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MARIANE TOJEIRA CARA ALMEIDA
A MARCA NA MODA JOVEM:
A RELEVÂNCIA DA EXPERIÊNCIA COLATERAL NA EFICÁCIA COMUNICATIVA DA MARCA
PUC/SP
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
SÃO PAULO
2007
MARIANE TOJEIRA CARA ALMEIDA
A MARCA NA MODA JOVEM:
A RELEVÂNCIA DA EXPERIÊNCIA COLATERAL NA EFICÁCIA COMUNICATIVA DA MARCA
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre
em Comunicação e Semiótica - área de
concentração Signo e Significação das
Mídias - sob a orientação da Profª.
Doutora Maria Lúcia Santaella Braga.
PUC/SP
SÃO PAULO
2007
BANCA EXAMINADORA
Para Fabio: um sonhador
incurável, que vive com os pés no
chão e a cabeça no espaço, entre
aviões e foguetes.
Agradecimentos
Muitas mãos prestativas e pensamentos generosos fizeram parte das
linhas que formam esta dissertação. Destes encontros agradeço especialmente:
CNPq, pela bolsa de estudos que possibilitou a realização do mestrado;
Lúcia Santaella, pela orientação atenciosa em todos os momentos, que
confirmam seu brilhantismo acadêmico e energia exemplar;
Cida, por todo suporte e pronto-atendimento: elementos decisivos em
tantas ocasiões;
Suzana Avellar, pela indicação do caminho, auxílio constante e amizade
sincera;
Grupo de Estudos da Moda do CEPE, pelas reuniões e conversas, em
especial à Solange Moreira, por sua contribuição nos aspectos formais do
trabalho;
Daniel Cara, pela disponibilização de bibliografias e pesquisas sobre
jovens e por seu cuidadoso trabalho em prol da juventude e educação brasileira;
Alunos do Senac São José dos Campos, turma Moda manhã 2005, pela
dedicação à pesquisa de campo que auxiliou na análise do tema proposto;
Kazuyo Yamada, pelo modelo de pessoa, professora de Moda e por
tantas conexões que nos aproximaram;
Marco Andreoni, pelos vários trajetos profissionais e acadêmicos;
Júlio Bueno, pela percepção diferenciada da juventude que nos permitiu
construir um trabalho inesquecível junto aos adolescentes;
Supera Comunicação, pelas experiências enriquecedoras em Publicidade,
Marketing e novas oportunidades em Moda;
Fabio Almeida, pelo apoio incondicional, amor verdadeiro e por todos os
momentos juntos na estrada do conhecimento, em suas mais diversas facetas;
Clóvis, Isabel e Beatriz, pelo incentivo ininterrupto.
À Deus, autor e criador da vida.
SUMÁRIO
Introdução ........................................................................................................... 2
Capítulo 1 Moda: Forma de Presença .............................................................. 8
1.1 A Roupa e a Moda .......................................................................................8 1.1.1 Vestir-se é preciso ................................................................................ 8
1.1.2 Diferenças terminológicas da vestimenta ........................................... 11
1.1.3 A dinâmica da Moda ........................................................................... 13 1.1.4 Assim caminha a Moda ...................................................................... 15
1.2 Olhar na Moda ........................................................................................... 21
1.3 Corpo e Aparência ..................................................................................... 22 1.3.1 O Corpo pavoneado ........................................................................... 22
1.3.2 Aparecer para ser ............................................................................... 26
1.4 A Moda como forma de presença .............................................................. 28
Capítulo 2 Marca de Moda .............................................................................. 33
2.1 Marca ......................................................................................................... 33
2.1.1 Elementos representativos da marca ................................................. 34
2.2 Personalidade e Familiaridade com a marca ............................................. 37
2.2.1 Personalidade de marca ..................................................................... 37 2.2.2 Familiaridade com a marca ................................................................ 39
2.3 A marca de Moda ....................................................................................... 41
2.3.1 Trajetória da marca de Moda.............................................................. 42
2.3.2 Marcas de Exclusividade .................................................................... 44 2.3.3 Marcas de Diferenciação .................................................................... 45
2.3.4 Marcas de Identificação ...................................................................... 46 2.3.5 A aura da Moda .................................................................................. 48
Capítulo 3 Juventude Transmutada ............................................................... 51
3.1 Juventude em contexto .............................................................................. 51
3.1.1 A Adolescência ................................................................................... 54 3.1.2 Três gerações distintas ...................................................................... 57
3.2 Dados atuais sobre adolescentes e jovens ................................................ 63 3.2.1 Família ................................................................................................ 64 3.2.2 Vida Social.......................................................................................... 64
3.2.3 Lazer .................................................................................................. 65 3.2.4 Preocupações juvenis ........................................................................ 66
3.2.5 Sexualidade ........................................................................................ 68 3.2.6 Auto-análise ........................................................................................ 69
3.3 O adolescente e seu relacionamento com as marcas de Moda ................. 71
3.3.1 O corpo adolescente .......................................................................... 71 3.3.2 Moda na visão juvenil ......................................................................... 73
3.3.3 Marcas de Moda Jovem ..................................................................... 74
Capítulo 4 A Teoria Peirceana aplicada à Moda Comercial ......................... 78
4.1 Por que aplicar a Teoria Peirceana num estudo de Moda? ....................... 78
4.2 Teoria Geral dos Signos: Fundamento, Objeto e Interpretante .................. 79 4.2.1 Fundamento (Ground) ........................................................................ 80
4.2.2 Objeto ................................................................................................. 81
4.2.3 Interpretante ....................................................................................... 82
4.3 A Experiência Colateral segundo Charles Sanders Peirce ........................ 86
4.4 Aplicação da Teoria Geral dos Signos na Semiose da Moda Comercial ... 96 4.4.1 O Fundamento do Signo .................................................................... 98 4.4.2 O Objeto do Signo ............................................................................ 100 4.4.3 O papel do Corpo ............................................................................. 103
4.4.4 Interpretante ..................................................................................... 105
4.4.5 (X) Experiência Colateral .................................................................. 110
Capítulo 5 O Papel da Experiência Colateral na Eficácia Comunicativa da marca de Moda Jovem ................................................................................... 113
5.1 A vida estetizada ...................................................................................... 113
5.2 A Experiência Colateral na Eficácia Comunicativa da marca de Moda Jovem ........................................................................................................... 115
5.2.1 Ação do Interpretante Dinâmico ....................................................... 117 5.2.2 Consumo redentor ............................................................................ 119
5.3 Mídias de Massa e Ciberespaço como Experiência Colateral ................. 121 5.3.1 TV ..................................................................................................... 124
5.3.2 Internet ............................................................................................. 127 5.3.3 Celulares .......................................................................................... 132
5.3.4 Revistas ............................................................................................ 134
5.3.5 Rádio ................................................................................................ 136 5.3.6 Jornais .............................................................................................. 136 5.3.7 Relevância das Mídias ..................................................................... 137
5.4 Outros acessos intermináveis .................................................................. 138 5.4.1 O Shopping ....................................................................................... 140
5.4.2 Acessos em rizoma .......................................................................... 142
5.5 A memória ................................................................................................ 144
Considerações Finais ..................................................................................... 150
Referências Bibliográficas ............................................................................. 154
Anexos ............................................................................................................. 165
Tópicos sobre marcas de Moda no Orkut ...................................................... 165
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Funcionamento e Determinações de uma Semiose ......................... 85
Figura 2: Representação didática de uma semiose ........................................ 88
Figura 3: Objeto Imediato - Foto da coleção Adidas Inverno 2006. .............. 101
Figura 4: Superação do Corpo - Foto da coleção Nike Inverno 2006. .......... 105
Figura 5: Formas de apresentação do Interpretante Imediato na Moda ....... 106
*As figuras ilustrativas que antecedem cada capítulo foram desenvolvidas
especialmente para a dissertação.
*A foto contida na figura de abertura do estudo, que precede a figura de
introdução, foi cedida por Ciceli Gravito em julho de 2006, para fins acadêmicos.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Preocupação dos jovens por região ................................................ 67
Tabela 2: Palavras escolhidas pelos jovens para definir a geração ................ 70
Tabela 3: Consumo entre os jovens de São Paulo ........................................ 119
Tabela 4: Principais Estilos de roupas para Adolescentes ............................ 120
Tabela 5: Fontes de Informação utilizadas pelos jovens ............................... 123
Tabela 6: Pesquisa Ibope – Programa Malhação .......................................... 125
Tabela 7: Perfil de leitoras da revista “Atrevida” ............................................ 135
Tabela 8: “Perceptual Map” – Meios de Comunicação. ................................. 137
Tabela 9: Lugares mais freqüentados por jovens das regiões Metropolitanas. ...................................................................................................................... 141
RESUMO
A identidade de uma marca de Moda, em especial no universo jovem, é construída por diversas informações que estão além das roupas comercializadas. Para entender sua complexidade e assim chegar à compreensão maior do fenômeno, o objetivo deste estudo é analisar a relevância da Experiência Colateral - conceito teórico cunhado por Charles Sanders Peirce em sua Teoria Geral dos Signos – na construção da identidade da marca. Neste caso, a Experiência Colateral designa a intimidade prévia dos jovens, em especial na fase adolescente, com o arcabouço simbólico da marca, intimidade que se desenvolve por meio da influência que as diversas mídias de massa e outros sistemas midiáticos exerce sobre os jovens. A definição do corpus foi realizada principalmente a partir da análise de pesquisas recentes, como o Dossiê Universo Jovem 3 do canal MTV e o relatório Retratos da Juventude Brasileira, organizado por Helena Wendel Abramo, que apresentam o panorama atual da juventude no Brasil. Para dar conta do tema proposto, a metodologia aplicada pautou-se na semiótica peirceana de base não racionalista. As etapas da pesquisa contemplam o levantamento bibliográfico dos principais temas, tendo como embasamento teórico os conceitos peirceanos na leitura de seus intérpretes, o estudo de teóricos da Moda, do Marketing e Mídia; análise das pesquisas recentes acima citadas, bem como outras pesquisas relacionadas e observação participativa. Dada a atenção crescente destinada aos estudos que envolvem as marcas, o presente trabalho apresenta relevância no campo da Comunicação e da Moda por levantar questões sobre o comportamento de consumo do público jovem nascido no final dos anos 80 e início dos anos 90, que cresceu em frente à TV e se conectou na internet desde seus primeiros anos de vida, demonstrando a grande relevância dos meios eletrônicos na aquisição de informações e conhecimento, inclusive no âmbito da Moda.
Palavras-chave: Marca, Moda, Juventude, Mídia, Semiótica.
ABSTRACT
The identity of Fashion brand, especially in young universe, is build by several information that are beyond the commercialized clothes. To understand the complexity and therefore to get more knowledge about this phenomena, the present research intends to analyze the relevance of Collateral Experience - theoretical concept from Charles Sanders Peirce in his Theory of Signs - to build an identity to brands. In this case, Collateral Experience is what assigns a previous knowledge with the symbolic meaning of brands, mainly in teenager age. This kind of previous knowledge is developed by various contacts with diverse mass media and other media systems used in everyday life by youth. The research corpus was mainly defined from analysis of recent researches, as Dossiê Universo Jovem 3 from MTV music channel and Retratos da Juventude Brasileira, report organized by Helena Wendel Abramo who presents the current situation of youth in Brazil. To give account of considered subject, the applied methodology was based in non-racionalist Peircean semiotics. The stages of this research includes bibliographical survey about main subjects, as theoretical basement of Peircean concepts through his writings and writings from his interpreters; studies from Fashion theoreticians, also books and papers about Marketing and Media, as well as analysis of the recent research above cited, other related researches and pragmatic observation of the fact. Given the increasing attention destined to studies that involves brands, the present work shows relevance in Communication and Fashion area, raising questions about consumption behavior in generation who has been born in later 80’s and early 90’s, those who grew in front of TV and were plugged and connected in Internet since their first years of life, showing the great relevance of cyber culture and media to get information and knowledge, also in Fashion scope.
Palavras-chave: Marca, Moda, Juventude, Mídia, Semiótica
2
Introdução
Poucos mercados consumidores são tão dedicados à questão da marca
como o mercado adolescente, principalmente quando o assunto é roupa.
Paralelamente, é a faixa etária que costuma absorver um maior número de
informações pelos diferenciados canais de comunicação, quer seja pela TV,
revista, rádio, celular ou mesmo pelos meios do ciberespaço como é o caso dos
sites, blogs, fotologs, orkut, entre tantos outros. Nesta profusão de informações,
a verificação do papel destas e outras formas de contato com a marca é um
desafio instigante para a compreensão das relações do público com a marca e
com a Moda.
O universo simbólico das marcas de Moda jovem ostenta uma série de
informações e não se resume apenas às peças de roupa. Uma marca é uma
atitude construída a partir de um estilo de vida que geralmente é entendido pelas
pessoas que vivenciam ou desejam experiências semelhantes das promessas do
produto.
Essas marcas - apresentadas ao público com aspectos tangíveis através
das formas de suas roupas, estampas, estilos e etiquetas visíveis - são
envolvidas também por aspectos intangíveis e importantes na interpretação de
sua imagem por parte do usuário, que sente e percebe-a não só por sua questão
concreta, mas também por informações existentes nas mídias, no ciberespaço,
nas relações pessoais, na vida urbana e em tantas outras formas de
comunicação dificilmente classificáveis, em contextos subjetivos e que se
localizam fora do signo “roupa”. Desta forma, deve-se considerar que as análises
de aspectos estético-formais e técnico-produtivos fazem parte do universo da
Moda, entretanto, os aspectos comunicacionais exteriores também devem ser
passíveis de atenção.
O enfoque aqui pretendido foi selecionado a partir do reconhecimento da
importância da construção de identidade para os jovens na faixa etária de 14 a
18 anos, que por possuir menos responsabilidades, podem desfrutar de valores
3
como lazer e diversão entre amigos de forma intensa, sempre em busca de uma
atitude ou postura em relação à vida que traga socialização. Nas atividades mais
prazerosas que estes jovens fazem, as roupas têm um papel importante porque
identificam, seduzem, causam admiração, estranhamento e aproximam os pares.
Os adolescentes de hoje cresceram sob a égide da mídia, suas babás
eram eletrônicas e sua experiência existencial, desde a mais tenra idade, foi
construída em grande parte pelos programas de TV e pelo acesso à internet. A
geração das experimentações e da velocidade de mudanças, agora é fruto da
cultura tecnológica e possui uma nova sensibilidade, percebida em seus relatos,
imagens e ritmos.
Outro fator que caracteriza esse grupo é o apelo frenético pela beleza,
fruto da vaidade exacerbada, em um excesso de hedonismo, individualismo e
consumismo. Neste cenário o que importa não são mais as tribos e seus
códigos internos que devem ser seguidos pelos membros - como em décadas
passadas - mas sim o encontro de um porto-seguro em relação à identidade,
através das marcas de roupas.
Estabelecer o problema da marca de Moda jovem, mais especificamente
da familiaridade com seus elementos como uma situação semiótica
incrementada pelas mídias e ciberespaço constitui o escopo deste estudo.
A localização da questão está em iniciar um percurso e uma vertente que
apresente a relevância da experiência colateral na eficácia comunicativa da
marca de Moda jovem, propondo uma ótica voltada para a questão inseparável
da moda e das investidas publicitárias nos ambientes midiáticos.
Para elucidar o assunto, considera-se a experiência colateral como algo
que está fora do signo, em relação ao objeto, uma outra maneira de acessá-lo,
além do que já é fornecido pelo próprio signo. A experiência colateral atua
também como uma espécie de garantia, de segurança, ou melhor, de limite e
controle da diversidade irredutível entre signo e objeto.
Peirce caracteriza como experiência colateral o que apelamos como
conhecimento necessário para entender, completar e fortalecer a compreensão
da relação objeto e signo.
4
O objetivo do estudo é prioritariamente investigar a relevância da
experiência colateral na eficácia comunicativa da marca de Moda jovem. Para
tal, parte-se da premissa que o vestuário é um dos reflexos mais profundos da
filosofia de vida dos jovens da atualidade, onde a moda é um dispositivo de
personificação do indivíduo.
O primeiro momento da dissertação visa apresentar um panorama da
Moda, seu surgimento enquanto sistema orquestradamente regido pelas
mudanças feéricas que estão pautadas na exaltação plena do presente, numa
lógica própria do efêmero.
Ainda no sentido do entendimento da Moda, verificamos o papel do corpo,
sendo o início da trajetória que se empreenderá no ato de vestir, despir, seduzir,
velar e revelar e como este corpo - não mais natural mas antes de tudo cultural -
se presta aos olhares atentos que a todos observam. Neste espaço,
apresentaremos brevemente a configuração da sociedade contemporânea
determinada pela aparência, primazia que se sobrepõe sobre tantas outras
disciplinas e remete à Moda como forma de presença nas relações de
exterioridade existentes.
Seguimos no capítulo 2 com a definição da marca e seus princípios
operatórios que a transformam em elemento de legitimação dos produtos
comercializados no mercado. Nesta direção, a questão da personalidade e
familiaridade com a marca é colocada em destaque, por constituir a riqueza de
expressões simbólicas formantes que suscitam o diferenciamento e
particularidade de uma marca, e como o acúmulo de contatos, aproximações e
experiências constroem o conhecimento pessoal de seus conceitos.
Após a apresentação da marca em si, nos ateremos principalmente à
marca de Moda e suas especificidades, na compreensão de seu papel
privilegiado no corpo dos usuários.
Em um terceiro momento, dedicado exclusivamente às atribuições das
juventudes atuais, o intuito é demonstrar o perfil desta coorte no Brasil, sem se
ater a conceituações reducionistas, mas respeitando a multiplicidade e
diversidade da condição.
5
O contexto juvenil desde os anos do pós-Guerra até os dias de hoje é
apresentado para referenciar as diferenças existentes entre a realidade presente
e o ideal ufanista da juventude dos anos 60, contextualizando as gerações que
se seguiram nas últimas décadas e a nítida ruptura dos conceitos relacionados
ao idealismo da contra-cultura em prol da força estética da aparência na
atualidade, fruto da espetacularização da realidade.
A partir de dados de pesquisas nacionais, em especial o Dossiê Universo
Jovem 3 da MTV e o relatório Retratos da Juventude Brasileira, averiguamos as
manifestações destes atores sociais na fruição da vida cotidiana, com
combinações comportamentais que direcionam ao consumo compulsivo, a
existência mediada pela vaidade e o interesse pelos assuntos individuais,
sugerindo uma certa falta de estímulo em relação aos assuntos coletivos.
O relacionamento desses personagens urbanos com as marcas de Moda
jovem evidencia um alto valor de identificação e pertencimento, principalmente
por ser a fase da vida em que disparam as grandes mutações corporais que
clamam por signos específicos que disfarcem ou ressaltem a aparência – signos
estes encontrados nas roupas assinadas por grandes marcas, tornando-se um
conjunto de expressões e atributos que facilitam o acesso nos grupos.
Para situar a aplicação teórica do tema proposto, o quarto capítulo
explicita os principais conceitos da Teoria Geral dos Signos de Charles Sanders
Peirce e a localização da experiência colateral, originada em sua segunda
semiótica.
No enquadramento do pensamento filosófico de Peirce e na abundância
de seus conceitos, classificações e determinações, desenvolvemos uma
aplicação prática da Teoria Geral dos Signos na Semiose da Moda Comercial,
sugerindo preocupações úteis para se discutir a Moda enquanto sistema
mercadológico e dotado de particularidades próprias.
Finalizando, na última etapa do estudo veremos um retrato atual dos
meios de comunicação e pontos de contato que fazem a produção imagética do
mundo adolescente, no advento dos mídias, nos lugares lúdicos e nos não-
lugares cibernéticos que comportam uma miríade de processos de enunciação.
6
Apresentamos, nesse capítulo, como a adolescência é dotada por modos
de acesso privilegiados à informação rápida, que se apresenta em um aspecto
múltiplo e polissêmico de intervenções instantâneas. Para estes garotos e
garotas é praticamente impossível permanecer apenas com um contato sobre
determinado assunto de interesse. Com uma inquietude emblemática, eles
procuram buscar diversas referências intermediadas pelos aparatos midiáticos.
Essa atitude perante os assuntos de interesse incide na construção do
pensamento de uma maneira peculiar. Nas variadas unidades de contato é
formada a pluralidade existente na memória e no acúmulo de informações,
discursos e enunciados disponibiliza-se o início da experiência colateral, que
conta com um número infinito de combinações, nos acessos midiáticos, nas
intervenções da cibercultura e em outras tantas experiências pessoais.
Com os dados e informações apresentadas, é possível traçar algumas
considerações e propor novas possibilidades e abordagens acadêmicas que
poderão ser desenvolvidas e elucidadas em estudos e pesquisas de campo
subseqüentes.
8
Capítulo 1
Moda: Forma de Presença
1.1 A Roupa e a Moda
Antes mesmo de existir a Moda, o vestuário sempre foi um elemento
importante na significação do homem em sua interação com o mundo e pode ser
considerado um mediador entre o indivíduo e a sociedade, por estabelecer o
nexo entre o físico e o social.
“Com efeito, (...) é um dos instrumentos mais poderosos de
integração e desempenha uma função niveladora importante.”
(SOUZA, 1987:49)
1.1.1 Vestir-se é preciso
Nossa existência, enquanto corpos físicos desprovidos de roupas, está
restrita a vida particular e isolada, porém quando nos vestimos abrimos a
possibilidade da sociabilidade, sendo a roupa comunicação no sentido mais
abrangente do termo, é através dela que podemos apresentar-nos de forma
multifacetada, prontos a comunicar mensagens prioritariamente não verbais,
também com a possibilidade de expressar mensagens verbais, quando vestimos
roupas com estampas de textos e frases de efeito.
As roupas se inscrevem no corpo e transmitem uma multiplicidade de
significações tanto para os outros como para o próprio usuário, num ato social,
por se endereçar às outras pessoas e num ato narcísico, por satisfazer o ego em
relação à aparência.
A vestimenta é uma das formas do homem se distinguir dos outros
animais, rechaçando a nudez natural para adotar peças que protejam o corpo da
temperatura e das agressões ambientais, porém as roupas não se esgotam na
sua praticidade, no simples fato de cobrir o corpo por proteção ou pudor, mas
9
acima de tudo trazem a oportunidade de transformação pessoal, através dos
adornos, enfeites e outros elementos de sedução contidos em qualquer peça de
roupa.
Flügel (1966) assinala que o ser humano dá prioridade ao sentido estético
das roupas (seus enfeites e adornos), tendo ainda iniciado sua jornada pela
estetização do corpo nas pinturas corporais que historicamente antecedem o
traje. O fato de enfeitar-se e a vontade de chamar a atenção de outros indivíduos
é um dos motivos mais fortes para o homem usar roupas.
É interessante notar que em todas as culturas os corpos se apresentam
vestidos ou pelo menos adornados com pinturas ou acessórios, isso porque as
roupas e os adornos têm um papel simbólico e um papel estético
extraordinariamente significativo, que gera vínculo entre as pessoas.
O caráter artificial da roupa na vida humana não a subestima, antes de
tudo é o elemento fundamental que faz com que a questão da mudança se
instaure com maior força nas vestimentas. Usamos as roupas como um artifício
que possibilita o câmbio constante de pele, em contraste com a perenidade e
ausência de autonomia da natureza da indumentária animal (pele e pelos), como
cita Dorfles (1990:18).
Embora alguns naturistas defendam veementemente a abolição da roupa
no dia a dia, alegando que a roupa nos afasta da nossa condição natural e
igualitária, a verdade é que não conseguimos escapar da artificialidade da
vestimenta quando saímos ao encontro de outras pessoas, para fazermos
nossas tarefas cotidianas.
A nudez define o natural do homem, deixa-o confinado naquela única
forma de apresentação de seu corpo e impossibilita uma série de diferenciações
que são parte da necessidade humana de caracterização e de individuação.
O fator vestimenta é tão forte nas sociedades que sua obrigatoriedade
chega até a constar no sistema legislativo da maioria dos países. No Brasil, a
nudez em qualquer local público que não seja destinado a esta forma de
apresentação (como as praias de nudismo) é considerada ultraje público ao
pudor, sendo definida no artigo 233 do Código Penal Brasileiro como “ato
10
obsceno”, que tem como pena a detenção de três meses a um ano ou
pagamento de multa1.
Segundo Malcolm Barnard (2002), o traje é um dos fatores que tornam as
sociedades possíveis por seu caráter eminentemente social, visto que ajuda a
comunicar e acaba por compor uma parte importante da constituição de uma
civilização.
Leroy-Gourghan (1965:21) chega a considerar que um homem só é
homem no momento que está situado em um grupo e revestido de símbolos
representativos de sua forma de vida (inserindo aí a questão da vestimenta).
Sem a roupa, os homens abdicam da capacidade de carregarem em seus corpos
um sistema simbolicamente humano e importantíssimo – o vestuário.
Dos muitos símbolos e expressões, a roupa faz parte das principais
linguagens existentes, sendo os atributos simbólicos da roupa indicadores da
forma de estarmos no mundo, enfim, a nossa condição enquanto indivíduos que
sentem a necessidade consciente ou inconsciente de transmitir mensagens, “(...)
as roupas são máquinas de comunicar”. (MAFFESOLI, 1996:161)
A roupa pode comunicar o grupo de referência do qual a pessoa faz parte,
sua auto-imagem, demarcar a época histórica vivida, a faixa etária, a classe
social, o gênero, a localização geográfica - cidade, campo ou até mesmo
particularidades de bairros distintos - período do dia - roupas específicas para o
dia, noite... - se estamos em tempo de lazer ou a serviço, certas hierarquias em
casos profissionais, posição religiosa, enfim, comunica diversas dimensões, que
fazem do traje um universo simbólico, universo este que foi estudado por
Bourdieu (1987) na leitura do mundo social.
Por meio das vestes e da combinação dos elementos constitutivos do
sistema de vestuário - acessórios, calçados, joalheria - é possível inventar e
escolher como se apresentar na sociedade, refletir diversas formas de
apresentação e diversas aparências sem mesmo abdicar do próprio “eu”. O
indivíduo não precisa mais estar à mercê de sua constituição biológica pura e
1 O Código Penal Brasileiro foi aprovado em 1940, sob o Governo de Getúlio Vargas e entrou em
vigor em 1942. Para ler o código penal na íntegra consultar o site: http://www.edutec.net/Leis/Gerais/cpb.htm
11
simplesmente, podendo interferir em seu corpo através da veste, que se torna
um suporte criativo camuflando pequenos defeitos corporais e ressaltando
virtudes, interferindo na altura através dos saltos, disfarçando o sobre-peso com
roupas mais escuras, destacando a pele com cores bem escolhidas e
modificando a aparência por completo.
Para elucidar a relevância da roupa na relação estética do Homem com a
cultura, Elizabeth Wilson (1989) compara o vestuário às outras artes do
espetáculo como a dança, o teatro ou a música. Em todos estes casos existe
uma linha evolutiva desde os primórdios até os dias de hoje, com três estágios
de desenvolvimento. O primeiro estágio é caracterizado pela importância
ritualística religiosa na representação de rituais de integração do homem com o
místico, em seguida, num segundo estágio, encontra-se a serenidade e
austeridade medieval, onde por influências agostinianas e de São Tomás de
Aquino foi vetado o prazer e a deliberação do desejo. O terceiro estágio cultural
culmina na modernidade e contemporaneidade, com o hedonismo exacerbado e
com a exaltação do “eu”, que precisa estar sempre atualizado e modificado. É
neste estágio pós-medieval, com a quebra da austeridade, que começamos a
falar do sistema da Moda propriamente dito, esse mundo tão rico em frivolidade
quanto em importância histórica para a humanidade.
1.1.2 Diferenças terminológicas da vestimenta
Para facilitar o entendimento do termo “Moda” faz-se necessário delimitar
algumas diferenças marcantes e pontuais em relação às terminologias utilizadas
na área. São quatro os termos mais utilizados e que são bem distintos, a saber:
o vestuário, a indumentária, a Moda e o estilo.
No momento, em um exercício que não está buscando demarcações
estanques, mas uma breve nuance de cada termo, descreveremos cada um
deles sucintamente.
O termo Vestuário inclui todas as vestimentas possíveis do cotidiano, que
inclusive não estejam preocupadas com o adorno, entre elas os uniformes,
vestes utilitárias, vestimentas de proteção, entre outras. O vestuário seria o
12
termo mais abrangente da área que estuda as roupas, porém deve ser utilizado
com cuidado quando o assunto é Moda, por esta última ser uma particularidade
específica deste sistema maior. A Moda é uma parte do vestuário, mas não o
representa por completo.
A Indumentária seria a definição adequada para as roupas tradicionais,
religiosas e culturais, que são impostas segundo leis suntuárias ou parâmetros
bem definidos que não devem ser quebrados ou modificados, mesmo com o
passar do tempo. Fala-se de indumentária especialmente até o final da Idade
Média, quando não existiam as mudanças constantes da Moda. Atualmente
utiliza-se o termo principalmente para trajes de culturas específicas como é o
caso de roupas festivas da região Nordeste do Brasil ou de qualquer outra
cultura que mantenha as tradições vestimentárias de seus antepassados, sem se
deleitarem ao sabor das mudanças efêmeras.
O Estilo é a forma de uma pessoa ou um grupo se expressar através da
roupa e acessórios, designando uma certa atitude ou personalidade do usuário,
de forma mais perene do que as tendências que vão e vêm e está marcado por
uma certa continuidade no tempo. Pode ser considerado como uma espécie de
recorrência estrutural interna e impressa que se repete nas criações de um
estilista, grupo de criadores ou mesmo em uma marca de roupas, definindo sua
singularidade. O conceito de estilo alude a um fato diferencial, à pulsão de uma
manifestação particular e um conjunto de traços que permanece no compósito de
uma obra e a distingue das demais.
Por fim, Moda é o fluxo constante das mudanças efêmeras do vestir no
presente; um presente fugaz que não tem ligação direta com o passado (embora
dele retire influências e inspirações) e enxerga no futuro seu próximo passo e
oportunidade para a frenética corrida pelas novidades, na lógica do novo e na
paixão ocidental pelo moderno, conforme apresenta Lipovetsky (1999) em seu
livro “O Império do Efêmero”. Não há sistema de Moda senão quando o gosto
pelas novidades se torna um princípio constante e regular, e quando a
inconstância veloz e volátil ganha espaço em detrimento à perenidade da
indumentária.
13
A Moda é efêmera, mas não superficial, pode ser chocante, provocativa,
escandalosa e é o resultado de uma apaixonante alquimia de parâmetros
móveis, que estão sempre à beira da obsolência.
Além da característica de mutabilidade constante que é indelével ao
sistema da Moda, enxerga-se nela uma dinâmica específica orquestrada pela
diferenciação e identificação.
“Compreender o termo “moda” equivale a entender a
dinâmica social de imitação e de especificação que ocorre desde o
século XV.” (GOMES, 2005:17)
1.1.3 A dinâmica da Moda
Muitos autores concordam que a Moda possui um movimento próprio
marcado pela imitação e diferenciação. Georg Simmel cita que:
“a moda é uma instituição social que unifica, numa
proporção peculiar, o interesse pela diferença e a mudança que se
dá pela igualdade e coincidência”. (Simmel, 1977: 580)
João Braga, na introdução do livro “Personal Stylist” de Titta Aguiar
descreve que:
“(...) a Moda é tão compreensível quanto paradoxal.
Queremos usar algo para nos diferenciarmos, porém acabamos
ficando iguais a todos aqueles que também querem se diferenciar
com aquilo que é considerado novo ou pelo menos novidade. É o
coletivo que gostaria de ser único; é a massa que gostaria de ser
individualizada; é o povo que gostaria de ser indivíduo; é o objetivo
que gostaria de ser subjetivo. Duas atitudes sociais, a imitação de
uma parte, a distinção de outra, que antinômicas por natureza vão,
como em eletricidade, criar o movimento da Moda.” (BRAGA,
2004:10)
Na Moda a imitação tem o poder de propagar uma maneira de fazer, um
comportamento e uma forma de vestir. Sem a imitação seria impossível a
14
disseminação das tendências e até mesmo o sucesso de uma Moda, que precisa
ser social.
A imitação retira o tormento da eleição, da escolha, se imitamos alguma
Moda é para estarmos em acordo, em harmonia com o outro; é um certo modo
de estabelecer um elo de proximidade possível, na medida em que o outro me
reconhece como parceiro e/ou vice-versa.
O elemento seguinte da dinâmica da Moda trata da busca pela
individuação/diferenciação ou mesmo a fuga da aparência massificada e
padronizada, uma forma de reivindicação da individualidade, na legitimidade da
singularidade pessoal no desejo latente de diferenciar-se.
É na emancipação da individualidade estética, na abertura do direito à
personalização, que se encontra o início do grito de liberdade no vestuário, ainda
que vivenciemos os decretos cambiantes do conjunto coletivo da Moda.
Lipovetsky (1999) postula que:
“A moda(...) é o corolário de uma nova relação de si com os
outros, de desejo de afirmar uma personalidade própria. É não ser
como os outros, ser único, fazer-se notar exibindo os signos da
diferença.” (LIPOVETSKY, 1999:60)
O pilar da Moda, fundamentado pela modificação constante e construído
através da dinâmica da imitação e da diferenciação, historicamente surgiu no fim
da idade média, com o fortalecimento dos conceitos do humanismo e com o
desenvolvimento do capitalismo, que exige o consumo acelerado, a produção em
massa, a troca constante de produtos e principalmente que instaura a divisão do
trabalho, caracterizando uma hierarquia dentro da indústria do vestuário que vai
desde o estilista até as costureiras, passando por diversos setores organizados.
É uma invenção diferente de todas as anteriores que se preocupavam
com a arte de vestir, conforme comenta Hollander (1996), porque a Moda
sempre adota um ponto de vista irônico com tudo que é antigo, deleita-se em
arranjos provisórios ao invés de procurar soluções estéticas permanentes.
15
1.1.4 Assim caminha a Moda
O desenvolvimento da Moda regida por mudanças constantes, como
conhecemos atualmente, aconteceu a partir da metade do século XIX, quando o
sistema começa a fender-se e adaptar-se (LIPOVETSKY, 1999:69). Seu primeiro
representante foi o estilista inglês Charles-Frédéric Worth que possuía seu ateliê
em Paris. Antes de Worth, a roupa era o resultado da solicitação do cliente para
seu costureiro particular, que estava no nível de artesão, e seguia algumas
delimitações sociais e familiares. A partir da figura do grand-couturier e do
crescimento das grandes cidades urbanas “a identificação fora do círculo familiar
será a prática corrente em nossos dias e caracterizará a moda contemporânea”
(GOMES, 2005:18).
Lipovetsky chama o período iniciado por Worth em 1857 até meados da
década de 60 do século XX de "moda de cem anos", fase em que o sistema se
solidifica. Neste período ocorre a ascenção de grandes nomes da alta costura
como Coco Chanel, Jean Patou, Jeanne Lanvin, Madeleine Vionnet, Paul Poiret,
Elsa Schiaparelli e Cristobal Balenciaga. A figura do estilista de alta costura
revoluciona completamente o sistema de manufatura de roupas, porque é ele
quem rege e define o que é de bom gosto e o que é de mau gosto e a partir de
sua força de opinião erige-se a Moda.
“The period between the First World War and Second World
War – might be called “ the golden age of the couturiére”.2
(BEATON apud STEELE, 1992:122)
Após o final da Segunda Grande Guerra os parâmetros começam a mudar
e o direcionamento principal é dado à produção em série prèt-a-porter3, que
viabiliza a Moda criada por estilistas para as grandes massas crescentes nos
centros urbanos. Christian Dior é uma das figuras mais importantes desta
mudança, seu New Look revolucionário de 1947 retira das cinzas as maisons
parisienses, drasticamente afetadas pela guerra e pela invasão alemã na França.
Dior é chamado por alguns como o “moderniser of the Haute Couture”
2 Tradução pessoal: O período entre a primeira guerra mundial e a segunda guerra mundial pode
ser chamado de “os anos dourados dos costureiros”. 3 Tradução: Pronto para consumir
16
(PARTINGTON, 1992:151), por ser o estilista que moderniza o conceito da Alta
Costura, contribuindo para o início do prèt-a-porter.
Neste mesmo período há também a popularização da televisão que
começa a influenciar o gosto e a forma de vestir da população, bem como o
surgimento de diversas revistas femininas que apresentam em suas páginas as
últimas tendências. A Moda começa a sofrer a transição do elitismo dos anos
dourados, dominados pelos grandes estilistas, para a nova Moda massificada
das ruas, da mídia e inspirada intensamente pela juventude.
Até os anos 50 era notório o efeito Trickle-Down, denominação dada
primeiramente por Georg Simmel em 1904 (PARTINGTON, 1992:148), que
designa o modelo vertical de imitação da Moda criada dentro do ambiente de
elite e imitada pelas massas. Neste sistema o gosto é determinado pelas classes
sociais superiores e pelas mentes dos grandes estilistas, sendo posteriormente
disseminada nas classes populares. No momento que alcança as massas esta
Moda deixa de ser vanguarda e é necessária a criação de novas Modas
inovadoras.
A partir da segunda metade do século XX começa a surgir com maior
força um efeito contrário ao Trickle Down, sendo chamado de Trickle Up
(GERARDI, 2002:33). Neste caso a influência não é mais determinada pela elite,
antes vem das ruas, dos jovens e das camadas inferiores que influenciam a
grande Moda, na forma vertical de sentido oposto.
Nos anos 60 assiste-se a ascenção de diversos estilistas influenciados
pela vida urbana como Courrèges e as geometrias construídas nos corpos de
suas moon girls (VINCENT-RICARD, 1996:155). Outros nomes importantes
desta fase são Pierre Cardin e Mary Quant que encontraram na Carnaby Street
de Londres e nas imagens idealizadas do futuro suas principais inspirações.
No sentido da Moda padronizada que deve ser seguida pela indústria,
com o intuito de auxiliar no desenvolvimento da organização industrial de
confecção, surge nos anos 50/60 um poderoso comitê regulador e facilitador do
funcionamento das engrenagens da Moda.
17
“Foi criado em 1955, na França, o Comitê de coordenação
das Indústrias de Moda (CIM), cuja principal missão era fornecer
aos diversos elos da cadeia têxtil, das fiações à imprensa,
indicações precisas e coerentes sobre as tendências”. (CALDAS,
2004:56).
Este comitê começa a ser o grande responsável pela determinação do
que está “na Moda” e do que está totalmente “fora de Moda”, fornecendo as
informações aos múltiplos elos da cadeia têxtil, baseado em pesquisas diversas
e promovendo uma hegemonia estética na Moda comercial sem precedentes.
Da mesma forma, os Bureaux de Style (escritórios de estilo) desde então,
são instrumentos de grande importância no meio empresarial, pois fornecem a
segurança necessária para o desenvolvimento de um produto de Moda, regem
as influências, cores, materiais, formas e temas que geram as tendências e as
coleções. Uma empresa extremamente comercial de roupas dificilmente
consegue sobreviver sem os conselhos dos Bureaux de Style, por serem estes
escritórios os unificadores do pensamento de todos os setores envolvidos no
sistema de confecção.
Ainda na linha evolutiva da Moda, assistimos na década de 70 o
crescimento da Moda Unissex e do Sportswear, que vieram concretizar a força
das roupas produzidas em massa como as calças jeans, as camisetas e outras
peças que enaltecem a vida confortável, o estilo casual e o bem estar pessoal,
na busca crescente pela jovialidade eterna.
“O traje esportivo nasce a partir da ideologia do corpo, uma
nova coerência entre viver melhor uma nova pele e a realidade do
contexto urbano. Se apropria do asfalto, corpo dominado, desejo de
expressão corporal, nova conscientização do corpo e do ambiente.”
(VINCENT-RICARD, 1996:169)
Concomitantemente, a Moda Italiana começa a ganhar força no mercado
por seu jeito despojado e sua boa modelagem.
Como a Moda começa a prezar pela simplicidade das formas a partir de
então, é preciso diferenciar as roupas e os criadores/marcas de outra maneira,
18
através das marcas e logotipias. A força do logo cresce com furor nos anos 80,
na era Yuppie (young urban people), onde os bens materiais são os valores mais
importantes para o indivíduo e o consumo conspícuo (VEBLEN, 2003:234)
invade os corredores dos Shoppings Centers.
As griffes mais cobiçadas, desde maisons francesas, até marcas de
artigos esportivos são estampadas nas mais diversas roupas, ressaltando o
elemento mais relevante para esta sociedade: a marca.
Neste período, a Moda de New York é celebrada principalmente pelas
criações de Donna Karan, que desenha roupas para as self-made woman,
grandes mulheres de negócios que ganham visibilidade nesta era. A influência
dos estilistas japoneses como Yoji Yamamoto, Issey Miyake e Rei Kawakubo
com suas peças bem estruturadas e minimalistas pode ser vista na Moda da
segunda metade da década.
No início dos anos 90 verifica-se que as notáveis tribos urbanas ou
subculturas juvenis fixas e advindas das classes proletárias, famosas nos anos
70 e 80 começam a se confundir com uma série de novas possibilidades
vestimentárias, surgindo o conceito de “supermercado de estilos”, cunhado por
Ted Polhemus (1994) e exprime de forma horizontal as diversas possibilidades
de looks, numa espécie de efeito Trickle Across, um estilo mais despreocupado e
descompromissado com o sentido ideológico presente nas subculturas juvenis,
sendo possível encontrar influências plurais, de várias referências.
Numa linha contrária à Moda comercial, tão forte neste período, os anos
90 assistem também à contribuição importante ao retorno da Moda conceitual e
artística, no momento em que surgem os estilistas belgas inovadores como
Martin Margiela.
O período que equivale aos anos 90 goza de uma busca incessante pelo
individualismo e exclusividade. Em um mundo que começa a perceber a
globalização e inicia a jornada da conexão mundial por fios e cabos de silício, é
um tempo em que o consumidor sente a necessidade de ter peças feitas
especialmente para ele e por isso está à procura de roupas inovadoras e
diferenciadas. A resposta do mercado para esta necessidade encontra-se na
19
difusão do conceito da customização, transformada em palavra de ordem nos
grandes centros de Moda.
No início do século XXI até o presente período, além da junção das
diversas possibilidades vestimentares vistas acima, no sentido do Style Surfing,
outro conceito de Polhemus (1996) que mostra que passeamos por diversas
influências para construir a Moda cotidiana do terceiro milênio, vemos um
fenômeno distinto também de grande relevância: o crescimento do mercado das
chamadas lojas “Cheap Chic”4 (TUNGATE, 2005:42), onde é possível comprar
roupas com estilo, diferenciadas e de qualidade por um preço bem convidativo
para qualquer bolso, o que é muito adequado para a situação de recessão
econômica do início do século, que sofre principalmente com a crise do petróleo.
Grandes editoras de Modas das revistas mais badaladas, celebridades e
outras pessoas do Jet Set já confessaram publicamente usarem ou comprarem
roupas nestas lojas. As principais marcas do roll são Gap (USA), Zara
(Espanha), H&M (Suécia), MNG (Espanha), Mexx (Holanda), entre outras.
Nas palavras do diretor de Marketing da H&M:
“You can dress from head to toe in Gucci if you like – that
proves you´re rich, but it doesn´t prove you have taste. It´s more
imaginative to wear your Gucci with some H&M. That´s why Vogue
readers are among our most loyal clients.” 5(Tungate, 2005:45)
A linha evolutiva da Moda, que pôde brevemente ser apresentada nos
momentos acima citados, é o reflexo do zeitgeist6 de cada época, com toda
carga cultural, política, econômica e ambiental inserida. A Moda marca presença
nos corpos e ali demonstra elementos da história, principalmente se nos
prestamos a ler seus códigos. Na aceleração da história a Moda desenvolvem-se
e criam-se novas realidades vestíveis para os corpos sociais.
4 Tradução pessoal: O chic barato
5 Tradução pessoal: “Você pode vestir-se dos pés a cabeça com Gucci, se você gostar – isto
prova que você é rica, mas não prova que você tem gosto. É mais inventivo vestir sua peça Gucci com alguma peça H&M. É por isso que as leitoras de Vogue são na maioria nossas clientes mais fiéis” 6 Tradução para Zeitgeist: Espírito do tempo
20
Estancar seu movimento em determinado ponto para estudar seus
pormenores e filigranas é retirar dela sua essência de mutabilidade, assim é
mais indicado reconhecer que, como um processo contínuo, a Moda deve ser
observada para encontrarmos os conceitos de sua linha de ação. Dada a
característica mutante da Moda, são adequadas as colocações de Greiner, a
seguir:
“Para não se manter surda ao rumor da ação do tempo, toda
área de conhecimento deve lembrar que o que está designado
como seu domínio não passa de um recorte e uma rarefação de um
saber mais amplo, ao qual o recorte se subordina como uma
descontinuidade.” (GREINER, 2005:126)
Por ser processo, toda e qualquer definição da Moda atual é parcial,
transitória e falível, pois está determinada pela percepção, inferência,
experiência e raciocínio.
A abordagem que considera o objeto de estudo como algo em processo
foi desenvolvida por Charles Sanders Peirce em sua teoria do Falibilismo, que
podemos adotar perfeitamente para o campo da Moda. Para Peirce, o falibilismo
é o entendimento de que nosso conhecimento nunca é absoluto, mas é como se
flutuasse em um continuum de incerteza e indeterminação (CP.1.171).
Evoluímos os conceitos em processo com o meio ambiente e a realidade que
nos cerca.
“(...) Isso nos dá uma idéia de sua concepção da ciência e
Filosofia como processos que amadurecem gradualmente,
produtos da mente coletiva que obedecem a leis de
desenvolvimento interno, ao mesmo tempo que respondem a
eventos externos (novas idéias, novas experiências, novas
observações) e que dependem, inclusive, do modo de vida, lugar e
tempo nos quais o investigador vive." (SANTAELLA, 1994:26)
O processo da Moda e suas abordagens teóricas envolvem diversas
dimensões, sobretudo a dimensão simbólica e semiótica, onde estudar seus
signos é estar apto a analisar significados mutantes, inconstantes e variáveis.
21
Nessa dimensão simbólica há que considerar o aspecto visual da Moda e a
importância do olhar neste contexto.
1.2 Olhar na Moda
A visão é um dos sentidos mais instigados pela Moda. Suas
representações atingem o olhar, não só como palco de apreciação dos outros,
mas ao mesmo tempo como uma auto-observação estética. Os mecanismos da
Moda estão diretamente ligados com o prazer de contemplar e exibir-se, em
especial quando o enfoque é posto na vivência em grupo, onde as pessoas se
observam mutuamente.
O olhar é uma das principais maneiras de captar a informação e a
comunicação da Moda, por que não somos deliberados a tocar todos os corpos
alheios que observamos para sentir a Moda ali presente, nos deleitamos apenas
em observar com interesse.
A presença de um look7 muitas vezes nos arrebata, impõe sua existência
sobre nós. Na imagem de uma pessoa vestida há algo de externo que instiga
nossa atenção, que está presente naquele momento, tomando conta da nossa
apreensão. A observação de um look é a percepção de um existente que está ali
para ser visto, admirado, contemplado, desejado, é uma condição de
secundidade da Moda: a segunda das três categorias Peirceanas.
Se a Moda tem em si um forte apelo a secundidade, embora não se
resuma a esta categoria, é importante citar a questão da Percepção na Moda, ou
a forma com que percebemos uma roupa. Charles Sanders Peirce construiu uma
teoria da Percepção bem concatenada e embasada nos esquemas triádicos.
Para o filósofo, o que percebemos, num ato de percepção, é algo que aparece
de certo modo. Em síntese, perceber é se dar conta de algo externo a nós, o
percepto.
7 A palavra Look é utilizada para designar a aparência completa de uma pessoa. Suas roupas, acessórios,
maquiagem, penteado, enfim, o contexto geral que forma a imagem da pessoa no momento em que a observamos.
22
“O que está lá, fora de nós, e que nos chega, que é
apreendido num ato de percepção, chama-se percepto.”
(SANTAELLA, 1998:59)
Diante de uma roupa ou aparência expressiva, a percepção visual se
detém para dela extrair conhecimento e representação. Como apresenta
Santaella (2005:196), a visão sempre aponta um objetivo e é guiada para um
objeto ou uma aparência que chame a atenção. A Moda trabalha
ininterruptamente com este intuito.
No desenvolvimento do tema da visualidade na Moda é preciso considerar
o suporte em que as roupas estão dispostas - o corpo - esse veículo de
comunicação primário que nos é tão imprescindível nas relações sociais, bem
como a importância da aparência corporal na contemporaneidade.
Lúcia Santaella (2004(c):108) frisa que a Moda utiliza-se de fatores
econômicos e artísticos, porém trabalha com mais destreza com os signos do
corpo, sendo a roupa uma estratégia de aparência corporal na busca de maior
expressão para a vida em sociedade.
1.3 Corpo e Aparência
1.3.1 O Corpo pavoneado
O corpo é um complexo sistema inserido na cultura que começou a ser
recriado pelo próprio homem, tornando-se um corpo não necessariamente
natural, mas acima de tudo estético e imagético.
Ted Polhemus (1995:109) anunciou que somos a única criatura conhecida
que modifica intencionalmente o próprio aspecto, o corpo e a aparência. Esta
capacidade unicamente humana é um fator chave para o desenvolvimento de
nossa espécie.
O corpo é uma narrativa exterior que produz comunicação, ocupa espaço
e está em busca da visualidade em um mundo de aparências, é uma espécie de
espetáculo sublimado, fenomenal e evanescente. Como uma inesgotável fonte
23
de símbolos, é o primeiro patrimônio de cada ser humano, a essência que
organiza a vida em si e que traz a possibilidade de nos personificarmos no
mundo.
Vários discursos normalizam o corpo e discorrem sobre suas diversas
implicações na vida, cada um com enfoque específico, seja no aspecto
antropológico, médico, publicitário, tecnológico, estético ou social. São as
ênfases estéticas e sociais que mais interessam nos estudos de Moda.
A imagem do corpo é um fator preponderante nas relações da Moda. Sua
exposição implica a busca do Belo e a noção do outro que lhe é exterior e
compele o sujeito a apresentar-se de uma ou de outra maneira.
“Meu corpo é para mim mesmo a imagem que eu creio que o
outro tem deste corpo”. (BARTHES, 1982:642)
Como veículo de perceber o mundo e a forma visual com que somos
notados por este próprio mundo, o corpo pode ser considerado como um dos
fatores preponderantes para a construção do self8 e da própria subjetividade de
cada pessoa.
Jurandir Freire Costa ao escrever sobre o corpo em Freud, diz que, para o
pai da psicanálise:
“(...) o eu é uma projeção da superfície corporal (...) em
outras palavras a identidade egóica é modelada pela imagem
corporal que atende a demanda do outro. O eu, pelo resto da vida,
tenderá a fazer da imagem corporal a moeda de troca de transação
com o outro idealizado.” (COSTA, 2004:73,74)
Na constante ânsia de possuir uma “moeda de troca” sempre atualizada e
positiva, interferimos na aparência do corpo com o máximo de possibilidades. A
partir desta construção e reconstrução incessante não temos mais o “corpo
natural” e sim uma “modelagem” edificada que privilegia a dramaturgia estética,
modulações e máscaras que fundam o corpo social, um corpo que está na cena
8 Self é uma palavra utilizada pelos psicanalistas para designar, em linhas gerais, os assuntos ligados à
personalidade.
24
cotidiana e se comporta como estando em um teatro, com textos e contextos
mutáveis conforme a situação e possibilidade de ação.
“Todo corpo contém inúmeros outros corpos virtuais que o
indivíduo pode atualizar por meio da manipulação de sua aparência
e de seus estados afetivos (...) Roupas, cosméticos, atividades
físicas formam uma constelação de produtos cobiçados, destinados
a ser o camarim onde o ator social cuida daquela parte de si
mesmo que em seguida vai exibir como se fosse um cartão de
visita de carne e osso.” (MALYSSE, 2002:79)
Neste estado de atuação e operação constante de mudança da paisagem
pessoal, o corpo não é algo fechado e absoluto, mas um organismo em
interminável composição. Além de ser um terreno fértil para a dramaturgia, por
conferir ao sujeito uma história a contar, o corpo, em especial a partir do século
XX, como enfatiza Mesquita (2004:61) é também linguagem e um dos meios de
comunicação mais imediatos. Seu desenho e linha são a plasticidade do sujeito
que arquiteta uma linguagem visual muito expressiva, em movimento.
No território da aparência corporal, uma das grandes facetas de diálogo é
a roupa, Kathia Castilho (1998) defende que o traje oferece mutação ao corpo e
se a pele é o tecido que veste o “conjunto” a que chamamos corpo, com a Moda
vestimos nosso tecido natural, pavoneando nossa existência. Como diria
Maffesoli (1999), o corpo cintila no espetáculo das ruas e inflama-se com os
jogos da Moda.
A roupa é o método diário mais utilizado na transformação do corpo, ela
pode alterar, esconder e ressaltar diversas partes corporais e assim ajudar na
atuação social do mesmo, substituindo a imagem natural por uma imagem ideal.
Nada está mais perto do corpo do que a roupa e nada mais arraigado em nossa
cultura do que o “ato de vestir”.
Quando nascemos, logo após os primeiros “tapinhas” para verificar nosso
estado de saúde e os primeiros choros, já somos envoltos por tecidos, como frisa
Vincent-Ricard (1996:185). O têxtil é o objeto de transição e a nossa primeira
experiência de ruptura.
25
O corpo social, este que vemos no cotidiano em praças, avenidas,
elevadores, escolas e tantos outros locais públicos, é o corpo vestido. Até
mesmo nas relações sexuais que predispõem a nudez, a erotização é promovida
pelas roupas bem construídas (e muitas vezes fetichizadas), como corselets,
lingeries e outros adornos sensuais que conferem maior fantasia ao “natural” do
ato sexual. Nosso corpo se acostumou a estar transmutado, adornado e vestido.
A Moda é um adereço imprescindível da nossa corporeidade, por valorizar e
enfatizar a aparência.
“No momento que fazemos sobreposições no corpo e
interferências em sua aparência através da roupa, (...) criamos uma
imagem nova que têm a finalidade de facilitar a interação social,
transmitindo narrativas muito particulares de cada indivíduo,
posicionando-o em relação ao universo e “fazendo da carne uma
túnica de gala”. (GERARDI, 2002:27)
O sistema da Moda não está preocupado apenas em pavonear o corpo,
sobrepondo tecidos em uma massa “indistinta”, mas também trabalha
constantemente com a mudança dos parâmetros aceitáveis das medidas do
corpo. Nos últimos anos, o “culto ao corpo” se tornou uma preocupação geral
que atinge as mais diferentes classes sociais, faixas etárias e setores da
sociedade. O que se observa são jovens, adultos, homens e mulheres cujos
corpos seguem um mesmo padrão: músculos à mostra e abdomens moldados
nas clínicas de cirurgias plásticas e academias de ginásticas espalhadas por
todo o país.
Tanto as academias como as clínicas de estética se transformaram em
verdadeiras “usinas de corpos”, sob o pretexto de realizarem em seus clientes
um completo “body building” que os levará a felicidade.
Cosméticos, maquiagem, cirurgia estética, dermatologistas, personal
trainers, estilistas e profissionais da elegância permitem mobilizar recursos e
operar expedientes para "a boa forma". É o superdimensionamento do corpo,
uma espécie de Corpolatria. Ter o corpo ideal é demonstração de auto-controle,
segurança, domínio e bom gerenciamento da vida. Sentir-se bem na própria pele
torna-se uma palavra de ordem.
26
O interessante é notar que estamos distantes (em tempo e realidade) das
práticas eugênicas do início do século XX, porém nesta corrida frenética pelo
corpo ideal estamos trazendo novamente à tona o assunto da perfeição corporal,
que tem raízes eugênicas.
Nos dias de hoje vivemos a construção da beleza, não mais como algo
ganho a priori, naturalmente, a perfectibilidade corporal tem que ser construída,
formulada, arduamente conquistada, para aparentar uma outra imagem que não
necessariamente é a natural e sim a bela que vai facilitar a vida, neste mundo de
aparências. “O aparecer é a poesia do ser” (CAMUS, 2000:37)
1.3.2 Aparecer para ser
A fascinação pela aparência sempre existiu e na atualidade tende a ser
ainda mais relevante. A aparência permeia o imaginário dos dias atuais com uma
panóplia estética, embriagante e fulminante. Vivemos no hedonismo exacerbado
e ardente, onde a vaidade é um dos principais fatores da existência.9
A vida urbana é a vida das aparências, fundada pela relação do parecer.
Valemos geralmente o que parecemos, como uma espécie de atores e
manequins desfilando em uma constante passarela, nas performances da ação
diária.
Há a tendência de avaliar o ser mediante o aparecer, a aparência basta,
apropriamo-nos dela para abarcar a realidade e é por este canal que
apresentam-se as noções de desejo e de vida.
A função da aparência acaba muitas vezes por se tornar também a função
do “ser”, como afirma Heiddeger: “Ser ente implica: apresentar-se, aparecer
manifestando-se, oferecer-se, ex-por algo.” (HEIDDEGER, 1959:142)
Em outros termos, a forma como as pessoas aparecem, partindo do
pressuposto de que todos agem eticamente, pode refletir o ente verdadeiro.
Somos reconhecidos por formas tênues, pelas aparências.
9 No capítulo 3 – Juventude transmutada, será explanado em detalhes com dados de pesquisas nacionais,
a importância da aparência e do individualismo para os jovens estudados – nascidos no final dos anos 80 e início dos anos 90, bem como a relação destes com as marcas de Moda.
27
Embora o assunto da aparência não tenha tanto furor na sociologia
clássica, Maffesoli (1999:125) defende que hoje é totalmente admissível falar de
aparência e superficialidade, por serem temas que estão na ordem do dia. A
preocupação com a aparência ou mesmo com o que podemos chamar de
“embalagem” não é uma superficialidade sem conseqüências, mas inscreve-se
num vasto jogo de simbologias e no modo de construirmos uma sociedade.10
A cultura dos Reality Shows e da fama feérica aumentou a proporção da
importância dada à aparência nos dias atuais. Mesquita (2004:67) comenta que
numa sociedade pautada na valorização da imagem, num momento de
espetacularização e consumo de imagens, tudo que estiver relacionado com a
aparência será levado em consideração.
A aparência pode ser considerada uma força interior que pulsa em busca
das profundezas da alma humana dificilmente racionalizáveis e definíveis, mas
que são representadas, mostradas e sugeridas pela imagem. Não existe uma
ligação direta da aparência com a utilidade ou a praticidade, antes, nasce da
revolta vazia, puramente estética e ligada ao prazer e ao hedonismo sem limites.
“(...) Como a aparência se situa além do sentido, até contra
ele, nos limbos da razão e da lógica, (...) ela é por excelência o
canal privilegiado de expressão de um discurso habitualmente
escondido, tabu, impossível de dizer com palavras comuns
lógicas.” (BOLLON, 1993:165)
Diversos autores discorrem sobre a ligação da aparência com o social.
Entre eles, Cidreira (2005:109) infere que a aparência corporal é mediatizada
pelo social por haver um controle social das aparências e uma prática de
construção da própria aparência.
O universo do vestuário dá condições mais favoráveis à multiplicidade de
aparências que podemos possuir. A Moda cresce em importância justamente
porque radicaliza a noção de aparência enquanto essência pessoal, este é um
dos motivos porque a Moda é tão apreciada pela humanidade: ela gera uma
preocupação forte com a imagem e com o investimento pessoal.
10
A questão da aparência na atualidade será tratada com maior propriedade no início do capítulo 5 desta dissertação, na seção intitulada “A vida estetizada”.
28
As aparências marcam presença e esta presença é vestida.
1.4 A Moda como forma de presença
Existe uma ligação direta entre Moda e corpo, onde a analogia é feita pela
manifestação da aparência, num mundo visual de observadores e observados,
que demonstram a inconfundível força simbólica da roupa na vida social
cotidiana pós-moderna.
A influência da urbanidade, da vida em sociedade e, sobretudo, do olhar
do outro na Moda é um processo que começa no final do século XVIII, quando as
mais importantes cidades européias começam a instalar os boulevards e os
parques de passeio público.
As pessoas saem do interior de suas casas e começam a se expor,
refletindo a “emergência de uma civilização do exterior.” (CALDAS, 1999:91),
longe de andar incógnita, a sociedade está em exibição. O principal desejo desta
nova ordem social é o de ver, e o de ser visto.
Foi o mesmo Georg Simmel já citado anteriormente quem estabeleceu a
relação entre a vida citadina, o individualismo e o desenvolvimento rápido da
Moda, na era industrial. O ego se desenvolveu quando homens e mulheres se
movimentaram em círculos sociais mais vastos, foram para as grandes cidades e
começaram a vivenciar uma série de sensações muito distantes em
características do velho ritmo uniforme e sem “ondas” da vida rural.
Nas cidades, a exterioridade e as aparências são decisivas pelo fato de
estarmos misturados a um emaranhado de informações visuais e convivendo
com uma multidão de pessoas semelhantes. Criamos na vida citadina uma
consciência maior de nossa subjetividade, que precisa se destacar em meio à
massa, sendo a apresentação pessoal um fator de grande relevância. Nas
cidades a sobrevivência não depende diretamente do solo, da agricultura ou da
subsistência, mas depende completamente do conjunto complexo ao qual damos
o nome de “eu”.
29
“Na cidade o indivíduo entra em contato constantemente
com outros indivíduos que lhe são estranhos, e sobrevive através
da manipulação do seu eu. A Moda é um adjunto desta
apresentação pessoal, (...) ela é uma imposição deste eu
recentemente descoberto”. (WILSON, 1989:186)
Na urbanidade, onde passamos mais tempo fora de casa, na rua, no
trabalho e na escola, a roupa é mais visível que a decoração da casa e dos
ambientes interiores, pode ser trocada com mais freqüência e traz inúmeras
possibilidades de filiação para o indivíduo. Em uma paráfrase de Carlyle
(1987:48) as roupas são os emblemas visíveis dos limites invisíveis entre os
homens.
Dias (1997:30) em seu livro “Moda divina decadência” afirma que vestimo-
nos para estarmos presentes no contato com uma outra pessoa, a estruturação
da Moda se deve à imagem cativante do semelhante, assim, vestidos por
imagens acabamos por atualizar, no imaginário, a posição que temos na
sociedade e por este motivo é possível considerar a Moda como parte da função
Moral, vigorando aí a necessidade de reconhecimento.
“Moda é modo de presença, construção da existência ou da
porção identitária do sujeito” (CASTILHO, 2004:11)
A roupa é o envoltório que nos modela, mas isso não significa que nos
reduzimos à condição de cabides. Na verdade, a roupa é uma forma de
expressão daquilo que idealizamos internamente ser, com todas nossas
idiossincrasias, sonhos, ideais, projetos e etc.
“Cosmetizar-se tem um papel sacramental: tornar visível
essa graça invisível que é estar junto”. (MAFFESOLI, 1999:167)
Umberto Eco defende em “Faith em Fakes” (1986) que na civilização a
roupa- armadura, no caso o blue jeans, influenciou a postura e portanto a
moralidade exterior. O autor crê que a moral e os costumes são determinados
por aquilo que vestimos. É como se nossa consciência estivesse sob nossas
peles, de forma epidérmica. Através das vestimentas processamos para fora
aquilo que está dentro de nós, num ato de presença do próprio sujeito no mundo.
30
Voltando novamente à questão da figura do “outro”, é sensato lembrar que
nossas escolhas de roupas são designadas por um forte desejo de
reconhecimento. A estética, nessa perspectiva, constitui uma das formas de
manifestação mais significativas das atividades diárias. O outro é estímulo e
define nossas ações e sentimentos, sendo uma das principais forças para nos
reinventarmos a partir de modos de presença.
Utilizamos a Moda para estarmos no mundo e essa forma de
apresentação varia de pessoa a pessoa. Segundo Garcia e Miranda (2005:100-
103) o discurso da roupa pode servir como:
1- instrumento de comunicação não verbal, uma espécie de linguagem e
código;
2- Instrumento de integração, no sentido da socialização e integração;
3- Instrumento de individualidade, ao fugir de regras e padrões,
diferenciando-se;
4- Instrumento de teatralização, no desempenho de diversos papéis do
dia a dia;
5- Instrumento de auto-estima, que impõe o ego como estimulador do
consumo;
6- Instrumento de transformação, onde a roupa assume um poder mágico
de transformação pessoal.
No universo jovem é possível acontecer qualquer um desses discursos. A
presença marcada pelas roupas é de extrema importância, sendo uma faixa
etária especialmente dedicada às aparências e ao estímulo visual provocado
pela Moda. Para se destacar, se diferenciar, se integrar ou mesmo se igualar
àqueles que configuram o padrão ideal de conduta, o jovem utiliza-se das roupas
como primeiro elemento distintivo e como sua forma de presentificação.
Quando as formas, as cores e o estilo da roupa não são suficientes,
apelam para uma força identitária imediata e direta: o uso de marcas de Moda
emblemáticas e reconhecidas como cool por todos os jovens.
31
Se a roupa é o signo a ser consumido, a marca de Moda é o Objeto de
desejo, em especial no público jovem e em públicos que prezam pela
visualidade. Usá-la, configura-se como uma grande possibilidade de sucesso no
ambiente social.
33
Capítulo 2
Marca de Moda
2.1 Marca
No âmbito acadêmico, as áreas de Marketing e Administração
predominam nos estudos a respeito das marcas, com o objetivo de buscar o
entendimento mercadológico e administrativo deste elemento primordial de uma
empresa, mensurando diversos componentes complexos. Esta forma de estudo
foi trabalhada por muitos autores, entre eles, Kotler (2000), Cobra (1993),
Weilbacher (1994), entre outros. O ponto de vista dominante destas abordagens
culminam nos sistemas econômicos que envolvem a marca.
Neste presente estudo, a dedicação analítica da marca será feita a partir
do pensamento do universo simbólico e semiótico, atendo-se principalmente à
familiaridade do público com o arcabouço simbólico contido no ambiente
comunicacional.
É no ambiente simbólico que podemos avistar a invasão da sedução,
identificação e legitimação, é o espaço que nos permite perceber o que leva a
intensificação do desejo por parte do público, em especial quando se trata de
grupos juvenis pertencentes ao que chamamos de adolescência: uma faixa
etária que vivencia atualmente um momento de narcisismo emergente.
Em um estudo dedicado ao jovem do século XXI, Osgerby (2004:46) cita
que “style and image (...)are seen as playing a more important role in Post-
Fordist economic life”1, reforçando a crescente importância das questões
relacionadas à imagem e ao estilo na contemporaneidade, em um mundo
totalmente estetizado, onde os elementos imagéticos tornam-se imperativos e
neste sentido são imprescindíveis na construção de uma marca forte e
consolidada.
1 Tradução Pessoal: “o estilo e a imagem estão ganhando um papel de maior importância na era
pós fordista”
34
Especificamente na questão da força de significação da marca, Maria
Clotilde Perez Rodriguez (2001), defende que, a cada dia enxergamos mais
nitidamente os aspectos simbólicos das marcas, sendo que “a real troca de valor
é encontrada na carga simbólica e cultural erguida pela marca”, onde “o
significado é o motor central da lógica da marca e dos produtos” (2001:248;250).
A partir dos significados ali presentes é que podemos compreender diversas
motivações e comportamentos de consumo, que pela via econômica podem
permanecer velados ou obscuros em meio aos dados estatísticos quantitativos.
Segundo Tavares (2003) a marca é um signo de identificação e
construção simbólica, que serve para inscrever, representar e diferenciar
produtos e serviços dentro do mercado. A marca, em especial para públicos
juvenis, caracteriza-se como signo representativo de um estilo de vida, uma
atitude, uma expressão que deve ser levada em consideração.
Cimatti, (2003:78) demonstra que as marcas se revestem de conteúdos
exclusivos e estes conteúdos são sua força representativa. Neste sentido é
possível visualizar que todas as particularizações e construções simbólicas
erigidas nos planos de comunicação de uma marca são um ponto crucial para
sua colocação no mercado.
Fournier (1998) reforça que a marca, antes de tudo, cria significados para
a vida das pessoas, ou seja, é no universo da significação, na capacidade de
criar sentidos positivos na mente do consumidor, que reside um dos grandes
trunfos das marcas.
2.1.1 Elementos representativos da marca
O primeiro elemento simbólico constitutivo de toda marca é seu nome.
Com a intenção de discorrer sobre o tema, Falk (1994) comenta o caso pioneiro
de adoção de um nome a um produto, ainda em 1880, quando a Aveia Quaker
se posicionou historicamente como a primeira empresa oficialmente reconhecida
a adotar um nome para seu produto, que juntamente ao novo título possuía uma
inovação tecnológica que permitia o beneficiamento dos flocos de aveia que
ficavam com uma aparência diferenciada. Como aponta o autor:
35
“It was in this particular packaged, identified form – as a
representation – that the product became more than just “plain
oats”.”2 (FALK, 1994:161)
Na representação inovadora criada pela Quaker, a partir de então o
produto não era apenas reconhecido como simples “flocos de aveia” como todos
os outros flocos existentes, mas sim um produto diferenciado, não só na
aparência, mas também “humanizado” pela identidade criada automaticamente
pelo nome.
Com o evento de “nomeação” a linguagem e a simbologia abrem seu
vasto espaço no mundo dos produtos e desde então tornam-se fundamentais
nas relações comerciais, onde os produtos comercializados não conseguem
permanecer fortes no mercado sem a unidade simbólica verbal.
O nome rege de certa forma o produto. No ato de nomear temos
automaticamente a atribuição de um signo verbal que não necessariamente tem
ligação racional direta com o produto, ou seja, relação com suas características,
componentes ou benefícios, mas antes de tudo tem a função de criar laços
emocionais que podem, a partir do trabalho de comunicação, sinalizar valores
positivos para a vida das pessoas.
Baudrillard (2003) sugere que a conotação de status, prestígio e
conhecimento do objeto é dada pelo nome, ou seja, sua marca. Um objeto só
encontra seu significado simbólico quando encontra significação pelo nome,
neste momento ele é reificado como signo de valor representativo, sendo a
lógica do consumo uma lógica de signos e diferenciação.
O universo simbólico de uma marca não se resume ao ato de nomear,
consideramos antes que o nome é o elemento verbal que inicia o processo de
representação, porém não é o único. Junto ao nome é necessária toda a
programação visual, logotipia, cores predominantes e mais uma série de
elementos sígnicos imagéticos que colaboram para aumentar a eficiência
simbólica da marca.
2Tradução pessoal: “Foi nesta embalagem particular, com forma identificada – como uma representação – que aquele produto se tornou mais do que simples aveia”.
36
É por meio de todo conjunto semiótico e da somatória de atributos e
valores emocionais que envolvem a marca que os produtos tornam-se animados,
humanizados e próximos de nossa identidade. Começamos a desejar que os
produtos de “marca” façam parte de nossas vidas e nos acompanhem como
aglutinadores de emoções, não tratando-os como simples commodities com
determinadas funcionalidades.
A marca, como a conhecemos atualmente, sobretudo no âmbito visual tem
uma espécie de valor semelhante aos antigos brasões de comunidades da Idade
Média, que distinguiam com imagens e cores pré-determinadas os cavaleiros
nas batalhas, além de serem uma das únicas formas de reconhecer os membros
de uma família específica ou grupo comunitário.
Benoit Heilbrunn (2004:14) comenta que a marca contemporânea
simboliza “uma pertença e um propósito coletivo” tal como os velhos emblemas e
brasões. As marcas são a forma moderna dos indivíduos se separarem em
grupos distintos de grande força representativa por meio de imagens, nomes e
particularidades existentes que ficam alocadas na mente do consumidor.
Segundo o pesquisador de tendências do consumo David Shah3,
atualmente as marcas passam a ser como famílias. Elas tentam desenvolver um
relacionamento com seu consumidor, construindo um elo emocional que muitas
vezes ocupa o espaço anteriormente reservado ao Estado e à Igreja,
proporcionando a mínima estabilidade emocional e as referências que a pessoa
procura.
A riqueza do imaginário que as marcas trazem para a vida cotidiana faz
com que vejamos nelas uma certa personificação, uma espécie espírito
semelhante à personalidade humana, com a qual temos afinidade. Nesta direção
de pensamento, David Aaker (1998:114) afirma que o princípio de marca que
traz significado na vida do consumidor é o índice de afinidade desenvolvido em
relação aos seus valores: sua personalidade.
Após a construção da personalidade de marca é no conjunto de
aproximações feitas, seja no ato de compra, nas comunicações e publicidades
3 Texto extraído de Matéria “Não há mais moda” publicada na Revista Época. Disponível em:
http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT829801-1666-1,00.html
37
visualizadas ou a partir de outras experiências positivas que nos sentimos
confortáveis e criamos com elas familiaridade. Estes dois pontos - personalidade
e familiaridade - serão discutidos a seguir.
2.2 Personalidade e Familiaridade com a marca
2.2.1 Personalidade de marca
O tema “Personalidade de marca” tem sido um dos pontos focais no
planejamento de comunicação das grandes agências de publicidade desde os
anos 70. Nos estudos teóricos, Kapferer (2004:108) comenta que o assunto
começou a ser levado em consideração somente a partir dos estudos de Aaker
(1998), que relacionam a personalidade de marca a uma escala de valores.
Kapferer (2004) sinaliza que o método classificatório de Aaker pode ser
visto como pouco eficaz, por “fechar” a questão da personalidade em aspectos
rígidos e tangíveis, enquanto é possível perceber, a partir de estudos empíricos,
que existem aspectos intangíveis distintos que são muito relevantes no tocante
da personalidade de marca e que não estão contabilizados na escala de Aaker.
Embora as escalas de Aaker possam ser limitantes, existem pontos de
sua linha teórica que devem ser ressaltados por serem informações
interessantes a respeito da personalidade e familiaridade de marca.
Para Aaker e Joachimsthaler (2000:58), a marca tem uma essência, em
outras palavras um pensamento único que captura sua alma, e é a partir desta
essência que se constroem relacionamentos entre consumidor e empresa.
Martins (1999) vai mais longe na importância da personalidade, citando que para
haver um envolvimento real com o público é preciso que a marca transmita uma
emoção definida, um espírito específico, uma personalidade.
Nestes e em outros textos e artigos sobre personalidade de marca vemos
uma espécie de tratamento idêntico ao tratamento comportamental dos seres
humanos. Considerar que marcas são semelhantes às características humanas
parece ser uma metáfora atrativa. Smit, Van den Berg e Franzen (2003:22)
consideram que este tipo de vertente empresta definições das teorias da
38
personalidade humana que desde Aristóteles desenvolvem-se nos âmbitos
psicanalíticos, behavioristas, comportamentais e nas teorias cognitivas.
A partir de elementos semelhantes às teorias tradicionais de
personalidade humana é erigida a personalidade dos produtos, tornando-os
únicos e “dignos” de atenção do consumidor.
Uma das grandes responsáveis pela criação de singularidade para os
produtos é a publicidade, ambiente em que a personalidade de marca iniciou sua
trajetória.
Rocha (1984:68) afirma que o caráter específico da publicidade é o de
classificar, nomear, instituir imagens positivas, personalizar e constituir uma
identidade própria que se cola nos produtos, trazendo-lhes identificação com o
consumidor.
Randazzo (1997) comenta que a publicidade é o meio que permite criar
um inventário perceptual de imagens, símbolos e sensações que culminam na
identidade perceptual que posteriormente reconhecemos como sendo a marca.
Naomi Klein, (2004:31) ressalta que o publicitário é o “rei filósofo da
cultura ocidental”, a pessoa capaz de dar vida a coisas inanimadas, dotando-as
de nomes, imagens e uma espécie de essência antropológica e psicológica que
transformam-nas em objetos de desejo personificados.
Estas e mais uma série de citações podem ser feitas a respeito do papel
da publicidade e do publicitário na construção de marcas com personalidade,
nelas é possível notar o caráter lapidatório utilizado pela publicidade para erigir
uma imagem ideal, no cuidado de “idealizar” os produtos, mostrando uma face
exclusiva da “vida animada” da marca.
Para Malcolm Baker e Greet Sterenberg (2003) existe até a possibilidade
de aplicar um sentido platônico para as marcas.
39
“It is in this Platonic, idealized world where brands take on
life and where they acquire their redemptive role.”4 (BAKER e
STERENBERG, 2003)
Com uma personalidade ideal, perfeita, incomparável e desejável, os
produtos entram no mercado a partir de diversas ações de comunicação
inseridas geralmente nos espaços mass midiáticos e complementados por ações
em mídias alternativas e diversas campanhas promocionais. Na medida em que
os atos comunicativos constituem um grau de conhecimento da marca, quando
são feitas associações de um nível considerável, é composta a familiaridade.
2.2.2 Familiaridade com a marca
A familiaridade é composta por experiências diretas e indiretas
acumuladas na mente e na memória do consumidor. Quanto maior a
familiaridade, maior a possibilidade de sucesso mercadológico. Para Kent e Allen
(1994) a familiaridade é um componente importante do Brand Equity.5
O posicionamento de marca, ou a forma como a marca deve ser
percebida no mercado é também decisivo para a familiaridade. Adotar um
modelo bem construído de comunicação, permite que o consumidor tenha maior
familiaridade com as informações transmitidas e aumente o índice de afinidade e
sinergia.
O elemento da familiaridade, as imagens mentais e as experiências
sígnicas que a formam devem ser estudadas com maior profundidade6 por
serem fatores da marca que não podem ser renegados a segundo plano.
Pesquisas mostram que as pessoas se interessam mais pelo que lhes é
familiar e conhecido. De acordo com o psicólogo Robert Zajonc da Universidade
de Stanford, citado por Fallon (2004), se uma pessoa não tem familiaridade com
um produto ou objeto não verá mérito no mesmo, sendo que quanto mais vemos
4 Tradução Pessoal: É no platônico e idealizado mundo onde as marcas têm vida e é ali que elas
adquirem seu papel de redenção”. 5 Brand Equity é o nome dado ao ato de mensurar o valor da marca e pode ser calculado a partir
de diversos dados. 6 A teoria da Experiência Colateral de Charles Sanders Peirce trata da familiaridade e destes
elementos e será comentada nos capítulos 4 e 5.
40
ou temos experiências positivas com algo, mais nos sentimos confortáveis. A
familiaridade faz parte do senso de sobrevivência humana, desta forma, nos
afastamos de objetos ou informações não familiariares, por não fazerem parte de
nosso arcabouço de conhecimento.
Para Aaker (1998:115) uma ligação com a marca será mais intensa
quando for baseada em muitas experiências ou exposições a comunicações,
sendo que o acúmulo de experiências fortalece a familiaridade. A partir da
familiaridade construída pelo grande número de conexões, são organizadas de
uma forma significativa figuras mentais e imagens visuais que vem a mente
quando a marca é mencionada, proporcionando um meio de assimilação. O
mesmo autor ainda ressalta que estas experiências podem ser particulares,
assim, cada indivíduo responde a uma marca de forma diferenciada ao unir em
sua memória experiências cotidianas e experiências de marca, significando que
a percepção do ambiente e a maneira de reagir a ele dependem da história de
experiências individuais relevantes.
“Para determinada pessoa, Sears pode significar um
passeio à loja com o vovô num velho Chevrolet barulhento. Para
outra, poderia estar associada à primeira bicicleta e ao sentimento
de liberdade que ela produziu. Para outra ainda, Sears usualmente
significa pneus e peças de automóveis e um lugar que entrega à
domicílio peças de qualidade.” (AAKER, 1998:119)
No que tange a marca de Moda ou griffe, quesitos como imagem ideal,
personalidade e familiaridade são decisivos, eles garantem o estilo único, a
aproximação com a realidade vivenciada pelo usuário e o nível de conhecimento,
em meio a uma centena de marcas concorrentes no mesmo segmento.
“Agora chegamos a um ponto em que um produto, e
especialmente uma griffe, tem de (...) refletir um estilo de vida, ter
pedigree e alma. Um produto com alma não só atrai o interesse do
consumidor, como também consegue se comunicar com ele e até
aumentar seu conhecimento”. (VILLAÇA, 2002:102)
41
A marca de Moda é uma forma muito especial de marca, por revestir a
pele de cada indivíduo, é uma espécie de segunda pele, que apropria-se da
identidade e do self de cada um.
2.3 A marca de Moda
No caso específico da Moda, diferentemente de outros produtos como
móveis, eletrodomésticos, computadores ou carros, a marca é epidérmica, uma
espécie de invólucro que ressalta a aparência pessoal. Por este motivo, a
questão da escolha da marca de Moda é bem mais elaborada e meticulosa do
que alguns atos de compra de produtos que não envolvem o corpo.
A eleição não é apenas uma questão de preferência, ela passa pela
decisão de como nos apresentaremos mediante outros olhares, qual será a visão
de mundo proporcionada pelas peças que vestimos, quais logotipos ou símbolos
visíveis que escolheremos para nos identificar a primeira vista, etc.
Em uma crítica à forma com que a sociedade trata a questão das marcas
de Moda e mesmo em uma crítica à dominância dos logotipos na
contemporaneidade, Naomi Klein (2004:377) defende que nossas vidas acabam
por ser marcadas pelas etiquetas que vestimos.
Em outra citação, Mesquita (2004:74) indica que nosso imaginário está
povoado pelas significações das grandes marcas, no momento que as roupas,
marcam o corpo, inscrevendo-se nele. Para a autora, campos subjetivos
produzem-se por meio de uma etiqueta e sua proposta. Em atitudes plenamente
emocionais, escolhemos nossa aparência pelas marcas.
A força simbólica da marca de Moda é reforçada por Castilho (2004:46)
quando a autora afirma que ao comprar determinada peça do vestuário o
consumidor não a compra por sua funcionalidade, mas pelo universo de valores
que ali estão enunciados e que passam necessariamente pelas marcas.
Nessa relação emocional, geralmente elementos como qualidade e
conforto são colocados em segundo plano, ainda que não sejam descartados da
42
escolha. O fato é que costuma prevalecer o aspecto visual da peça e toda sua
representação imagética.
No caso de muitos grupos sociais, em especial no público jovem, o papel
da marca aliado ao formato e cores da peça é imprescindível para uma escolha
certeira. É na dupla aparência da roupa/marca que domina a preferência de
compra nestes mercados.
Conforme Cidreira (2005:73), as grandes empresas de Moda, atentas a
esta realidade, compreenderam a predominância de desejo pela roupa de marca
e realizam uma proximidade afetiva junto ao potencial consumidor, passando
necessariamente por um habilidoso trabalho de marketing.
Por sua importância no sistema de Moda, a marca pode ser avaliada
como sendo maior do que o estilo em si e quando bem trabalhada engloba em
seu sentido pleno a linha criativa adotada, carregando consigo a promessa
fantástica de recriar o corpo em uma imagem ideal.
A marca traz a sensação de segurança e bem-estar para os usuários
através dos diversos aspectos simbólicos contidos em sua imagem. Seu preço é
alto para poder garantir a significação e diferenciação, sendo que o valor
embutido é contabilizado como sendo o “valor de design”, que segundo Castilho
(2004) contém uma série de informações e discursos.
Na história da Moda, é importante identificar quando as questões
relacionadas à marca surgiram no contexto mercadológico. Considera-se que foi
com o advento da Alta Costura, no ato de assinatura das roupas por seu criador,
e na abertura das Maisons que a marca iniciou sua jornada.
2.3.1 Trajetória da marca de Moda
O primeiro costureiro a receber o título de estilista, dando início ao
histórico das marcas de Moda, foi Charles-Frédéric Worth, já comentado
rapidamente no Capítulo 1 desta dissertação como sendo o primeiro
representante das mudanças constantes da Moda. Worth é um verdadeiro
“marco zero” da história da Moda, tanto nas engrenagens que a regem quanto no
sentido de construção de marca. A fundação de sua Maison data de 1857.
43
“Sob a iniciativa de Worth, a moda chega à era moderna;
tornou-se uma empresa de criação, mas também de espetáculo
publicitário”.(Lipovetsky,1999:72).
Antes de sua Maison, a elite aristocrata mandava fazer suas roupas em
costureiras particulares ou alfaiates de senhoras, que eram mais executantes
dos pedidos das clientes do que criadoras de um estilo inovador, respeitando
todas as ordens e petições à risca, sem sugerir uma opinião criativa própria.
O relacionamento afinado e de diálogo entre criador e cliente, que é
verificado somente a partir de Worth, permite às linhas da moda se tornarem
bem mais rigorosas e evoluírem com rapidez, por contarem com o aval de um
estilista regente que orquestra o ritmo das mudanças de formas e cores da
estação, conforme cita Vincent-Ricard (1989:56).
Na segunda metade do século XIX a ascenção da figura do estilista
coincide com o nascimento da indústria em grande escala e a promoção de uma
nova classe dirigente da sociedade: a alta burguesia, que não vinha dos círculos
aristocráticos, não tinha a educação baseada na etiqueta social e por isso estava
disposta a pagar qualquer preço para se fazer notar através da renovação
freqüente de seus trajes, e estava ávida pelos conselhos sábios dos grandes
criadores, que poderiam trazer o reconhecimento social tão almejado.
O papel da burguesia, o surgimento das metrópoles, a visualidade das
cidades, a produção em série das fábricas e o advento de uma nova sociedade
apegada às aparências faz com que o estilista na figura do “ditador de elegância”
ganhe força. Uma de suas funções é ensinar aos emergentes como se portar na
vida social citadina, diferenciando-se dos demais e exibindo signos de distinção
por meio de suas roupas e acessórios, à moda das histórias de Hollywood como
Sabrina e My fair Lady, ambos estrelados por Audrey Hepburn e de grande
sucesso na era de ouro do cinema.
Outro fator importante da Alta Costura é que ela fornece uma Moda
centralizada, internacional e torna o estilista uma figura pública de fama,
enfraquecendo os costumes tradicionais e regionais em prol de uma Moda
padronizada. A Alta Costura para Lipovestky (1999:109) acaba por reproduzir
uma “imagem de marca eterna”.
44
Com a entrada do século XX e principalmente a partir do final da 2a
Guerra Mundial, com o desenvolvimento da publicidade e dos meios de
comunicação de massa, o papel das marcas ganha maior status, através de
diversas ações de promoção como os desfiles de Moda que começam a ter
cobertura das principais revistas especializadas, a popularização do prèt-a-porter
e o crescimento de ações de comunicação que elevam o conhecimento da Moda
e das grandes marcas em âmbito global.
Desde então é possível verificar um tratamento particular para a marca em
cada mercado consumidor, com funções distintas. Nos círculos de usuários que
valorizam o luxo e a alta costura, muitas vezes a marca sinaliza exclusividade, já
nos mercados jovens sinaliza identidade e no meio esportivo sinaliza
desempenho. Escolhemos aqui tratar de três formas de tratamento da marca de
Moda, de acordo com o objeto de estudo deste trabalho.
A classificação que se segue não é rígida e definitiva, podendo haver
novas inserções ou diferentes visões a respeito, porém foi uma forma de
enxergar o panorama da marca de Moda em uma linha que facilite seu
entendimento e suas principais características em relação ao consumidor.
“brands ocupy a very different place in the fashion
universe”7. (TUNGATE, 2005:177)
2.3.2 Marcas de Exclusividade
O caso da exclusividade de marca é representado principalmente pela
Alta Costura dos grandes estilistas, onde a roupa é feita especialmente para uma
determinada cliente, sem produção em larga escala.
A peça confeccionada é um signo de particularização, um verdadeiro
fetiche e emblema de Luxo. Geralmente é feita com tecidos nobres de primeira
qualidade, muitas vezes produzidos especialmente para a peça. A produção é
feita em grande parte por processos manuais executados por mão de obra
altamente especializada e que demandam grande tempo de execução.
7 Tradução pessoal: “as marcas ocupam um lugar muito diferente no universo da Moda”.
45
Com todas as especificidades deste tipo de marca de Moda o custo final
das roupas é altíssimo, porém em contrapartida a peça é dotada de elementos
inconfundíveis e exclusivos.
Esta forma de marca de Moda existiu principalmente no fim do século XIX
e início do século XX, até a crise da Moda parisiense durante a Segunda Guerra.
Atualmente ainda existe este tipo de Moda exclusiva, luxuosa e de manufatura
minuciosa, porém em menor escala. Atrizes, cantoras, milionárias - em especial
do mundo árabe e oriental - e clientes com condições de manter o preço de uma
roupa exclusiva assinada por um grande estilista ainda consomem este tipo de
Moda e de marca no sentido tácito da exclusividade e luxo.
2.3.3 Marcas de Diferenciação
Se a marca de exclusividade é apoiada no luxo ostentatório, e por isso
inalcançável à maioria das pessoas, existe uma segunda categoria que ainda se
embasa na questão da distinção, porém de maior penetração social. É o que
podemos chamar de marcas de diferenciação.
Pode-se encontrar o distanciamento desta categoria em relação à
primeira a partir do crescimento vertiginoso do prèt-a-porter. Desde o início do
século XX Lipovetsky (1999) reforça que existe uma revolução no ato de vestir,
onde o chique é não parecer rico. Deixou de ser importante “ostentar” signos de
exclusividade e a maioria dos estilistas aderem também a coleções de produção
em massa, onde não é mais evocado o privilégio da peça única, mas
permanecem os signos de diferenciação pela etiqueta ou assinatura da marca.
Além do grande número de peças produzidas nas fábricas, os tecidos são
imitados e produzidos em larga escala, as fibras e corantes são encontrados a
preços mais acessíveis, a informação de Moda está espalhada pelos quatros
cantos do mundo e ocorre a padronização do estilo de roupas (coleções a serem
seguidas à risca). Neste cenário o grande diferenciador é a etiqueta reconhecida
por seu valor.
Para manter um certo status nas roupas semelhantes é necessário
incorporar o preço de cada peça ao desenho. Isso é realizado de uma forma
46
muito simples: deslocando o nome da Maison, antes relegado a uma posição
modesta no interior da roupa, para um local de proeminência. Lurie (1997:145)
afirma que sapatos, camisas, vestidos, calças e lenços comuns são clara e
indelevelmente marcados com os nomes, monogramas e logomarcas de seus
fabricantes.
Esse novo sistema foi acompanhado por uma grande promoção social,
que não só permitiu às grandes marcas tradicionais reforçarem sua imagem,
mas adquirir um renome internacional. As distâncias quanto às diferenças sociais
continuam a ocorrer como no caso das marcas de exclusividade, porém no caso
das marcas de diferenciação existem de modo mais brando, uma vez que o luxo
do vestuário deixou de ser um imperativo de demonstração de poder pecuniário.
Essa categoria de construção e gerenciamento de marca de Moda
geralmente se localiza nos casos das griffes de luxo com forte atividade
comercial, como o exemplo do conglomerado liderado pela LVHM e tantas outras
marcas de luxo que não estão necessariamente no âmbito da Alta Costura, mas
se distanciam da grande massa de marcas existentes.
2.3.4 Marcas de Identificação
Se construíssemos uma pirâmide das três categorias de marcas
sugeridas, o topo seria preenchido pelas marcas de exclusividade, a segunda
colocação ficaria para as marcas de diferenciação e a grande base representaria
esta terceira categoria: as marcas de identificação, que são as mais próximas do
público jovem/adolescente.
Para esta categoria, o papel da massificação industrial das roupas e das
ferramentas publicitárias é decisivo.
O assunto da produção em massa de Moda foi tratado com detalhamento
por Leopold (1992), porém aqui basta reter que o fator da disseminação da Moda
em grande escala, unida às tecnologias de vestuário e ao minucioso sistema
publicitário contribui para sua disseminação, que é feita em larga escala e
necessita de adesão maciça para se tornar Hit.
47
“Depois do sistema monopolístico e aristocrático da Alta
Costura, a moda chegou ao pluralismo democrático”.
(LIPOVETSKY, 1999:117)
Aqui as marcas funcionam como elemento de agregação de pessoas que
compartilham de uma mesma identidade, na unificação em torno de um estilo de
vida ou de um vestir semelhante. O senso de pertencimento ou belonging faz
com que o desejo por vestir determinada marca aumente. A comunicação dos
logotipos e todo complexo imagético existente influenciam os indivíduos a terem
modos de visibilidade análogos aos de seus amigos ou círculo social.
Em seu “universo de atuação” o indivíduo é visto por um público que tem
competência primária de contato com aquele símbolo ou logomarca expressa na
roupa, assim a leitura de sentidos e significados passa a ser muito mais eficaz.
A divulgação das marcas de identificação é densa e ocupa as mais
diversas mídias, enquanto as marcas de Luxo - tanto de exclusividade como as
de diferenciação - estão mais afastadas de ações agressivas de comunicação de
massa, exceto em seus produtos de beleza, em especial perfumes.
Caracterizam-se como marcas de Identificação e de grande adesão em
busca de uma identidade ideal alguns exemplos como Nike, Puma, Diesel,
Levi’s, Benetton, entre outras.
Mark Tungate (2005) ao comentar sobre esse tipo de marca de
identificação, ou seja, marcas com forte apelo publicitário com intenção de altos
níveis de venda, sugere que a forma de atuação dessas marcas é mais próxima
ao sistema de comercialização do Mc Donald’s se comparado ao sistema
utilizado por Chanel ou outros sistemas de Moda tradicionais. Esta afirmativa é
interessante porque demonstra o poder da mídia e dos métodos de marketing
para as marcas de identificação. Seu principal intuito é transformar o mundo - em
especial o jovem - em uma aldeia de indivíduos vestidos com seus emblemas e
para isso utilizam-se mais do marketing do que dos elementos tradicionais de
Moda.
Agins (1999:14) atenta a essa nova característica da indústria do vestuário
chega a arriscar que a Moda como a conhecíamos até então teria chegado ao
48
fim. O título de seu livro intencionalmente é: The end of fashion - How Marketing
Changed the Clothing Business Forever8, nele, a autora assume que a
criatividade do estilista é muito mais expressa pelas técnicas de marketing do
que pelo design em si, sendo que a imagem é a forma, porém a principal função
desta nova Moda reside no marketing.
Cidreira (2005:75) comenta no mesmo sentido que o papel da estratégia
de marketing torna-se cada vez mais importante e presente no universo da
Moda.
O fator marketing na Moda é visível quando verificamos que muitas
marcas antes de estarem preocupadas em apresentar roupas, estão
preocupadas acima de tudo em transmitir “estilos de vida” ou atitudes a partir de
seus conceitos publicitários, erigidos através de diversos códigos que só
conseguem ser lidos em plenitude pelos grupos que congregam das mesmas
atitudes e opiniões.
“À marca agrega-se um sentido de manutenção de valores e
de estilos de vida que ela promove e que são recorrentes em todas
as suas manifestações.” (CASTILHO, 2004:47)
2.3.5 A aura da Moda
Fazendo um paralelo com a teoria da “aura” de Walter Benjamin no texto
“A Obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica” é possível dizer que
antes da grande massificação da produção de roupas, mais precisamente até a
década de 40 do século XX, a roupa possuía sua aura dentro do contexto de
peça única, exclusiva, criada e manufaturada especialmente para uma
determinada pessoa.
Com o advento da indústria da confecção, aperfeiçoando a produtividade
de roupas em massa, a “aura” existente na moda mudou de posição, não é mais
necessariamente a exclusividade da peça que determina a sua especial
existência e sim a imagem mítica das marcas que transmitem sentimentos
8 Tradução pessoal: O fim da Moda – Como o Marketing mudou o negócio de roupas para
sempre.
49
intensos e desejáveis para os consumidores. Para conseguir o efeito desejado
deste novo padrão de atuação da Moda, podemos arriscar em dizer que a nova
“aura” da Moda atualmente está pautada na publicidade.
Verificamos que o objeto de desejo da Moda começou a ser regulado pela
personalidade da marca, construída pelos “reis filósofos” publicitários, que criam
comunicações criativas para expressar os sentimentos exatos que atingem o
consumidor final. Desde então, a Moda é um setor econômico dependente de
forma integral da publicidade, que geralmente tem eficiência em qualquer
camada social, desde que bem trabalhada.
O intuito é extrapolar, exteriorizar, comunicar e demonstrar a diferenciação
pela marca, em campos subjetivos e conceituais, com pequenos símbolos ou
signos ínfimos que são facilmente reconhecíveis e ganham relevância na força
identitária.
Os significados míticos da roupa com nome e logotipo, trabalhados pelas
ações de marketing é intenso, em especial no público adolescente que ainda não
pode desfrutar de objetos de consumo de maior porte, como é o caso de motos
ou carros e por isso precisam se “contentar” com outros signos que valorizem
sua apresentação pessoal.
O indivíduo de 14 a 18 anos tem como seu aliado primordial o corpo e é
com ele que cria e recria sua existência, em um jogo de aparências e narcisismo
sem freios. A roupa neste contexto serve como um objeto mágico que garante
sensualidade, poder, virilidade, entre outras qualidades.
Para entender o papel da marca de Moda para esse público e
principalmente conhecer seu perfil na atualidade a partir de dados recentes de
pesquisas nacionais, dedicamos o espaço do próximo capítulo.
51
Capítulo 3
Juventude Transmutada
3.1 Juventude em contexto
Conceituar juventude não é uma tarefa fácil. Arriscar uma definição é
ainda mais complicado, por ser um território mutável e em constantes
transformações, contando com diversos atores sociais que diferem entre si em
atitudes e comportamentos. O melhor caminho a seguir é o da revisão
bibliográfica de alguns dos principais autores que trataram do tema, e que
trazem no bojo de suas reflexões algumas pistas interessantes a respeito da
condição juvenil.
Sanchis (1996) demonstra o quanto é difícil categorizar a juventude, por
ser uma situação complexa e escorregadia. Trata-se de um termo multifacetado
que não pode incorrer nas simplificações terminológicas.
Abreu (1997) observa que a juventude pode ser uma espécie de
construção sociológica para determinar faixas etárias, concordando que a
simplificação do termo pode conduzir a um perigoso estudo limitante dessa
condição.
Margulis (1996) defende que não se deve estudar a juventude somente
em função etária, por estar constituída de uma dimensão simbólica relevante,
porém enfatiza a situação adolescente, que seria o momento de transição
banhado por rebeldias e comportamentos incompreensíveis, em busca de uma
auto-definição.
Para Groppo (2000), esse é o período de uma fase preparatória para a
idade adulta, porém o autor ressalta a imprecisão dos limites etários, por serem
confusos, pelo fato dos ritos de passagem e demarcação de gerações não serem
fixos.
52
Todos os autores citados concordam que a juventude é um momento
significativo e que as marcas sociais históricas de cada recorte temporário da
juventude correspondem a uma maneira específica de tratar o assunto. Paul
Singer (2004:27) destaca que uma classe juvenil distinta se desenvolve em
função do momento histórico em que nasceu, atravessando as mesmas
vicissitudes políticas e econômicas, ou seja, a época vivenciada interfere nas
ações juvenis.
Alguns estudos sobre juventude consideram este período da vida como
uma espécie de moratória, um espaço temporal em que é possível gozar das
benesses da vida sem ter que se preocupar com o futuro ou com o sustento
pessoal, focalizando seus esforços no lazer, no consumo e nos estudos. Esta
leitura tem uma ramificação especialmente econômica, dentro de um sistema de
produção capitalista que considera o adolescente e o jovem como uma pessoa
“improdutiva”, por estar impedida de trabalhar e que, por este motivo, é um
amplo espaço para as investidas publicitárias e apelos de consumo.
Vianna (1997) cita que o modo de interpretar a juventude como mera
transição ou moratória advém de uma compreensão do mundo adulto como algo
estático e rígido em contraposição ao mundo instável da juventude, excluindo-se
muitas vezes algumas representações simbólicas expressivas e existentes no
caldo juvenil.
Pierre Bourdieu (1983) lançou uma leitura ousada ao publicar seu texto
“Juventude é apenas uma palavra”. Diversas interpretações resultaram deste
texto, sendo acusado de ter reduzido a juventude a apenas um estado
transitório, porém é possível interpretarmos o texto de Bourdieu como a
caracterização da juventude como situação relacional, devendo-se ser estudada
segundo o contexto em que está inserida. Para Bourdieu, as fronteiras muito
rígidas que separam os jovens dos adultos são arbitrárias, a idade é socialmente
construída e varia em cada sociedade, nos diferentes momentos históricos, a
partir de distinções de idade, gênero e classe.
Em “A Juventud es más que una palabra”, Margulis (1996) respondendo
ao texto de Bourdieu qualifica a juventude como um espaço de sensibilidades
específicas, com velocidades e ritmos diferentes.
53
A questão a ser levantada em meio a tantas afirmações é: se a juventude
é uma fase tão imprecisa e multifacetada, como resolver seu recorte para um
estudo acadêmico ou para uma pesquisa quantitativa ou qualitativa? Verifica-se
que a juventude, conforme o texto introdutório do Relatório Global IBASE/POLIS
(2006), é uma categoria em permanente construção social e histórica,
incorporando a complexidade da vida em suas dimensões biológicas, sociais,
psíquicas, culturais, políticas e econômicas.
Além da diversidade percebida na condição juvenil, nota-se ainda que
dentro de recortes necessários realizados em pesquisas de opinião é possível
verificar diferentes comportamentos e localizar diversos grupos de atitudes1. Se
fosse possível esquematizar corretamente um conjunto denominado “juventude”
encontraríamos nele alguns encontros em comum e intersecções, embora em
outros diversos pontos possíveis teríamos distanciamentos e particularidades
específicas, mutáveis e nunca estáticas, dificultando a definição precisa de
comportamento a partir de uma análise simples. A condição jovem perpassa uma
série de conexões e ramificações infinitas no sentido da alteridade da condição
juvenil.
Existem múltiplas maneiras de viver a juventude, portanto uma agregação
arbitrária, qualquer delas, não resume as identificações possíveis. Para diminuir
a dificuldade de se estudar o jovem e por reconhecer sua multiplicidade, passou-
se a empregar, em especial nos textos e pesquisas nacionais, o termo
“juventudes”, no plural (ABRAMO, 2005).
Na multiplicidade das juventudes encontram-se signos distintos e
diversos, vinculados ao corpo e à subjetividade. Existem aqueles que se
dedicam com maior afinco ao consumo, ao lazer e ao desfrutar da condição que
lhes é permitida, outros que se preocupam com questões como o desemprego e
a falta de oportunidades, outros que ainda acreditam ser possível um mundo
melhor e mais justo, além da infinidade de outros perfis e atitudes que os jovens
possuem perante a vida. Unificá-los em um montante é impraticável, porém é
1 O dossiê Universo Jovem MTV3, após coletar as informações da pesquisa na fase qualitativa e
quantitativa, apresenta os diversos perfis encontrados na amostra de pesquisa. Em cada perfil é possível constatar comportamentos diferenciados e atitudes díspares, quando comparadas aos outros perfis. No final deste tópico será possível verificar dois dos perfis mais adequados ao trabalho.
54
admissível estabelecer um recorte que circunscreva um conjunto de sujeitos
cujas experiências se encontram em determinado grau, para assim delinear
informações e hipóteses com fins de pesquisa acadêmica.
3.1.1 A Adolescência
Para viabilizar o estudo aqui sugerido, foi definido como enfoque principal,
porém não o único, o período denominado “adolescência”, também chamado
como primeira juventude e que atualmente caracteriza-se - por convenção
acadêmica - pelos jovens com idade entre 14 e 18 anos moradores das regiões
urbanas e metropolitanas.
Uma das características que assinalam a adolescência como um todo é a
plasticidade deste período da vida. Edgar Morin afirma que:
na “adolescência a personalidade social ainda não está
cristalizada, os papéis ainda não se tornaram máscaras
endurecidas sobre os rostos, o adolescente está à procura de si
mesmo e à procura da condição adulta. (...) nessa busca, tudo é
intensificado: o ceticismo e os fervores”. (MORIN, 1997:154).
O adolescente experimenta tudo de modo mais intenso e segue sua
própria Moda, seu próprio modo de vida, suas gírias e suas manias pessoais.
Nesse caso específico, vamos reduzir o recorte total da adolescência para
os membros das classes A e B prioritariamente, que cursam o ensino médio e
cursinhos pré-vestibulares e são moradores dos grandes centros urbanos
brasileiros. Durante a realização deste estudo, os jovens desta coorte nasceram
em média no final dos anos 80 e início dos anos 90.
Ainda dentro desse universo composto por estudantes da classe A e B é
possível encontrar algumas particularizações ou perfis específicos. Para este
estudo utilizaremos prioritariamente dois perfis - ou agrupamentos - que reúnem
jovens com idéias comuns, criados pelo Dossiê Universo Jovem da MTV,
publicado em 2005.
55
O primeiro perfil caracteriza os adolescentes chamados pela pesquisa de
“antenas do tempo”, (Dossiê MTV3, 2005:52) assinalando 19% da amostra total.
Dentre todos os entrevistados estes são os mais modernos, antenados, liberais
& liberados a novas experiências, que valorizam ser jovem em tempo de
tecnologia, acreditam na superioridade de marcas famosas, são os mais atraídos
pelo universo cyber: os que mais possuem computador, celular, câmera
fotográfica digital, discman, MP3 player, que mais acessam a internet e que mais
conhecem e interagem com seu universo: blogs, fotologs e Instant Messenger.
São também os que melhor aceitam o homossexualismo, os que mais beijaram
pessoas do mesmo sexo ou que conheceram no mesmo dia e se destacam em
cuidados com a própria beleza. Nesse perfil concentra-se a grande parte dos
adolescentes de 15 a 17 anos da pesquisa e por isso são considerados destaque
para a análise aqui proposta.
O segundo perfil, chamado de “vivendo intensamente” caracteriza 22% da
amostra total e são ainda mais vaidosos, mais ambiciosos e querem mais
diversão que o primeiro perfil citado. Gostam de aproveitar ao máximo a
juventude e adiam ao máximo as responsabilidades. Abertos ao consumo,
valorizam a Moda e o acúmulo de bens. A TV é seu maior lazer em casa.
A partir destes dois perfis, que correspondem aproximadamente a 41% da
amostra total da pesquisa da MTV serão delineadas as informações aqui
apresentadas e a aplicação metodológica da experiência colateral na eficácia
comunicativa da marca.
Antes de nos atermos aos dados coletados deste recorte escolhido para o
estudo, é importante traçar um panorama geral de como se constituiu a fase da
juventude e da adolescência a partir da segunda metade do século XX até os
dias atuais.
Sanchis (1996) admite que historicamente sempre existiu um momento de
transição de uma fase da vida para outra, porém o que diferencia a sociedade
moderna no entendimento da juventude como uma das fases da vida, é o
tratamento dado a esta condição.
Vianna (1997) cita que a cultura adolescente, como a conhecemos hoje,
emergiu no seio da cultura de massa, a partir de 1950. De fato, é
56
aproximadamente depois do final da Segunda Guerra mundial que a juventude
começa a se converter em objeto de reflexão e o cinema apresenta seus
primeiros filmes retratando de maneira mais aprofundada o universo jovem,
sempre no sentido Moral Panics, ou seja, representando a juventude como uma
fase complicada e uma situação de perigo para a sociedade.
Um dos precursores é o filme de 1949 entitulado “Almas Abandonadas”
(City Across the River), estrelado por Tony Curtis e que conta a história de um
grupo de delinqüentes juvenis de uma escola de ensino médio do Brooklyn.
Apesar de “Almas Abandonadas” ter sido lançado ainda nos anos 40, a
maior lembrança que guardamos do debùt da juventude como tema
cinematográfico é com “Rebel without a cause” ou “Juventude Transviada” de
1955 e que tem no casting James Dean e Natalie Wood.
Segue juntamente com o lançamento de “Rebel without a cause”, a febre
Elvis Presley e a explosão dos Beatles, que consolidam o reconhecimento de
uma nova forma de viver a juventude, ao som do rock’n roll, no ritmo dos bailes
de formatura, no estímulo do consumo e, tendo como principal lazer, as sessões
de cinema recheadas de pipoca e banhadas por Coca-Cola. Somente a partir
dos anos 50 cristaliza-se uma cultura juvenil, no momento em que os meios de
comunicação de massa apontam em direção ao jovem, que pode se caracterizar
como um certo perigo para a sociedade, mas que por outro lado é um forte
consumidor em potencial.
Logo após a percepção deste grupo particular que se estabelecia na
sociedade iniciou-se, em especial nos Estados Unidos, a distinção dos
agrupamentos de pessoas nascidas em determinados períodos da História como
sendo participantes de gerações específicas. A distinção das gerações não é
exata e a definição do intervalo de anos que comporta cada uma difere de autor
para autor. Consideraremos aqui os dados mais utilizados, com a intenção de
delinear a juventude num processo cronológico2.
2 Após uma pesquisa ampla a respeito do tema com a consulta de vários artigos, livros e sites
chegou-se a determinação de três principais gerações: Baby Boomer, Geração X e Geração Y, porém é importante ressaltar que, por comportarem espaços temporais muito longos, cada geração apresentada possui particularidades que superam a definição cronológica. Considerar outras subdivisões é possível, porém em prol da objetividade e para evitar reduções desnecessárias, seguiremos apenas estas gerações-macro, que em linhas gerais resumem o
57
3.1.2 Três gerações distintas
A primeira geração estabelecida como fonte de estudo emergiu a partir do
retorno dos soldados da Segunda Guerra. Com o crescimento populacional,
surgiu a geração “Baby Boomer”, ou seja, a geração dos nascidos no pós-guerra.
Karen Ritchie (1995:12) afirma que os baby boomers são as pessoas nascidas
entre 1946 e 1964. A época juvenil desta coorte, entre os anos 60 e 70, foi
marcada pela crise dos valores morais, por guerras e guerrilhas sangrentas,
ditaduras militares e crises educacionais que levou-os à revolta.
Um dos primeiros sinais desta juventude contestadora foi percebido nos
Beatniks, jovens americanos, liderados por Jack Kerouak, que ainda em meados
dos anos 50 começaram a desconfiar do “sonho americano” e criaram uma
espécie de movimento poético/literário para contestar a ordem estabelecida. O
nome Beatnik, segundo Paulo Sérgio do Carmo (2003:29) foi cunhado pela
imprensa americana, advindo da fusão das palavras beat (barulho/batida) e nik
(a terminação nik vem de Sputnik, o primeiro satélite russo, mostrando assim que
estes jovens eram simpatizantes das idéias esquerdistas e comunistas).
Desiludidos e com um certo vazio existencial os Beatniks rejeitavam os
valores burgueses, viajavam sem rumo pelas estradas americanas e estavam
completamente insatisfeitos com o sistema. Todos estes ingredientes foram
elementos essenciais para o surgimento da chamada Contra-Cultura realizada
pelos Baby Boomers nas décadas seguintes.
Nos anos 60, das mais variadas formas, a juventude procurou romper com
tudo: com a universidade, com os partidos, com a família e com toda e qualquer
tradição. O pensamento vigente era anticonformista e contestador, as diferenças
entre jovens e adultos eram nítidas, a intenção era libertar-se dos padrões
estabelecidos e formar uma nova ordem social, uma nova configuração cultural.
comportamento vivenciado em cada época. Estas divisões temporais têm apenas a função de situar o estudo dentro de uma realidade histórica, mas não devem ser levadas como regra de conduta de todos os atores sociais de cada geração. Para buscar uma definição mais apurada e qualificada do grupo adolescente/jovem atual faz-se necessária a atenção ao tópico 3.2 deste capítulo, que exprime dados de pesquisas oficiais.
58
O meio que estes jovens encontraram para a revolução foi a invasão das ruas,
em protestos e passeatas.
Na França o “Maio de 1968” e a série de eventos iniciados pela greve de
estudantes universitários, em especial da Universidade de Sorbonne foi um dos
grandes marcos da Contra-Cultura. Embora encontremos na maioria dos autores
um aspecto heróico desta revolta e de tantas outras revoltas deste período é
interessante citar um contraponto à opinião romântica dominante.
Gilles Lipovetsky, em uma visão cética, considera a Revolução Estudantil
Francesa de 68 como produto efêmero e sem real aspecto revolucionário. Em
suas palavras:
“Sem projeto explícito, e sustentado por uma ideologia
espontaneísta, Maio de 68 não foi senão um parêntese de curta
duração, uma revolução frívola, uma paixonite pela Revolução mais
do que uma mobilização de fundo. Houve espetáculo da
Revolução, afirmação alegre dos signos da Revolução, não aposta
e confronto revolucionário. Diferentemente das revoluções
sangrentas centradas na construção voluntária de um futuro
diverso. Maio de 68 organizou-se segundo o eixo temporal da
moda, o presente, num happening mais parecido com uma festa do
que com os dias que abalam o mundo. (...) Maio de 68 foi levado
por uma ideologia individualista “libertária”, hedonista e
comunicacional, nos antípodas da abnegação de si das revoluções
anteriores. O presente coletivo e subjetivo é que foi o pólo temporal
dominante de Maio de 68, primeira revolução-moda em que o
frívolo prevaleceu sobre o trágico, em que o histórico se uniu ao
lúdico”. (1999:245)
Embora a opinião de Gilles Lipovetsky contradiga tantas opiniões a
respeito de Maio de 68, é notório que as cenas hippie e da contra-cultura tiveram
também muita eficácia para as organizações comerciais e para o apelo do
marketing. Os resultados efetivos de uma revolução sociológica, com a
transformação real do mundo em que vivemos foram algumas vezes eclipsados
59
pelo apelo ao consumo. Enquanto os jovens contestavam a sociedade, a
sociedade de consumo fazia produtos para a contestação.
Na percepção de tantas expressões juvenis e enxergando as
particularidades de cada manifestação, um grupo de teóricos ingleses iniciou
entre os anos 60 e 70 alguns estudos pioneiros sobre a juventude, focalizando
especificamente a realidade da Inglaterra. Baseados em Birmingham, o Centre
for Contemporary Cultural Studies, comumente chamado de CCCS começou a
orientar suas reflexões aos itens de consumo dos jovens, sua música, suas
roupas e tantos outros signos juvenis que caracterizavam, segundo os autores
do CCCS, as subculturas juvenis. Alguns exemplos das subculturas juvenis
encontradas pelos estudos de Birmingham foram os Rockers, Mods, Punks,
entre outros.
Um dos livros de maior repercussão lançado pelo CCCS é “Subculture:
The Meaning of Style”, de Dick Hebdige (1979). No livro, Hebdige retrata
algumas subculturas como os Rastafaris, Punks, Teddy Boys, Glam, entre
outros.
Andrew Bennett (2000) critica o recorte analítico do CCCS e mais
especificamente de Hebdige por considerar que os estudos excluem da análise
questões importantes, focalizando principalmente a questão de classe social, em
especial o proletariado.
A partir dos anos 90, o termo Subculturas Juvenis criado pelo CCCS foi
substituído na maioria dos estudos pelo termo Estilo de Vida, principalmente
porque o novo termo possui uma propriedade mais identificada com os jovens e
sua sensibilidade, que é de constante mutação.
Seguindo o curso das gerações, uma segunda coorte juvenil surgiu com
as pessoas nascidas no período entre 1965 e 1981, nomeada pelo escritor
Douglas Coupland (1991) como Geração X ou Generation X. As crianças desta
geração cresceram em lares onde ambos os pais trabalhavam e a televisão
passou a ser sua maior fonte de entretenimento tornando-se sua grande
companheira. Confinados em seus quartos - ao invés de aproveitarem a
liberdade dos parques e praças - tiveram como brinquedo principal o vídeo
game, iniciando um movimento de introspecção em direção oposta da geração
60
precedente, que desejava ganhar as ruas. A crença que o futuro seria melhor e
mesmo que a revolução seria um bom caminho esvaiu-se em torno da violência,
das angústias e da percepção de que tudo continua como sempre, sem grandes
transformações sociais.
Uma das poucas formas de contestação desta geração foi encontrada na
música, em especial com o advento do Hip Hop e do Rap, uma das mais
significantes formas de expressão “X”. O Hip Hop foi um meio encontrado pelos
Afro-Americanos nos anos 80 que ganhou repercussão mundial. No Brasil, o
movimento ganhou força especial na periferia, nas vozes discordantes que
clamavam por justiça e igualdade social.
Ainda na música, com um certo pessimismo em relação à vida, outros
jovens desta geração aderiram ao Movimento Grunge do início dos anos 90, que
expressava as frustrações e a crise juvenil em tom melancólico.
Acostumados com a rapidez dos comerciais televisivos e com a profusão
de imagens dos clips musicais (uma febre desta geração), a geração X exigia no
dia a dia mensagens rápidas, picotadas e simultâneas. A informática já era uma
realidade, porém no período da adolescência esta coorte não conviveu com o
frenesi da internet, que se popularizou no final do século XX e início do século
XXI.
A terceira geração é denominada como Geração Y ou Generation Y,
termo que apareceu pela primeira vez em um artigo do periódico Advertising
Age3 de agosto de 1993. O escopo dos nascidos nesta geração é representado
pelo período de 1982 até o início do século XXI (2001, 2002), porém as datas
ainda são imprecisas. O termo “Y” é uma espécie de reconhecimento de
sucessão da geração X para a próxima, portanto Y.
Segundo o boletim NAS4, essa geração é a maior em número de pessoas
desde os baby boomers nos Estados Unidos, significando também uma grande
faixa de consumo e interesse publicitário.
3 O site do periódico pode ser visitado através do link adage.com
4 disponível em http://www.nasrecruitment.com/TalentTips/NASinsights/GenerationY.pdf
61
Uma das principais características dessa coorte é que, mais do que
qualquer geração precedente, os Y estão cercados por tecnologia em todas as
partes, eles conectam-se ao mundo pelos sinais da internet e o digital faz parte
de suas vidas. Maria Rita Kehl (2002) em uma matéria da revista Época ressalta
que “vivemos dentro de casa com nossas engenhocas eletrônicas.”
No momento de decidirem qual profissão seguir, optam com mais
freqüência pelas novas carreiras ligadas à informática, ao meio digital ou mesmo
à beleza e à aparência, como é o caso da Moda5.
A significância das novas mídias e das novas tecnologias emergentes - da
internet ao celular, passando pelos MP3 players e tantos outros gadgets - é
imperativa, o capital cultural é desenvolvido nesses meios e as formas
comunicacionais são totalmente diferentes se comparadas com as gerações
anteriores. O que rege é a experiência on-line, fluída, hipermídia, sem raízes.
A informação não cessa, a todo momento surge um novo lançamento,
uma notícia quente do planeta pop, um vídeo imperdível no Youtube, um novo
amigo virtual e assim por diante. O acúmulo de informações grande parte das
vezes é um excesso de distração à disposição dos jovens, em especial
adolescentes.
Recentemente, segundo o portal de informações da MSNBC6, a Academia
da Força Aérea Americana teve que intervir no processo de estudos de seus
cadetes (que geralmente estão na faixa de 17 a 21 anos) por motivos
relacionados a mau uso da internet e conseqüente queda drástica no rendimento
escolar. No último semestre 19% dos estudantes tiveram baixo rendimento
escolar, trazendo para a escola a menor aprovação de toda sua história. Para
tentar amenizar os problemas, 43 alunos foram proibidos de usar a internet e
outras medidas foram tomadas.
Muitos psicólogos e psicanalistas enxergam principalmente nessa
juventude uma característica clara: a ausência de limites e fronteiras. Jorge
Forbes, psicanalista de base Lacaniana, escreve artigos sobre o tema e
5 No capítulo 5 apresentamos dados da Revista Capricho sobre a preferência pelos cursos
universitários de Moda pelas garotas desta geração. 6 Link: http://www.msnbc.msn.com:80/id/17037305/ . Acessado em 10/02/07
62
encabeça algumas discussões a respeito. Em agosto de 2004, na conferência
internacional do Luxo promovida pela FAAP, Forbes acenou que a coorte atual
de jovens "é fruto de uma sociedade onde os limites foram destruídos. Antes a
juventude tinha barreiras a lutar, que foram destruídas."7
Além da falta de limites e fronteiras, os “Y” vivem em dois mundos: o real
e o paralelo - neste caso virtual. Temos a impressão que eles estão
relativamente distantes da realidade, enfurnados no som de seus i-Pods e
resguardados em seus quartos, para conversarem pelo MSN e espalharem para
seus amigos as fotos mais produzidas, com seus rostos e corpos em zooms
diferenciados e imagens surpreendentes, trabalhadas pelo Photoshop. Estas
fotos por eles compartilhadas mostram algo a mais em relação à verdadeira
aparência, numa espécie de mundo de faz-de-conta.
Do outro lado do cabo, fora do universo virtual, o desemprego é uma
possibilidade nada remota, os vestibulares são cada vez mais concorridos, a
liberdade é cerceada pelo perigo das ruas e a atenção da família e amigos é
superficial. Diferenciar-se ou se tornar uma pessoa destacada dos demais é
uma tarefa difícil, por isso eles decidem manter uma imagem ideal no
ciberespaço, num erotismo pseudo-cool característico desta geração, tanto nas
imagens como nas frases e mensagens enviadas por scraps e MSN.
O que se constata, na observação comportamental desta geração, é que
virtualmente seu estilo de vida parece descolado e com certa facilidade em
comunicar-se sobre assuntos pessoais, porém nos encontros reais, a verdadeira
identidade apresenta-se mais tímida, insegura e até mesmo com uma outra
aparência física.8
Além desses fatores, os adolescentes estão inseridos em um mundo em
que a individualidade e a satisfação dos desejos pessoais estão na ordem do
7 matéria em: http://www.gestaodoluxo.com.br/comportamento/comportamento_materia_01.htm
acessado em 12/06/06. Escrita por Andrea Ciaffone 8 As percepções contidas neste parágrafo e nos parágrafos precedentes são fruto de observação
participativa realizada durante 5 anos (2001-2006) em um trabalho voluntário com aproximadamente 120 adolescentes da cidade de São José dos Campos - SP. Na reunião destas experiências de campo foi possível extrair as inferências citadas. Alguns dados que serão apresentados no desenvolvimento do capítulo corroboram para as informações aqui transmitidas. A escassez de análises aprofundadas sobre o relacionamento da Geração Y com o mundo virtual exige inferências a partir de observação participativa.
63
dia. Nízia Villaça demonstra esta particularidade social do início de século
citando frases de uma revista de tendências de jóias. Nas palavras da revista:
"Fica cada vez mais claro, e sem culpas, compreender,
principalmente depois do fim das utopias dos projetos sociais de
bem estar coletivo, a existência dos sonhos e dos desejos dos
indivíduos. Desejos que possuem significados específicos para
cada um de nós, indivíduos pós-modernos, curtindo a solidão com
que construímos nossos projetos pessoais. (...) O que me interessa
já não é a felicidade de todos os homens, é a felicidade de cada
um" (SIQUEIRA, MACHADO, VIAN, in: VILLAÇA, 2003:4).
Na união destes ingredientes é dificílimo pensar as juventudes separando-
as das mídias e do consumo. Martin Barbero (1999) discorre sobre o jovem do
século XXI como sendo um ator de ritmo acelerado que convive nos não-lugares
midiáticos, habitante de uma nova territorialização espacial. Penetrar nesse
território desterritorializado e nesses lugares não-lugares para tentar encontrar
pistas do relacionamento dos adolescentes com o mundo, torna-se um desafio
instigante.
3.2 Dados atuais sobre adolescentes e jovens
Atualmente o jovem brasileiro, segundo Lassauce (2004:74), corresponde
a cerca de 20,13% da população do país sendo aproximadamente 17,77 milhões
de jovens de 15 a 19 anos, onde 80% são moradores da área urbana. Rodriguéz
(2005:120) afirma que em 2003 o Brasil foi considerado o 5º país no mundo com
maior representação percentual de jovens e de acordo com dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 1940 ao ano 2000, o número de
jovens de 15 a 24 anos saltou de 8,2 milhões para 34 milhões. Os jovens desta
era convivem em um país marcado por contradições, com má distribuição de
renda e ainda com muita desigualdade social (DE OLIVEIRA, SILVA e
RODRIGUES, 2006:65)
64
Os dados analisados na pesquisa realizada no Brasil pela Unesco em
2004, entitulada “Juventudes Brasileiras” (ABRAMOVAY e CASTRO: 2006),
demonstram que o recorte de 14-18 anos, classe A e B, na faixa do ensino
médio e vestibular, moradores de regiões urbanas possui maior acesso aos
meios de comunicação e às novas tecnologias, sendo automaticamente mais
“bombardeados” com as mensagens ali inscritas, além de saírem mais para
compras, consumo e diversão em shoppings.
3.2.1 Família
No ambiente familiar esses adolescentes encontram uma situação
completamente nova: a maioria dos pais da atualidade tem atitudes e práticas
semelhantes aos filhos, o que para o próprio jovem pode soar estranho. De
acordo com o Dossiê MTV3 (2005:22), 55% da amostra concorda total ou
parcialmente que não é bom que os pais assumam comportamentos e atitudes
iguais aos filhos, como freqüentar a mesma balada, mesmos shows ou usar os
mesmos tipos de roupas. Nas palavras de uma das entrevistadas:
“Minha mãe tem 40 e alguma coisa, mas ela não fala que
tem 40 e alguma coisa e ela vai até para a noite, ela me conta dos
namoradinhos dela, parece que ela é minha amiga, e, às vezes, eu
fico meio assim, não gosto”. (entrevistada sexo feminino, 15 anos,
classe B, Rio de Janeiro. Dossiê MTV3 2005:23).
Para Edgar Morin (1997:153), hoje existem pais mais maternais. De fato a
imagem passada na família é de pais e mães que são “companheiros afetuosos“,
quase iguais aos filhos. Nesse cenário os adolescentes têm que lutar menos com
a família para tornarem-se adultos, mas ao mesmo tempo têm maior dificuldade
em identificarem-se com seus progenitores.
3.2.2 Vida Social
No dia a dia do adolescente, especialmente no caso brasileiro, o apoio
dos amigos ou o pertencimento a grupos é muito importante. A sociabilidade é
um fator forte e o espaço principal para se fazer amigos é o bairro/vizinhança
65
(47%), seguido pela escola (40%), o que aponta a importância do pedaço para a
convivência. (ABRAMO, 2004:64,208).
A sociabilidade não é somente feita entre os grupos escolares e
vizinhança, mas também através dos recursos crescentes de comunicação à
disposição, como mensagens instantâneas, telefones celulares e mensagens em
forma de texto. O contato dos adolescentes cresceu de maneira exponencial a
partir das novas tecnologias e aumentou a importância das amizades no dia a
dia.
Segundo dados apresentados por Mc Dougal e Chantrey em 2004, dentre
os entrevistados brasileiros, 89% consideram importante o pertencimento em
grupo, sendo que na China os números apontam 81%, e a menor porcentagem
ficou para a Alemanha, com 71%. A questão comunitária é relevante e os altos
índices desta pesquisa mostram o adolescente brasileiro pronto para entrar em
uma “turma”.
O conceito de belonging e de adesão de Bauman (2001) é evidente em
nossas juventudes, onde os membros têm uma história coletiva de construção da
identidade.
3.2.3 Lazer
Fator de primeira ordem para o adolescente, o lazer vem dividindo espaço
com instituições sociais clássicas como família e escola no processo de
formação das identidades (ABRAMOVAY e CASTRO 2006:533).
Para Bremer, Dayrell e Carrano (2004:176) o lazer é o tempo sociológico
no qual a liberdade de escolha é um elemento preponderante e se constitui
nessa fase como campo potencial de construção do “eu”.
As atividades de lazer e entretenimento ocupam parte considerável do
tempo livre dos jovens. Inquiridos sobre o que mais fazem nos finais de semana,
as respostas revelam a importância que conferem à diversão. 78% faz atividades
fora de casa e destes, 45% se dedica a atividades de lazer e entretenimento.
Apenas 4% dos jovens ocupa seu tempo livre com alguma atividade cultural,
aparecendo a leitura e o cinema com 1%.
66
Na faixa de renda acima de dez salários mínimos, encontra-se a maior
incidência de jovens que revelaram interesse em ampliar a realização de
atividades de lazer e entretenimento (51%) enquanto na faixa de renda familiar
de até cinco salários mínimos, este número fique em torno de 40%. (ABRAMO,
2004:54, 156, 186)
3.2.4 Preocupações juvenis
Não é só de lazer que vive o adolescente brasileiro, ele também tem
preocupações em relação à vida e entende que possui direitos que não podem
ser violados.
Questionados sobre os direitos mais importantes, 50% aponta os direitos
individuais como imprescindíveis, sendo que o mais citado é a liberdade, com
25%, seguido da igualdade com 14%. Os direitos políticos foram citados por
apenas 5%. (ABRAMO, 2004:68).
Em outra pesquisa foi inquirido, em grupos de discussão criados em
diversas capitais brasileiras, a respeito das preocupações que afligem a
juventude. Os resultados foram os seguintes:
67
Tabela 1: Preocupação dos jovens por região
In: Relatório Global Juventude Brasileira e Democracia: participação, esferas e políticas públicas, 2006:18.
É visível na tabela acima que as questões relacionadas à violência,
segurança e criminalidade são a tônica das apreensões juvenis. Eles possuem
consciência dos riscos a que se encontram expostos, onde a liberdade é
ameaçada pela violência das ruas. Mesmo no mundo virtual, eles estão expostos
à violência e invasão de privacidade, como visto em vários casos de fraudes no
Orkut ou mesmo na quantidade de vírus ocorridas no meio digital.
Os fatores emprego, oportunidades e educação demonstram que a
insegurança em relação ao futuro e ao próprio sustento existe, principalmente
por encontrarem um mercado de trabalho extremamente competitivo.
O pouco interesse em relação a assuntos sociais, em especial a questões
como Sociedade/Valores/Brasil, Política ou mesmo Miséria e Desigualdade
Social caracterizam em certo nível o comportamento individualista da juventude
deste início de século.
68
Se a violência e o futuro pessoal preocupa os jovens, isso não acontece
na mesma proporção nos assuntos relacionados às drogas e à sexualidade. Aqui
nos ateremos especialmente à questão da sexualidade que interfere direta ou
indiretamente na aparência e está ligada à Moda.
3.2.5 Sexualidade
Nessa coorte, os relacionamentos são cada vez mais feéricos e
descartáveis, poderíamos até chamá-los de turma “Mc Relacionamento”. Em
uma noite podem beijar e se relacionar com diversas pessoas, constando entre
eles até mesmo disputas e apostas para verificar quem mais beijou pessoas
diferentes numa mesma noite.
Na amostra do Dossiê MTV3, 76% dos entrevistados já beijaram na boca
uma pessoa que conheceram no mesmo dia e 53% já ficou com mais de uma
pessoa na mesma noite. 11% da amostra afirmam já ter beijado na boca uma
pessoa do mesmo sexo.
“Eu acho que é um reflexo da sociedade, você já tem tanta
pressão que às vezes a pessoa não quer assumir mais um
compromisso. Eu acho que também banalizou muito, está tudo
muito bagunçado. Eu acho que a questão do ficar, você acaba
usando a pessoa como um objeto para satisfazer seu desejo
naquele momento, mas você não quer nem saber da pessoa, você
não tem contato maior com a pessoa. É até um isolamento
disfarçado, porque você tem o contato, mas não se envolve. Isso
deixa as pessoas mais egoístas, mais fechadas em si.”
(entrevistada sexo feminino, 20 anos, classe B, Brasília.
Dossiê MTV3 2005:46).
Para alcançar maior êxito no número de “ficantes” em uma noite, a
aparência é um trunfo de primeira ordem. Roupas, maquiagem, acessórios ou
mesmo um comportamento corporal insinuante tendem geralmente a melhores
resultados. A Moda como estímulo sexual trabalha constantemente nestes
casos, é uma forte aliada em prol da sexualidade emergente.
69
Quando o assunto é relação sexual, a comunicação sobre a camisinha e
suas capacidades preventivas - tanto de natalidade como de doenças
sexualmente transmissíveis - está avançada se comparada a 10/15 anos atrás,
quando ainda engatinhava-se na publicidade do sexo seguro. Esta
conscientização aumentou o sentimento de segurança nas relações sexuais e as
libertou de culpa. A informação e a possibilidade de experimentação nunca
estiveram tão presentes nas vidas dos adolescentes, aumentando o
descompromisso das relações. A média de idade da primeira relação é 16 anos,
sendo 22% o índice dos que perderam a virgindade antes dos 14 anos.
(2005:48)
Outro comportamento sexual intensificado nessa coorte é a descoberta,
ainda na adolescência, da homossexualidade, que antigamente aparecia com
maior timidez nessa idade. A mídia tem dado um tratamento diferenciado aos
assuntos ligados a homossexualidade, e partir de então, a sociedade passou a
ter maior aceitação em relação às diferenças sexuais.
“Uma coisa que está acontecendo é que o homossexualismo
está virando moda. (...) Também tem a coisa de você nunca ter
pensado em ser gay, mas aí você começa a usar drogas e começa
a fazer troca de casais e gosta. Então, o que está acontecendo
muito é que está abrindo muito para experimentar. Antigamente
você podia até ter vontade, mas você não chegava a fazer.”
(entrevistada sexo feminino, 22 a 25 anos, classe B,
Salvador. Dossiê MTV3 2005:48).
3.2.6 Auto-análise
Além das percepções acima citadas, foi questionado como os próprios
adolescentes se definem enquanto geração: sua auto-análise. Os resultados
corroboram para a definição de uma coorte individualista, consumista e muito
vaidosa. A seguir a tabela com as principais palavras escolhidas pelos jovens.
70
Tabela 2: Palavras escolhidas pelos jovens para definir a geração
In: Dossiê Universo Jovem MTV3, 2005:14
Na opinião dos próprios entrevistados, sua geração pode ser definida
principalmente pelo trinômio Vaidosa/Consumista/Individualista, características
que permitem espaço privilegiado para a Moda.
De acordo com o France Presse de Washington9, em publicação do portal
Folha On Line de janeiro de 2007, pelo menos 81% dos jovens pertencentes à
Geração Y desejam ficar ricos e 51% ter fama, enquanto na Geração X o desejo
de ser famoso só atingia 29% dos pesquisados, ficando atrás da vontade de
ajudar as pessoas, com 36%.
9 Matéria publicada em 11/01/2007. Link:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u67480.shtml
71
A riqueza almejada pelos membros dessa coorte permite o consumo e a
satisfação dos desejos e sonhos individuais, enquanto a fama está relacionada à
vaidade e à aparência pessoal.
Os Y gostam de se expor visualmente e para isso precisam consumir
objetos-fetiche que os tornem diferenciados, para eles a Moda é essencial.
Dados de pesquisas, feitas pelo Instituto Ipsos-Marplan, apontam que cerca de
40% do público jovem tem o hábito de fazer compras em shopping, onde se
concentram a maioria das lojas de marcas famosas. Segundo o instituto
Gismarket, os jovens de 16 a 19 anos freqüentam os centros de compra pelo
menos duas vezes por semana, gastando em média R$ 45 por saída. Dados da
Abravest (Associação Brasileira de Vestuário) demonstram que os adolescentes
são responsáveis por 24% do consumo do setor de vestimentas, atrás apenas
das mulheres, com 58%.
O relacionamento do adolescente com a Moda e com a aparência em
geral sempre foi notório, por se tratar de uma fase de auto-afirmação e busca de
identidade. Nas palavras de Gilles Lipovetsky:
“O impulso de uma cultura jovem no decorrer dos anos 1950
e 1960 acelerou a difusão dos valores hedonistas, contribuiu para
dar uma nova fisionomia à reivindicação individualista. Instalou-se
uma cultura que exibe o não-conformismo, que exalta valores de
expressão individual, de descontração, de humor e de
espontaneidade livre”. (LIPOVETSKY, 1999:120).
Atualmente esses valores de expressão pessoal vão além da notoriedade.
Enxerga-se uma estima imperativa pela Moda e aparência, conseqüentemente
há a probabilidade do aumento de importância das marcas do segmento.
3.3 O adolescente e seu relacionamento com as marcas de Moda
3.3.1 O corpo adolescente
Enquanto processo biológico e social (D’ÁVILA, 2005:1), a juventude
encontra na roupa um elemento de valorização, ou mesmo de disfarce, para seu
72
corpo em transformação, bem como uma carteira de identidade que facilita a
aceitação nos grupos juvenis.
Especificamente o corpo é o território que visivelmente marca a iniciação
da adolescência, com a mudança de formas e com a miríade de transformações
hormonais que inauguram este período da vida. Nas palavras de Nadja Gomes,
para o adolescente “o corpo é a mensagem” (2003:3).
Esse corpo-mensagem, de uma hora para outra, já não é mais
reconhecido como há pouco tempo atrás, tudo está diferente, nas garotas
crescem os seios, afina-se a cintura, precisa-se lidar com a menstruação e
tantas outras responsabilidades. Do lado dos garotos surge a barba, a mudança
estranha da voz, as espinhas, os pés passam a calçar números acima do 40, a
altura passa rapidamente de 1,50 a 1,70 e assim por diante.
Maria Rita Kehl (2004:94), ao discorrer sobre o corpo adolescente, cita
Jean-Jacques Rassial (1999), que reforça o fato do adolescente se encontrar, de
uma hora para outra, excedido pelo seu corpo, sem base de apoio para constituir
uma atitude, com postura e personalidade que, ao mesmo tempo, acompanhem
seu crescimento físico.
Além das tantas mutações corporais e a dificuldade de lidar com a nova
imagem, o reconhecimento da sexualidade torna-se mais evidente e epidérmico.
Em um contexto banhado pela descoberta sexual a roupa tem um papel decisivo.
Para Nízia Villaça (2002:99) surge, a partir dos adolescentes, uma espécie de
“moda prótese”, onde a Moda atua como extensão do corpo, afim de trazer uma
maior expressividade corporal, para também muitas vezes criar maior evidência
sexual.
Questões como sexualidade, segurança e identificação estão presentes
na dimensão vestimentária, onde os adolescentes se sentem emocionalmente
“rejeitados e impopulares se não estão com a roupa certa” (KLEIN, 2004:377).
Para assegurarem que estão vestidos em conformidade com o que é mais
cool, causando boa impressão, os adolescentes gastam muito com roupas e
necessariamente com Moda. Esses indivíduos, segundo Kehl (2004), tentam se
valer de objetos fetiche, como sutiãs, blusas agarradas ou tênis de tamanho
73
maior ou menor que os próprios pés, sustentando como apêndice do corpo o
crescimento que eles reivindicam.
A Moda torna-se a máscara do adolescente, com objetos transacionais
que ajudam-no a reinscrever seu próprio corpo.
3.3.2 Moda na visão juvenil
Os guarda-roupas dos adolescentes possuem pilhas e pilhas de roupas
para cada ocasião, que com grande rapidez são encostadas, por não
condizerem mais com a atitude pretendida. De acordo com Maffesoli (apud
CIDREIRA, 2005:129), o fato dos adolescentes latinos desejarem intensamente
o “estar-junto” faz com que eles abandonem certos objetos-signos, ou mesmo
troquem seus star-signos com grande rapidez, para poderem se encaixar na
nova ordem do grupo.
Pela mudança constante dos signos do vestuário adolescente, decodificar
exatamente a linguagem das roupas juvenis é muito difícil. Seus membros
transitam por diversos estilos ao mesmo tempo, cada hora adotam um
determinado padrão de estética.
Para eles, Moda é contágio instantâneo e abandono feérico. No intuito de
construir um estilo de vestir, espelham-se não só na Moda tradicionalmente
regida por tendências, na verdade chegam a evitar este tipo de adoção rígida de
Moda, procurando reproduzir imagens e atitudes encontradas em territórios de
expressão transversais, como a música, a cultura urbana das ruas, o
underground e os esportes radicais.
Seu modo de vestir muitas vezes é imprevisível e flexível, misturam
materiais, desejam o choque e buscam a desconstrução do padrão estético.
Usam roupas do avesso, lingeries à mostra e criam formas de vestir
inimagináveis.
“Hoje a moda é como um caleidoscópio no qual os looks dos
jovens, impossíveis de classificar, se sucedem a um ritmo
alucinante, trazendo um sentimento de vertigem e irrealidade”.
(VINCENT-RICARD, 1996:155)
74
3.3.3 Marcas de Moda Jovem
Para a faixa etária dos 14 aos 18 anos, enquanto a maneira de vestir é
mutante, a importância das marcas é perene, principalmente quando as mesmas
mantêm um padrão estético moderno e condizente com o estilo de vida
almejado. Num momento de oscilações emocionais, os adolescentes encontram
nas marcas de Moda alguma segurança, um porto seguro para sua auto-
afirmação.
Em uma pesquisa realizada pelos alunos do Senac São José dos Campos
em dezembro de 200510, com amostra de aproximadamente 200 jovens
estudantes do Ensino Médio da região, foi constatado que entre os adolescentes,
o estilo de roupa mais almejado é relacionado às atividades esportivas como
Surf e Skate, bem como as roupas que referenciam o mundo urbano, street e da
música, como é o caso do gosto pelo Emocore. Para cada um dos estilos
citados, foram catalogadas marcas de Moda fortes, que exprimem atitude e, por
este motivo, permanecem no imaginário dos adolescentes como um ideal de
Moda.
“As marcas realmente fortes tornam-se uma parte
significativa da vida do cliente e do conceito que ele tem de si
mesmo.” (AAKER, 1998:277)
Ao serem questionados sobre as melhores marcas de Moda, os
entrevistados tinham na ponta da língua suas preferências, bem como o motivo
por desejarem vestir determinadas marcas, ligadas a um estilo de vida
específico.
Cynthia Andersen Sarti (2004:124) comenta que, nas sociedades tribais
ou tradicionais, os ritos de passagem cumpriam a função de marcar o corpo por
meio de cicatrizes, fazendo destes rituais verdadeiras provas de coragem e
força, habilitando o proponente a ingressar legitimamente no mundo. O que
vemos na sociedade contemporânea, em especial na urbana e metropolitana,
10
Pesquisa realizada como exigência parcial de conclusão da matéria “Marketing de Moda” do curso Moda e Estilo do ano de 2005.
75
são novas cicatrizes que marcam o ingresso no mundo, não mais sacrificiais
como nas sociedades tribais, porém ainda emblemáticas: as marcas de Moda,
que de uma nova forma marcam e demarcam os corpos, distinguem e definem
muitas atitudes adolescentes.
Para Heilbrunn (2004:25), a marca funciona como fetiche sacralizado, “o
suporte de um movimento de projeções e introjeções permanentes, de emoções
e representações”.
Naomi Klein comenta que vivemos em um mundo cercado por “gente de
grife, em uma época que as pessoas são marcas e as marcas são cultura”
(2004:83). Vemos, tanto na esfera pública quanto na vida privada, o crescente
apego às questões identitárias das marcas e seu grande valor de
reconhecimento.
No caso específico dos Y, esse reconhecimento é ainda mais evidente.
Conforme Holland (1998:11) essa geração é mais preocupada com o futuro, por
este ser cada vez mais incerto, e tem a necessidade de pertencimento para
sentir-se mais segura. Para a autora, a obrigação de fazer parte, numa busca
incessante pelo “belonging,” torna estes adolescentes verdadeiros outdoors
animados das marcas.
No contexto da Moda Jovem, existe uma miríade de possibilidades de
marcas, mais ou menos conceituadas, que lutam no mercado para atingir os
corações de consumidores fervorosos, que enxergam no consumo um caminho
para a aceitação. Para alcançar o êxito, capturando o espírito de individualidade
e modernidade, muitas marcas contratam consultores jovens que podem
expressar e entender o que se passa no universo adolescente. Estes consultores
são profissionais que entendem o frisson da faixa etária e fazem com que as
marcas acertem em suas investidas de marketing.
Mark Tungate (2005:87), explana sobre uma dessas profissionais: a jovem
Claudine Ben-Zenou. O trabalho desta garota, na casa dos 20 anos, é transmitir
para as grandes marcas e especialmente para a MTV tudo o que acontece no
mundo underground, quais os melhores artistas, tendências, lançamentos, entre
outras percepções relevantes. Com o auxílio de sua consultoria, muitas marcas
alcançam êxito em ações direcionadas para seus públicos.
76
Trabalhar com Moda Jovem não é uma tarefa simples, segundo Keith
Niedermeier11, o mercado de Moda para adolescentes “é incrivelmente lucrativo,
mas exige muita fibra. Não há setor de marketing cujas pesquisas tenham vida
mais curta do que esse.”
Para alcançar notoriedade, uma marca de Moda Jovem precisa de muita
afinidade entre os departamentos de marketing e criação/desenvolvimento de
coleção, sendo praticamente impossível dissociar o trabalho destes grupos
profissionais, principalmente por ser um segmento onde a forma das roupas
costuma, em grande parte, girar em torno do trinômio Jeans – Camisetas –
Jaquetas, que a primeira vista parecem peças simples de se confeccionar ou
criar, mas que pela simplicidade exigem muito trabalho de marca, em prol da
distinção.
No momento da criação das peças, é mandatório primeiramente catalizar
o que está acontecendo ao redor e enxergar as minúcias do comportamento
adolescente. O universo da marca deve estar coberto por uma atmosfera e um
espírito jovem, numa espécie de construção do mito moderno adolescente.
No desenvolvimento das estratégias de comunicação de uma marca de
Moda, é necessário reconhecer que estes jovens de 14/15 a 17/18 anos
apreendem a informação não só pela mídia tradicional, mas por múltiplos
contatos constantes e intermináveis, dispersos no universo informacional
disponível nos diversos canais de comunicação.
Para encontrar um caminho de entendimento da eficácia comunicacional
das marcas de Moda Jovem, utilizaremos o conceito da Experiência Colateral de
Charles Sanders Peirce.
11
Texto disponível em: http://www.wharton.universia.net/index.cfm?fa=viewArticle&id=1091&language=portuguese
78
Capítulo 4
A Teoria Peirceana aplicada à Moda Comercial
4.1 Por que aplicar a Teoria Peirceana num estudo de Moda?
Muitas são as maneiras de ler um determinado fenômeno de forma
científica. Podemos escolher, dentre os diversos enfoques, aquele que trará
contribuições pertinentes ao Objeto de Pesquisa, chegando a resultados ou
mesmo a novas indagações sobre o tema. No caminho em busca do enfoque
mais adequado para a leitura da Moda, em especial no que tange à marca de
Moda, a Semiótica Peirceana mostrou-se um método de grande contribuição, por
ter sido arquitetada a partir de uma ciência formal, ou um “organon” e constituída
com a densidade teórica exigida pelas ciências formais.
A semiótica Peirceana é parte de um sistema filosófico, cientificamente
concebido que a habilita a funcionar como um método heurístico capaz de dar
conta da sofisticação da análise da Moda e suas relações com a marca. A base
fundamental do pensamento Peirceano está na fenomenologia de concepção
não racionalista, também chamada de Faneroscopia, que permite postular
formas ou propriedades universais dos fenômenos, numa trajetória que exige
atenção aos acontecimentos que surgem e neles encontrar a representação ou
signo.
“Todo conhecimento, desde a adivinhação mais espontânea
até a certeza mais demonstrativa, está fundamentado em
evidências; ele é suportado por dados, credenciais, garantias e
premissas. Os dados não são em si mesmos evidências para
aquilo que eles atestam; eles devem ser interpretados para ser
evidências, para dar alguma credibilidade àquilo que eles
suportam.” (SAVAN, 1980: 255 apud SANTAELLA, 2005:31)
É na representação e na interpretabilidade dos fenômenos que a
Semiótica encontra seu campo de estudo, em especial na vasta e interminável
79
ação dos signos, no seu funcionamento e na atividade interpretativa ou
inferencial a partir destes mesmos signos. Para esta ação, Peirce deu o nome de
Semiose.
A Semiótica Peirceana constitui-se como uma ferramenta teórica que lida
com o potencial comunicativo e por este motivo tem grande aplicabilidade no
estudo das ciências humanas, como defende Liszka (1996). Na leitura das
relações mercadológicas, a Semiótica tem um papel crucial, inclusive na Moda e
nos aspectos relacionados ao consumo. Ao partirmos da premissa de que Moda
é, além de outras coisas, um ato de Comunicação, os aspectos simbólicos deste
universo são valiosos, bem como o processo de estabelecimento de sentidos
que auxiliam no entendimento do processo de consumo de uma marca de Moda.
“A semiótica com aplicações mercadológicas pode ajudar a
desmontar, para entender, a cadeia de significação colocada em
marcha por uma (...) determinada marca, permitindo analisar sua
pertinência e seu potencial comunicativo” (RODRIGUEZ, 2001: 87)
A completude da teoria Peirceana para aplicação em processos
comunicacionais mostra-se ainda mais evidente quando Peirce desenvolve, no
início do século XX, o conceito da Experiência Colateral nos processos de
Semiose, conceito este que dá conta da familiaridade que o intérprete de um
signo tem com todo o sistema de informações do contexto de inserção do signo,
e, por isso mesmo, apura a eficácia de qualquer comunicação.
4.2 Teoria Geral dos Signos: Fundamento, Objeto e Interpretante
Antes de estabelecermos uma visão da Semiótica na Moda, é necessário
trazer ao conhecimento do leitor um breve panorama da Teoria Geral dos
Signos, em especial a relação entre Fundamento, Objeto, Interpretante, e a
localização da Experiência Colateral nesta relação. O intuito é apresentar, de
forma breve, os pontos que Peirce postulou em sua Semiótica.
O Signo é o elemento crucial de toda a Teoria Peirceana, desde o início
de sua carreira, na defesa de sua tese anticartesiana, de que todo pensamento
80
se dá em signos. A partir desta concepção do pensamento e do próprio
conhecimento por meio de signos, Peirce arquitetou seu sistema semiótico
triádico, suportado pelos três elementos, a saber: Fundamento, Objeto e
Interpretante, com relações de determinação, em um movimento constante de
geração e auto-geração.
De forma geral, Peirce afirma que:
“O signo é um veículo que comunica à mente algo do
exterior. Aquilo em cujo lugar o signo está é denominado seu
objeto; aquilo que o signo transmite, seu significado (meaning); e a
idéia que ele provoca, seu interpretante.” (PEIRCE, 1.339 apud
SANTAELLA, 2000:28)
Para explicar em linhas gerais a questão da determinação na relação
triádica de uma semiose, Peirce cria a seguinte definição:
“Signo é qualquer coisa que, de um lado, é assim
determinada por um objeto e, de outro, assim determina uma idéia
na mente de uma pessoa (interpretante) é mediatamente
determinada por aquele objeto. Um signo, assim, tem uma relação
triádica com seu Objeto e com seu interpretante”. (PEIRCE 8.343,
apud SANTAELLA, 2000:12)
A seguir, explanaremos em breves palavras os principais pontos de cada
um dos elementos da semiose, com o intuito de esclarecer o papel e a
importância de cada termo.
4.2.1 Fundamento (Ground)
O fundamento (Ground), que nos primeiros escritos de Peirce também
fora chamado de Representamen, é a propriedade que o habilita a funcionar
como signo, ao apresentar, indicar ou representar alguma coisa a um possível
intérprete. Essas propriedades são de três ordens: quali-signo (1.1) quando o
fundamento do signo se constitui tão só e apenas de uma qualidade; sin-signo
(1.2) quando o fundamento se apresenta como um existente e legi-signo (1.3)
em que o fundamento é uma lei.
81
O fundamento pode se diferenciar conforme o contexto (common ground)
em que o signo se apresenta, ou seja, é possível selecionar a forma como o
fundamento se apresenta. Por exemplo, em um dado signo, podemos perceber
apenas o seu fundamento de lei e deixar de dar atenção ao seu fundamento
como quali-signo. As palavras que estão aqui inscritas, via de regra, são
apreendidas como leis no sistema de leis da língua portuguesa, sem que
atentemos para o quali-signo, quer dizer, o tipo gráfico, o tamanho desse tipo,
sua forma etc. em que essas palavras estão inscritas.
4.2.2 Objeto
Para pensar no Objeto é primordial entender que a concepção Peirceana
de Objeto não necessariamente significa matéria ou “coisa”, mas um conceito
mais amplo que extrai seu valor da posição lógica que ele ocupa na relação
triádica, como algo que é representado pelo signo (SANTAELLA, 2005:45).
O vínculo com o Objeto sempre permanece em toda semiose, porque é
dele que advém a determinação do signo que gera o interpretante. Pode-se dizer
que o Objeto seria a fonte da semiose.
Por ser um elemento importantíssimo, Peirce teve o cuidado de
apresentá-lo em dois conceitos distintos que demonstram a diferença no nível de
apreensão do Objeto.
Objeto Imediato
No seu nível mais próximo, aquele que primeiramente aparece, o objeto é
chamado de Imediato. É o objeto interno ao signo, isto é, o modo como o signo
representa ou indica ou se assemelha, sugere e evoca o objeto que está fora
dele. Deve haver algum tipo de correspondência do signo com aquilo que ele
apresenta, designa ou representa. Essa correspondência, que liga o signo ao
objeto que tem uma realidade distinta dele, é o seu objeto imediato. Esse algo
fora do signo, a que o objeto imediato se reporta, é o objeto dinâmico.
82
“O Objeto imediato depende (...) da natureza do fundamento
do signo, pois é o fundamento que vai determinar o modo como o
signo pode se referir ou se aplicar ao objeto dinâmico que está fora
dele”. (SANTAELLA, 2004:34)
Objeto Dinâmico
O Objeto Dinâmico é mediado pelo Objeto Imediato e, de um modo geral,
pode ser caracterizado como o contexto dinâmico a que o signo se aplica. Em
outras palavras, o Objeto Dinâmico é o “real”, em sua complexidade e, por isso
mesmo, apresenta uma multiplicidade de informações. Para Peirce este real é
amplo e praticamente inatingível em sua totalidade, por isso necessita de uma
série de mediações sígnicas que um único o Signo em si não é capaz de exaurir.
O fato é que, quanto mais nos aproximamos do Objeto Dinâmico, mais
mediações vão sendo feitas e esta amplitude nos leva a uma regressão infinita.
Peirce não sugere, em momento algum, que não podemos ter contato
com a realidade ou com o Objeto Dinâmico, mas que só é alcançável, via signo,
sob determinados aspectos, de forma incompleta. Chegar até uma fonte
originária última é certamente impossível, pois sempre terá um ponto da cadeia
que nos faltará. Uma maior proximidade só é possível por meio de “contatos”
consecutivos, em cada experiência particular e diversa.
No que tange aos tipos de relações que o signo pode ter com o Objeto,
Peirce distingue três formas, sendo respectivamente (1) Ícone, quando o
fundamento do signo é um quali-signo, em uma relação de primeiridade,
portanto, (2) Índice, quando o fundamento é um existente, em uma relação de
secundidade e (3) Símbolo, no caso do fundamento ser um legi-signo, em uma
relação de terceiridade.
4.2.3 Interpretante
O interpretante de um signo pode ser definido como o processo que leva o
signo a ser interpretado por uma mente interpretadora.
83
A significação, ou o efeito pretendido do signo só se dá quando o signo
encontra um intérprete. É na relação Fundamento - Interpretante que reside o
significado/sentido e não na relação diádica entre Fundamento e Objeto
simplesmente. A mediação do Interpretante é sequencial e possui níveis de
interpretação, passando também pelos conceitos pragmáticos das categorias de
primeiro, segundo e terceiro.
O Interpretante, que também é uma espécie de signo, é produzido como
um efeito na mente de um intérprete, efeito que só é possível porque o
fundamento carrega a determinação do objeto e, por isso o representa.
Da mesma forma que o conceito de Objeto, para Peirce, não é matéria
física e sim algo mais abrangente, o conceito de Interpretante não é uma
questão de intérprete nem mesmo de interpretação simplesmente, é uma função
mais complexa, um processo evolutivo e, nas palavras de Santaella é “(...)
coletivo, não se restringindo a humores particulares” (2000:9) ainda que o
intérprete tenha encontre espaço no segundo nível do interpretante.
O complexo sistema de interpretantes de Peirce possui três grandes
divisões, a saber:
Interpretante Imediato
O interpretante imediato é o interpretante interno ao signo. É o grau de
interpretabilidade que o signo tem, antes mesmo que a interpretação se realize
quando o signo encontra uma mente interpretadora. Sua função é importante
porque demonstra a potencialidade de significação que todo signo possui, sua
objetividade própria, tenha ou não alguém que a interprete. É a força de
significação interna a qualquer semiose.
Interpretante Dinâmico
O interpretante Dinâmico é o segundo nível de interpretante, trata do
efeito realmente produzido em uma mente, o fato empírico, atual, ato singular de
interpretação realizado por cada intérprete de uma semiose específica, numa
84
dada ocasião e num dado estágio de consideração do signo. “Em cada mente
interpretadora o signo irá produzir um efeito relativamente distinto.”
(SANTAELLA, 2005: 48). São três os tipos de Interpretante Dinâmico:
1. Emocional - qualidade de sentimento provocada, o primeiro efeito
produzido;
2. Energético - esforço, seja de qualquer grau - psicológico, físico ou de
outra dimensão - posterior ao Emocional;
3. Lógico – pensamento, uma regra de interpretação, um hábito.
A regra ou hábito no Interpretante Lógico pode ser vista nestas palavras:
“é um padrão de ações que, sob certas condições
apropriadas, será repetido indefinidamente no futuro [...]. As
ocorrências da regra ou hábito se dão em um conjunto particular de
ações dentro de um período de tempo limitado. Estes conjuntos de
ações particulares são interpretantes energéticos; mas, uma vez
que eles exemplificam um hábito indefinidamente repetível, eles
também são réplicas de interpretantes lógicos. Note-se que,
enquanto os interpretantes emocional e energético têm uma
terminação finita, o interpretante lógico é sempre potencialmente
repetível sem terminação.” (SAVAN 1976: 43-4 apud SANTAELLA,
2004(b):82).
Interpretante Final
O interpretante final (nome advindo de finalidade) é a significância, o efeito
generalizado, derradeiro e último, considerando-se a possibilidade da semiose
ser levada ao extremo. É a possibilidade de um signo produzir todos os
interpretantes dinâmicos de modo total e completo no desenvolvimento de
interpretantes. “Uma vez que isso não é possível, o interpretante final está
sempre em progresso, num processo evolutivo infinito.” (SANTAELLA, 2005:49).
Santaella ainda esclarece que o Interpretante Final deve ser considerado “como
um limite ideal, aproximável, mas inatingível, para o qual os interpretantes
dinâmicos tendem” (2000:74).
85
A característica inalcançável do interpretante final em sua totalidade é
paralela à característica inalcançável do Objeto Dinâmico. Assim, é possível
dizer que nunca chegaremos à realidade derradeira e muito menos vamos saber
todos os significados de forma completa em qualquer semiose, por sua
característica de regressão e evolução infinitas.
Para sintetizar os elementos acima descritos, segue um gráfico que
esquematiza a seguinte assertiva:
“O Objeto dinâmico determina o Objeto Imediato, que
determina o signo nele mesmo, que determina o interpretante
imediato, que determina o interpretante dinâmico, que determina o
interpretante final”. (SANTAELLA, 2000:96)
Figura 1: Funcionamento e Determinações de uma Semiose
Fonte: Figura esquemática baseada em gráfico apresentado por Lúcia Santaella no Curso “Semiótica Peirceana” PUC-SP em 07/11/2005
Na figura, além das determinações designadas pelas direções das setas,
também é possível verificar com clareza a localização do Objeto Dinâmico e do
Interpretante Dinâmico como estando fora do signo e que o interpretante final,
além de estar fora do Signo, também é um ponto mais afastado de alcance.
A limitação da ação do signo é visível, visto que o campo de referência é
muito mais vasto e complexo do que um signo em si pode representar. O acesso
ao Objeto Dinâmico, por parte do Interpretante Dinâmico não é completo dentro
do signo em si e deve ser mediado além do Objeto Imediato, deve ter
86
informações extras que estão fora do sistema interno do signo. Neste ponto - na
percepção da incompletude do signo e no entendimento da necessidade de “algo
mais” para complementar o processo de uma semiose – Peirce desenvolve a
teoria da Experiência Colateral.
4.3 A Experiência Colateral segundo Charles Sanders Peirce
Como vimos anteriormente, o signo não pode representar a totalidade do
Objeto, e uma das maneiras de se conhecer o Objeto Dinâmico é através de
informações fora do signo, via contexto: a Experiência Colateral.
A noção da Experiência Colateral para Peirce não veio em seus primeiros
escritos sobre a Semiótica, e só apareceu no início do século XX, em especial
quando Peirce cunhou o MS 318, considerado um manuscrito multifacetado, de
alta complexidade e que faz parte dos escritos de sua semiótica tardia, também
chamada de segunda semiótica ou later semiotics: período em que Peirce sentiu
a necessidade de deixar a noção do Objeto mais fina e apurada, conforme cita
Santaella (2004:23).
Para exemplificar o papel da Experiência Colateral nesta fase, citamos
abaixo algumas passagens escritas pelo filósofo e que são de grande valia:
“Como observação colateral não quero dizer intimidade com
o sistema de signos. O que assim é inferido não é colateral. Pelo
contrário, constitui o pré-requisito para conseguir qualquer idéia
significada pelo signo. Por observação colateral refiro-me à
intimidade prévia com aquilo que o signo denota”. (PEIRCE,
1980:122, parágrafo 179)
“(...) nenhum signo pode ser entendido – ou pelo menos
nenhuma preposição entendida -, a não ser que o intérprete possua
“familiaridade colateral” com o Objeto do Signo”. (PEIRCE,
1980:124, parágrafo 183)
“O Signo só pode representar o Objeto e referir-se a ele.
Não pode propiciar trato ou reconhecimento do Objeto; isso é o que
87
se pretende aqui significar por objeto de um signo, ou seja, que ele
pressupõe uma familiaridade com algo de sorte a veicular alguma
informação adicional concernente a esse algo.” (PEIRCE, 1972:96)
“(...) se houver alguma coisa que veicule informação e,
apesar disso, não tenha absolutamente relação nem faça
referência a algo com o qual a pessoa a quem a informação é
transmitida tenha a menor familiaridade, direta ou indireta, quando
recebe a informação - informação que seria de uma espécie
estranhíssima – o veículo desse tipo de informação, não será,
neste contexto, denominado Signo.” (PEIRCE, 1972:97)
“Deve-se distinguir entre o Objeto Imediato, isto é, o Objeto
representado no signo e o Objeto Real (...) ou antes dinâmico, que
pela própria natureza das coisas, o signo não consegue expressar,
podendo apenas indicar, cabendo ao intérprete descobrí-lo por
Experiência Colateral” (PEIRCE, 1980:125, parágrafo 314 de 14 de
março de 1909)
Para ser ainda mais didático em suas citações a respeito da Experiência
Colateral, Peirce redigiu uma série de exemplos baseados no dia a dia,
exemplos estes que apresentavam a relevância da Experiência Colateral (ou
familiaridade) com o assunto em questão para poder existir uma semiose mais
apurada. Seus exemplos tratam de Napoleão (com a estranha possibilidade do
líder ser uma pessoa letárgica), Hamlet (como louco), uma situação de incêndio,
uma situação em que um professor e um aluno de Francês tratam sobre o
significado da palavra Sol, uma situação de um extra-terrestre ouvindo falar de
Theodore Roosevelt, um batalhão de soldados sob a ordem de comando de seu
superior, entre outros. As citações podem ser encontradas na íntegra em CP
6.318, CP 8.178-179, CP 8.183, CP 8.314, MS318 pp. 37-40, MS 849.9-101 e em
citações de Santaella (2000; 2004; 2005).
Podemos dizer que a Experiência Colateral é um conjunto de contatos
anteriores, por meio de outros signos ou quase-signos, com o objeto do signo em 1 A abreviação CP diz respeito aos Collected Papers e a abreviação MS diz respeito aos
manuscritos de Peirce. Todas as referências de CP e MS citadas foram retiradas do link: http://peircematters.blogspot.com/2005/02/collateral-observation-quotes.html
88
questão: percepções sutis, informações sensoriais particulares, um sentido
instaurado que recorda uma série de atributos que o signo em si não pode
fornecer totalmente. É uma espécie de estado de consciência que nos conecta
com o universo relativo ao signo ali apresentado no momento (PEIRCE
1980:122, parágrafo 178).
Para explanar o papel da Experiência Colateral e de quais elementos da
semiose ela dá conta, segue o gráfico com as devidas considerações.
Figura 2: Representação didática de uma semiose
Fonte: Figura desenvolvida para a dissertação por Mariane T.C. Almeida.
O elemento 1 diz respeito ao fundamento do signo, a cor amarela
representa-o como algo que se apresenta a nós (chama a atenção) e a forma
quadrada caracteriza a objetividade intrínseca, que o signo possui em si. Sua
maneira de apresentação pode ser 1.1 quali-signo, 1.2 sin-signo e 1.3 legi signo.
O elemento 2.1 representa o Objeto Imediato, que está dentro do signo e
por isso está em um ponto de intersecção entre 1 e 2, sua cor é o resultado
desta relação. Por ser uma forma menor, imediata e resoluta do Objeto em si,
seu espaço na forma também é reduzido.
O Objeto Dinâmico 2.2, é o real, em toda a sua amplitude e infinidade.
Sua cor vermelha representa esta característica de existente, “aquilo que insiste”
e sua forma circular caracteriza a amplidão do conceito.
89
O elemento 3.1 é o Interpretante Imediato, interno ao signo e, por este
motivo, é apresentado aqui como intersecção com o fundamento. Sua cor verde
é resultado desta sobreposição e pode também representar o “disparar” do
processo complexo dos interpretantes, por ser o seu primeiro ponto de contato.
O sistema 3.2 (chamado sistema por possuir 3 elementos internos em si)
diz respeito ao Interpretante Dinâmico, onde se localiza o intérprete, e está fora
do fundamento. Seus níveis são: 3.2.1 – Emocional, 3.2.2 – Energético e 3.2.3 –
interpretante lógico. A cor azul, para representar o sistema do Interpretante
Dinâmico, pode caracterizar nossa condição relativamente “passiva” em relação
a uma semiose que se apresenta, principalmente no sentido de retirar de nós um
certo “ego” que nos faz crer piamente que somos nós que criamos todo o sentido
da vida e das coisas. Somos parte do processo, uma parte importante, porém o
sentido pleno está além de nós e é isso que podemos chamar de uma certa
“passividade relativa” do intérprete na semiose.
No ponto do Interpretante Dinâmico de nível Lógico 3.2.3, existe uma
ramificação externa e colateral na cor lilás, denominada no gráfico como (X) que
vai ao encontro do objeto dinâmico sem passar pelo caminho do fundamento (1),
apresentado no momento da semiose. Esse (X) é a Experiência Colateral, a
segunda forma de acesso ao Objeto Dinâmico por parte do Intérprete. A linha por
ela representada tem o formato de conexão exatamente por ser esta sua função:
a de conectar o Interpretante ao Objeto por outra via. Todas as pequenas
ramificações irregulares e multiformes que terminam na linha principal (com os
pequenos quadrados em amarelo) designam os outros contatos e as outras
experiências com o assunto em questão, em outros signos, em outros momentos
e que desencadearam o processo cognitivo colateral que toca o Objeto
Dinâmico. As linhas diagonais e divergentes representam as possibilidades de
experiências de uma vida, que podem ser múltiplas e variadas, porém interferem
em nosso ato de interpretação e enriquecem a própria Experiência Colateral.
A definição da letra (X) para representar a Experiência Colateral no
Gráfico não foi ao acaso. O (X) é uma letra que tem em si, por tradição e regra,
um caráter de indefinição e abertura, representando um fato particular, exclusivo
a cada indivíduo. Não existem duas pessoas no mundo que compartilham
90
exatamente as mesmas experiências e embora, em certos momentos da vida,
tenhamos uma mesma experiência, temos mais centenas ou milhares de
momentos em que as experiências diferem, o X é o múltiplo. A cor lilás pode
representar a carga de experiência de vida que interfere no conhecimento da
realidade do Objeto Dinâmico, sendo o lilás reconhecido como “vida”.
O elemento 3.3 é o ponto do Interpretante Final, que só seria alcançável
se a semiose fosse levada ao extremo, com todos os pontos esclarecidos e
compreendidos, caracterizando a totalidade ideal de interpretante. A cor branca e
o traço preto foram escolhidos para representar a completude que o conceito
carrega (cor preta – a soma de todas as cores – o total - quando estamos lidando
com o sistema de cores pigmento CMYK) e a impossibilidade de atingí-lo em
plenitude (branco – o vazio - no sistema de cores pigmento CMYK)2.
Esse exercício da “Representação Didática da Semiose” foi uma tentativa
de deixar os conceitos mais claros, em especial no que tange ao funcionamento
da Experiência Colateral e seu caráter múltiplo e complexo: resultado de
diversos contatos anteriores que estão armazenados na memória e ajudam na
cognição das relações de comunicação humana.
Para apurar ainda mais a questão da Experiência Colateral, durante o
período de pesquisa bibliográfica, foi possível localizar artigos acadêmicos que
dedicaram suas linhas especialmente para o assunto. A relevância de cada um
destes estudos foi crucial para a aplicação do conceito ao tema proposto,
portanto é interessante citar as principais idéias de cada um destes autores e
suas contribuições para o tema.
David Savan foi um dos tradicionais estudiosos de Peirce que se ateve
especialmente ao conceito da Experiência Colateral, demonstrando a carga
empírica do conceito, por estar ligado completamente ao campo experimental.
Nas palavras de David Savan:
2 CMYK é o sistema de cores utilizado quando estamos lidando com pigmentos e tintas (incluindo
as de impressora). As iniciais significam: C – Cyan, M – Magenta, Y – Yellow, K – Black. Esse sistema é também chamado de aditivo e é através da sobreposição das tintas que conseguimos todas as tonalidades de pigmentos. Existe um outro sistema de cores muito utilizado: RGB (Red, Green and Blue), este sistema é utilizado por monitores, telões e todas as formas de obtenção de cores através de luz.
91
“O objeto é o ambiente empírico de que temos
conhecimento colateral, independentemente da ação do Signo. É o
contexto, as circunstâncias, a situação que é compartilhada pelo
signo e pelo interpretante”. (SAVAN, 1977: 190 apud LINZ, 2003:2).
Em outro texto, Savan (1994:35) ressalta que a experiência é a segunda
forma de assegurar que o interpretante e o signo estejam relacionados com um
mesmo objeto.
Raimo Anttila (1994), ao desenvolver o tema da colateralidade na
linguística genética, refere-se à Experiência Colateral da seguinte forma:
“Collateral consideration, or evidence, experience,
information, or previous acquaintance, or prior information (...) is
again a direct equivalent of the hermeneutic pre-knowledge,
Vorverständnis, the immer schon aspect (Biere 189:116-117
“Kontext und Vorwissen in Perzeption”). Cognitions are inferred
from previous cognitions. “We cannot begin with complete doubt.
We must begin with all the prejudices which we actually have when
we enter upon the study of philosophy”(CP 5.256). Experience is
interpreted experience, or experience context, Umwelt and not just
Umgebung.” 3 (ANTILLA, 1994:38)
No texto, o autor cita palavras em alemão que têm relação com
conhecimento prévio e aspectos já conhecidos (Vorverständnis e immer schon).
Porém são duas outras palavras em alemão, contidas na frase, que têm um
conceito muito relevante para a Experiência Colateral, são elas Umwelt e
Umgebung. Quando Raimo Anttila diz que com a Experiência Colateral temos
Umwelt e não somente Umgebung, significa que, com a Experiência Colateral,
3 Tradução Pessoal: “A consideração Colateral, ou a evidência, a experiência, a informação, ou o
conhecimento precedente, ou a informação prévia (...) são outra vez um equivalente direto do pré-conhecimento na hermenêutica, o conhecimento anterior, o aspecto já sabido (Biere 189:116 – “Pré conhecimento e contexto na percepção” 117). A cognição é inferida por cognições precedentes. “Nós não podemos começar com a dúvida completa. Nós devemos começar com todos os preconceitos que nós temos realmente quando começamos o estudo da filosofia” (PC 5.256). A experiência é experiência interpretada, ou contexto da experiência, Umwelt e não apenas Umgebung.”
92
em determinada semiose, temos o conhecimento mais completo e pleno
(Umwelt, que pode ser traduzido como ambiente pleno) e não apenas os
arredores ou informações superficiais (Umgebung, traduzido como vizinhança,
arredores, cercania).
Já nas palavras de David Pharies (1985), a Experiência Colateral funciona
como uma espécie de “enciclopédia de conhecimento” adquirida sobre
determinado assunto, compilada durante a vida e que traz vários aspectos da
realidade (Objeto Dinâmico) e usada para aprimorar o decifrar dos signos.
Carl Hausmann (2003:31) mostra que os intérpretes, quando são
colocados em uma ação de semiose, trazem consigo suas próprias resistências,
sentimentos ou qualquer sorte de pré-conhecimento – a experiência colateral -
que acaba por ser associada com o sistema semiótico de significância em
questão (com o Fundamento, Objeto e Interpretante) e que este fator prévio
contribui para a interpretação resultante.
No Brasil, Aline Grego Linz foi quem escreveu um artigo com o tema da
Experiência Colateral, aplicando o conceito no telejornalismo. Alguns trechos
deste artigo, apresentado no Intercom de 2003, serão transcritos a seguir:
“(...) não sendo o signo o objeto em si, mas uma
representação, ele acaba sendo marcado, quase sempre, pela
vagueza e pela generalidade que poderá ser reduzida através da
Experiência Colateral. (...) A Experiência Colateral do objeto, assim,
contribuiria para diminuir, em parte, esse grau de generalidade e de
vagueza que acompanha o signo (...) Ela também será garantida
por informações, muitas vezes anteriores ao próprio signo, e
desencadeadoras de novos signos. Aliás, as experiências
colaterais, são elas mesmas também reveladas através de signos.
(...) Fica claro, desse modo, o papel do intérprete na utilização
dessa experiência. Baseado nesse elemento a mais, nesse
conhecimento em relação ao objeto, ele terá mais chances de
evitar interpretações equivocadas.” (LINZ, 2003)
93
Por fim, temos os textos do finlandês Mats Bergman, que tem dedicado
seus estudos à questão da Experiência Colateral, desenvolvendo uma série de
artigos que vão além da definição do conceito e chegam ao ponto filosófico do
termo, mostrando como a Experiência Colateral tem a influência do pragmatismo
Peirceano e é decisiva na semiótica tardia de Peirce.4
Para a finalidade deste estudo é importante ressaltar de maneira breve
alguns pontos cruciais levantados por Bergman.
Em uma sequência diacrônica, no primeiro texto – Reflections on the role
of the Communicative Sign in Semiotic – publicado em 2000, o autor apresenta
uma série de pontos que defendem a semiótica tardia de Peirce (later semiotics)
– que é tida por alguns teóricos e matemáticos como uma redução do projeto
Peirceano da Semiótica, por se relacionar grandemente com as questões
comunicativas. Para rebater tais críticas, o autor apresenta algumas evidências
de como esta semiótica “comunicacional” tem relação com o Pragmatismo
Peirceano e como sua Teoria tem amplitude de aplicação nos fenômenos
comunicativos de forma mais “filosófica” e, por isso mesmo, mais profunda do
que os estudos feitos a partir das ciências aplicadas à comunicação. Nas
palavras de Bergman:
“(…) there would still seem to be room for a philosophical
study of communication, as long as we accept that there are
communicative phenomena among our persistent everyday
experiences; and in my opinion there certainly are. In fact, it may be
one of semeiotic's most important functions to analyse such
communicative and social aspects of our seemingly private
experiences – traits which are so omnipresent that they would
otherwise escape our attention.”5 (BERGMAN, 2000:245)
4 entenda-se tardia como sendo os escritos depois de 1885, que modificaram algumas
percepções em determinado grau da sua primeira lista publicada em 1867. 5 Tradução Pessoal:“(…) Parece que continua existindo um espaço para o estudo filosófico da
comunicação, contanto que nós aceitemos que existem fenômenos comunicativos entre nossas experiências diárias; e em minha opinião há certamente. De fato, se existe uma principal função para a semiótica esta seria para analisar como os aspectos sociais e comunicativos de nossas vidas parecem estar banhados por nossa experiência privada - os traços que estão assim onipresentes e que escapariam de outra maneira de nossa atenção.”
94
Em seu segundo texto analisado - C. S. Peirce on Interpretation and
Collateral Experience – de 2002, Bergman enfatiza que a questão da Experiência
Colateral é relevante em Peirce para interações de comunicação que envolvam
signos, sendo uma forma importante de mediação. Neste texto o autor continua a
desenvolver sua defesa da Segunda Semiótica de Peirce e sua relevância
teórica, por ter sido desenvolvida em um momento de maior maturidade científica
do filósofo, bem como a questão da experiência e da percepção na semiótica
madura, trazendo para o seio da teoria uma sensibilidade maior para a variedade
e complexidade das relações de significação.
“Equipped with a new logical outlook, and a stronger belief
in realism, Peirce begins to emphasise the relevance of other kinds
of signs besides thought-signs, and attempts to break the hermetic
tendency of his earlier theory of signs by calling attention to the role
of non-semiotic experience as a forceful factor in semiosis.”6
(BERGMAN, 2002)
No mesmo texto apresenta-se o papel central do Objeto e seu status
relevante na Segunda Semiótica de Peirce, bem como a necessidade de duas
condições distintas para a interpretação: uma relacionada ao sistema interno do
signo e outra através da Experiência Colateral do Objeto envolvido, mostrando
assim como existe um mundo mais vasto do que o contido no próprio signo,
resultado de contatos com outros signos anteriores.
O último texto do autor, apresentado no IX Encontro Internacional sobre
Pragmatismo da PUC-SP em 2006, “Common Grounds and Shared Purposes On
the Pragmatic Contexts of Communication” apresenta as conexões entre os
conceitos de common ground (contexto) e Experiência Colateral, demonstrando
o enfoque de Peirce para o conceito de Experiência, que não necessariamente
está relacionado a um senso clássico de empirismo (simples experiências),
principalmente porque o projeto de Peirce é filosófico, não estando, portanto,
6 Tradução pessoal: “Equipado com um novo modelo lógico, e uma opinião mais forte a respe ito
do realismo, Peirce começa a enfatizar a relevância de outros tipos de signos além dos signos do pensamento, tentando assim quebrar a tendência hermética de sua teoria semiótica primeira através da atenção especial ao papel da experiência não-semiótica como um fator importante na semiose.”
95
interessado em conceitos rasos. Para Peirce, a experiência é um resultante
cognitivo da vida, que, segundo Bergman, está fortemente conectado com a
secundidade, por ser estritamente particular, um fato bruto, tal como a teoria de
percepção de Peirce tem grande influência da secundidade7. Para Bergman, os
índices são fundamentais na comunicação, porque contextualizam o fato.
Nas palavras de Peirce (1992: CP 5.50):
“A experiência é nossa única mestra. Longe de mim está
enunciar qualquer doutrina de uma tabula rasa... O que a
experiência gradualmente faz é, e por uma espécie de
fracionamento, precipitar e filtrar as falsas idéias, eliminando-as e
deixando a verdade verter em sua corrente vigorosa.”
Um ponto crucial do texto de Bergman diz respeito à indeterminação de
toda semiose, demonstrando que nem signo e nem Experiência Colateral
conseguem dar conta completamente da determinação de um objeto, o que o
torna sempre pronto a novas descobertas. Em suas palavras:
“On their own, signs are not capable of properly fixing the
reference of discourse purporting to relate information concerning
some world. Nor can collateral observation ever bring forth a
perfectly particular positive object, determinate in every conceivable
respect; singular experience is never adequate by itself. Thus, there
will always be a certain degree of indeterminacy or latitude in
semiosis, because human beings cannot escape the use of signs to
some kind of “hard core” of pure objective perception.”8
(BERGMAN, 2006:18)
7 Sobre a Teoria da Percepção de Peirce o Capítulo 1 desta dissertação apresenta alguns
conceitos gerais. A Teoria da Percepção é calcada em como se dá a construção ou apreensão da realidade. Em linhas gerais, os fenômenos nos chegam pela percepção. Os feixes perceptivos (perceptos) que a natureza emite afetam a mente (percipuum) pelas portas de entrada: os órgãos dos sentidos. Para um melhor entendimento desta questão, consultar o livro A Percepção. Uma Teoria Semiótica de Lúcia Santaella e citado nas referências bibliográficas. 8 Tradução Pessoal: “Em si próprios, os signos não são capazes de fixar a referência do discurso
proposto para relacionar a informação a respeito de um universo completo. Nem pode a experiência colateral trazer um objeto particular esmiuçado em sua exatidão, determinado em cada ponto concebível; a experiência pessoal e singular nunca é adequada por si própria. Assim, haverá sempre um certo grau de indeterminação ou de latitude na semiose, porque os seres
96
Em uma citação de Brock, Bergman conclui que esta indeterminação tem
um papel positivo, pois faz da semiose um constante elemento evolutivo, sempre
um devir.
“We should not complain about the fact that our symbols are
never completely determined, because if they were, there would be
no semiotic growth and change (...) vagueness is the mother of
invention”9 (BROCK, 1981:136 apud BERGMAN, 2006:24).
Estes foram os pontos concernentes à Experiência Colateral encontrados
neste momento, porém a partir da leitura de Bergman percebe-se que o tema
ainda apresenta um vasto espaço de análise e dedicação acadêmica que não é
possível aprofundar em um projeto científico de cunho inicial.
Para embasar a aplicação do conceito da Experiência Colateral na relação
da marca de Moda Jovem, que será desenvolvido no próximo capítulo é
importante primeiramente localizar os elementos semióticos apresentados em
uma Semiose de Moda Comercial.10
4.4 Aplicação da Teoria Geral dos Signos na Semiose da Moda Comercial
“Não existe nenhum critério apriorístico que possa
infalivelmente decidir como um signo realmente funcionará. Tudo
humanos não podem escapar do uso dos signos sem algum tipo de “núcleo” da percepção objetiva pura.” 9 Tradução Pessoal: “Nós não devemos nos queixar sobre o fato que nossos símbolos nunca
estão completamente determinados, porque se assim fosse, não haveria nenhum crescimento e mudança semiótica (...) a indeterminação é a mãe da invenção.” 10
A Moda Comercial, com efeito de consumo, mais voltada às questões de vendas, difere-se da Moda Conceitual, criada por estilistas/artistas com “menor” preocupação mercadológica. É notório que existe um ponto de intersecção entre estas duas formas de Moda, onde toda Moda Comercial tem seu aspecto Conceitual para chamar a atenção do público e toda Moda Conceitual tem um certo nível de objetividade mercadológica e comercial, para poder sobreviver no sistema e no mercado. O fato é que a gênese de cada uma reside em sua maior preocupação – enquanto consumo ou enquanto novas possibilidades artísticas de vestir o corpo. A Moda é sempre um elemento que vive com estes dois pesos, parafraseando o título da tese de doutorado de Suzana Avellar, a Moda está sempre entre a Arte e o Consumo, tendo nesta relação a Moda Comercial mais atenta ao consumo e a Moda Conceitual mais dedicada a arte.
97
depende do contexto de sua atualização e do aspecto pelo qual é
observado.” (SANTAELLA, 2000:102)
Quando nos aventuramos a realizar uma análise semiótica de qualquer
assunto, sabemos de antemão que estamos inferindo definições e significações
a partir da realidade que se apresenta naquele momento e em determinada
situação. Nossa posição nesta leitura é de Interpretante Dinâmico e, por isso, há
uma certa abertura de interpretação em cada realidade estudada. “O signo é
múltiplo, variável e modifica-se de acordo com o olhar do observador (...)
nenhum signo pertence a um tipo apenas” (SANTAELLA, 2004:42) e, ao mesmo
tempo, exige de nós o respeito à Objetividade própria que todo signo possui, o
que clama pela acuidade na análise.
No caso da Moda Comercial, a leitura aqui apresentada leva em
consideração os principais elementos contidos em um sistema de consumo de
Moda, localizando nos aspectos de Fundamento, Objeto, e Interpretantes as
questões que foram consideradas mais relevantes nesta relação, estando ciente,
todavia, da existência de outros pontos de relevância, quando o enfoque é
mudado na direção do vestuário em geral.
A força mercantil e de vendas da Moda colabora para o grande mercado
da Moda Comercial, sendo a roupa um dos produtos que mais consumimos
durante nossa vida e um dos objetos aos quais rendemos maior tempo de
escolha, tanto no ato de compra como no ato de vestir-se para o dia a dia.
Nesse universo de escolha, tanto de compra como de uso da roupa, um
elemento crucial é a marca: este “nome” - discutido no capítulo 2 – dotado de
tantos significados que fazem de uma empresa fabricante um produtor de
identidades e conceitos que transcendem a própria roupa em si, principalmente
se levamos em consideração o sistema de tendências ditadas pelos Bureaux
d’Style, onde existe uma linha bem definida a ser seguida de tecidos, formas e
cores utilizadas em cada estação.
Sem o elemento “marca” e o toque criativo de cada um destes “nomes”
teríamos uma Moda comercial circular, previsível e pouco diferenciada. Em todas
as lojas estariam expostas as mesmas roupas e a possibilidade de construção
de um look diferenciado seria mais difícil.
98
Vestir-se com roupas de marca e com looks elaborados tem a função de
aprimorar a relação de visualidade onde o principal intuito é atrair olhares, incitar
o interesse do outro pelo corpo vestido, enfim, um caráter social que preenche a
Moda Comercial ou mesmo a Moda de marca de sentidos e a transforma em
comunicação: um signo em ação.
4.4.1 O Fundamento do Signo
“Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que as roupas e
acessórios exibem qualidades sígnicas, fato este que coloca a
moda em relação direta com a comunicação”. (MOREIRA,
2005:105)
Na semiose da Moda, o Fundamento do Signo é o núcleo da ação, e não
pode ser outro senão a própria roupa - sozinha, enquanto peça, ou em
combinação com outras peças, formando o look.
“No domínio do sistema da Moda, a roupa é entendida como
a unidade básica fundamental a partir da qual se estabelecem
todas as relações que caracterizam este fenômeno sócio-cultural
enquanto processo semiótico.” (MOREIRA, 2006:1)
A roupa habilita a Moda a funcionar, é sua criação máxima que possui as
principais propriedades da Moda, seus elementos essenciais como forma, cor e
tecido, como também os elementos complementares como texturas, estampa
corrida, estampa localizada, etiqueta, aviamentos, etc. Todos estes caracteres
como tantos outros são possíveis de classificar na questão da roupa.
Na multiplicidade de análise do Fundamento “roupa” podemos escolher
vários Common grounds ou formas de apresentação. Podemos vê-la como a
regra de um tempo ou de uma estação (no momento em que estudamos seu
aspecto diacrônico e histórico), como o cuidado com que foi produzida se
pretendemos analisar as questões fabris e de tecnologia do vestuário, como
presença profunda da mente criadora do estilista em cada criação, além de
outras formas de apresentação de fundamento que uma roupa tem como
potencialidade.
99
No caso específico da Moda Comercial, veremos a questão do
Fundamento (e também em todas as demais faces semióticas) enquanto um
conjunto de peças vestidas em um corpo que está presente para a observação
do outro, em um momento qualquer do cotidiano. Neste caso os aspectos deste
signo podem ser:
Quali-signo
Qualidades que estimulam sensações, tirando-nos de todo e qualquer
julgamento apriorístico, onde nos abrimos ao sentimento, mesmo que seja o
sentimento de estranhamento. São as sensações dos elementos que compõem
a roupa ali observada no corpo e que nos despertam para certas emoções,
certas qualidades das formas, das cores e do aspecto geral do look que nos faz
contemplar o signo Roupa e a Moda em si.
Sin-signo
Um existente, uma coleção, uma tendência ali no momento apresentada,
com suas características e suas “normas” efêmeras, que, por isso mesmo, não
chegam a tocar a complexidade de um sentido geral de regra perene. É um
momento passageiro que marca um período, geralmente determinado pelos
Bureaux de Style. Uma fase em que a Moda exprime o espírito do tempo vigente.
Vemos na Moda uma forte ação de existente e secundidade no sentido
peirceano, porém seu o conceito não pára neste ponto semiótico.
Legi-signo
Uma lei ou uma regra na semiose da Moda Comercial. Esta terceiridade
tem maior probabilidade de ocorrência no estilo corrente das roupas criadas por
uma grife e que governa todas as suas criações. Uma certa linearidade, traços
comuns e padronizados, que resultam numa unicidade, numa assinatura:
tendência a gerar o mesmo interpretante ou interpretantes. Esta lei é pautada na
continuidade de um determinado estilo em todas as roupas desenvolvidas, um
certo perfil único de roupa que a distingue das demais, ainda que coexistindo sob
uma mesma estação, e regida pelos mesmos “existentes” transmitidos pelos
Bureaux de Style.
100
Coco Chanel é um exemplo máximo de Legi-signo na Moda. Nas palavras
de Maria Carolina Garcia Gerardi:
“Chanel tem uma identidade auto presentativa(...) O fio
condutor da marca torna-se emblemático da sua obra, fazendo com
que a coleção de hoje correlacione-se com a de ontem, mas
também com a de amanhã.” (GERARDI, 2002:52)
4.4.2 O Objeto do Signo
Na faceta da Moda aqui trabalhada (Moda Comercial), a marca pode ser
considerada como o Objeto, no termo e complexidade que Peirce dá a este
elemento da tríade, ainda que a característica do Objeto seja multifacetada,
podendo abarcar outras questões.
A marca de Moda comporta uma multiplicidade de informações e parece
ser uma parte essencial no processo da Moda Comercial, é a forma de criação
de um existente, que permanece e resiste.
A marca seria aqui colocada como o Objeto, pois é a partir de todos os
elementos nela reunidos (posicionamento, linha criativa, direcionamento do
público-alvo...) que emanam a definição e identidade das roupas de Moda. A
partir destas construções, são determinadas todas as roupas comercializadas,
tendo como ponto de partida e seu DNA na base de sensações presentes no
complexo conceito da marca.
Quando a relação de determinação da marca nas roupas produzidas é por
algum motivo prejudicada, as vendas costumam cair consideravelmente11. No
caso dos jovens, a importância da marca como determinação da Moda é ainda
mais forte.
11
Em 2004 trabalhei com uma marca bem colocada em seu público-alvo durante anos e que na época trouxe algumas “novidades” nas criações que feriam completamente a identidade e personalidade de marca (sua determinação). A Identidade da marca não estava regendo a coleção daquele período. O resultado foi desastroso, a coleção ficou confusa, sem a linha esperada pelo público. Os clientes fiéis esperavam um estilo de roupa que estavam acostumados a comprar e não gostaram absolutamente do que viram. Em contrapartida, os novos clientes que poderiam ter se “aproximado” da marca tampouco acharam boa a coleção. Isso demonstra na prática que a determinação de uma marca é fator preponderante na relação de Moda Comercial e este Objeto deve estar bem contruído em todas suas múltiplas questões, para determinar o signo corretamente e assim determinar o interpretante ideal.
101
Objeto Imediato
Por ser o elemento interno ao signo, está presente na roupa e é um dos
caminhos para o acesso ao conceito geral da marca. Pode ser qualquer
elemento ou forma de apresentação que remeta a determinada marca: uma
etiqueta, símbolo, logotipo, frase conhecida (como “Just do it “da Nike),
elementos exclusivos e que são caracterizados como um padrão (como o estilo
inconfundível de Tailleur Chanel), entre outros.
Na análise de Objeto Imediato, não devemos considerar apenas o logotipo
ou logomarca da empresa de Moda impressa ou colocada de alguma forma; este
pode ser o sinal mais evidente, porém, como objeto imediato, podemos ter outras
ocorrências também relevantes. Para demonstrar a força de outros elementos
enquanto Objeto Imediato, segue uma imagem representativa:
Figura 3: Objeto Imediato - Foto da coleção Adidas Inverno 2006.
Fonte:www.adidas.com/campaigns/originalsbmc. Acessado em 04/12/2006
Nesta foto da Adidas podemos reconhecer – dentro do signo roupa -
elementos que remetem diretamente à marca: especificamente aqui as três
listras verticais na calça, uma das características padrão da Adidas e bem
conhecida pelo senso comum. Por muito tempo a própria Adidas utilizou o
slogan: “The brand with three stripes” e facilmente remetemos a imagem das três
listras à marca.
102
Na Moda Comercial, o Objeto Imediato é de grande valia, porque é antes
de tudo o visível que dispara as primeiras e momentâneas reações em relação a
uma roupa e em relação à marca que a confeccionou, bem como é o elemento
que distingue o usuário dos demais (principalmente quando vemos a Moda como
forma de presença e onde os signos distintivos fazem toda a diferença na
apresentação e reconhecimento do corpo).
No corpo vestido, o Objeto Imediato é a Moldura particular que está em
exibição para os olhares e para a aprovação em determinado grupo, antes de
tudo. É a identidade epidérmica, o jeito exterior de se construir um modo de ser
através das características por vezes ínfimas que dizem respeito a uma grande
identidade de marca e Estilo.
Faz-se necessário ressaltar que, para evitar equívocos entre o signo
Roupa e o Objeto Imediato apresentado na Roupa, é preciso distinguir que o
signo Roupa em si é, acima de tudo, o conjunto da criação, especialmente seus
materiais, tecidos, corte (modelagem), formas, cores, etc. Já o Objeto Imediato
são os “rastros”, “indícios” e “sinais” da marca presentificados na roupa e que
têm o papel de provocar o reconhecimento instantâneo. Para uma roupa de
Moda Comercial, o Objeto Imediato bem trabalhado é essencial para o sucesso
de uma marca.
Objeto Dinâmico
O Objeto Dinâmico da Moda Comercial é o fio condutor que liga a marca a
suas criações de forma plena e ampla, em sua realidade multifacetada
construída ao longo da história e a partir do posicionamento de mercado,
representando a totalidade dos elementos que a compõem. Incluem-se aí
diversos pontos, como a linha criativa emblemática, a identidade de marca, a
equipe de criação unida em uma expressividade de Moda, o sistema de vendas
utilizado, distribuição, produção, ética comercial, atitudes perante a concorrência,
escolha do plano de ação em comunicação e mídia, pesquisas (tanto de
mercado quanto com fins criativos) e inúmeros outros pontos.
103
Conhecer a plenitude do Objeto Dinâmico da Moda Comercial é realmente
uma tarefa inalcançável, porém temos acessos limitados que podem trazer um
conhecimento razoável. Quanto mais nos aproximamos deste Objeto Dinâmico
mais mediações vão sendo feitas e estas conexões nos trazem, passo a passo,
a um maior conhecimento da marca.
Através do Objeto Imediato da Moda Comercial é possível tocar seu
Objeto Dinâmico, porém a familiaridade (experiência colateral) com o sistema de
signos relacionados com a marca é a outra forma de acesso também importante
para o conhecimento do Real.
Ainda no que tange à relação Objetual, Peirce designou a tríade ícone,
índice e símbolo, porém elas não serão aprofundadas neste momento.12
4.4.3 O papel do Corpo
O corpo é o território no qual a Roupa e a Moda se instalam, com o intuito
de torná-lo possível nas relações sociais, território este que, na relação da Moda,
funciona como suporte em busca de mudanças, transformação e superação da
própria condição atualizada no momento, na espetacularização, enfeite e
atratividade.
A Moda redesenha o corpo, traz novas linguagens que podem diferenciar
a imagem natural. Já na relação do Vestuário - sistema que inclui principalmente
vestes utilitárias, uniformes e roupas voltadas ao conforto - esta questão de
espetacularização é amenizada, dando espaço para o bem estar do corpo.
Enquanto o Vestuário busca primordialmente a racionalidade, ergonomia,
utilidade e proteção, a Moda tem maior enfoque no irracional, adorno,
diferenciação, fantasia, subversão, volição, truque, ilusão de ótica e até mesmo
12
Em resumo, o ícone apresenta-se na qualidade artística de toda Moda, já o índice é
um elemento crucial da Moda Comercial, por se tratar da indexicalidade de toda coleção, um acontecimento temporal bruto. Ainda que venha voltar mais adiante (em outro tempo e espaço), vem em forma de releitura, em um outro existente. O símbolo na Moda Comercial é a representação e a regra de uma marca, “internalizada na mente de quem o interpreta, sem o que o símbolo não pode significar.” (SANTAELLA, 2004:25)
104
no incômodo13. A Moda promete o sonho da imagem perfeita, da mudança do
natural para um ápice estético. Pode-se até mesmo utilizar-se artigos que
machucam, pinicam ou trazem desconforto físico, mas garantem uma imagem
bela para a época vivida.
Na dimensão irracional e espetacular da Moda é impossível permanecer
apenas na praticidade e funcionalidade14, sua força motora está no ato de trazer
um “up” na imagem, seja no âmbito sexual, de status ou de identidade, sempre
em conexão com o conceito de beleza. A Moda no corpo é por vezes ir além
deste corpo, criar novas formas, aumentar, diminuir, interferir ou melhorar.
O corpo na relação da Moda Comercial estaria como o suporte, a
finalidade para a qual a roupa é feita. Não seria aqui colocado como o Objeto,
mas antes como o Objetivo de uma roupa, que sem um corpo para vestí-la não
teria função. Seu objetivo derradeiro é estar em um corpo. Em uma possibilidade
drástica de ciclo de consumo e de parâmetros máximos de aparência é possível
até mesmo dizer que a determinação do corpo é feita pela Moda, em especial
entre os jovens, que muitas vezes morrem de fome para ter o corpo idealizado
da Moda, porém isto é assunto para outros estudos dedicados à relação do
corpo na contemporaneidade.
Também na área de roupas esportivas, que não necessariamente são
consideradas Moda, existe a superação do corpo, por exemplo, muitas roupas de
esporte procuram aumentar o desempenho do atleta, até mesmo criar nele
capacidades “extras” que o próprio corpo não possui, como uma tentativa de
reprodução do super-homem ou da mulher maravilha.
13 Para ver mais sobre as diferenças conceituais e estruturais entre Moda e Vestuário, consultar o capítulo1 desta dissertação. 14
Aqui não queremos afirmar que a Moda não se preocupa com tais funções, mas antes dizemos que seu “mainly point” é outro, ligado ao desejo e a aparência ideal.
105
Figura 4: Superação do Corpo - Foto da coleção Nike Inverno 2006.
Fonte: http://www.nike.com/index Acessado em 04/12/2006 (site oficial da empresa)
Esta peça da linha Nike+ confeccionada com tecido Dry Fit (que mantém o
atleta seco e com sensação de frescor durante o exercício) possui o sistema
lightweight (tecido leve para facilitar a atividade física), foi desenhada com uma
modelagem especial chamada ultra-form fitting (ajuste perfeito ao corpo) e
possui um complexo exclusivamente criado para a utilização de iPods nano,
incluindo um bolso mínimo na manga da blusa que mantém o aparelho seguro e
protegido, sem interferir no desempenho do atleta e um sistema de passagem do
fio que conecta o Ipod aos fones de ouvido de forma interna (na própria roupa),
com fácil acesso para mudança de músicas ou volume do MP3 player.
4.4.4 Interpretante
Dos termos que compõem o signo, o interpretante é um dos elementos
mais complexos e para viabilizar sua análise somente aplicaremos a tríade
“Interpretante Imediato, Dinâmico e Final” bem como a subdivisão do
Interpretante Dinâmico em Emocional, Energético e Lógico, que dá conta do
efeito do signo em outro signo.
Na figura da Tríade, podemos localizar na Semiose da Moda Comercial os
seguintes pontos:
106
Interpretante Imediato
É o potencial que toda roupa tem enquanto comunicação e significação,
antes mesmo de encontrar alguém que a interprete. O interessante em relação
ao Interpretante Imediato da Moda Comercial é a diferença de potencialidade de
uma roupa isolada (sozinha em um cabide) e as outras várias potencialidades de
significação quando combinada em um look completo, emoldurado por um corpo
específico e complementado com acessórios ou elementos diferenciados.
Nesses casos, o Interpretante Imediato pode apresentar-se de outra
maneira, porque a peça de roupa combinada em um corpo, com outras roupas e
elementos surge também com outras potencialidades de significação. A seguir
apresentamos três fotos com uma camisa branca em comum, porém em três
diferentes formas de potencialidade de significação.
Figura 5: Formas de apresentação do Interpretante Imediato na Moda
Fonte: Revista Elle - edição 219 – Agosto de 2006. Fotógrafo: Paschoal
Rodriguez. Acesso: http://elle.abril.uol.com.br/livre/edicoes/219/05.shtml.
Interpretante Dinâmico
Na Moda esta é a figura do Interpretante mais fértil, por ser efetivamente a
fase em que o efeito potencial existente já no Interpretante Imediato se
107
concretiza em uma mente, neste caso a mente humana, seja de um observador
particular, de um grupo específico, de comentaristas da mídia (especificamente
jornalistas de moda e consultores de estilo) ou de qualquer “outro” que esteja
exposto a uma relação semiótica de Moda.
É na figura dos intérpretes singulares que a Moda recebe todas as
possíveis conexões com o significado. Por não se tratar de uma linguagem
verbal normatizada e regulamentada, todavia sendo a Moda uma linguagem que
tem como base a matriz visual, sempre é um território livre para as mais diversas
interpretações e nuances de sentidos, presentes nas cores, formas, aviamentos
e principalmente nos indícios da marca ali presentes.
No caso específico de uma marca de Moda Comercial, estes significados
“abertos” passam a ser cada vez mais reduzidos, porque são induzidos através
de uma série de contatos com a identidade de marca e preferencialmente devem
ser lidos conforme a objetividade trazida pelo Objeto. O nível desta interpretação
varia conforme o conhecimento e proximidade do Intérprete com o universo de
sentidos ali apresentados na Moda e na Roupa em si. Os tipos de Interpretante
Dinâmico são:
Emocional
A abertura ao sensível que cada look ou roupa estimula. Quando nos
deparamos com uma roupa, esta evoca sentimentos de forma rápida, quase
imperceptível, esta é a qualidade do Interpretante Emocional; uma percepção
fugaz, praticamente superficial, sem julgamentos prévios ou preocupações com
significados pré-construídos.
Pessoas que não fazem questão de prestar atenção no universo da Moda
acabam, ao menos, sendo alcançadas no nível do Interpretante Emocional na
Semiose de Moda Comercial, porque ainda que estejam desarmadas da
munição interpretativa da Moda ou da roupa, até por desinteresse pelo assunto,
são ao menos sensibilizadas com a presença marcante de uma imagem, que em
si mesma já é estimulante e pode levar a outros níveis de interpretação
(energético e lógico) dependendo do grau de interesse pelo tema.
108
Energético
Posteriormente ao primeiro acesso sensível à roupa e suas primeiras
filigranas de interpretação iniciadas pelo nível emocional, passamos ao
Interpretante Dinâmico Energético, o esforço em si, uma série de sensações
leves, sutis que começam a incomodar ou clamar por um nível maior de
acuidade. É o nível de presença ativa, o desejo de observar que sugere uma
maior aproximação rumo ao conhecimento da Moda. Esta fase pode ser
caracterizada pelo segundo olhar que damos a uma roupa ou a um look, o
momento em que focamos nossa percepção e sentimos o desafio de prestar
maior atenção ao elemento de Moda ali apresentado, em busca do
reconhecimento. É o início do interesse pela decifração da Moda, seus signos e
significados, porém ainda não atualizados em regras interpretativas.
Lógico
Um hábito ou regra de interpretação que é geralmente automatizada. Por
estarmos tratando da Moda Comercial (e automaticamente da marca de Moda)
este caso de interpretante merece especial atenção.
Império do efêmero, do transitório e passageiro, das mutações
ininterruptas dos existentes (coleções), a Moda encontra nos significados
transmitidos pela marca e em seu estilo corrente a maneira especializada de
gerar hábitos mentais.
“(...) Enquanto os eventos existentes são descontínuos,
transitórios, o hábito é continuidade, garantia de que os particulares
irão se repetir de acordo com uma certa regularidade.”
(SANTAELLA, 2004(b):82)
Por ser um terreno arenoso, móvel, que tem como motor de
funcionamento a própria mudança constante, a Moda pode somente atualizar
uma espécie de garantia da regularidade no particular de cada peça pelos
elementos significativos contidos no estilo ou na marca presente no Fundamento
109
e na familiaridade com a Moda. O hábito interpretativo na Moda Comercial surge
geralmente do padrão estético e de identidade intencional do Objeto marca.
Em um exemplo extremo, ao vermos um grande logotipo estampado em
determinada roupa – como Nike, Levi’s, Chanel ou qualquer outro conhecido –
produz-se em nós um interpretante lógico através da marca. O tecido torna-se
um ambiente para a impressão de uma lei interpretativa visível, um sentido
complexo ao qual nos habituamos.
Aqui é importante frisar que estamos tratando da Moda Comercial,
mutante e inconstante e mais adiante nos ateremos ao espaço somente da Moda
Jovem neste processo, onde em questão de dias muda-se de opinião em relação
a uma determinada peça. Cada dia que passa as peças “Must Have” mudam
ininterruptamente nas páginas dos jornais, revistas, na mídia eletrônica e nos
catálogos de Moda e nesta rapidez de existentes emergentes, somente o estilo e
identidade de marca pode reger uma espécie de hábito interpretativo.
Por outro lado, nas peças mais tradicionais ou mesmo no vestuário em
geral, podemos considerar outras formas de hábitos interpretativos. Um terno ou
costume tem em si uma espécie de hábito interpretativo convencional, bem como
um uniforme militar com suas insígnias, a veste de um padre, ou casos em que
existe uma certa perenidade e uma carga significativa conhecida por todos e, por
isso, um hábito interpretativo advindo de outras vias que não passam pela marca
comercial.
Interpretante Final
Caracterizado como tendência de uma interpretação geral e final,
especialmente na Moda - uma área do conhecimento dotada de dinamismo - o
Interpretante Final é provavelmente inalcançável. Nunca esgotaremos as
possibilidades interpretativas da Moda, elas serão sempre um devir, substituídas
rapidamente por outros existentes e assim sucessivamente. A inconstância
própria da Moda é a mola propulsora do consumo que inviabiliza interpretações
estáticas ou perenes.
110
Estar permanentemente no meio do caminho na Semiose da Moda é
também contemplar a graça de nunca sabermos o que virá depois, é sermos
direcionados pela curiosidade todo tempo, à espera de novidades que tragam
sensações, ações e conhecimento.
4.4.5 (X) Experiência Colateral
Conforme apresentamos anteriormente no gráfico “Representação
Didática de uma Semiose”, no ponto do Interpretante Dinâmico de nível Lógico
existe uma ramificação externa denominada Experiência Colateral (X): a
segunda forma de acesso ao Objeto Dinâmico por parte do Intérprete.
Aqui são incluídas todas as manifestações colaterais (tangíveis e
intangíveis) nas quais a marca se dá a conhecer e que são importantes para o
reconhecimento apurado dos sentidos e identidade da marca e da própria Moda,
onde o conjunto de informações combinadas e misturadas geram sentido.
“Existe um vasto repertório de experiências significantes no
universo das marcas (...) que somados determinam a percepção
integral que o público tem a respeito da marca” (CIMATTI, 2003:
87)
É importante frisar que a Experiência Colateral da Moda não contempla
necessariamente o conhecimento aprofundado do Signo da Moda, como
conhecer a roupa nos mínimos detalhes, o histórico de toda a Moda e do criador,
suas formas de produção, ou qualquer outro aspecto teórico ou técnico - isso
não é colateral e sim um conhecimento prévio do Sistema Moda. Colateral é o
conhecimento da marca, dos desfiles, da sua mídia e principalmente das
questões ordinárias e corriqueiras que envolvem o ambiente de consumo e que
fascinam a todos que se interessam pelo mundo das aparências.15
15
A colateralidade é voltada para relações com o usuário e público alvo, não exige estudo acadêmico ou tecnológico de Moda, se assim não fosse seria impossível uma leitura da Moda pelo público em geral. Para gostar, ler os códigos exteriores e usar Moda não é preciso estudá-la e esmiuçá-la, esse é um outro plano de intuito acadêmico e produtivo, com outros enfoques mais aprofundados que os presentes na Experiência Colateral. Esta afirmação está embasada no parágrafo 179 de Peirce, citado anteriormente (Peirce, 1980:122)
111
Atualmente a informação corriqueira de Moda está em todos os lugares,
permeia todos os âmbitos da vida urbana, formando um repertório vasto de
estímulos comunicacionais que interferem no entendimento de seu mecanismo.
Incluem-se na Experiência Colateral da Moda certos aspectos externos,
transmitidos pela mídias, pelo ciberespaço, pelas relações pessoais tanto na vida
urbana cotidiana quanto nos ambientes de diversão, nas experiências de
compra, no contato direto com a marca ou com a Moda, na participação em
desfiles de coleções, na visualização de merchandising em novelas e seriados,
e em tantas outras formas de comunicação difíceis de serem classificadas, que
dependem diretamente da experiência única do indivíduo e sua exposição ao
universo representativo da Moda em outros contextos que estão fora do signo
“roupa” apresentado.
A Experiência Colateral engloba, enfim, todas as experiências empíricas
que possuam informações relevantes de Moda, capturadas e compreendidas
pelo indivíduo em determinado espaço e tempo e que, por sua capacidade
comunicativa ou mesmo criativa, permanecem retidas na memória pessoal,
pronta para suscitar, a qualquer momento, sensações a respeito dos signos que
emanam da Moda, a saber, as roupas. É um processo de experimentação,
cognição e memória que juntos formam um complexo imprescindível na
comunicação de Moda.
A questão da Experiência Colateral será aprofundada no capítulo
seguinte, onde será abordada a relevância deste elemento semiótico no mundo
juvenil e o papel das mídias e do ciberespaço nesta relação.
113
Capítulo 5
O Papel da Experiência Colateral na Eficácia Comunicativa da marca de Moda Jovem
5.1 A vida estetizada
Grande parte das manifestações nas quais a marca de Moda se dá a
conhecer possuem, antes de tudo, um caráter estético ou intencionam captar o
público através da sensibilidade estética. A apreensão dos sentidos e das
experiências permanecem envoltas em imagens e sensações sedutoras.
A força estética1 das relações entre consumidores, potenciais
consumidores e os objetos não é apenas uma percepção superficial de um
fenômeno. A partir dos clássicos da Sociologia, Antropologia e das áreas
correlatas podemos encontrar já no final do século XIX e início do século XX nos
textos de Georg Simmel, Walter Benjamin e Baudelaire pontos relevantes sobre
a estetização da vida. Durante as gerações seguintes, a percepção do caráter
estético só veio a intensificar–se nos estudos sociais.
Guy Debord (1997) sinaliza que o capitalismo atual bem como a
sociedade erigida a partir do conceito do espetáculo é marcada pela onipresença
e onipotência da imagem, na intensificação da produção de imagens, de maneira
que o texto urbano é constituído pelas questões estéticas.
Fredric Jameson, seguindo as idéias de Debord, frisa que:
“we consume less the thing itself, than its abstract idea,
open to all the libidinal investments ingeniously arrayed for us by
advertising. Everything in consumer society has taken on aesthetic
dimension”.2 (JAMESON, 1990:117).
1 Estética aqui é levada no termo diminuto do conceito, da percepção do belo no senso comum.
Não é o conceito amplo de Estética erigido por Peirce. 2 Tradução pessoal: “Nós consumimos menos a coisa em si do que a idéia abstrata aberta a
todas as possibilidades de investimento libidinal e endereçadas ingenuamente a nós através da propaganda. Tudo na sociedade de consumo é visto através da dimensão estética.”
114
Pierre Bourdieu (1983:87) afirma que a construção do estilo de vida se dá
pela estilização da vida, por meio de um ponto de vista estético em relação aos
produtos, onde estes são vistos como obras apreendidas esteticamente,
constituídos esteticamente e feitos para serem admirados no seu aspecto
espetacular, partindo também de princípios estéticos.
Michel Maffesoli (1999:164) chega a citar que vivemos num período de
barroquização da vida, excesso de estetização e que a megalópole traz
intrinsecamente o supérfluo da aparência.
Gilles Lipovetsky (1999:163) mostra que atualmente o mundo do consumo
está sob o jugo do estilismo, charme das aparências, aspecto exterior das
coisas, valor estético, alegorias, extravagâncias, prazer.
Na geração de novos pensadores temos, na mesma direção, Mike
Featherstone reforçando a importância da estetização da vida e da estilização do
cotidiano na nossa cultura.
“Tendências pós-modernas e pós-modernizantes podem ser
observadas nos novos espaços urbanos, assinalando uma
estetização maior da trama urbana e das vidas diárias das
pessoas”. (FEATHERSTONE, 1995:152)
Em outro texto, Featherstone (2003:166) diz que, nesta cultura imagética
e do estético, tudo está conectado com o libidinoso e desejável, o ponto alto é
que neste meio ambiente (enviroment) o próprio corpo vira espaço de exibição,
que deve estar exposto nos diversos lugares, da melhor forma.
A ênfase no estético aumenta a produção sígnica e a oferta constante de
comunicações, com fluxos velozes de signos, saturação de imagens em
colagens superpostas umas a outras, mélange, panóplia, numa constelação de
códigos inseridos.
Nos textos acima citados é possível traçar pontos em comum: o interesse
pelo estilo em si e a exploração lúdica das experiências transitórias e dos efeitos
estéticos fascinantes na modernidade e na pós-modernidade. As abordagens
variam de críticas sobre esta situação - como no caso de Jameson - ou a defesa
115
do ponto da estetização como integrador social - como nos casos de Lipovetsky
e Maffesoli.
A partir desses pontos de vista, podemos considerar que a Experiência
Colateral na Moda é uma forma experiencial que passa obrigatoriamente pelo
apelo estético e imagético, sendo erigida em um mundo que está absorvido pela
estética e pelas imagens.
Uma faixa etária que especialmente se dedica a estilizar e estetizar a vida
é a que contempla o adolescente. Suas vidas são verdadeiras obras de arte do
cotidiano, sempre com o cuidado de representação e apresentação do “eu”, em
busca de novas possibilidades, prontas a alargar e reinventar a identidade
pessoal por meio de outras associações imagéticas coletadas em vivências
acumuladas por um cenário vasto de experimentações intensas e extremas,
onde o pano de fundo é tecido nas tramas da cidade, na colcha de retalhos da
mídia e na rede infinita do ciberespaço, onde não há começo nem fim.
5.2 A Experiência Colateral na Eficácia Comunicativa da marca de Moda Jovem
Como um conjunto formado pelas experimentações e observações
particulares do indivíduo, a Experiência Colateral é o que apreendemos e
extraímos de uma massa imensa de informações, que ali se encerram, em uma
intersecção feita na mente, com a conectividade de lembranças diversas que se
unem a outros relacionamentos e associações pessoais. Nesse processo, o
papel do ator social é crucial, é dele - e de suas construções mentais - que
advém uma parcela de significação do processo semiótico.
Mesmo sem estar falando sobre o tema da Experiência Colateral,
encontramos em uma frase de Everardo Rocha uma boa defesa a respeito da
experiência e vivência do indivíduo na significação. Em suas palavras:
“Esses atores sociais possuem um olhar próximo, íntimo, de
compreensão, entendimento e decodificação de todas essas
formas de mensagens que foram, afinal de contas, endereçadas
116
para eles. Numa palavra, eles possuem a chave de sua
significação podendo perceber e captar estes diversos planos em
que ela está cifrada. Mais ainda, podem transformar todos esses
planos numa narrativa.” (ROCHA, 2002:99)
O ator social, a pessoa para quem se endereça a mensagem, ou mesmo
numa linguagem mercadológica o target/público-alvo, é cada vez mais valorizado
em novos approaches teóricos que estudam a marca, especialmente no que
tange às experiências pessoais e observações particulares.
Susan Fournier, em um estudo direcionado às relações entre consumidor
e marca, relata que as percepções pessoais do público e suas experiências são
decisivas no entendimento da marca e sua preferência.
“The context of particular life experiences does more to
reveal the dynamics of brand choice and consumption (…) one
brand often fits multiple thematic categories for the same or
different consumers reveals the fluid and polysemous nature of
goal.”3 (FOURNIER, 1998:367)
Se o valor da marca depende também dos contatos pessoais, advindos do
próprio destinatário, a significação de uma roupa da mesma forma inclui a
pessoa do usuário.
Barnard (2000:74) ressalta que a idéia do sentido/significado de uma
roupa vir apenas da intenção de um designer é errônea ou ao menos
inadequada, porque é preciso lembrar que, se esta afirmativa fosse real, não
haveria espaço para as interpretações do público e as pessoas estariam
desabilitadas a dar sentido ou intenções próprias às roupas.
Para que os produtos - e neste caso a Moda - façam sentido e tenham a
potencialidade de consumo, precisam ser passíveis de significação no mundo
particular de cada pessoa. Por ser individual e entrelaçada por uma rede imensa
de conexões particulares - verdadeiras ou não, válidas ou não - a Experiência
3 Tradução Pessoal: “O contexto de experiências particulares da vida faz mais para revelar a
dinâmica da escolha de marca e do consumo. (…) uma marca geralmente se encaixa em categorias temáticas múltiplas para os mesmos consumidores ou consumidores diferentes e revela a polissêmica e fluída natureza do assunto ”
117
Colateral ajuda a construir o conhecimento sobre os objetos e será diferente de
pessoa a pessoa e isso, além de tolerável é imprescindível para o
desenvolvimento cognitivo, resultando em um novo e mais apurado
conhecimento que refinará a qualidade da interpretação no intérprete.
Especificamente tratamos da marca de Moda Jovem, que tem um papel
psicológico na vida de seus consumidores e é endereçada à mente.
“Produtos são feitos nas fábricas. marcas são feitas nas
mentes” (SCWEITZER apud KLEIN, 2004:219)
Uma roupa já está pronta a produzir interpretante ou significação em
algum nível em seu caráter de interpretante imediato4. O papel da Experiência
Colateral é envolver mentalmente uma série de observações, um arsenal de
códigos já familiares que fazem com que o intérprete intua muito mais e tenha
diversas informações aguçadas a respeito da identidade da marca, agilizando o
processo comunicativo.
O bombardeio mental que muitas marcas de Moda Jovem realizam com
ações de Marketing Viral contribui para a constituição desta Experiência. As
marcas “transformam seu conceito em um vírus e enviam-no para a cultura por
uma variedade de canais” (KLEIN, 2004:44) e é neste aspecto viral que o jovem
também é atingido por informações da marca.
5.2.1 Ação do Interpretante Dinâmico
A Experiência Colateral advém do Interpretante Dinâmico ou I.D que está
caracterizado pelo intérprete na pessoa do adolescente, em uma espécie de
ramificação do nível Lógico deste interpretante, porém para chegar a este ponto
é necessário haver anteriormente outros dois níveis de I.D.
4 Quando frisamos a importância da familiaridade com a Moda pela Experiência Colateral não
fazemos apologia à possibilidade de ausência de comunicação em uma roupa. Em uma probabilidade remota de não se conhecer nada de Moda é notório que uma roupa em si comunica, ainda que não haja conhecimento da marca, principalmente porque temos contato e relacionamento estreito com todo o sistema do vestuário desde que nascemos. Existe em todas as pessoas ao menos uma familiaridade mínima com a roupa e com o vestir, porém no caso aqui estudado de marca, como símbolo e uma regra, é necessário o conhecimento e a familiaridade prévia com os elementos constitutivos deste complexo sistema.
118
O I.D de nível emocional para o jovem é necessariamente atualizado,
posto que esta faixa etária é apaixonada por Moda ou pelo menos pela
aparência, estão reconhecidamente em busca da sexualidade, do pertencimento,
da sociabilidade e por isso o desejo de ver e ser visto é passagem obrigatória
durante o dia a dia. O nível emocional é produzido no momento em que os
jovens se vêem vestidos e a partir daí são despertados desejos sexuais, de
amizade, de comparação: o interesse emocional pela Moda. O desprezo, ainda
que exista, passará pela observação e será fruto de uma sensibilidade presente
no nível emocional.
No I.D de nível energético está na reação, choque, surpresa, atenção às
novas informações que possam aparecer na roupa ou mesmo em relação à
marca, o que não é difícil de acontecer posto que a Moda é feita de
transformações, mudanças e efemeridade, onde o fundamento roupa apresenta-
se sempre com novidades e diferenciações. O contato energético com as
imagens da Moda é o elo entre a emoção primeira e o entendimento/pensamento
lógico sobre a roupa em questão. Esse momento não costuma ser muito
demorado nos adolescentes.
Na terceira fase do I.D, no nível lógico, o adolescente tece suas
considerações em relação à imagem Moda ali presente. Nos membros deste
grupo o interpretante lógico vem cedo demais, porque eles dominam as regras
interpretativas das marcas, como cita Santaella (2005: 48-49).
O jovem enxerga nas cores, formas e combinações de uma roupa de
marca não só emoções ou existentes particulares de cada estação, mas um
suporte de leis, que são interpretadas como tipos gerais, na verdade eles muitas
vezes têm uma espécie de prazer em classificar, denominar e designar os pares,
distinguir quem é quem no seu grupo, com quem se parecem ou quem aspiram
ser.5
5 No anexo deste trabalho coletamos alguns depoimentos dos jovens sobre as marcas no site de
relacionamento “Orkut”, numa pequena amostra de como os jovens inferem instantaneamente a respeito dos outros somente pela aparência em uma foto.
119
5.2.2 Consumo redentor
Existe um consumo simbólico e classificatório na juventude, em especial
nos adolescentes. O consumo conspícuo parece ainda ser de grande
importância nesse segmento de mercado, por ser um grupo etário que está
sempre preparado a “ler” os sinais representados nas roupas de seus próximos,
mais que qualquer outra faixa etária. O papel da roupa é imprescindível e é uma
ferramenta social simbólica essencial em seu dia a dia, podendo libertá-los da
preocupação com escolhas próprias ou com auto-afirmação.
Um dos amálgamas desses grupos está no ato de consumir, das mais
diversas formas, numa forma de escape que escamoteia a insegurança e
imprevisibilidade em relação ao futuro da geração nascida entre os anos 80 e 90
do século XX. Na lacuna ideológica da vida urbana metropolitana, o apelo
frenético pela beleza ganha força, fruto da vaidade exacerbada e do excesso de
hedonismo – espaço fértil para o mundo das marcas, que tem vida longa e
próspera nesta coorte.
O jovem atual é, nas palavras de Maria Rita Kehl, “livre dos freios morais e
religiosos e desligado de qualquer discurso tradicional, trazendo a enxurrada de
mercadorias essenciais à felicidade”. (KEHL, 2005:92)
O branding alcança o jovem e o adolescente em cada canto de sua vida.
Como o jovem em São Paulo gasta seu dinheiro
1- Roupas e acessórios
2- Lanches fora de casa
3- Calçados e tênis
4- Guloseimas
5- Barzinhos e danceterias
6- CDs
7- Condução
8- Passeios
9- Material escolar
10-Cinema, teatro e shows
Tabela 3: Consumo entre os jovens de São Paulo
120
Fonte: Pesquisa “O adolescente e a sociedade de consumo na cidade de São
Paulo realizada pelo Procon-SP e pela UniFMU.
Em direção à identificação em grupo, com o intuito de pertencimento,
adolescentes buscam estilos de vestimenta e marcas que demonstrem para os
semelhantes partes de sua personalidade ou gostos pessoais. A seguir algumas
percepções sobre estilos de roupa teen publicados em uma matéria jornalística
que pode dar pistas sobre a questão classificatória entre a juventude.
Três principais estilos de roupa do mundo teen
1- Patricinha e Mauricinho Com um estilo bem arrumadinho, as patricinhas e os mauricinhos pagam o preço que for para estar impecável, mesmo que seja para uma simples ida à casa de um colega. marcas preferidas: Diesel, Osklen, Guaraná Brasil, Mercearia, Costume, Spezzato, Doc Dog, Daslu, Arezzo, Corello, Nike.
2- Surfistas/Skatistas
Na intenção de não parecer tão engomados, mas não deixando de lado a vontade de gastar, os jovens com estilo surfista e skatista buscam roupas mais confortáveis e com cores alegres.
marcas preferidas: Billabong, Quiksilver, Reef, Oakley, Mormaii, Rusty, Volcom e Lui lui.
3- Moderninhos e Alternativos
Não revelam um estilo fácil de definir. Na verdade, vão do básico ao eclético. Se a febre é ser Emocore eles serão, se no outro dia mudar, lá estão eles vestindo-se da outra forma. Misturam tendências e não se ligam muito em seguir as ditaduras da Moda.
marcas preferidas: Puma, Cavalera, Adidas, Colcci, Zapping, Triton, M. Officcer e outras marcas alternativas.
Tabela 4: Principais Estilos de roupas para Adolescentes
Fonte: Texto baseado na tabela do site Vitrine 25 de Março. Matéria: Moda prá
que te quero? Por Andréia Meneguete. Publicado em 17/04/2006. Link:
www.vitrine25demarco.com.br/noticia_detalhe
O nome da marca de Moda é quase um sobrenome ideal adotado pelos
jovens, sendo que os educadores prioritários para esta atitude estão na mídia.
121
“é incrível. Os garotos lhe dizem que a Nike é a coisa
número 1 em suas vidas. A segunda é a namorada” (COOPER,
estilista da Nike apud KLEIN, 2004:99)
Com os pais mais preocupados com a situação econômica e, numa
espécie de círculo vicioso, precisam trabalhar mais para dar melhores condições
de consumo para seus filhos, os momentos de lazer e os momentos onde os
adolescentes não estão na escola são mediados e controlados pela mídia, que
informa e educa para o consumo.
Naomi Klein (2004) chama os jovens de “filhos da mídia”, e é no contato
com a mídia e com os sofisticados dispositivos de informação que são tecidas
muitas das experiências de vida, alargando a esfera da percepção e de
intervenção no mundo, bem como a própria representação da realidade, sempre
com a intermediação das marcas patrocinadoras. O jovem ainda indeterminado
como indivíduo é “um destinatário por excelência das peças publicitárias”
(NOVAES e VANNUCHI, 2004:24)
5.3 Mídias de Massa e Ciberespaço como Experiência Colateral
Alta exposição à mídia não é assunto apenas teórico, pelo menos há mais
de uma década, vemos os resultados e efeitos na prática. A aquisição de
informação e mesmo de formação pessoal é feita pela mídia e cada vez mais
intensamente nas novas gerações. Na atualidade, pode-se dizer que são as
mídias que fornecem o conhecimento a ser partilhado pela humanidade através
do conteúdo ali transmitido.
O número de mensagens publicitárias e o incentivo ao consumo através
da Mídia e de outros acessos é mais insidioso do que muitos de nós pensamos.
Conforme Chris Taylor (2001) os adolescentes e jovens recebem
aproximadamente 1.500 mensagens comerciais por dia, informação que eles
precisam digerir, filtrar e construir uma opinião ou atitude a respeito.6
6 Os dados foram transmitidos por Simon Brown, diretor de pesquisas da MTV Inglesa na época
do artigo de Chris Taylor em 2001.
122
Utilizando as mídias é possível atingir o jovem em qualquer lugar do
mundo. Dados da Inglaterra (LIVINGSTONE, 2002: 77) mostram que os
adolescentes gastam aproximadamente 5 horas por dia com mídia, entre TV,
música, vídeos, games, internet, etc. Vive-se em saturação de mídia, numa
ascensão midiática irresistível. As horas, minutos e segundos das vidas juvenis
são devoradas pelo entretenimento e pelo uso dos meios de comunicação, que
se tornam seu próprio meio de existência indispensável. Livingstone ainda
conclui que a relação com a mídia difere de pessoa a pessoa e que a
combinação das mídias e suas texturas e significados constrói modos diferentes
de atitude.
“Through the construction of more or less individualized
lifestyles, young people combine media and non-media leisure
activities in particular ways, making use of the time they have at
their disposal to pursue themes or interests which become, in turn,
constitutive of their identities”.7 (LIVINGSTONE, 2002:78)
A emergência midiática seguida do surgimento da cibercultura e mesmo a
convergência das mídias foi alertada por Santaella ainda na década de 908, onde
era possível enxergar uma nova espécie de cultura: a cultura das mídias que
seria uma forma de cultura intermediária, um espaço de semeadura entre a
cultura de massas e a cultura do virtual ou cibercultura.
Neste processo constitutivo, a autora (SANTAELLA, 2003) cita seis eras
de culturas ou formações culturais na humanidade, a saber: 1. Cultura Oral, 2.
Cultura Escrita, 3. Cultura Impressa, 4. Cultura de Massas, 5. Cultura das Mídias
e 6. Cultura Digital/Cibercultura, esta última não seria uma continuidade da
cultura de massas, existindo uma fase transitória, a cultura das mídias, com o
casamento e mistura de linguagens e meios.
Necessariamente não existe uma linearidade nesta sequência, mas um
processo cumulativo de complexidade, considerando os meios de comunicação
7 Tradução pessoal: “Através da construção de mais ou menos estilos de vida individualizados,
os jovens combinam as mídias e as atividades de lazer feitas fora da mídia de formas particulares, empregando o tempo que eles têm para perseguir os temas ou os interesses que se tornam, por sua vez, constitutivos de suas identidades.” 8 No livro cultura das mídias
123
como meros canais para a transmissão de informação, sendo os signos que ali
circulam os verdadeiros responsáveis que propiciam o surgimento de novos
ambientes socioculturais. Santaella frisa que mídias, antes de tudo, são meios,
suportes materiais, canais. Por outro lado, a mensagem ali codificada constitui-
se como o grande propulsor e possuidor de sentido na comunicação.
Ainda no mesmo texto verificamos que a cibercultura engendra uma busca
dispersa, fragmentada, e cria a cultura do acesso, alinear e individualizado,
coexistindo no mesmo espaço todas as seis formações culturais e a
convergência das mídias.
“As novas tecnologias geram modos de participação mais
globais que introduzem jovens e adolescentes em uma nova
experiência de socialização”. (D’AVILA, 2005:15)
A tabela abaixo é uma amostra da influência da mídia como catalizadora
de informações para o público jovem no Brasil. Os dados são recentes, de 2005,
e as respostas podiam considerar mais de uma fonte de informação. O que
vemos é um jovem que capta informações por meio da mídia e pela opinião dos
amigos. As instituições de ensino ou a família têm um papel diminuto nesta
relação.
Fontes e Meios de Informação utilizados pelos(as) jovens
Fontes e Meios de Informação Percentual de Jovens
Televisão 84,5
Jornais/Revistas escritos 57,1
Rádio 49,0
Amigos(as)/Turma 28,0
Internet 27,0
Familiares 18,0
Colegas da Escola 15,0
Professores 14,4
Outras Fontes 4,4
NS/NO 0,1
Tabela 5: Fontes de Informação utilizadas pelos jovens
124
Fonte: IBASE/POLIS. Pesquisa de opinião Juventude Brasileira e Democracia:
participação, esferas e políticas públicas, 2005.
As mídias citadas acima serão brevemente apresentadas a seguir. Não
abordaremos todas em profundidade, porém faremos um exercício de
explanação destes principais acessos comunicacionais e incluiremos o celular
também como meio de comunicação, tendo como base os dados do Dossiê
Universo Jovem 3 da MTV Brasileira. Um trabalho aprofundado, a partir de
dados primários de pesquisa, poderá ser feito em outras oportunidades, com
objetivos bem definidos.
5.3.1 TV
Diversos estudos mostram que a TV comporta em sua programação uma
grande fonte de informação para a juventude. Nas palavras de Edgar Morin:
“os sucos que penetram através das membranas televisuais
purgam e irrigam simultaneamente a personalidade e a própria vida
do homem moderno”. (MORIN, 1997:72)
Os números da pesquisa IBASE/POLIS com valores em torno de 84% de
informação absorvida por meio da telinha é confirmado por outra pesquisa
nacional. A Jaime Troiano Consultoria de marca, de São Paulo em seu estudo de
1997 - Brazilian Teenagers Go Global9, realizada com 500 jovens de 11 a 19
anos mostrou que 84% destes jovens estão ligados na TV com frequência.
Um dos fenômenos pop jovem da TV brasileira é a telenovela Malhação,
que caiu no gosto dos adolescentes e está no ar desde abril de 1995 na TV
Globo, uma revolução no modelo adotado no Brasil, onde a duração de novelas
não se compara com a duração de sitcoms e seriados americanos. Malhação,
que começou como uma academia, foi mudando com o tempo, passando a
abrigar uma escola, e a partir de então pôde inserir diversos assuntos
relacionados ao universo juvenil como brigas familiares, sexo, gravidez, AIDS e
9 Artigo com resultados publicados na ESOMAR, Marketing in Latin America, Rio, May 1997.
125
doenças terminais. O site do programa tem um espaço opinativo reservado para
tratar dos assuntos abordados.10
O sucesso da novela é confirmado pelos dados de pesquisa de audiência.
Em Abril de 2006, a direção geral de comercialização da Globo apresentou os
seguintes dados:
Audiência Território Nacional Índice Share(%) Índice
Malhação 33 100 64 100
Prog. B 5 15 9 14
Prog. C 6 18 11 17
Prog. D 2 6 4 6
Tabela 6: Pesquisa Ibope – Programa Malhação
Fonte: Ibope/Telereport Abr 06. Disponível em: http://comercial.redeglobo.com.br/programacao_serie/malha3_globox.php
Outro fenômeno que merece especial atenção é a MTV, um canal que
desde sua inauguração tem como público-alvo o jovem e adolescente.
MTV
“O estudo do adolescente do Novo Mundo descobriu que o
mais significativo fator isolado contribuindo para os gostos
compartilhados dos adolescentes de classe média que participaram
do levantamento era a televisão, em especial a MTV. 85% chamou
a MTV de boletim noticioso para criação de imagens de marca. O
sistema de auto-falantes para uma geração (...) em outras palavras
a MTV tornou-se o catálogo mais convincente para a moderna vida
com grife”. (KLEIN, 2004:145)
A MTV começou como o canal musical do jovem, com ênfase na cultura
do videoclipe, formado por imagens que possibilitam sentidos e significações
polissêmicas. O videoclipe, antes da criação da MTV Brasileira em 1990, era
10
Mais informações em malhacao.globo.com
126
apresentado em pequenos espaços no Fantástico, da Rede Globo, ou como foco
de programas de uma hora, como o Clip Trip da TV Gazeta, o Som Pop da TV
Cultura e o Super Special da TV Bandeirantes.
No início das atividades da MTV, o videoclipe tinha o status de principal
atração. O canal exibia videoclipes durante o dia inteiro, organizados em blocos
de interesse, como no caso do programa Gás Total, dedicado ao Rock ou
mesmo o Disk MTV que apresentava as músicas da parada de sucessos.
Embora ainda tenhamos uma imagem idealizada da MTV como canal
especialmente voltado aos videoclipes, seu perfil tem mudado
consideravelmente com o tempo. Desde o início desta primeira década do século
XXI, a emissora tem alinhado sua programação em direções diferentes,
investindo em reality shows, freak shows como Jackass, desenhos animados
com temas de violência ou crítica social como Beavis e Butthead e South Park e
programas de auditório dedicados aos jovens, como o Beija Sapo e o Fica
Comigo, entre outros enfoques de diversão que não estão diretamente
relacionados com videoclipes.
Em dezembro de 2006, a diretoria da MTV composta por André Mantovani
e Zico Góes anunciou que irá aposentar o videoclipe de sua programação.11 A
alegação do canal é que o formato de videoclipe está cada vez mais ligado ao
mundo digital, pelo fato dos jovens recorrerem a outras mídias para assistir
clipes. Essas mudanças estratégicas estão alinhadas com os resultados das
pesquisas que o canal realiza com frequência tanto no Brasil como
mundialmente.
As pesquisas são realizadas para localizar os gostos e interesses dos
jovens e podem também facilitar a atuação dos patrocinadores, que precisam ter
uma atitude jovial eficiente e uma linguagem adequada para estar em harmonia
com o estilo de intervalo proposto pela MTV. Esse intervalo é cuidadosamente
elaborado para também ser entretenimento, com vinhetas especiais bem
humoradas e muitas vezes non sense, feitas para prender a atenção do público,
que tem neste espaço um aprendizado de consumo.
11
Entrevista coletiva realizada para lançar a programação 2007 do canal. Notícia publicada no boletim Meio e Mensagem. Disponível em www.meioemensagem.com.br/novomm/br/
127
O intuito da MTV é estar completamente inserida na vida do público-alvo,
ser absorvida pela porosidade das mentes adolescentes em transformação e em
busca de identidade.
Outro fator que contribui para o aprendizado de consumo e de estilo de
vida transmitido pela MTV é a convergência das mídias proposta pelo canal. A
partir de 2007, a MTV Brasil também deixará de ser apenas uma rede de
televisão, unindo em seu “guarda-chuva” meios como TV, revista (já existente há
alguns anos), site, mobile, rádio e overdrive - um espaço exclusivo da MTV na
internet para apresentações multimídia e videoclipes.
A união de uma série de meios de comunicação em um mesmo objetivo
reforça a importância das diversas mídias para a construção de conhecimento do
jovem e denuncia o surgimento dos cyberteens, cidadãos de uma ordem
multifacetada de conexões que desafiam as hierarquias lineares de construção
de pensamento. É a confirmação plena da convergência das mídias.
“Através da digitalização e da compressão de dados todas
as mídias podem ser traduzidas, manipuladas, armazenadas,
reproduzidas e distribuídas digitalmente, produzindo o fenômeno
que vem sendo chamado de convergência das mídias.”
(SANTAELLA, acessado em 07/12/06)
Em todas as imagens veiculadas na TV, seja na MTV ou em outros
canais, existe sempre um fator de Moda, seja nas roupas de VJs,
apresentadores ou atores, nas inserções de merchandising, nos patrocínios, nas
publicidades, nos eventos de Moda transmitidos, na cobertura de festas ou
aparições de celebridades, entre outros tantos investimentos tanto de Moda
quanto de marca. Direta e indiretamente a TV educa para a Moda e para o
comportamento social.
5.3.2 Internet
O papel da internet é essencial para o adolescente deste início de século.
Suas vidas estão enraizadas no ciberespaço, ali realizam trocas de experiências
e adquirem conhecimentos dos mais variados em “dimensões inéditas,
128
desenvolvimento de novas funções, novos planos de existência virtualmente
trazidos pela inovação técnica”. (LEVY, 2003:207)
A existência do jovem, além de física, passa a ser virtual, idealizada e
banhada por um universo de signos evanescentes. Especialmente o adolescente
é “um usuário em estado de prontidão, conectando-se entre nós e nexos,
atravessando rotas multilineares, multiseqüenciais e labirínticas que ele próprio
ajuda a construir ao interagir com os nós entre textos, imagens, documentações,
músicas, vídeos etc.” (SANTAELLA, acessado em 07/12/06).
Há um universo de garotos e garotas que esticam seus braços para
tirarem fotos alternativas e estilosas no interior de seus quartos ou em locais que
estão sozinhos. Querem encontrar seu melhor ângulo, que crie essa segunda
identidade cool, multifacetada. A facilidade da câmera digital e sua utilização no
ciberespaço para divulgação de imagens criou um segundo narcisismo,
fabricado, digital, fantasioso. Eles registram sua imagem para partilhá-la na rede
para amigos reais e amigos que eles possuem somente na Internet.
Segundo a jornalista Larissa Coldibeli, “basta um dia sem internet para
ficar por fora do que rolou na balada do fim de semana. (...) É no mundo virtual
que acontece praticamente metade da vida social dos adolescentes.”12
A situação comunicacional juvenil que se desenha neste início de século é
absolutamente original, misturam-se e hibridizam-se formas comunicativas
irreverentes, coexistem informações das mais diversas e cria-se uma nova
existência profundamente marcada pela desterritorialização e um certo
enclausuramento no quarto, sentado à frente do monitor ou da TV. Um
distanciamento social (no sentido tradicional) que em contrapartida promove
aproximações e encontros sociais de uma outra espécie, o adolescente é um
flanêur sonâmbulo que prefere muitas vezes conexões virtuais em um primeiro
contato, para depois saber quão interessante será o encontro pessoal.
“Eu vejo assim: às vezes você quer falar com a pessoa,
mas não falar, entende? Não quer que a pessoa responda nada,
12
disponível em “Guia da semana Teen”, acessado em 15 de fevereiro de 2007. link: http://www.guiadasemana.com.br/noticias.asp?/TEEN/SAO_PAULO/&a=1&ID=16&cd_news=24082&cd_city=1
129
nem você sabe o que vai falar depois se ela responder, sei lá…
Então por isso que é muito bom, você ter o torpedo, ou o MSN,
porque você pode matar aquela vontade de falar sem ter que
conversar, sem ter que ficar na frente da pessoa… que é mais
difícil ainda… Então coisas que você nem pensava em dizer, você
diz, porque agora tem como…” (Dossiê MTV3, 2005:26 –
depoimento de um entrevistado do sexo masculino do Rio de
Janeiro, classe A)
76% dos adolescentes de 15 a 18 anos acessam a internet segundo o
dossiê MTV3. A pesquisa ainda revela que a internet mudou para melhor a forma
de relacionamento com os amigos para 51% da amostra; deu maior liberdade
para tratar assuntos delicados para 51%; trouxe a possibilidade de novas
amizades apenas por meios virtuais a 50%; abriu espaço para possíveis
mentiras on-line para 48% e facilitou a comunicação com os amigos para 39%. A
base de dados é composta pelo total de pessoas que acessam a internet na
amostra de pesquisa (fonte: Dossiê MTV3; 2005: 26).
Dentre as possibilidades comunicativas existentes na Internet, as
principais para o público adolescente são:
Blog e Fotolog
O Blog ou Webblog é um espaço aberto para as idéias dos internautas e
registros freqüentes de informação. Os Fotologs são voltados à publicação de
fotos pessoais. Os jovens entre 15 e 17 anos, são os mais envolvidos com este
tipo de comunicação. De acordo com o Dossiê, 67% conhecem Blogs e 62%
Fotologs; 17% declaram possuir um Fotolog ou Blog e 36% visitam
habitualmente. (Dossiê MTV3; 2005: 29)
No começo de 2007 a febre dos Blogs e Fotologs foi o impulso para a
nova campanha da marca Melissa, dedicada principalmente ao universo Teen.
Ao verificar a popularidade deste meio de comunicação entre os adolescentes,
os estrategistas de comunicação da marca foram à busca dos blogs e fotologs
mais chamativos e bem acessados no Brasil e, a partir desta análise, escolheram
quatro garotas famosas no mundo virtual e praticamente desconhecidas no
mundo real, chamadas de “Goldies” para serem as protagonistas da Campanha
130
“Create Yourself”, começando as ações de divulgação no SPFW Inverno/2007. A
idéia foi um sucesso e continuará com comerciais, anúncios e divulgação
permanente no site da marca.13
Vídeos Compartilhados e You Tube
Para muitos adolescentes a televisão começa a dar seus primeiros
sinais demodè, algo ultrapassado se comparado com o hipertexto e com o
mundo cyber, muito mais interativo e multi-tarefa. Até mesmo a atividade de
zapping para encontrar um programa interessante na TV, tão comentada há
alguns anos atrás como sendo uma das principais características juvenis já é
antiquada e entediosa.
Hoje, em benefício da escolha pessoal do que ver, fazer e ouvir, conta-se
com um dispositivo eletrônico mais avançado - o computador - que habilita o
usuário a concomitantemente ver um vídeo, ouvir uma música, acessar um site,
verificar mensagens, conferir o prazo de entrega de trabalhos escolares, procurar
assuntos interessantes no google, conversar com o namorado, entre tantas
possibilidades sem interrupções bruscas, em real time e com um leque infinito de
escolhas.
Nesse comportamento multi-tarefa e de escolhas inumeráveis o papel da
televisão tem sido substituído pelos vídeos compartilhados em You Tube ou
mesmo em sites de meios de comunicação tradicionais, como é o caso do
Overdrive da MTV.
O You Tube é um programa gratuito de compartilhamento de vídeos que
permite que seus usuários publiquem vídeos e assistam a vídeos publicados por
outros usuários. O sucesso do You Tube, que foi fundado em fevereiro de 2005,
fez com que o site fosse considerado pela revista Time a invenção do ano de
2006.14
No meio adolescente o You Tube é responsável por boa parte do tempo
gasto na internet, ali eles têm a oportunidade de assistir pequenos vídeos
profissionais, clips, programas de TV exibidos anteriormente - o que é impossível
13
para maiores informações acessar www.createyourself.com.br 14
Link: http://www.time.com/time/2006/techguide/bestinventions/inventions/youtube.html acessado em fevereiro de 2007.
131
na TV tradicional, a não ser que a pessoa tenha gravado em vídeo cassete ou
DVD todas as possibilidades de programas interessantes - e vídeos caseiros,
geralmente de humor.
Orkut
O Orkut é um site que disponibiliza espaço para criação de comunidades
virtuais, sobre qualquer assunto e permite encontrar amigos antigos, fazer novos
contatos conforme seus interesses, trocar idéias, deixar recados (ou scraps) e
testemunhais sobre amigos. Além de ser um local de encontro de amigos ou
assuntos de interesse, tornou-se um espaço para a divulgação de marcas de
Moda.
Nas comunidades voltadas às marcas ou a assuntos relacionados à
Moda, é possível ver diversos fóruns que tratam das preferências por marcas, se
a marca tem relação com a aparência da pessoa, se realmente os participantes
compram aquela marca ou estão dissimulando os depoimentos, entre outros
assuntos.
MSN
O Messenger ou MSN é um programa que permite a conversa online
através de textos, em tempo real, simultaneamente com diversas pessoas bem
como permite opções como voz, vídeos, troca de arquivos, diferentes fundos de
tela, fotos, uso da webcam, winks, emoticons, etc. É um veículo com maior
rapidez e flexibilidade se comparado ao e-mail e por ser uma comunicação
rápida, elimina-se o máximo de letras possível, o que pode até mesmo interferir
na forma de escrita dos jovens, mesmo em ambientes educacionais e
futuramente profissionais. Sua utilização é muito comum entre os jovens, e é
conhecido por 71% da amostra. (Dossiê MTV4; 2005: 29)
As publicidades veiculadas nas páginas de acesso do MSN costumam ser
animadas e desenvolvidas especialmente para chamar a atenção dos usuários,
que em sua maioria são jovens. Marcas de moda ou assuntos relacionados
também inserem suas propagandas no espaço.
132
O correio eletrônico ou e-mail é uma forma de comunicação de acesso
seguro e fácil, com uma linguagem mais formal que a dos demais recursos
disponíveis atualmente. Segundo a pesquisa da MTV, o e-mail ganha relevância
para marcar encontros, agendar reuniões de trabalhos escolares e envio de
arquivos e fotos. Do total da amostra, 84% enviam e recebem e-mails
habitualmente. (Dossiê MTV3; 2005: 29).
Por meio do sistema de e-mail é possível também receber e-mail
marketing de diversas marcas de Moda e spams a respeito de Moda ou assuntos
correlatos. Nesses acessos é possível também construir um conhecimento de
marca.
Sites
Atualmente grande parte das marcas de Moda Jovem, se não for exagero
falar em sua totalidade, possui um site empresarial, que apresenta o estilo e
conceito da marca, suas coleções atuais e anteriores - tendo em alguns casos
substituído os catálogos impressos pela maneira virtual de apresentação –
endereços de lojas, espaço para a opinião dos usuários nos blogs oficiais e
tantas outras conexões ali possibilitadas que aprimoram o conhecimento da
marca geralmente para os mais aficcionados pelo tema Moda.
O complexo existente na Internet, como as funções aqui colocadas entre
outras formas comunicacionais disponíveis no ciberespaço, proporcionam uma
série infinita de contatos e experiências com a Moda e com a marca, educando
para o consumo e principalmente definindo uma atitude perante a vida na fase
adolescente.
5.3.3 Celulares
Se nas gerações anteriores o telefone fixo era um importante instrumento
de comunicação entre os adolescentes, onde eram feitas declarações,
confissões e conversas das mais diversas, hoje seu espaço foi substituído pelo
celular, em que já não mais existe a angústia de intermediários na comunicação,
com a vantagem de ser personalizado e acompanhar o proprietário em qualquer
lugar.
133
“Acha que eu vou ligar na casa, dizer boa noite para pai,
mandar chamar?… Eu não, nem penso mais nisso, se você quer
falar com alguém liga pra esse alguém, não pra casa dele”. (Dossiê
MTV3, 2005:27 depoimento de entrevistado na fase qualitativa)
Em um só aparelho é possível ter agenda de telefones, identificador de
chamada, jogos, acesso à internet, envio e recebimento de e-mails, câmeras
fotográficas e de vídeo, ringtones e músicas, envio de torpedos, gravador de voz
e som, calendário, despertador, protetor de tela, chat, acesso ao Messenger,
entre outras facilidades.
No Brasil a utilização dos celulares cresceu vertiginosamente de 1999 a
2005. Segundo os dados do Dossiê MTV3 (2005:10) de acordo com a Anatel, em
2004 o número de celulares cresceu 41,5% em comparação com o ano anterior e
atualmente no Distrito Federal já existe um celular por habitante. Em janeiro de
2005 o Brasil chegou ao número de 66,6 milhões de celulares, o que significa
36,16 aparelhos para cada 100 habitantes. Um número considerável.
Na amostra da pesquisa realizada pela MTV, o celular é usado
essencialmente para fazer ligações (96%) e enviar mensagem de texto (79%)
porém as funções de jogos, baixar música/ringtones, baixar protetor de tela, e-
mail e acesso à internet já são hábitos expressivos, que crescem quanto menor a
idade. (Dossiê MTV3, 2005:27)
Estes números sobre a utilização do aparelho celular demostram que sua
forma comunicacional tem absorvido novas possibilidades antes impossíveis nos
telefones fixos e o espaço para intenções publicitárias tem estado cada vez mais
aberto.
Um fator interessante em relação ao celular é que o investimento
publicitário das empresas inseridas neste mercado está geralmente linkado ao
conceito da Moda. Empresas de telecomunicação como Tim, Vivo e Claro
investem pesadamente em eventos de Moda como o São Paulo Fashion Week,
Fashion Rio ou eventos regionais de menor porte. No mesmo sentido,
fabricantes de dispositivos de telecomunicação como a Nokia, Samsung ou
Motorola também possuem apelo constante para a Moda, vinculando a
modernidade de seus aparelhos aos conceitos antes exclusivos à Moda.
134
O adolescente que quer sempre trocar de celular e estar em dia com as
novidades telecomunicacionais, é o mesmo jovem que é apaixonado por Moda e
por marcas de Moda.
5.3.4 Revistas
Durante as décadas de 80 e 90 as revistas teen foram essenciais para o
universo adolescente, principalmente do sexo feminino. Com o crescimento da
Internet este relacionamento mudou consideravelmente, porém as revistas
segmentadas para o público adolescente ainda possuem certa influência na
construção de identidade. Os temas abordados são sempre ligados ao
jornalismo soft, como denomina Candiani (2000) confundindo jornalismo com
publicidade, por tratarem de temas que podem sempre estar atrelados a
anúncios ou informes publicitários. Os assuntos circulam em torno do estilo de
vida adolescente, vida das celebridades, moda, lançamentos musicais, beleza,
sexualidade, viagens, diversão, astrologia e testes de comportamento.
As principais revistas do segmento são Capricho e Atrevida.
Segundo Teixeira (2002) a revista Capricho representa, sozinha, 13% da
circulação de títulos femininos no mercado nacional, onde são destinados 60%
em páginas de editoriais e matérias e 40% para publicidade, o que reforça ainda
mais a questão do apelo ao consumo nesta mídia.
Atenta à linha de convergência das mídias, a revista Capricho criou um
site atrativo na Internet com espaços especiais para as assinantes, que podem
acessar diversos links exclusivos que aprimoram o relacionamento com o
conteúdo proposto pela editoria. É possível participar de fóruns, ler mensagens
postadas em blogs e acessar o espaço interativo chamado “República das
Meninas”, uma espécie de casa com cômodos distintos que tratam de um
assunto específico patrocinado por marcas voltadas ao universo jovem. Um dos
espaços da República, chamado ateliê, é dedicado exclusivamente à Moda e
neste local é possível encontrar dicas de customização, como é a vida de uma
modelo, o que está nas passarelas, textos de Thais Losso (estilista muito
135
conhecida e com criações voltadas a jovens e adolescentes), referências aos
cursos de Moda e editoriais com tendências.15
O assunto Moda e o universo que a envolve além de ser tema de
interesse cotidiano para a leitora, como a forma de se vestir no dia a dia ou em
festas e eventos, passou ao status de interesse de estudo universitário. Segundo
uma pesquisa realizada pela Capricho, em amostra de 797 meninas, somente
3% disseram nunca ter pensado em cursar moda como opção no vestibular e
45% afirmaram que moda é a primeira opção na lista de possibilidades.16
Atenta à febre “Moda” no meio feminino adolescente, a revista Atrevida da
Editora Símbolo lançou um título dedicado especialmente ao tema. A circulação
mensal da nova revista teve início em setembro de 2006, sob o nome “Atrevida
Fashion”.
Conforme o departamento comercial da revista, o perfil de suas leitoras é
de “jovens consumidoras, vaidosas e que adoram estar na moda”. Alguns dados
extraídos do site demonstram esta afirmação:
Hábitos de lazer
82% compra em shoppings/lojas de departamento
84% come ou passeia em shoppings
Assuntos de interesse
87% tem interesse por humor/passatempo/diversão
80% tem interesse por moda
75% tem interesse por gente famosa
Tabela 7: Perfil de leitoras da revista “Atrevida”
Fonte: Marplan Consolidado 2005. IVC Fev 2006. Disponível em: http://www.simbolo.com.br/institucional/Conteudo/0/artigo5341-1.asp#PUBLICIDADE
Além das revistas dedicadas ao público feminino, existem os títulos
especializados em música (como as revistas da Jovem Pan e da MTV), revistas
15
Mais informações: http://capricho.abril.com.br/home/ (acessado em dezembro 2006). 16
Matéria sobre a febre dos cursos de moda foi assinada por Julia Prata no site da revista Capricho
136
de games, revistas de variedades como TRIP e TPM, onde se verifica sempre
algum apelo a Moda e consumo de marcas de Moda.
5.3.5 Rádio
O Rádio geralmente é um acompanhante dos jovens nos momentos em
que estão realizando outras atividades como estudo, deslocamentos (escola –
casa), exercícios esportivos, entre outros.
Os horários de maior audiência geralmente estão localizados no início da
manhã, horário de almoço - em que se costuma transmitir programas
humorísticos - e final de tarde, nos programas de novidades musicais. Por se
tratar de um meio que explora a audição e não tanto a visualidade, não possui
influência direta nas relações com a Moda. A sensibilidade para a Moda é
exposta em spots, jingles, patrocínios de programas, comentários de
entrevistados ou mesmo através de uma imagem idealizada ou memorizada dos
cantores e grupos musicais que ali são apresentados.
Segundo o último IBOPE consultado - Setembro a Novembro de 2006 na
cidade de São Paulo e Grande São Paulo - a rádio com maior audiência é a
TUPI FM, que possui programação sertaneja/romântica, seguida pela
Transcontinental com programação direcionada ao Pagode. Em terceiro lugar
permanece a Nativa FM de programação Sertaneja e com outros estilos de
música popular, como forró.
A primeira rádio dedicada exclusivamente ao público jovem encontrada na
pesquisa é a Mix FM, em 4o lugar. Sua programação enfoca músicas pop e rock,
nacionais e internacionais. No mesmo perfil segue a rádio Jovem Pan 2 em 6o
lugar.
5.3.6 Jornais
O jornal não é considerado um meio de grande penetração no público
jovem, que costuma receber as informações por meio eletrônicos ou por mídias
impressas segmentadas, como é o caso das revistas. O destaque para o meio
137
jornal é dado ao suplemento juvenil Folhateen, do jornal Folha de São Paulo, em
formato tablóide de 12 páginas, todas coloridas, que circula semanalmente, às
segundas-feiras, desde 1991.
Segundo Gomes (2003), o Folhateen é voltado especialmente aos
assuntos relacionados à música jovem, com atenção às bandas em destaque, o
que sugere para o leitor um produto diferenciado, especialmente dedicado ao
público-alvo de15 à 18 anos.
Semelhantemente ao Rádio, o Jornal - especialmente no caso do público
jovem - acaba trazendo contatos indiretos com a Moda, menos incisivos, mas
que influenciam em determinado grau os leitores desta mídia.
5.3.7 Relevância das Mídias
Para apresentar as mídias descritas acima e a relevância de cada uma na
vida dos jovens da coorte nascida no final dos anos 80 e início dos anos 90,
apresentamos a seguir um esquema desenvolvido pela MTV brasileira.
Tabela 8: “Perceptual Map” – Meios de Comunicação.
Fonte: Dossiê Universo Jovem MTV4 2005
Conforme o Perceptual Map, vemos que a TV e a Internet são as formas
de aquisição de informação, diversão e lazer mais influentes e indispensáveis,
com uma linguagem jovem e de grande interesse para a coorte atual. As revistas
138
e jornais, a cada dia que passa, reduzem sua influência, enquanto o rádio e o
celular são caracterizados como companheiros inseparáveis.
Em todos esses meios de comunicação circulam mensagens de Moda de
forma enfática ou branda, que paulatinamente criam experiências externas
relacionadas ao signo roupa e que constróem na memória de jovens e
adolescentes conceitos de marca e certas atitudes de Moda que se concretizam
em consumo posterior.
Em relação à mídia e especialmente ao Ciberespaço, os adolescentes são
a faixa etária pertencente à juventude que consome mais produtos relacionados
e é mais influenciada pelos apelos midiáticos. Para o Dossiê MTV3, quanto
menor a idade do jovem maior é a posse de produtos e “gadgets” tecnológicos
como webcams, MP3, celulares, câmeras digitais, bem como o próprio
computador.
Os contatos externos e constantes com a Moda não se encerram na
dependência da mídia e do ciberespaço, existem também conexões em outros
acessos intermináveis que contribuem para a construção da Experiência
Colateral na marca de Moda Jovem.
5.4 Outros acessos intermináveis
Além das mídias tradicionais e chamadas comumente de Meios de
Comunicação de Massa, o jovem recebe outros fermentos comunicacionais de
marca, residentes em espaços e itinerários incomuns, em uma cadeia
polissêmica flutuante.
Na corrida em prol da expressividade de cada marca, suas vidas podem
ser resumidamente caracterizadas pelo código 24/7 (McDOUGAL e CHANTREY,
2004). O código 24/7 designa uma geração disponível a incursões comunicativas
e abertas a relações de consumo durante 24 horas por dia e 7 dias por semana.
No sentido 24/7 vivenciado ocorre a expansão inquieta das intenções
comunicativas.
139
Vemos certos signos ambulantes que a todo tempo transitam nas ruas e
invadem as mentes, de forma profusa e ilimitada, a toda hora, por canais
estimulantes que incitam o consumo. Mesmo as exterioridades, que parecem
banais, concentram em seu bojo uma sucessão de imagens para além das
fronteiras da roupa nos muitos fios que inter-relacionam Moda e público-alvo, por
efeitos que emanam e geram impactos e sensações de marca. É no acúmulo
interminável de informações nas mais diversas possibilidades que reside parte
do denso caldo da Experiência Colateral.
Os jovens “vêem-se mergulhados simultaneamente a um
sem número de contextos culturais e redes de relações sociais
preexistentes dos quais selecionam e hierarquizam valores e
ideais, estéticas e modas, formas de relacionamento e
convivência.” (D’AVILA, 2005:15)
Na emergência de signos e no “travelling incessante que a megalópole
nos propõe” (MAFESOLLI, 1999: 167) constitui-se um arcabouço de significados
que são instaurados nas mentes dos adolescentes e jovens, transformando o
modo de enxergar e entender as imagens contemporâneas.
São “mil perspectivas, conceitos líquidos que não emergem
somente dos fluxos intermináveis: eles deslizam em virtude das
pessoas (entities) que pertencem a contextos muito variáveis que
estão explorando e produzindo novos territórios comunicacionais.”
(CANEVACCI, 2005: 159)
O jovem “rodeia-se de sons, vozes, imagens e que,
navegando nas arquiteturas fluídas do espaço informacional
adquire potencialmente condições de trazer o planeta para dentro
de seu espaço privado. (...) significa trafegar na densa floresta de
signos de uma cultura da multiplicidade, do diversificado, dos fluxos
e deslocamentos, das metamorfoses imprevisíveis.”
(SANTAELLA, Link: http://www.videobrasil.org.br/14/port/cult.pdf
acessado em 07/12/06)
140
A partir desta realidade, as marcas de Moda começaram a aplicar o
conceito de Marketing de Guerrilha17 (OSGERBY, 2004:5), uma política de
iniciativas diversas e geralmente não convencionais que atingem o público de
forma criativa. Além dos catálogos, desfiles tradicionais, pôsters, outdoors e
mídias de grande formato, incluem-se adesivos, divulgação da marca em
discotecas e casas noturnas, ações promocionais inusitadas, patrocínio em
eventos, performances, realização de campeonatos de esportes radicais,
concursos culturais, criação de rádios piratas - como foi o caso da Diesel em
alguns paises - e outras formas de comunicação da marca de Moda que contém
uma quantidade exponencial e mesmo explosiva de informações, dotadas de
certos elementos distintivos que permanecem fixos na memória juvenil.
Na corrida para dotar de sentidos uma comunicação de Moda, algumas
marcas também expõem suas roupas - especialmente aquelas que possuem o
logotipo visível - no corpo de celebridades. Um caso bem conhecido comentado
por Paul Smith (1997), é o da marca Tommy Hilfiger que preferiu não explorar o
aspecto publicitário convencional, investindo na visibilidade de sua marca em
pessoas de alta performance, verdadeiros trendsetters que deixariam a imagem
da empresa visível nas páginas jornalísticas das colunas sociais.
5.4.1 O Shopping
Um espaço decisivo nas experiências de marca e que contribui na
construção cognitiva do adolescente é o próprio Shopping.
“Uma coisa é certa: os shoppings são o espaço de grande
interesse cognitivo, sobre as mudanças do consumo e a dupla
valorização (econômica + estilo de vida) do consumo atual.”
(CANEVACCI, 2005:127).
O Shopping é o lugar mais freqüentado pelo jovem brasileiro que vive nas
regiões metropolitanas, em todas as classes sociais, conforme os dados
apresentados pelo instituto IBASE/POLIS:
17
O conceito do MKT de Guerrilha foi criado por Jay C. Levinson, no início dos anos 80 e é usado por pequenas e grandes empresas de diversos segmentos, incluindo a Moda.
141
Lugares mais frequentados por jovens das regiões Metropolitanas*
Lugares Total Classes A/B Classe C Classe D/E
Shoppings 69,2 82,4 72,3 53,8
Cinemas 51,2 75,0 52,4 29,3
Parques e Praças 47,8 50,9 46,2 47,8
Teatros 15,1 24,6 14,0 8,8
Centros Culturais 13,7 20,3 13,3 8,6
Museus 11,6 17,7 11,4 7,2
Nenhum desses lugares 13,1 6,4 10,8 22,2
NS/NO 0,8 0,4 0,9 1,0
Tabela 9: Lugares mais freqüentados por jovens das regiões Metropolitanas.
Fonte: Pesquisa Juventude Brasileira e Democracia: Participação, esferas e políticas públicas (IBASE/PÓLIS, 2005). In: Relatório Global Juventude Brasileira e Democracia:
participação, esferas e políticas públicas, 2006:34
O Shopping, que sempre foi considerado a “Catedral do Consumo”, é o
grande ponto de encontro dos adolescentes. Para os pertencentes das classes
A/B constitui-se um lugar seguro, onde eles podem circular e se divertir sem o
perigo das ruas. Os pais buscam seus filhos com todo o conforto dos
estacionamentos ou pontos de embarque e desembarque de clientes e no
interior dos Shoppings eles podem se divertir de diversas formas: cinema,
brinquedos eletrônicos, danceterias, etc., garantindo momentos de lazer e
consumo seguro.
Já para os adolescentes das classes C/D/E é um lugar freqüentado
geralmente por outros motivos, especialmente por ser um espaço lúdico com
entrada gratuita, onde eles podem passear sem ter que gastar necessariamente.
Este grupo passa horas trafegando pelos ambientes dos Shoppings sem
poderem consumir, mas são bombardeados com mensagens de marcas e apelo
ao consumo.
O Shopping, pelo que observamos no cotidiano, tornou-se a praça dessa
geração e seu principal ponto-de-encontro: um verdadeiro parque de diversões
de acesso facilitado. No Brasil não é difícil perceber a “horda” de jovens de todas
as classes transitando pelos shoppings, em especial nos finais de semana. O
142
adolescente gasta grande parte de suas energias andando nos corredores dos
shoppings e esta atividade constitui-se como um importante lazer, que vai estar
sempre mediado pelo apelo das marcas, em uma espécie de diversão atrelada
às compras que gera uma concepção lúdica da vida intermediada
constantemente pelos objetos e pela própria Moda.
John Fiske (1989) trata da invasão dos jovens nos shoppings como sendo
um fenômeno importante de congregação entre os adolescentes que não podem
trabalhar e querem ter momentos de lazer descompromissado. É neste caminhar
pelos corredores dos Shoppings que são criadas diversas conexões e
conhecimentos de marca, na observação das cenas e vitrines das lojas.
Na verificação do papel do Shopping e do ponto-de-venda nas
experiências de marca, muitas empresas preocupadas com o branding investem
pesadamente em programação visual, em especial para poder diferenciar seu
espaço de vendas de tantas outras marcas concorrentes e presentes no mesmo
local (muitas vezes como vizinhas). Um exemplo é a marca espanhola Zara, que
conforme Alvarez (2000) investe apenas 0,3% de seu faturamento em
publicidade, durante ações de liquidação, direcionando grande parte de seu
budget para a decoração dos pontos de venda e para o planejamento de novas
filiais, instaladas em locais estratégicos.
Especialmente nas marcas voltadas ao público jovem, um exemplo de
ponto de venda bem pensado é o da marca Colcci. Suas lojas assemelham-se a
discotecas, em um ambiente totalmente lúdico e criativo, que desperta
sentimentos positivos para o público-alvo durante o contato com as peças de
Moda.
5.4.2 Acessos em rizoma
Em meio a tantos acessos e incursões conclui-se que uma comunicação
eficaz para esta geração deve ter caráter de fluxo e acúmulo, em espécie
rizomática, conceito de Guattari e Deleuze.
Num rizoma “cadeias semióticas de toda natureza são aí
conectadas a modos de codificação muito diversos, (...) colocando
143
em jogo não somente regimes de signos diferentes, mas também
estatutos de estado de coisas (...) Um rizoma conecta um ponto
qualquer com outro ponto qualquer e cada um dos seus traços não
remete necessariamente a traços da mesma natureza; ele põe em
jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive estados de não-
signos. (...) Não é feito de unidades, mas de dimensões (...) a
árvore impõe o verbo ser, mas o rizoma tem como tecido a
conjunção e...e...e. É tudo ao mesmo tempo, em um processo
cognitivo rápido e de difícil congelamento, até mesmo imperceptível
porque liga com a memória. O rizoma tem sempre múltiplas
entradas”. (DELEUZE e GUATTARI, 1995:15, 22, 32)
A marca é dilatada na galáxia mental, numa atividade intensa que torna
impraticável definir o princípio e origem da Experiência Colateral com a marca de
Moda Jovem, bem como seu fim. Uma investigação que penetre em todas as
avassaladoras experiências é impossível, por tratar-se de uma sequência
espiralada, sem encadeamento lógico, rascunhada, inclusiva e apta para novas
inserções.
A Experiência Colateral reside no ramo do cognoscível, em uma série de
memórias curtas e longas em que:
“o pensamento não é arborescente e o cérebro não é uma
matéria enraizada nem ramificada. (...) o salto de cada mensagem
por cima destas fendas fazem do cérebro uma multiplicidade que,
no seu plano de consistência ou em sua articulação, banha todo
um sistema probabilístico incerto” (DELEUZE e GUATTARI, 1995:
25)
Caracteriza-se como um complexo de pensamento da marca, que inclui as
formas de sentir diferentes de cada pessoa, conforme a experiência pessoal
única que extrai das relações gerais e comuns uma particularidade específica e
múltipla.
144
5.5 A memória
Todos os acessos, familiaridades e experiências que compõem a
Experiência Colateral na eficácia comunicativa da marca de Moda Jovem
permanecem armazenadas na memória. É no espaço da mente que se
reproduzem lembranças, reminiscências e certas recordações a respeito de uma
marca.
A memória e os processos mentais de pensamento são decisivos para o
Marketing e conseqüentemente para a Moda Comercial, que utiliza das
ferramentas de publicidade para atingir seu público.
A área de pesquisa dedicada ao Marketing e publicidade comumente
utiliza o termo Recall para as lembranças de marca na mente do público alvo ou
mesmo das pessoas em geral. O Recall ou recordação é um teste empírico que
designa a habilidade de uma determinada pessoa em relação à lembrança de
uma marca ou de publicidades específicas, bem como a recordação de
percepções passadas e o nível de armazenamento de informações que
contribuem para futuras intenções de compra.
Estudos psicológicos, comportamentais e pesquisas médicas têm
dedicado seus esforços científicos para buscar respostas e mesmo novas
questões em relação à memória e à mente. O enfoque é descobrir como as
marcas permanecem na mente do indivíduo e como evitar o esquecimento das
mensagens publicitárias ou os esforços comunicacionais.
Daniel Schacter, professor de psicologia da Universidade de Harvard,
dedica seus estudos para assuntos relacionados à memória. Entre seus livros
publicados estão: Searching for Memory: The Brain, the Mind, and the Past
(1996) e The Seven Sins of Memory: How the Mind Forgets and Remembers
(2001). Este último foi utilizado em um artigo de Marketing escrito por Larry
Percy (2002), professor da Copenhagen Business School. No artigo, Percy
desenvolve o tema da memória para ações comunicacionais e de Marketing,
bem como os fatores que podem dificultar a memorização de marcas, chamando
o fenômeno de “os sete pecados da memorização de marca”.
145
Conforme o autor, uma memória de marca pode ser dificultada por fatores
como rotina diária, ou seja, um público com a rotina de assistir a TV sempre no
mesmo horário pode resultar em perda de parte da relevância das mensagens ali
inscritas, por estarem associadas a baixos níveis de atividade do córtex pré-
frontal.
Outro fator relaciona-se ao problema do esquecimento de partes das
mensagens: o receptor lembra da marca sem necessariamente recordar-se de
todos os aspectos que a envolvem.
Podem ocorrer falhas de memória advindas de stress ou excesso de
atividades, criação de confusão mental em relação a marcas, ao fazer menção a
uma determinada marca e na realidade estar pensando em outra; bloqueios
mentais em ações que exigem memória; instabilidade do que está guardado na
memória e outras questões que abrangem o tema e aumentam a complexidade
da lembrança de marca.
Para Percy uma das únicas formas de construir-se uma imagem forte de
marca, devido aos inúmeros problemas relacionados à memória particular de
cada pessoa, é através de múltiplos acessos e diversos esforços de
comunicação criativos e exclusivos a uma determinada marca, ou seja, no
acúmulo de acessos que constituem a experiência colateral. Em suas palavras:
“Memories for objects and experiences are decomposed into
a number of different parts and those parts are stored in various
areas of the brain, waiting to be reassembled and 'remembered'.
(…) This suggests the need to have copy (and packaging as well as
other marketing communication) unique to a brand in order to avoid
connections in memory that could minimize or override the desired
brand-related memory.” 18 (PERCY, 2002).
18 Tradução pessoal: As memórias para os objetos e experiências são decompostas em um
número de peças diferentes que estão armazenadas em várias áreas do cérebro, esperando para serem remontadas e “recordadas”. (…) Isto sugere a necessidade de ter uma cópia empacotada com outras ações comunicativas de marketing que sejam únicas à marca, a fim de evitar conexões errôneas que poderiam minimizar ou cancelar a memória exata e relacionada à marca.”
146
Recentemente, a área da medicina também apresentou dados a respeito
do impacto das marcas nas mentes dos consumidores. Os avanços científicos na
área neurológica demonstram que é plausível medir o impacto das marcas nas
mentes dos consumidores, bem como emoções inconscientes e decisões
advindas desta relação.
“A revolutionary approach to brand equity and management,
called Brain Branding, is presented. Case studies show how brand
management strategies can directly benefit from brain imaging's
ability to measure a brand's impact on consumers, providing not
merely new actionable metrics but a new language for emotional
branding, offering new validations for brand management and
measures of marketing.” 19 (QUARTZ e ASP:2005)
Em Novembro de 2006, a Radiological Society of North America (RSNA),
durante seu encontro anual em Chicago, num dos maiores eventos relacionados
a questões científicas de Medicina, lançou um press release com resultados de
uma pesquisa que apresenta dados referentes ao funcionamento do cérebro
quando submetido a imagens de marca ou a visualização de logotipos famosos.
Pelo ineditismo do tema e por ser voltado ao mercado consumidor, gerou
certo frisson em diversos jornais, tanto científicos como comerciais, que
lançaram matérias a respeito. As informações que serão aqui transmitidas foram
retiradas do portal de notícias BBC News, Washington Post (por E.J. Mundell) e
Wall Street Journal (por Kevin Helliker), todos publicados em 28 de novembro de
2006.
A pesquisa em questão, realizada por uma equipe da Universidade
Ludwig Maximilians, de Munique (Alemanha) foi liderada pela Dra. radiologista
Christine Born e utilizou como amostra 20 pessoas saudáveis, homens e
mulheres, com idade entre de 27 e 28 anos e com alto nível cultural, escolhidos
19 Tradução pessoal: “Uma abordagem revolucionária para o Brand Equity e a gerência de
marcas, chamada Brain Branding, é apresentada ao mercado. Estudos de caso mostram como as estratégias de gerenciamento de marca podem diretamente se beneficiar das imagens construídas na mente e assim medir o impacto de uma marca nos consumidores, fornecendo não apenas métricas e números, mas uma nova linguagem para o Emotional Branding, oferecendo novos conceitos para o gerenciamento de marcas e decisões de marketing.”
147
especialmente para desmistificar a idéia comumente proposta que mensagens
de marca são mais suscetíveis em pessoas com menor grau de instrução.
Os voluntários foram submetidos a um exame radiológico de Ressonância
Magnética chamado fMRI - functional magnetic ressonance imaging - em que a
atividade neurólogica foi assistida em tempo real para tornar mais clara a forma
de funcionamento cerebral a partir de estímulos de marca. No momento do
exame foram apresentados logotipos de marcas de automóveis famosas e outras
marcas menos conhecidas, bem como marcas de empresas de seguros no
mesmo propósito20.
Os resultados demonstraram que marcas mais conhecidas acessam áreas
cerebrais do córtex que envolvem emoções positivas e de auto-identificação,
além de necessitarem de menos esforços mentais, por já estarem fixadas e por
isso são facilmente reconhecidas.
Em entrevista concedida a Kevin Helliker do Wall Street Journal, a Dra.
Christine Born comentou: “this suggests that the stronger brands were "more
fixed in the brain" and "perceived more easily"21, já no caso de marcas “fracas”
exige-se um maior trabalho cerebral e geralmente é possível que más
recordações venham a tona por existir uma atividade cerebral difusa que
dispende muita energia. No caso de marcas fracas o pensamento recorre
principalmente a partes situadas no lado direito do cérebro, que segundo a
pesquisadora envolvem emoções negativas e mesmo um certo conflito de
mensagens.
O recente estudo da Universidade Ludwig Maximilians foi realizado no
bojo das ciências biológicas em uma área específica denominada
neuroeconomics e sugere que a importância de uma marca tem sido fortemente
influenciada pelos aspectos cognitivos e cerebrais do consumidor exposto às
comunicações das mais variadas formas.
20
É importante ressaltar que na Alemanha, país em que foi desenvolvida a pesquisa, o mercado automobilístico e de seguros detém grande importância econômica e provavelmente por este motivo foram os segmentos de produtos escolhidos. 21
Tradução pessoal: “ isto sugere que as marcas fortes estão mais fixadas no cérebro e são mais facilmente acessadas.”
148
Em ambos os resultados apresentados – de marcas fortes e fracas que
estavam armazenadas na mente dos voluntários no momento da pesquisa –
vemos claramente o aspecto emocional com que o indivíduo se relaciona com as
marcas, seja de forma positiva ou negativa, o que evidencia a carga emotiva
construída pelos contatos externos realizados pela experiência colateral, bem
como os contatos e experiências reais com o signo em questão, no caso um
carro ou um serviço de seguros efetuado, que poderiam tranqüilamente serem
adaptados para a relação adolescente-roupa.
Os estudos que contemplam a área de neuroeconomics e Brain Branding,
citados acima, esmiúçam todo o sistema complexo cerebral existente e
relacionado às emoções e armazenamento de mensagens na memória, através
de pesquisas científicas avançadas que só são plausíveis por meio de um grupo
de pesquisadores experientes em diversas áreas correlatas que esteja reunido
no objetivo de entender os processamentos cerebrais no relacionamento com as
marcas.
O conceito peirceano da experiência colateral, da cognição e percepção
humana pode contribuir no desenvolvimento do tema, trazendo para o campo de
pesquisa noções abrangentes sobre o funcionamento dos signos e sua rede
complexa de conexões e determinações, que apuram detalhadamente o
processo de pensamento, lembrando sempre que toda a arquitetura semiótica de
Peirce foi construída com o intuito de apresentar uma teoria sígnica do
conhecimento, como indica Santaella (1994) e conseqüentemente buscar o
entendimento do pensamento humano, que vive ao redor de signos, comunica-
se através de signos e cria novos signos para garantir sua sobrevivência.
150
Considerações Finais
A configuração contemporânea da adolescência, no ritmo informacional
24/7, faz com que pensemos em seus atores como indivíduos cuja extensão de
vida transcende o físico e adentra no virtual, convergindo mídias, ciberespaço,
ambientes lúdicos de consumo e tantos outros encontros, que apresentam a
potencialidade de uma nova práxis experencial e perceptual.
Retomando a análise da sustentação da marca de Moda Jovem, vinculada
à relevância das mídias e à dominância da cibercultura, verificamos que os
argumentos da Experiência Colateral de Charles Sanders Peirce são decisivos
na Moda. É a familiaridade constituída pelo arcabouço cultural, armazenado na
memória, diante da quantidade enorme de informação recebida, no excesso de
intervenções instantâneas e ininterruptas dos meios de comunicação.
O ato de vestir, ou a preferência por determinadas roupas e estilos, não se
apresenta apenas como uma solução ou possibilidade com fins de proteção,
pudor e até mesmo com funções simplificadas de embelezamento, antes,
representa a ampla esfera de representação social, num mundo de observadores
e observados. Seu espaço legítimo é maximizado, clamando por intervenções
comunicacionais, numa relação sem fronteiras no que tange à significação.
A influência das novas tecnologias e a interatividade por elas permitida
fornece uma visão do público jovem enriquecedora para o campo da Moda, pelo
fato de tratar diretamente da dimensão do consumo desta coorte, que é
praticamente impossibilitada de viver sem os mídia, seus signos, seus conteúdos
e referências, que acabam por moldar grande parte de sua postura perante a
vida, definindo muitos de seus traços essenciais.
A visualização dos aspectos comunicacionais presentes no universo
adolescente, pode alterar a compreensão do papel da Moda e da aparência no
contexto em que vivemos. A riqueza de experiências presentes nestes
ambientes demonstram leituras plurais, que interferem na apreensão dos
151
códigos de vestimenta pelos indivíduos de 14 a 18 anos e podem influenciar
suas escolhas futuras.
Os contextos em que esses jovens estão inseridos são completamente
diferentes: seus modos de olhar, o foco de sua atenção e o arranjo das
preferências pessoais referenciam, constantemente, padrões implícitos no
conteúdo das mensagens midiáticas, catalisadas diariamente, juntando-se ao
arcabouço pessoal.
Tal percurso, movido pela evidência do acúmulo de textos publicitários
diretos ou indiretos, demonstra que a abordagem utilizada, contemplando
diversos aspectos do pensamento, da memória e do próprio Recall de marcas de
Moda na mente do público-alvo é de grande valia, constitui-se um significativo
campo de estudo comportamental, envolvendo o conjunto de estudos
relacionados ao marketing, psicologia e neurologia.
A complementação pela via da teoria semiótica peirceana deve ser
considerada em conjunto inseparável: de um lado a perspectiva da tríade sígnica
e de outro as questões relacionadas à cognição e à familiaridade prévia com o
sistema, a saber a experiência colateral.
Articular respostas assertivas e definições exatas nesse campo é
impossível, pelo fato da experiência colateral ser construída também a partir das
experiências pessoais e únicas de cada indivíduo, com o complexo sistema
simbólico presente nos átomos da vida cotidiana, onde interferem desejos
particulares, instintos, necessidades e aspirações sociais, na singularidade
sistemática de cada ente.
O percurso aqui seguido teve a intenção de traçar as primeiras linhas a
respeito de uma área pouco estudada e que clama por novas incursões, face às
dimensões contidas no denso sistema da experiência humana.
A contribuição deste trabalho foi instigar a reflexão, e colocar em pauta,
para possíveis análises, a questão da mídia e da cibercultura na relação Moda –
marca – adolescente.
Os primeiros passos do pensamento teórico a respeito do armazenamento
dos contatos com a marca de Moda, a partir da teoria peirceana, foram definidos
152
com a proposta de trazer à tona uma percepção diferenciada, passível de ser
vista e revista em outras abordagens acadêmicas relacionadas à Moda e à
publicidade, criando uma agenda que pense suas complexas relações pelo
caminho triádico de Peirce.
É preciso considerar, primeiramente, que o estudo dos fenômenos de
consumo e do comportamento do público-alvo, perante os produtos de Moda, é
um compromisso intelectual que não deve ser desmerecido. A abordagem
pondera uma característica importante de nossa sociedade, onde somos
educados e socializados muitas vezes por meio dos objetos consumidos e,
portanto, exige cuidado e atenção acadêmica.
O aprofundamento teórico, bem como a aplicação prática aqui realizada,
possui as limitações próprias ao nível proposto para uma dissertação de
mestrado. Sugere-se sua continuidade, em novas iniciativas de pesquisa, em
especial maior dedicação ao levantamento de dados primários, que vislumbrem
a possibilidade de interações e diálogos com jovens, em nível doutoral.
Novas abordagens implicarão resultados mais aprofundados, em
conseqüência amadurecerão as questões levantadas, através do refinamento
qualitativo dos dados primários, tendo como efeito a consolidação dos
conhecimentos apresentados.
154
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WILLIS, P. Common Culture: Symbolic Work at play in everyday cultures of the
young. Milton Keynes: Open University Press, 1990.
WILSON, E. Enfeitada de Sonhos. Tradução de Maria João Freire. Lisboa,
Edições 70, 1989.
- Pesquisas -
_______________. Dossiê Universo Jovem MTV3 Pesquisa realizada pelo
Escritório “Wilma Rocca & Associados. Planejamento e Pesquisa” (execução do
trabalho qualitativo, coordenação e análise final da pesquisa) e Datafolha
(realizador da fase quantitativa da pesquisa) - canal MTV. São Paulo: 2005.
__________________________. Relatório Global Juventude Brasileira e
Democracia: participação, esferas e políticas públicas. Coordenado por IBASE
(Instituto Brasileiro de Análises Sociais e econômicas) e POLIS (Instituto de
Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais). São Paulo: 2006
- Sites Gerais -
malhacao.globo.com – site da novela adolescente da Globo
http://comercial.redeglobo.com.br/programacao_serie/malha3_globox.php
www.meioemensagem.com.br/novomm/br/
http://news.bbc.co.uk/1/hi/health/6191152.stm
http://www.edutec.net/Leis/Gerais/cpb.htm
http://www.nasrecruitment.com/TalentTips/NASinsights/GenerationY.pdf.
http://www.gestaodoluxo.com.br/comportamento_materia_01.htm
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u67480.shtml
http://www.guiadasemana.com.br/noticias.asp?
www.createyourself.com.br
http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT829801-1666-1,00.html
http://peircematters.blogspot.com/2005/02/collateral-observation-quotes.html
http://www.msnbc.msn.com:80/id/17037305/ . Acessado em 10/02/07
http://www.wharton.universia.net/index.cfm?fa=viewArticle&id=1091&language=p
ortuguese
165
Anexos
Tópicos sobre marcas de Moda no Orkut
*Obs: aqui serão mantidas a ortografia e concordância verbal utilizadas
pelos comentadores e participantes do Orkut, sem correções, para dar o caráter
realista do meio virtual.
COMUNIDADE CAVALERA
(acessado em 27/09/2006) 161.719 membros na data
Tópico: Porque a Cavalera é tão cara?
Resposta de Julio em 15/11/05
pq?
pq eh chique...
pq sao lindas...
pq eh moda...
pq É CAVALERA!
pra que?
pra ficar bem vestido em qlqr ocasião...
pros outros verem que você sabe se vestir e não falar q vc tava maloquero na
balada...
pra ficar na moda...
pra USAR CAVALERA!
Resposta de Jean 16/11/05
eh isso aí andy!!
c fosse mais barata qualker otario usaria!!aí quando a marca eh popularizada d
mais, perde a "fama",e CAVALERA eh uma marca descolada e irreverente,pra
qm tem estilo, naum pra agroboys, e com q roupa a gente iria numa balada?!fz
166
oq!!tem q c assim mesmo!!cara compra uma la d vz em quando entaum!!eh o
jeito!!flw!!
Resposta de Marcus em 19/11/05
Caro???ainda eh barato viu, uma camisa de qualidade como as da cavaleras ser
80 reais.. rapaz... sai da comunidade entao seu pobre... vai comprar roupa na
C&A
Comentário de Giovane 16/12/2006
Senão fosse relativamente caro, não faria sucesso. O q a maioria quer é
aparecer pq a ropinha é cara.. Poucos ligam pro q ela e se ela representa algo. A
parada perde as qualidades pra virar sonho de consumo..
Tamires, ñ sei onde vc mora, respeito sua opinião, mas aki no RJ existem
diversas marcas que fazem o msm estilo brincalhão, sacástico e cheio de
trocadilhos como a Cavalera. Só não são famosas sabe.. E cada vez mais vo
partir pra essa sabe..
O frisson acabou qdo o kra deixou de falar " q blusa foda! " pra comentar " Blusa
da cavalera, deve ter sido X reais "
Pra quem realmente não acha uma blusa que custa 1/3 do salário mínimo de um
país CARA, só lamento. é muita vontade de achar que é rico.
Comentário de Bruna – 10/01/2006
Putz acho essa uma discussão sem fundamento...
Pq na verdade vc n compra uma blusa.. vc compra uma marca
E pow eh caro tanto qt outras roupas de marca, ate pq se fosse barato ngm iria
querer comprar... pq as pessoas se vestiriam iguais.
Eh um pensamento mt fútil,, mas eh isso
Tópico: Cavalera, Collci, Zapping ou Triton???
Resposta de Caio em 22/10/2004
Cavalera, Colcci, Zapping ou Triton?
167
hmmm
abriram esse tópico lá na comunidade da Colcci... E achei que seria interessante
fazer o mesmo aqui.
Então. Em ordem de preferência, o que vocês gostam mais e o por quê?
Pra mim... O top list fica:
1º lugar- Colcci (é perfeita. 1ª sem dúvidas. Nem preciso explicar... É minha grife
do coração. Amo tudo que a Colcci faz, apesar de não ter gostado muito da
última coleção, a Road Riders)
2º lugar- Cavalera (Fica pau a pau com a Colcci para mim... Mas a modelagem é
a que faz ficar em 2º. A P fica gigante em mim e não sou pequeno)
3º lugar- Zapping (ahhhh muito boa... Mas os acessórios me chamam mais
atenção do que as blusas ou calças)
4º lugar- Triton (Só gosto das calças... Eu acho as blusas da Triton caras demais
e muito simples para cobrarem o preço q cobram)
(po axei bem legal esse tópico pq eu axu qi o publico dessas lojas eh mais ou
menos o msm.eu adoro todas essas, pq saum bem estilosas)
Resposta de Bruno em 19/11/05
sei lá
Olha eu acho que a Cavalera é melhor, a Colcci tem muito nome pelos
patrocinios e comerciais que recebem da MTV, que muitas pessoas assistem,
por isso cresceu tanto eu acho.
Resposta de M. Em 19/11/05
Os colcci-maníacos que me desculpem, mas a Cavalera seleciona melhor; por
exemplo, pra quem presa pela individualidade e originalidade, como eu, fica
difícil sair vestindo colcci e não esbarrar em álguem com a mesma peça. A
Cavalera, por ser mais cara (nem sei se há tanta diferença de preço) com
certeza caracteriza um estilo único.
E by the way, pq a Colcci massifica tanto os looks? As peças são muito
parecidas.
Resposta de Denis em 28/11/05
168
AFF..sem qrer ser chato?
acho colcci uma imitaçao barata da cavalera..
colcci tem um stilo pop...normal..sem graça..
cavalera eh bem + style..
e sobre o material...pra mim os dois usam o msmo...só cavalera sabe fzer um
pano virar roupa de mark...colcci n : P
hsauhs
Comentário de Claudinha em 12/12/05
DEPOIMENTO DE UMA VENDEDORA.!
só quem realmente trabalhou ou trabalhou nas 2marcas eh q vai saber
responder direito ou quem compra direto as 2 pra saber qual vai se desgastar
primeiro!trabalhei 2anos com a marca CAVALERA,tive varias blusas e calcas ...a
marca por ser descontraida,engracada,faz com q vc se apaixone...mas tem UM
(ou vários)porem:ela nao dura NADA!o silk sai com facilidade e se vc tiver
aquelas blusinhas bonitinhas com estampas coloridas furta cor nao
comprem!elas na 1lavagem saem e a blusa fica com a aparencia de q foi usada
varias vezes,sem contar com as camisas masculinas q ficam TORTAS.blusas
brancas ou claras com detalhes vermelhos NEM PENSAR!a cor vermelha da
cavalera migra pra clara e olha q eu ja fiz varias analises!!!hj eu estou
trabalhando na COLCCI(pra quem trabalhou na cavalera sabe q a colcci eh uma
eterna rival!)e olha,estou bestificada com a qualidade e com a seriedade q eles
dao a peça e com o cliente.o tecido eh especialmente elaborado pela
MENEGOTI(q tem uma parceria de tecidos com a colcci)as peças sao feito
analise com todas e isso eh pra gente q eh vendedor saber q o q o cliente esta
comprando eh de fato bom.isso nos da uma maior confianca pra
vender.resumindo,a COLCCI sem dúvida eh melhor.gosto do estilo irreverente
da CAVALERA(amo o estilo deles)porem a COLCCI eh legal e eh melhor!
Obs: Lembrar que a Colcci era uma marca que vendia apenas roupas baratas e
de repente virou marca, há pouco tempo mudou isso...
COMUNIDADE VIDE BULA
(acessado em 27/09/2006) – 17.521 membros na data
169
Tópico: Por que vc gosta das roupas Vide Bula?
Resposta de Guilherme em 19/07/04
Acho que gosto das roupas da Vide Bula por que quase todas as coleções são
ligadas com problemas sociais, política, temas polêmicos em geral. Muitas das
estampas não são apenas um desenho bonito e sem sentido. Muitas passam
mensagens, e mensagens proveitavéis. Sempre engajada com assuntos
diversos, eu acho que é isso que mais admiro na marca: moda consciente.
COMUNIDADE ZAPPING
(acessado em 27/09/2006) – 13.556 membros na data
Tópico Cavalera ou Zapping?
Resposta de Diguinho em 15/09/06
CAVALERA SEM DUVIDA...ZAPPING E ZOOMP QUE SAO DA MESMA
FABRICA JA TAO FORA DA MODA A ANOS POR CAUSA DA MESMICE...
Tópico: Zapping esqueceu suas origens
Comentário de Iulo em 5/5/06
o que, na verdade, não me diz nada de bom!
e como eu já havia dito em algum tópico aqui, vale reforçar:
coleção nova sem graça e sem vida. nada conceitual, extremamente comercial
quer vender? beleza! vai vender igual feira, mas onde fica a moda nessa história
toda?
tragam a thais de volta; o público zapping agradece :)
170
TÓPICO: Qual marca a pessoa acima tem a cara?
Luana
Humm.. 24/8/2005 20:26
Rafael
Cavalera 25/8/2005 05:18 gata, vc tem stilo e atitud... nasceu pra vestir Cavalera...
☆ [DiegÖ]
25/8/2005 06:18 Versace
Luana
hum... 25/8/2005 13:09 Vc eh bem a cara da Cavalera msm...acertei?!
Victor
26/8/2005 09:26 tvz colcci...coca cola...
Jorge Hierro
VOLCOM 26/8/2005 12:49 Tem cara de skatista !
Bernardo
ellus 26/8/2005 14:42 hhahua tah meio longe mais vai ellus ...
___yAsm!ne
☆
¬¬ 26/8/2005 15:12 cOlcci .. ?!!
♥ ღ
..Andressa
26/8/2005 16:43 Colcci.. com ctz!
171
Márcio Goddini
colcci 28/8/2005 07:43 certo?
Geraldo
28/8/2005 07:52 rip curl
Geraldo
28/8/2005 07:53 rip curl
Vanessa
28/8/2005 08:26 se lah, maha talvez!
Olívia
28/8/2005 08:31 zapping =]
Dragon
28/8/2005 08:34 Colcci
Ádamo
axo que 28/8/2005 09:18 DISRITMIA
Luana
humm.. 28/8/2005 09:24 Axo q colcci!
Kadu
Sei não... 28/8/2005 09:39 Não sei... Mas ficaria linda de qualquer jeito...hehe Eu falaria DocDog, Colcci e Zapping...
coca cola 28/8/2005 11:05 neh naum??
172
Geraldo
Carolza
28/8/2005 11:08 cavalera! o_o'
Alexandre
ellus 28/8/2005 12:10 Até...
Alessandro
maha / psico street 28/8/2005 12:18 coisas bem street wear, skate...
☆ [DiegÖ]
Disritmia 30/8/2005 21:29 Sera?
Danilo
M.Officer 30/8/2005 22:23 Po,com certeza ele uma M.Officer!
Carol
HUMMM 30/8/2005 22:30 COLCCI e CAVALEIRA :D
Victor
tvz... 31/8/2005 04:23 Alexandre Herchcovitch, slam, amp...
Alessandro
pel estilão dá para citar: 31/8/2005 05:53 lacoste e osklen...
Eliseu
hering.... 31/8/2005 10:29 como nas fotos soh tinha uma camiseta, foi a primeira coisa que veio na cabeça...