolvente.
A verificação dos factos referidos em a), c) e d), permite aos sócios
deliberar o reconhecimento da dissolução, por maioria simples dos
votos produzidos na assembleia geral ou, ainda, a qualquer sócio
promover a justificação notarial, nos termos do artigo 94.º e seguintes
do Código do Notariado (CN) ou o procedimento simplificado de
justificação, previsto no artigo 79.º-A do Código de Registo Comercial
(CRCom). Estes são meios que a lei confere para tornar certa a
dissolução, sem contudo prejudicar a eficácia imediata das referidas
causas1. Contudo, não é obrigatório que os sócios e as demais pessoas
com legitimidade nos termos do n.º 2 do artigo 141.º do CSC utilizem
esses meios, “nada impedindo que os órgãos da sociedade e os sócios
Claudia Cunha ASSESSORA JURÍDICA
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procedam em consonância com a situação de sociedade dissolvida, criada por força da causa de dissolução imediata2. Assim ainda que os sócios recorram aos meios de reconhecimento de dissolução, a sua eficácia ou o momento da dissolução ocorre com a verificação da causa. A deliberação dos sócios, a reconhecer uma destas causas de dissolução, não é semelhante à acima referida dissolução por deliberação dos sócios, a qual é em si a causa de dissolução e que está sujeita a diferentes maiorias, consoante o tipo de sociedade, o que veremos mais adiante.
Pode ainda ser requerida pelas sociedades, pelos respectivos sócios, pelos credores das sociedades ou pelos credores dos sócios a dissolução administrativa das mesmas, ficando sujeita a procedimento próprio, com fundamento em facto previsto na lei e quando:
a) por período superior a um ano, o número de sócios for inferior ao mínimo exigido por lei, sem prejuízo das excepções previstas no CSC;
b) a actividade que constitui o objecto comercial se torne de facto impossível;
c) a sociedade não tenha exercido qualquer actividade durante dois anos consecutivos;
d) a sociedade exerça de facto uma actividade não compreendida
no objecto contratual, (artigo 142.º, n.º1 do CSC).
A ocorrência de qualquer um dos referidos fundamentos permite
que os sócios deliberem, por maioria absoluta dos votos expressos
em assembleia geral, a dissolução da sociedade, considerando-se
a sociedade dissolvida na data da deliberação ou se a deliberação
for impugnada, na data do trânsito em julgado da sentença (artigo
142.º, n.º3 e 4 do CSC). Seguindo-se o procedimento de dissolução
administrativa, o qual é regulado em diploma próprio (RJPADL) é
lavrado oficiosamente o registo da pendência da dissolução,
reportando-se a este momento os efeitos dos registos que venham
a ser lavrados na sequência do procedimento (artigo 6.º, n.º1 do
RJPADL) e lavrando-se oficiosamente registo da dissolução quando
a decisão de declaração de dissolução se torne definitiva (por já não
ser possível a sua impugnação judicial - prazo de dez dias após a
notificação da decisão), como determinam os artigos12.º e 13.º do
RJPADL. Também esta deliberação dos sócios não se deve confundir
com a deliberação causa imediata de dissolução, a qual está sujeita
a diferentes maiorias, consoante o tipo societário.
Esquematiza-se as maiorias exigidas para as diferentes deliberações
de dissolução das sociedades, no quadro que se segue:
DIREITO
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O serviço de registo competente pode ainda instaurar oficiosamente
procedimento administrativo de dissolução, caso ainda não tenha
sido iniciado voluntariamente pelos interessados, nas seguintes
circunstâncias:
a) durante dois anos consecutivos, a sociedade não tenha procedido
ao depósito dos documentos de prestação de contas e a
administração tributária tenha comunicado ao serviço de registo
competente a omissão de entrega da declaração fiscal de
rendimentos pelo mesmo período;
b) a administração tributária tenha comunicado ao serviço de
registo competente a ausência de actividade efectiva da sociedade,
verificada nos termos previstos na legislação tributária;
c) a administração tributária tenha comunicado ao serviço de
registo competente a declaração oficiosa de declaração da cessação
de actividade, nos termos previstos na legislação tributária.
Por “actividade efectiva” deve entender-se a actividade económica
que é ou pode ser objecto da sociedade, aferida através do seu
objecto social, não sendo de excluir a actividade que constitua
objecto de facto. O cumprimento de obrigações legais (eleição de
gerentes ou administradores, elaboração de balanço, apresentação
de contas, pagamento de impostos) não permite necessariamente
concluir que a sociedade se mantém activa.3
O artigo 83.º do Código de Processo e Procedimento Tributário
(CPPT) prevê que no caso de sociedades, cuja declaração de
rendimentos evidencie que não desenvolveram actividade efectiva
por um período de dois anos a administração tributária comunica
tal facto à conservatória de registo competente, com vista para
efeitos de instauração do procedimento administrativo oficioso. E
o n.º3 do referido artigo acrescenta que não se considera exercício
da actividade a mera emissão directa ou indirecta de facturas a
utilizar por terceiros, sem que a causa da emissão tenha sido qualquer
operação económica comprovada.
Além das causas acima referidas, comuns a todo o tipo de sociedades,
existem ainda causas especiais para os diferentes tipos de sociedade:
- o artigo 195.º do CSC prevê que as sociedades em nome colectivo
podem ser dissolvidas: i. a requerimento do sucessor do sócio falecido,
se a liquidação da parte social não puder efectuar-se por for força
do disposto no artigo 188.º, n.º 1 do CSC; ii. a requerimento do sócio
que pretenda exonerar-se com fundamento no artigo 185.º, n.º2,
alínea a) e alínea b), se a parte social não puder ser liquidada por
força do disposto no artigo 188.º, n.º1 do CSC. Na redacção do preceito,
anterior à alteração sofrida com o Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29
de Março, o corpo do artigo previa que “Além dos casos previstos na
DIREITO
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Cláudia Cunha / ASSESSORA JURÍDICA
lei, a sociedade pode ser dissolvida judicialmente”, passando na
actual redacção a referir apenas a dissolução. Apesar de não o dizer
expressamente, pelo procedimento da dissolução (a requerimento
de um dos sócios) ter-se-á que concluir que se trata de “dissolução
administrativa”.
- o n.º 3 do artigo 464.º do CSC preceitua que as sociedades anónimas
podem ser dissolvidas por via administrativa quando, por período
superior a um ano, o número de accionistas for inferior ao mínimo
exigido por lei, podendo dentro deste prazo de um ano qualquer
accionista requerer ao tribunal a concessão de um prazo razoável a
fim de regularizar a situação, suspendendo-se entretanto a dissolução
da sociedade, o que corresponde, assim, ao disposto na alínea a) do
n.º1 do artigo 142.º do CSC.
- o n.º 2 do artigo 473.º do CSC prescreve como fundamento especial
de dissolução das sociedades em comandita o desaparecimento de
todos os sócios comanditados ou de todos os sócios comanditários,
sendo que neste último caso a sociedade pode ser dissolvida por via
administrativa (artigo 473.º, n.º3 do CSC). A sociedade dissolve-se
imediatamente, se faltarem todos os sócios comanditados e a
situação não se regularizar nos 90 dias seguintes (artigo 473.º, n.º4
do CSC).
A dissolução de sociedades não depende de forma especial nos casos
em que tenha sido deliberada pela assembleia geral, em que para
proceder à inscrição da dissolução no serviço registo comercial basta
apresentar a acta da deliberação, com as formalidades previstas no
artigo 63.º do CSC (cfr. artigo 145.º, n.º1 do CSC).
As outras formas de dissolução criam um título para efeitos de
registo: a decisão do conservador no âmbito do procedimento oficioso
de dissolução, seja voluntário ou oficioso, a decisão do conservador
ou do notário no âmbito do procedimento simplificado de justificação
ou justificação notarial, respectivamente. Antes das alterações
introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, as
sociedades só se dissolviam por escritura pública ou sentença.
Como acima se frisou a sociedade dissolvida, independentemente
das causas ou formas de dissolução e salvo disposição legal em
contrário, entra imediatamente em liquidação (artigo 146.º, n.º1 do
CSC), e sendo a dissolução promovida oficiosamente, a liquidação
será igualmente promovida por via oficiosa (artigo 146.º, n.º6 do
CSC). Assim e antes de atentarmos na liquidação das sociedades,
“a dissolução, como facto pelo qual se determina a cessação da
existência da sociedade, traduz-se num processo progressivo de
extinção que culmina com a aprovação das contas finais”, ou seja,
aquando do encerramento da liquidação. (Parecer do Conselho
Técnico da Direcção Geral dos Registos e Notariado, de 19 de
Dezembro de 1986: Boletim dos Registos e Notariado, n.º 20, pág.
7, e Rev. Not., 1987/2.º-300).
III. Liquidação de sociedadesA partir da dissolução, à firma das sociedades deve ser aditada a
menção “sociedade em liquidação” ou “em liquidação” (artigo 146.º,
n.º 3 do CSC).
A sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica, nos
termos da doutrina dominante, sem qualquer restrição de âmbito
e continuam a ser-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações,
as disposições que regem as sociedades não dissolvidas (artigo 146,
n.º 2 do CSC).
A liquidação pode ser voluntária, administrativa ou judicial. A
liquidação judicial tanto pode ocorrer no âmbito de um processo de
insolvência, em que se rege pelo CIRE, como no âmbito de processo
civil, em que se rege pelos artigos 1122.º a 1130.º do CPC, conforme
dispõe a parte final do n.º1 do artigo 146.º do CSC. Ressalva-se que
na lei a designação de liquidação judicial abrange apenas a liquidação
prevista no CPC, contudo, na presente exposição, para diferenciar
das demais formas de liquidação e porque corre igualmente junto
dos tribunais, esta designação abrange também a liquidação no
decurso de um processo de insolvência.
III. A) LIQUIDAÇÃO VOLUNTÁRIA
A liquidação voluntária de uma sociedade encontra-se regulada no
CSC (com excepção da extinção imediata que se encontra prevista
no RJPADL) e pode obedecer a uma das seguintes formas:
i. Extinção imediata (sem activo, nem passivo);
ii. Dissolução e liquidação simultâneas (sem activo, nem passivo);
iii. Dissolução e liquidação com partilha imediata (com activo e sem
passivo);
iv. Dissolução com transmissão global (com ou sem activo e com
ou sem passivo);
v. Dissolução com entrada em liquidação (com passivo ou com
passivo e activo).
A extinção imediata encontra-se prevista no artigo 27.º e seguintes
do RJPADL e pode ser requerida junto dos serviços de registo
competentes, desde que se verifiquem cumulativamente os
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DIREITO
seguintes requisitos: deliberação unânime dos sócios e inexistência
de activo ou passivo a liquidar.
A dissolução e liquidação simultâneas tem como pressuposto
igualmente a inexistência quer se activo, quer de passivo e difere da
extinção imediata, na medida em que exige apenas a maioria
qualificada específica para cada tipo societário, conforme quadro
supra. Assim é uma via para os casos em que os sócios não chegam
a uma deliberação unânime e num único acto procede-se à extinção
da sociedade.
A dissolução com partilha imediata encontra-se prevista no artigo
147.º do CSC e constitui uma opção nos casos em que a sociedade
tem património para partilhar e não tem passivo, caso em que
aquando da dissolução os sócios podem proceder à partilha, liquidando
assim o património e fazendo extinguir a sociedade.
A dissolução com transmissão global de património é outra via para
os sócios procederem à extinção imediata da sociedade. Neste caso
todo o património, activo e passivo, é transmitido para algum ou
alguns sócios e depende do acordo escrito de todos os credores da
sociedade (artigo 148.º, n.º1 do CSC). Pode ocorrer com ou sem
passivo, nos termos do disposto na 1.ª parte do n.º1 artigo 147.º, e
com ou sem património, se bem que nesse caso não teria interesse
para nenhum dos sócios.
A dissolução com entrada em liquidação pressupõe que a sociedade
tenha passivo, podendo ter ou não activo, sendo nomeado um
liquidatário para desenvolver as operações necessárias para saldar
o passivo.
III. B) REVISÃO E CERTIFICAÇÃO LEGAL DAS CONTAS - O PAPEL DO REVISOR OFICIAL DE CONTAS
Preliminarmente à liquidação voluntária devem ser organizados e
aprovados, nos termos do CSC, os documentos de prestação de
contas da sociedade, reportados à data da dissolução (artigo 149,
n.º 1 CSC), nos quais, por maioria de razão, se tem que incluir todos
os documentos previstos para o respectivo tipo societário, o que
significa nas sociedades anónimas e por quotas sujeitas a revisão
legal das contas, a certificação legal das contas. A liquidação deve
estar encerrada e a partilha aprovada no prazo máximo de três anos,
com prorrogação máxima por um ano (artigo 150.º do CSC). A
sociedade considera-se extinta (momento em que perde a
personalidade jurídica) com o registo do encerramento da liquidação
(artigo 160.º, n.º2 do CSC). Na falta de cláusula contratual ou
deliberação em contrário, os membros da administração (ou gerência)
da sociedade passam a ser liquidatários a partir do momento em
que a mesma se considere dissolvida (artigo 151.º, n.º 1 do CSC).
Do regime exposto resulta que durante um período máximo de três
anos, principalmente nos casos de dissolução com entrada em
liquidação, as sociedades comerciais podem estar em liquidação,
que se traduz numa situação entre a dissolução e a extinção da
sociedade, implicando a realização de um conjunto de operações,
perpetradas, em regra, pela anterior administração ou gerência,
tendentes, em síntese, a pagar o passivo e a atribuir aos sócios o
restante património. Pode, ainda, o liquidatário, com autorização dos
sócios, continuar temporariamente a actividade anterior da sociedade
(artigo 152.º, n.º 2 al. a) do CSC).
Além de pelo disposto no n.º 2 do artigo 146.º do CSC as sociedades
em liquidação continuarem sujeitas às disposições que regem as
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sociedades não dissolvidas, relativamente à prestação de contas,
prevê o artigo 155.º do CSC que os liquidatários devem prestar, nos
três primeiros meses de cada ano civil, contas da liquidação. Os
documentos de prestação de contas devem ser organizados,
apreciados e aprovados nos termos prescritos para os documentos
de prestação de contas da administração com as necessárias
adaptações (artigo 155.º, n.º 2, com referência aos artigos 451.º,
452.º, 453.º e 455.º, todos do CSC). No Comentário ao Código das
Sociedades Comerciais, Dissolução e Liquidação de Sociedades, Raúl
Ventura, Almedina, na anotação ao referido artigo 155.º é referido
que “ As contas [prestadas pelo liquidatário] hão-de reflectir as
actividades efectivamente desenvolvidas pelo liquidatário no ano
anterior. Mantém-se a fiscalização das contas pelo conselho fiscal
ou por revisor oficial de contas, conforme anteriormente acontecia
para a mesma sociedade”.
Esta ilação é suportada, não só pela conjugação dos mencionados
n.º 2 do artigo 146. e artigo 155.º, ambos do CSC, mas também pela
expressa referência nos n.º 3 e 4 do artigo 151.º do CSC aos poderes
do conselho fiscal (ou fiscal único) quanto à destituição e nomeação
de liquidatário, afastando qualquer dúvida quanto à manutenção
em funções dos membros dos órgãos de fiscalização, após a
dissolução da sociedade.
III. C) Conclusão:
Assim, a conclusão relativamente às sociedades em liquidação
voluntária é de que até ao registo do encerramento da liquidação,
ou seja, da sua extinção, estarão sujeitas a revisão e certificação
legal das contas.
IV. Liquidação por via administrativaTal como na dissolução, também a liquidação por via administrativa
pode ser voluntária ou oficiosa. A liquidação administrativa
voluntária ocorre nos casos em que os sócios, as sociedades, os
credores, entre outros, a requerem (artigo 15.º, n.º1 do RJPADL) em
simultâneo ou não com a dissolução. No caso em que a dissolução
tenha sido declarada em procedimento administrativo de dissolução
voluntário, o pedido de liquidação considera-se efectuado no
requerimento de dissolução (artigos15.º, n.º 4 do RJPADL).
O procedimento administrativo de dissolução das sociedades
comerciais (ou liquidação administrativa oficiosa) é instaurado
oficiosamente pelo conservador, nomeando um ou mais liquidatários,
nos casos seguintes:
a) a dissolução tenha sido declarada em procedimento administrativo
de dissolução instaurado oficiosamente pelo conservador (artigo 15,
n.º 5, al. a) do RJPADL e 146.º, n.º 6 do CSC);
b) decurso dos prazos previstos no artigo 150.º do CSC para a duração
da liquidação, sem que tenha sido requerido o respectivo registo de
encerramento (artigo 15, n.º5, al. b) do RJPADL e 150.º, n.º 3 do CSC);
c) o tribunal tenha decidido o encerramento de um processo de
insolvência por insuficiência da massa insolvente e tenha comunicado
esse encerramento ao serviço de registo competente (artigo 15.º,
n.º5, al. g) e 234.º, n.º4 do CIRE). Neste caso não serão praticados
DIREITOCláudia Cunha / ASSESSORA JURÍDICA
O conservador fixa o prazo para a liquidação, que não pode exceder
um ano, prorrogável por idêntico prazo apenas uma vez, desde que
devidamente justificada a demora (artigo 18.º, n.º 7 e 8 do RJPADL).
Diferentemente da previsão para a liquidação voluntária, regulada
no CSC, o RJPADL só prevê a prestação de contas finais,
acompanhadas do projecto da partilha, a apresentar no prazo de 30
dias após efectuada a liquidação total. Esta é a prestação de contas
global e final relativa às operações da liquidação, que no nosso
entendimento, por falta de previsão específica, não estará sujeita
a certificação legal das contas. Não existe qualquer disposição
relativamente à prestação das contas anuais da sociedade em
liquidação administrativa, o que se coaduna coma ao prazo máximo
(um ano) concedido para o efeito.
V. Liquidação JudicialV. A) SOCIEDADES EM SITUAÇÃO DE INSOLVÊNCIA – REVISÃO E CERTIFICAÇÃO LEGAL DAS CONTAS
A declaração de insolvência de uma sociedade comercial, determina
a sua dissolução, como prescreve a al. e) do n.º 1 do artigo 141.º do
CSC. O que nos termos do acima referido deveria determinar a
imediata entrada em liquidação, com a consequente aplicação dos
normativos acima referidos. Contudo, o n.º 1 do artigo 146.º do CSC
prevê a aplicação, nos casos de insolvência, da respectiva lei de
processo, ou seja, o CIRE, o qual por ser especial prevalecerá sobre
a lei geral.
Nos termos do artigo 81.º do CIRE a declaração de insolvência priva
imediatamente a sociedade insolvente, por si ou pelos seus
administradores ou gerentes, dos poderes de administração e de
disposição dos bens integrantes da massa insolvente, que passam
a competir ao administrador de insolvência. Ao administrador de
insolvência compete assim preparar o pagamento das dívidas do
insolvente à custa das quantias em dinheiro existentes na massa
insolvente, o que passa normalmente pela liquidação do património;
prover, no entretanto, à conservação e frutificação dos direitos do
insolvente e à continuação da exploração da empresa, se for o caso,
evitando quanto possível o agravamento da sua situação económica
(artigo 55.º, n.º 1 do CIRE). As funções do administrador da insolvência
são semelhantes à dos liquidatários. O artigo 61.º do CIRE prevê a
obrigação de o administrador de insolvência prestar informação
trimestral sobre o estado da administração e liquidação, tendo que
prestar contas da sua actuação dentro dos dez dias subsequentes
à cessação de funções e sempre que o juiz o determine (artigo 62.º,
n.º 1 e 2 do CIRE). As referidas contas são elaboradas em forma de
conta corrente, com um resumo de toda a receita e despesa destinado
a retratar sucintamente a situação da massa insolvente (artigo 62.º,
n.º 3 do CIRE). Não obstante, a prestação de contas referente à
actuação do administrador de insolvência, a sociedade insolvente
é também obrigada a prestar contas anuais, nos termos que lhe
foram legalmente obrigatórios (artigo 65.º do CIRE).
A prestação de contas de sociedades comerciais sujeitas à revisão
legal das contas (sociedades anónimas e sociedades por quotas que
tenham órgão de fiscalização ou que ultrapassem os limites do artigo
262.º, n.º 2 do CSC), antes da sua dissolução, obriga à inclusão da
certificação legal das contas e se tiver órgão de fiscalização do parecer
deste órgão. A remissão do artigo 65.º do CIRE para os termos
legalmente obrigatórios ter-se-á que entender para este regime.
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actos de liquidação e partilha, não sendo necessária a nomeação de
liquidatário, pois se o Conservador constatar que inexiste património
para suportar os encargos com o procedimento administrativo de
liquidação, declara imediatamente o encerramento da liquidação,
que conduz à extinção da sociedade (artigo 26.º do RJPADL).
IV. A) REVISÃO E CERTIFICAÇÃO LEGAL DAS CONTAS - O PAPEL DO REVISOR OFICIAL DE CONTAS
Na liquidação administrativa voluntária o conservador nomeia os
liquidatários que lhe tenham sido indicados pela entidade comercial
e na falta desta indicação ou nos casos em que tal lhe compita
(liquidação administrativa oficiosa) nomeia um ou mais liquidatários
de reconhecida capacidade técnica e idoneidade para o cargo. Se o
liquidatário não for revisor oficial de contas (ROC) ou sociedade de
revisores oficiais de contas (SROC) o conservador pode designar
como perito, uma de tais entidades, com base em indicação da
Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (artigo 18.º, n.º 3 do RJPADL).
DIREITO
Contudo, a natureza da insolvência é avessa a essa ideia, já que se traduz numa situação em que o passivo é superior ao activo, pelo que mais despesa significa o consequente aumento do passivo. Em conformidade, prevê o artigo 82.º do CIRE a manutenção em funções dos membros dos órgãos sociais após a declaração de insolvência, se bem que perdendo o direito à remuneração, sendo-lhes, por essa razão, conferido o direito de renunciar ao cargo. Por outro lado, nas situações em que o ROC não integra o órgão de fiscalização pode ter aplicação o disposto nos artigos 110.º e 111.º do CIRE e portanto justificada, por qualquer das partes, a denuncia antecipada do respectivo contrato.
Estes normativos apontam para uma situação consentânea com a situação de insolvência, em que se visa reduzir ao mínimo os gastos no período que medeia entre a declaração de insolvência e a extinção da entidade (após o rateio final – artigo 234.º, n.º 3 do CIRE).
Não se é alheio ao facto de o desfecho da sociedade declarada insolvente, além da sua extinção pela liquidação do património, poder ser o regresso à actividade, com a aprovação de um plano de insolvência (artigo 234.º, n.º 1 do CIRE), ou o encerramento do processo de insolvência por insuficiência da massa insolvente, em que a liquidação da sociedade prossegue nos termos do RJPADL, devendo o juiz comunicar o encerramento e o património da sociedade ao serviço de registo competente (artigo 234.º, n.º 4 do CIRE).
V. A) - 1 CONCLUSÃO:
Assim, por que o artigo 65º do CIRE é geral e de aplicação a todas as sociedades declaradas insolventes, independente do respectivo desfecho, formalmente estarão sujeitas a revisão e consequente certificação legal das contas, embora de acordo com os normativos anteriormente referidos possa não fazer sentido, por contrariar o objectivo da insolvência, e por na prática poder revelar-se de difícil aplicação.
V. B) LIQUIDAÇÃO JUDICIAL DE SOCIEDADES STRICTO SENSU, PREVISTA NOS ARTIGOS 1122.º A 1130 DO CPC E A REVISÃO E CERTIFICAÇÃO LEGAL DAS CONTAS
Antes da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 76/2006, de 29 de Março a liquidação era um processo voluntário e só seria judicial se houvesse uma manifestação de vontade nesse sentido, mormente por desentendimento dos sócios quanto à forma da partilha, a concretização de um dos factos previstos na lei para o efeito ou a respectiva previsão no pacto social.
O processo judicial de liquidação era obrigatório nos dois casos seguintes:
a) a liquidação não estar encerrada e a partilha não estar terminada nos prazos previstos no artigo 150.º do CSC;
b) ser declarado nulo ou anulado o contrato de sociedade, nos termos constantes do artigo 165.º do CSC.
Assim, com a entrada em vigor do supra referido Decreto-Lei a obrigatoriedade do processo judicial de liquidação de sociedades ficou restringido aos casos em que os contratos ou pactos sociais são declarados nulos ou anulados, já que no caso de a partilha não estar encerrada e a partilha terminada nos prazos previstos no artigo 150.º do CSC, o que se aplica é o procedimento administrativo oficioso
de dissolução e não o processo judicial.
Na liquidação judicial os liquidatários, designados pelo juiz, têm
trinta dias após a realização da liquidação total para apresentar as
contas e o projecto de partilha do activo restante, como dispõe o n.º
1 do artigo 1126.º do CPC. Esta disposição é semelhante à constante
do n.º 1 do artigo 157.º do CSC, relativa à liquidação voluntária. Nos
termos do n.º 1 do artigo 146.º do CSC, as sociedades em liquidação
regem-se pelo disposto nos artigos 146.º a 165.º do CSC e também,
no caso de liquidação judicial, pelo disposto nas leis do processo.
Assim, em tudo o que não se encontre previste e que não contrarie
o regime especial de liquidação judicial aplicar-se-ão as referidas
disposições legais. Isto significa que os argumentos e ilações extraídas
nos prévios pontos III. B) e III.C) têm aqui adequação.
1 in Dissolução e Liquidação de Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Raúl Ventura, Almedina, Edição1993, página 42.2 in obra citada , página 42, Raúl Ventura.3 in obra citada, página 131, Raúl Ventura.
DIREITOCláudia Cunha / ASSESSORA JURÍDICA