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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS
PAULO HENRIQUE CARDOSO SANTOS WEIDLE
Itajaí, 27 de maio de 2010.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS
PAULO HENRIQUE CARDOSO SANTOS WEIDLE
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Professora: Esp. Débora Cristina Freytag Scheinkmann.
Itajaí, 24 de maio de 2010
AGRADECIMENTO
À família, base para todos os momentos da vida.
DEDICATÓRIA
À minha mãe, minha guerreira vencedora.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 27 de maio de 2010.
Paulo Henrique Cardoso Santos Weidle Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Paulo Henrique Cardoso Santos
Weidle, sob o título Responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes
ambientais, foi submetida em 10 de junho de 2010 à banca examinadora
composta pelos seguintes professores: [Nome dos Professores ] ([Função]), e
aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]).
Itajaí, 27 de maio de 2010
Professora Esp. Débora Cristina Freytag Scheinkmann Orientador e Presidente da Banca
Professor Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ART.
Artigo
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 LA Lei de Crimes Ambientais. Rio/92 Convenção do Rio de Janeiro de 1992
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Crime - Crimes são os fatos ilícitos a que se cominam abstratamente penas mais severas. Crimes ambientais – Fatos Ilícitos contra o meio ambiente.
Direito ambiental - Um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a
vários ramos de Direito reunidos por sua função instrumental para a disciplina do
comportamento humano em relação ao seu meio ambiente1.
Meio ambiente - meio ambiente é um conjunto de ações, circunstâncias, de
origem cultural, social, físicas, naturais e econômicas que envolvem o homem e
toda forma de vida2.
Pessoa jurídica – Associação de pessoas físicas com propósito negocial,
expansivo, atos que vão além do obtido por pessoas físicas, caracterizado pela
união entre pessoas.
Princípio – linhas mestras, grandes nortes, diretrizes do sistema jurídico.
Apontam rumos a serem guiados por toda a sociedade e obrigatoriamente
perseguidos pelos órgãos do governo (poderes constituintes). Expressam a
substância última do querer popular, seus objetivos e desígnos, devem ser
prestigiados.[...]3.
Princípio da prevenção - O princípio da prevenção aplica-se ao risco conhecido,
sendo que entende-se por conhecido o risco quando se teve levantamento de
pesquisas, dados e informações ambientais ou conhecidos por já ter ocorrido
anteriormente, É a partir do risco ou perigo conhecido que se busca adotar
medidas que possam minimizar os danos ambientais.
1 MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado, Rio de Janeiro: forense universitária, 1992, p.
10. 2 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental, 8 ed. rev. Ampl. Atual., editora Lumen Juris. Rio
de Janeiro. 2005. p. 227. 3 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 06-07
Responsabilidade - Responsabilidade, para o direito, nada mais é, portanto, que
a obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as
conseqüências jurídicas de um fato, conseqüências essas que podem variar
(reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com
o interesse do lesado.
Responsabilidade civil - A responsabilidade civil, por ser repercussão do dano
privado, tem por causa geradora o interesse em restabelecer o equilíbrio jurídico
alterado ou desfeito pela lesão, de modo que a vítima poderá pedir reparação do
prejuízo causado, traduzida na recomposição do status quo ante ou uma
importância em dinheiro.4
Responsabilidade penal - pressupõe uma turbação social, ou seja, uma lesão
aos deveres de cidadãos para com a ordem da sociedade, acarretando um dano
social determinado pela violação da norma penal.5
Sanção – resposta ao ato ilícito praticado por um agente
4 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 4. p.
6 5 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:
responsabilidade civil. 4 ed. Ver., atual. E reform. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 3.
SUMÁRIO
RESUMO ........................................................................................... XI
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
1. UMA ANÁLISE ACERCA DA RESPONSABILIDADE ......... 3
1.1 - CONCEITO DE RESPONSABILIDADE. ........................................................ 3 1.2 - ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA RESPONSABILIDADE PENAL. ......... 5 1.3 - DIFERENÇA DE RESPONSABILIDADE CIVIL E RESPONSABILIDADE PENAL. ................................................................................................................... 7 1.4 - LEGISLAÇÃO AMBIENTAL. ....................................................................... 14 1.5 - CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA. .......................................................... 16
2. ASPECTOS DOUTRINÁRIOS ACERCA DO DIREITO AMBIENTAL. .................................................................................... 22
2.1 - CONCEITO DE MEIO AMBIENTE. .............................................................. 22
2.2 - DIREITO AMBIENTAL. ................................................................................ 25 2.3 - PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL. .................................................... 27
2.3.1 - PRINCÍPIO DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. ...................... 27 2.3.2 - PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. ............................................ 29 2.3.4 - PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL DA PROPRIEDADE. .......................... 31
2.3.5 - PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO. ............................................................................ 32 2.3.6 - PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. ........................................................................... 33
2.3.7 - PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR. ............................................................... 35
2.3.8 - PRINCÍPIO DO USUÁRIO-PAGADOR .................................................................. 36
2.3.8 - PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO AMBIENTAL. ......................................................... 37 2.3.9 - PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA. ................................................... 37
2.3.10 - PRINCÍPIO DA UBIQÜIDADE. .......................................................................... 37 2.3.11 - PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO. ....................................................................... 38 2.4 - CONCEITO DE CRIME. ................................................................................ 38 2.5 – FORMAS DE SANÇÃO E A REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. ................................................................................................ 39 2.5.1 - MULTA. ........................................................................................................ 43 2.5.2 - RESTRITIVAS DE DIREITO. .............................................................................. 45 2.5.3 - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. .................................................... 46 2.5.4 - DA FALTA DE PROCESSO LEGAL PARA RESPONSABILIDADE PENAL EMPRESARIAL. .............................................................................................................................. 46
2.5.5 - REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. ..................................... 48
3. A REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS. . 50
3.1 A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA EM OUTROS PAÍSES. ................................................................................................................ 51 3.1.1 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM PORTUGAL ................................ 51 3.1.2 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM FRANÇA .................................... 52 3.1.3 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM ALEMANHA ............................... 54 3.1.4 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM ESTADOS UNIDOS ...................... 55
3.1.5 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM ESPANHA .................................. 56 3.1.6 - RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA EM INGLATERRA ............................. 57 3.3 . A REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS ................. 57 3.3.1 - A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ................................................... 57 3.3.2. A LUZ DA LEI 9.605/1998 (LEI DOS CRIMES AMBIENTAIS) ................................ 60
3.4 - ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURIDICAS. ....................................................................................... 63 3.5 - ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURIDICAS ........................................................................................ 69
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 78
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 81
RESUMO
A sociedade mundial passou a se preocupar com a preservação ambiental há
poucas décadas. É sabido que durante séculos o homem vem utilizando a
natureza para atender não somente às necessidades vitais para sua
sobrevivência, mas deve buscar formas de manter um desenvolvimento
sustentável. Várias são as discussões quanto a possibilidade de se
responsabilizar a pessoa jurídica em âmbito penal após a promulgação da
Constituição de 1988, o que gera um grande debate doutrinário, principalmente no
tocante ao meio ambiente como bem jurídico protegido pelo ordenamento pátrio e
digno da tutela penal, conforme destaca a Lei 9.605/98. Este estudo objetiva
analisar os aspectos da responsabilidade penal das pessoas jurídicas nos crimes
ambientais. Caracteriza-se pelo estudo sobre o que é responsabilidade, seu
conceito, antecedentes históricos e diferenciação entre responsabilidade civil e
penal. Trata-se também sobre os aspectos doutrinários acerca do direito
ambiental, matéria ainda considerada recente em nosso ordenamento jurídico.
Apresentam-se as formas de sanção e os tipos de reparação do dano causado ao
meio ambiente. Por fim, é mostrado o estudo acerca da responsabilidade da
pessoa jurídica, levando em consideração sua aplicação em outros países, as
novidades impostas pela constituição e a inserção da lei dos crimes ambientais,
Lei 9.605/98. Por derradeiro, conclui-se o trabalho com a argumentação, tanto
favorável como contrária à responsabilização da pessoa jurídica em crimes contra
o meio ambiente
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto o estudo acerca da
responsabilização da pessoa jurídica nos crimes contra o meio ambiente.
O seu objetivo é mostrar as possibilidades de
responsabilização da pessoa jurídica.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de análise
acerca da responsabilidade. É dado o conceito de responsabilidade seguindo-se
pelos antecedentes históricos da responsabilidade penal. Trata-se também da
diferenciação da responsabilidade civil e da responsabilidade penal. O primeiro
capítulo é concluído com o conceito de pessoa jurídica.
O Capítulo 2, tratará de aspectos doutrinários acerca do
Direito Ambiental, delimitamos o conceito de meio ambiente, depois fora definido
o significado do direito ambiental. São mostrados os princípios do Direito
Ambiental, conceitua-se crime e chega-se até as formas de sanção e a reparação
do dano causado ao meio ambiente.
No Capítulo 3, tratará de responsabilidade penal da pessoa
jurídica fora mostrado o direito comparado com outros países no tocante a
responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Logo após, tem-se uma análise
quanto a responsabilidade da pessoa jurídica nos crimes conta o meio ambiente à
luz da Constituição Federal, em seguida a mesma análise é feita sobre a Lei
9.605/98. Por fim são mostrados os argumentos favoráveis e desfavoráveis
quanto a responsabilização da pessoa jurídica no cometimento de crimes
ambientais.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a responsabilidade da pessoa jurídica nos crimes ambientais.
2
Para a presente monografia foi levantada a seguinte
hipótese:
A pessoa jurídica é responsabilizada pelos crimes cometidos
contra o meio ambiente
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação6 foi utilizado o Método Indutivo7, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano8, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas do Referente9, da Categoria10, do Conceito Operacional11 e da Pesquisa
Bibliográfica12.
6 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.
7 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.
8 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.
9 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.
10 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.
11 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.
12 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.
1. UMA ANÁLISE ACERCA DA RESPONSABILIDADE 1.1 - CONCEITO DE RESPONSABILIDADE.
O verbo latino respondere origina a palavra
responsabilidade, que era usada como significado de uma obrigação assumida e
trazia consigo a devida conseqüência jurídica de sua atitude13.
Dias14, mostra a responsabilidade como sendo ”[...] toda
manifestação da atividade humana traz em si o problema da Responsabilidade”.
Cavalieri Filho15 conceitua da seguinte maneira:
Responsabilidade é um dever jurídico sucessivo conseqüente à violação do
primeiro [...] Em síntese, em toda obrigação há um dever
jurídico originário, enquanto na responsabilidade há um
dever jurídico sucessivo. E, sendo a responsabilidade uma
espécie de sombra da obrigação (a imagem é de Larens),
sempre que quisermos saber, quem é o responsável
teremos que observar a quem a lei imputou a obrigação ou
dever originário.
Responsabilidade significa dizer que existe obrigação na
reparação de um dano.
Lopes16 trata do assunto da seguinte maneira:
[...] a obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de uma
outra circunstância legal que a justifique, com a culpa
presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva.
13
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. 4 ed. Ver., atual. E reform. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1. 14
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, v.I. p.1. 15
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2 ed.São Paulo: Malheiros, 2000. p.20. 16
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil: fontes contratuais das obrigações – responsabilidade civil. 5 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989. p. 160.
4
A responsabilidade pode originar-se por culpa ou dolo,
sendo que nas duas hipóteses existe o dever de reparar caso o ato praticado
traga algum dano a vítima.
Segundo a opinião de Savatier apud Rodrigues17 a
responsabilidade é definida como “[...] a obrigação que pode incumbir uma
pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de
pessoa ou coisas que dela dependam”.
Próximo ao que entende Gagliano e Pamplona Filho18:
Responsabilidade, para o direito, nada mais é, portanto, que a obrigação derivada
– um dever jurídico sucessivo – de assumir as
conseqüências jurídicas de um fato, conseqüências essas
que podem variar (reparação dos danos e/ou punição
pessoal do agente lesionante) de acordo com o interesse do
lesado.
É a responsabilidade então, garantia do direito do lesado de
ver reparado através de uma sanção legal, o ato danoso que foi praticado pelo
lesante contra si.
Ao buscar a palavra responsabilidade no dicionário jurídico
brasileiro encontra-se a seguinte definição19:
Responsabilidade. S. f. (Lat., de respondere, na acep. De assegurar, afiançar.)
Dir. Obr. Obrigação, por parte de responder por alguma
coisa resultante de negócio jurídico ou de ato ilícito. OBS. A
diferença entre responsabilidade civil e criminal está em que
essa impõe o cumprimento da pena estabelecida em lei,
enquanto aquela acarreta indenização do dano causado.
17
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 4. p. 6. 18
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. 4 ed. Ver., atual. E reform. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 3. 19
Academia Brasileira de Letras Jurídicas. Dicionário Jurídico. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. p. 679.
5
Considerando a matéria ambiental aqui tratada, temos que
quando existir violação às normas de proteção ambiental será imputado
responsabilidade àquele que tenha dado causa à ruptura da ordem pública, ao
meio ambiente.
A seguir serão vistos os antecedentes históricos da
responsabilidade penal.
1.2 - ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA RESPONSABILIDADE PENAL.
A responsabilidade penal e a civil surgiram em conjunto,
ambas iniciaram-se em tempos antigos onde grupos primitivos se reuniam em
pequenas comunidades, na qual já existia um sistema de leis20.
A lei de Talião surgiu como vingança privada, a conhecida
expressão “[...] olho por olho dente por dente” vem deste período.
A função do poder público era somente a de manifestar-se
se a vítima tinha ou não o direito de retaliação pela ofensa proferida21.
Na concepção de Aguiar22 sobre a vingança privada vemos
o seguinte:
[...] forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e
natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os
povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal.
Surgiu da Revolução Francesa a idéia geral do que é
responsabilidade dentro do ordenamento jurídico.
O Direito Francês estabeleceu a concepção da reparação
sempre que houvesse culpa, separando-se a existência de culpa contratual que
20
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 9. 21
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. P. 9 22
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, v.I. p.1.
6
não está ligada a um crime ou delito, mas se origina da negligência ou
imprudência23.
Sendo o homem uma criatura social, surgiu a necessidade
do mesmo se associar a outros membros da comunidade com a finalidade de
atingir objetivos e progressos.
Surgiram daí as organizações comerciais, indústrias e outras
associações mantidas pelo Estado ou por seus federados.
Emergiu, assim, o reconhecimento destas entidades na
ordem jurídica, por tal fato o Direito iniciou a legitimação de tais instituições,
conferindo-lhes personalidade jurídica e, então, tornando-se sujeitos de direitos e
obrigações. Surgem as chamadas pessoas jurídicas24.
No mundo, existem países que aceitam a responsabilização
penal da pessoa jurídica, outros não aceitam e um terceiro grupo admite sua
existência, mas sempre que estiver condicionada a certas situações definidas em
lei.
É o que mostra Lecey25:
[...] existem três modelos legislativos: o primeiro é o dos países que aceitam a
responsabilidade penal da pessoa jurídica, sem maiores
indagações (v.g., Estados Unidos); o segundo é daqueles
que a repelem (v.g., Itália); e o terceiro, adotado pelo Brasil,
admite a responsabilidade, mas condicionada a
determinadas situações definidas expressamente pelo
legislador.
Diante das mudanças sociais, o direito brasileiro tende a
adotar a responsabilidade penal como regra geral nos casos de prática de delitos
23
GONÇALVES Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.5 24
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade civil. 1 ed. 2tir. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1998. p.17-24 25
LECEY, Eládio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.) Direito Ambiental em evolução 1.2. Ed. Curitiba: Juruá, 2002. p. 46
7
Esta é melhor adaptável a sociedade atual, uma vez que o
direito penal tem a função de selecionar os comportamentos humanos mais
graves, capazes de colocar em risco valores fundamentais para a convivência
social, aplicando sanções de forma correta e justa de acordo com o delito
praticado26.
Entretanto, é óbvio que a sanção penal não exclui a
possibilidade de existir responsabilidade civil e administrativa, simultaneamente
aplicadas.
Isto ocorre pelo fato de objetos distintos serem protegidos
por regimes jurídicos diversos27.
Sobre o tema personalidade jurídica, este será analisado
melhor no momento oportuno.
Findo esta análise, trataremos das diferenças entre a
responsabilidade civil e a responsabilidade penal. Estudo importante para
compreendermos o objetivo do trabalho.
1.3 - DIFERENÇA DE RESPONSABILIDADE CIVIL E RESPONSABILIDADE PENAL.
O que diferencia estes dois tipos de responsabilidade é
basicamente a repercussão da conduta praticada pelo agente causador do dano.
Quando determinada conduta leva em conta repercussão
social necessita-se de intervenção do Estado.
Fiorillo28 menciona o seguinte sobre o tema:
26
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V. I. p. 1 27
MAGALHÃES, Juraci Perz. A evolução do direito ambiental. 2 ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 50 28
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8 ed. Ver, atual. E ampl. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 1. p. 462.
8
A distinção fundamental trazida pelos doutrinadores está baseada, numa
sopesagem de valores, estabelecida pelo legislador, ao
determinar que certo fato fosse contemplado com uma
sanção penal, enquanto outro com uma sanção civil ou
administrativa.
Determinadas condutas, levando-se em conta a sua
repercussão social e a necessidade de uma intervenção mais severa do Estado,
foram erigidas à categoria de tipos penais, sancionando o agente com multas,
restrições de direito ou privatização de liberdade.
Tanto a responsabilidade penal como a responsabilidade
civil estão baseadas, praticamente, no mesmo fundamento. A principal diferença é
o fato de que uma exige mais aperfeiçoamento para se efetivar do que a outra.
É o que mostra Gagliano e Pamplona Filho29:
[...] na responsabilidade civil, o agente que cometeu o ilícito tem a obrigação de
reparar o dano patrimonial, ou moral causado, buscando
restaurar o status quo ante, obrigação esta que, se não for
mais possível, é convertida no pagamento de uma
indenização (na possibilidade de avaliação pecuniária do
dano) ou de uma compensação (na hipótese de não se
poder estimar patrimonialmente este dano), enquanto, pela
responsabilidade penal ou criminal, deve o agente sofrer, a
aplicação de uma cominação legal, que pode ser privativa de
liberdade (ex: prisão), restritiva de direitos (ex: perda da
carta de habilitação de motorista) ou mesmo pecuniária (ex:
multa).
Pressupõe-se, para a responsabilidade penal, uma turbação
social já que existe violação de uma norma na esfera penal, sendo atingida a
sociedade.
29
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 1. p. 462.
9
Na responsabilidade civil o bem jurídico atingido é o direito
do lesado, sendo que somente este poderá pleitear ação de reparação de danos
causada pelo lesante.
A distinção destes tipos de responsabilidade jurídica é assim
tratada por Rodrigues30:
Num e noutro caso encontra-se, basicamente, infração a um dever por parte do
agente. No caso do crime, o delinqüente infringe uma norma
de direito público e seu comportamento perturba a ordem
social; por conseguinte, seu ato provoca uma reação do
ordenamento jurídico, que não pode se compadecer com
uma atitude individual dessa ordem. A reação da sociedade
é representada pela pena.
A saúde, liberdade, propriedade e vida são alguns dos bens
jurídicos que o direito penal visa proteger, são considerados bens jurídicos
indispensáveis à humanidade.
No caso de ocorrer violação a qualquer um dos bens
protegidos, considerando que são protegidos pela coletividade, deverá o agente
responder penalmente, sendo, assim, aplicada uma sanção correspondente ao
crime praticado.
O mesmo autor discorre da seguinte forma sobre a
responsabilidade civil:
[...] No caso de ilícito civil, ao contrário, o interesse diretamente lesado, em vez de
ser o interesse público , é o interesse privado. O ato do
agente pode não ter infringido norma de ordem pública; não
obstante, como seu procedimento causou dano a alguma
pessoa o causador do dano deve repará-lo. A reação da
sociedade é representada pela indenização a ser exigida
pela vítima do agente causador do dano. Todavia, como a
matéria é de interesse apenas do prejudicado, se este se
30
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 4. p. 6.
10
resignar a sofrer o prejuízo e se mantiver inerte, nenhuma
conseqüência advirá para o agente causador do dano.
Quando se trata de direito civil, o dano é considerado
praticado contra algum interesse direto e único do lesado, nesta situação,
portanto, deve haver reparação pelo lesante através de indenização
correspondente ao dano praticado.
Mister se faz esclarecer que tanto na responsabilidade civil
como na responsabilidade penal existe um fato juridicamente qualificado como
ilícito.
Pode, este fato, também ser considerado como atos
praticados que não são desejados pelo direito pátrio, pois praticado em ofensa a
ordem jurídica, violando direito subjetivo individual.
Diniz31 ensina que:
[...] a responsabilidade penal pressupõe uma turbação social, ou seja, uma lesão
aos deveres de cidadãos para com a ordem da sociedade,
acarretando um dano social determinado pela violação da
norma penal, exigindo para restabelecer o equilíbrio social
investigação da culpabilidade do agente ou o
estabelecimento da anti-sociabilidade do seu procedimento,
acarretando a submissão pessoal do agente à pena que lhe
for imposta pelo órgão judicante, tendendo, portanto, à
punição, isto é, ao cumprimento da pena estabelecida na lei
penal.
Na responsabilidade penal o agente que praticar o delito terá
que arcar com sua respectiva sanção imposta pelo ato praticado, já que este ato é
considerado proibido pelo ordenamento jurídico penal.
No mesmo sentido Diniz32 mostra que:
31
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.7. p. 20. 32
. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.7. p. 20.
11
A responsabilidade civil requer prejuízo a terceiro, particular ou Estado. A
responsabilidade civil, por ser repercussão do dano privado,
tem por causa geradora o interesse em restabelecer o
equilíbrio jurídico alterado ou desfeito pela lesão, de modo
que a vítima poderá pedir reparação do prejuízo causado,
traduzida na recomposição do status quo ante ou uma
importância em dinheiro.
Fica de fácil entendimento a afirmativa de que a diferença
entre a responsabilidade civil e a responsabilidade penal é a mesma distinção
entre o direito civil e o direito penal.
Na responsabilidade civil não se verifica se o ato que
causou dano ao particular ameaça, ou não, a ordem social, na importando se a
pessoa compelida à reparação seja, ou não, moralmente responsável, enquanto
que para haver responsabilidade penal estes requisitos são imprescindíveis.
Outra vez vemos nas linhas de Gangliano e Pamplona
Filho33:
[...] a ilicitude jurídica é uma só, do mesmo modo que um só, na sua essência, é o
dever jurídico. Em seus aspectos fundamentais há uma
perfeita coincidência entre o ilícito civil e i ilícito penal, pois
ambos constituem uma violação da ordem jurídica,
acarretando, em conseqüência, um estado de desequilíbrio
social. Mas, enquanto o ilícito penal acarreta uma violação
da ordem jurídica quer por sua gravidade ou intensidade, a
única sanção adequada é a imposição da pena, no ilícito civil
por ser menos a extensão da perturbação social, são
suficientes as sanções civis (indenização, restituição in
specie, anulação do ato, execução forçada etc.). A diferença
entre o ilícito civil e o ilícito penal é, assim, tão somente, de
grau ou de quantidade.
Notória a importância das duas espécies de
responsabilidade para o estudo do tema.
33
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 1. p. 6.
12
É, então, preciso compreender o significado de
responsabilidade civil, e por seguinte poder, então, distinguir a responsabilidade
penal.
Apesar de terem as sanções e aplicações jurídicas de forma
distintas, de acordo com o respectivo ramo do Direito a serem aplicadas ao caso
concreto, ambas as espécies emergem de um ilícito que fora praticado pelo
lesante com conseqüências sociais.
Sendo assim, é essencial a diferenciação entre os dois
institutos, pois resulta na possibilidade de aplicação conjunta, em função de um
mesmo fato, sem que ocorra bis in idem34.
Para Bittar apud Gagliano e Pamplona Filho35:
[...] a reparação representa meio indireto de devolver-se o equilíbrio às relações
privadas, obrigando-se o responsável a agir, ou dispor de
seu patrimônio para a satisfação dos direitos do prejudicado.
Já a pena corresponde à submissão da pessoa física do
agente, para reestruturação da normalidade social violada
com o delito... Um dos princípios gerais do direito –
consoante o qual ninguém se deve lesar, cujos efeitos em
concreto se espraiam pelos dois citados planos, em função
do interesse maior violado (de pessoa, ou de pessoas, de
um lado; da sociedade ou da coletividade, de outro) e
conforme a técnica própria dos ramos do Direito que a
regem, a saber: (para a repressão pública).
Um só indivíduo poderá ser atingido pela responsabilidade
penal, porém o bem jurídico que fora atingido atinge e repercute em toda a
sociedade, e sendo assim, deve o lesante ser punido pelo Estado.
Para a responsabilidade civil o dano somente diz respeito ao
lesante, o qual sofreu uma ação ou omissão que poderá gerar o direito a
34
“É a aplicação da norma duas vezes sobre o mesmo assunto, sobre a mesa coisa” (Agenda do Estudante. A arte de fazer direito. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 39.) 35
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 1. p. 5.
13
reparação do dano causado, desde que tenha ocorrido a violação do direito ou
prejuízo a outrem.
Rodrigues36 sobre o tema:
É possível, entretanto, que o ato ilícito, pela sua gravidade e suas conseqüências,
repercuta tanto na ordem civil como na penal, constituindo
crime ou contravenção, de outro, porque acarreta prejuízo a
terceiro. Nesse caso haverá uma dupla reação do
ordenamento jurídico, impondo a pena ao delinqüente, e
acolhendo o pedido de indenização formulado pela vítima.
Temos que na responsabilidade civil existe a ocorrência de
um dano, existe um prejuízo ao patrimônio do lesado, e determinado fato deve ser
indenizado.
Na responsabilidade penal há a ocorrência de uma das
infrações penais, prática de alguma conduta tipificada como crime, ao qual a
sanção é a pena.
Como explica Venosa37:
[...] considera a responsabilidade direta, isto é, do causador do dano ou da
ofensa, do transgressor da norma. No direito Penal, a noção
de punição de terceiro não participante da conduta é, em
princípio, completamente afastada no direito moderno: a
pena não pode transpor a pessoa do agente, embora essa
noção já venha sendo contraditada na penalística mais
moderna.
Considerando a legislação ambiental pode-se afirmar que
seus dispositivos seguem esta linha de raciocínio e usam a reparação quando se
trata de responsabilidade civil, e aplicam a penalidade no tocante a
responsabilidade penal.
36
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 4. p. 7. 37
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2004. V. 4. p. 13.
14
Oliveira38, sobre responsabilidade civil diz que:
A proteção ambiental é, em essência, preventiva. Contudo, ainda que o
empreendedor adote todas as medidas preventivas para
obstar os impactos ambientais e, mesmo assim ocorra dano,
subsistirá a obrigação de reparar o dano ambiental. Desde a
edição da Lei 6.938/1981 que o sistema jurídico brasileiro
adota a responsabilidade objetiva, sem culpa, impondo a
obrigatoriedade de reparar ou indenizar pelos danos
causados. A Constituição Federal reforçou esta obrigação no
parágrafo terceiro do artigo 225, com a imposição de reparar
os danos causados.
No que tange a responsabilidade penal, a lei 9.605/1998
mostrou as devidas sanções penais e administrativas ambientais. Estas sanções
são aplicáveis às pessoas físicas e jurídicas quando violarem as regras de
garantia para que a coletividade tenha um meio ambiente ecologicamente
equilibrado39.
Por derradeiro, constata-se que a reparação é algo que
emana da responsabilidade civil. Já a aplicação de penalidade diz respeito à
responsabilidade penal.
O próximo tema é legislação ambiental, seguiremos uma
pequena análise quanto à legislação ambiental existente em nosso país.
1.4 - LEGISLAÇÃO AMBIENTAL.
38
OLIVEIRA, Fabiano Melo Gonçalvez de. Difusos e coletivos. Elementos do Direito – Direito Ambiental, 1 ed. São Paulo. Editora RT, 2009. p. 131 39
OLIVEIRA, Fabiano Melo Gonçalvez de. Difusos e coletivos. Elementos do Direito – Direito Ambiental, 1 ed. São Paulo. Editora RT, 2009. p. 152
15
Segundo Antunes40 o Direito Ambiental analisa o meio
ambiente a sua utilização, buscando-se sua proteção e a melhora da qualidade de
vida da sociedade.
No Brasil a Lei n. 6.938 de 31 de agosto de 1991
representou um momento marcante no Direito Ambiental dando definições de
meio ambiente, degradação da qualidade ambiental, poluição, poluidor e recursos
ambientais.
Instituiu, também, um valioso mecanismo de proteção
ambiental denominado estudos prévios de impacto ambiental (EIA) e seus
respectivos relatórios (RIMA), instrumentos eficazes e modernos em termos
ambientais mundiais.
A Lei 9605/98 apresentou várias inovações, principalmente
na responsabilidade da pessoa jurídica conforme reza o seu art. 3º:
Artigo 3º - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e
penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em
que a infração seja cometida por decisão de seu
representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade.
De acordo com Ferreira41:
O Estado deve permanecer sendo um elemento central para que seja possível a
institucionalização das questões ambientais e para que
formulação, implementação e gerenciamento de políticas de
sustentabilidade ocorram com sucesso. Para isso é preciso
que, em primeiro lugar, afastemos a idéia de que o Estado é
um corpo monolítico, dotado de uma homogeneidade
inflexível. Ora, na verdade, conforme defende a autora, as
políticas públicas, enquanto expressão do Estado em ação,
são, dentre outras coisas, o resultado da interação entre os
atores coletivos e individuais, que se relacionam de maneira
40
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental, 8 ed. rev. Ampl. Atual., editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2005. p. 227. 41
Ferreira, Leila da Costa. A Questão Ambiental: Sustentabilidade e Políticas Públicas no Brasil. Ed. Boitempo. São Paulo. 2003, p 117
16
estratégica a fim de fazerem valer e articular seus diferentes
projetos. É nesse sentido que, por exemplo, "em várias
ações governamentais na área de meio ambiente (...) os
motivos, as crenças dos policymakers que formularam e
implementaram essas políticas, foram na verdade resultado
de uma rede de ações interdependentes.
Deve o Estado estar à frente das questões ambientais, pois
só ele é capaz de aglutinar toda vontade existente na sociedade e selecionar o
que realmente deve ser feito em questões ambientais.
As políticas públicas, que são efetivas políticas públicas,
nada mais são do que o resultado da busca do Estado sobre o pensamento da
coletividade. Este é um mecanismo extremamente necessário para a efetivação
dos resultados ambientais satisfatórios.
Dentre outros dispositivos que auxiliam o direito ambiental
podemos citar a Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981.
Tal Lei dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,
seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
Outra lei é a Lei 7.347, de julho de 1987
Esta disciplina a ação civil pública de responsabilidade por
danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e dá outras providências.
Estas legislações elencadas serão utilizadas no decorrer do
trabalho.
Passamos agora a discursar sobre o conceito de pessoas
jurídicas.
1.5 - CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA.
17
Tema que é prudente ser tratado nesta discussão é o
conceito da pessoa jurídica.
Pessoa jurídica, para o dicionário Michaelis42, “significa a
entidade abstrata com existência e responsabilidade jurídicas como, por exemplo,
uma associação, empresa, companhia, legalmente autorizadas”.
Tem-se por sacramentado, tendo em vista o longo estudo já
realizado acerca do tema, que a pessoa jurídica é sujeito do direito necessário,
tendo em vista a característica humana em associar-se com o intuito de
conquistar objetivos maiores.
Leonardo43 diz:
A sensível diferença entre a pessoa humana e a pessoa jurídica estaria na
substância. [...], os seres existentes poderiam ser
diferenciados entre aqueles dotados de forma substancial e
outros dotados de forma acidental.
Os seres de forma substancial seriam aqueles que não necessitariam de
fundamentos extrínsecos para sustentar-se, ou seja,
existiriam por si mesmos.
Por outro lado, os seres de forma acidental não teriam existência em si mesmos,
na medida em que seriam dependentes de outros seres de
substância.
Por conclusão, “o ser humano é reconhecido como indivíduo, mas não apenas
indivíduo: substância também, isto é, ser que existe por si
mesmo; e de natureza racional”. Irredutível fim em si
mesmo, a pessoa humana é dotada de dignidade. Mais que
uma realidade ontológica, trata-se de uma realidade
axiológica, vez que “ser e valer estão intimamente ligados,
em síntese indissolúvel, eis que o valor está, no caso,
42
MICHAELIS: pequeno dicionário da língua portuguesa - São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998 (Dicionário Michaelis) 43 LEONARDO, Rodrigo Xavier. Pessoa jurídica: por que reler a obra de J. Lamartine Corrêa de Oliveira,
Monografia vencedora do Concrurso de Monografias Prêmio José Lamartine Corrêa de Oliveira. In:
CASTRO, Rodrigo Pironte Aguirre de (org). Concurso de monografias prêmio José Lamartine Corrêa de
Oliveira. Curitiba : Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, 2005. p. 1/3
18
inserido no ser. O homem vale, tem a excepcional e
primacial dignidade de que estamos a falar, porque é”. A
pessoa jurídica é um ser, uma unidade ontológica. Essa
unidade, no entanto, não teria “forma substancial”, mas sim
“forma acidental”. A pessoa jurídica, por sua vez, “como a
pessoa humana, ela é um ser. E, mais, como a pessoa
humana, ela é indivisa, individual. É permanente (...) Possui
independência externa”. Diversamente da pessoa natural,
todavia, a pessoa jurídica “não é substancial. Depende, para
existir, dos seres humanos, que estão sob sua existência.
Entretanto, é ser, pois o acidente é ser”.
Acerca da personalidade jurídica, entende-se que faz parte
da vontade humana para realização de grandes atividades, por isso a
necessidade de juntar-se a outros.
Venosa44 nos explica:
[...] O ser humano, pessoa física ou natural, é dotado de capacidade jurídica. No
entanto, isoladamente é pequeno demais para a realização
de grandes empreendimentos.
Menciona o autor a fraqueza do homem para alcançar
maiores objetivos quando trabalha sozinho. A união do homem pode construir
situações de grande magnitude, sendo assim a idéia de pessoa jurídica cabe
perfeitamente com o ideal humano de crescimento.
Continua o autor45 sobre o tema:
[...] A legislação não acompanha as mutações constantes e rápidas que
ocorreram no âmbito das pessoas jurídicas. Sente-se
perfeitamente, dentro de cada ordem de pessoas jurídicas,
necessidade permanente de o legislador , a cada momento,
estar a disciplinar um novo fenômeno que surge tanto no
campo dos atos lícitos como no campo dos atos ilícitos. Sim,
porque, se a pessoa jurídica é mola propulsora para a
44
VENOSA, sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 6. Ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 229 45
VENOSA, sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 6. Ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 229
19
economia, também pode servir de instrumento para atos
contrários à Moral e ao Direito.
O autor menciona o aspecto de esconderijo que muitas
vezes a pessoa jurídica serviu para que pessoas físicas cometessem ilícitos
quando estavam em seu controle. Com a evolução dos estudos acerca deste tipo
de personalidade, temos hoje maior dificuldade na hipótese de pessoas físicas
cometerem crimes e não serem punidas, mesmo estando à frente de pessoas
jurídicas.
Toda a história vivida pela humanidade faz prova inequívoca
de que somos uma espécie que vive em associação.
Nas mais escondidas tribos podemos verificar o caráter
associativo, reinando diante da natureza humana.
Gonçalves46 diz:
[...] o homem não vive isolado, mas em grupos. A associação é inerente à sua
natureza. Nem sempre as necessidades e os interesses do
indivíduo podem ser atendidos sem a participação e
cooperação de outras pessoas, em razão das limitações
individuais. Desde a unidade tribal dos tempos primitivos até
os tempos modernos essa necessidade de se agrupas para
atingir uma finalidade, para alcançar um objetivo ou ideal
comum, tem sido observada.
Por diversas vezes, nas mais diversas situações, é possível observar o caráter associativo que o ser humano tem para com seu semelhante. Nas mais primitivas tribos pode-se verificar esta característa inerente ao ser humano.
Prossegue no mesmo pensamento o autor47:
[...] o direito não podia ignorar essas unidade coletivas, criadas pela evolução
histórica ou pela vontade dos homens, e passou então a
46
GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, v. 1. Parte geral. 5.ed. rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p.181. 47
GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, v. 1. Parte geral. 5.ed. rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p.181.
20
discipliná-las para que possam participar da vida jurídica
como sujeitos de direitos, a exemplo das pessoas naturais,
dotando-as, para esse fim, de personalidade própria.
Pois bem, como é característica humana, obvio que teria
repercussão em todos os níveis de sociedade, e numa análise mais profunda
pode-se afirmar que a personalidade jurídica é em termos jurídicos a evoluçõa da
associação humana. O direito, como ciência da sociedade, não poderia deixar de
dar atenção às associações humanas.
Nos dias atuais a personalidade jurídica é fato comum e
possuem, no ordenamento jurídico, personalidade distinta de cada um de seus
membros, atuando na vida jurídica com personalidade própria.
Barros48 assim menciona pessoa jurídica:
[...] Para bem compreender a existência de semelhantes entidades, as pessoas
jurídicas, é preciso partir da idéia de que o indivíduo, muitas
vezes, por si só, será incapaz de realizar certos fins que
ultrapassam suas forças e os limites da vida individual. Para
consecução desses fins, ele tem de unir-se a outros
homens, formando associações, dotadas de estrutura
própria e de personalidade privativa, com as quais supera a
debilidade de suas forças e a brevidade de sua vida.
O autor deixa claro que a pessoa jurídica consegue atingir fins onde o homem dificilmente conseguiria chegar, pois bem se sabe, a vida humana tem limite, e suas forças também. Continua o ilustre professor da seguinte maneira sobre o tema:
[...] com justeza já se afirmou anteriormente que o espírito de associação
obedece, em todas as suas manifestações, a duas forças
fundamentais, simultâneas e concorrentes:
A – de um lado, a tendência inata do homem para o convívio em sociedade;
B – de outro, a acenada vantagem que resulta da conjugação de forças e que se
expressa pelo princípio mecânico da composição das forças
48
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 33. ed.São Paulo: Saraiva, 1995, p95
21
no paralelogramo e segundo o qual o efeito da resultante é o
próprio e não a soma aritimética das forças agrupadas.
Surgem assim as pessoas jurídicas, também denominadas pessoas morais (no
direito Francês) e pessoas coletivas (no direito Português) e
que podem ser definidas como associações ou instituições
formadas para a realização de um fim e reconhecidas pela
ordem jurídica como sujeitos de direitos.
Esta unificação dos homens, buscando juntos um fim
comum criou a pessoa jurídica e a evolução da sociedade juntamente com o
direito trouxe este ente jurídico como conhecemos nos tempos atuais.
Foram mostrados os principais professores do direito civil
tratando do conceito de pessoa jurídica.
É nítido que o ser humano busca associação com seus
coletivos, esta busca tem por foco um objetivo maior, que um homem sozinho
dificilmente conseguiria.
Estes objetivos, por sua grandeza, por vezes, perpetuam no
tempo, existem pessoas jurídicas que passam por inúmeras gerações, fazendo
parte da história de uma localidade.
A evolução que passou a pessoa jurídica criou um estágio
de reconhecimento jurídico muito avançado, reflexo de sua importância na
sociedade atual.
Passamos agora ao segundo capítulo, adentraremos na
matéria ambiental.
22
2. ASPECTOS DOUTRINÁRIOS ACERCA DO DIREITO AMBIENTAL.
2.1 - CONCEITO DE MEIO AMBIENTE.
Silva49, em 1815, foi o primeiro homem público a se
manifestar sobre o meio ambiente. Conseguiu sintetizar a necessidade de
adequação entre a natureza e a economia, vemos em suas palavras:
[...] Se a navegação aviventa o comércio e a lavoura, não pode haver navegação
sem rios sem fontes, não há fontes sem chuva, não há
chuvas sem umidade, não há umidade sem floresta.
49
SILVA, José Bonifácio de Andrada e. apud PÁDUA, José Augusto, Natureza e projeto nacional: nascimento do ambientalismo brasileiro (1820-1920). Ambientalismo no Brasil, p. 16.
23
Para Antunes50 meio ambiente é:
O conceito de Meio Ambiente, como se pode ver antes, é um conceito que implica
reconhecimento de uma totalidade. Isto é, meio ambiente é
um conjunto de ações, circunstâncias, de origem cultural,
social, físicas, naturais e econômicas que envolvem o
homem e toda forma de vida. É um conceito mais amplo do
que o de natureza que, como se sabe, em sua acepção
tradicional, limita-se aos bens naturais.
As ciências preferem usar o termo ecossistema a meio
ambiente. Pelo Dicionário Eletrônico Michaelis51 tem-se o seguinte:
ecossistema
e.cos.sis.te.ma
sm (eco3+sistema) Conjunto de uma comunidade de
organismos e seu meio ambiente funcionando como uma
unidade ecológica na natureza.
No legislação brasileira encontra-se uma definição de meio
ambiente na Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que por seu artigo 3°, inciso I,
estabelece:
Artigo 3° - Para fins previstos nesta Lei, entende-se por: I – meio ambiente: o
conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege
a vida em todas as suas formas
Esta definição conjuga conceitos técnicos com conceitos
sociais, é amplo, como não poderia deixar de ser.
Nesta mesma lei, analisamos em seu artigo 2°, inciso I, que
o meio ambiente deve ser entendido como um patrimônio público, e sendo assim
protegido através do direito público. Antunes52 afirma:
50
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental, 8 ed. rev. Ampl. Atual., editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2005. p. 227. 51
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=ecossistema - acessado em 13 de Fevereiro de 2010.
24
[...] o meio ambiente deve ser considerado como um patrimônio público a ser
necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o
uso coletivo. A noção de patrimônio público de ser
compreendida como um instrumento capas de possibilitar a
defesa do meio ambiente através de mecanismos de direito
público.
A doutrina brasileira não estabelece análise crítica do
conceito legal de meio ambiente. Alguns doutrinadores fizeram tal análise,
Aguiar53 ressalta:
O conceito de meio ambiente é totalizador. Embora possamos falar em meio
ambiente marinho, terrestre, urbano etc. essas facetas são
parte de um todo sistematicamente organizado onde as
partes, reciprocamente, dependem umas das outras e onde
o todo é sempre comprometido cada vez que uma parte é
agredida.
O meio ambiente como conceituado acima se mostra
indeterminado, sendo possível criar um espaço positivo de incidência de norma.
É possível dividir o meio ambiente em aspectos, facilitando
assim a identificação da atividade degradante e do bem agredido.
Fiorillo54 faz esta divisão da seguinte maneira:
[...] meio ambiente natural, constituído pela atmosfera, pelos elementos da
biosfera, pelas águas (inclusive pelo mar territorial), pelo
solo, pelo subsolo (inclusive recursos minerais), pela fauna e
flora. Concentra o fenômeno da homeostase, consistente no
equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e meio em que
vivem.
52
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental, 8 ed. rev. Ampl. Atual., editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2005. p. 227. 53
AGUIAR, Roberto Armando Ramos de. Direito do Meio Ambiente e Participação Popular, Brasília, Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal/IBAMA, 1994. p. 36. 54
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008, p.19.
25
[...] meio ambiente artificial, compreendido pelo espaço urbano construído,
consiste no conjunto de edificações (chamado de espaço
urbano fechado), e pelos equipamentos públicos (espaço
urbano aberto).
E o mesmo autor ainda menciona outros aspectos do meio
ambiente, como o cultural, do trabalho e genético.
[...] meio ambiente cultural, integrado pelo patrimônio histórico brasileiro, artístico,
arqueológico, paisagístico, turístico, que embora artificial, em
regra, como obra do homem, difere do anterior (que também
é cultural) pelo sentido de valor especial.
[...] meio ambiente do trabalho, constituído pelo local onde as pessoas
desempenham suas atividades laborais relacionadas à
saúde, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está
baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes
que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos
trabalhadores, independente da condição que ostentem
(homens e mulheres, maiores ou menores de idade,
celetistas, servidores públicos, autônomos etc.).
[...] patrimônio genético merece proteção jurídica em face de relacionar-se à
possibilidade trazida pela engenharia genética de utilização
de gametas conservados em bancos genéticos para a
construção de seres vivos, possibilitando a criação e o
desenvolvimento de uma unidade viva sempre que houver
interesse.
2.2 - DIREITO AMBIENTAL.
Os conceitos a respeito do Direito Ambiental são amplos,
conforme destacado por Mukai55 como:
[...] Um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos de
Direito reunidos por sua função instrumental para a disciplina
55
MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado, Rio de Janeiro: forense universitária, 1992, p. 10.
26
do comportamento humano em relação ao seu meio
ambiente.
Carvalho56 define como:
[...] conjunto de princípios e regras destinados à proteção do meio ambiente,
compreendendo medidas administrativas e judiciais, com a
reparação econômica e financeira dos danos causados ao
meio ambiente e aos ecossistemas de uma maneira geral.
Temos neste conceito a visão irrestrita do Direito Ambiental,
existem medidas tanto administrativas como judiciais para a reparação do mal
causado ao bem coletivo que é o meio ambiente.
Freitas57 ensina que:
[...] é um novo ramo do Direito, com peculiaridades especiais. É que ele está
ligado diretamente à profissionais de outras áreas do
conhecimento científico. O Direito une-se à biologia,
engenharia florestal, química e outras especialidades do
saber, para dar suporte teórico e legal à conduta do homem.
É necessária esta interligação do Direito Ambiental com
outros segmentos científicos que dão base para o devido cuidado e apreço ao
meio ambiente.
Para Borges58 temos que:
Ao contrário dos direitos liberais, que são considerados uma garantia do indivíduo
diante do poder do Estado, e ao contrário também dos
direitos sociais, que consistem basicamente em prestações
que o Estado deve ao indivíduo, o direito difuso ao meio
ambiente consiste num direito-dever, na medida em que a
56
CARVALHO, Carlos Gomes de. Introdução ao direito ambiental. Cuiabá: Verde-pantanal, 1990, p. 140 57
FREITAS, Vladimir Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a Lei 9.605/98) 8 ed. rev., atual.. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 21. 58 BORGES, Roxana Cardoso. Processo, Ação Civil Pública e Defesa do Meio Ambiente: os
direitos difusos em busca de uma concepção não-individualista de tutela e ampla legitimidade. In: Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000. p. 159
27
pessoa, ao mesmo tempo em que é titular do direito do meio
ambiente ecologicamente equilibrado, tem também a
obrigação de defendê-lo e preservá-lo”
Considerando que o Direito Ambiental é um novo ramo do
Direito, Freitas59 o considera sob dois aspectos:
[...] um objetivo, consistente no conjunto de normas jurídicas disciplinadores da
proteção da qualidade do meio ambiente; outro como
ciência, que tem por finalidade o conhecimento
sistematizado das normas e princípios ordenadores da
qualidade do meio ambiente.
As normas do direito ambiental auxiliam a coordenação da
conduta humana com relação à natureza e seu meio.
2.3 - PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL.
Não existe sistematização doutrinária acerca dos princípios
no direito ambiental brasileiro.
Existem princípios explícitos e implícitos, e ainda princípios
oriundos de tratados internacionais sobre direito ambiental.
2.3.1 - Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Previsto no caput do artigo 225 da Constituição Federal, que
dispõe que “todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. Este princípio
pode ser considerado como matriz do direito ambiental.
Para Mliaré60:
59
FREITAS, Vladimir Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a Lei 9.605/98) 8 ed. rev., atual.. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 21. 60
LILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2007, p. 763
28
[...] Princípio transcendental de todo o ordenamento jurídico ambiental,
ostentando o status de verdadeira cláusula pétrea.
O Supremo Tribunal Federal na ADIn 3.540, julgou:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um
típico direito de terceira geração (ou de novíssima
dimensão), que assiste a todo o gênero humano, Incube, ao
Estado e AA própria coletividade, a especial obrigação de
defender e preservar, em benefício das presentes e futuras
gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter
transindividual”.
No Rio de Janeiro, no ano de 1992 ocorreu a conferência
sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio/92), também conhecida como
cúpula da terra, é considerada o ponto alto da preocupação ambiental no âmbito
mundial.
Esta conferência contou com a participação de 179 países,
chegando ao número de mais de 10.000 participantes.
Os efeitos produzidos pela convenção Rio/92 foram os
documentos internacionais, a saber: Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento; Agenda 21; Convenção Quadro sobre Mudanças Climáticas;
Convenção sobre Diversidade Biológica.
A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento contém 27 princípios, é uma importante fonte para o
desenvolvimento dos princípios na legislação ambiental. Apesar de ser
recomendação a declaração traz preceitos para o desenvolvimento de uma
agenda internacional que visa a proteção do meio ambiente, contendo
compromissos e obrigações para os Estados.
Pelo Ministério do Meio Ambiente61 vemos que:
61
http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=18&idConteudo=576 – acessado em 19 de fevereiro de 2010
29
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
tendo se reunido no Rio de Janeiro, de 3 a 14 de junho de
1992, reafirmando a Declaração da Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, adotada em
Estocolmo em 16 de junho de 1972, e buscando avançar a
partir dela, com o objetivo de estabelecer uma nova e justa
parceria global mediante a criação de novos níveis de
cooperação entre os Estados, os setores-chaves da
sociedade e os indivíduos, trabalhando com vistas à
conclusão de acordos internacionais que respeitem os
interesses de todos e protejam a integridade do sistema
global de meio ambiente e desenvolvimento, reconhecendo
a natureza integral e interdependente da Terra, nosso lar,
O princípio 01 da declaração do Rio mostra: “os seres
humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável.
Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza”.
É visto a preocupação com o futuro da natureza, tendo o
homem o direito de viver em um ambiente equilibrado e saudável.
2.3.2 - Princípio do desenvolvimento sustentável .
Em 1987, a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento criou o relatório Brundtland, ou também conhecido como
Relatório Nosso Futuro Comum.
Este relatório definiu os contornos do conceito clássico de
desenvolvimento sustentável, como “aquele que atende as necessidades das
gerações atuais sem comprometer a capacidade de as futuras gerações terem
suas próprias necessidades atendidas”. Fora isso, pode-se afirmar que é o
primeiro documento internacional que fala em compatibilizar sobre a conervação
do meio ambiente com as atividades econômicas.
A partir das conclusões deste relatóri, a ONU definiu que
seria necessário uma nova conferência sobre o meio ambiente, surgindo então a
RIO/92.
30
Existe um conceito clássico sobre desenvolvimento
sustentável no relatório Brundtlan que é ”aquele que atende às necessidades do
presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações atenderem as
suas próprias necessidades”.
É também previsto em vários princípios da declaração do
Rio, que proclamam que os seres humanos são o centro das preocupações com o
desenvolvimento sustentável (Princípio 01) e que para alcançá-lo, a proteção
ambiental deve ser considerada parte integrante de desenvolvimento e não pode
ser dissociada dele (Princípio 02). Ademais, é reconhecido que o
desenvolvimento de considerar o uso equitativo dos recursos naturais, em
atenção às necessidades da presente e das futuras gerações (princípio 03).
Para o Supremo Tribunal Federal na ADIn 3.540:
“o princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter
eminentemente constitucional, encontra suporte legitimados
em compromissos internacionais assumidos pelo Estado
brasileiro e representa fator de obtenção de fator de justo
equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia,
subordinada, no entanto, a invocação desse postulado,
quando ocorrente situação de conflito entre valores
constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja
observância não comprometa nem esvazie o conteúdo
essencial de um dos mais significativos direitos
fundamentais: o direito à preservação ao meio ambiente,
que traduz bem o uso comum da generalidade das pessoas,
a ser resguardado em favor das presentes e futuras
gerações”.
O artigo 170 da Constituição Federal diz que a ordem
econômica é fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa e visa
assegurar a existência digna conforme os ditames da justiça social, com a
observância, entre outros, dos princípios da função social da propriedade e da
defesa do meio ambiente.
31
A função social pode ser entendida como o exercício do
direito de propriedade onde é perceptível o respeito às normas ambientais. A
defesa do meio ambiente nas atividades econômicas ocorre mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus
processos de elaboração e prestação.
Para interpretar os princípios do desenvolvimento
sustentável é necessário conjugar o artigo 170 com o artigo 225 da CRFB/88.
As atividades econômicas não podem ser exercidas com
desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio
ambiente.
2.3.4 - Princípios da função sócio-ambiental da propriedade.
A propriedade privada pode ser garantida (artigo 5°, XXII, da
Constituição Federal), mas somente se legitima o direito ao atender à sua função
social (artigo 5°, XXIII).
O artigo 182 da carta magna prevê em seu parágrafo 2°
mostra a função sócio-ambiental da propriedade urbana em nível constitucional, já
a função sócio-ambiental da propriedade rural é vista no artigo 186.
Na área urbana os planos diretores municipais, que são
obrigatórios para as cidades com mais de 20.000 habitantes, definem critérios,
elementos e requisitos para o cumprimento da função sócio-ambiental da
propriedade.
Já na esfera rural o artigo 186 da CRFB/88 prevê:
Art. 186 - A função social é cumprida quando à propriedade rural atende,
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência
estabelecidos em lei, os seguintes requisitos:
I – aproveitamento racional e adequado;
32
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do
meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações do trabalho;
IV – exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores”.
Temos então três aspectos que podem ser destacados do
artigo mencionado: a – aspecto econômico, com o aproveitamento racional e
adequado (inciso I); b – aspecto ambiental, utilização adequada dos recursos
naturais disponíveis e preservação do meio ambiente (inciso II); c – aspecto
social, com a observância das disposições que regulam as relações de trabalho e
a exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
(inciso III e IV).
A função social da propriedade rural só é alcançada com a
observância destes três componentes.
2.3.5 - Princípio da prevenção.
Para Machado62, o vocábulo prevenção, do verbo prevenir,
significa agir antecipadamente. Essa é, em essência, a conduta necessária em
qualquer política, planejamento ou atuação na proteção ambiental.
Para que o direito ambiental seja eficaz é necessário o
caráter preventivo.
Os danos ambientais, em regra, são praticamente
irreversíveis, sem a atuação antecipada não há como evitar a ocorrência de
danos ambientais.
O princípio da prevenção aplica-se ao risco conhecido.
É conhecido o risco que teve levantamento de pesquisas,
dados e informações ambientais ou conhecidos por já ter ocorrido anteriormente,
62
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 15 ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 84
33
como por exemplo, uma atividade mineradora que suas conseqüências são
conhecidas por todos. É a partir do risco ou perigo conhecido que se busca adotar
medidas que possam minimizar os danos ambientais.
O Estudo Prévio de Impacto Ambiental é um importante
instrumento de efetivação do princípio da prevenção.
Referido instrumento é previsto no artigo 225, parágrafo 1,
inciso IV da Constituição Federal. Consiste num estudo que identifica previamente
os possíveis impactos e danos ao meio ambiente e sugere as medidas de
mitigação e compensatórias.
O licenciamento ambiental também vem em decorrência do
princípio da prevenção, juntamente com o poder de polícia ambiental.
2.3.6 - Princípio da precaução.
A Declaração do Rio em seu princípio 15 mostra “quando
houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, ausência de certeza científica
absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas
economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.
Neste princípio o que se configura é a ausência de
informações ou pesquisas científicas conclusivas sobre a potencialidade e os
efeitos de uma intervenção no meio ambiente. Tem-se aqui a incerteza científica,
a incerteza sobre os efeitos do dano em potencial. O plantio de organismos
geneticamente modificados ou a intensidade do aquecimento global são alguns
exemplos.
Sendo assim, a ausência de estudos e levantamentos
científicos não autoriza a intervenção sobre o meio ambiente.
O princípio diz que não se admite, por exemplo, a produção
de uma substância com a afirmação de que não existem provas de que tal
intervenção não cause danos ao meio ambiente.
34
Necessariamente, a incerteza quanto às conseqüências de
tal produção para o meio ambiente e para a saúde humana, faz com que o
princípio da precaução apareça. Afinal, in dúbio pro ambiente.
Existem diferenças entre o princípio da prevenção e o
princípio da precaução.
O princípio da prevenção se delineia a partir do perigo
concreto, conhecido.
Já o princípio da precaução aplica-se em perigo abstrato,
incerto, que ainda não se conhecem os resultados e conseqüências para o meio
ambiente.
No direito patrio, a primeira remissão ao princípio da
precaução veio com a Lei 9.605/1998, em seu artigo 54, parágrafo 3°, que prevê o
crime de poluição:
Artigo 54 - Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou
possam resultar em danos à saúde humana, ou que
provoquem a mortandade de animais ou a destruição
significativa da flora:
[...] parágrafo 3°. Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior
quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade
competente, medidas de precaução em caso de risco de
dano ambiental grave ou irreversível.
Temos na Lei 11.428/2006, em seu artigo 6° que:
[...] Parágrafo único: na proteção e na utilização do Bioma Mata Atlântica, serão
observados os princípios da função socioambiental da
propriedade, da equidade intergeracional, da prevenção, da
precaução, do usuário-pagador, da transparência, das
informações e atos, da gestão democrática, da celeridade
procedimental, da gratuidade dos serviços administrativos
prestados ao pequeno produtor rural e às populações
tradicionais e do respeito ao direito de propriedade.
35
Em suma, o princípio da precaução é a prudência para que
exista intervenção, liberação ou plantio de substâncias de que ainda não se tem o
conhecimento de suas conseqüências para o meio ambiente e para a saúde
humana.
2.3.7 - Princípio do poluidor pagador.
Este princípio tem natureza econômica, cautelar e
preventivo.
Compreende a internalização dos custos ambientais, e estes
devem ser suportados pelo empreendedor ou empresário, sendo que são
afastados desta internalização os entes da coletividade.
O princípio 16 da Declaração do Rio menciona que “as
autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos
ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem
segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com
a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e
nos investimentos internacionais”.
O inciso VII, do artigo 4°, da Lei 6.938/1981 faz menção
expressa de tal princípio ao mencionar como um dos objetivos que a Política
Nacional do Meio Ambiente visará “[...] a imposição, ao poluidor e ao predador, da
obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados”
Fiorillo63 apresenta duas feições para o princípio do poluidor
pagador:
[...] Podemos identificar no princípio do poluidor pagador duas órbitas de alcance:
a) busca evitar a ocorrência de danos ambientais (caráter
preventivo); b) ocorrido o dano, visa sua reparação (caráter
repressivo).
63
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 9. Ed. rev. Atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 37
36
No aspecto preventivo, o princípio do poluidor pagador faz
com que o seja haja obrigação da internalização das externalidades negativas.
A internalização é o processo produtivo
As externalidades negativas são tudo aquilo que se encontra
fora do processo de produção, não têm valor econômico como por exemplo os
Gases tóxicos.
Para que seja evitado que a comunidade suporte as
externalidades negativas o empreendedor deve adotar medidas preventivas e os
custos para tal implantação ficam a seu cargo.
Mesmo assim, depois de ter implantado as medidas
preventivas e eventualmente se tenha o dano ambiental, não se retira o
empreendedor de sua reparação, decorrente de sua responsabilidade
consignada.
2.3.8 - Princípio do usuário-pagador
É um princípio complementar ao do poluidor-pagador, sendo
previsto no inciso VII, artigo 4°, da Lei 6.938/1981, como um dos objetivos da
Política Nacional do Meio Ambiente: “Ao usuário da contribuição pela utilização de
recursos ambientais com fins econômicos”. Um exemplo efetivo de tal princípio é
a água ser reconhecida como bem econômico e, assim, dado ao usuário seu real
valor.
Este princípio visa a valorização econômica dos recursos
naturais para que haja consciência no seu uso.
A importância do princípio foi alçada pelo Supremo Tribunal
Federal na ADIn 3.378, que discutiu a constitucionalidade da compensação
ambiental, a saber: “O art. 36 da Lei 9.985/2000 densifica o princípio usuário-
pagador, este significa um mecanismo de assunção partilhada da
responsabilidade social pelos custos ambientais derivados da atividade
econômica”.
37
2.3.8 - Princípio da informação ambiental.
É direito da população receber e ter acesso às informações
sobre todos os procedimentos que intervenham no meio ambiente, sendo eles
públicos ou privados. Logo, é dado ao indivíduo a oportunidade de mostrar sua
preocupação, idéias e soluções nos processos decisórios que intervenham no
meio ambiente. É titulado no princípio número 10 da Declaração do Rio.
A efetivação destes princípios é feita através da Lei
10.650/2003, que dispõe sobre o acesso público aos dados e informações
ambientais existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do
Meio Ambiente (SISNAMA).
2.3.9 - Princípio da participação comunitária.
É de objetivo deste princípio levar a participação da
comunidade na formulação das políticas públicas ambientais.
Temos neste princípio a população participando de tais
políticas na esfera administrativa, propõem ações judiciais e vota por meio de
mecanismos legislativos (plebiscito, referendo e iniciativa popular de lei). É um
dever jurídico e não apenas uma faculdade, como diz o artigo 225 da Constituição
Federal no seu caput.
2.3.10 - Princípio da ubiqüidade.
Ubiqüidade significa dizer o fato de estar ou existir
concomitantemente em todos os lugares, pessoas, coisas.
A proteção ao meio ambiente está no epicentro dos direitos
humanos. Na esfera estatal, a variável ambiental é uma obrigação em todas as
políticas de desenvolvimento. Por este motivo, os projetos, decisões, políticas
econômicas ou de planejamento não podem deixar de ter, previamente, a análise
ambiental.
38
2.3.11 - Princípio da Cooperação.
Entende-se de cooperar com agir em conjunto, neste sentido
o direito ambiental busca cooperação nacional e internacional.
Como caráter internacional, verifica-se que a proteção ao
meio ambiente é uma obrigação conjunta dos Estados, atuando, assim, com a
redução da pobreza e para o desenvolvimento sustentável.
Na esfera nacional nosso país adotou o federalismo
cooperativo, de partilha de responsabilidades entre os entes federativos (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios) na proteção ao meio ambiente. Temos por
fim que o caput do artigo 225 mostra como dever do Estado a proteção ao meio
ambiente, sendo obrigação comum entre políticos e a sociedade civil.
2.4 - CONCEITO DE CRIME. Existem diferentes escolas penalistas no ordenamento
jurídico, por este motivo o crime passou a ser definido diferentemente dentre
estas, sendo que dentro das divisões ocorriam ainda sub-divisões.
Considerando as teorias majoritárias temos 3 divisões
principais, o conceito formal, material e analítico do crime.
O conceito formal corresponde a uma definição nominal, ou
seja, relação de um termo a aquilo que o designa. Sob o aspecto formal, podem-
se citar os seguintes conceitos de crime: ”crime é o fato humano contrário à lei”.
“crime é qualquer ação legalmente punível”. Não penetram, contudo, em sua
essência, em seu conteúdo, em sua matéria.
O conceito material por sua vez, visa uma definição real,
procura estabelecer o conteúdo do fato punível. Tem o objetivo de encontrar a
essência da conduta criminosa. A melhor orientação para obtenção de um
conceito material de crime é aquela que tem em vista o bem protegido pela lei
39
penal. “Crime é a conduta humana que lesa ou expõe a perigo um bem jurídico
protegido pela lei penal”.
O conceito analítico indica as características ou elementos
constitutivos do crime, portanto, de grande importância técnica. [...] tem o objetivo
de racionalizar a instrumentalização das estruturas penais. Se a conduta é um
dos componentes do fato típico, deve-se definir o crime como “fato típico e
antijurídico”.
2.5 – FORMAS DE SANÇÃO E A REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE.
A tutela ao meio ambiente pelo Direito Penal é digna, visto
que “o que justifica a intervenção penal é o fato de estar em causa a proteção de
um bem jurídico – o ambiente – digno de tal tutela, que além do mais, deve ser
necessária. Dignidade penal e necessidade de tutela são categorias que intervêm
a legitimar a intervenção penal, e não se vê razão para que não intervenham
aqui”64.
Temos no direito ambiental uma luta na defesa do meio
ambiente.
Quando não se mostram suficiente as sanções civis e
administrativas para a repressão contra agressões ao meio ambiente, devemos
utilizar o Direito penal para satisfazer tais necessidades.
Lopes65 observa o seguinte:
[...] Sempre que determinado comportamento torna-se objeto de maior reprovação
social, por ofender ou ameaçar bens ou valores aos quais a
sociedade passe a atribuir maior importância, tal
64
RODRIGUES, Anabela Miranda. Os crimes contra o ambiente no código penal português revisto. Revista de direito ambiental v.1 São Paulo. RT. 1996, p1/24 65
LOPES, Jair Leonardo. Curso de direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993 p. 25
40
comportamento, em regra, vem a ser proibido, também, sob
ameaça de pena, como a mais eficaz técnica de proteção.
Martin66 diz:
O emprego de sanções penais para a proteção do meio ambiente em
determinadas ocasiões se tem revelado como indispensável,
não só em função da própria relevância dos bens protegidos
e da gravidade das condutas a perseguir (o que seria
natural), senão também pela maior eficácia dissuasória que
a sanção penal possui.
O meio ambiente é agredido por diversas formas, poluição
do ar, do solo, da água e suas conseqüências cada vez mais interferem no
cotidiano dos seres humanos. Somente com a aplicação da sanção penal,
conseguir-se-á refreá-las.
O direito penal apresenta três respostas do Estado para o
ilícito cometido por pessoas jurídicas, são elas; (i) medidas administrativas e/ou
civis, a mais tradicional; (ii) “medidas de segurança” e (iii) a verdadeira
responsabilidade criminal.
A primeira resposta consiste na responsabilidade
administrativa e/ou civil, geralmente utilizada em países que não reconhecem a
responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Neste caso pode haver a
indenização civil que fica restrita aos prejuízos causados, sendo este um bem
disponível, e ainda podendo o lesado não a requerer. Fato é, que o montante
indenizado, via de regra, será inferior ao ganho que a empresa obteve através da
infração. Já a multa de caráter administrativo tem uma função preventiva e
retributiva, isto é, a sanção não será uma reprovação da ética da empresa como
seria uma sentença em um processo criminal e ainda há a possibilidade da
negociação entre a empresa e as autoridades administrativas.
66
MARTIN, Eduardo Ortega. Os delitos contra a flora e a fauna. Direito Penal administrativo. Granada: Comares, 1997, p. 401
41
As “medidas de segurança” são resultantes de um processo
penal, e estas devem ser impostas às empresas devido a sua periculosidade,
neste tema trata com brilhantismo o doutrinador Shecaira67 da seguinte forma:
[...] a aplicação de medidas de segurança é uma solução intermediária entre as
reprovações extra penais e penais. Os adeptos dessa teoria,
embora defendam o processo penal contra a empresa,
avaliam que o afastamento da discussão sobre a culpa
possa facilitar a aceitação de medidas contra as empresas
em si. Embora não seja um efeito prático muito distinto de
aplicar medidas de segurança no lugar das penas, posto que
o mais importante é o efeito intimidatório do processo penal
(em face de se tutelar um bem jurídico mais relevante).
A terceira e última resposta estatal consiste na pena, posto
que constatada a lesão a certo bem jurídico tutelado pelo Estado, a resposta
deste para determinada conduta é a pena. Este meio deve ser aplicado para
demonstrar a total reprovação de uma conduta que não condiz com a maioria do
grupo social, para que seu agente não volte mais a delinqüir devido a seu caráter
público.
A Lei 9.605/98, conhecida como a Lei de Crimes Ambientais
(LA), consagrou a responsabilidade penal das pessoas jurídicas e para tanto
regulou as penas aplicáveis a estas em crimes ambientais, localizadas nos artigos
21 ao 24, abaixo transcritos, da referida Lei.
As sanções aplicadas às pessoas jurídicas nestes casos
são: a) multa (art. 21, inciso I da LA), b) pena restritiva de direitos (art. 21, inciso II
da LA) e c) a prestação de serviços a coletividade (art. 21, inciso III da LA). Fato é
que as penas corporais estão excluídas para as pessoas jurídicas, conforme
ressalta-se:
Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas
jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:
67
SHECAIRA, Sergio Salomão. A responsabilidade das pessoas jurídicas e os delitos ambientais. Boletim do IBCCRIM, abr./1998, n. 65, p 121
42
I - multa;
II - restritivas de direitos;
III - prestação de serviços à comunidade.
O artigo 22 da lei 9.605/98 prevê quais são as modalidades
previstas para as penas restritivas de direito aplicáveis à pessoa jurídica,
conforme pode-se verificar:
Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:
I - suspensão parcial ou total de atividades;
II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;
III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter
subsídios, subvenções ou doações.
§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem
obedecendo às disposições legais ou regulamentares,
relativas à proteção do meio ambiente.
§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade
estiver funcionando sem a devida autorização, ou em
desacordo com a concedida, ou com violação de disposição
legal ou regulamentar.
§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios,
subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez
anos.
Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:
I - custeio de programas e de projetos ambientais;
II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas;
III - manutenção de espaços públicos;
43
IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.
A referida lei ainda prevê:
Art. 24. A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim
de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido
nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu
patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal
perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.
2.5.1 - Multa.
Referente à pena de multa o legislador foi omisso em dispor
como será fixada a multa, qual o valor e de que forma será aplicada. Para o
preenchimento dessa lacuna faz-se necessário buscar analogia no Código Penal,
mesmo que neste Digesto refira-se a responsabilidade individual e não a coletiva.
Encontra-se no artigo 49 do Diploma Penal o critério dos
dias-multa, onde o valor é fixado com base no salário mínimo vigente ao tempo do
fato. Este critério de valoração da multa não determina uma soma em dinheiro,
como no sistema tradicionalmente utilizado, mas um sistema de unidades
artificiais, os dias-multa, este por sua vez equivalerá a um valor pecuniário.
Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da
quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será,
no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e
sessenta) dias-multa.
§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um
trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo
do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.
§ 2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de
correção monetária
44
E ainda prevê o artigo 18 da Lei n. 9.605/98 que essa pena
poderá ser triplicada caso se revele ineficaz, mesmo que seja aplicada no valor
máximo.
Todavia há um grande empecilho para estabelecer a pena
de multa, posto que o Código Penal preceitua em seu artigo 50, parágrafo
primeiro, que o pagamento deverá incidir sobre um percentual do salário do
condenado, porém a pessoa jurídica não possui remuneração, assim devendo ser
calculado o mesmo percentual sobre o total do faturamento da empresa.
Art. 50 - A multa deve ser paga dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em
julgado a sentença. A requerimento do condenado e
conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o
pagamento se realize em parcelas mensais.
§ 1º - A cobrança da multa pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou
salário do condenado quando:
a) aplicada isoladamente;
b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos;
c) concedida a suspensão condicional da pena.
§ 2º - O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento
do condenado e de sua família
De acordo com o doutrinador Shecaira68 o legislador deveria
utilizar uma unidade padrão para a pessoa física, sendo esta o dia-multa, e uma
outra unidade para a pessoa jurídica como por exemplo o dia-faturamento, com
isso facilitaria a imposição da pena de multa pelo magistrado posto que cada
critério de multa teria suas peculiaridades.
68
SHECAIRA, Sergio Salomão. A responsabilidade das pessoas jurídicas e os delitos ambientais. Boletim do IBCCRIM, abr./1998, n. 65, p 121
45
2.5.2 - Restritivas de Direito.
Já no tocante as penas restritivas de direito, previstas no
artigo 22 da Lei dos Crimes Ambientais o legislador utilizou o artifício das normas
penais em branco, isto é, estabelece um tipo aberto que será complementado por
um outro dispositivo, posto que não há como saber quais serão as disposições
legais ou regulamentares a que se refere o parágrafo 1° do respectivo artigo 22,
como analisamos:
Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:
I - suspensão parcial ou total de atividades;
II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;
III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter
subsídios, subvenções ou doações.
§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem
obedecendo às disposições legais ou regulamentares,
relativas à proteção do meio ambiente.
§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade
estiver funcionando sem a devida autorização, ou em
desacordo com a concedida, ou com violação de disposição
legal ou regulamentar.
§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios,
subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez
anos.
Também foi aplicada a normal penal em branco no caso da
interdição, já que o parágrafo 2° do referido artigo não menciona o autor da
interdição.
46
Por fim no parágrafo terceiro proíbe-se contratar com o
Poder Público, sendo assim proibida de participar de licitação, receber
subvenções ou subsídios deste Poder. Neste mesmo parágrafo o legislador não
logrou êxito pois não mencionou qual o delito que a empresa deve cometer para
ter este apenamento e ainda qual seria o critério para fixar o tempo de proibição.
Com isso ficando a cargo da doutrina e da jurisprudência
versar sobre a matéria e preencher as lacunas deixadas pelo legislador,
viabilizando assim a efetiva aplicação da lei em tela.
2.5.3 - Prestação de Serviços à Comunidade.
Por fim a última modalidade de punição prevista no artigo 23
da Lei 9.605/98 é a prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica
consiste em: I - custeio de programas e de projetos ambientais; II - execução de
obras de recuperação de áreas degradadas; III - manutenção de espaços
públicos; e IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.
Esta pena tem maior cunho educacional do que punitivo,
todavia deveria o legislador ter especificado os programas e os projetos que
deveriam ser custeados, assim foi utilizado outra vez mais a norma penal em
branco, formando um tipo extremamente aberto que possibilitam interpretações
diversas e aplicabilidade prática diminuta.
Outro ponto que o legislador também se olvidou de
esclarecer no presente artigo foi o quantum a ser fixado para a empresa infratora
gastar com o custeio de projetos e programas ambientais, ficando mais uma vez a
cargo da doutrina e jurisprudência dirimir tal lacuna.
2.5.4 - Da falta de processo legal para responsabilidade penal empresarial.
47
Notadamente foi um grande avanço da nova ordem
constitucional a abertura da possibilidade para a punição de um ente, que mesmo
não praticando por si só, pode ter contra si imputada uma conduta delituosa,
podendo assim sofrer sanções na esfera penal, além da civil e administrativa.
Com esta previsão demonstra-se a preocupação da
implementação da responsabilidade penal da pessoa jurídica, todavia a maneira,
o modo ou a forma para a efetiva responsabilização não restou clara, isto é, faltou
a explanação sobre como seria feito o processo legal para pleitear a
responsabilização e a conseqüente condenação.
A doutrina corrobora tal entendimento, e Shecaira69 pondera
sobre o tema da seguinte forma:
Novamente pecou o legislador ao não estabelecer mecanismos mais concretos no
plano procedimental. O Capítulo IV da lei é totalmente
silente no que concerne à ação e ao processo penal contra
as empresas. Na recente legislação francesa foi editada uma
lei (Lei de Adaptação ao Código Penal, de 16/12/1992), com
as modificações necessárias implantadas ao Código de
Processo Penal. São normas sempre em nome do seu
representante legal; para a definição do domicilio da pessoa
jurídica, para proteção pessoal quando a divulgação da
pessoa jurídica, para proteção pessoal quando a divulgação
do nome do empresário citado (a fim de preservá-lo de
eventuais ataques da opinião pública), etc. Sem tais
medidas saber-se-á o procedimento a ser implantado,
decorrente de tantas especificidades deste novo processo.
A título exemplificativo analisa-se o artigo 21 da Lei de
Crimes Ambientais, o qual trata das penas às empresas diz que: “[...] as penas
aplicáveis isoladas, cumulativas ou alternativamente às pessoas jurídicas são:
multa, restritiva de direito e privativa de liberdade”.
69
SHECAIRA, Sergio Salomão. A responsabilidade das pessoas jurídicas e os delitos ambientais. Boletim do IBCCRIM, abr./1998, n. 65, p 3.
48
No artigo supra o legislador afirma haver três formas da
aplicação da pena, seja isolada, cumulativa ou alternativamente, todavia não se
lembrou de mencionar quais são os casos que a pena seria isolada, cumulada ou
alternada, não estabelecendo também um único dispositivo no tocante ao
processo legal aplicado no caso com pessoas jurídicas.
Com a falta da estipulação legal das condições da aplicação
da pena à pessoa jurídica, para que esta responda penalmente, restou somente
as condições da responsabilidade penal individual e seus requisitos (capacidade
de ação, personalidade da pena e capacidade de culpabilidade), os quais não
podem ser aplicados aos entes coletivos, com isso gerando um grande problema
para operação do dispositivo.
Assim, na prática os magistrados têm de se basear no bom
senso, na doutrina e na jurisprudência, mesmo esta sendo muito restrita, para
poder efetuar a responsabilização penal da pessoa jurídica. Ressalte-se que a
jurisprudência pátria tem evoluído neste assunto, aplicando as penas previstas
em lei como se observa no capítulo número três da presente.
2.5.5 - Reparação do dano causado ao Meio Ambiente.
A Reparação do dano causado ao meio ambiente está
prevista nos artigos 27 e 28 da Lei dos Crimes Ambientais.
Art. 27. Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a proposta de
aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa,
prevista no art. 76 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de
1995, somente poderá ser formulada desde que tenha
havido a prévia composição do dano ambiental, de que trata
o art. 74 da mesma lei, salvo em caso de comprovada
impossibilidade.
Da mesma forma o artigo 28 trouxe como requisito a
exigência da demonstração da reparação do dano, para que o agente tenha
direito a benesse da lei 9605/98.
49
Art. 28. As disposições do art. 89 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de
1995, aplicam-se aos crimes de menor potencial ofensivo
definidos nesta Lei, com as seguintes modificações:
I - a declaração de extinção de punibilidade, de que trata o § 5° do artigo
referido no caput, dependerá de laudo de constatação de
reparação do dano ambiental, ressalvada a impossibilidade
prevista no inciso I do § 1° do mesmo artigo;
II - na hipótese de o laudo de constatação comprovar não ter sido completa a
reparação, o prazo de suspensão do processo será
prorrogado, até o período máximo previsto no artigo referido
no caput, acrescido de mais um ano, com suspensão do
prazo da prescrição;
III - no período de prorrogação, não se aplicarão as condições dos incisos II,
III e IV do § 1° do artigo mencionado no caput;
IV - findo o prazo de prorrogação, proceder-se-á à lavratura de novo laudo
de constatação de reparação do dano ambiental, podendo,
conforme seu resultado, ser novamente prorrogado o
período de suspensão, até o máximo previsto no inciso II
deste artigo, observado o disposto no inciso III;
V - esgotado o prazo máximo de prorrogação, a declaração de extinção de
punibilidade dependerá de laudo de constatação que
comprove ter o acusado tomado as providências
necessárias à reparação integral do dano.
O doutrinador Sirvinskas70 afirma sobre o tema:
A reparação tem cunho repressivo e educativo. Trata-se de prevenção geral
(exemplo dirigido a toda sociedade) e prevenção especial
(exemplo dirigido ao próprio infrator). Tanto é verdade que
apara que o infrator possa se beneficiar da composição do
dano (art. 74 da Lei 9.099/95), da transação penal (art. 76 da
70
SIRVINSKAS, Luís Paulo. op. cit., p. 100.
50
Lei 9.099/95) e da suspensão do processo (art. 89 da Lei
9.099/95) deverá comprovar previamente a reparação dos
danos causados ao meio ambiente (arts. 27 e 28 da LA).
A legislação tem por objetivo determinar que o autor da
infração restaure, com suas custas, o bem destruído ou danificado ou, se não for
possível sua restauração, que seja transformado em pecúnia o valor do prejuízo,
assim é mister uma análise acerca da responsabilidade da pessoa jurídica, o que
será abordado no próximo capítulo.
3. A REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS.
É necessário e esclarecedor que se faça uma análise acerca
da responsabilidade penal da pessoa jurídica em alguns países para depois
abordar-se o tema perante a legislação pátria.
51
3.1 A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA EM OUTROS PAÍSES.
3.1.1 - Responsabilidade da pessoa jurídica em Portugal
O código penal português, em seu artigo 11, trata da
responsabilidade individual, no entanto, na parte final deste dispositivo, permitiu,
através da expressão "salvo disposição em contrário" que a legislação
infraconstitucional dispusesse acerca de outras formas de responsabilidade penal
diferentes da individual, tais como, coletiva, a objetiva e a responsabilidade penal
da pessoa jurídica.
São exemplos de disposições legais que prevêem a
responsabilidade penal as pessoas jurídicas do Direito Lusitano o artigo 7° da Lei
433/82, que trata das contra-ordenações; o artigo 3° da Lei 28/84 que prevê
delitos econômicos, também denominada “Lei das Infrações Antieconômicas”, o
artigo 3° da Lei 109/91 que trata da criminalidade de informática, Dec.-lei 142-
A/91, artigos 677 e 679, que aprovou o Código de Valores Mobiliários, dentre
outros.
Tais disposições favoráveis à responsabilidade criminal da
pessoa coletiva tiveram seu passo decisivo com o Decreto-lei 28/84, de 20 de
janeiro, onde em seu preâmbulo salienta-se a consagração da responsabilidade
corporativa em atenção às recomendações de instancias internacionais.
É necessário que o comportamento do agente do ente
coletivo atue em representação e nos limites desta representação. Assim é que
este preâmbulo do referido decreto-lei, exige sempre uma conexão entre o
comportamento do agente - pessoa singular e o ente coletivo, já aquele deve
atuar em representação ou em nome deste e no interesse coletivo. E tal
responsabilidade tem-se por excluída quando o agente tiver atuado contra ordens
expressas da pessoa coletiva.
52
É afastada a responsabilidade penal do ente coletivo se a
pessoa física tiver agido exclusivamente em seu próprio interesse, sem qualquer
conexão com os interesses da pessoa jurídica.
Nesse sentido é que se posiciona a doutrina majoritária
portuguesa, entretanto com certo cuidado posto que a responsabilidade do ente
coletivo tem de ser comprovada para, não trazer prejuízos econômicos nefastos e
desastrosos a este ente, não ser uma fuga para a não responsabilização da
pessoa singular (pessoa física) e assim deixando esta ultima imune às penas
aplicadas em lei.
As jurisprudências têm sido também neste sentido,
admitindo plenamente a responsabilidade criminal das pessoas jurídicas. Mesmo
antes da legislação já havia sido consagrada através de julgados da década de 70
a referida responsabilização da pessoa jurídica.
No Dec.–lei 28/84, em seus artigo 7°, foram previstas as
penas criminais aplicáveis à pessoa jurídica, sendo elas divididas em penas
principais; admoestação, multa e dissolução; e as penas acessórias; perda de
bens, caução de boa conduta, injunção judiciária; interdição temporária do
exercício de certas atividades ou profissões, privação temporária do direito de
particular em arrematações ou concursos públicos de fornecimentos; privação do
direito a subsídios ou subvenções outorgadas por entidades ou serviços públicos;
privação do direito de participar em feiras ou mercados; privação do direito de
abastecimento através de órgão da Administração Pública ou de entidades do
setor público, encerramento definitivo do estabelecimento, encerramento definitivo
do estabelecimento e publicidade da decisão condenatória.
3.1.2 - Responsabilidade da pessoa jurídica em França Recentemente a doutrina francesa vem se mostrando
receptiva à responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Com a atual reforma do
Código Penal ela foi expressamente aceita, sendo assim indo de encontro com a
jurisprudência que vinha se mostrando refratária a idéia da responsabilização.
53
Com a referida Reforma o artigo 121-2, feita pela Lei de
adaptação de 16.12.1992, foi acolhida a responsabilidade das pessoas morais de
forma plena, excluindo somente as infrações cometidas por coletividades
territoriais, isto é, comunas ou departamentos desde que estas estejam no
exercício das suas funções estatais; e o próprio Estado.
Sendo assim todas as pessoas jurídicas atingidas, para tal
feito, no plano teórico, acolheu-se a idéia de que a pessoa jurídica tem uma
vontade própria, e esta é diferente da vontade individual.
Contudo, para que se reconheça a responsabilidade das
empresas são necessárias duas condições, são elas: que a infração seja
cometida por um órgão ou representante moral, que a ação seja feita para o seu
interesse.
Com isso haverá a responsabilidade penal da pessoa
jurídica, e neste ponto ilustra Prado71 da seguinte forma:
Trata-se da teoria da responsabilidade penal por ricochete, de empréstimo,
subseqüente ou por procuração, que é explicada através dos
mecanismos denominado emprunt de criminalité, feito à
pessoa física pela pessoa jurídica, e que tem como suporte
obrigatório à intervenção humana.
Noutro dizer: a responsabilidade penal da pessoa moral está
condicionada à pratica de um fato punível suscetível de se reprovado a uma
pessoa física. Desse caráter subseqüente ou de empréstimo resulta importante
conseqüência: a infração penal imputada a uma pessoa jurídica será quase
sempre igualmente imputável a um pessoa física. Isso quer dizer: a
responsabilidade da primeira pressupõe a da segunda. É exatamente essa
71
PRADO, Luis Regis (Coord) A responsabilidade penal da pessoa jurídica: fundamentos e implicações in, PRADO Luiz Regis (Coord). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, p. 124.
54
simbiose entre pessoa física e jurídica que legitima o empréstimo de
criminalidade.72
Por fim, as penas previstas são a de multa, interdição
definitiva, ou temporária de exercer uma ou várias atividades profissionais ou
sociais, controle judiciário por 5 anos ou mais, fechamento definitivo ou
temporário do estabelecimento utilizado para a prática do delito, a publicação da
decisão judicial, a exclusão definitiva ou temporária dos mercados públicos, a
interdição do direito de emitir cheques, a dissolução e o confisco do objeto do
crime.
3.1.3 - Responsabilidade da pessoa jurídica em Alemanha
A Alemanha adota o princípio societas delinquere non potest
desde a revogação da legislação econômica estabelecida pelas potências de
ocupação após a II Guerra Mundial, que permitia a responsabilidade penal da
pessoa jurídica.
A orientação doutrinária sobre este quesito mudou
radicalmente, onde agora as pessoas coletivas só podem atuar por intermédio
dos seus órgãos, e assim elas não podem ser castigadas.
Podem sofrer sanções pela via do chamado direito penal
administrativo, ou contravenção á ordem, e tendo como sanção uma multa
administrativa chamada de Geldbusse.
A punição é feita através de multas administrativas,
bastando somente o comportamento antijurídico, não se exigindo a culpa. A
autoridade administrativa, diante do fato antijurídico, conforme o caso, pode impor
uma multa ou outras sanções, de caráter acessório como o confisco e a repetição
72
PRADO, Luis Regis (Coord) A responsabilidade penal da pessoa jurídica: fundamentos e implicações in, PRADO Luiz Regis (Coord). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, p. 124.
55
de indébito. Desta decisão pode se recorrer através do tribunal administrativo
regional.
O art. 30 da OWIG (Parte Geral da legislação
contravencional da República Federal da Alemanha) prevê a imposição de multa
contravencional, Geldbusse, contra pessoa jurídica ou associação de pessoas, se
seus órgãos tiverem cometido delitos ou contravenções à ordem e lesado assim a
legislação referente à empresa ou tenham atuado com o fim de favorecer a esta.
No tocante a multa leciona o doutrinador Shecaira73 da
seguinte forma:
“A justificativa para a adoção de tal sistema se firma na idéia segundo a qual não
se pode aplicar uma sanção de natureza penal às empresas,
em face da inexistência de reprovação ético-social de uma
coletividade. As multas, em tais casos, são desprovidas do
significado social de reprovação e, portanto, valorativamente
neutras; daí a razão de se adotar uma infração sem caráter
penal.”
Além dessas penas pecuniárias, os artigos 8 e 10 da lei
sobre delinqüência econômica contemplam o confisco a pessoa jurídica à seus
bens, dentre outras medidas. Apreensão de bens, restituição das vantagens e
encerramento as empresas também são medidas encontradas para reprovação
das empresas no direito alemão.
3.1.4 - Responsabilidade da pessoa jurídica em Estados Unidos
Assim como nos outros países do Common Law a
responsabilidade da pessoa jurídica também vigora, todavia é valido ressaltar que
em função do sistema federado norte-americano, alguns Estados, como Indiana,
não adotam a orientação majoritária nos Estados Unidos.
73
SHECAIRA, Sergio Salomão. op. cit., p. 73.
56
No direito norte-americano a empresa pode ser
responsabilizada desde que seu empregado esteja exercendo seu dever, mesmo
que esta empresa não tenha tirado proveito do fato delituoso.
E ainda, será responsável se quando o fato criminoso for
cometido de forma dolosa por um executivo de nível médio.
As penas pelo cometimento do delito são de multa e de
inabilitações.
Atualmente com o vertiginoso aumento dos crimes
praticados pelas pessoas jurídicas houve conseqüente aumento nas sanções
aplicadas aos mesmos, porém como na maioria das vezes a pessoa coletiva
consegue absorver o pagamento da multa, sendo repassados os valores para as
mercadorias, houve uma orientação em termos de prevenção.
Com isso a pessoa jurídica foi incentivada a prever
mecanismos internos diretos para prevenir, descobrir ou denunciar
comportamentos ilegais. E ainda havendo crime a empresa terá sua pena
pecuniária proporcional a sua culpabilidade no delito.
3.1.5 - Responsabilidade da pessoa jurídica em Espanha
A responsabilidade penal da pessoa jurídica não é
reconhecida na Espanha, tanto a doutrina quanto a jurisprudência tem um
posicionamento bastante firmado quanto a este ponto, tanto que a legislação
corrobora tal entendimento posto que a responsabilidade criminal pertence
somente as pessoas naturais.
Alguns doutrinadores espanhóis, como Silva Sanchez,
apontam o conflito de dois princípios no tocante a responsabilidade das
empresas. Não sendo admitida que a pessoa jurídica seja autora de crimes e do
outro lado a doutrina apregoando a necessidade político-criminal de sancionar
diretamente os entes coletivos, justificando que para combater as práticas
criminosas das empresas deve-se sancionar diretamente as mesmas.
57
Contudo, atualmente, a empresa pode ser punida se esta
auxiliar uma pessoa física a cometer um crime, nesse caso, a empresa sofre uma
medida de segurança, quais são, suspensão do funcionamento, dissolução e
privação de direitos e privilégios.
3.1.6 - Responsabilidade da pessoa jurídica em Inglaterra
Antes da metade do século XIX era princípio geral do
Common Law, a irresponsabilidade penal das pessoas jurídicas, as corporations,
que vigorava no país.
A responsabilização penal das pessoas jurídicas era vedada
tanto por obstáculos materiais, a incapacidade de querer, como processuais a
incapacidade de comparecer pessoalmente em juízo.
Devido ao crescimento industrial acentuado proliferaram-se
as corporations, com o aumento do poder destas os tribunais passaram a admitir
a responsabilidade penal da pessoa jurídica nas infrações decorrentes de
negligência ou omissão.
O grande marco jurisprudencial quanto ao reconhecimento
da responsabilidade penal foi a sentença de natureza penal exarada em 1840,
pelo Queens`s Bench no caso Reg versus The Birmigham e Gloucester,
condenou uma ferrovia a demolição de uma ponta construída indevidamente.
Nos dias atuais a Inglaterra condena penalmente as pessoas
jurídicas, seja por infrações mais leves, seja por infrações mais graves, tendo
destaque alguns campos como a segurança do trabalhador, a proteção ao
consumidos e a contaminação atmosférica.
3.3 . A REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS
3.3.1 - A luz da Constituição Federal de 1988
58
Toda discussão acerca do tema em tela foi causada porque
de maneira inusitada a Constituição Federal de 1988 inovou em dois pontos,
sendo eles, no artigo 173, § 5°, onde se afirma que a pessoa jurídica poderá ser
responsabilizada por atos cometidos contra a ordem econômica, financeira e
contra a economia popular, e ainda, no artigo 225, § 3°, abaixo transcrito:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais
e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados.
Pode-se observar no artigo supra que tanto as pessoas
físicas quanto as jurídicas estão sujeitas a sofrer sanções tanto penais quanto
administrativas, dando base assim para a responsabilização no âmbito penal das
mesmas.
A Carta Magna adota, dentre outras, as seguintes espécies
de penas com fulcro no artigo 5°, inciso XLVI: a) privação ou restrição de
liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e e)
suspensão ou interdição de direitos. Todavia a presente relação não exclui a
possibilidade de a pessoa coletiva ser objeto de algumas das mencionadas
sanções, salvo a primeira delas, de caráter evidentemente física, as demais
poderiam se aplicar às pessoas jurídicas. Apesar da compatibilidade formal, a
Constituição veda à hipótese de se levar a pessoa jurídica para o banco dos réus
criminais, pois no parágrafo 5° do mesmo artigo 173 da Constituição pátria,
preceitua que se deve sujeitar a pessoa, seja física ou jurídica, às punições
compatíveis com a sua natureza.
59
A Constituição Federal de 1988 consagra, dentre outros,
dois princípios norteadores do direito penal, são eles; o principio da culpabilidade
e o da individualização das penas.
O primeiro princípio citado diz que não há crime sem
culpabilidade, excluindo assim a possibilidade de reconhecimento da
responsabilidade objetiva.
Já o segundo princípio diz que nenhuma pena deverá passar
da pessoa do condenado, com isso ninguém responderá por um crime se não
houver ao menos participado culposa ou dolosamente para sua consumação,
sendo a sanção aplicada contra quem for considerado autor ou partícipe de tal
conduta.
Com isso indaga-se a compatibilidade da condenação de
pessoas jurídicas com os princípios norteadores do Código Penal, e por isso
alguns doutrinadores, dentre eles Miguel Reale Júnior74, acham inconstitucional
tal espécie de responsabilização no tocante a pessoa jurídica, por faltar
capacidade a mesma, o autor assim coloca:
Falta à pessoa jurídica capacidade criminal. Se a ação delituosa se realiza com o
agente realizando uma opção valorativa no sentido do
descumprimento de um valor cuja positividade a lei penal
impõe, se é uma decisão em que existe um querer, e um
querer valorativo, vê-se que a pessoa jurídica não tem essa
capacidade do querer dotado dessa postura axiológica
negativa.
O principal argumento trazido por tais doutrinadores consiste
em que a pessoa jurídica é sujeito de direitos e deveres, atuando por meios de
órgãos ou indivíduos, sendo assim totalmente determinável fisicamente a pessoa
que determinou ou deixou de determinar o ilícito que geraria a responsabilidade
penal.
74
REALE JR, Miguel. A responsabilidade penal da pessoa jurídica in, PRADO Luiz Regis (Coord). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, pág. 138.
60
3.3.2. A luz da Lei 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais)
Depois de algumas tentativas de aprovação de leis
apresentadas ao Congresso Nacional, as quais tratavam da regulamentação de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, foi aprovada a Lei 9.605/98, mais
conhecida como Lei dos Crimes Ambientais.
Importante faz-se ressaltar que nesta lei foi instituída pela
primeira vez no Brasil a responsabilidade da pessoa jurídica acerca da legislação
pátria, tendo por base a Carta Magna, a qual, como supra mencionado, já previa a
responsabilidade penal e administrativa da referida pessoa.
E ainda, os argumentos contra a responsabilização penal da
pessoa jurídica, onde seus principais defensores têm base constitucional, estes
vêm sendo rebatidos por muitos outros juristas, dentre eles: Júlio Fabbrini
Mirabete, Ada Pellegrini Grinover, Gilberto Passos de Freitas, Edis Milaré, entre
outros. O principal fundamento legal utilizado como base para estes juristas é o
artigo 3° da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), abaixo transcrito.
Art. 3° - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativas, civil e
penalmente conforme disposto nesta Lei, nos casos em que
a infração seja cometida por decisão de seu representante
legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse
ou beneficio de sua entidade.
Com fulcro no artigo supra a pessoa jurídica deve ser de
Direito Privado, posto que se fosse de Direito Público esta não poderiam cometer
ilícito penal no seu interesse ou beneficio, uma vez que isso somente aconteceria
se o administrador público agiu com desvio de poder. Ainda no mesmo artigo, há
de se destacar que se exige que a infração tenha sido cometida por decisão do
representante legal ou contratual e com a finalidade de obter beneficio ou
vantagem para dada empresa.
61
Neste quesito faz-se mister ressaltar as lições de
Sirvinskas75:
Ainda que fazendo ressalvas, como a dificuldade de se responsabilizar pessoa
jurídica face ao principio da culpabilidade vigente no direito
penal, admitem já que a tendência do direito penal moderno
é romper com clássico principio societas deliquere non
potest. Isto porque a pessoa jurídica não deve ser vista com
os olhos conceituais da doutrina clássica. Devem-se
observar suas particularidades para a eventual aplicação da
pena de caráter penal. Sua responsabilidade jurídica não
deve ser vista como dotada de vontade, na acepção estrita
da palavra. Deve-se distinguir a pessoa física que age em
nome da pessoa jurídica da própria pessoa jurídica.
No tocante ao artigo supra mencionado, confirma-se a
potencial gravidade do dano cometido pelas pessoas jurídicas, que atuam muitas
vezes com o espírito de acobertar os agentes que se escondem sob as estruturas
complexas de empresas modernas, e estas praticam as mais graves violações ao
consumidor e as mais perigosas ao meio ambiente.
Devido a essa complexidade das empresas modernas
entendeu-se que se não houvesse punição para este ente jurídico estas iriam
beneficiar-se do crime com a impunidade da afirmativa de que elas não têm
vontade, não podendo assim, agir e praticar delitos com o que acarretaria na não
punição dos verdadeiros agentes criminosos.
Este mesmo artigo 3° retrata que a pessoa jurídica deve ser
entendida em sentido lato, isto é, com exceção do Estado em si, qualquer pessoa
jurídica de direito público ou de direito privado pode ser responsabilizada, mesmo
porque a lei não faz distinção alguma.
O mesmo artigo ainda permite que além dos sócios, os quais
podem ser civil ou penalmente responsabilizados pelo dano, o ente coletivo seja
75
SIRVINSKAS, Luís Paulo. Tutela penal do meio ambiente: breves considerações atinentes à Lei n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1988. São Paulo, Saraiva, 1998, pág. 21/22.
62
também passível de punição, pois são duas pessoas distintas, e assim sendo
cada um terá sua pena proporcional ao dano causado.
Prosseguindo, no artigo 4°76 da Lei em tela foi introduzido
um importante instituto no tocante aos crimes ambientais, o da desconsideração
da pessoa jurídica, isto é, ocorrendo tal instituto a responsabilidade do sócio que
é limitada passa a ser ilimitada, e assim o patrimônio particular do sócio passa a
responder também.
Assim trata o referido tema Shecaira77 com fulcro nos
ensinamentos de Justen Marçal Filho da seguinte forma:
É necessário que se diga que essa desconsideração não ocorre em qualquer
situação e exige requisitos para que seja determinada. São
quatro os requisitos para que haja a desconsideração da
pessoa jurídica: o desvio de poder, o abuso de direito, a
fraude e prejuízos causados a terceiros. É necessário que
todos os requisitos estejam presentes para que possa haver
a desconsideração da pessoa jurídica.
Nota-se que tal desconsideração somente é aplicada
quando a personalidade jurídica é um meio para ocultar o ilícito penal, mas
sempre respeitando os quatro requisitos para a desconsideração. E nesta Lei
especificamente a desconsideração é de suma importância, pois por meio dela
permite-se que os danos sejam reparados, sendo assim facilitando a quitação do
prejuízo causado ao meio ambiente.
Posto isso a Lei dos Crimes Ambientais gerou certa
“revolução” no tocante a responsabilização penal das pessoas jurídicas em crimes
ambientais, porém faz-se a necessidade de estudar detalhadamente os
posicionamentos prós e contras tal responsabilização.
76
Art. 4° - Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que ela for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do Meio Ambiente. 77
SHECAIRA, Sergio Salomão. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 2ª ed, Método, São Paulo, 2003, pág. 153.
63
3.4 - ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURIDICAS.
É fatídico que no mundo globalizado dos dias de hoje o
crescimento econômico dos países, e conseqüente das empresas, costuma vir
acompanhado de crimes, sendo de grande escala os de caráter econômico e
ambiental, devido a isso costumeiramente busca-se na pessoa jurídica a sua
responsabilidade por tais crimes.
Sendo assim tema de constantes debates entre a doutrina
para a responsabilização ou não do ente coletivo, mesmo no cenário internacional
a doutrina vem discutindo acerca do tema como em capítulo oportuno será
mostrado.
Todavia a responsabilidade penal da pessoa jurídica não se
compatibiliza com adoção, pelo sistema brasileiro, de um Direito penal do jus
libertatis78, no qual imperam os princípios da capacidade de ação, da
culpabilidade, da personalidade da pena, conforme Luis Regis Prado preconiza.
Além do doutrinador acima há ainda muitos outros que não
aceitam a responsabilização penal da pessoa jurídica, dentre eles: Miguel Reale
Júnior, Luis Regis Prado, José Cretella Júnior, Cezar Roberto Bitencourt, José
Antonio Paganella Boschi e Luiz Vicente Cernichiaro. Estes doutrinadores têm
uma tripla sustentação para embasar suas idéias.
A primeira tem origem epistemológica, isto é, refere-se à
origem do tema, onde, como já explanado, Savigny elaborou a teoria da ficção
jurídica, este ao estudar sobre a natureza jurídica do ente coletivo definiu que a
pessoa jurídica tem existência fictícia e, portanto, não pode delinqüir, baseando
assim o princípio tradicional do societas delinquere non potest79.
Outro ponto norteador para os doutrinadores é a natureza da
pena, posto que se esta tem natureza preventiva não há que se falar em
78
Expressão em Latim: Direito à Liberdade. 79
Expressão em Latim: A sociedade não pode delinqüir.
64
responsabilidade penal da pessoa jurídica se essa não tem capacidade para
sentir o efeito da cominação desta, sobre o tema traz Prado80 o que segue.
Em verdade, o princípio da personalidade da pena – nenhuma pena passará da
pessoa do condenado (art. 5°, XLV, da CF) –
tradicionalmente enraizada nos textos constitucionais
brasileiros, impõe que a sanção penal recaia exclusivamente
sobre os autores materiais do delito e não sobre todos os
membros da corporação (v.g., operários, sócios minoritários
etc.), o que ocorreria caso se lhe impusesse uma pena. Não
há lugar aqui para outra interpretação senão a que liga a
responsabilidade penal à realização de um comportamento
próprio, sendo a responsabilidade pessoal sempre e
exclusivamente de ordem subjetiva. Afasta-se, desse modo,
qualquer outra modalidade de responsabilidade penal (v.g.,
coletiva, pelo fato de outrem etc.).
Ainda sobre o tema das penas o doutrinador Cabette81
corrobora do entendimento acima da seguinte forma:
Argumenta-se que a eventual condenação de uma pessoa jurídica poderia atingir
inocentes, tais como sócios minoritários que não atuaram na
tomada de decisão ou foram vencidos por maioria,
empregados ou outras pessoas físicas atingidas direta ou
indiretamente com a apenação da empresa. [...] Na verdade
esse tipo de efeito reflexo das sanções é irremediável. O que
contraria o Princípio da Personalidade das Penas, gerando
inconstitucionalidade (CF, art. 5°, XLV) é uma imputação
penal direta a terceiros por fato de outrem e não os reflexos
inerentes às sanções em geral, que constituem um mal
necessário ou inevitável.
Por fim o último ponto, e de maior relevância para a não
responsabilização da pessoa jurídica, de embasamento de tais doutrinadores é no
tocante ao princípio da culpabilidade, isto é, a exigibilidade de conduta diversa é
80
PRADO, Luis Regis (Coord) , Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, p. 108. 81
CABETTE, Eduardo Luis Santos. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica – Estudo Crítico. Curitiba: Juruá Editora. 2003. P. 64 e 66.
65
um dos elementos da culpabilidade em nosso sistema jurídico. Mais uma vez faz-
se necessário citar as lições de Prado82 para explanar o tema.
Sobre o principal critério aventado para justificar a culpabilidade da própria
pessoa jurídica (v.g., culpabilidade por defeito de
organização), tendo em conta as categorias sociais
(culpabilidade social), objeta-se correntemente, que a
culpabilidade da pessoa coletiva nesse sentido (como já
acontece com sua ação) continua sendo também uma
ficção, já que a organização defeituosa não pode ser
realizada pela própria pessoa coletiva, mas sim por seus
dirigentes. Isso significaria, portanto, fundamentar a
culpabilidade em fato alheio – culpabilidade presumida –
porque a responsabilidade da pessoa jurídica estaria
baseada na imputação do fato culpável de seu órgão ou
representante, em uma violação flagrante do princípio da
culpabilidade.
Acerca do tema em tela o doutrinador Reale Júnior83 faz seu
discurso de forma breve e concisa conforme abaixo exposto.
Falta à pessoa jurídica capacidade criminal. Se a ação delituosa se realiza com o
agente realizando uma opção valorativa no sentido do
descumprimento de um valor cuja positividade a lei penal
impõe, se é uma decisão em que existe um querer, e um
querer valorativo, vê-se que a pessoa jurídica não tem essa
capacidade do querer dotado dessa postura axiológica
negativa. A Constituição estabelece que a pena não passe
da pessoa do condenado (inc. XLV do art. 5°), e o inciso
seguinte diz que a lei individualizará a pena. A
individualização significa o quanto de reprovação, de
censurabilidade merece a conduta, sendo absolutamente
incongruente com admissão da pessoa jurídica como agente
de delitos. Portanto, há uma incapacidade penal da pessoa
jurídica, que a analise sistemática do texto constitucional
torna evidente.
82
PRADO, Luis Regis, Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. op. cit., p. 107 83
REALE JR, Miguel. A responsabilidade penal da pessoa jurídica in, PRADO Luiz Regis (Coord). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, pág. 138.
66
De acordo com o doutrinador Sergio Salomão Shecaira, o
qual é fervoroso defensor da responsabilização penal dos entes coletivos, há
quatro críticas utilizadas pelos doutrinadores que são contrários a esta
responsabilização penal.
A primeira destas críticas refere-se a que não há
responsabilidade sem culpa, isto é, devido à pessoa jurídica ser desprovida de
inteligência e vontade, não podendo esta cometer um crime, tendo sempre de
recorrer às pessoas físicas que a compõem.
Já a segunda crítica é no tocante a personalidade das
penas, como já estudado, refere-se que com a condenação da pessoa jurídica
poderiam ser atingidas pessoas físicas que não tiveram participação direta na
conduta delituosa.
A terceira crítica diz serem inaplicáveis as penas privativas
de liberdade, a qual é a principal medida institucional utilizada contra as pessoas
físicas.
Por fim, a quarta crítica refere-se que a pessoa jurídica não
se arrepende do ato cometido, posto que esta seja desprovida de vontade e não
tem capacidade para compreender a distinção dos fatos lícitos dos ilícitos, ficando
assim impossível que esta seja reeducada ou intimidada com as penas
previstas84.
Como se pode observar existem muitos entraves jurídicos
que os doutrinadores utilizam para justificar a não responsabilização penal do
ente coletivo, posto que é uma criação artificial da lei. Este não pode ser objeto de
autêntica responsabilidade penal, que somente pode recair sobre os reais
responsáveis pelo delito, ou seja, as pessoas físicas por trás das pessoas
jurídicas.
84
SHECAIRA, Sergio Salomão. op. cit., p.103-104
67
Há jurisprudência pátria que corrobora o entendimento dos
doutrinadores contrários a responsabilização penal da pessoa jurídica como se
pode observar abaixo:
Apelação criminal n. 2006.015166-6, de Videira.
Relator: Des. Irineu João da Silva.
CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE ¿ DENÚNCIA OFERTADA CONTRA PESSOA JURÍDICA ¿ ENTE QUE NÃO PODE SER RESPONSABILIZADO PELA PRÁTICA DE CRIME AUSÊNCIA DE VONTADE PRÓPRIA RECURSO PROVIDO.
A pessoa jurídica, porque desprovida de vontade própria, sendo mero instrumento de seus sócios ou prepostos, não pode figurar como sujeito ativo de crime, pois a responsabilidade objetiva não está prevista na legislação penal vigente (RCR n. 03.003801-9, de Curitibanos, rel. Maurílio Moreira Leite, j. 01.04.2003).
CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE (ART. 54, § 2º, INC. V, DA LEI N. 9.605/98) MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS CRIME FORMAL E DE PERIGO ¿ DESNECESSIDADE DA OCORRÊNCIA EFETIVA DO DANO, BASTANDO A POTENCIALIDADE LESIVA QUE POSSA CAUSAR CULPABILIDADE DO RESPONSÁVEL PELA EMPRESA EVIDENCIADA DELITO CONFIGURADO ¿ CONDENAÇÃO MANTIDA.
O crime de poluição é delito formal, que se consuma com a possibilidade de dano, pois, uma vez consumado, afeta de tal maneira o meio ambiente que, dificilmente, as suas características primitivas poderão ser recuperadas, advindo daí a necessidade de evitá-lo o quanto possível.
PENA ACESSÓRIA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL FIXAÇÃO CONFORME OS PREJUÍZOS SOFRIDOS PELO OFENDIDO OU PELO MEIO AMBIENTE E NÃO DE ACORDO COM AS CONDIÇÕES PESSOAIS DO RÉU RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal n. 2006.015166-6, da Comarca de Videira, em que são apelantes Comercial de Combustíveis Golfinho Ltda. e Guilherme Scapini, e apelada a Justiça Pública, por seu promotor:
ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, para anular o processo e rejeitar a denúncia, no tocante a Comercial de
68
Combustíveis Golfinho Ltda, nos termos do art. 43, inc. III, primeira parte, do Código de Processo Penal, mantidas as demais cominações da sentença.
Temos ainda jurisprudência do mesmo tribunal estadual neste sentido
CRIME AMBIENTAL DENÚNCIA NOS TERMOS DO ART. 3º DA LEI N. 9.605/98 REJEITADA EM RELAÇÃO À PESSOA JURÍDICA PROSSEGUIMENTO QUANTO À PESSOA FÍSICA RESPONSÁVEL RECURSO DA ACUSAÇÃO PLEITEANDO O RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA AUSÊNCIA DE PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS ORIENTAÇÃO DOUTRINÁRIA OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PESSOALIDADE DA PENA E DA IRRESPONSABILIDADE CRIMINAL DA PESSOA JURÍDICA VIGENTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO RECURSO DESPROVIDO (Rec. Crim. n. 00.004656-6, de Descanso, Rel. Juiz Torres Marques, j. 12.09.2000).
Também:
Apelação criminal. Artigo 54 da Lei n. 9.605/98. Denúncia oferecida contra pessoa jurídica. Impossibilidade de a pessoa jurídica figurar no pólo passivo da ação penal. Recurso provido para excluí-la da relação processual¿ (Apelação criminal n. 02.011726-4, de Itajaí, rel. Des. Maurílio Moreira Leite, j. 25.02.2003).
E, deste relator:
AÇÃO PENAL CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE REJEIÇÃO DA DENÚNCIA ¿ RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA IMPOSSIBILIDADE PRECEDENTE DESTE TRIBUNAL RECURSO MINISTERIAL NÃO PROVIDO (Recurso criminal n. 02.023129-6, de Videira, j. 18.02.2003).
Apelação Criminal n. 2008.049436-6, de Itajaí
Relator: Des. Victor Ferreira
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL (ART. 54 DA LEI N. 9.605/98).
SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. LIMITE DE PENA MÍNIMA NÃO ALTERADO PELA LEI N. 10.259/01. CONTINUIDADE DELITIVA DEVIDAMENTE DESCRITA NA DENÚNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 243 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA BENESSE NÃO PREENCHIDOS.
69
A Lei n. 10.259/01, que disciplina os Juizados Especiais Federais, refletiu na Lei n. 9.099/95 apenas quanto ao conceito de infrações de menor potencial ofensivo. O limite de pena mínima para que o autor do fato tenha direito ao sursis processual permanece de 1 ano.
ATIPICIDADE DA CONDUTA. TIPO LEGAL QUE INCRIMINA A CONDUTA DE CAUSAR POLUIÇÃO "DE QUALQUER NATUREZA". PREVISÃO QUE ALCANÇA A POLUIÇÃO SONORA.
O art. 54 da Lei n. 9.605/98, ao tipificar a conduta de "causar poluição de qualquer natureza", alberga os ruídos que interferem no meio ambiente e afetam a saúde humana.
ILEGITIMIDADE PASSIVA. PREVISÃO CONSTITUCIONAL DA RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. INEXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE EXIGÊNCIA DE CO-AUTORIA. CONDUTA INDISCUTIVELMENTE PRATICADA POR DECISÃO DO REPRESENTANTE LEGAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL, POR ESSE MOTIVO, INVIÁVEL.
3.5 - ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À REPONSABILIZAÇÃO PENAL DAS PESSOAS JURIDICAS
A responsabilidade penal da pessoa jurídica tem de ser
contemplada como um grande avanço nos Direitos Penal e Ambiental brasileiro,
posto que os entes coletivos são os maiores poluidores e degradadores do meio
ambiente, estes lançam resíduos sólidos, líquidos ou gasosos no solo, no ar ou
nas águas, causando danos irreversíveis para a natureza. Além do meio
ambiente, a poluição coloca em risco a vida do homem, e ambos, são protegidos
por lei e, ainda têm proteção nas esferas civil, administrativa e penal.
Todavia as esferas civis e administrativas não têm
repercutido o efeito esperado em suas sanções sobre as pessoas jurídicas, assim
a esfera penal tem de exercer sua função perante a sociedade e punir
severamente os infratores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas.
A Teoria da realidade, defendida primariamente por Otto
Gierke, afirma que as pessoas jurídicas são seres reais, reconhecidos e
70
regulados por lei, com isso possuindo os requisitos para lhe serem imputados as
sanções penais possíveis. Leciona Sales85 sobre o tema.
A pessoa moral é como a pessoa física: como os indivíduos possuem capacidade
de atuar, ainda que mediante formas diferentes as pessoas
morais, segundo esta tese, com efeito, vivem uma existência
distinta da de seus membros, possuem direitos e obrigações
diferentes daquelas que incumbem aos primeiros.
O primeiro alicerce para a responsabilização penal dos entes
coletivos é a Constituição Federal de 1988 em seu art. 225, parágrafo 3º, onde se
encontra o fundamento da responsabilidade penal da pessoa jurídica na esfera da
proteção ao meio ambiente, fundamento o qual foi mais bem trabalhado pelo
legislador em lei própria (Lei 9.605/98), cabendo a esta legislação
infraconstitucional tornar plausível sua aplicação. Vemos que:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preserva- lo para as presentes e futuras
gerações.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais
e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados.
A Lei 9.605/98, Lei dos Crimes Ambientais, versa sobre a
tutela do meio ambiente e em seu artigo terceiro dispõe como segue: “As pessoas
jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o
disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu
representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou
benefício da sua entidade.”; assim evidenciando a possibilidade da
85
SALES, Sheila Jorge Selim, Anotações sobre o principio Societas Delinquere Non Potest no direito penal moderno: um retrocesso praticado em nome da política criminal? in, PRADO Luiz Regis (Coord). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, 1ª ed. São Paulo: RT, 2001, pág. 138.
71
responsabilização penal da pessoa jurídica, todavia não diferenciando a de Direito
Privado da de Direito Público, tema o qual ficou a cargo da doutrina e
jurisprudência estabelecer.
Interpretando o artigo supra de forma minuciosa, depara-se
com alguns requisitos legais para a pessoa jurídica ser responsabilizada
penalmente.
O primeiro deles é que a infração seja cometida pelo
representante legal ou contratual do ente coletivo, representante este que é
aquele que exerce sua função em virtude e com base na lei, sobre este tema
Shecaira86 trata de forma brilhante quando diz:
O indivíduo que pratica ações puníveis no exercício das funções que tem dentro
de uma empresa o faz, em regra, na pior das hipóteses, com
o consentimento tácito dos outros sócios ou a mando de
seus dirigentes. Quando pratica o crime, ele se despe de
suas condições pessoais, agindo no interesse exclusivo da
empresa. A obtenção de vantagens para um funcionário só
será efetiva de forma indireta; isto é, o objetivo do
empregado é ascender socialmente: promovendo-o, a
empresa nele depositará, mais e mais, sua confiança.
E continua mais adiante:
Assim, a empresa que ampliou seus rendimentos, e acabou beneficiando-se com
o cometimento do delito, permanece com o patrimônio
integro, de vez que a pena de multa aplicada ao funcionário
(ou mesmo diretor), ainda que seja paga pela pessoa
jurídica, será fixada tendo em conta a fortuna da pessoa
física, e não tendo como referencia a vantagem auferida
com o crime e o patrimônio da pessoa jurídica.87
Assim pode-se perceber que no caso do ente coletivo não
pode ser responsabilizado penalmente e sim a pessoa física em seu lugar, para a
empresa será melhor, diga-se, até certo ponto benéfico, posto que com a renda
86
SHECAIRA, Sergio Salomão. op. cit., p. 108. 87
Ibidem., p. 108.
72
obtida em relação à multa recebida, a qual foi para seu funcionário e tendo este
como base para a aplicação da punição, é muito mais vantajoso para a empresa
quitar sua dívida e dar certa remuneração especial a seu funcionário, pois este
responderá penalmente devido ao serviço prestado a pessoa jurídica.
Com essa sanção a pessoa jurídica não será afetada
perante a sociedade e assim saindo, de certa forma, impune, sendo que a
prevenção geral seria maior se a empresa fosse efetivamente punida, e ainda
com a divulgação desta notícia a empresa sofreria um dos efeitos da sanção
penal, qual seja de sancionar o infrator e mostrar à sociedade, a titulo
exemplificativo, a sanção sobre determinada conduta.
Outro requisito legal é que o ato tenha sido praticado no
interesse ou beneficio da pessoa jurídica, assevera sobre o tema Sirvinskas88 o
que segue:
Interesse se consubstancia na vantagem, proveito ou no lucro material ou
pecuniário. Beneficio, por outro lado, se caracteriza no favor,
graça, serviço ou bem que se faz gratuitamente. Interesse e
beneficio são sinônimos. Não é, portanto, somente a idéia de
vantagem ou de lucro que existe no termo interesse. Assim,
age criminosamente a entidade em que seu representante
ou seu órgão colegiado deixa de tomar medidas de
prevenção do dano ambiental, por exemplo, usando
tecnologia ultrapassada ou imprópria à qualidade do
ambiente. De qualquer modo, a pessoa jurídica deve ser
beneficiaria direta ou indiretamente pela conduta praticada
por decisão de seu representante legal ou contratual ou de
seu órgão colegiado.
O último requisito legal importante a ser estudado é a não
definição se todas as pessoas jurídicas podem ser responsabilizadas penalmente,
as de Direto Público e Privado ou somente as de Direito Privado.
Alguns doutrinadores entendem que somente a pessoa
jurídica de Direito Privado pode ser responsabilizada penalmente posto que as de
88
SIRVINSKAS, Luís Paulo. op. cit. p.61.
73
Direito Público não podem cometer ilícito penal no seu interesse ou beneficio já
que perseguem os interesses da sociedade, e se caso isso ocorrer o
administrador público que terá cometido desvio de poder e assim somente a
pessoa física que cometeu tal desvio deverá ser responsabilizada e
conseqüentemente punida devido a infração cometida.
Há outros doutrinadores que defendem a idéia de que tanto
o ente coletivo de Direito Privado ou Público deve responder penalmente, estes
justificam que as pessoas jurídicas de Direito Público seriam punidas nos casos
em que estiver praticando atos de comércio e concorrendo com pessoas de
Direito Privado. Com isso haverá a igualdade entre todas as pessoas jurídicas
independentemente de suas supostas naturezas jurídicas, sob pena de não o
fazendo quebrar o princípio da isonomia amparado constitucionalmente.
Outro argumento para responsabilização das pessoas
jurídicas de Direito Público é que com a penalização desta, as outras pessoas
jurídicas teriam maior cuidado para a prática de qualquer ato lesivo contra o meio
ambiente.
Conforme relatado no capitulo anterior o doutrinador Sergio
Salomão Shecaira cita quatro críticas que são utilizadas pelos doutrinadores que
são contrários a devida responsabilização penal da pessoa moral, críticas estas
que o mesmo autor rebate de forma brilhante, como se pode observar.
Uma das críticas utilizadas pelos doutrinadores é a que se
refere ao princípio da personalidade da pena, como já explanado, o qual consiste
em que uma condenação da pessoa jurídica poderia vir a afetar pessoas físicas
inocentes, sejam estes sócios minoritários, acionistas entre outros. Todavia tal
argumento não deve ser levado em conta, posto que a Parte Geral do Código
Penal prevê penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e multa,
nenhuma destas deixa de atingir terceiros. Um belo exemplo dado pelo
doutrinador em questão é o do pai de família que tem sua liberdade privada, e
acarretando inúmeros percalços para sua mulher e filhos, atingindo estes de
forma indireta.
74
Outra crítica rebatida de forma brilhante pelo doutrinador
Shecaira89 é que seriam inaplicáveis certas penas às pessoas coletivas, como a
de prisão. Tal argumento utilizado não merece prosperar uma vez que desfocam
o problema principal, aqui se faz necessário a citação do autor.
No plano do direito econômico ou mesmo do direito ecológico, aonde
normalmente vem se implementando a responsabilidade
coletiva, a pena privativa de liberdade é, na maioria das
vezes, desnecessária e até descabida. O tipo particular de
agente que comete crimes econômicos, que a criminologia
moderna, a partir de Sutherland, batizou de “crimes de
colarinho branco”, não precisa de qualquer “ressocialização”,
por se tratar de pessoa altamente socializada, integrada ao
corpo social e de boas qualificações profissionais.
Mais uma crítica rebatida é a impossibilidade da pessoa
jurídica arrepender-se, não sofrer intimidação, e não podendo ser emendada ou
reeducada através da pena que lhe for atribuída. Todavia os principais objetivos
das penas hoje em dia tem de ter sua relevância pública e não se baseando em
princípios morais para punir o ente coletivo.
Por fim, a última crítica a ser rebatida, e a de maior
relevância, refere-se ao argumento de que não há responsabilidade sem culpa e
esta pressupõe vontade própria, a qual somente seria encontrada na pessoa
física e não na pessoa jurídica. Todavia a pessoa jurídica é um encontro de
vontades individuais, gerando assim uma vontade coletiva, caracterizada pela
deliberação e pelo voto na assembléia geral dos seus membros, com isso a
vontade coletiva tem consciência de seus atos e podendo ser plenamente capaz
de cometer crimes assim como a pessoa física com vontade individual.
Válido é ressaltar que a jurisprudência pátria vem
entendendo em sua maioria que se deve responsabilizar penalmente o ente
coletivo, como se observa abaixo:
89
SHECAIRA, Sergio Salomão. op. cit. p. 106.
75
Recurso Criminal n. 2008.035801-5, de Joinville Relator: Solon d´Eça Neves Juiz Prolator: João Marcos Buch Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal Data: 11/12/2008 Ementa: RECURSO CRIMINAL - CRIME AMBIENTAL - REJEIÇÃO DA DENÚNCIA NA PARTE EM QUE FIGURAVA PESSOA JURÍDICA COMO SUJEITO PASSIVO DE DELITO PENAL - LEI DOS CRIMES AMBIENTAIS (LEI N. 9.605/98) QUE ADMITE EXPRESSAMENTE A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA - RECURSO PROVIDO. A Lei dos Crimes Ambientais inovou o Direito Brasileiro quando admitiu, expressamente, a RESPONSABILIDADE PENAL da PESSOA JURÍDICA para coibir e penalizar os chamados crimes de dano ao meio ambiente cometido por empresas. Necessário atender ao rigorismo pretendido pela legislação em relação ao infrator que provoca danos ao meio ambiente, seja PESSOA física ou JURÍDICA, resguardando, com isso, o direito constitucional que garante qualidade de vida AMBIENTAL a todos.
Processo Crime n. 2005.006085-0, de Trombudo Central.
Relator: Juiz José Carlos Carstens Köhler..
CRIME AMBIENTAL ARTIGO 60 DA LEI 9.605/98 PENA MÁXIMA EM ABSTRATO INFERIOR A UM ANO PRESCRIÇÃO NA FORMA RETROATIVA LAPSO SUPERIOR A UM BIÊNIO ENTRE A DATA DO ILÍCITO E O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE RECONHECIDA.
ILEGITIMIDADE DE PARTE ACUSADO QUE ALEGA NÃO EXERCER ATOS DE ADMINISTRAÇÃO DA EMPRESA NA ÉPOCA DOS FATOS AUSÊNCIA DE PROVA INTELIGÊNCIA DO ART. 156 DO CPP RÉ QUE ARGÚI AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE SOBRE OS FATOS IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO PRIMA FACIE RESPONSÁVEL QUÍMICA DA INDÚSTRIA POLUIDORA MATÉRIA AFETA AO MÉRITO PREFACIAIS AFASTADAS.
RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA POSSIBILIDADE EXEGESE DO ART. 225, § 3º, DA ¿CARTA DA PRIMAVERA PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
DELITO PREVISTO NO ART. 54, § 2º, INCISO V, DA LEI 9.605/98 AUTORIA E MATERIALIDADE PATENTEADAS POLUIÇÃO DO LEITO DO RIO MORTE DE PEIXES VAZAMENTO DA LAGOA DE DECANTAÇÃO LÍQUIDO TÓXICO PERÍCIA CONCLUSIVA ¿ CRIME DE PERIGO ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. DENÚNCIA PARCIALMENTE PROCEDENTE.
76
Temos ainda:
PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CRIME CONTRA O
MEIO AMBIENTE. RESPONSABILIDADE PENAL DA
PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. EVOLUÇÃO
HISTÓRICA DO CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA.
PASSAGEM DA CRIMINALIDADE INDIVIDUAL OU
CLÁSSICA PARA OS CRIMES
EMPRESARIAIS.Criminalidade de empresas e das
organizações criminosas. Diferenças. Sistema normativo
repositivo e retributivo. Imputação penal às pessoas
jurídicas. Capacidade de realizar a ação com relevância
penal. Autoria da pessoa jurídica deriva da capacidade
jurídica de ter causado um resultado voluntariamente e com
desacato ao papel social imposto pelo sistema normativo
vigente. Possibilidade de a pessoa jurídica praticar crimes
dolosos, com dolo direto ou eventual, e crimes culposos.
Culpabilidade limitada à manifestação de vontade de quem
detém o poder decisório. Função de prevenção geral e
especial da pena. Falência da experiência prisional.
Prestação de serviços à comunidade. Melhores resultados.
Aplicabilidade às pessoas jurídicas. Vontade da pessoa
jurídica se exterioriza pela decisão do administrador em seu
nome e no seu proveito. Pessoa jurídica pode consumar
todos os crimes definidos nos artigos 29 e seguintes da lei
9.605/98. Penas aplicáveis. Critérios para aplicação das
penas alternativas e prescrição. Limites mínimo e máximo da
pena privativa de liberdade previstos nos tipos da lei
9.605/98. Interrogatório não deve ser feito na pessoa do
preposto. Ato deve ser repetido na pessoa do atual dirigente.
Prova. Necessidade de revelar a existência de um comando
do centro de decisão que revele uma ação final do
representante. Inviabilidade de analisar provas em sede de
mandado de segurança. Necessidade de contraditório.
Segurança denegada.Desembargador Federal Fábio
Bittencourt da Rosa, Tribunal Regional da 4ª Região,
Mandado de Segurança nº 2002.04.01.013843-0/PR.
77
Mostrados todos os argumentos e vistos, então, o
entendimento jurisprudencial pátrio.Seguimos para às considerações finais do
trabalho.
Considerações Finais
A responsabilidade penal da pessoa jurídica é um tema
muito discutido na atualidade, seja no Brasil ou em outros países, e há uma forte
tendência mundial no tocante a adoção da responsabilidade penal do ente
coletivo, principalmente nos enfoques econômico e ambiental.
No Brasil, verificou-se a necessidade da revisão do código
penal, pois estava obsoleto frente à criminalidade moderna, sendo que a
responsabilidade penal da pessoa jurídica é um ponto imprescindível para a
atualização do mesmo. Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, o
tema da proteção do meio ambiente nunca havia sido motivo de tutela
constitucional, tendo aquela constituído um marco histórico, na medida em que
dedicou um capítulo para disciplinar o assunto.
Referida elevação ao status constitucional veio de encontro
a uma tendência contemporânea com os interesses difusos, e, em especial com o
meio ambiente, que deve ser saudável, equilibrado e íntegro.
Para a responsabilização do ente corporativo são
necessários quatro requisitos: que a infração individual tenha sido praticada no
interesse da pessoa jurídica, que esta infração não se situe fora da esfera de
atividade da empresa, que a mesma seja cometida por pessoa estritamente ligada
ao ente coletivo e que a prática do delito tenha o auxílio do poderio da pessoa
coletiva.
Todavia grandes doutrinadores refutam a responsabilização
embasando-se em três principais argumentos, são eles; o princípio da
personalidade das penas, a inaplicabilidade das penas privativas de liberdade às
pessoas jurídicas e a inviabilidade do arrependimento, intimidação e reeducação
destes entes coletivos.
Em face do primeiro argumento, o princípio da personalidade
das penas, não é atingido pela responsabilização penal da empresa, posto que,
79
os terceiros eventualmente atingidos para com a punição da pessoa jurídica não
são atingidos diretamente, mas sim como ocorreria com a aplicação de qualquer
pena imposta a uma pessoa física, como no que atinge a família do condenado
penal.
Já o segundo argumento, inaplicabilidade das penas
privativas de liberdade, não tem razão de ser aceita posto que nem mesmo às
pessoas físicas esta modalidade de pena é a única modalidade de pena aplicada,
tendo-se alternativas para a aplicação de sanção sobre o ente coletivo.
Por fim, o terceiro argumento é a inviabilidade do
arrependimento, intimidação e reeducação destes entes coletivos que é
totalmente refutável, posto que tal indagação também pode ser feita no que tange
às pessoas físicas.
E ainda, além da Constituição Federal de 1988 ter adotado a
responsabilização penal das pessoas jurídicas (artigos 173, 5° e 225, 3°) há ainda
a Lei 9.605/98, a Lei dos Crimes Ambientais, a qual veio como apoio
infraconstitucional para a Carta Maior estabelecendo, ainda que não
perfeitamente, a maneira de se aplicar a responsabilidade penal ao ente coletivo,
como se pode observar no artigo 3°, em caso de crimes ambientais.
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta
de atividade econômica pelo Estado só será permitida
quando necessária aos imperativos da segurança nacional
ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 3º - A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a
sociedade.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preserva- lo para as presentes e futuras
gerações.
80
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais
e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados.
Art. 3° - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e
penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em
que a infração seja cometida por decisão de seu
representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Desta forma, conclui-se, em linhas finais versando sobre a
responsabilidade penal da pessoa jurídica, esta deve alcançar todas as pessoas
jurídicas de direito privado, abrangendo mesmo as empresas “paraestatais”,
desde que seja reconhecido o desvio de finalidade das empresas com utilização
de sua estrutura para prática de crimes. No tocante as pessoas jurídicas de direito
público não devem ser responsabilizadas penalmente, dada a sua natureza e em
face de o Estado não dever punir a si próprio, o que revelaria um ônus para a
sociedade como um todo90.
90
SHECAIRA, Sergio Salomão, Op. Cit, p. 196.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS Academia Brasileira de Letras Jurídicas. Dicionário Jurídico. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
AGUIAR, Roberto Armando Ramos de. Direito do Meio Ambiente e Participação Popular, Brasília, Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal/IBAMA, 1994.
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental, 8 ed. rev. Ampl. Atual., editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2005
ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995,
BARROS, Flávio Augusto Monteiro. Direito Penal, parte geral. V.1 5. Ed. rev. Atual.. São Paulo: Saraiva, 2006,
BRASIL. Constituição de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em 31 jul. 2009.
BRASIL. Lei dos Crimes Ambientais. Lei n° 9.605 de 12 de fevereiro de 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9605.htm. Acesso em 12 ago. 2009.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Disponível em: http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/VerIntegraAvancada.do. Acesso 20 jul. 2009. Recurso criminal n. 2005.000496-2, de Joaçaba. Relator: Des. Sérgio Paladino. Tribunal de Justiça de Santa Catarina
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Disponível em: http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/VerIntegraAvancada.do. Acesso 20 jul. 20009 Apelação criminal n. 2006.015166-6, de Videira. Relator: Des. Irineu João da Silva. Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php. Acesso em 10 ago. 2009. Apelação Crime Nº 70009597717, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Eugênio Tedesco, Julgado em 14/10/2004.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php . . Acesso em 10 ago. 2009. Apelação Crime Nº 70009200510, quarta câmara criminal, Tribunal De Justiça Do RS, Relator: Lúcia De Fátima Cerveira, julgado em 12/05/2005
82
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